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CONTRATOS EM ESPECIAL

Generalidades

O Direito das Obrigações divide-se em duas partes: uma relativa as obrigações


em geral e outra relativa aos contratos em especial. Nas obrigações em geral estuda-se
fundamentalmente a prestação (objecto da obrigação), os princípios dos direitos de
crédito, as fontes das obrigações, a transmissão de créditos e dívidas, modalidades das
obrigações, o cumprimento e outras formas de extinção da relação obrigacional, o
incumprimento (impossibilidade da prestação) e as garantias.

Na parte especial nossas atenções estarão viradas aos contratos de natureza


civil . Mas não iremos no presente curso, aflorar sobre todos os contratos previstos no
1

Cód. Civil, apenas abordaremos os mais frequentes e de maior importância,


designadamente: a compra e venda, a locação e a empreitada2.

Pelos contratos faz-se circular as riquezas, compra-se e vende-se, financia-se,


transporta-se, segura-se, deposita-se, confia-se, transfere-se bens, etc.

No Direito Privado os contratos vem regulados não só no Código Civil, mas


também no Código Comercial. Há contratos que não foram disciplinados no Código
Civil nem no Código Comercial (contratos da bolsa, franchising, factoring, leasing,
hospedagem, cartão de crédito, depósito bancário), outros somente no Código Civil
(doação) e outros apenas no Código Comercial (reporte, seguro, agência, comissão-
correctores), e outros ainda por ambos (compra e venda, mútuo).

As diferenças ocorrem em consequência do tratamento dual da legislação civil e


mercantil.

No âmbito comercial fala-se hoje numa recente classificação que são os


contratos de distribuição. Constitui uma relativa novidade. Em Angola e na
generalidade dos ordenamentos jurídicos, a referida designação nem sequer tem assento
na lei, sendo apenas consagrada na doutrina. Pressupõe um conjunto de contratos que
revelam uma certa homogeneidade. São os contratos de Agencia, de Concessão
Comercial e de Franquia- sendo estes dois últimos atípicos.

1
Todavia, várias vezes iremos referir o Cód. Comercial, pois alguns contratos civis também estão
regulados do Cód. Comercial
2
O contrato de mútuo é sem dúvida de grande importância também.

1
CONTRATO DE COMPRA E VENDA
1.1. Noção, características,forma e efeitos.

1.1.2. Noção legal: aspectos gerais.

A busca para transladar o património da esfera jurídica de uma pessoa para outra
é negócio jurídico que nos remete ao direito romano, uma vez que este é fonte do nosso
ordenamento jurídico.

A compra e venda surgiu em virtude do aparecimento da moeda metálica, até


esse momento o que existia era a troca directa de um bem por outro bem, em que uma
das partes trocava o que tinha em excesso por algo que carecia, ou seja, estava presente
a figura da permuta.

O contrato de compra e venda é o mais importantee frequente entre as relações


sociais no que toca a transação de bens e é o prototípico dos contratos onerosos(e não
gratuitos) de alienação-transmissão 939.° (dação em cumprimento - 837° C.C., o
reporte3 art. 477.ᵒtroca ou escambo, art. 480.ᵒ Cód. Comercial4)5.

O regime jurídico do contrato de compra e venda vem regulado nos arts. 874.° a
939.°.

O C.C. define contrato de compra e venda no art. 874.°.

Assim, o contrato de compra e venda existequando há transmissão


correspectiva de duasprestações: por um lado o direito depropriedade ou outro
direito, e, por outro lado, o preço.6

Compra e venda não corresponde à dois contratos7.

Do conceito de compra e venda pode-se depreender que:

3
Contrato de reporte que é de origem anglo-saxónica é comumente designado por REPO- diminutivo
de repurchase agreement-, consiste num acordo entre duas partes em que uma acorda vender e,
posteriormente recomprar um activo- (tal como valores mobiliários- que é uma acção ou crédito)
4
Contrato de troca é aquele em que as partes se obrigam reciprocamente a transferir um direito de
propriedade ou outro direito sobre uma coisa, ou seja, a entregar coisas. Se a troca for de dinheiro por
dinheiro o contrato é bancário de câmbio e não, como impropriamente é designado, compra e venda de
divisas.
5
Assim como a compra e venda internacional é a base de todos contratos internacionais como o
contrato internacional de seguro, contrato internacional de transporte, financiamento, etc. Compra e
venda internacional é aquela em que a mercadoria vendida deve ser entregue em
outro país diverso daquele em que ela se encontra no momento da conclusão do
contrato. Normalmente a compra e venda internacional é regulada por regras costumeiras
internacionais, designadas por INCOTERMS.
6
Se no mesmo contrato a uma transferência reciproca de direitos sobre coisas e acréscimo de um
preço, o contrato será misto, aplicar-se-á a teoria combinação. Alguma doutrina entende que será
de troca ou compra e venda em função do valor a acrescer em relação a coisa.
7
Ao contrário de alguns países que restringiram a denominação à venda- Direito Francês e Italiano-; ou
o contrato de compra- Direito Inglês e Alemão. A convenção de Viena de 1980,adoptou venda de
mercadorias.

2
a) O seu objecto é sempre um direito (objecto imediato)8. Fala-se em alienação de
uma coisa, mas, na realidade, o que se aliena é a propriedade da coisa ou outro
direito. Constitui objecto da compra e venda direitos reais (o usufrutuário,
contudo, o titular do direito de uso e habitação não pode alienar por compra e
venda – arts. 1446.º e 1488.º), direitos de créditos (cessão de direitosart. 577.º-
cessão da posição contratual – 424.º 9⬄venda de jogadores-.), alienação de
herança, trespasse10,direitos do autor, propriedade industrial, etc. Não constitui
compra e venda a assunção de dívida, na medida em que alei considera como
contrato translativo de obrigações e não de direitos, assim como
aquelassituações que não possam ser consideradas como direitos subjectivos
(venda de informações, de segredos ou produtos financeiros).

b) O preço representa neste contrato uma contrapartida monetária, sendo o


elemento que permite distinguir a compra e venda da doação (940°) e da
permuta.

O contrato de compra e venda incide sobre coisas móveis e imóveis, corpóreas e


incorpóreas (energia eléctrica), presentes e futuras, fungíveis e infungíveis, simples e
compostas (universalidades).

Na compra e venda vigora, como óbvio, o princípio da liberdade contratual (405.°).


Porém, existem alguns limitesimpostos pela lei ou convenção.

O contrato de compra e venda resulta de duas ou mais declarações de vontade,


todavia, pode resultar de decisão judicial (ex. a venda executiva).

Aplica-se a compra e venda as regras gerais sobre a legitimidade (excepto na


representação- ex: bolsa de valores11) e a capacidade.

1.1.3. Características do contrato de compra e venda

8
Sendo o objecto mediato a própria coisa.
9
A venda de jogadores é na verdade uma cessão da posição contratual.
10
Trespasse é um acto formal que importa a transmissão da propriedade do estabelecimento comercial,
mas considerando este na sua totalidade, como unidade económica e funcional do negócio ou comercio.
11
Bolsa de valores é um ambiente de negociação no qual investidores podem comprar ou vender seus
títulos emitidos por empresas, sejam privadas, de capitais públicos ou privados. Este processo é
intermediado com auxílio de correspondentes de negociação através de corretores. A bolsa é o
ponto de encontro entre quem quer vender uma acção e quem quer comprar.
Através dela uma empresa decide vender, abrir seu capital e disponibilizar acções em troca de
verbas, os interessados podem se tornar sócios da empresa comprando pequenas fatias do negócio.

3
Na caracterização jurídica da compra e venda, dizem os civilistas (TITO
FULGÊNCIO, ESPÍNOLA, CARVALHO MENDONÇA, SEBASTIÃO DE
SOUSA, entre outros) que este contrato é:

⇨Contrato típico e nominado12 (arts. 874.° e ss. do C.C. e 463.° Cód. Comercial). Ao
contrário da troca que é atípica e inominada no C.C., porém, nominada no Cód.
Comercial, art. 480.ᵒ,mas atípica.
⇨Contrato consensual13
⇨Contrato oneroso14
⇨Contrato sinalagmático15 (as prestações são reciprocas e interdependentes, funcionam
em termos de correspectividade- sinalagma genético e funcional)
⇨Contrato obrigacional e real quoad effectum16
⇨Comutativo, excepcionalmente aleatório17
⇨Contrato de execução instantânea; excepções18

1.1.4. Forma

Relativamente a forma, vigora o princípio da liberdade de forma (art. 219.°),


excepto na compra e venda de coisas imóveis (art. 875.°) 19; alienação de herança,
2126.°, transmissão de quotas (art. 228.° da LS.C.), direitos do autor, direito real de
habitação periódica20.

A lei pode não exigir forma, porém, resultar de convenção (art.223.°).

A inobservância da forma legal despoleta, nos termos do art. 220.°do C.C., a


nulidade do contrato (efeitos, art. 289°).

1.1.5. EFEITOS ESSÊNCIAS DA COMPRA E VENDA


12
A lei o reconhece como categoria jurídica, tem um nomem juris.
13
Porque se forma, comummente, pelo mero acordo de vontades, embora em certos casos seja solene.
14
Porque ambas as partes dele extraem proveitos e vantagens e há sacrifício económicos para ambas às
partes.
15
Da palavra grega sinalagma que significa cruzar.
16
Pois produzem efeitos de natureza real e, transferência do direito se dá por mero efeito do contrato (art.
408.° n° 1, excepcionalmente o n° 2), não se exigindo tradição (real quoad constitutionem)
17
Arts. 880.°n° 2 e 881.°n° 2,
2124.º e ss. do CC);
podendo uma prestação ser realizada sem a outra.
18
Porque esgota-se num só momento, o efeito translativo é imediato, e depois vem o pagamento do preço
e a entrega da coisa. Pode ser de execução continuada, por exemplo os contratos de fornecimento de
energia (porque embora cada prestação se integrar num todo contratual, tem autonomia). Na venda a
prestação pelo contrário, existe uma única prestação cindida em partes e escalonadas no tempo, só se
considera realizada a final.
19
Parece que não há necessidade de escritura pública nos créditos bancários para habitação.
REGIME DE CONCESSÃO DE CRÉDITO BANCÁRIO- DEC. PRES. Nᵒ 259/11, de 30 de
Setembro, tem como objectivo fomentar a aquisição de habitação própria permanente, e fomentar a
realização de obras de beneficiação e remodelação de habitações já existentes, terrenos para habitação.
Visa essencialmente, regular o acesso ao crédito bancário pelos interessados. Assim terá de apresentar, o
interessado, a título exemplificativo, a escritura do contrato promessa de compra e venda que
outorgou, a entidade financeira. Existem as seguintes especificidades: a taxa de juros pode ser
livremente negociada; seguro de vida, hipotecas ou outras garantias e estão isentos de emolumentos
notarias e registais.
20
Compra e venda de direito real de Habitação periódica (esta não existe em Angola)

4
O contrato de compra e venda produz um efeito real e dois obrigacionais,
designadamente: transferência do direito de propriedade ou outro direito real;
obrigação de entregar a coisa; obrigação de pagamento do preço.

A) EFEITO REAL

O feito real da compra e venda vem previsto no art. 879.° a)e art. 408.°n° 1

Por força destas disposições a transmissão ou constituição de direitos reais, opera


por mero efeito do contrato de compra e venda 21, ou seja a transferência da
propriedade ou outro direito real, é imediata e automática22. Assim, a transferência
da propriedade ou outro direito real não depende da entrega da coisa,nem de registo
da aquisição, basta a sua realização.

Tal efeito real encontra-se também no art. 1470.ᵒdo Código Civil Italiano.

Se for celebrado um contrato de compra e venda de um bem, o comprador torna-se


imediatamente proprietário do bem vendido podendo voltar aliena-lo, mesmo que não
lhe tenha sido entregue ou o preço respectivo ainda pago.

Nestes termos, vigora no nosso ordenamento jurídico osistema doTítulo(nacompra


e venda o título aquisitivo é o próprio contrato de compra e venda 23). Para se operar o
efeito real basta um justo título, ou seja, qualquer título capaz de transferir a propriedade
da coisa.

Para além do sistema do título, existem ainda o sistema do título e modo e o


sistema do modo.

O sistema do título e modo, em vigor na Áustria e Espanha, para que o efeito real
se produza não basta o título, a realização do contrato, sendo necessária a realização de
um segundo acto de transmissão (traditio ou o registo), o modo, constituindo assim um
negócio causal. Se se verificar apenas o título o contrato apenas produz efeitos
obrigacionais.

No sistema do modo, vigente na Alemanha e Brasil, em que o negócio apenas


produz efeitos obrigacionais (caracterizando-se como venda obrigatória), não
produzindo qualquer efeito real, não é necessário um título de aquisição, basta o modus
adquirendi, ou seja, para que o comprador seja proprietário do bem vendido é
necessário a entrega da coisa se for móvel ou registo se for imóvel.

21
Se a coisa for presente e determinada.
22
O C.C. Brasileiro define a compra e venda no art. 481.°“ pelo contrato de compra e venda, um dos
contraentes se obriga a transferir o domínio de certa coisa, e o outro, a pagar-lhe certo preço em
dinheiro”. Neste sentido o contrato de compra e venda no ordenamento jurídico brasileiro gera apenas
entre as partes obrigações, devendo-se praticar-se um acto posterior para se transferir a propriedade.
23
Existem outros títulos aquisitivos de direitos como a usucapião, sucessão mortis causa, acessão)

5
⬄No nosso direito, a transferência da propriedade não implica necessariamente a
transferência da posse24 da coisa. Não havendo tradição da coisa quer simbólica ou
material, a posse só se transfere por constituto possessório (art. 1264.°).

⇨Excepções
Existem hipóteses em que a transferência do direito real não se opera por mero
efeito (art. 408.° n° 2).

A primeira hipótese ocorre nas coisas indeterminadas- obrigações quanto ao


objecto (genéricas e alternativas).

Nas obrigações genéricas é com a concentração (arts. 541.° e 542.°). Ex: A


obriga-se a entregar 20 garrafas de vinho, a transmissãodá-se quando for específica.25

Nas obrigações alternativas (arts. 543.° e ss.) a transferência dá-se com a


escolha da prestação, isto é, com a sua determinação.

Na venda de bens futuros(arts. 880.° e 211.°) a transmissãodá-sequando a coisa


for adquirida pelo alienante nas coisas relativamente futuras ou existir nas
absolutamente futuras.

IMPORTANTE:Portanto, em todas essas situações, a transferência se dá por


mero efeito, imediato, mas, não no momento da celebração do contrato, porém,
completado por outro facto.

⬄Porforça da liberdade contratual, as partes podem convencionar a


transferência do direito real para outro momento através de elementos acidentais
(através da cláusula de reserva de propriedade).

⇨CLÁUSULA DE RESERVA DE PROPRIEDADE ( PACTUM


RESERVATI DOMINII)

A venda sob reserva de propriedade vem regulada no art 409.° e é aposta


sobretudo na venda a prestações ou a espera de preço. Ela apresenta-se, pelo menos,
em termos teóricos como uma condição ou termo suspensivo da transferência da
propriedade ou outro direito real.

É a convenção pela qual o alienante (vendedor) reserva para si a propriedade


da coisa, até ao cumprimento total ou parcial da outra parte, ou a verificação de
qualquer evento26.

O fundamento dessa cláusula resulta do facto de que, ocorrendo transferência do


direito real no momento da celebração do contrato, o comprador torna-se titular do
direitopodendo se quiser alienar a outrem, mesmo que a coisa não for entregue ou pago
o preço. O vendedor apenas pode cobrar o preço, sendo apenas mero titular de um
24
Posse é afectação material de coisa corpórea aos fins pessoais individualmente consideradas. Para que
haja posse tem de se verificar o elemento material e psicológico. Se faltar o elemento psicológico tratar-
se-á de mero detentor e a posse será precária.
25
Se A se obriga a entregar as 20 garrafas de vinho da loja a obrigação é específica. A se obriga a vender
2 cavalos já é genérica, mas se for o cavalo mais rápido à obrigação é específica.
26
Exemplo, pagamento de uma dívida a terceiro.

6
direito de crédito, concorrendo até com os outros credores que tem direitos sobre o
património do comprador, e sem qualquer preferência (art. 604.° n° 1).

A cláusula de reserva de propriedade constitui uma forma de fazer pressão ao


comprador para cumprir e proteger assim o vendedor.

Na venda sob reserva de propriedade, enquanto o preço não for pago à


propriedade se conserva na esfera jurídica do vendedor.

No âmbito do seu regime é importante aferir que:

a) A cláusula deve ser aposta no momento da celebração do contrato e não em


momento posterior27, sob pena de ineficácia;
b) Acláusula segue a mesma forma que se exige para o contrato28;
c) Pode ser celebrada quer para coisas móveis ou imóveis;
d) Deve ser registada se for coisa imóvel ou móvel sujeita a registo, sob pena de
ineficácia contra terceirosde boa-fé (art. 409.° n° 2 do C.C. e art. 2.ᵒ nᵒ 1 al. h)
do Cód. Registo Predial, art. 5.ᵒnᵒ 1 do Cód. de Registo Automóvel).

Relativamente às coisas móveis não registáveis é entendimento de alguma doutrina 29


de que a mesma pode ser oponível a terceiros ainda que este estiver de boa-fé,salvo se o
terceiro adquirir a propriedade a título originário, como a usucapião e a acessão, nestes
casos a cláusula se extinguirá. Acresce PIRES DE LIMA quea posse não vale título (a
posse vale título é uma máxima, em matéria de móveis, significa que o adquirente de um
móvel, estando de boa fé, porque ignorava os vícios da legitimidade da pessoa que lhe
transmitiu, o adquire definitivamente, não podendo ser exigida a restituição- MOTA PINTO)
(contra, ROMANO MARTINEZ30).

Através da conservação da propriedade no vendedor até ao pagamento (por força da


cláusula de reserva),impedem os credores do comprador executarem o bem (contudo,
dado o facto de existir uma expectativa jurídica pode ser nomeada a penhora), podendo
o vendedor reagir através de embargos de terceiros (art. 342.° do C.P.C.).

O vendedor não pode alienar a um terceiro, pois, sendo a reserva oponível a


terceiros (por força do registo), salva hipótese prevista na o art. 1301.°., bem como o
vendedor, neste casopoder-se-á aplicar o regime da venda de bens alheios

Em caso de incumprimento do comprador, o vendedor pode resolver o contrato


nos termos do art. 801.°n°1, salvo se a venda for a prestações (art. 934.°).

Havendo reserva depropriedade em contrato de compra e venda a doutrina divide-se


se há ou não posse. Para MENEZES LEITÃO e ANA MARIA PERALTA, existe
27
Pois já se transferiu o direito de propriedade
28
Mas pode ser convencionada forma se a lei não há exigir.
29
MENEZES LEITÃO, ANTUNESE VARELA, ALMEIDA COSTA, JORGE RIBEIRO FARIA.
30
Para MARTINEZ, que tratando-se de coisa móvel não registável a cláusula é inoponível em relação a
terceiros, pois a lei tutela a aparência das situações como resulta do art. 1301.ᵒe no penhor art.
667.ᵒ,ainda por força do princípio da relatividade dos contratos (art. 406.°) e facilitaria o ajuste de
acordos fraudulentos em prejuízo de terceiros de boa-fé, acresce invocando o art 435.°n° 1 que a
resolução não afecta terceiros de boa fé.

7
posse uma vez que o comprador tem uma expectativa jurídica de aquisição oponível a
terceiros, podendo usar e fruir a coisa, defender o gozo da coisa através da inerência e
sequela, podendo intentar acções possessórias (arts. 1276.°) e exigir indeminizações.

ROMANO MARTINEZ, defende que não há posse. O comprador sob reserva de


propriedade tem um direito de retenção (art. 754.°) a partir do momento em que a coisa
lhe tenha sido entregue e ele credor quanto à devolução de parte do preço já pago.

Sobre a natureza jurídica cfr. MENEZES LEITÃO, p.p. 56-60.

O RISCO NO CONTRATO DE COMPRA E VENDA

Ligada a transferência da propriedade da coisa surge também a transferência do


risco.

Risco é um facto futuro e incerto, do qual pode resultar algum dano a coisa. A
questão que se coloca no âmbito do risco é a de saber a quem cabe suportar o risco
peladeterioração ou perecimento da coisa.

O risco na compra e venda vem regulado no art. 796.°


A primeira regra contida no n° 1, é tradicional (res perit domino- a coisa morre
com o senhor; ou casumsentitcreditor- o dono ou credor sofre o acaso). Se ao
adquirente pertence o incremento do valor da coisa, posterior alienação, sem que
deva pagar, com isso, um preço mais alto, deve suportar o risco da perda ou
deterioração, o alienante ao transferir a propriedade cumpriu a sua principal
obrigação, se o alienante conservou a coisa depois de transferir a propriedade, fica
sendo apenas mero depositário, não recebe, em regra, qualquer benefício (VAZ
SERRA).

Através do contrato de compra e venda se opera a transferência da titularidade


do direito real no momento da celebração, podendo o comprador aliena-la, constituindo-
se credor da entrega da coisa e deixa de concorrer com os outros credores em relação a
coisa (604.° n° 1). Entretanto, por força do apotegma ubi commodaibiincommoda, é
justo que os riscos inerentes a coisa sejampor ele suportados.

Ex: A aliena a B um automóvel, ainda queA não entregar,se a coisa se deteriorar


ou perder, sem culpa do vendedor, estes danos serãoimputáveis ao comprador.

Porém, essa regracomportaexcepções.

A primeira consta do n.° 2 (termo, por regra termo certo) Ex: A aliena a B um
automóvel, porém só o vai entregar numa certa data quando receber a encomenda de
outro automóvel, se se deteriora ou perde com ou sem sua culpa, estes danos ser-lhe-ão
imputáveis. O art. 807.°refere-se a mora na entrega. Assim, se não entrega na data
acordada e a coisa se deteriorar ou for roubada ainda que não seja culpa sua ser-lhe-á
imputável.

A segunda consta do n.° 3 (condição resolutiva). Assim, se durante a pendência


ocorrer o perecimento da coisa, o risco é imputável ao comprador quer se verifique ou
não a condição. Ex: A aliena a B um automóvel e o entrega, porém, os efeitos do

8
contrato cessarão se A casar, se ainda não casar a condição não se verificou nem deixou
de se verificar, se houver um dano será imputável ao comprador (tendo ou não culpa).

Se a condição for suspensiva, na pendência da condição o risco corre por conta


do vendedor. Se a obrigação for de envio o risco corre nos termos do art.797.ᵒ. Assim se
alguém compra um automóvel que se encontra no Dubai o risco será do transportador.

Estas regras formuladas neste artigo são supletivas. Nenhuma razão de


ordem pública se impõe.

Nas obrigações genéricas e alternativas, a questão do risco está naturalmente


ligada ao momento da transferência do domínio sobre o objecto da prestação do credor
(com a entrega)31.

O que esta em causa não é a titularidade do direito, mas sim a relação material
com a coisa.

RISCO NA VENDA SOBRE A RESERVA DE PROPRIEDADE,

Configurando-se como uma condição suspensiva, nos termos do art. 796.°ns. 3


2ªparte, o risco ocorre por conta do alienante (vendedor) na pendência da condição.
Contudo, a cláusula de reserva de propriedade funciona como garantia e podendo o
comprador usar e fruir a coisa, sendo este o titular das vantagens sobre acoisa por lhe
ter sido entregue, fundamenta-se a assunção do risco.

Tratando-se a venda sob reserva de propriedade também um termo, se coisa for


entregue ao comprador o risco corre por sua conta na pendência da condição (art. 796.°
n° 2).

EFEITOS OBRIGACIONAIS

B) ENTREGA DA COISA

Esta obrigação imputável ao vendedor vem estabelecida no art. 879.° b),


constituindo um direito de crédito do comprador, o qual concorre com a acção de
reivindicação da propriedade (art. 1311.°).

Constitui uma obrigação que resulta do contrato e não um elemento do processo da


sua formação, por não ser a compra e venda quoad constitutionem. Ainda que for uma
obrigação genérica, pois, à entrega da coisa- concentração da prestação é uma
consequência indirecta do contrato.

Com a entrega material ou simbólica da coisa, verificar-se-á aatribuição da posse da


coisa (art. 1263.° b). Mas pode ocorrer por via do constituto possessório.

31
PIRES DE LIMA7ANTUNES VARELA, C.C. Anotado, p. 51.

9
Se a coisa já estiver na posse do comprador, fica excluída essa obrigação de entrega
(por exemplo se a coisa for vendida ao inquilino ou quem a tenha alugado).

Esta obrigação pode ser cumprida por um terceiro (art. 767.°).

A obrigação de coisa específica é objecto de regulação especial no art. 882.°n°1,


2 e 3. E outros deveres acessórios de conduta33.
32

Quanto ao tempo é aplicável o disposto no art. 777.°.


Quanto ao lugar arts. 772..° e ss. No caso de obrigação de envio cfr. art. 797.°.
Cfr. Ainda art.473.° e 475.°do Cód. Comercial.

O vendedor pode beneficiar daexcepção do cumprimento nos termos do art. 428.°34

Se o comprador não aceita receber a coisa o vendedor pode consignar em depósito 35,
nos termos do art. 841.°e ss.

As despesas de empacotamento e transporte são imputáveis ao vendedor se a entrega


tiver de ser feita em lugar distinto.

C) PAGAMENTO DO PREÇO

Ao comprador cabe aobrigação de pagar o preço, nos termos do art. 879.° b)e 474.º
do Código Comercial. Configurando-se numa obrigação pecuniária36 de quantidade (art.
550.°). Nestes termos segundo o princípio do curso legal o preço deve ser pago em
Kwanzas, mas pode ser pago em moeda específica ou estrangeira, arts. 552.°e ss e
558.°.

O preço define-se por dois elementos: material - deve consistir numa quantia em
dinheiro; um funcional – deve ser objecto da obrigação assumida.

O nosso Código Civil e o Suíço das Obrigações, se diz “mediante um preço”,


pressupõe-se um conceito do qual faz parte o referido elemento material.

Não haverá compra e venda se no contrato a referência a dinheiro não definir o


objecto da obrigação do comprador, mas tiver uma outra função, como por exemplo a
32
Não inclui as coias acessórias, art. 210.º nº 2.
33
Informação (é um verdadeiro direito consagrado até na Constituição) e conselho. Etc.
34
Na venda a contado em que o preço tem de ser pago no mesmo acto da entrega da coisa ;
mas em comércio também se diz venda a contado quando o comprador tem um curto prazo para
pagar, prazo que não se reputa como concessão de crédito.
35
Constitui uma forma de extinção da obrigação devida através do depósito da coisa objecto
da prestação em determinadas circunstâncias ou por ordem do credor. Só pode ser feita por via
judiciária.
36
A obrigação pecuniária é aquela cuja prestação debitória consiste numa quantia em dinheiro, que é
tomada pelo seu valor monetário propriamente dito.

10
indicação do valor dos bens trocados entre os contraentes ou o montante de
indemnização por falta da obrigação assumida, cujo objecto seja a entrega de bens
diferentes de dinheiro.

Se uma das partes se obriga a entregar ou uma quantia em dinheiro ou uma coisa,
para RAÚL VENTURAp. 607, trata-se de uma venda com faculdade alternativa
para o comprador, mas venda, porque se estipulou primeiro dinheiro.

O artigo 883.º refere-se aos vários modos de fixação do preço.

a) Preços fixados

. Fixação por autoridade pública (os critérios supletivos não podem ser aplicados se o
preço for fixado por autoridade pública)37.

Muitas vezes o preço fixado por autoridade pública não é um preço fixado, mas
apenas um preço máximo (câmbio fixado pelo BNA em relação a moeda estrangeira,
mas que não é compra e venda).

b) Preços convencionados

. Determinação directa – pelas partes ou vendedor. Mas o preço pode ser fixado
mais tarde por exemplo na venda de cereais (sendo o preço determinável mas não
determinado).

. Determinaçãoindirecta – especialmente a determinação por terceiro (art. 400.º nº


1 e 2 e 466.º do Código Comercial).

c) Preços supletivos legais – pelo tribunal 38e pela bolsa.

Quanto ao lugar e momento, cfr. art. 885.° (domicílio do devedor), que se afasta da
regra estabelecida no art. 774.°.

O comprador pode recorrer a excepção do não cumprimento, art. 428.°ess., ainda


que já for entregue a coisa e houver discordâncias ou divergências em relação a coisa
vendida (venda sobre amostra).

A redução do preço opera-se nos termos do art. 884.°.

Existemduas hipóteses quando o preço for descriminado ou não: O primeiro caso


ocorre nos termos do art. 292.°nos casos de nulidade e anulabilidade parcial(Ex:
vendem-se 2 automóveis por 22.000,00; um por 10.000,00 e outro por 12.000,00, e a
invalidade se verificar apenas em um deles-vício num dos automóveis). Mas
Existem outros casos de redução proporcional como o caso de a prestação se tornar
37
Mas pode ser fixado por um comerciante. A prática comercial mostra com frequência a inclusão
em certos contratos de venda de fabricantes grossistas e destes para os retalhistas de uma cláusula
que impõe certo preço de venda ao público – trata-se normalmente de vendas de mercadorias
especiais. Exemplo de preço fixado por autoridade pública, o preço dos combustíveis fixados pelo
Governo.
38
O processo de fixação do preço pelo tribunal é regulado nos arts. 1004.°do C.P.C.

11
parcialmente possível (art. 793.°), venda por unidade e global 887.º e 888.º nº 2 (Assim,
Se houver discriminação de cada parcela do preço global, o preço será respeitante
a parte válida. Ou vende-se por 10.000,00 600 m2 quando só tem 590 m2), ou venda
de coisa defeituosa (art. 911.°).

Na falta de descriminação a reduçãoserá feita por avaliação 39, podendo ser


extrajudicial ou judicial (art. 568 .°e ss. C.P.C.).

São aplicáveis as regras gerais dos arts. 762.°- boa-fé-, e ss., 790.°-impossibilidade-,
e ss e 804.° - mora-, e ss.

Prazo de prescrição art. 309.°

O não incumprimento dará lugar a acção de cumprimento para cobrança (art.


817.°) e juros de mora (art. 806.° n° 1). A lei não admite, a princípio a
RESOLUÇÃO, por força do art. 886.°.

Excepcionalmente, pode o vendedor resolver o contrato se se verificar uma das três


seguintes situações:

1. Existir convenção em contrário (pois o art. 886.° é uma norma supletiva e, se


poder convencionar a resolução art. 432.°);

2. Se a coisa não for ainda entregue, ainda que já tiver sido transferida a
propriedade (com excepção do não cumprimento, art. 428.°.);

3. Na venda sob reserva de propriedade (art. 409.°), pois, nesta, ainda não foi
transferida a propriedade.

Ao comprador cabe ainda outros deveres relativos as despesas do contrato (art.


878.°), tais como: despesas com os documentos autênticos ou autenticados, registo da
transmissão, imposto de SISA, IVA, selo, honorários para preparação do contrato
(advogados), etc.

39
Avaliação é o arbitramento destinado à simples determinação do valor de um bem ou direito. Avaliação
Judicial art. 603.º.

12
VENDAS INTERDITADAS
Na literatura jurídica alguns autores falam de proibições de vendas (RAÚL
VENTURA, MENEZES LEITÃO, entre outros), outros consideram estas hipóteses
incluídas nas modalidades típicas de compra e venda 40. Na verdade trata-se de uma
questão dogmática. Porém, preferimos vendas interditas, pois o código proíbe que tais
contratos de compra e venda sejam celebrados entre determinados sujeitos ou só em
determinados termos (como o assentimento de terceiro), pois, verifica-se a falta de uma
qualidade específica para serem parte no âmbito deste direito.

Estas proibições constituem limites legais ao princípio da liberdade contratual-


liberdade de celebração ou conclusão.

a) VENDA POR PAIS OU AVÓS A FILHOS OU NETOS

40
Cfr. PEDRO ROMANO MARTINEZ, defende que elas tem uma particularidade de regimes, logo, são
modalidades de vendas, p. 57

13
A exigência de consentimento por parte de terceiro esta relacionada por um
particular regime da compra e venda. Tal problema não resulta da incapacidade ou a
ilegitimidade das partes, apesar de relacionada com os sujeitos do negócio41.

A protecção à igualdade dos quinhoes legitimários é um dos valores que o Direito


Sucessório tutela. Neste sentido, diversas regras são definidas para que não haja fraudes,
simulações ou outros meios de dissipação ou ocultação patrimonial, com o intuito de
esquivar regras sucessórias.

É em função dessa função protetiva que o art. 877.ᵒ,estabelece que“os pais e avôs
não podem vender afilho ou netos sem consentimento dos outros descendentes”. O Cód.
De Visconde Seabra continha uma disposição semelhante no art. 1565.º.

Nas palavras de GALVÃO TELLES esta proibição é de carácter preventivo,


fundada no receio ou perigo de simulações adaptadas a esconder liberalidades de uma
venda ardilosa e inventada.

Destarte, a lei pretende muralhar a utilização do instituto da compra e venda para


evitar que se esconda uma doação. Proíbe o ascendente de vender ao descendente
porque se receia que, na obscuridade, se esteja a doar.

Procura-se com esta proibição evitar uma simulação, difícil de se provar, em


prejuízo das legítimas dos descendentes. Os pais doariam bens aos filhos, sob forma de
venda, para estes não imputarem nas suas quotas legitimárias os valores recebidos (por
força da colação-visa a reconstituição do património hereditário para a igualação de
quotas da herança)42e assim prejudicarem os outros herdeiros43.

Enquanto nos casos normais de simulação, o contraente interessado na futura


invalidação do negócio guarda em regra as provas consigo, na venda simulada entre
descendente e ascendente, estes procurarão desfazer-se provas44
41
Apesar de que não devemos sobrevalorizar estes argumentos, concordamos que não se trata de
incapacidade porque não falta qualquer causa natural que limite sua capacidade de discernimento, porém,
a nosso ver, trata-se de ilegitimidade na medida em que falta uma qualidade específica apara actuar.
42
Em relação as doações a proteção do quinhão hereditário é feito por dois mecanismos:
antecipação do quinhão legitimário ao donatário - descendente (art. 2104.º) e a redução por
liberalidade inoficiosa (art. 2168.º)
43
MENEZES LEITÃO. Haveria uma simulação relativa. Sempre que não houvesse
consentimento dos outros descendentes haveria uma presunção iuris tantum de ter havido
simulação. Contudo, ANTUNES VARELA “a lei não presume que todas as vendas de pais a
filho ou de avós a netos, sem consentimento dos demais, sejam simuladas. A sua ratio não é de
raiz concreto-individual, nem estritamente repressiva, alicerçada na convicção sistemática,
generalizada, de que em todos estes casos pai e filho (arvorados em vendedor e comprador) se
conluiaram no intuito de iludir as legítimas dos outros filhos.
A intenção da lei consiste em evitar – é coisa diferente – as vendas simuladas entre pais e
filhos, com o fim altamente reprovável de lesar as expetativas sucessórias dos outros filhos,
assentes na própria lei (e não na vontade dos pais). A sua finalidade, ao instituir o
mecanismo do assentimento prévio dos outros filhos, é de carácter essencialmente
preventivo.” Acresce GALVÃO TELLESque não descurando esta possibilidade, o certo é que
seria impensável vedar um acto só porque hipoteticamente poderia ser simulado.
44
Vide PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, p. 165

14
O antigo Código Civil abrangia também a hipoteca. Não há referência expressa no
Novo Código em relação a hipoteca.

Quanto à sua exclusão no artigo vigente, RAUL VENTURAentende que, hoje,


mesmo sem a menção da hipoteca no art. 877º, a proibição abrange-a na mesma graças
à extensão prevista no art. 939º.

Contudo, a jurisprudência tem decidido em sentido diverso, como é o caso do


Acórdão do STJ de 24-10-2002, “tendo a mãe do autor feito uma hipoteca a favor dum
banco para garantir um crédito dum filho, não está em causa a proibição do art. 877º
do CC, pelo que os demais filhos não se podem opor à sua realização”.

No seguimento do caso supra citado, interrogamo-nos se, em caso de


incumprimento da obrigação e, executada a hipoteca, não poderia ser aplicável o art.
877º? Não existe de facto uma tentativa de beneficiar um certo filho? Sim. Mas com o
intuito de prejudicar a legítima do outro filho herdeiro? Não nos parece.
A constituição de uma hipoteca não implica, à partida, a sua execução, ou seja, não
parte do pressuposto que irá existir um incumprimento por parte do filho, para que este
possa ser beneficiado. A hipoteca “constitui um direito real de garantia”.

Noutro prisma, será este filho beneficiado por obter um crédito bancário devido
a uma hipoteca voluntária feita pelos pais? Talvez seja de admitir esta vertente mas,
iríamos cair (provavelmente) no exagero do alcance de uma norma que possui uma
natureza excepcional.

15
Esta disposição abrange duas situações: a venda a filhos e a venda a netos; não
carece de qualquer autorização a venda a bisnetos, nem as situações em que o vendedor
é filho ou neto45.

45
Para RAUL VENTURA não vê que os bisavôs sejam menos tentados que os pais e avós a dissimular,
por vendas, doações, feitas a bisnetos.

16
17
A lei não refere sobre a venda ser realizada por interposta pessoa. O que faz supor
que a venda de pais e avós por interposta pessoa não é proibida 46. Parece que esta
omissão não querida pelo legislador pretende-se evitar uma repetição da venda de coisa
ou direito litigioso (arts. 579.ᵒ e 876.ᵒ). Se a venda for realizada por interposta pessoa
haverá uma fraude a lei e é aplicável o art. 877.ᵒ.

O consentimento não carece de forma especial (ainda que a venda exigir forma
especial) e caberá aos outros filhos ou sucessores se aqueles tiverem falecido, podendo
ser expressa ou tácita.O art. 877.ᵒpressupõe a existência simultânea de vários filhos ou
netos, nada interessando que, depois da venda, o pai ou avô vendedor venha a ter mais
filhos ou netos; basta reparar que os filhos ou netos nascidos posteriormente à venda
não poderiam dar o consentimento para na altura em que é celebrada.

Se depois da venda a filho ou a neto venha a ser perfilhado ou reconhecido


judicialmente outro filho ou neto, nesta hipótese o filho pode pedir a anulação da venda
pois a perfilhação produz efeitos retroactivos (art. 162.ᵒ).

A lei sanciona com a anulabilidade pela falta de assentimento nos termos do nᵒ 2


do art. 877.ᵒ, podendo ser suprida a falta de consentimento. Esta proibição não abrange
a dação em cumprimento feita pelo ascendente ao descendente (cfr. nᵒ 3).

Havendo compropriedade entre o pai e filhos e o pai quiser alienar a um dos filhos
titular de direito de preferência (art. 1409.ᵒ) não carece de consentimento dos outros
descendentes.

46
Neste sentido seguiu GALVÃO TELLES.

18
19
20
b) VENDA DE COISA OU DIREITO LITIGIOSO
Esta proibição vem prevista no art. 876.ᵒ. É de notar a existência de uma duplicação
nos arts. 876.ᵒe art. 579.ᵒ (Cfr.). Este último regula a cessão de créditos ou outros
direitos litigiosos e aquela, além da venda de coisa litigiosa, a venda de direitos
litigiosos; a duplicação resulta de a cessão de direitos compreende a venda de direitos.
A definição de direito litigioso encontra-se no nᵒ 3 do art. 579.ᵒ.

O fundamento desta proibição visa evitar fins especulativos, levando os titulares a


vender-lhes os bens por baixo preço, por força da influência que têm no processo.

A referência a palavra contestado pressupõe o sentido de “discutido”, “submetido a


juízo” e “ qualquer interessado” significa não só o réu ou alguém legitimo para intervir
no processo em oposição a pretensão do autor, mas sim qualquer pessoa interessado no
direito, incluindo o seu titular (que na acção é o autor)47.

A palavra direito litigioso serve para definir “coisa litigiosa”, embora com as
necessárias adaptações, pois não faz sentido por exemplo “coisa contestada”.

O objecto da acção pode ser uma acção declarativa em todas suas modalidades ou
acções executivas.

Quando as primeiras pessoas a lei diz “se o processo decorrer” quanto as últimas a
lei diz “ que tenham intervenção no processo”.

Se aquelas pessoas primeiro adquirirem o direito e só depois disso passar a exercer a


sua actividade ou profissão na área onde o processo decorre a venda é válida, bem como
se deixar de exercer a sua actividade48

Em termos de competência legal do tribunal o elemento delimitador é a área e não a


efectiva jurisdição do processo. São todos os juízes e funcionários da área.

Porém, esta proibição cessa se se verificar uma das hipóteses previstas no art. 581.ᵒ.

A lei sanciona com a nulidade e ainda a obrigação de reparar danos (arts. 876.ᵒ nᵒ 2
e 580.ᵒ nᵒ 1). Entretanto, a nulidade não pode ser invocada pelo comprador, pois, o
comprador celebraria um negócio que poderia sempre declarar nulo se a operação
especulativa não lhe corresse de feição. Essa nulidade é estabelecida fundamentalmente
no interesse do vendedor.

O comprador deve repara os danos causados. A venda em si não causa danos, mas a
nulidade pode causa-los (indeminização pelo interesse contratual negativo)

c) COMPRA POR PAIS, TUTORES E CURADORES.

47
RAÚL VENTURA, pág. 264.
48
Idem, pág. 265

21
Estabelece o art. 141.ᵒdo Cód. Família que “os pais, no exercício da administração
legal dos bens dos filhos, não podem, sem autorização do tribunal, praticar actos de
alienação de bens imóveis ou móveis com carácter duradouro, repudiar heranças; ou
contrair obrigações que vinculem o filho depois de este atingir a maioridade”. A lei
não fala em aquisição. Contudo, esta disposição abrange também tal hipótese49. E se o
pai compra um bem que administra pertencente ao filho, estaria a contratar com um
incapaz, logo, o contrato é anulável por incapacidade por menoridade do vendedor filho
(art. 126.ᵒ).

A violação desta disposição é sancionada com a anulabilidade nos termos do art.


145.ᵒ.

Em relação ao tutor o art. 238.ᵒdo Cód. da Família manda aplicar o disposto no art.
141.ᵒ. Os actos praticados sem autorização do tribunal é aplicável o disposto no art.
145.ᵒ,

É aplicável aos curadores por força do art. 156.ᵒdo Código Civil o regime da
curadoria com as necessárias adaptações.

d) VENDA ENTRE CÔNJUGES

O ordenamento jurídico português estabelece no art. 1714.º n.º 2 a nulidade do


contrato de compra e venda celebrado entre os cônjuges. Fundamenta-se tal proibição
na imutabilidade do estatuto patrimonial e para evitar que um dos cônjuges abuse da
influência que tem sobre o outro. Em Angola não existe tal proibição.

MODALIDADES ESPECÍFICAS DE VENDA

49
Ademais, tratar-se-ia de um negócio consigo mesmo (art. 261.ᵒ).

22
1. VENDA DE BENS FUTUROS, FRUTOS PENDENTES E PARTES
COMPONENTES OU INTEGRANTES.
Estas vendas vêm reguladas no art. 880.ᵒdo C. C. e 467.ᵒdo Cód. Comercial,
constituindo uma excepção a regra da transferência imediata do direito (art. 408.ᵒ nᵒ 2).
Trata-se de vendas celebradas sob condição suspensiva nos termos dos arts. 270.ᵒe ss.

a) VENDA DE COISA FUTURA


O conceito de coisa futura vem previsto no art. 211.ᵒ.

Não deve confundir-se venda de coisa futura com a venda de coisa alheia, embora
as partes podem atribuir na venda de coisa alheia a natureza de futura (art. 892). Na
coisa futura nenhuma das partes ignora que a coisa não pertence ao alienante, ainda que
haja necessariamente a expectativa de ela vir a integrar, no futuro, o seu património
(emptio rei speratae)50. Não se confunde a venda de coisa de existência ou
titularidade incerta (art. 891.ᵒ) em que as partes ignoraram se coisa existe ou quem é o
titular, mas a coisa é presente. Nesta falta atitude psicológica da coisa vir a existir ou
integrar no património do alienante.

As coisas futuras são aquelas que não estão ao poder do disponente ou a que este
não tem direito ao tempo da declaração negocial.

Seria uma venda de um bem ou direito futuro quando o bem ou direito vendido
não tem existência jurídica (por exemplo como um crédito não constituído ou um
direito real) ou o direito já existe mas não esta na titularidade do transmitente.

Nestes termos, as coisas futuras podem ser absolutamente futuras (quando nem
sequer existe), ex: venda de coisa que o vendedor construirá). Serão relativamente
futuras se elas existem mais não são propriedade do vendedor ou seja pertencem a um
terceiro (ex: a venda de uma coisa objecto de processo judicial nos casos de violação de
preferência legal ou real ou venda de peixes que ira pescar (res nullius, in rerum
natura). Esta hipótese confunde-se com a empreitada com fornecimento de matérias
pelo empreiteiro.

Um subtipo de venda de coisas futuras é a compra e venda de coisas futuras que


respeite ao fornecimento continuado de determinados bens, como água, eletricidade
ou gás. O fornecedor se obriga a proporcionar de modo continuado bens que no
momento do contrato não estão na sua disponibilidade, devendo retira-los da natureza,
produzi-los ou adquiri-los.

O comprador deve praticar todas as diligências necessárias para que o comprador


adquira os bens vendidos nos termos do nᵒ 1 do art. 880.ᵒ51. Trata-se de uma obrigação
preparatória ou preliminar de fazer a coisa existir ou pelos modos apropriados torná-la
presente.
50
Na venda de bens alheios um das partes, normalmente o comprador, não sabe que a coisa não pertence
ao alienante.
51
Como construir, adquirir, pescar.

23
Se vendedor não cumpre, porque não realiza a prestação, fazendo com que deixe de
ser futura, são aplicáveis as regras gerais sobre esta matéria os arts 798.ᵒe ss.. Devendo
ser restituído ao comprador o preço.

As partes podem atribuir carácter aleatório a compra e venda de bens futuros nos
termos do nᵒ 2. São os casos em que o objecto da venda é uma mera esperança de
aquisição das coisas (emptio spei-chance). Ex: A vende a futura plantação de serais,
independentemente de esta ocorrer ou não, o comprador fica obrigado ao preço. Assim,
existem duas modalidades de venda de coisa futura (a emptio rei speratae52- o preço só
é devido se a transmissão dos bens vier a verificar-se-, e emptio spei- o preço é devido
ainda que a transmissão dos bens não vier a verificar-se).

Neste caso, por vontade dos contraentes, não há obrigação de restituir o que houver
sido prestado pelo comprador; e se, este não pagou o preço, é obrigado a fazê-lo (salvo
se houver culpa do vendedor), não obstante a impossibilidade do cumprimento por parte
do vendedor (sem culpa, por exemplo uma estiagem) e não verificação da transferência
da propriedade.

A lei equipara a venda de bens futuros a Venda de frutos pendentes, partes


componentes e integrantes. Estas não tem individualidade jurídica ao tempo da
declaração e que só depois da separação se tornam autónomas e se transferi a
propriedade (408.ᵒ nᵒ 2).

Frutos pendentes são os que estão ligados à árvore. São os frutos naturais são os
frutos produzidos pela natureza, os que se renovam periodicamente, em razão da força
orgânica da natureza, sem a intervenção do homem 53, de produção periódica e que não
alteram a substância. Ex: a venda das laranjas de um pomar, quando ainda não estão nas
árvores.

A diferença entre partes componentes e partes integrantes já foi precisada em


T.G.D.C.

Todavia, existem por vezes dificuldades em qualificar determinadas situações. É o


que sucede com os elevadores. Durantes a construção do imóvel, os elevadores são
vendidos ao empreiteiro com reserva de propriedade por um por fornecedor, o contrato
é valido sem registo (art. 409.ᵒ nᵒ 2). O elevador é montado no prédio e passa a ser parte
da estrutura. Vendidos os vários andares, os compradores passam a ser condóminos.
Surgem duas questões: a primeira é a de saber se a cláusula de reserva de
propriedade é oponível aos compradores dos andares; a segunda é a de saber se o
elevador é ou não parte integrante, pois o regime difere em função disso. Se for
considerado o elevador como parte integrante, então é coisa imóvel (art. 204.ᵒ nᵒ 3 e nᵒ 1
e)). Dito de outro modo, quando a coisa móvel (elevador) se integra no prédio, perde
autonomia, logo, a cláusula de reserva é inoponível a terceiro.

52
Venda de coisa esperada.
53
Uma fábrica que produza doces de manga ou goiaba, este constitui um fruto industrial

24
2. VENDA DE BENS DE EXISTÊNCIA OU TITULARIDADE INCERTA
Constitui também uma modalidade específica de venda, aludida nos arts 881.ᵒe ss do
C.C. e 467.ᵒnᵒ 1 do Cód. Comercial (na verdade o a lei comercial não à regula, apenas a
remete para o C.C.).

Em princípio só poderão ser objecto de venda as coisas que existem e pertencem ao


vendedor, sob pena de nulidade por força do art 280.ᵒ (impossibilidade física ou legal) e
art. 892.ᵒ (venda de bens alheios)

Entretanto, não impede que se celebre contrato de compra e venda sobre um bem
cuja existência ou titularidade se apresente incerta, todavia, dever-se-á fazer menção a
essa incerteza no próprio contrato.

Existem duas hipóteses de incerteza: incerteza quanto a existência (venda de um


tesouro que não se tem certeza se existe); incerteza quanto a titularidade (venda de
uma coisa que não se tem certeza se pertence ao vendedor).

A lei presume que o contrato tem carácter aleatório (emptio spei), sendo o preço
devido pelo comprador. Porém, tratando-se de uma presunção iuris tantum, as partes à
podem ilidir, sendo o preço pago se o bem vier a existir ou pertencer ao vendedor. Mas
se se verificar uma impossibilidade originária, o contrato é nulo e, o preço não será
pago.

O carácter aleatório desta venda resulta de presunção legal, ao contrário da venda de


bens futuros que resulta de convenção (art. 880.ᵒ nᵒ2)54

Há quem considere que a emptio spei não se enquadra na compra e venda, porque o
preço pago sem contrapartida da venda, seria outro tipo de contrato, pois, falta a coisa.
Entretanto a característica comutativa não é imprescindível na compra e venda, ademais
no momento da formação do contrato, não há diferença entre compra e venda de coisa,
com carácter aleatório ou não, ficando dependente de uma condição. Acresce que, tendo
o contrato natureza aleatória, se a coisa vier a existir, procede-se a troca de dinheiro pela
coisa, independentemente do carácter aleatório. Não é o carácter aleatório que impede a
qualificação do contrato como de compra venda.

3. VENDA DE COISAS SUJEITAS A CONTAGEM, PESAGEM OU


MEDIÇÃO55
Este tipo de venda vem prevista nos arts. 887.ᵒa 891.ᵒdo C.C. e o art. 472.ᵒ Cód.
Comercial.

54
A venda de bens de existência e titularidade incerta difere da venda de bens futuros e da venda de bens
alheios: nesta existe uma expectativa futura de aquisição ou autonomização da coisa no património do
vendedor, naquela há incerteza de uma situação presente relativa a existência e titularidade do bem
objecto da venda. Na venda de bens alheios o vendedor não celebra na qualidade de proprietário,
excluindo qualquer garantia a essa situação. Cfr. MENEZES LEITÃO, p 48-49
55
Vendem-se arroz por 10.000 e afirma-se que tem 100 kg. Realiza-se uma operação de pesagem. Ou
vendem-se cada por 100 kzs frutas e diz-se que tem mil. Realizar-se-á uma operação de contagem.

25
Consiste esta, numavenda de coisas determinadas, ainda que sujeitas a uma posterior
operação de contagem, pesagem ou medição56. Não se aplica as coisas genéricas, na
medida em que nesta estão em causa coisas indeterminadas (tantos kilowatts de
eletricidade ou vinte garrafas de vinho).

O art. 472.ᵒdo Cód. Comercial estabelece que (…) . Deste artigo pode-se retirar que
há um regime diferente de risco na venda por conta, peso ou medida, que corre por
conta do vendedor (enquanto for indeterminada) até que elas sejam contadas, pesadas
ou medidas, excepto se a contagem, pesagem ou medição não foi realizada por culpa do
comprador. O que faz supor que esta disposição se refere a coisas genéricas 57, sujeitas a
essa regra (art. 541.ᵒ) e, não de coisas determinadas sujeitas a contagem, pesagem ou
medição58 (arts. 887.ᵒ e ss.). Nestes termos a transferência da propriedade no contrato
mercantil de compra e venda de coisas sujeitas a contagem, pesagem e medição se opera
com a concentração (art. 408.ᵒ nᵒ 2 C.C.).

□ Os arts 887.ᵒa 891.ᵒvem estabelecer regras para determinação do preço59. Estas


regras visam a resolução do problema de eventuais discrepâncias (descoincidências)
entre a referência contratual e o resultado real da operação de contagem, pesagem e
medição. Ex:

Os efeitos dessa discrepância são diferentes conforme seja:

Venda ad mensuram o preço é estabelecido em razão de um tanto por cada unidade


vendida (venda por medida) (art. 887.ᵒ)60.

Ex: A vende o vinho de umaadega61 por 2.000 kzs a pipa62; indica-se a existência
de 20 pipas. Ao se realizar a operação de contagem na realidade existem apenas 19.

Vende-se um prédio rústico 1000 kzs o m2 ou vende-se o prédio rústico que se diz
medir 1 hectare, a 1000 kzs o m2. Quando se procede a medição só tem 800 m2. O
preço que resulta da multiplicação de cada unidade não coincide com o produto
declarado. Portanto, o preço será corrigido.

Venda ad corpus não se fixa agora o preço por unidade, mas sim um preço global,
embora se indique o número, peso e medida da coisa vendida (art. 888.ᵒ).

56
Por exemplo vender tantos acessórios de automóveis ou tantos kg de ouro ou tantos km2.
57
A compra e venda mercantil de coisa sujeita a contagem, pesagem ou medição não tem de ser
necessariamente genérica; pode vender-se uma coisa específica que vai depois, ser contada, pesada ou
medida. Nesse domínio a lei comercial remete para a lei civil (art. 3 da Cód. Comercial)
58
A diferença entre venda a esmo ou a partida por inteiro e venda sujeita a contagem, pesagem e medição
cfr. Art. 472.ᵒparágrafo 1º e 2º.
59
O requisito comum dos dois artigos é ser objecto de venda de coisa determinada.
60
O preço é fixado em razão de tanto por unidade, quando a declaração negocial fixa uma importância em
dinheiro por cada unidade de quantidade de coisa, de modo que o preço devido resulta da multiplicação
dessa importância pelo número de unidades (reais ou declaradas).
61
Adega é o lugar onde armazena vinho em garrafas, barris ou em barricas.
62
Pipa é uma vasilha grande de madeira usada para armazenar líquidos, ou seja é um barril.

26
Ex: vende-se um terreno que mede 1hectare por 10.000 kzs; ou vende-se uma
adega por 50.000.00, com a declaração de que nele existem 50 pipas.

Em ambos os casos, o preço devido é o global, embora a medida indicada não


corresponde a realidade. Pois entende a doutrina que o facto de as partes não terem
indicado o preço unitário, extrai-se a conclusão de que elas formaram a sua
vontade sobre o preço e a coisa globalmente consideradas, sendo apenas incidental
a referencia à quantidade, peso e medida.

Assim, nos termos do art. 888.ᵒnᵒ 1, se o terreno tiver 950 m2 ou adega tiver 49
pipas, o preço prevalece o declarado.

Entretanto, a uma excepção prevista no nᵒ 2. Assim, se a quantidade diferir em mais


de uma vigésima63, tanto o comprador como o vendedor tem o direito a um aumento ou
redução proporcional do preço. Se se afirmou que a adega tem 50 pipas quando a final
tem menos de ou mais de uma vigésima, haverá redução ou aumento.

Todavia, se a coisa for qualitativamente ou quantitativamente diferente da que


constitui objecto do contrato aplicam-se as regras do cumprimento defeituoso arts.
913.ᵒe ss. Ex: A vende um terreno que diz ter 1000 m2, para edificar um armazém, e só
tem 800 m2, pode aplicar-se o regime do cumprimento defeituoso, pois, foi entregue
uma coisa com características diferentes das asseguradas pelo vendedor.

Se houver erro de cálculo também não se aplica o regime da venda de coisas sujeitas
a pesagem, medição e contagem. Ex: A vende 1000 kg de cereal (obrigação genérica)
por 1.000 kzs, se constar que o preço é de 1.100.000, há divergência que se prevalece
pelo preço determinado pela multiplicação, que seria 1.000.000 kzs. Neste caso aplica-
se o art. 249.ᵒ.

O mesmo sucede se alguém se obriga a entregar 1000 kg de milho por 50.000 kzs., e
só entrega 800 kg aplica-se o arts. 793.ᵒe 802.ᵒ, cumprimento parcial.

Também não se aplica esta venda no caso de uma empresa fornecedora de energia
eléctrica, se houver um erro na facturação da energia consumida pelo cliente, não por ter
indicado um consumo diferente do real, depois de acertado o preço do quilovático, mas
por ter omitido um factor de cálculo do preço.

COMPENSAÇÃO64 ENTRE FALTAS E EXCESSOS

Vem prevista no art. 889.ᵒ

O objecto do contrato de compra e venda é constituído, nesta hipótese, por uma


variedade de coisas determinadas e homogéneas (análogas), com a fixação de um preço
unitário. Há um só contrato e não duas vendas distintas.

63
Vigésima é cada uma das vinte partes que se divide um todo. 20%
64
Vem prevista no art. 847.ᵒ, deriva do latim “pensare cum” e traz a ideia de balança com um peso em
cada um dos lados. Consiste na extinção reciproca de obrigações até a concorrência dos respectivos
valores entre pessoas que são devedoras uma da outra.

27
Ex: A vende por 10.000 kzs arroz e feijão existentes num celeiro e se destacar
que há nele 100 arrobas65de arroz e outras 100 de feijão. Se pela pesagem se
verificar que só há 90 de arroz e 110 de feijão haverá compensação. Não haverá
redução do preço ou aumento.

Já não será assim se no mesmo documento se vender por 1000 kzs, 100 barras
de ouro e 100 kg de milho e depois perceber-se que só tem 90 barras de ouro e 110
kg de milho, porque falta homogeneidade e parece haver contratos diferentes.

CADUCIDADE DA DIFERENÇA DO PREÇO(PRAZO)

Existem duas vicissitudes que extinguem um direito pelo não exercício durante
um certo lapso de tempo: a prescrição e a caducidade.

Na venda sujeita a medição, contagem ou pesagem, o prazo para correcção do


preço apenas ocorre com a caducidade, prevista nos termos do art. 890.ᵒ. O prazo é de
seis meses se se tratar de coisa móvel e um ano se for imóvel.

O prazo para caducidade conta-se a partir de um dos três momentos:

a) A partir da entrega;
b) Do momento em que a diferença se torne exigível, sendo esse momento
posterior a entrega (quando a contagem ou medição ser feita depois da entrega
ou haver prazo para o cumprimento desta obrigação);
c) Do dia em que o comprador receber a coisa de for enviada (nᵒ 2).

Não existe interrupção nem suspensão na caducidade.

RESOLUÇÃO

A resolução do contrato vem estabelecida no art. 891.ᵒ, Constituindo uma faculdade


atribuída apenas ao comprador, pois, só este poderá ter dificuldades em pagar o excesso
em relação ao preço convencionado. Alias, o vendedor estará em melhores condições de
apreciar o número, peso e medida.

4. VENDA A CONTENTO E VENDA SUJEITA A PROVA


Tais vendas vem previstas nos artigos 923.ᵒa 925.ᵒdo C.C. e 469.ᵒe 470.ᵒdo Cód.
Comercial66.

A venda a contendo é o contrato de compra e venda que depende da aprovação


subsequente do comprador, isto é, feito sob reserva de a coisa agradar a este67. Ex:

65
É uma unidade de medida que corresponde à 15 kg.
66
A compra e venda a contento comercial não vista, à condição resulta da natureza do contrato. Nas
outras, depende de convenção.
67
A venda a contento é comum ser feita nas vendas por catálogo.

28
A venda sujeita a prova é aquela que fica condicionada ao resultado de um exame
a fazer, destinado a averiguar a aptidão do objecto à satisfação do fim a que se
destina e a existência, nele, das qualidades asseguradas pelo vendedor. Ex:

A diferença reside no facto de que na venda a contendo o comprador reserva a


faculdade de contratar, ou de resolver o contrato, consoante a sua apreciação subjectiva
(o seu gosto pessoal)68; na venda sujeita a prova esta em causa uma avaliação objectiva
do comprador em relação às qualidades ou idoneidade da coisa em conformidade com
um teste a que esta será sujeita por um perito, experiência ou inspecção.

VENDA A CONTENTO

a) Primeira modalidade de venda a contento


Esta modalidade vem prevista no art. 923.ᵒ, e implica a estipulação de que a coisa
vendida terá que agradar ao comprador, corresponde à tradicional cláusula ad gustum.

No regime do nosso código civil, esta modalidade não se trata de uma verdadeira
venda, porque não há contrato, traduzindo apenas uma proposta e cabe ao comprador
aceitar ou não.

Porém, ao contrário do que geralmente sucede, a lei admite a celebração do contrato


através do silêncio (art. 218.ᵒ) se o comprador não se pronunciar dentro do prazo (228.ᵒ
e 923.ᵒ nᵒ 2)69.

Entretanto, a lei estabelece que a coisa deve ser facultada ao comprador para exame
(art. 923.ᵒ nᵒ 3), pelo que, se a coisa não for entregue o prazo para aceitação não conta.

b) Segunda modalidade de venda a contento70


Esta venda vem prevista no art. 924.ᵒ, constituindo um verdadeiro contrato de
compra e venda sujeito a condição resolutiva potestativa em relação ao comprador.

Se a coisa não agradar o comprador, tem o direito de resolver o contrato nos termos
do arts. 432.ᵒe ss. do C.C. e 470.ᵒdo Cód. Comercial , mantendo-se esse direito ainda
que o bem tiver sido entregue. (cfr. o nᵒ 3).

Relativamente ao risco é aplicável o disposto no art. 796.ᵒnᵒ 3 1ª parte (condição


resolutiva).

VENDA SUJEITA A PROVA

68
A degustação (experimentar, provar) não corresponde a um direito de arrependimento
69
Estas regras não se aplicam nas vendas catalogadas, por força do regime da defesa do consumidor. De
contrário seria uma espécie de venda forçada, porque seria uma forma de pressionar os compradores a
darem uma resposta.
70
A venda a contendo se relaciona com a venda à consignação (contrato estimatório), em que a coisa
comprada (normalmente livros, revistas, artigos de artefactos ou géneros alimentícios) pode ser devolvida
se o comparador, num certo prazo, não conseguir revender, com direito a reaver o preço pago ou, não
sendo efectuado o pagamento, deixa de ser devida a prestação do preço. ROMANO MARTINEZ, p. 78

29
Na venda sujeita a prova o contrato não se considerará definitivo enquanto o
comprador não averigue, através do prévio uso da coisa, se é idónea para o fim a que
destina ou tem as qualidades asseguradas pelo vendedor, não importando se a coisa o
agrade. Trata-se também de uma venda sob condição suspensiva ou resolutiva (art.
925.ᵒ).

Se apresentar aquelas qualidades ou fim a que se destina o contrato se considera


celebrado desde a sua celebração (efeito retroactivo).

A prova sobre as qualidades ou fim devem ser feitas nos prazos estabelecidos no
nᵒ 2, bem como comunicar ao vendedor o resultado da prova, nᵒ 3.

Em caso de dúvida sobre a modalidade de venda cfr. art. 926.ᵒ.

5. VENDA A RETRO71

A venda a retro vem regulada no C.C. nos arts. 927.ᵒe ss., que, no entanto, era proibida
pelo C.C. de Visconde Seabra.

Venda a retro é a cláusula pela qual o vendedor se reserva o direito de, no fim
de certo prazo, desfazer o contrato e reaver a cousa vendida, restituindo o preço
recebido (CUNHA GONÇALVES, Da compra e Venda, 2ª ed. p. 475).

A venda a retro implica a faculdade de resolução da venda anterior por


simples declaração de vontade do vendedor, obrigando por isso à entrega do preço
primitivo e determinando a caducidade dos direitos entretanto constituídos sobre a
coisa (ANTUNES VARELA, Das obrigações, p. 278).

O efeito prático da venda a retro é a reaquisição da coisa pelo vendedor, por


mera vontade deste e sem necessidade de novo contrato entre os mesmos contraentes,
em sentido inverso ao primeiro (RAÚL VENTURA, pág. 643).

A natureza jurídica da venda a retro trata-se na verdade de uma condição


resolutiva potestativa (direito potestativo) a exercer pelo vendedor72.

A figura da venda a retro fundamentou-se com o interesse de tutelar a situação


do proprietário que, devido à necessidades financeiras, se vê na necessidade de alienar
um bem (em vez de um crédito hipotecário ou penhor), todavia, mantem o interesse em
reaver, tao logo a sua situação financeira melhore.

A venda a retro tem sido considerada em termos económicos não como uma
compra e venda, mas como função creditícia em relação ao vendedor e uma garantia em
relação ao comprador. Efectivamente, o contrato se apresenta como uma operação de
financiamento na qual o pagamento do preço substitui a concessão de um empréstimo
71
Difere-se da retro-venda o designado pactum retro-vendendo pois esta produz eficácia meramente
obrigacionais, vinculando o comprador a revender a coisa ao vendedor.
72
DE MARTINI, ROMANO MARTINEZ, entre outros. Contra BIANCA, PEDRO DE
ALBURQUERQUE, MENEZES LEITÃO, trata-se de uma revogação ou resolução do contrato; para
OUTROS GORLA, BARASSI, trata-se de propriedade temporária ou resolúvel.

30
pelo comprador ao vendedor, e o direito de resolução substitui o reembolso desse
mesmo empréstimo.

Por força da sua configuração financeira a venda a retro tem sido questionada,
uma vez que através dela pode-se esquivar-se da proibição dos pactos comissórios 73,
previsto nos arts. 694.ᵒ, 695.ᵒ, 698.ᵒe 753.ᵒ, bem como pode também resultar em negócio
usurário se se acordar que em caso de resolução o vendedor ter que pagar um preço
muito alto. Acresce RAÚL VENTURA que também pode resultar em simulação,
por dissimular um mútuo com garantia real.

Quanto a forma, a venda retro segue a mesma forma para o contrato. Deve ser
registada (art. 932.ᵒ)

Quanto ao seu regime cfr. arts. 928.ᵒ (cláusulas invalidas); 929.ᵒ (prazos); 930.ᵒ
(modo de resolução74 ); 435.ᵒ (efeitos da resolução) e art. 931.ᵒ

6. VENDA A PRESTAÇÕES

A venda a prestações vem regulada nos arts. 934.ᵒe ss. do C.C.

Venda a prestações é aquela em que o preço devido corresponde a uma prestação


unitária, que é fraccionada e escalonada no tempo no que respeita ao cumprimento.
Representa uma possibilidade da compra e venda de execução continuada.

Trata-se de vendas muito divulgadas nas sociedades de consumo manipuladas por


poderosas organizações capitalistas, para em dadas circunstâncias, não permitir a
resolução por falta de pagamento de uma só prestação. Neste tipo de venda visa-se
proteger o comprador.

Corresponde um tipo de venda a crédito. A venda a crédito distingue-se da compra


e venda em que o comprador recorreu ao crédito (crédito para habitação ou
automóvel), porque, nesta última, na verdade existe uma união ou coligação de
contratos75 (mútuo e compra e venda). Ou seja na venda a crédito com recurso ao
crédito bancário, o comprador celebra contrato de mútuo e outro de compra e venda,

73
Pacto comissórioé convenção estabelecida entre o credor e o devedor, em virtude da qual se permite
ao credor apropriar-se directamente da coisa dada como garantia, perante a obrigação assumida pelo
devedor. O art. 694.ᵒdefine-o “é o acordo segundo o qual o credor faz sua a coisa onerada se, no caso de o
devedor não cumprir”. Esta proibição está prevista na lei civil a respeito da hipoteca, regime
paradigmático das garantias reais e é, ainda aplicável por remissão do art. 678.ᵒem sede de consignação
de rendimentos (art. 665.ᵒ) e de penhor (art. 678.ᵒ). O pacto comissório é nulo por força do art. 280.ᵒnᵒ 1 e
294.ᵒ. É proibida também no direito alemão pág. 1229.ᵒe no pág. 1149.ᵒ, na Espanha art. 1859.ᵒ, Itália art.
2348.ᵒ. Os pactos comissórios são negócios celebrados em fraude a lei.
74
Esta disposição determina que a resolução deve ser feita por notificação judicial avulsa- é um meio que
serve para, através do tribunal, dar a conhecer a alguém de um acto ou facto em que não existe acção
pendente.
75
Haverá união de contratos quando os contratos estão ligados entre si de acordo com a intenção das
partes, todavia mantêm a sua individualidade. Ao contrário dos contratos mistos, aqui não a fusão dos
contratos. A união pode ser interna, externa e alternativa.

31
podendo eventualmente, os dois contratos estarem coligados; esta situação ocorre
sempre que o empréstimo é feito em função de uma compra e venda determinada, em
particular, quando o preço é pago directamente pelo mutuante ao vendedor. Ao
contrário, a compra e venda a crédito existe um único negócio em que o vendedor
assume as vestes similares às do mutuante, aceita receber o preço ou parte dele mais
tarde; todavia, o vendedor não empresta dinheiro ao comprador, característico do mútuo
(art. 1142.ᵒ).

O art. 934.ᵒtem uma construção elegante, todavia, peca por começar da hipótese mais
específica para a hipótese mais ampla. A reserva de propriedade resulta de convenção,
mas não é exclusiva da venda a prestações conforme resulta da sua segunda parte. Esta
disposição refere-se a venda a prestações com ou sem reserva de propriedade.

A compra e venda a prestações comporta dois regimes para resolução do contrato na


hipótese de incumprimento:

A primeira circunstância incluída na previsão legal do art 934.ᵒé a de ter havido reserva
de propriedade (cfr. 409.ᵒ). Compreende-se essa exigência, pois, se houver transferência
de propriedade, deixa de ser possível, a resolução do contrato por falta de pagamento do
preço, nos termos do art. 886ᵒ.

Assim, para que o vendedor não possa resolver o contrato é necessário:

a) Que falte o pagamento de uma só prestação;


b) Que a coisa tenha sido entregue ao comprador. Se não for entregue, aplica-se as
regras gerais sobre o incumprimento e a mora.
c) Que se trate de uma só prestação e esta não exceda a oitava parte do preço
(mesmo que seja a 2ª ou 3ª vez que o comprador incorra em semelhante falta)
ex: vende-se a prestações um automóvel por 50.000; 50.000/8=6250.

Mas se estiverem em divida duas prestações, mesmo que de valor inferior a um oitavo
do preço, o comprador pode resolver o contrato.

O outro regime vem previsto no art 781.ᵒ (cfr.) (por força da parte final do art. 934.ᵒ,
quando se fere a perda do benefício do prazo).

Nos termos deste artigo é necessário que a prestação exceda um oitavo, para que se
exija a exigibilidade antecipada (de todas as prestações em falta).

Faltando o comprador ao pagamento de uma prestação superior a um oitavo do preço, o


vendedor procederá a uma interpelação admonitória76, exigindo o pagamento das
prestações vincendas. A partir desse momento o comprador entra em mora
relativamente a todas as prestações não pagas, mora essa que poderá se transformar em

76
Interpelação admonitória consiste numa intimação formal, do credor ao devedor moroso, para que
cumpra a obrigação dentro de prazo determinada, com expressa advertência de se considerar a
obrigação como definitivamente incumprida

32
incumprimento definitivo depois de decorrido o prazo admonitório (é o que e consta da
interpelação) (art. 808.ᵒ), podendo o comprador resolver o contrato.

A excepção aberta no art. 934.ᵒao regime geral da venda a prestações reveste carácter
imperativo. A expressão final do texto legal “ sem embargo de convenção em
contrario”, deve entender-se “ não obstante convenção em contrário, ou ainda que haja
ou mesmo haja convenção em contrário”.

Cláusula penal

A cláusula penal é genericamente permitida no art 810.ᵒ, como modo de fixação prévia
da indeminização pelo incumprimento.

O art. 935.ᵒnᵒ 1 estabelece uma limitação quanto à estipulação da cláusula penal,


considerando que esta não pode exceder a metade do preço. Se a cláusula exceder
aquela metade será considerada usuraria ou se as prestações pagas ultrapassarem o valor
indemnizatório e se tiver convencionado a sua não restituição, portanto, haverá redução
nos termos dos arts. 812 e 935.ᵒn 2.

Ex1: A vende um automóvel por 1000 kzs, e se estipulou que no caso de não
cumprimento, pagaria a título de indeminização 700 kzs. Em caso de inadimplemento
proceder-se-á a redução até 500 kzs

Ex2:A vendeu um automóvel a prestações por 1000 kzs, e se estipulou que no caso de
não pagamento integral, o comprador perderia as prestações pagas. Pagaram-se 600 kzs.
Em princípio, o vendedor terá de restituir 100 kzs e ficaria com 500 kzs, em harmonia
com o disposto no nᵒ 2 1ª. Se porém, os seus prejuízos forem superiores (o automóvel
pode já não valer nada), mesmo sem convenção, o comprador tem direito a ser
indemnizado até 600 kzs recebidos.

Aplicação do regime a outros contratos art. 936.ᵒ (ex: contrato de empreitada a


prestações). O nᵒ 2 estabelece um caso especial de locação venda.

7. LOCAÇÃO VENDA

Locação venda vem prevista no art. 936.ᵒnᵒ 2.

Ex: A arrenda uma casa a B, e estipulasse que com a última renda se transfere a
propriedade do imóvel.

Esta é uma hipótese corrente, especialmente em certos domínios públicos, muito


próxima de uma modalidade do contrato de leasing77.

Trata-se na verdade de união alternativa de contratos78.

77
Também designado em por crédt-bail, locazione financeira, arrendamento mercantil. O leasing traduz-
se aparentemente numa locação a médio ou a longo prazo, completada com a faculdade (ou opção) de
compra na qual se tomam em conta as rendas ou alugueis já pagos pelo comprador (ORLANDO
GOMES E A. VARELA, Direito Economico, p272).

33
Com esta venda pretende-se evitar que o locatário-comprador, usurariamente, perca
tudo aquilo que pagou, quer a título de renda, quer de preço de uma compra; por outro
lado, que locador-vendedor sofra prejuízo por ter a casa improdutiva e a deteriorar-se
durante certo lapso de tempo.

Se for resolvido o contrato serão devolvidas as rendas e alugueres pelo locador, pois,
esta produz efeitos retroactivos; podendo ser indemnizado pela deterioração da coisa
(Ao contrário da renda resolúvel, em que não há restituição das rendas pagas).

8. VENDA SOBRE DOCUMENTOS

Vem prevista no art. 937.ᵒ. Nesta venda, a entrega da coisa é substituída pela entrega
do título representativo79 e dos documentos exigidos pelo contrato, ou, no silêncio
deste, pelos usos (BAPTISTA MANCHADO, Do Contrato de Compra e Venda, 1971,
221.)

É frequente no âmbito comercial, sobretudo, em matéria de títulos de crédito, muitas


vezes comprovativo do embarque, em determinado porto, da mercadoria vendida, é rara
no campo civil. A obrigação de entregar a coisa é substituída pelo respectivo título
representativo do direito, sem necessidade de demostrar a existência física dos bens;
basta apresentar o documento que representa a propriedade.

Título (aquisitivo) importa também a transferência da propriedade sobre as coisas


depositadas ou transportadas ao comprador e legitima o levantamento das respectivas
mercadorias directamente ao transportador ou depositário.

Esta substituição é determinada, em regra, pelo facto de a coisa se encontrar em poder


de terceiro que a detém por conta do vendedor, ou ser produzida no estrangeiro.

A doutrina dominante quanto a venda sobre documentos defende que, o objecto da


venda não são os documentos, mas as coisas a que estes se referem, sendo que o direito
incorporado no título constitui unicamente o crédito à entrega dessas coisas e não a
propriedade das mesmas80. A transmissão da propriedade e transferência do risco
sujeita-se as regras gerais.

9. VENDA DE COISA EM VIAGEM

A venda de coisa em viagem vem regulada no art. 938.ᵒdo C.C. Na verdade, constitui
uma hipótese especial de venda sobre documentos, na medida em que, para sua
validade basta a entrega dos documentos relativos as coisas vendidas em viagem. A

78
Verifica-se quando se celebram dois contratos, mas em termos tais que, conforme se considerará
celebrado, desde o inicio, só um deles ou só o outro. São contatos realizados sob condição.
79
São representações de bens ou mercadorias
80
MENEZES LEITÃO, p. 84

34
coisa a entregar encontra-se em trânsito de um lugar para outro, não tendo, como é
óbvio, ainda disponibilidade material.

Para que a venda seja considera em viagem, em primeiro lugar é necessário que nele
(documento) seja mencionada essa circunstância, conhecida pelas partes, e tenha
sido entregue ao transportador. Porém, se a coisa não tiver sido entregue ao
transportador ou expedidor ou pessoa indicada para a execução do acto, é então
aplicável o disposto no art. 797.ᵒ (promessa de envio)81.

A lei sujeita o contrato as seguintes regras:

A) Se a coisa alienada se tiver perdido acidentalmente (fortuitamente), depois de


entregue ao transportador, o preço é devido, mesmo que o contrato tenha sido
celebrado depois da perda (al. a)). Ex: vende-se mercadoria que se supõe em
viajem por terem sido entregues ao transportador, porém, o um furacão
arrastou o navio para o fundo do mar. Entretanto, isso só ocorre se for
entregue ao comprador apólice de seguro da mercadoria em viagem (cfr. nᵒ 1).
Neste caso o risco transfere-se para o comprador (al. c)).
B) Nos termos da alínea b) se após ao momento da entrega a coisa apresentar um
defeito provocado acidentalmente, o comprador não poderá também anular o
contrato (R. MARTINEZ fala em resolução).
C) Cfr. nᵒ 2 do art. 938.ᵒ. Neste caso não é havido o preço e, o comprador pode
anular o contrato com fundamento nos defeitos dela, nos termos dos arts. 913.ᵒe
ss.
D) Cfr. n 3 do art. 938.ᵒ

10. COMPRA E VENDA COMERCIAL

Constitui igualmente uma modalidade específica de compra e venda a compra a venda


comercial, regulada nos arts 463.ᵒa 476.ᵒ.

As hipóteses de venda comercial vem enumeradas exemplificativamente no art. 463.ᵒ.


Um aspecto salta a vista; a venda será comercial nas situações em que se pretende
revender e não para consumo final e, uma das partes tem de ser comerciante.

A compra e venda não será comercial sempre que se verificar uma das hipóteses
previstas no art. 464.ᵒ. Nos termos do nᵒ 1, ainda que a compra seja efectuada por
comerciante para consumo e depois revender, será não comercial.

Actualmente algumas normas do Cód. Comercial de 1888, são dispensáveis, na medida


em que o C.C. veio regular genericamente essas matérias que anteriormente eram
específicas do Cód. Comercial. São, por exemplo, os arts. 465.ᵒ (contrato para pessoa a
nomear); 466.ᵒ (determinação do preço); 469.ᵒ (venda sobre amostra); 467.ᵒ (venda de
coisas incertas ou de esperanças).

11. VENDA CELEBRADA FORA DO ESTEBELECIMENTO COMERCIAL


81
PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, p. 234-235

35
Abrange a compra e venda a distância, ao domicílio, automática, esporádica, em cadeia
forçada, com vista protecção do consumidor. São vendas especiais.

a) Venda a distância ou por correspondência82

A venda a distância é aquela em que as coisas são apresentadas aos potenciais


compradores por via de imagens, através dos variados meios de comunicação.

A venda a distância é uma modalidade de distribuição comercial a retalho; entretanto,


ao contrário da venda ao domicílio (porque nesta não há encomenda), a iniciativa
negocial cabe ao comprador, pois foi o consumidor (comprador) que encomendou
os bens ou serviços que se encontravam publicitados. São vendas realizadas por
correio ou correspondência, por catálogos, telefone, revistas, televisão ou televenda ou
teleshoping83, vídeo texto, por Internet ou cibervenda, etc.

O consumidor tem a iniciativa negocial e utiliza uma ou mais técnicas de comunicação a


distância quer na negociação como na celebração do contrato.

É um contrato celebrado sob condição resolutiva, pois, o comprador pode resolver


(sem exigência de forma 436.ᵒ nᵒ 1) o contrato. Os riscos correm por conta comprador,
art. 796.ᵒnᵒ 3 do C.C.

b) Venda ao domicílio84

A venda ao domicílio é aquela em que o fornecimento de bens e serviços é proposto e


concluído no domicílio do consumidor, pelo fornecedor, sem que tenha havido pedido
expresso pelo consumidor.

Corresponde às situações em que, sem ter feito qualquer encomenda, aparece um


vendedor à porta do consumidor, propondo-lhe a aquisição de determinados bens.

Ex: alguém aparece a vender computadores, espelhos, ou outro tipo de bens.

Neste contrato a lei procura proteger o consumidor por se encontrar numa posição mais
frágil, pois, é apanhado de surpresa no domicílio sem poder aferir com precisão as
características da coisa nem pode fazer comparações com coisas semelhantes (dai que
pode resolver depois de 14 dias, Portugal).

O domicílio pode ser qualquer lugar fora do estabelecimento comercial; pode ser o
geral, profissional, de eleição, residência ocasional ou o lugar onde se encontrar (casa de
um amigo).

Em Portugal esta sujeito, esse contrato, a forma escrita.

82
Art. 14.ᵒ b) da Lei nᵒ 1/07, de 14 de Maio, LEI DAS ACTIVIDADES COMERCIAIS
83
Televenda é a venda realizada através de televisão, com vista ao fornecimento de produtos ou
prestação de serviços mercantis, incluindo bens imóveis, direitos e obrigações, mediante retribuição
art. 4.ᵒnᵒ 36
84
Art.4.ᵒ nᵒ 41 e 14.ᵒ a).

36
c) Venda automática

A venda automática é aquela em que o bem é colocado a disposição do consumidor


para adquirir mediante utilização de qualquer tipo de mecanismo de pagamento
antecipado do seu preço. Ex: compras efectuadas nos multibancos

d) Venda esporádica (acidental)

São aquelas realizadas de forma ocasional fora do estabelecimento comercial, em


instalações ou espaços privados especialmente contratados ou disponibilizados para o
efeito. Ex: Vendas realizadas nas feiras.

e) Venda em cadeia e forçadas ou em sistema de pirâmide ou de bola de neve

Essas vendas estão proibidas em Portugal. São aqueles em que o preço será reduzido
ou excluído se o comprador recrutar (angariar) compradores interessados em
adquirir os mesmos bens àquele vendedor.

f) Venda ambulante

Nos termos do art. 4.ᵒnᵒ 38 é aquela realizada fora do estabelecimento comerciai


permanente de forma habitual, ocasional, periódica ou continuada em perímetros ou
locais devidamente autorizados, instalações comercias desmontáveis e transportáveis,
incluindo roulottes.

37
PERTUBAÇÕES TÍPICAS DO CONTRATO DE COMPRA E
VENDA

VENDA DE BENS ALHEIOS


A venda de um bem pertencente a outrem implica consequências de vária ordem.
Pode constituir ilícito penal, mais concretamente um crime de burla, p. e p., pelo art.
450.ᵒdo Código Penal, caso o agente (vendedor ou comprador), visando obter para si ou
para terceiro enriquecimento ilegítimo, determinar a contraparte, por meio de erro ou
engano sobre os factos que astuciosamente provocou, à celebração do contrato que lhe
cause prejuízo patrimonial. Por outro lado, pode a venda de um bem alheio
consubstanciar-se, por força do art. 453.ᵒ Código Penal, num crime de abuso de
confiança, pois a alienação pode prefigurar a apropriação ilegítima do bem que tinha
sido entregue ao vendedor por título não translativo da propriedade (por exemplo um
comodato, depósito).

A venda de bens alheios constitui uma perturbação típica do contrato de compra


e venda prevista nos arts. 892.ᵒa 904.ᵒdo Código Civil e art 467.ᵒdo Cód. Comercial.

O Código Civil não nos apresenta um conceito de venda de coisa alheia.

A venda de bens alheios ocorre sempre que o vendedor não tem legitimidade
para realizar a venda, como sucede no caso de a coisa não lhe pertencer, ou de o
direito que possui sobre ela não lhe permitir a sua alienação (usufrutuário que aliena o
direito de propriedade sobre a coisa).

Falta legitimidade e nem sequer há representação. Nemo dat quod non habet
(ninguém dá o que não tem). Na venda de bens alheios o objecto é legalmente
impossível (art.280.º)

A venda de bens alheios tem como fonte a antiga garantia contra a evicção do
direito romano que segundo a qual, o vendedor, em consequência do contrato de
compra e venda, garantiria ao comprador a posse pacífica da coisa vendida,
respondendo objectivamente se esta viesse a ser perturbada por uma pretensão real
apresentada por terceiro.

Todavia, existem casos em que não se aplica o regime da venda de bens alheios,
designadamente:

A) Não constitui venda de bens alheios se as partes atribuíram a qualidade de


venda de bens futuros relativamente (arts.893.º e 880.º).

38
B) Alienação de bem como pertencente a outrem (cfr. art. 904.º). Não é
venda de bem alheio se se verificar a hipótese de gestão de negócios
representativa (464.º, 471.º, 268.º e 269.º)
C) Vendas executivas nos termos dos arts. 889.ᵒe ss. do Código de Processo
Civil,
D) Antecipação de venda em relação aos credores pignoratícios art. 674.ᵒ,
E) Nas vendas de coisas fora do comércio sendo estas, segundo o n.º 2 do art
202.º, do Código Civil aquelas que são insusceptíveis de apropriação privada
individual (o mar, baldios85).
F) E também não se aplica na venda de coisas indeterminadas enquanto
permanecerem nessa qualidade.

PRESSUPOSTOS

Aplicação do regime da venda de bens alheios depende de dois pressupostos: A


boa-fé de um dos contraentes e a falta de legitimidade do vendedor para dispor.

Quanto ao primeiro a boa-fé (subjectiva ou de crença) consiste apenas no


desconhecimento da falta de legitimidade do vendedor. A aplicação das regras dos
arts. 892.ᵒe ss do C.C., requer que uma das partes não conheça a alienidade do bem
no momento da celebração do contrato.

A falta de legitimidade pressupõe que o vendedor terá de vender a coisa


alheia como própria, no seu próprio interesse. Assim, ensina PESSOA JORGE, se
o vendedor de coisa alheia estiver autorizado pelo proprietário desta a vende-la
(mandatário com representação) a venda é válido e à obrigação de entregar a
coisa.

Mesmo faltando legitimidade, a lei em certos casos, por razões de tutela da


aparência, vem considerar válida alienação nos casos do art. 2076. ᵒnᵒ 2, 291.ᵒ, na
venda tabular se o terceiro registar art. 7.ᵒ Código de Registo Predial.

O CONTRATO PROMESSA DE VENDA DE COISA ALHEIA

Nas obrigações em geral foram estuda a noção e modalidades de contrato


promessa.

Também ficou sabido que o art. 410.º nº 1, manda aplicar ao contrato promessa
todas as disposições legais relativas ao contrato prometido, por outro lado, o mesmo
preceito, in fine, salvaguarda as regras que, por razão de ser, não devam considera-se
extensivas ao contrato promessa (bem quanto a forma, n.º 2).

85
Baldios são terrenos não individualmente apropriados, destinados a servir de logradouro comum dos
vizinhos de uma povoação ou grupo de povoações com vista a satisfação de certas necessidades
individuais. Ex: terrenos para pastorícia, recolha de lenha. Os baldios não fazem parte do domínio
privado nem das autarquias locais nem do domínio público do Estado, integrando-se no sector
comunitário.

39
Neste sentido, é da máxima importância apurar se a ratio das regras relativas à
venda de coisa pertencente a outrem permite aplicação das mesmas à promessa de
venda de coisa alheia.

Parece não haver razão nenhuma que impeça a celebração de um contrato


promessa de venda de coisa alheia. Parece-nos que é válida a promessa de venda de um
direito, cuja titularidade ainda não pertence ao promitente.

O vício que parece afectar a compra e venda de coisa alheia não é


comunicável ao contrato promessa. É certo que o promitente vendedor não tem
legitimidade para dispor do bem no momento em que celebra o contrato promessa.
Contudo, a translatividade não é um efeito necessário neste tipo contratual , já que o
promitente não transfere o direito de propriedade, apenas se obriga a vende-lo.

Sublinha VAZ SERRA que o objecto do contrato promessa não é legalmente


impossível, visto que, até a celebração do contrato de compra e venda, pode o
promitente adquirir legitimidade para vender.

Se pelo contrário o promitente-vendedor não adquiriu o bem, fica


impossibilitado de o alienar. Esta impossibilidade é meramente subjectiva, o que, à
luz do direito angolano, não afecta a validade do contrato.

No entanto, com o incumprimento do contrato promessa, fica impossibilitada a


execução específica, por força da parte final do nᵒ 1 do art. 830.ᵒ (Acórdão do Tribunal
Supremo Português de 1997 de 11 de Novembro e ALMEIDA COSTA.)

EFEITOS (REGIME)

a) Nulidade

O nosso legislador consagrou, por influência do Direito Francês, a solução da


nulidade para venda de bens alheios.

Tratando-se de nulidade, ela pode ser invocada por qualquer interessado (art. 286.ᵒ)
e um dos interessados é o próprio proprietário que pode até intentar acção de
reivindicação de propriedade (art. 1311.ᵒ) ou por via de uma acção de restituição da
posse (art. 1278.ᵒ)86.

Relativamente a legitimidade para arguir (286.ᵒ) e a obrigação de restituir (art.


289.ᵒ), a venda de bens alheios comporta regras específicas.

Quanto a legitimidade para arguir cfr. ar. 892.ᵒin fine. O vendedor não pode opor
a nulidade ao comprador de boa-fé (não importa se o vendedor esteja de boa ou má fé).
Por outro lado, o comprador que se comportou com dolo (art.253.ᵒ) não pode opor
contra o comprador (afasta-se do regime geral em que qualquer interessado pode

86
Contra, MENEZES LEITÃO, para este o proprietário só pode intentar acção de reivindicação de
propriedade, pois o contrato para ele será sempre ineficaz por força do art. 406.ᵒnᵒ 2, p. 93-94

40
invocar a nulidade, constituindo assim uma nulidade atípica). Estas limitações
impostas são ditadas por compreensíveis razões de moralidade e justiça87.

Relativamente a obrigação de restituição comporta regras especiais, distintas do


art. 289.ᵒ. Assim, o comprador de boa-fé que não poder restituir a coisa comprada,
porque por exemplo se perdeu ou danificou, e não lhe é imputável, tem ainda assim o
direito a restituição do preço global (art. 894.ᵒ nº 1). Porque ao julgar que o direito sobre
a coisa lhe pertence, não se lhe pode exigir cuidados. Mas se toma conhecimento do
vício da venda, se a coisa estiver em seu poder, tem o dever de guardar e conservar,
como se fosse depositário88

Cfr. N.º 2 – se por exemplo ter obtido uma indemnização por dano causado nos
referidos bens ou o pagamento dum seguro pela perda ou deterioração deles, será
compensado com o montante à haver pelo o vendedor. O fundamento de evitar o
enriquecimento sem causa do comprador.

b) Convalidação89 do negócio

Artigo. 895.ᵒ (nulidade atípica). Assim, se o vendedor adquirir a propriedade da


coisa por qualquer título (por negócio entre vivos, sucessão mortis causa, usucapião ou
acessão, artigo 1316.º). Não há necessidade de praticar qualquer acto (a convalidação é
automática).

Porém, a convalidação não será procedente se verificar-se uma das hipóteses


previstas no art. 896.ᵒ.

c) Obrigação de convalidar o contrato

Vem estabelecida no art. 897.ᵒ. Quando o comprador está de boa-fé tem direito a
que o efeito translativo que não resultou automaticamente da celebração do contrato,
venha posteriormente a ser produzido, adquirindo um direito de crédito sobre o
vendedor que este proceda à aquisição do bem, o que determina a convalidação do
contrato e a consequente transmissão da propriedade para o comprador no termos do art.
895.ᵒ.

O cumprimento desta obrigação dependerá da concordância do titular do direito, se


este não poder ou não quiser alienar, nada pode fazer o vendedor.

87
GALVÃO TELLES, Contratos Civis, 1984, p 20.
88
PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, p. 187
89
Recuperar o negócio. É a correcção ou ratificação dos vícios ou defeitos de um acto. É o
saneamento do acto jurídico.

41
d) Indemnizações

Indemnização em caso de dolo art. 898.ᵒ

Independentemente do direito a restituição integral do preço, o comprador de


boa-fé tem ainda o direito a uma indemnização (arts. 562.ᵒ e ss.) se o vendedor agir
dolosamente (art. 253.ᵒ) não convalida a venda nos termos do art. 894.ᵒ, bem como se
vier a convalidar.

Esta indemnização resulta do interesse contratual positivo dado o facto de o


contrato não ter sido válido desde o início, caso haja Convalidação. Será pelo interesse
contratual negativo (dano negativo) pela culpa na celebração de um contrato inválido,
art. 227.ᵒ se o contrato não for convalidado e ser nulo.

Indemnização no caso de não houver dolo nem culpa art. 899.ᵒ

Ocorre também independentemente do direito a restituição integral do preço se o


contrato não for convalidado. O fundamental que o comprador esteja de boa-fé,
independentemente de culpa (responsabilidade objectiva). Atende-se apenas aos danos
emergentes (art. 564.ᵒ nᵒ 1) e que não resultem de despesas voluptuárias (art. 216.ᵒ nᵒ 3).

Indemnização pela não convalidação da venda art. 900.ᵒ

A indemnização a que se refere esse artigo não resulta directamente da venda de


coisa alheia, mas o não cumprimento da obrigação de sanar a nulidade da venda ou
mora no seu cumprimento. Esta ocorre por força do disposto no art. 897.ᵒ (não
cumprimento ou mora da obrigação de convalidação arts. 798.ᵒe 804.ᵒ).

O nᵒ 1 pressupõe acumulação de indemnizações, por exemplo, o caso previsto no


art. 899.ᵒ: à indemnização pelos danos emergentes resultantes da nulidade do contrato,
acresce a obrigação de indemnizar pelo não cumprimento da obrigação de convalidar.
Se o prejuízo for comum apenas haverá uma indemnização. O n.ᵒ 2 cfr.

GARANTIA DO PAGAMENTO DAS BENFEITORIAS

Vem prevista no art. 901.ᵒ, e fixa uma obrigação solidária para o vendedor, seja
ou não culpado. O pagamento das benfeitorias vem previsto no art. 1273.ᵒ.

Assim, o comprador, na venda de bens alheios, sendo a posse titulada do bem


(art. 1259.ᵒ), terá direito a exigir do proprietário a restituição das benfeitorias
necessárias ou úteis estando de boa ou má-fé, podendo até ter direito de retenção sobre a
coisa (art.754.ᵒ), excepto se estiver de má-fé.

Se o vendedor pagar, em vez do direito de regresso, fica sub-rogado nos direitos


do comprador em relação ao dono da coisa90 (art. 592.ᵒ nᵒ 1).

CASOS ESPECIAIS DE VENDA DE BENS ALHEIOS

90
PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, p. 193-194

42
Venda de bens parcialmente alheios: esta hipótese vem prevista no art. 902.ᵒ.
Compreende as hipóteses de venda em que vende-se um prédio, mas o logradouro
pertence ao vizinho. Nestes casos aplicam-se as disposições antecedentes à parte nula, e
o preço será reduzido proporcionalmente nos termos do art. 292.ᵒ.

Venda de coisa indivisa: São as hipóteses em que sobre a coisa existe


compropriedade e o vendedor aliena toda a coisa, quando na verdade é dono apenas de
uma quota abstracta da mesma.

A lei apenas admite a alienação total da coisa com o consentimento unânime dos
comproprietários (arts 1408.ᵒ e 2091.ᵒ), apenas permitindo a alienação isolada de quota
– respeitando o direito de preferência -, (arts. 1408.ᵒ nᵒ 1 e 2124.ᵒ), obviamente, haverá
falta de legitimidade nos termos do art. 892.ᵒ.

Tal alienação constitui venda de bem alheio nos termos do art. 1408.ᵒnᵒ 2. 91
Assim, haverá uma nulidade total do negócio, salvo se o vendedor vier a adquirir as
quotas dos demais comproprietários (895.ᵒ).

O art. 903.ᵒvem estabelecer algumas restrições a possibilidade de acordos que


afastem o regime da venda de bens alheios.

A compra e venda comercial de bens alheios vem prevista no art. 467.ᵒnᵒ 2. No


âmbito do direito comercial não há motivos para a invalidade do negócio, por causa da
celeridade e tutela na circulação de bens.

VENDA DE BENS ONERADOS92


A venda de bens onerados encontra-se prevista nos arts. 905.ᵒss.

A venda onerada dá-se quando o direito transferido fica limitado no seu conteúdo em
consequência da atribuição de um direito anterior sobre a mesma coisa a outra pessoa.

91
Para VAZ SERRA e RIBEIRO FARIA, nestes casos converte-se a venda de coisa comum na venda
de quota ideal, reduzindo-se o contrato à venda dessa quota-parte. Porém, isso dificilmente
corresponderia a vontade do adquirente, pois, ele pretende ser adquirente de um bem de forma integral e
não de uma quota indivisa, cfr. MENEZES LEITÃO, p. 102.
92
Exemplo: alienação de bens penhorados.

43
A venda é de bens onerados quando o direito transmitido estiver sujeito a
algum ónus ou limitações que excedam os limites normais inerentes aos direitos da
mesma categoria93.

O que esta em causa na venda de bens onerados é a existência de ónus ou


limitações que constituem vícios de direito, que afectam a situação jurídica e não vícios
que afectam as qualidades fácticas da coisa, que neste caso seria uma venda de bens
defeituosos.

O ónus ou limitações resultariam de direitos reais de gozo ou garantia, locação


sobre a coisa, um contrato promessa de compra e venda com tradição da coisa,
penhora, arresto, expropriação por utilidade pública, quando a coisa vendida viola
direitos do autor ou propriedade industrial, venda de veículos por incumprimento
da obrigação de entrega do art. 882.ᵒnᵒ 2, imóvel vendido sem licença.

Corresponde a uma das modalidades do inadimplemento das obrigações do


vendedor, na hipótese de incumprimento defeituoso.

Outrossim, não se aplica o regime da venda de bens onerados quando


resultem de limites normais aos direitos como: restrições derivadas das relações de
vizinhança (arts. 1346.ᵒ e ss.), as servidões legais (arts 1550.ᵒ e ss), ou de direito
público (restrições à edificabilidade impostas por planos directores), etc.

Se na compra e venda de acções, em que o adquirente não foi informado acerca


da situação económica da empresa ou tenham sido vendidas acções e a sociedade tenha
dívidas ou prestada garantias e não foi informado, não se aplica o regime da venda de
coisa onerada, mas o regime do art. 227.ᵒ (violação do dever de informação). Aliás esta
disposição confere uma protecção mais alargada que o art. 905.ᵒ.

MEIOS DE REACÇÃO

a) Anulabilidade por erro ou dolo (905.ᵒ)

Constitui o primeiro remédio. Para que haja anulabilidade por erro-vício tem de se
verificar os pressupostos do art. 247.ᵒ e 251.ᵒ. No caso dolo arts. 253.ᵒ94.

b) Convalescença do contrato (art. 906.ᵒ)

93
A ONERAÇÃO dá-se quando o direito fica limitado no seu conteúdo em consequência da atribuição
de um direito novo sobre o mesmo objecto a outra pessoa, OLIVEIRA ASCENSÃO, Direito Civil
Teoria Geral-Relações e Situações Jurídicas, Vol. III, Coimbra Editora, 2002, p.148
94
Se a coisa vendida for genérica não se aplica o regime do erro, só o cumprimento defeituoso (art. 918.º)
e nada justifica uma dualidade de regime na venda de coisa genérica e específica.

44
Com este remédio pretende-se sanar ou eliminar o defeito (ónus), que é imputável
ao vendedor, pois, foi ele que vendeu uma coisa onerada. Por exemplo se existir uma
hipoteca ou usufruto desconhecida(o) do comprador e se o credor pignoratício receber a
prestação ou usufrutuário renunciar ao seu direito, não há motivos para o comprador
invocar a anulabilidade por erro ou dolo ( nᵒ 1).

Se, porém, existir prejuízo ou já ter sido requerida a anulabilidade, ela persiste (n.º
2).

O comprador, na verdade, pode exercer os direitos em alternativa (em processo civil


são pedidos alternativos), exigindo a eliminação do ónus e, subsidiariamente, a
resolução ou anulação, não existindo qualquer dependência entre eles.

c) Obrigação de fazer convalescer o contrato (907.ᵒ)

A doutrina que estabelece o n.º 1 é paralela a do art. 897.ᵒnᵒ 1. Na venda de bens


alheios, o vendedor é obrigado a adquirir a propriedade da coisa ou direito vendido, na
venda de bens onerados a expurgar (eliminar ou limpar) os ónus ou limitações para
sanar a anulabilidade. Se não cumprir essa obrigação será responsabilizado nos termos
do art. 910.ᵒ.

Cfr. ns. 2 (prazo) e 3 (cancelamento do registo). Nos termos do nᵒ 3 o simples


registo dum encargo não constitui, de per si, um encargo; mas as presunções que dela
derivam (por força de terceiro de boa fé que podem representar um perigo para o
comprador) e as dificuldades do cancelamento justificam a solução legal.

d) Indemnizações

. Indemnização em caso de dolo art. 908.ᵒ

Essa consequência é idêntica a do art. 898.ᵒ, todavia, na venda de bens alheios é


aplicada não só ao vendedor mas também ao comprador, se for este o contraente doloso.

A determinação do prejuízo sofrido respeita os danos emergentes e os lucros


cessantes (art. 564.ᵒ) e esta em causa apenas o interesse contratual negativo pelo dano
da confiança (art. 227.ᵒ). Integram o prejuízo do comprador a restituição do preço, as
despesa feitas com o contrato e com a coisa, as despesas com a acção anulatória, o lucro
que deixou de obter numa outra operação negocial, etc.

. Indemnização em caso de erro art. 909.ᵒ

Consagra-se uma responsabilidade objectiva e só o prejuízo imediato é


indemnizável. Esta doutrina é similar a do art. 899.ᵒ, porém, na venda de bens onerosos
inclui-se as despesas voluptuárias.

. Indemnização por violação da obrigação de convalescer o contrato art. 910.ᵒ

Há perfeita coincidência com o art. 900.ᵒ.

45
e) Redução do preço95

O art. 911.ᵒestabelece que (…). A redução regula-se pelo disposto no art. 884.ᵒ.

A redução do preço corresponde a antiga actio quanti minoris e aparece como uma
alternativa à anulação por erro ou dolo.

Para que o art. 911.º seja aplicável imperativamente, é necessário que as


circunstâncias mostrem que o comprador, mesmo conhecendo os ónus ou limitações,
teria adquirido os bens.

Pode-se requerer a redução como pedido subsidiário da anulação, se se não provar o


dolo ou a essencialidade do erro ou ignorância (sobre os ónus ou limitações) ou a sua
cognoscibilidade para o vendedor.

No entanto, ao contrário do que determina o art. 292.ᵒ (em que o vendedor pode
opor-se a redução), o art. 911.ᵒ não admite.

COMPRA E VENDA DE BENS DEFEITUOSOS96


A compra e venda de bens defeituosos apresenta-se como uma das perturbações
típicas de que o contrato pode enfermar, sendo uma hipótese de incumprimento.

A protecção conferida ao comprador de bens defeituosos, também designada por


garantia idílica, manifestou-se desde cedo no Direito Grego e Romano. No Direito
Grego, a garantia por vício ocultos encontrava-se na venda de escravos e apenas se
reconhecia a acção redibitória como forma de reacção.

No Direito Romano a garantia idílica ganhou forma em virtude da criação dos


esdis cruís, que tinham o papel de policiar a cidade, sendo a área de maior incidência
95
Quando há erro ou dolo acidental.
96
Alienação de automóvel com defeito ou venda de produto alimentar que caducou o prazo para
consumo.

46
destes magistrados centrada na fiscalização dos mercados, uma vez que era seu encargo
vigiar “os pesos e medidas utilizados nas transacções comerciais”. A actuação dos edis
centrou-se fundamentalmente na venda de escravos e animais, para isso criaram
mecanismos para proteger o comprador dos vícios que a coisa padecesse.

Sobre o vendedor recaia um dever de informar ao comprador sobre todos os


defeitos que podiam existir na coisa desde corpóreos, morais ou jurídicos. Os vícios
ocultos da coisa tinham de preencher determinados requisitos, nomeadamente serem
anteriores a celebração do negócio, reduzirem a utilidade do bem e não resultarem
de venda judicial.

Assim foram criadas duas acções: a actio redhibitoria que conferia ao


comprador o direito de resolver o contrato ainda que o vendedor estivesse de boa-fé;
actio minoris, tinha como escopo a redução proporcional do preço à desvalorização que
a coisa padecia devido ao vício que lhe retirava a utilidade esperada pelo comprador.

Sob impulso do IMPERADOR JUSTINIANO, o regime da venda idílica


passou a aplicar-se a todos os contratos de compra e venda e não somente a venda de
escravos e animais.

O regime da venda de bens defeituosos (vícios redibitórios) vem previsto nos


arts. 913.ᵒe ss.

A venda é de bens defeituoso se a coisa alienada apresenta um vício ou se


for desconforme àquilo que foi acordado.

Existe uma dualidade de regimes na venda de coisa defeituosa:

A) Venda de coisa defeituosa desde o momento da celebração do contrato


(defeito originário). Se a coisa for específica aplicar-se-á o regime jurídico
do erro, sendo anulável nos termos dos arts. 913.ᵒ e 905.ᵒ (ex: Alguém
compra um terreno para construir uma residência unifamiliar e descobre que
tem um lençol de água. Terá que demonstrar que estava em erro para poder
anular o negócio, exigir a restituição do preço e uma indemnização pelos
danos emergentes pelo interesse contratual negativo, arts. 915.ᵒe 909.ᵒ).
B)
C) Venda de coisa defeituoso verificar após a celebração (defeito
superveniente). Quer a coisa seja presente, determinada e não entregue, bem
como no que respeita a venda de coisa futura e indeterminada - não pode
haver erro do comprador, porque a coisa ainda não existe ou não está
determinada no momento da celebração do contrato -, e se verificar um
defeito haverá cumprimento defeituoso se for imputável ao vendedor
(neste caso aplica-se o disposto no art. 918.ᵒ). Se for imputável ao comprador

47
com a entrega por força do risco 796.ᵒnᵒ 1 (ex: Encomenda uma televisão –
venda a distância -, e afinal a imagem é fusca ou não houve o som, haverá
cumprimento defeituoso, art. 918.ᵒ e a indemnização abrange o interesse
contratual positivo).

A tendência dos vários ordenamentos jurídicos é a de proceder a unificação dos


regimes em incumprimento da obrigação de entrega, uma vez que independentemente
de a coisa ser específica ou genérica, o vendedor tem sempre a obrigação de entregar a
coisa em conformidade com o contrato, considerando-se incumprimento sempre que
não houver essa conformidade.

O regime da venda de bens defeitusos abrange tanto no caso de ser prestada a


coisa devida, mas com defeito, tanto nas hipóteses em que for prestada coisa distinta (o
chamado aliud).

PRESSUPOSTOS

São pressupostos da venda de bens defeituosos os previstos no art. 913.ᵒ, e,


compreende um sentido objectivo e subjectivo de defeito os seguintes:

a) Vício97 que desvalorize a coisa: enquadra-se numa concepção objectiva de


defeito, resultante do facto de o vício implicar que a coisa valha menos que
sucederia se não tivesse vício. São as imperfeições relativas as qualidades
normais (padrão) de coisa daquele tipo, representando um defeito da coisa.
Vende-se uma coisa que se afasta-se do padrão de normalidade. Ex: compra um
automóvel como novo quando afinal é usado; compra de um imóvel com um
sistema deficiente de canalização; compra um telemóvel que não se ouve quando
se fala. Estes vícios desvalorizam a coisa.

b) Vício que impeça a realização do fim a que se destina: corresponde a uma


concepção objectiva de defeito. É a utilidade da coisa tendo em conta as
qualidades específicas que o comprador pretende que lhe sejam proporcionadas
pela coisa. Ex: um automóvel é feito para andar; uma instalação eléctrica é feita
para dar luz.

c) Falta das qualidades98 asseguradas pelo vendedor (qualidades acordadas): tem


uma concepção subjectiva. A qualidade assegurada não afasta o padrão normal,
apenas o reforça (completa). São as hipóteses em que o vendedor certifica a
existência de certas características. No entanto não corresponde com o que o
vendedor certificou (ex: que a o cão é de raça afinal é rafeiro, que a mercadoria é
nacional ou importada, que a máquina é do último modelo). Esta certificação

97
Vício corresponde a imperfeições relativamente à qualidade normal. Desconformidade representa
uma discordância com respeito ao fim.
98
Falta de qualidade é inaptidão da coisa.

48
pode ser tácita ou expressa (217.ᵒ) e pode resultar de amostra ou modelo (art.
919.ᵒ do C.C. e 469.ᵒ do Código Comercial)99

d) Falta das qualidades necessárias para a realização do fim a que se destina (a


coisa é inapta para o fim a que se destina). Ex: Venda de um terreno com 1200
m2 para construir um armazém, quando afinal só tem 800m2.

Defeito oculto, defeito aparente e defeito conhecido

Defeito oculto (invisível) é aquele que, sendo desconhecido do comprador, pode ser
legitimamente ignorado, pois não era detectável através de um exame diligente (só neste
revela a responsabilidade civil).

Se o defeito poder ser detectado por exame diligente o defeito é aparente (visível,
manifesto).

Já será defeito conhecido se os vícios da coisa foram revelados ao comprador quer


pelo vendedor, quer por terceiro, ou o comprador se apercebeu pela sua própria perícia.
Nestes dois últimos não justifica a responsabilidade civil, na medida em que o
comprador esta cônscio da situação ou não sabe por negligência.

MEIOS DE REACÇÃO

Ao comprador são facultados alguns remédios quanto se depare com um carecido de


conformidade, que lhe permitem fazer face a essa situação, entre eles se destacam:

a) Direito a anulação: Este resulta do art. 905.ᵒpor força do art. 913.ᵒnᵒ 1 do C.C
(erro ou dolo), permitindo a restituição de tudo quanto se prestou nos termos do
art. 289.ᵒ. MARTINEZ refere-se a resolução;

b) Direito de reparação ou substituição: na venda de bens onerados, o vendedor


é obrigado a sanar a anulabilidade, através da expurgação dos ónus ou vícios nos
termos do art 907.ᵒ. Na venda de bens defeituosos o vendedor é obrigado a
reparar ou a substituir. Vem prevista no art 914.ᵒna verdade não se encontram no
mesmo nível, isto porque a substituição só se opera se a reparação e, por si
própria, incapaz de repor a normalidade da coisa ou quando pressupõe uma
excessiva onerosidade em comparação a substituição. Esta solução não
encontramos na compra e venda, mas no contrato da empreitada art. 1221.ᵒnᵒ 2,
mas por força da boa fé no cumprimento das obrigações art. 762.ᵒnᵒ 2, não é de
99
MENEZES LEITÃO, p. 114

49
aceitar que o direito de reparação do defeito da coisa vendida seja exigível
sempre a despesa que isso pressupõe seja excessiva para o vendedor. A
substituição só é possível de se tratar de coisa fungível art. 207.ᵒ;

c) Indemnização

. Indemnização em caso de dolo art.908.ᵒ por remissão do art. 913.ᵒ. O mesmo


sucede com as doações de coisas defeituosas (art. 957.º n.º 2)

Dolo, nos termos do art. 253.ᵒ. A determinação do prejuízo sofrido respeita os


danos emergentes e os lucros cessantes (art. 564.ᵒ) e esta em causa apenas o interesse
contratual negativo pelo dano da confiança (art. 227.ᵒ). Integram o prejuízo do
comprador a restituição do preço, as despesas feitas com o contrato e com a coisa, as
despesas com a acção anulatória, o lucro que deixou de obter numa outra operação
negocial, etc.

. Indemnização em caso de erro art. 909.ᵒpor remissão do art. 913.ᵒ

Consagra-se uma responsabilidade subjectiva (e não objectiva), art. 915.ᵒe só o


prejuízo imediato é indemnizável. No entanto, o art. 915.ᵒvem a restringir as condições
em que se exige a indemnização, ao referir que ela também não é devida nos casos em
que o vendedor ignorar sem culpa100 (que se presume nos termos do art. 799.ᵒ)o vicio ou
falta de qualidade de que a coisa padece, não havendo uma responsabilidade
integralmente objectiva do vendedor por força dos danos causados ao comprador pelos
defeitos da coisa. Mas também pode resultar uma responsabilidade extracontratual –
concurso positivo, que advém de danos pessoais (ex.: compra de uma garrafa de gás que
explode).

. Indemnização por violação da obrigação de reparar ou substituir a coisa art.


907.ᵒ

Esta sujeito as regras dos arts. 798.ᵒ, 801.ᵒ, 804.ᵒ.

d) Redução do preço

A redução opera-se nos termos do art. 911.ᵒ

O art. 911.ᵒestabelece que (…). A redução regula-se pelo disposto no art. 884.ᵒ.

A redução do preço corresponde a antiga actio quanti minoris e aparece como uma
alternativa à anulação por erro ou dolo.

Os diversos remédios que o ordenamento confere ao comprador não podem ser


exercidos em alternativa, existindo uma sequência lógica: assim, em primeiro lugar, o
vendedor está adstrito a reparar o defeito; depois a substituição, a seguir a redução do
preço e por fim a anulabilidade (ou resolução). Já indemnização cumula-se com
qualquer dos outros remédios com o fim de reparar os danos. Assim se com eliminação
100
Boa-fé subjectiva ética

50
do defeito não fique totalmente ressarcidos os danos, o comprador pode exigir uma
indemnização compensatória.

Também pode invocar a excepção do não cumprimento do contrato enquanto por


exemplo o vício não for reparado.

GARANTIA DO BOM FUNCIONAMENTO

A garantia do bom funcionamento esta integrada na secção relativa a compra e


venda de bens defeituoso, tendo previsão legal expressa no art. 921.ᵒ (prazo de
garantia).

O vendedor assume o bom funcionamento da coisa vendida durante um certo lapso


de tempo, também designado por “ período de rodagem”, no qual existindo algum
defeito este responde objectivamente.101

A garantia do bom funcionamento tem o significado e os efeitos de uma obrigação


de resultado102, na exacta medida em que, durante a sua vigência, o vendedor assegura
o regular funcionamento da coisa vendida103.

É comum o vendedor assumir principalmente, uma garantia de duração. Mas, pode


por convenção ou por imposição dos usos (em certos tipos de bens) assumir uma
obrigação que garantia de bom funcionamento. Esta garantia visa de modo especial a
venda das máquinas, mas estende-se agora, pelo espírito da norma, a qualquer outra
aptidão da coisa para o uso a que ela se destina, sem ser trabalho automático, que
caracteriza a máquina104.

A garantia importa para o vendedor uma das duas obrigações: a de reparar a coisa
ou, a substituição da coisa (921.º n.º 1). Não se exige culpa do vendedor ou erro do
comprador; pode tratar-se de não cumprimento de uma obrigação.

Os prazos de garantia vêm previstos nos números subsequentes (ns. 2, 3 e 4).

101
ANA MANUELA COSTA FERNANDES, A Compra e Venda de Bens Defeituosos A Garantia do
bom Funcionamento, Coimbra 2015, p. 36
102
É aquela que por força da lei ou contrato o devedor está vinculado a conseguir um
efeito útil. Já na obrigação de meio o devedor apensa se compromete a desenvolver
prudente e diligentemente certa actividade para a obtenção de um determinado efeito, mas
assegurar o mesmo se produza. Contudo, em certos casos parece que a obrigação do médico
terá natureza de obrigação de resultado, por exemplo, a obrigação do médico cirurgião plástico
e que não difere do cirurgião geral, mas já deve ser feita uma distinção entre cirurgia estética e
cirurgia reparadora, parecendo que, neste caso, dever haver uma obrigação de meios e, no
primeiro caso uma obrigação de resultado. Também será uma obrigação de resultado a
actividade de médico patalogista-clínicos, por exemplo, ao efectuarem uma determinação do
factor Rh, hemograma, doseamento da ureia, colesterol ou glicemia ou a colocação de uma
prótese.
103
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 23/09/ 2008.
104
PIRES E LIMA/ANTUNES VARELA, p. 216-217

51
FORMA E PRAZOS PARA O EXERCÍCIO DE DIREITOS

Para que haja responsabilidade por venda de coisa defeituosa deve ser feita a
denúncia105 do defeito (art. 916.ᵒ). O comprador deve informar ao comprador sobre os
defeitos. Esse ónus é excluído em caso de dolo do vendedor.

A denúncia deve ser feita dentro do prazo de trinta dias a contar do


conhecimento do defeito e, seis meses a contar da entrega da coisa (nᵒ 2 do art. 916.ᵒ)106,
sob pena de caducidade, anulação, reparação ou substituição (art. 298.ᵒ nᵒ 2).

Vigora para denúncia o princípio da liberdade de forma nos termos do art. 219.ᵒ,
podendo ser tácita ou expressa (art. 217.ᵒ).

O prazo de trinta dias vale para cada vício ou falta de qualidade da coisa, porque
pode haver dois ou mais defeitos.

Na hipótese de coisas transportadas (art. 922.ᵒ) o defeito só revela com a entrega


matéria e não simbólica, pois, só em contacto com a coisa o comprador poderá notar os
seus defeitos. Se for substituída a coisa reinicia-se o prazo.

Cfr. n 3.

Estes prazos valem quer o defeito seja grave ou não.

O prazo para caducidade da acção vem previsto no art. 917.ᵒ. Quer dizer que
feita a denúncia começa a contar novo prazo para caducidade da acção por
incumprimento defeituoso107, que se contará a partir do conhecimento do vício ou falta
de qualidade, quando o próprio vendedor os tenha reconhecido (art. 331.ᵒ nᵒ 2). Este
prazo é de seis meses, sem prejuízo, diz a lei, do disposto no art. 287.ᵒnᵒ 2. Quer dizer se
o negócio não tiver sido cumprido, isto é, não tiver sido entregue a coisa ou pago o
preço, não se verifica a caducidade, podendo a anulabilidade ser invocada por via de
acção ou excepção.

Ex 1: contrata no dia 1/04/2019;

Conhece o defeito 1/05/2019;

Denuncia no dia 20/05/2019. A partir desde dia começa a contra o prazo para
caducidade da acção que vai até 6 meses.

Ex 2: Mas se o negócio não for cumprido (porque não pago o preço ou entregue
a coisa), não há caducidade, mas anulabilidade nos termos do art. 287.º n.º 2.

105
É um negócio unilateral receptício, pois deve ser levado ao conhecimento do destinatário. Mas é
eficaz independentemente de concordância.
106
É de 8 dias no âmbito comercial art. 471 do Código Comercial
107
Por exemplo faz-se a denúncia depois de dois meses, tem mais seis meses para intentar acção de
anulabilidade.

52
Esta disposição apenas se explica em caso de erro e não de dolo, em que o prazo é o
estabelecido no art 287.ᵒgenericamente.

CASOS ESPECIAIS
A) Venda sobre amostra.

Vem prevista no art. 919.ᵒdo C.C. que teve como fonte o 469.ᵒdo Cód. Comercial.
Estamos perante uma venda de coisa específica realizada por referência a outro objecto
(qualidades iguais às da amostra). Pela falta de conformidade são aplicáveis os arts
913.ᵒe ss.

A venda sobre amostra não se confunde com a venda sujeita a prova: esta é
realizada sob condição suspensiva ou resolutiva, enquanto aquela considera-se perfeita
desde logo, sem necessidade de um requisito posterior de eficácia 108. Contudo, a venda
sobre amostra pode ser sujeita aprova.

Por força da parte final podem as partes excluir certas características ou qualidades
da amostra, ficando a garantia do vendedor relativamente as qualidades restantes.

B) Venda de animais

O art. 920.ᵒremete para regime especial que é o Decreto de 16 de Dezembro de


1886, aplicável também em Angola, cujos os arts. 49.ᵒa 58.ᵒregulam a compra e venda -
ou troca de animais defeituosos (com vícios redibitórios).

Este diploma elenca um conjunto de doenças consideradas como vício, que por
força delas pode o comprador fazer valer um dos remédios postos a sua disposição.
Exige-se um prazo de 10 dais par exame médico.

C) Responsabilidade do produtor

A responsabilidade directa do produtor foi colocada pela primeira vez em 1963 nos
E.U.A.

Ex: medicamentos, janelas mal feitas, biberão que causa alergia (responsabilidade
objectiva).

Essa responsabilidade resulta da dificuldade de em muitas situações ser difícil


responsabilizar alguém pelos danos causados, pois, o vendedor directo não podia ser
responsabilizado porque desconhecia os defeitos (arts. 914.ᵒ e 915.ᵒ), por exemplo os
produtos embalados. Se os danos forem causados por produtos postos em circulação,
deve-se responsabilizar o produtor dos mesmos.

108
PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, p. 215

53
O produtor pode ser: real- fabricante do produto acabado, de uma parte
componente ou de matéria-prima; produtor aparente- quem se apresente como tal pela
aposição no produto do seu nome, marca ou outro sinal distintivo

O art. 10.ᵒnᵒ 1 da lei nᵒ 15/03, Defesa consumidor determina uma


responsabilidade objectiva do produtor. Tal responsabilidade não resulta de qualquer
conduta deficiente, mas do defeito do produto que pôs em circulação. Mas se forem
vários os responsáveis a responsabilidade será solidária

A responsabilidade do produtor não pretende substituir os regimes de


responsabilidade do C.C. nos arts. 913 e ss., mas criar uma nova responsabilidade que
se pode cumular, tanto com extracontratual, como com a contratual.

D) Defesa do consumidor

O regime civil tradicional no que toca ao cumprimento defeituoso tem vindo a


perder sucessivamente aplicação no âmbito das relações de consumo. Estas distorções
resultam do facto de a noção de cumprimento defeituoso devia ser equiparada a de
incumprimento; outras distorções resultam do facto de se excluir a responsabilidade do
vendedor em caso não ter havido culpa no defeito e normalmente não ser responsável
pelos vícios aparentes.

Nos contratos de consumo a tutela do consumidor é, por esse motivo, assegurada de


modo distinto relativamente ao regime clássico. Assim a que considerar na Lei n 15/03,
de 22 de Julho, os arts. 4.ᵒnᵒ 1 a); 5.ᵒ; 10.ᵒ nᵒ 2 § 1,§ 2 e §4; 11.ᵒ; 12.ᵒ; 13.ᵒ.

54
O CONTRATO DE LOCAÇÃO
O contrato de locação permite por via do arrendamento a afectivação do direito à
habitação.

A tutela constitucional do direito a habitação esta prevista no art. 85.ᵒ.

As figuras que permitem o acesso ao gozo habitacional de imóvel ou gozo de


móvel alheio são:

Usufruto; uso e habitação; direito de superfície; direito real de habitação


periódica; comodato; arrendamento; aluguer; locação venda; renda resolúvel e leasing.

O regime jurídico da locação vem previsto nos arts. 1022.ᵒa 1082.ᵒdo C.C.,
corresponde a locatio conductio rei – locação ou arrendamento de coisas-, do direito
romano.

No direito angolano a locação vem regulada no Código Civil, na Lei nᵒ 26/15, de


23 de Outubro, Lei do Arrendamento Urbano e a Lei de Terras (direito de ocupação
precária), Lei n° 9/04, de 9 de Novembro.

O Código Civil define o contrato locação no art. 1022.ᵒ.

Assim, a locação pressupõe que se proporcione a outrem o gozo de uma coisa


corpórea ou incorpórea temporariamente por força de uma contrapartida em dinheiro.

O locatário não recebe a titularidade do direito de propriedade, mas com uma


parte importante do conteúdo desse direito - o gozo da coisa – o que o torna em
proprietário economicamente temporário sem poder de disposição.

55
Não é o gozo do locador que se transmite para o locatário, mas sim os meios a
prestar pelo locador e a que ele fica obrigado, que permitem ao locatário o gozo da
coisa.

A relação locatária pode resultar de contrato, de sentença judicial (divórcio, art.


98.ᵒ), imposição de órgãos públicos ou usucapião.

A locação permite ao titular do direito de propriedade ou outro direito real obter


um rendimento, através da concessão temporária, sem resignar ou extinguir o seu
direito, evitando assim que os bens fiquem inutilizados, podendo o titular aproveita-los,
satisfazendo necessidades alheias. Também permite ao locador que não pode adquirir os
bens de que precisa, porque não tem capacidade financeira ou por outra razão obter o
gozo das mesmas, pagando uma quantia inferior se tivesse que adquiri-los.

MODALIDADES DE LOCAÇÃO

As modalidades de locação estão previstas no art. 1023.ᵒ (arrendamento e


aluguer109).

A distinção entre arrendamento e aluguer, não obstante apresentar-se como


elementar, não corresponde verdadeiramente a uma substancial diferença de regime,
pois, a lei apenas define regras especiais para certos tipos de arrendamento, não tendo
sido estabelecido nenhum regime especifico para o aluguer, logo rege-se pelas regras
gerais.

O arrendamento pode ser:

→Arrendamento urbano110: aquele que recai sobre prédios urbanos (cfr. art. 2ᵒ
da Lei nᵒ 26/15). Pode ser: para habitação, comércio ou indústria-excepcionalmente
pode incidir sobre prédios rústicos (art. 120 da Lei do Arrendamento Urbano) -,
profissão liberal (cfr. art. 4.ᵒ da Lei nᵒ 26/15)111112.
109
No Brasil usa-se a terminologia aluguer para abranger tanto a cedência de gozo de móvel como de
imóvel. Quando se proporciona o gozo de um navio o contrato é de fretamento contrato que tem por
objecto o transporte por mar.
110
Noção de prédio urbano e rústico cfr. art. 204.ᵒn 2.
111
É controversa a natureza da figura do direito real de habitação periódica. É um direito de um titular,
usufruir de determinada unidade de alojamento, localizada num empreendimento turístico, durante
certo período de tempo em cada ano. Constitui um novo direito real que equivale a um regime de
propriedade fraccionada por quotas-partes temporárias. Os empreendimentos turísticos podem ser de três
tipos: Hotéis-apartamentos; aldeamentos turísticos, apartamento turísticos.

Muitos autores consideram-no como direito sobre coisa alheia, dado que conferem ao seu titular um poder
de utilização total ou parcial de um bem cuja titularidade não lhe pertence, se sobrepõem a todos os outros
direitos incompatíveis, constituídos de sequela ou persuasão.

O titular pode usar as instalações e equipamentos de uso comum do empreendimento e ceder o exercício
destas faculdades a terceiros. Depende, a sua validade de documento autêntico ou particular autenticado.
Em Portugal Decreto-Lei n° 355/81.
112

Outra situação susceptível de arrendamento é o direito de ocupação precária. Constitui um direito


fundiário -Direito Fundiário é um direito sobre a terra, cfr. art.ᵒ 34.° al d) da Lei de Terras, LEI N° 9/04

56
→Arrendamento rural: é a cessão onerosa do uso total ou parcial de prédio
rústico para fins agrícolas, florestais ou outras actividades de produção de bens e
serviços associados a agricultura, à pecuária ou floresta. Aquele que incide sobre
prédios rústicos. Pode ser: para fins agrícolas, pecuária ou florestal (cfr. art. 1064.ᵒ). o
regime jurídico das florestas vem previsto na Lei de Bases de Florestas e fauna
selvagem, Lei nᵒ 6/17, de 24 de Janeiro, nada refere de forma expressa sobre o
arrendamento. Contudo, o art. 74.ᵒnᵒ 1 al. a), prevê a concessão de exploração de
florestas por via de contrato de concessão, a nosso ver, nada obsta a que esse
contrato seja um arrendamento.

Embora não previstos, mas o arrendamento pode ser também para fins
desportivos, arrendamento para fim associativos, culturais, recreativos, políticos.

→Híbridos ou mistos: aquele que incide sobre prédio rústico e urbano


concomitantemente (por exemplo habitação e agrícola, cfr. 3ᵒ da Lei nᵒ 26/15). Assim,
será o valor113da matriz predial que vai terminar se prevalece o prédio rústico ou urbano,
aplicando-se a teoria da absorção.

O mesmo prédio urbano ou rústico pode ser arrendada para vários fins
(arrendamento misto urbano ou rústico) , por exemplo para habitação e profissão
liberal ou habitação e comércio (cfr. art 1028.ᵒ do C.C. e 5.ᵒ da Lei nᵒ 26/15).

Se arrendar um imóvel que tenha móveis, não se considera, parece, no âmbito do


ordenamento jurídico angolano, o princípio acessorium sequitur principale, por força
do disposto no art. 210.ᵒnᵒ 2 (art. 86 da L.A.U.), ao contrário do que sucede em Portugal
por força do art. 74.ᵒ NRAU.

Não se aplica o regime da LAU nas hipóteses previstas no n.ᵒ 2 do art. 1.ᵒ

(enquanto que o Direito Agrário é o ramo do direito que compreende um conjunto de normas que
regulam a relações entre homem e a propriedade rural. O direito de ocupação precária (cfr. art. 40.°. da
lei de terras) não é um direito que se aplica a qualquer terreno, ou seja, visa, fundamentalmente
regular a ocupações que acontecem nas áreas próximas as grandes obras, projectos de procura de
minerais e estudos de animais plantas, terrenos, etc.

É muito semelhante ao direito de superfície, consiste na possibilidade de, temporariamente, poder-se


ocupar pequenos terrenos para apoiar de grandes obras. O seu titular fica obrigado a pagar uma taxa ao
Estado. Ex: a ENSA pretende construir um prédio urbano em Caconda, para o efeito pede dois terrenos:
um para construir o prédio e o outro para colocar o material de construção.

113
Pode ser económico ou basta que uma actividade prevaleça sobre a outra.

57
PRESSUPOSTOS OU ELEMENTOS DA LOCAÇÃO

1. Direito de gozo (obrigação de proporcionar a outrem o gozo da coisa)

Essa é uma obrigação característica da locação, referida no art. 1031.ᵒal. b),


adoptando o locador um comportamento positivo (prestação de facto positivo).

Existe controversa na doutrina sobre a qualificação (natureza jurídica) deste direito:


para a tese personalista, posição sufragada por GALVÃO TELLES, PIRES DE
LIMA, ANTUNES VARELA, ROMANO MARTINEZ, MENEZES LEITÃO E
JANUÁRIO GOMES, o locatário é meramente titular de um direito pessoal de
gozo, não produzindo consequentemente o contrato de locação quaisquer efeitos reais.

A favor desta tese tem-se afirmado que a locação não aparece no C.C. no livro III,
mas nos contratos em especial no domínio das obrigações; o art. 1031.ᵒal. b)
qualifica de forma expressa o gozo da coisa como direito de crédito do locatário; o
carácter temporário da locação; por via da locação ao locatário é conferido o gozo
da coisa e não um poder directo e imediato sobre ela, que caracteriza os titulares
de direitos reais.

Para tese realista, defendida sobretudo por OLIVEIRA ASCENÇÃO e


MENEZES CORDEIRO o direito de locação é um direito real de gozo. Baseiam-se
no facto de a locação, no que respeita ao arrendamento urbano, não constitui uma
forma verdadeiramente temporária de gozo da coisa, passou a constituir uma
situação jurídica com alguma perenidade (perpetuidade) da cedência do gozo da
coisa; ademais, o art. 1037.ᵒnᵒ 2 atribui ao locatário o direito de utilizar, mesmo
contra o locador, as acções atribuídas ao possuidor (arts 1276.ᵒ);o art.
1057.ᵒestabelece que (…) quer dizer que a locação não é prejudicada se a coisa vier
a ser adquirida por um terceiro “ emptio non tollit locatum” é oponível erga omnes,
e isto corresponde a sequela.

Tese dualista ou mista (Henrique Mesquita)

A disciplina da locação não permite que o direto do locatário, globalmente


considerado, se reconheça, no quadro dos conceitos que permitem distinguir entre
relações reais e obrigacionais, natureza jurídica unitária. Trata-se de um regime
de direito dualista ou isto, sendo o locatário, para determinados efeitos titular de
58
uma verdadeira posição de soberania e, para outro, mera contraparte de um
contrato, que constitui fonte da relação locativa e do qual esta nunca se deliga (a
posição de soberania revela que o locatário se encontra já no usso e fruição da
coisa).

Só após a entrega da coisa poderá dizer-se que o locatário passa a ser titular
de um direito que lhe confere o gozo de uma “res” e que lhe confere esse gozo com
eficácia erga omnes.

O interprete deve sempre ter presente que o direito do locatário é tratado


para certos efeitos, como direito de soberania e, para outros, como meramente
creditório, assente numa relação intersubjectiva que liga permanentemente o
locador e o locatário ,e, face a este estatuto dualista, o caminho metodologicamente
correcto para esclarecer dúvidas interpretativas e resolver problemas de
regulamentação será o recurso, nalguns casos, aos princípios que regem as
obrigações, consoante o interesse em jogo, apreciados e valorados à luz das
soluções ditadas pelo legislador para os problemas de que directa ou
expressamente se ocupa.

Esta posição tem inspirado boa parte da jurisprudência, apesar de


reconhecer a natureza obrigacional do arrendamento, não deixa nalguns casos de
reconhecer alguns traços que se assemelham com os direitos reais, nomeadamente
o disposto no artigo 1037.º do C.C.

Em favor desta tese está o facto de que o artigo 1051.º do C.C., que indica os
casos em que o contrato de arrendamento caduca, não é taxativo, pode caducar
por impossibilidade de cumprimento, artigo 795.º do C.C.

Porém, em Angola a locação não produz efeitos reais.

Se o locatário tem poderes com esta consistência, que quase se configura em


direito de sequela, não se compreende que tal direito caduque com a venda em praça
prédio arrendado, tão só porque o arrematante e o exequente com hipoteca sobre o
prédio, registado anterior ao arrendamento.

O facto de a lei conceder acções possessórias ao locatário não quer significar que
seja um direito real, porque também existem em relação ao parceiro pensador (art.
1125.ᵒ nᵒ 2), o comodatário (art. 1133.ᵒ nᵒ 2) e o depositário (1188.ᵒ nᵒ 2) não sendo
qualificadas como direitos reais.

O art. 1057.ᵒ “ emptio non tollit locatum” não representa uma manifestação da
sequela, mas uma cessão da posição contratual que opera por força da lei (para
MENEZES LEITÃO é apenas uma sub-rogação legal imposta ao terceiro resultante de
uma aquisição derivada).

Violado o direito de locação o locador apenas pode intentar uma acção de


incumprimento nos termos do art. 817.ᵒe não uma acção de reivindicação.

59
Ao locatário não lhe é conferida a faculdade de proporcionar a outrem o gozo total
ou parcial da coisa (art. 1038 al. g), como o que acontece na generalidade dos direitos
reais de gozo.

A locação é apenas um direito pessoal de gozo, mencionado no art. 407.ᵒdo C.C.

2. CARÁCTER TEMPORÁRIO (TRANSITORIEDADE)

Vem prevista no art. 1022.ᵒ. Referem-se ao carácter temporário os art. 1025.ᵒe arts.
12.ᵒe 13.ᵒda Lei nᵒ 26/15. Porém, a locação muitas vezes, pode perdurar vários anos, cfr.
art. 1065.ᵒnᵒ 4.

O prazo de 30 anos corresponde apenas o limite máximo do prazo inicial do contrato


e não o seu limite de duração, nos arrendamentos de renovação forçada nos termos do
art. 1054.ᵒe 113.ᵒda LAU a duração pode levar o arrendamento a uma duração superior.

3. CARÁCTER ONEROSO (RETRIBUIÇÃO)

Não há locações gratuitas, todas são necessariamente onerosas.

Esta obrigação recai ao locatário e pode consistir na renda ou aluguer, sendo uma
prestação pecuniária (art. 1022.ᵒ), conforme se trate de arrendamento ou aluguer (art.
1038.ᵒ al. a) e art. 23 da L.A.U.). Mas a contrapartida pode ser uma prestação diferente
da soma pecuniária: prestação em espécie (art. 1067.ᵒ), prestação de coisa indivisível ou
prestação de facere.

CARACTERÍSTICAS DA LOCAÇÃO

→Típico e nominado;

→Sinalagmático;

→Oneroso;

→Consensual;

→Não formal (salvo, art. 1029.ᵒ nᵒ 1, art. 8ᵒ da Lei nᵒ 26/15 e art. 49.ᵒ Lei das Terras-
direito de concessão precária);

→Execução duradoura;

→Obrigacional (não é real quoad effectum nem quoad constitutionem);

→Intuitu personae (art. 1038.ᵒ al. f), art. 1051.ᵒal. e)). Relativamente ao locatário, a
relação contratual é fungível, como se conclui do disposto no art. 1057.ᵒ.

OBJECTO DA LOCAÇÃO

60
O objecto da locação vem previsto no art. 1023.ᵒ, podendo incidir sobre coisas
imóveis ou móveis. A locação pode incidir sobre coisas incorpóreas (o estabelecimento
comercial, propriedade industrial).

A locação não pode incidir sobre coisas consumíveis ou fungíveis.

A locação pode incidir sobre a totalidade ou sobre parte de uma coisa, por
exemplo murros, paredes, terraços ou janelas114 (para assistir a um cortejo).

FORMAÇÃO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO

Legitimidade

Tem legitimidade para locar: o proprietário; usufrutuário115; representantes


legais; os mandatários com poderes gerais de administração (art. 1159.ᵒ); os curadores
provisórios e definitivos do ausente (arts. 94.ᵒ e 110.ᵒ); os administradores das
sociedades e demais pessoas colectivas (salvo se for o proprietário, nas outras hipóteses
deve ser mencionado a natureza do direito do senhorio, cfr. art. 10.ᵒ nᵒ 2 al. b)).

A legitimidade do locador determina-se pelo poder de administrar a coisa


objecto de locação, tratando-se de uma mera administração ou ordinária se for inferior a
6 anos, se for superior será um acto de disposição (art. 1024.ᵒ nᵒ 1).

Os arrendamentos com duração ilimitada só podem ser celebrados por quem tem
poderes de disposição da coisa (o proprietário, usufrutuário, fiduciário ou procuradores
com poderes especiais).

Se for locada uma compropriedade, só vale com o consentimento dos demais


(art. 1024.ᵒ nᵒ 2).

Em relação ao locatário, a locação é um acto de mera administração se não for


celebrado por prazo excessivo.

Capacidade

Remete-se para as regras gerais.

114
Cfr. art. 1.ᵒnᵒ 2 al. c) da LAU
115
Não o titular do direito de uso e habitação, cfr. art. 1488.ᵒ

61
EFEITOS ESSENCIAIS DA LOCAÇÃO (DIREITOS E OBRIGAÇÕES).

1. Obrigações do locador
a) Obrigação de entregar a coisa

Vem prevista no art. 1031.° a) e art. 48.° da Lei n° 26/15. Mesmo não fazendo
parte do conceito de locação, constitui um corolário lógico do disposto no art. 1022.°,
estando o locador obrigado a proporcionar ao locatário o gozo da coisa, tem a obrigação
de lha entregar, tratando-se de um acto de cumprimento. A entrega pode ser material ou
simbólica.

b) Assegurar o gozo da coisa

Esta obrigação relaciona-se com a primeira e vem prevista na alínea b) do art.


1031.° do C.C.

Destas dois deveres decorrem três outros deveres:

1. A coisa deve ser entregue sem vícios de direito (ónus ou limitações cfr. art.
1034.°)ex:… e nem defeitos (cfr. art 1032.°) ex:…. Nestes dois últimos abrangem-se os
vícios à data da celebração do contrato, como no momento em que a coisa for entregue
e, os vícios supervenientes. Se entrega a coisa com vícios é aplicável a figura do
incumprimento defeituoso e presume-se a culpa do locador (art. 799.° n° 1), podendo
ser exigido o locatário usar um dos meios de reacção a seu favor;

2. Não praticar actos que diminuam o gozo da coisa (por exemplo utilizar
uma parte comum do imóvel para praticar certo acto);

3. Realização de reparações necessárias e pagar as despesas imprescindíveis


à boa conservação da coisa (art 1036.° e arts 14.° e ss da Lei n° 26/15, sobre as obras
de conservação ordinária, extraordinária e de beneficiação- são aquelas que não sendo
de conservação servem para melhorar ou beneficiar imóveis ou móveis, definem-se por
exclusão de partes).

c) Pagamento dos encargos com a coisa locada

Vem previsto no art. 1030.° e art. 49.° da Lei n° 26/15. São encargos da coisa
locada as contribuições, o imposto predial, os prémios de seguro, as taxas de
saneamento, imposto de incêndio, os foros, as exigências municipais relativas a beleza
dos prédios, as taxas de condomínio.

d) Obrigação do reembolso das benfeitorias

Cfr. art 1046.° que remete para o art. 1273.°.

62
e) Obrigação de preferência

Constitui uma preferência legal art. 58.° e 59.° da Lei n° 26/15. Se for violada cfr.
art 1410.°.

2. Obrigações do locatário
a) Pagamento da renda ou aluguer.

É o correspectivo pela cedência do gozo da coisa, sendo a obrigação mais relevante


para o locatário. Vem prevista nos arts. 1038.° e ss.

→ Fixação da renda ou aluguer

O montante da renda ou aluguer é fixado por acordo das partes, por força do
princípio da liberdade contratual. Entretanto, a lei determina algumas restrições:

No arrendamento urbano a renda constitui uma certa quantia monetária, sendo uma
obrigação pecuniária de quantidade e força do princípio do curso legal só pode ser paga
em moeda nacional. Se for fixado em moeda estrangeira a cláusula será nula (cfr. art.
23.° da Lei n° 26/15).

A lei proíbe antecipação da renda em mais de três meses (cfr. art. 28.ᵒ LAU)

No arrendamento rural a renda é fixada nos termos do art. 1067.°.

A retribuição é determinada, mas não quer dizer que tenha de ser fixa,
invariável.

→ Alteração da renda ou aluguer

A regra é da inalterabilidade da renda ou aluguer, pois, por força do princípio do


nominalismo monetário a moeda conserva o seu valor liberatório ao longo do tempo
independentemente da ocorrência de inflação ou deflação. Em consequência deste
princípio, as dívidas em dinheiro são quitadas com o pagamento do quatum devido.

Todavia, este princípio pode ser mitigado por força da lei ou convenção 116. A renda
pode ser alterada por disposição legal ou convenção.

No arrendamento urbano a renda pode ser alterado por força da lei nos termos do
art. 1040.° (cfr. arts. 437.° e ss – erro sobre a base do negócio-.) do C.C. e arts. 37.° e
38.° da Lei 26/15. Porém, o inquilino pode não aceitar, cfr. arts. 42.ᵒe 43.ᵒ.

No arrendamento rural a renda pode ser alterada nos termos do art. 1069.° e 1070.°
do C.C.

116
Pensasse na obrigação de alimentos no Direito Familiar

63
→ Tempo do cumprimento

Está ligado ao vencimento da retribuição. Pode resultar das partes, na falta desta,
supletivamente pela lei (cfr. arts. 1039.° n° 1 C.C, e 24.°117 da Lei n.º 26/15).

→ Lugar do cumprimento (cfr. arts 1039° do C.C. e 26° da Lei n° 26/15).

→ Incumprimento e mora (cfr. arts. 804.° e ss; 1041.° do C.C. e 27.° e 29 da Lei
nᵒ 26/15).

→ Garantia do cumprimento da obrigação do locatário

Poderá ser o seu património, garantia pessoal ou real. Porém, a mais comum é a
fiança118.

b) … esse direito do locador tem como fito verificar o bom estado da coisa, suprir
deficiências e responsabilizar o locatário por danos. Todavia, não pode exercê-lo
em condições de perturbar o gozo da coisa, sob pena de abuso de direito nos
termos do art. 334.°.
c) … tanto o arrendamento rural, urbano assim como o aluguer têm em vista certo
escopo. O fim diverso tem de ser duradouro e não um simples uso esporádico ou
isolado (art. 10.ᵒ nᵒ 1 al. c) da LAU).
d) … pressupõe que no uso e fruição da coisa o locatário deve actuar conforme a
diligencia de um bom pai de família (arts. 1043.° e 1044.° C.C.).
e) … mas cfr. art. 6.ᵒda LAU.
f) … o trespasse119 não carece de autorização (art. 125.ᵒ da L.A.U.)
g) …; h)…; i)…
h)
117
O calendário Gregoriano é um calendário de origem europeu, utilizado oficialmente pela maioria dos
países. Foi promulgado pelo Papa Gregório XIII em 1585 pela bula inter gravíssimas em substituição
do calendário do imperador Júlio César em 46 a.C. Porém, existem outros calendários por exemplo o
chinês.
118
Fiador é um terceiro que se obriga pessoalmente perante o credor, garantindo com o seu património
a satisfação do crédito deste sobre o devedor. O fiador garante a satisfação do crédito, ficando
pessoalmente obrigado perante o credor.
Avalista é aquele que presta garantia pessoal em favor de alguém em título cambial, obrigando-se
solidariamente. O aval é forma específica de garantia cambial, em que o avalista fica obrigado e
responsável pelo pagamento do título nas mesmas condições do seu avalizado.
A obrigação do aval mantem-se mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer
razão que não seja um vício de forma.
A fiança é melhor que o aval apesar de ser mais burocrática ao assinar o contrato. O fiador é responsável
por todo o documento, ou seja, responde por todas as cláusulas contratuais, caso haja algum desrespeito.
O avalista é responsável apenas pelo título, ou seja, pelo valor do contrato, sem a incidência dos juros e
encargos, em caso de atraso no pagamento.
A diferença ocorre também na assinatura. O fiador assina o próprio contrato ou documento à parte, o
avalista assina o título de crédito.
Por outro lado, existe diferença na preferência de ordem na execução. No caso da fiança o devedor deve
ser demandado primeiro, só depois de esgotada todas as possibilidades de o próprio contratante não
honrar com a dívida, o fiador será demandado.
No aval o outro cônjuge outorga e não na fiança.
119
Trespasse consiste na transferência da propriedade de um estabelecimento comercial ou industrial
e abrange normalmente todos elementos que o compõem.

64
Proibições de locação

Os incapazes não podem arrendar ou alugar a favor de seus pais, tutores,


protutores, nem por interposta pessoa (cfr. art. 141.° do Código de Família, sob pena de
invalidade, art. 145.°). Pois, parece que haveria um negócio consigo mesmo (art. 261.°),
salvo em caso de licitação em processo de inventário ou sub-rogação legal.

VICISSITUDES DO CONTRATO LOCATÍCIO

1. TRANSMISSÃO DA POSIÇÃO CONTRATUAL (TRANSMISSÃO INTER


VIVOS)
65
A) TRANSMISSÃO DA POSIÇÃO PELO LOCADOR

Vem prevista no art. 1057.°do C.C. Ex: A locador…………..B locatário, A


(cedente) transfere a C (cessionário) um direito real de gozo120 sobre a coisa objecto da
locação, o contrato de locação mantêm-se entre B e C (venda de bens onerados).

Na cessão da posição contratual há uma modificação subjectiva da relação


contratual, mas o objecto se mantêm. É a consagração do princípio Emptio non tollit
locatum segundo o qual com “a alienação do direito à terceiro, o contrato de locação
se conserva” (cfr. art. 1057.°)121.

Porém, existe controversa na doutrina se o contrato de locação se extingue


por caducidade no caso de venda executiva (cfr. art. 824.ᵒ do C.C.).

O sentido do n.º 1 : A venda dos bens penhorados pode ser feita judicial e
extrajudicialmente. Realizada esta, os direitos do executado, direito de propriedade;
direitos de crédito; usufruto, ou outro, transfere-se para o aquirente.

O sentido do n.º 3: os direitos de terceiro, que caducam, transferem-se para o


produto da venda os respectivos bens. Ex: a penhora foi registada no dia 15 de Outubro,
todavia o usufruto sobre o bem penhorado foi registado no dia 20. O usufruto caduca,
mas o remanescente; depois de pagos os credores; transfere-se para o produto da venda,
os direitos do usufrutuário.

O sentido do nº 2 Há distinguir duas espécies de dtos que incidem sobre a coisa.

a) Dtos reais de garantia caducam todos. Devendo-se com venda executiva


proceder-se ao cancelamento do registo.

b) Os dtos de gozo só caducam se não tiverem um registo anterior ao do arresto,


penhora, ou garantia. Ex: o usufruto sobre imóvel registado antes da penhora
do bem.
Exceptuam-se os dtos que produzem efeitos em relação a terceiros
independentemente de registo; estes não caducam se forem constituídos
antes daqueles actos. Ex: usufruto sobre bem móvel não sujeito a registo,
constituído antes do arresto ou penhora.

Em relação a locação?

Par Oliveira Ascensão (e outros), a locação caduca, pois o direito de gozo do


locatário tem natureza real. Pedro Romano Martinez, também sufragava a cessação do
contrato de locação com a venda executiva. Alias o acórdão de 1998 foi buscar
fundamentos da caducidade da locação pelo que escreveu Martinez.

120
Direito de propriedade a título oneroso ou gratuito.
121
ROMANO MARTINEZ inclui a transmissão inter vivos e mortis causa a cessão da posição
contratual. A nosso ver a cessão da posição contratual pode operar inter vivos, por mortis causa é a
sucessão.

66
Afirmava o autor como nota “importa reconhecer que a finalidade conseguida
por este contrato pode ser atingida mediante recurso a direitos reais menores”, em
primeiro lugar, e em segundo lugar, que “retira-se - do artigo 1022.º-, que a locação é
uma forma de proporcionar o gozo temporário de uma coisa” Martinez, Contratos em
Especial; universidade Católica Editora, 1996, p. 158.

A semelhança das situações jurídicas e socio-económicas justifica e exige o


recurso à aplicação analógica do preceituado no n.º 2 do artigo 824.º, quanto a
caducidade do contrato de arrendamento.

Afirma-se ainda que não se trata de analogia para a colmatar lacuna legal
(interpretação analógica), mas da semelhança do arrendamento com um direito
real de gozo tal como o uso e habitação, além da sua tendencial longa duração. Por
isso deve ser tratado no concerne à tutela dos direitos do credor com garantia real.

Conclui-se que “na expressão – direitos reais (gozo)-, sujeitos a caducarem


mercê da venda executiva … encontra-se … abrangidos os contratos de
arrendamento, quer sujeito ou não há registo.

Assim, por via de interpretação teleológica e com base em argumentos de


analogia ou semelhanças das situações de facto e consequências práticas, deverá
entender-se que a referida norma do art.824.º se aplica a todos os dtos reais de gozo,
quer de natureza real, quer de natureza pessoal, que a coisa vendida seja objecto de
que produzam efeitos em relação a terceiros, deve para este efeito, equipará-lo a um
direito real (acórdão de 22.10. 2015 e 15.02. 2018).

Outra doutrina ( Antunes Varela, Pires de Lima, Galvão Telles, Pinto


Furtado, Menezes Leitão), entende Menezes, que no caso de venda executiva o direito
do locatário persiste, pois não se encontra incluído nos direitos que caducam com essa
venda, nos termos do artigo 824.º n.º 2. Pedro Romano, mudou para essa corrente.

O acórdão Português de 16.09.2018, entendeu que o artigo 824.º n.º 2, não e


aplica, nem directa, nem analogicamente ao arrendamento, não caducando, assim, com a
venda executiva, havendo-se antes como transmitida a posição do locador para terceiro
adquirente do prédio.

Acresce Galvão Telles que a concessão do gozo significa qua nada se transmite,
nada se transfere, nada se aliena. O que sucede é que o locador se vincula à prestação de
proporcionar esse gozo ao locatário, adquirindo este, em contrapartida, o direito à
mesma prestação-de natureza obrigacional-, e não qualquer direito sobre a coisa.

Refere Pinto Furtado, as disposições que concedem ao locatário tratamento


jurídico análogo aos dos direitos reais são raras e de natureza excepcional, não podendo
ser submetidas a integração analógica. Acresce ainda que não parece coerente defender-
se as equiparações legais, dada a natureza proeminentemente pessoal do direito do
locatário, só se aplicam porque há disposições a concedê-las e ,depois, admitir-se um
tratamento real para caso omisso do regime legal locativo.

67
B) TRANSMISSÃO DA POSIÇÃO PELO LOCATÁRIO

Vem prevista no art. 1059.°nᵒ 2 e remete para o art. 424.°. (trespasse de


estabelecimento comercial, art. 125.ᵒda LAU)

No âmbito do casamento vigora o princípio da comunicabilidade do


arrendamento (cfr. art. 97.° e 98.° da L.A.U.).

2. SUCESSAO MORTIS CAUSA (TRANSMISSÃO MORTIS CAUSA)

A) SUCESSÃO NA POSIÇÃO DO LOCADOR (CFR. ART. 2024).

B) SUCESSÃO NA POSIÇÃO DO LOCATÁRIO.

Para o locatário, a locação é intuitu persona porque é um contrato realizado


levando-se em conta a pessoa do locatário, logo não devia ser transmissível, mas no
âmbito do arrendamento pode ser transmitido aos herdeiros do locatário art. 99.° da
L.A.U., salvo o disposto no art. 100.° da L.A.U., ou se houver acordo cfr. art 1059.° n°
1 e 1051° al. c.

C) SUBLOCAÇÃO

A sublocação é um subcontrato122. Sublocação é o contrato celebrado pelo


locatário, com base num anterior contrato locativo.

Contém, portanto, em si, todos os caracteres do contrato de locação e só a posição


especial do locador em relação a coisa lhe confere natureza própria (o regime da
sublocação e o da locação, ex: subarrendamento para profissão liberal aplica-se o
regime do arrendamento para profissão liberal). O Código Civil a define no art. 1060.°.
Abrange tanto o arrendamento (art. art. 52.° da Lei n° 26/15) e o aluguer.

Ela pode ser total ou parcial ½, 1/3, ¼.

A-------------------------B-----------------------C
Locador locatário sublocatário
Sublocador

Ao contrário da cessão da posição contratual em que o cedente sai da


relação contratual, nesta o locatário permanece.

Cfr. art.ᵒ 1061.° do C.C. e 55.° da LAU (efeitos), art. 1062.° e art. 54.º da L.A.U.
(ex: se o subarrendamento for total por exemplo e paga 1.200,00, só pode cobrar ao
sublocatário até 20%, mas se for parcial, por exemplo 1/3, seria 1200. 1/3 o resultado
mais 10%), 1063.°do C.C. e 57.º da LAU (o locador pode cobrar a subarrenda).

122
Subcontrato é a convenção pela qual um dos contraentes, sem perder essa qualidade, permite a um
terceiro gozar as vantagens que esse contrato lhe proporciona.

68
O subarrendamento caduca pelas mesmas causas que extinguem o contrato de
arrendamento (cfr. arts. 56.º e 62.º da LAU).

4. REGIME JURÍDICO DA UTILIZAÇÃO DE ESPAÇOS EM CENTROS


COMERCIAIS.

Verifica-se a prática de designar estes contratos de cessão de exploração ou contrato


de ocupação, de modo a afastar as normas injuntivas do arrendamento comercial e
acrescentando cláusulas leoninas como a exigência de chave, renda, fiscalização da
contabilidade e acção directa.

Existindo esta prática, confrontam-se duas opiniões:

1. Contrato de utilização de espaços em centros comerciais como contrato típico de


arrendamento comercial

Pinto Furtado: o contrato pelo qual um gestor de um centro comercial se obrigaa


proporcionar a outro contraente o gozo temporário de um dos seus espaços destinados a
loja, mediante retribuição, integra um autêntico arrendamento não habitacional
comercial.

As lojas são exploradas pelos próprios proprietários, como unidadesindependentes,


em regime de propriedade horizontal. Embora materialmente autonomizadas e

69
numeradas as lojas estão na propriedade do titular do centro, que contrata com terceiros
a sua exploração de venda a retalho ou prestação de serviços.

À falta de disposição legal específica, a prestação temporária e remunerada


dafruição das lojas em centros comerciais é análoga às prestações de espaços em
parques de campismo ou em grandes prédios de espaços para serviços ou lojas.

Ao reconhecer-se a natureza de contrato misto de locação e de prestação deserviços


ao ser celebrado por um campista com um gestor do parque de campismo, não é
admissível recusar esta natureza ao contrato entre o gestor de um centro comercial e um
lojista. A diferença entre eles é que, no primeiro caso há um arrendamento para
habitação transitória, enquanto no segundo caso há um arrendamento comercial.

2. Contrato de utilização de espaços em centros comerciais como contratoatípico

Pais de Vasconcelos: a atribuição temporária e remunerada do gozo de uma lojade


centro comercial não pode ser vista como arrendamento comercial, pois este é
tipicamente individual, enquanto o que há é uma pluralidade agregada e a remuneração
é parciária, ao contrário do arrendamento.

Oliveira Ascensão: o contrato de cessão de utilização de espaços em


centroscomerciais, embora se traduza também na cedência onerosa dum direito de
utilização (de parte) dum imóvel mediante retribuição, acaba por ultrapassar o modelo
do arrendamento, por a vertente de prestação de serviços ser bastante acentuada.

Características do contrato de utilização:

a) É um contrato necessariamente comercial;


b) O concedente é um empresário;
c) O concedente assume a obrigação de fazer funcionar a empresa quecaracteriza o
centro;
d) O concessionário assume a obrigação de fazer funcionar a empresasingular;
e) Há algo como uma composse do concedente a limitar a empresasingular;
f) O concessionário sofre grandes restrições na sua posição sobre osbens.

As regras do arrendamento são inaplicáveis, visto que o arrendamento se referea um


objecto imóvel, enquanto os contratos de utilização se referem à existência de uma
empresa, a substância do negócio é empresarial.

Ao contrário do locador e locatário, a concessionária está estritamente dependente


da concedente no exercício do seu direito e na obtenção do seu efeito útil. A sua posição
não tem autonomia. A concedente controla do início até ao fim a utilização do local
disto é diferente o arrendamento, na medida em que, o arrendatário, uma vez feita a
entrega, tem um direito autónomo sobre a coisa). Isto significa que não há nenhuma
posse exclusiva da concessionária, quanto muito, é possível conceber uma composse 123
da administração do centro comercial e do lojista.

123
Composse: esta figura supõe a existência de dois ou mais possuidores da mesma coisa.

70
A concessionária está, por isso, numa posição subordinada perante a concedente, e é
tão vulnerável que esta, com uma simples interrupção do fornecimento da corrente
eléctrica, faz cessar toda a utilização do espaço (mais uma vez aqui se demonstra a
incompatibilidade deste regime com o da locação).

Resumindo, este é um contrato fundamentalmente distinto do contrato de


arrendamento. É um contrato atípico que se rege pela disciplina autónoma que as partes
lhe trouxerem, na medida em que não ofenda regras injuntivas e subsidiariamente pelo
que resulte da sua própria natureza e, eventualmente, por alguma analogia quanto aos
contratos típicos

É um contrato de empresa, sendo os poderes relativos ao imóvel, meramente


instrumentais, todo ele depende de actividades e prestações empresariais, que
constituem a sua essência.

EXTINÇÃO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO

O contrato de locação se extingue por revogação, resolução, caducidade,


denúncia e outras causas – invalidade, art. 62.º da LAU.

A) Revogação: ocorre quando o locador e o locatário põem termo ao contrato de


locação por mútuo acordo através da celebração de um contrato extinção 124.
Resulta do art. 406.°. Na lei do arrendamento art. 74.°.

B) Resolução: consiste na extinção do contrato com eficácia retroactiva por


declaração unilateral de uma das partes. A resolução ocorre quando não for
cumprido o contrato nos termos do art. 801.°.

⇨A resolução pelo locador; ocorre se o locatário violar uma das suas obrigações
resultantes do art. 1038.°, por exemplo não pagar a renda ou aluguer 125; utilizar o
prédio para práticas ilícitas, imorais ou desonestas (cfr. outras causas art. 76.° da
Lei n 26/15).

⇨ A resolução pelo locatário; ocorre nos termos do arts 1050.º do C.C. e 75.º, da
LAU.

124
Distrate mútuo dissenso é a convenção pela qual as partes revogam um contrato anterior.
125
O atraso apenas dará lugar a mora.

71
Os prazos para caducidade do direito de resolução vêm previstos no art. 77.º

C) Caducidade: é a extinção automática do contrato, como mera consequência de


algum evento a que a lei atribui esse efeito (ex: o decurso do tempo,
expropriação). As causas da caducidade vêm previstas no art. 1051.° do C.C. e
art 79.° da Lei do Arrendamento Urbano.

Assim, se o contrato foi celebrado para durar seis meses, findo esse prazo
caduca. Porém, nem sempre ocorre, como é caso da renovação automática
1054.°.

A locação pode caducar também se as causas que deram lugar ao contrato


cessarem (impossibilidade superveniente), exemplo arrenda um imóvel para
explorar um restaurante porque naquela zona se vai criar uma cidade académica
e isso não ocorre (erro vício).

D) Denúncia: é uma declaração feita por um dos contraentes, em regra com certa
antecedência sobre o termo do período negocial em curso, de que não quer a
renovação do contrato renovável ou a tempo indeterminado.

A denúncia vem prevista no art. 1055.° do C.C. e 80.° da Lei do Arrendamento


Urbano.

Constituem casos de denúncia os previstos no art. 80.º da LAU.

Quanto a forma de denúncia deve resultar de acção judicial nos termos do art.
82.º; Se a denúncia for feita pelo senhorio e o reocupar, o inquilino tem direito a
indemnização nos termos do art. 84.º.

ARRENDAMENTO RURAL

O C.C. apenas fixa um regime geral para o arrendamento rural nos arts. 1064.ᵒa
1082.ᵒ. Entretanto, não há existe regulamentação especial para os vários tipos de
arrendamento rural. Excepcionalmente, o direito de concessão precária regulado no art.
40 da Lei de Terras. Relativamente ao arrendamento florestal, a Lei de Bases de
Florestas e Fauna, Lei n 6/17, de 24 de Janeiro refere-se no art. 72 sobre os direitos de
constituição florestal e na al a) o contrato de concessão florestal, que a nosso ver, pode
ser um contrato de concessão do gozo de floresta atreves de arrendamento, outrossim
não nesta lei qualquer regulamentação.

ARRENDAMENTO URBANO

A L.A.U. , compreende uma parte geral, onde se regula os aspectos gerais aos
vários tipos, incluindo a acção de despejo (arts. 66.ᵒ a 73.ᵒ) e uma parte especial dos
arrendamentos em especial: Arrendamento urbano para habitação (arts. 86.ᵒ a 119.ᵒ);
para comércio e indústria (arts. 120 a 126); para profissão liberal (arts. 127.ᵒ a 128.ᵒ).

72
No âmbito da ACÇÃO DE DESPEJO importa analisar o arts. 66.ᵒ (fim); 67.ᵒ
(forma-processo comum sumário); 68.ᵒ (recurso de apelação). Ficam revogadas as
normas do C.P.C. sobre o despejo.

CONTRATO DE EMPREITADA
A maioria de nós (sobretudo nos centros urbanos) passa a maior parte do tempo
de nossas vidas no interior de construções, que nada mais é do que o objecto e resultado
final do contrato de empreitada.

Hodiernamente, o contrato de empreitada, muito ligado ao direito do


urbanismo126, tem um papel pertinente no comércio jurídico, designadamente na
construção casas residenciais, pontes, centros comerciais, estradas, reparação de
edifícios, reparação de automóveis (a quem qualifica a reparação de automóveis como
contrato de prestação de serviços), navios, mobiliário, desaterro (escavação), e a
remoção de terras, perfuração de tuneis, esgotos, poços, etc.

A empreitada vem regulada no C. Civil nos artigos 1207.ᵒa 1230.ᵒ. O legislador


civil define empreitada no art. 1207.ᵒ127128. A empreitada constitui uma das modalidades
do contrato de prestação de serviço a par do mandato e do depósito.

Existem dúvidas na qualificação de empreitada ou não por exemplo lavar ou


passar roupa, alguém que se obriga a escrever um livro (contrato de encomenda

126
É o conjunto de normas jurídicas relativas a formação, estruturação e funcionamento dos meios
urbanos enquanto tal. FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Economico, 1979, p. 457
127
Segundo ORLANDO GOMES, no contrato de empreitada, uma das partes obriga-se a executar,
por si só, ou com o auxílio de outros, determinada obra, ou a prestar certo serviço, e a outra, a pagar o
preço respectivo. O C.C. Italiano define empreitada no art. 1655.ᵒ (A’ppalto); C.C. Alemão §631.I
Werkvertrag; C.C. brasileiro art. 618.ᵒ.
128
Por realização de uma obra deve entender-se não só a construção ou criação, como a reparação, a
modificação ou a demolição de uma coisa. PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, C. Anotado, p. 865

73
intelectual), realizar um espetáculo, elaboração de um projecto. Intervenções cirúrgicas
realizadas por médicos, um parecer jurídico, um programa para computador.

Os sujeitos do contrato de empreitada têm as designações legais de empreiteiro e


de dono da obra que pode não ser o proprietário da coisa como resulta do nᵒ 1 e 2 do art.
1212.ᵒ. (exemplo um alfaiate que se obriga a fazer um fato e utiliza seus materias-
tecidos, botões. Depois de concluída a obra e aceite pelo dono da obra passa a ser
também proprietário desses materias).

No Direito Romano a empreitada constituía uma modalidade de locação, locatio


operis-locação de serviços.

EMPREITADA DE DIREITO PÚBLICO E DE DIREITO PRIVADO

Por força da influência francesa, em que se subordinava ao Direito


Administrativo a celebração de certos contratos entre a administração e os particulares,
veio a ser tradicional em Angola a qualificação de empreitada de obras públicas como
contrato administrativo (Contrato Administrativo, cfr. art. 120.ᵒ do Decreto nᵒ 16-A/95).

Em Angola as empreitadas de obras públicas vem reguladas em legislação


especial, na Lei nᵒ 09/16, de 16 de Junho,LEI DOS CONTRATOS PÚBLICOS,
Assim, “empreitada de obras públicas é o contrato oneroso que tenha por objecto a
execução ou a concepção e execução de uma obra pública”

A LCP para além de ser aplicada a empreitadas de obra públicas, aplica-se


também a locação, aquisição de móveis e serviços públicos (art. 2.º).

O contrato de empreitada, no Direito Privado, vem regulado nos arts 1207.ᵒe


ss. 129

NATUREZA JURÍDICA DO CONTRATO DE EMPREITADA

A quem defende que a empreitada tem natureza alternativa, isto é, civil e


comercial, consoante o resultado seja ou não produtivo. Assim, se o contrato for
economicamente produtivo e que resulte de organização empresarial (sociedade
comercial) com emprego de capitais, estar-se-ia no âmbito do Direito Comercial.

129
Contudo, hodiernamente é comum utilizar nas obras de grande envergadura, subsidiariamente normas
que regulam os contratos de empreitada de obras públicas (por exemplo sobre a adjudicação). A
regulamentação das empreitadas de obras privadas data de 1966, sendo a de empreitada de obras públicas
mais recente, normas mais actuais que justificam que sejam às vezes reguladoras de empreitadas de obra
privada, e uma vez que as soluções previstas na LEI Nᵒ 9/16,podem revelar-se mais equilibradas para
justa composição do interesse das partes, salvo as normas que manifestam interesses públicos. Podem
também as normas que regulam as empreitadas de obra pública ser aplicadas subsidiariamente quando o
C.C. é omisso em relação a uma certa matéria (por exemplo o prazo geral de garantia é 5 anos para
reparação de quaisquer defeitos art. 1225.ᵒ nᵒ 1 , o art. da LEI determina um prazo variável em função do
defeito e que poderá ser aplicável a empreitada civil. PEDRO DA GAMA XAVIER e VASCO DA
GAMA DE MESQUITA, aplicação de normas substantivas de Direito Público a contratos de
empreitada de obra particular: um caso de fuga para o direto público, pp 263-266

74
A empreitada tem natureza civil se alguém se obriga a realizar uma obra e não
empregar capital, ou a aplicação de capital tem pouca expressão, sendo apenas
instrumental, tendo em conta o valor total da obra a realizar, e se só assume o risco
do seu trabalho e de algum material que tenha fornecido, mas cujo valor seja
reduzido em relação ao preço da obra no seu conjunto.

Assim, a construção de uma casa por pedreiro contratado por alguém é


empreitada civil. Entretanto, se for construída por uma empresa já é comercial.

CARACTERIZAÇÃO DO CONTRATO DE EMPREITADA

→Típico e nominado;

→Sinalagmático;

→Oneroso;

→Consensual;

→Não formal, mas pode se convencionar a forma. Entretanto, o contrato de


empreitada de Direito Público esta sujeito a forma (cfr. art..ᵒ108.º da LCP);

→Obrigacional (podendo ser real quoad effectum, quando a propriedade da obra


pertença ao empreiteiro, e este venha a transmitir-se ao dono da obra, é o que acontece
na empreitada de coisas móveis realizada com matérias pertencentes ao empreiteiro, cfr.
art. 1212.ᵒ e art. 408.ᵒ nᵒ 2);

→ De execução duradoura ou instantânea.

QUANTO A EXECUÇÃO a empreitada pode ser:

. Lavor: o empreiteiro assume a obrigação de prestar o trabalho, fornecendo a


mão-de-obra.

. Mista: o empreiteiro fornece a mão-de-obra e materias

O CONTRATO DE EMPREITADA E FIGURAS PRÓXIMAS

A) Contrato de empreitada e contrato de trabalho

75
→O empreiteiro desenvolve a sua actividade de forma autónoma (quer dizer que
o empreiteiro realiza a obra sem interferência do dono da obra), não deve obediência ao
dono da obra130; no contrato de trabalho estar-se-á perante um vínculo de
hierarquia e subordinação (por força do poder de direcção do empregador e dever de
obediência do trabalhador);

→A obrigação do empreiteiro é de resultado a do trabalhador é de meios, pois


este se compromete a desenvolver diligentemente e prudentemente uma actividade. Mas
a existência de deveres acessórios (art. 44.ᵒ da LGT) podem conduzir a um resultado;

→Na empreitada quem suporta o risco é empreiteiro (se o empreiteiro não


realiza a obra por facto não imputável as partes-caso fortuito ou de força maior-, não
pode exigir o preço), todavia, no contrato de trabalho existe uma relacção de
comissão, não sendo o resultado obtido tem o trabalhador direito a remuneração (ex:
estar doente constitui falta justificada e não permite a execução do trabalho, ainda assim
tem direito a remuneração).

B) O contrato de empreitada e o contrato de prestação de serviços

O contrato de prestação de serviços assim como o contrato de trabalho, constitui a


locatio conductio operarum do direito romano.

Existem casos cuja qualificação é controversa se se trata de prestação de serviço ou


empreitada. São os casos de o contrato celebrado com médico em que se obriga a
colocar uma placa dentária, parece mais de empreitada.

→Na prestação de serviço se garante uma actividade através da utilização do


trabalho físico ou intelectual; na empreitada se promete o resultado desse
trabalhofísico ou intelectual(obrigação de resultado);

→Na prestação de serviços o risco corre por conta do beneficiário (O advogado


constituído num processo ainda que perca tem direito aos honorários), na empreitada o
risco corre por conta do empreiteiro (se não se obtém o resultado o dono da obra fica
dispensado de pagar o preço).

→A empreitada não se confunde com o mandato,pois o mandato presume-se


gratuito (art. 1158.ᵒ), a empreitada é onerosa;

→O mandante se obriga a praticar actos jurídicos (uma interpelação), o


empreiteiro realiza actos materiais. Porém, o mandatário pode praticar actos matérias
(entregar uma coisa) e o empreiteiro pode praticar actos jurídicos (obter uma licença
municipal); No mandato existe uma relação de comissão (pelos danos responde o
mandatário), o empreiteiro é independente.

130
O facto de o dono da obra poder fiscalizar a obra, elaborar projectos, impor alterações, não mina a
autonomia do empreiteiro.

76
→Não se confunde a empreitada com odepósito (cfr. art. 1185.ᵒ). O empreiteiro se
obriga a realizar a obra, mas também pode guardar a obra realizada, sendo um obrigação
acessória. O depósito é contrato real quoad constitutionem, a empreitada não.

C) O contrato de compra e venda e empreitada131

Não é muito fácil distinguir, por vezes, a empreitada da compra e venda, embora sejam
contratos com objectos diferentes.

→Da empreitada nasce uma obrigação de prestação de factopositivo (realização da


obra), na compra e venda há uma prestação de coisa (a entrega da coisa), sendo um
contrato que pressupõe a transferência da propriedade ou outro direito real de modo
imediato e automático, quoad effectum. Quando a empreitada a transferência da
propriedade tem regras próprias (1212.ᵒ e 408.ᵒ nᵒ2).

A dificuldade em distingui-las ocorre sobretudo nos casos em que os materias


são fornecidos pelo empreiteiro, e põem-se, sobretudo, quando o valor dos
materiais ultrapassa o valor do trabalho. Em princípio, no nosso direito, o
fornecimento de matérias necessários a execução da obra não altera a natureza do
contrato, como resulta claramente dos arts. 1210.ᵒe 1212.ᵒ132. O regime destes artigos
difere da compra e venda. Assim, a transferência da propriedade dos materias dá-se
só no momento da entrega da obra ou da incorporação no solo, e não por efeito do
contrato. Todavia, isso não quer dizer que as normas da compra e venda não possam
ser aplicadas na empreitada (cfr. art. 939.ᵒ)133.
Entre os dois, aliás, pode haver problemas de delimitação e “há um aspeto em que a destrinça” é
relevante. “Na compra e venda, não obstante terem sido estabelecidas algumas regras específicas, faz-se
remissão, consoante os casos, para o instituto do erro (arts. 905.º e 913.º) ou para as normas gerais do não
cumprimento (art. 918.º); ao passo que, na empreitada, foi estabelecido um regime próprio para o
cumprimento defeituoso (arts. 1218.º e ss.) Já com uma justificação relacionada com a execução do contrato,
cabe aludir à transferência da propriedade e do risco, podendo este encontra-se relacionado com a
impossibilidade de cumprimento. Por último, encontram-se algumas diferenças no que respeita ao regime da
cessação (...) Os contratos apresentam-se com uma finalidade distinta, pois o empreiteiro está adstrito a uma
prestação de facto (de facere), enquanto sobre o vendedor impende uma prestação de coisa (de dare). Por
outro lado, a compra e venda é um contrato real quoad effectum, porque os efeitos reais, translativos da
propriedade (ou de outro direito real), se produzem por mero efeito do contrato (art. 408.º), ao passo que a
empreitada constitui um negócio consensual do qual emergem efeitos obrigacionais. Mesmo quando o
cumprimento do contrato de empreitada acarrete a transferência da propriedade sobre uma coisa, esta
transferência segue regras diferentes das da compra e venda (arts. 1212.º e 408.º). Por último, há que ter em
conta que na compra e venda – em especial de coisa futura-, a iniciativa e o plano do objeto a executar cabem
ao que constrói ou fabrica a coisa, enquanto o empreiteiro realiza uma obra que lhe é encomendada,
devendo executá-la segundo as diretrizes e fiscalização daquele que lha encarregou”

Mas nada impede que as partes tenham querido um contrato verdadeiramente


misto combinado, fazendo corresponder uma contraprestação unitária à prestação

131
No Direito Inglês é irrelevante que se qualifique o contrato como de empreitada ou compra e venda,
porque o suply of goods and services act não diverge muito do sale of goods act.
132
Os matérias constituem apenas um meio para atingir certo fim
133
PIRES DE LIMA/ALMEIDA COSTA, P. 865-866

77
que tenha simultaneamente por objecto a obrigação de transferir o direito e a realização
da obra (Anotações de VAZ SERRA ao Ac. Do Trib. Sup. De 14 de Julho de 1972, pp.
191 e ss.).

→Contrato de promoção imobiliária

A construção e transferência da propriedade de edifícios (andares e moradias)


podem estar relacionadas com um contrato de promoção imobiliária.

Promotor imobiliário é a quele que constrói, por conta própria ou mediante


contrato de empreitada, o prédio e promove a sua venda, normalmente por andares,
antes ou depois da respectiva construção.

Em alguns países (Espanha, Itália, França, Portugal e Alemanha) tem sido


considerados tais contratos como de empreitada.

Não pode ser compra e venda o contrato, por força da unidade do sistema,
quando a obra é vendida depois de terminada. A solução mais justa é a de aplicar as
regras da empreitada. Mas, se vendido um prédio não construído ou ainda em
construção pode considerar-se um contrato misto.

Assim há uma lacuna no contrato de compra e venda no caso de edifícios e


outros imóveis destinados a longa duração, lacunas supridas pelos dispostos nos arts.
1225.ᵒpor força da analogia.

OBJECTO DA EMPREITADA

A empreitada tem por objecto a realização de uma obra. Para efeitos de


empreitada, obra não se identifica com o sentido corrente de serviço (tarefa), sendo
antes uma modalidade específica de serviço que traduz um resultado material,
correspondente a criação, modificação ou reparação de uma coisa, como o fabrico,
construção, benfeitorias, etc134.

134
Existe controversa na doutrina sobre a inclusão de obra intelectual no âmbito do objecto da empreitada.
Para tal existem duas teses: a tese do conceito amplo de obra sufragada por A. FERRER CORREIA e
ENRIQUES MESQUITA, que admitem que o conceito de obra pode ser integrado por um resultado
eminentemente intelectual. Para estes autores partindo de uma interpretação literal do art.
1207.ᵒaoutilizar apenas as expressões realizar certa obra conduzirá a tal resultado e do ponto de
vista sistemático, acrescem, a empreitada é, nos termos do art. 1155. ᵒuma modalidade de contrato
de prestação de serviços, o qual, nos termos do art. 1154. ᵒé definido como “…”, logo também o
contrato de empreitada se referiria a um trabalho intelectual ou manual, admitem ainda que o
legislador não curou no art. 1212.ᵒtodas as modalidades possíveis de empreitada , caberá ao interprete
traçar as não contempladas, o regime adequado.

78
A obra intelectual não parece ser objecto de empreitada, que se restringe a obras
corpóreas ou materias (ou imateriais por exemplo reparar um rádio), sendo antes objecto
de contrato de encomenda de obra intelectual, pois a fiscalização, transferência da
propriedade, alterações, defeitos da obra, é dificilmente compatível com a criação
intelectual, e, nestas esta assegurada a liberdade ao criador e a questão principal prende-
se com a atribuição do direito autoral sobre a obra, e a empreitada não resolve este
quesito.

Acresce PEDRO ROMANO MARTINEZ, que o legislador ao regulamentar o


contrato de empreitada, preocupa-se, quase exclusivamente, com a construção de
coisas corpóreas, muito em especial, edifícios. Acresce que, a aceitar a aplicação da
empreitada nas obras intelectuais, o seu objecto passará a ser muito amplo e a
empreitada passaria, na prática, a abranger todo contrato de prestação de serviço (art.
1154.ᵒ). Ademais, obra intelectual em si mesma não abrange por exemplo as
páginas do livro ou o disco. Por fim, o criador da obra pode desistir a todo tempo
da actividade a que se obrigou, na empreitada essa possibilidade só é concedida ao
dono obra (art. 1229.ᵒ).

Todavia, em alguns países como França, Alemanha, Espanha, Brasil, o


objecto do contrato de empreitada abrange as obras intelectuais, por força da
interpretação que se retira nos respectivos códigos a noção de contrato de
empreitada.

Porém, subsidiariamente, por analogia, algumas regras da empreitada ser-lhe-ão


aplicáveis.

PROCESSO DE FORMAÇÃO E EXECUÇÃO DO CONTRATO DE


EMPREITADA.

A empreitada de Direito Privado obedece ao regime regra da formação dos


contratos, previsto nos arts. 224.ᵒe ss. do C.C. Mas o processo pode ser difícil, pois
pode-se exigir um projecto remunerado a parte. O projecto com desenhos e a definição

Para tese do conceito restrito de obrasufragada por ANTUNES VARELA, CALVÃO DA


SILVA, PEDRO ROMANO MARTINEZ e outros, limitam a empreitada por referência a
obrigações de resultado consubstanciadas em objectos de natureza corpórea. Começam também com
uma interpretação literal do art. 1207.ᵒde que a exigência de um resultado material seria decorrente da
noção de obra, e a materialidade estaria presente em expressões usadas pela regulamentação
prevista, como seja o caso de dono da obra. Por outro lado a exigência de materialidade tornaria
inadequada a regulamentação do contrato de empreitada quando aplicado a contratos que tivessem
por objecto uma obra intelectual. Ademais, as criações intelectuais, enquanto obras do espirito, são
objecto de um regime legal próprio-constante da ordenação dos direitos do autor, assim se estiver
em causa um contrato que visa uma obra intelectual, a regulamentação a aplicar será, primordialmente,
essa (criticas se levantaram a esse argumento sobretudo por JEORGE BRITO PERREIRA, pois, para
que obra intelectual exista torna-se necessário, por imperativo lógico, que um processo produtivo/criativo
tenha sido seguido; os direitos do autor constituem apenas a aplicação protetiva do autor, que incidem
sobre o resultado final, não deve ser confundida com a incidência normativa primária sobre o próprio
processo. Cfr. JEORGE BRITO PERREIRA, pp. 580-587.

79
dos trabalhos a realizar, os materias empregues vêm a ser posteriormente objecto de
encargos que deverá ser respeitado pelo empreiteiro135.

A empreitada pode ser antecedida de uma fase pré-negocial (pode despoletar


responsabilidade pré-contratual nos termos do art. 227.º).

Normalmente a fase de negociação começa um pedido de orçamento depois de


explicada a obra. Esta fase pode ser autónoma constituindo mesmo um contrato (por
exemplo prestação de serviço com regras próprias).

Nesta fase de planeamento define-se o programa, seleciona-se o projectista,


elabora-se o projecto com estudo de materias e solo, e autorização administrativa. E o
empreiteiro apresenta o caderno de encargos reduzido a escrito que passa a fazer parte
do contrato.

Pode resultar de contrato de adesão quando o empreiteiro fixa a cláusulas


contratuais gerais. E sobre a interpretação aplica-se os arts. 236.º e seguintes,
relacionando-as com o art. 222.º.

Nada obsta a que a empreitada de Direito Privado possa decorrer de concurso


público (art. 463.º C.C.), denominado concurso para celebração de contrato de Direito
Privado136, e consequentemente é adjudicada (adjudicação é o acto de aceitação do dono
da obra da proposta do empreiteiro)137

A) CONSIGNAÇÃO DA OBRA

A consignação da obra é o acto pelo qual o comitente faculta ao empreiteiro os


locais onde será executada a obra, os materiais, plantas, etc. Com a consignação
começa a contar o prazo para a execução da obra e não com a celebração do
contrato.

Na empreitada de obra pública 236.º da LCP.

B) ALTERAÇÃO DO PLANO CONVENCIONADO

Constitui uma vicissitude do contrato de empreitada.

1. Alterações da iniciativa do empreiteiro


A regra é a de que o empreiteiro não pode realizar alterações (art. 1214.º nº 1). O
se pretende é evitar que o empreiteiro eleve importânciasda obra, aproveitando
por vezes a inexperiência do dono da obra. CFR. nº 2 e 3 do art. 1214.º

2. Alterações necessárias (art. 1215.º)

135
A formação do contrato de empreitada de obra pública inicia-se coma d de contratar, e só pode tomar
essa decisão de contratar se a verba estiver inscrita no orçamento (art. 31.º nº 1 e 2, da LCP).
136
MENEZES LEITÃO, p.p. 464-465
137
Na empreitada pública o concurso público é procedimento obrigatório (art. 44.º e arts. 69.º e ss. da
LCP). Sobre adjudicação art.98.º e ss.)

80
Não pode modificar a natureza da obra. Podem resultar de imperfeiçoes ou
insuficiências no plano convencionado não imputável as partes. Neste preceito
ficam de fora as alterações das circunstâncias (art. 437.º) e de impossibilidade
superveniente não imputáveis as partes (art. 1227.º). Contudo, a necessidade de
alteração pode resultar de acordo das partes, art. 406.º ou decisão do tribunal,
podendo nesta hipótese o dono da obra não aceitar e denunciar o contrato (art.
1229.º).

3. Alterações da iniciativa do dono da obra (art.º 1216.º).


É uma excepção do art. 406.º, pois admite a modificação por vontade unilateral.

4. Obras novas e alterações posteriores à entrega.


Obras novas vem previstas no art. 1217.º nº 1 (por exemplo a elevação de um
outro andar depois de entregue a obra. Quanto as alterações depois da entrega
parece que não podem ser da iniciativa do empreiteiro ou necessárias. CFR. nº 2.
O empreiteiro pode recusar, se aceitar estar-se-á perante novo contrato de
empreitada.

A empreitada de Direito Público o seu processo de formação é complexo e


pressupõe a realização de concurso público, adjudicação, prestação de caução, etc.

a) CAPACIDADE DAS PARTES

Para o dono da obra, aplicam-se as regras gerais. Entretanto, os inabilitados, nas


hipóteses de actos disposição (como nova construção) 138, art. 153.ᵒdo C.C., podem
celebrar contrato de empreitada desde que o empreiteiro apresente um certificado que o
habilite a efectuar a obra, assim como no mandato, art. 1159.ᵒnᵒ 1 cujo os poderes
abrangem administração ordinária (reparações). Sobre a distinção entre actos de
ordinária administração e disposição cfr. TGDC.

Para o empreiteiro profissional a empreitada é um acto de administração ordinária,


pois, a execução da obra corresponde a sua actividade normal, não se considera que
altere o seu património.

b) LEGITIMIDADE

A questão da legitimidade pode colocar-se quer em relação ao dono da obra quer em


relação ao empreiteiro (mais à aquele).

Tem legitimidade como dono da obra o proprietário, o representante legal,


mandatário, o usufrutuário, o locatário.

A utilização de material ou solo alheio não invalida o negócio podendo aplicar-


se o regime da cessão industrial mobiliaria ou imobiliária cfr. arts. 1333.ᵒe 1340.ᵒ.

138
Em sentido diverso MENEZES LEITÃO (o inabilitado prática actos de ordinária administração, os
actos de disposição só podem ser praticados por quem capacidade).

81
As reparações, modificações ou manutençãosobre a coisa que sobre ela incidem
direitos reais menores feitas proprietário, não invalidando o contrato, em que se ponha
em causa esses direitos (v.g. Arts. 1471.ᵒ, 1472.ᵒ e 1473.ᵒ).

Se se tratar de compropriedade e só um dos consortes for parte, este responde


perante o empreiteiro no âmbito do contrato, e perante os outros contitulares por ter
violado o direito de propriedade (poi faltou aquiescência dos demais). Se o dono da obra
actuar como gestor, na gestão de negócio, cfr. arts 464.ᵒe 465.ᵒ, arts 471.ᵒ.

c) PLURALIDADE DE SUJEITOS

Se houver vários donos e um empreiteiro os direitos e obrigações são exercidos


conjuntamente (obrigação conjunta, art. 513.ᵒ, quer dizer que em relação a pluralidade
activa ou passiva-vários donos da obra e um empreiteiro-, cada um deles demanda o
empreiteiro ou o empreiteiro demanda cada um deles). Se houver vários donos em
situação de indivisibilidade, aplica-se o art. 538.ᵒ. Na empreitada comercial, os vários
donos respondem solidariamente pelo pagamento do preço.

Se forem vários empreiteiros e um dono da obra e existir uma co-empreitada 139 cada
co-empreiteiro esta vinculada ao dono da obra mas em contratos distintos, cada um
deles só estará obrigado pela respectiva execução (por exemplo no caso de várias
empresas de construção em que cada uma tem as suas atribuições).

Não se trata nesta hipótese de um consórcio140 de empreitada.

Mas se forem vários empreiteiros fora da co-empreitada é aplicável o disposto nos


arts. 513.ᵒou 535.ᵒ.

Se for comercial haverá solidariedade entre os empreiteiros.

EFEITOS DO CONTRATO DE EMPREITADA (DIREITOS E OBRIGAÇÕES-


NO PLANO DAS RELAÇÕES INTERNAS)

DIREITOS DO DONO DA OBRA

A) Obtenção de um resultado

Constitui o principal direito do comitente (empreiteiro). Pressupondo o contrato de


empreitada uma obrigação de resultado para o empreiteiro (logo, um direito subjectivo
do dono da obra), ao dono da obra deve ser-lhe entregue a obra no termos acordados, ou
seja, com aquele efeito útil.

B) Direito de fiscalização da obra

139
Ocorre quando os vários empreiteiros obrigam-se, em conjunto, por contratos distintos, a executar o
mesmo trabalho, ficando cada co-empreiteiro directamente relacionado com o dono da obra.
140
Consórcio origina-se pela necessidade de as empresas se unirem para execução, em conjunto, de todas
as fases e os projectos necessários a conclusão de um empreendimento na construção civil, mediante
celebração de um contrato de empreitada total.

82
O art. 1209.ᵒ (tratando-se de norma imperativa, sendo nula as convenções em contrário)
atribui ao dono da obra a faculdade de fiscalizar a execução da obra. A fiscalização da
obra tem como fim principal impedir que o empreiteiro oculte vícios de difícil
verificação no momento da entrega. Visa controlar o modo como o empreiteiro
executa a obra, fundamentalmente quanto aos materias que utiliza, o respeito pelo
plano convencionado. Através da fiscalização, o dono da obra pode exigir alterações à
obra, grandes ou pequenas (cfr. art. 1216.ᵒ).

Não traduz uma obrigação do empreiteiro convidar o dono da obra a fiscalizar, mas se
exercer esse direito deverá fazê-lo de boa-fé.

A simples fiscalização não significa o exercício de autoridade e direcção que caracteriza


o contrato de trabalho (cfr. art. 1152.ᵒ). Não se coarta a independência do empreiteiro.
Ademais, a fiscalização só pode ser feita de modo a “não perturbar ao normal o
andamento ordinário da empreitada”.

O exercício deste direito, por ser do interesse do dono da obra, deve ser ele a custeara as
despesas, podendo ser feita directamente por ele ou por terceiro por si contratado
(arquiteto, engenheiro, director de trabalhos, empresa, etc.).

O direito de fiscalização, não significa renúncia tácita aos direitos relativos a sua má
execução (art. 1209.ᵒ nᵒ 2) nem os efeitos da verificação (art. 1218ᵒ).

DEVERES DO DONO DA OBRA

A) Dever do pagamento do preço

Constitui um elemento essencial do conceito de empreitada, sem o preço seria uma


prestação de serviço gratuita (mandato ou depósito gratuito, cfr. arts.). Mas pode não
haver equilíbrio das prestações, o preço pode ser simbólico.

Nos termos do art. 1211.ᵒo preço é fixado nos termos do art. 883.ᵒ. Assim, o preço deve
ser convencionado se não for imposto por autoridade pública. Em seguida pelos outros
critérios. Outrossim, não pode ser fixado preço pela bolsa, por não se cortinar a
possibilidade prática de aplicar no âmbito da empreitada.

Constitui o principal dever do dono da obra, o dever de pagar o preço. O preço pode ser
fixado de várias formas, assim teremos:

→Preço global ou a corpo (a chamada empreitada à forfait): é aquela em que o preço


é fixado no momento da celebração do contrato globalmente para toda
obra(exemplo Mão de obra----1000; materias-----1000; margem do empreiteiro----5000
/ 6000). Envolve alguns riscos para o empreiteiro, pois, se o preço dos materias forem
alterados ou se existir a necessidade de realizar alterações não previstas, o empreiteiro
não pode reclamar o aumento do preço ainda que forem autorizadas pelo dono da obra

83
se não forem por escrito, podendo apenas reclamar a indeminização por enriquecimento
sem causa (art. 1214.ᵒ nᵒ 3)141.

→Preço por medida ou unitário: é determinada uma tarifa para determinada


unidade de medição (construção de uma parede a tanto por metro; abertura de uma
estrada a tanto por km; construção de um edifício a tanto por metro quadrado de área
coberta, construção do muro, alicerce, etc.,). O preço final resultará de medição que virá
a ser realizada depois de concluída a obra.

→Preço por artigo:o preço é fixado por mercadoria e, o preço final variará em
função do tipo e quantidade dos artigos. Ex: 1000 batas, por cada bata 10.000 kzs.

→Preço por tempo de trabalho:fixado em função do tempo de trabalho diário,


vindo a ser pago em função do número de dias de realização de obras. Ex: se obriga
a construir um alpendre, será pago em função do número de dias que executar a obra.

→Preço por percentagem:quando o dono da obra fornece os materias e paga a


mão-de-obra, atribuindo ao empreiteiro uma percentagem conjuntamente sobre o
valor dos materiais e do trabalho contratados(material 500.000 e mão de obra
500.000 e o empreiteiro recebe 30%).

Em relação a empreitada de obra pública o preço pode ser global; por série de
preços e por percentagem(art. 185.º da LCP).

Se for convencionado o pagamento do preço total ou parcial antes da aceitação,


o empreiteiro poderá invocar a excepção do não cumprimento. (art. 428.ᵒ). Assim, se for
convencionado pagamentos parciais em cada fase, o empreiteiro poderá suspender a
execução da obra, caso o dono não lhe pague o preço correspondente à parte já
executada.

O preço consiste sempre numaquantia em dinheiro, pois a lei se refere a preço e


não retribuição142. Pode-se convencionar noutrasespécies, Ex: o empreiteiro receber
como retribuição uma quota da obra a criar. Nestes casos parece tratar-se de um
contrato misto de empreitada e dação em cumprimento.

O nᵒ 2 do art. 1211.º é na verdade um a norma supletiva.

Fixado preço ele pode vir a ser alterado ou revisto 143. A lei por vezes impõe
essa alteração, como é o caso das alterações necessárias (art. 1215.ᵒ) e de alterações
exigidas pelo dono da obra (art. 1216.ᵒ nᵒ 2). Nas empreitadas de longa duração
(construção de edifícios, etc.) é comum as partes convencionarem alterações do preço.

141
Princípio do nominalismo monetário o risco é do credor.
142
PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA, p. 874. Contra PEDRO ROMANO MARTINEZ
143
A regra é a de que o preço estabelecido não pode ser alterado, ou seja, o empreiteiro não pode pedir
qualquer acréscimo mesmo que os salários e os materias tenham aumentado. A revisão do preço é uma
situação excepcional por força da lei ou convenção.

84
Esta hipótese fundamenta-se, pois, sem essa cláusula, apenas se aplica o disposto nos
arts. 437.ᵒe ss, que é um regime mais rigoroso144.

O pagamento faz-se com a aceitação (art. 1211.ᵒ), pois a partir deste momento se
transfere a propriedade da obra (art. 1212.º nº 1, C.C.). É frequente nas empreitadas de
imóveis estabelecer o pagamento do preço por prestações em períodos determinados ou
em função do trabalho executado.

B) Cooperação necessária

Este dever resulta da necessidade, muitas vezes, do dono da obra fornecer o terreno, o
projecto ou materias e utensílios145, obter autorizações, etc., com o fito de o empreiteiro
executar a obra que se encontra obrigado. Na verdade, não constitui uma verdadeira
obrigação, mas antes um dever do credor, cuja violação faz incorre em mora do credor
(art. 813.ᵒ), permitindo o aumento do prazo para a execução da obra.

Se o dono da obra não cumpre este dever (apesar de o empreiteiro não poder
exigir), pode a contra parte invocar a excepção do não cumprimento, exigir uma
indeminização ou resolver o contrato nos termos do art. 802.ᵒnᵒ 2.

Ao dono da obra pode se imputar deveres acessórios de conduta (informação).

C) Dever de verificação, comunicação e aceitação (sobre esta matéria PEDRO


MARTINEZ p.p. 435- 443)

→ A verificação da obra (art. 1218.ᵒ ns. 1, 2 e 3):constitui um dever e um ónus do


dono da obra. Terminada a obra, o comitente (empreiteiro) deve a visar o dono de que
ela esta em condições de ser verificada.Tem por finalidade permitir ao dono da obra
assegura-se pessoalmente de que esta foi executada conforme as condições
acordadas e sem vícios. Não se confunde com a fiscalização (esta ocorre na fase da
execução).

As despesas de verificação, na falta de convenção, correm por conta do empreiteiro.

Da verificação e aceitação depende o vencimento do preço (cfr. art. 1211.ᵒ nᵒ 2), daí a
lei considera obrigatória para o dono da obra (n. 1). Cfr. nᵒ 2 e 3).

→A comunicação do resultado da obra: é o acto jurídico mediante o qual o


dono da obra transmite ao empreiteiro o resultado da verificação, isto é, se a obra
se encontra nos termos acordados e sem vícios( nᵒ 4). Distingue-se da verificação por
se tratar esta de um acto material. A comunicação não exige forma e declaração
negocial pode ser expressa ou tácita e obedece as regras do art. 224.ᵒ, se for entre
ausentes.

144
A alteração do preço do preço por alteração anormal das circunstâncias ocorre quando a execução da
obra se torna mais difícil ou onerosa.
145
Em relação aos materiais e utensílios é um dever que resulta de convenção (art. 1210.º).

85
Se na comunicação forem denunciados vícios considera-se, a princípio, como
não aceita a obra (cfr. arts. 1220.ᵒ e ss.).

Existe divergência sobre a natureza jurídica da comunicação: para RUBINO é


uma declaração de ciência (dar ciência é dar a conhecer); para outros uma operação
técnica de informação.

→A aceitação da obra:Difere-se da comunicação. No direito alemão é


dispensável a aceitação, basta a entrega. É um acto de vontade pelo qual o dono da obra
declara que a obra foi realizada a seu agrado (contento) e que deve recebe-la e paga-la
(art. 1211.º nº 2), excepto se já tiver a posse.

A aceitação pode ser expressa ou tácita-quando se comunica ao empreiteiro que


a obra executada conforme acordado e sem defeitos (art. 217.º) ou por força do silêncio
(aceitação ficta no nᵒ 5) (art. 218.º) na hipótese de falta de verificação ou comunicação.

A aceitação pressupõe a transferência da propriedade sobre a coisa construída


com os materias pertencentes ao empreiteiro (art. 1212.ᵒ nᵒ 1), cujo risco passa por conta
do dono (art. 1228.ᵒ nᵒ 1). Exige-se com a aceitação a entrega da obra, excepto se já
estiver na posse do dono da obra.

A aceitação pode ser com ou sem reserva. Na primeira hipótese ocorre quando o
dono da obra detecta vícios e a aceita mas não renuncia os direitos que lhe são
conferidos nos arts. 1221.º e ss. Na segunda ocorre quando não detecta vícios e é seu
agrado e determina a irresponsabilidade a respeito dos vícios visíveis e conhecidos 146
(art. 1219.º).

A aceitação pode ser anulada, por erro, dolo ou coação.

. Se recusar sem motivo a verificação ou aceitação, constituir-se-á em mora do


credor perante o empreiteiro (art. 813.ᵒ), o que implica a inversão do risco (1228.ᵒ nᵒ 2),
permite ao empreiteiro efectuar a consignação em depósito sempre que for possível (art.
841.ᵒ e ss.).

DIREITOS DO EMPREITEIRO

1. Direito à recepção do preço

Constitui o principal direito do empreiteiro.

Tratando a empreitada um contrato sinalagmático, o pagamento do preço representa


o correspectivo pela realização da obra. Se o empreiteiro não realiza a obra ou a realiza
mais defeituosamente o dono da obra pode suspender o pagamento preço. Se não for
pago o preço o empreiteiro pode resolver o contrato se se tratar de incumprimento
definitivo (arts. 801.ᵒ nᵒ 2 e 808.ᵒ).

146
E não por vícios ocultos.

86
2. Direito de retenção147

Para compelir o dono da obra a cumprir a sua obrigação principal e garantir


indeminizações pelo inadimplemento dos deveres contratuais, o empreiteiro goza do
direito de retenção (art. 754.ᵒ) da obra que construiu ou modificou, quer seja móvel (art.
758.ᵒ) ou imóvel (art. 759.ᵒ); exemplo: o mecânico ou alfaiate que não é pago.

Alguma doutrina (PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA) nega a existência


deste direito no âmbito da empreitada, pois, o direito de retenção constitui uma garantia
excepcional, pelo que não poderá aplicar-se nos casos não previstos na lei e, o direito de
retenção do empreiteiro não se encontra previsto no art. 755.ᵒ.

Outrossim, a generalidade da doutrina admite o direito de retenção na empreitada,


este este direito é um instituto de aplicação geral para qualquer credor.

Do contrato de empreitada, resulta para o empreiteiro a entrega da coisa e o pagamento


do preço resulta das despesas que realizou na construção, modificação ou reparação.

Por aplicação do regime do penhor (excepto as regras sobre a legitimidade


art.667.ᵒ nᵒ 1), o empreiteiro pode, por força dos arts. 758.ᵒe 759.ᵒnᵒ 3 usar das acções
possessórias 1276.ᵒe ss, até contra o proprietário da obra. Mas não pode adquirir por
usucapião a coisa por força do 1251.ᵒ.

O direto de retenção pode incidir sobre coisa que não seja propriedade do dono
da obra (por exemplo o locatário que aluga um automóvel e contrata um empreiteiro, se
não paga pela reparação) ou de terceiro (compra e venda com reserva de propriedade,
em que o comprador realiza obras na coisa que lhe foi entrgue), pois, o art. 754.ᵒexige
apenas que a coisa seja certa, não se referindo a propriedade da mesma 148. Também,
pode incidir o direito de retenção nos casos em os materias foram fornecidos pelo
empreiteiro (art. 1212.ᵒ).

DEVERES DO EMPREITEIRO

1. Realização da obra

A principal obrigação do empreiteiro é a realização da obra e sem vícios (arts.


1207.ᵒ e 1208.ᵒ). O cumprimento desta obrigação obedece os princípios da pontualidade,
isto é deve obedecer os prazos (art. 406.ᵒ), sob pena de mora independentemente de
interpelação (art. 805.ᵒ nᵒ 2) e da boa-fé (art. 762.ᵒ nᵒ 2).

O empreiteiro esta vinculado aos deveres acessórios de conduta, como: informação


(sobre a coisa); cuidado; de segredo, segurança, etc.

2. Fornecimento de materias e utensílios

147
Consiste na faculdade de uma pessoa reter ou não restituir a coisa alheia que possui ou detém, até ser
pago o que lhe é devido por causa dessa coisa, pelo respectivo proprietário.
148
Porem, já não pode exigir o pagamento a um terceiro por força do princípio da relatividade dos
contratos art. 406.ᵒ.

87
Sobre o empreiteiro impede, supletivamente a obrigação prevista no nᵒ 1 do art.
1210.ᵒ, que uma obrigação natural. Se inclui por exemplo o material para construção de
um estaleiro.

Quanto a qualidade, devem ser as acordadas pelas partes, no silêncio, cfr. art.
1210.ᵒn 2.

Se não existirem o materias convencionados e sem culpa do empreiteiro, estar-se-á


perante as alterações necessárias (art. 1215.ᵒ; por exemplo o material já não existe no
mercado ou os que existem são mais caros).

3. Guarda e conservação da obra

Constitui um dever lateral que pode resultar do contrato. Se ao empreiteiro tiver sido
confiada uma coisa para reparar, ou a propriedade da coisa já tiver sido transferida ao
dono da obra (aceitação art. 1211.º nº 2), no caso de empreitada de construção, sem que
se lhe tinha sido entregue (art. 1212.ᵒ), o empreiteiro fica vinculado a guardar e
conservar a coisa, constituindo-se num depositário (1187.ᵒ). Ex:Existe no Lubango um
senhor mecânico que se no dia e hora acordada não for buscar o automóvel ele coloca
na estrada e com as chaves, se for furtado ele responde não por incumprimento do
contrato, mas por violar o dever de custódia.

Se os materias forem fornecidos pelo dono da obra, este dever se imputa ao


empreiteiro até a incorporação.

4. Entrega da coisa

É o último dever do empreiteiro que surge depois da conclusão da obra, sendo a


entrega poder ser material ou simbólica. Se não houver prazo é uma obrigação pura
(dificilmente na empreitada a obrigação será pura, por causa da natureza da empreitada
e dos usos fixar-se-á prazo por acordo, art. 777.º nº 2), aplica-se o disposto no art.
777.ᵒnᵒ 2 (só haverá mora com a interpelação, art. 805.º nº 1), quando ao lugar, aplica-se
o disposto no art. 773.ᵒnᵒ 2 (sendo a coisa móvel).

88
SUBEMPREITADA
A subempreitada constitui um subcontrato e que vem definida no art.
1213.º nº 1. O subempreiteiro se obriga a realizar uma prestaçã o (uma obra)
relacionada com a obra (dita principal).

O empreiteiro assume a posiçã o de dono da obra perante o novo


empreiteiro.

Dono da obra-----------------empreiteiro -------------------------subempreiteiro


dono da obra empreiteiro

A subempreitada pode ser total ou parcial, esta é frequente na construçã o


de imó veis por exemplo colocaçã o de caixilharia, vidros, assentamento se soalho.

Os empreiteiros recorrem a subempreitada as vezes por razões de


especialização (montagem de elevadores, passeios, canalizaçã o, etc.) e por razões
da quantidade dos encargos e nã o tem capacidade para cumprir dentro dos
prazos convencionados.

Força do art. 1213.º n 2.º. é aplicá vel a subempreitada os arts. 264.º e ss.

A subempreitada facilita o incremento de pequenas empresas e postos de


trabalho.

São pressuposto da subempreitada:

a) Existência de um contrato prévio;


b) Celebração de um outro contrato.

Nã o existe contrato misto pois a empreitada e a co-empreitada nã o se fundem,


mantem-se autó nomos (uniã o ou coligaçã o de contratos unilateral).

Os contratos nã o prosseguem uma finalidade econó mica comum, tendo


identidade, pelo menos parcial, de conteú do e de objecto. Contudo, prosseguem a
mesma finalidade, a execuçã o da obra149.

No contrato de subempreitada existe liberdade de celebraçã o, ou seja, nã o


carece de aquiescência do dono da obra, alias o contrato principal pode ter

149
Daí que o empreiteiro será responsável perante o dono da obra pelo inadimplemento do subempreiteiro

89
clá usula neste sentido ou resulte da execuçã o do pró prio contrato (quando por
exemplo o contrato de empreitada possa resultar de tarefas especiais nã o
exequíveis pelo empreiteiro ou se tal faculdade resultar do cará cter fungível da
prestaçã o do empreiteiro; e para o dono da obra o mais importante é resultado que
seja atingindo pelo empreiteiro ou terceiro).

Todavia existem casos em que o consentimento do dono da obra é fundamental


para que a subempreitada produza efeitos em relaçã o a ele.

Mas se nã o houver consentimento, o contrato é eficaz entre as partes, mas


ineficaz em relaçã o ao terceiro (dono da obra), logo nã o há ilegitimidade e aplica-
se o disposto no art. 795.º ou 801.º.

A violaçã o dessa obrigaçã o negativa só gera responsabilidade contratual do


empreiteiro se vir a ser executada pelo subempreiteiro.

A autorizaçã o nã o carece de forma especial e pode ser expressa ou tá cita.

A autorizaçã o pode ser específica ou geral, ou ainda depender de uma


aprovaçã o concreta. Específica quando o dono da obra faz referencia a um
subempreiteiro ou objecto certo. Se nã o há essa referencia a subempreitada é
geral. Mas autorizaçã o pode posterior.

Mas se for concedida uma autorizaçã o ou depender de aprovaçã o em concreto


e sem razã o o dono da obra nã o autoriza, haverá abuso de direito (art. 334.º C.C.,
por força da exceptiodolisgeneralis ou venire contra factumproprium).

Em relaçã o a empreitada pú blica cfr. LEI nᵒ 09/16, de 16 de Junho, Lei da


Contratação Pública

FIGURAS PRÓXIMAS (DISTINÇÃO).

1. Cessão da posição contratual

A subempreitada nã o se confunde com a cessã o da posiçã o contratual. Na


cessã o transmite-se a um terceiro do acervo de direitos e deveres que, para uma
parte, emergem de terminado contrato (art. 426.º). Há uma mudança subjectiva da
relaçã o contratual. Na subempreitada nã o substituiçã o mais sim sobreposiçã o de
sujeitos, pois mante-se na relacçã o contratual também o empreiteiro, ficando
ambos vinculados ao dono da obra.

Para que a cessã o produza efeitos tem de haver anuência 150 da contraparte,
contudo dispensá vel, à princípio, na subempreitada.

A subempreitada segue as regras da empreitada, a cessã o segue as regras do


negó cio que lhe serve de base (art. 425.º onerosa ou gratuita).

150
Todavia, pode haver cessão sem consentimento quando feita sob condição.

90
Ao cessioná rio sã o facultados os meios de defesa do cedente no â mbito do
contrato base contra o cedido, o que nã o sucede na empreitada.

A subempreitada só pode ser celebrada pelo empreiteiro e nã o pelo dono da


obra embora este possa ceder a sua posiçã o contratual.

Se existirem dú vidas de qualificaçã o se o contrato é de subempreitada ou


cessã o de créditos, presume-se iuris tantum de subempreitada. Os fundamentos
dessa presunçã o resultarem do facto de que a subempreitada pode realizar-se sem
consentimento e nã o a cessã o; por outro lado, a subempreitada é sempre um
negó cio oneroso e relativamente as dú vidas sobre a interpretaçã o deve-se buscar
um resultado que conduza a um maior equilíbrio das prestaçõ es (art. 237.º). Pois
persistindo ambas as relaçõ es o dever “obtençã o de resultado” fica mais garantido
para o dono da obra, assim como o “preço” para o empreiteiro.

Em relaçã o as obras pú blicas cfr. art.

2. Contrato de fornecimento de materiais

Este contrato ocorre quando empreiteiro solicita materias e utensílios à um


terceiro. Aqui trata-se de compra e venda ou locaçã o e nã o subempreitada. Mas se
além do fornecimento o terceiro fica obrigado a uma obra com os materiais, parece
haver uma compra e venda ou subempreitada (ex: a instalaçã o de um elevador por
um terceiro). Ou aluga-se um gerador industrial e a empresa fornece um operador,
pode haver aluguer ou subempreitada.

3. Contrato de trabalho

O empreiteiro pode celebrar contrato de trabalho com certas pessoas. Nesta


hipó tese haverá uma relaçã o de hierarquia e subordinaçã o, sendo uma obrigaçã o
de meios.

Por outro lado o subempreiteiro pode subcontratar e o trabalhador só pode ser


substituído com consentimento da entidade patronal.

4. Cessão de trabalhadores

A cessã o de trabalhadores corresponde a uma cedência ocasional de


trabalhadores ou uma relaçã o de trabalho temporá rio (ver LEI GERAL DO
TRABALHO) é um contrato atípico de prestaçã o de serviço.

Nesta hipó tese os trabalhadores contratados vã o trabalhar sob organizaçã o,


ordens e responsabilidade do empreiteiro; quem cede os trabalhadores nã o
assume os riscos da execuçã o da obra. Na subempreitada os trabalhadores
executam os trabalhos à s ordens do subempreiteiro e, os riscos sã o partilhados
entre o empreiteiro e o subempreiteiro.

5. Co-empreitada
91
Ocorre quando os vários empreiteiros obrigam-se, em conjunto, por contratos
distintos, a executar o mesmo trabalho, ficando cada co-empreiteiro directamente
relacionado com o dono da obra. Na subempreitada o vínculo contratual é com o
empreiteiro.

Contudo, pode haver na co-empreitada um empreiteiro principal a quem foi


encomendada a parte mais expressiva e orientar a execução dos trabalhos dos demais.
Pode haver co-empreitada ou subempreitada conforme tenham sido contratados pelo
empreiteiro ou subempreiteiro.

Regime da subempreitada

À subempreitada aplica-se o regime da empreitada. Mas por convenção pode ser


aplicado regime diverso em relação ao preço e tipo de preço (a corpo ou por medida) e
os prazos.

Também não aplicável na subempreitada, por força da sua natureza, o disposto no


art 1214.º nº 3- alteração por escrito da iniciativa do empreiteiro.

Em relação a aceitação pelo empreiteiro, se não houver referência no subcontrato,


esta fica condicionada à aceitação, sem reserva pelo dono da obra, isto é, enquanto a
obra principal não termina a subempreitada não é aceite.

Quanto aos prazos de caducidade, se se tratar de vícios aparentes e a aceitação


coincide (subempreitada e empreitada) o prazo de garantia é o mesmo (art. 1224.º nº 1).
Em relação aos vícios ocultos, o prazo de garantia da subempreitada contar-se-ia a partir
do momento em que o subempreiteiro entrega a obra ao empreiteiro, o que poderia
ocorrer antes da entrega ao dono da obra, assim como nas empreitadas de longa
duração.

O prazo de garantia do subempreiteiro só termina antes da empreitada se a


empreitada for autónoma, podendo ser verificada e aceite antes da empreitada principal.

Em relação ao preço, o pagamento da subempreitada não fica condicionada a


execução do contrato geral se houver autonomia da subempreitada.

Relação entre o dono da obra e o subempreiteiro: acção directa.

Alguma doutrina (PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA p. 880) admitem que por


não existir nenhum vínculo directo entre o dono da obra e subempreitada não existe
também qualquer acção directa (como direito de retenção) contra o dono da obra151.

MENEZEZ LEITÃO (p. 488), entende também neste sentido, acresce que isto
violaria o princípio da relatividade (art. 406.º), as regras do concurso de credores (art.
604.º). dai que a inexistência dessa relação impede o dono da obra possa reagir contra o
subempreiteiro se existir vícios (reage contra o empreiteiro e este teria direito de
regresso nos termos do art. 1226.º- só não será assim na hipótese do art. 1225.º).

151
ACORDÃO DO TRIB. SUPREMO DE PORTUGAL, de 28 de Maio de 1981

92
E qualquer alteração no plano convencionado é ao empreiteiro que o subempreiteiro
pede autorização (arts. 1214.º nº 1 e 1215.º) e aquele ao dono da obra.

MENEZES, ressalva apenas a possibilidade de o dono da obra pode exercer contra o


empreiteiro acção sub-rogatória contra o empreiteiro nos termos gerais. E, por seu turno
o subempreiteiro pode exercer direito de retenção se não for pago o preço.

PEDRO ROMANO MARTINEZ entende que em alguns casos é admitida a


existência de uma relação entre o dono da obra e o subempreiteiro: o princípio da
relatividade comporta excepções (art. 406.º nº 2) e o dono da obra e subempreiteiro não
são verdadeiros terceiros entre si.

Assim, o dono da obra pode exigir ao subempreiteiro quer o cumprimento quer


responsabiliza-lo pelo incumprimento, pois a empreitada e a subempreitada visam o
mesmo fim. E, ainda que a obra seja executada por subempreiteiro o dono da obra tem
direito de fiscalização e pode exigir alterações.

Também o subempreiteiro tem direito a acção directa contra o dono da obra em


relação ao pagamento do preço, podendo mesmo reter a coisa se a mesma não for paga.

93
EXTINÇÃ O DO CONTRATO DE EMPREITADA

O contrato de empreitada extingue-se com a entrega da obra. Pode também


extinguir-se por impossibilidade de cumprimento; desistência do dono da obra;
por morte ou incapacidade do empreiteiro.

SUBEMPREITADA

94
A subempreitada constitui um subcontrato e que vem definida no art. 1213.º nº
1. Na LEI DOS CONTRATOS PÚBLICOS vem definida no art. 340.º.

O subempreiteiro se obriga a realizar uma prestação (uma obra) relacionada com


a obra (dita principal).

O empreiteiro assume a posição de dono da obra perante o novo empreiteiro.

Dono da obra-----------------empreiteiro -------------------------subempreiteiro


dono da obra empreiteiro

A subempreitada pode ser total ou parcial, esta é frequente na construção de


imóveis por exemplo colocação de caixilharia, vidros, assentamento se soalho152.

Nas subempreitadas públicas o empreiteiro não pode subempreitar mais de 75%,


art. 339.º nº 3. Para as subempreitadas de obras públicas a lei exige forma (340.º nº 2).

Os empreiteiros recorrem a subempreitada as vezes por razões de


especialização (postes de iluminação pública, montagem de elevadores, passeios,
canalização, etc.) e por razões da quantidade dos encargos e não tem capacidade para
cumprir dentro dos prazos convencionados.

Força do art. 1213.º n 2.º. é aplicável a subempreitada os arts. 264.º e ss.

A subempreitada facilita o incremento de pequenas empresas e postos de


trabalho.

São pressupostos da subempreitada:

c) Existência de um contrato prévio;


d) Celebração de um outro contrato.

Não existe contrato misto pois a empreitada e a subempreitada não se fundem,


mantem-se autónomos (união ou coligação de contratos unilaterais).

Os contratos não prosseguem uma finalidade económica comum, tendo identidade,


pelo menos parcial, de conteúdo e de objecto. Contudo, prosseguem a mesma
finalidade, a execução da obra153.

No contrato de subempreitada existe liberdade de celebração, ou seja, não carece de


aquiescência do dono da obra, alias o contrato principal pode ter cláusula neste sentido
ou resulte da execução do próprio contrato (quando por exemplo o contrato de
empreitada possa resultar de tarefas especiais não exequíveis pelo empreiteiro ou se tal
faculdade resultar do carácter fungível da prestação do empreiteiro; e para o dono da
obra o mais importante é resultado que seja atingindo pelo empreiteiro ou terceiro).

152
Pavimento de madeira.
153
Daí que o empreiteiro será responsável perante o dono da obra pelo inadimplemento do subempreiteiro

95
Todavia existem casos em que o consentimento do dono da obra é fundamental para
que a subempreitada produza efeitos em relação a ele.

Mas se não houver consentimento, o contrato é eficaz entre as partes, mas ineficaz
em relação ao terceiro (dono da obra), logo não há ilegitimidade e aplica-se o disposto
no art. 795.º ou 801.º.

A violação dessa obrigação negativa só gera responsabilidade contratual do


empreiteiro se vir a ser executada pelo subempreiteiro.

A autorização não carece de forma especial154 e pode ser expressa ou tácita.

A autorização pode ser específica ou geral, ou ainda depender de uma aprovação


concreta. Específica quando o dono da obra faz referencia a um subempreiteiro ou
objecto certo. Se não há essa referencia a subempreitada é geral. Mas autorização pode
posterior.

Mas se for concedida uma autorização ou depender de aprovação em concreto e sem


razão o dono da obra não autoriza, haverá abuso de direito (art. 334.º C.C., por força da
exceptiodolisgeneralis ou venire contra factumproprium).

FIGURAS PRÓXIMAS (DISTINÇÃO).

6. Cessão da posição contratual

A subempreitada não se confunde com a cessão da posição contratual. Na cessão


transmite-se a um terceiro do acervo de direitos e deveres que, para uma parte, emergem
de terminado contrato (art. 424.º). Há uma mudança subjectiva da relação contratual. Na
subempreitada não substituição mais sim sobreposição de sujeitos, pois mante-se na
relacção contratual também o empreiteiro, ficando ambos vinculados ao dono da obra.

Para que a cessão produza efeitos tem de haver anuência 155 da contraparte, contudo
dispensável, à princípio, na subempreitada.

A subempreitada segue as regras da empreitada, a cessão segue as regras do negócio


que lhe serve de base (art. 425.º onerosa ou gratuita).

Ao cessionário são facultados os meios de defesa do cedente no âmbito do contrato


base contra o cedido (427.º C.C.), o que não sucede na empreitada.

A subempreitada só pode ser celebrada pelo empreiteiro e não pelo dono da obra
embora este possa ceder a sua posição contratual. Na cessão as partes podem ceder.

Se existirem dúvidas de qualificação se o contrato é de subempreitada ou cessão de


créditos, presume-se iuris tantum de subempreitada. Os fundamentos dessa presunção
resultam do facto de que a subempreitada pode realizar-se sem consentimento e não a
cessão; por outro lado, a subempreitada é sempre um negócio oneroso e relativamente
154

155
Todavia, pode haver cessão sem consentimento quando feita sob condição.

96
as dúvidas sobre a interpretação deve-se buscar um resultado que conduza a um maior
equilíbrio das prestações (art. 237.º). Pois persistindo ambas as relações o dever
“obtenção de resultado” fica mais garantido para o dono da obra, assim como o “preço”
para o empreiteiro.

7. Contrato de fornecimento de materiais

Este contrato ocorre quando empreiteiro solicita materias e utensílios à um terceiro.


Aqui trata-se de compra e venda ou locação e não subempreitada. Mas se além do
fornecimento o terceiro fica obrigado a uma obra com os materiais, parece haver uma
compra e venda ou subempreitada (ex: a instalação de um elevador por um terceiro). Ou
aluga-se um gerador industrial e a empresa fornece um operador, pode haver aluguer ou
subempreitada.

8. Contrato de trabalho

O empreiteiro pode celebrar contrato de trabalho com certas pessoas. Nesta hipótese
haverá uma relação de hierarquia e subordinação, sendo uma obrigação de meios.

Por outro lado o subempreiteiro pode subcontratar e o trabalhador só pode ser


substituído com consentimento da entidade patronal.

9. Cessão de trabalhadores

A cessão de trabalhadores corresponde a uma cedência ocasional de trabalhadores


ou uma relação de trabalho temporário. Em Angolaé um contrato típico de prestação de
serviço, pois tem regime jurídico no Decreto Presidencial n.º 272/11, de 26 de Outubro,
e não atípico.

Contrato de trabalho temporário é o contrato pelo qual uma pessoa se obriga,


mediante retribuição, a prestar a sua actividade intelectual ou manual à empresa de
trabalho temporário, por um período de tempo determinado.

Aqui temos a Empresa de trabalho temporário que a cedente a terceiros de


trabalhadores e o utilizador.

A lei determina o tempo de duração no art. 11.º (24, 12, 6 meses, etc.) em função
dos motivos previstos no art. 10.º (exemplo uma tarefa específica e não duradoura,
substituição de trabalhador ausente, necessidades intermitentes de mão-de- obra
determinadas, etc).

Nesta hipótese os trabalhadores contratados vão trabalhar sob organização, ordens e


responsabilidade do empreiteiro; quem cede os trabalhadores não assume os riscos da
execução da obra. Na subempreitada os trabalhadores executam os trabalhos às ordens
do subempreiteiro e, os riscos são partilhados entre o empreiteiro e o subempreiteiro.

10. Co-empreitada

97
Ocorre quando os vários empreiteiros obrigam-se, em conjunto, por contratos
distintos, a executar o mesmo trabalho, ficando cada co-empreiteiro directamente
relacionado com o dono da obra. Na subempreitada o vínculo contratual é com o
empreiteiro.

Contudo, pode haver na co-empreitada um empreiteiro principal a quem foi


encomendada a parte mais expressiva e orientar a execução dos trabalhos dos demais.
Pode haver co-empreitada ou subempreitada conforme tenham sido contratados pelo
empreiteiro ou subempreiteiro.

Regime da subempreitada

À subempreitada aplica-se o regime da empreitada. Mas por convenção pode ser


aplicado regime diverso em relação ao preço e tipo de preço (a corpo ou por medida) e
os prazos.

Também não aplicável é na subempreitada, por força da sua natureza, o disposto no


art 1214.º nº 3- alteração por escrito da iniciativa do empreiteiro.

Em relação a aceitação pelo empreiteiro, se não houver referência no subcontrato,


esta fica condicionada à aceitação, sem reserva pelo dono da obra, isto é, enquanto a
obra principal não termina a subempreitada não é aceite.

Quanto aos prazos de caducidade, se se tratar de vícios aparentes e a aceitação


coincide (subempreitada e empreitada) o prazo de garantia é o mesmo (art. 1224.º nº 1).
Em relação aos vícios ocultos, o prazo de garantia da subempreitada contar-se-ia a partir
do momento em que o subempreiteiro entrega a obra ao empreiteiro, o que poderia
ocorrer antes da entrega ao dono da obra, assim como nas empreitadas de longa
duração.

O prazo de garantia do subempreiteiro só termina antes da empreitada se a


empreitada for autónoma, podendo ser verificada e aceite antes da empreitada principal.

Em relação ao preço, o pagamento da subempreitada não fica condicionada a


execução do contrato geral se houver autonomia da subempreitada.

Relação entre o dono da obra e o subempreiteiro: acção directa.

Alguma doutrina (PIRES DE LIMA/ANTUNES VARELA p. 880) admitem que por


não existir nenhum vínculo directo entre o dono da obra e subempreiteiro não existe
também qualquer acção directa (como direito de retenção) contra o dono da obra156.

MENEZEZ LEITÃO (p. 488), entende também neste sentido, acresce que isto
violaria o princípio da relatividade (art. 406.º), as regras do concurso de credores (art.
604.º). dai que a inexistência dessa relação impede o dono da obra reagir contra o
subempreiteiro se existir vícios (reage contra o empreiteiro e este teria direito de
regresso nos termos do art. 1226.º- só não será assim na hipótese do art. 1225.º).

156
ACORDÃO DO TRIB. SUPREMO DE PORTUGAL, de 28 de Maio de 1981

98
E qualquer alteração no plano convencionado é ao empreiteiro que o subempreiteiro
pede autorização (arts. 1214.º nº 1 e 1215.º) e aquele ao dono da obra.

MENEZES, ressalva apenas a possibilidade de o dono da obra pode exercer contra o


empreiteiro acção sub-rogatória nos termos gerais. E, por seu turno o subempreiteiro
pode exercer direito de retenção se não for pago o preço.

PEDRO ROMANO MARTINEZ entende que em alguns casos é admitida a


existência de uma relação entre o dono da obra e o subempreiteiro: o princípio da
relatividade comporta excepções (art. 406.º nº 2) e o dono da obra e subempreiteiro não
são verdadeiros terceiros entre si.

Assim, o dono da obra pode exigir ao subempreiteiro quer o cumprimento quer


responsabiliza-lo pelo incumprimento, pois a empreitada e a subempreitada visam o
mesmo fim. E, ainda que a obra seja executada por subempreiteiro o dono da obra tem
direito de fiscalização e pode exigir alterações.

Também o subempreiteiro tem direito a acção directa contra o dono da obra em


relação ao pagamento do preço, podendo mesmo reter a coisa se a mesma não for paga.

Em relação a subempreitada de obras públicas o direito de retenção ocorre em


relação as quantias, no mesmo montante devidas ao empreiteiro (art. 341.º da LEI Nº
9/16.

EXTINÇÃO DO CONTRATO DE EMPREITADA

99
O contrato de empreitada extingue-se com a sua execuçã o. Assim cabe ao dono
da obra verificar se a mesma está conforme o acordado, comunicar o resultado da
verificaçã o e aceitar, caso em que cessa a relaçã o contratual (art. 1218.º nº 1 e 4).
Contudo, existem outras causas de extinçã o do contrato de empreitada,
designadamente:

1. IMPOSSIBILIDADE DO CUMPRIMENTO

A prestação torna-se impossível quando, por qualquer circunstância (legal,


natural ou humana) o comportamento exigível do devedor se torna
inexequível. (ANTUNES VARELA).

Pode ser:

⇒ Originá ria: quando a impossibilidade é contemporânea da


constituição do vínculo obrigacional. No contrato de empreitada a
impossibilidade originá ria despoleta a nulidade do contrato 157 (art. 401.º nº 1).
Nã o é necessá rio avaliar se há incumprimento. Ex: realizaçã o de obra em terreno
expropriado, em terreno pantanoso.

Mas se o empreiteiro nã o dispõ e de condiçõ es técnicas para realizar a obra,


nã o haverá impossibilidade da prestaçã o (nã o dá lugar a nulidade - art. 401.º n º 3,
quando por exemplo nã o dispõ e de meios para execuçã o da obra), mas
inadimplemento. Bem como nã o será nulo se a prestaçã o vir a ser possível.
Exemplo: quando extingue-se a expropriaçã o ou a invençã o de material que
permita a execuçã o da obra.

O incumprimento e a impossibilidade resultam da impraticabilidade física


do objecto (por exemplo alguém se obriga a construir um prédio urbano no planeta
Jú piter).

⇒ Superveniente: quando a prestaçã o nã o pode ser realizada depois da


constituiçã o da obrigaçã o. Ex:

Se a impossibilidade superveniente nã o for imputá vel a nenhuma das partes


o contrato extingue-se (art. 790.º) e o dono da obra nã o paga o preço (795.º), salvo
o disposto no art. 1227.º.

A impossibilidade superveniente pode ser:

157
Deverá ser também absoluta na medida em que afecta a prestação em si, não pode ser realizada por
ninguém.

100
a) Efectiva158
b) Absoluta: ninguém pode realizar a prestaçã o;
c) Relativa: quando só o empreiteiro é que nã o pode realizar a obra (quando a
prestaçã o for fungível). O empreiteiro é contratado em funçã o das suas
aptidõ es.
d) Definitiva: quando a impossibilidade nã o é susceptível de findar (nã o pode
ser realizada mais tarde). Nã o se confunde com atraso, por exemplo quando
resulte de causas naturais (neste caso aplica-se o disposto no art. 792.º).
e) Total: quando a impossibilidade afecta toda obra.
f) Parcial: afecta parte da obra. Nesta hipó tese o preço será reduzido (art.
793.º). A reduçã o tem de ter em conta o trabalho realizado, os materias e
lucro que será proporcionalmente reduzido. Ver o nº 2 do art. 793.º (nesta
hipó tese o empreiteiro terá direito a uma indemnizaçã o, art. 1227.º 2ª
parte, ainda que o dono da obra nã o tirar qualquer proveito da obra.

RISCO NO CONTRATO DE EMPREITADA

É importante diferenciar a impossibilidade da execuçã o da empreitada (art.


1227.º 2ª parte) e o risco da perda ou deterioraçã o da coisa (art. 1228.º nº 1).

Na impossibilidade o empreiteiro corre o risco da remuneraçã o e o dono da


obra o risco do trabalho e despesas realizadas (esta regra aplica-se também nas
alteraçõ es necessá rias – art. 1215.º-, por exemplo se se tiver que demolir parte da
obra já edificada o dono da obra paga esta parte e a que vai ser construída e deduz
proporcionalmente no lucro do empreiteiro.

Em relaçã o ao risco ver art. 1228.º

Exemplos: assim se a empreitada for de coisa mó vel e os materias serem


fornecidos pelo empreiteiro e se a obra se deteriorar por causa nã o imputá vel nem
ao empreiteiro nem ao dono da obra, o empreiteiro é obrigado a realizar nova
obra, mais com direito ao preço acordado, bem como o trabalho realizado e as
despesas da obra construída.

Se os materias forem do dono da obra, o empreiteiro também constró i nova


obra, desde que seja possível sem gastos desproporcionados.

Se se tratar de empreitada de construçã o de coisa imó vel e se deteriora sem


culpa das partes; se o solo for propriedade do dono da obra pode ser exida nova
obra desde que nã o seja muito onerosa bem como os trabalhos e despesas; se for
do empreiteiro, enquanto nã o forem incorporados no solo o risco é seu.

2. DESISTÊNCIA DO DONO DA OBRA

A desistência nã o carece de fundamentaçã o nem de apreciaçã o do tribunal.


158
É verdadeira, não realizável. É contrária do agravamento da prestação que torna a empreitada mais
onerosa (aumento do preço dos materias ou salários). Nestes casos aplica-se o disposto no art. 437.º.

101
Vem prevista no art. 1229.º. A desistência constitui uma excepçã o do art.
406.º.

A desistência pode ser depois de concluída a obra 159, mas antes de ser
aceite. Todavia, se a obra nã o apresentar defeito o preço é devido.

A desistência pode ser parcial nã o carecendo de um pré-aviso, nem de


forma especial.

A desistência nã o se confunde com a resoluçã o (esta produz efeitos


retroactivos); com revogaçã o (esta resulta de acordo); denú ncia (esta ocorre nos
contratos de duraçã o indeterminada). Na verdade a desistência situa-se numa fase
intermédia entre a revogaçã o e a denú ncia.

A desistência despoleta responsabilidade civil por actos lícitos, dando lugar


indemnizaçã o.

3. MORTE OU INCAPACIDADE DO EMPREITEIRO.

A regra é a de que o contrato de empreitada nã o se extingue por morte do


empreiteiro (art. 1230.º do C.C.). Alias se se tratar de empresa nã o faz qualquer
sentido a extinçã o do contrato com a morte de um dos só cios (excepto se a morte
de um dos só cios extingue a contrato de sociedade).

Mas se a empreitada for contrato intuitu persona ou se os herdeiros nã o


poderem cumprir o acordo, o contrato extingue-se (nº 2), ficando o dono da obra
vinculado ao pagamento do que já foi executado (incluindo mã o-de-obra,
materiais).

4. RESPONSABILIDADE CIVIL

Responsabilidade civil contratual (incumprimento definitivo, cumprimento


defeituoso ou mora). Presunçã o de culpa do devedor, art. 799.º.

Se com a execuçã o da obra forem violadas relaçõ es de vizinhança (emissã o de


fumos e ruídos) despoleta responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos
ou por intervençõ es licitas (direitos de personalidade).

Mas pode haver concurso. Se por exemplo uma obra defeituosa que desaba e
causa danos a integridade física.

5. DENÚNCIA DOS DEFEITOS

Vem prevista no art. 1220.º. Se os vícios forem ocultos a denú ncia faz-se de
depois de descobertos.

159
Por exemplo se apresentar vícios.

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Mas se se reconhece os defeitos e ainda assim aceita, nã o justiça a denú ncia, salvo
se a aceitaçã o for com reserva. A denú ncia nã o carece de forma.

MEIOS DE REAÇÃO DO DONO DA OBRA

a) Eliminação dos defeitos e realização de nova obra.

Por força do apotegma latino “nemo ad factumpraecisecogi potest160”, a


eliminaçã o dos defeitos ou a realizaçã o de nova obra nã o pode ser imposto.

Mas se se recusa e a prestaçã o for fungível o dono da obra pode requisitar uma
execuçã o especifica nos termos do art. 828.º e o empreiteiro for condenado e ainda
assim recusa-se a eliminar os defeitos ou a realizar nova obra, pode recorrer a
realizaçã o a um outro empreiteiro, a custa daquele.

Art. 1221.º 2 (prende-se com razoes de justiça comutativa).

b) Redução do preço

Por força do disposto no art. 1222.º nº 1, remete-se apar o art. 884.º.

Cfr. o nº 2 do art. 1222.

c) Resolução do contrato.

Vem prevista no art. 1222.º nº 1, 2ª parte. Ocorre quando os vícios nã o forem


eliminados ou nã o é realizada nova obra.

Assim a resoluçã o procederá quando:

⇒A obra é inadequada ao fim que se destina, ex:

⇒É inapropriada para o uso normal ou previsto, ex:

d) Indemnização (art. 1223.º)


e) Caducidade do direito a eliminação dos defeitos, nova obra e resolução
(ver os arts. 1220.º nº 1; 1224.º e 1225.º).

160
Significa ninguém pode ser directamente coagido ou obrigado a praticar o acto a que se obrigou.

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