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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO


COMARCA DE MARÍLIA
FORO DE MARÍLIA
VARA DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL
RUA LOURIVAL FREIRE ,120, Marilia-SP - CEP 17519-902
Horário de Atendimento ao Público: das 12h30min às18h00min

Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/pg/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1001534-02.2020.8.26.0344 e código 708394A.
SENTENÇA

Processo Digital nº: 1001534-02.2020.8.26.0344


Classe – Assunto: Procedimento do Juizado Especial Cível - Cancelamento de vôo
Requerente: Giovanni Antonio Pinto Alves
Requerido: Azul Linhas Aéreas Brasileiras S/A

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por GILBERTO FERREIRA DA ROCHA, liberado nos autos em 19/08/2021 às 12:56 .
Juiz(a) de Direito: Dr(a). Gilberto Ferreira da Rocha

Vistos.

Relatório dispensado a teor do art. 38 da Lei nº 9.099/95.

Fundamento e DECIDO.

Pelo que se extrai da inicial, aduz o requerente ter adquirido


passagem aérea junto à requerida, para viagem na data de 15/12/2017, partindo de Porto Alegre-
RS com destino a Marília-SP, com conexão em Campinas-SP. Pontua que, por ocasião do
embarque no Aeroporto de Viracopos, foi informado quanto ao cancelamento do voo, sendo que,
por não ter sido disponibilizada nenhuma acomodação em hotel, somente restou-lhe aceitar seguir
viagem por transporte terrestre. Ressalta, ainda, que o pneu do ônibus disponibilizado pela
requerida estourou, necessitando efetuar a troca de veículo às margens da rodovia. Assevera que,
em razão dos fatos ocorridos, sofreu atraso de 08 (oito) horas em relação ao horário de chegada ao
destino. Diante disso, requer a condenação da empresa requerida ao pagamento de indenização
por danos morais.

A empresa requerida, de sua parte, ofertou a peça contestatória de


págs. 29/45, alegando a ocorrência de problema técnico operacional que levou à necessidade de
manutenção emergencial e não programada da aeronave. Em razão disso é que ocorreu o
cancelamento do voo, sendo prestada toda assistência aos autores. Em vista disso, da ocorrência
de caso fortuito e força maior, é que não poderia ser responsabilizada civilmente pelo
cancelamento de voo. De resto, impugna a ocorrência dos danos morais e termina pedindo a
improcedência da causa.

Réplica às págs. 66/68.

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O pedido veiculado na inicial é procedente.

De início, cumpre destacar que a relação de direito material


havida entre as partes é de cunho consumerista, figurando a parte autora como consumidora e a
empresa ré como fornecedora de serviços de modo que no caso em apreço, aplicam-se as
disposições do CDC, valendo assinalar que em razão da verossimilhança das alegações e da
hipossuficiência técnica, plenamente possível a inversão do ônus da prova em favor da parte
consumidora nos termos do art. 6º, VIII do CDC.

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por GILBERTO FERREIRA DA ROCHA, liberado nos autos em 19/08/2021 às 12:56 .
No caso em apreço, constitui fato incontroverso nos autos a
ocorrência do cancelamento do voo, assim como a utilização de transporte rodoviário para trazer
os passageiros de Campinas até Marília. A ré não nega a ocorrência de tais fatos. Contudo,
procura justificar sua conduta argumentando a ocorrência de problemas técnicos na aeronave, o
que teria demandado a necessidade de manutenção não programada. Escora-se, portanto, na
ocorrência de caso fortuito ou de força maior para se eximir de sua responsabilidade.

Ora, a responsabilidade da empresa requerida, responsável pelo


transporte aéreo, é objetiva nos moldes do art. 14, CDC. A empresa de transporte aéreo deve
realizar o transporte dos passageiros e de seus pertences na forma como pactuado, o que não
ocorreu no caso presente.

Em contestação, a requerida sustenta que o cancelamento do voo


mencionado na inicial ocorreu por necessidade de "manutenção emergencial não programada da
aeronave", mas que foram prestadas as devidas assistências aos autores. Argumenta ausência de
sua responsabilidade, por se tratar de caso fortuito, imprevisível. Não se insurgiu,
especificamente, com relação ao atraso questionado pela parte autora.

Sucede que o fato relativo à manutenção da aeronave não se


enquadra como situação suficiente a repelir a responsabilidade da ré no tocante ao evento danoso
descrito na inicial. Aliás, cumpre destacar que aludida manutenção não configura caso fortuito
e/ou força maior, sendo, pois, forçosa a conclusão de que o problema apresentado na aeronave
estaria relacionado à negligência da companhia aérea quanto a sua devida manutenção. Além
disso, não há de se olvidar que, no caso em apreço, deve ser aplicada a teoria do risco da
atividade.

A propósito, já se decidiu:

“...Outrossim, verifica-se que a alegação de problemas na


manutenção da aeronave não configura, no presente caso, a ocorrência de caso fortuito, vez que

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referida manutenção inesperada é um risco da atividade da requerida, de modo que deveria ter
praticado ações com o intuito de minimizar os prejuízos suportados pelo autor em decorrência de
eventualidades relacionadas a sua atividade. ...” (TJSP - Apelação nº:
0027778-77.2011.8.26.0577. Órgão julgador 20ª Câmara de Direito Privado. Relator: Luis Carlos
de Barros. Data do julgamento: 17 de março de 2014)

“JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS. CONSUMIDOR. CONTRATO


DE TRANSPORTE AÉREO. ATRASO VOO E CANCELAMENTO DE VOO. ESPERA SUPERIOR

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A 4 (QUATRO) HORAS. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. RESPONSABILIDADE DO
FORNECEDOR DE SERVIÇOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA
MANTIDA. ... Resta caracterizada a falha na prestação dos serviços, já que a recorrente firmou
com o recorrido contrato que encerra obrigação de resultado. Tal situação traz aos
consumidores o sentimento de angústia e desconforto em face da delonga exagerada na solução
da questão e o desconforto da espera sem que se tenha a certeza do embarque. Danos morais
comprovados. ... A empresa recorrente responde objetivamente pelos danos ocasionados aos
consumidores, em virtude de falha na prestação dos serviços, consoante dispõe o art. 14 do
Código de Defesa do Consumidor. ...” (Processo nº 2011.01.1.039120-2 (538733), 1ª Turma
Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais/DF, Rel. Wilde Maria Silva Justiniano
Ribeiro. unânime, DJe 05.10.2011).

Anote-se que, em virtude da falha na prestação dos serviços da


requerida, a parte autora enfrentou atraso na viagem superior a 08 (oito) horas, porquanto o autor
pretendia chegar em Marília-SP às 14:40 horas, contudo, em razão do cancelamento do voo e do
transporte rodoviário, somente logrou chegar ao seu destino às 22:30 horas.

É neste sentido o depoimento da testemunha ouvida em juízo


Julia Aline de Lisboa Araujo, que vinha de Belo Horizonte-MG e igualmente teve o voo
cancelado, tendo aludida testemunha confirmado a falta de assistência aos passageiros, bem como
todos os percalços havidos com o transporte rodoviário disponibilizado pela ré, o qual, por sua
vez, culminou com a duração de oito horas da viagem, inicialmente prevista para durar apenas
uma.

Em sendo assim, ao meu sentir, não há qualquer dúvida quanto à


ocorrência dos danos morais ocasionados ao autor da demanda. Houve um atraso na sua chegada
em Marília, destino final, em oito horas. Além disso, o autor adquiriu passagens aéreas, de sorte
que o transporte seria muito mais rápido, cômodo e menos desgastante. Por certo, o autor não
adquiriu passagem rodoviária de Campinas a Marília. Houve, assim, uma frustração na justa
expectativa do consumidor. Diante desse cenário é que entendo caracterizado o dano moral.

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Cabe consignar, neste contexto, que a requerida não produziu
prova firme e segura no sentido de infirmar a tese do requerente quanto ao atraso da viagem.

Neste sentido, utiliza-se como critérios aqueles enunciados pelo


STJ, no REsp. 1.796.716, no qual se pronunciou pela necessidade de análise das circunstâncias do
caso concreto para configuração do dano moral passível de reparação: "6. Sem dúvida, as
circunstâncias que envolvem o caso concreto servirão de baliza para a possível comprovação e a
consequente constatação da ocorrência do dano moral. A exemplo, pode-se citar

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particularidades a serem observadas: i) a averiguação acerca do tempo que se levou para a
solução do problema, isto é, a real duração do atraso; ii) se a companhia aérea ofertou
alternativas para melhor atender aos passageiros; iii) se foram prestadas a tempo e modo
informações claras e precisas por parte da companhia aérea a fim de amenizar os desconfortos
inerentes à ocasião; iv) se foi oferecido suporte material (alimentação, hospedagem, etc.) quando
o atraso for considerável; v) se o passageiro, devido ao atraso da aeronave, acabou por perder
compromisso inadiável no destino, dentre outros.".

Diante disso, é seguro afirmar que, por conta da situação retratada


na inicial, a qual se originou da falha da prestação dos serviços, por parte da requerida, o
requerente, de fato, sofreu transtorno suficiente a causar-lhe abalos psíquicos, sendo, pois, aptos a
ensejarem a condenação da requerida ao pagamento da indenização por danos morais.

Pois bem.

Embora a lei não estabeleça os parâmetros para fixação dos danos


morais, impõe-se ao Magistrado observar os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, de
modo a arbitrar os danos morais de forma moderada, que não seja irrisório a ponto de não
desestimular o ofensor, e que não seja excessivo a ponto de configurar instrumento de
enriquecimento sem causa.

Dessa forma, levando-se em consideração as peculiaridades do


caso concreto, atento ao grau de culpa do ofensor, à gravidade do dano, à capacidade econômica
das partes e a reprovabilidade da conduta ilícita, considero o valor de R$8.000,00 (oito mil reais),
suficiente a compensar a parte autora e apto a desestimular novas condutas ilícitas por parte da
requerida.

Destarte, não resta alternativa senão a procedência do pedido,


observando-se, contudo, que, diante da natureza da demanda, o valor da indenização por danos
morais se mostra estimativo.

DISPOSITIVO

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Ante o exposto e considerando o mais que dos autos consta,
JULGO PROCEDENTE o pedido veiculado na inicial, o que faço para condenar a requerida a
pagar ao requerente a importância de R$8.000,00 (oito mil reais), a título de danos morais,
devidamente corrigidos e atualizados de acordo com a tabela do Tribunal de Justiça e acrescidos
de juros de mora de 1% ao mês, tudo a contar da presente sentença. Sem custas e honorários
advocatícios a teor do disposto no artigo 55 da Lei 9.099/95. Valor total das custas do preparo:
R$465,45 (quatrocentos e sessenta e cinco reais e quarenta e cinco centavos), sendo R$145,45,

Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por GILBERTO FERREIRA DA ROCHA, liberado nos autos em 19/08/2021 às 12:56 .
correspondente a 1% do valor da causa, acrescido de R$320,00, relativo a 4% sobre o valor da
causa ou condenação.

Publique-se e intime-se.

Marilia, 17 de agosto de 2021.

DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006,


CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA

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