Você está na página 1de 42

CAPITULO-I: CONTEXTUALIZAÇÃO

O presente capítulo é exclusivamente reservado a identificação ou delimitação dos


aspectos gerais pertinentes relativo ao problema em estudo, que coincidem nalgum
momento com o tema. Entretanto, trataremos os aspectos pertinentes e relevantes
relativo ao tema que melhor introduzem a temática em estudo, nomeadamente: Noção
do recurso, efeitos do recurso, e por fim o princípio da presunção de inocência.

1.1. Generalidade
1.1.1. Noção geral

O recurso é a impugnação de uma decisão judicial de um tribunal para outro, de


categoria superior, das decisões da primeira instância recorre-se geralmente para a
reclamação.1

Em matéria de recurso há que distinguir entre o recurso ordinário e os recursos


extraordinários, estes com duas espécies: recurso de fixação de jurisprudência e recurso
de revisão.2 Recorre-se ordinariamente de decisões não transitadas; e recorre-se
extraordinariamente de decisão já transitada.

2. RECURSOS ORDINÁRIOS

2.1. Objectivo do recurso

O recurso visa alterar uma decisão sobre a qual se não concorda, ainda que
exclusivamente no interesse do arguido.3

A justiça penal visa a descoberta da verdade material.

O Ministério Público de acordo com o artº 2º do seu Estatuto e a CRPM está sujeito a
critérios de legalidade (deve cumprir e fazer cumprir a lei), objectividade (deve olhar a
realidade judiciária sem “paixões, crenças ou ideologias”) e isenção (não deve tomar
partido e o seu partido deve ser a Justiça).

1
EIRAS, Henriques, Processo penal elementar, 5a edição, sociedade editora, Lisboa, Lisboa Outubro
2004, Pág.42.
2
Idem. 165-166.
3
. Justiça criminal em Moçambique-notas essenciais. Centro de Estudo, jurisdicao penal, Julho 2017.
Pag. 2
Assim deve recorrer sempre que entenda que não foi realizada justiça por violação de
normas processuais ou substantivas ou deficiente análise da realidade da vida que
constitui o objecto daquele processo. Compreende-se, pois, que o Ministério Público
não tenha o estatuto de “parte”, mas de fiscal da legalidade e promotor da justiça.

Daí que, em determinadas situações tenha obrigatoriamente que recorrer.

2.1.1. Recursos obrigatórios para o Ministério Público

a) Moldura penal: sempre que sejam aplicadas as penas maiores previstas no artº 61 do
C. Penal; b) Situações em que está em causa a independência do Tribunal – artº 110 do
CPP; c) Ofensas no exercício de funções ou por causa delas – artº 116 do CPP; d) Por
determinação hierárquica; e) Por violação de jurisprudência obrigatória – artº 670 do
CPP. 4

2.1.2. Admissibilidade legal de recurso. Excepções.

O art. 645 estabelece-se o princípio geral da admissibilidade de recurso das sentenças e


dos despachos judiciais, sempre que a irrecorribilidade não esteja prevista na lei e traduz
a consagração do pressuposto de que o direito de recurso constitui uma garantia de
defesa e um corolário da garantia de acesso ao direito e aos tribunais, mas deve
subordinar-se a um desígnio de celeridade, associado à presunção de inocência e à
descoberta da verdade material.5

Como é de sua natureza e função processual, o recurso não pode ter como objecto a
decisão de questões novas, constituindo apenas um remédio processual que permite a
reapreciação, em outra instância, de decisões expressas sobre matérias e questões já
submetidas e objecto de decisão do tribunal de que se recorre. Em fórmula impressiva,
no recurso não se decide, em rigor, uma causa, mas apenas questões específicas e
delimitadas que tenham já sido objecto de decisão anterior pelo tribunal recorrido e que
um interessado pretende ver reapreciadas.

Por sua vez, nos termos art.º 646, não é admissível recurso:

− Dos despachos de mero expediente1; − Das decisões da polícia ou de quaisquer outros


actos judiciais, se nelas se não excederem os limites prescritos na lei; − Das decisões
4
MIGUEL, João Manuel da Silva, GUERRA, Paulo Alexandre Pereira, justiça criminal em Moçambique
-notas essenciais, centro de estudo judiciário, jurisdição penal, Julho 2017. Pag. 229
5
Idem.
que ordenem actos dependentes da livre resolução do tribunal2; − Das decisões sobre
matéria de facto tomadas pelos Tribunais de recurso quando julgam em 1ª Instância,
pelo tribunal colectivo e pelo tribunal de júri, salvo quando houver anulação de
decisões, nos termos do artº 517 do CPP; − Da decisão judicial que julgar iníqua a
decisão do júri; − Dos acórdãos do tribunal da Relação sobre decisões absolutórias em
processo correccional e nos processos de polícia correccional, de transgressões ou
sumário, salvo oposição de julgados ou para fixar jurisprudência (artºs 669 e 670), salvo
quando a multa aplicada exceda os 120000000 MT); − Dos Acórdãos do Tribunal
superior de fixação de Jurisprudência; − Nos demais casos previstos na lei.

2.2. Legitimidade para recorrer

Nos termos do art. 647, só pode recorrer quem tiver interesse em agir, nomeadamente:

− O Ministério Público, de qualquer decisão, ainda que o faça no exclusivo interesse do


suspeito - Trata-se de afloramento da função primacial do MP, de defender a legalidade,
seja contra ou a favor da defesa; − O arguido/Réu, a parte acusadora/assistente e o
responsável civil nas decisões contra si proferidas e na parte em que o forem;6

− Quem tiver sido condenado ao pagamento de qualquer importância ou tiver que


defender um direito afectado pela decisão.

A admissibilidade de recurso de decisão proferida em 2a instância é a chamada questão


da segunda via de recurso: da decisão proferida por um tribunal foi admitido recurso
para outro. Trata-se agora de apurar em que caso é admissível o recuso da decisão
proferida por este.7

O recurso da parte da sentença relativo a indemnização civil está sujeito a regime


diferente: quanto a decisão na parte penal é geralmente recorrível e recorrível só numa
via, apenas há vendo lugar a duas vias de recurso nos casos que indicamos, na parte
relativa à questão civil a decisão só é recorrível desde que estejam preenchidos os
seguintes requisitos cumulativamente:

 Valor de pedido superior à alçada do tribunal recorrido, e

6
MIGUEL, João Manuel da Silva, GUERRA, Paulo Alexandre Pereira, justiça criminal em Moçambique
-notas essenciais, centro de estudo judiciário, jurisdição penal, Julho 2017. Pag. 230.
7
EIRAS, Henriques, Processo penal elementar, 5a edição, sociedade editora, Lisboa, Outubro 2004, Pág.
166.
 Decisão impugnada desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da
alçada.

Se foi interposto recurso da 1a instância para relação com o fim de resolver divergência
sobre questão interlocutória, resolvida esta o processo a baixo à 1 a instância e prossegue
a sua tramitação. Do acórdão daquela não há recurso, a decisão não é recorrível para o
Supremo Tribunal de Justiça.

Se for aplicável pena superior a oito anos de prisão há uma 2a via do recurso. Há
também 2a via de recurso dos acórdãos condenatórios que apliquem pena compreendida
entre cinco a oito anos de prisão, se não confirmarem a decisão da 1a instancia.

2.2.1. Delimitação do objecto do recurso

O recurso pode abranger toda a decisão ou parte dela se o recorrente não limitar objecto,
o recurso abrange a totalidade da decisão. Para que o recorrente possa limitar o objecto
é necessário que a aparte recorrida separável da parte não recorrida de modo que seja
possível uma apreciação e uma decisão automática.8

A decisão proferida em recurso tem um âmbito de aplicação amplo não se aplicando


apenas ao recorrente mas também a outros participantes processuais.

2.2.2. Fundamento de recurso

Sempre que a lei restringir a cognição do tribunal ou os respectivos poderes, o recurso


pode ter como fundamento quaisquer questões de que pudesse conhecer a decisão
recorrida. Nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria
de direito, o recurso pode ter fundamento, desde o vicio resulte do texto da decisão
recorrida, por si so ou conjugada com as regras da experiencia comum:9

 A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;


 A contradição insanável da fundamentação;
 Erro notório na apreciação de prova;
 Inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que deva considerar-
se sanada.

8
EIRAS, Henriques, Processo penal elementar, 5a edição, sociedade editora, Lisboa, Outubro 2004, Pág.
167.
9
PINTO, Antonio Augodto tolda. Novo código processual penal. 2 edicao, editora rei dos livros. Lisboa.
Pag. 503.
2.2.3. Prazo de interposição do recuso

O prazo de interposição de qualquer recurso é de cinco dias, a contar daquele em que foi
publicado o despacho, sentença ou acórdão, salvo se o recorrente não tiver assistido à
publicação e a leio ordenar que seja notificado, porque, neste caso, o prazo começara a
correr desde a notificação, (Cfr. Art. 651 do CPP).10

Excepções:

Em processo sumário terá de ser em acta e a seguir à leitura da sentença ( artº 561 e §
Único do artº 651; b) Quando a lei estabelece que os recursos sobem com determinada
decisão final, caso dos despachos de pronúncia e do que rejeita a instrução.11

2.2.4. Rejeição e desistência do recurso

O juiz rejeita o recurso nos seguintes casos seguintes:

 Se a decisão for irrecorrível;


 Se for extemporâneo;
 Se faltar a motivação;
 Se o recorrente não tiver as condições necessárias para recorrer.12

O recorrente pode desistir do recurso por requerimento ou por requerimento ou por


tempo no processo ate à apresentação deste só relator para exame preliminar.

O direito de interpor recurso de determinada decisão é livremente renunciável (cfr.


Artº 648 do CPP), sendo admissível a desistência do recurso.13

2.3. Regime de subidas do recurso

O regime de subida integra a questão de saber como sobe o recurso, quando sobe e
com que efeito. 14

Para responder «como», temos a considerar dois modos de subida:

10
Cfr.651. do Código de Processo Penal DE Moçambique. 2 a Edição, 2018.
11
Justiça criminal em Moçambique -notas essenciais. Centro de Estudo, jurisdição penal, Julho 2017.
Pag. 2
12
EIRAS, Henriques, processo elementar, 5a Edição Sociedade editora, Lisboa 2004. Pag172-173.
13
Justiça criminal em Moçambique -notas essenciais. Centro de Estudo, jurisdição penal, Julho 2017.
14
MIGUEL, João Manuel da Silva, GUERRA, Paulo Alexandre Pereira, justiça criminal em Moçambique
-notas essenciais, centro de estudo judiciário, jurisdição penal, Julho 2017. Pag.233.
Subida nos próprios autos – sobem nos próprios autos os recursos interpostos de
decisões que ponham termo à causa (ou seja, as sentenças, que conhecem a final do
objecto do processo ou os despachos que ponham termo ao processo) e os que com eles
devam subir (cfr. art. 661 do CPP), bem como os que suspendam o andamento do
processo. 15

Subida em separado – os recursos que, não sendo interpostos de decisões que ponham
termo à causa ou que com estes devam subir, devam subir imediatamente.

No que se refere ao «momento da subida» há a considerar dois tempos para o efeito:

Sobem imediatamente os recursos (art. 655)

 O da decisão que ponha termo à causa e das que forem proferidas depois
desta;16
 O da decisão que aplicar ou mantiver a prisão preventiva;
 O da decisão do juiz que condenar no pagamento de qualquer importância,
nos termos deste código;
 O do despacho em que o juiz se não reconheça impedido;
 O do despacho de alteração da acusação previsto no artº 351;
 O do despacho sobre a legitimidade do Mº Pº e da admissão da parte
acusadora;
 O dos despachos que não admita a prestação de caução ou ordenem a sua
quebra ou a declarem inidónea e fixarem o seu quantitativo;
 O da decisão que determine a prisão de qualquer pessoa por crime de
desobediência a mandado de justiça;
 O do despacho que indeferir exame médico de arguido suspeito de alienação
mental e do despacho que ordenar o seu internamento e a sua cessação;
 O do despacho que prolongue o prazo da prisão em consequência da não
separação de processos de arguidos não notificados – artº 581; o Das
decisões finais sobre as excepções;
 O do despacho sobre a prova nos processos de difamação e injúria do artº
590;
 O do despacho que não admitir instrução;
15
MIGUEL, João Manuel da Silva, GUERRA, Paulo Alexandre Pereira, justiça criminal em Moçambique
-notas essenciais, centro de estudo judiciário, jurisdição penal, Julho 2017. Pag.233.
16
Idem. Pag.234.
 O de Todos os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis (por
aplicação dos princípios do regime do agravo);
 O das decisões posteriores à decisão final.

2.5.1.Sobem diferidamente

O Todos os recursos que não subirem imediatamente, sobem e são instruídos e


julgados com o recurso da decisão final. O Vejam-se especificamente os artºs 653,
654 e 657 do CPP. 17

A subida diferida dos recursos assenta numa exigência de celeridade processual, que em
processo penal é um valor relevante. Assim, fazendo a lei processual penal subir
imediatamente apenas alguns recursos, obvia-se a que a tramitação normal do processo
seja afectada por constantes envios do processo à segunda instância para apreciação de
decisões interlocutórias e, por outro lado, pode vir a evitar o conhecimento de muitos
destes recursos que podem ficar prejudicados no seu conhecimento pelo sentido da
decisão final.

Nos processos de transgressões e sumários todos os recursos subirão com o que for
interposto da decisão final – art. 657 do CPP.

Finalmente, no que se refere aos «efeitos do recurso», temos:

3.1. Recursos com efeitos suspensivos

Quanto ao efeito do recurso ele pode ser meramente devolutivo ou suspensivo.

O recurso tem efeitos suspensivo, sem prejuízo de os actos urgentes serem praticados
pelo juiz visado, se tal for indispensável. O problema que coloca-se quanto a eficácia
suspensiva da decisão condenatória porquanto, tendo o recurso interposto o efeito
suspensivo, podia gerar-se, como consequência desse efeito, a inexequibilidade total da
decisão, já que o réu poderia furtar-se ao seu encolhimento, caso a mesma fosse
confirmada pelo tribunal.18

Tem efeitos suspensivos do processo cfr 658:19

17
MIGUEL, João Manuel da Silva, GUERRA, Paulo Alexandre Pereira, justiça criminal em Moçambique
-notas essenciais, centro de estudo judiciário, jurisdição penal, Julho 2017.
18
BARREIROS, José António, processo penal-1, editora Almedina Coimbra. Pag415.
19
Cfr. No artigo 658 do Código de Processo Penal DE Moçambique. 2 a Edição, 2018.
 Os recursos interpostos das sentenças ou acórdão finais condenatórios, sem
prejuízo do disposto nos arts. 295o 300o e seguintes;
 O recurso do despacho de pronúncia;
 O recurso do despacho que designar dia para o julgamento em processo de
polícia correccional, quando subir logo ao tribunal superior;
 O recurso dos despachos a que se referem os artigos 350o e 351o;
 O recurso do despacho a que se refere artigo 590o.

O recurso do despacho do despacho de pronúncia não impede que se mantenha a


prisão dos arguidos ou a caução prestada.

3.2.Recurso com efeito devolutivo

Os recursos não mencionados nos artigos 658 e 659 têm efeitos meramente
devolutivos, sem prejuízo do disposto no parágrafo único do artigo 300 e no artigo
301. 20

3.3.Recurso de despacho de pronúncia havendo vários réus (cfr. 662)

Se tiverem sido pronunciados diversos réus os recursos interpostos do despacho de


pronúncia subirão, quando terminar o prazo em que pode recorrer o último dos réus
presos caucionados, nos termos do artigo 372. 21

Se tiverem decorrido mais de trinta dias depois da prisão de alguns dos réus, se
terem sido presos ou caucionados os outros, o recurso da pronúncia dos que
estiverem presos subirão logo nos próprios autos, ficando porém em 1a instância o
translado das peças do processo que o ministério público indicar, alem do despacho
de pronúncia, para servirem de base ao interrogatório dos indiciados que ainda não
tenha sido presos nem tenha prestado caução.

Se, no caso do parágrafo anterior, réus que não tenha sido preso nem prestado
caução vierem a recorrer da pronúncia quando presos ou caucionados, serão
apensados ao processo principal os respectivos traslados, se chegarem á Relação
antes do julgamento do recurso que tiver subido nos próprios autos, e serão em todo
o caso julgados pelos mesmos juízes.

20
Cfr. No artigo 660 do Código de Processo Penal DE Moçambique. 2 a Edição, 2018.
21
Idem. Cfr. Artigo 662.
Os dispostos nestes parágrafos são aplicáveis em processo de polícia correccional.
Quando houver réus presos.

3.4.Efeitos do recurso quanto aos réus não recorrentes

Se responderem diversos réus e for interposto recurso da decisão final, ainda que
relativamente a alguns deles, o tribunal de recurso conhecera da causa em relação a
todos22. Os não recorrentes não serão, em caso algum, condenados em imposto de
justiça. O mesmo se observará nos recursos interpostos dos despachos de pronúncia
ou equivalente. Se houver diversos recursos interpostos de despachos de pronúncia,
não pronúncia e não forem julgados conjuntamente, o tribunal que conhecer dos
recursos posterior julgá-los-á livremente, quaisquer que sejam as decisões
anteriores. Se, porem, as decisões forem inconciliáveis, o M.P, a aparte acusadora e
quaisquer e qualquer dos réus poderão recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça,
que decidirá em tribunal pleno, independentemente de vistos, e quanto a todos os
réus.

O prazo para interposição deste recurso começara a contar-se da baixa do acórdão


que decidir o último recurso, e o Supremo Tribunal julgará de facto e de direito. (cfr
no artigo 663)23

4. Proibição de reformatio in pejus

O instituto da proibição da reformatio in pejus mais que um princípio geral das


impugnações será um princípio do processo», que «vale, não por si mesmo, mas como
tradução (ou mera consequência) de uma ideia de "equidade" ou de "justiça" do caso
concreto», e, por isso, «um princípio da função jurisdicional, enquanto garantia do
direito de defesa, que vale para qualquer Direito e processo sancionatório público».No
fundo, a proibição da reformatio in pejus não é mais que um corolário do próprio
princípio da acusação. E isso porque «um processo de estrutura acusatória, assente num
juízo equitativo, não é senão um processo que garante todos os direitos de defesa face a
uma acusação que define os limites do tema em discussão». 24

22
GONSALVES, Manuel Lopes Maia. Código de Processo Penal Anotado e Comentado, 2 a Edição, Editora
Almedina. Pag. 690.
23
Cfr. Artigo 663 do Código de Processo Penal DE Moçambique. 2 a Edição , 2018.
24
MIGUEL, João Manuel da Silva, GUERRA, Paulo Alexandre Pereira, justiça criminal em Moçambique
-notas essenciais, centro de estudo judiciário, jurisdição penal, Julho 2017. Pag.235.
Este instituto encontra-se previsto no art. 667, impondo logo no seu n.º 1 que, quando
for interposto recurso ordinário da decisão final:

Pelo suspeito; − Pelo Ministério Público; − Pelo Ministério Público e pelo suspeito – no
interesse exclusivo da defesa.

O tribunal superior não pode:

 Aplicar sanção diversa da constante da decisão recorrida que deva considerar-se


mais grave em espécie ou medida (cfr. n.º 1);
 Revogar o benefício da suspensão da pena ou o da sua substituição por pena
menos grave;
 Aplicar pena acessória que não tenha sido aplicada pelo tribunal recorrido;
 Modificar, por qualquer modo, a pena aplicada pela decisão recorrida;

25
Esta proibição não se verifica quando:

 O tribunal superior qualificar diversamente os factos, quer quanto às normas


incriminadoras, quer em relação a circunstâncias modificativas (artº 447 e
448) − O Ministério Público no Tribunal superior der parecer fundamentado
nesse sentido, caso em que será dado prazo para resposta, em 8 dias, aos
réus.

O sentido e fundamento da proibição da reformatio in pejus é o de obstar a que o


arguido veja alterada a sentença penal, em seu prejuízo, quando só a defesa recorreu,
ou mesmo quando também o MP recorreu, mas no exclusivo interesse do Réu, e
esse fundamento encontra acolhimento no 667 do CPP, embora com diversas
limitações.

No caso do nº 1, mesmo que o recuso seja interposto pelo arguido ou pelo Ministério
Público no interesse da defesa, o tribunal superior pode aplicar sanção diversa da
decisão recorrida – mais grave em espécie ou medida -, quando operar uma qualificação
diversa dos factos - quer quanto às normas incriminadoras, quer em relação a
circunstâncias modificativas.

Na verdade, o princípio da acusação, subjacente à estrutura acusatória do processo,


imporia que nos casos em que a acusação se conforma com uma decisão e o recurso é
25
Idem. Pag.236.
interposto apenas pelo Réu, ou no seu interesse exclusivo, ficassem necessariamente
limitados os parâmetros da decisão, estabelecendo-se com o recurso, em tais casos, uma
vinculação intraprocessual, no sentido de que ficaria futuramente condicionado
intraprocessualmente o poder de decisão à não alteração em desfavor do arguido.

No caso do nº 2 o parecer fundamentado do superior hierárquico do Magistrado do M.P


não violará o princípio do acusatório e será como que um “remédio”, uma “censura”
para eventuais actuações menos correctas do Mº Pº da instância inferior.

4.1.Resposta ao recurso

Os sujeitos processuais afectados pela interposição podem responder no prazo de sete


dias, a contar da data da notificação efectuada, sendo a resposta será notificada aos
sujeitos processuais por ela afectados. 26

Na resposta o que se pretende é atacar os fundamentos da motivação, recorrendo à


decisão recorrida e explicando porque se está de acordo com ela.

No fundo, trata-se de um exercício ao contrário. Enquanto na motivação de recurso se


tenta desconstruir a decisão, na resposta visa-se solidificá-la.

9 Cfr. GERMANO MARQUES DA SILVA, (Curso de Processo Penal, III, 2.ª edição,
p. 351); «As conclusões do recurso são, logicamente, um resumo dos fundamentos por
que se pede o seu provimento, tendo como finalidade que elas se tornem fácil e
rapidamente apreensíveis pelo tribunal ad quem»

Devem formular-se conclusões claras e precisas e rebater os argumentos de forma


sistemática e precisa.

4.2.Âmbito dos poderes de cognição

Nos termos do art. 665 do CPP os Tribunais de recurso que julguem, quer matéria de
facto quer matéria de direito, baseiam-se nos documentos e quaisquer elementos de
prova que constem do processo e, no caso de decisões de tribunal colectivo ou de júri,
na resposta aos quesitos. 27

26
MIGUEL, João Manuel da Silva, GUERRA, Paulo Alexandre Pereira, justiça criminal em Moçambique
-notas essenciais, centro de estudo judiciário, jurisdição penal, Julho 2017. Pag 237.
27
Idem. 238.
Daí que se deva ter especial atenção à forma como os quesitos são formulados e à
reclamação a que já se fez referência pois esse é o momento em que verdadeiramente se
discute a matéria de facto.

5. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS

São extraordinários porque ocorrem depois do trânsito em julgado das decisões em


apreciação. São, pois, excepcionais. 28

5.1. O Recurso para fixação de Jurisprudência

Recurso obrigatório para o Ministério Público;

Fundamento: a existência de dois acórdãos proferidos pelos Tribunais superiores em


que sobre a mesma concreta questão de direito tenham proferido decisões de sentido
oposto. 29

Exemplo: nos termos do artº 127 do CP um Tribunal decretou que a pena atendível para
efeitos de aplicação deste artigo é a pena concretamente aplicada e outro Tribunal
declarou que o critério atendível é a pena abstracta.

5.2. O recurso de revista

Fundamentos – artº 673 do CPP:

a) Se os factos nela invocados como fundamento para a condenação de um réu forem


inconciliáveis com os que constem de outra sentença e da oposição entre eles possam
resultar graves dúvidas sobre a justiça da condenação 30- ex: um arguido foi declarado
culpado de crime de homicídio num processo-crime e foi-lhe aplicada uma pena maior e
num processo diferente outro arguido for declarado culpado pelos mesmos factos; b) Se
uma sentença transitada em julgado declarar falsos quaisquer depoimentos, declarações
de peritos ou documentos que possam ter determinado a decisão absolutória ou
condenatória – ex: um arguido apresenta um atestado médico para justificar que se
encontrava internado no hospital no dia da prática do crime de violação que lhe é
imputado e prova-se que esse atestado é falso; c) Se resultar de uma sentença transitada
em julgado que a decisão do tribunal foi proferida por peita, suborno, corrupção ou
28
MIGUEL, João Manuel da Silva, GUERRA, Paulo Alexandre Pereira, justiça criminal em Moçambique
-notas essenciais, centro de estudo judiciário, jurisdição penal, Julho 2017, pag.242.
29
Idem.
30
Ibdem.
prevaricação de juízes ou jurados; d) Se, no caso de condenação, se descobrirem factos
novos ou nocos elementos de prova que, por si ou combinados com factos ou provas
apreciados no processo, constituam graves presunções da inocência do acusado – ex:
“A” condenado por homicídio doloso por envenenamento vem a descobrir que quem
pôs o veneno no copo que deu a beber ao morto foi “C”, facto que se desconhecia ao
tempo do julgamento; e) Quando, por exame médico forense feito em qualquer réu que
esteja cumprindo pena e, por quaisquer diligências necessárias, se mostrar que a sua
falta de integridade mental poderia ter determinado a sua inimputabilidade e a sua
irresponsabilidade pelo crime ou infracção em que foi condenado.

6. Princípio da presunção de inocência

O princípio de presunção de inocência significa que todas as pessoas em relação à qual


não exista sentença transitada declarando-a culpada devem ser considerada inocente.
Trata-se de um princípio reconhecido não só pelo direito positivo constitucional interno
mas pela generalidade das nações signatárias de alguns pactos do direito internacional.31

Nos termos do n.o2 do artigo 59.o da Constituição da República, cujo, os arguidos


gozam da presunção de inocência até decisão judicial definitiva.32

A presunção de inocência é um direito inalienável, todo o cidadão arguido em processo


penal, ate ao trânsito em julgado da sentença condenatória que lhe for imposta.33 Implica
esta presunção de inocência que seja feita a prova da sua responsabilidade e
culpabilidade por que acusa e pelo tribunal, em conformidade estrita com as regras
estabelecida pelo presente código e outros diplomas legais atinentes ao processo penal.
Levantada razoável duvida sobre quaisquer elemento s relativos ao crime cuja autoria se
procura determinar ou ao apuramento da responsabilidade, impera sempre o princípio in
dúbio pró reo. (Cfr. Artigo 1 do Fundamento do Processo penal).

Terceiro capítulo

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

31
EIRAS, Henriques, Processo penal elementar, 5a edição, sociedade editora, Lisboa, Outubro 2004,
Pág100.
32
Cfr, o no2 do artigo 59 da constituição da Republica, actualizada pela Lei n 1/2018, de 12 de Julho.
33
Fundamento do Processo Penal. Pag.1.
PRM e a garantia constitucional da presunção de inocência

 
Ericino de Salema

12 h · Editado · 
PRM e a garantia constitucional da presunção de inocência
A Polícia da República de Moçambique (PRM) voltou
ontem, através do seu Comando Geral, a chamar a
imprensa para exibir alguns indivíduos que ela diz serem
sequestradores. Estou particularmente preocupado com a
criminalidade, sobretudo com a violenta, mas não acho
acertado que a PRM pretenda combater um mal sem
obedecer escrupulosamente os comandos constitucionais
relevantes ao seu trabalho.
Nos termos da norma contida no número 2 do artigo 59 da
Constituição da República de Moçambique (CRM), “Os
arguidos gozam da presunção de inocência até condenação
judicial definitiva”. Além de ser uma garantia processual,
nos termos do Código de Processo Penal (CPP), a
presunção de inocência, para sua relevância num Estado
de Direito Democrático, é, igualmente e acima de tudo,
uma garantia constitucional.
O comando constitucional (artigo 254, mais precisamente
o seu número 1) que se ocupa da definição dos atributos
da PRM é esclarecedor: “A Polícia da República de
Moçambique, em colaboração com outras instituições do
Estado, tem como função garantira lei e a ordem, a
salvaguarda da segurança de pessoas e bens, a
tranquilidade pública, o respeito pelo Estado de Direito
Democrático e a observância estrita dos direitos e
liberdades fundamentais dos cidadãos”.
Estará, a nossa PRM, a aplicar, nas suas acções, a
“Constituição” de uma “região autónoma” há muito
“chancelada” pelo Parlamento, antes mesmo de ser
referida nas notícias? A quem ajuda a táctica de mostrar
serviço atropelando a CRM e a lei?
Partilhar
 71 pessoas gostam disto.
 2 partilhas

Donaldo Chongo Não é só a PRM que viola o princípio
de presunção de inocência. A imprensa também alinha no
mesmo diapasão.
11 h · 9

Ericino de Salema Caro Donaldo Chongo, sim! Estas
coberto de razao! Eh uma "associacao" PRM-imprensa...
11 h · 9

Ariel Sonto Eh para mostrar trabalho.
11 h

João Carlos Trindade Além da violação dos princípios
constitucionais referidos, essa prática reiterada da PRM -
numa clara tentativa de "mostrar serviço" perante a
opinião pública, seja a que preço for - é um inaceitável,
ilegítimo e ilegal factor de pressão e condicionamento
sobre os órgãos do poder judicial. Se o Ministério Público
ou o tribunal - respeitado o princípio (igualmente
fundamental) do contraditório - entenderem não haver
prova suficiente para declarar os agora suspeitos como
autores dos crimes que lhes estão sendo imputados, a
Polícia montará a farsa habitual, declarando-se vítima do
boicote de magistrados corruptos ou sem sentido patriótico
(sim, porque o patriotismo neste país tem patente registada
a favor de uma certa categoria de cidadãos...) e fazendo
passar a velha mensagem de que "a Polícia prende os
bandidos e o tribunal solta-os sem qualquer fundamento"...
11 h · 23

Arsenio Manhice Uma das minhas preocupações prende-
se com a atitude de alguns jornalistas que pouco
questionam a policia e ás cegas apresentam imagens dos
supostos criminosos. É preciso rever este aspecto.
11 h · 7

Mebanze Joao nota zero tambem para a nossa imprensa k
nao tapou as caras dos suspeitos como acontece em outos
cantos do globo.
11 h · 1

Torres Lameque Remigio Mais incrivel ainda foi ver um
braço dum corpo que a camera nao mostrou nao sei se de
um polícia ou jornalista a esticar a pra baixo a camisete de
um dos indiciados que tapava a sua cara com o propósito
de que fosse melhor filmado e visto pela opinião publica.
Este conluio deve acabar
10 h · 1

Torres Lameque Remigio ...a esticar pra baixo
10 h · 1

Jr Chauque Ouvi ontem na Stv na entrevista aos
suspeitos um deles: Levei tanta porrada que acabei
aceitando o que nem sei o que é.
10 h

Adérito Guilande Coisas interessantes que vemos quando
a polícia exibe recém capturados fruto de “UM
APURADO TRABALHO OPERATIVO”!
Em Maputo, principalmente “... mas não só” (não sei se
precisava colocar esta nota!), o comando geral da PRM faz
questão de exibir os PRESUMÍVEIS malfeitores que
quase sempre ... FAZEM PARTE DE UMA PERIGOSA
QUADRILHA e a polícia estava já no seu encalço a
BASTANTE TEMPO...
Esta semana, salvo o lapso, a mesma PRM em Tete
anunciou a prisão do PRESUMÍVEL culpado do caso
“Phombe” e aqui... “NÃO FOI AUTORIZADA A
CAPTAÇÃO DE IMAGENS PORQUE O INDIVÍDUO
GOZA DE PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA...”
COMO FICAMOS PRM?
10 h · 1

King Vasquinho King Parece telepatia eu acabei
contestando ontem o facto da PRM vender a imagem de
terror encarnada por um camponês de Chitima julgando
que ele terá morto as 75 vitimas de Phombe e a prova
sugerida é" que mudou de residência habitual no dia da
tragédia..." so um Juiz débil pode aceitar esta prova
Mesmo sem saber até hoje o tipo ds veneno e as provas
concludentes da causa de morte, qual é a pressa ds apontar
culpado sem provas? Mostrar serviço? 
Porque nao mostra serviço na investigação do laudo, na
perícia, no móbil e na mudança do comportamento?
Neste caso o senhor acusado já está julgado e foi
"assassinado o seu carácter" antes dele se defender, a sua
inocência esta posta em causa e até vai atrapalhar a
investigação. 
Obrigado Dr.João Carlos Trindade e Ercilio Ericino de
Salema por nos iluminar com temas do judiciário
10 h · 2

Jr Chauque King Vasquinho, eu já não falo nada de nada
pk dizem k sou contra ou da oposição, como vão prender
um suspeito k estão à espera de resultados laboratoriais
para resultados? Pk gastaram dinheiro e ainda diz MISAU
k não tem laboratórios especializados em Tete enquanto
existem especialista em faro e ouvir dizers?
O dia k algo acontecer no meu bairro e por coincidência
eu desaparecer sou eu o suspeito . E se por acaso os
laboratórios não acharem venenos ou matéria que pode-se
ser mortífero ? Quem vai pagar aquele papa?
E se também existir substâncias venenosas prontos já o
suspeito vira culpado bandido será k basta só pk fugiu já
são provas?
A justiça num distrito é 1000 vezes pior k nas cidades.
10 h · Editado · 1

Dinis Tivane Meu caro Ericino de Salema. Parabéns pelo
flagrante aos atropelos à CRM e aos Direitos do Cidadão
no geral. Contudo, não acho que o seu texto esteja no
timming certo. Creio que, face à onda de sequestros e a
violência que tende a generalizar-se em Moçambique,
outros temas podiam ser mais apropriados debater neste
momento e não sobre PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA ou
ainda POPULISMO DA PRM. Por exemplo, temas como:
Declaração de Proveniência de Dinheiro e Bens; Melhoria
da Segurança Publica; O que Fazer com o Mercado Estrela
Vermelha; As Bebedeiras e Acidentes de Viação entre
outros temas que acho eu ajudariam até a animar o debate
e trabalho de todos os agentes da Lei e Ordem neste
momento particular de medo generalizado. Não lhe tiro o
mérito, mas acho que não é esse o caminho neste
momento. Em cerca de 24 meses já perdi (eu e minha
esposa) mais de 4 telemóveis entre assaltos à nossa casa e
viatura e não acho particularmente grave a Demagogia da
Polícia contra a Arrogância Viva dos Malfeitores...
10 h · Editado · 1

Gulumba D. Mutemba Boa observaçao mano Salema,a
PRM e a imprensa,adoram sujar a imagem das pessoas. 
Enquanto a pessoa gozar da presunçao da inocência,Estes
dois órgaos deviam evitar fazer exibiçoes descabidas,até
que se prove o contrário.
A nossa policia tem que também evitar o chamboco como
forma de investigar actos criminais.
Uma daquelas pessoas que Coram gratuitamente
exibidas,terá dito que "só vieram me levar em casa,só
bateram,aínda nao me disseram porque estou detido.
E como a imprensa é cúmplice, fez de contas que nao
ouviu. Em quase todos os casos,os detido,Sao sempre
torturados para confessar os seus crimes.
Moz. tem que assumir logo,que é "Rei" na vilaçao dos
direitos humanos.
2 h · Editado

Josue Matsinhe Uma NOVA POLICIA precisa-se no
meu Mocambique!!!
10 h

Torres Lameque Remigio Os procedimentos á
Guantanamo por parte da nossa policia para obter por
vezes confissoes falsas dos indiciados sao antigos e nem
as reformas legais alguma vez feitas aqui e ali foram
suficientes pra debelar este mal. O que me a mim me
indigna é ter um jornalista (que era suposto conhecer as
leis elementares de Direito) mas que por desconhecimento
ou tentaviva de mostrar serviço alinha nos atropelos da
nossa policia e apresenta simples indiciados como se
fossem reus julgados e condenados. A imprensa jamais
deverá acasalar se a policia pra cercearem e violarem as
liberdades garantias e direitos fundamentais do homem
10 h · 2

Arnaldo Tembe QUEM POE GUIZO AO GATO, CARO
JOSUE MATSINHE? FICA O SENHOR O
COMANDANTE GERAL DA TAL NOVA POLICIA?
Eh caso para se dizer:" preso por ter e nao ter".
Nhandaheyooo!!!
9 h · 1

Ericino de Salema Mano Dinis Tivane, eu e os meus
tambem temos estado a sofer danos tais. Alias, uma das
vezes ate fui assaltado em casa, aa mao armada, por
agentes da PRM. Quanto tentavam assaltar a casa do
vizinho dias depois, neutralizamo-los e os levamos aa
esquadra, onde o oficial de permanencia logo disse "estes
dois sao nossos colegas". Quando tentei seguir o caso, um
quadro da tal esquadra me disse: "mano, melhor desistires,
pois estes tipos vao-te matar". Sabes qual foi a sancao para
os dois? Transferencia para uma outra esquadra, tambem
da Matola. Tudo isto para dizer o seguinte: fora as
situacoes expressamente previstas na propria Constituicao,
nao devemos permitir que ela seja violada. Isto me parece
basico e central!
8 h · 4

Carlos V. Mavuie Nao vi a Reportagem, mas noutras os
suspeitos ou arguidos tem tido oportunidade de se
defenderem das acusacoes, respondendo as perguntas dos
Jornalistas. O negativo eh, talvez expo-los ao julgamento
publico, onde muitas vezes as pessoas tiram conclusoes
sem saberem do detalhe do sucedido, sobretudo se nao
houver materia suficiente, ou nao terem sido detido em
flagrante. Nao entendo nada da constituicao, mas acho
muito positivo mostrar as caras de gente criminosa,
sobretudo se houver materia suficente para incriminar.
Isso motiva a propria corporacao e desmotiva a pratica de
crime.
8 h · Editado

Custódio Mugabe Interessante esta reflexao Ericino de
Salema. A mesma PRM nega apresentar o rosto do
suspeito da tragégia de Chitima já detido, alegando a tal
presunção de inocencia. Onde ficamos afinal?
8 h · 3

Ericino de Salema Da mesma forma, mano Custódio
Mugabe, que nao nos mostra o "esconderijo" no qual o Sr.
MBS "foi resgatado"...
8 h · 1

Edú Sanculane Ilustres!isso não acontece so em
moz"segundo a PRM disseram que outros acusados foram
encontrado a transportar as vitimas!agora que inocencia
vão esperar provar?deve ser assim quando ha prova para
desencorajar outros.ja virou moda n nosso país criticar
tudo!eu não sou especialista nenhum mais gostaria que os
academicos debate se assuntos construtivo.
7h

Harildo Tivass Tivass Sinceramente, me surpreendo mais
com o dia a dia. Parece que tudo que tive sorte de
apreender esta sendo desmentido pela PRM. Mas enfim já
tinha dito um dos docentes de criminalística que no dia a
dia veremos tudo ao contrario.
7 h · Editado

Josue Matsinhe Insigne Arnaldo Tembe, nao ataque o
homem, ataque antes a sua ideia. Eu nao tenho perfil para
ser membro da PRM e muitissimo menos me qualifico
para seu comandante. Agora, acha que isso me tira o
merito de criticar o que vai mal? De Almejar uma nova
roupagem para a nossa policia? De desejar que ela seja
mais profissional do que espectaculosa? De querer que ela
respeite os cidadaos, a Constituicao e as leis? De exigir
que ela seja mais cientifica do que empirica? Se a policia
fizer bem o seu trabalho, nao precisara' de espectaculo
para exibir meros indiciados como se condenados fossem!
Pois tera' provas irrefutaveis que nenhum procurador ou
juiz se atrevera' a ignorar. Mas essas tais provas nao se
conseguem com empirismos do tipo seguir pegadas. Os
criminosos se sofisticaram, a nossa policia DEVE fazer o
mesmo e se modernizar, sob pena de continuarmos nesse
circo de entretenimento para o povo sonecar e se desviar
do foco, do real problema de quase ausencia de
investigacao e de ignorancia na busca, recolha e
tratamento de provas incriminatorias. Cumprimentos e um
abraco `a diferenca de ideias!
7 h · 1

King Vasquinho King Custódio Mugabe leia acima o
meu comentário sobre Chitima muito triste pegar um
Camponês qualquer e fazer de contas?
Sobre os raptos a polícia apresentou 10 cidadãos mas
bateu com a língua ao afirmar que meus senhores as
vossas camaras têm Memória para ver que estas caras são
constantes nos vossos files da TV mas que.foram libertos
na Barra.Quis dizer que pedem nos resultados e nos PRM
trazemos os mesmos de ontem. 
Devo felicitar a PRM por trazer os concidadãos3 raptados
incluindo a ultima nossa mãe que ai também foi um
vexame a nossa dignidade humana; será que a famosa
tecnologia de rastreio de comunicações ja está a
funcionar? Vide o Post de MMosse.
7 h · 1

Régulo Urbano Drd Caro Dr. Ericino de Salema, tenho
um entendimento tendencialmente contrário ao seu e
generalidade dos comentaristas do seu post. O n. º 2 do
artigo 59 da Constituição da República de Moçambique,
por si já citado, deve ser interpretado com a devida
conveniência: “os arguidos gozam da presunção de
inocência até decisão judicial definitiva”. Encontramos
ínsito o princípio da obrigatoriedade de decisão do
julgador penal o que de certo modo liga o princípio da
presunção de inocência ao do in dubio pro reo. Ou seja, a
partir do momento que se considerar que a instrução
preparatória foi desencadeada a pessoa sobre qual recaiem
os indícios ou suspeitas da prática de um crime deve-se
PRESUMIR INOCENTE até a prolatação da setença final
definitiva (irrecorrível). Ora, aqui reside a primeira
questão: o que é presunção? Pelo que eu saiba o único
instrumento legal que nos oferece uma definição do que é
presunção é o Código Civil no seu artigo 349 "presunções
são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto
conhecido para firmar um facto desconhecido". Para
facilitar a compreensão entendamos melhor o que é uma
ilação: de acordo com o Dicionário Priberam da Lingua
portuguesa ilação "é aquilo que se deduz de certos factos".
Mas o que é dedução? Nada mais, nada menos que partir
das causas para os efeitos. Ora, retomando à definição
legal de presunção diriamos sumariamente que é partir de
certos factos (daí que quando se desencadeia uma
instrução preparatória é porque há um certo facto
criminoso - o que efectivamente aconteceu) que a lei (para
o caso da presunção de inocência é a Constituição da
República de Moçambique e o Código de Processo Penal)
ou o julgador (nesse caso desde o Ministério Público e o
respectivo coadjuvante - Polícia de Investigação Criminal
até ao Juiz, quiça os serviços da penitenciária quando o
arguido encontre-se em prisão preventiva) tira de um facto
conhecido (facto criminoso e o que liga directa ou
inderectamente a pessoa àquele facto) para firmar (apoiar,
«as»segurar, ratificar) um facto que não se conhece
(QUEM COMETEU O CRIME E EM QUE
CIRCUNSTÂNCIAS). Ora, escalpelada a definição de
presunção retomemos ao nosso princípio de presunção de
inocência constitucionalmente consagrado. A Polícia ao
apresentar à imprensa pessoas alegando serem raptores
estará ou não a violar uma garantia constitucional do
arguido? A resposta a essa questão não é pacífica como
pode ressaltar à primeira vista e isso decorre do sentido e
alcance que deva ser dado ao princípio da presunção da
inocência. Aliás, Gomes Canotilho e Vital Moreira
(GOMES CANOTILHO E VITAL MOREIRA,
Constituição da República Portuguesa - Anotada, 3.ª
edição, Coimbra, Coimbra Editora, 1993, p. 203)
reconhecem que "não é fácil determinar o sentido do
princípio da presunção de inocência do arguido". Mas
tentemos, humildemente. O sentido que nos parece
conveniente e acertado tendo em conta o exercício pré-
interpretativo supra encetado é de que no âmbito do
processo penal que inicia com a notícia do crime que
maior parte das vezes é simultânea ao desencadeamento da
instrução preparatória todos os sujeitos processuais
(Ministério Público, Polícia, Juiz, maxime) devem, tendo
em conta a ligação (precária ou arreigada) que o arguido
tem com o facto criminoso firmar que o mesmo é
inocente. Ora, chegados neste ponto creio que, tendo em
conta a questão da exibição dos presumíveis raptores à
imprensa, a inocência (presunção) do arguido digladia-se
com um direito fundamentalíssimo e comunitário que é o
da INFORMAÇÃO. Será que a Polícia ao informar a
comunidade que deteve pessoas que presumem-se autores
de crimes de raptos que estão a flagelar a sociedade estará
a violar a inocência presumida dos tais arguidos? Creio
que a balança de interesses em jogo deve ser convocada e
creio que penderá para o DIREITO À INFORMAÇÃO se
a mesma for devidamente veiculada. À guisa do que me
refiro está o seguinte aspecto: "a presunção de inocência
em processo penal tem por função impor que a contenção,
a suspenção e a negação de direitos do arguido sejam o
mais limitadas possível de forma a assegurar que, uma vez
que a decisão é alcançada neste sentido da inocência do
arguido, aquela contenção, suspensão ou negação que ao
longo do processo fazem sofrer o arguido se possam
considerar toleráveis, nesta ordem jurídica assente na
dignidade da pessoa humana e em princípios de liberdade
e democracia". Ou seja, o arguido num determinado
processo penal nunca sairá incólume porque a própria
suspeita da prática de uma infracção criminosa pressupõe
um entorse ao princípio da presunção de inocência do
arguido. Chancela esta minha ideia o Souto Mouro (JOSÉ
SOUTO DE MOURA, «A questão da presunção de
inocência do arguido», in RMP, ano 11.o, n. º 42, p. 35)
quando diz que: "...a justiça humana é de tal modo
precária, que não só faz sofrer as pessoas depois de
condenadas, como as faz sofrer para se saber se hão-de ser
condenadas. Ora, é em face desta realidade inelutável, mas
nem por isso menos lamentável, que o princípio da
presunção de inocência ganha nova luz. Até à decisão
final, é sempre possível admitir a hipótese de absolvição.
E se a absolvição ocorre por força de se ter afirmado a
inocência do arguido, este tê-lo-ia sido sempre, antes do
processo e durante o processo. Ora, os actos gravosos
cometidos durante o processo contra o arguido, que se
verificou depois estar inocente, surgirão como
inadmissíveis, já que produziram uma lesão de interesses
imerecida e irreversível. Lesão sofrida por alguém que em
nada contribui para criar a situação de que foi vítima. Este
pensamento parece ser suficiente para o tratamento
preferível durante o processo seja de inocência e não de
culpabilidade". Como facilmente se pode depreender, o
próprio SOUTO MOURA, reconhece a inelutabilidade de
fazer sofrer as pessoas depois e antes de serem
condenadas. Isto dá entender que decisivamente a
presunção de inocência é uma questão da prova. Mas
como satisfazer a opinião pública assegurando o direito à
informação numa fase do processo que já não está em
segredo de justiça não veiculando informações acerca de
presumíveis autores de crimes partindo do pressuposto que
a prova é realizada durante todo o desenrolar do processo
penal? Esta é a questão do fundo: até onde vai o princípio
de presunção de inocência quando confrontado com o
direito à informação? Será que a Polícia, algumas vezes,
não está sendo mal interpretada quando pretende com base
no Direito à informação que a societas dispõe ao
reafirmar, com a exibição na imprensa de presumíveis
autores de crime, defender e reitegrar a comunidade ético-
jurídica? Não sejamos tão levianos em atacar sem apelo
nem agravo a nossa Polícia!
4 h · Editado · 1

Marcelo Mosse E que dizer dos jornais e TVs que
mostram essas imagens...nao serao eles "cumplices" dessa
violacao policial?...sera que os editores desconhecem
esses principios?. Duvido.
5 h · Editado · 3

King Vasquinho King Os Jornais e as TV fazem parte da
mediocridade informativa e também carecem de princípios
éticos. Formação de Polícias e Jornalistas precisa se
urgentemente
5 h · 2

Manuel Bude A polícia precisa responder à pressão
popular.
5h

Marcelo Mosse Essa do campones de Chitima eh uma
fuga para frente, uma mentira grosseira.
5 h · 2

Douglas Harris Se os orgãos judiciais os inocentar,
aparecerão mortos em qualquer esquina e acusados de
tentativa de fuga e por essa razão a polícia teve que abaté-
los.... e assim vai-se mais testemunhas do crime
organizado!!!
4 h · 3

Ericino de Salema Regulo Régulo Urbano Drd, bom que
existam interpretações diversas. Isso alimenta a ciência.
Entretanto, uma questão bem simples: acha que o Direito
aa Informação se acharia condicionado se a Policia tivesse
partilhado a informação com os media sem exibir os
supostos seqüestradores? A resposta eh nao! Ou seja,
cuidado com o aparente. Se nao fosse possível partilhar
informação sem exibir os suspeitos, ali sim! Aquilo, como
explanou atras o juiz Jubilado JCTrindade, pode gerar
outro tipo de problemas, mormente quando os
procuradores e juizes chegam aa conclusão de que "nao há
materialmente nada"!
3 h · 1

Régulo Urbano Drd Decerto Caro Dr. Ericino de Salema!
Eu parto do pressuposto que a exibição nunca deve ser
condicionada a não ser quando se trata de mostrar a face
do indivíduo! Mas o post quando lido sem que se tenha
visto as imagens pode induzir o leitor a concluir que o que
explana é que a polícia não deva exibir pessoas quando se
refira a presumíveis raptores. Como creio que entendeu
em nenhum momento disse que o princípio da presunção
de inocência deva ser vilpendiado! Contudo, não creio que
haja necessidade de se mostrar a face. Mas esse já é o
problema da imprensa e não da polícia!!!!
3 h · 1

Ericino de Salema A imprensa tem sim as suas
responsabilidades! Sem publicidade talvez nao houvesse o
tal esvaziamento da sobredita garantia...
3 h · 2

Lionel Magul Meu caro Ericinio de Salema, em outras
palavras deveria-se esperar pela Sentenca e ai chamar-se a
Imprensa para a respectiva publicacao e consequente
conhecimento de todos nos.
1h

Pedro Miguel O que faz a PGR como fiscal da
legalidade?
https://ambicanos.blogspot.com/2015/02/prm-e-garantia-constitucional-da.html

https://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/9721/1/O%20Princ%C3%ADpio%20da
%20Presun%C3%A7%C3%A3o%20de%20Inoc%C3%AAncia%20em%20sede%20de%20Media
%C3%A7%C3%A3o%20Penal.pdf

UNIVERSIDADE CATÓLICA PORTUGUESA CENTRO REGIONAL DO PORTO DISSERTAÇÃO DE


MESTRADO PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE EM CIÊNCIAS JURIDICO - PENAIS
A Importância do Princípio da Presunção de Inocência no Processo Penal Português Cumpre
agora analisar a relevância da presunção de inocência no actual processo penal português. Foi
já referido que, tratando-se de um instrumento extremamente invasivo na liberdade e demais
direitos fundamentais do cidadão, o processo penal, enquanto processo público e oficial
movido pelo Estado14 contra determinado(s) cidadão(s), terá não só que estar pois
consagrado na C.R.P., como terá igualmente o C. P. P. de prever uma tramitação legal em
obediência estrita ao postulado na lei fundamental. Antes de mais, coloca-se a questão sobre
as principais finalidades do principio da presunção de inocência, em sede de processo penal,
no que respeita à sua relação com a actividade probatória e consequentemente, se se traduz
num verdadeiro meio de prova ou se é apenas um instrumento orientador e limitador da
actividade probatória em juízo. Neste contexto, não podemos deixar de referir uma possível
relação com o principio do “in dubio pro reo” (conforme já havíamos referido acima). Numa
breve referência ao princípio “in dubio pro reo”, refira-se que em qualquer situação de dúvida
razoável sobre a responsabilidade penal do arguido, o juiz deve sempre decidir-se pela sua
absolvição. Esta é, genericamente e em termos simplistas, a definição do principio em causa.
Segundo Castanheira Neves15 , o princípio do “in dubio pro reo” existe de forma a satisfazer
duas necessidades decorrentes da própria condução do processo penal: primeiro, o juiz deve
sempre emitir uma decisão sujeito idêntico a qualquer outro cidadão não sujeito a um
processo penal – poderá ter que ceder perante as exigências de prevenção geral positiva do
processo penal, mormente no que respeita à aplicação de medidas de coacção (prisão
preventiva, sendo a mais grave) de forma a que se garanta a completa eficácia e a justa
conclusão do processo penal movido contra o sujeito, o que por sua vez, poderá implicar uma
restrição à liberdade individual do arguido. Sobre este assunto, continua ALEXANDRA VILELA,
ob. cit., pág. 22, nota de rodapé nº 20 que o principio da presunção de inocência, enquanto
principio constitucional integrado no art. 32º nº 2 C.R.P., beneficia igualmente de outros
regimes outorgados pela C.R.P.. Mormente o respeitante ao tratamento a dar em situações de
estado de sitio ou estado de emergência (art. 19º C.R.P.), a existência do direito de resistência,
em caso de ofensa grave a tal direito e não ser possível o recurso, em tempo útil, a qualquer
força policial (art. 20º nº 2 C.R.P.), e ainda do facto da competência para a sua regulamentação
legal estar sobre a alçada da Assembleia da República, fazendo pois parte do elenco taxativo
de poderes que compõem a chamada reserva relativa de competência legislativa da
Assembleia da República, podendo apenas o governo legislar sobre tais temas mediante lei de
autorização parlamentar, nos termos dos arts. 164º, 165º nº1 b) e 168 da C.R.P.. 14 Em
Portugal, a entidade responsável pelo impulsionamento de qualquer processo penal contra
algum cidadão é o M. P.. Se em relação aos chamados crimes públicos, compete ao M. P. a
abertura do inquérito (1º fase do processo penal) e é de sua responsabilidade e obrigação
“perseguir” o acusado mesmo sem ou contra a vontade e assistência do ofendido, já nos
crimes semi – públicos e particulares a lei penal exige, para que o processo penal se inicie, a
apresentação de queixa – crime por parte do ofendido (art. 49º C. P. P.) e ainda, nos que
respeita à segunda categoria de crimes, que o ofendido deduza ainda acusação particular (art.
50º C. P. P.), dedução essa que será feita finda a fase de inquérito, nos termos do art. 285º nº 1
C. P. P.. Daí que, nos termos do art. 51º nº 1 C. P. P., a intervenção do MP cessa assim que haja
a homologação da desistência de queixa por parte do ofendido ou que, por outro lado, não
seja deduzida acusação particular, uma vez finda a fase de inquérito, nos termos do referido
art. 285º C. P. P.. 15 vide CASTANHEIRA NEVES, Sumários de Processo Penal, Coimbra, 1968,
pág. 52. 11 final, ou seja de se pronunciar em sentença absolutória ou condenatória e com
isso, pôr fim ao processo criminal e apurar a responsabilidade do arguido16. Em segundo,
serve o postulado processual de que é inadmissível “uma condenação penal em que não se
tenha “convencido” o réu da sua efectiva responsabilidade e culpabilidade” 17 . Daqui,
inevitavelmente, teremos que relacionar o princípio do “in dubio pro reo” com o ónus de
prova exigido às partes no sentido de obter uma condenação ou uma absolvição. Em boa
verdade e se entendermos o principio do “in dubio pro reo” como um corolário mais vasto do
Princípio da Presunção de Inocência, então a conclusão imediata é que a parte coberta pela
presunção de inocência fica imediatamente exonerada de qualquer ónus probatório, ficando
por isso vinculada a contra - parte em provar, para alem de qualquer dúvida razoável, a
culpabilidade do sujeito trazido a juízo, sob pena de obter contra si (o acusador) uma sentença
absolutória. Não podemos deixar de evidenciar que este tema é amplamente discutido na
doutrina nacional e estrangeira e a relação entre o princípio da presunção de inocência e o
princípio “in dubio pro reo” não é pacificamente aceite e concebida em moldes de
unanimidade doutrinária. Rui Patrício, por um lado, defende que o princípio “in dubio pro reo”
é um corolário mais vasto do princípio da presunção de inocência, considerando-o como “um
verdadeiro reverso processual do princípio penal da culpa.”18 Segundo este autor, não há uma
relação directa que elucida quem deve provar o quê (à semelhança do que acontece em
processo civil, segundo as regras de distribuição do ónus probatório, em relação à parte que
reclama a protecção de um determinado direito que diz ter sido violado) mas tão somente se
traduz, o principio do “in dubio pro reo”, numa espécie de “comando” sobre a forma de
valoração da prova, a respeitar pelo julgador, e em que sentido deverá ele decidir numa
situação em concreto. Trata-se pois de uma solução normativa que actua sobre a matéria de
facto (a dúvida que impende sobre os factos) e não em relação 16 Neste mesmo sentido, o art.
8º nº1 do C. C. : “ O tribunal não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da
lei ou alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio. A dentro da mesma orientação,
refira-se RUI PATRÍCIO, ob. cit., pág. 30 e nota de rodapé nº 54:” …esta obrigatoriedade de
decisão é imposta pela finalidade processual de restauração da paz jurídica, paz comunitária e
segurança jurídica do arguido. Por outro lado e ainda dentro desta premissa, CAVALEIRO DE
FERREIRA, Curso de Processo Penal, Lisboa 1956, pág. 311: “deve aceitar-se o risco de
absolvição do culpado e nunca o da condenação de um inocente.” 17 Sobre a importância do
princípio do “in dubio pro reo”, refira-se as palavras de Figueiredo Dias e Germano Marques da
Silva, em relação ao descrédito que este princípio assume em relação à situação social actual e
ao constante aumento da criminalidade. Para estes dois ilustres criminalistas, as vozes que se
levantam contra uma exagerada importância deste princípio revela “uma atitude de espírito
inadmissível perante uma ordem jurídica inspirada num critério superior de liberdade, assente
no valor moral da pessoa humana. A condenação penal, a pena criminal, é castigo destinado a
resgatar a culpa do delinquente pelo que é de todo inaceitável a condenação sem a certeza
moral da sua culpabilidade a redimir; é inaceitável que, numa sociedade em que o valor
primeiro é a pessoa humana, a condenação penal não tenha por fundamento a certeza da
culpa do condenado e possa servir como simples instrumento de intimidação”, vide GERMANO
MARQUES DA SILVA, ob. cit., pág. 83 e, no mesmo sentido, FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., pág.
123, nota de rodapé nº 2. Sábias palavras que, em relação às quais, concordamos plenamente.
18 vide RUI PATRÍCIO, ob. cit., págs. 31 e ss. 12 à dúvida que impende sobre o sentido da
norma criminal. Rui Patrício entende assim que o princípio do “in dubio pro reo”, enquanto
corolário mais vasto da presunção de inocência, assume dois objectivos essenciais: a
obrigatoriedade da emanação de uma decisão judicial e por outro lado, numa qualquer
situação de dúvida face ao sentido da prova produzida, há um dever de decidir em prol da
absolvição do acusado. 19 Como tal e em consequência do que ficou explicito, Rui Patrício
refere-se ao principio do “in dubio pro reo” como um expediente que funciona nas situações
em que fracassa ou se mostra insuficiente a prova realizada no sentido de ilidir a presunção de
inocência de que goza sempre e ainda o acusado, devendo por isso este ser absolvido quando
a prova realizada não é suficiente para formar uma convicção segura de culpabilidade, na
mente do julgador. Nesta perspectiva, e partindo-se da ideia geral de que cabe ao arguido
provar a sua inocência, os dois princípios são corolários mais vastos do principio da presunção
de inocência.20 Em sentido oposto, evidenciamos Alexandra Vilela, distinguindo
categoricamente o princípio da presunção de inocência do princípio “in dubio pro reo”,
fazendo valer os ensinamentos de Castanheira Neves21 e Souto Moura, contrariando 19
Opinião partilhada também por CASTANHEIRA NEVES, ob. cit., pág. 52, conforme foi até já
referido na devida oportunidade. 20 vide GERMANO MARQUES DA SILVA, ob. cit., pág. 84 – no
mesmo sentido e seguindo uma linha de pensamento semelhante a R. Patrício, também este
ilustre penalista se parece referir ao principio do “in dubio pro reo” como o ponto central do
processo criminal, já que a dúvida sobre a responsabilidade criminal “é a razão de ser do
processo”. Germano Marques da Silva parece pois relacionar o princípio da presunção de
inocência e o princípio “in dubio pro reo” em razão dos limites do conhecimento e da
racionalidade humanas, o que provoca uma manutenção, ao longo de todo o processo crime,
da dúvida inicial que não foi dissipada apesar de todo o esforço probatório da acusação o que,
em consequência disso, “imporá a absolvição do arguido já que a condenação significaria a
consagração de um ónus de prova a seu cargo, baseado na prévia admissão da sua
responsabilidade, ou seja, o princípio contrário ao da presunção de inocência” – em conclusão,
o autor parece estabelecer, à semelhança de outros (como veremos), uma relação de causa –
efeito entre os dois princípios. 21 vide CASTANHEIRA NEVES, ob. cit., págs. 53 e ss. – C. Neves é
paradigmático ao afirmar que “não é aceitável a afirmação de que o principio “in dubio pro
reo” só pode entender-se na base de uma presunção de inocência que, como exigência político
– jurídica, se impusesse ao processo criminal.” Desta forma, o autor distingue claramente o
principio “in dubio pro reo” de uma mera presunção de inocência, dizendo mesmo que o
funcionamento do “in dubio pro reo” não se limita a um jogo de presunção e contra – provas,
mas apenas o de provar efectivamente e peremptoriamente, a infracção criminal. E desta
forma, acaba mesmo por ir contra alguns autores já aqui analisados, separando igualmente o
“in dubio pro reo” de um simples ónus de prova, não sendo o princípio referido um correlato
da existência de uma regra de ónus de prova mas é antes efectivamente, um principio
processual da exclusão desse ónus probatório. Isto porque de facto, não impende sobre o M.
P. um verdadeiro ónus de prova (o M.P. nunca pode ser entendido como parte
verdadeiramente interessada na condenação de um arguido já que, na condição de
representante do Estado na administração da justiça, o MP tem tanto interesse em condenar
um acusado como, por outro lado, em ilibar um inocente – sobre o estatuto de objectividade
do MP, ver o art. 221º da C.R.P. e o art. nº 2 da lei 23/92 de 20 de Agosto) dos factos
constitutivos, nem tão pouco impende sobre o acusado um ónus probatório dos factos
extintivos ou modificativos (neste ponto, C. Neves adopta a posição de Figueiredo Dias e da
restante doutrina portuguesa de que o principio “in dubio pro reo” aproveita igualmente os
factos modificativos ou extintivos do crime). Daí que se conclui por isso que C. Neves nega
categoricamente qualquer relação entre o principio “in dubio pro reo” e o principio da
presunção de inocência, afirmando que o “in dubio pro reo” é um principio probatório,
desprovido de qualquer natureza politico – criminal e cujo campo de actuação é o da exigência
absoluta da prova efectiva da pratica do crime, rejeitando-se por isso qualquer condenação do
arguido com base em infracções não provadas – esta é, para C. Neves, a verdadeira essência
do principio “in dubio pro reo”. Segundo o próprio autor: “o principio não traduz um “favor
rei” (expediente que se manifesta por exemplo, na presunção de inocência) mas uma exigência
probatória.” 13 assim as posições de Rui Patrício e Cavaleiro de Ferreira22 . Para Alexandra
Vilela, a constitucionalização do princípio da presunção de inocência não se traduz numa
duplicação do princípio de que, em caso de dúvida, se decide a favor do arguido.23 Continua a
autora dizendo que embora o princípio da presunção de inocência e o princípio “in dubio pro
reo” se encontrem no mesmo campo de actuação, ou seja, ambos se relacionam com a
questão da prova no que respeita à sua produção e distribuição processual, são contudo dois
princípios que se manifestam em alturas ou momentos processuais distintos e de certa forma,
opostos. Concretizando melhor o que foi dito, refira-se: o princípio “in dubio pro reo”
relaciona-se com a distribuição do ónus da prova que, em face de uma deficiente ou
insuficiente actividade probatória por parte do sujeito processual obrigado a tal, redunda
inevitavelmente numa absolvição do arguido. Tal é assim por força do principio da presunção
de inocência que exonera o arguido de qualquer esforço em provar a sua inocência, devendo o
julgador presumi-la (e demais actores processuais) até que se produza prova em contrário
suficientemente forte e inequívoca para uma sentença condenatória justa. Ao expor a questão
de uma perspectiva em que, eventualmente possam ambos os princípios intervir “sobre o
mesmo campo, neste caso, o da prova”24, a autora parece relacioná-los numa estrita relação
de causa – efeito (à semelhança do que faz, por exemplo, Germano Marques da Silva,
conforme vimos atrás – cfr. nota de rodapé nº 23). Contudo, a verdadeira orientação da autora
parece ir no sentido completamente oposto, advogando que o princípio da presunção de
inocência e o princípio “in dubio pro reo” não só se manifestam de maneira diferente como
também actuam e intervêm em momentos processuais diferentes. Desde logo, o princípio da
presunção de inocência está presente 22 vide CAVALEIRO DE FERREIRA, ob. cit., págs. 316 e ss.
– Este autor acaba por se referir á repartição do ónus da prova em sede de processo criminal.
Em processo penal, como é certo e sabido, não há uma repartição do ónus nos mesmos
termos do processo civil (art. 520º do Cód. Processo Civil) mas sim a existência de um ónus
probatório para a entidade acusadora, já que o acusado se encontra protegido por uma
presunção de inocência ao longo de todo o processo criminal. O ilustre jurista continua
dizendo ainda que o principio do “in dubio pro reo” abrange não só os factos constitutivos do
crime mas também poderá abranger os factos extintivos e / ou modificativos, estes últimos
terão que ser alegados e provados pelo acusado, se pretender beneficiar deles mas, contudo,
pelo simples facto de a decisão sobre os factos extintivos e modificativos redundar apenas
numa decisão sobre a matéria de facto e não de uma verdadeira interpretação de uma
qualquer norma legal, é motivo suficiente para, na opinião do autor, se alargar o âmbito do
principio “in dubio pro reo” para alem da prova dos factos meramente constitutivos do crime –
no mesmo sentido, também FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., págs. 125 e 126. Cavaleiro de Ferreira
acaba, em consequência do que foi dito, por fazer equivaler o princípio “in dubio pro reo” e o
principio da presunção de inocência ao considerar a presunção de inocência como verdadeira
presunção jurídica, de natureza legal e relativa (ou seja, iuris tantum), defendo por certo uma
equiparação entre o facto presumido e o facto indiciante, dando assim uma solução efectiva
ao problema da falta de prova ou prova insuficiente do facto presumido. O autor diz então que
uma qualquer presunção legal relativa (como o é a presunção de inocência) tem natureza
eminentemente processual e actua perante a incerteza de um facto incerto ou facto probando.
Daí ser taxativo e enigmático na seguinte expressão: “uma presunção de inocência é o próprio
princípio “in dubio pro reo”. 23 Na mesma linha de raciocínio, vide JOSÉ LUÍS VAZQUEZ
SOTELO, Presuncion de inocencia del imputado e intima conviccion del tribunal: estúdio sobre
la utilizacion del imputado…, Editorial Bosch, 1984, pág. 292. 24 vide ALEXANDRA VILELA, ob.
cit., pág. 78. 14 ao longo de todo o processo, desde o início do inquérito criminal até ao
trânsito em julgado da sentença. Já o principio “in dubio pro reo” apenas se manifesta no
momento em que o julgador tem que emitir uma decisão final sobre determinada factualidade
– absolutória ou condenatória – seja na forma de sentença em fase de julgamento, seja na
forma de despacho de acusação ou de pronúncia, nas fases de inquérito e instrução
respectivamente.25 Alexandra Vilela conclui por isso dizendo, que o princípio da presunção de
inocência se traduz, em ultima instância, num verdadeiro direito subjectivo26 “a serem
considerados inocentes enquanto não se produza prova bastante acerca da sua
culpabilidade”27. Já por seu lado, continua a autora, o principio do “in dubio pro reo” é um
mero comando, uma norma de interpretação dirigida ao juiz ou outra entidade julgadora,
impondo uma determinada orientação a seguir nos casos em que se tenha que decidir perante
a dúvida razoável e que sentido a dar a essa mesma decisão. Em nossa modesta opinião, penso
que a querela acima problematizada se traduz tão só num problema de lógica e de interligação
dos conceitos. Se é verdade, tal como refere Alexandra Vilela, que o principio da presunção de
inocência e o principio do “in dubio pro reo” se manifestam em momentos processuais
diferentes e possuem igualmente campos de actuação diferentes, não é menos verdade
contudo, que ambos se 25 Desta forma, Alexandra Vilela discorda por isso da posição do autor
espanhol - vide JOSÉ LUÍS VAZQUEZ SOTELO, ob cit., pág. 291 - em que este afirma que ambos
os princípios se manifestam no mesmo momento processual, ou seja, “na hora” do julgador se
pronunciar por uma decisão final. Contudo o penalista espanhol não deixa de referir que
apesar de existirem grandes semelhanças entre o princípio “in dubio pro reo” e o princípio da
presunção de inocência, há contudo algumas diferenças assinaláveis. Como tal, dá como
exemplo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça Espanhol de 31 de Janeiro de 1983, sendo
este o principal marco de jurisprudência espanhola que melhor define a separação entre o
principio constitucionalmente consagrado da presunção de inocência e o principio “in dubio
pro reo”, apesar da existência bem documentada de acórdãos na jurisprudência espanhola que
atestam o principio da presunção de inocência e o principio “in dubio pro reo” como princípios
gerais e fundamentais do direito espanhol, sem contudo se constituírem plenamente como
preceitos substantivos (exemplos dados pelo autor são o acórdão do Supremo Tribunal de 4 de
Abril de 1884 e, mais recentemente, o acórdão de 20 de Outubro de 1959). Ainda assim, o
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça Espanhol de 31 de Janeiro de 1983 foi, efectivamente,
o primeiro a fixar claramente as características e o campo de actuação de cada um dos
princípios em causa, fundamentando a sua correcta separação: enquanto que o principio da
presunção de inocência se manifesta num direito a favor dos cidadãos em serem presumidos
inocentes enquanto não se fizer prova bastante para que tal presunção seja ilidida, já o
principio “in dubio pro reo” se traduz maioritariamente numa norma de interpretação dirigida
especialmente ao julgador, instruindo-o a absolver o acusado, por uma questão de
humanidade e sentido de justiça, nas situações em que não fique completamente convencido
da sua culpabilidade, ainda que se tenha realizado uma actividade probatória “normal”. Assim
e conclui o douto acórdão, o principio da presunção de inocência liga-se fundamentalmente à
suficiência da actividade probatória, ou seja, às situações de existência (ou de não existência)
de prova suficiente para desvirtuar a referida presunção. Já o principio “in dubio pro reo” se
relaciona maioritariamente com um problema subjectivo de valoração da prova realizada, ou
seja, prende-se fundamentalmente com a apreciação subjectiva do julgador das provas
trazidas a juízo e qual a força jurídica necessária para o convencer, completa e
inequivocamente, da responsabilidade criminal efectiva do arguido. 26 vide FIGUEIREDO DIAS,
ob. cit., pág. 122 – O ilustre penalista considera igualmente que o principio da presunção de
inocência é um verdadeiro direito subjectivo público, que se manifesta em dois sentidos: no
direito em receber um tratamento justo e adequado, semelhante ao tratamento dado a
qualquer pessoa inocente e, por outro lado, ao direito em não ser condenando em face de
uma produção insuficiente de prova. No mesmo sentido, vide GERMANO MARQUES DA SILVA,
ob. cit., pág. 82 – “todo o acusado tenha o direito de exigir prova da sua culpabilidade no seu
caso particular, a estreita legalidade, subsidiariedade e excepcionalidade da prisão preventiva,
a comunicação ao acusado, em tempo útil, de todas as provas contra ele…” 27 ALEXANDRA
VILELA, ob. cit., pág. 80. 15 inter – relacionam numa relação de quase causa – efeito. Sem nos
querermos cingir a apenas uma das posições acima demonstradas, somos por uma solução, de
certa forma, híbrida, influenciada por ambas as doutrinas em disputa. Cremos que,
efectivamente, a distinção ou aproximação de ambos os princípios só se justifica mediante as
circunstâncias concretas do caso em questão e especialmente, do sujeito ou sujeitos que vão
beneficiar das vantagens processuais da aplicação desses princípios, individual ou
cumulativamente. De facto, é nossa opinião que todo aquele que beneficia de uma presunção
de inocência irá igualmente beneficiar, ainda que indirecta ou reflexivamente de um “in dubio
pro reo” já que a falta de prova suficiente para formar uma certeza inabalável na
responsabilização criminal do arguido leva, necessariamente e por um principio de justiça
penal constitucional, à absolvição do mesmo já que a dúvida favorece a inocência (presumida)
do arguido. Pode parecer um simples jogo de semântica ou um mero exercício de retórica mas
a verdade é que se ambos os princípios se manifestam em matéria de prova28 e, por uma
questão de lógica processual, se “reencontram” aquando da decisão final do julgador, que está
instruído para decidir “pro reo” em caso de dúvida razoável, respeitando assim uma inocência
presumida do arguido que nunca, ao longo de todo o processo, se esvaeceu. Assim e em jeito
de conclusão, apesar de notáveis e bem documentadas as diferenças de intervenção e de
oportunidade processual entre os princípios em causa, parece-nos contudo visível uma relação
de causa – efeito essencial entre o “in dubio pro reo” e a presunção de inocência do arguido na
medida em que, em última instância, o funcionamento de um é pressuposto ideológico do
outro. Não queremos ser tão radicais como se mostram alguns autores acima mencionados ao
considerar que o principio do “in dubio pro reo” é um correlato processual mais alargado do
principio da presunção da inocência ou que, consequentemente, o principio da presunção de
inocência se esgota no principio do “in dubio pro reo”29 já que, em nossa opinião, o principio
da presunção de inocência é dotado de um espectro de protecção mais alargado e mais
diversificado do que o principio do “in dubio pro reo”: enquanto que este parece apenas
proteger a figura do arguido, enquanto sujeito processual e interveniente activo em
determinado processo criminal, já o princípio da presunção de inocência, dada a sua natureza
de princípio constitucional (ou mesmo de direito subjectivo fundamental), parece ser
disponível à 28 O principio da presunção de inocência manifesta-se ao nível do tratamento a
dar ao arguido, durante a produção de prova em processo penal e enquanto esta se mostrar
incipiente a ilidir a inocência do mesmo enquanto que, por seu lado, o principio do “in dubio
pro reo” constitui numa instrução para o julgador, sobre a orientação da sua decisão, caso haja
qualquer dúvida fundada no seu juízo de apreciação da causa. 29 vide, por todos, CAVALEIRO
DE FERREIRA, ob. cit., págs. 316 e ss. 16 generalidade dos cidadãos, independentemente de
estarem envolvidos ou não num qualquer processo – crime. Esta linha de pensamento leva-nos
a assumir uma posição intermédia (ou híbrida, se se preferir) nesta temática pois e conforme
referimos, se há uma ligação sistemática e lógico – conceptual entre os princípios em causa
decorrente do exercício da prova e da forma como esse exercício afecta e influi o resultado
final de um qualquer processo – crime, há por outro lado, a questão de que limitarmos o
espectro da presunção de inocência à mera actuação do principio do “in dubio pro reo”, leva a
uma espécie de duplicação de princípios constitucionais30 o que redundaria, em ultima
instância, num desprovimento de qualquer sentido e alcance lógicos bem como numa
anulação recíproca entre os dois, criando um vazio politico – constitucional que seria, de todo
em todo, inadmissível. Por outro lado, o principio da presunção de inocência é um principio ou
direito fundamental que limita o “ius puniendi” do Estado enquanto que o principio do “in
dubio pro reo”, ainda que entendido dentro da mesma lógica, se aproxima a uma “regra” de
actuação processual, que instrui a parte processual respectiva – o julgador - a decidir de
determinada forma, tendo em conta uma determinada factualidade e circunstâncias. Por isso é
que da nossa parte, advogamos uma solução híbrida, que recolhe o “melhor dos dois
mundos”, sendo que para nós, o fundamental é agilizar e harmonizar ambos os princípios, de
acordo com a situação presente, por uma questão de justiça e de economia processual. Para
concluir esta breve análise do princípio da presunção de inocência, refira-se ainda uma querela
que tem motivado alguns debates não só entre a doutrina nacional mas tem também
merecido alguma consideração por parte da doutrina estrangeira: será a presunção de
inocência uma verdadeira presunção em sentido técnico, ou deverá ser antes incluída em
categoria jurídica diferente? Sem querermos entrar num campo demasiado pormenorizado
acerca das presunções jurídicas e das suas várias categorias31, passemos só em revista o que
refere a doutrina maioritária sobre este assunto. Rui Patrício, por um lado, rejeita
completamente a ideia de que a presunção de inocência é uma verdadeira presunção jurídica,
considerando antes estarmos perante um verdadeiro direito subjectivo do arguido que,
segundo o autor, se manifesta de duas formas: a presunção de inocência constitui um direito
absoluto do arguido em ser tratado como um cidadão completamente inocente (pelo menos,
até que tal presunção 30 vide ALEXANDRA VILELA, ob. cit., pág. 76 e por JOSÉ VAZQUEZ
SOTELO, ob. cit., pág. 292. 31 Para uma visão aprofundada sobre tal temática, vide BATISTA
MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina 2004, págs. 111 e ss., e
ainda CAVALEIRO DE FERREIRA, ob. cit., págs. 313 e ss. 17 seja ilidida por prova concreta da
sua culpabilidade efectiva). Por outro lado, o direito à presunção de inocência garante ao
arguido que a aplicação das medidas de carácter cautelar e de garantia patrimonial
obedecerão a padrões de estrita proporcionalidade e de adequação, forma a não atentar
gravemente contra os seus direitos e liberdades fundamentais, servindo apenas a necessidade
processual de descoberta da verdade material. Consequentemente e em virtude de tal
protecção, o arguido jamais poderá usado como meio de prova contra a sua vontade nem tão
pouco ser forçado a cooperar com o tribunal ou a confessar os factos de que está acusado,
sendo meramente instituído como um “livre contraditor ao acusador, dotado de armas iguais
às dele”32 33 . Por seu lado, José Vázquez Sotelo, também se debruçou sobre a qualificação do
principio da presunção de inocência, partindo do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Espanhol de 25 de Julho de 1981, que configura expressamente a presunção de inocência
como verdadeira presunção legal “iuris tantum”, qualificação essa que causa alguma confusão
dogmática, no que respeita à integração e interpretação da expressão “presunção” nos vários
textos constitucionais e nos tratados internacionais que prevêem o principio da presunção de
inocência. Sotelo refere-se primeiramente à posição de outro autor italiano, Bettiol,
considerando-a errada já que o autor considera apenas a figura do acusado, que é
concretamente alvo de um processo – crime, como o único destinatário ou beneficiário da
presunção de inocência. Por seu lado, Sotelo considera que a presunção de inocência abrange
toda uma comunidade de cidadãos já que, ao contrário do que diz Bettiol, é na extensa
comunidade dos cidadãos que se pode presumir com segurança, a efectiva inocência da
maioria já que, os sujeitos processados e efectivamente condenados, constituem uma ínfima e
pouco significativa parte dessa comunidade - é dentro desta perspectiva que deve ser pois
fundamentada a existência de uma presunção de inocência, sendo até no seguimento deste
raciocínio que se justifica a previsão de uma presunção de inocência ao sujeito processado
criminalmente pelo legislador constitucional34. Daí que o argumento de Bettiol é
categoricamente recusado por Sotelo, uma vez que o autor italiano tende a limitar em demasia
o espectro 32 vide RUI PATRÍCIO, ob. cit., pág. 38. 33 No mesmo sentido, parecem ir autores
como FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., pág. 122 e GERMANO MARQUES DA SILVA, ob. cit., pág. 82 e
ss. O primeiro quando diz expressamente que “o direito a ser presumido inocente é um direito
subjectivo público”, concedendo uma dupla missão a tal direito: o direito, por parte do
acusado, em receber um tratamento condigno e fiel à sua condição de presumível inocente até
prova em contrário e, por outro lado, o direito a ser condenado após uma exaustiva produção
de matéria probatória que seja igualmente suficiente para uma culpabilização plena e para lá
de qualquer dúvida razoável na mente do julgador. Na mesma linha de pensamento, está
também Germano Marques da Silva que engloba uma série de direitos a favor do acusado,
dentro do mesmo direito à presunção de inocência: o direito do arguido a exigir prova da sua
culpabilidade, o direito a que lhe sejam aplicadas medidas de coacção (mormente a prisão
preventiva) dentro do estritamente necessário para fins de garantia processual e ainda o
direito a que lhe seja comunicado, em tempo útil, sobre todas as provas reunidas contra ele.
34 vide VÁZQUEZ SOTELO, ob. cit., pág. 270. 18 de abrangência da presunção de inocência
apenas, como ficou demonstrado, aos sujeitos acusados e portanto, alvos de um processo –
crime movido contra eles. Por outro lado, Vázquez Sotelo volta-se igualmente contra outro
penalista italiano, Manzini. Sotelo não concorda com a fundamentação dada por Manzini uma
vez que a presunção de inocência não é dogmaticamente fixada e construída através de um
juízo de normalidade da realidade quotidiana, juízo esse que confirma (ou refuta) a presunção
estabelecida. O principio da presunção de inocência não é de facto induzido por uma qualquer
regra de experiência ou vivência normal da realidade, mas tão só por um imperativo geral de
cidadania e justiça social, presumindo-se a inocência do acusado ao longo de todo o processo
criminal, enquanto não se conseguir comprovar, cabal e eficazmente, a sua culpabilidade. Daí
que na concepção de Vázquez Sotelo, sob este ponto de vista, a presunção de inocência
resume-se mais propriamente a um direito fundamental à inocência do que propriamente uma
presunção em sentido técnico – jurídico quando a prova produzida não se mostrou suficiente
para provar a culpabilidade do arguido, dando lugar a uma prova plena da sua inocência
efectiva, que era já presumida desde o início do processo. Considera pois o autor, que estamos
antes perante uma verdade interina35 ou provisória que, ao contrário das presunções, em que
estas partem de um facto conhecido e tido como existente para se aceitar a existência de um
outro facto relacionado, mediante um regra de experiencia, já a verdade interina ou provisória
dispensa absolutamente a existência de qualquer facto preliminar ou dado como existente
para se inferir a existência de um outro desconhecido bem como se dispensa igualmente,
qualquer processo lógico de apreensão da realidade construída para daí se deduzir o facto
presumido. Em face disto, Sotelo considera que estamos perante dois institutos jurídicos
absolutamente distintos um do outro já que a verdade interina dispensa o 35 Tese que
também recolhe algum acolhimento em Portugal. Vide, por exemplo, ALEXANDRA VILELA, ob.
cit., págs. 81 e ss - segundo a autora, o principio da presunção de inocência não cumpre os
requisitos legais da definição do artigo 349º C. C. e como tal não se coaduna com a conclusão
natural da maior parte dos processos crime que, na sua maioria, acabam em condenação
efectiva do acusado pelo que, desta feita, havendo maior previsibilidade de uma condenação
do que uma absolvição, seria então difícil sustentar uma presunção desta envergadura,
quando o facto conhecido ou a realidade conhecida contraria precisamente o facto que seria
daqui deduzido como verdadeiro (presumido). Por isso, autora também entende que a
presunção de inocência pode actuar como verdade interina se esta resultar da experiência
comum que a grande maioria dos arguidos são declarados inocentes, sendo tal pensamento de
aceitar se for igualmente pacífico que as verdades interinas, ao contrário das presunções
legais, dispensam qualquer facto preliminar cuja existência foi já comprovada para desta
forma, se aceitar outro facto relacionado como existente – tal relação causal é, para este caso,
secundária sendo irrelevante se a experiência normal de vida diz exactamente o oposto.
Porém e em aparente contradição ao exposto, a autora também não deixa de referir que não
se deve entender o principio da presunção de inocência como uma verdade interina em
sentido estrito porque, conforme é sabido, a inocência do arguido só é presumida em absoluto
mas até ao momento em que se produza prova suficiente em contrário, deixando por isso de
ser “uma verdade” em determinado sentido, assumindo uma outra realidade oposta. Daí que
para a autora, a melhor classificação é mesmo a que foi já conferida por lei: trata-se de um
principio fundamental e constitucionalmente consagrado, de protecção e garantia dos direitos
do acusado. 19 sujeito favorecido (ou seja, aquele que vai beneficiar da admissão de uma
verdade construída ou, se se quiser, “simulada”) da produção de qualquer prova em contrário,
já que a sua posição se encontra blindada e segura pela convicção do julgador de que não se
irá contrariar, à partida, esse “status quo”. Por seu turno e fazendo juízo a uma nova corrente
doutrinal em ascensão em relação a esta temática e que da qual parece ser Sotelo apologista,
podemos considerar que as presunções legais (pelo menos, as de natureza “iuris tantum”) não
exoneram completamente a parte favorecida de um esforço probatório mas tão pouco supõe,
unicamente, uma espécie de “aligeiramento ou facilitação de prova”36 37, sem contudo
afectar ou modificar as regras de distribuição do ónus de prova. Pelo contrário e no entender
do autor, a norma que estabelece uma verdade interina, funcionará plenamente como uma
regra geral de prova. Sotelo conclui por isso que o principio da presunção de inocência não é
verdadeira presunção mas tão somente uma verdade interina ou provisória de garantia de
qualquer cidadão, até que seja produzida contra ele prova concreta e suficiente da sua
culpabilidade. Se nos dedicarmos a opinar sobre qual a melhor categoria jurídica a atribuir ao
princípio da presunção de inocência, diríamos sem grande hesitação que concordamos
plenamente com Rui Patrício e com Figueiredo Dias (entre outros) ao considerarem o principio
de presunção de inocência como um verdadeiro direito subjectivo público, aplicável à
generalidade dos cidadãos de uma dada comunidade38, sendo até aparentemente a
orientação seguida pelo legislador constitucional no referido artigo 32º nº 2 da C.R.P. Com
efeito, e segundo a grande maioria da doutrina nacional e estrangeira (atingindo-se quase uma
unanimidade total), não parece ser correcto considerar o princípio da presunção de inocência
como uma verdadeira presunção legal (ou judicial) em sentido técnico – jurídico e conforme o
artigo 349º C. C., uma vez que falha, quanto a nós, o grande requisito central para estarmos
perante uma verdadeira presunção: as ilações que se retiram de um facto conhecido para se
ter como verdadeiro um outro facto desconhecido. Parece-nos, em nossa opinião, que o facto
conhecido que servirá de base à formação de uma presunção de inocência deverá estar
dotado de uma 36 vide VÁZQUEZ SOTELO, ob. cit., pág. 276. 37 Não parece ser contudo, uma
doutrina que vá vigorar entre nós a avaliar pelo menos, pela orientação generalizada da nossa
lei e especialmente, da nossa doutrina mais proeminente. Veja – se por exemplo, o que o diz o
já referido artigo 350º nº 1 do C. C. que diz que “quem tem a seu favor uma presunção legal
escusa de provar o facto a que ela conduz.” Por outro lado e numa visão mais doutrinal, veja-
se por exemplo os ensinamentos de FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., pág. 126 e CASTANHEIRA
NEVES, ob. cit., págs. 55 e ss. – não só concluem categoricamente por uma total exoneração de
prova em favor do acusado em relação aos elementos constitutivos do crime, como
consideram igualmente que o principio da presunção de inocência pode e deve funcionar
também em relação aos elementos extintivos, modificativos ou justificadores do crime
ocorrido. 38 vide FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., pág. 122 – “O princípio da presunção de inocência
(…) integra uma norma directamente vinculativa e constitui um dos direitos fundamentais dos
cidadãos…” 20 certa regularidade ou até, de uma certa imutabilidade e perpetuação no tempo
na medida em que se encara o facto conhecido como absolutamente verdadeiro e sempre
com a mesma natureza. Como tal e admitindo que a presunção de inocência seja aplicada à
generalidade dos cidadãos e que mesmo que essa generalidade seja maioritariamente
inocente, não nos parece correcto aceitar esse facto como conhecido para daí se presumir ou
deduzir um outro facto – a presunção – que demonstre a inocência como “imutável e
perpétua”. Daí que seja mais correcto, em nossa opinião, referirmo-nos ao princípio como um
verdadeiro direito à presunção de inocência (ou até apenas de um direito à inocência em
processo penal) e não como uma presunção técnico – jurídica. Uma última palavra para
considerar como igualmente aceitável a posição de Vázquez Sotelo quando este considera a
presunção de inocência como uma verdade interina ou provisória: apesar de se tratar de um
instituto que está sempre à mercê da orientação concedida pela prova produzida, parece-nos
que a sua construção caracteriza exactamente o funcionamento da presunção de inocência no
processo penal ou seja, entende-se como verdade provisória a inocência do arguido até que
seja produzida prova bastante e suficiente e que demonstre que essa verdade provisória está
errada.39

Você também pode gostar