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QUI 136 – QUÍMICA ORGÂNICA EXPERIMENTAL I – 2021-2

EXPERIMENTO

4 PREPARAÇÃO DO ÁCIDO
ACETILSALICÍLICO
2021-2

1 Introdução
O ácido acetilsalicílico (AAS) tem propriedades analgésicas, antipiréticas e anti-inflamatórias.
Também conhecido pelo nome comercial de Aspirina, é um sólido branco que funde a 135 oC. É
pouco solúvel em água (3 g/L a 20 °C), mas muito solúvel em etanol e em éter dietílico.
Nesta aula será preparado AAS por reação entre ácido salicílico (AS) e anidrido acético.
Observe que, além do AAS também será obtido ácido acético:

Ácido salicílico Anidrido acético Ácido acetilsalicílico Ácido acético

Figura 1. Equação da reação de preparação do AAS

O AS também é um sólido branco pouco solúvel em água, solúvel em etanol e em éter


dietílico. Porém, pode ser facilmente distinguido do produto por seu ponto de fusão (158,6 oC).
O AS também tem propriedades analgésicas, antipiréticas e anti-inflamatórias. Entretanto,
apresenta efeitos colaterais mais pronunciados que o AAS, como irritação e sangramento no
estômago. Foi muito usado na forma de extrato natural da casca do salgueiro até ser substituído pelo
derivado acetilado AAS, mais seguro. Hoje o AS ainda encontra aplicações medicinais em produtos
para o tratamento de problemas de pele como a psoríase, acne, ictiose, caspa e dermatite seborreica.

1.1 Mecanismo da reação de preparação do ácido acetilsalicílico

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A Figura 1 mostra a equação da reação. Entretanto, no procedimento experimental é


adicionado também ácido sulfúrico, em pequena quantidade. Sua presença é importante para tornar a
ligação C=O do anidrido mais polar (protonando o oxigênio). Isto acelera a reação.
A Figura 2 ilustra de forma simplificada o mecanismo de reação. Veja que, no final do
processo, o ácido sulfúrico (H-A) é regenerado. Assim, pode-se dizer que é o catalisador dessa reação.

Figura 2. Mecanismo da acetilação do ácido salicílico, onde H-A representa o catalisador ácido
sulfúrico (H2SO4) e A- é sua base conjugada, o ânion hidrogenossulfato (HSO4-)

1.2. Cromatografia

A cromatografia é um método de separação, através da interação dos componentes da mistura


com duas fases em contato. Uma fase é estacionária (fixa). A outra fase é móvel e se constitui de um
fluido que percorre a fase estacionária. A separação depende principalmente das forças de atração de
cada componente pelos constituintes das fases estacionária e móvel. Neste experimento, faremos uma
cromatografia em camada delgada (CCD) para acompanhar a reação de síntese do ácido
acetilsalicílico a partir do ácido salicílico. Neste caso, a sílica gel será a fase estacionária. A fórmula
deste adsorvente é representada como SiO2, porém na superfície do cristal há grupos hidroxila (Figura
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5a). Na CCD a sílica está dispersa sobre uma placa que pode ser de vidro, alumínio ou plástico (Figura
5b). A amostra que se deseja analisar (neste caso, o meio reacional) é aplicada na placa com o auxílio
de um tubo capilar, como ilustra a Figura 5b. A placa é, então, colocada em uma cuba cromatográfica,
que é um frasco com tampa contendo a fase móvel (Figura 5c). Ao aplicar a amostra na placa, é
preciso garantir que o ponto de aplicação não fique muito baixo, pois este ponto deve ficar acima da
altura da fase móvel na cuba.

A fase móvel líquida é chamada de eluente e pode ser um solvente puro ou uma mistura de
solventes. O eluente sobe pela placa por capilaridade e arrasta consigo os componentes da mistura
que foi aplicada na placa, separando-os.

Por que os componentes da mistura se separam? As substâncias orgânicas da mistura irão se


adsorver (aderir) nas partículas do sólido (a sílica). Dependendo do tipo de estrutura e dos grupos
funcionais presentes em cada substância que compõe a amostra, forças intermoleculares de
intensidades diferentes estarão envolvidas no processo de adsorção: forças de van der Waals,
interações dipolo-dipolo, ligações de hidrogênio, etc. Quanto mais polar o composto, maior a sua
interação com a sílica gel. Compostos com maior superfície de contato também terão interações de
van der Waals mais intensas com a sílica. Quanto mais forte a interação do componente com a sílica,
mais difícil será o arraste pelo eluente e menor distância esse componente percorrerá na placa.

(a) (b) (c)

Figura 3. Estrutura parcial da sílica gel (a), aplicação da amostra em placa de CCD (b) e eluição da
placa em uma cuba cromatográfica (c).

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Para que o experimento seja rápido e bons resultados sejam obtidos na CCD, é necessário que
a cuba fique saturada com vapores da fase móvel. Para isso, as paredes laterais internas da cuba podem
ser recobertas com papel filtro (Figura 5c). A placa de CCD é retirada da cuba um pouco antes da
frente do eluente alcançar a extremidade superior da placa e uma marca deve ser feita indicando até
que altura a fase móvel a percorreu.

Um exemplo de cromatograma é mostrado na Figura 4. Este desenho exemplifica a separação


de uma amostra que continha dois componentes. O componente 1 interagiu mais fortemente com a
fase estacionária, ficando mais retido que 2, com a passagem do eluente. Assim, 1 percorreu menor
distância na placa (22 mm). A substância 2 foi menos retida pela na fase estacionária, apresentando
maior afinidade pela fase móvel e percorrendo maior distância (50 mm). Para reportar esse resultado,
não adiantaria informar os valores dessas distâncias, pois se a placa tivesse outro tamanho, os valores
seriam diferentes. Assim, o correto é informar o fator de retenção (Rf), que não varia muito, desde
que se mantenham os tipos de fase móvel e estacionária (sem variar muito também a temperatura).

A Figura 6, mostra como se calculam os valores de Rf para os componentes 1 e 2: o Rf é a


razão entre a distância X percorrida por um dado componente da amostra (do ponto de aplicação até
o centro da mancha) e a distância Y percorrida pelo eluente (do ponto de aplicação até a linha final
de avanço do eluente). Assim, o valor de Rf será menor ou igual 1.

Figura 4. Esquema de um cromatograma e de cálculo de Rf.

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Como a maioria dos compostos orgânicos é incolor, deve-se realizar a revelação da placa
cromatográfica para localizar as manchas. Para isto podem ser usados reagentes químicos ou luz
ultravioleta (se os compostos absorverem nestes comprimentos de onda).

Para a placa ser revelada em câmara de luz UV, a fase estacionária deve conter substâncias
fluorescentes. A substância fluorescente absorverá luz na região do ultravioleta (λ = 254 nm) e emitirá
luz em outra região do espectro, no visível. Essa emissão tem uma coloração característica esverdeada
e brilhante. Assim, nos locais onde houver substâncias orgânicas, principalmente aquelas contendo
duplas ligações conjugadas ou sistemas aromáticos, não ocorrerá a emissão de luz, aparecendo como
manchas escuras. Depois dessa análise, a placa pode ainda ser avaliada por outros reveladores.

Outra forma de revelação não destrutiva é a introdução da placa em uma câmara contendo
cristais de iodo. O iodo é volátil e seu vapor logo enche a câmara. O vapor interage com os compostos
orgânicos insaturados da placa, resultando em manchas de coloração marrom. Normalmente a
interação com o iodo é reversível e a placa revelada deixada em repouso por algum tempo, após o
desaparecimento das manchas pode ser revelada por outros métodos químicos. Compostos saturados
não se revelam com este reagente e devem ser visualizados utilizando outros reagentes químicos
apropriados.

Métodos destrutivos de revelação consistem usualmente na oxidação dos compostos orgânicos


que estão sobre a superfície da placa, utilizando-se oxidantes fortes (por exemplo, permanganato de
potássio) e às vezes temperaturas elevadas. Esses reveladores são preparados na forma de solução
(mergulha-se a placa na solução ou espalha-se o reagente sobre a placa na forma de spray). As
substâncias orgânicas são oxidadas e reveladas na forma de pontos escuros.

Neste experimento será utilizada a revelação por luz UV e um revelador químico. Em aulas
práticas posteriores, utilizaremos novamente a CCD e teremos a oportunidade de visualizar as
manchas com outros reveladores.

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A Figura 5 exemplifica uma situação em que a CCD foi utilizada para acompanhar o resultado
de uma reação. O produto (amostra 2) foi comparado com o material de partida (amostra 1).

Figura 5. Comparação por CCD entre amostras do reagente (1) e do produto (2) de uma reação.

Vimos no experimento 2 que fatores de retenção (Rf) são calculados para cada mancha na
CCD dividindo-se a distância percorrida pela amostra (considerando o centro da mancha e o ponto
de aplicação) pela distância percorrida pelo eluente (a partir da linha dos pontos de aplicação até a
frente final de eluição). Observe na Figura 3 que, após a eluição da placa de CCD, foram observadas
três manchas. Se a mancha da esquerda (1) corresponde ao reagente, pode-se concluir que ocorreu
reação, pois após a eluição surgiu uma mancha com fator de retenção maior (Rf = 0,80) na linha
correspondente à amostra do produto (2). Também pode-se verificar que o produto (2) não está puro,
pois apresenta duas manchas no cromatograma. Como o fator de retenção dessa segunda mancha é
igual ao do material de partida (Rf = 0,54), pode-se supor que o contaminante seja parte do reagente
que não foi consumido. Para explicar esse resultado podem ser levantadas algumas hipóteses. Entre
elas podemos considerar:

• A reação pode ter sido interrompida antes de seu final e, portanto, parte do reagente ainda não
tinha sido consumida.
• O reagente em análise pode ter sido usado em excesso. Assim, ao final do processo,
naturalmente esse excesso permaneceria no sistema.
• A reação é reversível e chegou ao equilíbrio, não sendo possível o consumo total do reagente.

A maioria dos compostos orgânicos é incolor (como é o caso da aspirina e do ácido salicílico).
Assim, é preciso revelar a placa cromatográfica para localizar as manchas. Para isto podem ser usados
reagentes químicos ou luz ultravioleta. Para a placa ser revelada em câmara de luz UV (Figura 6a), a
fase estacionária deve conter substâncias fluorescentes. A substância fluorescente absorverá luz na
região do ultravioleta (= 254 nm) e emitirá luz em outra região do espectro (visível). Essa emissão

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tem uma coloração esverdeada brilhante (Figura 6b). Assim, nos locais onde houver substâncias
orgânicas, principalmente aquelas contendo duplas ligações conjugadas ou sistemas aromáticos
(absorvem luz UV), não ocorrerá a emissão de luz, aparecendo como manchas escuras (Figura 4b).
Como o AS e o AAS são compostos aromáticos, esse tipo de revelação será adequado.

Figura 6. (a) Um modelo de câmara de luz UV e (b) Placa de CCD revelada sob luz UV

Observe o exemplo de revelação mostrado na Figura 4b, onde foram aplicadas três amostras
A, B e C na placa de CCD. A luz UV revelou que A e C são substâncias diferentes, pois têm Rf
diferentes. Também fica claro que a amostra B é, provavelmente, uma mistura das substâncias A e C.

2. Roteiro experimental1

a. Em um erlenmeyer de 50 mL seco coloque 1,5 g de ácido salicílico e 3 mL de anidrido acético.


Agite para dissolver. Adicione 3 gotas de ácido sulfúrico concentrado. Acrescente uma barra
magnética e deixe sob agitação em banho-maria a aproximadamente 60oC até completa dissolução.
A partir desse ponto, deixe sob aquecimento e agitação por mais 15 minutos.

b. Verta a mistura para um béquer contendo cerca de 30 mL de água gelada e gelo picado. Agite com
bastão de vidro e deixe em repouso para a cristalização do AAS.

c. Adapte um papel filtro a um funil de Büchner e molhe com água destilada fria. Filtre a mistura sob
vácuo e lave os cristais com cerca de 300 mL de água destilada gelada. Teste com papel de tornassol
a acidez das últimas gotas da água de lavagem. Se ainda estiver ácido, lave com mais 100 mL de
água.

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Atenção: Este experimento requer o uso de óculos de segurança e deve ser realizado em capela de exaustão. O anidrido
acético libera vapores irritantes e é lacrimejante; reage com água liberando ácido acético. A vidraria a ser utilizada deve
estar bem seca. O ácido sulfúrico também é perigoso e corrosivo.
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d. Pese um vidro de relógio ou placa de Petri e anote. Transfira o sólido e deixe em estufa a 50oC até
massa constante.2 Determine o rendimento da reação.

e. Acrescente uma pequena amostra de ácido salicílico a um frasco pequeno e dissolva com gotas de
etanol. Faça o mesmo com uma amostra do produto da síntese e com um padrão de AAS comercial.
Aplique as três amostras em uma placa de sílica-gel para CCD. Marque com lápis uma linha na
extremidade oposta, para indicar o ponto máximo de percurso do eluente na placa (Figura 7).

Figura 7. Esquema para a realização da CCD.

f. Prepare a mistura eluente (hexano e éter dietílico 2:1 v/v) e coloque-a em uma cuba cromatográfica.3
Acrescente um retângulo de papel filtro à cuba, conforme ilustrado na Figura 5, e umedeça-o com o
eluente. Acrescente a placa de CCD e tampe imediatamente. Observe até que o eluente atinja a marca
desejada. Remova a placa e deixe o solvente evaporar por cerca de 1 minuto na capela de exaustão.

g. Observe a placa em câmara de luz ultravioleta. Marque as manchas observadas. Desenhe o


cromatograma e calcule os fatores de retenção do AS e do AAS. Analise os resultados.

2
Após cerca de 10 minutos na estufa, retire e pese, levando de volta à estufa em seguida. Repita esse procedimento até
que não haja mais diminuição no valor da massa.
3
Atenção: A altura de líquido na cuba não deve alcançar o ponto de aplicação das amostras na placa
de CCD.
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RELATÓRIO

Dados:
Densidade do anidrido acético = 1,08 g cm-3
Massas molares: AS = 138,12 g mol-1 ; Anidrido acético = 102,09 g mol-1; AAS = 180,16 g mol-1

1. Escreva a equação balanceada da reação usando fórmulas moleculares.

2. Calcule as quantidades em mol adicionadas de:


a) Ácido salicílico: _________ mol Cálculos:4
b) Anidrido acético:__________ mol

3. Calcule o rendimento teórico da reação (a partir do reagente limitante): __________ g de


AAS
Cálculos:1

4. Pese o produto e calcule o rendimento experimental da reação.


Massa de AAS obtido:___________ g Cálculos:
Rendimento experimental:___________ %

5. Considerando que 4 gotas de H2SO4 são uma quantidade muito pequena em comparação com
as quantidades de reagentes utilizados nesse experimento, explique a ação do H2SO4 neste
procedimento de síntese.

6. Por que a vidraria não pode estar molhada no início do experimento, mas, no final, adiciona-
se água e lava-se o sólido com água no funil de Büchner?

7. Desenhe um esquema do cromatograma realizado e mostre como foi calculado o fator de


retenção. Que conclusões foram tiradas a partir da CCD?

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