Você está na página 1de 11

Um dos grandes desafios de toda entidade é manter a situação financeira equilibrada, de tal forma que os

compromissos assumidos sejam cumpridos com o menor impacto possível na rentabilidade da organização. Para
tanto, três instrumentos fundamentais são apresentados: Capital Circulante Líquido (CCL), Necessidade de Capital de
Giro (NCG) e Saldo em Tesouraria (ST).

7.1 CAPITAL CIRCULANTE LÍQUIDO

Para Assaf Neto (2015, p. 159), “[...] o conceito básico de equilíbrio financeiro fica evidenciado ao ser
demonstrado que toda aplicação de recursos no ativo deve ser financiada com fundos levantados a um prazo de
recuperação proporcional à aplicação efetuada”. Ou seja, as fontes de curto prazo (Passivo Circulante) devem ser
utilizadas para financiar as aplicações de curto prazo (Ativo Circulante).

1
Para tanto, tem-se o conceito de capital circulante líquido (CCL), que representa a diferença entre o ativo
circulante e o passivo circulante, ou a diferença entre o passivo não circulante somado ao patrimônio líquido e o ativo
não circulante.

Sendo positivo o CCL, significa que a empresa possui mais aplicações que fontes de financiamento no curto prazo.
Ou seja, o passivo circulante financia parte do ativo circulante, o restante é financiado por passivos de longo prazo ou
de patrimônio líquido, conforme o caso.
Mas não é tão simples! A análise de liquidez de curto prazo de uma entidade deve ser precedida da análise do ciclo
operacional financeiro dessa entidade.

7.2 NECESSIDADE DE CAPITAL DE GIRO

O ativo circulante é composto de duas partes: (a) uma parte relativa ao giro do próprio negócio (operacional) e que
é cíclica, pois é necessária para a manutenção das atividades básicas da entidade; e (b) outra parte não ligada às
atividades operacionais, tendo como regra a sazonalidade (itens financeiros). Com o passivo circulante ocorre da mesma
forma, ou seja, existem itens recorrentes em função da operação da empresa e itens onerosos, que não estão ligados
diretamente à atividade operacional da empresa, a não ser na função de seu financiamento. Portanto, é “importante
analisar a composição do capital circulante líquido, verificando-se quais os componentes operacionais e quais os itens
financeiros do ativo e do passivo circulantes, analisando-se, dessa forma, a necessidade de capital de giro e como ela
está sendo financiada [...]” (MARTINS; DINIZ; MIRANDA, 2018, p. 187).

Em geral, as principais contas componentes dos grupos operacional e financeiro do circulante são as seguintes:
•Ativo Circulante Operacional: clientes, diminuídos da provisão para devedores duvidosos, adiantamentos a
fornecedores, estoques, impostos a recuperar (IPI, ICMS), despesas antecipadas etc.
•Ativo Circulante Financeiro: disponibilidades,1 aplicações financeiras, créditos de empresas coligadas ou controladas;
imóveis para venda, equipamentos desativados disponibilizados para negociação (ativos não circulantes disponíveis
para venda) etc.
•Passivo Circulante Operacional: fornecedores, impostos (PIS/COFINS, ICMS, IPI, IR, CSSL), adiantamentos de
clientes, salários e encargos sociais, participações de empregados, despesas operacionais a pagar etc.
•Passivo Circulante Financeiro: empréstimos e financiamentos de curto prazo, duplicatas descontadas, dívidas com
coligadas e controladas etc.
Pela diferença entre ativo operacional e passivo operacional, tem-se a necessidade de capital de giro (NCG). Ou
seja, a necessidade de capital de giro representa a parte do ativo operacional que não é financiada por passivos
operacionais, devendo ser financiada por passivos financeiros de curto prazo ou por passivos não circulantes, o que seria
mais adequado, conforme apresenta a fórmula a seguir.

2
Mas os itens financeiros (ativos e passivos circulantes) também requerem atenção especial na análise de liquidez
de uma empresa.

7.3 SALDO EM TESOURARIA

O saldo em tesouraria é obtido pela diferença entre ativo financeiro e passivo financeiro, que sinaliza a política
financeira da empresa. Se positivo, indica que a empresa terá disponibilidade de recursos para garantir a liquidez no
curtíssimo prazo. Se negativo, pode evidenciar dificuldades financeiras iminentes, principalmente se a situação for
recorrente (MARQUES; BRAGA, 1995). A fórmula abaixo ilustra o cálculo do saldo em tesouraria.

O Saldo em Tesouraria (ST) também é igual ao Capital Circulante Líquido deduzido da Necessidade de Capital
Giro. A Figura 11 ilustra a composição do CCL, NCG e ST, bem como suas relações.

As diferentes composições que o CCL, NCG e ST podem assumir vão determinar a estrutura financeira de um
empreendimento em um dado período.
Note que esses indicadores apresentam valores absolutos, o que torna difícil a comparação entre empresas de
diferentes tamanhos. Para solucionar este problema, podem-se dividir os resultados obtidos pela receita líquida e
multiplicá-los por 365 dias. Assim, obtém-se CCL em dias de venda, NCG em dias de venda e ST em dias de venda.
Ou seja, são medidas relativas e comparáveis entre diferentes entidades.

3
7.4ANALISANDO CCL, NCG E ST

A análise do capital circulante líquido, da necessidade de capital de giro e do saldo em tesouraria, de forma
conjunta, poderá proporcionar importantes evidências sobre a liquidez de um empreendimento no curto prazo. A Figura
12 ilustra as possibilidades de administração de cada um desses itens, bem como a classificação de cada uma dessas
situações sugeridas por Braga (1991).

Uma empresa classificada como “Tipo I”, como pode ser observado na Figura 13, possui capital circulante líquido
positivo, pois seus ativos circulantes são maiores que seus passivos circulantes. A análise da composição desses itens
mostra que ela possui fontes de financiamento operacionais que cobrem todos os seus ativos operacionais e ainda sobram
recursos! Ou seja, ela talvez tenha prazos junto a fornecedores que cubram a rotação dos estoques e os recebimentos de
clientes com folga. Assim, sua necessidade de capital de giro é negativa.
Verifica-se ainda que essa empresa “Tipo I” possui ativos financeiros superiores aos passivos financeiros,
mostrando sobra de liquidez. Ou seja, seu saldo em tesouraria é positivo, pois seus ativos financeiros são financiados
em pequena parte por passivos financeiros; a maior parte vem dos passivos operacionais e a parte restante (neste
exemplo) pelos passivos de longo prazo.

4
Braga (1991) classifica esse tipo de empresas como “excelentes”, em termos de administração do capital giro.
Ainda de acordo com o autor, tal configuração pode ser encontrada entre empresas do setor comercial varejista.
A empresa “Tipo II” (Figura 14) possui CCL positivo, pois os ativos circulantes totais são maiores que os passivos
circulantes operacionais e financeiros. Mas mesmo assim, a entidade apresenta necessidade de capital giro positiva, pois
os seus passivos operacionais são insuficientes para financiarem suas aplicações operacionais de curto prazo. Nota-se
também que a empresa tem saldo em tesouraria positivo, pois os ativos financeiros são maiores que os passivos
financeiros nesse momento. Os recursos de longo prazo investidos no CCL garantirão a continuidade do saldo em
tesouraria positivo, se o nível de atividade for mantido.

Braga (1991) classifica as empresas do “Tipo II” como sendo empresas “sólidas” e entende que esse tipo de
empreendimento representa a posição mais comum no mercado.
A empresa “Tipo III” também apresenta CCL positivo, pois os ativos de curto prazo são superiores aos passivos
exigíveis no curto prazo. No entanto, sua necessidade de capital de giro é positiva, uma vez que os passivos operacionais
são insuficientes para financiar os ativos circulantes operacionais. Além disso, os passivos circulantes financeiros
(onerosos) são superiores aos ativos circulantes financeiros, conforme demonstra a Figura 15.

5
Para Braga (1991), as empresas do “Tipo III” evidenciam uma situação “insatisfatória”, pois se houver uma
recessão, por exemplo, os itens do ativo circulante operacional poderão ter dificuldades de realização, ao passo que o
passivo financeiro poderá se elevar em virtude das altas taxas de juros.
A empresa “Tipo IV” possui uma situação complicada: seu CCL é negativo e, o que é pior, sua necessidade de
capital de giro é positiva, já que não consegue financiar com seus passivos operacionais a sua operação. Além disso, seu
saldo em tesouraria é negativo, pois a empresa está financiando sua necessidade de capital de giro com empréstimos a
curto prazo. Aliás, seus passivos financeiros de curto prazo financiam inclusive parte de seu Ativo Não Circulante, o
que é de fato preocupante. A classificação utilizada por Braga para empresas com esse perfil é “péssima”.

A empresa “Tipo V”, apresentada na Figura 17, possui CCL negativo, pois seus ativos de curto prazo são
menores que os passivos circulantes, revelando insuficiência de recursos circulantes para fazer frente às necessidades
de curto prazo. Embora a necessidade de capital de giro seja negativa, em virtude do saldo em tesouraria negativo, Braga
(1991) classifica empresas com esse formato como “muito ruim”.

Finalmente, a empresa “Tipo VI” possui a seguinte situação: seu CCL é negativo, sua necessidade de capital
de giro também é negativa, já que consegue financiar, com seus passivos operacionais, todos os seus ativos operacionais.
E o seu saldo em tesouraria é positivo.
6
Braga (1991) classifica empresas com essa conjuntura como sendo “alto risco”, notadamente pelo uso de fontes
de curto prazo aplicadas em ativos não circulantes.
Em síntese, a empresa apresentará segurança em termos financeiros se seu CCL for maior que a Necessidade de
Capital de Giro, pois, nessa situação, as fontes de longo prazo (passivo não circulante) financiam as atividades
operacionais e seu saldo em tesouraria é positivo.
No capítulo seguinte discutiremos melhor alguns fatores relevantíssimos para se completar a análise do CCL e da
NCG.
No Quadro 22 é reproduzido o Balanço Patrimonial da Cia. Grega. Na sequência são calculados o capital circulante
líquido, a necessidade de capital de giro e o saldo em tesouraria da Cia. Grega para os três períodos.

7
QUADRO 22 – Balanço patrimonial da Cia. Grega

No Quadro 23 são apresentados o capital circulante líquido e a necessidade de capital de giro da Cia. Grega
para os três períodos.

8
Interpretando o CCL e NCG da Cia. Grega
Como pode ser notado no Quadro 23, o CCL da Cia. Grega é positivo em todos os períodos, revelando que os
recursos de curto prazo (ativo circulante) são suficientes para fazer frente aos compromissos de curto prazo (passivo
circulante) da entidade. Além disso, o CCL melhorou significativamente no período 3, demonstrando que a situação
financeira está melhorando com o passar dos períodos.
A NCG é positiva e crescente entre os períodos “2” e “3”. Como pode ser percebido, as fontes de passivo
operacional não crescem na mesma proporção que os ativos operacionais, tornando necessária a busca de fontes onerosas
de financiamento para fazer frente às necessidades de investimento na operação. Houve uma queda na necessidade de
capital de giro no período “2”, mas voltou a crescer no período “3”.
A evolução positiva das vendas fez com que os ativos operacionais da empresa aumentassem, muito embora os
passivos operacionais também tenham aumentado, mas estes foram em menor proporção. Ou seja, os acréscimos
ocorridos nas vendas, 68,2% no período “2” e 95,5% no período “3” tiveram por consequência os aumentos ocorridos
no contas a receber nos estoques, os quais contribuíram tanto para o aumento no CCL quanto na NCG.
O saldo em tesouraria também é positivo em todos os períodos, revelando que os ativos financeiros de curto prazo
são suficientes para liquidar os passivos financeiros de curto prazo. Ou seja, em termos de capital de giro pode-se dizer
que a empresa é sólida.

9
Exercícios

1) Com base no Balanço Patrimonial da Cia. Medusa, apresentado no Quadro 24, calcule o capital circulante líquido,
a necessidade de capital de giro e o saldo em tesouraria para os três períodos. Quais conclusões podem ser tiradas
dos valores apurados?

QUADRO 24 – Balanço patrimonial da Cia. Medusa

10
2) Com base no Balanço Patrimonial da Cia. Zeus, apresentado no Quadro 25, calcule o capital circulante líquido, a
necessidade de capital de giro e o saldo em tesouraria para os três períodos. Quais conclusões podem ser tiradas dos
valores apurados?

QUADRO 25 – Balanço patrimonial da Cia. Zeus

11

Você também pode gostar