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Importa referir que o bem jurídico é um limite ao poder punitivo do estado e que o direito penal
deve ser tratado como um direito de última ratio. Releva ainda aferir se a norma incriminadora em
questão está em conformidade com a constituição, para tal é necessário o preenchimento de dois
pressupostos cumulativos: que a ação em causa ponha em perigo os direitos fundamentais
constitucionalmente protegidos e que o comportamento proibido cause de tal forma um
constrangimento à vida em sociedade que a torne impossível.
O primeiro princípio do direito penal que iremos atender é o Princípio da Legalidade (nullum
crimen, nulla poena sine lege) que se desdobra em três dimensões: nullum crimen, nulla poena sine lege
scripta; nullum crimen, nulla poena, sine lege certa; e nullum crimen, nulla poena sine lege praevia. Estas
três dimensões traduzem-se na necessidade de para que haja crime e pena da existência de uma lei
prévia, escrita, estrita e certa. Numa primeira instância, o princípio da legalidade traduz-se na limitação
capaz de evitar o exercicio estadual arbitrário e excessivo e a proteção de direitos.
(Relativamente ao direito internacional, a ideia de nullum crimen sine lege parece limitar aplicação deste no
OJ nacional. Importa atentar em duas ideias chave: o art.8º nº1 CRP que afirma que as normas e os princípios de direito
internacional são parte integrante do direito português e na ideia de que o conceito de lei abrange, na dimensão
internacional, o direito costumeiro e o ius gentium. Assim sendo, pelo conceito abrangente de lege no OJ internacional
e a sua integração no OJ português revela que não é necessário que uma lei aplicável em direito internacional tenha
de estar expressamente consagrada.)
O nullum crimen, nulla poena sine lege scripta remete para a reserva de lei da AR que aparece
consagrada no art.165º nº2 c) CRP e traduz-se na ideia de que a lei penal pertencente à reserva relativa
da AR é da competência da mesma, por vínculo à soberania popular, contudo o governo pode legislar
sobre esta matéria mediante decreto-lei autorizado. Importa ainda referir que a norma deve ser geral e
abastrata de forma a dirigir-se a todos por igual e a respeitar.
O nullum crimen, nulla poena sine lege certa remete para a necessidade de que a lei cumpra as
condições de certeza e determinabilidade, para que tal aconteça é necessária a presença de elementos
necessários específicos: a tipicidade, a ilicitude, a culpa e a punibilidade.
O nullum crimen, nulla poena sine lege praevia traduz-se no princípio da irretroatividade
previsto no art.29ºnº1 e nº4 da CRP, este princípio remete para a ideia de que a lei apenas respeita a
factos que possam ocorrer no futuro garantindo a proteção das expectativas do agente. Por fim, importa
referir que existe uma exceção a este princípio, a retroatividade da lei penal mais favorável ao arguido.
Em seguida iremos falar do Princípio da Jurisdicionalidade, nullum crimen, nulla poena sine lege
judicio, que deriva do princípio da separação de poderes. Este princípio engloba duas dimensões: a
intervenção de um magistrado judicial e a mediação penal. No primeiro caso, temos a garantia de uma
apreciação da responsabilidade penal do arguido e a determinação concreta da pena por parte de uma
magistrado independente e imparcial do qual pode resultar a suspensão provisória do processo, a
dispensa da pena e a possibilidade de extinção da responsabilidade penal, importa ainda referir que a
esta garantia acresce a garantia de acesso aos tribunais e a presunção de inocência consagrada no
art.32ºCRP. No caso da mediação penal, prevista na Lei nº21/2007 de 12 de Junho, temos um processo
informal, voluntário e confidencial que tem como objetivo obter um acordo entre arguido e ofendido de
forma a alcançar a reparação material ou simbólica do dano causado pelo ato crime cometido; releva
ainda referir que este conceito apenas se aplica a crimes patrimoniais com penas inferiores a 5 anos de
prisão e dependentes de acusação particular.
O Princípio da Autonomia afirma a independência do Direito Penal para com os outros ramos
do direito com dois fundamentos: na lei Penal há incriminações de comportamentos que não são ilícitos
noutros ramos de direito e no Direito Penal apenas se tem em vista conformar os comportamentos com
imperativos jurídicos de utilidade social e não reforçar a consciência moral das pessoas.
As teorias combinadas procuram a junção das teorias relativas e das teorias absolutas. As teorias
combinadas têm por base a ideia de que a pena promove fins preventivos especiais positivos e que a
culpa é o pressuposto limite da pena. Nestas teorias, o fundamento da pena é a prevenção de
reincidência pela procura de ressocialização e integração do condenado na comunidade.
As teorias reparadoras têm por base a ideia de restauração do equilíbrio perturbado pelo crime
e a procura da satisfação publica que se pode dar pela suspensão provisória do processo, a dispensa de
pena e a mediação penal, sendo esta última a única existente em Portugal.
Destas teorias o código penal português retira das teorias absolutas a retribuição como
correspondente à natureza da pena e das teorias relativas a ideia de a pena prosseguir fins de prevenção.
PENAS TENDENCIALMENTE FIXAS
As penas são tendencialmente fixas quando existe possibilidade de aplicação de institutos da
atenuação especial de pena e de dispensa de pena, que de algum modo permitem moldar a pena à luz
da culpa demonstrada pelo agente na prática do facto. contudo no Acórdão nº95/01 do TC é aferido
que a dispensa de pena é apenas aplicável a casos concretos muito restritos pois é necessário um grau
muito baixo de culpa e motivos de prevenção que não ditem aplicação de pena. Dito isto, importa atentar
em três princípios: O princípio da culpabilidade pois a pena tem como fundamento e limite a culpa, isto
é, não pode a pena exceder a medida da culpa, o que no caso das penas tendencialmente fixas é possível
visto não ser relevante o grau de culpa do agente para a aferição de pena; O princípio da
proporcionalidade afirma que a medida da pena deve ser proporcional à culpa do agente, na pena
tendencialmente fixa não dá para adequar a pena em função da culpa; O problema relativo ao princípio
da igualdade é que a lei fixa trata de forma igual situações diversas do ponto de vista pessoal. Assim
sendo, a tendência do Tribunal Constitucional é a de vir a considerar inconstitucionais as penas
tendencialmente fixas.
MONISMO E DUALISMO
O monismo não admite aplicação de medidas de segurança a imputáveis que tenham atuado
com culpa na prática de um determinado facto típico-ilícito, neste sistema as exigências de defesa social
por uma especial perigosidade encontram-se na pena. O monismo é alvo de críticas pois desvirtua a
ideia de culpa e condena o agente por razões estranhas ao princípio da culpabilidade.
No caso do sistema penal português é adotada uma visão híbrida, adotando do sistema dualista
aplicação de medidas de segurança a imputáveis como previsto no art.91º CP e adotando do sistema
monista o conceito de penas relativamente indeterminadas que devem ser aferidas pelo caso concreto
com base na culpa e na perigosidade como aparece consagrado no art.83º CP. Importa referir que a
pena e a medida de segurança são articuladas através do sistema vicariato de execução, no qual as
sanções surgem como “unidade de efeitos reciprocamente determinados” que se desdobra em três
fases: a medida de segurança deve ser executada antes da pena de prisão e nela descontada; na pena
a cumprir devem ser refletidos os efeitos úteis que tenham sido alcançados com a medida de segurança
anterior; e a execução no seu todo deve ser considerada na aplicação de medidas de substituição e
incidentes de execução que possam favorecer a socialização.
O DIREITO PENAL E OUTRAS FORMAS DE DIREITO SANCIONATÓRIO
Estão em causa normas provenientes de autoridade administrativa que num primeiro
momento (pré 25 de Abril) aparecem como um reforço do direito penal secundário que teve como
consequência uma híper criminalização; as violações de normas de direito administrativo ético-
socialmente neutros denominadas contravenções e transgressões integravam formalmente o Direito
Penal tendo por sanção uma multa. A problemática relativa à força das normas de natureza
administrativas tem por base a questão do processamentos destas normas ser da competência dos
tribunais comuns, isto levou a uma sobrecarga criminal e a atrasos que implicavam arquivação de muitos
processos, assim criou-se um sentimento de impunidade.
Num segundo momento (pós 25 de Abril), viu-se como inevitável a descriminalização tendo por
base um estado social vinculado à promoção da liberdade individual e como necessário assegurar a
força da vigência das normas de natureza administrativa. Foi então que Eberhart Schmidt criou um novo
típico de ilícito, o qual nominou de Contraordenações, estes ilícitos de mera ordenação social traduzem-
se em comportamentos violadores de normas de natureza estritamente administrativa e neutros do
ponto de vista ético-social que tem por consequência as coimas. Este novo conceito visa retirar do
âmbito do direito penal infrações de nula ou duvidosa relevância ético social e evitar que essas infrações
fossem objeto de ameaça por via de penas. As contraordenações são de competência das entidades
administrativas, apenas podendo ter natureza judicial em sede de recurso da decisão administrativa.
Relativamente à distinção entre contraordenação e crime ainda não foi definido um critério de
distinção. Em primeira instância, foi proposto que a distinção se fizesse pelo tipo de condutas
axiológicas, sendo as contraordenações condutas axiologicamente neutras e os crimes condutas
axiologicamente relevantes; contudo, esta ideia não resiste a prova da realidade quotidiana. Entende-se
que a resposta poderá ser encontrada no grau de tolerância social associada a cada tipo de conduta,
mas nada foi definido em concreto. A indefinição do critério de distinção já teve diversas consequências
como a multiplicação de diplomas legais do mesmo nível do RGCO incompatíveis com este; a questão
das grande contraordenações nos quais os valores da coima são superiores a valores de multa; e a
incerteza e imprevisibilidade dos critérios de determinação do montante a pagar.
Importa referir que o Direito Penal em sentido amplo inclui o Direito Processual Penal.
INTERPRETAÇÃO DA LEI
A interpretação traduz-se na análise do texto, conteúdo e significado da lei. Os autores iniciais
tinham alguma desconfiança relativamente à interpretação, contudo, agora, parece-nos implausível que
a lei dispense a interpretação. Existem dois pressupostos para aceitação da interpretação, num primeiro
momento é necessário aferir se a interpretação é admissível face ao teor literal da lei e o significado
comum das palavras; num segundo momento, a interpretação deve ser teleologicamente comandada e
funcionalmente justificada, de modo alcançar a finalidade da lei.
ANALOGIA
A analogia é proibida nos termos do art.1º nº3 CP, contudo importa atentar numa distinção feita
pelo próprio artigo sendo esta entre analogia in malam partem e a analogia in bonam partem; esta é
referente a normas expansivas do espaço de liberdade individual e aquela remete para as normas de
conteúdo restritivo de liberdade. Releva, ainda, referir que a analogia malam partem é proibida
enquanto a analogia bonam partem é permitida.
AS NORMAS PENAIS EM BRANCO
O Acórdão 102/2008 TC dá-nos um conceito amplo de norma penal em branco, no qual estas
consistem em toda e qualquer descrição incompleta de uma norma penal, independentemente da sua
concretização e um conceito de norma penal em branco restrito, que se traduz em normas que remetem
a integração da sua previsão para outras fontes.
Importa saber quais são estas fontes alvo de remissão: em primeira instância, releva atentar na
distinção entre normas penais em branco em sentido impróprio que apenas são proibidas se
descaracterizarem o ilícito e as normas penais em branco em sentido próprio que são permitidas se
tiverem um caráter de concretização técnica ou natureza meramente informativa. Em sentido prático as
NPEB em sentido impróprio traduzem-se nas fontes normativas legais hierarquicamente semelhantes à
lei penal e as NPEM em sentido próprio remetem para as fontes normativas legais hierarquicamente
inferiores à lei Penal, as fontes infralegais de origem estadual e não estadual e as fontes não normativas.
Releva aferir se as normas penais em branco violam o princípio da legalidade, para tal importa
atentar em duas ideias fundamentais, a reserva de lei da AR em matéria de normas penais e a certeza e
determinabilidade da lei como tipo de garantia. No que toca à reserva de lei as normas penais em branco
em sentido próprio são questionáveis em matéria de constitucionalidade orgânica pois neste caso as
definições do comportamento punido não dependerão de fonte legal com o nível exigido. No que toca
à certeza e determinabilidade como tipo de garantia as normas penais em branco podem causar
constrangimento ao conhecimento da lei por parte do homem médio ou implicar recurso a critérios
autónomos. Assim, é preciso que se identifiquem os elementos essenciais do crime: a ação, o nexo de
causalidade, o evento, o dolo, a negligencia, a ilicitude da ação, a inexistência de justificação, a
imputabilidade, a consciência da ilicitude, a exigibilidade de comporta conforme a ordem juridica, a
inexistência de causas de exculpação e a punibilidade do ato. Assim o Professor Germano Marques da
Silva de acordo com o Acórdão nº427/95 TC afirma que apenas as leis penal em sentido próprio
levantam problemas face ao princípio da legalidade, contudo é admissível a remissão desde que o
núcleo essencial da incriminação esteja determinado por lei.
Em suma, as normas penais em branco são admissíveis quando a norma em causa apenas reflita
sobre conceitos definidos na norma principal, se trate de uma mera aplicação de conhecimentos
técnicos ou de natureza informativa e quando a definição da natureza meramente técnica seja entendida
como um critério de prova pericial.
A sucessão de leis tem por base o prius punible, posterius punible, ergo punible, isto é, apenas
se dá quando o facto punível pela lei nova é o mesmo que o facto punível pela lei antiga. Importa referir
que dentro da sucessão de leis encontramos 3 casos com consequências distintas: no caso em que a lei
é declarada inconstitucional ou que é modificada a natureza juridica do facto de tal forma que se dê a
descriminalização do mesmo, a lei penal não é mais aplicável; no caso em que a lei modifica a norma
penal, aplica-se a lei mais favorável ao delinquente; e no caso de leis interpretativas, a lei não obriga
aplicação das mesmas. Releva ainda atentar ao que acontece à aplicação retroativa da lei penal mais
favorável ao caso julgado, de acordo com o Professor Germano Marques da Silva, o condenado pode
requerer a reabertura da audiência para que lhe seja aplicado o novo regime.
As leis processuais penais de acordo com o art.5º CPC são de aplicação imediata sem prejuízo
dos atos realizados na vigência de lei anterior. Importa referir que as leis processuais materiais estão
sujeitas ao princípio da aplicação mais favorável ao arguido podendo, então, ser aplicadas
retroativamente.
PRINCIPIOS DA RETROATIVIDADE
Descriminalização – a LN aplica-se em casos em que a sentença condenatória já tenha transitado em
julgamento
Leis intermediárias – as leis que entraram em vigor posteriormente à prática de um ato, mas já não estão
em vigor no tempo da apreciação judicial deste, proíbe-se aplicação da retroatividade de lei mais grave
posterior.
Leis temporárias ou excecionais – em regra, estas leis valem para todos os atos praticados durante a sua
vigência, mesmo que o julgamento seja realizado em momento posterior