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12ª
edição
revista,atualizada
e ampliada
2022
Abuso de Autoridade.
Lei nº 13.869, de 5 de setembro de
2019
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º Esta Lei define os crimes de abuso de autoridade, cometidos por agente público,
servidor ou não, que, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las, abuse do
poder que lhe tenha sido atribuído.
§ 1º As condutas descritas nesta Lei constituem crime de abuso de autoridade quando
praticadas pelo agente com a finalidade específica de prejudicar outrem ou beneficiar a si
mesmo ou a terceiro, ou, ainda, por mero capricho ou satisfação pessoal.
§ 2º A divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas não configura
abuso de autoridade.
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Art. 2º LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
CAPÍTULO II
DOS SUJEITOS DO CRIME
Art. 2º É sujeito ativo do crime de abuso de autoridade qualquer agente público, servidor
ou não, da administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de Território, compreendendo,
mas não se limitando a:
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Abuso de Autoridade. Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019 Art. 43º
1. Sujeito ativo. Crime próprio. O legislador elencou no art. 2º quem pode ser sujeito
ativo do delito de abuso de autoridade. No caput fez uma previsão bastante abran-
gente e nos incisos especificou os membros de algumas Instituições, o que nos
leva a concluir que o rol não é taxativo. E arrematou a abrangência no parágrafo
único. Assim, todos os delitos da presente lei configuram crimes próprios.
2. Redundância do legislador. Não precisa ir muito longe para concluir que o le-
gislador foi extremamente redundante no artigo ora comentado. O dispositivo
é absolutamente autoexplicativo e qualquer tentativa de comentá-lo implicaria
repetição desnecessária, uma vez que é consabido o significado de agente públi-
co, servidor, Administração Pública Direta, Indireta ou Fundacional, Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de Territórios, servidores
públicos e militares ou pessoas a eles equiparadas, membros do Poder Legislativo,
Executivo, Judiciário, do Ministério Público, Tribunais e Conselhos de contas. No
parágrafo único o legislador foi ainda mais abrangente para dispor sobre as diver-
sas formas de vínculo, ou seja, eleição, nomeação, designação, contratação etc, e
deixou claro que poderá ser autor de abuso de autoridade até mesmo quem não
tenha estabilidade, nem remuneração. Em síntese, basta que o agente tenha um
vínculo formal com o Poder Público que será considerado autoridade para fins
dessa lei.
3. Agente público de férias ou de licença. Pode ser autor do crime de abuso de au-
toridade, uma vez que, mesmo de férias ou de licença, a pessoa mantém o vínculo
formal com o Poder Público.
4. Agente público aposentado. Não pode praticar o delito de abuso de autoridade,
pois o aposentado não mantém mais o vínculo formal com o Poder Público.
CAPÍTULO III
DA AÇÃO PENAL
Art. 43º Os crimes previstos nesta Lei são de ação penal pública incondicionada.
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Art. 4º LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
§ 1º Será admitida ação privada se a ação penal pública não for intentada no prazo legal,
cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva,
intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a
todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte principal.
§ 2º A ação privada subsidiária será exercida no prazo de 6 (seis) meses, contado da data
em que se esgotar o prazo para oferecimento da denúncia.
1. Ação penal. Mais um dispositivo legal desnecessário. Bastaria que o legislador nada
dissesse, caso em que a ação seria pública incondicionada, não sendo necessário
que isso esteja previsto em lei.
2. § 1º. Ação penal de iniciativa privada subsidiária. A ação penal privada subsidiária
da pública está prevista no art. 5º, LIX, da Constituição da República (LIX – será
admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no
prazo legal. O “prazo legal” a que o legislador faz menção está previsto no art. 46,
do CPP (5 dias para indiciado preso e 15 dias para indiciado solto). O legislador
deferiu ao particular a possibilidade de oferecer a queixa-crime caso o Ministério
Público não ofereça a denúncia, como forma de impedir que o delito não seja
apurado em caso de inércia do Ministério Público. Note-se que deve ficar clara
a inércia, de forma que se o Ministério Público não oferecer a denúncia porque
requisitou diligências ou tomou alguma outra atitude investigatória ou até mesmo
arquivou o procedimento investigatório, não há inércia e não estará justificado o
oferecimento da ação penal privada subsidiária da pública.
3. §2º. Prazo para o oferecimento da queixa-crime. De acordo com o §2º, o prazo
para oferecer a queixa-crime é de seis meses após esgotado o prazo para o ofe-
recimento da denúncia, ou seja, seis meses após o esgotamento dos 5 dias em
caso de indiciado preso ou 15 dias em caso de indiciado solto, conforme o art. 46
do CPP. É importante destacar que o fato de a vítima não oferecer a queixa-crime
no prazo de seis meses não impede que o Ministério Público ofereça a denúncia
posteriormente, enquanto não ocorrer a prescrição.
CAPÍTULO IV
DOS EFEITOS DA CONDENAÇÃO E DAS
PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS
Seção I
Dos Efeitos da Condenação
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Abuso de Autoridade. Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019 Art. 4º
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Art. 5º LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
Seção II
Das Penas Restritivas de Direitos
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Abuso de Autoridade. Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019 Art. 5º
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Art. 6º LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
7. Parágrafo único. O legislador permitiu a aplicação das duas penas de forma alter-
nativa ou cumulativa, deixando para o Juiz a forma de aplicação, sempre norteado
pelo princípio da individualização da pena e da proporcionalidade.
CAPÍTULO V
DAS SANÇÕES DE NATUREZA CIVIL E ADMINISTRATIVA
Art. 6º As penas previstas nesta Lei serão aplicadas independentemente das sanções de
natureza civil ou administrativa cabíveis.
Parágrafo único. As notícias de crimes previstos nesta Lei que descreverem falta funcional
serão informadas à autoridade competente com vistas à apuração.
1. Independência das penas. Não há bis in idem na aplicação cumulativa das sanções
penal, civil e administrativa por possuírem naturezas diversas. Contudo, as res-
ponsabilidades civil e administrativa devem ser apuradas pelos órgãos próprios.
2. Notícia-crime. O parágrafo menciona expressamente a “falta funcional”, o que
nos faz concluir que essa autoridade competente a que o dispositivo faz menção
é a autoridade administrativa com atribuição para apurar a infração funcional.
Coisa julgada da sentença criminal. Ao dispor que a sentença penal que reco-
nhecer alguma causa de exclusão da ilicitude faz coisa julgada na esfera cível e na
esfera administrativo-disciplinar, este dispositivo legal proíbe que a questão seja
rediscutida naquelas duas esferas. Só que isso seria muito lógico para vir escrito
na lei (embora não seja raro a lei dizer o óbvio). Porém, a intenção do legislador
foi evitar a discussão naquelas duas esferas acerca da possível indenização pelo
ato praticado. Em suma, se o agente praticou a conduta acobertado por alguma
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Abuso de Autoridade. Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019 Art. 9º
causa de exclusão da ilicitude, não seria possível discutir eventual indenização nas
esferas cível e administrativo-disciplinar. Entretanto, como é consabido, os atos
líticos também podem gerar o dever de indenizar (como no exemplo clássico do
estado de necessidade agressivo). Assim, pensamos que, apesar de previsão legal,
quando se tratar de um ato lícito que gere o dever de indenizar, esse artigo deve
ser desprezado e, por conseguinte, não aplicado.
CAPÍTULO VI
DOS CRIMES E DAS PENAS
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Art. 9º LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
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Abuso de Autoridade. Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019 Art. 11
21. Classificação. Crime próprio; formal; doloso; omissivo próprio; instantâneo; não
admite tentativa por ser omissivo próprio.
22. Inciso III. Deixar de deferir liminar ou ordem de habeas corpus, quando mani-
festamente cabível.
23. Sujeito ativo. A autoridade judiciária. Crime próprio.
24. Sujeito passivo. A pessoa presa.
25. Liminar ou ordem de habeas corpus. A tratar da liminar, o legislador quis referir-se à
liminar em ordem de habeas corpus, e não a qualquer liminar. Da mesma forma que
dissemos em relação ao inciso II, o deferimento da liminar ou do mérito na ordem
de habeas corpus não é algo automático. Depende do convencimento do Juiz e das
provas produzidas, sobretudo nesse tipo de ação em que se exige prova pré-consti-
tuída. Por essa razão que o legislador utilizou as expressões quando manifestamente
cabível, ou seja, quando a concessão da liminar ou do mérito na ordem de habeas
corpus for patente e não deixar nenhuma dúvida sobre a sua possiblidade.
26. Consumação. Com a simples omissão da autoridade judiciária. Crime formal.
27. Classificação. Crime próprio; formal; doloso; omissivo próprio; instantâneo; não
admite tentativa por ser omissivo próprio.
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Art. 12 LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
criminal, mas, tão somente o investigado, razão pela qual a incriminação do presen-
te tipo penal não abrange o réu, em razão do princípio da legalidade. Interpretar
o tipo penal no sentido de abranger o réu seria analogia in malam partem.
6. Comissão Parlamentar de Inquérito – CPI. A CPI não pode determinar condução
coercitiva. Embora a constituição da República disponha no art. 58, §3º, que a CPI
tenha poderes investigatórios próprios das autoridades judiciárias, a lei 1.579/52
(que trata das CPIs), em seu art. 3º, § 1º dispõe que em caso de não compareci-
mento da testemunha sem motivo justificado, a sua intimação será solicitada ao
Juiz criminal da localidade em que resida ou se encontre, nos moldes dos arts. 218
e 219 do CPP. Assim, o presente tipo penal não abrange o presidente da CPI.
7. Consumação. Com a efetiva decretação da condução coercitiva. Crime formal.
8. Classificação. Crime próprio; formal; doloso; comissivo; instantâneo; admite ten-
tativa.
9. Suspensão condicional do processo. Cabível, pois a pena mínima cominada não
ultrapassa 1 ano (art. 89 da lei 9.099/95).
1. Sujeito ativo. A autoridade policial, que é a pessoa com atribuição legal para fazer
a comunicação da prisão em flagrante de qualquer pessoa à autoridade judiciária,
conforme o art. 306, do CPP. Crime próprio.
2. Sujeito passivo. A pessoa presa.
3. Deixar de comunicar injustificadamente à Autoridade Judiciária. De acordo com
o art. 306 do Código de Processo Penal, a prisão de qualquer pessoa e o local onde
se encontre serão comunicados imediatamente ao Juízo competente, ao Ministério
Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. Este tipo penal consiste
na ausência de comunicação da prisão em flagrante ao Juízo. Trata-se de conduta
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Estatuto da Pessoa Idosa.
Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003
TÍTULO I
Disposições Preliminares
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Art. 2º LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
Art. 2º A pessoa idosa goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa hu-
mana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por
lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua
saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em
condições de liberdade e dignidade.
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Estatuto da Pessoa Idosa. Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003 Art. 4º
III – destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção
ao idoso;
IV – viabilização de formas alternativas de participação, ocupação e convívio do idoso
com as demais gerações;
V – priorização do atendimento do idoso por sua própria família, em detrimento do aten-
dimento asilar, exceto dos que não a possuam ou careçam de condições de manutenção
da própria sobrevivência;
VI – capacitação e reciclagem dos recursos humanos nas áreas de geriatria e gerontologia
e na prestação de serviços aos idosos;
VII – estabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações de
caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais de envelhecimento;
VIII – garantia de acesso à rede de serviços de saúde e de assistência social locais.
IX – prioridade no recebimento da restituição do Imposto de Renda. (Incluído pela Lei
nº 11.765, de 2008).
§ 2º. Dentre os idosos, é assegurada prioridade especial aos maiores de oitenta anos,
atendendo-se suas necessidades sempre preferencialmente em relação aos demais idosos.
(Incluído pela Lei nº 13.466, de 2017).
Art. 4º Nenhuma pessoa idosa será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação,
violência, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão,
será punido na forma da lei.
§ 1º É dever de todos prevenir a ameaça ou violação aos direitos do idoso.
§ 2º As obrigações previstas nesta Lei não excluem da prevenção outras decorrentes dos
princípios por ela adotados.
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Art. 5º LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
1. Política Nacional do idoso. A lei 8.842/94 dispôs sobre a Política Nacional do Ido-
so, que tem por objetivo assegurar os direitos sociais do idoso, criando condições
para promover sua autonomia, integração e participação efetiva na sociedade
(art. 1º), e rege-se pelos seguintes princípios: “I – a família, a sociedade e o estado
têm o dever de assegurar ao idoso todos os direitos da cidadania, garantindo sua
participação na comunidade, defendendo sua dignidade, bem-estar e o direito à
vida; II – o processo de envelhecimento diz respeito à sociedade em geral, devendo
ser objeto de conhecimento e informação para todos; III – o idoso não deve sofrer
discriminação de qualquer natureza; IV – o idoso deve ser o principal agente e o
destinatário das transformações a serem efetivadas através desta política; V – as
diferenças econômicas, sociais, regionais e, particularmente, as contradições entre
o meio rural e o urbano do Brasil deverão ser observadas pelos poderes públicos e
pela sociedade em geral, na aplicação desta lei.” (art. 3º).
2. Diretrizes da Política Nacional do Idoso. De acordo com o art. 4º da lei 8.842/94,
são diretrizes da Política Nacional do Idoso: a viabilização de formas alternativas
de participação, ocupação e convívio do idoso, que proporcionem sua integração
às demais gerações; a participação do idoso, através de suas organizações repre-
sentativas, na formulação, implementação e avaliação das políticas, planos, pro-
gramas e projetos a serem desenvolvidos; a priorização do atendimento ao idoso
através de suas próprias famílias, em detrimento do atendimento asilar, à exceção
dos idosos que não possuam condições que garantam sua própria sobrevivência;
a descentralização político-administrativa; capacitação e reciclagem dos recursos
humanos nas áreas de geriatria e gerontologia e na prestação de serviços; a im-
plementação de sistema de informações que permita a divulgação da política, dos
serviços oferecidos, dos planos, programas e projetos em cada nível de governo;
o estabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações
de caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais do envelhecimento; a
priorização do atendimento ao idoso em órgãos públicos e privados prestadores
de serviços, quando desabrigados e sem família; o apoio a estudos e pesquisas
sobre as questões relativas ao envelhecimento. Por fim, a lei afirma que é vedada
a permanência de portadores de doenças que necessitem de assistência médica
ou de enfermagem permanente em instituições asilares de caráter social.
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Estatuto da Pessoa Idosa. Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003 Art. 94
3. Conselho Nacional do Idoso. O Conselho Nacional do Idoso foi instituído pela lei
8.842/94, que na redação do projeto de lei, dispunha sobre ele nos arts. 11 ao 18,
todos vetados pelo Presidente da República. A despeito disso, o Estatuto do Idoso
trouxe uma atribuição do Conselho do Idoso, que é zelar pelo cumprimento dos
direitos do idoso, nele definidos.
............................................
TÍTULO VI
Dos Crimes
CAPÍTULO I
Disposições Gerais
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Art. 95 LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
CAPÍTULO II
Dos Crimes em Espécie
Art. 95. Os crimes definidos nesta Lei são de ação penal pública incondicionada, não
se lhes aplicando os arts. 181 e 182 do Código Penal.
1. Natureza da ação penal. Sabe-se que a regra geral do Direito Processual Penal
é de que a ação penal é pública incondicionada, salvo quando a lei dispuser de
forma contrária. Assim, não havia necessidade de o legislador explicitar no artigo
ora comentado que a ação penal é pública incondicionada. Trata-se, assim, de
previsão inócua.
2. Exclusão da incidência das imunidades absolutas e relativas do Código Penal.
Como dito acima, não havia necessidade de o legislador explicitar no artigo ora
comentado que a ação penal é pública incondicionada. Entretanto, pela leitura
do dispositivo legal, percebe-se que o legislador quis frisar a não aplicabilidade
das imunidades absolutas e relativas, previstas, respectivamente, nos arts. 181
e 182 do Código Penal. Sucede que o legislador do Estatuto, a um só tempo, fez
essa previsão de forma expressa e alterou o Código Penal, nas disposições finais
dos crimes contra o patrimônio, acrescentando o inciso III no art. 183 do Código
Penal, que também exclui expressamente a incidência das imunidades absoluta e
relativa aos crimes praticados contra idoso, utilizando-se dois dispositivos legais
para dizer a mesma coisa.
3. Bem jurídico protegido. Nos crimes previstos no Estatuto do Idoso, os bens jurídi-
cos tutelados são a dignidade, a saúde, a integridade física e psíquica, a liberdade
e o respeito ao idoso.
4. Violação do princípio da legalidade. O princípio da legalidade está retratado na ex-
pressão latina nullun crimen nulla poena sine lege certa, segundo o qual a lei penal
deve ser clara, certa, precisa e taxativa, proibindo-se conceitos vagos e imprecisos.
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Estatuto da Pessoa Idosa. Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003 Art. 96
Art. 96. Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações
bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio
ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade:
Pena – reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.
§ 1º Na mesma pena incorre quem desdenhar, humilhar, menosprezar ou discriminar
pessoa idosa, por qualquer motivo.
§ 2º A pena será aumentada de 1/3 (um terço) se a vítima se encontrar sob os cuidados
ou responsabilidade do agente.
§ 3º Não constitui crime a negativa de crédito motivada por superendividamento da
pessoa idosa.
1. Sujeito ativo. Trata-se de crime comum, uma vez que pode ser praticado por
qualquer pessoa.
2. Sujeito passivo. Pessoa idosa, com idade igual ou superior a sessenta anos.
3. Discriminar. Significa diferenciar, fazer distinção, tratar de forma desigual. No tipo
penal ora analisado, dá-se tratamento diverso à pessoa em razão de sua idade. O
móvel da conduta do agente é a condição de idoso da vítima. Em outras palavras,
impede-se ao idoso que ele tenha acesso à operações bancárias, aos meios de
transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento
necessário ao exercício da cidadania, justamente em razão de ter sessenta anos
de idade ou mais.
4. Impedir ou dificultar. Impedir significa não permitir, obstruir, proibir. Dificultar é
causar embaraço, servir de obstáculo.
5. Operações bancárias. Negócios jurídicos por meio dos quais se movimenta valores
financeiros em instituições financeiras (bancos), como transferências de uma conta
corrente pra outra, saques, depósitos, transferência de valores da conta corrente
para a poupança e vice versa.
6. Meios de transporte. Por meio de transporte entenda-se qualquer forma de des-
locamento de pessoas de um local específico para outro. Abrange o transporte
terrestre, aéreo e marítimo, individual ou coletivo, público ou particular, por meio
de qualquer veículo que possua propulsão própria, como carro, motocicleta,
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Art. 96 LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
barco, lancha, avião, helicóptero etc. Como o tipo legal de crime não fez qualquer
distinção, conclui-se que ele abrange qualquer natureza de meio de transporte,
podendo ser transporte público ou privado, de lazer ou trabalho, interestadual ou
intermunicipal, gratuito ou oneroso. Dessa forma, quando o motorista do ônibus
não para o veículo, impedindo o ingresso do idoso, pratica esse crime, uma vez
que dificultou acesso do idoso ao meio de transporte.
7. Direito de contratar. O direito de contratar consiste na liberdade que qualquer
pessoa tem de contrair obrigações e direitos. Desde que atendidos os limites
dogmáticos do Direito Civil, o direito de contratar é livre, seja a pessoa idosa, seja
a pessoa não idosa. Entretanto, o tipo legal de crime ora estudado dispõe que é
infração penal impedir ou dificultar ao idoso, o seu direito de contratar. Trata-se
de tipo penal aberto demais, em plena violação ao princípio da legalidade, na
vertente taxatividade – nullun crimen nulla poena sine lege certa, uma vez que o
legislador não estabeleceu de qual espécie de contrato se trata. Logo, ainda que
isso implique violação do princípio mencionado, abrange qualquer espécie de
contrato.
8. Qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania. O legis-
lador utilizou-se da técnica de interpretação denominada interpretação analógica,
para abranger qualquer forma de exercício da cidadania. O legislador não poderia
ter sido mais genérico. Ao utilizar as expressões qualquer outro meio ou instrumento
necessário ao exercício da cidadania, o legislador feriu de morte o princípio da le-
galidade, na vertente taxatividade – nullun crimen nulla poena sine lege certa. Com
efeito, o tipo legal de crime não mencionou quais seriam os meios ou instrumentos
necessários ao exercício da cidadania. A noção de cidadania está atrelada a qual-
quer direito que possa ser exercido pelo cidadão. Assim, o tipo penal possui uma
abrangência indefinida e infinita, dificultando, dessa forma, a sua aplicabilidade.
9. Tipo misto alternativo. A prática das duas condutas descritas no tipo (impedir ou
dificultar) não gera concurso de crimes, respondendo o agente por apenas um
delito.
10. Especial fim de agir. O tipo penal possui um especial fim de agir, consistente na
prática da conduta típica por motivo de idade. Ausente o especial fim de agir, a
conduta será atípica.
11. Condutas equiparadas. § 1º. Mais uma vez o legislador foi repetitivo de forma
desnecessária, uma vez que as expressões desdenhar, humilhar, menosprezar e
discriminar são sinônimas, significando a mesma coisa. Talvez seja essa conduta a
violação, em maior grau, do princípio da legalidade, na vertente taxatividade – nul-
lun crimen nulla poena sine lege certa. A incriminação consiste em humilhar pessoa
idosa, por qualquer motivo, desde não seja em razão da idade, não estabelecen-
do, o legislador, um motivo específico, circunstância ou a forma de humilhação,
Trata-se de delito de difícil aplicação prática. O delito ora comentado não estará
configurado caso haja a emissão de palavras ou conceitos injuriosos, como chamar
alguém de velho surdo ou velho ranzinza, caso em que estará configurado o delito
de injúria preconceituosa ou discriminatória prevista no art. 140, § 3º do Código
Penal, inserido pelo próprio Estatuto do Idoso, que possui a seguinte redação: “art.
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Estatuto da Pessoa Idosa. Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003 Art. 97
Art. 97. Deixar de prestar assistência à pessoa idosa, quando possível fazê-lo sem risco
pessoal, em situação de iminente perigo, ou recusar, retardar ou dificultar sua assistência à
saúde, sem justa causa, ou não pedir, nesses casos, o socorro de autoridade pública:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.
Parágrafo único. A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal
de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.
1. Sujeito ativo. Trata-se de crime comum, uma vez que pode ser praticado por
qualquer pessoa.
2. Sujeito passivo. Pessoa idosa, com idade igual ou superior a sessenta anos.
3. Deixar de prestar assistência ao idoso quando possível fazê-lo sem risco pessoal,
em situação de iminente perigo. Deixar de prestar assistência é conduta omissiva,
por meio da qual o agente deixa de cumprir um mandamento normativo. O legis-
lador trouxe, na norma penal, um mandamento dirigido ao agente no sentido de
prestar assistência ao idoso, determinando que o agente aja, preste o socorro, e
327
Art. 97 LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
328
Estatuto da Pessoa Idosa. Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003 Art. 97
idoso quando possível fazê-lo sem risco pessoal, em situação de iminente perigo
ou não pedir o socorro de autoridade pública; Segunda incriminação: Recusar,
retardar ou dificultar a assistência à saúde do idoso, sem justa causa ou não pedir
o socorro de autoridade pública. Dessa forma, nas primeiras condutas, o fato de
o agente não poder prestar assistência ao idoso em situação de iminente perigo,
diante de um risco pessoal, ou recusar, retardar ou dificultar a assistência à saúde
do idoso por uma causa justificada, isso não lhe retira o dever de pedir socorro da
autoridade pública, caso em que, se não o fizer, pratica o delito ora comentado. Por
autoridade pública entenda-se o agente público que tenha atribuição ou possa, de
alguma forma, prestar socorro ao idoso. Não adianta pedir socorro ao agente de
trânsito para que o mesmo preste socorro a um idoso que se encontra dentro de
um prédio completamente em chamas, uma vez que o agente de trânsito nada po-
derá fazer. Entretanto, a autoridade pública que sempre poderá prestar, de alguma
forma, socorro ao idoso, é o agente policial, que tem o dever de comunicar ao outro
agente público que possa efetivamente prestar o socorro ao idoso, solicitando-o.
6. Não aplicabilidade ao agente garantidor. O tipo legal de crime em comento não
se aplica ao agente garantidor previsto no art. 13, § 2º, do Código Penal. Em pri-
meiro lugar por tratar-se de omissão própria; em segundo lugar, porque o agente
garantidor jamais responderá por esse delito de omissão de socorro previsto no
Estatuto do Idoso. Ao contrário, o agente garantidor sempre responde pelo re-
sultado ocorrido. A omissão do garante o conduz à responsabilidade penal pelo
resultado decorrido de sua omissão, não podendo ele ser responsabilizado por uma
omissão própria. Dessa forma, se o agente garantidor, como os filhos em relação
aos pais idosos, o médico da rede pública de saúde ou o agente policial se omitir
e de sua omissão decorrer, por exemplo, o resultado morte, ele responde pelo
homicídio consumado por omissão imprópria. Caso não haja o resultado morte, a
omissão do agente garantidor, se for dolosa, o conduzirá à tentativa de homicídio
por omissão imprópria. Entretanto, de forma diversa, se a omissão do garante
for culposa e não ocorrer o resultado, não se punirá a tentativa, uma vez que o
crime culposo não admite a figura da tentativa. Exemplificando: um médico de
um hospital público se depara com um idoso que acabara de chegar ao hospital,
levado por populares, sofrendo um possível enfarte. Caso ele dolosamente não o
socorra para evitar-lhe a morte, não responderá pelo delito ora comentado, mas
por homicídio consumado por omissão imprópria, justamente em razão de sua
condição de agente garantidor.
7. Causa especial de aumento de pena. Parágrafo único. A pena é aumentada de
metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave (art. 129, §§ 1º e
2º do Código Penal), e triplicada, se resulta a morte da pessoa idosa. Tais resulta-
dos sempre decorrerão de culpa do agente, por tratar-se de delito preterdoloso,
que é aquele em que o agente age com dolo na conduta, gerando um resultado
qualificador mais grave à título de culpa. Caso o agente tenha dolo em relação à
lesão corporal ou à morte, o delito deixará de ser omissão de socorro previsto no
Estatuto do Idoso, e passará a ser de lesão corporal dolosa ou homicídio doloso,
ambos com previsão no Código Penal. Tal aumento de pena tem natureza jurídica
de causa especial de aumento de pena, também chamada de majorante, incidindo
na terceira fase do critério trifásico de aplicação da pena.
329
Art. 98 LEIS PENAIS ESPECIAIS – Gabriel Habib
8. Tipo misto alternativo. A prática de duas ou mais condutas descritas no tipo não
gera concurso de crimes, respondendo o agente por apenas um delito.
9. Especialidade. O tipo legal de crime ora comentado é especial em relação ao art.
135 do Código Penal, que prevê o delito de omissão de socorro.
10. Consumação. Na conduta deixar de prestar assistência, por se tratar de crime
omissivo próprio, se consuma com a mera omissão do agente. Já nas condutas
recusar, retardar ou dificultar nas formas comissivas, o delito se consuma com a
prática das condutas; entretanto, se essas mesmas condutas forem praticadas na
forma omissiva própria, o delito estará consumado com a mera omissão do agente,
independentemente de qualquer resultado ulterior, mesmo que o socorro seja
prestado, posteriormente, por outrem.
11. Classificação. Crime comum; formal; doloso; comissivo ou omissivo próprio nas
condutas recusar, retardar ou dificultar, e omissivo próprio na conduta deixar de
prestar assistência; instantâneo; admite tentativa nas modalidades comissivas,
não a admitindo nas modalidades omissivas próprias.
12. Infração penal de menor potencial ofensivo. Tendo em vista que a pena máxima
cominada não ultrapassa 2 anos, trata-se de infração penal de menor potencial
ofensivo, sendo a competência dos Juizados Especiais Criminais para o processo e
o julgamento, salvo no caso de ocorrer o resultado qualificador morte da pessoa
idosa, previsto no parágrafo único.
13. Suspensão condicional do processo. Cabível, pois a pena mínima cominada não
ultrapassa 1 ano (art. 89 da lei 9.099/95), salvo se houver a incidência da causa
especial de aumento de pena prevista no parágrafo único. Entretanto, o STF deu
ao art. 94 desta lei interpretação conforme a Constituição (ver comentários ao
art. 94 desta lei).
Art. 98. Abandonar a pessoa idosa em hospitais, casas de saúde, entidades de longa
permanência, ou congêneres, ou não prover suas necessidades básicas, quando obrigado
por lei ou mandado:
Pena – detenção de 6 (seis) meses a 3 (três) anos e multa.
1. Sujeito ativo. Trata-se de crime próprio, uma vez que somente pode ser praticado
por pessoa que esteja obrigada, por lei ou mandado, a amparar o idoso, como na
hipótese dos filhos em relação aos pais.
2. Sujeito passivo. Pessoa idosa, com idade igual ou superior a sessenta anos.
3. Abandonar ou não prover as necessidades básicas do idoso. Abandonar significa
desamparar, deixar de dar assistência. Pode ser praticada na forma comissiva ou
na forma omissiva. Na forma comissiva ocorre quando o agente leva o idoso ao
asilo, ao hospital ou à casa de saúde e o deixa lá, abandonando-o. Na modalida-
de omissiva, o delito se dá quando, por exemplo, o agente não busca o idoso no
hospital onde se encontra internado, igualmente abandonando-o. Note-se que o
abandono pode ser temporário ou permanente, desde que fique caracterizado
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