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Legislação nacional

É grande a necessidade de uma reforma legal abrangente em Moçambique, por forma a


assegurar que a legislação existente cumpra com as disposições da Constituição e do
direito internacional. Disposições constitucionais como as relativas à Carta dos Direitos,
Deveres e Liberdades Fundamentais e à ratificação de tratados e acordos internacionais
serão ineficazes se não forem complementadas com legislação e regulamentação
nacional relativas a direitos humanos.

Houve alguns esforços bem sucedidos na revisão da legislação nacional com vista a
adequá-la aos padrões constitucional e internacional, como é o caso da nova Lei de
Terras de 1997,26 que prevê uma protecção reforçada dos direitos da mulher em relação
à terra. A lei reconhece, implicitamente, a validade do direito costumeiro na
administração e gestão da terra, ao dispor que normas e práticas implementadas em cada
comunidade poderão ser aplicadas por cidadãos relativamente à sua terra,27 desde que
não neguem o direito da mulher à igualdade, consagrado na Constituição.

A Lei da Família de 200428 também dá maior protecção aos direitos da mulher,


nomeadamente através do reconhecimento dos casamentos religiosos e tradicionais e da
protecção da mulher nas uniões de facto.29 A protecção da criança também foi
melhorada, por exemplo, com o aumento da idade mínima para o casamento (veja-se o
Secção 1.D. Reforma do sector da justiça).

Ainda se encontra em vigor legislação que contraria os padrões constitucional e


internacional, sendo urgente a sua revisão. Um exemplo flagrante é o Código de
Processo Penal31, que permite longos períodos de detenção sem acusação. O Código
encontra-se em processo de revisão, sendo importante observar a perspectiva que será
adoptada nas alterações relativas a processos criminais.

Estrutura dos tribunais Desenvolvimento histórico da estrutura dos tribunais No tempo


colonial, o sistema de justiça formal limitava-se aos tribunais coloniais das áreas
urbanas, que serviam os portugueses e uma minoria de cidadãos negros considerados
“assimilados”. A maioria dos moçambicanos era governado pelo direito costumeiro
local, imposto por funcionários portugueses através da cooptação de chefes e líderes
tradicionais. Estes tribunais tradicionais estavam amplamente associados a práticas de
corrupção e opressão.
Durante o período de transição para a independência, à medida que a FRELIMO foi
tendo o controlo de pequenas áreas em províncias do norte do país, estas começaram a
criar as suas próprias estruturas legais, que consistiam em tribunais presididos por
quatro a seis juízes eleitos no seio da comunidade.

Estes tribunais populares tomavam suas decisões através de diversos mecanismos de


consulta e respondiam perante as assembleias populares locais. Em 1978, a FRELIMO
introduziu a Lei da Organização Judiciária de Moçambique34, que reestruturou os
tribunais coloniais, condicionou a aplicação do direito costumeiro ao respeito pela
Constituição e estendeu a estrutura dos tribunais populares a todo o país.

A lei estabeleceu uma hierarquia de tribunais, com um Tribunal Popular Supremo,


tribunais provinciais, distritais e locais. Enquanto os tribunais locais funcionavam com
juízes eleitos no seio da comunidade e sem qualquer formação formal, os juízes
formados eram distribuídos pelos tribunais distritais, provinciais e Supremo. Tais juízes
aplicavam as leis formais herdadas da era colonial, enquanto que os juízes eleitos
julgavam de acordo com o senso comum, princípios de equidade e valores locais.

A implementação do sistema de tribunais populares melhorou o acesso dos cidadãos


moçambicanos à justiça, mas o severo impacto socioeconômico da guerra civil,
juntamente com as perturbações no contexto político, fizeram com que o sistema
precisasse desesperadamente de um reajuste na década de 1990. A Constituição de 1990
e a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais introduziram alterações fundamentais no
sistema judicial.

A Constituição de 1990 estabeleceu uma clara separação entre os poderes judiciário,


executivo e legislativo. Anteriormente, a Lei da Organização Judiciária de Moçambique
colocava os tribunais populares sob o controlo das assembleias populares locais, e em
termos de administração, sob a tutela do Ministério da Justiça.37 Ao nível distrital,
provincial e do Tribunal Supremo, os tribunais populares foram reconfigurados como
tribunais judiciais e, ao nível local, como tribunais comunitários. A Constituição de
2004 preservou esta mesma estrutura de base, que permanece em vigor.

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