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SOCIEDADE DE ENSINO SUPERIOR DE SERRA TALHADA -SESST

FACULDADE DE INTEGRAÇÃO DO SERTÃO – FIS


COORDENAÇÃO DO CURSO DE DIREITO

GLEYDSON MATEUS DE OLIVEIRA PEIXOTO

Parecer sobre o caso Espólio de Augusto Liberato x Rose Miriam

Trabalho apresentado na disciplina de Direito das Famílias do


curso de Direito ao Professor Me. Oswaldo de Freitas.

Serra Talhada/PE
2022
1.PARECER JURÍDICO ACERCA DA RELAÇÃO EXISTENTE ENTRE O
SENHOR ANTÔNO AUGUSTO LIBERATO E A SENHORA ROSE MIRIAM DI
MATTEO

2. ENDEREÇAMENTO
Ao Douto Professor Me. Osvaldo de Freitas Teixeira, Titular da Disciplina Direito Das
Famílias, no curso de Direito da Faculdade de Integração do Sertão, em Serra Talhada/PE.

3. EMENTA
Direito Civil. Direito das Famílias. União Estável. Coparentalidade. União Estável.
Coparentalidade. Concubinato. Conjugalidade. Parentalidade. Gugu Liberato. Rose Miriam.
Privatização do Direito de Família. Princípio da afetividade. Afeto. Uniões livres. Direito de
Família. Livre Planejamento Familiar. Autonomia da vontade. Socioafetividade. Sucessão.
Contrato de coparentalidade.

4. RELATÓRIO
Trata-se de consulta formulada pelo Professor Me. Oswaldo Teixeira, acerca da relação
do Senhor Antônio Augusto Liberato, o Gugu, com a Senhora Rose Miriam, em face das
relações entre eles produzidas, com o fito de tentar inseri-la no rol de relações de conjugalidade
e parentalidade existentes no ordenamento jurídico brasileiro.
Gugu foi um apresentador célebre, empresário, ator e cantor; tornou-se ícone da
televisão brasileira no decorrer dos anos 1980, 1990 e 2000, animando os finais de semana de
gerações. Seus programas mais conhecidos, Viva a Noite e Domingo Legal, marcaram presença
durante décadas entre os programas de auditório, consagrando-o como um dos mais lendários
apresentadores de todos os tempos.
O apresentador sofreu uma queda em sua casa, no dia 20 de novembro de 2019 em
Orlando, Estado da Flórida, nos Estados Unidos, resultando em traumatismo craniano, que
acabou evoluindo para morte encefálica, no dia seguinte.
Ele faleceu aos 60 anos de idade, deixando 3 filhos, João Augusto de 18 anos, Marina
e Sofia gêmeas que possuem 16 anos de idade.
Após seu falecimento, desencadearam-se discussões acerca da sua herança bilionária,
e pela surpreendente omissão de sua companheira, Rose Miriam, no testamento.
Antônio Augusto fez um testamento em 2011 incluindo filhos, sobrinhos, e sua mãe
Maria do Céu para que recebesse de forma vitalícia a quantia de R$100.000,00 (cem mil reais)
mensais, bem como o usufruto do imóvel em que reside e que era propriedade de Gugu. Por
fim, nomeou a sua irmã Aparecida como inventariante e curadora dos bens herdados pelos
filhos dele.
Em entrevista, Aparecida Liberato, irmã e inventariante do espólio de Gugu comunicou
à imprensa e deu alguns detalhes sobre o testamento deixado pelo apresentador, esclarecendo
que a maior parte de sua herança ficará com os três filhos.
“Antônio Augusto de Moraes Liberato, em plenas capacidades físicas e mentais, deixou
testamento, onde expressa suas últimas vontades e dispõe dos seus bens móveis, imóveis,
materiais e imateriais, contemplando seus familiares e principalmente, em quase sua totalidade
os seus três filhos, João Augusto, Marina e Sofia”.
O testamento foi lido por Carlos Eduardo Farnesi Regina - advogado do apresentador
de longa data, representando seus interesses e de sua família - na presença de tabelião e notário,
da suposta companheira do apresentador, Rose Miriam Di Matteo, dos filhos e dos familiares.
O testamento previu ainda que a irmã dele, Aparecida Liberato, além de ser
inventariante da herança, é também a cuidadora das duas filhas mais novas do apresentador
com Rose.
Nesse contexto, o testamento não contemplou Rose Miriam, que supostamente fora sua
companheira por anos, estando presente em sua vida em todos os momentos, bons e ruins,
inclusive abandonando sua carreira como médica para cuidar da família e dos filhos,
priorizando o bem estar deles e do companheiro. Miriam pleiteia comprovar sua união estável
com o apresentador e, assim, ter a sua parte da herança reconhecida, na qual foi excluída.
Rose afirma que os dois desejavam construir uma família e acabaram se incluindo na
vida um do outro, além de se mudarem para os Estados Unidos. "Apesar da distância, a nossa
casa aqui se tornou um lar mais sólido", escreveu.
"Gugu foi um querido e zeloso pai. Foi meu companheiro nos momentos felizes na
criação e educação dos filhos", continua.
Segundo a carta, Rose se conforta em "ter a certeza que Gugu está calmo e bem pertinho
de Deus". “Nem mesmo o tempo decorrido (alguns meses) e muito menos a maliciosa repetição
de fórmulas inverídicas já contidas no aludido compromisso (...) atestam a inegável verdade
dos fatos: a união estável, pública, contínua e duradoura".
Ela ajuizou uma Ação de Reconhecimento de União Estável Post Mortem cumulada
com a Ação de Petição de Herança, para que então seja reconhecida como companheira, e assim
se constituir como herdeira necessária na sucessão legitima, se o pedido for procedente poderá
receber como meeira e herdeira.
O polo passivo nesse processo é composto pelos os que estão na posse da herança. Logo,
deverá ser analisada a parte indisponível da herança para que seja partilhada da forma adequada,
sendo assim, deverá seguir a regra da ordem de vocação hereditária da sucessão do descendente
em concorrência com a companheira Rose, isto se no suposto contrato firmado entre os
companheiros não versarem em contrário, portanto caberá ao magistrado analisar a validade do
documento anexado ao processo.
A Ação foi ajuizada em São Paulo, sendo endereçada para a Vara da Família e Sucessões
do Foro Central de São Paulo, onde o processo tramita sob segredo de Justiça.
É o relatório. Passo a opinar.

5. FUNDAMENTAÇÃO
5.1. CONCEITOS DE FAMÍLIAS
A Constituição Federal de 1988 celebra as Famílias em seu Art. 226, trazendo um rol
exemplificativo, o qual não exclui a possibilidade de outros modelos de entidade familiar:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem


e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento.

§ 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer


dos pais e seus descendentes.

§ 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente


pelo homem e pela mulher.

§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. (Redação dada Pela Emenda
Constitucional nº 66, de 2010)

§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade


responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado
propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada
qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a


integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.

Apesar de célebre o entendimento de que o rol acima é meramente exemplificativo, o


Eminente Jurista e Professor da UFPE, Paulo Lôbo, ressalta que havia entre os civilistas o
intento de tutelar somente estas entidades familiares, dando uma interpretação numerus clausus
ao artigo. Essa forma de raciocínio foi, e é responsável até hoje pelas soluções jurídicas
inadequadas ou de total desconsideração das mudanças pelas quais passa o direito das famílias.
Em que pese esse passado retrógrado recente, fato é que a família deve ser entendida
como o núcleo no qual o ser humano é capaz de desenvolver todas as suas potencialidades
individuais, tendo em vista o princípio da dignidade da pessoa humana, base e orientador dos
demais princípios contidos no direito das famílias.
Desta forma, a Carta Magna de 88 codificou não apenas valores sociais já sedimentados
à época, como também reconhece a inexorável evolução da sociedade e o fenômeno das uniões
de fato, outrora relegadas ao ostracismo, hoje protegidas pela Lei Maior.

Os princípios constitucionais do Direito de Família trouxeram significativa evolução ao


ordenamento jurídico brasileiro, principalmente no sentido de reconhecer o pluralismo familiar
existente no plano fático, em virtude das novas espécies de família que se constituíram ao longo
do tempo.

A perspectiva do “Direito das Famílias Constitucionalizada” engloba valores e


princípios abrangentes, alcançando direitos fundamentais tais como a dignidade da pessoa
humana (artigo 1º, III, da CF); a isonomia, ao reafirmar a igualdade de direitos e deveres do
homem e da mulher e o tratamento jurídico igualitário dos filhos (artigo 5º, I da CF); a
solidariedade social (artigo 3º, I da CF); e a afetividade que, nesse contexto, ganha dimensão
jurídica de relevo fundamental no deslinde do reconhecimento das uniões familiares.

Dessa forma, a CF/88 deu o tom das mudanças que chegariam na aurora do Século XXI.
Sendo esta uma sociedade plural, complexa e diferenciada, o Constituinte dos Oitenta
reconhece de antemão que para haver família não é mais preciso homem e mulher, como bem
decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, decidindo
equiparar a união homoafetiva à união estável garantindo todos os direitos conferidos pela
Constituição e demais leis pertinentes à união entre pessoas do mesmo sexo; não é mais preciso
haver pai e mãe, mas tão somente pessoas que, enlaçadas pelo afeto que as une, conjugam suas
vidas íntimas sem visar adequar-se a moldes antiquados.

Se na sociedade contemporânea novos valores inspiram a sociedade, mister se faz


romper com as concepções tradicionais de família. Dessa forma, o afeto passa a frente, sendo o
valor fundamental a orientar a formação familiar, pouco importando a espécie ou tipo de família
na qual o indivíduo está inserido. Doravante, dever-se-á levar em consideração a plena
realização do ser humano, a concretização do bem-estar de seus membros familiares.

Desta forma, os valores a serem buscados devem ser a realização pessoal de cada um de
seus membros, o respeito ao outro e a proteção de suas individualidades; e nesta ordem de ideias
é que podemos vislumbrar como o afeto passou a ser parâmetro principal dentro das relações
familiares, ficando o biológico em segundo plano, pois o ser humano é muito mais do que isso.

A família baseada na autodeterminação afetiva e na busca pela felicidade plena é


chamada pelos doutrinadores de “família eudemonista”. Ainda que o princípio da afetividade
não possua texto legal, considerar juridicamente o afeto seria conferir proteção à dignidade de
pessoa humana.

Em que pese a afetividade não incidir expressamente na Constituição, há um movimento


crescente na doutrina no sentido de adotar uma perspectiva principiológica em relação ao afeto.
Paulo Lôbo, precursor da tese, entende a afetividade como um princípio implícito constitucional
que incide sobre todo o direito de família, pelos seguintes dispositivos:

Encontram-se na Constituição Federal brasileira algumas referências, cuja


interpretação sistemática conduz ao princípio da afetividade, constitutivo dessa aguda
evolução social da família, especialmente: a) todos os filhos são iguais,
independentemente de sua origem (art. 227, § 6o); b) a adoção, como escolha afetiva,
alçou-se integralmente ao plano da igualdade de direitos (art. 227, §§ 5o e 6o); c) a
comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os
adotivos, e a união estável tem a mesma dignidade de família constitucionalmente
protegida (art. 226, §§ 3o e 4o); d) o casal é livre para extinguir o casamento ou a
união estável, sempre que a afetividade desapareça (art. 226, §§ 3o e 6o) (LOBO,
2004).

Como já elucidado, a CF/88 presta à família especial proteção estatal, devendo


o Estado tutelar e proteger seus membros, por meio de políticas públicas, fiscalização
e proteção por meio de amparo jurídico, como efetivação dos direitos a alimentos, à
meação, aos direitos sucessórios, dentre muitos outros.
Diante das transformações sociais e evolução do tratamento jurídico em relação à
família, se delineia um caminho de proteção da liberdade das escolhas existenciais dos
indivíduos. Assim é que se observa uma tendência de limitação da interferência do Estado nas
relações familiares, seja na legislação, seja como um princípio norteador do Direito de Família,
pelo Princípio da intervenção mínima do Estado.
No Código Civil, observa-se a intenção do legislador de limitar ingerências externas no
seio de vida familiar, mais precisamente no artigo 1.513, que assim dispõe: “É defeso a qualquer
pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família”
Sendo assim, é de se reconhecer que a função protetiva do Estado em relação à família,
estará efetivada somente na proteção de seus membros, pela tutela de seus direitos, que inclui,
indubitavelmente, o respeito a autonomia privada no que tange às suas escolhas existenciais e
associações afetivas, que se traduzem na convivência familiar e constituição de seu próprio lar.

5.2. COPARENTALIDADE

A família, no contexto contemporâneo, vem assumindo novos caracteres e novas


estruturas, tendo o afeto como catalisador da constituição familiar. As evoluções sociais
incorreram em mudanças na dinâmica, na configuração e nos papéis dos membros da família.
A sua existência, seja pela formalidade do matrimônio, pela convivência de uma união
estável, pela maternidade ou paternidade solo ou mesmo pela total ausência de paternidade,
como as famílias anaparentais, é consequência das escolhas e contingências individuais de seus
membros.
Assim como há pessoas que optam por uma produção independente, há outras que
optam por ter e criar filhos em parceria, com o exercício da paternidade ou maternidade
desvinculado do elemento romântico ou sexual, seja por opção prévia, seja pelo rompimento
do vínculo conjugal.
Neste mundo globalizado, com a internet rompendo barreiras físicas e aproximando o
contato social pelo meio virtual, vão sendo construídos espaços que unem as pessoas pela
identificação de valores e propiciam a comunhão de seus interesses.
São nesses espaços que se encontram, em sua grande maioria, aqueles que desejam
constituir uma família coparental. Existem pelo menos 4 grupos no facebook, um deles com
mais de 1.500 membros, destinados a possibilitar que se encontre um parceiro com o único fim
de exercer em conjunto os prazeres e os encargos inerentes à criação de um filho, que pode ser
concebido de forma natural ou artificial.
A tal estrutura o Doutrinador Rodrigo da Cunha Pereira conceitua da seguinte forma:
Coparentalidade, ou famílias coparentais, são aquelas que se constituem
entre pessoas que não necessariamente estabeleceram uma conjugalidade, ou nem
mesmo uma relação sexual. Apenas se encontram movidos pelo interesse e desejo em
fazer uma parceria de paternidade/maternidade. Na maioria das vezes o processo de
geração de filhos se vale de técnicas de reprodução assistida.
Este novo fenômeno familiar não possui regulamentação legal, tendo somente algumas
regras específicas para a atuação do profissional da saúde, como o provimento nº 63/2017 do
CNJ e a Resolução do CFM – 2168/2017, que dão as diretrizes das normas éticas para a
reprodução assistida, em consonância com os princípios éticos e bioéticos.
Em suma, o termo “coparentalidade” tem se referido cada vez mais à famílias que se
formam com o único e exclusivo propósito de conceber e criar filhos, sem intenção de
constituírem relacionamento afetivo-sexual, do que a situações circunstanciais em que os pais
têm de criar os filhos em conjunto após o divórcio, isto é, quando não há a pré-disposição de
procriar sem um vínculo afetivo-sexual entre si.

5.3. CASO AUGUSTO LIBERATO


Adentrando-se, enfim, ao caso de Gugu Liberato, tem-se que, ao falecer, foi
aberto o testamento deixado por ele e verificado que Rose Miriam, tratada pela mídia como
companheira do apresentador, havia sido excluída da divisão da sua herança em tal
instrumento de última vontade. É válido ressaltar, ainda, que a análise in casu
foi feita a partir das informações veiculadas pela mídia.
A união estável, conforme já discutido, possui alguns requisitos preconizados pelo
Código Civil de 2002 em seu art. 1.723, quais sejam, convivência pública, duradoura,
contínua e com o objetivo de constituição de família, pressupostos estes necessários para que
seja reconhecida a união estável, tendo em vista seu caráter de extrema informalidade.
Analisando os requisitos em relação ao caso, tem-se que, aparentemente, Gugu e Rose
possuíam uma convivência pública como se casados fossem, além das várias fotos em família
que posteriormente foram capa de revistas com frequência, em que sempre estava incluída a
senhora Rose Miriam.
Quanto ao fato de ser ou não uma relação duradoura e contínua, considera-se este um
elemento que separa a união estável do namoro; é dizer, é uma relação não compatível com a
eventualidade, vez que necessita da durabilidade que está mais atrelada à ideia de casamento
In casu, foi divulgado que Gugu e Rose possuíam uma relação desde 1994, o que não
quer dizer, per si, que a união estável existia à época, mas, todavia, pode ter se consolidado a
partir do momento em que se viram diante de uma relação duradoura e que originou filhos, que
não é indispensável, e se intensifica com o próximo requisito: constituir família.
Este requisito não é tão fácil de ser comprovado quando um dos conviventes falece, não
podendo alegar seus fatos. Em contrapartida, Rose Miriam demonstrou sua relação através dos
bilhetes que trocava com Gugu, bem como através das capas de revistas em que figuravam
como se casados fossem.
Até então, a ideia que todos possuíam, tendo em vista o fato de Gugu Liberato era um
apresentador com visibilidade nacional, era a de que ele possuía uma relação com Rose Miriam,
visto que esta residia nos Estados Unidos com seus três filhos comuns e que Gugu passava suas
férias lá, posto que trabalhava como apresentador no Brasil, fato este que, frise-se, não impede
a união estável, pois o STF já possui entendimento sumulado (n° 382) preceituando ser
dispensável a vida do casal sob mesmo teto para configuração de união estável.
A partir do seu falecimento, vários assuntos restaram conturbados, primeiramente
com a exclusão de Rose Miriam do seu testamento, o que ensejou a incógnita de que poderia
ser ou um caso de união estável ou de coparentalidade.
Com o ajuizamento de ação de reconhecimento de união estável por Rose Miriam face
à situação em que se encontrava sem direito algum à herança e nem à meação, visto que não
havia uma união estável formalizada, a família de Gugu Liberato alegou que nunca existiu uma
relação afetiva entre os dois, mas apenas uma amizade da qual gerou filhos, apresentando como
prova um contrato de geração de filhos que teria sido firmado no ano de 2011 entre Gugu e
Rose.
A coparentalidade, consoante ao que fora abordado no tópico referente ao assunto, não
possui regulamentação jurídica no Brasil, o que acarreta uma insegurança jurídica nesta relação,
dado que consiste em uma união na qual não existem pretensões amorosas, mas meramente
procriativas, isto é, não existe uma conjugalidade, mas uma relação unicamente de
parentalidade, existindo família apenas em relação aos filhos e não entre os pais.
Para isso, existe o instrumento do contrato de geração de filhos com o intuito de
resguardar a segurança jurídica da relação coparental.
Ocorre que, como todo negócio jurídico, dispõem de requisitos de validade contratual,
estes dispostos no art. 104 do Código Civil, os quais serão aplicados ao caso.
O primeiro requisito é o da capacidade, a qual se refere ao gozo dos plenos direitos e da
contração de obrigações para com o mundo dos negócios. Rose Miriam e Gugu Liberato são
detentores da capacidade plena para contratar, ensejando validade ao negócio jurídico, de forma
algo superveniente ao ato, não será suficiente para declarar sua nulidade. De toda forma, caso
houvesse algum vício de capacidade apto a ensejar a nulidade do negócio jurídico, o prazo de
que Rose Miriam dispunha era de 4 anos, consoante o art. 178 do Código Civil.
O segundo requisito é o objeto lícito, possível, determinado ou determinável. Assim,
como ainda não se tem no direito brasileiro muitos casos judicializados, não se tem por hora
uma posição concreta acerca do tema, restando ao judiciário discutir acerca da legalidade do
objeto do contrato de geração de filhos.
Por fim, o terceiro requisito trata da forma prescrita ou não defesa em lei. Como
mencionado, o contrato de geração de filhos não possui regulamentação até o presente
momento. Dessa forma, em que pese não seja prescrito, não é defeso por lei, por isso deduz-se
ser válido até que se demonstre o contrário.
Em seu testamento, Gugu dispôs de 100% dos seus bens, tendo destinado 75% para seus
três filhos e 25% para seus cinco sobrinhos e, além disso, deixou uma pensão vitalícia para sua
mãe.
Em sendo improcedente o reconhecimento de união estável, declarando que existia
apenas uma relação de coparentalidade, Rose Miriam não teria direito à herança de Gugu e nem
à meação dos bens comuns, sendo plenamente válido o instrumento de última vontade
apresentado.

6. CONCLUSÃO
Ante o exposto, esclareço que caso seja reconhecida a União Estável, a senhora Rose
Miriam terá direito à herança do senhor Antônio Augusto Liberato, nos moldes da legislação
civil. Entretanto, caso o tribunal competente reconheça a validade do contrato de criação de
filhos existente, tratar-se-á de relação de coparentalidade, de forma que o instrumento particular
de vontade deverá prevalecer.
É o parecer.

Serra Talhada/PE, 15 de junho de 2022.

GLEYDSON MATEUS DE OLIVEIRA PEIXOTO


OAB/PE Nº XX.XXX
7. REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei Federal nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Brasília, DF. Presidência da República
Casa Civil, Subchefia Para Assuntos Jurídicos. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm. Acesso em: 25 mai.2022.
LOBO, Paulo Luiz Netto. Entidades familiarizadas constitucionalizadas: para além do numerus causus.
2004. Disponível em:
http://www.ibdfam.org.br/artigos/128/Entidades+familiares+constitucionalizadas%3A+para+além+do+
numerus+clausus. Acesso em: 30 mai. 2022.

OLIVEIRA, José Sebastião de. Fundamentos Constitucionais do Direito de Família. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002, p. 91.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Coparentalidade abre novas formas de estrutura familiar. 2017. Disponível
em: http://www.ibdfam.org.br/artigos/1229/Coparentalidade+abre+novas+formas+de+estrutura+familiar.
Acesso em: 29 mai. 2022.
KÜMPEL, Vitor Frederico; PONGELUPPI, Ana Laura. Coparentalidade. 2017. Disponível em:
https://www.migalhas.com.br/coluna/registralhas/260401/coparentalidade. Acesso em: 02 jun. 2022.

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