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Introdução

Segundo o artigo 70.º da Constituição da República de Moçambique, os cidadãos têm o


direito de impugnar judicialmente contra os actos que violem os seus direitos e
interesses reconhecidos pela constituição e pela lei.

Porém, o artigo 33.º/1 da Lei do Contencioso Administrativo, diz que “só é admissível
recurso “contencioso” de actos administrativos definitivos e executórios”, que é uma
decisão com força obrigatória e dotada de exequibilidade sobre um determinado
assunto, tomada por um órgão de uma pessoa colectiva de direito público. Ou seja, aqui
prevalece o princípio da exaustão do acto administrativo nos meios administrativos
graciosos previstos no artigo 18.º da lei n.º14/2011 de 10 de Agosto, em que para o
administrado recorrer judicialmente sobre um acto administrativo arguido de vícios
determinante da sua nulidade, anulabilidade ou inexistência jurídica, este deve esgotar
toda reclamação graciosa.

No meu entender, este princípio é inconstitucional, e já é sabido que uma norma é


considerada inconstitucional quando é contrária ou viola os preceitos estabelecidos na
Constituição.

Portanto são consideradas inconstitucionais todas as previsões que impõem a


interposição de recurso hierárquico necessário como condição de acesso contencioso.

Resumindo, essa norma é inconstitucional porque põe em causa o princípio da plenitude


jurisdicional consagrado na lei fundamental. Portanto a CRM estabelece de forma
inequívoca que “o cidadão tem direito de recorrer aos tribunais contra actos que violem
seus direitos e interesses recnhecidos pela Constituição e pela lei. (artigo 70.º e 69.º
CRM): não prevê portanto a questão da definitividade e executoriedade do acto
administrativo que consta na alinea a) do artigo 1 do Decreto 30 conjugado ao artigo
33.º/1 da Lei do Contencioso Administrativo, como condição para o recurso
contencioso.

 Até que ponto o preceito estabelecido na Constituição da República de


Moçambique no seu artigo 70.º “Direito de recorrer aos tribunais”, tem
eficácia material como garantia dos administrados para fazer valer os seus
direitos?
Delimitação temática

De acordo com CERVO como sendo a selecção de um tópico ou parte a ser focalizada.
Entretanto, nas ideias deste escritor, o presente estudo será delimitado ao nível espacial,
temporal e disciplinar. Em outras palavras MARCONI & LAKATOS defendem que
delimitar “constitui sobretudo a sua limitação geográfica espacial com vista a realização
de uma boa pesquisa”.

O estudo enquadra-se na cadeira de Direito Administrativo e Contencioso


Administrativo..
O vocábulo “objetivo”, tomado em seu sentido genérico, denota pretensão,
intencionalidade – finalidades sempre propostas quando se deseja buscar, descobrir e
realizar qualquer acção. Nestes termos, RAMOS e NARANJO, citado por VIDA ,
defendem que os objectivos “permite precisar o fim da investigação e tem como
característica as especificidades orientadas para alcançar o que é central”, numa outro
perspectiva defende CERVO et all, quando defende que os objectivos (…) definem
muitas vezes, a natureza do trabalho, o tipo de problemas ser seleccionado e o material a
colectar. Assim o presente estudo desdobrasse em dos grandes objectivos,
nomeadamente: objectivo geral e objectivos específicos.

A presente pesquisa tem como obectivo central, compreender o alcance e a eficácia do


direito do cidadão impugnar judicialmente contra os actos que violem os seus direitos e
interesses, estabelecidos no artigo 70º da CRM.

E tem como objecticos específicos: abordar a efectividade das normas constitucionais,


identificar as formas de controlo da constitucionalidade dos actos.

Hipoteses

 H1: Propor a revisão da norma estabelecida no artigo 33.º/1 da Lei n.º7/2014 de


28 de Fevereiro.
 H2: O Estado moçambicano não adopta meios legais com vista a fiscalização da
constitucionalidade.
O estudo contribui para o cumprimento sério e efectivo das normas legais e o controlo
das mesmas por parte órgãos com competência face à violação dos direitos
fundamentais dos cidadãos, exclusivamente ao direito de recorrer aos tribunais.
Revisão da Literatura
Direitos fundamentais e direitos humanos

Os direitos fundamentais e os direitos humanos são situações jurídicas de bastante


complexidade, tanto ao nível conceitual como ao nível prático.

Pode dizer-se que os direitos humanos (e na sua raiz, os direitos fundamentais) são
aqueles direitos e liberdades que as pessoas detêm pelo simples facto de serem dotadas
de caráter humano, possuindo uma natureza essencial para garantir a existência do
indivíduo. Para além disso, considera-se que tanto os direitos fundamentais como os
direitos humanos estão intimamente ligados a uma visão de igualdade e de liberdade dos
indivíduos.

Jónatas Machado resume eficazmente este conceito, quando diz que:

“A primeira tese [dos direitos fundamentais], de inspiração


preponderantemente lockeana e kantiana, corresponde ao pensamento de
autores como Rawls, Dworkin, Richards, etc., que partindo de teses neo-
contratualistas ou de um discurso filosófico político-moral, procuram
identificar um conjunto de direitos fundamentais deduzidos a partir de
princípios de justiça (fairness) ou de prerrogativas morais da personalidade,
afirmando a sua inegociá vel prioridade na ordenação da comunidade
política.”

Os direitos fundamentais e os direitos humanos são muitas vezes definidos pela


sua finalidade: proteger poderes e esferas de liberdade das pessoas, aplicáveis
primordialmente na relação pessoa Estado.
Os direitos fundamentais podem também ser definidos com o recurso a uma
abordagem positivista que os define através de sua inclusão em um texto constitucional.
Isto é, os direitos fundamentais são resultado de um processo de constitucionalização.
CANOTILHO refere este processo como a incorporação de direitos subjectivos
do homem em normas formalmente básicas, subtraindo-se o seu reconhecimento e
garantia à disponibilidade do legislador originário (p.378)1.
MIRANDA2considera que os direitos fundamentais são entendidos como os
direitos ou as condições jurídicas subjectiva das pessoas enquanto tais, individual ou
institucionalmente consideradas, assentes na constituição.

1
CANOTILHO, Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituiçao pag. 378.
2
MIRANDA, Jorge. Direitos Fundamentais: Introdução geral.pág.90
Resumindo, o principal ponto entre os direitos fundamentais e os direitos humanos é a
sua fonte, onde os direitos fundamentais são encontrados positivados nos ordenamentos
jurídicos de cada Estado, enquanto os direitos humanos referem-se as garantias
fundamentais integrantes do direito internacional. Em termos gerais os direitos humanos
são os direitos da pessoa humana como tal, válidos para todos os povos e em todos os
tempos.

Características e Classificação dos Direitos Fundamentais e dos


Direitos Humanos

Como já exposto, a compreensão do conceito dos direitos fundamentais e dos direitos


humanos apoia-se em uma análise das suas características e classificações. As principais
características quer dos direitos fundamentais, quer dos direitos humanos são:
fundamentabilidade, universalidade, inalienabilidade, indivisibilidade, interdependência
e inter-relação.

a) Fundamental: estes direitos representam questões essenciais para o ser


humano, no que respeita à sua existência e à sua autonomia. Eles contêm uma
natureza de necessidade, não representando somente aspetos desejáveis. São
direitos inerentes à própria noção de pessoa humana, como direitos básicos das
pessoas.
b) Universal: todas as pessoas podem ser titulares destes direitos. No âmbito
internacional, esta característica significa que todas as pessoas,
independentemente do local onde residam, da sua nacionalidade ou cultura
possuem direitos humanos. As existências de categorias de direitos
especificamente relevantes a certos grupos, por exemplo, mulheres, crianças e
pessoas portadoras de deficiência, não ferem a característica de universalidade
dos direitos humanos e dos direitos fundamentais (trata-se das designadas
diferenciações positivas, necessárias ao respeito pelo princípio da igualdade,
como será visto infra.
c) Inalienável: o caráter de inalienabilidade é um dos mais proeminentes dos
direitos fundamentais e dos direitos humanos. Esta característica refere-se à
permanência e à indisponibilidade destas garantias, significando que estas
garantias não podem ser retiradas, exceto em certas circunstâncias e de acordo
com os procedimentos aplicáveis, e o seu titular não pode dispor, abdicar delas.
Estes direitos extinguem-se somente com a morte do titular.
d) Interdependentes e Interrelacionados: esta característica relaciona-se
principalmente com a implementação destas garantias, provendo que o gozo de
um direito tem impacto no gozo de outro direito. Estas relações encontram
aplicação tanto nos direitos económicos, sociais, e culturais como nos direitos
civis e políticos.

Funções dos direitos fundamentais e dos direitos humanos


Na tarefa de conceptualização dos direitos fundamentais e dos direitos humanos pode
utilizar-se uma análise funcional destas normas. Neste âmbito, Gomes Canotilho. vem à
nossa assistência identificando quatro funções primordiais dos direitos fundamentais
(que representam também funções dos direitos humanos):

i. função de não-discriminação;
ii. função de defesa ou liberdade;
iii. função de prestação social; e
iv. função de proteção perante terceiros.

A função de não-discriminação enraíza-se na visão de igualdade que se encontra no seio


do conceito dos direitos fundamentais. Esta função primária e básica visa assegurar que
o Estado trate todos sob sua jurisdição como indivíduos fundamentalmente iguais.

A função de defesa está proximamente relacionada com a defesa da pessoa humana e da


sua dignidade perante os poderes estatais. Esta função é bem acentuada nos direitos,
liberdades e garantias pessoais (normalmente categorizados como direitos civis e
políticos no âmbito internacional).

Os direitos fundamentais também possuem uma função de prestação social e esta pode
ser resumida como a capacidade dos indivíduos, por virtude da titularidade dos direitos
fundamentais, de obter algo através do Estado, como por exemplo, saúde, educação e
segurança social. Esta função é normalmente servida pelos direitos económicos, sociais
e culturais.

Esta função condiciona o Estado à criação de normas reguladoras de relações jurídico-


civis capazes de garantir a observância dos direitos fundamentais na relação entre
indivíduos (esta questão é também denominada de aplicação horizontal dos direitos
fundamentais).

Garantia da Constituição em geral

A importância da defesa da Constituição

A preocupação com a defesa da Constituição é a outra face da constitucionalidade, não


já numa perspectiva normativo-sistemática, quanto numa óptica de protecção da Ordem
Constitucional estabelecida.

Por força da importância da defesa da Constituição, os mecanismos que se alinham


nesse desidrato são múltiplos, podendo apresentar - se como:

 Garantias internas e garantias externas: as primeiras integrando – se dentro


da própria Ordem Constitucional, enquanto que as outras funcionando a partir
do exterior da Ordem Constitucional;
 Garantias gerais e garantias específicas: as primeiras tendo uma vocação
irradiante para toda a Constituição, ao passo que as outras se limitando a
segmentos mais específicos da Ordem Constitucional;
 Garantias políticas, legislativas, administrativas ou judiciais: cada uma delas
dependendo da natureza do órgão que a protagoniza;
 Garantias ordinárias e garantias extraordinárias: as primeiras ocorrendo na
normalidade da vida do Estado, diversamente das outras, surgindo apenas em
momentos de crise constitucional.

As garantias são normas que asseguram o exercício do interesse, normas que protegem
os direitos positivamente consagrados pelo Estado no texto constitucional. São remédios
constitucionais.

A constituição é a regra estruturante do Estado e da sociedade, cuja tarefa das mais


relevantes é a protecção e a garantia dos direitos e liberdades fundamentais, vinculando
os órgãos de poder em termos não só políticos, mas também jurídicos, limitando o
exercício da autoridade.
Para que os direitos e liberdades reconhecidos constitucionalmente sejam efectivos, é
necessário que haja uma série de garantias jurídicas que compreendem um conjunto de
instrumentos legais e processuais reconhecidos.

Na maior ameaça aos direitos e liberdades uma das primeiras medidas a serem tomadas
é a suspensão das garantias constitucionais. No entender do estudo, o conceito garantias
constitucionais tem uma finalidade geral, velar pelos direitos e liberdades do indivíduo.
Uma ferramenta jurídica essencial em todo e qualquer Estado de Direito. Do contrário,
os cidadãos ficariam desprotegidos pelas leis diante de qualquer possível abuso.

A luz da Constituição da República de Moçambique, art.72, as liberdades e


garantias individuais só podem ser suspensas ou limitadas, temporariamente, em virtude
de declaração do estado de guerra, do estado de sítio ou do estado de emergência.

Sobre as garantias constitucionais, a CRM3 prevê no seu título XV, capitulo I o Estado
de Sitio e de Emergência - art.290º, no qual só podem ser declarados no todo ou em
parte do território, nos casos de agressão efectiva ou eminente, de grave ameaça ou
perturbação da ordem constitucional. Tal situação pode e deve ser equiparada ao actual
cenário vivenciado respectivamente no norte do país. Situação está que requer uma
actuação urgente dos órgãos do poder público, uma vez que a própria constituição já
prevê tais órgãos e os respectivos deveres especificamente individualizados no que
respeita as suas competências, e no caso em concreto, fundamenta o artigo 160, alínea
a) que claramente aflora a competência do Presidente da república para declarar o
referido estado de sítio, em função de garantia aos cidadãos sobre os seus direitos e
liberdades, uma vez que ele é o garante da Constituição conforme o n° 2 do art. 145.º.

 A revisão constitucional: a possibilidade de rever a Constituição, por ela


directamente aceite, inscreve – se, em último termo, no desejo da sua
perpetuação, desenhando – se os limites que não podem ser galgados, sob pena
de subversão da Ordem Constitucional e de já não haver revisão, mas uma
qualquer outra coisa, como a revolução ou a rutura constitucional;
 O estado de necessidade constitucional: a ocorrência de situações dramáticas
de perturbação da Ordem Constitucional obriga a tomar medidas muito drásticas
que interrompem largas parcelas dessa mesma Ordem Constitucional, que se

3
Constituição da República de Moçambique
alinham numa preocupação pela sua protecção última, não obstante o aparente
paradoxo de que para defender a Constituição é preciso suspendê-la e modificá-
la substancialmente;
 A fiscalização da constitucionalidade – a adopção de instrumentos
funcionalmente aptos à verificação das situações de violação da Constituição,
levadas a cabo no âmbito de competências específicas que apenas têm esse fito,
é o sinal mais forte da confirmação do objectivo de defesa da Ordem
Constitucional, o que vem a acontecer com a fiscalização da constitucionalidade.

Inconstitucionalidade

A inconstitucionalidade é a qualidade do que se opõe a constituição. Pressupõe


uma violação do que se encontra disposto na constituição, ou dos princípios neles
consignados.
Miranda, explica que a constitucionalidade e a inconstitucionalidade designam
conceitos de relação, isto é, “ a relação que se estabelece entre uma coisa (constituição)
e outra coisa (um comportamento), que está conforme ou não, que com ela é compatível
ou não, que cabe ou não ao seu sentido”. (p.273-274).4
A inconstitucionalidade não abrange apenas a actuação dissonante com a
constituição, mas também a omissão em face de um dever constitucional.
Assim, da Cunha Júnior afirma:
“É tão inconstitucional uma acção normativa estatal em contraste
com a constituição, como uma omissão indevida em face da mesma. Há pois,
omissão inconstitucional quando devendo agir para tornar efectiva uma
norma constitucional, o poder público cai inerte, abstendo-se
indubitavelmente. E essa omissão pressupõe o não cumprimento de uma
norma constitucional individualizada, ou seja, certa e determinada” (p.389).5

BERNARDES6explica que, “em termos gerais, a


inconstitucionalidade por omissão é a anomalia resultante da abstenção em
cumprir certos deveres constitucionais dirigidos a produção ou a actualização
das medidas necessárias para tornar plenamente efectiva uma determinada
norma constitucional. Contudo, o conceito de actos omissivos
inconstitucionais deve ser fixado com cautela, pois nem toda a inércia dos
órgãos constituídos afronta a ordem constitucional”. (BERNARDES, 2011,
p.527)
Este autor propõe que seja levado em conta não apenas o acto omissivo
inconstitucional em si, mas se essa omissão foi suficiente para comprometer ou ameaçar
a efectividade da constituição.
4
MIRANDA, Jorge. Direitos Fundamentais: Introdução geral. Pag. 273-274.
5
JÚNIOR, Dirley da Cunha. Noção de Inconstitucionalidade. Pag. 389.
6
BERNARDES, Juliano Taveira. In: JUNIOR, FredieDidier (ORG). Acções Constitucionais. Pag. 523-562.
Para PIOVESAN, a omissão inconstitucional possuiria as seguintes
características: “ a falta ou insuficiência de medidas legislativas; a falta de adopção de
medidas politicas ou de governo e a falta de implementação de medidas administrativas,
incluindo as medidas de natureza regulamentar, ou de outros acto da Administração
Pública” (PIOVESAN, 2003, p.90).7

Controle de Constitucionalidade é tema de sobrelevada importância no estudo não só do


Direito Constitucional como também em relação a todos os demais ramos do Direito,
posto que a Carta Magna é, em última instância, a fonte primária de todo o
ordenamento.
Para compreender o mecanismo de Controle, por sua vez, faz-se necessário
perquirir sobre quais normas irá tal mecanismo incidir. De modo geral, pode-se dizer
que as normas primárias, quais sejam as que encontram seu fundamento de existência na
própria Constituição, são os veículos normativos sujeitos a tal Controle.
No entanto, compreender que tais normas são o objeto do Controle tal como ele
se afeiçoa em Moçambique não é suficiente. É preciso entender quais os tipos de
inconstitucionalidade que podem as afligir. O objetivo do presente texto, de maneira
breve e didática, é esse.

1. Inconstitucionalidade por ação x por omissão

A primeira dessas duas formas de inconstitucionalidade se apresenta por meio de uma


conduta positiva do Poder Público. Ocorre com a edição de uma lei ou resolução, por
exemplo, que afrontem a sistemática constitucional.
A segunda advém, por seu turno, de uma abstenção. O Poder Púbico, no momento em
que deveria agir, silencia. Ocorre em face das normas de eficácia limitada, ou seja,
aquela cuja força normativa depende da edição de ato infraconstitucional. Para sanar tal
inconstitucionalidade há a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão.

2. Inconstitucionalidade material x formal

A material se apresenta quando a violação é ao conteúdo da Constituição. Uma norma


que, por exemplo, permitisse a exploração do trabalho em condições próximas à
degradante seria materialmente inconstitucional por afronta ao conteúdo de um dos

7
PIOVESAN, Flávia. Noção de Inconstitucionalidade. pag. 90.
fundamentos da República, qual seja o valor social do trabalho. Tal
inconstitucionalidade persistiria mesmo que a norma seguisse todas as etapas formais do
processo legislativo.
Já a inconstitucionalidade formal se configura quando algum dos requisitos
procedimentais da elaboração normativa é desrespeitado, seja a competência para
disciplinar a matéria, seja um quórum específico ou mesmo um pressuposto objetivo
para editar o ato normativo. Um exemplo é o pressuposto de relevância e urgência da
Medida Provisória, constantemente desrespeitado hodiernamente.

3. Inconstitucionalidade total x parcial

Neste caso, a classificação é quase auto-explicativa. A total atinge a integralidade da


norma, enquanto a parcial atinge um trecho, um artigo ou, até mesmo, uma expressão ou
palavra mal colocada, eivando a norma de vício constitucional.

4. Inconstitucionalidade direta x indireta

A direta atinge as normas primárias, acima conceituadas. A indireta, ou reflexa,


entretanto se verifica quando um decreto do Executivo, por exemplo, exorbita dos
limites legais e se torna indiretamente inconstitucional. Em verdade ele padece, em
primeiro plano, de um vício de legalidade.

5. Inconstitucionalidade originária x superveniente

Nesse caso, há a análise de duas normas: uma, a constitucional, chamada de parâmetro,


a outra, a infraconstitucional, chamada de objeto. Assim analisa-se a constitucionalidade
da norma objeto de acordo com a norma parâmetro vigente.
Assim, a inconstitucionalidade originária ocorre quando a norma nasce inconstitucional
em relação ao parâmetro vigente. A superveniente, por seu turno se apresenta quando
uma nova ordem constitucional desponta, tornando a norma infraconstitucional anterior
inconstitucional.

As omissões inconstitucionais no geral


A existência de omissões juridicamente relevantes é um fenómeno que se
encontra nas mais diversas áreas jurídicas. Ela verifica-se sempre que, perante uma
obrigação de fazer ou praticar certo acto ou certa actividade, mandada directa ou
indirectamente por norma reguladora de certa relação ou situação, o destinatário não o
faça, não o faça nos termos exigidos, não o faça em tempo útil.
Relativamente a quaisquer funções do Estado que seja objecto de disciplina
pela constituição, podem existir possíveis manifestações, e não apenas teóricas, de
comportamentos omissivos, sejam omissões de actos normativos ou se conteúdo não
normativo, individual e concreto. Sucede com a função legislativa e com a função
política ou de governo, sucede com a função administrativa e pode suceder também com
a função jurisdicional. Tais comportamentos vêm a ser inconstitucionais ou ilegais,
consoante os casos e podem ainda revelar-se ilícitos.
Para Canotilho, as constituições portuguesa e brasileira consistem em
fundamentos de validade dos ordenamentos jurídicos em que actuam e são compostas
por regras e princípios, categorias normativas abertas e qualitativamente distintas mas
que devem aliar estabilidade e capacidade de adopção as mudanças de concepção e as
modificações da realidade. (p. 1159).8
Âmbito específico: Omissões Legislativas
Porque não interessa generalizar, o estudo funda ou assenta-se nas omissões
legislativas por se entender que delas resulta a hipótese concebível de
inconstitucionalidade por omissão em certas configurações da constituição prospectiva,
cujos princípios exijam a concretização progressiva de certas providências por via
constitucional e quando isso não se verifique.
Saber em que consiste a inércia legislativa é a questão primordial no estudo da
inconstitucionalidade por omissão. Porquanto, cabe afirmar que a omissão legislativa
inconstitucional não decorre apenas de uma simples abstenção ao não fazer, mas
também de não fazer aquilo a que se estava constitucionalmente obrigado de forma
escrita.
Para Miranda, entre todas as omissões, sobressaem as legislativas devido à
relação imediata do legislador com a Constituição. A aplicabilidade imediata das
normas constitucionais, em particular das normas que consagram os direitos
fundamentais, é imprescindível a intervenção do legislador no que respeita ao seu
conteúdo essencial. (p.76 e p.333)9
Esta omissão é entendida como a falta de medidas legislativas necessárias, falta
esta que pode ser total ou parcial. Isto significa que a violação da constituição provém

8
CANOTILHO, José Gomes, Direito Constitucional. pag.1159.
9
MIRANDA, Jorge. Direitos Fundamentais: Introdução Geral.Pag. 76 e 333.
por vezes da inércia do legislador e outras vezes da sua deficiente actividade. Desta
forma, compete ao órgão de fiscalização, pronunciar-se sobre a adequação da norma
legal a constituição.
A constituição portuguesa dispõe do artigo 277º que define a
inconstitucionalidade por acção. Salientar que ao contrário daquele, o artigo283º ainda
da constituição portuguesa, não refere expressamente o incumprimento de princípios
consagrados na lei maior como possível fundamento da inconstitucionalidade por
omissão. Pelo que, deve ser admitida a existência de inércia inconstitucional no caso de
inobservância de princípios escritos.
Deste modo, se a constituição não estiver a ser cumprida por de
desenvolvimento de princípios constitucionais efeitos, vê-se razão para que o Conselho
Constitucional apreciar este incumprimento.

Já é conhecido o conceito de normas não exequíveis por si mesmas, nas quais


se regista por motivos diversos de organização social, política e jurídica. Num breve
deslumbramento, temos o primeiro comando que consubstancialmente determina um
objectivo, atribui um certo direito e prevê certo órgão. Temos de seguida um segundo
comando, seja ele implícito ou não, que requer a realização daquele objectivo previsto
no primeiro comando, a efectivação daquele direito, a constituição do órgão dependente
das normas adequadas a dispor os necessários instrumentos para tal efeito (cfr.
Manual…, II, pags.287 e segs)10.
É a necessidade de complementação por normas legislativas, da interpositio
legislatoris nesse sentido, integrando-a num quadro mais amplo, a fim de realizar a sua
finalidade específica, que identifica a norma constitucional não exequível por si mesma.
Nas normas exequíveis por si mesmas, os comandos constitucionais
actualizam-se só por si, já nas normas não exequíveis, aos comandos constitucionais
acrescem as normas legislativas. A não regulamentação ou a sua não concretização
determinam inconstitucionalidade por omissão. Daí, a necessidade de fiscalização dessa
inconstitucionalidade.
A fiscalização da inconstitucionalidade por omissão
Primeiramente, importa referir que não se pretende esgotar o tema sobre a
apreciação, mas apenas intensificar o estudo da matéria de fiscalização da
inconstitucionalidade por omissão, que a propósito, se apresenta como muito necessário,
10
-----------------------pag. 278.
visto que o nosso ordenamento jurídico não prevê, o que figura um grande obstáculo no
que respeita aos recursos que o nosso sistema oferece.
A Constituição moçambicana não consagra expressamente a possibilidade de
verificação da inconstitucionalidade por omissão. a relevância deste instituto pode ser
aferida em razão da disposição que consagra a fiscalização de constitucionalidade por
acção, de normas jurídicas como limites materiais à revisão constitucional.
A fiscalização da inconstitucionalidade por omissão visa implementar as
medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis certas normas constitucionais
programáticas que não goze de eficácia plena, por meio da ciência dada aos órgãos
legislativos competentes.
A existência de omissões juridicamente relevantes, é um fenómeno que se encontra em
diversos sectores do ordenamento jurídico, particularmente o direito constitucional.
Nesta senda, o princípio da constitucionalidade não diz respeito apenas as acções do
poder publico mas também abrange as omissões.
É importante perceber que a Constituição não é apenas um conjunto de normas
proibitivas, de organização e de competências, ou seja, limite negativo de actividade do
Estado, ela é também um conjunto de normas positivas, que exigem do Estado e seus
órgãos uma actividade, uma acção, que implica o limite positivo da actividade do
Estado. O incumprimento dessas normas por inércia ou por falta de medidas
legislativas, traduz-se numa infracção da Constituição, inconstitucionalidade por
omissão.
A inconstitucionalidade por omissão prevista no artigo 290ᵒ conjugado com o
art. 72ᵒ da CRM, não possui carácter preventivo, uma vez que o tribunal só poderá
reconhecer a posterior a inconstitucionalidade diante da ausência das medidas
legislativas necessárias para a efectivação da norma constitucional programática.
É extremamente necessário que se tome por relevante o não cumprimento da
das normas constituição que se manifesta através do incumprimento, omissão no caso
em concreto das normas constitucionais devidamente individualizadas.
A inconstitucionalidade por omissão aqui abordada não se afere em face do
sistema constitucional como um bloco, a violação é aferida olhando uma norma violada,
não necessariamente ao conjunto de regras e princípios. Isto significa que a
inconstitucionalidade por omissão implica a preterição de um determinado dever do
legislador.
A intervenção do legislador não é aqui reconduzida ao dever que incumbe
sobre os órgãos de soberania competentes para atender as necessidades gerais da
legislação, ou seja, não reconduz ao dever geral de legislar, mas sim, trata-se de algo
que deriva de uma incumbência específica e concreta ao encargo constitucional. Trata-
se de uma incumbência não apenas claramente definida quanto ao seu sentido e alcance,
sem deixar ao legislador qualquer margem de liberdade quanto a sua própria decisão de
intervir em tais termos, trata-se de uma verdadeira ordem de legislar, assim o
cumprimento das correspondentes normas fica de forma satisfeita efectivado.
O juízo da inconstitucionalidade por omissão é aqui traduzido num juízosobre
o tempo em que deveria ser produzida a lei, isto porque nenhuma omissão pode ser
descrita em abstracto, somente em concreto. A ausência ou insuficiência da norma legal
não pode ser afastada ou separada de determinado tempo, assinalado pela necessidade
de produção legislativa cuja duração será prefixada pela própria constituição ou pela
natureza da norma confrontada com a situação que a sua margem, o legislador esteja por
acção, ordinário a criar.

CAPÍTULO II: METODOLOGIA

Este capítulo dedica-se fundamentalmente na descrição do percurso metodológico usado


para o seu desenvolvimento.
Para MINAYO11 a metodologia é a discussão epistemológica sobre o caminho do
pensamento que o tema ou o objecto da pesquisa requer. Refere também que ela pode
ser definida como a apresentação adequada e justificada dos métodos, técnicas e dos
instrumentos operativos que devem ser utilizados para buscas relativas a indagações da
investigação.
2.1. Tipo de pesquisa
Para GIL, a pesquisa é definida como o procedimento racional e
sistemático que tem como objectivo proporcionar respostas aos problemas que
são propostos. Acrescenta ainda que a pesquisa se desenvolve por um processo
constituído de várias fases desde a formação do problema até a apresentação e
discussão dos resultados.

11
MINAYO, Mário Celso. O Desafio do Conhecimento. Pesquisa qualitativa em saúde. São Paulo:
HUCITEC, 2007.
2.2. Quanto a sua abordagem

O presente estudo adoptou a abordagem qualitativa. GIL12, considera a pesquisa


qualitativa como sendo a relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, ou seja, um
vínculo indispensável entre o mundo objectivo e o subjectivo, que não se pode traduzir
em números.

2.3. Quanto aos objectivos

Trata-se de uma pesquisa exploratória pois pretende-se conhecer a realidade do


fenómeno e levantar hipóteses implicando assim, conhecer e explicar a situação actual
do objecto de estudo ou investigação que é a questão da inconstitucionalidade.

Para GIL, este tipo de pesquisa tem como objectivo proporcionar maior familiaridade
com o problema, de forma a torna-lo mais explícito ou a construir hipóteses.

2.4. Quanto aos procedimentos

Para FONSECA13, “ Existem pesquisas científicas que se baseiam unicamente


na pesquisa bibliográfica, procurando referências teóricas publicadas com o objectivo
de recolher informações ou conhecimentos prévios sobre o problema a respeito do qual
se estuda e se procura resolver.

O presente estudo, sob o ponto de vista dos procedimentos, serve-se da


pesquisa bibliográfica, efectivada através do levantamento de referencias teóricas já
analisadas e publicadas por, meios escritos físicos e electrónicos respectivamente, livros
e artigos científicos.

12
GIL, António Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 5ºed. São Paulo: Atlas, 1999.
13
FONSECA, João José. Metodologia de Pesquisa Científica. Fortaleza: UEC, Apostila, 2002.
2.5. Universo e amostra da pesquisa

De acordo com LAKATOS E MARCONI, “ Universo é o conjunto de seres


animados ou inanimados que apresentam pelo menos uma característica em comum.”
(p.223)

Entende-se que a população indica a totalidade de indivíduos que possuem as


mesmas características definidas para um determinado estudo. Nesta senda, o estudo
abrange pessoas ligadas a área jurídica.

2.6. Amostra

Segundo os critérios que garantem a sua representatividade, a amostra constitui


um subconjunto do universo populacional. Assim, é adoptada a amostra representativa
probabilística por ser de carácter intencional. Logo, o estudo conta com 4 participantes,
respectivamente:

2.7. Técnica de recolha de dados

Em geral, toda a pesquisa necessita da aplicação de certas técnicas para


facilitar a recolha de informações necessárias para o seu desenvolvimento. Neste
contexto, o presente estudo adopta como técnicas de recolha de dados a entrevista, a
pesquisa documental e a observação participante.

2.8. Entrevista

Para LAKATOS E MARCONI14, “ a entrevista consiste numa conversa


efectuada verbalmente de forma metódica, proporcionando ao entrevistador a
informação necessária a consumação da pesquisa. A escolha deste método se deve ao
facto de se pretender perceber a realidade prática do objecto do estudo, por este ser novo
no nosso sistema.

2.9. Pesquisa documental

Segundo GIL, esta técnica é aplicada por ser aquela que busca informações
referentes a pessoas de maneira indirecta através de documentos como livros,

14
MARCONE, Maria de Andrade. LAKATOS, Eva Maria. Fundamentos de Metodologia Científica. 7ºed.
Atlas: São Paulo, 2010.
papéis oficiais e registos estáticos. A consulta documental proporcional ao
pesquisador, dados com qualidades suficientes, verdadeiros e fidedignos.

2.10. Instrumento de colecta de dados


Evidenciam-se como instrumentos de colecta de dados aplicados a pesquisa os
seguintes:
 Revisão bibliográfica: serão consultados manuais, monografias, trabalhos
académicos de conclusão de curso, leis, revistas e publicações avulsas.
 Literatura diversa: a recolha de dados empíricos e focalizados para a presente
pesquisa compreendem dois critérios:
a) Material disponível nas doutrinas;
b) Trabalho de campo, em locais previamente definidos, nomeadamente: instituições
localizadas na província da Zambézia, cidade de Quelimane;
c) Literatura electrónica: constituí um conjunto de sites online que versam sobre a
matéria em estudo.
2.11. Técnicas de análise e interpretação de dados
 Análise de documento: constitui uma forma de análise da legislação na ordem
jurídica interna e internacional que regula sobre a matéria em estudo.
 Análise bibliográfica: os dados são obtidos a partir de uma modalidade específica
de documentos, portanto, fontes escritas impressas em editoras, comercializadas em
livrarias e classificados em bibliotecas.
 Hermenêutica jurídica: método usado para confrontar os dados colhidos através
das teorias bibliográficas dos entrevistados.
4.2. ANÁLISE, INTERPRETACAO E DISCUSSAO DE DADOS
De acordo com MARCONI & LAKATOS, apresentar os dados colhidos serve para
conciliar o problema, levando como base a investigação e os resultados obtidos nas
entrevistas.
Desta forma, os resultados descritos e analisados a seguir, foram discutidos baseando-se
nas informações colhidas nas entrevistas e foram trabalhadas no sentido de mostrar a
necessidade da consagração da comissão como inconstitucional de modo a acautelas
situações de violação dos direitos fundamentais como consequência da inércia de
determinado órgão.
Com vista a trazer uma melhor compreensão do tema em análise, o processo da sua
interpretação com base nos objectivos traçados leva a criação de pontos de reflexão que
se apresenta a seguir.
2.12. Garantia jurisdicional da constituição
Com o estudo feito no campo de pesquisa, foi possível apurar que em Moçambique,
existe sim um sistema que fundamentalmente assegura a garantia da constituição, por
meio da fiscalização da constitucionalidade das leis e a ilegalidade dos actos normativos
dos órgãos do Estado pelos tribunais, cujo regime jurídico se compactua na lei numero
06/2006, de 2 de Agosto, que aprova a lei orgânica do Conselho Constitucional.

Estamos perante um mecanismo de protecção da ordem jurídica constitucional, de


garantia da existência da lei fundamental. Com a fiscalização se pretende assegurar a
observância da Constituição, bem como prevenir a criação de actos normativos que a
contrariem. Cabendo aos limites da revisão constitucional, garantir a estabilidade e a
conservação da Constituição.

2.13. Efectividade das normas constitucionais


Falar da efectividade das normas constitucionais é discutir a eficácia e aplicabilidade
dessas normas. É falar do facto real da observação da norma e isso só se verifica na
circunstância de uma conduta humana, respectivamente dos órgãos de soberania.

Sendo a constitucionalidade e inconstitucionalidade juízos decorrentes da relação que se


estabelece entre a constituição e um comportamento que com ela é ou não compatível.
Com base no estudo feito em campo sobre a inconstitucionalidade abranger não apenas
a acção mas também a omissão, foi possível apurar que o conceito inconstitucionalidade
para os entrevistados abrange apenas a actuação dissonante com a constituição.

Porquanto, importa destacar os elementos a observar na configuração da


inconstitucionalidade, onde encontramos:

 A constituição, como primeiro elemento da relação de inconstitucionalidade.


Constituição como regras e princípios.
 O comportamento do poder publico, sendo este normativo ou não, abstracto ou
concreto. O comportamento sob análise de direito interno que pode figurar como
positivo (uma acção) ou negativo (uma omissão), esta é fundamentalmente a
distinção para a compreensão do presente estudo.
Nesta senda, é inconstitucional o acto normativo produzido em dissonância com
a constituição, o que significa um desrespeito ao conteúdo por ela previsto, bem
como o silêncio que deixa de editar o acto normativo exigido apesar do dever
específico que lhe foi imposto por lei.

Assim, a Constituição como norma de suprema hierarquia, qualquer acção com


legislativa incompatível às suas normas será inválida. Ao passo que a inércia
passa a ser objecto de verificação da inconstitucionalidade por omissão, o que
claramente viabiliza a utilização de mecanismos de protecção, especificamente a
responsabilização civil do estado.

A não aplicabilidade das normas constitucionais pode ser explicada tendo em


atenção uma questão fundamental, a omissão do legislador. a inércia ou silencio
ao não cumprir determinada obrigação constitucional deriva da própria lacuna da
lei. Resulta dai um comportamento incompatível com a obrigação constitucional
de legislar, imposta pela própria constituição.

Com este efeito, a constituição exige do legislador a emissão de normas


regulamentadoras para que se torne viável o exercício de determinados direitos
assegurados no seu texto, compreendendo as normas declaratórias de principio
institutivo e programáticas.

O legislador dispõe de discricionariedade ampla para regulamentar a norma.


Assim sendo, torna-se inconstitucional a abstenção legislativa quando a
constituição impõe o dever de editar uma norma regulamentadora do texto
constitucional.

A comissão constitucional do legislador pode se verificar de maneira total ou


parcial. Onde na comissão total a inércia assume-se de maneira integral,
ocorrendo uma falta de acção do órgão competente, uma falta absoluta. Ao passo
que, na comissão parcial, decorre uma abstenção em parte, ou seja, o órgão
competente actua, mas actua de maneira incompleta e desta forma não atende
aquela que é a real exigência da constituição. E dai que deriva o não
cumprimento da norma preceituada, incumprimento por parte do órgão sobre o
qual a norma atribuiu dever.

No caso em discussão, o órgão legislativo actuou, tendo previsto a norma no


texto constitucional por via do titulo XV Garantias da Constituiçao, capitulo I,
com a epigrafe: Estado de Sitio ou de Emergência.

No entanto, no contexto do art.290, no ambito da declaração do Estado de Sítio,


o legislador usou o sentido de poder, uma faculdade, quando era certo usar o
sentido de dever. Desta forma, abre então o legislador, espaço para a não
observação do preceito legalmente estabelecido.

2.14. Normas programáticas na Constituição da República de Moçambique


É certo e concordamos através dos resultados apurados no campo de pesquisa, que
existem na Constituição da República de Moçambique, normas programáticas, que não
gozam de eficácia plena. Fica em causa assim, a garantia das exigências constitucionais
relativas aos direitos fundamentais, ou seja, como tornar exequível uma norma cuja sua
aplicação eficiente depende da actuação dum determinado órgão? Pode-se accionar a
verificação duma acção directa de inconstitucionalidade por omissão.

É importante consignar que esta acção tão pouco se destinaria a protecção de situações
individuais ou relações subjectivadas, mas sim a defesa da ordem jurídica visando a
preservação da ordem constitucional. Seu objectivo principal seria permitir a eficácia
plena as normas constitucionais. Busca-se aqui a protecção de um interesse pública, o
que a torna um processo de natureza objectiva, não há discussão de qualquer interesse
de agir individualizado. Devido a estas características há uma limitação dos titulares do
direito a acção directa de inconstitucionalidade por omissão, e se restringe a aqueles que
seriam capazes de representar eventualmente interesse público.

Em Portugal, a previsão dessa acção na Constituição da República consta da secção que


cuida das competências do Supremo Tribunal, está expressa no parágrafo segundo do
artigo 130º, cuja redacção foi dada pela emenda constitucional nº 3/1993, segundo a
qual, declarada inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efectiva norma
constitucional, será dada ciência ao poder competente para adopção das providências
necessárias
APRESENTAÇÃO DOS DADOS
Extracto de entrevista para magistrado do Ministério Público, Tribunal, Ordem
dos Advogados e Jurista.
1. A existência de um Estado de Direito pressupõe o respeito pela lei, pelos
princípios universalmente aceites e dos direitos humanos ora fundamentais. Sendo
Moçambique um Estado de Direito, possui um Sistema de garantia jurisdicional da
constituição?
Segundo MMP, sim existe. É através da fiscalização da (in) constitucionalidade da lei e
a ilegalidade dos actos normativos dos órgãos do estado, cujo regime jurídico é a lei nr
06/2006 de 02 de Agosto, que aprova a lei orgânica do Conselho Constitucional.
Para MJ, existe sim, e acrescentou o seguinte: o sistema de garantia jurisdicional
assenta no facto de o tribunal, nos feitos submetidos a julgamento, impõe a não
aplicação de leis e princípios que ofendam a constituição (art. 213 CRM).
J. Respondeu que sim, o Estado moçambicano possui um sistema de garantia
jurisdicional da constituição e acrescenta que o mesmo precisa ser aprimorado para sua
efectivação.
Segundo ADV, sim existe, e é na CRM em que podemos encontrar as garantias
constitucionais, através das quais o cidadão que sentir violados seus direitos pode
recorrer para os ver ressarcidos.
Bom, sobre este ponto depreende-se positivamente e concordamos todos que
Moçambique possui sim um sistema de garantia jurisdicional da constituição. Porem,
apresentam-se meios distintos. Cabe no entanto concordar com a primeira posição
avançando que a garantia da constituição é assegurada fundamentalmente por meio da
fiscalização da constitucionalidade da lei e ilegalidade dos actos normativos dos órgãos
do Estado, e, a revisão constitucional. São estes os meios que asseguram a observância
da constituição e previnem a criação de actos normativos que a contrariem. (art.299 e
segs. E art. 244 a 245, todos da CRM).
2. A constitucionalidade e inconstitucionalidade designam conceitos de relação
entre a constituição e um comportamento, se está conforme ou não, se com ela é
compatível ou não. Na sua opinião, a inconstitucionalidade abrange apenas a
actuação dissonante com a constituição ou também a omissão?
Segundo MMP, a inconstitucionalidade abrange apenas as normas e leis dissonantes
com a constituição, porquanto as omissões legislativas não estão garantidas para a sua
fiscalização, nos termos do nº 1 do artigo 244 da CRM.
Para MJ, a inconstitucionalidade abrange tanto a acção como a omissão. No entanto, os
casos de omissão têm sido de difícil apreciação por raras vezes ser suscitada nos pleitos
submetidos as instituições de administração da justiça.
J. Respondeu o seguinte: abarca também a omissão, embora de forma não sucinta, tendo
em conta o alcance do texto constitucional.
ADV respondeu que a inconstitucionalidade abrange apenas a actuação dissonante da
lei, o que pode na sua aplicação, traduzir-se na violação dos direitos humanos.

3. É certo que existem na CRM, normas programáticas, que não gozam de eficácia
plena, tornando-se eficazes por meio da actuação dos órgãos competentes da
administração. No entanto, diante da inércia desses órgãos sobre os quais a lei
atribui ciência, como tornar exequíveis essas normas com vista a salvaguarda dos
direitos fundamentais?
MMP, as normas programáticas por depender sob condição económica, torna difícil
garantir as exigências constitucionais e legais dos direitos fundamentais em qualquer
ordem jurídica. Mas encontra o seu eco na prestação de contas no campo político. Por
exemplo: naspressões da sociedade civil, manifestações populares, perda de mandato
através de eleições.
MJ respondeu que, para alcançar tal desiderato podem ser accionados mecanismos para
intervenção dos órgãos criados para o efeito, como seja a denúncia ao provedor de
justiça para acautelar tal facto. art. 255 e segs. CRM.
J. para tornar exequíveis é necessário que se criem leis infraconstitucionais de modo a
aflorar as consequências da inércia dos órgãos sobre os quais a lei atribui uma certa
competência.
ADV respondeu que as normas programáticas, embora estejam na Constituição da
República, a sua ineficácia não implica necessariamente uma inconstitucionalidade e
muito menos a omissão, depende de políticas públicas.
4. Havendo, por parte de um órgão de soberania, um comportamento omisso, que
seja objecto de disciplina pela constituição, existe uma medida legislativa
necessária a reparação deste comportamento?
MMP respondeu que sim, existem medidas, através do referendo, revisão
constitucional e propostas legislativas.
MJ respondeu o seguinte: dado que os órgãos de soberania são designados por
pessoas físicas, em casos de omissão do titular, poderá ser intimado a repor a
conduta lesiva por via do contencioso administrativo e/ ou responsabilidade civil.
Art. 32 segs. Da lei 7/2014 de 28 de Fevereiro.
J respondeu que sim, embora a norma não clarifique como tal, mas no entanto existe
um suporte legal que dá azo aos cidadãos um leque de garantias para se socorrerem
da violação dos seus direitos por parte da Administração Publica.
ADV, no meu ponto de vista não se trata de inconstitucionalidade.
5. Defendemos um sistema de administração da justiça que assegure os direitos e
liberdades fundamentais. Em casos de violação, agressão efectiva ou eminente, aos
referidos direitos e liberdades ou perturbação da ordem constitucional, a CRM
assiste algumas garantias? Se sim, qual?
MMP. Sim, existe. Dependendo do tipo de agressão, se vem do acto normativo ou de
simples facto administrativo. Se vier do acto normativo, terá a fiscalização da (in)
constitucionalidade sucessiva abstracta, a fiscalização preventiva através do referendo e
a fiscalização concreta nos termos do artigo 245, 136 e 246, todos da CRM, cujos
procedimentos tem regime jurídico da lei citada no ponto 1 deste.
As garantias dos actos administrativos são as contenciosas cujo regime é a lei nr
07/2014 de 28 de Fevereiro, e as administrativas como as reclamações, recurso
hierárquico e tutelar com, o regime jurídico da lei nº 14/2011 de 10 de Agosto.
MJ respondeu que existem. São os limites consignados na declaração do estado de sítio
ou estado de emergência, no que dispõe os art. 290 esegs. CRM.
Para J, partindo deste pressuposto, importa referir que a República de Moçambique é
um Estado de Direito, baseado no pluralismo de expressão, na organização política
democrática e no respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais do homem.
(art. 11 CRM).
ADV, várias garantias estão consagradas, nomeadamente: o recurso a instituição de
acesso a justiça, indemnização por parte do estado.
Sobre este ponto, assumindo que a violação do direito fundamental prove da omissão do
acto normativo, concordando com a posição do MMP, assiste a fiscalização da
constitucionalidade sucessiva. No entanto, assume-se que a violação prove da
abstinência de um dever imposto, nesse caso, da omissão duma norma administrativa,
incluindo direito público. As garantias dos actos administrativos são as contenciosas,
como refere o MMP.

6. Quanto ao acesso a jurisdição constitucional ao particular, existe uma acção


directa de inconstitucionalidade para a defesa dos direitos e liberdades
fundamentais que possa ser accionado por iniciativa do cidadão?
MMP. Não existe, na medida em que são apenas adstritos ao poder judiciário através da
fiscalização concreta.
MJ. Respondeu que a constituição não prevê tal mecanismo individualmente (art. 244
nº 2 alínea g)). No entanto, em caso de lesão, a lei ordinária assegura os mecanismos de
ressarcimento (código civil).
J respondeu que não, infelizmente o nosso texto constitucional não faz menção, apenas
confere o direito de solicitar a apreciação da inconstitucionalidade reunindo assinaturas
de dois mil cidadãos desde o momento que preencham os requisitos, como se depreende
o nº 2 do art. 244 CRM.
ADV, respondeu que é importante separar inconstitucionalidade de lei com a violação
de um direito. E acrescentou que quando se fala de inconstitucionalidade, deve se reunir
o número de assinaturas a submeter no Conselho Constitucional.
Assumindo que houve lesão dos direitos fundamentais por omissão de um órgão do
poder público, resultante da própria omissão legislativa, inviabilizando desta forma a
concretização das normas constitucionais, era lógico e prudentemente necessário que
houvesse um mecanismo a disposição do particular a que foi pesado um direito.
Verifica-se aqui a inércia do órgão competente no sentido de abstinência na consecução
de um acto administrativo concreto, como também uma abstinência na edição de um
acto normativo. Porquanto, legitima-se a intervenção do judiciário, em sede de acção de
inconstitucionalidade por omissão por se tratar especialmente da essência de medidas de
cunho normativo.
Assumindo que portanto podem propor a acção directa de inconstitucionalidade por
omissão, os mesmos sujeitos legitimados no art.244º nº2 al. a), mostra-se necessário
uma análise ao caso concreto, levando em consideração que o acto omissivo
questionado, afim de evitar a confusão contraditória de ser o sujeito legitimo
provocador da comissão simultaneamente o mesmo destinatário mencionado no artigo
supra, ou seja, o órgão que tem legitimidade para accionar a procedência da acção de
inconstitucionalidade ser o mesmo responsável da omissão questionada. Neste caso,
quando a comissão lhe for própria, não lhe será conferida a legitimidade de propor a
acção, a legitimidade será conferida aos demais sujeitos.
Porquanto, alguns dos sujeitos com legitimidade activa poderão ser sujeitos a exame de
pertinência temática afim de se comprovar a existência duma relação entre a comissão
inconstitucional e suas áreas de actuação, submetendo-se a esse critério objectivo de
qualificação da legitimidade da causa. Os requeridos são propriamente os órgãos
competentes, omissos, que deixaram de cumprir o que lhes foi imposto pelo texto
constitucional.

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