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CENTRO UNIVERSITÁRIO FAMETRO

GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

ERIK VICTOR CAVALCANTE DE ALMEIDA

RELATÓRIO DE ESTÁGIO BÁSICO II

MANAUS – AM
2022
CENTRO UNIVERSITÁRIO FAMETRO
GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA

ERIK VICTOR CAVALCANTE DE ALMEIDA

RELATÓRIO DE ESTÁGIO BÁSICO II

Relatório de estágio apresentado ao centro


universitário FAMETRO para a obtenção de nota
institucional, orientado pela profª Carla Cristina de
Souza Dimarães, da disciplina de estágio básico II

MANAUS – AM
2022
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Fotografia 1 - Consultório Psicológico I .................................................................................... 8


Fotografia 2 - Consultório Psicológico II ................................................................................... 9
SUMÁRIO

1. DADOS DE IDENTIFICAÇÃO .............................................................................4


1.1. IDENTIFICAÇÃO DO LOCAL ...............................................................................4
1.2. IDENTIFICAÇÃO DO ESTAGIÁRIO ....................................................................4
1.3. DADOS DO SUPERVISOR LOCAL .....................................................................4
1.4. DADOS DA SUPERVISOR ACADÊMICO ...........................................................4
2. INTRODUÇÃO .....................................................................................................5
3. ATIVIDADES REALIZADAS ................................................................................6
3.1. ACOLHIMENTO PSICOSSOCIAL .......................................................................7
3.2. ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO ..............................................................14
3.3. ENCAMINHAMENTO À REDE DE APOIO ........................................................18
4. AUTOAVALIAÇÃO DO ACADÊMICO ..............................................................20
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................22
REFERÊNCIAS ...........................................................................................................23
ANEXO A – FICHA DE AVALIAÇÃO DO ESTAGIÁRIO ..........................................25
ANEXO B – DECLARAÇÃO DE HORAS DE ESTÁGIO CURRICULAR .................27
ANEXO C – DIÁRIO DE CAMPO DE REGISTRO DE ATIVIDADES ........................28
1. DADOS DE IDENTIFICAÇÃO

1.1. IDENTIFICAÇÃO DO LOCAL


Nome: Central Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA
Endereço: Rua Gabriel Gonçalves s/n – Centro
Cep: 69005-330
Telefone: (92) 9 8150-8717

1.2. IDENTIFICAÇÃO DO ESTAGIÁRIO


Nome: Erik Victor Cavalcante de Almeida.
Matrícula: 1902762
Turma: PSI201N01ZL
Período: 6º
Turno: Noturno
Telefone: (92) 9 9193-0274
E-mail: almeida.erikvictor@gmail.com

1.3. DADOS DO SUPERVISOR LOCAL


Nome do supervisor local: Raimundo Nonato dos Santos Mello
CRP do supervisor local: 20/06131
Telefone: (92) 9 9163-2382
E-mail:zinho1936@outlook.com

1.4. DADOS DA SUPERVISOR ACADÊMICO


Nome da supervisora acadêmica: Carla Dimarães
CRP da supervisora acadêmica: 20/1308
Telefone: (92) 9 8156-5659
E-mail: carlacsdimaraes@hotmail.com
Carga horária total: 220 horas
Carga do local: 154 horas
Carga horária de supervisão acadêmica: 66 horas
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2. INTRODUÇÃO

O estágio constitui uma etapa de grande valia na vida do acadêmico, pois trata-se de
uma oportunidade de coadunar aquele conteúdo teórico que foi desenvolvido em sala de aula
com a prática efetiva no local de estágio. Esse momento deve ser visto como uma possibilidade
de adentrar em áreas específicas de determinado campo de conhecimento. Na atuação como
estagiário, há um ganho positivo de saberes no que se refere à conduta profissional, ética e
questões teóricas imbricadas nas atividades realizadas.
O presente relatório de estágio foi desenvolvido a partir do entendimento da relevância
do estágio como um processo necessário para o bom desenvolvimento acadêmico e profissional.
Este relatório confere um conjunto de informações a respeito de como se deu as atividades
realizadas na Central Integrada de Acompanhamento do Alternativas Penais do Amazonas –
CIAPA, avaliando como foram desempenhadas, descrevendo-as com detalhes, tomando como
alicerce um referencial teórico para cada ação pertinente as tarefas do local de estágio.
A Central Integrada de Acompanhamento do Alternativas Penais do Amazonas –
CIAPA tem como seu princípio norteador a prática de justiça restaurativa e atua auxiliando na
redução do número de detentos provisórios nas unidades prisionais do Estado. Suas atividades
possuem grande valor, pois têm estrutura e alcance o suficiente para lidar com as
vulnerabilidades do público atendido, fornecendo atendimento social, psicológico, jurídico e
pedagógico, tendo como base para essas atividades a humanização, a promoção de liberdade,
autonomia e responsabilização por parte da pessoa em alternativa penal.
Objetivou-se com a experiência de estágio na Central Integrada de Acompanhamento
do Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA auxiliar no atendimento psicossocial oferecido
pela Central às pessoas em alternativas penais, atuando de forma orientativa, acolhedora e
propiciando a proteção social, bem como o fortalecimento dos laços familiares e sociais do
público-alvo. As atividades realizadas durante o estágio foram o acolhimento psicossocial e
aconselhamento psicológico. Ambas atividades estão descritas e explicadas, a partir de
exemplos retirados da própria prática, neste presente trabalho.
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3. ATIVIDADES REALIZADAS

De modo geral, as atividades desempenhadas na Central Integrada de Acompanhamento


de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA estão voltadas para o acolhimento,
acompanhamento e orientação por parte da equipe técnica às pessoas em alternativas penais,
garantindo o acesso aos direitos a partir das demandas apresentadas por cada pessoa, partindo
de uma abordagem centrada na afirmação da autonomia, liberdade e responsabilização.
Em um primeiro momento é realizado o acolhimento psicossocial, abrindo espaço para
a escuta qualificada necessária para desenvolver um vínculo com a pessoa atendida, entendendo
seus aspectos subjetivos, emocionais e sociais. As informações obtidas nesse primeiro encontro
são registradas, assegurando ao custodiado o caráter sigiloso dessa ação, para o devido
acompanhamento.
Durante o acompanhamento da pessoa em alternativa penal é realizado o
aconselhamento psicológico com vistas a fornecer informações, direcionamentos e orientações
para o melhor ajustamento do jurisdicionado ao cumprimento das medidas cautelares impostas.
Esse acompanhamento objetiva ajudar a pessoa a planejar sua condição e busca também
identificar possíveis demandas e fatores de risco.
Com a identificação das demandas informadas por cada pessoa em alternativa penal,
caberá o encaminhamento para os serviços da rede parceira, enfatizando o caráter não
obrigatório da ação. As pessoas em alternativas penais poderão ser encaminhadas à órgãos
como o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), Centro de Referência de Assistência Social
(CRAS), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), Pronto
Atendimento ao Cidadão (PAC), Defensoria Pública, etc. Essa atividade é mais ativamente
desempenhada pela equipe de serviço social e pelo assessor jurídico da Central.
O acompanhamento junto com a pessoa em alternativa penal se dará em seis encontros
mensais previamente agendados. No sexto encontro, será dado o encerramento do
acompanhamento do jurisdicionado na Central Integrada de Acompanhamento de Alternativas
Penais do Amazonas – CIAPA. Será então elaborado o parecer psicossocial, informando como
se deu seu acompanhamento na central, bem como suas expectativas futuras com relação a sua
vida laboral, sua capacidade reflexiva, seus aspectos emocionais e sociais.
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3.1. ACOLHIMENTO PSICOSSOCIAL

Conforme o Conselho Nacional de Justiça (2021) após a realização da Audiência de


Custódia, com a determinação do juiz de que a pessoa responderá seu processo em liberdade
provisória com medidas cautelares aplicadas, o sujeito será encaminhado à Central de
Alternativas Penais devendo o mesmo comparecer dentro do prazo determinado.
Dado início no seu acompanhamento na Central Integrada de Acompanhamento de
Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA, a pessoa em alternativa penal será recebida pela
equipe técnica para seu devido atendimento. Nesse primeiro momento o atendimento é voltado
para a escuta onde serão identificadas as dúvidas referentes ao contexto processual penal, os
aspectos psicológicos, sua condição física e as demandas apresentadas pelo indivíduo. A pessoa
em alternativa penal deverá ser compreendida de forma integral, buscando entender a formação
de suas relações interpessoais, seu estado emocional, suas condições sociais, entre outros
aspectos que permitam o melhor ajustamento da orientação prestada pela equipe (LEITE, 2016).
Esse acolhimento se mostra necessário, pois a pessoa ao ser liberada da Audiência de
Custódia apresenta uma carência de informações de cunho jurídico, desse modo, o acolhimento
não está situado apenas nos atendimentos sociais e psicológicos oferecidos pela CIAPA, mas
também pela assessoria jurídica. Ainda segundo Leite (2016, p. 40)
É comum que as pessoas cheguem neste primeiro encontro ainda com dúvidas
jurídicas e resistência quanto ao cumprimento. É importante que seja um espaço de
escuta e não só de orientação, uma vez que a percepção da pessoa quanto à capacidade
de ser ouvido pela equipe, poderá determinar uma construção de vínculo que contribua
para o acompanhamento. É possível o agendamento de atendimentos específicos e
fora da determinação judicial, desde que haja demanda e consenso com a pessoa.

No atendimento realizado pela equipe do serviço social, a pessoa em alternativa penal


terá suas datas seguintes agendadas para o acompanhamento na Central. Já no seu segundo
comparecimento na Central, o jurisdicionado é encaminhado ao atendimento psicológico, sendo
recebido e acompanhado por um agente penitenciário até o auditório da Central Integrada de
Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA, onde ficará aguardando até
ser chamado para o atendimento.
Durante o dia 01/11/2022 foram realizados dois primeiros atendimentos psicológicos
que serão explorados ao longo deste tópico. Dado que a pessoa em alternativa penal já havia
sido direcionada até o auditório e já estava aguardando ser atendida, a cumprimentei e solicitei
seu Termo, documento onde estão identificadas suas medidas cautelares e anexado um canhoto
com suas datas agendadas. Em seguida a levei para fazer a leitura biométrica, após isso pedi
para que aguardasse novamente no auditório. Busquei então localizar a ficha de
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acompanhamento no arquivo, após isso procurei pelo seu nome no Sistema Integrado de
Administração Penitenciária – SIAP para ler o registro da equipe de serviço social e, então, a
convidei para adentrar no consultório psicológico II.
É importante salientar nesse primeiro momento a preparação do ambiente e a garantia
de atendimento, entendendo que esses aspectos são valiosos para o acolhimento. O espaço
físico, social e profissional estabelece a acolhida adequada ao usuário (VELASCO; RIVAS;
GUAZINA, 2012). A Central Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais do
Amazonas – CIAPA conta com dois consultórios psicológico, um localizado no segundo andar
do prédio e outro localizado no terceiro andar. Conforme mostra a Fotografia 1, o espaço do
consultório psicológico I é relativamente pequeno. Já na Fotografia 2 é possível verificar que
conta com um espaço mais amplo, possui outras mesas e cadeiras, no entanto o atendimento é
realizado apenas na mesa onde está o único computador.

Fotografia 1 - Consultório Psicológico I

Fonte: Produção do próprio autor.


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Fotografia 2 - Consultório Psicológico II

Fonte: Produção do próprio autor.

Atentar-se para os aspectos do ambiente onde será realizado o atendimento revela-se


necessário para fornecer à pessoa que será ajudada a devida valorização e isso se dá por meio
do arranjo adequado das condições ambientais, tais como decoração, eliminação de qualquer
desconforto do ambiente, limpeza e oferecimento de pequenos cuidados ao ajudado
(MIRANDA; MIRANDA, 1993).
Com a pessoa em alternativa penal dentro do consultório psicológico II solicitei para
que se sentasse e ficasse à vontade. Questionei se estava tudo bem e como havia sido a ida até
a Central, a pessoa respondeu que estava bem e que sua ida tinha sido frustrante por conta do
trânsito intenso. Verifiquei se seu nome estava correto e me apresentei, identificando-me como
estagiário de psicologia e indicando que iria realizar o seu primeiro atendimento psicológico.
Esse primeiro contato é essencial e deve ser feito com muita cautela. Miranda e Miranda (1993)
enfatizam que o acolher no primeiro contato mostra-se uma etapa importante na construção de
uma relação de ajuda. Nesse primeiro encontro se faz necessário receber calorosamente o
sujeito, conhecer seu nome, individualizá-lo e nutri-lo fisicamente.
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Depois de me apresentar fiz perguntas básicas, como em todos os primeiros


atendimentos, tais como “quantos anos você tem?”, “você está em algum relacionamento
atualmente?”, “tem filhos?”, “mora com quem?”, “atualmente está trabalhando?”, “finalizou
seus estudos?”. Dispenso perguntar bairro onde reside, pois essa informação já está previamente
registrada no Sistema Integrado de Administração Penitenciária – SIAP, porém em algumas
ocasiões esse questionamento se faz relevante. Dando continuidade no atendimento, informei
o caráter sigiloso das informações declaradas durante a entrevista. Nesse ponto as atividades
acolhimento psicossocial e aconselhamento psicológico começam a se sobrepor.
Questionei ao custodiado sobre o artigo pelo qual havia sido encaminhado à Central,
nesse caso se tratava do artigo 14 da lei n° 10.826 que determina reclusão, de dois a quatro anos
e multa para pessoa que for configurada como tendo porte ilegal de arma de fogo de uso
permitido (BRASIL, 2003). Então o Sr. P.H. começou a relatar como se deu o ocorrido.
Segundo seu relato, foi encontrado uma “arma caseira” próximo do Sr. P. H. e de seu cunhado.
Informou que estava passando na casa de sua irmã, no bairro Flores. "Eu fui lá na casa da minha
irmã. Daí eu fui pego com meu cunhado por lá mesmo. A gente não tinha nada, mas estava
tendo tiroteio [conflito entre facções] e tu sabe como é, na hora que chega a polícia quem tem
B.O. joga tudo fora. Jogaram perto da gente, mas como a gente não tinha nada, a gente ficou lá
na perdição". Após esclarecer o que tinha gerado toda sua situação processual, perguntei de que
forma esse ocorrido havia afetado sua vida e o custodiado respondeu o seguinte: “Foi muito
ruim. Tive que ficar preso um dia lá CDPM [Centro de Detenção Provisória Masculina], só
depois que me levaram pra audiência de custódia. Eu já tive que assinar por artigo 157 [roubo
majorado], daí fiquei assinando por dois anos lá na cachoeirinha. Isso me atrapalhou, né? Sujou
meu nome de novo e querendo ou não isso atrapalha a vida do cara”. Com essas informações
declaradas, perguntei sobre como sua família havia reagido ao saber que tinha sido detido mais
uma vez e o mesmo respondeu que ficaram “irritados” e “chateados”, principalmente sua mãe.
“Ela ficou muito brava. Já tinha pagado a fiança na primeira vez e agora aconteceu de novo,
mas depois eu expliquei para ela que o que tinha acontecido. Agora tá tudo normal”.
Conforme explicitado por Benjamin (2008), ao alcançar o problema que levou a pessoa
a buscar ajuda, o entrevistador realizou o primeiro estágio da entrevista e, a partir, desse ponto
pode entrar no segundo estágio que consiste em desenvolver ou explorar o verdadeiro problema
que foi identificado, sendo despendido a maior parte do tempo nesse momento. O problema a
ser identificado dentro do contexto da Central se refere justamente a questão processual penal
e como isso se desenrola e se entrelaça com a história daquele indivíduo e de que forma as suas
relações interpessoais, suas atividades laborais, seus aspectos emocionais, situação financeira,
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entre outras diversas características penetram no contexto judicial. De acordo com Herkenhoff
(1994, p. 101) apud Poitevin, Sacchelli e Roehrig (2007) “O sistema jurídico não é um sistema
fechado, mas aberto, penetrado pelo conjunto do sistema social. A decisão judicial não se isola,
não se ilha: é condicionada pelos diversos fenômenos sociais, a começar pelo econômico, e atua
para além do sistema jurídico”. Nesse sentido compreender como sua situação processual se
infiltra em outros aspectos de sua vida é indispensável.
Para além dessas informações mais centrais, também foi perguntado sobre o uso de
substâncias psicoativas. O custodiado informou que não faz uso de nenhuma droga ilegal,
porém relatou que fuma cigarro desde os 14 (quatorze) anos. Ao ser questionado se já passou
por algum tipo de acompanhamento ou tratamento, o mesmo respondeu que sim, enquanto
ainda era menor de idade, no entanto não se adaptou. “Me deram um remédio lá, mas eu já
estava trocando uma coisa por outra, sabe? Daí eu não quis mais”. Foi questionado o nome o
do medicamento, mas a pessoa em alternativa penal não soube responder.
Indaguei também sobre suas relações interpessoais e segundo o custodiado, ele cresceu
em uma comunidade que valorizava as relações parentais apenas, sempre indicando que outras
pessoas, que não sejam de sua família, tinham seus próprios interesses e que não seria
apropriado se expor para essas pessoas. "Até mesmo para pessoa que você ama... Uma
namorada, por exemplo".
Encaminhou-se para o fim da entrevista levantando as informações que o Sr. P.H. havia
fornecido de forma sumarizada que, conforme apontado por Silvares e Gongora (1998), “[...]
consiste em apresentar ao cliente uma síntese das principais informações, até então fornecidas
por ele. Note-se que esta síntese deveria ser sempre apresentada junto com alguma solicitação
de ‘reformulação’ ou ‘confirmação’ de seu conteúdo”. Desse modo verifica-se se as
informações estão corretas e possibilita que o entrevistado tenha uma devolutiva do que foi
desenvolvido durante a entrevista. Expliquei também a respeito dos próximos atendimentos,
informando que serão voltados para o aconselhamento psicológico. Passei as últimas
orientações a respeito do comparecimento periódico em juízo, após verificar as medidas
cautelares impostas judicialmente e que se encontram explicitadas em seu termo de audiência
de custódia. Então questionei se o custodiado tinha alguma dúvida ou alguma informação para
adicionar, a resposta foi uma negativa, portanto pedi para que assinasse a ficha de
acompanhamento e o encaminhei para o atendimento jurídico. Depois de direcionar o
custodiado à sala de acessória jurídica, dei início ao registro do atendimento realizado no
Sistema Integrado de Administração Penitenciária – SIAP, relatando o que ocorreu,
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adicionando as informações mais relevantes, as queixas, os motivos a respeito do ato delituoso,


bem como observações a serem feitas no próximo atendimento.
Para mencionar mais um atendimento que ocorreu no dia 01/11/2022, que se tratou
também de um primeiro contato, isto é, nesse atendimento foi realizado o acolhimento
psicossocial. Assim como o atendimento com o Sr. P.H. acima descrito, ao cumprimentar o
custodiado, solicitei o Termo, o levei para realizar a leitura biométrica e pedi para que
aguardasse no auditório mais uma vez. Após encontrar a ficha de acompanhamento, chamei o
Sr. V.H. para adentrar no consultório psicológico II, pedi para que se sentasse, confirmei seu
nome e em seguida dei início a entrevista coletando as informações mais básicas. Foram
identificados os fatores que levaram o Sr. V.H. a cometer o ato delituoso, que nesse caso se
tratava de violência contra a mulher e a pessoa ofendida em questão era sua tia. Busquei saber
como era a relação do custodiado com seus outros familiares, visto que a pessoa em alternativa
penal coabitava com sua mãe e que seus outros parentes residiam no mesmo terreno, incluindo
a sua tia. O Sr. V.H descreveu as relações com os demais familiares como sendo “tranquilas”,
comentou também a respeito de sua relação com sua mãe, descrevendo como sendo similar à
de “dois amigos”, informando que ambos se apoiam. Ao ser questionado sobre seu pai,
respondeu que não tem contato com ele há 11 (onze) anos. Solicitei o Termo de Audiência de
Custódia para verificar as medidas cautelares impostas judicialmente, passei as orientações a
respeito de como se daria os atendimentos e o encaminhei para o atendimento jurídico.
Destaca-se desse atendimento o fator tempo, haja vista que idealmente um atendimento
psicológico na Central Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas –
CIAPA dura trinta minutos, porém para manter o fluxo de atendimentos muitas vezes esse
tempo é encurtado. No caso, desse atendimento, o tempo foi, majoritariamente, utilizado no
tópico do que havia gerado sua situação processual, portanto não foi possível identificar uma
demanda clara do custodiado, não sendo feita observações referentes aos próximos
atendimentos, nem levantadas outras informações sobre os aspectos emocionais e subjetivos do
indivíduo. Ainda sobre o tempo de atendimento existem muitas situações adversas que acabam
determinando como será manejado essa questão, tais como pessoas que não estão agendadas
para o dia, mas que compareceram, pessoas que chegam atrasadas ou adiantadas.
Em caso de um dia em que diversas pessoas, sejam elas agendadas ou não para o dia,
compareçam, há de se pensar em como organizar o fluxo de atendimento, de modo a utilizar
adequadamente o tempo. “Quando diversas entrevistas estão programadas, o fator tempo é parte
integrante da atmosfera geral e do relacionamento” (BENJAMIN, 2008). Ainda segundo
Benjamin (2008), é importante que informe ao entrevistado, implicitamente ou explicitamente,
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que há um determinado tempo para ele. É preciso também saber o quanto aquele indivíduo
aguardou para ser atendido, pois quanto mais uma pessoa fica aguardando, mais pode imaginar
que foi esquecido, portanto é necessário, em casos de atraso, informar o motivo e ser sincero
com a pessoa. O fator tempo é um determinante fundamental para a relação com a pessoa que
está sendo atendida e configura ser um ponto muito caro no contexto da Central Integrada de
Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA.
Dado que esses atendimentos ocorreram depois de um contato inicial com a equipe do
serviço social e que as informações coletadas das pessoas em alternativas penais foram
pertinentes durante todo esse processo, ressalta-se a relevância de uma abordagem psicossocial
no momento da acolhida das pessoas que estão chegando da Audiência de Custódia. Segundo
Alves e Francisco (2009, p. 769) “A abordagem psicossocial contempla, portanto, articulações
entre o que está na ordem da sociedade e o que faz parte do psíquico, concebendo o sujeito em
suas múltiplas dimensões”. Os fatos sociais e também jurídicos no contexto da política de
Alternativas Penais associam-se aos saberes da psicologia e é dentro deste campo em que se
favorece a autonomia e valorização dos jurisdicionados, através do reconhecimento das
implicações e direitos da sua existência humana, toda essa conjuntura reflete-se na eficiência
da integração social das pessoas em alternativas penais (POITEVIN; SACCHELLI; ROEHRIG,
2007).
Salienta-se também que o amplo acesso à justiça pela sociedade, conforme como
apontado por Roehrig e Siqueira (2007, p. 187) apud Poitevin, Sacchelli e Roehrig (2007)
“depende do reconhecimento mútuo das diferentes ciências, pois é na articulação de diversos
saberes que se torna viável alcançar práticas institucionais mais coerentes às necessidades
humanas e sociais, numa perspectiva ecológica e ética”.
Constata-se desses dois atendimentos que foi possível alcançar o objetivo da atividade
que consiste em promover a acolhida ao custodiado, no entanto, houve atendimentos em que a
pessoas se mostravam extremamente rígidas. Com relação a esses atendimentos, avalio que não
obtive êxito na atividade de acolhimento. Para levantar um exemplo, menciona-se o
atendimento realizado no dia 29/09/2022 com um policial militar que foi encaminhado à Central
para o acompanhamento. Não foi possível extrair informações a respeito de sua percepção do
ocorrido. Entendeu-se que foi um caso delicado, pois o custodiado ficou detido no mesmo local
em que estava um policial militar preso pelo Sr. F.L. e, ainda segundo seu relato, houve tortura
tanto por parte da força tática que havia lhe abordado, quanto das pessoas que ficaram presas
junto com ele. O Sr. F.L. apresentou-se, de forma geral, com uma atitude indiferente diante do
atendimento e, em alguns momentos, mostrou-se incomodado. Quando questionado se tinha
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algum compromisso ou se havia algo que estava lhe perturbando, o custodiado respondeu o
seguinte: “Faz aí o teu atendimento”. Foi comunicado a dificuldade enfrentada nesse
atendimento ao supervisor local que, prontamente, deu alguns esclarecimentos e sugestões para
o próximo encontro.

3.2. ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO

De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (2020), os psicólogos que atuarem nas
Centrais Integradas de Alternativas Penais não terão atribuição clínica, não havendo também
competência para emissão de laudos psicológicos. Na Central Integrada de Acompanhamento
de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA o atendimento do público por parte do psicólogo
e dos estagiários de psicologia se volta para o aconselhamento psicológico.
Sheefer (1989, p. 14) define, de modo sintetizado, aconselhamento psicológico como
sendo “[...] uma relação face a face de duas pessoas, na qual uma delas é ajudada a resolver
dificuldades de ordem educacional, profissional, vital e a utilizar melhor os seus recursos
pessoais”. Essa definição é consonante com o que Patterson e Eisenberg (1988) apresentam
sobre o aconselhamento psicológico, sendo um processo interativo, entre o conselheiro e o
cliente, onde o último será levado a produzir mudanças em determinados campos de sua vida.
O atendimento psicológico no contexto da Central consiste em auxiliar a pessoa em
alternativa penal a lidar com sua questão processual penal, a partir dos seus próprios recursos.
Dado que há apenas alguns encontros com o público atendido durante todo o acompanhamento,
tem-se que a estrutura do atendimento psicológico na Central fundamenta-se em um contexto
mais pontual, permitindo explorar apenas demandas limitadas diante de todo o processo.
Scorsolini-Comin (2014) ao tratar sobre o tema aponta que o aconselhamento psicológico seria
indicado quando não houvesse um diagnóstico de transtorno psicológico ou em situações
pontuais. Ainda com relação às diferenças entre aconselhamento e psicoterapia entende-se que,
embora mantenham estreitas relações, há um consenso de que se trata de duas modalidades
distintas (SCHMIDT, 2012 apud SCORSOLINI-COMIN, 2014).
Para explanar de que modo essa atividade ocorreu durante o estágio, cabe aludir um
atendimento realizado no dia 27/10/2022. O caso em questão se tratava de retorno, isto é, o
custodiado já havia passado pelo primeiro atendimento psicológico, no entanto, foi
acompanhado por outras duas estagiárias. Realizei o procedimento padrão antes de dar inicio
ao atendimento. Fiz a leitura dos comentários feitos pelas estagiárias e busquei identificar os
pontos que foram relevantes, bem como as observações que foram registradas. Após a leitura,
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convidei a pessoa em alternativa penal para adentrar no consultório psicológico 2, me apresentei


e segui com o seu acompanhamento.
Questionei o Sr. G. C. se havia ocorrido alguma mudança em sua vida desde o seu último
comparecimento na Central e o custodiado respondeu que a única mudança era que o mesmo
não estava mais trabalhando vendendo “balinhas” no semáforo, além disso, relatou que estava
participando de um processo seletivo para uma vaga de emprego em um posto de gasolina.
“Quero voltar a trabalhar no posto de novo”, afirmou. Após essa declaração, indaguei a respeito
de sua experiência anterior trabalhando no posto de gasolina e o Sr. G.C. respondeu que havia
sido “tudo tranquilo”, não apresentando nenhuma queixa ou irritação. Foi identificada
incongruências entre o que havia sido relatado no atendimento anterior e no que estava sendo
declarado durante a entrevista que desempenhei.
Inicialmente o custodiado apresentou-se de forma muito contida, o que me levou a
realizar perguntas mais neutras (e.g., quantos anos você tem? onde mora?) e, gradativamente,
fiz questionamentos sobre tópicos mais sensíveis, conforme indicado por Dalgalarrondo (2019).
Mesmo após um certo tempo, quando foi questionado sobre suas relações sociais, mostrou-se
inquieto e constantemente coçava sua perna. Em um dado momento disse, “Vou falar logo...
Eu tenho algum problema, é uma questão social”. Ao ser questionado sobre como se sente
diante de um contexto social, o mesmo não soube dizer com clareza. "Não consigo explicar.
Não sei como falar", dizia ele. Ainda sobre a sua queixa a respeito do convívio social, informou
que desde o ensino fundamental I enfrenta dificuldades. "Ficavam me zoando. Eu faltava muito,
porque não gostava de ir". Relatou que essa situação se estendeu até o segundo ano do ensino
médio. Nesse momento questionei sobre como havia sido sua relação com seus familiares desde
a tenra idade, no entanto, não conseguiu esclarecer essa informação, de todo modo, expliquei
que certas circunstâncias, por mais distantes temporalmente que estejam, exercem forte
influência sobre como nos comportamos em contextos similares. Segundo Sheefer (1989), no
decorrer no aconselhamento psicológico, pode-se utilizar de técnicas interpretativas. A partir
disso permite-se a melhor compreensão do comportamento do indivíduo e dos fatores que o
motivam. Enfatizar que certos tipos de inter-relação familiar ou social levam o sujeito a tomar
determinadas decisões e ter certas atitudes e, ao explicitar essas questões, o orientando pode
organizar melhor suas próprias experiências.
O Sr. G.C. informou que gosta de desenhar, tocar violão e rimar. Foi questionado se
realizava essas atividades dentro de alguma comunidade e o Sr. G. C. respondeu positivamente,
tendo uma postura mais confortável e entusiasmada ao relatar como era rimar acompanhado de
alguns colegas. Relatou que prefere realizar parte dessas atividades sozinho. "Eu gosto de ficar
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mais na minha". Inclusive se descreveu como uma pessoa observadora e em muitos momentos
da entrevista fez esse apontamento. "A pessoa pode preferir ficar observando também, né?",
disse ao ser proposto que imaginasse um cenário de debate em sala de aula. Durante a entrevista
apresentou algumas contradições a respeito de como enxerga as relações sociais. Ora afirmando
que se adaptou e que prefere ficar sozinho, ora informando que enfrenta dificuldades quando
precisa tratar de assuntos com outras pessoas. Foi questionado sobre como algo que não é visto
com tanta importância pode lhe gerar tanto incomodo, no entanto não soube responder.
Importante notar que tratar dessas questões e buscar revelar essas contradições se faz muito
relevante no sentido de buscar construir, junto do custodiado, uma possível alternativa de ação
concreta. Conforme apresentado por Hayes, Strosahl e Wilson (2021, p 74)
Em última análise, a saúde psicológica é produzida por meio do trabalho eficaz no
mundo real. Posteriormente, o trabalho eficaz tende a produzir um senso de vitalidade
e conexão com a vida e um senso de saúde e bem-estar. Esse sentido de fluidez e
engajamento emerge quando uma pessoa faz contato com eventos reforçadores no
presente que são intrínsecos a ações de vida profundamente significativas.

Chegando próximo do fim do atendimento, apontei que o Sr. G. C. havia se comunicado


bastante e que foi, durante a entrevista, expressando-se corporalmente com mais frequência,
diferentemente da forma como se apresentou inicialmente. O custodiado apenas sorriu e, em
seguida, fez alguns questionamentos sobre como poderia conseguir uma bolsa de estudos para
universidade, esclareci algumas delas. Antes de colher sua assinatura e encaminhá-lo ao
atendimento jurídico, perguntei se teria interesse em passar por um processo psicoterápico e o
mesmo respondeu que sim, então apresentei alguns locais onde poderia procurar por um serviço
de psicologia. Após finalizar o atendimento registrei a informações no Sistema Integrado de
Administração Penitenciária – SIAP e anotei algumas observações e sugestões para os próximos
atendimentos. Comentei sobre esse atendimento com as outras estagiárias que haviam efetuado
o atendimento psicológico anteriormente, bem como solicitei orientações do supervisor local.
Avalia-se que o objetivo de estabelecer um vínculo com a pessoa atendida foi alcançado,
no entanto não há como avaliar se os objetivos do aconselhamento psicológico foram atingidos,
pois a pessoa em alternativa penal ainda não retornou à Central Integrada de Acompanhamento
de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA até o momento em que este relatório está sendo
redigido. Optou-se por mencionar esse atendimento para ilustrar um caso onde há uma postura
ativa da pessoa em alternativa penal no sentido de apresentar uma queixa, visto que isso ocorre
com uma frequência reduzida na Central. Importante esclarecer que nesse local de estágio não
há uma demanda espontânea, o que não inviabiliza o atendimento psicológico, apenas
apresenta-se como mais um desafio a ser encarado.
17

O caso do Sr. C. A. ilustra bem o desenvolvimento desta atividade, pois o mesmo


encontra-se, até o momento em que este relatório está sendo redigido, próximo de finalizar seu
acompanhamento na Central. O Sr. C. A. fez seu primeiro comparecimento na Central no dia
03/06/2022, sendo recebido pela equipe de serviço social. Já no dia 08/08/2022 realizei seu
primeiro atendimento psicológico. Nesse atendimento não fui capaz de colher informações
relevantes, fiz perguntas indiretas e pouco claras. Durante o atendimento foi perdido o controle
da entrevista e o Sr. C. A. mostrou-se como uma atitude expansiva e hostil, o que elevou meu
nível de ansiedade. Devido a pouca experiência, não pude lidar com meus próprios sentimentos
e perdi de vista a pessoa que estava sendo atendida.
A pessoa em alternativa penal havia sido encaminhada à Central por ter furtado um item
de uma pessoa que frequentava uma academia próximo de onde residia. No decorrer da
entrevista informava constantemente que sofria ameaças da vítima do furto. “Ele fica lá
mexendo comigo. Se ele vier pra cima eu vou matar, não tenho medo não. Se ele vier sozinho
não vai ter outra, eu vou pra matar”. No dia 04/10/2022 o custodiado retornou para dar
continuidade com o seu acompanhamento, na ocasião informou que estava internado em um lar
terapêutico, porém havia fugido. Relatou que quando chegou em sua casa recebeu ameaças de
algumas pessoas e foi espancado. Tentou voltar para o lar terapêutico e foi aceito novamente.
Indiquei para o Sr. C. A. as consequências de suas atitudes e questionei sobre o que ele pensava
a respeito, o mesmo respondeu que precisava “ajeitar” as coisas e que “aquilo não era vida”.
Apresentou insatisfações com o lar terapêutico. “Cara lá é muito chato, só tem homem e o dono
lá parece ser meio louco. Ele pega no meu pé”, nesse momento me dirigi ao custodiado dizendo
que “às vezes não é uma questão de ‘pegar no pé’. Se sua filha estivesse fazendo algo que
gerasse algum prejuízo a saúde dela o que o senhor faria?”. O custodiado respondeu que entende
que o “cara” queria ajudar, mas que mesmo assim é chato. Indiquei que o Sr. C. A deveria
abraçar mais uma vez a oportunidade oferecida pelo lar terapêutico.
No dia 07/11/2022 o Sr. C. A. retornou à Central mais uma vez. Realizei seu
atendimento e durante toda a entrevista apresentou-se de forma colaborativa e entusiasmada.
Ao ser questionado se havia tido alguma mudança em sua vida desde o seu último
comparecimento, o custodiado respondeu o seguinte: “Agora eu aceitei Jesus e estou seguindo
o caminho dele”. Perguntei também sobre como estava se sentindo com relação ao lar
terapêutico, dado que no último atendimento o Sr. C. A. havia apresentado diversas queixas, e
o mesmo respondeu que estava muito bem por lá. “Agora me sinto como se fosse da família,
não sou só um interno. Estou até ajudando a resgatar outras vidas”. Relatou que se sentiu “muito
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feliz e motivado” quando recebeu visita de sua mãe e de sua ex-companheira. Durante todo o
atendimento apresentou-se de forma colaborativa e receptiva.
Ao longo do processo de acompanhamento do Sr. C. A. evidencia-se mudanças positivas
referente aos comportamentos adotados pela pessoa em alternativa penal. No atendimento do
dia 04/10/2022 foi apontado durante a entrevista sobre as consequências das atitudes do Sr. C.
A., enfatizando as suas relações interpessoais, em especial a sua relação com sua mãe.
Conforme indica Patterson e Eisenberg (1988, p. 23) “uma das funções dos conselheiros é
ajudar os clientes a avaliarem as margens reais de sua liberdade, focalizando o que eles pensam
sobre as consequências de suas ações e decisões”. Enfatiza-se também como o custodiado
passou a olhar para si mesmo, tendo uma mudança em seu autoconceito, descrevendo-se como
prestativo dentro de sua comunidade. Esse tipo de mudança é elementar em um processo de
aconselhamento psicológico (PATTERSON; EISENBERG, 1988).

3.3. ENCAMINHAMENTO À REDE DE APOIO

Dado que o público atendido pela Central Integrada de Acompanhamento de


Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA apresenta certas vulnerabilidades sociais, se mostra
pertinente o encaminhamento à rede de apoio, de modo que possa viabilizar a inclusão social
de cada pessoa em alternativa penal às instituições parceiras, conforme as demandas
apresentadas. Os encaminhamentos não serão feitos como determinação judicial, devendo partir
da sensibilização da equipe técnica que integra a Central, enfatizando o seu caráter voluntário
(CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2020).
Para a identificação das demandas e dos fatores de risco apresentados pelas pessoas em
alternativas penais, torna-se necessário o espaço de escuta. O uso da entrevista, um instrumento
indispensável ao psicólogo, possibilita essa escuta, pois permite uma maior investigação a
respeito do sujeito a ser entrevistado (TAVARES, 2003). Para a realização dos atendimentos
na Central Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA
utiliza-se uma entrevista semiestruturada que, segundo Tavares (2003), se denomina dessa
forma, pois o entrevistador tem seus objetivos esclarecidos, sabendo quais informações irá
colher para atingi-los. As perguntas nesse tipo de entrevista são pré-definidas, no entanto não
limita a elas.
Enfatiza-se que o objetivo da entrevista que é realizada na Central Integrada de
Acompanhamento de Alternativas Penais Amazonas – CIAPA consiste no aconselhamento.
Nessa modalidade o psicólogo fornece informações, faz sugestões ao sujeito e interpreta o
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material que é colocado pelo indivíduo (CUNHA, 1986, p. 31 apud OLIVEIRA, 2005). Ainda
a respeito da entrevista, entendendo que trata-se de um instrumento valioso, é proposto por
Benjamin (2008, p 16) que a entrevista se constitui em
[...] um diálogo entre duas pessoas, um diálogo que é sério e tem um propósito. O
objetivo da entrevista é auxiliar o entrevistado, que pode vir até nós livremente,
procurando ajuda. Pode vir contra a sua vontade, forçado pela lei ou outros agentes,
talvez por nós mesmo. Em qualquer caso, a questão fundamental para o entrevistador
deve ser sempre a seguinte: qual será o melhor modo de ajudar essa pessoa?

No decorrer do acompanhamento na CIAPA, a pessoa em alternativa penal passa por


entrevistas, tanto pela equipe de serviço social como também pela equipe de psicologia e
assessor jurídico, justamente com o objetivo de esclarecer as demandas, bem como os demais
aspectos imbricados na experiencia individual de cada um dos jurisdicionados.
A atividade de encaminhamento à rede parceira, como já mencionado neste relatório, é
efetuado com mais frequência pela assistente social, as estagiárias de serviço social e o assessor
jurídico, que realizam encaminhamentos à órgãos que firmaram parceria com a Central
Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA, como o Centro
de Atenção Psicossocial (CAPS), Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), Centro
de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), Pronto Atendimento ao Cidadão
(PAC), Defensoria Pública, etc.
O psicólogo eventualmente realizou encaminhamentos ao Pronto Atendimento ao
Cidadão (PAC), Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), bem como ao Centro de Atenção
Psicossocial Álcool e outras Drogas (CAPS AD) e realiza também constantes visitas técnicas
nas redes parceiras, tais como Desafio Jovem de Manaus e Centro de Reabilitação Ismael Abdel
Aziz (CRDQ). Algumas estagiárias o acompanharam em uma das visitas no dia 27/10/2022.
Não realizei o encaminhamento às redes parceiras, nem acompanhei as visitas técnicas.
Ressalta-se que o fato dessas atividades serem menos usuais no contexto da equipe de
psicologia da Central se deve à alta demanda de atendimentos realizados ao longo dos meses.
As pessoas em alternativas penais são acompanhadas mais diretamente pela equipe de
psicologia da Central desde seu segundo comparecimento até o seu encerramento, o que
inviabiliza a realização de algumas atividades que estavam previstas ou que constam no
desenho do programa.
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4. AUTOAVALIAÇÃO DO ACADÊMICO

A Central Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas –


CIAPA fica localizada na Rua Gabriel Salgado, S/N, na região central da cidade e ocupando
dois andares de um prédio anexo da Secretária de Estado de Administração Penitenciária do
Amazonas (SEAP). O local de estágio fica a, aproximadamente, 300 metros de distância do
Ponto de Ônibus mais próximo. O trajeto é um tanto quanto perigoso, no entanto, o horário em
que eu saio do local, às 14h, ainda há movimento nas ruas. O local possui uma estrutura de
aparência desgastada. O corredor que dá acesso ao consultório psicológico II conta com pouca
iluminação. O banheiro masculino do segundo andar está com a lâmpada queimada e a descarga
com defeito, contudo esse último ponto foi solucionado pelo meu supervisor local. As salas
estão empoeiradas, no consultório psicológico II há muitas cadeiras e mesas, poluindo o
ambiente, além de ser excessivamente grande. Em síntese, o local de estágio é evidentemente
precarizado.
A Central conta com dois psicólogos, sendo um do quadro efetivo da SEAP enquanto
que o outro é contratado por convênio da Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN).
Ambos sempre se apresentaram de maneira solícita, constantemente fazendo apontamentos
referente aos atendimentos, além de prestarem auxílio na elaboração do plano de estágio e deste
relatório. O psicólogo contratado por convênio da DEPEN está mais ativamente na Central
Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas – CIAPA, enquanto que
o psicólogo do quadro efetivo da SEAP tem de dividir suas atividades entre a Central e a sede
da secretária. De forma geral, avalio como positiva a postura de ambos, contudo, devido uma
questão de segmentos teóricos distintos não senti que pude aproveitar integralmente a
supervisão, embora levasse todas as críticas e os apontamentos em consideração ao guiar
minhas ações.
Quanto a supervisão acadêmica, qualifico como suficientemente boa, apesar de não ter
tido o tanto de números de aulas esperado por conta de algumas questões adversas. Ressalto
uma das primeiras aulas, onde questionei a professora de estágio básico II sobre como construir
um vínculo, pois havia verificado que existia uma dificuldade no contexto da Central por não
haver uma demanda espontânea e por não ter tanto contato com as pessoas em alternativas
penais. Nessa ocasião, recordo-me de que a professora indicou que para que um vínculo fosse
estabelecido, deveria existir um interesse em entender a dinâmica da pessoa que está sendo
atendida, olhando diretamente em seus olhos e buscando acolher a experiência do sujeito.
21

Considero que essa orientação foi extremamente valiosa, pois influir radicalmente sobre meu
comportamento, gerando maior confiança e também um senso de responsabilidade.
No que diz respeito as minhas competências e habilidades gerais acredito ter tido
capacidade de me expressar de forma clara, objetiva e com linguagem adequada. Sempre
quando necessário solicitei apoio dos membros de equipe, sendo respondido prontamente por
todos. Julgo que estabeleci um bom relacionamento com a equipe da Central, respeitando as
relações hierárquicas do local. Durante todo o período de estágio organizei meus itens da forma
como acreditava ser o mais adequado, adaptando o ambiente, mantendo-o limpo e manuseando
os equipamentos com muita cautela. Atuei de modo consistentemente ágil, sem comprometer a
qualidade da atividade desempenhada.
Com relação a postura profissional, desempenhei minhas tarefas de forma consonante
com as Diretrizes do Código de Ética Profissional e busquei atender todas as orientações do
supervisor local. Apresentei-me de modo colaborativo para com todos os membros da equipe.
Mantive uma postura assídua e pontual.
No que tange a atuação prática, demonstrei interesse pelas atividades da Central,
procurando sempre por novas informações, solicitando orientações da equipe multidisciplinar.
Alinhei meus conhecimentos teóricos as minhas tarefas e, nesse sentido, aprecio que houve um
desempenho satisfatório. Mostrei proatividade e desenvolvi minhas atividades de maneira
organizada e assertiva.
22

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Atuar como estagiário na área de psicologia jurídica foi uma importante experiencia,
pois a possibilidade de adentrar em um conteúdo, relativamente recente no contexto brasileiro,
que vem se estabelecendo como um campo teórico e prático, requer um muita diligencia quanto
aos estudos e práticas desempenhada no local de estágio. A atuação do aluno no estágio consiste
justamente em uma etapa necessária para o desenvolvimento de competências e habilidades que
só poderiam ser ensinadas em contato com o ambiente de trabalho onde essas atividades são
desenvolvidas. Desse modo ter o treino de certos comportamentos em um ambiente real de
atuação com a supervisão local, somada a supervisão acadêmica, serviu de base para apreender
diversos aspectos da psicologia que não poderiam ser apenas depreendidos com o material
teórico produzido na literatura acadêmica.
O local de estágio certamente contava com suas próprias dificuldades. O desenho do
projeto não abarca com qualidade o serviço de psicologia, as demandas estão para além da
capacidade do serviço que pode ser prestado. Essa conjunção dos fatores influi sobre o
desempenho da Central Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais do Amazonas –
CIAPA e, consequentemente, exercem influência sobre as atividades que foram empreendidas
durante o período de estágio. Ainda que as falhas do projeto estivessem presentes, não
inviabilizou a aprendizagem de habilidades pertinentes ao âmbito acadêmico. Compreender o
papel do psicólogo foi justamente o que possibilitou enxergar com um olhar crítico as condições
do projeto vinculado a SEAP.
O traquejo desenvolvido durante os atendimentos, o contexto propicio para poder
conectar-se com outro ser-humano e buscar ativamente entender sua dinâmica, sua história
forma as atividades mais gratificantes. Revelou-se ao longo desse processo a importância de se
construir uma atuação consonante com o papel social que o profissional de psicologia há de ter
e, além disso, foi possível verificar as dificuldades da atuação. Ter a oportunidade de ajudar
outra pessoa é uma experiencia sublime e o estágio abriu essa possibilidade, como um ensaio
para o futuro, e o compromisso demonstrado hoje terá suas consequências explicitadas em
breve.
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REFERÊNCIAS

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psicossocial. Psicologia: ciência e profissão, v. 29, p. 768-779, 2009.

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comercialização de armas de fogo e munição, sobre o Sistema Nacional de Armas – Sinarm,
define crimes e dá outras providências. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.826.htm. Acesso em 04 nov. 2022.

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o processo e a prática da mudança consciente. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2021.

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v. 13, n. 2, p. 243-255, 2012.
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ANEXO A – FICHA DE AVALIAÇÃO DO ESTAGIÁRIO


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ANEXO B – DECLARAÇÃO DE HORAS DE ESTÁGIO CURRICULAR


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ANEXO C – DIÁRIO DE CAMPO DE REGISTRO DE ATIVIDADES


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