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AS FASES DO DESENVOLVIMENTO HUMANO E O ADOECER

Heloisa Benevides de Carvalho Chiattone

A criança, enquanto ser em desenvolvimento sempre foi objeto de


estudos, principalmente porque é na infância que o ser terá realizado as
primeiras e fundamentais inscrições em seu psiquismo, sendo essas,
elementos primordiais para o crescimento saudável.
Assim, o desenvolvimento infantil deve ser enfocado em abordagem integrativa
onde em condições normais, a criança desenvolve-se como um “todo
integrado”, sob a influência de múltiplos fatores. Nessa medida, o
desenvolvimento da criança só pode ser compreendido se considerar as
relações interpessoais e as experiências vividas que contextualizam a evolução
das potencialidades individuais.
Então, se estão centradas na infância as mais importantes inscrições da
vida emocional de um indivíduo, a vivência de uma doença e conseqüente
necessidade de hospitalização, claramente prejudicam o desenvolvimento
normal.

“A doença constitui, talvez, a tensão generalizada mais comum que pode


vir a ocorrer com a criança em desenvolvimento. Cada criança que fica doente
tem uma reação psicológica à sua doença. Algumas reações são gerais, outras
são específicas da doença. As reações gerais dependem de diversos fatores,
entre eles:

(1) os estágios evolutivos da criança (seus níveis de


desenvolvimento cognitivo e emocional e a capacidade
adaptativa prévia),
(2) o grau de sofrimento e mutilação e o significado que a doença
tem para a criança e os pais,

(3) a relação pai-filho e a resposta da criança à reação dos pais,

(4) a reação psicológica da criança aos procedimentos médicos e


cirúrgicos, separações, hospitalização e

(5) a interferência resultante nas funções físicas, psicológicas e


sociais. As reações específicas dependem, em parte, da
natureza e severidade da doença” (Lewis e Volkmar,
1993:265).

Essa vivência intensa de crise acontece, principalmente, pela ocorrência,


na criança, de dissociação entre o psíquico e o somático e por atingir um ser
que ainda não possui estrutura egóica suficiente para o enfrentamento da
situação. Além disso, a criança vivencia a experiência da doença e
hospitalização com uma intensidade emocional muito significativa, d
evido a frágil distinção entre o mundo externo e interno,associado ao fato de
sua vida psíquica ser composta de fantasias, portanto pouco acessível ao
princípio de realidade.

Ajuriaguerra e Marcelli (1991) afirmam que a vivência da doença remete


a criança a movimentos psicoafetivos diversos:

 a regressão quase sempre acompanha a doença: retorno a uma relação


de cuidados corporais e de dependência como aquela do lactente;

 o sofrimento pode ser vinculado a uma vivência de punição ou a um


sentimento de falta: a culpa freqüentemente infiltra a vivência da criança
doente. Esta culpabilidade pode ser, então, reforçada pelo discurso da
família (“você não me obedeceu e por isso ficou doente”; “você não faz a
lição da escola e por isso teve que ficar no Hospital”), mas encontra a
sua origem também na vida fantasmática da criança;

 a alteração do esquema corporal, é freqüente (“meu corpo não é


perfeito, é frágil, é defeituoso”), podendo evidenciar fantasmas de
castração ou em ferida narcísica mais ou menos profunda;

 a morte ou a angústia de morte, aparece nos comportamentos, nos


sonhos, nas brincadeiras.

Vários efeitos psicológicos podem ser citados como conseqüência da


situação de doença e hospitalização:

 negação da doença
 revolta
 culpa e sensação de punição
 ansiedade
 depressão
 projeção
 solidão
 distúrbios neuróticos
 comportamento “esquizóide”
 frustração de sonhos e projetos
 privação da realização
 regressão e busca de proteção
 intolerância emocional
 negativismo

As reações de culpa e sensação de punição, ansiedade e depressão,


acrescidas de distúrbios neuróticos, podem ser destacadas como causadoras
de intenso descontrole emocional à criança doente e hospitalizada. É evidente,
portanto que bebês, crianças e adolescentes internados necessitam de
serviços de saúde mental.

Avalia-se que aproximadamente 2/3 das crianças internadas necessitam de


avaliação e apoio psicológico.

No entanto, na prática, somente 11,3% de todos os pacientes recebem esse


tipo de apoio.

É fato que a permanência no Hospital aumenta o risco de transtornos.


Principalmente se associada a
incapacidade crônica, desfiguração, imobilização absoluta ou relativa e perda
da autonomia. Várias são as seqüelas em crianças internadas por longos
períodos:

 imaturidade
 dificuldades em
tomar decisões
 insegurança frente a vida
 temores difusos

 intolerância à incertezas

 intolerância a perdas

 rigidez nos relacionamentos
 ambivalência afetiva
 resistência a mudanças
 resistência a figuras de autoridade
 desafio a limites
 problemas com a sexualidade
 instabilidade escolar (dificuldade na leitura e escrita)
 transtornos de sono (pesadelos, terror noturno)

As reações à doença e hospitalização são interdependentes a alguns


fatores:

• nível de desenvolvimento cognitivo e emocional


• capacidade adaptativa prévia
• grau de sofrimento e mutilação
• significado da doença para criança e pais
• relações pais-filhos
• interferências nas funções físicas e psicossociais
• experiências vividas na internação
• atitudes da equipe
• rotinas hospitalares
• duração da hospitalização
• tipo de internação
• natureza da doença

É importante ressaltar que os efeitos da hospitalização nas diferentes


fases de desenvolvimento da criança, também evidenciam como esta se
defronta à situação de doença, tornando o desenvolvimento infantil
comprometido pelas vivências que a criança doente se vê obrigada a enfrentar.
Principais efeitos da hospitalização em crianças
CARACTERÍSTICAS EFEITOS DA
FAIXA ETÁRIA
PRINCIPAIS HOSPITALIZAÇÃO
 Criança crê que causou a
Egocentrismo doença e a hospitalização
18 meses a 3 anos  Intensa sensação de
desproteção e abandono
 Temor da perda de amor

 Percepção concreta da
doença e da hospitalização
afetando a vida cotidiana:
18 meses a 3 anos Pensamento concreto
 sofrimento intenso
 não compreende
hospitalização
 dificuldades de adaptação
 temor da separação
 ansiedade no confronto com
estranhos e diante dos
procedimentos
 Fantasias assustadoras

18 meses a 3 anos Controle de si e das  Imposição de medidas


situações através de terapêuticas levam à
exploração e interferência no desejo por
manipulação controle

 Perda da autonomia
18 meses a 3 anos Busca de autonomia  Aumento dos comportamentos
de vínculo e regressão
 Luta para manter habilidades
adquiridas
 Intensa reação contra
restrições da doença
18 meses a 3 anos Imposição contra  Agressividade
limites  Ambivalência ou relutância da
família na imposição de
limites determinam
interferência no
desenvolvimento do controle
do impulso

3 a 6 anos Pensamento concreto/  Dor, sintomas da doença e


egocentrismo condutas terapêuticas vividas
como punição

 Limite à capacidade de atingir


controle motor e competência
3 a 6 anos Domínio de social
habilidades,  Limite à interação com pares e
conceitos, valores e aprovação
relações  Limite ao senso de domínio
causando temores,
passividade e dependência

Espontaneidade
máxima  Regressão: anorexia,
lambuzar-se regressivo,
Flutuações recusa à mastigação, perda do
dependência controle esfincteriano
/independência,
3 a 6 anos  Gratificações primitivas/caráter
Jogos cooperativos pré-genital
/integrados,
 Balanceio, masturbação,
Relações com novos chupar o dedo
amigos,
 Retardo do ingresso na
Desenvolvimento escola, aumento da
psicossexual dependência, raiva por ser
diferente

 Raiva/culpa

6 a 12 anos Importância dos  Ressentimento por ser


grupos, pares diferente

 Interferência nas relações


com o grupo

6 a 12 anos Compreensão de  Morte personificada, ameaça


causa e efeito gradual e pessoal, interesse
pelo alem da morte, reações
de angustia e luto

Aquisição de  Faltas escolares


habilidades sociais e
 Insegurança e ansiedade
físicas
6 a 12 anos  Aumento de queixas
Desenvolvimento do
físicas/faltas
senso de realização
 Diminuição de habilidade
Ajustamento ao
cognitiva e capacidade de
setting escola
concentração

 Frustração de sonhos e
projetos

Conforme Chiattone em “E a psicologia entrou no hospital”, 1996: 98

É necessário considerar também os vários aspectos inerentes à


hospitalização na infância:
• desmame intempestivo
• desestrutura familiar
• interrupção e/ou retardo do desenvolvimento
• interrupção e/ou retardo da escolaridade
• agressões psicológicas:
privação materna acompanhada de sensação de abandono
medo do desconhecido
sensação de culpa / punição
despessoalização
limitação de atividades e estimulação
aparecimento ou intensificação do sofrimento
ASSISTÊNCIA PSICOLÓGICA EM PEDIATRIA
Heloisa Benevides de Carvalho Chiattone - Hospital Brigadeiro e HSPM

O desenvolvimento infantil deve ser enfocado em abordagem integrativa,


a qual em condições normais, a criança desenvolve-se como um "todo
integrado", sob a influência de múltiplos fatores. Dessa forma, o
desenvolvimento da criança só pode ser compreendido considerando-se, as
relações da criança com o mundo, consigo mesma, suas potencialidades
individuais contextualizando assim sua evolução.
A criança enquanto ser em desenvolvimento sempre foi objeto de
estudos, principalmente porque é na infância que o ser terá realizado as
primeiras e fundamentais inscrições em seu psiquismo, sendo estas elementos
primordiais para o crescimento saudável.
Então, se estão centradas na infância as mais importantes inscrições da
vida emocional de um indivíduo, a vivência de uma doença e conseqüente
necessidade de hospitalização, claramente prejudicam o desenvolvimento
normal da criança.
A doença constitui a tensão generalizada mais comum na infância, pela
ocorrência de dissociação entre o psíquico e o somático e, por atingir um ser
que ainda não possui estrutura egóica suficiente para o enfrentamento da
situação.
Nesse sentido, a criança vivencia a experiência da doença e
hospitalização com uma intensidade emocional muito significativa, devido a
frágil distinção entre o mundo externo e interno e pela vida psíquica infantil ser
composta de fantasias, muitas vezes, pouco acessíveis ao princípio de
realidade.
A situação de doença e necessidade de hospitalização na infância,
provocam repercussões psicossociais importantes e intensas na vida da
criança, como:

 Reforço do sentimento de aniquilamento e mutilação (vivenciados através


de condutas terapêuticas e procedimentos invasivos);
 Incremento da angústia de morte (pelos longos períodos de hospitalização);
 Sensação de punição (com origem e reforço na vida fantasmática da
criança);
 Despessoalização;
 Perda da autonomia (interferindo no desejo por controle da criança,
prejudicando o desenvolvimento de um ego seguro);
 Limitação de atividades e de estimulação (limitando o senso de domínio da
criança);
 Retardo na entrada na escola ou suspensão escolar (comprometendo auto-
estima, auto-conceito e as relações sociais da criança)

Ressalta-se que estas repercussões psicossociais, podem levar a


criança doente e hospitalizada à regressão, dependência, passividade e até ao
sentimento de impotência perante a situação.
As estratégias de atendimento utilizadas à criança doente e
hospitalizada, devem em sua essência minimizar o risco de má adaptação,
objetivando primordialmente a humanização do atendimento.
Nesse sentido, as estratégias psicológicas utilizadas pelo Serviço de
Psicologia Hospitalar estão fundamentadas no brincar como forma de
comunicação da criança doente e hospitalizada.
É primordial que as crianças doentes possam participar em enfermarias
pediátricas ou nos ambulatórios de atividades lúdicas programadas, dirigidas
por profissionais de saúde mental- psicólogos ou psiquiatras, pois através do
brinquedo ela poderá experimentar sua nova forma de ser

Naturalmente, brincar é a forma de autoterapia da criança e esta


atividade pode se transformar em excelente instrumento preventivo,
diagnóstico, prognóstico e terapêutico às crianças na situação de doença, pois
experienciando, tomando consciência ou descobrindo através do brinquedo, a
criança pode formular e assimilar o que experencia, facilitando a internalização,
amadurecimento e melhor elaboração do processo.
Assim, nas atividades, deve-se encorajar ao máximo as fantasias
utilizando-as como instrumento terapêutico, pois através delas pode-se
descobrir qual é o processo psicológico da criança, penetrar nos recantos mais
íntimos de seu ser, trazer à luz de sua consciência o que está oculto ou o que
evita e, enfim, desvendar o que ela sente a parte de sua perspectiva.
Portanto, deve-se buscar nas atividades o fortalecimento de auto-estima
e autoconceito criando oportunidades para que a criança possa retomar seu
equilíbrio psíquico, pois ao recuperá-lo pode explorar e descobrir alternativas
na situação de doença. A meta, assim, é ajuda-lá a tomar consciência de si
mesma, de sua existência no mundo e de sua situação de doença e iminência
de morte, reconstruindo seu senso de eu, fortalecendo suas funções de contato
renovando o contato com seus sentidos e sentimentos. Ao fazer isso, pode-se
redirigir a criança para a percepção mais saudável das funções de contato que
lhe restam e em direção a comportamentos mais satisfatórios.
Pode-se utilizar de uma grande quantidade de técnicas específicas
incluídas em atividades programadas para o Hospital para ajudar as crianças a
expressarem seus sentimentos. Primordialmente, deve-se incentivar o
compartilhar de sentimentos e promover autodescoberta para que a criança
possa reconhecer, aceitar e expressar seus sentimentos. Assim, quando lhe é
pedido para contar uma história é a partir de um estímulo de uma figura de um
animal doente, esta história é a afirmação de sua consciência. Quando se
facilita a expressão de sentimentos através do play-mobil de Hospital, busca-se
a consciência explícita. E, com o desenvolvimento da consciência, a criança
doente começa a examinar opções e escolhas disponíveis, pode lidar melhor
com temores ocultos que impedem escolhas sadias.
Portanto, é de suma importância a tarefa de ajudar as crianças doentes
a se sentirem fortes dentro de si mesmas, plenas de que possuem escolhas
mesmo na situação de doença e morte. A principal tarefa do profissional de
saúde mental é apontar caminhos, oferecendo condições de forma direta, sem
invadir - sendo leve e delicado sem ser passivo, aceitando a criança com
respeito e consideração.

Várias atividades podem ser programadas na rotina do Hospital, como


mostra a Figura 01.
Sugestões de atividades psicoterapêuticas no Hospital

Artes Desenho Livre Expressão de tendências


inconscientes
Artes Pintura livre a dedo Expressão de sentimentos
Calmante
Fluente
Desenhar e apagar /
fracasso
Artes Pintura de modelos Situações de doença e
prontos hospitalização
Artes Desenho ou pintura Hospital
Doença
Casa
Equipe
Artes Desenho “Se você fosse mágico...”
desenhe
Artes Desenho “Desenhe alguma coisa
que você gostaria de não
ter feito”
Artes Desenho de polaridades Fraco / Forte
Saúde / Doença
Gosto / Não gosto
Medo / Coragem
Tristeza / Alegria
Vida / Morte
Artes Manuais sobre a doença, Projeção
hospitalização Identificação
Elaboração
Artes Recortes e colagens Projeção
Internalização
Artes Modelagem Manifestação de
processos internos
primários

Fluidez – aproxima a
criança dos sentidos,
penetra na armadura
protetora

Crianças inseguras –
sensação de controle e
domínio
Hospital de Crianças Recorte e colagem de Hospital Real X Imaginário
figuras do Hospital Doença X Cura
Vida e Morte
Eliminação de falsos
conceitos
Os atendimentos psicológicos devem ocorrer diariamente, aos
pacientes internados e seus familiares, em grupo ou individualmente, estando
fundamentados na psicoterapia breve/focal.
O atendimento psicológico na Enfermaria de Pediatria, segue um
Programa de atendimento no qual estão inseridas as seguintes estratégias
psicológicas:

 Desenho livre
 Desenho dirigido
 Pintura livre a dedo
 Pintura de modelos prontos
 Pintura de manuais
 Desenhos desafios
 Desenho de polaridades
 Recortes e colagem
 Modelagem
 Dramatização
 Comemoração de datas festivas
 Jogo palavra de criança
 Banho de sol
 Construindo meu brinquedo
 Boneco paciente
 Clínica veterinária
 Árvore da vida
 O trenzinho
 Oficinas de criatividade
 Banho de sol
 Visitando o hospital
 Contação de histórias
 Hospital das crianças
 Cineminha
Todas estas estratégias vem de encontro ao objetivo primordial do
atendimento à crianças doentes e hospitalizadas, a Humanização como
compromisso do atendimento.

Segue abaixo, a discriminação de algumas atividades:


BONECO PACIENTE

Definição: estratégia criada por Chiattone, em 1988 e utilizada como rotina


na enfermaria pediátrica do Hospital Brigadeiro. Trata-se de uma
estratégia grupal baseada na técnica projetiva, utilizada no
contexto psicoterápico como meio de contato, investigação e
tratamento.

Objetivos:
 participação ativa no processo de doença, tratamento e hospitalização;
 minimização de angústias e sofrimento gerados a partir da doença;
 diminuição de fantasias e falsos conceitos em relação a doença e
tratamento;
 projeção e identificação de conteúdos inerentes ao processo de doença;
 preventivo, diagnóstico e terapêutico;

Recursos materiais:
 papel pardo (coletivo);
 canetinha hidrocor ou giz de cera;
 fita crepe;
 sucata (para cabelo, roupa, fios de lã, barbante, etc)

Procedimento: o psicólogo deverá convidar as crianças para


sentarem-se à mesa da sala de recreação e, em
seguida, solicitará que cada membro do grupo diga
seu nome, idade, nome da doença e a localização
desta no corpo.
Na seqüência, uma criança será escolhida, a partir
de um consenso, para deitar-se sobre uma folha de
papel pardo para que seja desenhado o contorno do
corpo. O psicólogo deverá explicar que o desenho
será o “boneco” e solicitará que cada criança localize
e desenhe a sua doença nele. Caso haja
necessidade, o psicólogo poderá intervir no sentido
de esclarecer dúvidas acerca da localização ou
incentivar o paciente e as outras crianças do grupo a
ajudá-lo na proposta. Muitas vezes, o psicólogo
poderá, para facilitar a tarefa, oferecer explicações
simplificadas sobre o funcionamento de alguns
sistemas, clarificando e concretizando as etapas do
tratamento, os exames necessários, a rotina da
internação, desde que não saia dos limites e
objetivos de seu papel. Assim, por exemplo, de
forma muito simples, as crianças podem entender o
funcionamento dos rins se o psicólogo compará-lo
com um filtro ou da medula óssea, se compará-lo,
concretamente, à fabrica do sangue. Dessa forma,
se “o filtro não está funcionando, a água não passa,
permanecendo no corpo que fica inchado”,
concretizando para o paciente a necessidade, a
razão do tratamento e seus mecanismos. No caso
das crianças leucêmicas, a fábrica do sangue é um
excelente instrumento para que as crianças
entendam o funcionamento do sistema circulatório.
Se a fábrica não está funcionando adequadamente,
produzindo quantidades ideais do produto x, as
doenças do sangue aparecem. Dessa explicação
simples, as crianças podem entender e se adaptar,
de forma mais eficiente, à necessidade de realização
de exames, punções, biopsias, etc. No boneco-
paciente, as crianças com doenças hematológicas
irão desenhar veias, artérias e localizar assim, a
doença no sangue.
Quando todos os integrantes do grupo já tiverem
localizado suas doenças no boneco, o psicólogo
pedirá que cada um fale sobre seu desenho e sobre
sua doença aos demais. Nesta etapa, o psicólogo
deverá atuar facilitando e estimulando as crianças a
falarem sobre a doença, tratamento e hospitalização,
bem como de suas dúvidas, medos e angústias
acerca dessa situação.
Ao final, o fechamento da atividade se dá através
das considerações dos membros participantes
sobre o boneco, sobre a tarefa; a significação e o
sentido dos conteúdos abordados, ressaltando
aspectos positivos e efeitos adaptativos para melhor
elaboração e enfrentamento do processo de doença.
O boneco-paciente, após o fechamento formal da
atividade, pode ser vestido, nomeado, enfeitado,
transformando-se, não raro, em personificação do
universo simbólico interno e individual de cada
criança durante toda aquela semana, permanecendo
pendurado na parede da sala de recreação.

Resultados: esta atividade auxilia o psicólogo a avaliar o


conhecimento e compreensão do paciente em
relação a doença, tratamento e necessidade de
hospitalização. Além disso, torna-se possível
detectar falsos conceitos, fantasias e angústias em
relação a doença e sua localização e “efeito” no
corpo do paciente.
A partir da atividade, pode-se discutir os aspectos do
tratamento, as dores, as picadas, as condutas
médicas e de enfermagem. O alívio que se obtém é
impressionante, uma vez que, compreendendo a
doença e tornando-se elemento ativo no processo
poderá, a criança, encarar o tratamento e
hospitalização como menos ameaçadora e
angustiante.
Possibilita ao psicólogo, auxiliar o paciente na
compreensão da doença, tratamento e necessidade
de hospitalização e consequentemente na
minimização da angústias e sofrimento. É muito
eficaz aos pacientes com diagnóstico recente que
frequentemente encontram-se dotados de dúvidas,
fantasias e medos.
Como estratégia grupal, a partir da participação de
uma criança, as demais que tiverem o mesmo
diagnóstico podem beneficiar-se, em mecanismo de
identificação. Além disso, o boneco-paciente,
possibilita a manifestação mais direta de aspectos
que a criança não tem conhecimento, não quer ou
não pode revelar, ou seja, aspectos profundos e
inconscientes, definidos por conteúdo simbólico
menos reconhecido.

DRAMATIZAÇÃO

Definição: estratégia adaptada às necessidades e demandas das crianças


doentes e hospitalizadas, a partir da técnica psicodramática. .....
Sendo os temas inerentes ao processo de doença e
hospitalização os mais angustiantes e conflituosos, dramatizando-
os as crianças poderão ter importantes benefícios em direção à
elaboração. Diversos temas de dramatização podem ser
utilizados, seja a partir da história de um livro, de um filme, de
acontecimentos cotidianos, etc.
Na enfermaria pediátrica do Hospital Brigadeiro são
desenvolvidas como rotina as dramatizações como: “Hospital das
Crianças”, “Clínica Veterinária”, Simulações de exames e
procedimentos cirúrgicos, teatro de fantoches, etc.

Objetivos:
 possibilitar a expressão e elaboração de polaridades, medos, fantasias,
desejo de transformação e expectativas das crianças;
 aliviar as angústias referentes à sua condição por meio de projeção;
 trabalhar dúvidas e falsos conceitos em relação a doença, tratamento,
cirurgias, exames, etc.
 integração entre as crianças.

Recursos Materiais:
 bonecos; fantoches
 bonecos vestidos de médico;
 bonecos vestidos de paciente;
 roupas de médico e paciente para crianças;
 equipamentos médicos de brinquedo (injeções, xaropes, estetoscópio,
tesoura, algodão, soro, etc.);
 fantasias;
 animais de pelúcia ou borracha.

Procedimento: O tema da dramatização poderá ser escolhido com


base na faixa etária predominante e nas demandas
comuns ao grupo. Neste caso que segue, o tema
será sobre o “Hospital das Crianças”.
Após convidar as crianças a sentarem-se à mesa e
após a apresentação de cada membro do grupo com
nome, idade e o motivo da internação, o psicólogo
poderá colocar sobre a mesa brinquedos como
bonecos, bonecos vestidos de médico e paciente,
equipamentos médicos, roupinhas de médico e
paciente para crianças, etc. Paralelamente, deverá o
psicólogo estimular o grupo a dramatizar situações
de exames, tratamento, cirurgias, etc.
As crianças poderão brincar livremente ou poderão
estruturar um hospital (com um nome dado por elas)
onde cada um escolherá sua função e papel e o
psicólogo poderá atuar por meio da projeção das
crianças.
Ao final, cada criança será convidada a falar sobre a
atividade e sobre o que sentiu.

Resultados: através da dramatização a criança pode expressar e


elaborar seus sentimentos relacionados à vivência
de doença, tratamento e hospitalização. É muito
eficaz para crianças recém internadas que ainda
apresentam dificuldades em adaptar-se ao ambiente;
para crianças em pré- operatório; etc.
Além da oportunidade de trabalhar questões
inerentes à vivência, oferece oportunidade à criança
de se posicionar, de lutar contra seus receios, de
mostrar raiva, angústia, de sofrer menos. Para a
equipe de saúde também ocorre a oportunidade de
se espelhar e refletir sobre as próprias atitudes
perante as crianças.

SAQUINHO BAGUNÇINHA E CADERNETA INDIVIDUAIS

Definição: estratégia criada por Chiattone e utilizada como rotina na


enfermaria pediátrica do Hospital Brigadeiro, São Paulo.
Objetivos:

 estabelecimento de vínculo entre as crianças;


 individualizar cada paciente;
 resgate e fortalecimento da identidade de cada criança;
 minimizar a sensação de despessoalização advinda da situação de
doença, hospitalização e tratamento;
 percepção do nível de informação que a criança possui sobre a doença;
 estabelecimento de um vínculo saudável de responsabilidade para com
as atividades a partir do cuidado com caderneta.

Recursos materiais:
 tinta guache;
 pincéis;
 saquinhos de tecido de tamanho médio;
 caderneta (vide modelo nos anexos);
 caneta esferográfica para o preenchimento dos dados da caderneta;
 varal e pregador (podem-se utilizar outros recursos);
 estrelinhas coloridas;
 cola.

Procedimento: o psicólogo convidará as crianças a sentarem-se à


mesa e em seguida solicitará que cada uma se
apresente às demais dizendo nome, idade, nome da
doença e o motivo da internação. Será distribuído
um saquinho de tecido para cada criança juntamente
com pincel e tinta.
As crianças poderão decorar com pintura o saquinho
da maneira que acharem melhor, utilizando ou não o
pincel. O psicólogo explicará que cada criança terá o
seu saquinho para guardar suas coisas enquanto
estiver internada, inclusive a caderneta.
A caderneta também será preenchida neste dia, com
os seguintes dados da criança (compatíveis com o
que a criança sabe): nome completo, idade, nome de
sua doença (caso a criança não diga ou não saiba
que tem leucemia, colocar o que ela disser), nome
de seu médico, etc. Na parte interna da caderneta
deverá ter um espaço para que, a cada atividade de
que a criança participar, tenha o registro da data e
uma gratificação colada ao lado (pode ser estrelinha,
adesivo, etc.).
A criança deverá ser orientada para que a cada
atividade a carteirinha seja entregue ao psicólogo
antes de seu início e para que será devolvida ao
final, desenvolvendo, assim, seu senso de
responsabilidade e o resgate de objetos
significativos.
O saquinho ficará secando, pendurado no varal ou
em mesas na sala de recreação e poderá ser
recolhido pela própria criança.
O ideal é que se realize essa atividade todo início de
semana, quando os pacientes novos pintarão o
saquinho e preencherão a caderneta e os antigos os
auxiliarão.
Como é comum que as crianças internem, recebam
alta e reinternem, o psicólogo deverá orientá-las
também (no caso das menores orientá-las
juntamente com o acompanhante) a guardar e a
cuidar da caderneta, pois a cada internação irão
utilizá-la nas atividades.

Resultados: estratégia eficaz, principalmente, para as crianças


submetidas a longo período de internação. Através
da confecção da caderneta e saquinhos, as crianças
que a partir da doença e hospitalização foram
afastadas dos objetos que, muitas vezes, lhe davam
sentido de identidade e que perderam a
individualidade ao usar pijama e ao dormir em leito
igual ao das outras crianças podem alcançar o
resgate e fortalecimento da identidade e minimizar a
sensação de despessoalização.
Além disso, as crianças criam um importante vínculo
e comprometem-se mais com as atividades
realizadas pelo psicólogo a partir da valorização da
caderneta. O saquinho, passa a agrupar objetos
adquiridos ou confeccionados pelas crianças
durante a internação.

CINEMINHA SÃO LUIZ

Objetivos:
 sair da unidade, possibilitando a quebra da rotina interna das crianças
hospitalizadas;
 reforçar o vínculo com a vida (atividade que a criança fazia quando era
sadia);
 integração das crianças do grupo;
 a partir da mensagem ou de aspectos do conteúdo da história pode-se
amenizar angústias, medos e propiciar, por meio de projeção ou
identificação com personagens, um gancho para a elaboração de
conflitos.

Recursos Materiais:
 bloquinho de folhas destacáveis para confecção dos bilhetes e
dinheirinhos;
 giz de cera, lápis de cor ou canetinha hidrocor;
 televisão;
 vídeocassete;
 filme;
 caso tenha trabalho prévio e posterior, utilizar materiais como livro com a
história do filme, sulfite, cartolina, fantoches, etc.

Procedimento: a escolha do filme deve ser adequada ao nível de


compreensão das crianças e deve estar baseada em
algum objetivo construtivo à situação de doença e
hospitalização vivida por elas.
Se possível, em algum momento ou no dia anterior à
atividade seria importante trabalhar previamente a
história do filme para aquecer e estimular as
crianças e, também, para evitar que alguma criança
se surpreenda negativamente com algum
acontecimento ou personagem do filme. Esse
preparo pode ser com base no livro sobre a história
ou com a narração do psicólogo como recurso.
Desenhos também podem ser feitos para verificar o
nível de fantasia da criança sobre os eventos
futuros, o que pode contribuir para o conhecimento
da dinâmica interna de cada criança, servindo de
alerta para uma situação de exame, por exemplo,
que também exige preparo prévio e pode dar
margem a muitas fantasias.
Na manhã da atividade, o psicólogo deverá reunir as
crianças na sala de recreação e juntamente com
elas confeccionar as entradas do cineminha, que
deverão conter: o nome do cineminha (por exemplo,
“Cineminha São Luiz”), o nome do filme do dia, o
horário do filme e a data. Além disso as crianças
poderão enfeitar as entradas com desenhos.
Uma das crianças será o bilheteiro, ficando
encarregada de “vender” os ingressos e de recolhê-
los novamente à entrada do cineminha. O
“dinheirinho”, confeccionado também previamente,
será distribuído às crianças e às mães (ou
acompanhantes) antes do bilheteiro iniciar as
vendas, para que, no momento em que receberem o
bilhete, automaticamente “paguem” o bilheteiro.
Após essa etapa, o psicólogo deverá organizar as
crianças, sempre com ajuda da equipe de
enfermagem, para subirem ao auditório do hospital,
onde se encontra uma grande televisão e o
vídeocassete. Vale lembrar que, antes de tudo, é
preciso consultar os médicos para verificar se
alguma criança encontra-se impossibilitada de
participar da atividade, já que ela exige que as
crianças subam alguns andares de elevador e
permaneçam um certo tempo fora da enfermaria.
A locomoção para o local do filme deve começar um
bom tempo antes do horário marcado, pois muitas
crianças vão com soro, bomba de infusão de
quimioterapia, exigindo cuidado e ajuda dos adultos.
As mães também participam da atividade e podem
ajudar os profissionais.
Quando todas as crianças estiverem acomodadas, o
filme terá início e, ao seu término, o psicólogo
solicitará que as crianças digam do que mais
gostaram no filme e do que não gostaram. É
importante buscar a mensagem da história com o
grupo. Observar a reação das crianças durante o
filme também pode oferecer dados ao psicólogo
quanto à fragilidade, tolerância a frustração,
identificação com personagens, medos, etc.
Posteriormente ao dia do filme, a história pode
continuar a ser explorada (caso valha a pena) com
dramatização, por exemplo, a fim de fortalecer a
mensagem, dar margem a fantasias e propiciar
condições de elaboração de medos, polaridades,
etc.

Resultados: os resultados obtidos a partir desta estratégia são


bastante valiosos. Ao sair da rotina interna da
enfermaria e participar da atividade que lhe
reaproxima da vida e das coisas que costumava
fazer antes do adoecer, a criança pode descontrair-
se e fortalecer-se criando melhores condições para o
enfrentamento da situação.
As histórias podem exercer efeitos positivos, a partir
do momento que nelas as crianças podem projetar
suas fantasias, medos, desejos ou angústias. Em
crianças cujos efeitos físicos da doença e tratamento
alteram a imagem corporal, histórias com
transformações físicas no enredo podem propiciar
identificação e possibilidades de elaboração da
questão.
Mensagens finais incluindo polaridades como o bem
e o mal, também exercem efeitos positivos sobre a
criança doente que vive ambivalências em relação
ao tratamento (cura mas maltrata), hospitalização e
equipe de saúde.

TRENZINHO

Definição: estratégia criada por Chiattone, 1988 e utilizada como rotina na


enfermaria pediátrica do Hospital Brigadeiro, São Paulo.

Objetivos:

 Facilitar a apropriação e entendimento da necessidade de permanência


no hospital;
 Facilitar a integração das crianças e transmitir noção de grupo;
 Propiciar o reconhecimento da equipe de saúde como aliados no
tratamento;

Recursos materiais:
 Cartolina (para o trenzinho);
 Revistas;
 Cola;
 Tesoura;
 Caneta hidrocor;
 Fita crepe.

Procedimento: após reunir as crianças na sala de recreação, o


psicólogo solicitará à cada integrante do grupo que
apresente-se aos demais dizendo nome, idade e
motivo da internação. A atividade iniciará com a
confecção do trenzinho, sendo que cada criança
poderá construir um vagão e ao final o todo será
montado no mural da sala.
Em seguida, as crianças deverão recortar das
revistas, figuras que possam ser utilizadas como
fotografia de cada uma. Os membros da equipe
também podem ser passageiros do trem caso as
crianças queiram incluí-los e recortem figuras
referentes aos mesmos.
As “fotografias” deverão ser fixadas nos vagões do
trem para que a viagem pela “estação Brigadeiro” se
inicie. O psicólogo contará a história do trenzinho, da
viagem pelo hospital Brigadeiro, da possibilidade de
ir e voltar, de entrar ou descer do trem após a alta,
da participação efetiva de todos a cada viagem.
No dia da alta, o próprio paciente poderá retirar sua
“fotografia” do trem, pois sua viagem terá terminado.
DESAFIOS

Definição: estratégia utilizada como rotina na enfermaria pediátrica do


Hospital Brigadeiro, São Paulo. Pressupõe técnica projetiva.

Objetivos:
 possibilitar a expressão de angústias e medos diante da situação de
doença, tratamento e hospitalização;
 minimizar as fantasias e falsos conceitos em relação a situação (doença,
tratamento e hospitalização);
 estimular a participação mais ativa no processo de doença e tratamento;
 reforçar a capacidade de enfrentamento;
 estimular a busca de soluções frente as dificuldades inerentes a
situação;
 integração entre as crianças.

Recursos materiais:
 desenhos com desafios;
 lápis de cor ou giz de cera.

Procedimento: os desafios tratam-se de desenhos seguidos por


alguma frase desafiadora cujo conteúdo seja
relacionado a situação vivida pelos pacientes (por
exemplo: no de senho de um coelho doente tomando
soro, o desafio pode ser “como ele está se sentindo
e o que acontecerá com ele”?).
Após reunir as crianças na sala de recreação, o
psicólogo deverá solicitar que cada uma se
apresente às demais dizendo nome, idade e o
motivo da internação. A atividade poderá ser com
dinâmica coletiva ou individual dependendo da
demanda e característica dos membros do grupo. No
caso da coletiva, as crianças receberão desafios
iguais e após colorir o desenho deverão montar uma
história coletiva frente ao desafio. Se for individual,
as crianças receberão desafios diferentes e após
colorir cada uma enfrentará o desafio, achando uma
solução e completando a situação com uma história.
Em ambos os casos, as histórias serão lidas para o
grupo e os desafios serão discutidos.

Resultados: é eficaz para todas as crianças doentes e


hospitalizadas que, muitas vezes, necessitam de
estimulação e de auxílio do externo para encontrar
recursos para o enfrentamento da situação.
Através dos desafios, podem projetar os sentimentos
em torno da vivência atual, buscam soluções para o
enfrentamento das dificuldades e tem possibilidades
de elaborar sentimentos conflituosos.

DESENHO LIVRE

Definição: estratégia utilizada como rotina nas enfermarias e unidades


pediátricas Pressupõe técnica projetiva.

Objetivos:
 externar através do desenho seus sentimentos e serem ajudadas, por
meio de projeção, na elaboração dos mesmos (culpa, agressividade,
saudades da família, fantasias e medos), de maneira livre, não dirigida;
 desenvolver criatividade e habilidades gráficas interrompidas e
bloqueadas pelas limitações inerentes à condição de doença e
hospitalização;
 oferecer ao psicólogo subsídios para identificar conteúdos internos da
criança através da análise do grafismo e do conteúdo projetivo do
desenho.

Recursos materiais:
 papel sulfite, cartolina ou papel pardo (coletivo);
 giz de cera, lápis de cor, tinta guache ou pintura a dedo;
 fita crepe.

Procedimento: o psicólogo deverá reunir as crianças na sala de


recreação e solicitar que cada uma se apresente às
demais dizendo nome, idade e o motivo da
internação. Em seguida, distribuirá folhas de papel
sulfite individuais ou um papel coletivo juntamente
com giz de cera para as crianças desenharem
livremente o que quiserem.
Essa atividade pode ser realizada com pintura a
dedo, massinha, colagem, etc., desde que seja livre
e que o psicólogo tenha objetivos a alcançar.
Ao final, cada criança contará ao grupo sobre seu
desenho e poderá falar o que achou e como se
sentiu durante a atividade. Os trabalhos poderão
ficar expostos na parede da sala de recreação por
alguns dias.
DESENHO DIRIGIDO

Definição: estratégia utilizada de rotina. Pressupõe a utilização de desenhos


prontos (modelos), com temas específicos da situação de doença
e hospitalização (coelhinho tomando soro, gatinho sendo
examinado por médico, etc)

Objetivos:
 externalização de sentimentos por meio de projeção;
 favorecer a elaboração ou minimização dos sentimentos (culpa,
agressividade, saudades de casa, medos, etc.);
 oferecer ao psicólogo subsídios para identificar conteúdos internos da
criança através da análise do grafismo e do conteúdo projetivo do
desenho.

Recursos materiais:
 papel individual ou coletivo;
 giz de cera, lápis de cor ou caneta hidrocor;
 fita crepe.

Procedimento: na sala de recreação, cada criança deverá


apresentar-se aos demais integrantes do grupo
dizendo nome, idade e o motivo da internação. Em
seguida, o psicólogo distribuirá giz de cera e papéis
individuais ou coletivos e, com base em um tema
pré-determinado (que pode ser algum fato ocorrido
na enfermaria, a casa e família das crianças, a
situação de doença, a vida fora do hospital, algum
livro lido pelo grupo, o que gostariam de estar
fazendo no momento, etc.) solicitará que as crianças
executem um desenho.
Ao final, cada criança deverá falar sobre seu
desenho ao grupo e, para finalizar, poderá ser
solicitado que digam o que acharam da atividade, o
que sentiram em relação à ela e os desenhos
poderão ficar expostos na parede da sala.

O BRINCAR COMO FORMA DE COMUNICAÇÃO DA CRIANÇA DOENTE E


HOSPITALIZADA

Heloisa Benevides de Carvalho Chiattone – Hospital Brigadeiro e HSPM

"Quando se interna uma criança, o Hospital tem que assumir tarefas que

vão além da função curativa, tarefas que devem cumprir-se de maneira tal que

o ritmo de vida e de crescimento possa continuar. A forma normal de vida da

criança implica sua relação com outras crianças, com os adultos, com o brincar

e com a aprendizagem. Estas relações devem unir-se, habilmente, dentro de

um dia pleno de procedimentos diagnósticos e terapêuticos. A ameaça da

doença em si, as condutas terapêuticas e a provável proximidade da morte,

complicam a tarefa" (Plank, 1966:13)

Daí a importância do "brincar" no hospital, constituindo-se como a


principal forma de comunicação da criança doente e hospitalizada.
Isto porque o brincar é parte integrante da vida das crianças e através
do brincar, as crianças desenvolvem: seu entendimento de mundo exercitando
sua competência para interagir nesse mundo.
Na brincadeira , a criança pode representar através de um objeto, algo
que não seja exatamente o objeto que possui, remetendo a uma situação ou
evento particular. Através das brincadeiras simbólicas, as crianças podem se
apropriar de seu mundo interior, de seus sentimentos, desejos, temores,
revivendo acontecimentos de sua vida diária e assim buscando entender e
arranjar formas de lidar com as situações que lhe angustiam. A função
simbólica e as representações mentais desempenham função de grande
importância na vida mental, no desenvolvimento e adaptação da criança ao
mundo em que vive.

Winnicott (1985) esclarece que a brincadeira não é apenas a


oportunidade de obter prazer, ela possibilita que a criança expresse seus
sentimentos. As crianças brincam para dominar suas angústias, as quais
muitas vezes podem ser um fator dominante nas brincadeiras. Assim como um
adulto desenvolve sua personalidade através de suas experiências de vida, o
mesmo acontece com as crianças no momento do brincar. Ela adquire
experiência brincando, amplia sua capacidade criadora. Além disso, a
brincadeira fornece uma organização para a iniciação de relações emocionais
e, assim, proporciona o desenvolvimento de contatos sociais.

Enquanto a criança "brinca", provoca situações nas quais pode lidar de


maneira positiva com ansiedades e incertezas, buscando controlar a realidade.
Através da repetição de eventos ameaçadores (como a vivência da
hospitalização), as crianças podem transformar-se em agentes ativos com
sentimentos de controle. Assim, o brincar também é um processo de controle
onde o resultado é a capacidade.
No brinquedo a criança buscará a satisfação substitutiva de seus
desejos e graças ao mecanismo de projeção, o brincar permitirá aliviar, através
da personificação, a carga de angústia suscitada pelo conflito intrapsíquico. A
projeção destes conflitos e da angústia que os acompanha sobre a realidade
exterior representada no brincar, possibilita à criança, um melhor domínio desta
realidade e um apaziguamento da angústia interna.
Assim, através do brincar, a criança consegue tornar emergente estas
fantasias, utilizando objetos suficientemente afastados do conflito primitivo e
que cumprem o papel de mediadores, apelando para as suas possibilidades de
elaboração secundária para expressar a fantasia. Nessa medida, quanto mais
elementos a criança lançar mão para expressar seu mundo interno, estará
revelando maiores possibilidades egóicas, no sentido de refletir na realidade
uma série de significados adquiridos, mediante um processo de capacitação
para simbolizar.

Enquanto brinca, as crianças podem então, "brincar com" seus


problemas. Nesse sentido, o brincar é uma forma de derivar significados, onde
a partir das interações ambientais, configura-se como uma estratégia
persistente que a criança utiliza para compreender o desconhecido.

Através do brinquedo, a criança tem a possibilidade de: experienciar,


tomar consciência, descobrir alternativas e assimilar vivências, auxiliando-a na
elaboração do processo de doença e hospitalização.
Além disso ao "brincar", a criança doente pode:

 Recuperar capacidades
 Desenvolver senso de controle
 Exercitar a flexibilidade e espontaneidade
 Reparar frustrações
 Exercitar mecanismos de adaptação ao desconhecido
 Melhorar seu desempenho
 Recuperar capacidade de diversão
 Recuperar motivação e volição

Em sua essência, o brincar ajuda a criança doente e hospitalizada a


recuperar seu equilíbrio, descobrir e utilizar alternativas, minimizando o impacto
psicológico gerado pela instalação da doença, a limitação de atividades e a
perda da autonomia, inerentes à hospitalização.
O brincar no hospital, auxilia as crianças doentes a sentirem-se mais
fortes, plenas de que possuem escolhas, mesmo na situação de doença.
Assim, “é primordial que as crianças doentes e hospitalizadas possam
participar nas enfermarias pediátricas de atividades lúdicas programadas,
dirigidas por profissionais de saúde mental – psicólogos ou psiquiatras –, pois
através do brinquedo as crianças podem experimentar sua nova forma de ser”
(Chiattone, 1996: 103).

“Naturalmente, brincar é a forma de autoterapia da criança e esta


atividade pode se transformar em um excelente instrumento preventivo,
diagnóstico, prognóstico e terapêutico a crianças na situação de doença, pois
experienciando, tomando consciência ou descobrindo através do brinquedo a
criança pode formular e assimilar o que experiencia, facilitando a
internalização, o amadurecimento e a elaboração do processo de doença e
hospitalização” (Chiattone, 1996: 103).

“Portanto, deve-se buscar nas atividades o fortalecimento de auto-estima


e autoconceito, criando oportunidades para que a criança possa retomar seu
equilíbrio psíquico, pois ao recuperá-lo pode explorar e descobrir alternativas
na situação de doença. A meta, assim, é ajudá-la a tomar consciência de si
mesma, de sua existência no mundo e de sua situação de doença e
hospitalização, reconstruindo seu senso de eu, fortalecendo suas funções de
contato e renovando o contato com seus sentidos e sentimentos. Ao fazer isso,
pode-se redirigir a criança para a percepção mais saudável das funções de
contato que lhe restam e em direção a comportamentos mais satisfatórios”
(Chiattone, 1996:103).

Embora o atendimento individual seja eficaz e muitas vezes necessário,


em associação a ele, as técnicas de psicoterapia de grupo têm ganho cada vez
mais adeptos por apresentar a vantagem operacional de atender um maior
número de pacientes com o mesmo número de profissionais. Além disso, os
grupos apresentam a vantagem de constituir-se em um espaço no qual o
comportamento presente pode ser experienciado e novos comportamentos
experimentados.

Além do alto custo dos serviços individuais, no caso da atuação com


crianças internadas, a psicoterapia de grupo parece compatível com as
necessidades dessa faixa etária, pela alta demanda de pacientes internados,
pelos efeitos da limitação de atividades e estimulação durante a internação
hospitalar, pela necessidade de adaptar o ambiente hospitalar às necessidades
das crianças (enfermaria pediátrica com sala de recreação) e pela necessidade
de atenção específica a essa faixa etária.

Quando nada impede a criança de sair do leito e de interagir com outras


pessoas, a participação no grupo terapêutico mostra-se muito vantajosa. As
vantagens dos procedimentos realizados em grupo podem ser amplamente
descritas:

 na situação de grupo, as crianças podem vivenciar experiências


semelhantes às de seu dia-a-dia e, com isso, podem generalizar com
maior rapidez os seus ganhos;

 em grupo, a criança pode entrar em contato com um maior número de


situações problema e visualizar saídas mais condizentes, aumentando
seu repertório de respostas positivas pois os membros do grupo são
modelos mais eficazes;

 o grupo é importante fator de esperança para a criança pois, ao observar


diretamente outros membros que apresentam melhora evidente, a
criança pode sentir-se com esperança quanto à sua própria melhora;

 o grupo exerce uma intensa sensação de universalidade. Especialmente


no estágio inicial, as crianças costumam experimentar intenso alívio ao
perceber que não estão sozinhas com seus problemas. Essa
constatação estimula a auto-revelação, a motivação para continuar
enfrentando a situação;

 na terapia de grupo, as crianças podem beneficiar-se da observação do


processo terapêutico de outra criança com problemas similares,
ocorrendo a aprendizagem por substituição, através do comportamento
imitativo;
 outro aspecto inerente à terapia de grupo é a coesão. Refere-se à
atração que os membros do grupo têm entre si e pelo grupo. Os
membros de um grupo coeso aceitam-se uns aos outros, oferecem
apoio e estão constantemente inclinados a fornecer relacionamentos
significativos, pois se encontram mais inclinados a se expressar e a
explorar seus próprios comportamentos, conscientizando-se e
integrando aspectos até então inaceitáveis de si mesmos;

 em grupo, a intervenção terapêutica a crianças pode ser imediata, pelo


alívio da angústia aguda;

 a economia de tempo e de custo são evidentes e indiscutíveis.

Portanto, a prática de grupos terapêuticos no Hospital, operativos ou de


encontro, sempre baseados em uma tarefa, parece ser muito eficaz e frutífera
ao responder às necessidades ou capacidades eletivas dos pacientes. Em
grupo, as crianças conseguem comunicar-se melhor, tanto através da
linguagem verbal quanto por meio de uma linguagem simbólica,
proporcionando ao psicólogo a possibilidade de observar seu comportamento,
interpretando o significado de seus jogos e de suas interações, enquanto
doentes e internadas.
“A troca recíproca de pensamentos e sentimentos entre os membros do
grupo revela-se vantajosa na medida em que eles se apercebem que outras
pessoas semelhantes vivenciam as mesmas angústias, dificuldades, dúvidas e
deixam de se sentir únicos nessa jornada permeada de conflitos e incertezas.
Aprender que seus problemas não são únicos e que podem ser compartilhados
com demais pessoas pode promover uma troca mais rápida de informações.
Isso geralmente não ocorre de forma tão eficiente na terapia individual, visto
que a rebeldia silenciosa impede o progresso e a eficácia do processo
terapêutico” (Gonçalves, 1998:48).
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