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ARTIGO ORIGINAL

Analise sensorial de sorvete de creme:


estudo comparativo
Sensory analysis of ice cream: a comparative study

Carine Pereira de Oliveira*, Simone Ruth Gomes*, Luciana Caldeira de Paula Ricardo, M.Sc.**

*Graduanda em Nutrição pela Faculdade de Saúde Ibituruna – FASI, Montes Claros/MG,


**Nutricionista, Docente da Faculdade de Saúde Ibituruna

Resumo
A Gordura Hidrogenada é considerada por vários autores a pior e mais nociva invenção no campo da alimentação já
realizada. Está diretamente relacionada com o risco de doenças cardiovasculares. Este trabalho visou avaliar a preferência de
dois tipos de sorvetes por universitários de uma faculdade particular de Montes Claros/MG. O estudo foi de caráter expe-
rimental e quantitativo, realizado com acadêmicos dos cursos da faculdade do período noturno, de ambos os gêneros, com
idade acima de 18 anos, regularmente matriculados. Os acadêmicos participaram do teste de preferência que se caracteriza na
escolha entre duas amostras da amostra preferida. Foram comparadas as receitas com e sem gordura hidrogenada ao mesmo
tempo. Dos 51 alunos participantes da analise sensorial, 30 (59%) preferiram o sorvete com gordura hidrogenada e 21 (41%)
preferiram o sorvete sem gordura hidrogenada. De acordo com a Tabela de Significância para o Teste Bicaudal, Pareado Pre-
ferência, para 51 julgadores seria necessária a preferência de 37 pessoas por uma das amostras para atingir um nível de 0,01%
de significância. Como não se obteve este número de julgamentos, conclui-se que os julgadores não encontraram diferença
significativa entre as amostras de sorvete de creme.

Palavras-chave: análise sensorial, sorvete, gordura hidrogenada.

Abstract
The hydrogenated fat is considered by several authors the worst and most damaging invention in the field of nutrition
ever conducted. This fat is directly related to the risk of cardiovascular disease. This study aimed to evaluate the preference of
two types of ice cream in a private college university of Montes Claros/MG. The study was experimental and quantitative,
performed with academic students in, both genders, > 18 years old. The students participated in the preference test that
characterizes the choice between two samples. Recipes were compared with and without hydrogenated fat simultaneously. Of
the 51 students participating in the sensory analysis, 30 (59%) preferred the ice cream with hydrogenated fat and 21 (41%)
preferred the ice cream without hydrogenated fat. According to Table significance for two tailed, paired preference, would be
required for 51 judges the preference of 37 people for a sample to reach a level of significance of 0.01%. AS we do not get
this number of answers, we concluded that the judges did not find significant difference between the samples of ice cream.

Key-words: sensory analysis, ice cream, hydrogenated fat.

Recebido 9 de junho de 2014; aceito 15 de agosto de 2015


Endereço para correspondência: Carine Pereira de Oliveira, Rua Euclides Fernandes de Andrade, 65B Vila Mauriceia
Montes Claros MG, E-mail: carineoliveira.nutricionista@hotmail.com, simone_ruth@hotmail.com, lucianaricardo@gmail.com
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Introdução organismo do que o próprio colesterol e as gorduras


animais saturadas [6].
Existem várias teorias sobre o surgimento do Em alguns países europeus e na América do
sorvete. Entre elas pode-se citar o primeiro relato Norte, têm sido observadas diminuições no conteúdo
sobre o sorvete, que data de mais de três mil anos de ácidos graxos trans (AGT) na dieta devidas, pro-
atrás, e tem sua origem no Oriente, quando os chine- vavelmente, às modificações nas gorduras disponíveis
ses costumavam misturar frutas à neve. Já na Europa comercialmente ou por mudanças nas escolhas dos
em tempos medievais, sabe-se que gelo e neve eram consumidores [7].
usados para resfriar e congelar sobremesas. O Impe- A quebra de gordura durante o preparo do sor-
rador Nero, há cerca de 1900 anos atrás, mandava vete onde a homogeneização da mistura reduzirá o
seus escravos às montanhas em busca de neve, que tamanho dos glóbulos de gordura da emulsão é vital
era utilizada para o congelamento do mel, polpa de para que este adquira uma boa estrutura, no entanto
frutas ou sucos [1]. essa gordura não é considerada saudável [2].
O sorvete é fabricado a partir de uma emulsão Para identificar as características dos alimen-
estabilizada, também chamada de calda, pasteurizada tos, a avaliação sensorial surge como um método de
que através de um processo de congelamento sob verificação da aceitação pelos consumidores e é uma
agitação contínua e incorporação de ar produz uma analise critica para o desenvolvimento do produto
substancia cremosa, suave e agradável ao paladar. [2]. Esse método de avaliação permite qualificar uma
Esta emulsão é composta de produtos lácteos, água, propriedade de um produto perceptível pelos órgãos
gordura, açúcar, estabilizante, emulsificante, corante dos sentidos [8].
e aromatizante, além de ser boa fonte de vitaminas Neste contexto esta pesquisa justifica-se na preo-
A, B1, B2, B6, C, D, E e K, cálcio, fósforo e outros cupação em se ter uma alimentação saudável, e junto
minerais. É considerado um alimento completo e de com esta preocupação cresce também a necessidade de
alto valor nutricional. O sorvete ideal deve apresentar desenvolvimento de novas tecnologias para a criação
características próprias como textura macia, sabor de produtos menos nocivos à saúde [9].
típico, delicado e agradável [2]. Este trabalho teve como objetivo avaliar a
Um dos ingredientes envolvidos no processo de preferência dos dois tipos de sorvetes de creme por
fabricação do sorvete é a gordura hidrogenada. O pro- universitários de uma faculdade particular de Montes
cesso de hidrogenação, na qual o produto é denomi- Claros/MG.
nado gordura vegetal hidrogenada, teve a sua primeira
aplicação industrial em 1903 com a preparação de Material e métodos
gorduras a partir de óleo de baleia. A partir da década
de 30 houve um aumento na sua produção, o que O delineamento do presente estudo teve ca-
resultou no maior consumo de margarinas e gordura ráter experimental e quantitativo. A população foi
hidrogenada durante a Segunda Guerra Mundial [3]. composta por acadêmicos dos cursos de uma facul-
No Brasil a produção de gordura vegetal hi- dade particular de Montes Claros/MG, do período
drogenada começou por volta de 1960, desde então noturno, de ambos os gêneros, com idade acima de
a indústria nacional de gordura hidrogenada vem se 18 anos, regularmente matriculados. Os acadêmicos
direcionando para o desenvolvimento de produtos foram convidados nas dependências da faculdade para
com características especificas que atendessem às neces- participarem da pesquisa. Foram excluídos do projeto
sidades da indústria de alimentos não se preocupando os acadêmicos que se negaram a participar da análise
muito com a produção de produtos com baixos níveis sensorial, acadêmicos que não gostam de sorvete e
dessa gordura [3]. Um estudo realizado por Mensink e acadêmicos que apresentaram intolerância ou alergia
Katan [4] despertou a atenção para a investigação dos a algum ingrediente dos sorvetes.
efeitos adversos da gordura hidrogenada, mostrando Àqueles que se dispusera a participar foi entregue
que esta aumentava os níveis de lipoproteína de baixa para conhecimento e assinatura o termo de Consenti-
densidade (LDL), considerada o mau colesterol, de mento livre e Esclarecido (TCLE) para participação em
maneira parecida aos ácidos graxos saturados [5]. pesquisa. Essa pesquisa foi aprovada junto ao Comitê
A gordura trans é um tipo específico de gordura de Ética e Pesquisa da Associação Educativa do Brasil/
formada pelo processo de hidrogenação, o qual é usa- SOEBRAS, sob o CAAE nº. 07944312.0.0000.5141.
do para transformar óleos líquidos em gorduras mais As acadêmicas informaram os ingredientes
plásticas para fabricação de margarinas e gorduras presentes nos dois sorvetes para que os estudantes
em geral. Pesquisas recentes mostram que esse tipo que apresentassem intolerância ou alergia a algum
de gordura provoca efeitos mais prejudiciais ao nosso ingrediente não participassem da pesquisa. Após a
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assinatura do TCLE uma cópia foi devolvida para as O Gráfico 1 mostra a preferência dos provadores
acadêmicas responsáveis pelo estudo e, os acadêmicos em relação ao sorvete. Dos 51 alunos participantes da
participantes foram encaminhados ao laboratório de analise sensorial, 30 (51%) preferiram o sorvete com
técnica dietética da faculdade. gordura hidrogenada e 21 (49%) preferiram o sorvete
O teste de preferência se caracterizou na escolha sem gordura hidrogenada.
entre duas amostras da amostra preferida. Foram
comparadas as receitas com e sem gordura hidrogena- Gráfico 1 - Escolha dos provadores participantes do
da ao mesmo tempo. A análise sensorial foi realizada teste de preferência de sorvete de creme em uma
em cabines individuais. Os provadores receberam em Faculdade particular de Montes Claros/MG 2012.
uma bandeja dois recipientes iguais marcados um com 51%
número de três números escolhidos aleatoriamente 51%
com aproximadamente 20 g de cada preparação. Na 50%
bandeja com as preparações foi oferecida água filtra- 51% 51%
da para a limpeza das papilas gustativas. O sorvete
49%
foi preparado na Sorveteria Bem Família situada há
49% 49%
Avenida Leonel Beirão no bairro Doutor João Alves,
em Montes Claros/MG. 48%
Caso algum acadêmico participante da pesquisa Sorvete com gordura Sorvete sem gordura
hidrogenada hidrogenada
apresentasse alguma reação decorrente do consumo
dos sorvetes seria acionado o Serviço de Atendimento
Móvel de Urgência (SAMU). De acordo com a Tabela de Significância para
Após a análise sensorial os dados foram tabulados o Teste Bicaudal, Pareado Preferência, para 51 julga-
utilizando o Excel. Para análise dos dados de análise dores seria necessária a preferência de 37 pessoas por
sensorial foi utilizada a tabela de significância no teste uma das amostras para atingir um nível de 0,01% de
pareado. Como não se sabia qual seria a amostra mais significância.
preferida foi utilizado o Teste Bicaudal de preferência Os participantes da pesquisa relataram ainda
[10]. que o sorvete sem gordura hidrogenada apresentava-se
mais cremoso e saboroso em relação ao sorvete com
Resultados e discussão gordura hidrogenada.

A população do estudo constituiu-se de uma Conclusão


amostra de 51 provadores, não treinados, estudantes
do ensino superior regularmente matriculados, entre Como não se obteve este número de julgamen-
19 e 33 anos, que gostavam de sorvete de creme, e que tos, conclui-se que os julgadores não encontraram
não apresentavam nenhuma alergia ou intolerância a diferença significativa entre as amostras de sorvete
nenhum ingrediente dos sorvetes. O teste utilizado foi de creme com gordura hidrogenada e sem gordura
o de preferência e a ficha da análise está apresentada hidrogenada, indicando não haver estatisticamente
na Figura 1. uma amostra preferida.
Desta forma, a indústria de sorvetes poderia
Figura 1 - Ficha de analise sensorial do teste de investir no desenvolvimento de sorvetes sem gordura
preferência de sorvete de creme em uma faculdade hidrogenada como o objetivo de oferecer à população
particular de Montes Claros/MG 2012. um sorvete mais saudável.
Comparação pareada
Nome:__________________________Data:___/___/____ Agradecimentos
Idade:___________
Por favor, prove as amostras da esquerda para a direita. Agradecemos as Faculdades Unidas do Norte de
Circule o código da amostra de sua preferência em Minas (FUNORTE), por nos ceder o Laboratório de
cada linha. Lave as papilas entre as avaliações e espere Técnica e Dietética para realização do experimento.
60 segundos.
_________ Referências
Comentários: ____________________________________
1. Associação Brasileira das Indústrias de Sorvete. [citado
_______________________________________________ 2012 jun 1]. Disponível em URL: http://www.abis.
____________________________________________ com.br/institucional_historia.html.
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2. Souza JCB, Costa MR, De Rensis CMVB, Sivieri K. 26]. Disponível em URL: http://www.insumos.com.
Ice cream: composition, processing and addition of br/aditivos_e_ingredientes/materias/86.
probiotic. Aliment Nutr 2010;21(1):155-65. 7. Craig-Schimidt M. World-wide consumption of trans
3. Ghotra BS, Dyal SD, Narine SS. Lipid shortenings: a fatty acids. Atherosclerosis Supplements 2006;7(2):1-4.
review. Food Res Inter 2002;35:1015-48. 8. Norma portuguesa 4263. Análise Sensorial- Vocabulá-
4. Mensink RP, Katan M.B. Effect of dietary trans fatty rio. IPQ, Lisboa; 1994.
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5. Martin CA, Matshushita M, Souza NE. Ácidos graxos (sem trans) e com gordura vegetal hidrogenada (com
trans: implicações nutricionais e fontes na dieta. Rev trans) 2007. [citado 2012 jun 28]. Disponível em URL:
Nutr 2004, jul/set 2004. http://www.pg.utfpr.edu.br/setal/docs/artigos/2007/
6. Aditivos & Ingredientes. Lipídios: hidrogenação, inte- comparacao_sorvete.
resterificação e fracionamento; 2006. [citado 2006 jun 10. Dutcosky SD. Análise sensorial de alimentos. Curitiba:
Champagnat; 2011.

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