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FISIOLOGIA 1 – A2

Elaine Belon Silvério

4º CASO INTEGRADOR: Fisiologia da glândula tireoide

BIOSSÍNTESE DOS HORMÔNIOS TIREOIDEANOS;


1. Captação ativa de iodeto: como cediço, os HT contêm iodo, acreditando-se ser o único uso
conhecido deste mineral no organismo humano. Contudo, advêm da alimentação na forma de
iodeto (I-), que ganha a circulação sanguínea e é captado pelas células foliculares via transporte
ativo, por meio de uma proteína cotransportadora chamada NIS (sodium- iodide symporter),
localizada na superfície basolateral da célula folicular. Neste sentido, a NIS promove a entrada de
iodeto extracelular contra um gradiente eletroquímico negativo, devido à maior concentração de
iodo no interior da célula folicular, valendo-se de energia oriunda da bomba de sódio potássio. É
importante observar, ainda, que a bomba de iodeto é estimulada sobretudo pelo TSH, e que o
transporte de iodeto em direção ao coloide é feito por um transportador de ânions chamado
pendrina (PDS).
2. Oxidação do iodeto: uma vez no interior da célula folicular, o iodeto é oxidado pela enzima
tireoide peroxidase (TPO), localizada na membrana apical e com a face catalítica voltada para o
lúmen folicular. Com efeito, a TPO, que também é estimulada pelo TSH, retira um elétron do iodeto,
formando iodo, que é o único capaz de se ligar diretamente com a tireoglobulina.
3. Iodação: a iodação ou organificação da tireoglobulina ocorre no coloide e traduz a incorporação,
por iodação, de iodo oxidado aos resíduos de tirosina da molécula de tireoglobulina. Com efeito,
quando uma molécula de iodo é incorporada à tirosina, forma-se monoiodotirosina (MIT) e,
diversamente, quando dois iodos são incorporados, forma-se a di-iodotirosina (DIT). Vale observar
que a ligação do iodo oxidado à tirosina é extremamente lenta, contudo, na tireoide, ocorre em
segundos ou minutos por ação da TPO.
4. Acoplamento: ocorre no colóide, separadamente da iodação, sendo também catalisada pela TPO.
Ainda ligadas à tireoglobulina, algumas tirosinas (MIT ou DIT) se acoplam e geram tironinas iodadas.
Com efeito, MIT + DIT = T3 (ou, em 1% dos casos, T3 reversa, que tem efeito biológico distinto),
enquanto DIT + DIT = T4.
5. Proteólise da tireoglobulina: quando a síntese hormonal está completa, o complexo
tireoglobulina- T3/T4 é recapturado pelas células foliculares em vesículas endocíticas. Com efeito,
em resposta ao estímulo do TSH, formam-se pseudópodes na membrana apical da célula folicular,
que capturam vesículas de coloide, cuja presença no citoplasma das células foliculares atrai
lisossomos com função proteolítica, que digerem as moléculas de tireoglobulina e, assim, forma-se
um pool de hormônios livres que, eventualmente, ganharão a circulação por difusão.
Vale observar que cerca de 93% dos hormônios secretados pela tireoide são formados por T4 (pró-
hormônio) e apenas 7% por T3 (hormônio ativo). Entretanto, após poucos dias, cerca da metade da
tiroxina é lentamente desiodada, formando mais T3. Sendo assim, o hormônio finalmente
transportado e utilizado pelos tecidos consiste, em sua maior parte, em T3.
TRANSPORTE DOS HT PARA OS TECIDOS
Apenas uma pequena fração de HT (0,02%) se encontra na forma de hormônios livres, que são os
únicos que efetivamente atuam nas células-alvo. Isto pois, no plasma, os HT se ligam com grande
afinidade, porém reversivelmente, a várias proteínas transportadoras. Com isso, prolonga-se a vida
do hormônio na circulação, garantindo o aporte necessário quando a fração livre restar inteiramente
consumida.
As proteínas transportadoras são sintetizadas no fígado e as principais delas são: (i) TBG (thyroid
binding protein); (ii) TTR (transthyretin), conhecida anteriormente como pré- albumina ligadora de
tiroxina (TBPA); e (iii) albumina.
Neste particular, observa-se que T4 tem maior afinidade, sendo liberado muito lentamente para as
células teciduais: metade da tiroxina sanguínea é liberada, aproximadamente, a cada seis dias,
enquanto metade do T3, devido a sua menor afinidade com as proteínas transportadoras, é liberado
para as células em cerca de um dia.
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Ao penetrar as células, ambos se ligam, novamente, a proteínas intracelulares, sendo a ligação de T4


também mais forte neste contexto.
MECANISMO DE AÇÃO DOS HT
Como cediço, os HT são hormônios derivados de aminoácidos de tirosina, ou seja, não são nem
propriamente esteroidais nem proteicos. Dada sua constituição química, afiguram-se aptos a
penetrar a membrana das células-alvo, onde se comportarão de maneira distinta.
Por anos pensou-se que o T4 era o hormônio ativo, porém, hoje é certo que o T3 é 3 a 5 vezes
biologicamente mais ativo, sendo o verdadeiramente atuante nas células-alvo. Ademais, sabe-se que
as células-alvo produzem cerca de 85% do T3 ativo por meio de enzimas presentes em quase todas
as células humanas, chamadas deiodinases, que removem um iodo do T4. Com efeito, a ativação do
hormônio no tecido-alvo acrescenta um nível de controle, pois os tecidos-alvo individualmente
podem controlar sua exposição ao hormônio ativo, regulando sua síntese enzimática tecidual.
Contudo, em que pese ambos possam penetrar a membrana celular, certo é que os receptores dos
HT encontram-se no núcleo e são altamente específicos apenas para T3, de cujo acoplamento
resultam, sobretudo, uma série de efeitos genômicos. Sendo assim, o mecanismo de ação de T3 e T4
são distintos:

o Após a entrada na célula-alvo, T3 se liga aos receptores nucleares de HT (TR, thyroid hormone
receptor), com função de fator transcricional, intermediando a ação nuclear do HT na regulação da
expressão gênica. Ou seja, os receptores ativados iniciam o processo de transcrição e formam um
grande número de RNAm diferentes que, após minutos ou horas, são traduzidos nos ribossomos
citoplasmáticos e formam centenas de novas proteínas intracelulares.
o Após a entrada na célula-alvo, T4 poderá ter dois desfechos: (i) transformar-se em T3, perdendo
um iodo, pela ação da desiodase, para então gerar os mesmos efeitos nucleares supra descritos,
cabendo observar que no fígado e no rim, por abundância de desiodase, há produção de T3 para
consumo interno e, ainda, para liberação de excedentes de T3 na corrente sanguínea; ou (ii) a
presença de T4 no citosol, por si só, já é suficiente para estimular a atividade das mitocôndrias,
aumentando a produção de ATP.
EFEITOS DOS HT
• SOBRE O CRESCIMENTO
Os HT provocam efeitos gerais e específicos sobre o crescimento, sobretudo em crianças. Com
efeito, crianças que apresentam hipotireoidismo podem apresentar crescimento retardado,
enquanto crianças com hipertireoidismo podem apresentar crescimento esquelético excessivo.
Assim, há uma ação sinérgica entre o GH e as somatomedinas na formação óssea.
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Ademais, um importante efeito dos HT é a promoção do crescimento e desenvolvimento do cérebro


durante a vida fetal e nos primeiros anos da vida pós-natal. Vale observar que disfunções
tireoidianas podem ser detectadas no teste do pezinho.
• SOBRE O SNC
Em geral, o HT aumenta a velocidade da atividade cerebral, estimula a produção de mielina, bem
como a liberação de neurotransmissores, além de participar na formação de sinapses.
Por ser assim, indivíduos com hipertireoidismo podem apresentar nervosismo e tendências
psiconeuróticas, tais como complexos de ansiedade, preocupação excessiva e paranoia.
Diversamente, o hipotireoidismo pode causar, no desenvolvimento intra-uterino e infantil,
retardamento mental conhecido como cretinismo, bem como, na vida adulta, apatia, lentidão dos
movimentos, sonolência, comprometimento da memória e capacidade mental reduzida.
• SOBRE O SISTEMA CARDIOVASCULAR
O HT apresenta acentuado efeito cronotrópico e inotrópico no coração, produzindo efeitos similares
aos induzidos pelas catecolaminas (adrenalina, noradrenalina e dopamina), estimulando a função
cardíaca. Ademais, promove vasodilatação em face do aumento do metabolismo tecidual que, por
óbvio, aumenta o consumo de oxigênio.
• SOBRE O SISTEMA RESPIRATÓRIO
Um maior metabolismo aumenta a utilização de oxigênio e a formação de CO2, sendo certo que
estes efeitos elevam a frequência e a profundidade da respiração. Ademais, o HT estimula a
produção de surfactante.
• SOBRE O SISTEMA DIGESTÓRIO
Além do apetite maior e da ingestão alimentar, o HT aumenta a produção de secreções digestivas e
a motilidade do TGI. O hipertireoidismo, portanto, frequentemente resulta em diarreia, enquanto a
falta de HT pode causar constipação.
• SOBRE O METABOLISMO BASAL
Em linhas gerais, o metabolismo basal é a quantidade de energia necessária para o metabolismo em
um indivíduo em repouso, sem estresse, mantido a temperaturas constantes após 12 ou 14h sem
alimentação. Com efeito, os HT aumentam a atividade metabólica de quase todos os tecidos
corporais, de modo que o metabolismo basal aumenta de 60% a 100%.
Neste sentido, sabe-se que os HT aumentam o transporte ativo de íons através das membranas
celulares pela bomba de sódio e potássio, aumenta o número e a quantidade das mitocôndrias,
aumenta o consumo de oxigênio e, também, aumenta a produção de calor (efeito termogênico).
• SOBRE O METABOLISMO DE MACROMOLÉCULAS

Como se observa, é um hormônio que vai do


anabolismo ao catabolismo (ciclo de
substrato): ao mesmo tempo que, por
exemplo, realiza lipogênese, também faz
lipólise, ou, ao mesmo tempo que faz
gliconeogênese, realiza glicólise.
Os HT estimulam em quase todos os aspectos
o metabolismo de carboidratos, incluindo a
captação rápida de glicose, gliconeogênese,
absorção pelo TGI e, até mesmo, da secreção
de insulina.
No metabolismo lipídico, observa-se principalmente a rápida mobilização a partir do tecido adiposo,
o que reduz o acúmulo de gordura e acelera a concentração de AGL no plasma, os quais são mais
acentuadamente oxidados pelas células. Sobre as gorduras plasmáticas e hepáticas, observa-se a
redução das concentrações de colesterol, fosfolipídios e TAG, em que pese o aumento de AGL.
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Tanto a síntese quanto a degradação proteicas são estimuladas pelo HT. O estímulo da síntese pode
ser responsável por parte do efeito termogênico do HT, sendo certo, ainda, que o crescimento
normal está diretamente relacionado com a promoção dessa síntese proteica.

CLÍNICA
Hipertireoidismo: aumenta o consumo de oxigênio e a produção metabólica de calor. Devido ao
calor interno gerado, os pacientes têm pele quente e suada, podendo se queixar de intolerância ao
calor. Ademais, o excesso de hormônios da tireoide aumenta o catabolismo das proteínas e pode
causar fraqueza muscular, bem como perda de peso. Sobre o sistema nervoso, verifica-se reflexos
hiperexcitáveis e transtornos psicológicos. Há, ainda, influência nos receptores beta adrenérgicos do
coração, levando a batimentos rápidos e aumento da força de contração. A causa mais comum de
hipertireoidismo é a doença de Graves, em sede da qual o corpo produz anticorpos (imunoglobulinas
estimuladoras da tireoide) que mimetizam a ação do TSH, ligam-se aos receptores de TRH na
tireoide e causam hipertrofia da glândula (bócio), bem como os sintomas clássicos do excesso de HT.
O hipertireoidismo pode ser decorrente de doenças na própria tireoide (hipertireoidismo primário)
ou de doenças na hipófise, como tumores nas células produtoras de TSH (hipertireoidismo
secundário). Uma forma de determinar o tipo de hipertireoidismo é através da dosagem de TSH: no
caso da doença primária, a produção de T3 e T4 passa a ser independente da regulação do hormônio
tireotrófico, e as taxas elevadas de hormônios tireoidianos realizam feedback negativo intenso na
hipófise (altos níveis de T3 e T4 e baixos níveis de TSH). Já no caso da doença secundária, o tumor na
hipófise faz com que as células produtoras de TSH fiquem irresponsivas ao feedback negativo dos
hormônios tireoidianos, hiperestimulando a tireoide de forma contínua (altos níveis de TSH).
Hipotireoidismo: diminui o consumo de oxigênio e a taxa metabólica, de modo que os pacientes se
tornam mais
intolerantes ao frio pela baixa produção de calor interno. Com a baixa produção de proteínas, as
unhas se tornam quebradiças, ocorre perda de cabelo e a pele se torna fina e seca, podendo ocorrer
mixedemas (bolsas abaixo dos olhos). A alteração cardiovascular primária e a bradicardia.
Assim como no hipertireoidismo, o hipotireoidismo pode ser decorrente de doenças na própria
tireoide (hipotireoidismo primário) ou de doenças na hipófise (hipotireoidismo secundário). Uma
forma de determinar o tipo de hipotireoidismo é através da dosagem de TSH: no caso da doença
primária, a produção de T3 e T4 fica comprometida por problemas na tireoide, independentemente
dos níveis de TSH. Por isso, a baixa quantidade de hormônios tireoidianos circulantes estimula a
hipófise de forma contínua, o que acarreta altas taxas de TSH no organismo. Já no caso da doença
secundária, há deficiência na produção de TSH em quantidades normais mesmo com baixo feedback
negativo (baixos níveis de TSH), o que faz com que a tireoide não seja estimulada o suficiente para
produzir e secretar os níveis fisiológicos de hormônios tireoidianos.
REGULAÇÃO DA SECREÇÃO DOS HT
O controle da secreção dos HT segue o padrão hipotalâmico-hipofisário-glândula endócrina
periférica. O hormônio liberador de tireotrofinas (TRH) do hipotálamo controla a secreção do
hormônio adenohipofisário, a tireotrofina, também conhecida como hormônio estimulador da
tireoide (TSH). O TSH, por sua vez, atua na glândula tireoide para promover a síntese de HT, que
geralmente atuam como sinal de retroalimentação negativa para evitar a hipersecreção.

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