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Assim como Engels, o filósofo da Escola de Frankfurt percebe que, com as revoluções
industriais e técnicas, a classe trabalhadora foi ampliada e, internamente, dividida. Em geral,
de um lado estão os trabalhadores mais especializados e integrados no modo de manutenção
da produção capitalista – a estes, Engels chamou “aristocracia operária” (LESSA, 2014, p. 20
apud MENEZES; SILVA, 2022, p. 101) –, do outro, estão os trabalhadores não qualificados,
aqueles que estão na linha de frente do trabalho bruto. Desse modo, a classe trabalhadora,
dividida e alienada pelo desejo de consumo baseado em pseudonecessidades, torna-se aliada
da burguesia, nesse caso, dos controladores do grande capital, os quais veem a promoção da
justiça social meramente como um meio de evitar revoluções e manter a ordem de produção.
Assim, Menezes e Silva apresentam três elementos constituintes do processo de alienação da
ação do sujeito revolucionário: a criação de cargos executivos com salários consideráveis e
gradativos; os grandes investimentos na promoção de uma cultura de consumo que satisfaça
demandas criadas pela sociedade capitalista; a educação para a conformação das novas
gerações dos países em desenvolvimento aos padrões em vigência (2022, p.103).
A prática desses princípios é atribuída ao Estado, o qual, não sendo uma entidade
fechada em si mesma, geralmente, obedece ao ritmos do grande capital. Consequentemente, a
manutenção do Estado equivale à permanência do capital. No entanto, adverte os autores, o
estado moderno possui a particularidade de tentar não seguir essa circularidade, integrando os
interesses trabalhistas na gestão de políticas públicas, provocando o fenômeno que Marcuse
chamou de mais-repressão, ou seja, o peso da elite capitalista, utilizando-se até mesmo do
aparato do Estado, reprimindo movimentos organizados de revolução, o que redunda, na
maioria das vezes, na cedência do Estado aos interesses de quem movimenta o mercado
financeiro e na dissolução do sujeito revolucionário. Desse modo, assevera Marcuse,
implanta-se a unidimensionalidade, ou seja, não há espaço para a mudança social, mas apenas
meros ajustes no interior da ordem social capitalista, o que inviabiliza a superação de uma tal
sociedade pela implantação de uma democracia de tipo socialista, uma sociedade
qualitativamente distinta da vigente.
Como podemos ver, Marcuse toma para si o projeto do Manifesto Comunista (1848)
de Marx e Engels. O pensador considera-o como ainda não decididamente implantado em
nenhuma parte do mundo, mas perseguido em suas tentativas de efetivação, gerando governos
de elevada estatização e burocratização, além de isolados e com a população oprimida pela
falta de artigos básicos e com altos investimentos bélicos, como, por exemplo, o socialismo
soviético, que ele considera como insuficiente para o processo de humanização. Em outras
palavras, Marcuse considera que o socialismo é ainda uma alternativa para uma sociedade
qualitativamente distinta da capitalista, uma vez que a sua ideia de socialismo consiste na
autoafirmação das liberdades individuais e na promoção da equidade como indispensável para
a humanização da sociedade. Nessa mesma linha, ele defende uma nova sensibilidade, uma
espécie de renovação do sentido desgastado pela destruição, competitividade e centramento
das relações no lucro e no desenvolvimento financeiro, o que gera a introjeção de valores
apregoados como necessários e, consequentemente, comportamentos doentios podem ser
considerados, facilmente, como “normais”.
Por fim, Menezes e Silva interpretam que o filósofo, diante dos dois âmbitos da
reflexão, o teórico e o prático, pode ou desenvolver sua reflexão somente no primeiro ou,
como Marcuse e outros, tornar ambos um mesmo plano sob uma perspectiva política (2022, p.
114). Independentemente de qual procedimento for adotado, a atividade filosófica é
considerada fundamental, uma vez que ou desenvolve as teorias, atualizando-as com novos
dados e construindo uma nova aplicação conforme as demandas hodiernas, ou possibilita
meios práticos, válidos e humanitários, de como proceder para a transformação da sociedade.
De um modo geral, tanto em um quanto em outro caso, o filósofo deve estar totalmente
comprometido com o processo de humanização das relações em sociedade sem que se possa
distinguir o ambiente vivencial, social, onde se desenrolam as atividades políticas e
econômicas entre os indivíduos, do ambiente natural, sem considerá-lo mais uma mera
reserva energética a ser utilizada em favor da produção, do capital e da manutenção de um
estilo de vida consumista falsamente necessário para a realização do ser humano.