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não conhece as transformações intimas que fariam dele uma verifica da unicidade c da sua significação genérica no
per- se sua
sonalidade individualizada e que, por conseguinte, dissolveriam plano humano, quer sob o ponto de vista do intemporal, quer
as suas dimensões tipicas. Ora, a
personagem desenhada é quase sob o ponto de vista da historicidade. Julien Sorel é uma perso-
sempre uma personagem-tipo. Não provoca nenhuma surprèsa, nagem modelada, conmplexa, dinâmica, contraditória, mas alia
por exemplo, o facto de, n'Os Maias, Dâmaso assinar uma carta à sua unicidade elementos típicos que se afirmam claramente,
que João da Ega Ihe dita e na qual aquele se declara um ébrio por exemplo, nas palavras que proferiu no tribunal que havia
habitual, pois tal reacção coaduna-se perfeitamente com o que de o condenar à morte: os jurados «quereräo castigar em mim
o leitor conhece do bochechudo e balofo Dâmaso Salcede. e desencorajar para sempre certa espécie de jovens que, nascidos
As personagens planas são extremamente cómodas para o uma classe inferior e, por assim dizer, oprimidos pela pobreza,
romancista, visto que basta caracterizá-las apenas uma vez, têm a felicidade de se proporcionar uma boa educação, e a
aquando da sua introdução no romance, não sendo necessário audácia de se intrometer com o que o orgulho das pessoas ricas
cuidar atentamente do seu desenvolvimento ulterior. Semelbantes chama a sociedade». A personagem modelada, em suma, poderia
exclamar como Baudelaire, no seu poema Au lecteur: «Hypo-
personagens estão particularmente indicadas para o papel de
crite lecteur,- mon semblable,-mon frèreb. *
comparsas.
As personagens modeladas, pelo contrário, oferecem uma
complexidade muito acentuada e o romancista tem de con-
lhes ( - 0 romancs. como.toda.a nartativa, svocasum mundo
concebido como real, material.e.spiritual, sitado. mum espaco
sagrar uma atenção vigilante, esforçando-se por caracterizá-las
sob diversos aspectos. Ao traço úico próprio das personagens determinado, num tempo determinados refilectida.nadamaiorie
poesi,
planas, corresponde a multiplicidade de traços peculiar das per- das vçzesnum.espírito.determinado.que,diferentemente
do
sonagens redondas. As personagens de Dickens, de contornos anto.pode ser.o de.uma ou de yárias.peISonagens.como.o
conexão estreita
simples, embora extremamente vigorosos, opöem-se as persona- narrador».(01) Nesse tempo e nesse espaço, em
da natureza e dos caracteres técnicos desse discurso. A diegese Benveniste designa como o prospectivo). Nesta enunciação, o
de um determinado romance nunca será exactamente igual à narrador não existe: «os acontecimentos apresentam-se como
diegese de um filme extraido desse romance, por grande que seja se produziram à medida que aparecem no horizonte da his
a fidelidade do realizador ao texto do romance, tal como a diegese tória» (71).
de um romance (digamos, Adolphe) haveria de se alterar se fosse o discurso pressupöe um locutor e um auditor e nele são
utilizadas todas as formas pessoais do verbo, tanto a primeira
possivel reescrevë-lo segundo uma técnica narrativa diferente e a segunda como a terceira-e no discurso, a terceira pessoa,
(por exemplo, Adolphe reescrito segundo técnicas do nouveau diferentemente do que acontece na história, opõe-se a uma pessoa
roman). todos os tempos verbais, com excepção do
As distinções que acabámos de mencionar apresentam afi- eu/tu, bem como
ao passo que os citados conceitos de intriga (Tomachevski e texto de Balzac que Benveniste apr esenta como paradigma da
outros formalistas ussos), narração (Ricardou), discurso (Todo- diversos sintagmas que denunciam
enunciaçãão histórica, ocorrem
rov), narrativa propriamente dita(Genette) e narração (Lefebve) indubitavelmente a presença do narrador (12). Enquanto, porém,
factores especificamente literários, de técnica nar- de enunciação
compreendem
benvenistiana de o discurso assimila sem dificuldade elementos permanecendo
rativa, que não so abrangidos pela noção histórica, a_história é.refractária ao discurso,
de muito fácil de reco
discurso. este no seu seio como «uma espécie quisto
Benveniste distingue dois-planos de enunciação:.o.plano nhecer e de localizar» (73).
histórica «carac-
da história e o plano do discurso. A enunciação encontrando-se
teriza a narrativa dos acontecimentos passados», 5.1-Tem-se desenvolvido vigorosamente, nos útimos anos,
forma "autobiográfica": «o historiador semiologia, que
excluída dela qualquer a chamada narratologia, disciplina integrada na
nunca dirá tu, nem aqui, nem agora, pois que jamais ele teoria geral do discurso narrativo (não
eu nem
procura elaborar uma
antes de
se servirá do aparelho formal do discurso, que
consiste
apenas literário, acentue-se bem). Entre os objectivos visados
tudo na relação de pessoa eu : tw(70). A enunciação histórica da narrativa nas suas
certos tempos pela narratologia, ayulta o da segmentaço têm
utiliza apenas formas da terceira pessoa e apenas unidadesfuncionais mínimas, as quais, segundo os autores,
incluindo a formna
recebido denominaçöes várias: funções, motivos,
verbais (em francês, o aoristo, o imperfeito, narremas,
do princípio da
suçessão cronológica de eventos. A admissão ou a rejeição fundamen-
causalidade, na vida real como na diegese romanesca, dependem
ideologia. Esta problemática
talmente de uma visão do mundo, isto é, de umaromance Ferreira:
de Vergílio
assim analisada pelo narrador de Nitido nulo,
«0princípio da causalidade. Não existe. Para pessoas não existe. Porque
Se não que o seja,
ima causa só é ceusa quando a gente quer que seja. num quer
o
sonagens, objectos
e aspectos vários do espaço
ou u m a síncope na sin-
pausa
tórico-sociológico, constitui
uma
no
Embora a descrição funcione sempre
1agmática narrativa. a verdade é que pode
romance como uma ancilla narrationis,
descrição uma isenta de elementos nar-
facilmente encontrar-se
senão impossível, existir
rativos, ao passo que é muito dificil,
um enunciado narrativo que
não ofereça, por mínimo que seja,
um conteúdo descritivo (75).
Adescrição.é.o. principal instrumento de que romancista
o
não sendo
dispõe para figuraro espaço.em que.decorre diegese,
a
existência. contemporâneo,.
O espaço tem adquirido grande relevância
no romance
R-4
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se ajeitara em ferral,
sem ser visto.
gelosia de forma a comodamente deixar ver
Devassava-se dali o longe e o perto, as abas
Ihudas de primavera do povo, farfa
[...]» (Aquilino Ribeiro, Andam faunos pelos
Lisboa, Bertrand, 1962, p. 16): bosques,
Chegou janela. A quinta parecia lavrada
à «Margarida acordou às oito horas. [..
à mostra. Os
cedros estavam por arados fantásticos, de relha
o cerne
vermelho com as fibras descabeçados, dois ou três
partidos, mostrando
nadavam ramos de faia inchadas de água, Aqui e
[...]» além, nos currais,
Lisboa, Bertrand, s.d., p. (Vitorino Nemésio, Mau no canal, 3.
29); «Em frente da mesa, tempo lá
ed.,
da janela aberta
para
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Antunes da Mota, noite, fez justamente quarenta e sete anos seis, pelas onze
do Porto,, estava em morador na rua dos que o snr. João
sua casa» Arménios, desta sempre leal cidade
dade7, 11. ed., (Camilo Castelo
Lisboa, Parceria A. M.
gidissimo dia de janeiro Branco, (Onde estáa felici-
de 1847, por volta Pereira, 1965,
das nove horas 23); «Em um fri-
p.
menegildo Fialho
Barrosas, brasileiro grado e
eterna, estava a suar, da manh, o sr.
Her
na rua das dos mais gordos da
dos srs. Flores, encostado ao cidade
Mourões» (id., Os balcão da
A. M.
Peeira, 1965, p. 33); brilhantes
«A casa
do ourivesaria
brasileiro, 8. ed., Lisboa,
que os Maias Paceria
vieram habitar em Lisbg