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RECLAMAÇÃO 57.

476 PERNAMBUCO

RELATOR : MIN. GILMAR MENDES


RECLTE.(S) : ANTONY ROCHA DA SILVA E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) : FILINTO DA COSTA PINTO NEVES FILHO
RECLDO.(A/S) : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE
PERNAMBUCO
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
BENEF.(A/S) : ESTADO DE PERNAMBUCO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE
PERNAMBUCO
BENEF.(A/S) : INSTITUTO DE APOIO À UNIVERSIDADE DE
PERNAMBUCO - IAUPE
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS

DECISÃO: Trata-se de reclamação constitucional proposta por


Antony Rocha da Silva e Marcos José Silva dos Santos, contra decisão do
Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, proferida nos autos do
Processo 0001114-32.2015.8.17.1090.
Sustenta, em síntese, que o ato reclamado está em desconformidade
com a orientação firmada por esta Corte no RE-RG 837.311 (tema 784),
paradigma da repercussão geral, ante a preterição dos candidatos, diante
da inexistência da cláusula de barreira quando da divulgação do edital do
certame.
Colhe-se da inicial:

“Na origem, trata-se de ação de obrigação de fazer


apresentada pelos reclamantes em face do Estado de
Pernambuco e da Instituição de Apoio à Universidade de
Pernambuco, acerca do concurso para soldados da Polícia
Militar de Pernambuco – PMPE do ano de 2009.
Aquele certame foi inaugurado pela Portaria Conjunta
SAD/SDS nº. 101 de 31 de agosto de 2009, para o preenchimento
de 2.100 (duas mil e cem) vagas.
Devido ao baixo número de preenchimento de vagas, foi
publicada a Portaria Conjunta SAD/SDS nº. 105 de 17 de
novembro de 2014 decidindo que:

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RCL 57476 / PE

(…)
Apesar da determinação da Portaria, apenas 1.108 (mil
cento e oito) candidatos foram devidamente nomeados e
empossados, quando o concurso foi encerrado no ano de 2015,
portanto, sem o preenchimento de todas as vagas disponíveis.
Logo em seguida, no ano de 2016, a Portaria Conjunta
SAD/SDS nº 25 de março de 2016 abriu novo concurso para o
cargo de soldados da PMPE, com um total de 1.500 (mil e
quinhentas) vagas.
(…)
O certame da PMPE 2009 não possuía nenhuma cláusula
de barreira que, como sabemos, deve estar expressa e
devidamente fundamentada no edital do concurso, apesar de
insistentemente ser a tese defendida pelo TJPE. Por esta razão,
os candidatos que, inicialmente, não seguiram para as fases
posteriores do certame, dentre eles os reclamantes, ficaram no
cadastro de reserva.
Pois bem! A portaria nº. 105 de 2014 previu que 2000 (dois
mil) candidatos seriam convocados, contudo, o Estado de
Pernambuco encerrou o certame com 892 (oitocentos e noventa
e duas) vagas em aberto. Fica evidente, portanto, a violação à
Repercussão Geral nº. 784 do Supremo Tribunal Federal – STF,
incorrendo o TJPE em usurpação dos poderes desta Corte”.
(eDOC 1, pp. 2-3)

Nesses termos, afirma que “o juízo do primeiro grau e o tribunal de


origem violaram o entendimento suso, quando permitiram que o Estado de
Pernambuco encerrasse o concurso da PMPE 2009 sem o preenchimento de todas
as vagas e, imediatamente após o encerramento, abrisse um novo certame para
provimento de 1500 (mil e quinhentas) vagas”. (eDOC 1, p. 9)
Assevera, ainda, que, com a promulgação da LC 498/2022 do Estado
de Pernambuco, evidenciou-se a violação ao Tema 784-RG, “uma vez que
permite que candidatos com notas inferiores aos reclamantes adentrem, de forma
definitiva, nos quadros da PMPE. Em anexo, estão processos onde candidatos
com notas inferiores aos reclamantes já se beneficiaram da LC”. (eDOC 1, p. 12)

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Requer, assim, a cassação do ato reclamado, “determinando o


prosseguimento dos reclamantes nas demais fases do certame da PMPE 2009 e,
no caso de êxito, que sejam devidamente nomeados e empossados”. (eDOC 1, p.
13)
A autoridade reclamada prestou informações. (eDOC 36)
Intimada, a parte reclamante promoveu a emenda à inicial. (eDOCs
39-45)
Registro, por fim, que a presente reclamação foi a mim distribuída
por prevenção à Rcl 38.214/PE, consoante certidão de eDOC 29.
É o relatório. Decido.
De início, dispenso a remessa dos autos à Procuradoria-Geral da
República, por entender que o processo já está em condições de
julgamento (RISTF, art. 52, parágrafo único).
Superada a questão, rememoro que, conforme disposto na
Constituição Federal, compete ao STF processar e julgar originariamente
reclamação para a preservação de sua competência e garantia da
autoridade de suas decisões (art. 102, I, “l”, da CF/88). Nesse sentido, o
Código de Processo Civil de 2015 estabelece o rol das hipóteses de
cabimento da reclamação, nos termos a seguir transcrito:

“Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do


Ministério Público para: I - preservar a competência do tribunal;
II - garantir a autoridade das decisões do tribunal; III – garantir
a observância de enunciado de súmula vinculante e de decisão
do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de
constitucionalidade; (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016)
IV – garantir a observância de acórdão proferido em julgamento
de incidente de resolução de demandas repetitivas ou de
incidente de assunção de competência (…). (Redação dada pela
Lei nº 13.256, de 2016)”.

O § 4º do mesmo artigo esclarece que as hipóteses dos incisos III e IV


compreendem a aplicação indevida da tese jurídica e sua não aplicação
aos casos que a ela correspondem.

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Verifica-se, ainda, nos termos do § 5º, que é inadmissível reclamação


proposta para garantir a observância de acórdão de recurso
extraordinário com repercussão geral reconhecida, exceto quando
comprovado o esgotamento das instâncias ordinárias, com a devida
interposição e julgamento do agravo interno, previsto no art. 1.030, § 2º,
do CPC, e a demonstração da teratologia da decisão.
Nesses termos, a reclamatória proposta para garantir a observância
de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida
somente será cabível quando presentes os seguintes pressupostos
necessários e cumulativos, quais sejam: o esgotamento da instância de
origem, com a interposição de agravo interno da decisão monocrática que
sobresta o feito, inadmite liminarmente o recurso da competência do STF
ou o julga prejudicado; a plausibilidade na tese de erronia na aplicação do
entendimento do Supremo Tribunal Federal firmado na repercussão geral
pelo Juízo a quo, a indicar teratologia da decisão reclamada.
Na hipótese dos autos, incabível inferir-se, nesse momento
processual, o descumprimento da orientação firmada por esta Corte no
julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário 837.311 (tema 784),
paradigma da repercussão geral, porquanto não se vislumbra o
esgotamento das instâncias exigido para o conhecimento da reclamação.
Nesses termos, a autoridade reclamada encaminhou informações
dando conta que “não houve a interposição do cabível agravo interno do art. 1.
021 do CPC”. (eDOC 36)
Ora, a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a
ausência de interposição de todos os recursos cabíveis demonstra a
ausência de esgotamento das vias ordinárias, o que inviabiliza o manejo
da reclamação. Confiram-se os seguintes precedentes:

“CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL.


EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO
AGRAVO INTERNO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE
RECURSAL. RECLAMAÇÃO. SUPOSTA VIOLAÇÃO AO
TEMA 96 DA REPERCUSSÃO GERAL. NÃO
EXAURIMENTO DAS INSTÂNCIAS RECURSAIS

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ORDINÁRIAS. UTILIZAÇÃO DA RECLAMAÇÃO COMO


SUBSTITUTIVO DE RECURSOS DE NATUREZA
ORDINÁRIA OU EXTRAORDINÁRIA. AGRAVO INTERNO
A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Não houve o pleno
exaurimento das instâncias recursais na origem, o que
inviabiliza o ajuizamento desta ação, uma vez que, nos termos
do art. 988, § 5º, inciso II, do CPC, o esgotamento dos meios
recursais a quo é pressuposto para o cabimento da Reclamação,
quando tem por fundamento a exigência de respeito a
precedente julgado por esta SUPREMA CORTE, em regime de
Repercussão Geral. 2. Esta CORTE já se pronunciou, por
diversas vezes, no sentido de que a reclamação constitucional
não deve ser utilizada como sucedâneo recursal ou atalho
processual para postular diretamente no STF a observação de
precedente vinculante estabelecido sob a sistemática da
Repercussão Geral, por não ser substitutivo de recurso ou de
ação rescisória. 3. Embargos Declaratórios recebidos como
Recurso de Agravo, ao qual se nega provimento”. (Rcl 37.313-
ED, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, DJe
12.12.2019, grifei)

“AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO


CONSTITUCIONAL. ALEGAÇÃO DE DESCUMPRIMENTO
DE DECISÃO PROFERIDA EM SEDE DE REPERCUSSÃO
GERAL. RE 924.456 (TEMA 754). AUSÊNCIA DE
ESGOTAMENTO DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. 1. O art.
988, § 5º, inciso II, do Código de Processo Civil condiciona a
admissibilidade da reclamação, nos casos em que se busca
assegurar a observância de entendimento firmado em sede de
repercussão geral, ao esgotamento das instâncias ordinárias. 2.
A ausência de interposição de todos os recursos cabíveis
demonstra a ausência de esgotamento das vias ordinárias,
inviabilizando o manejo da reclamação. 3. Agravo interno
conhecido e não provido”. (Rcl 35.437 AgR, Rel. Min. Rosa
Weber, Primeira Turma, DJe 1º.10.2019)

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Ademais, é assente na jurisprudência desta Corte que o instrumento


processual da reclamação não pode ser empregado como sucedâneo
recursal ou atalho processual para fazer chegar a causa diretamente ao
Supremo Tribunal Federal, conforme ocorre nestes autos.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes de ambas Turmas deste
Tribunal:

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO


EM RECLAMAÇÃO. REPERCUSSÃO GERAL. AUSÊNCIA DE
ESGOTAMENTO DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. 1. O
CPC/2015 prevê como requisito para o ajuizamento de
reclamação por alegação de afronta a tese firmada em
repercussão geral o esgotamento das instâncias ordinárias (art.
988, § 5º, II, do CPC/2015). Requisito não cumprido, na espécie.
2. Agravo interno a que se nega provimento, com aplicação da
multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, em caso de
decisão unânime”. (Rcl 32.306-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso,
Primeira Turma, Dje 6.2.2019)

“RECLAMAÇÃO ALEGADO DESRESPEITO À


AUTORIDADE DE DECISÃO QUE O SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL PROFERIU NO JULGAMENTO DE RECURSO
EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL
RECONHECIDA NECESSIDADE DE PRÉVIO E EFETIVO
EXAURIMENTO DAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS
INADEQUAÇÃO, NO CASO, DA UTILIZAÇÃO DA
RECLAMAÇÃO, QUE, ADEMAIS, NÃO SE QUALIFICA
COMO SUCEDÂNEO DE AÇÃO RESCISÓRIA, DE
RECURSOS OU DE AÇÕES JUDICIAIS EM GERAL
INCOGNOSCIBILIDADE DO INSTRUMENTO
RECLAMATÓRIO RECONHECIDA PELA DECISÃO
AGRAVADA RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO”. (Rcl
40.252 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe
20.8.2020)

Dessa forma, inadmissível a presente reclamação.

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Finalmente, registre-se que o Código de Processo Civil estabelece


determinação de citação do beneficiário da decisão impugnada, que terá
prazo de 15 (quinze) dias para apresentar a sua contestação (art. 989, III).
Consoante o art. 319, II, c/c o art. 321 do CPC, é ônus da parte
reclamante indicar o endereço atualizado do beneficiário da decisão
impugnada, sob pena de indeferimento da inicial.
A citação é dispensável em casos, como o presente, de
improcedência liminar do pedido. Entretanto, na eventualidade de
interposição de recurso, deverá a parte reclamante fornecer o endereço do
beneficiário do ato impugnado nesta sede reclamatória, para fins de
observância do art. 332, §4º, do CPC.
Ante o exposto, nego seguimento à reclamação (art. 21, § 1º, do
RISTF).

Publique-se.
Brasília, 18 de março de 2023.

Ministro GILMAR MENDES


Relator
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