Você está na página 1de 266

Antecedentes na Península Arábica (século I - 632)

A sociedade arábica pré-islâmica era principalmente uma sociedade


nômade habitada por unidades tribais em constante movimento. Dessas tribos
beduínas, algumas mantêm o estilo de vida nômade até hoje. Com alianças em
constante mudança, guerras intermináveis e raras ocorrências de Estados
organizados e centralizados.

Essas tribos davam muita ênfase a grupos relacionados a parentesco,


famílias, e vagavam pelo deserto com seu gado composto principalmente de
ovelhas, cabras e camelos, vivendo em tendas com seus familiares. Os líderes
tribais impunham regras não escritas da sociedade beduína na tribo, que eram
patriarcais. As mulheres não podiam herdar propriedades, viviam sem direitos e
podiam ser apreendidas em conflitos tribais como espólios de guerra e as leis
beduínas permitiam que os homens se casassem com as cativas. O número de
mulheres que um homem podia casar não era fixo, e quando um homem
morria, seu filho “herdava” todas as suas esposas, exceto a própria mãe.
Também havia casos de assassinato de bebês do sexo feminino, e o Alcorão
descreve que os árabes no período de ignorância chamado Jahiliyyah
enterravam suas filhas vivas. Os homens também consideravam as mulheres
como um fardo econômico e uma fonte potencial de constrangimento, pois a
captura de mulheres da tribo por tribos hostis era considerada humilhante na
sociedade beduína.

Não havia leis escritas, tribunais ou aplicação da lei de qualquer tipo


para proteger a população, portanto o principal objetivo de um tribo beduína era
proteger os seus membros. Buscava-se vingança pelo assassinato de um
membro do tribo por outra tribo, o que levava a guerras e conflitos praticamente
constantes. Proteger sua tribo e vingar seus parentes era uma grande honra.
As duras condições de vida na Península melhoraram ainda mais o sistema
tribal e o senso de indentidade dentro de uma tribo, pois muitas vezes sua
proteção e cooperação econômica era a diferença entre a vida e a morte. O
historiador francês Maxime Rodinson afirma:

“os árabes livres não estavam vinculados a nenhum


código de lei escrito, e nenhum estado havia para fazer cumprir
seus estatutos com o apoio de uma força policial. A única
proteção para a vida de um homem era a certeza estabelecida
pelo costume, de que seria caro. Sangue por sangue e uma vida
por uma vida. A vingança, que em árabe, é um dos pilares da
sociedade beduína.”.

O historiador austríaco Gustave E. von Grunebaum reiterou isso e


descreve a situação: “luta de guerrilha tribal, todos contra todos.”. As tribos
lutavam umas contras as outras, atacando e saqueando caravanas e
assentamentos sedentários, já que a ilegalidade era a lei da terra na maior
parte da Arábia. Caravanas e assentamentos sedentários pagariam tributos às
tribos beduínas para evitar seus ataques.

(Arábia por volta do século III e IV d.C. – Kings and Generals)

Algumas das tribos beduínas conseguiram influência sobre certos


territórios e mudar para uma vida sedentária. No século V, Meca era
praticamente governada pelos mercadores habilidosos da tribo dos Coraixitas,
que assumiu o controle da cidade em algum momento nesse século. Enquanto
Iaitrib, que mais tarde teve seu nome mudado para Medina, era dominada
pelos tribos Aus e Khazraj e as tribos judaicas Nadheer, Qaynuqaa e Qurayza.
Enquanto os beduínos nômades encaravam a vida sedentária com desprezo e
pensavam nos moradores das cidades como uma “nação de lojistas”, o
surgimento de cidades como Meca foi a causa principal do surgimento de uma
identidade árabe comum no período pré-islâmico. Tanto Meca quanto Iatrib são
na região do Hejaz, virada pro Mar Vermelho, uma região com água o
suficiente para suportar o estilo de vida sedentário. Meca era um importante
centro comercial na região onde as caravanas iam, e onde era localizada a
Kaaba, onde estátuas de ídolos e deuses de diferentes tribos árabes foram
colocadas.

(Kaaba antes do Islamismo – Kings and Generals)

O historiador grego Diodorus Siculus, que viveu entre 60 e 30 a.C.,


escreveu sobre a região isolada da Arábia em seu trabalho Bibliotheca
Historica, descrevendo a Kaaba como um templo muito sagrado que
extremamente reverenciado por todos os árabes. As rotas comerciais usuais
através do Mar Vermelho e do Tigre e do Eufrates foram interrompidas pela
pirataria e pelo conflito romano-persa no século V, e caravanas e comerciantes
mudaram para a rota comercial passando por Meca. Mercadorias de além do
Mar Vermelho e das tribos beduínas locais seriam trazidas para Meca, de onde
as caravanas de camelos as transportariam para a região do Levante. Os
habitantes de Meca assinaram tratados com o Império Bizantino e tribos
beduínas para a passagem segura de suas caravanas comerciais. Uma vez por
ano, árabes de todas as regiões faziam uma peregrinação à Kaaba e bebiam
no sagrado Poço de Zamzam. Nessa época do ano, os conflitos entre tribos
parariam, uma trégua seria declarada, disputas e dívidas seriam resolvidas e o
comércio aconteceria entre diferentes tribos. Então Meca se tornou o centro de
uma confederação solta de tribos ao redor da cidade, pois os hóspedes eram
obrigados a seguir as regras de Meca.

Já Iatrib era um centro agrícola, e se tornou um importante ponto de


trânsito para as caravanas de comércio que viajavam pelo Mar Vermelho.
Inicialmente Iatrib era dominada por tribos judaicas, mas gradualmente várias
tribos árabes se mudaram para a cidade e ganharam influência política e
econômica. Enquanto os árabes eram ativos na agricultura, os judeus eram
ativos como empresários, e a ascenção do comércio na cidade inevitavelmente
levaria à usura, prática usada tanto por árabes quanto judeus. Posteriormente a
usura seria proibida pelo islã. A arábia pré-islâmica era uma mistura de
politeístas árabes, judeus, cristãos, e religiões iranianas, com o paganismo
politeísta árabe sendo o mais popular. Cada tribo, cidade e região poderia ter
seu próprio deus ou ídolo, que era de certa forma um patrono daquela
comunidade em particular. Os árabes também acreditavam em seres
sobrenaturais como os djinns. Existem hadiths que afirmam que na Kaaba
também havia uma imagem da Virgem Maria e do Menino Jesus com Abraão
olhando por cima deles. Estima-se que a Kaaba tinha até 360 dessas estátuas
e divindades.

Já no século I d.C., comerciantes árabes trouxeram o Cristianismo para


a Arábia. Outros foram evangelizados por São Paulo e São Tomás, seguindo
por uma forte influência do Império Bizantino no século V e VI. Por exemplo, os
Gassânidas eram um reino vassalo de Roma que se converteu ao Cristianismo.
No sul da Arábia, uma comunidade cristã surgiu em Najran, como resultado da
influência do reino cristão etíope de Aksum, que se tornaria o bastião do
Cristianismo Copta em 642. A heresia do nestorianismo era forte em algumas
partes da Arábia, mas a denominação mais popular era a heresia do
monofisismo. O judaísmo também era significativo no cenário religioso da
Arábia, com judeus fugindo da perseguição romana no século I, se
estabelecendo em Iatrib, Khayber, Fadak e Umm-ul-Qura, e muitos árabes se
converteram ao judaísmo, muitas vezes como uma condição para
estabelecerem em cidades no Hejaz, dominadas por judeus. O reino himiarita
do Iêmen se converteu ao judaísmo no século V, e alguns da tribo dos Kindah
no século V. Alguns autores falam que estava surgindo um religião monoteísta
que não era afilhada ao Cristianismo ou ao Judaísmo, mas que provavelmente
era centrada na figura de Abraão. Seguidores dessa religião eram chamados
de Hafini, e rejeitavam a idolatria e o paganismo da maioria dos árabes. De
acordo com algumas fontes islâmicas, Maomé pertencia à essa religião. A
Arábia também tinha alguns seguidores de religiões iranianas como o
Zoroastrismo, Mazdakismo, entre outras.

(judaísmo e paganismo nas tribos árabes no século V – Kings and Generals)

No século I, no Iêmen já tinha Estados mais estabelecidos, e todos eram


governados como uma monarquia. No Norte, confederações tribais soltas, ou
cidades-estado como Meca eram a forma mais prevalente de governo. Tais
estados eram governados como uma oligarquia ou uma aristocracia. No século
V começou um processo inverso onde muitas tribos do sul migraram para o
norte e sofreram influência do norte, com a escrita desaparecendo do sul da
Arábia. O reino Himiarita fundado em 280, era um dos estados mais
proeminentes da Península Arábica. Era governado por um monarca, mas na
prática, o poder era compartilhado com os governadores regionais, que tinham
um alto grau de autonomia, semelhante ao feudalismo. No início do século IV,
este reino governou o sul da Arábia e se expandiu para o norte até Najran, e se
tornaram monoteístas com a crença no Deus abraâmico em algum momento
deste século. No século VI, o rei himiarita Abu Kariba se converteu ao
judaísmo, mas seu filho Yusuf Dhu Nuwas começou a perseguir os cristãos do
reino. Dhu Nuwas foi morto após ser derrotado pela coalizão cristã do Reino
etíope de Aksum, Império Bizantino e os cristãos do sul da Árabia em 524.
Então o reino de Aksum tomou o controle deste reino, construiu uma igreja em
Sana para atrair peregrinos, e fazer comércio em Sana ao invés de Meca. Isso
gerou um conflito entre Abraha, vice-rei etíope no Iêmen e Meca, o qual é
mencionado no Alcorão. Aparentemente, Abraha usou elefantes de guerra
contra Meca, mas não teve sucesso e teve que voltar. A segunda parte do
século VI foi marcada pela luta entre etíopes e sassânidas pelo poder e
controle do restante do reino himiarita, no qual os persas venceram.

No final do século V, surgiu o reino de Kinda, que conseguiu unir todas


as tribos em Najd. Este reino conseguiu sucesso nos ataques aos territórios
bizantinos no norte da Arábia, mas esforços semelhantes contra o Império
Sassânida falharam, quando em 529 os vassalos Lacmidas derrotaram e
mataram o rei al-Harit de Kinda, que causou o fim do reino.

No século III d.C., os gassânidas e os Lacmidas eram duas tribos árabes


que migraram do moderno Iêmen até a Mesopotâmia. Os gassânidas se
tornaram vassalos do Império Romano do Oriente, enquanto os Lacmidas se
tornaram vassalos do Império Sassânida. Eles participavam das guerras
romano-sassânidas, muitas vezes como batedores, ou como invasores
separados dos exércitos, ou como unidades de cavalaria leve dentro dos
exércitos, enquanto também defendiam os dois impérios das outras tribos
árabes do sul.

De 600 a 621, os habitantes desses reinos eram ou pagãos árabes


politeítas ou cristãos da heresia monofisita. A tentativa do Império Romano do
Oriente, ou Império Bizantino, de tentar combater o monofisismo, fez com que
os gassânidas se revoltassem contra eles no final do século VI e início do VII.
As tensões religiosas entre os Lacmidas e os sassânidas foram exarcebadas
pelas tentativas de Asha Khosrau II de controlar diretamente a região. Em 602,
ele capturou e executou o rei lacmida Al-Numan III, e transformou o reino numa
província controlada por um governador. Isso fez com que os lacmidas
buscassem ajuda dos seus irmãos das tribos do sul. Embora as forças árabes
conseguissem derrotar os sassânidas em 609 na batalha de Dhi Qar, os
sassânidas conseguiram manter a província sob seu domínio. Essa série de
eventos criou lealdades divididas entre as tribos árabes, e acabou com o
estado tampão dos Lacmidas.

No entanto, os persas ainda eram fortes e em 602 eles usaram um


conflito interno no Império Bizantino como uma desculpa para declarar guerra.
Os persas conseguiram importantes vitórias sobre os bizantinos, conquistando
as províncias da Síria, Egito, Judéia, e o sudeste da Turquia. Mas o imperador
Heráclio venceu duas batalhas contra os persas entre 622 e 625, mas em 626
o exército de Shahrbaraz sitiou Constantinopla, ajudado pelos ávaros. O
Império Bizantino estava à beira da destruição, mas a cidade resistiu
fortemente e os bizantinos viraram o jogo. Em 627, Heráclio fez uma aliança
com o líder do Khaganato turco, Tong Yabgu, e juntos eles invadiram e
conquistaram o coração do Irã. Heráclio derrotou os sassânidas em Nínive em
627, e ameaçou a capital Ctesifonte em 628, levando os nobres a assainar
Khosrow II, e seu filho assinou um tratado de paz, e os sassânidas pagaram
uma compensação pela guerra, e os dois impérios retornaram às fronteiras pré-
guerra.

Enquanto isso, na Península Arábica a coisa estava esquentando. As


populações da região em geral tinham religiões pagãs, mas estava surgindo
seguidores do Zoroastrismo, Judaísmo e Cristianismo. Os persas assumiram o
controle da província de Mazun, leste do atual Omã, e a parte oriental do
Iêmen, enquanto que os desertos de centro e norte da Península era habitado
pelos beduínos árabes nômades. Eles se estabeleceram nas ricas cidades-
estado mercantes do Hejaz, e uma dessas cidades era Meca, que era um
centro econômico e religioso governado pela tribo dos Coraixitas, que
comercializavam principalmente especiarias com romanos, sassânidas e com o
reino de Axum. Na península arábica, os únicos lugares urbanos da Arábia
eram Meca, Iatrib e Taif. A cidade de Meca abrigava uma construção cúbica
chamada de Kaaba, que servia como um centro de culto para as várias tribos
árabes. Esses povos eram politeístas, venerando vários tipos de deuses e
espíritos, e acreditava-se que dentro da Kaaba estavam reunidos os mais
diversos deuses. Dentre essas divindades a que se começou a sobressair era
Alá. E os monoteístas pré-islâmicos que diziam que Alá é o maior (Allah
Akbar), eram os Hanifs.

Maomé nasceu em 570, e se tornou o mais bem sucedido desses


Hanifs, e era da poderosa tribo dos coraixitas. Ele controlava não só os
interesses caravaneiros de Meca, quanto a própria Kaaba, e Meca era
praticamente toda dos Coraixitas. Maomé veio de uma família pobre e ficou
órfão muito cedo. Dessa forma ele foi educado por seu tio Abu Taleb, que
também não era muito bem de vida. Então Maomé precisou trabalhar no
comércio de caravanas, como era de costume entre os coraixitas. Depois ele
entrou para o serviço de uma viúva rica chamada Khadidja, e rapidamente
tornou-se o seu homem de confiança. E nessas viagens de Maomé, vez ou
outra ele encontrava os famosos "Homens do Livro", que eram judeus e
cristãos heréticos que habitavam os arredores da Arábia. E isso influenciou
pesadamente Maomé.

Com 25 anos de idade, Maomé se casou com Khadidja, e agora ele tava
com a vida feita porque ela era muito rica. Ele rejeitou todas as lendas árabes
que contavam acerca dos deuses, e buscava uma explicação mais profunda.
Essa angústia cessou quando ele julgou estar recebendo revelações da própria
fonte divina. Ele acreditou ter visões de um ser de luz, que vinha em sua
presença. Ele identificou esse ser como sendo o arcanjo Gabriel e saia ainda
mais convicto que estava recebendo uma revelação divina acerca de uma
religião monoteísta especial. E Khadidja o encorajou a seguir nessa missão, o
que faz dela a primeira mulher muçulmana. Com a conversão de sua esposa,
Maomé se dispos a pregar, a seus parentes e amigos mais próximos, que
formaram seu primeiro grupo de discípulos.

Quando ele chegou em Meca com essas histórias de revelação e


monoteísmo, de ressuirreição e amor para com os pobres, ele acabou sendo
rechaçado pelo seu próprio povo. Muitas acusavam Maomé de receber tais
revelações possuído por demônios. Alguns árabes da cidade de Iatrib estavam
em Meca nessa ocasião, e eles pareciam muito mais propensos a acreditar em
Maomé, que os próprios concidadãos. Então Maomé resolve ir a Iatrib, já que
ele percebeu que teria melhor sorte pregando lá. Essa migração de Maomé a
Iatrib em 622, chamada de Hégira, foi um marco para o Islã, que é o início do
calendário deles, assim como o nascimento de Cristo é o nosso. E Iatrib vai
passar a se chamar Medina (a cidade do profeta). A partir de agora, Maomé já
era o chefe de uma comunidade muito promissora e com potencial de
crescimento. Acontece que os cristãos heréticos desses lados da Arábia eram
um tanto intransigentes e mais ainda os judeus, que não aceitavam de forma
alguma a missão profética de um gentio. Toda a ideia de pregação e conversão
com base no convencimento era coisa do passado para Maomé. Para Maomé
era mais eficaz conquistar territórios e fiéis por meio da diplomacia e se
necessário a guerra.

Maomé tentou justificar sua religião falando que também era Abraâmica,
porque os árabes também eram descendentes de Ismael, o filho primogênito
de Abraão. Maomé transformou a Kaaba no lugar de culto a Alá, e ele disse
que ela foi edificada por Abraão. Ele juntou um exército com centenas de
discíplos seus e partiu pra cima de Meca com tudo. Ele venceu a batalha de
Badr em 624, mas perdeu a batalha de Uude em 625. Foi cercado sem
sucesso em Medina e aos poucos foi ficando muito popular em todos os lados.
O povo humilde de Meca sentia um certo rancor pelos Coraixitas, vistos como
exploradores, e com isso o Islã ganhou muitos adeptos. A sua aprovação
popular era tanta que sem desferir um só golpe, Maomé entrou vitorioso em
Meca em 629. Três anos depois retornou a Meca numa peregrinação à Kaaba,
e voltou à Medina onde morreu em 632.

Em algum momento de 628, Maomé enviou mensageiros para o Império


Bizantino e o Império Sassânida, para incentivar seus líderes a se juntarem ao
Islã. O xá Khosrow II insultou o enviado muçulmano, e o enviado aos bizantinos
foi morto na região dos gassânidas. Isso levou a um ataque por um pequeno
exército muçulmano, que foi derrotado pelos gassânidas e bizantinos em 629
na batalha de Mutah. As fontes dizem que Maomé liderou ele mesmo uma
força de 30.000 soldados nas terras bizantinas e capturou a cidade de Tabuk,
apesar das fontes modernas não concordarem com esse último evento. Em
631, a maior parte da Península Arábica estava sob domínio muçulmano, um
ano antes de Maomé morrer.

O livro sagrado islâmico Alcorão significa "a recitação", e diferente da


Bíblia, Maomé é o único escritor do Alcorão. Vinte anos após a morte de
Maomé, todos esses escritos foram organizados, divididos em 116 capítulos ou
sudas, que por sua vez estavam subdivididos em versículos. Em pouco tempo,
após 640, o Islã tomou toda a Arábia. O islã é um emaranhado de velhas
crenças vindas do judaísmo e de um Cristianismo deturpado. Se Maomé
tivesse contato com o verdadeiro Cristianismo, o Catolicismo Apostólico
Romano, ao invés de hereges do Oriente, talvez ele se convertesse ao
Catolicismo, e talvez o destino do mundo seria bem diferente.

Abu Bakr Abdallah ibn Uthman Abi Quhafa se tornou o sucessor de


Maomé e o primeiro califa, do califado Rashidun. O xá Kavad II começou a
matar seus irmãos para garantir seu trono, que aprofundou as rixas entre
nobres persas e partas. Kavad II morreu de praga em setembro de 629, sendo
sucedido pelo seu filho de 8 anos de idade, Ardashir II. Mas na prática o
Império era controlado por um vizir parta chamado Mah-Adhur Gushnasp, o
que causou grande preocupação ao partido persa e se aliaram ao general
Shahbaraz. O último ataque à capital ocorreu em abril de 630, tomando a
cidade e matando Ardashir II, e Shahbaraz se tornou o xá. Com os sassânidas
à beira de uma guerra civil, as regiões de Mazun e do Iêmen declararam
independência, se tornando presas fáceis para o califado Rashidun. Apenas 40
dias depois de Shahbaraz subir ao trono, ele foi morto, e o líder dos partos,
Faraukh Hormuzd, elevou Buran, filha de Khosrow ao trono. Essa primeira
rainha da história persa foi derrubada pelo filho de Shahbaraz, Shapur, alguns
meses depois. Para acabar com as guerras, Faraukh propôs um casamento
entre Shapur e Azarmidakht, outra filha de Khosrow. No entanto, ela se
recusou, e Faraukh usurpou o trono para si mesmo no final de 630. Ele seria
morto por um apoiador de Azarmidakht em 631, e ela assumiu o trono. O filho
de Faraukh, Rustam, marchou para Ctesifonte, e derrotou os exércitos de
Azarmidakht no caminho. Depois de tomar a capital, ele devolveu a coroa à
Buran. Mas depois de Rustam deixou a capital, Firozan matou Boran em junho
de 632. Então Rustam marchou de novo para a capital, e de acordo com
algumas fontes, os exércitos dos dois cansaram e então eles assinaram um
acordo. Então o neto de Khosrow II, foi coroado como Yazdegerd III.

Califado Rashidun e expansão inicial (632-656)

(ápice da expansão territorial do califado Rashidun em 654)

Em 632, Abu Bakr envia parte de seus exércitos sob o comando de


Osama bin Zayd para invadir os gassânidas em junho. A morte de Maomé e a
partida deste exército fizeram muitas das tribos árabes recém conquistadas
acreditarem que o califado é fraco, e em julho toda a península com a exceção
de Hejaz se revoltou contra Abu Bakr, no que ficou conhecida como Guerra da
Apostasia, onde muitos rebeldes foram liderados por pessoas autoproclamadas
profetas. A situação estava tensa em Medina, quando os rebeldes ameaçaram
a segunda cidade mais importante para o califado no final de julho. No entanto,
Abu Bakr logo marchou para a área e derrotou os rebeldes em agosto, e o
exército do norte derrotou os gassânidas. Abu Bakr tinha dividido seu exército
em grupos menores, que atacaram cada um dos grupos rebeldes
separadamente. Essa estratégia funcionou perfeitamente e em março de 633, o
califado foi restaurado.

Enquanto a Guerra da Apostasia foi crescendo, o líder da tribo árabe


Bani Bakr, Al-Muthanna ibn Haritha, estava atacando terras sassânidas no sul
do Iraque. Al-Muthana alertou Abu Bakr sobre a fraqueza dessa região persa, e
o califa achou que era a hora de atacar. Com a ajuda de um de seus principais
generais na Guerra da Apostasia, Khalid ibn al-Walid, ordenou a invasão da
Pérsia. Ele conseguiu recrutar um exército de 18.000 homens e partiu para o
Iraque em março de 633. Uma carta foi enviada a Hormozd, exigindo sua
rendição. Obviamente ele não se rendeu, mas enviou uma carta pedindo
reforços ao xá Yazdegerd III. Hormozd conseguiu 20.000 soldados, e saiu de
Uballa, para defender sua estrada crucial à Yamana, perto de Kazima. No
entanto, Khalid moveu suas forças pelo deserto e ameaçou a cidade de Hafira,
um pouco ao norte de Kazima. Hormozd teve então que ir para Kazima, que
era exatamente o que Khalid queria. A principal vantagem dos islâmicos na sua
expansão inicial eram sua mobilidade e seus movimentos e agressões faziam
com que o inimigo tivesse que defender várias cidades e castelos, porque
nunca ficava claro onde os árabes iriam atacar. Quando Hormozd chegou em
Hafira, Khalid chegou em Kazima, e ele poderia ter conquistado a cidade
facilmente, mas não queria ser cercado por sassânidas fortemente blindados e
suas tropas esperaram e descansaram ao sul de Kazima, enquanto Hormozd
marchava em sua direção. Nos primeiros dias de abril, as cansadas forças
sassânidas se aproximaram. A batalha é conhecida como Batalha das
Correntes, onde as tropas de Khalid ficaram atrás das colinas no deserto.

A batalha começou quando Hormozd chamou Khalid para um duelo um


contra um. Durante a luta entre os dois, alguns guerreiros sassândias se
intrometerem e foram ajudar Hormozd. Isso foi visto por outro general árabe,
Qaqa´bin Amr, que decidiu ajudar Khalid, atacando os guerreiros intrometidos,
e os dois conseguiram matar Hormozd. Os dois voltaram às suas posições
iniciais e ordenaram que o exército fosse pra cima com tudo. Durante uma das
cargas, Khalid conseguiu quebrar a disciplinada linha sassânida em alguns
lugares. O exército sassânida, cansado e sem líder começou a recuar, com os
líderes das laterais recuando também. Os árabes venceram a batalha e talvez
metade do exército sassânida foi dizimado.

Enquanto isso, Yazdegerd III decide enviar um exército para Uballa, para
reforçar suas defesas. Quando Karinz chega perto de Uballa, ele encontra o
resto do exército de Hormozd, e foi informado da Batalha das Correntes. Ao
mesmo tempo, uma força liderada por Al-Muthanna apareceu, provavelmente
enviada por Khalid para arrebatar o que sobrou do exército. Karinz decidiu
sacrificar Uballa, e manter sua posição para evitar que Khalid atravessasse o
rio Tigre ou marchasse para o oeste para a cidade mais importante da região,
Al-Hira. Al-Muthanna avisou Khalid que uma nova força estava se movendo
para o sul, e Khalid enviou um pequeno grupo para tomar Uballa. A batalha do
rio aconteceu na terceira semana de abril, onde os sassânidas estavam com
algo em torno de 25.000 a 50.000 soldados, enquanto Khalid tinha algo em
torno de 18.000. A batalha começou com Karinz chamando Khalid para um
duelo, mas um espadachim árabe que foi ao duelo e foi capaz de derrotar
Karinz. Então Qubaz e Anushgan foram para a frente e exigiram outro duelo.
Os líderes muçulmanos Asim e Uday correram para eles, e os dois líderes
sassânidas foram mortos. Então Khalid ordenou um ataque com tudo às tropas
inimigas, mas apesar de todos os líderes sassânidas terem morrido, as tropas
resistiram. Mas quando os sassânidas empurraram os árabes para trás, seu
exército se desorganizou e Khalid conseguiu criar alguns buracos na formação
do inimigo. A retaguarda do exército sassânida tentou recuar, enquanto a frente
continou a lutar, mas sem suporte logo foram massacrados. Mas os árabes
conseguiram alcançar os que recuaram e a batalha recomeçou perto do rio.
Não sabemos exatamante o que aconteceu agora, mas a maioria das fontes
nos mostram que muitos foram mortos, outros afogados no rio, e alguns
conseguiram atravessar o rio. No final da batalha, o exército do xá perdeu algo
em torno de 15.000 a 30.000 soldados, enquanto as perdas de Khalid foram na
casa das centenas.

O líder do califado estabeleceu uma nova autoridade na província, com


seus habitantes começando a pagar a jizya, um imposto per capita para os não
muçulmanos. Ao mesmo tempo, escoteiros das tribos locais foram enviados
para o oeste e norte para descobrir se os sassânidas tinham mais exércitos por
perto. Yazdegerd III então ordenou que suas tropas do norte e das partes
orientais do Império que marchassem para Ctesifonte. Quando o primeiro
exército comandado por Andarzgar chegou, ele foi enviado para a cidade de
Walaja, o primeiro ponto estratégico entre Uballa e Al-Hira. Os remanescentes
da batalha do rio se juntaram a Andarzgar que juntou algo entre 25.000 e
30.000 soldados. O segundo exército era comandado por Bahman, que deveria
ajudar Andarzgar caso os muçulmanos resolvessem atacar. Suas tropas
contavam com 20.000 homens e ficaram entre Walaja e Uballa.

Khalid então deixou uma pequena guarnição em Uballa e marchou para


o oeste, esperando derrotar Andarzgar antes dele avisar Bahman. Ao longo do
camingo, Khalid fortaleceu seu exército com mais tribos árabes, que agora
estavam mais confiantes para se juntarem à ele já que o imposto que tinham
que pagar para ele era menor do que eles pagavam para os persas. Com isso,
Khalid aumentou suas forças para algo entre 15.000 e 20.000 soldados, e na
segunda quinzena de maio Khalid encontra o exército de Andarzgar bem antes
de Bahman se juntar a ele. Khalid ordena que seu exército avançasse com
tudo contra as tropas de Andarzgar, e por uma hora ou mais, os dois divisores
lutaram sem parar, mas como os sassânidas tinham bastante soldados, eles
trocaram a linha de frente por soldados que estavam atrás mais bem
descansados e mais fortes. Isso lhe deu uma vantagem e os persas passaram
a empurrar o exército de Khalid para trás, até que os deixa perto da colina, o
que deixaria eles sem poder bater em retirada. No entanto, a cavalaria que
Khalid enviou para o deserto na noite anterior, apareceu atrás das linhas
sassânidas e a cavalaria leve árabe massacrou o exército sassânida, e minutos
depois a vitória era de Khalid, com Andarzgar morto. Apenas 5000 soldados
conseguiram se retirar, enquanto Khalid perdeu apenas 3000.

Esses 5000 que conseguiram fugir eram daqueles cristãos monofisistas


e conseguiram se abrigar em Ulleis e mandaram cartas para outras tribos
cristãs à noroeste, pedindo ajuda. As tribos responderam ao chamado e o xá
mandou Bahman para encontrar eles em Ulleis. Bahman enviou um general
chamado Jaban para ir com o exército para Ulleis, enquanto ele voltou para
Ctesifonte. E em algum momento entre maio e junho de 633, o exército dos
cristãos e de Jaban lutou contra o exército de Khalid. Os detalhes da batalha
estão perdidos, mas sabemos que os muçulmanos venceram.

Nos últimos dias de maio, Khalid se aproximou de Al-Hira, e mais uma


vez não temos fontes confiáveis do que aconteceu. Sabemos que os
sassânidas e seus aliados árabes resistiram por alguns dias, mas no final
ambos os lados decidiram negociar. Khalid prometeu poupar a população em
troca do pagamento da Jizya, e ele passou as próximas semanas construíndo
um novo governo na região e coletando impostos. Ao mesmo tempo, grupos de
ataque foram enviados para o centro do Iraque e para as fronteiras com o
Império Bizantino, e esses ataques trouxeram saques e informações da
movimentação do inimigo. No entanto, as cidades de Anbar e Ain al-Tamr
ainda estavam intactas e com muitos soldados. No final de junho de 633,
Khalid deixou metade de suas tropas em Al-Hira e marchou para Anbar com
10.000 soldados. Os detalhes não são claros, mas parece que a decisão de
Khalid de atacar essa cidade surpreendeu seus oponentes e o comandante da
guarnição foi forçado a se render. Então Khalid parte para Ain al-Tamr e ele
conseguiu vencer com relativa facilidade. O líder dos árabes cristãos foi
executado e a cidade se rendeu. De julho a setembro de 633, Khalid estava
firmando um governo na região, mas outros afirmam que os últimos
remanescentes da Guerra da Apostasia era no sul e Khalid moveu suas forças
para Dumat al-Jandal, e ajudou seu colega Iyad bin Ghanem a derrotar os
rebeldes. Durante esse período, os persas conseguiram juntar cinco exércitos
entre a região de Maziyah e Hasid. Qaqaa bin Amr, que estava governando a
guarnição de Al-Hira, manda ataques para o noroeste, e atrasou os exércitos
sassânidas o máximo possível, não permitindo que esses quatro exércitos se
unam.

Em setembro Khalid chega em Al-Hira e manda Qaqa´ Bin Amr e Abu


Laila a liderarem partes da guarnição para Al-Hussein enquanto suas tropas se
estabelecem na cidade. Em outubro, pequenos grupos sassânidas e
muçulmanos travaram algumas batalhas, em que os persas tiveram algumas
derrotas que os forçou a recuar para Muzzaya. Então Khalid tinha caminho livre
para Ctesifonte, mas os persas ainda eram relativamente fortes no oeste.
Então Khalid decide atacar os persas passando pelo deserto para evitar as
cidades de Zumeil e Saniyy, e partir direto para Muzzaya. A travessia do
deserto era perigosa, mas o prêmio também era alto, e as três tropas de Khalid
atingiram o alvo ao mesmo tempo. E durante uma noite na primeira semana de
novembro, os 20.000 de Khalid atacaram durante a noite enquanto os
sassânidas dormiam, e não esperando o ataque, Khalid venceu facilmente,
matando mais de 10.000 persas. Khalid repetiu a tática com as tropas persas
perto de Saniyy e Zumeil. Mais da metade do exército dos árabes cristãos
morreram, e aparentemente, entre os mortos estavam alguns muçulmanos
recém convertidos, e suas famílias enviaram um apelo ao califa Abu Bakr para
punir Khalid. Essa chamada rejeitada foi enviada pelo futuro califa Oman, que
se tornará importante para nossa história no futuro.

Em dezembro de 633, Khalid pensa se deve atacar Ctesifonte de uma


vez, mas prefere não arriscar. Em vez disso ele decide ir mais ao noroeste e
atacar a cidade de Faraz. As forças bizantinas e persas ficaram do lado norte
do rio Eufrates, enquanto os 20.000 de Khalid ficaram do outro lado. Do lado
persa provavelmente tinha algo entre 15.000 e 25.000 soldados. Por 5 ou 6
semanas, os dois exércitos ficaram em frente um do outro, pois nenhum dos
lados tinha um lugar seguro para cruzar o rio. Na terceira semana de janeiro de
634, Khalid recuou, fazendo com que o inimigo atravessasse o rio. Lentamente
a força bizantina-persa empurrou as tropas de Khalid para trás. Uma parte da
cavalaria de Khalid contornou o exército inimigo e atacou por trás, e as tropas
inimigas começaram a perder coesão porque pensavam que outra tropa
gigante muçulmana tinha cruzado o rio pelo norte. Ao mesmo tempo, Khalid
lançou o contra-ataque, mas uma parte do exército inimigo sobreviveu porque
fugiu, apesar de mais da metade ter morrido.

Khalid estava pronto para atacar Ctesifonte, mas ele recebeu uma carta
do califa Abu Bakr, ordenando que ele parasse seus ataques aos sassânidas e
virasse as atenções à Síria para atacar os bizantinos. Ao longo de 633, os
muçulmanos já tinham enviado forças para atacar a Palestina, nas áreas ao
redor do mar da Galiléia, o rio Jordão e o mar Morto, mas para atacar os
centros urbanos precisavam de mais reforços. Em 634, o general muçulmano
escolheu a rota mais perigosa através de um deserto sírio sem água e Khalid
ordenou que 20 camelos fossem obrigados a beber grandes quantidade de
água para que pudessem ser usados como armazem temporário. Os camelos
foram abatidos ao longo da jornada quando a comida era necessária, e a água
era colhida dos camelos. Após 5 longos dias de caminhada por essa paisagem
desolada, 9000 soldados muçulmanos apareceram e rapidamente inflingiram
uma pequena derrota nos gassânidas em Marj Rahit, enquanto eles
celebravam a Páscoa. Então ele marchou para o sul, para a cidade de Bostra,
quando seus reforços chegaram e ele conseguiu tomar a cidade em julho de
634. Então o imperador Heráclio enviou seu irmão Theodore e um general
armênio chamado Wardan, a 25 milhas a sudeste de Jerusalém, onde ele
reuniu um grande exército. Então ocorre a batalha de Ajnadayn, onde 10.000
bizantinos enfrentaram 15.000 muçulmanos. Antes do começo da batalha, um
bispo cristão tentou negociar a retirada dos muçulmanos, mas o general
respondeu mostrando a escolha tradicional: se converta ao islã, pague o jizya,
ou morra em batalha. Então começa a chuva de flechas dos dois lados, mas
um guerreiro muçulmano chamado Dirar, caminhou direto para as flechas,
gritando um grito de guerra. Após a enxurrada acabar, Dirar e sua comitiva se
encontraram com seus companheiros bizantinos, e disseram que os
muçulmanos melhoraram no combate, matando muitos generais romanos de
elite e dois generais. Então o exército Rashidun atacou, e foi um jogo duro com
poucas manobras que durou até o anoitecer. No outro dia, Wardan tentou atrair
Khalid para uma armadilha oferecendo negociações, mas o plano deu errado e
ele foi morto por Dirar. Depois de um longo combate corpo a corpo, que exauriu
os dois lados, Khalid empregou seus 4000 soldados de reserva no centro, e
quebrou a formação bizantina. Após isso, os bizantinos fugiram. As tropas
fugiram para o norte e entraram em outras cidades bizantinas, que ficaram
lotadas de refugiados.

As forças árabes começaram a marchar para o norte na direção de


Damasco. No caminho eles tiveram que deixar um destacamento na cidade de
Fahl, antiga Pela, para manter a guarnição romana amarrada enquanto o
exército principal marchava para frente. Após isso, os muçulmanos chegam em
Yaqousa, na margem sul do rio Yarmouk. Aqui se opôs uma força bizantina na
costa norte, mas que só estavam lá para atrasar os muçulmanos. Após outra
batalha contra 12.000 romanos no prado amarelo, o caminho estava limpo para
Damasco. O comandante percebeu que suas forças não eram o suficiente para
cercar completamente a cidade. Então eles cercaram as estradas de modo a
bloquear a chegada de suprimentos. O povo de Damasco começou a passar
fome, e os muçulmanos começaram a cercar a cidade para não chegar
reforços bizantinos. Em Antióquia, Heráclio soube do cerco e enviou uma força
de 12.000 homens para Damasco, mas os muçulmanos facilmente
conseguiram derrotar essas tropas. Então o cunhado do imperador em
Damasco decidiu lançar um contra-ataque ele próprio, saindo da cidade para
enfrentar os árabes. Mas não deu muito certo e as forças bizantinas voltaram
pra a cidade. Então ele elaborou outro plano, que consistia em lançar ataques
simultâneos pelos quatro portões da cidade. No lado do portão de Jabiyah, as
forças decidiram sair da cidade e confrontar os árabes, e ambos os lados
tiveram pesadas perdas, e eles tiveram que voltar para a cidade. No portão
leste, os bizantinos conseguiram quebrar a infantaria árabe, mas Khalid chegou
com 400 cavaleiros de elite, e os defensores foram empurrados de volta para
dentro da cidade. Um grego saiu da cidade, chamado de “Jonas, o Amante”
pelos árabes, e contou a eles que na noite de 18 de setembro haverá
cerimônias religiosas cristãs, e que os muros ficariam relativamente
desprotegidos. Então os árabes escalaram a muralha, abriram os portões leste
e entraram na cidade, tomando-a.

A queda de Damasco foi um choque para os bizantinos, e Heráclio


começou a mandar mais reforços para as regiões da Síria e Egito. O califa Abu
Bakr morreu em agosto de 634, e foi substituído por Omar. O novo califa
começou a implementar reformas administrativas e militares, centralizando
mais o comando do exército, que antes tinha características tribais. Omar
mandou uma carta liberando Khalid do seu posto e nomeando Abu Obeida no
seu lugar. Três dias após a conquista de Damasco, Khalid começa a perseguir
os bizantinos no norte com 5000 cavaleiros. Então ocorre a batalha de Maraj-
al-Debaj, onde os muçulmanos vencem os bizantinos que estavam fugindo de
Damasco com milhares de refugiados. Os bizantinos perdem, o líder de
Damasco morre em batalha, mas boa parte dos refugiados conseguem fugir
para o norte.
Voltando à Pérsia, Rostan prepara um ataque grande contra as
posseções conquistadas pelos árabes, que passaram a adotar táticas de
ataques rápidos. Os comandantes mandados são Jaban, Narsi, Bahman e o
armênio Jalinus. Al-Muthanna sabia que ele precisava de reforços e enviou
mensageiros para a capital. O novo califa nomeou Abu Ubaid e lhe deu 6000
soldados para auxiliar Al-Muthanna. Quando Jaban estava chegando em Al-
Muthanna, este se retirou para se juntar a Abu Ubaid em outubro, e agora eles
estavam com a força total de 15.000 homens. Os detalhes da batalha não são
claros, mas parece que Jaban foi forçado a se retirar para fora do rio. Abu
Ubaid então marchou para o norte para Caskar, para derrotar o exército de
Narsi e o derrotou, embora o exército dele recuou praticamente intacto. Então
Abu Ubaid recua para o sul e os exércitos de Bahman e Jalinus encontram ele
em outubro na batalha da ponte. Os sassânidas estavam com 20.000 homens
e os muçulmanos com 15.000, mas estes conseguiram impedir a travessia dos
persas pelo rio Eufrates. Os persas tinham os catafractários e elefantes de
guerra, e a cavalaria árabe se assustou com os elefantes, e os cavalos
recuaram, e quando isso ocorreu os arqueiros persas aproveitaram e deram
uma saraivada nos árabes. Ainda os persas lançaram seus elefantes e
cavalaria com tudo nos árabes, e o exército árabe foi forçado a recuar. Abu
Ubaid ordenou que a cavalaria fosse desmantelada, e ele próprio liderou um
grupo de guerreiros e matou alguns elefantes e seus aliados. No entanto, outro
elefante foi mandado para ajudar os persas e ele matou Abu Ubaid. Muitos
outros líderes muçulmanos foram mortos e os árabes começaram a fugir em
caos, e Al-Muthanna foi um dos últimos líderes remanescentes, e ele obteve
algum grau de disciplina e organização na travessia, permitindo que o resto do
exército recuasse pela ponte. Ele ficou gravemente ferido durante a batalha,
mas suas ações salvaram milhares. Essa foi a primeira derrota dos
muçulmanos, e cerca de 10.000 deles morreram, enquanto somente 2.000
persas morreram.

Al-Muthanna então se retirou para Ulleis, e Bahman voltou para


Ctesifonte. Alguns autores afirmam que houve outra rebelião contra Rosman, e
Bahman foi enviado para lidar com invasores turcos. Heráclio estava trazendo
vários reforços para o Levante e Theodoros começou a se reunir no oeste de
Pela em dezembro de 634, que era um ótimo lugar para lançar um ataque para
o leste e cortar a linha de comunicação da Península Arábica. Assim que a
guarnição de Pela soube disso, ela recuou em direção ao exército de
Theodoros, inundando o rio Jordão e criando uma área pantanosa dividindo
árabes e bizantinos. Depois de ocupar Pela, os árabes partiram para Beisan,
que era onde estavam o exército bizantino. A vanguarda liderada por Khalid
ficou presa na lama do pântano e foi forçada a se retirar de volta a Pela. Em 23
de janeiro de 635, Theodoros foi com suas tropas atacar o acampamento
muçulmano durante a noite. No entanto, os muçulmanos tinham colocado
escoteiros ao longo do rio, e logo que os bizantinos começaram a atravessar, o
acampamento árabe foi informado disso e começou a se preparar. De acordo
com fontes árabes a batalha durou por toda a noite e boa parte do dia. Quando
Theodoros foi ferido, a tropa perdeu a moral e recuou, e quando eles estavam
atravessando o rio de volta a Beisan, os árabes aproveitaram e mataram
milhares. O resto do exército bizantino dispersou para várias regiões e
Theodoros retornou para Antióquia pelo mar. Sharhabeel tomou Beisan e
Tiberíades, e depois foi junto com Amr ibn al-Aas para o sul, enquanto Abu
Ubaidah e Khalid foram para o norte. Em março de 635, os muçulmanos
estavam no controle de toda a área a sul de Beirute, com a exceção de
Cesaréia e Jerusalém. No mesmo ano, Heráclio fez uma aliança com o xá
persa Yazdegerd.

Heráclio mandou Harbees com 8000 homens para defender Emesa dos
ataques de Khalid e Abu Ubaidah. Por semanas e até meses, o cerco se
resumiu em saraivadas de flechas, porque Emesa era uma cidade muito bem
fortificada. Em março de 636 o inverno acabou, e ficou claro que os árabes
estavam planejando matar os cidadãos da cidade de fome. Harbees marchou
com muitos soldados para fora da cidade e até que conseguiu aniquilar parte
das forças muçulmanas no sul, mas foi forçado a voltar pra cidade. Depois ele
tenta outra vez sair da cidade e atacar os muçulmanos, mas desta vez ele é
cercado e acaba morrendo, junto com boa parte de seu exército. A cidade caiu
e Heráclio estava em Antióquia, mas já estava velho e com um edema. Então
ele divide seu exército em 5 generais que lançam um ataque para Emesa. Os
árabes então recuam para o sul, e os bizantinos recuperam Damasco. A partir
de julho de 636, os dois se encontram e ocorre e a famosa batalha de
Yarmouk, que começou em 15 de agosto. Os campeões dos dois lados
insistiram por algumas hora num duelo. Os bizantinos avançam, mas são
forçados a recuar e assim acaba o primeiro dia de batalha. Após 6 dias de
batalha, os bizantinos vão acabar perdendo, com cerca de metade do exército
sendo morto, enquanto apenas um quinto do exército muçulmano foi morto.

Ao mesmo tempo, os árabes também estavam lutando contra os persas,


que juntaram um enorme exército em 636, com aproximadamente 60.000
soldados a mando de Rostan. Enquanto isso, o exército muçulmano tinha algo
em torno de 30.000 guerreiros, comandado por Saad bin Abi Waqas. A batalha
de Al-Qadisiyyah começou e após 4 dias de batalha, os persas perderam
20.000 soldados, enquanto os muçulmanos perderam menos de 10.000, dando
mais uma vitória aos muçulmanos.

Jalinus consegue vencer alguns muçulmanos enquanto ele foge para o


norte, até que decide enfrentar seus perseguidores, acaba tendo um duelo com
o líder muçulmano e acaba morrendo. Firuzan manda algumas tropas para
Bushbura para que ele aguente firme no Eufrates. Quando Zuhra se aproximou
de Burs, começou a batalha e a força de contenção das forças sassânidas foi
derrotada e Bushbura ficou gravemente ferido, e morreu logo depois. Com isso,
o novo governador da cidade colaborou com os muçulmanos dando
informações e assistência logística. A maior parte do exército persa estava na
Babilônia junto com as tropas de Firuzan. Em dezembro de 636, uma grande
força muçulmana sob a liderança de Saad bin Abi Waqas e Zuhra destroça as
forças de Firuzan, que fugiu para o norte. Zuhra e Saad bin Abi Waqas
continuam avançando para o norte e tomam sem resistência as cidades de
Sura, Deir Kab e Kusa.

Em janeiro de 637, os árabes chegam em Ctesifonte e começam a


atacar as cidades ao lado. Primeiro eles atacam Veh-Ardashir, onde os persas
tinham cavado uma trincheira em volta da cidade, e tinha catapultas e muitos
arqueiros. O primeiro ataque árabe falha e muitos morrem para projéteis. Então
Saad ordena que faça um cerco ao redor das cidades à oeste do Tigre, e que
prepare as tropas para um longo cerco. Enquanto isso, os muçulmanos vão
fazendo invasões no interior circundante capturando gado e ovelhas para
benefício próprio, enquanto eles drenam os recursos do inimigo, impedindo os
suprimentos de chegar à Ardashir. No processo, a cavalaria árabe capturou
milhares de agricultores como prisioneiros de guerra, e subornou eles com a
liberdade dos senhores persas, desde que pagassem a jizya. Alguns
engenheiros persas desertaram no meio do cerco e foram para o lado
muçulmano, provendo eles de catapultas.

Em março, a situação a oeste de Ctesifonte se tornou insuportável, e


centenas de civis persas morreram de fome. Sob essas condições, os persas
fizeram um ataque desesperado aos árabes, e os dois perderam forças
consideráveis. Um dos persas ofereceu termos de paz, mas que foram
recusados pelos muçulmanos. Durante a noite, as forças persas que estavam
em Ardashir se retiraram secretamente e queimaram a ponte que ligava a
fortaleza ao resto da cidade, e agora Ctesifonte ocidental estava sob controle
dos muçulmanos. Outro civil persa, provavelmente cansado dos pesados
impostos sassânidas, ajudou os muçulmanos e leva Saad a cruzar o rio, mas
este ficou desconfiado e escolhe dormir e pensar sobre o assunto depois. No
dia seguinte, eles cruzam o rio e os persas vão atacá-los, mas um deles clama:
“Por que vocês nos matam, não há ninguém mais em Ctesifonte para
defender.”. Ele estava parcialmente correto, porque o xá Yazdegerd III fugiu e
mudou a capital para Helwan, e levou muito da corte imperial com ele.

Depois que a resistência falhou, a maior parte do exército que estava


defendendo a cidade morreu, exceto um regimento sassânida fortificado no
Palácio Branco. Então no coração de Ctesifonte, Saad encontrou uma
resistência simbólica, mas que foi rapidamente vencida. Os muçulmanos
decidiram enviar Salman Al-Farsi, um persa de nascimento que tinha se
convertido ao islã. Após breves negociações, as forças desesperadas do
palácio aceitaram o imposto islâmico e se renderam. Ctesifonte, uma pérola do
mundo persa, uma superpotência por mais de quatro séculos, agora estava na
mão dos árabes. Apesar disso, a resistência persa vai continuar até a
conquista da cidade de Zagros em 651.
(Ctesifonte – Kings and Generals)

De agosto a novembro de 636, Abu Ubaidah lançaria um ataque à uma


grande cidade, Jerusalém. Percebendo o que estava a acontecer, o patriarca
Sofrônio de Jerusalém enviou secretamente as mais sagradas relíquias cristãs,
incluindo a verdadeira cruz recuperada por Heráclio, para Constantinopla pelo
mar. Em algum momento em novembro, Khalid chegou em Jerusalém, antes
do resto do exército, e isso fez com que a guarnição bizantina recuasse para
dentro da cidade. Sabendo que as muralhas da cidade foram fortificadas, os
cinco comandantes - Khalid, Abu Ubaidah, Yazid, Amr e Shurahbil, bloquearam
todas as entradas e saídas de Jerusalém. Isso continuou por quatro meses
num cerco relativamente tranquilo, o qual poucos detalhes sobreviveram. Em
março de 637, Sofrônio se ofereceu para entregar Jerusalém, se o próprio
califa Omar viesse e assinasse pessoalmente um tratado com ele. Shurahbil
disse então para Khalid se passar pelo califa, pois sua aparência era
semelhante, para conseguir uma rendição mais rápida. No entanto, essa
tentativa falhou porque Khalid já era bem conhecido no Levante a essa altura.
Poucas semanas depois, Omar chegou perto de Jerusalém após ter feito uma
longa viagem pela Arábia. Omar rapidamente começou a negociar com
Sofrônio e Jerusalém foi aberta aos muçulmanos no final de abril de 637, e o
tratado reconheceria os cristãos como um povo protegido com o direito de
praticar a própria religião, desde que pagassem o jizya, mas essa aliança de
Omar é provavelmente apócrifo.

(Jerusalém – Kings and Generals)

O exército sírio então se dividiu em terços, com Amr e Shurahbil


movendo-se para reocupar e proteger a Palestina, Yazid sitiando Cesaréia,
enquanto Khalid e Abu Ubaidah se moveram para conquistar o norte da Síria.
O imperador Heráclio então se retirou de Antióquia e voltou para a Anatólia,
com a intenção de consolidar a força militar bizantina e proteger o restante de
seu império. Quando Heráclio partiu ele disse: “Adeus, um longo adeus à Síria,
minha bela província. Você é um inimigo agora. A paz esteja com você, ó Síria,
que bela terra você será para as mãos do inimigo.”

Heráclio criaria as temas em 610, que eram subdivisões administrativas


onde os camponeses trabalhavam em troca de serviço nas milícias locais, e
ganhavam direito de propriedade sobre a terra. As propriedades senatoriais
foram desmembradas e entregues aos que nelas trabalhavam, em troca de
serviço nas milícias locais, o que acabou com boa parte da parasitagem que os
camponeses sofriam. Ele faz uma distinção entre territórios centrais que eram a
Turquia, as ilhas do Egeu e a Grécia, que devem ser defendidos a qualquer
custo. Fora disso você tinha as periferias dispensáveis, que eram a Síria, Egito,
Itália, norte da África. Esse sistema de milícias camponesas foi a espinha
dorsal da defesa do Império Bizantino por séculos, até a aristocracia fundiária
faminta por terras começar a ganhar poder no século XI e começar a desarmar
o povo e mudando significativamente o sistema de temas nos séculos XI e XII,
até serem extinguidos em 1204 com o saque de Constantinopla na Quarta
Cruzada, onde o Império foi desmembrado e só foi reestabelecido em 1261.
Durante o período de 610 à 1025, os cidadãos da Roma medieval lutaram
como tigres em defesa de seu país e de sua fé ortodoxa. Repetidas vezes, os
exércitos do califa colidiram contra uma parede de proprietários armados, e
perderam.

De Jerusalém, uma força de 17.000 homens sob o comando de Khalid e


Abu Ubaidah marchou sem oposição para Damasco e depois para Emesa. Em
Chalkis, os árabes encontraram resistência de Menas e seus homens, mas
Menas foi morto. Só que com isso, os seus homens entrarem em fúria e apesar
da inferioridade numérica, conseguiram empurrá-los um pouco para trás. No
entanto, eles perderam, e dizem que nenhum romano sequer sobreviveu nesse
combate em Hazir. Em julho de 637, Khalid se mudou para Chalkis, onde a
guarnição tinha fortificado pesadamente a cidade. Mas Khalid apenas exigiu
que eles se rendessem, o que eles fizeram logo depois. Abu Ubaidah se juntou
a Khalid e os dois partiram para Aleppo, onde eles derrotaram uma força
bizantina menor comandada por Joachim em uma batalha campal fora da
cidade. Joachim tentou sair da cidade novamente para tentar uma ataque mais
falhou e morreu, e a cidade foi tomada em outubro. A maior cidade romana na
Síria, Antióquia, agora estava próxima. Ubaidah enviou uma força de ataque
para lidar com a guarnição de Azaz no norte, para que nenhuma unidade
romana pudesse atingí-los pelo flanco enquanto eles atacavam Antióquia.
Quando eles estavam a 12 milhas da cidade, eles foram recebidos por um
grande exército romano numa ponte sobre o rio Orontes, vindo de Antióquia.
Khalid usou sua guarda móvel e esmagou os romanos. Mas a tomada de
Antióquia foi anticlimática, pois apenas alguns dias depois da investida de Abu
Ubaidah, em 30 de outubro, a cidade se rendeu em termos e seus defensores
foram autorizados a se retirar para o norte sem serem molestados.
Agora, dividindo o Império em duas regiões separadas, Khalid marchou
para a região de Tarso na Anatólia, enquanto Abu Ubaidah marchou para o sul,
capturando portos como Laodicéia, Gibala, Antarados e Trípoli. Na Pérsia,
Yazdegerd III estava em Hulwan ansioso para salvar seu império depois da
queda de Ctesifonte. Para isso, ele mandou o principal exército persa sob
Mihran e Khurrazad se virassem para enfrentarem os invasores em Jalula. Os
exércitos que tentavam avançar para o norte, passando por uma cidade
ribeirinha, foram forçados a marchar por uma brecha estreita entre um afluente
do Tigre à oeste e uma área de terra batida quase intrasitável à leste. Se os
20.000 a 30.000 de Mihran pudessem manter a sua posição, o restante do
território norte Suwad e Sassânida leste das montanhas Zagros seria
inatacável. Uma vala foi escavada três milhas ao sul da cidade, que ligava o
terreno acidentado ao rio, bloqueando a abertura.

Então Saad manda seu sobrinho Hashim bin Utba com 12.000 soldados
para reduzir o exército persa. A fim de evitar reforço e retirada, Saad também
despachou 5000 homens para lidar com o governador persa Intaq em Mosul.
Depois de várias tentativas de tomar aquela cidade de assalto, espiões
muçulmanos conseguiram assegurar a deserção de vários árabes cristãos em
uma traição que levou à queda de Mosul. Na força principal indo para Jalula em
março de 637, Hashim trouxe consigo o feroz Qaqa ibn Amr. Consciente que a
situação só pioraria com o tempo, Hashim ordenou várias tentativas de invadir
a vala fortificada. Os persas conseguiram repelir esses ataques com os
arqueiros. Após isso, os persas substituiram os obstáculos de madeira por
obstáculos de ferro, mais eficientes. Os muçulmanos cessaram a ofensiva por
um tempo e isso deu a Mihran uma oportunidade única. Utilizando o constante
fluxo de reforços que vinha em sua direção, ele começou a lançar surtidas
contra as posições de Hashim, inflingindo perdas e ganhando confiança. Mas
ninguém conseguiu vencer as linhas inimigas e os persas voltaram para a
cidade. Então Hashim pediu reforços de Ctesifonte, e Saad enviou 600 de
infantaria e 400 de cavalaria. Depois, mais 500 reforços de cavalaria chegaram,
incluindo muitos chefes tribais árabes competentes que lutaram contra o
califado na Guerra de Apostasia. Os persas, reforçados por tropas do xá,
decidiram atacar antes que os muçulmanos tivessem ainda mais reforços.
Sob o comando de Mihran, a batalha de Jalula começou pra valer com
um ataque sassânida em larga escala ao longo de toda a frente, e a carga teve
um impacto devastador. Os muçulmanos resistiram com toda a sua força, e a
batalha foi ficando brutal à medida que as flechas iam acabando e eles se
matavam na facada. Uma unidade de Hashim fugiu e Qaqa voltou e restaurou
a ordem. O calor quase insuportável do deserto e os combates brutais levaram
os persas a deixar a ofensiva e ambos os lados se separassem. Depois de um
breve descanço, Mihran planejava continuar pressionando, mas Hashim tinha
outros planos. Hashim ordenou que suas tropas atacassem por toda a frente,
estragando o ataque de Mihran e iniciando outro confronto extenuante, que
durou mais de uma hora sem nenhum momento decisivo. No entanto, pouco
antes do pôr do Sol, o vento aumentou e uma tempestade de areia veio do sul,
fenômeno que afetou mais os persas do que os acostumados nômades do
deserto. Hashim então sinalizou para Qaqa ibn Amr embarcar em uma
manobra que eles haviam preparado de antemão. Enquanto Hashim mantinha
Mihran ocupado no centro, Qaqa dava a volta e mantinha suas tropas numa
área protegida para impedir que fossem vistos. Após algumas tropas
sassânidas desnortearem mas manterem a posição, Qaqa atacou com tudo de
trás. As forças muçulmanas continuaram atacando as forças cercadas, mas
ainda resistentes de Mihran durante todo o dia. Ao pôr do Sol, tudo
desmoronou e os persas foram derrotados, apenas parem serem cortados
pelas tropas de Qaqa enquanto fugiam. Até metade do exército persa pereceu
em Jalula, enquanto o restante, incluindo a guarnição da cidade, fugiu em
direção de Hulwan, e a própria cidade de Jalula caiu em dezembro de 637.
Pouco depois, Qaqa cavalgou em busca do inimigo e os derrotou, primeiro em
Khaniqeen, antes de cercar e capturar Hulwan em janeiro de 638. O imperador
Yazdegerd III recuou para além do Zagros.

Apesar de todas essas vitórias, a feroz resistência persa continuou nas


montanhas a noroeste, enquanto o imperador Heráclio impedia o avanço
muçulmano o máximo que podia. Heráclio enviou enviados para seus aliados
árabes cristãos área de Jazeera, solicitando que eles atacassem os
muçulmanos na Síria. Eles obedeceram as ordens do imperador, cruzando o
Eufrates e chegando em Emesa em março de 638, onde Abu Ubaidah havia
concentrado suas forças para enfrentá-los. No entanto, o califa Omar mandou
Saad invadir a Jazeera pelo Iraque. Quando estes começaram a saquear as
cidades da Jazeera, os árabes cristãos voltaram para tentar defender a região,
mas as forças de Saad anexaram completamente a região. Ao mesmo tempo,
muitos grupos de ataque montados foram enviados por Ubaidah para a
Anatólia bizantina. Khalid então capturou Marash no outono de 638 e
transportou grandes quantidades de saque para sua base em Qinnasrin. O
califa Omar estava preocupado que por causa de seu brilhantismo militar,
Khalid estava sendo tão adorado pelos muçulmanos, ao invés deles adorarem
Deus. Então Omar tirou Khalid de seu posto e o trouxe até Medina. Depois
disso, Khalid foi para Chalkis onde viveu apenas mais quatro anos infelizes e
banais.

Agora que Khalid morreu em 642, o próximo grande general muçulmano


que se destaca é Amr ibn al-As, de 48 anos em 638. Ele recebeu toda a região
da Palestina e ao se mudar para a área, ele forçou a rendição de Gaza e várias
outras guarnições bizantinas. No início de 639, a peste se espalhou
rapidamente por todo o Levante, e os árabes desacostumados com esse tipo
de doença por causa de seu estilo de vida nômade, morreram aos milhares,
incluindo Yazid, Shurahbil e o próprio Abu Ubaidah. Amr recebeu o comando
do exército e com isso ele teve a oportunidade de ouro para propor uma ideia
ao califa, a de tomar o Egito bizantino que era extremamente rico. Com apenas
4.000 soldados, Amr invadiu o Egito em 639-640. O Egito era uma região bem
problemática do Império Bizantino devido a diferenças culturais e religiosas
grandes, além da frouxidão militar e alienada das forças imperiais em
Constantinopla. A população nativa do Egito era copta, e eles aderiram à uma
versão diferente do Cristianismo, que existe até hoje. O imperador Heráclio
perseguia qualquer herege de uma maneira que tornava inevitável a divisão
religiosa, além da heresia monofisista ser bem presente no Egito.

As forças bizantinas foram alertadas da presença de Amr e então


enviaram tropas para reforçar a cidade de Pelúsio, a “chave do Egito”. Partindo
de Arish no final de dezembro de 639, o pequeno exército de veteranos do
califado Rashidun logo alcançou Pelúsio, cercando-a por terra. No entanto, a
superioridade naval bizantina significava que a cidade poderia ser reforçada e
abastecida, e isso levou a um cerco de dois meses que só foi concluído quando
os muçulmanos repeliram uma surtida e invadiram a cidade em fevereiro de
640. Depois disso, Amr marchou sem oposição até chegar na cidadela de
Bilbeis, onde os defensores resistiram por um mês, dando tempo para que os
bizantinos mudar suas forças. O prefeito do Egito e o patriarca Ciro de
Alexandria, marcharam com um exército de 20.000 homens para reforçar a
fortaleza vizinha chamada Babilônia. Comandada por Augustalis Theodorus e
guarnecida por 5000 soldados, Babilônia era um dos bastiões mais fortes
defensivos do Nilo, com 60 pés de altura em alguns lugares e possuindo
muralhas de até seis pés de espessura.

Os muçulmanos chegaram na cidade em maio, e havia uma trincheira


com as tropas bizantinas atrás dela. Amr lançou suas tropas diretamente para
a trincheira, mas depois de uma luta árdua os muçulmanos foram repelidos
com relativa facilidade. Amr montou um acampamento um pouco atrás, e
lançou expedições diárias contra as posições romanas ao longo do fosso. Após
dois meses nessa situação, Amr escreve para o califa pedindo reforços.
Algumas semanas depois, chegam 4000 soldados de Omar. Então a moral de
Amr aumentou e ele conseguiu matar um grande número de soldados
romanos, mas não conseguindo quebrar a resistência do bastião. Então ele
enviou outra carta a Omar pedindo ajuda, que desta vez envia mais 4000
soldados sob a liderança de Zubayr bin Al-Awwam, que chegaram no final de
setembro. Zubayr lembrou Amr que a cidade de Heliópolis estava a 16 Km
atrás, e os bizantinos poderiam esmagar as tropas muçulmanas se lançassem
um ataque partindo das duas cidades. Amr então liderou uma boa parte de
seus 12.000 soldados para Heliópolis, mas parte do contigente de cavalaria da
guarnição emergiu e derrotou alguns dos cavaleiros de Amr. No entanto, eles
foram forçados a recuar, e Heliópolis foi sitiada. Zubayr e uma pequena
unidade de guerreiros escolhidos a dedo, escalaram as muralhas numa
manobra arrojada e invadiram a cidade. Vendo que o conflito era inevitável, a
guarnição de Heliópolis se rendeu e pagou o jizya, e após isso Zubayr e Amr
retornaram para Babilônia.

Em Babilônia, Theodorus começou a atacar as tropas muçulmanas


usando as próprias táticas deles, fazendo ataques diários. A situação ficou num
impasse até que um oficial árabe Kharija bin Huzafa, se aproximou de Amr com
um plano arriscado, mas decisivo. Naquela noite, Kharija recebeu um
regimento de cavalaria e ordenou que armasse a sua armadilha, o que ele fez
cavalgando até o contraforte sul de um cume, e após assumir uma posição
oculta relativamente perto da vala dos romanos, a cavalaria muçulmana
esperou. Quando amanheceu, as forças romanas cruzaram as trincheiras com
tudo, e Theodorus lançou um ataque pela frente, empurrando Amr, que
ordenou que seu exército recuasse. Foi uma retirada fingida, e o regimento de
Kharija atacou por trás quando os romanos já tinham empurrado Amr bem
longe do fosso. Os remanescentes do exército romano recuou pela trincheira, e
a luta continuou entre o fosso e o portão. Ciro partiu da Babilônia com uma
pequena escolta, e ele tentou oferecer a Amr um grande suborno se os
muçulmanos deixassem o Egito. Mas Amr respondeu que ele tem três opções:
conversão ao islã, pagamento do jizya, ou a morte.

Em dezembro, Zubayr descobre a fraqueza no portão de ferro à beira do


rio, na parte de trás da fortaleza. Na noite de 20 de dezembro de 640, a maior
parte do exército muçulmano se posicionou silenciosamente no lado de fora do
portão de ferro, enquanto Zubayr e seus companheiros subiam escadas pelas
muralhas. Eles deram um grito de guerra que assustou todo mundo, e no meio
do caos, Zubayr matou os sentinelas e quebrou a corrente que mantinha o
portão fechado. Enquanto algumas tropas resistiram até a morte, a maior parte
fugiu pelos rios até o norte, e a fortaleza de Babilônia estava tomada. Teodoro
conseguiu fugir e voltou para Alexandria. Quando Ciro mandou uma carta para
Heráclio falando sobre a paz que fizeram, o imperador ficou furioso e recusou
categoricamente, e mandou cartas aos generais romanos do Egito para que
resistam o máximo que puderem.

O próximo passo agora era a cidade de Alexandria e a campanha na


Núbia. Depois de conquistar a cidade de Babilônia, Amr mandou notícias de
seu sucesso para o califa Omar e pediu permissão para continuar até
Alexandria. Em Constantinopla o já doente e idoso Heráclio lançou uma última
cartada, transportando milhares de reforços imperiais para o Egito através do
Mediterrâneo, para proteger Alexandria a todo custo. E Amr seguiu com 12.000
homens para o norte em fevereiro de 641. Os muçulmanos superaram uma
leve resistência bizantina em Tarnut e Kaum Shareek, e depois de capturar
Sulteis, Amr teve uma vitória sangrenta em Kiryaun, apenas a 12 milhas de
Alexandria e perseguiu os bizantinos derrotados até o leste da cidade.

Os muçulmanos acamparam fora do alcance das armas e depois se


desdobraram para a batalha, lentamente avançando para as muralhas de
Alexandria recém reformadas. Felizmente os bizantinos tinham catapultas e
conseguiram inflingir alguns danos no exército de Amr, que teve que recuar.
Depois eles voltaram e os bizantinos mandaram suas forças, mas falham e os
soldados voltam para dentro da cidade. Em algum ponto durante os primeiros
meses de ação indecisa, os bizantinos saem de novo e confrontam a tribo
Mahra, com eles vencendo um homem cuja cabeça foi cortada e levada para a
cidade. Na manhã seguinte, os bizantinos fizeram a mesma coisa, só que
agora o resultado foi bem diferente, e os árabes que mataram e levaram a
cabeça de um soldado bizantino. Depois de uma negociação, ambos os lados
entregaram a cabeça do soldado morto de cada lado. Após dois meses depois
dos árabes estabelecerem seu acampamento, o comandante tribal sahmi
decidiu se deslocar para frente por razões que desconhecemos, e os bizantinos
aproveitaram e lançaram um ousado ataque de cavalaria, que no entanto, foi
facilmente repelido. O imprudente destacamento de cavalaria de sahmi então
perseguiu os bizantinos de volta à cidade, entrando na cidade, e em menor
número, travaram uma batalha feroz na chamada Igreja de Ouro, em que
alguns deles foram mortos e outros foram expulsos da cidade.

Em Constantinopla, Heráclio estava preparando uma grande armada e


exército para mandar para Alexandria, mas ele morre, deixando seus filhos
Constantino III e Heraclonas como co-herdeiros. Isso iniciou uma rodada de
politicagem imperial que fez com que o império não conseguisse reagir no pior
momento possível. Constantino III tentou controlar a situação no Egito mas ele
morreu prematuramente. Além disso, alguns generais como Valentino pegaram
em armas para apoiar Constante II, filho de Constantino III.

Quando chegou no sexto mês do cerco, Amr recebeu uma carta de


Omar castigando-o por demorar tanto. Então Amr selecionou o experiente
general Ubada bin As-Samit para liderar um ataque, e no final de outubro de
641, e suas forças finalmente conseguiram capturar a cidade, invadindo um
portão perto da Igreja do Ouro. A riqueza, o luxo e a beleza de Alexandria
enredaram os árabes, mas Amr não podia estabelecer seu quartel-general ali
sem a permissão do califa. O califa não deixou ele prosseguir pelo rio Nilo e
então ele se moveu para o sul por terra, e lançou as bases para a capital
islâmica do Egito, Misr al-Fustat – a Cidade das Tendas. Em 642, Amr resolveu
as queixas entre seus guerreiros e os habitantes locais, revitalizou obras de
infraestrutura incluindo canais, e enviou comida para a faminta Medina.

(Alexandria – Kings and Generals)

Com o Egito estabelecido, Amr se voltou para um reino cristão núbio ao


sul, chamado Makuria. Makuria era governada por um rei chamado Qalidurut
em sua grande cidadela de Dongola, e era uma potência ascendente e
expansionista na África Subsaariana. Seu monarca tinha recém anexado seu
rival regional, Nobatia. Uma sociedade alfabetizada, com uma cultura própria
vibrante, os núbios eram conhecidos por serem guerreiros ferozes, e suas
habilidades principais eram a equitação com arco e flecha. Em algum ponto no
verão de 642, Amr enviou seu primo Uqba bin Nafe e 20.000 cavaleiros para a
Núbia, onde logo começaram a sofrer nas mãos dos habitantes locais. Os
núbios faziam a velha tática de bater e correr, montados em cavalos e atirando
flechas, e conseguiram minar o exército muçulmano e voltaram ilesos para o
deserto. Conforme os muçulmanos iam avançando, iam enfrentando mais
ataques de guerrilha por parte dos núbios, os makurianos gritavam: “Onde você
gostaria que eu colocasse uma flecha em você?”. Quando Uqba e suas forças
diminuídas finalmente chegaram em Dongola, eles encontraram um pequeno
exército de cerca de 10.000 núbios comandados pelo rei. Quando o avanço
muçulmano em direção à linha de Qalidurut começou, foi quase
instantaneamente atingido por uma barragem impetuosa de flechas
makurianas, que danificou quase todo o exército de Uqba, que teve que recuar.
Para sempre, os muçulmanos chamariam os núbios de “arqueiros do olho”, por
causa de sua propensão de atirar flechas com precisão nos olhos de seus
inimigos. Os muçulmanos continuaram recuando até Fustat.

(arqueiros núbios destroçando os muçulmanos perto de Dongola – Kings and


Generals)

Após um mês ou dois de recuperação, Amr reuniu seus exércitos e os


levou para o oeste através do deserto em setembro de 642. Após um mês de
duras marchas, os muçulmanos chegaram em uma cidade ainda bizantina
chamada Barca, no que hoje é o nordeste da Líbia, que não tendo meios de
defesa se rendeu rapidamente. Amr fez com que Uqba cavalgasse para o
interior da costa, onde pacificou com sucesso a área de deserto entre Barca e
Zawila sem violência. A população pobre rapidamente provou cumprir a lei e
ser confiável no pagamento de impostos, então Amr decretou que parte das
receitas provenientes de toda a região do Fezzan seria gasta para aliviar a
pobreza de lá. Os garamantes, povo do deserto da região da atual Líbia e
Argélia, com redes de comércio e irrigação complexas ao longo do Saara,
cairam nessa época, com a cidade de Garama e Cynamus caindo, e a
população se convertendo ao islã.

Na primavera de 643, o exército muçulmano avançou e bloqueou a


cidade de Trípoli, guarnecida pelos bizantinos. Ele percebeu que a cidade
podia ser facilmente reabastecida pelo mar, e ele não tinha armas de cerco.
Então após dois meses de relativa inatividade, oito dos guerreiros de Amr
galoparam a oeste da cidade para uma viagem de caça. Quando eles voltaram
ao longo do dia, o calor do deserto fez com que eles cavalgassem ao longo da
costa, e quando chegaram perto de Trípoli, eles descobriram que havia uma
seção da cidade que estava pouco protegida. Esses oito então se inflitraram na
cidade, chegaram no centro da cidade e começaram a matar seus inimigos.
Então um grande número de soldados bizantinos armados dentro da cidade
acreditou que um grande contigente inimigo tinha entrado e se refugiaram nos
navios ancorados no porto. Amr percebeu a confusão e ordenou que suas
tropas passassem pela região pouco protegida da cidade, e ordenou um
ataque em grande escala. Alguns muçulmanos então entram por aquela região
e se juntam aos oito que já estavam lá e os defensores bizantinos pegaram
tudo o que podiam levar e partiram com seus navios, deixando Trípoli para os
árabes. Amr também enviou cavaleiros para a cidade vizinha de Sabrata a
oeste, que ainda estava despreocupada, mesmo ouvindo rumores de lutas na
cidade vizinha. Na manhã seguinte, soldados bizantinos abriram os portões da
cidade quando sua população começou a levar animais para pastar fora da
cidade. Então a cavalaria islâmica atacou de surpresa, passando pelos portões,
matando a maioria das tropas e saqueando a cidade.

Amr então manda uma carta para o califa Omar, perguntando se ele
podia continuar suas conquistas, e o califa nega. Depois, Amr voltou para
Fustat onde permaneceu lá, administrando silenciosamente seus domínios no
Egito e lidando com sussurros de uma futura rebelião.
As coisas na Pérsia estavam voltando a esquentar, e o exército de Saad
estava ansioso para perseguir Yazdegerd III pelas montanhas. Mas o califa
Omar não permite que ele continue sua expansão e então Saad busca um
lugar onde possa criar uma guarnição árabe permanente, e funda uma colônia
que se tornaria a cidade de Al-Kufa. Mais a sudeste, outra força árabe de 800
homens lideradas por Utba bin Ghazwan, começou a procurar uma base
própria, e criou o que se tornaria a moderna Basra. Mas os persas
continuariam a resistir, liderados por Hormuzan, chefe de uma das mais
importantes famílias da Pérsia. Durante a retirada de Qadissiyah, Hormuzan se
separou da coluna principal com seu recrutamento pessoal de sobreviventes e
marchou de volta para suas propriedades no Khuzistão. Com poucas chances
de resistir à uma invasão muçulmana, Hormuzan decide atacar em 638,
lançando ataques rápidos na área de Maysan. À medida que esses ataques
aumentavam com frequência, Hormuzan estabeleceu duas bases adicionais a
oeste perto de Manazir. Utba foi incapaz de lidar com os ataques persas com
seus 800 homens e então pede ajuda a Saad. Em resposta, Saad enviou Nu
´man bin Muqarrin, com alguns milhares de homens. A força combinada de
Utba e Nu´man lançou uma campanha relâmpago que derrotou Hormuzan em
suas bases avançadas e empurrou a fronteira do califado para leste até o rio
Karun.

Hormuzan então decide se submeter à suserania dos califas, ou pelo


menos é isso que ele diz. Em 639 ocorre o Fiasco de Fars, onde um dos rivais
de Saad e governador da tranquila província do Bahrein, Ula bin Al Hadrami,
lançou um imprudente ataque anfíbio pelo Golfo Pérsico. Desembarcando na
costa de Fars, a força árabe seguiu em direção a Persépolis, conseguindo
derrotar uma pequena milícia em uma batalha custosa, antes de serem
cercados e encurralados pelos sassânidas. Saad ficou furioso, mas mesmo
assim enviou Utba para judar ele, o que deu certo, mas ele foi demitido.

O novo governador de Basra, Abu Musa, pediu ajuda para o califa Omar,
que respondeu que ele deve tomar Ahwaz e parar os ataques de Hormuzan.
Isso fez com que Abu Musa enviasse suas forças para o rio Karun e
enfrentasse Hormuzan na batalha de Ahwaz em 639. Confiante, Hormuzan
deixa o exército árabe cruzar a ponte no rio para enfrentá-los em uma batalha
campal. Só que o exército muçulmano derrotou com alguma dificuldade as
forças de Hormuzan, que fugiu para Ram Hormuz. Os árabes o perseguiram e
forçou ele a recuar ainda mais para o leste, e Hormuzan teve que negociar a
paz com os muçulmanos reconhecendo que Ahwaz era deles agora.

Saad foi substituído como governador em Kufa por Ammar bin Yasir, que
enviou tropas a Abu Musa para subjulgar a ameaça persa. Musa lançou suas
forças contra as de Hormuzan em Ram Hormuz em 640, derrotou ele numa
batalha rápida e capturou a maior parte do leste do Khuzistão. Hormuzan
recuou para o norte até o ponto de concentração sassânida em Shushtar, uma
cidade murada altamente fortificada. Musa teve 1000 novos guerreiros
enviados de Kufa. Com esses guerreiros adicionais, Musa tomou Shushtar e
Hormuzan foi levado como cativo até Medina, seguida pela cidade de Susa.
Voltando para Basra, Musa enviou um subordinado para capturar a guarnição
final do Khuzistão, que foi Junde Shapor, que o sucedeu no final de 641. Após
a queda do Khuzistão, Yazdegerd III enviou ordens urgentes para todas as
suas províncias restantes para reunir tropas e enviá-las para Nahavand. Na
virada de 642, um exército de 60.000 homens se reuniu nessa cidade. Um
general sassânida chamado Mardanshah foi nomeado para liderar o exército.

O califa Oman queria que todo o exército do califado se concentrasse na


Pérsia, mas o genro de Maomé, Ali Ibn Abi Talib, discordou dessa decisão,
falando que tirar tropas das outras fronteiras convidaria os bizantinos, etíopes e
outros para reconquistarem seus territórios. Ao invés disso, ele sugeriu que as
tropas ao longo da nova fronteira com a Pérsia, formassem o núcleo do
exército, suplementado por uma nova leva de recrutas e veteranos da Arábia.
Oman concordou com Ali, e deu o comando para Nu´man bin Muqarrin.
Caminhando a nordeste de Ctesifonte ao longo do rio Diyala, os muçulmanos
giraram em Qasr Shereen e mergulharam nas montanhas Zagros, chegando
em Tazar em dezembro de 641. Com 30.000 guerreiros, Nu´man enviou um
destacamento de reconhecimento ao longo do vale de Nahavand para saber
exatamente onde os persas estavam. Então ele marchou com seu exército
para uma cidade pequena conhecida como Isbeezaham, e quando
Mardanshah descobriu, ele levou todo o seu exército para fora da cidade. Ele
estabeleceu seu exército ao longo do rio Wadi e minou a região com
obstáculos. Quando os exércitos de Nu´man marcharam em direção aos
persas, eles foram recebidos por uma chuva mortal de flechas, e os obstáculos
imobilizaram e mutilaram muitos cavalos árabes. No entanto, Nu´man
continuou avançando, e os dois exércitos finalmente colidiram, e em alguns
lugares os árabes conseguiram empurrar os persas, mas foram empurrados de
volta com a ajuda dos arqueiros persas, e em outros lugares os persas
conseguiram inflingir dano e até empurrar os árabes de volta para atrás do rio.
Essa matança em massa continuou até a noite, quando os muçulmanos se
retiraram para seu acampamento. No outro dia, Nu´man lançou outro ataque
atravessando o rio, que durou o dia inteiro. Depois do que o historiador Akram
descreve como uma “trágica colheita da morte”, os muçulmanos novamente
recuam, sem sucesso e muito debilitados. No terceiro dia, os persas
começaram a cruzar o rio com pequenas forças, atirando flechas nas tropas
muçulmanas, causando danos ao pessoal e suprimentos antes de recuar
rapidamente.

Mardanshah começou a receber reforços da cidade vizinha de


Hamadan, e Nu´man convocou um conselho de guerra no seu acampamento.
O companheiro mais velho presente aconselhou que os muçulmanos não
deviam atacar de forma alguma, e apenas destruir aqueles grupos de ataque
que viessem atacá-los. Outro recomendou que os ataques diretos
continuassem. Os dois foram ignorados. Então chegou Tuleiha bin Khuleiwad,
um ex-inimigo do islã e arquiteto de Jalula, e apresentou uma estratégia
inteligente: “os muçulmanos deviam colocar a sua cavalaria em posição de
flanqueá-los e mostrar uma frente fraca, fingindo que vai se retirar. Que os
persas esperem pela vitória e avancem contra nós. Então nós nos viramos e
lutamos contra eles.”. Para funcionar melhor ainda a estratégia, os
muçulmanos começaram a espalhar a notícia falsa de que o califa Omar estava
morto. Os muçulmanos então começaram a desarmar as barracas, carregar a
bagagem, e pequenos contigentes de homens começaram a marchar para o
oeste.

Os persas começaram então a atavessar o rio, e duas horas após o


meio-dia, Mardanshah ordenou que seu exército avançasse lentamente em
direção os árabes. Os persas começaram a disparar flechas nas tropas árabes,
e depois de um tempo mandou a carga completa em direção deles. Nesse
momento, o flanco direito imperial do cume de Ardashan ficou de olho para
flanquar os persas. As tropas de Nu´man no meio do combate começaram a
recuar lentamente de maneira semelhante ao centro da Aníbal na batalha de
Canas. Após um tempo, Nu´man ordenou um contra-ataque, e a cavalaria de
Qaqa saiu de trás do cume e abriu uma cunha entre os persas e seus
obstáculos. No entanto, Mardanshah reuniu uma força de reserva que manteve
a cavalaria muçulmana antes que o cerco fosse concluido. As linhas persas
lentamente foram empurradas para trás pelo contra-ataque de Nu´man, mas o
general muçulmano foi atingido por uma flecha, caiu do seu cavalo e foi
afastado da luta. Nueim então se passou por ele para manter a moral da tropa
muçulmana. Conforme foi chegando a noite, a maioria do exército de
Mardanshah foi desmoronando, e foi derrotado. Em meio a esse caos, Tuleiha
também foi morto junto às tropas de Qaqa que estavam flanqueando os persas.
Um número relativamente grande de tropas persas conseguiu escapar do
campo de batalha, mas muitos, incluindo Mardanshah, foram mortos por seus
perseguidores muçulmanos.

Hudayfah assumiu o controle do exército do califado após a morte de Nu


´man, e derrotou o remanescente sassânida no outro dia em Darazeed. Parte
do exército derrotado recuou para a própria cidade de Naravand, onde o novo
comandante imperial, Dinar, rendeu a cidade incondicionalmente. Levaria mais
uma década até o Império Sassânida cair de vez em 651, mas depois da
derrota em Naravand, nenhuma batalha significativa ocorreria entre eles, e os
persas jamais teriam outra chance. No final de 644, Yazdegerd III era
efetivamente “um rei sem reino”, como afirma Peter Crawdord.

No final de 643, logo após o retorno de Amr de sua expedição contra a


chamada Pentápolis, o governador egípcio voltou a Medina para se encontrar
com Omar. O califa suspeitava que Amr tinha enriquecido injustamente no
Egito, e então enviou o inspetor Muhammed bin Maslama, para avaliar os bens
de Amr. Amr mandou uma carta falando de seus bens e foi considerado
culpado, e o excesso de seus bens foi confiscado e levado para Medina. Um
enviado copta por Amr falou ao califa que os antigo senhores do Egito viam a
prosperidade da terra antes de tirar qualquer coisa, e os muçulmanos apenas
extraíam. Então Omar dividiu o Egito em dois centros administrativos no final
de 644, dando a Amr o Baixo Egito para governar em Fustat, que era
basicamente o delta do Nilo, e o Alto Egito seria governado de Fayyum por
Abdullah ibn Abi Sarh.

De volta à Medina, uma conspiração mortal se formou, centrada em


Hormuzan que se converteu ao islamismo, e usou sua vasta experiência
administrativa para se tornar um dos principais conselheiros de Omar. Parece
que Hormuzan fez contato com Firuz, um soldado persa que foi escravizado
após Qadissiyyah ou Nahavand. Em novembro de 644, Firuz esfaqueou o califa
Oman. O segundo califa foi Otomão ibne Afane, que três dias depois matou
Firuz, e nomeou um shura ou “conselho” de seis homens, para apontar seu
sucessor, que escolheu ele próprio para ser o terceiro califa. Os sunitas
acreditam que isso foi correto, enquanto os xiitas acreditam que Ali quem
deveria assumir.

Em 645, Amr fez um lobby com Otomão para remover seu colega do
Alto Egito. Otomão recusou e Amr falou que não retornaria ao Egito até que
Abdullah ibn Abi Sarh fosse removido. Em resposta a essa ameaça, Otomão
nomeou Abdullah como governador de todo o Egito. Os súditos bizantinos não
estavam nem um pouco satisfeito com o julgo de Amr, mas a tentativa de
Abdullah de aumentar a renda das províncias foi ainda mais impopular. Um
grupo de bizantinos enviou mensagens ao novo imperador Constante II,
falando dos horrores do julgo muçulmano e da jizya, mas ainda falaram que
Abdullah tinha deixado a defesa do reino do Nilo cair em um estado lamentável,
e Alexandria estava guarnecida por apenas 1000 homens e podia ser
facilmente retomada. Constante II então começou secretamente a acumular
uma frota de 300 navios e milhares de soldados, sob o comando do eunuco
Manuel. Quando a frota bizantina desembarcou em Alexandria, a população
simultaneamente se revoltou contra os árabes, e a maior parte da guarnição
árabe foi morta. No entanto, enquanto os bizantinos devastavam regiões perto
de Alexandria, alguns muçulmanos que conseguiram escapar fugiram para
Fustat e informaram o governador. Abdullah não teve nem chance de reagir e
Amr foi colocado de volta no comando do Egito. Então Amr volta ao Egito em
Fustat e junta muitas tropas, enquanto Manuel está descendo o rio em direção
a ele.

Os dois exércitos se encontraram em Nikiou em 646, e a luta começa.


Manuel posicionou alguns de seus arqueiros em navios para ficar no rio de
olho, enquanto outros arqueiros começaram a lançar uma saraivada de flechas
no exército muçulmano. No rio, Manuel tinha preparado uma estratégia
inteligente: seus navios continuaram navegando até passarem pelo flanco de
Amr, momento em que os arqueiros do navio atingiram os muçulmanos pelos
lados. Uma vez que Manuel achou que seu inimigo já estava fraco o suficiente,
ele chamou de volta os navios e fez com que os arqueiros desembarcassem e
se juntassem ao resto das tropas. Depois ele ordenou que a infataria
avançasse com suas lanças e espadas diretamente contra os muçulmanos. Os
bizantinos conseguiram quebrar as linhas muçulmanas e parte do regimento
deles fugiu. Amr retirou seus homens e recuou para reagrupar as forças.
Depois de algum tempo, um combatente bizantino com armadura de ouro
cavalgou para o espaço aberto entre os dois exércitos e desafiou os
muçulmanos para um combate individual. O árabe Haumal aceitou o duelo, e
começou o duelo com lanças, mas nenhum dos dois foi capaz de dar um golpe
decisivo. Depois eles mudaram para espadas e também ninguém conseguiu
vencer. Até que num momento, o maior duelista bizantino conseguiu desarmar
e ferir gravemente Haumal com uma série de golpes ferozes. Mas quando o
duelista ia dar o golpe final em Haumal, este desembainhou sua adaga curta e
enfiou na garganta do bizantino e o matou. Apesar de vencer, Haumal morreu
de seus ferimentos alguns dias depois.

Esse duelo deu tempo dos muçulmanos se reagruparem e a parte do


exército que tinha fugido retornar. Quando o exército estava pronto, os árabes
partiram com tudo pra cima dos bizantinos no corpo a corpo, mas depois de
algumas horas de resistência, os bizantinos fugiram voltando para Alexandria
sendo perseguidos. Amr trouxe várias catapultas consigo e lançou pedras na
cidade, e os bizantinos revidaram. Até que um dos porteiros, Ibn Bassana,
ofereceu para deixar as tropas de Amr entrar, desde que ele, sua família e
propriedades fossem mantidos, termos que Amr achou aceitável. Os soldados
bizantinos que não morreram na cidade, fugiram para seus navios e voltaram
para Constantinopla.

Em 645, o Califado Rashidun chegou até o Cáucaso, conquistando o


que hoje é a Geórgia. Abdullah começou a lançar ataques às terras bizantinas-
berberes, perto de Leptis Magna. Essas pequenas expedições rapidamente se
mostraram um sucesso impressionante, retornando com grandes quantidade
de escravos, gado e outras riquezas. Abdullah pediu permissão do califa
Otomão para ir mais pro oeste e este concordou e enviou uma força com
10.000 soldados da Arábia, composto de várias tribos. O governador egípcio
também forneceu 10.000 soldados a Abdullah, que agora tinha 20.000. Em
647, quando o exército estava preparando para atacar as posições bizantinas
do norte da África que sobraram, o patrício que estava no comando de
Cartago, Gregório, declarou independência do resto do Império Bizantino com
o apoio de vários africanos romanizados e berberes nativos. Quando as tropas
de Abdullah chegaram em Trípoli, eles encontraram um cidade fortemente
fortificada barrada contra eles, contrariando a recepção amigável que
receberam em Cirenaica. Abdullah bloqueou Trípoli em seu flanco terrestre, e a
sitiou.

Gregório estava preparando o seu principal exército em sua capital


interior de Sufetula. Estavam chegando reforços para Trípoli, porém quando
viram que a cidade estava sendo sitiada, os navios foram mais para oeste e
desembarcaram as tropas na praia, mas os muçulmanos chegaram ao mesmo
tempo e mataram todos. Sabendo que Trípoli ainda resistiria por um bom
tempo, Abdullah então marchou para oeste até Sufetula, onde sabia que
Gregório estava preparando uma força grande. Gregório ficou sabendo do
ataque dos muçulmanos quando eles passaram por Gabes, e então deslocou
seu exército fortemente equipado, para uma posição de bloqueio em Faiz, a 30
Km de Sufetula. No entanto, a guarda avançada da cavalaria leve árabe caiu
sobre a contraparte bizantina, fazendo-a voltar cambaleando ao acampamento
principal. Cerca de 4 milhas a leste de Sufetula, o exarca virou e se preparou
para a batalha. A região era uma passagem onde nenhum dos dois podia
flanquear o outro, mas os árabes colocaram algumas tropas nas montanhas,
nas laterais dos bizantinos. No dia seguinte, a batalha começou e os primeiros
dias foram ferozes, ininterruptos e sangrentos. Depois de dias de luta indecisa,
Gregório decidiu tentar assassinar o líder inimigo, mas obviamente não ia fazer
isso sozinho. Em vez disso, ele se ofereceu para casar sua filha lendariamente
bonita, inteligente e valente, com o guerreiro bizantino que conseguisse matar
Abdullah. E então Abdullah fala que ele vai conceder a filha de Gregório, a
qualquer soldado que matar o pai.

Os próximos dias continuam com um impasse mortal de violência


amarga, com cada um fazendo ofertas e contra-ofertas toda hora. Isso acabou
quando Zubayr foi abordado por desertor berbere do exército bizantino, que
falou que como os combates estavam ocorrendo bem longe das muralhas da
cidade, a posição de Gregório, perto do portão norte de Sufetula, estava na
verdade muito pouco defendida. Zubayr então apresentou o plano a Abdullah e
este lhe concedeu 2000 homens. Durante as horas quase silenciosas da noite,
Zubayr se posicionou com seus 30 valentes cavaleiros atrás do cume norte de
Sufetula. Quando amanheceu, os dois exércitos lutaram na passagem como se
nada tivesse mudado. Depois que os combates pararam, Zubayr e seus
homens conseguiram entrar no que ficou conhecido como “portão da traição”, e
a guarda de Gregório formou uma linha apressada, mas que foi quebrada,
Gregório foi morto e sua cabeça foi decepada. O exército bizantino se
desmoralizou completamente e ainda a grande reserva montada por Zubayr
atingiu a crista do cume norte, e atacou o desorganizado exército. O exército
bizantino foi cercado e quase todos morreram, com o resto dispersando para
todos os lados. Os que sobraram fugiram para as muralhas da cidade onde
foram massacrados pelos árabes que já estavam lá.

A próxima parada de Abdullah era Cartago, e começou a sitiar a cidade.


No entanto, havia um problema. Não havia como os sitiantes tomarem Cartago
com suas linhas de suprimentos sobrecarregadas e o trem de cerco
funcionando mal. Mas ao mesmo tempo não tinha como os habitantes de
Cartago expulsarem eles. O chefe da cidade era Gennadius e ofereceu termos
aos árabes, e Abdullah aceitou grandes quantidade de ouro e foi embora,
deixando Cartago em paz por enquanto. No entanto, esse saque foi tão grande
que de 647 a 652, o califado enriqueceu muito, e Abdullah ganhou fama e
respeito.
No final de 648, o governador da Síria, Muawiya, lançou uma expedição
naval de escala desconhecida no Chipre. Ele chegou na ilha e a tomou sem
nenhuma oposição, cobrando um tributo de 7000 dinares por ano, apesar da
ilha não ser anexada de facto ao califado. Em 652, Abdullah tentou conquistar
a Núbia, falhando mais uma vez aos “Arqueiros do Olho”. Agora tanto os
bizantinos, quanto os árabes começam a olhar para o Mediterrâneo oriental,
pois se Constantinopla mantivesse o domínio marítimo, podia lançar
expedições navais no norte da África. Em 654, as frotas bizantinas e árabes se
encontram na costa da Lícia, no que ficou conhecida como a Batalha dos
Mastros, onde Abdullah esmagou a frota de Constante II no primeiro triunfo
naval muçulmano, abrindo um caminho para atacar Constantinopla.

Em 649, Abdullah ibn Aamer e Al-Ahnaf ibn Qais estavam avançando


rapidamente sobre o moribundo Império Sassânida. Yazdegerd III foi reduzido
a pouco mais que um fugitivo. Após a queda da província de Fars entre 649 e
650, tentativas de angariar apoio primeiro em Kernan e depois em Sakastan
falharam, com os governadores dessas províncias se recusando a pagar
impostos a um imperador destituído e impotente. Se retiraram então para Merv,
na Ásia Central, ele tentou um último esforço em repelir os invasores, apelando
para seus aliados entre os principados haftalitas. Alguns soldados realmente
foram enviados, mas nunca veriam uma batalha contra os árabes. O seu último
general, Farrukhzad, o abandonou em 651, com o governador de Merv, Mahuy
Suri se voltando contra Yazdegerd III também. Yazdegerd então finalmente
encontra seu fim se escondendo na casa de um humilde moleiro nos arredores
de Merv, assissinado logo depois. Embora a resistência local continuasse no
Tabaristão nos anos seguintes, o Império Sassânida já era, e sua dinastia
continuaria existindo apenas por meio de uma família de exilados se refugiando
na China.

No entanto, de 651 a 656, o nepotismo do califa envelhecido e as


políticas econômicas impopulares criariam uma oposição crescente ao seu
governo. Durante o reinado de Omar, foram feitas leis proibindo soldados
árabes de comprar terras nos territórios conquistados, para evitar influências
estrangeiras na fé, tanto para “proteger” a propriedade dos conquistados.
Durante o reinado de Otomão, essas restrições foram removidas, fazendo com
que muitos soldados comprassem grandes extensões de terras na Síria e no
Iraque, em alguns casos abusando do poder para expulsar os habitantes e
revender a mesma terra com grandes lucros, criando uma nova classe de ex-
soldados ricos estabelecendo propriedades luxuosas em todo o califado. Essa
preferência por luxo, aumentou os impostos e criou um grande ressentimento
entre os não-muçulmanos e não-árabes convertidos.

Otomão também criou uma controvérsoa religiosa por criar uma versão
unificada e oficial do Alcorão. Além disso, a natureza ad hoc pela qual as
revelações do Profeta foram registradas e transmitidas por seus companheiros
mais próximos, significa que muitos livros do Alcorão tinham pequenas
variações no texto de um para o outro. Então Otomão fez com que uma reunião
de estudiosos religiosos determinasse o relato canônico das palavras do
Profeta, reunindo e queimando o máximo possível de variantes do Alcorão. O
Alcorão de Otomão permanece inalterado até hoje. No entanto, muitos não
concordaram com essa queima dos outros livros com variações, e começou a
estourar rebeliões.

Primeira Guerra Civil Muçulmana (656-661)


(domínios de Ali em verde e domínios de Mu´awiya, ambos em 658)

O ressentimento de longa data contra Otomão estourou numa rebelião


aberta em 656. No Egito, Kufa e Basra, soldados descontentes se reuniram e
marcharam para Medina para exigir a deposição de Otomão. Otomão foi
informado por agentes que diziam que as queixas contra ele eram frívolas e
uma revolta era improvável, e Otomão foi pego de surpresa quando um bando
de soldados chegaram em Medina. Otomão recusou sair do cargo e tentou
chegar a um acordo pacífico, enviando Ali ibn Abi Talib, o genro de Maomé,
para negociar com os revoltosos em seu nome. Os destacamentos menores de
Basra e Kufa foram convencidos a fazer as pazes com Otomão, enquanto que
a força do Egito foi aplacada com a promessa de remover seu impopular
governador, Abdullah, e substituir por Muhammad ibn Abi Bakr, filho do
primeiro califa. Então os soldados voltaram para o Egito, mas atacaram um
mensageiro com destino ao Egito, com ordens de executar os líderes rebeldes.
Tomando isso como um ato de traição de Otomão, os rebeldes voltaram para
Medina, cercaram a casa de Otomão, exigindo sua renúncia. Não está claro se
Otomão realmente ordenou que os rebeldes fossem executados, com a maioria
das fontes creditando a mensagem não a Otomão, mas a seu primo e
secretário, o futuro califa Marwan ibn al-Hakam. Seja qual for a verdade, os
rebeldes cortaram a água da casa de Otomão e começaram a fazer exigências
cada vez mais ameaçadoras, até que um dos servos de Marwan matou um dos
porta-vozes rebeldes com uma pedra da sacada, dando um fim sangrento e
quase inevitável.

Abandonado pela maioria do seu clã omíada, com os rebeldes


iraquianos e notáveis de Medina permanecendo neutros, Otomão ordenou que
seus defensores restantes se retirassem na esperança de evitar derramamento
de sangue quando os rebeldes atacaram a casa no dia seguinte. Marwan e os
filhos de Ali se recusaram a cumprir essa ordem e tentaram salvar a vida do
seu califa. Enquanto Otomão estava fazendo suas orações do meio-dia,
Muhammad ibn Abi Bakr e alguns dos rebeldes egípcios entraram em sua casa
do telhado de uma casa vizinha, ameaçando o califa com uma espada. Otomão
foi o primeiro califa a ser assassinado pelos seus companheiros muçulmanos, o
que abalou o mundo muçulmano. Então os rebeldes passaram a controlar
efetivamente Medina, e principalmente os iraquianos, e Ali se tornou o novo
califa. No entanto, seu reinado seria conturbado por pessoas querendo justiça
pelo que fizeram a Otomão. Como seu próprio filho Hasan foi ferido
defendendo Otomão, é muito improvável que Ali estava por trás do
assassinato. No entanto, muitos dos rebeldes que se opuseram a Otomão,
agora eram seus maiores apoiadores, então se Ali os punisse, perderia a base
de seu poder. Por outro lado, como ele permitiu que o assassinato de Otomão
ficasse impune, ele foi chamado de fraco e cúmplice, principalmente pelo
poderoso clã Omíada.

Os primeiros sinais de conflito da Guerra Civil, também chamada de


Primeira Fitna, vieram de Talha ibn Ubayd Allah e Zubayr, principais
concorrentes de Ali na eleição que o levou ao trono. Eles se aliaram com Aisha,
a viúva do próprio Profeta, sendo ela a figura espiritual unificadora da rebelião,
financiando vários governadores omíadas depostos por Ali no início de seu
reinado, além de vários outros líderes muçulmanos, como Marwan e o filho de
Otomão. No entanto, muito esforço de Aisha foram desperdiçados tentando
angariar apoio no Iraque, apesar da maior parte da região ser leal a Ali. Então,
quando a liderança rebelde deixou Meca, para ganhar apoio em Basra em
outubro de 656, a discordância interna fomentou dentro de sua causa. Talha e
Zubayr estavam disputando um contra o outro por autoridade, enquanto o
segredo do destino do exército criou ressentimento em Marwan e dos clãs
omíadas dentro do exército que viam a insurgência mais como uma rixa de
sangue do que uma rebelião, e preferiam apenas ter marchado para Medina e
executar os conspiradores que mataram Otomão.

Quando o grupo de Aisha chegou em Basra em dezembro, Zubayr e


Talha fizeram um discurso no mercado chamando o povo para pegar em armas
contra Ali. Mas a reação do povo se didiviu, com alguns fornecendo apoio e
outros denunciando. A primeira briga ocorreu logo depois quando apoiadores
de Aisha e os apoiadores de Ali começaram a brigar no mercado de Basra,
batendo uns nos outros com solas de sapatos. O governador de Basra, Uthman
ibn Hunayf, permaneceu leal a Ali, mas temendo derramamento de sangue na
sua cidade, ele permitiu que os rebeldes acampassem do lado de fora da
cidade, enquanto esperava um pronunciamento de Ali. A mensagem de Ali logo
chegou e instruiu Hunayf a dar aos rebeldes o ultimato de lealdade a Ali, ou a
guerra. No entanto, o grupo de Aisha já estava numa posição defensável perto
do armazém da guarnição local. O estudioso Zalim ibn Amr al-Du´ali foi enviado
por Hunayf para fazer uma última súplica por paz e pelo fim da rebelião.
Quando foi recusada, o comandante da cavalaria de Basra, Hukaym ibn
Jabala, saiu furioso com as forças locais do governador. Seguiu-se uma
batalha curta e sangrenta ao longo do acampamento de Aisha, e muitos dos
dois lados morreram, mas os rebeldes não foram desalojados. Um cessar-fogo
foi assinado pelos rebeldes com a intenção de durar até a chegada de Ali.

No entanto, durante a noite um grupo dos rebeldes capturaram o


governador em um ataque surpresa, dando-lhe 40 chicotadas, e arrancando
sua barba e cílios antes de aprisioná-lo. Na manhã seguinte, o filho de Zubayr,
Abdallah, liderou os rebeldes em um ataque ao armazém, matando quarenta
ex-escravos convertidos de Sindh que haviam sido colocados como guardas e
apreendendo os grãos destinados às provisões de inverno da cidade. Hukaym
chegou pouco depois com muita raiva, exigindo que Abdallah libertasse o
governador e repreendendo-o pelo assassinato de muçulmanos inocentes de
qualquer participação na assassinato de Otomão. Quando Abdallah recusou,
Hukaym atacou com os 700 homens restantes, se encontrando rapidamente
cercado e dominado por um exército rebelde maior. Embora ele tenha lutado
bravamente, inclusive atingindo fatalmente um dos rebeldes com a sua própria
perna decepada, acordo com um relato bastante fantasioso, ele, seus filhos e
muitos de seus soldados foram mortos. O resto fugiu e se rendeu, deixando os
rebeldes com o controle de Basra.

Com Ali a caminho, os rebeldes vitoriosos tiveram pouco tempo para


reunir apoio para seu movimento. Embora o controle da cidade e de seus
tesouros trouxesse a maioria das tribos vizinhas pelo menos nominalmente à
bandeira de Aisha, os emissários enviados para Kufa ao norte tiveram menos
sucesso. O governador de Kufa, Abu Musa ibn Asha´ari estava tentando
permanecer neutro, o notável Zayd ibn Suhan, depois de receber uma
mensagem de Aisha carinhosamente abordando-o como um filho amado,
respondeu que seu amado filho deseja que ela fique em segurança em casa.
Os esforços de Ali foram mais frutíferos, mandando seu filho Al-Hasan para
Kufa, Abu Musa foi logo deposto, e mais de 6000 homens foram reunidos para
a retomada de Basra. Ali chegou em Basra com quase 10.000 homens em 5 de
dezembro. Quando os exércitos se encontraram um enviado de Ali estava com
o Alcorão fixado na ponta de uma lança, simbolizando que queriam um
combate honroso. Mas esse cara foi perfurado por flechas e caiu morto, e a
batalha começou com os dois exércitos de cavalaria pesada se chocando como
um trovão. Várias tribos de Basra desertaram no meio da batalha, o que
enfraqueceu Aisha. No centro do exército de Ali, Abu Qutada al-Nu´man liderou
os soldados de infantaria Kufan, enquanto o filho de Ali, Muhhamad ibn
Hanafiyyah, carregava o estandarte de seu pai. Na ala direita do exército de Ali,
Malik al-Ashtar liderou a maior parte da cavalaria Kufan, derrotando as tribo de
Banu Hanzala. E na esquerda de Ali, o célebre Ammar ibn Yasir é dito que
levou Zubayr, que liderava o exército rebelde contra ele, a abandonar seu
exército e partir sem lutar. A deserção de Zubayr é questão de algum mistério.

A deserção de Zubayr fez com que Talha assumisse o controle da


situação, e liderando a cavalaria de Basra, ele fez várias incursões na
esquerda de Ali. No entanto, Talha foi atingido por uma flecha na parte de trás
de seu joelho, mas essa flecha veio de seu aliado Marwan. As tropas de Ali
venceram a batalha e Marwan foi feito prisioneiro. Essa batalha é chamada de
Batalha do Camelo. Dos três líderes rebeldes, apenas Aisha sobreviveu à
batalha e suas consequências, sendo escoltada de volta à Medina por seu
irmão Muhhamad ibn Abi Bakr, onde ela viveria seus dias em conforto mas sem
relevância política. Zubayr foi encontrado logo após o fim da batalha por um trio
de membros da tribo, e assassinado enquanto tentava escapar.

Como Ali tinha deposto Mu´awiya e outros governadores nomeados por


Otomão, a rivalidade entre os dois era inevitável. Mu´awiya era poderoso o
suficiente para rasgar a carta de demissão e os outros governantes depostos
rapidamente se aliaram a ele. Rapidamente Mu´awiya repreendeu
publicamente Ali pelo assassinato de Otomão, e reinvidicou o califado, já que
ele era o parente mais próximo e Otomão. O famoso Amr também se aliou a
Mu´awiya, em troca dele remover o atual governador do Egito, Qays ibn Sa´d.
O jeito que Mu´awiya fez isso foi brilhante: ele escreveu uma carta como se
fosse Qays escrevendo para ele, concordando em se juntar à sua causa, e
garantiu que os espiões de Ali soubessem disso. Então Ali caiu no truque e
depôs Qays, e colocou Muhhamad ibn Abi Bakr no lugar. Amr também ajudou
Mu´awiya a forjar uma importante aliança com a tribo mais poderosa do Iêmen,
os Himyar, que já governou um poderoso reino independente em tempos pré-
islâmicos.

Quando Ali partiu de Medina no final de maio de 657 com seus exércitos
atrás dele para depor Mu´awiya, ele teria uma luta mais dura do que esperava.
Antes que os dois exércitos se encontrassem em batalha, uma série de
perseguições e escaramuças de cavalaria ocorreram em Harran e Raqqa,
colocando Malik al-Ashtar contra Abd al-Rahman ibn Khalid, filho do
inesquecível Khalid. A primeira luta verdadeira aconteceria em Siffin, às
margens do rio Eufrates. Quando o exército de Ali chegou em 5 de junho de
657, eles encontraram a cavalaria síria impedindo-os de chegar na única área
de água acessível por quilômetros. Isso foi contra o conselho de Amr, e provou
ser um erro por parte de Mu´awiya. A tentativa imprudente de Mu´awiya de
negar água a seus inimigos no calor do deserto, perdeu qualquer simpatia que
ele ou suas forças pudessem ter desfrutado nas fileiras de Ali. Al-Tabari coloca
o exército de Ali como sendo de 70.000 homens, mas provavelmente ele tinha
de 20.000 a 30.000 homens, com o exército de Mu´awiya sendo um pouco
maior. A batalha de Siffin foi uma das maiores e mais impactantes da história
islâmica e teve várias fases nas próximas semanas.

Após guerrear com as tropas sírias que estavam guardando a água, Ali
conseguiu vencê-las, mas nos próximos dois dias, os dois exércitos fizeram
negociações fracassadas. Além disso, teve uma semana de incursões diárias e
duelos pessoais que duraram até 18 de junho. Em 19 de junho teve outro
cessar-fogo, com a duração de mais de um mês. Finalmente em 26 de junho,
os dois exércitos começam a batalha pra valer, que duraria três dias e três
noite ininterruptas. No segundo dia, Mu´awiya quase derrotou Ali, com Habib
ibn Maslama liderando um ataque massivo que levou a ala direita de Ali a fugir,
e empurrou com força contra seu centro, até que reforços liderados por Malik
al-Ashtar detivessem o avanço sírio. Abd´Allah ibn Budayl, que estava no
comando da direita de Ali, tentou aproveitar a vantagem momentânea levando
sua cavalaria até a tenda de Mu´awiya, apenas para ser cercado e morto pelas
tropas de elite de Mu´awiya. No terceiro dia, Mu´awiya redobrou seus esforços
para quebrar a ala direita de Ali, enviando seus aliados himiaritas contra ela,
sob o comando de Ubayd´Allah ibn Umar, o filho desgraçado do califa Omar,
cujo nome havia sido manchado por um crime de honra ilegal, mas cuja
ascendência fez dele muito útil para Mu´awiya. No entanto, a ala direita de Ali
se manteve firme, matando Ubayd´Allah e o chefe Dhul-Kala do Himyar, e
inflingindo baixas terríveis.

No quarto dia, Ali parecia estar na vantagem. Muitos enviados de Mu


´awiya vieram para o centro do campo de batalha com o Alcorão nas lanças,
como uma bandeira de trégua, apelando a Ali para permitir uma arbritragem
obrigatória para resolver sua disputa com Mu´awiya. Com as mãos atadas, Ali
aceitou a trégua de Mu´awiya, dando fim à batalha. Cada lado nomeou um
árbitro, sendo Amr para Mu´awiya, e Abu Musa para Ali. No entanto, alguns
apoiadores de Ali viram isso como um ato de traição por deixar a justiça na
mão dos homens e não de Deus no campo de batalha. Zur´ah ibn al-Burj e
Hurqus ibn Zuhayr confrontaram Ali exigindo que ele abandonasse as
negociações, mas Ali não concordou. Insatisfeitos, esses dois adotaram o
slogan “A autoridade pertence somente à Deus”, com novos adeptos se
convertendo ao seu ponto de vista. Após Ali retornar a Kufa, esses carijitas,
como mais tarde serão chamados, provoram ser uma pedra no sapato de Ali,
declarando que tanto Ali quanto Mu´awiya são impróprios para governá-los.

À medida que esse descontentamento crescia, os dois árbitros se


reuniram duas vezes ao longo do ano seguinte, finalmente retornando um
veredicto a favor de Mu´awiya, ordenando que Ali fosse deposto em abril de
658. Ali não concordou falando que isso era um julgamento político e não
religioso. Além disso, em Kufa, os carijitas estavam formando uma nova
rebelião, com Abdallah ibn Wahb assumindo o comando do movimento.
Abdallah ibn Wahb então reagrupou suas forças para o norte, na ponte que
cruzava o Nahrawan. Enquanto isso, outros bandos de carijitas em todo o
Iraque partiram para se juntar a Abdallah ibn Wahb. Parecia que Abdallah ibn
Wahb queria marchar em direção a al-Mada´in e conquistar a cidade. Ali foi
atrás dos carijitas, chegando em Nahrawan em julho de 658. Ali tentou evitar a
guerra com os carijitas, propondo que ele retornasse a guerra contra Mu´awiya,
e pedindo para que eles retornem para a sua causa. Alguns fizeram, mas a
maioria permaneceu entrincheirada. Muitos das tropas de Ali achavam que os
carijitas eram um problema menor, para lidar depois que lidassem com Mu
´awiya. Mas depois que vários aldeões locais foram mortos pelos carijitas, a
reação de Ali foi rápida, com seu exército muito maior enfrentando eles em 17
de julho. Após um conflito rápido, sangrento e em grande parte unilateral, o
exército rebelde foi quebrado.

Nos próximos dois anos, Mu´awiya colocaria Amr como governante do


Egito, e faria novas alianças em todo o califado, que agora via ele como o
verdadeiro califa, ao invés de Ali. No início de 661, Ali decide atacar a Síria
novamente, mas o ataque nunca aconteceu. Reunidos em Meca, três carijitas
fizeram um pacto para assassinar os três homens que para eles eram
responsáveis pela guerra civil: Ali, Mu´awiya, e Amr. Duas das três tentativas
de assassinato falharam, mas em 28 de janeiro, quando Ali estava orando na
Grande Mesquita de Kufa, Abd al-Rahman ibn Muljan o atacou pelas costas
com uma espada envenenada, matando o califa e vingando os seus
compatriotas carijitas. Com Ali morto, poucos restaram que podiam negar que
Mu´awiya era o novo califa. E assim começa o Califado Omíada.

Depois dessa guerra civil é que começa a divisão entre sunitas e xiitas.
Os apoiadores mais próximos de Ali negaram a legimidade de Mu´awiya e seus
sucessores, elevando Ali e sua linhagem familiar ao papel de imãs de
inspiração divina. Conhecido como Partido de Ali ou Shi´at Ali seu movimento
permanece forte até hoje, conhecido como islamismo xiita (shi´at), agora
dividido em seitas próprias. Os seguidores de Mu´awiya são os sunitas, os
seguidores da Sunnah, as tradições e exemplos derivados do Profeta.

Espalhando-se e conquistando o norte da África, os carijitas


permanecem uma força antagônica e difamada muitas vezes em conflito com
seus companheiros muçulmanos e o que eles viam como califas corruptos e
ilegítimos. Embora sua seita permanecesse pequena, estaria no centro de
inúmeras revoltas e rebeliões durante o período omíada e também nos séculos
seguintes. Foi de dentro de suas fileiras porém, que a comunidade de Ibadi,
mais moderada e neutralista, surgiria, a fé dominante agora no atual Omã.

Além disso, não teria mais eleições para os califas como aconteceu com
os quatro primeiros. Agora teria elementos de sucessão dinástica, e o poder
ficaria com a dinastia Omíada até seu fim em 750.
Califado Omíada (661-750)

(auge do califado Omíada em 750)

Enquanto estava acontecendo a Guerra Civil, os bizantinos sob


Constante II pensaram em tentar reconquistar algumas províncias. No entanto,
eles estavam ocupados demais cuidado dos eslavos na campanha dos Balcãs
em 658, e a única região que anexaram foi a Armênia. Além disso, Constante II
aumentou os impostos de regiões como Sicília e norte da África, que eram
vistas como não tão importantes quanto a Anatólia e a Grécia segunda a
divisão de Heráclio. Além disso, também havia problemas religiosos, visto que
havia discordância entre cristãos calcedônicos e os armênios miafisistas.
Esforços para reconciliar as diferenças religiosas entre a ortodoxia grega e
armênia levou à criação do movimento monotelita, uma espécie de
compromisso religioso a ser seguido mas que não conseguiu influenciar a
maioria da população bizantina. Durante o reinado de Constante II, esse
movimento criou divisões dentro da capital, e ele tentou reprimir o cisma
proibindo qualquer discussão sobre o tema, e até forçando o papa Martinho I
ao exílio depois que ele condenou o monotelismo.

Em 663, Constante II mudou a capital para Siracusa, na Sicília. Ele


também reuniu todas as forças que conseguiu na esperança de derrotar os
lombardos e garantir o sul da Itália em 666. No entanto, os lombardos os
derrotaram em uma série de batalhas, forçando-o a se retirar para Siracusa,
enquanto seu filho e co-imperador Constantino IV, mantinha a ordem em
Constantinopla. Ele foi incapaz de impedir que a Armênia caísse para os
muçulmanos no mesmo ano. E a Sicília sofreria em devastador ataque naval
em 666, comandado por Abdullah ibn Qais, que pilhou enormes quantidades na
ilha.

O califa Mu´awiya também estava fazendo ataques semelhantes pelo


mar em Rodes enquanto a marinha árabe estabelecia bases navais ao longo
da Ásia Menor se preparando para um cerco em Constantinopla. Em 667,
Constante II foi obrigado a lidar com uma rebelião apoiada pelos omíadas feita
por um general armênio vira-casaca Sabórios, que brevemente assumiu o
controle da maior parte da Anatólia. A rebelião deu em nada após um acidente
mortal onde Sabórios morreu em um acidente de equitação, pouco antes da
batalha de Melitene. Mas Fadalah ibn Ubayd, um general muçulmano
experiente, logo sitiou Constantinopla em 667, no subúrbio de Calcedônia na
Anatólia. Embora fossem capazes de capturar muitos prisioneiros, a falta de
suprimentos e apoio fez com que essa primeira tentativa de cerco fracassasse.
Doenças e fome logo acometeram seu exército, e Fadalah foi forçado a se
retirar no mesmo ano. No entanto, de acordo com Teófanes, o Confessor, 5000
soldados foram deixados na fortaleza capturada de Amório. No entanto, Amório
seria recapturada durante o inverno extremamente frio que se seguiu, com um
camareiro eunuco chamado Andrew liderando uma força através das fortes
nevascas.

Em 668, Constante II foi atingido pela cabeça com um balde e morto por
um de seus servos, enquanto tomava banho. Mais rebeliões surgiram na
Sicília, com os conspiradores de seu assassinato aclamando o general
Mezezius como imperador, em oposição a Constantino IV. Constantino
convocou tropas em apuros do norte da África e Itália, pondo fim à rebelião na
Sicília após sete meses e encerrando seu breve apogeu como capital do
império. No entanto, a convocação de soldados do norte da África deixou as
forças bizantinas em Cartago muito menos capazes de resistir à pressão dos
árabes. Em 668 e 669 houve novos ataques relâmpagos árabes no norte da
África perto de Cartago, onde eles capturaram milhares de prisioneiros nos
territórios bizantinos. De 670 a 671, os muçulmanos também fizeram
conquistas menores ao leste do antigo Império Sassânida. Em 670, Muhallab
ibn Abi Sufra conquistou Cabul e assumiu pelo menos o controle nominal de
todo o Khurasan, uma das regiões anteriormente sob controle persa que tinha
ficado fora do domínio árabe. Apesar da forte resistência das tribos das colinas
turcas que quase viram uma força cercada e exterminada durante seu retorno a
Cabul, ele também penetrou com sucesso no Passo Khyber para iniciar as
primeiras conquistas do interior do atual Paquistão. As incursões muçulmanas
no subcontinente indiano se limitaram às planícies costeiras que eram mais
fáceis de atravessar.

A campanha para tomar Constantinopla começou em 672, com uma


enorme frota omíada equipada, passando o inverno nas bases preparadas da
Esmirna e Cilícia. Enquanto isso, os bizantinos se preparavam para construir
grande birremes e dromons para a defesa da cidade, equipados com uma nova
arma mortal, provavelmente o maior segredo da Idade Média, equiparável à
bomba atômica, o fogo grego. Com a chegada da primavera, a frota embarcou
para Constantinopla, colidindo quase diariamente com frotas bizantinas nas
águas ao sul de Dardanelos, de abril até setembro. E os bizantinos destruíram
a frota árabe usando o fogo grego, o que tornava o confronto de frota contra
frota quase suicida pra os árabes.
Então sob o comando de Yazid, os omíadas foram transportados para
terra para cercar a cidade de Constantinopla, desembarcando perto de
Adrianópolis. No entanto, a falta de um apoio naval efetivo tornou a superação
das impotentes muralhas de Constantinopla impossível. O cerco à cidade
durou de 674 a 678, quando em 678 teve uma revolta de cristãos mardaítas e
escravos fugitivos na cordilheira Nur ao norte de Alexandreta, o que forçou Mu
´awiya a abandonar Constantinopla.

Os anos seguintes dariam um alívio breve mas necessário aos


bizantinos. Quando Mu´awiya morreu em 680, ele foi sucedido por um período
de turbulência e guerra civil. Yazid foi aclamado como califa em Medina, mas
quando os governadores e notáveis do califado foram convocados para prestar
seus juramentos de fidelidade, duas importantes figuras se recusaram: Husain
ibn Ali, filho de Ali, e Abdullah ibn Zubayr, filho de Zubayr. Os dois se uniram e
fugiram para Meca para começar uma rebelião contra Yazid. Um primo de
Husain, Muslim ibn Aqil, foi enviado para Kufa antes de Husain e seu partido
para determinar a força de apoio em Kufa e por suspeitas de que as ofertas
possam ser uma armadilha de Yazid ou de um notável local que estava
tentando bajular seu favor. Após a sua chegada, ele achou as ofertas de apoio
genuínas e cerca de 12.000 se reuniram ao lado de Muslim para prometer
lealdade a Husain. Após receber essas notícias, Husain saiu de Meca em
direção a Kufa para encontrar seu primo, uma jornada que ele nunca
completaria. E Yazid ao saber que o governador de Kufa, Nu´man ibn Bashir
ficou neutro, e permitiu que os apoiadores de Husain se reunissem em Kufa,
rapidamente tomou atitude. Yazid transferiu Nu´man para uma província
diferente, nomenado Ubaidallah ibn Ziyad no lugar, iniciando uma dura
repressão ao crescente bando rebelde, com Muslim ibn Aqil e vários outros
líderes sendo assassinados, e os rebeldes desmoralizados sendo espalhados
sob intensa pressão de forças militares locais.

Quando Husein recebeu a notícia desse desastre ele já estava perto da


atual Rifai, longe da segurança em Meca. Eventualmente Husein foi a Kufa
para vingar o primo assassinado, e embora muitos de seus apoiadores terem
desertado ele continuou a marchar para a cidade. Nas planícies de Karbala,
seu pequeno grupo foi perseguido pelos apoiadores de Ubaidallah e Husein
pediu permissão para voltar para Meca. Ubaidallah exigiu que Husein se
rendesse e jurasse lealdade a Yazid. Quando Husein recusou, as forças de
Ubaidallah o cercou forçando sua rendição. Isso também falhou, e o exército de
Ubaidallah atacou com tudo em 10 de outubro de 680, matando Husein e seus
apoiadores. A morte de Husein, o neto do profeta, também chocaria o mundo
muçulmano, e a data ficou imortalizada pelos xiitas como um dia de luta e
Karbala virou lugar de peregrinação.

Estimulados pelo martírio de Husein, muitas revoltas lideradas por


Abdullah ibn Zubayr surgiram em Meca e Medina nos anos seguintes, com as
experientes forças de Yazid, sob o comando de Muslim ibn Uqba inflingindo
derrotas aos rebeldes, mas falhando em recuperar a lealdade da população. O
cerco e o bombardeio da própria cidade sagrada de Meca em 683 só criou
mais indignação, com Yazid morrendo no mesmo ano de causas inexplicáveis.
Seu filho e sucessor, o doente Mu´awiya II, governaria apenas por alguns
meses antes de abdicar, deixando um trono vazio e um califado dividido mais
uma vez, inaugurando a Segunda Fitna.

Em 684, várias figuras reinvidicaram o califado. No Hijaz, Abdullah ibn


Zubayr foi aclamado califa, com a maioria do mundo muçulmano inicialmente
apoiando-o. Ubaidallah ibn Ziyad também reinvidiou o califado por um breve
período, mas não conseguiu obter apoio generalizado, e logo foi expulso de
Basra por uma revolta dos carijitas. E na Síria, Mu´awiya II foi sucedido por
Marwan. Ubaidallah confiscaria oito milhões de dirhams do tesouro de Basra
para si e marcharia para se aliar a Marwan. O primeiro desafio de Marwan foi
garantir seu domínio sob a Síria contra um inimigo poderoso e perto de casa,
Dahhak ibn Qays, governador da província de Damasco. Dahhak desertou para
Abdullah em oposição aos omíadas, trazendo boa parte da Síria com ele. Os
conflitos começaram nas ruas assim que Dahhak e Khalid ibn Yazid fizeram
seus discursos cada um defendendo seu lado, e os omíadas mantiveram o
controle da cidade de Damasco e consequentemente um vasto tesouro do
califado, garantindo que Marwan conquiste a lealdade de muitas tribos através
do suborno. Dahhak e Qays conseguiram reunir um exército considerável de
20.000 ou mais em Marj Rahit, na borda do deserto à leste de Damasco. Os
dois exércitos se encontraram em 29 de julho de 684. Marwen estava com
grande desvantagem numérica, mas seu exército de infantaria pesada foi
capaz de se manter firme ao longo de 19 dias de ataques e escaramuças da
grande força montada de Dahhak. A ala esquerda de Marwan era comandada
por Ubaidallah e a direita por Amr ibn Sa´id. Em 18 de agosto a luta ficou mais
feroz e começou as cargas e combates corpo a corpo. Apesar de vir de tantos
grupos díspares, a moral e a disciplina das forças de Marwan venceram, com
sua infantaria pressionada resistindo a vários ataques desorganizados até que
um poderoso campeão chamado Zuhnah ibn Abdallah matou Dahhak no meio
da briga acalorada. A batalha estava vencida e os que fugiram voltaram para
casa ou juraram obediência a Marwan.

No entanto, a maior parte do califado não aceitava Abdullah como novo


califa, e mais facções e desafiantes surgiam para complicar a luta pelo trono.
Com a vitória em Marj Rahit, Marwan resgatou sua dinastia da beira da derrota
total.

Segunda Guerra Civil Muçulmana (683-685 ou 680-692)

A autoridade de Abdullah ibn Zubayr dependia de alianças instáveis com


os carijitas e os xiitas. Abdullah lutava para encontrar uma frente unificada
entre seus apoiadores para enfrentar Marwan. Em 684, logo após a batalha de
Marj Rahit, Marwan foi capaz de tomar o Egito, trazendo a população de volta à
causa omíada. No entanto, ele ficou num impasse com o governador do Egito
Abd al-Rahman, do lado de fora da cidade.

Enquanto isso, na Ásia Central na região de Khurasan, com Abdallah ibn


Khazim nunca tendo sido nomeado governador por nenhum califa. Em vez
disso, ele forçou a saída do governador omíada Salm ibn Ziyad graças a
sentimentos anti-omíadas no exército. O vácuo de poder permitiu que várias
comunidades locais e facções dentro do exército expulsassem funcionários e
assumissem o controle de Khurasan. No entanto, a eficácia e brutalidade de
Khazim em suprimir rebeldes e invasores heftalitas oportunistas, supostamente
ordenando que suas forças executassem os prisioneiros até o pôr do Sol após
uma vitória, rapidamente encerrou qualquer oposição, permitindo que ele
governasse com pouca consideração de qualquer facção da guerra civil.

Em Kufa, um movimento militante xiita conhecido como al-Tawwabin ou


Penitentes, estava ganhando força. Embora a morte de Husein tenha causado
um choque e indignação em toda a comunidade muçulmana, o impacto foi
maior na comunidade xiita em Kufa. Com a eclosão da Segunda Fitna,
propagandistas foram enviados para guarnecer cidades em Kufa, pedindo
vingança e troca de poder para a família do profeta. O movimento começou a
se dividir, no entanto, com a chegada de Mukhtar al-Thaqafi em 7 de maio de
684. Ele alegou ser um seguidor de Muhammad ibn al-Hanafiyyah, um filho de
Ali através de uma esposa diferente. As suas alegações serviram para afastar
uma parte dos Penitentes de seu líder Sulayman ibn Surad e criar uma divisão
amarga. Quando o governador de Zubayrid, Abdallah ibn Yazid chegou em 15
de maio, foi tudo que ele pode fazer para impedir a violência entre as duas
facções ou contra seus antigos aliados de Zubayrid.

Enfraquecendo ainda mais Abdullah ibn Zubayr, seus aliados carijitas


em Meca o abandonaram durante o mesmo período. Cansados das vagas
alegações de apoio ideológico de al-Zubayr, eles se mudaram para Basra, e
para a região de Al-Yamamah para levantar uma rebelião própria sob a
liderança de Abu Talut. Eles permaneceriam um grande espinho no lado dos
Zubayrids, até conquistando boa parte da península árabica nos próximos
anos.

Os Penitentes de Sulayman ibn Surad iniciaram a tão esperada invasão


da Síria em 15 de novembro. Mas ele ficou desapontado porque vieram apenas
5000 soldados dos 16.000 soldados que havia sido prometido, e muitos desses
5000 também desertaram nos próximos meses. Abdallah ibn Yazid tentou
convercer eles a ficarem em Kufa, mas não funcionou. Quando os Penitentes
chegaram em al-Qarqisiya, eles receberam suprimentos e informações do
simpático Zufar ibn al-Harith.

O exército omíada, retornando da subjugação do Egito, havia


recentemente deixado Raqqa em direção à cidade de Ayn al-Warda em 685.
No entanto, Sulayman chegou em Ayn al-Warda antes de seus inimigos sírios,
e acampou a oeste da cidade a fim de isolar seus inimigos de água e comida.
Quando eles chegaram em janeiro de 685, os Penitentes foram conduzidos ao
seu acampamento por um beduíno local e lançando um ataque surpresa e os
cavaleiros de Sulayman derrotou as forças de al-Kala. Os Penitentes exigiram
que ibn Ziyad fosse entregue a eles por seu papel na morte de Husein, e os
omíadas exigindo que Sulayman jurasse lealdade a Marwan. Mas essas
exigências eram mais por formalidade, e eles queriam guerrear entre si de
qualquer jeito.
Os Penitentes fizeram bom uso de sua mobilidade, reforçando ou
retirando contigentes quando forem atacados em vez de enfrentar a força
omíada maior de frente. Ambos os comandantes lideraram seus respectivos
centros, com a cavalaria de Sulayman desmontando para apoiar seus
camaradas no chão onde a luta era mais intensa. As forças sírias se retiraram
em boa ordem para se reagrupar. Quando os combates começaram no dia 6,
os exaustos Penitentes logo se viram pressionados por todos os lados, sem
poder impedir que fossem flanqueados. Sulayman morreu junto com vários de
seus companheiros por uma rajada de flechas, e al-Musayyab ibn Najabah
morrendo também do lado dos Penitentes.

A destruição da causa dos Penitentes aproximou os omíadas de


recuperar seu califado, embora Marwan morresse de praga ou assassinado por
sua rainha na primavera de 685. Ele foi sucedido pelo seu filho Abd al-Malik. A
morte de Sulayman não acabaria com o envolvimento xiita no conflito ainda, só
que os sobreviventes do movimento de Sulayman se voltam para Mukhtar al-
Thaqafi, que vinha crescendo em poder no Iraque. Esse por sua vez rompeu
qualquer laço restante que tinha com Abdallah ibn al-Zubayr e destituiu seu
governador, Abdallah ibn Muti, assumindo o controle da maior parte do Iraque e
Armênia.

Revoltas carijitas derrubaram a autoridade zubaírida no sul da Pérsia e


Bahrein, deixando os dois lados do Golfo Pérsico para eles, e o pretenso
califado de Abdallah ibn al-Zubayr ficando cada vez menor. Apesar disso,
Abdallah ibn al-Zubayr estava londe de estar indefeso e derrotou um empurrão
omíada em Medina sob o líder tribal Quda´a ibn Dulja, quanto um ataque
carijita em Basra.

As forças omíadas que derrotou os Penitentes de Sulayman fez um


progresso lento após essa vitória, atrasada pela morte de Marwan e revoltas
das tribos Qaysi que apoiaram Dahhak em Marj Rahit. Quando os omíadas
lançaram a invasão do Iraque no verão de 686, al-Mukhtar estava em
desvantagem, pois suas tentativas de apaziguar tanto a nobreza tribal quanto
os convertidos não-árabes, fez com que a nobreza tribal tentasse depô-lo. Esse
conflito foi ainda mais alimentado pelo irmão de Abdallah ibn al-Zubayr, e
governador de Basra, Mus´ab que cortejou essa nobreza descontente com al-
Mukhtar. Perto de Mosul, um dos comandantes de al-Mukhtar venceu os
omíadas, mas este morreu de praga. Como ele morreu de praga, espalhou o
rumor que eles perderam a batalha e uma revolta oportunista eclodiu no final
de junho. No entanto, al-Mukhtar mesmo sitiado em Kufa pelas tropas de Mus
´ab, foi capaz de reprimir essa tentativa de golpe, resistindo em seu palácio
tempo o suficiente par que Ibrahim ibn al-Ashtar retornasse da frente omíada
de Mosul, e aliviasse a sua situação em Kufa.

Em Khazir, os omíadas estavam com 30.000 soldados aproximadamente


e Ibrahim ibn al-Ashtar estava com 13.000. Os estágios iniciais da batalha
foram em favor dos omíadas, com a ala direita comandada por ibn Numayr,
matando o comandante da direita de Ibrahim ibn al-Ashtar, e colocando suas
tropas em fuga. No entanto, a bandeira caída logo foi pega por Abdallah ibn
Warqa, sobrinho de um dos companheiros do Profeta, que reuniu o suficiente
de soldados fugitivos de volta ao seu lado para impedir o avanço omíada. Na
esquerda omíada, relatos conflitantes sobre o papel de Umayr, com o
historiador al-Kalbi alegando que a prometida deserção nunca se materializou e
Umayr permaneceu leal, enquanto outros afirmam que ele desertou do campo
de batalha. No entanto, o que sabemos é que ele teve um papel passivo, e na
direita, Sharik ibn Jadir al-Taghlibi, cercou a tropa do meio e ibn Ziyad morreu,
o grande exército omíada se dissolveu em fugiu.

Alguns meses depois, provavelmente no outono de 686, Mus´ab ibn al-


Zubayr marcharia de Basra para sua própria invasão, apoiado por nobres
rebeldes exilados Kufan. Com pouco tempo de se recuperar, o exército de
Ibrahim ibn al-Ashtar apressou em encontrar os exércitos de Mus´ab, mas sem
o líder que os levou para a vitória contra os omíadas. O próprio Ibrahim ibn al-
Ashtar abandonou a causa de Mukhtar em circunstâncias pouco claras. Ahmar
ibn Shumayt assumiu o comando de suas forças, mas sem a experiência de
seu antecessor, seu exército sofreu um desastre em Madhar, com
ressentimento entre a nobreza tribal em ambos os exércitos em relação aos
mawali que compunham a maior parte das forças de Mukhtar. Enquanto os
não-árabes eram tradicionalmente impedidos de servir como guerreiros
montados, Mukhtar flexibilizou essa regra e aumentou os salários deles para
ganhar apoio. Quando ibn Shumayt exigiu que eles desmontassem e lutassem
como soldados de infantaria, mas ele foi morto pelas tropas de Mukhtar e os
cavaleiros Kufan escaparam, enquanto um grande número da infantaria mawali
foram atropelados e massacrados. Esse desastre acabou com o movimento
messiânico de Mukhtar. Mukhtar lideraria seu exército mais uma vez contra os
Zabayrids em Harura, nos arredores de Kufa. Mukhtar e suas forças lutaram
bravamente, mas Muhhamad ibn al-Ash´ath, líder dos exilados de Kufan que
lutavam sob Mus´ab, foi morto, e as tribos Hejazi das terras altas compondo um
quinto da força de Basran, fugiu da batalha. No entanto, quando a ala esquerda
de Basran, sob o cauteloso al-Muhallab abi Sufrah virou para frente, esmagou
as forças Kufan.

Embora Mukhtar tenha escapado por pouco, seu exército e esperanças


foram destruídos. Seus apoiadores foram executados em massa pelos
vencedores, com o cerco de quatro meses ao palácio em Kufa apenas
prolongando o inevitável. Em 3 de abril de 687, as forças de Mus´ab invadiram
o palácio e executaram Mukhtar, rapidamente restaurando a Armênia e o
Iraque ao domínio de Zubayrid.

Além de ataques carijitas e pequenos confrontos de fronteira, o


confronto entre omíadas e Zubayrids continuaria nos próximos quatro anos,
com ambos os lados exaustos da guerra civil, e nenhuma grande batalha
ocorrendo até 691. Durante esse período, no norte da África, os muçulmanos
voltaram a atacar a região de Cartago, com um exército omíada sob Zuhayr ibn
Qays despachado para as montanhas da Argélia, onde o rei berbere Caecilius,
aliado dos bizantinos, aproveitou da guerra civil para invadir grande parte da
Ifriqiya. Derrotando-o e matando-o em 688, Zuhayr retomou Kairouan e
reestabeleceu o califado como dominante na região, chegando os domínios do
califado até a fronteira com Cartago.

O omíada Abd al-Malik permaneceu ativo contra seus rivais de Zubayrid


durante a aparente calmaria, se envolvendo em intrigas e diplomacia com
apoiadores de Zubayrid em todo o califado. De 688 a 691, ele invadiu o Iraque,
mas foi interrompido por seu parente Amr ibn Sa´id numa tentativa de golpe de
curta duração. O fim da guerra civil viria quase como um anticlímax, na batalha
de Maskin em 691. A maioria do exército de Mus´ab desertou e abandonou ele
para morrer, enquanto Abd al-Malik finalmente recapturou o Iraque em outubro
de 691. Agora Abd al-Malik partiu para Meca para conquistar o último polo de
resistência, que era onde Abdallah ibn al-Zubayr estava. Teve um cerco em
meca em 692, e ele acaba com os últimos apoiadores de Abdallah ibn al-
Zubayr.

(grupos da Segunda Guerra Civil, ou Segunda Fitna)

Agora o único grupo que sobrava na guerra civil para os omíadas


vencerem eram os carijitas que formaram um estado independente na Arábia, o
que levaria ainda alguns anos. Mas o que importa é que o califado Omíada saiu
vitorioso depois dessa longa guerra civil.

Da conquista do Magreb até a Revolução Abássida (692-750)

Durante a Segunda Guerra Civil, o imperador bizantino Justiniano II até


que conseguiu reconquistar partes da Armênia de forma indireta, e Antióquia
em 689, mas duraria apenas até 692, e a Armênia até 694. Em agosto de 695,
o Império Bizantino entra num período conhecido como Anarquia dos Vinte
Anos, que foi marcado pela rápida sucessão de diversos imperadores no trono
entre a deposição de Justiniano II em 695, já no final da dinastia heracliana, e a
ascensão de Leão III, o Isauro em 717, o início da dinastia isáurica. Em 697, os
muçulmanos começam a tomar alguns territórios do Magreb bizantino,
cercando a cidade de Cartago, e tomando-a em 698 junto com a cidade de
Icósio. As únicas posseções bizantinas que sobraram na África foi um pequeno
pedaço do norte do Marrocos, onde estavam as cidades de Tingi, Septo e
Volubilis. Em junho de 707, os califado Omíada vai tomar as ilhas Baleares dos
bizantinos, perto da Espanha, e em outubro os muçulmanos vão atacar Tingi,
capturando a cidade em fevereiro de 709. As cidades de Septo e Volubilis vão
cair em maio e agosto, respectivamente.

No entanto, mesmo depois da reconquista do norte da África feita pelo


imperador Justiniano em 535, o Magreb teria a presença dos povos berberes
como independentes até a conquista muçulmana. Os berberes eram divididos
entre diversas tribos diferentes, cujas culturas, dialetos e estruturas sociais,
diferem de região para região. O principal grupo deles são os Amizigh que na
língua deles é algo como “povo livre”, e sua sociedade foi moldada para
prosperar no ambiente hostil do deserto. A maioria das tribos vivia conduzindo
rebanhos de gado entre bolsões de oásis em um estilo de vida semi-nômade.
Muitras tribos aproveitaram a fértil região do Magreb para se tornarem
agricultores sofisticados, enquanto outras se tornaram comerciantes, se
tornando mercadores de camelos que enfrentavam as rotas comerciais do
Saara pelo ouro da África Ocidental e Central. Exceto pela enigmática escrita
Tifinagh, usada por algumas tribos, a maioria das tribos era não tinha alfabeto.

Os Amizigh, que opuseram uma resistência feroz e teimosa aos


muçulmanos. Ao contrário dos bizantinos, os berberes estavam acostumados
com a guerra no deserto em ritmo acelerado, e conseguiram se igualar aos
árabes. Talvez o maior símbolo da resistência berbere tenha sido a rainha
Dehija, que esmagou um exército do califado Omíada na cidade de Meskiana
em 698. No entanto, ela foi derrotada na batalha de Tabarka, e com sua morte
as terras dos berberes foram rapidamente conquistadas.

Em 711, durante o reinado de Ualide ibn Abedal Malik (705–715), os


muçulmanos alcançaram a Península Ibérica. O Reino Visigótico que ali existia
encontrava-se decadente, dilacerado por problemas internos. A invasão foi
liderada por Tárique, um berbere. A população judia, que tinha experimentado
perseguições durante os últimos tempos do reino visigótico, apoiou e facilitou a
entrada dos muçulmanos, e por volta de 714 já quase toda a Península estava
conquistada. O último rei visigodo, Rodrigo foi morto na Batalha do Guadalete
em 31 de julho de 711. Uma parte da população converteu-se ao islã, outra
parte da população permaneceu cristã, mas tendo que tendo que pagar o jizya
e aderiram à língua e à cultura árabe, e ficaram conhecidos como
os moçárabes. A maioria dos visigodos que sobreviveram à batalha de
Guadalete se refugiram no reino franco, e uma outra parte conseguiu escapar
indo para o extremo norte da Península Ibérica, e formaram o reino das
Astúrias, a única resistência cristã na Península. Pelágio foi aclamado o
primeiro rei do reino das Astúrias, e em 718, sob seu comando os cristãos
conseguiram dar um primeiro passo rumo à Reconquista. E com isso, os
cristãos conseguiram uma vitória heróica na mística batalha de Covadonga em
718, onde somente 10 guerreiros asturianos sobreviveram na defesa da última
região cristã da Península.

Em 720, os exércitos islâmicos ultrapassam os Pireneus, e conquistaram


todo o sudoeste da França, chegando próximo de Paris. No entanto, a vitória
de Carlos Martel em Poitiers em 732 trava a expansão do islã na Europa
Ocidental de uma vez por todas, e faz os muçulmanos recuarem de volta à
Espanha.
(Península Ibérica em 750)
(Batalha de Poitiers em 732)

Na Ásia, os árabes tornaram-se senhores do Sinde e de uma parte


de Panjabe entre os anos de 711 e 713, duas partes do atual Paquistão. A
conquista foi liderada pelo general Maomé ibne Alcacim, que não discriminou a
população local budista e hindu; tomando conhecimento de que estes povos
possuíam escrituras sagradas, tratou-os como dhimmis ("Povos do Livro"), tal
como era hábito considerar judeus ou cristãos. Na Ásia, salienta-se ainda a
conquista do Afeganistão, da Transoxiana e da Sogdiana. 

Os berberes se convertem ao islã em massa, mas na maioria das vezes,


essa conversão foi nominal, e os amazigh mantiveram muitos atributos de suas
línguas, estrutura social e muitas práticas tradicionais. Foi no século VIII que a
rede de comércio transaariana começou a se expandir, ligando o mundo árabe
à África Subsaariana, e posteriormente muitas comunidades da África
Ocidental e Central também se converteram ao islã. O poderoso Império de
Gana por exemplo se converteu ao islã em 799.

Os berberes sabiam que na prática ainda eram considerados cidadãos


de segunda classe em comparação às elites árabes. Os berberes eram
colocados nas batalhas mais perigosas na linha de frente, enquanto os árabes
ficavam bem protegidos. Os berberes também recebiam menos pagamento e
pilhagem de guerra, e eram pesadamente tributados. Sob o pacto de Umar, as
comunidades judaicas e cristãs sob o domínio muçulmano tinham segurança
garantida em troca do pagamento do jizya. Os berberes inicialmente eram
pagadores da jizya, mas quando foram se convertendo ao islã, a quantidade de
receita tributária vinda da metade ocidental do califado começou a secar. Para
neutralizar isso, os governadores árabes da província de Ifriqiya começaram a
impor o jizya nos berberes muçulmanos convertidos. O carijismo também foi
introduzido ao Magreb, e eles eram linha-dura e acreditavam que qualquer
homem podia governar o mundo muçulmano, desde que fosse justo. E os
carijitas começaram a ficar muito famosos com os berberes que ficaram
intrigados em fazer uma guerra santa contra a opressão árabe. Em 739, as
tribos Ghomara, Berghwata e Miknasa, do oeste do Marrocos, se revoltaram
contra o califado Omíada. Eles selecionaram um homem amazigh chamado
Maysara al-Matghari para ser seu líder. Enquanto o governador estava
invadindo a Sicília bizantina, eles amarraram as escrituras do Alcorão em suas
lanças e marcharam para a batalha. A cidade de Tânger logo caiu, e os
berberes executaram o governador omíada Omar al-Moradi. Os rebeldes
abriram caminho de destruição desde o Estreito de Gilbratar até o vale de
Sous, derrubando guarnições omíadas no caminho, enquanto mais tribos
berberes se uniram a eles no caminho. No entanto, uma coluna de cavaleiros
árabes de elite, composta pelas elites aristocráticas de Ifriqiya, entrou em
confronto com os rebeldes nos arredores de Tânger interrompendo seu
avanço, e forçando al-Matghari a puxar seus exércitos de volta a Tânger
propriamente dita. Condenado por sua covardia, al-Matghari foi executado
pelos chefes berberes e foi substituído por Khalid ibn al-Zanati. Khalid foi
declarado califa em confronto direto à autoridade do califa omíada. No inverno
de 740, seu exército encontrou a cavalaria árabe na batalha campal no vale de
Shalaf, esmagando completamente e matando 10.000 soldados omíadas.

Então o califa omíada enviou uma força de 30.000 soldados contra os


berberes, para ajudar as forças de Ifriqiya, que reuniram cerca de 40.000
homens. O exército omíada de 70.000 homens marchou em outubro de 741,
encontrando seu inimigo na cidade de Bagdoura. O exército berbere contava
com cerca de 200.000 pessoas, mas muitos armados apenas com pedras e
facas. Mas mesmo assim, 40.000 soldados omíadas foram massacrados e os
berberes venceram mais uma vez. Na Península Ibérica, os soldados amazigh
estacionados na fronteira norte abandonaram suas guarnições para guerrear
com seus senhores árabes em Al-Andaluz nas cidades de Toledo, Córdoba e
Algeciras. Essa revolta foi logo esmagada, mas permitiu o rei Afonso I das
Astúrias aproveitasse a situação e dobrasse o tamanho de seu reino. No
entanto, os berberes não conseguiram tomar a província de Kairouan perto de
Cartago em 742. O povo berbere garantiu a independência em todo o Magreb
ocidental, formando uma colcha de retalhos de emirados nativos.

O maior problema da dinastia omíada era sua falta de legitimidade.


Havia duas escolas de pensamento sobre sucesão no califado: uma era a
eleição do governante pelos anciãos e líderes do Ummah, a comunidade
muçulmana; outra era a sucessão baseada no pertencimento à família de Ali,
que acabou criando o ramo xiita. Mas os omíadas não eram nem escolhidos
pelo Ummah, nem da família do profeta, então não tinham legitimidade. Eles
simplesmente passavam o reino de pai para filho, o que era inédito para o
califado. Então os omíadas contavam com as conquistas militares e as
riquezas que ganhavam com isso para ter legitimação. Depois da derrota em
Poitiers, os muçulmanos não conseguiriam avançar mais para a Europa,
apenas para algumas regiões na África mais tarde.

Além disso, agora muitos não-árabes e não-muçulmanos se tornaram


súditos do califa, e o desafio dos omíadas era a sua integração no império.
Obviamente muitos se converteram ao islã apenas para não pagar o jizya. Os
omíadas entenderam que quanto mais gente se convertesse, menos receita o
califado teria. Então em alguns momentos eles impediam a conversão ao islã,
ou obrigavam a pagar o jizya mesmo aos já convertidos. Por exemplo, no ano
700, milhares de camponeses persas viajaram para Wasit para a sede do
governador omíada pedindo-lhe que reconhecesse sua conversão ao islã. Esse
pedido foi rejeitado e eles foram enviados de volta para trabalhar em suas
terras e tiveram que continuar pagando o jizya. Isso para o islã era inaceitável.
Então os omíadas tiveram que contar com os muçulmanos árabes apenas,
particularmente os da Síria. Omar II era aparentemente o califa mais generoso
da dinastia, e parecia genuinamente querer mudar as coisas em relação à
aceitação do Islamismo por terras não-árabes do califado e em relação à
imposição da jizya aos muçulmanos recém convertidos. No entanto, o resto dos
califas tinha a reputação de serem corruptos e não estarem nem aí para a
religião.

Os xiitas estavam seriamente em oposição aos omíadas, e os


muçulmanos não-árabes também estavam infelizes, pois se sentiam
discriminados pelas políticas centradas nos árabes. A historiadora Patricia
Crone comenta que as razões mundanas e financeiras são insuficientes para
explicar a conversão dos não-árabes, particularmente no Irã. Nas palavras
dela:

“A maioria dos convertidos provavelmente abraçou sua


nova vida com entusiasmo, empolgado com a ideia de que a
divindade que permitiu que os árabes conquistassem o mundo
deveria estar disposta a incluir os povos derrotados entre seus
devotos.”.

Na maioria dos casos, os árabes que residiam nas regiões recém


capturadas eram soldados e burocratas, e viviam em cidades de guarnição
segregadas, não tendo muita interação ou se misturando com os locais. Em
Khurasan isso era diferente, e cerca de 70.000 árabes se estabeleceram na
província e viveram entre os habitantes locais, até se casando com habitantes
locais. Além disso, os colonos árabes e os persas locais tinham uma causa
comum na defesa da fronteira oriental do califado contra as tribos turcas.
Muçulmanos não-árabes no Irã também estavam descontentes com o fato de
que os omíadas cobravam da nobreza persa não-muçulmana, os dihqans, que
continuaram a adorar seus antigos deuses iranianos ou seguiam o
Zoroastrismo, apesar de pagarem impostos como o jizya. Controversamente,
isso colidiu com outra política omíada de atitude dura em relação aos
zoroastristas, onde milhares deles foram massacrados ou forçados ao exílio.
Obviamente as outras religiões como Cristianismo, Judaísmo, e as religiões
pagãs também eram perseguidas.

Finalmente, os muçulmanos árabes não xiitas tiveram suas razões de


descontentamento. O conflito árabe intertribal era comum e muitos estavam
descontentes com os privilégios dos sírios. Além disso, teve a Terceira Guerra
Civil, ou Terceira Fitna (744–750/752), que culminou na vitória de Marwan II em
747. Mas o pior para a dinastia omíada ainda estava por vir. O quarto filho de
Ali, Muhammad ibn al-Hanafiyyah se tornou o chefe da casa de Ali, que foi
sucedido por seu filho e novo imã, Abu Hashim. Diz-se que ele lançou um
movimento clandestino para promover vagas visões anti-omíadas e pró-xiitas
em todo o califado. Esse movimento chamado de Hashimiyya foi um
recrutamento metódico e secreto, que desempenhou um papel fundamentou na
Revolução Abássida.

Embora o recrutamento e a propaganda em redutos tradicionais de


oposição como Kufa, não tinham sido bem-sucedidos, eles escolheram a
região de Khurasan na Ásia Central, como uma das regiões chaves para a
Hashimiyya. Após a morte de Abu Hashim, a maioria do movimento prometeu
seu apoio a Mohammad ibn Ali, o bisneto do tio do profeta, Abbas. Há grande
chance que esse testamento final tenha sido fabricado, porque é mais provável
que Abu Hashim, que não teve filho, escolhesse um parente mais próximo para
ser seu sucessor. No entanto, Mohammad ibn Ali do clã abássida se tornou o
líder da Hashimiyya, e desde o final da década de 710, os Hashimiyya
lançaram uma cuidadosa campanha de propaganda em todo o califado, com
seu centro em Khurasan em uma vaga plataforma de deposição da dinastia
omíada e instalação de al-Rida min al Muhammad, o candidato aceitável da
família do profeta.

Khurasan foi abalada por uma luta de três vias pelo domínio da província
pelo governador omíada Nasr ibn Sayyar, o candidato iemenita ao cargo de
governador, Jadi al-Kirmani e al-Kharit ibn Surayj, que lançou inúmeras
rebeliões malsucedidas contra o govereno omíada na província. No Egito, os
comandantes do exército desafiaram Marwan II e instalaram seu próprio
governador. Em Kufa, houve mais uma revolta contra o domínio omíada. Não
tinha melhor hora do que esta.

Abu Muslim foi enviado a Khurasan pela família abássida para lançar a
rebelião lá. Em julho de 747, Abu Muslim proclamou uma rebelião em Khurasan
pelo “Livro de Alá e a sunnah do Profeta” e enviou subordinados para informar
do movimento clandestino na província que a bandeira negra abássida havia se
levantado em revolta. O historiador Farouk Omar, afirma que no começo Abu
Muslim tinha apenas de 3000 a 4000 homens. Mas logo os números
aumentariam, com milhares de escravos abandonando seus senhores para se
juntar à causa de Abu Muslim. Ele manipulou magistralmente a discórdia tribal
dentro do exército omíada entre os árabes sírios e iemenitas, e conseguiu o
apoio desse último.

Em fevereiro de 748, Abu Muslim assumiu o controle da capital


provincial de Merv, devido à baixa resistência dos omíadas e seu baixo apoio
popular entre a população, além de capitalizar a luta das várias facções e tribos
pelo controle da cidade. Depois de ganhar uma posição em Khurasan, o líder
abássida Ibrahim ibn Muhammad nomeou Qahtaba ibn Shabib como
comandante do exército abássida, e ordenou que marchasse para a Síria e o
Iraque. Até então, as cidades de Herat e Balkh também estavam sob o controle
abássida e seu exército aumenta para 30.000 homens, reforçados por escravos
e membros descontentes de tribos árabes descontenes com os omíadas.

Enquanto Abu Mulsim permaneceu em Khurasan para solidificar o poder


abássida, Qahtaba perseguiu os remanescentes do exército omíada na região
liderada pelo governador Nasr. Marwan II mudou a liderança omíada na região,
enviando Nabata al-Kallabi com cerca de 10.000 homens para derrotar a
revolta abássida pedindo que Nasr renunciasse. Em julho de 748, Qahtaba
derrotou os omíadas na batalha de Gorgan, onde Nabata foi morto. O exército
abássida continuou sua marcha para a Mesopotâmia e desta vez Amir ibn
Dubara foi enviado para enfrentar Qahtaba com 50.000 homens. Em março de
749, Qahtaba o derrotou, destruindo a espinha dorsal do exército omíada. Com
o exército abássida chegando no Iraque, as células subterrâneas criadas e
nutridas por eles por décadas se prepararam para uma rebelião no Iraque, e
logo Halwan, Tikrit, o Baixo Eufrates e outros lugares se revoltaram, alguns
pelo saque, outros pelo apoio aos abássidas.

O exército de Qahtaba se moveu para Kufa para se conectar com os


rebeldes de lá, e foi interceptado por outro exército omíada comandado por
Yazid ibn Hubayra em Upper Fallujah. Em 27 de agosto de 749, o exército
abássida teve mais uma vitória, apesar da morte de Qahtaba. Kufa se revoltou
e derrubou o domínio omíada, no qual eles sofreram tanto ao longo dos anos.
Na mesma época, o líder abássida Ibrahim ibn Mohammad foi preso e
executado pelos omíadas, abrindo caminho para que seu irmão Abul Abbas se
tornasse seu sucessor. No final de 749, os Kufans o proclamaram califa sob o
título de al-Saffah, o derramador de sangue. A marcha abássida continuou com
o irmão de al-Saffah capturando Wasit, enquanto o tio do califa, Abdallah ibn Ali
foi enviado para se fundir com o exército abássida Khurasani menor
comandado por Abu Ayun para enfrentar o exército omíada sob comando do
próprio Marwan II, que se entrincheirou entre os rio Tigre e o Grande Zab.
Marwan II tinha apenas 12.000 homens, enquanto os abássidas tinham de
20.000 a 100.000 soldados. A batalha do rio Zab começou em 25 de janeiro de
750 e terminou com uma vitória decisiva para os abássidas. Marwan II fugiu
para o Egito, e o exército omíada não existia mais. Os abássidas tomaram o
controle da principal cidade omíada, Damasco. Logo, Marwan II foi encontrado
pelo novo regime e executado.

Temendo uma possível vingança omíada, o novo califa al-Saffah reuniu


todos os principais membros remanescentes da dinastia omíada para um
banquete sob o pretexto de reconciliação, e ordenou seu assassinato a sangue
frio, no estilo Casamento Vermelho de Game of Thrones. Poucos omíadas
conseguiram sobreviver e um jovem chamado Abd al-Rahman tornou-se o mais
proeminente deles por ser capaz de estabelecer um governo omíada na
Espanha, o Emirado de Córdoba.

Políticas discriminatórias contra um número crescente de muçulmanos


não-árabes acabariam por dar errado. E alguns estudiosos como Gerlof Van
Vloten e Julius Wellhausen afirmam que a revolução abássida é uma contra-
ofensiva persa contra a elite árabe, mas os estudiosos repreenderam essa
justificativa como racista, focando demais no componente étnico, ignorando o
papel da dinâmica tribal árabe.

Fragmentação, Novos Reinos e Idade de Ouro? (750-1055)

Uma das grandes figuras do Islã é Abd al-Rahman I, pai da Espanha


muçulmana. Ele era neto do califa Hisham ibn Abd al-Malik, e filho de Mu´awiya
e uma concubina berbere capturada. Os governadores omíadas tinham o
costume de sequestrar mulheres berberes bonitas para fazer parte de seus
haréns na Síria, o centro de poder dos omíadas. Abd al-Rahman foi criado na
corte de Hisham, que foi o penúltimo califa da dinastia Omíada. Depois do
massacre de toda a linhagem omíada com o sucesso da Revolução Abássida,
Abd al-Rahman foi obrigado a se esconder numa vila perto do rio Eufrates no
nordeste da Síria. Mas o jovem foi traído por um escravo de um homem em
quem ele confiava, e os cavaleiros abássidas estavam a caminho. Junto com
um irmão, Abd al-Rahman fugiu para um pomar à beira do rio, mas foi visto e
perseguido. Com a cavalaria abássida os perseguindo, os dois irmãos pularam
no rio e o atravessaram. No meio do rio, seu irmão que não era tão bom
nadador quanto ele, começou a se debater e então voltou. Os cavaleiros
falaram que iam poupar a vida dele, mas quando Abd al-Rahman terminou de
cruzar o rio ele viu os cavaleiros cortando a cabeça de seu irmão.
Desesperado, Abd al-Rahman correu para uma floresta próxima, possuindo
apenas uma pequena bolsa de dinheiro e as roupas no corpo.

Sozinho, abrigado por pastores, vaqueiros e outras pessoas humildes,


ele finalmente chegou à Palestina, onde ele foi acompanhado por dois ex-
escravos, o seu Badr, e o ex-escravo de sua irmã, Salem. Este último tinha
considerável discrição e trouxe uma pequena fortuna e joiás para manter Abd
al-Rahman a mando de sua irmã. Eles viajaram para o sul do Egito, e lá
residiram icógnitos por algum tempo. Por alguma razão, o príncipe fugitivo e
seu bando fugiram para a antiga cidade de Barca, e se estabeleceram por um
tempo. Mesmo depois que saíram das terras do califado Abássida e chegaram
no califado de Ifriqiya, o governador local era um homem que compartilhava o
nome do príncipe, que era aconselhado por um conselheiro judeu, que já tinha
servido na Síria, servindo ao ex-califa Maslama. Esse judeu fazia profecias e
falou que um membro omíada ia fazer uma dinastia na Espanha e seu nome
seria Abd al-Rahman, e o governador pensou que fosse ele porque ele também
tem esse nome. Mas o judeu desencorajou o governador falando que ele não
era do clã correto. Então esse governador enviou espiões para achar qualquer
um que se chamasse Abd al-Rahman em todo o seu reino. Eventualmente eles
acharam o príncipe fugitivo em Trípoli, que foi levado ao assento do seu xará
em Qairowan. O governador queria matar o príncipe, mas o judeu convenceu
ele a deixar o rapaz, falando: “Se você o matar, não é ele. Se você deixá-lo ir, é
ele.”. O governador ficou tão surpreso com a resposta que deixou o príncipe
sair ileso.

Então o príncipe Abd al-Rahman foi para o oeste o mais rápido possível,
mas quando passou no reino berbere, viveu lá por um tempo no reino de sua
mãe. Eles passaram de tribo por tribo, com algumas acolhendo ele, outras
olhando com suspeita. No entanto, o governador de Ifriqiya mudou de ideia e
resolveu mandar caçar o príncipe. Enquanto o príncipe estava sendo abrigado
pelo chefe berbere Abu Qarrah Wanesus, soldados chegaram na aldeia e
começaram a vascular o acampamento. Diz-se que a esposa do chefe berbere,
Tekfah, escondeu o príncipe dentro das dobras de seu vestido, até que o
perigo passasse. Por causa desse ato, Abd al-Rahman nunca esqueceria os
berberes durante seus dias posteriores mais prósperos.
Em 754, ele chegou perto de Ceuta, onde a tribo Nafza da sua mãe
estava localizada. O príncipe finalmente se sentiu em paz, longe do alcance do
governador. Ao longo da jornada, Badr e Salem permaneceram sempre fiéis a
ele. Desde a década de 730, a Espanha muçulmana estava envolvida em uma
guerra civil impulsionada por uma fusão complexa de rixas tribais árabe-
berberes e inter-árabes. O príncipe viu a oportunidade, e em junho de 754, Abd
al-Rahman despachou Badr para a Espanha. Badr colocou antenas e testou
aliados, enquanto angariava apoio e espalhava a notícia de que os grandes
omíadas estavam prestes a retornar. Badr enviou um navio para buscar Abd al-
Rahman, e em 14 de agosto de 755, o príncipe fugitivo desembarcou em
Almuñécar, na costa de Andaluzia. Na sua chegada, seus apoiadores saíram
para encontrá-lo, supostamente oferecendo a ele vinho e mulheres. Enquanto
Abd al-Rahman estava reunindo as suas tropas, o governador Yusuf e seu
capitão-chefe Sumail, estavam debatendo como detê-lo. O governador decidiu
seduzir Abd al-Rahman oferecendo sua filha para casar com ele, o que foi
rapidamente negado.

Ao longo do inverno de 755 e começo de 756, Abd al-Rahman embarcou


em uma onda final de atividades, atraindo quaisquer clientes que pudesse, e
concentrando forças em Granada. Ele foi de cidade em cidade, recebendo
boas-vindas e recrutando o máximo que pudesse. Quando ele chegou em
Sevilha em abril de 756, ele tinha 3.000 homens. No início de maio, Abd al-
Rahman avançou a nordeste de Sevilha, e no meio do caminho entre Sevilha e
Córdoba os dois exércitos se encontraram. No entanto, os dois exércitos
estavam dividios pelo rio Guadalquiver que estava na cheia por causa de
chuvas e não podia ser atravessado. Então Abd al-Rahman decide marchar até
Córdoba, que estava quase indefesa. No entanto, Yusuf viu essa estratégia e
simplesmente começou a ir também só que seguiu pela outra margem do rio.
Essa marcha paralela durou alguns dias até que Yusuf parou em um lugar
chamado Musara, onde tinha um vau que podia ser cruzado. No entanto,
começou uma série de negociações de paz entre os dois, e talvez
subestimando o príncipe, Yusuf ficou feliz com a perspectiva de paz e permitiu
que as forças de Abd al-Rahman cruzasse o rio. No entanto, tudo foi um truque
e no dia seguinte ocorre a sangrenta batalha de Musara, onde a força de Yusuf
foi despedaçada. Logo depois, Abd al-Rahman entrou em Córdoba, e o que se
seguiu foi a fundação de um Emirado extremamente próspero, chamado
Emirado de Córdoba, que mais tarde se tornou um califado. Esse Emirado não
significou apenas a era de ouro da alta cultura islâmica na Península Ibérica,
mas talvez em todo o mundo muçulmano.

Como era o tratamento de outros povos de outras religiões em territórios


islâmicos? Se você fosse um judeu ou cristão, você era considerado um “Povo
do Livro”, porque sua religião tem um livro sagrado. No entanto, num território
islâmico você seria obrigado a usar certas roupas que distinguem você do
resto, você não podia levar provas num tribunal contra um muçulmano, você
não poderia comprar um cavalo, não poderia construir novas casas de culto,
teria que pagar impostos especiais como o jizya, um imposto por cabeça, ou o
Kharaj, um imposto sobre a terra. Além disso, você poderia estar sujeito à
perseguições à qualquer momento. Em 638, quando os muçulmanos tomam
Jerusalém, o governo de Amório crucifica peregrinos cristãos que se recusaram
a pagar as suas taxas. Em todo território islâmico, os impostos aos cristãos
foram crescentes, e em breve a evangelização foi proibida também. Em 789,
atacam o monastério de São Teodósio, e em 923, começam um processo de
destruir as igrejas em todo território islâmico. Aqueles cristãos ou judeus que
não se convertessem ao islã, eram deixados em paz desde que pagassem
seus impostos especiais e não desrespeitassem o califa. Não podemos ter
certeza da porcentagem de pessoas por religião nesses novos territórios
muçulmanos, mas sabemos por exemplo que no Egito, até a peste negra na
década de 1340, a religião majoritária era o Cristianismo Copta. Já para os
pagãos, os muçulmanos ofereciam a conversão ao Islã ou a morte. Algumas
outras religiões como o Zoroastrismo persa e o budismo os muçulmanos
ficaram um pouco confusos quanto o que fazer, e às vezes consideravam
esses povos como “Povos do Livro”, apesar de muitos zoroastristas serem
perseguidos ou mortos, desde que não fizessem parte da antiga nobreza
persa.

Os islâmicos clamam que a Espanha islâmica foi um lugar de paz e


tolerância religiosa entre cristãos, islâmicos e judeus. Eles citam Maimônides
(1138-1204), um intelectual judeu, e Averróis (1126-1198) um filósofo islâmico
aristotélico, e ambos viviam em Córdoba. Também falam que as traduções
árabes de Aristóteles foram passadas da França para a Espanha. No entanto,
falta evidências arqueológicas para essas alegações de que era um paraíso de
tolerância religiosa, e há evidências literárias falando de massacres de judeus
em 1066 e expulsão de cristãos em 1126, além é claro de todo o tratamento
dado aos dominados que já falamos. Como os islâmicos ficaram tanto tempo
na Península era inevitável que os hispânicos absorvessem alguns elementos
culturais deles. Por exemplo, algumas palavras do espanhol e português foram
inspiradas no árabe como as palavras “alface”, “almirante”, “algodão”.
Durante o período Omíada, a capital era Damasco e os islâmicos vão
usar um estilo de arte predominantemente grego, e você não veria muita
diferença entre a arte islâmica neste período, com a arte bizantina. No entanto,
quando muda para o califado Abássida é que o mundo islâmico passa a ser
meio alienígena para os olhos ocidentais, quando eles mudam a capital para
Bagdá. O islã passa a ter enorme influência persa com isso, já que antes os
servos eram gregos. Bagdá se tornou um grande polo comercial, e a cidade
atingiu 1 milhão de habitantes em 940, a segunda cidade a atingir essa
patamar, sendo Roma a primeira.

O califado Abássida vai ser influenciado pela cultura helenística e cristã


de Damasco, e pela cultura persa de Bagdá. Teve um período que os
escritores islâmicos consideram como uma Revolução Científica Islâmica. Eles
inventaram a destilação de álcool, o primeiro uso da bússula, grandes
descobertas na matemática, a tradução para o árabe via siríaco dos clássicos
filosóficos gregos, etc. Mas a partir de 861 até 945, vai ter uma decadência
interna, perdendo as províncias periféricas. Após 850, o califado Abássida
começou a se separar em áreas separadas e semi-separadas. Na Espanha
você vai ter o califado da Andaluzia ou Al Andaluz, no norte da África e na Síria
você tem o Califado Fatímida, e na Síria e Iraque vai ter o Califado Abássida e
outros. O mais rico e poderoso era o Califado Fatímida, que tinha a capital em
Cairo, e eram xiitas. O Califado Fatímida tinha os lugares sagrados do Islã, as
cidades de Medina e Meca, e os lugares sagrados cristãos e judeus, que é
Jerusalém. Além disso, o Califado Fatímida estava em paz com o Império
Bizantino. Mas após a década de 1060, quando as inundações do Nilo falham,
o Califado Fatímida inteiro começa a entrar em caos. E foi o carregamento de
comida da Crimeia e de Constantinopla, feita pelo Império Bizantino, que
manteve o Califado Fatímida estável durante 20 anos. A partir de 1007, o
terrível califa do califado Faítimida, Abu Ali Almançor Taricu Aláqueme,
começou a perseguição ativa dos cristãos de Jerusalém, e destruiu a Igreja do
Santo Sepulcro em 1010.

Sobre a chamada Idade do Ouro islâmica ou Revolução Científica


Islâmica é preciso fazer algumas considerações. É verdade que houve muitos
cientistas, filósofos e teólogos muçulmanos muito bons na Idade Média. No
entanto, boa parte das descobertas e invenções na real foram roubadas ou
copiadas dos persas e bizantinos, o qual tiveram seus territórios conquistados
pelos muçulmanos ao longo da Idade Média, com o Império Persa caindo em
651 e o Império Bizantino em 1453.

Muitos lugares do Alcorão e o hadith colocam uma posição de destaque


na educação e nas descobertas científicas. Os estudiosos muçulmanos não
encontraram muitas dificuldade em aprender com os escritos de não-
muçulmanos para avançar na construção de seu conhecimento. Um estudioso
muçulmano chamado Burhan Al-Din declarou que a educação deve ser
legislada para todos. Os muçulmanos têm desfrutado de um aumento de
número de pessoas alfabetizadas por causa de seu foco na ciência como parte
dos componentes de uma vida virtuosa. Na chamada Idade de Ouro, esse
processo educacional foi normalizado em escola chamadas madraças (‫)مدرسة‬,
que eram mesquitas, casas fechadas e bibliotecas no mesmo prédio. A base
curricular habitual de uma madraça inclui cursos de língua árabe e o ensino
da Sharia (o Direito islâmico), tafsir (interpretação
do Alcorão), hadith (narrações do profeta Maomé, mantiq (lógica) e história do
Islã. Algumas dessas escolas se tornaram as primeiras universidades do
mundo. A primeira universidade do mundo é a Ez-Zitouna, na Tunísia, fundada
em 737. Outras importantes são a Al Quaraouiyine, no Marrocos em 859, a do
Cairo em 970, e a Sankore Mosque, no Mali em 989, e a Universidade de
Economia do Irã em 1315.

No entanto, nos outros vários países muçulmanos, apenas depois de


1800 que vai surgir Universidades, e percebe-se que essas que surgiram antes
do ano 1000 foram nos lugares onde o governo era menos centralizado, em
califados menores, tirando a da Tunísia, que ainda era no califado Omíada. As
primeiras Universidades da Europa cristã medieval são a de Bolonha em 1088
na Itália, Oxford em 1096 na Inglaterra, a de Salamanca em 1134 na Espanha,
a de Montpellier em 1220 na França, e a de Coimbra em 1290 em Portugal. No
mundo bizantino, que a partir de 1054 se tornou cristão ortodoxo com o Grande
Cisma do Ocidente, a primeira Universidade foi a de Constantinopla, fundada
em 425 e reconhecida como uma em 848. Logo, nota-se que a evolução da
educação está diretamente relacionada à descentralização política e jurídica,
além da liberdade econômica no setor educacional.

O Império muçulmano financiava grandemente o trabalho de estudiosos


e filósofos, e a quantia em que o governo gastou em tradução foi enorme,
rivalizando com alguns dos orçamentos de pesquisa do nosso tempo. O
símbolo desse período é a Casa da Sabedoria de Bagdá, uma biblioteca
enorme construída pelo califa Al-Mansur, que reinou de 754 à 775, e foi uma
das maiores incubadoras de vários livros raros, tanto persas quanto árabes.
Quando eles se expandiram para o Império persa, eles encontraram um grande
número de estudiosos persas, assim como fizeram os gregos que deixaram o
Império Bizantino. O califado chegou até eles através de uma grande rede de
comércio e informação, que também adicionou o árabe a esses idiomas
combinados. Muita da informação que chegava ao Império era em grego, persa
ou árabe, mas também podia ser em latim, chinês, ou qualquer outra língua.
Para que o Império funcionasse, era preciso um grande número de tradutores
para manter o fluxo de informações. Um talentoso linguista traduziu mais de
uma centena de obras de autores famosos da medicina como Galeno e
Hipócrates. Eles também traduziram as obras de Aristóteles para o árabe,
ajudando a preservar a cultura aristotélica. Muitos dos tradutores da Casa da
Sabedoria eram zoroastristas persas ou cristãos. Depois da batalha de Talas
em 751, o Império Abássica capturou vários chineses prisioneiros de guerra, e
eles conheciam o ofício do papel, que tornava os livros mais fáceis do que o
couro e o pergaminho.

Um muçulmano chamado Ibn Khaldun (1332-1406), era um tunisiano de


classe alta que viveu durante a Era de Ouro Islâmica, é considerado o fundador
de muitas ciências sociais, como a demografia, economia, historiografia e
sociologia. Ele se tornou um memorizador de todo o Alcorão, algo que poucos
muçulmanos são capazes de fazer. Sua Magnum opus é Muqaddimah, que era
uma introdução à história, onde ele estudou o papel da geografia na formação
de culturas. No deserto o povo é mais casca grossa, formado por tribos
guerreiras. Já na cidade, que tem mais comércio, e as pessoas ricas e
luxuosas tendem a ser mais suaves e mais liberais. E essas tribos do deserto
tomam as cidades, e com o tempo passaram a adquirir os hábitos das cidades,
e se tornam mais liberais, e o ciclo continua. Basicamente um Mário Ferreira
dos Santos do Islã. Ele também era economista e diz que nos reinos onde o
governo produz as coisas, esses reinos não são bem sucedidos, e onde os
mercadores e pessoas nos negócios privados produzem, as coisas prosperam.
E o Estado não deveria estar na produção. Ele fala que o objetivo do Estado
deveria fazer os comerciantes e os negócios livres, e onde o governo cobra
muito imposto, o povo fica pobre e com medo do Estado.

Um dos filósofos islâmicos mais famosos foi Abu Ali Huceine ibne
Abdala ibne Sina, também chamado de Avicena (980-1037), que foi um grande
filósofo no campo da metafísica. A metafísica é um campo da filosofia que
busca compreender os fundamentos da realidade, o estudo do ser, suas
propriedades, e sua própria existência. Um debate entre Platão e Aristóteles
era sobre a natureza das formas. A forma, ou essência de uma coisa, é o que
torna algo distinto em si mesmo. Um triângulo é um triângulo porque tem três
lados. Platão acreditava que tudo, mesmo os abstratos, existem no Mundo das
Ideias, onde há um exemplo perfeito de uma coisa, e o que vemos nada mais é
do que uma sombra dessa coisa. Aristóteles rejeitou essa ideia, acreditando
que a imagem de uma coisa existe neste mundo e que todos os seres são uma
combinação de matéria e forma. Avicena queria casar essas ideias ao
pesquisar a alma, bom como provar sua existência. Ele fez isso com um
experimento mental do “homem flutuante”: ele imagina um homem caindo
livremente no ar. Com a incapacidade de ver outras coisas em referência a si
mesmo. Uma pessoa ainda poderá ser capaz de sentir sua presença e
consciência. E Avicena acreditava que essa era a evidência para a existência
da alma, uma coisa interior, imaterial, tem propriedades externas (material e
imagem), mas é de outro nível, tentando combinar os dois conceitos. Essa
ideia é muito semelhante ao ponto de partida de Descartes, com a sua famosa
frase “Penso, logo existo.”.

Outro foi o filósofo e médico árabe Ibn al-Nafis (1213-1288), em sua


pesquisa sobre como uma pessoa pode aprender isoladamente de outras. Ele
escreveu um romance filosófico chamado “A Auto-Teologia”, que era uma
história de crescimento, seguindo um personagem desde criança atá a idade
adulta, antes que o gênero fosse popular. O lugar é uma ilha deserta, onde
tinha elementos de fim do mundo, e uma explicação do que está relacionado
com a vida após a morte e o que está nele de astronomia, biologia e teologia, o
que levou alguns historiadores a considerá-lo como um precursor da ficção
científica. O romance gira em torno de um garoto que se encontra em uma ilha
deserta e conhece os párias que acabam em sua casa. O personagem
principal é uma página em branco buscando entender o mundo, um relato de
como alguém que não foi ensinado nada, encontra a necessidade de Deus, do
Islã e da racionalidade. Em seguida, o personagem busca ciências e filosofias.
O romance não é muito interessante, mas revela muitas ideias diferentes sobre
o mundo em que o polímata Ibn al-Nafis conhecia. Foi uma resposta ao livro da
ilha do deserto, chamado “Hayy bin Yaqzan”, que também foi uma resposta ao
“Incoerência dos Filósofos”. A preocupação deles era sober quais aspectos das
ideias e crenças racionais vinham inatas da mente humana e quais vinham
com a educação.

Temos também Abu Iúçufe Iacube ibne Ixaque Alquindi, ou


simplesmente Alquindi (801-873), que foi um polímata e o primeiro dos filósofos
islâmicos peripatéticos, e se destacou por introduzir a filosofia grega ao mundo
árabe.
(Abu Iúçufe Iacube ibne Ixaque Alquindi (801-873))

Os islâmicos também tem contribuições no próprio método científico. Na


Antiguidade, Aristóteles desenvolveu os métodos de raciocínio dedutivo e
indutivo, e Demócrito que criou a ideia de átomo. Isso tudo eram teorias, e no
mundo islâmico a teoria se encontrou com testes e com os primeiros métodos
experimentais. Ali surgiu a ideia de fazer experimentos e usar medidas para
testar diferentes hipóteses. Muitos dos pensadores da Idade de Ouro Islâmica
era polímatas e generalistas. Um dos grandes desenvolvedores de métodos
experimentais foi Hasan ibn al-Hayytam (965-1040), também conhecido como
Alhazém. Usando raciocínio lógico combinado com a experimentação empírica,
ele discordou de muitos filósofos gregos sobre a natureza da luz e da visão. Ele
praticou um processo de ceticismo implacável e de encontrar a verdade através
da observação. Esse pensamento é uma forma primitiva de positivismo, ou a
ideia de que o conhecimento sobre os fenômenos naturais só pode ser obtido
por meio da observação e da razão. Além disso, seus escritos indicam uma
forma de usar o princípio da navalha de Ockham, nomeado em homenagem ao
nominalista Guilherme de Ockham (1288–1347), que significa escolher a opção
com o menor número de suposições ao selecionar entre diferentes explicações
para os fenômenos. Ele introduziu a ideia de indução para o método científico.
Ao contrário da dedução, onde se removem possíveis explicações para os
fenômenos até restar apenas uma, a indução constrói uma coleção de
evidências e usa a razão para encontrar uma teoria que seja a melhor
explicação dada o que está à mão. Esse pensamento é o que está por trás da
ciência moderna.

Outro desenvolvedor do método científico nessa época foi o persa Abu


Rayhan al-Biruni (973-1048), que se interessou ainda mais pela
experimentação sistemática para encontrar princípios naturais. Ele deu muita
ênfase na repetibilidade dos experimentos, mostrou preocupação em evitar o
viés na observação, e muitas vezes repetiu os experimentos muitas vezes. Ele
desejava fazer médias de resultados para compensar os erros inerentes às
ferramentas e aos humanos que as usavam.

O sistema de numeração arábico é um excelente exemplo dos fatores


que fizeram da Idade de Ouro Islâmico tão impressionante. O sistema numérico
tem suas origens nos matemáticos hindus no século VIII, incluindo o conceito
do número zero. Um dos grandes matemáticos árabes foi Abū ʿAbdallāh
Muḥammad ibn Mūsā al-Khwārizmī (780-850), ou simplesmente Alcuarismi. Em
820 ele publicou um livro defendendo a adoção em massa de um sistema
numérico de base dez que tornava o trabalho matemático muito mais
gerenciável. O livro seria traduzido e copiado ao longo de toda a Eurásia e
norte da África. A palavra álgebra vem de um termo árabe para reunir peças
quebradas. Alcuarismi também foi um grande estudioso, junto com o
matemático grego Diofanto, que tem o título de pai da álgebra. Grande parte de
seu trabalho dizia respeito à técnicas para reduzir equações polinomiais. De
seu nome que vem a palavra algorismo.

Outro matemático importante foi Omar Khayyam (1048-1131), que se


baseou no trabalho de Alcuarismi para desenvolver o mundo das equações
cúbicas. Um matemático egípcio Abu Kamil (850-930) expandiu o trabalho de
Alcuarismi em uma exploração dos números negativos e sua notação. Os
matemáticos deste período também fizeram um desenvolvimento nas áreas da
indução, trabalho, e notação de números irracionais, e a lei esférica dos senos.
Antes de Newton, os islâmicos desenvolveram os conceitos de aceleração,
reação e ímpeto. O desenvolvimento das leis de refração e reflexão começou
com o físico Abū Saʿd al-ʿAlāʾ ibn Sahl (940-1000), ou simplesmente Ibn Sahl,
em que ele escreveu um tratado influente investigando como os espelhos
curvos dobram e focalizam a luz, desenvolvendo a primeira lei de refração e
inventando lentes anaclásicas, uma invenção inicial crítica no desenvolvimento
do óculos, e muito mais tarde da câmera. Entre outros cientistas islâmicos
marcantes temos Abu Ali al-Hasan Ibn Al-Haitham, também chamado de
Alházem (965-1040), que foi um dos pioneiros da Óptica, junto com Ptolomeu
(90-168) e o católico Roger Bacon (1220-1292). Os gregos acreditavam que a
visão funcionava como uma espécie de sonar ou radar, onde a luz era emitida
pelos olhos e refletida no objeto e assim que enxergamos. Alhazém discordou
e postulou que a luz reflete nos olhos e poderia explicar com lentes e fisiologia
da visão, assim desenvolvendo a câmara escura. Ele também procurou
entender a natureza do movimento da luz como o movimento dos objetos,
observando que muitas das leis do movimento parecem se aplicar da mesma
maneira. E o mesmo Alcuarismi que contribuiu para a álgebra, também
contribuiu para a astronomia, documentando a movimentação do Sol, das
estrelas e dos planetas.

A cartografia também se desenvolveu bastante no mundo islâmico


porque a era islâmica estava cheia de exploradores muçulmanos. Eles
documentaram empreendimentos de exploração no extremo leste da China e
no sul da África austral. Eles também conseguiram calcular o tamanho da
circunferência da Terra com uma precisão muito boa. Eles também
desenvolveram os primórdios do método de coordenadas polares.

Na química, o alquimista persa Abu Muça Jabir ibne Haiane (721-815)


procurou classificar os metais da Terra pelo modelo aristotélico. O que ele
teorizou foi que os metais eram fusões de mercúrio e enxofre feitas nas
profundezas da terra. Ele foi um dos a teorizar que podia misturar metais para
se obter o ouro. Na biologia, eles fizeram avanços principalmente na
agricultura. Eles pegaram as culturas básicas do Mediterrâneo, como azeitonas
e tâmaras, e disponibilizar informações sobre as melhores práticas para um
grande número de pessoas. Agrônomos como ibn Bassal de Toledo, viajaram
pelo mundo islâmico, aprendendo e estudando como os agricultores
praticavam seu trabalho em diferentes terras. Ele documentou cerca de 200
espécies de culturas e escreveu guias práticos sobre como cuidar delas. Os
antigos aqueodutos romanos foram reparados e colocados em uso em
Córdoba, e às vezes eram até expandidos.

No entanto, hoje é quase um dogma que a criação de riqueza vem da


pesquisa, e que a pesquisa precisa de subsídios governamentais. A ideia de
que o governo deve financiar a ciência veio pela primeira vez por Rashid al Din,
em 1302, que era o Vizir do Império Persa. Isso foi retomado por Francis
Bacon, em 1605 em seu livro, falou que se um indivíduo fizer uma pesquisa, e
uma descoberta, isso custará muito caro, mas os competidores podem copiar
praticamente de graça, então terão uma vantagem sobre a pessoa que copiou.
Vimos que teve realmente muitos cientistas brilhantes vindo do mundo
islâmico, mas isso não quer dizer que foi por causa da centralização do
califado, ou porque o califa financiava a pesquisa em alguns casos. Após a
Idade Média, praticamente não houve mais cientistas muçulmanos que se
destacaram, e o Império Turco Otomano (1299-1922), que era centralizado,
não produziu muitos avanços na ciência e em tecnologia.

Os xiitas tinham sido apoiantes dos abássidas na sua investida pelo


poder; porém os abássidas abandonam as pretensões destes em pouco tempo.
Em 786, em Meca, ocorreu um massacre dos descendentes de Ali. Alguns
conseguiram fugir e estabelecem em 789 o reino independente
dos Idríssidas no actual território de Marrocos, que perdurará até ao século X.

O califa Harune Arraxide (786–809), ordenou que após a sua morte o


império fosse dividido entre os seus dois filhos, Alamim e Almamune. Quando
Harune morreu os seus filhos envolveram-se numa luta pelo poder, tendo
Almamune saído vencedor em 813. Almamune adotou o mutazilismo, uma
doutrina que rejeitava a teoria muçulmana da predestinação e que defendia
que o Alcorão não deveria ser interpretado de uma forma literal. Este
movimento era visto como herético pela maioria dos muçulmanos.

Na Pérsia, um antigo apoiante dos abássidas cria um reino separado na


província do Coração, onde a dinastia dos taíridas ali se afirma entre 820 e
873, antes do seu território ser absorvido pelos Samânidas (819–999). No
Magreb, surgiu no século IX a dinastia dos aglábidas que tinham a sua capital
em Cairuão, na atual Tunísia. Os Aglábidas conquistaram a Sicília dos
bizantinos entre 827 e 878 e só no início do século XI é que esta ilha
regressaria ao domínio cristão, sob os normandos. Os Aglábidas viriam a ser
derrotados pelos fatímidas que partindo da Tunísia fixam-se no Egito abássida
em 969. Por volta de 945 o território que é hoje o Iraque caiu nas mãos da
dinastia dos emires buídas, antigos prefeitos do palácio abássida.

Em 751 ocorre a batalha de Talas, entre os Abássidas e a dinastia Tang


da China. A dinastia Tang chegou ao poder na China em 618 e começou sua
expansão para o oeste. Por volta de 630, as terras turcas do Khaganato
Oriental na região do norte da atual China e Mongólia, foram anexadas, e em
657, o Khagantato Ocidental foi derrotado decisivamente, na região do oeste
da atual China e Ásia Central. Em 715, a dinastia Tang ganhou muita influência
na Ásia Central, e muitos pequenos países da região se tornaram seus
vassalos. De 673 a 716, os muçulmanos travaram uma série de guerras na
Ásia Central, conquistando a Tranoxiana. Os dois grandes impérios agoram
compartilham o controle da rota da seda, e o conflito se tornou inevitável.

Os detalhes dos confrontos iniciais não são claros, mas sabemos que o
primeiro conflito foi no Vale de Ferghana em 715, mas apesar da ajuda
tibetana, os muçulmanos foram derrotados. A mesma coisa aconteceu dois
anos depois quando os chineses enviaram um exército de mercenários Karluk
que derrotaram os árabes e os tibetanos. Os chineses aproveitam dos abalos
causados pela Revolução Abássida para tentar ganhar a disputa pela Ásia
Central. Em 747, o comandante chinês local Gao Xiangxi iniciou uma
campanha contra a cidade de Gilgit no Tibete, e foi vitorioso. Ele foi nomeado
governador da região e forçou muitos pequenos reinos a se tornarem cidadãos
da cidade. Os estados locais de Fergana e Tashkent ficaram apreensivos
durante este período. O primeiro pediu ajuda aos chineses em 750 e Gao
atacou e capturou Tashkent na primavera do mesmo ano. Os príncipes de
Tashkent não tiveram escolha a não ser se aliar aos árabes. A força
muçulmana local liderada por Ziyad ibn Said deixou Samarcanda e iniciou uma
marcha ao longo do rio Talas, e Gao estava lentamente recuando para se unir
aos seus aliados Karluk. Os dois exércitos finalmente se encontraram na
segunda metade de 751, na fronteira moderna do Cazaquistão e Quirguistão.

Os árabes falam que tinham 100.000 de cada lado, enquanto os


chineses insistem que haviam 200.000 do califado e 30.000 para os guerreiros
da cidade. No entanto, o fluxo da batalha indica que os dois lados estavam com
uma paridade de forças, e ambos deviam ter entre 30.000 e 50.000 soldados.
O exército de Ziyad era composto por arqueiros na frente, lanceiros atrás de
sua cavalaria pesada com sua guarda e a cavalaria leve na reserva. Gao tinha
arqueiros na frente, lanceiros na segunda linha, sua guarda e virgana na
terceira linha, com os turcos Karluk nas extremidades leste e oeste da primeira
linha. Os primeiros três dias de batalha foram quase idênticos, com tropas
chinesas atacando na frente, e seus arqueiros levaram a melhor. Os arqueiros
árabes tiveram que recuar e os lanceiros foram para a primeira linha nos dois
lados, colidindo com a infantaria. Os lanceiros de Gao tinham armaduras
melhores e empurraram os lanceiros muçulmanos para trás, causando grande
danos neles. Ziyad tentou aliviar a pressão sob sua infantaria enviando sua
cavalaria pesada para atacar a coluna mais leve nos flancos chineses. Este
ataque não conseguiu cercar as unidades de Gao, mas o general chinês teve
que transferir suas reservas para a batalha. Uma série semelhante de eventos
aconteceu no segundo e terceiro dia. Mas no quarto dia, os turcos Karluk
traíram os chineses e atacou sua infantaria pelos flancos, enquanto o exército
árabe fez um ataque frontal com tudo. O exército de Gao colapsou, e de 10.000
a 20.000 árabes morreram nessa batalha, enquanto os chineses perderam
quase 30.000.
(representação da Batalha de Talas)

Outros contam que os dois não ousaram se atacar por quatro dias,
enquanto um terceiro exército chegou, composto de uma força menor de Karluk
que permaneceu do outro lado do rio Talas, e não se juntou a nenhum dos
lados. Mas na manhã do quinto dia, esses Karluk cruzaram o rio e atacam o
exército chinês pelo flanco esquerdo e as forças islâmicas entram na batalha
pela frente com tudo, destroçando os chineses sem perder quase ninguém.
Não se sabe se os Karkuk e os árabes planejaram isso, mas em qualquer caso
o exército chinês foi destroçado e apenas alguns milhares de soldados perto de
Gao conseguiram escapar.

A dinastia Tang envia novos exércitos para a área para conter a


expansão árabe, mas em 755 uma grande rebelião começa na China e as
forças que operavam na Ásia Central tiveram que voltar para casa. Os
abássidas também não conseguiram estabelecer um controle estável sobre
essas terras e a influência turca começou a aumentar. As implicações da
batalha de Talas foram que a influência do budismo naquela região foi
diminuindo com o tempo, já que a China e a Índia não estavam mais
conectadas por terra. As diferenças entre os dois ramos do budismo nesses
países se tornaram mais proeminentes ao longo dos séculos. Ao mesmo
tempo, os turcos começaram a adotar o islã, e formariam os futuros turcos
seljúcidas, que conquistariam boa parte do Império Bizantino e Jerusalém,
fechando a peregrinação, que é o motivo para o início das Cruzadas. E
também o uso do papel, que era um segredo dos chineses que agora foi
roubado pelos muçulmanos e foi parar no Oriente Médio e na Europa.

O islão prosseguiu o seu avanço na Ásia, começando a atingir as


populações do Turquestão Ocidental. No início do século XI a casa dos
turcos gasnévidas (977-1186), com o sultão Mahmud de Gázni (998–1030),
lança grandes incursões muçulmanas na Índia. Em 1055 os turcos
seljúcidas colocam o califado abássida sob sua tutela e torna-se defensores da
ortodoxia sunita contra os fatímidas xiitas do Egito. Os seljúcidas constituem
um império que começava no Turquestão e englobava todo o Próximo Oriente.

Turcos Seljúcidas, Cruzadas e Reconquista Ibérica (1055-1250)

No século VIII, uma horda de turcos conhecidos como oguzes migrou


para o oeste para a vasta região de estepe entre o mar Cáspio e o Mar de Aral,
e essa área se tornou o Estado Oghuz Yabghu. Nesse estado, os nômades
turcos migravam grandes distâncias para garantir pastagens sazonais ideiais
para seus rebanhos. Embora houvesse assentamentos sedentários, o legado
imperial deixado pelos turcos foi herdados pelos cazares pelos quais os turcos
eram meio que subordinados. É no reino da Cazária no final do século X que
encontramos nossas primeiras referências aos senhores da guerra turcos
Oghuz, conhecidos na história como Duqaq e seu filho, que conhecemos como
Seljuk. De acordo com registros compostos durantes os reinados dos sultões
seljúcidas posteriores, os ancestrais de sua dinastia serviram na Cazária como
comandantes militares. Isso quer dizer que é possível que Duqaq e Seljuk
podem ter servido à Cazária e abraçado o judaísmo deles.
Durante a desintegração da Cazária na década de 960, os seljúcidas
migraram para o leste com um pequeno bando. Alguns afiram que foi por
conflitos internos e outros afirmam que foi por mudanças climáticas. Seljuk
liderou seu bando de 100 cavaleiros, 1500 camelos e 50.000 ovelhas até a
cidade de Jand, nas margens do Khwarezm islâmico, e foi lá que Seljuk
abraçou a fé islâmica. Com isso, os seljúcidas conseguiram ganhar mais
seguidores turcos daquela região, homens que parecem ter sido Ghazi –
guerreiros do islã. Seljuk morreu em 1009 em Jand, segundo com algumas
fontes com 107 anos de idade. Dois novos reinos – os Caracânidas em
Transoxiana, e os ex-escravos turcos Gasnévidas em Khurasan e Oxus –
emergiram, anexando todo o emirado Samânida em colapso.

Além disso, vindos do extremo oriente, os Khitans estavam se


expandindo para o leste através do noroeste da China, e isso empurrou ondas
de refugiados para as fronteiras do mundo islâmico, exatamente onde as tribos
Seljuk estavam. Os seljúcidas começaram a ganhar força rápido, por sua
capacidade de absorver esses guerreiros nômades rebeldes e descontentes, e
muitos deles também se converteram ao Islamismo. Após a morte de Seljuk,
seu filho Arslan Isra´il se tornou o chefe da tribo e ele começou a interferir na
política da Transoxiana, apoiando um príncipe Caracânida conhecido como ´Ali
Tegin, que tentou se estabelecer como governador de Bukhara em 1020. Tegin
sofreu a oposição do partidário de seu irmão mais novo Mahmud, sultão dos
Gasnévidas. Foi em um combate militar na estepe fora de Bukhara que o sultão
Ghazni viu os seljúcidas pela primeira vez e ficou impressionado com seus
números. A resposta de Mahmud foi prender Isra´il, esperando que isso
simplesmente dissolvesse os turcos. As ações de Mahmud fizeram com que os
seljúcidas se juntassem ao seu próprio reino Gasnévida como soldados,
enquanto alguns optaram para fugir para o Irã. No entanto, a maioria continuou
onde estava e começou uma luta por liderança. No final, três figuras ficaram no
topo da hierarquia seljúcida: Chaghri, Tughril, ambos filhos do irmão de Isra´il,
e Musa, outro parente do clã interno.

Enquanto os seljúcidas estavam se organizando, Mahmud morreu e o


sultanato Gasnévida por herdado por seu filho Ma´sud em 1030. No entanto, os
seljúcidas foram derrotados em batalha pelos Caracânidas de ´Ali Tegin, e eles
decidiram fugir para Khurasan. Eles foram auxiliados por um governador traidor
chamado Harun, que ajudou os nômades a passar por sua terra em troca de
sua ajuda na conquista da província de Khurasan do seu soberano. Apesar de
Harun ser assassinado pelos agentes de Ma´sud em 1035, os seljúcidas
continuaram para o sul e eventualmente chegaram numa cidade conhecida
com Nasa. Os turcos então enviaram propostas diplomáticas para o
governador Gasnévida, Suri, explicando sua situação e êxodo, e pedindo-lhe
que intercedesse junto ao sultão Ma´sud em seu nome. Os seljúcidas
essencialmente prestaram seu serviço e homenagem ao sultão em sua corte,
prometendo “descansar em sua grande sombra”, se ao menos lhes fosse
concedida uma pequena província própria nas fronteiras de Khurasan, onde
pudessem se estabelecer. Eles também se comprometeram em defender o
território Gasnévida de outras tribos turcas.

No entanto, Ma´sud recusou a oferta e se preparou para a guerra. Essa


expedição foi um desastre completo que terminou quando o exército do sultão
foi atingido por uma emboscada de cavalaria nas planícies perto de Nasa em
junho de 1035. Então o sultão começou a atender as demandas dos turcos,
que começaram a ficar cada vez maiores. Quando essas foram recusadas, os
turcos varreram Khurasan, capturando tudo, inclusive as grandes cidades de
Merv e Nishapur em 1038. A única exceção foi Balkh, que permaneceu nas
mãos de Ma´sud. Os Gasnévidas foram tentando recuperar o controle de
Khurasan, mas a cavalaria rápida e ágil dos turcos quase sempre os vencia. A
batalha final ocorreu em Dandanaqan, perto de Merv em maio de 1040. Um
enorme exército Gasnévida marchou com vários elefantes de guerra, e eles
estavam exaustos de andar nas estepes. Quando uma briga ocorreu entre o
sultão e o resto da tropa, Chaghri, que estava acompanhando silenciosamente
o exército inimigo, cercou o exército de Ma´sud e com seus temíveis arcos
compostos, massacraram um exército maior do que o deles, destruindo-o
completamente. Ma´sud fugiu de volta para a Índia, mas logo morreu em um
golpe no palácio.

Fontes hostis enfatizam a devastação feita na província de Khurasan


pelos turcos e seus animais, mas não poderia ser apenas obra deles. Textos
pró-seljúcidas enfatizam o papel de Tughril em restaurar a ordem, esmagando
os bandidos que surgiram após o colapso de autoridade Gasnévida. Dizem que
Tughril chegou a ameaçar suicídio se seu irmão Chaghri saqueasse a cidade
de Nishapur. Tughril se tornou sultão e os seljúcidas eram islâmicos mas com
seus costumes nômades. Tughril então começou a expandir o domínio
seljúcida para o Irã, que era governado por um grupo xiita chamado Império
Buída. Esses soberanos regionais muitas vezes brigavam pelo poder, e por
volta de 1050, por meio de uma mistura de diplomacia, apoio oportunista de
aliados regionais e conquista direta, os seljúcidas afirmaram sua soberania
sobre o planalto iraniano. No entanto, além dos assentamentos estratégicos de
Ray e Hamadan, Tughril fez pouco esforço para afirmar o domínio direto sobre
as áreas urbanas. Portanto, muitos moradores das cidades nas terras
anexadas não experimentaram quase nenhuma diferença no curto prazo. Nas
principais cidades sob o domínio direto turco, foram instalados agentes,
essencialmente governadores turcos que priorizavam o aumento da receita das
cidades que governavam. Depois que Isfahan foi conquistada em 1051, um
sistema de isenções fiscais foi posto em prática para atrair camponeses de
volta às terras que eles tinham abandonado anteriormente. Fortes também
foram construídos para garantir a segurança das estradas próximas dos
bandidos, à medida que visava tranquilizar os comerciantes e dinamizar a
atividade comercial.

As ações de Tughril atraíram a atenção do califado abássida em Bagdá,


especialmente do vizir do califa, Ibn Muslima. O califa abássida era sunita, e o
Irã era xiita e mal reconheciam sua autoridade, levando à uma reação sunita na
Cidade Redonda, liderada pelo vizir al-Qa´im, que era conhecido pelo seu ódio
aos xiitas. E então ele se aliou a Tughril, já que os seljúcidas também era
sunitas. Muslima deu vários títulos religiosos ao líder turco e em 1053,
proclamou a perseguição aos hereges em Bagdá e na cidade de Nishapur
simultaneamente, essa última sob o domínio dos turcos. Então um exército
seljúcida avançou pelo Khuzistão, com seu líder falando que queria realizar a
peregrinação à Meca e liderar uma expedição contra os fatímidas xiitas. Então
Tighril e seus seljúcidas entraram pacificamente em Bagdá em dezembro de
1055, e eles foram recebidos por uma procissão de notáveis locais e multidões
que se reuniram para ver o que estava acontecendo.
O sultão Tighril acabou morrendo em 1063, aos 70 anos de idade. Quem
assumiu foi Alparslano, filho de Chaghri, e que rapidamente embarcou em
várias conquistas militares e liderou seus exércitos pessoalmente.

O Império Bizantino tinha reconquistado alguns territórios do domínio


árabes ao longo do reinado da dinastia Macedônica (867-1059), como a ilha de
Creta em 961, a Cilícia e o Chipre em 965, Antióquia em 969, Alepo em 970,
Van em 1022, Edessa em 1031, e partes do leste da atual Turquia e da
Geórgia. No entanto, quando Basílio II morre em 1025 sem deixar sucessor, o
império começa a decair lentamente porque ele era governado por um número
de cidades facções, e a aristocracia fundiária e a administração civil, ambas
achavam que seus interesses estariam garantidos se desmantelassem as
forças armadas. Eles queriam abolir as milícias camponesas, que por séculos
foram a espinha dorsal da defesa bizantina. Então os bizantinos começaram a
ficar dependentes de mercenários estrangeiros para fazer parte de suas forças
armadas, e os turcos já trabalhavam como mercenários para eles desde o
século VI.

O principal golpe que os bizantinos sofreram foi em 1071, quando os


turcos ganham de um exército mercenário do imperador Romano IV, e
capturam o imperador após vencerem a batalha de Manziquerta. O sultão
Alparslano então fala para Romano IV: “se você tivesse ganhado, o que faria
comigo?”; e Romano IV responde algo como: “Bom, eu poderia ter colocado
você em uma exposição neste hipódromo em Constantinopla, ou poderia ter te
matado, algo assim”. Então Alparslano fala: “Então eu farei algo melhor que
isso, eu te libero, pode ir para casa”. Com a morte de Romano IV um ano
depois, teve uma guerra civil no Império Bizantino e os turcos aproveitaram
para entrar com tudo, com a tribo Nawakiyya comandada pelo chefe tribal
Suleiman, privando os bizantinos da sua fonte primária de recrutas militares
que estavam na Turquia. E nos próximos anos até 1095, os turcos seljúcidas
tomam quase toda a Turquia, que agora estava em um controle frouxo de um
grupo de senhores da guerra turcos. E os turcos vão formar o Sultanato de
Rum na Turquia em 1081, que vai durar até 1308.

Segundo o professor Carter Vaughn Findley, os próximos séculos na


Anatólia seriam como o “Oeste Selvagem”, e começou um ciclo de
nomadização que afetou profundamente a Anatólia. Repetidas invasões anuais
durante a primavera e o verão acabaram por despovoar as áreas sujeitas a
eles por meio da fuga, morte ou escravidão, levando ao abandono das
fazendas e ao declínio na produção de alimentos. No entanto, a derrubada
turca da Anatólia bizantina foi um processo lento, demorando cerca de quatro
séculos até que a influência turca fosse sentida. Ao longo dos séculos, as
cidades foram saqueadas, reconstruídas e saqueadas novamente, e a junção
dos turcos com os bizantinos locais foram chamados de mixavarvoroi. Pouco
antes da invasão, havia 47 metropolitas e mais de 400 bispados subordinados
ao patriarca de Constantinopla, enquanto que quatro séculos depois havia 17
metropolitas, um arcebispado e três bispados. As propriedades da Igreja foram
confiscadas, locais sagrados cristãos foram saqueados como São Basílio em
Cesaréia, a Igreja de São Focas em Sinope, a de São Nicolau em Mira, e os
mosteiros de Monte Latrus, Strobilus e Meladounium. Além disso, manter uma
hierarquia eclesiástica como a Igreja Ortodoxa exige dinheiro, e a falta dele
afetou severamente a capacidade das figuras religiosas de desempenhar as
funções que eram necessárias, porque era a Igreja que fornecia a maioria dos
serviços de caridade e educacionais disponíveis para os civis bizantinos, bem
como a liderança espiritual tão necessária para a vida medieval. Os turcos
proibiram a peregrinação cristã no território que conquistaram, e passaram a
atacar peregrinos, roubá-los, e até escravizavam eles, e esse é um dos motivos
para começar a Primeira Cruzada.

Então diante dessa situação, o imperador bizantino Aleixo I Comneno,


que assumiu em 1081, faz uma série de medidas para controlar a situação. Ele
assume com 24 anos e era um homem muito inteligente, e uma das primeiras
coisas que faz é fazer uma aliança com os venezianos. Essa aliança era
porque os normandos tomaram as possessões bizantinas no sul da Itália e
fizeram o reino deles lá, o reino da Sicília, e os venezianos iriam proteger os
bizantinos contra ataques dos normandos nos Balcãs. Aleixo também apoia os
territórios balcânicos sobreviventes do Império, e tenta lentamente recuperar
áreas dominadas pelos turcos. Só que Aleixo não tinha mercenários o
suficiente, não tinha soldados o suficiente, e então escreve ao papa Urbano II
pedindo ajuda. O papa convoca os nobres no Concílio de Clermont em 1095,
começando assim a Primeira Cruzada.

O discurso do papa Urbano II é icônico e épico, porque ele convoca


qualquer homem fisicamente capaz deve pegar a cruz e marchar para o leste,
e não para salvar o Império Bizantino, mas para recuperar os lugares sagrados
para a Cristandade. No seu discurso ficou famosa a frase “Deus Vult” que seria
algo como “A Vontade de Deus”, falando que é a vontade de Deus que
retomemos a Terra Santa dos invasores infiéis.

(Anatólia em 1097, antes do Cerco de Niceia e da Batalha de Dorileia)

Os muçulmanos medievais pensavam os europeus como selvagens, ou


bárbaros que não tinham nenhum senso de higiene, e a Europa era imaginada
como uma ambiente frio, escuro e nebuloso. No entanto, tanto os cristãos
quanto os muçulmanos não tinham muita ideia de como era o outro lado,
tirando aqueles que estavam na periferia dos dois mundos como na Península
Ibérica, na Sicília e na Turquia bizantina.

Na véspera da Primeira Cruzada, o califa Abássida era apenas um


vassalo do grande Império Seljúcida, e o poder central tinha enfraquecido e
muitos pequenos clãs baseados em conexões familiares floresceram em toda a
Síria e Palestina. O califado xiita Fatímida também estava em declínio, estando
apenas com o Egito. Em 1092, o vizir seljúcida Nizam Al-Mulk, o califa
abássida Al-Muqtadi e o sultão seljúcida Malik Shah morrem, e dois anos
depois o califa fatímida Al-Mustansir morre junto com seu vizir Badr Al-Jamali.
Tais perdas geraram um caos no mundo islâmico, que fez o trabalho dos
Cruzados mais fácil um pouco. Como eu já escrevi um livro inteiro sobre todas
as Cruzadas, vou resumir suas conquistas. Com o término da Primeira Cruzada
em 1099, os territórios do Oriente Médio ficam deste modo, com a fundação
dos Estados Cruzados, e a reconquista da Anatólia Ocidental dada ao Império
Bizantino.

(Fronteiras em 1140)
(Conquista de Jerusalém pelos Cruzados, por Émile Signol, no Palácio de
Versalhes)

A Segunda Cruzada (1147-1149) foi um fracasso, que começou com


uma reação à queda do Condado de Edessa para o exército do seljúcida Zengi
em 1144. O restante dos cruzados pereceram durante o fracassado cerco de
Damasco. O fracasso dessa cruzada levou os muçulmanos liderados por Nácer
Saladim ou Saladino Iúçufe ibne Aiube, ou simplesmente Saladino, sultão do
califado Fatímida, que funda o Império Aiúbida em 1171, que durará até 1250.
Em 1187, Saladino consegue vencer os cristãos na batalha de Hattim e toma
Jerusalém e quase todo o reino.

Em 1189, começa a Terceira Cruzada (1189-1192), com grandes reis da


Europa medieval como Ricardo Coração de Leão da Inglaterra, Frederico
Barbarrosa do Sacro Império, e Filipe Augusto da França. Frederico Barbarrosa
acaba morrendo na Turquia afogado num rio, e os outros dois chegam à Terra
Santa, e Ricardo Coração de Leão consegue reconquistar as cidades de Acre e
Jafa. Ele não consegue reconquistar a cidade de Jerusalém, mas como nem
ele nem Saladino conseguiam vencer, eles fazem um acordo onde os cristãos
poderiam entrar em Jerusalém, desde que desarmados.
As outras cruzadas não alteraram muito para alterar o equilíbrio de
poder no Levante. A Quarta Cruzada (1202-1204) foi uma atrocidade onde os
cristãos pediram ajuda à Veneza para transportá-los para a Terra Santa, mas
eles não tinham dinheiro para pagar e então eles passam a saquear cidade
como Zara e saqueiam a própria Constantinopla em 1204, dividindo o Império
Bizantino em 4: Império Latino, Império de Trebizonda, Despotado de Epiro e
Império de Nicéia. Os participantes dessa atrocidade foram excomungados
pelo papa mesmo antes de chegarem em Constantinopla, mas não adiantou
nada, e o Império Latino permaneceu como uma força católica comandando
Constantinopla, até forças combinadas do Império de Nicéia e do Despotado
de Epiro reconquistarem a capital e reestabelecerem o Império Bizantino em
1261, com tamanho bem reduzido. Na Quinta Cruzada (1217-1221), os cristãos
conseguiram tomar Damieta no Egito, mas mesmo assim perderam e foram
para casa. Na Sexta Cruzada (1228-1229), quem liderou foi Frederico II do
Sacro Império, que tinha sido excomungado, mas apesar disso, ele consegue
através da diplomacia um tratado com o sultão aiúbida Camil que lhe condeceu
a posse de Jerusalém, Belém e Nazaré por 10 anos, mas a derrota em Gaza
fez eles perderem os Santos Lugares em 1244. A Sétima Cruzada (1248-1251)
foi liderada pelo rei São Luís IX da França, e ela é basicamente a mesma coisa
que a Quinta, com os cruzados atacando Damieta e perdendo e tendo que se
retirar no final. A Oitava Cruzada em 1270 também foi um fracasso humilhante
para os cristãos, que comandados por São Luís IX, decidem atacar a cidade de
Tunís, mas morrem de peste no caminho, inclusive São Luís, e perdem feio.
Por fim, a Nona Cruzada ocorreu de 1271 a 1272, comandada pelo rei Eduardo
I da Inglaterra, que até conseguiu algumas vitórias contra o sultão Baibars, mas
no final teve que voltar à Inglaterra pois seu pai Henrique III morreu e ele era o
herdeiro.

Em 1291, os mamelucos do sultanato do Egito fundado em 1250, tomam


as últimas posseções cruzadas no Levante, pondo fim ao período das
Cruzadas, pelo menos do ponto de vista europeu católico. Os islâmicos sempre
viram as Cruzadas como uma continuação da “agressão” que sofriam na
Reconquista da Península Ibérica, da conquista normanda da Sicília de 1061 a
1091, e da reconquista das terras bizantinas. Outros falam que a ocupação de
Jerusalém e outras terras no Levante não conseguiram trazer muito
ressentimento e mobilização no mundo muçulmano fragmentado além das
comunidades de refugiados islâmicos. Um deles é Abu Al-Fida (1273-1331),
um participante dos cercos de Trípoli e Acre, e apresentou fatos precisos sobre
atrocidades cometidas por ambos os lados, falando especificamente do
massacre da população masculina em Acre feita pelos muçulmanos e suas
mulheres e crianças sendo vendidas como escravos. Inicialmente, muitos
muçulmanos viam as Cruzadas com curiosidade ao invés de ódio, mas com o
tempo e com massacres de muçulmanos como o de Mahara, o ódio começou a
ser generalizado e a resistência passou a ser ferrenha.

A maioria das pessoas que iam para as Cruzadas eram francos, porque
a França era a maior potência da Idade Média. Quando você fosse falar com
uma autoridade oficial dos reinos cruzados, geralmente você iria falar em
francês, mas quando fosse falar com pessoas comum, geralmente você usaria
o grego, ou o árabe, e outros dialetos locais.

No reino de Jerusalém, o rei era eleito por um tribunal superior, e em


1118, Balduíno II é eleito pelo tribunal, após a morte de Balduíno I. Apesar de
tentarem implementar uma administração feudal na região, ainda havia
resquícios da administração bizantina e árabe. Por exemplo, na agricultura,
todas as terras agrícolas eram governadas por um sistema de senhorios e
inquilinos, chamado iqta, que veio dos muçulmanos. A alta corte auxiliava o rei
em todos os assuntos importantes, algo como uma Casa dos Lordes.

Sobre a população cristã no território, é estimado que cerca de metade


da população era cristã, e segundo Bernard Hamilton, cerca de 140.000
europeus imigraram para o Reino de Jerusalém na segunda metade do século
XII. Considerando que havia cerca de 230.000 cristãos ortodoxos no Reino de
Jerusalém, e que houve a chegada destes 140.000, cerca de 60% da
população do reino era cristã, e para os outros reinos cruzados deve ter sido
mais ou menos a mesma porcentagem.

De acordo com um relato de Ibn Jubair, por volta de 1170, no seu livro
que em tradução literal seria “Viagens no Egito, Palestina e Síria”: “Todos que
são novos imigrantes das terras francas tem caráter mais rude do que aqueles
que se aclimataram e se mantiveram associados com os muçulmanos”.

Outro relato é o de Usama ibn Munqidh, que escreve no final do século


XII, na sua autobiografia:

“Nós chegamos na casa de um dos velhos cavaleiros que


vieram na primeira expedição dos francos. Ele havia sido
retirado do registro e do serviço e tinha uma propriedade em
Antióquia onde ele vivia. Ele trouxe uma boa mesa e comida
extremamente limpa e excelente. Ele me viu me abstendo de
comer e disse: ‘Coma, fique tranqulo que eu não como a comida
do franco. Eu tenho mulheres egípcias como cozinheiras. Eu
como somente o que elas cozinham e carne de porco não entra
na minha casa.’. Então eu comi, cautelosamente e saímos.”.

Essa citação é interessante porque mostra a assimilação que os francos


fizeram, mostrando um cavaleiro que fala árabe bem, come comida árabe e
mora em uma casa com arquitetura oriental em Antióquia, e o que ele serve é
aceitável para seus convidados islâmicos.
(Christian And Moor Playing Chess. from The Book of Games of Alfonso X, c.
1285. Reproduced in Lebedel, "Les Croisades, origines et consequences", p.
108.)

Na Terra Santa, além dos francos católicos, havia tolerância para as


várias denominações cristãs: gregos ortodoxos, sírios ortodoxos, armênios, e
maronitas. Os cânones produzidos no Concílio de Nablus em 1120, a
constituição efetiva do Reino de Jerusalém, menciona a regulação das relações
entre cristãos e muçulmanos e cristãos e judeus. Não fala nada sobre como
tratar as outras denominações cristãs, o que sugere que não houve nenhuma
perseguição. Tanto os judeus, quanto os muçulmanos eram proibidos de se
estabelecerem na cidade de Jerusalém. Os judeus foram permitidos viver sobre
seus próprios costumes, estavam sujeitos às suas próprias leis e tribunais, a
única diferença é que seus antigos senhores muçulmanos foram substituídos
pelos francos. Aos muçulmanos foi permitido seguir a religião em todo o reino,
exceto na cidade de Jerusalém. Em outro relato do mesmo livro, Ibn Jubair fala:
“Nós deixamos Tibnin por uma estrada que passava por
fazendas onde vivem muçulmanos que se dão muito bem sob os
francos... Os muçulmanos tem suas próprias casas e se
governam à sua maneira. É assim que as fazendas e grandes
aldeias são organizadas no território franco. Muitos muçulmanos
são extremamente tentados a se estabelecer aqui quando eles
vêem as condições nada confortáveis em que seus irmãos vivem
nos distritos sob domínio muçulmano. Infelizmente para os
muçulmanos, eles sempre têm motivos para reclamar sobre as
injustiças de seus chefes e nas terras governados por seus
correligionários, enquanto eles podem ter nada além de elogios
à conduta dos francos, cuja justiça eles sempre podem confiar.”

Então podemos concluir que no reino de Jerusalém tinha um sistema


legal muito mais limpo que nos estados islâmicos circundantes. Outro relato é
de Usama ibn Munqidh, também na sua autobiografia, em que ele foi em uma
mesquita para fazer suas orações, e ele era bem amigo dos templários, que
eram donos do templo e deixaram ele entrar. Só que há um imigrante franco
que estava lá que viu que Usama estava virado para Meca enquanto rezava, e
fala que ele deveria se virar para o leste. Os templários então tiram gentilmente
esse homem e pedem desculpas a Usama, falando que ele era um recém
chegado que não entendia os costumes do local.

Usama ibn Munquidh também entra em uma disputa jurídica com um


homem conhecido como o príncipe de Baniyãs, que fica na fronteira do que
hoje é o Líbano e Israel. Então Usama leva esse caso para a alta corte em
Jerusalém, e acusa o príncipe falando que ele atacou e apreendeu seu
rebanho, falando que era a época que as vacas estavam no período fértil, e os
bezerros morreram ao nascer, e ele devolveu a manada completamente
arruinada. O rei de Jerusalém se voltou para seus seis ou sete cavaleiros, e
decidiram que o príncipe de Baniyãs devia indenizar este homem pelo gado
que ele arruinou.

É claro que não podemos falar que esses dois casos eram a regra para
como os muçulmanos eram tratados, mas mostra que houve considerável
respeito e vários casos onde os muçulmanos foram tratados com justiça.
Os cânones 13 e 14 puniam o sexo entre um homem cristão e uma
mulher escrava muçulmana, com castração e expulsão. O cânone 15 proibe o
sexo consentido entre uma mulher cristã e um homem muçulmano. Não havia
nada na lei proibindo o sexo consensual entre homens cristãos e mulheres
muçulmanas livres. Também não havia nada falando de casamento entre
pessoas de diferentes denominações cristãs, nem de um cristão e uma judia,
ou qualquer outra combinação. Após 1187, os reinos cruzados vão ficar mais
na defensiva e na esfera dos reinos católicos da Europa.

Na elite governante, o casamento entre denominações cristãs era


extremamente comum. A mulher do rei Balduíno I era Morfia de Melitene, que
era da ortodoxia armênia, e reinou Jerusalém de 1116 até 1126/28. Um dos
primos de Balduíno II, Waleran de Le Puiset se casou com a filha de um lorde
armênio em al-Bira.

Durante as duas últimas décadas, estudos de documentos, assistidos


por computador, demoliram a narrativa iluminista de que os cruzados eram
sem-terra e inúteis que aproveitaram a oportunidade para roubar e pilhar um
território distante. Especialistas descobriram que, em geral, os cavaleiros
cruzados eram homens ricos que possuíam muitas terras, e que abriram mão
de tudo voluntariamente para realizar a santa missão. Participar de uma
Cruzada não era algo barato, até senhores ricos podiam facilmente ficar pobres
junto com suas famílias por participarem de uma. Eles participavam
porque tinham a esperança de ajuntar tesouros onde nem as traças nem a
ferrugem os poderiam consumir. 

Eles tinham profunda consciência do quanto eram pecadores, e estavam


dispostos a suportar as privações da Cruzada como um ato penitencial de amor
e caridade. A Europa está repleta de documentos medievais que confirmam
esses sentimentos, documentos por meio dos quais aqueles homens falam
conosco até hoje. É claro que eles não se opunham a capturar espólios quando
isso era possível, mas as Cruzadas eram notoriamente ruins para a pilhagem.
Poucas pessoas enriqueciam, e a grande maioria retornava sem nada,
“apenas” sabendo que lutou por uma causa justa.
Urbano II deu aos cruzados dois objetivos, e ambos continuaram sendo
essenciais para as Cruzadas orientais nos séculos seguintes. O primeiro era
resgatar os cristãos do Oriente, e como disse seu sucessor, Inocêncio III:

Como pode um homem amar o próximo como a si


mesmo, segundo o preceito divino, quando, sabendo que seus
irmãos na fé são mantidos pelos pérfidos muçulmanos em estrito
confinamento e oprimidos pela mais pesada servidão, não se
dedica à tarefa de libertá-los? É por acaso que ignorais que
milhares de cristãos são mantidos na escravidão e na prisão
pelos muçulmanos, além de serem torturados com inúmeros
suplícios?

O segundo objetivo era libertar Jerusalém e outros locais santificados


pela vida de Cristo. A palavra cruzada é moderna, e os cruzados medievais
consideravam-se peregrinos que realizavam atos de justiça no trajeto em
direção ao Santo Sepulcro. Se você participasse de uma Cruzada tinha os
pecados passados e futuros perdoados pelo papa.
A reconquista de Jerusalém foi um ato de restauração, não de
colonialismo, e uma declaração aberta de amor a Deus. Os medievais sabiam,
é claro, que Deus tinha poder para reconquistar Jerusalém para si — na
verdade, Deus tinha poder para pôr o mundo inteiro sob seu governo
novamente. Porém, como pregou São Bernardo de Claraval, sua recusa em
fazê-lo era uma bênção para seu povo:

Digo novamente: levai em conta a bondade do Todo-


poderoso e prestai atenção em seus planos de misericórdia. Ele
impõe a si uma obrigação para convosco (ou antes simula isso),
de modo que possa ajudar-vos a satisfazer vossas obrigações
para com Ele… Considero abençoada a geração que pode
aproveitar a oportunidade de uma indulgência tão rica como
essa.
.
A conversão forçada dos muçulmanos nunca foi o objetivo, até porque o
bispo Alcuíno de York (735-804) já mostrou três séculos atrás, quando foi
conselheiro do imperador Carlos Magno, que toda conversão é voluntária. O
objetivo dos cruzados era derrotá-los e defenderem-se deles. Só no século XIII
que os franciscanos começaram a tentar converter os muçulmanos, mas tais
tentativas foram em grande medida infrutíferas e ao fim e ao cabo foram
abandonadas. Não era incomum muçulmanos se convertendo ao Cristianismo,
mas ocorreu em número menor.
Cinquenta anos depois, quando a Segunda Cruzada estava sendo
preparada, São Bernardo pregou muitas vezes que os judeus não deviam ser
perseguidos:

Perguntemos a qualquer um que conhece as Sagradas


Escrituras o que o Salmo vaticina sobre os judeus. “Não rezo
pela destruição deles”, ele diz. Os judeus são para nós as
palavras vivas da Escritura, pois sempre nos recordam o que
Nosso Senhor sofreu… Sob o governo dos príncipes cristãos,
eles suportam uma difícil servidão, mas “apenas esperam o
momento de sua libertação”.

Contudo, um monge cisterciense contemporâneo de São Bernardo


chamado Rodolfo incitou as pessoas contra os judeus da Renânia, apesar de
Bernardo ter escrito várias cartas para exigir que ele parasse com aquilo. No
final das contas, ele se viu obrigado a ir pessoalmente até a Alemanha, onde
alcançou Rodolfo, enviou-o de volta ao seu convento e interrompeu os
massacres. 

Judeus morreram durante as Cruzadas, mas o objetivo delas não era


matar judeus. Papas, bispos e pregadores deixaram claro que os judeus da
Europa deviam ser deixados em paz. Numa guerra moderna, chamamos
mortes trágicas como essas de “dano colateral”. Mesmo com tecnologias
inteligentes, os Estados Unidos mataram um número muito maior de inocentes
em guerras do que os cruzados jamais poderiam imaginar.

A antiga fé do cristianismo, com seu respeito pelas mulheres e sua


aversão à escravidão, não apenas sobreviveu, mas prosperou. Sem as
Cruzadas, ela poderia muito bem ter seguido o caminho do Zoroastrismo persa,
outro rival do islã, rumo à extinção. E vale lembrar que durante as Cruzadas, o
tráfico de escravos bérbere feito pelos muçulmanos foi interrompido, já que o
reino de Jerusalém agora tinha contato com o mar Vermelho.

Além das Cruzadas, os normandos conseguiram conqusitar a Sicília


muçulmana e a Tunísia e parte da Líbia por um tempo. Conforme já falamos
que de 1061 a 1091 os normandos conquistam a Sicília, eles vão estabelecer o
reino da Sicília em 1130 e que irá durar até 1816. Em  1135 , o rei
normando Rogério II invade a zona costeira norte-africana
da Tunísia e Tripolitânia , e a anexa de facto ao Reino da Sicília. Este "Reino
Normando da África" se tornou uma espécie de "protetorado" siciliano, apoiado
em parte pela pequena comunidade cristã que havia sobrevivido à
conquista muçulmana do norte da África. Os normandos aproveitaram o fato de
que uma epidemia e uma grande fome enfraqueceu os árabes da Tunísia e
foram recebidos com simpatia pelos habitantes graças à comida que os
normandos trouxeram da Sicília. Várias centenas de cristãos se mudaram com
eles, o que criou um ressentimento entre os muçulmanos locais. Na capital,
Mahdia, foi inaugurada uma igreja local, a primeira desde a conquista árabe no
século VII. Os normandos sicilianos deram total autonomia administrativa
aos nobres árabes locais, mas em 1158 , logo após a morte de Rogério II em
1154, já reinando Guilherme II da Sicília , os almóadas apreenderam quase
todo o reino da África. Em 1160 , a capital do reino e último bastião cristão no
norte da África, Mahdia, caiu em mãos árabes. Sucessivamente, os cristãos da
África desapareceram por causa das perseguições dos fanáticos muçulmanos
almóadas, embora algumas comunidades muito pequenas tenham sobrevivido
no sul da Tunísia por mais alguns séculos.
(Reino da África (1135-1160)

Voltemos nossas atenções agora de volta à Península Ibérica. Em 785,


Carlos Magno impôs a Marca Hispânica no norte da Espanha, como divisa
entre os francos cristãos e os muçulmanos, a partir dos montes Pirineus e
algumas fortificações. Em 778, ocorre a famosa batalha de Roncesvalles, entre
francos e vascões, onde o comandante da retaguarda de Carlos Magno,
Rolando, acabou morrendo em batalha, e os vascões foram vitoriosos. Essa
batalha inspirou a canção de Rolando, uma das música mais famosas de toda
a Idade Média, talvez a mais famosa, só que no lugar dos vascões, ele
colocam os muçulmanos, por causa do contexto da Reconquista e das
Cruzadas.
No século IX, São Tiago Maior, que foi um dos 12 apóstolos de Jesus,
teria supostamente aparecido miraculosamente em vários combates na batalha
de Clavijo em 844, conduzindo os cristãos à vitória. E com isso São Tiago foi
apelidado de Santiago Matamouros. Em 1063, o papa Alexandre II concede
indulgência geral aos franceses que fossem ajudar seus irmãos espanhóis.
Em 1008, no norte da Espanha estavam estabelecidos os reinos de
Leão-Galiza, Castela, Navarra, a Marcha Hispânica que era da França, e o
condado de Barcelona. O resto da Península, que era a maior parte, era o
Califado de Córdoba, que tinha surgido em 929. Nas mãos de Almançor, o
califado retornou aquele ímpeto expansionista, e retomou algumas cidades dos
recém formados reinos cristãos. Depois que Almançor morreu em 1002, os
cristãos tiveram um grande alívio. Em 1031, o Califado se fragmenta em uma
federação de 23 pequenos estados, as taifas, onde muitos brigavam entre si.
Então se aproveitando da situação Fernando I une os reinos de Leão e
Castela, por meio de um casamento com a rainha de Leão em 1037. Fernando
ataca e cerca os taifas de Toledo, Badajoz e Saragoça, e chega até a submeter
sob sua autoridade o taifa de Sevilha. Mas ele acaba por morrer em 1065, e
seu reino foi dividido entre seus herdeiros, formando o reino da Galiza, Leão, e
Castela. Seu filho, Afonso VI consegue reunificar Castela e Leão, e retoma as
ofensivas, principalmente pelo apoio do papa Gregório VII, que transforma a
Reconquista numa Cruzada. Os taifas de Sevilha, Saragoça, Valência e
Granada são duramente atacados por Afonso. Mas os reis muçulmanos dos
taifas de Sevilha, Badojoz e Granada, resolvem apelar para um cara chamado
Yusuf Ibn Tashfin, chefe de uma nova facção de muçulmanos nômades do
deserto do Saara, que em pouco tempo foram imparáveis nas conquistas do
noroeste da África, os temíveis almorávidas.

No entanto, vamos focar melhor no norte da África e como os


almorávidas chegaram ao poder. Quando o califado Abássica começa a se
fragmentar em 850, os berberes do Magreb começaram a ser governados por
dinastias árabes e persas como os rustâmides, aglábidas e idríssidas. Apesar
disso, um punhado de confederações tribais nas margens de Magreb ocidental
conseguiu sobreviver como independentes. Talvez a mais notável tenha sido
os berberes livre de Barghawata, que devido ao seu isolamento, nunca se
converteram totalmente, praticando uma mistura única de islamismo, judaísmo
e politeísmo berbere.

No século X, os fatímidas xiitas governaram o Magreb ocidental, e


muitos berberes lutavam lealmente sob a bandeira fatímida em sua expansão.
No entanto, muitos outros amazigh guardaram um ressentimento por estarem
sob domínio estrangeiro, não vendo diferença dos fatímidas com os omíadas
de antigamente. Em 943, uma nova revolta eclodiu, desta vez liderada por um
enigmático ancião amazigh chamado Abu Yazid, que se posicionou como um
Messias levando seu povo à liberdade. A rebelião foi bem-sucedida e ele quase
quebrou o poder fatímida, o que forçou o califa a chamar seu leal vassalo Ziri
ibn Manad do clã Zirid, que conseguiu esmagar a revolta. Em 969, os fatímidas
tomam o Egito e Levante dos abássidas, deixando-os com apenas a região do
Iraque. Eles fundaram Cairo como capital e perderam o interesse em governar
o Magreb, e deram esses territórios ao filho de Ziri, Buluggin ibn Ziri, que se
tornou o emir de Ifriqiya em 972. O reino Zíride foi o primeiro verdadeiro império
berbere, e expandiram sua influência para a rica cidade de Granada no
Califado de Córdoba e sob a Sicília.

Os Zíridas tiveram que enfrentar diversas rebeliões tribais e lutas


interdinásticas. Apesar disso, o domínio Zíride inaugurou uma Era de Ouro da
cultura berbere já que a capital Kairouan se tornou a joia do Magreb onde a alta
cultura, arte e arquitetura prosperaram, enquanto que a agricultura praticada ao
longo da fértil área estava entre as mais produtivas do Mundo Mediterrâneo.
Com o tempo, as relações entre os Zíridas e os Fatímidas começam a se
deteriorar e em 1049, o emir Al-Mu´izz ibn Badis decidiu romper ligações com
os Fatímidas e se converteu do xiita para o sunita. Os fatímidas responderam
mandando tribos beduínas nômades, que derrotaram Zirid com facilidade. Os
avanços dos Zíridas foi destruído, e os campos cultivados se transformaram
em pastagens para ovelhas beduínas.

Durante séculos, o deserto do Saara ocidental e o Magreb ocidental foi a


região esquecida do mundo islâmico. As tribos ali eram de maioria muçulmana,
mais a distância de Meca e do califado principal, fez com que eles
obedecessem mais ou menos às leis do Alcorão. Tudo isso mudaria com a
ascenção de Abdallah ibn Yasin, que foi educado em Córdoba e que desejava
unir as tribos berberes sob o sunismo de Malik. Em 1040, ele foi convidado
pelo chefe da tribo Saharan Godara para ser o pastor religioso de seu povo.
Yasin exerceu sua autoridade religiosa com punhos de ferro, punindo desvios
com açoites brutais. Eventualmente a Godara se cansou do fundamentalismo
dele e o expulsou, mas ele conseguiu assumir o controle da tribo Lamtuna,
ganhando muitos seguidores que ficaram conhecidos como al-Murabit, que
significa “aqueles que estão prontos para a batalha em uma fortaleza”. É da
palavra al-Murabit que deriva a palavra Almorávida, e no início da década de
1050, o movimento Almorávida saiu do deserto, forçando as tribos Godala,
Musufa e Lamta sob sua bandeira na batalha de Tabfarilla na atual Mauritânia.
Em 1055, Sijilmasa havia sido tomada e em 1059, ibn Yasin e seus guerreiros
puritanos Amazigh estavam à porta da confederação de Barghawata, cuja fé
sincrética semi-islâmica era considerada herética da mais alta ordem para os
Almorávidas puritanos. No seu primeiro conflito, os Barghawata foram
vitoriosos e até conseguiram matar ibn Yasin. No entanto, seu irmão Abu Bakr
ibn Umar assumiu o controle e conquista completamente os Barghawata
forçando-os a se converteu ao sunismo Maliki.

Em 1070, eles fundaram uma nova capital, Marrakech, que se tornou um


próspero centro de grandes mesquitas e bazares coloridos. Por volta de 1076,
eles estabeleceram hegemonia sob o Império de Gana, o terminal
extremamente rico da rede de comércio transaariana. Em 1086, o líder
almorávida Yusuf ibn Tashfin recebeu um pedido de ajuda das taifas ibéricas, e
decide unir essas taifas. Então em 1086 ocorre a batalha de Zalaca entre
cristãos e almorávidas, que foi desastroso para o lado cristão, fazendo Afonso
e seus homens recuarem até Toledo. Yusuf dá uma desanimada na consquista
da Espanha porque seu filho morreu nessa batalha, mas ele retorna quatro
anos depois, e passa a conquistar um por um os taifas de Al Andaluz, e em
1090, quase toda Al-Andaluz tinha sido unificada sob domínio almorávida.
(extensão do Império Almorávida em sua máximo extensão em 1120)

Nesse período da Reconquista, merece destaque a figura de El Cid.


Rodrigo Díaz de Vivar (1043-1099) foi um cavaleiro do reino de Castela e
senhor da guerra na Espanha medieval e veio a ser conhecido pelos mouros
como El Cid (“senhor” em árabe) e pelos cristãos como El Campeador
(Campeão). Ele nasceu em Vivar del Cid, um vilarejo próximo à cidade de
Burgos, em Castela. Como chefe de seus leais cavaleiros, veio a dominar o
Levante da Península Ibérica no final do século XI. Ele recuperou a cidade de
Valência do controle muçulmano por um breve período durante a Reconquista,
depois de 20 meses de cerco, criando o senhorio independente o “Señorío de
Valência” de 17 de junho de 1094 até sua morte em 1099. Sua esposa, Jimena
Díaz, herdou a cidade e a manteve até 1102 quando foi reconquistada pelos
mouros.
Os mouros ainda insistiam em atacar Barcelona, que só conseguiram
segurar as pontas por causa de um exército cristão vindo da França. A próxima
figura forte que surge agora é Afonso I de Aragão, que reinou de 1104 até
1134, chamado de “O Batalhador”. Ele retomou Saragoça em 1118, pulverizou
os inimigos em Cutanda em 1120, e cinco anos mais tarde ele fazia incursões
no coração do reino de Al Andaluz dos muçulmanos, em Córdoba e Granada.
Ele só perdeu uma batalha na sua vida, que foi a última que lutou. Mas ocorre
uma outra revolução no mundo islâmico, já que muitos muçulmanos achavam
os almorávidas puritanos, fanáticos, e materialistas demais. Então surgem os
almóadas, que se opuseram aos almorávidas, pregando a jihad contra eles. O
nome almóada vem de al-Muwwahidun (aqueles que afirmam a unidade de
Deus”), que os seguidores de ibn Tumert se deram depois que ele causou uma
agitação em Bagdá ao pregar furiosamente contra a corrupção dos
almorávidas, a venda de vinho e carne de porco em suas cidades e sua
dependência de juristas corruptos da corte para interpretar a lei religiosa.

Sob os almorávidas, os cristãos eram muito maltratados e


frequentemente expulsos em massa. Os Almóadas foram ainda piores nesse
quesito, e os cristãos podiam se converter ao islamismo ou morrer. Mas isso
também fazia com que os Almóadas ficassem mais pobres, porque não teriam
mais as receitas dos cristãos e judeus. A partir de 1145, a Espanha Almorávida
vai decaindo, e vai se tornando do Império Almóada. E os cristãos vendo os
islâmicos brigando entre si, vão aproveitar a situação para continuar a
Reconquista.

Surge então a figura de Afonso Henriques, que é um herói de Portugal.


Em 868, nasceu o Condado Portucalense, o atual norte de Portugal, o qual era
muito importante e tinha bastante autonomia, porém era um vassalo do reino
de Leão. Em 1071, o Condado Portucalense é anexado ao reino da Galiza,
mas 20 anos depois ele reemergiu. Em 1109, nascia Afonso Henriques “O
Conquistador”, filho do conde portucalense Henrique que morreu três anos
depois, e Afonso se tornou conde aos três anos. Como ele era muito novo, sua
mãe, Teresa de León virá uma regente. Em 1120, ele assume uma posição
contrária a de sua mãe, e foi obrigado a sair do condado. Sua mãe havia se
aliado com Fernão Peres de Trava, de uma das casas mais fortes da Galiza.
Como isso poderia ser ruim para a autonomia da região, em 1128, Afonso
Henriques volta com a ajuda de um exército e luta contra sua mãe que estava
com o exército da Galiza, na batalha de São Mamede. Afonso acaba ganhando
e vira assim o conde de Portugal. Ele estava lutando pela independência da
região e lutou várias batalhas, e em 1139 ocorreu uma das mais difíceis, a
batalha de Ourique. Nessa batalha, o exército de Afonso Henriques se deparou
com um exército mouro bem maior. Diz a lenda que Afonso teria uma visão
com Jesus, onde ele garantira a vitória se Afonso espalhasse a palavra por
todo o mundo. Então Afonso acabou ganhando a batalha e foi nomeado rei de
Portugal pelo seu exército. Em 1149, acontece o cerco de Lisboa, onde ele
acaba ganhando novamente. Com o passar dos anos ele conquista mais um
pouco de territórios até que em 1179, a Igreja reconhece a independência de
Portugal. Afonso Henriques acaba morrendo em 1185 na sua casa em
Coimbra, até hoje não tem consenso sobre o motivo.
Em 1195, os Almóadas vencem o rei Afonso VIII de Castela na batalha
de Alarcos. Em 1212, o arcebispo Rodrigo Jiménez de Toledo, quer enfim
reuinir as forças cristãos e fazer o Cristianismo prevalecer de vez na Península
Ibérica. Então ele reúne um grande exército e no mesmo ano ocorre a batalha
mais decisiva da Reconquista, a Batalha de Navas de Tolosa, e a Europa
inteira envia voluntários e o papa prega a cruzada espanhola. Três reis ibéricos
se unem para a emprentada, Sancho VII de Navarra, Pedro II de Aragão e
Afonso VIII de Castela. Alguns especialistas contam 60.000 cristãos contra
120.000 muçulmanos, mas logo se estabeleceu a desordem no exército dos
almóadas, e com a derrota, muito de seu exército foi dizimado.
(Batalha de Navas de Tolosa. Pintura a óleo do século XIX, de F. P. Van Halen,
exposta no Palácio do Senado em Madrid.)

Em 1236, temos a reconquista de Córdoba, que estava a 525 anos em


mãos muçulmanas. Em 1248, temos a reconquista de Sevilha e Valência pelas
tropas de Fernando III de Castela. Agora só sobrava o pequeno reino de
Granada, que à essa altura já era vassalo do reino de Castela. Quando
Fernando III morre em 1252, só faltava o pequeno pedaço de Granada para ser
retomado. Isso começa a se dar em 1482, com Fernando II de Castela e Isabel
de Aragão, que utilizando de um jogo diplomático e de alguns enfrentamentos,
em 10 anos eles terminam a Reconquista da Península Ibérica, conquistando
Granada em 1492. O Califado Almóada cai em 1269, sendo dividido entre o
Reino de Granada, Império Merínida no Marrocos, e o Reino Haféssida na
Tunísia e Líbia.
(A rendição de Granada por Francisco Pradilla Ortiz)

Invasões Mongóis, Mamelucos e Turcos-Otomanos, e a queda de


Constantinopla (1250-1453)

No século XIII surge outra força poderosa, só que desta vez no Extremo
Oriente, os mongóis. Os planaltos da Mongólia eram ocupados por cinco tribos
poderosas: os Keraites, Mongóis, Naimans, Merquites e os Tártaros. Essas
cinco tribos brigavam toda hora entre si, e a dinastia Jin da China estava muito
feliz com isso. A dinastia Jin e os tártaros atacavam, matavam, conquistavam,
destruíam, saqueavam, até que surge a figura de Temudjin, filho de um rico
chefe mongol. Temudjin queria ser os reis dos mongóis, mas eles já tinham um
rei, Kurtait. Então Temudjin une todas as tribos da Mongólia e em 1206 forma o
Império Mongol, assumindo o nome de Gengis Khan.
Gengis Khan criou o código de leis, proibiu a venda de mulheres,
reprimia brigas internas e roubo. A religião deles era o Tengriismo, uma forma
de paganismo, mas você podia fazer parte de outra religião de boa. Os pobres
e o clero não pagavam impostos. Foi como líder militar que ele mais brilhou,
desenvolvendo um novo exército, com corpos de 10, 100, 1000 e 10.000
soldados, comandados por homens de confiança de Khan. Esses corpos eram
conhecidas como as temíveis hordas mongóis. Com guerreiros montados a
cavalo, Khan começa sua marcha em direção à sua maior glória, os rus de
Kiev. Com seu exército implacável ele parte para o oeste e inicia a invasão
mongol da Rússia de Kiev em 1223. No entanto, Gengis Khan morre em 1227,
e seu neto seria responsável pela conquista final da Rússia, Batu Khan, que
leva os mongóis a serem o único povo da história a derrotar os russos em
pleno inverno. Ele desintegra todos os principados russos da Rússia de Kiev, e
subjulga os povos eslavos até o final do século XV.
Após essa grande conquista ele foi invadir a Polônia, Hungria, República
Theca, Aústria, Croácia, e Bulgária. No entanto, a Polônia, a Hungria e a
Bulgária conseguem pará-los e não são dominados. A Europa inteira tinha 70
milhões de habitantes e o Império Mongol sozinho tinha 100 milhões. De todas
as ordens militares religiosas, apenas os templários enviaram reforços contra
os mongóis na batalha de Mohi no reino da Hungria em 1241, e na batalha de
Legnica entre uma força armada de poloneses e alemães em 1241. Os
cavaleiros lutavam com espadas e escudos e os mongóis com cavalos e arcos.
O grande Khan Ogedei avança para a Europa com toda a sua força, mas algo
surpreendente acontece: ele acaba morrendo do nada em 1241 e sem seu
líder, os mongóis acabam abandonando a Europa.
Com a morte de Ogedei, sua esposa Toregene assume o poder e se
torna a mulher mais poderosa do mundo. Mas o novo imperador seria seu filho,
Guyuk Khan, mas que reinou só dois anos de 1246 a 1248 até morrer doente.
Um conselho de aristocratas chamado Kurultai se reúnem e escolhem o novo
imperador, Mongke Khan, neto de Gengis Khan, filho de Tului e não de Ogedei.
Então ocorre um conflito interno entre o filho de Ogedei e Mongke Khan, com
Mongke vencendo. Mongke era um grande Khan, e seguia as leis, não era um
bêbado, era tolerante com as religiões estrangeiras, tinha templos budistas,
mesquitas, e Igrejas. A capital Karakorum era adornada com arquitetura
europeia, chinesa e persa. Ele confiou sua administração aos muçulmanos e
empreendeu uma série de reformas econômicas. Com as finanças em dia era
hora de atacar, desta vez o sul da China e o Oriente Médio.
Em 1258, os mongóis conquistam e saqueiam Bagdá, a maior cidade
islâmica, sob o comando de Hulagu, irmão de Mongke. Esse saque leva o
sistema islâmico à beira do colapso, e 80.000 pessoas são massacradas, além
do centro de poder mudar de Bagdá para o Cairo. Depois ele ataca a Síria e
destrói completamente o califado Abássida. Depois foi a vez de Damasco e
Alepo. Eles só foram parados pelo poderoso sultanato mameluco a caminho do
Egito. Em 1260, os mongóis derrotam os mamelucos na batalha de Ain Jalud.
(saques mongóis na Síria e Palestina em 1260)
Para piorar, no sul da China, os mongóis tiveram contato com doenças e
o grande Khan Mongke morre em batalha, levando o Império ao caos. Mas ele
tinha um irmão, o salvador do Império, Kublai Khan. Kublai queria a China, mas
os mongóis queriam Kublai, que os ignorou. Então o irmão de Kublai, Ariq Boke
se torna o novo Khan. Então começa a guerra civil Toluid entre os dois irmãos
e Kublai vence e se torna o novo Grande Khan. Mas Kublai ainda queria a
China, e ele conquista a China, destrói a dinastia Jin, e cria a dinastia Yuan em
1271.
A rota da Seda volta a funcionar, o mercado volta a funcionar e a Europa
e a Ásia ficam felizez. Mas quando Kublai morre em 1294, os mongóis perdem
seu líder e o Império é dividido entre quatro canatos: o Canato da Horda
Dourada, a Dinastia Yuan, Ilcanato e o Canato da Chagatai. A dinastia Ming
briga com os mongóis da China, os mongóis se separam e acaba a Pax
Mongólica.
Gengis Khan foi um dos líderes mais cruéis e sanguinários da história,
matando cerca de 40 milhões de pessoas em suas campanhas na Eurásia.
Para comemorar suas vitórias sobre os russos, os mongóis colocaram dezenas
deles deitados no chão, colocaram um portão em cima e fizeram um banquete
em cima do portão, esmagando todos. Em algumas batalhas os mongóis
colocavam manequins montados nos cavalos para parecer que eles tinham
mais soldados do que realmente tinham. Aqueles que resistissem aos mongóis
tinham um tratamento extremamente violento e selvagem, como o príncipe
muçulmano de Mayyafaraqin que quando capturado foi obrigado a comer a
própria carne. O sistema de irrigação de Bagdá foi completamente destruído, e
o entorno da cidade se tornou um deserto. Por incrível que pareça os cristãos
de Bagdá vão ser poupados, porque a mãe de Hulagu era cristã, e sua esposa
favorita era cristã.
Em 1260, Beomundo VI de Antióquia tenta fazer um acordo com os
mongóis, onde ele tenta persuadir outros governantes francos da Terra Santa a
se aliarem aos mongóis contra os islâmicos. Os mongóis dobram o território do
principado de Antióquia por causa desse acordo. Os mongóis repetidamente
oferecem Jerusalém como incentivo, e há negociações com o papa e o rei da
França. Em 1268, os mamelucos capturam Antióquia, marcando o fim do
principado.
O fim da Horda Dourada só iria ocorrer em 1502, após a Rússia
unificada começar a se expandir para o leste. A dinastia Yuan mongólica na
China cairia em 1368. E o último canato, o Canato de Chagatai só irá cair em
1687.

(auge da extensão do Império Mongol, em 1259)


O reino de Jerusalém sempre foi hostil aos mongóis, e viam eles como
mais terríveis que os muçulmanos. Inclusive o reino garantia passagem livre
dos mamelucos pelo seu reino, do Egito para a Síria. No entanto, os
governantes islâmicos estavam ressentidos por alguns governadores cristãos
apoiarem os mongóis, como Beomundo VI. Em 1269, Eduado I da Inglaterra
vai para a Terra Santa e tenta fazer um acordo com os mongóis que sobraram
e não é ajudado por ninguém, e acabou sendo inútil a sua vinda. O general
muçulmano que venceu os mongóis, Qutuz, é assassinado por seus generais e
o sultão Baibars se torna o grande governante islâmico no Levante e agora é
capaz de se voltar contra os francos por sua colaboração parcial com os
mongóis. E depois de Baibairs, ainda há dois sucessivos líderes islâmicos
fortes que são Qalawun, que governou de 1279 a 1290, e Al-Ashraf, que
governou de 1290 a 1293.

(Conquistas das Campanhas Do Sultão Baibars (1261-1277))


Quando Antióquia foi tomada em 1268, todos foram massacrados,
exceto os cristãos mais ricos, que foram resgatados. Possivelmente esse foi o
maior massacre de toda a história das Cruzadas, e a cidade foi destruída e
hoje só restam ruínas. Em 1278, Hugo III retira a corte da cidade de Acre para
o Chipre. Em 1287, Qalawun toma a Lataquia no principado de Trípoli. Em
1289, aliados venezianos pedem que Qalawun tome Trípoli e destrua o
comércio genovês, e ele cumpre. Trípoli é tomada em meio ao massacre geral
de cristãos, e a cidade é arrasada. Os francos agora desesperadamente se
preparam para defender o último ponto de resistência cristã, uma pequena
faixa que incluia a cidade de Acre e Beirute. Em 6 de abril de 1291, Al-Ashraf
chega em Acre com um grande exército e poderosas máquinas de cerco. Tem
um longo cerco de Acre, de 4 de abril até 18 de maio, e a cidade tinha defesa
corajosa, mas as muralhas foram golpeadas a rublo. Suprimentos chegam do
Chipre e eles preparam uma evacuação acelerada de mulheres e crianças.
Templários, hospitalários e francos lutam lado a lado à medida que mais
inimigos entram na batalha. Eles são expulsos de volta para o cais, mas a
resistência dá tempo para muitos civis serem evacuados para Chipre. Em 18
de maio, Acre é uma cidade muçulmana, e ocorre um massacre geral dos
cristãos, e quase nenhum prisioneiro foi deixado para o mercado de escravos.
O castelo templário ainda está segurando e os cavaleiros continuam
fazendo uma limitada evacuação dos civis para o Chipre. Al-Ashraf oferece
termos de rendição favoráveis e os templários aceitam, mas imediatamente é
quebrado por muçulmanos em ataques de pilhagem e estupro, e os templários
lutam. Al-Ashraf oferece os mesmos termos, os templários ofereceram salvo-
conduto para organizar a rendição, e são imediatamente apreendidos e
decapitados. Os templários que sobraram decidem lutar até a morte.
Em junho de 1291, Al-Ashraf chega em Tiro com o mesmo poderoso
exército. A guarnição era pequena demais para defesa, então as pessoas são
evacuadas para o Chipre. Em agosto de 1291, Sídon, Tiro, Beirute e Haifa
caem sem nenhuma resistência. Em Monte Carmelo os monges são
assassinados e os monastérios são queimados. O Chipre estava lotado de
refugiados aterrorizados, mas o poder marítimo mantém a ilha segura. Todas
as cidades tomadas na costa são destruídas.
A derrota dos mongóis em Ain Jalut, em 1260, não foi o fim da guerra
entre mongóis e mamelucos, que iria se extender por um longo tempo ainda. O
Ilkanato era governado por Hugalu Khan e se extendia da Turquia até o rio
Amu Dária na Ásia Central. Para Hugalu, o sultanato Mameluco era apenas
uma das fronteiras a qual ele tinha que proteger, caso ele estivesse tranquilo
com os outros canatos mongóis.

(Ilcanato na sua maior extensão)


O sultão Baibars expandiu os regimentos mamelucos, encorajando boas
relações com a Horda Dourada, com Gênova e com o Império Bizantino, para
manter o fluxo de soldados turcos escravos vindos das estepes. Ele
estabeleceu uma sofisticada rede de inteligência para informá-lo do Ilcanato e
para espalhar desinformação dentro dele, apoiado num sistema de torres
sinalizadoras, pombos-correio, em estradas, pontes e estações
retransmissoras melhoradas para rapidamente enviar mensagens. Fortificações
fronteiriças como al-Bira e al-Rahba no Eufrates foram fortalecidas, e Baibars
imediatamente marcharia do Cairo quando os mongóis invadissem. As
guarnições recuaram e se reagruparam nos locais designados durante as
invasões, encarando os mongóis com as forças unidas ou aguardando o sultão.
Baibars cultivou relações com os nômades beduínos pela Síria, os quais
forneceram valiosos reforços e inteligência, e os impediu que se aliassem aos
mongóis. Ele também se fortaleceu controlando a economia e nomeando
califas para se legitimar, apontado a si mesmo como defensor do islã.
Em dezembro de 1260, uma força de 6000 retornou à Síria sob o
comando de Baidar. Essa força foi derrotada pelas guarnições combinadas de
Homs, Hama e Alepo, com a ajuda de uma neblina densa e do oportuno
flanqueamento dos beduínos locais. Hugalu passou os anos seguintes lutando
contra Berke Khan da Horda Dourada, pelo território do Azerbaijão. Em
fevereiro de 1265, Hugalu foi sucedido por Abaqa, que foi distraído por esses
ataques no Azerbaijão e esqueceu a necessidade de organizar o novo império.
Baibars usou esse período para se concentrar nas isoladas fortalezas cruzadas
que ainda restavam na Terra Santa. Hugalu e seus sucessores chegaram a
enviar cartas para os reis e papas da Europa para convocar uma nova cruzada
e juntos eles derrotaram os muçulmanos. Abaqa chegou a enviar um exército
sob o comando de Samagar para auxiliar Eduardo I na Nona Cruzada (1271-
1272), mas essa força se retirou com a chegada de Baibars. Mu´in al-Din
Sulaiman, mais conhecido como Pervane, era uma figura dominante no
remanescente do sultanato de Rum na Turquia, e atuava como cogovernador
ao lado de Samagar. Mas quando Abaqa nomeou seu irmão mais novo, Ejei,
Pervane se irritou com a sobrecarga e supervisão financeira e solicitou que
Abaqa tirasse seu irmão, alegando que este estava cooperando com Baibars.
Abaqa prometeu que faria isso, mas postergou a situação. Então Pervane entra
em contato com Baibars, mas a resposta só chegou em 1274, quando Ejei e
Abaqa foram substituídos por Toqa Noyan.
Sob Toqa Noyan, a pressão mongol sob a Anatólia era ainda maior, e os
poderes de Pervane eram limitados. Em novembro de 1275, os mongóis
sitiaram al-Bira, mas Baibars já estava sabendo e venceu os mongóis. Ao
mesmo tempo, com ou sem a ajuda de Pervane, um grupo de emires seljúcidas
se encontraram com Baibars em julho de 1276 o instigou a atacar. Julgando
que havia suporte o suficiente em Rum para ele, Baibars concordou e
mobilizou seu exército no inverno de 1276, partindo em fevereiro de 1277.
Quando Baibars percorreu a costa do Levante, Pervane perdeu o controle de
Rum, com vários turcos se rebelando, e com isso um novo exército mongol sob
Tudawan reprimiu os emires que tinham contactado Baibars. Na Síria, ele
enviou uma força diversionária partindo de Alepo para o Eufrates, enquanto
seu exército principal entrou na Anatólia no final de abril. Depois de repelir uma
força mongol de 3000 no Monte Tauro, Baibars recebeu notícias de que
Tudawan estava acampando perto, numa planície próxima à cidade de
Elbistan. Ele partiu para enfrentá-los e os exércitos se encontraram em 15 de
abril de 1277.

O exército de Tudawan tinha cerca de 14.000 soldados, e um exército de


tamanho semelhante sob o comando de Pervane estava estacionado por perto,
mas Tudawan desconfiava deles e os manteve longe de suas linhas. Os
confrontos começaram e a situação estava crítica para os mamelucos, e
Baibars abriu espaço às suas reservas, a guarnição de Hama, para reforçar a
sua esquerda, e conseguiu empurrar os mongóis de volta. Com grande esforço,
os mamelucos os derrotaram e mataram seus comandantes. No dia seguinte,
Baibars marchou até Caiseri, chegando em 20 de abril. Baibars ordenou que os
seljúcidas e Pervane o apoiassem, mas Pervane ficou em seu castelo. Mas 5
dias depois de Baibars chegar em Caiseri, ele voltou para suas terras para
proteger suas tropas de Abaqa, que chegou tarde demais. No entanto, Abaqa
capturou Pervane e o matou.

No entanto, o grande Baibars morreu em julho de 1277, e seus filhos


foram depostos do trono, e um de seus mamelucos, Qalawun, se tornou sultão
em novembro de 1279. Abaqa lançou uma expedição à Síria em novembro de
1280 comandada por seu irmão Möngke Timur, apoiada por um contigente de
cavaleiros hospitalários e dos vassalos do Ilcanato: rei Leão III da Cilícia
armênia e Beomundo VII de Trípoli. Em setembro de 1281, Möngke Timur
retornou com 40 ou 50.000 mongóis e armênios sob Leão III, georgianos,
francos e tropas seljúcidas. Abaqa vinha com outro exército, mas um ataque da
Horda Dourada fez ele retornar. E Qalawun consegue uma vitória arrasadora
contra os mongóis em 1281 em Homs. Um ano depois, Abaqa morre, e seus
sucessores tiveram reinados breves até 1295, além de lutas internas e novos
ataques da Horda Dourada.

Com o assassinato do sultão al-Calil em 1293, os mamelucos entraram


num período de instabilidade política. Em comparação, em 1295, o poderoso
Gazã Khan assumiu o Ilcanato. Gazã não foi o primeiro ilkan muçulmano, mas
no seu reinado a maioria dos mongóis dentro do Ilcanato se converteu e tornou
o país em islâmico. Diante das perseguições empreendidas pelos ilcãs
posteriores a Hulagu, a maioria muçulmana foi oprimida diante dos
imperadores budistas, os quais encorajaram o florescer do nestorianismo e
do budismo tibetano. No entanto, com a conversão de Gazã ao islã, a religião
ascendeu mais uma vez, e desta vez budistas e cristãos passaram a ser
perseguidos. No entanto, o Ilcanato e os mamelucos ainda eram inimigos,
apesar de ter agora a mesma religião. No verão de 1299, uma incursão
mameluca no Ilcanato saqueou Mardin, profanando uma mesquita durante o
Ramadã. Gazã então facilmente obteve uma fatva contra os mamelucos por
causa disso, se apresentando como um santo guerreiro que veio vingar as
atrocidades contra os muçulmanos. Em dezembro de 1299, Gazã e seu
exército de mongóis, georgianos e armênios sob seu rei Hetum II haviam
cruzado o Eufrates em direção a território mameluco.

Novamente em Homs, Gazã optou por flanquear os mamelucos


cruzando o deserto sírio e emergindo um riacho a cerca de 16 Km ao norte da
cidade. Agora os mamelucos foram forçados a cruzar o deserto, se esgotando
para alcançar Gazã na manhã seguinte. Em 23 de dezembro de 1299, a
batalha começa e os mamelucos acabam perdendo e fugindo. Homs se rendeu
sem lutar e Gazã se apossou do tesouro do sultão. Depois Gazã marchou até
Damasco, que também se rendeu sem lutar, embora sua cidadela tenha
resistido. Parece que quase toda a guarnição mameluca tinha se retirado da
Síria, talvez chamada para defender a capital. Grupos mongóis estavam indo
até Gaza e uma fonte narra que inclusive eles entraram em Jerusalém. No
entanto, em 5 de fevereiro de 1300, Gazã se retirou de Damasco e retornou ao
Ilcanato, deixando o general Qutlugh-Shah na cidade, mas que logo o seguiu.
Até o fim de maio, os mamelucos retomaram a Síria.

Em dezembro de 1300, Gazã cruzou o Eufrates novamente, chegando


até Alepo, mas pesadas chuvas tornaram as operações militares
insustentáveis. Em 1303, Gazã ordenou que Qutlugh-Shah voltasse à Síria,
mas ele foi derrotado em Marj al-Suffar, perto de Damasco, em abril. Gazã
morreu no ano seguinte e seu irmão e sucessor, Öljeitü, ordenou o último
ataque do Ilcanato contra o sultanato, um esforço vexatório no inverno de 1312,
em que o exército recuou não diante dos mamelucos do rei, mas diante da dura
resistência dos cidadãos comuns. O filho de Öljeitü, Abu Said, por fim
organizou a paz com os mamelucos no início dos anos 1320, mas o Ilcanato
sobreviveu por menos tempo que o tratado. A morte de Abu Said em 1335 sem
um herdeiro fez com que o Ilcanato fosse fragmentado por comandantes
regionais: os jalairidas, os chupanidas, os muzafáridas, injuídas, entre outros
que indicavam seus Khans fantoches. No entanto, os mamelucos não puderam
tirar vantagem disso porque quando al-Nasir Mohammad morre em 1341, eles
entram em seu próprio período de anarquia. Na Anatólia, o colapso do Ilcanato
fez com que a península ficasse sob o governo de pequenos beilhiques,
incluindo um governado pelo senhor da guerra Orcano Gazi, a semente da qual
o poderoso Império Otomano surgiria. Todos esses pequenos estados
beilhiques, logo seriam afetados por uma nova investida oriunda do
fragmentado Ilcanato: Timur (ou Tarmerlão).

Nas grandes cidades do Ilcanato e da Horda Dourada, a maioria da


população era muçulmana, e em geral os mongóis não perseguiam pela
religião. Além disso, artesãos, administradores e curandeiros islâmicos se
espalharam rapidamente pelo Império Mongol, acompanhando cada Khan e
Noyan em campanhas e em seus acampamentos. Em pouco tempo, eles
comandavam exércitos, muitas vezes de suas próprias forças locais, para lutar
pelos Khans. No reinado de Ogedai, muçulmanos eram muitos dos membros
de mais alto escalão da burocracia. A presença de muitos juristas islâmicos nas
cortes de Chinggisid é bem atestada, e um comerciante com habilidade fiscal
poderia ser ricamente recompensado em arranjos lucrativos com os príncipes
mongóis. Os Khans do Ilkanato gastavam bastante dinheiro financiando
alquimistas muçulmanos que afirmavam ser capazes de produzir ouro ou
prolongar a vida. Os astrólogos que podiam determinar o futuro também
recebiam grandes recompensas. Mesmo depois de se converter ao islã, muitos
mongóis continuavam comungando com seus xamãs. O exemplo mais extremo
da abordagem flexível dos mongóis é o caso de Oljeitu, irmão de Gazã. Ele se
batizou como um cristão nestoriano assumindo o nome de Nicolau; depois na
adolescência se tornou budista e assumiu o nome de Oljeitu; sob a influência
da sua esposa se converteu ao islamismo sunita e se tornou Muhammad
Khudabanda; primeiro da escola sunita do hanafismo, mudou para a shafi
´ismo; depois voltou pro budismo; por fim em 1309 escolheu o islamismo xiita.
Em alguns relatos falam que ele voltou para o islã sunita antes de sua morte
em 1316.

A conversão dos mongóis e seus servos começaram na década de


1240, e talvez o mais famoso convertido seja Berke Khan, conhecido pela
guerra contra Hulegu pelo Cáucaso. Após o reinado de Gazã (1295-1304), o
Ilcanato é considerado um Estado Islâmico, e em 1326, o canato de Chagatai
já pode também ser considerado um. O primeiro governante muçulmano da
Horda Dourada foi Töde-Möngke (1280-1287), e em 1313 Özbeg Khan (1313-
1341) se converteu para ganhar apoio dos noyans influentes dentro da Horda.
No entanto, Özbeg ordenou a execução de mais de uma centena de príncipes
e noyans Chinggisid, maiores do que expurgos realizados por outros
convertidos como Gazã. Os esforços violentos de Özbeg conseguiram tornar
permanentemente os Jochids muçulmanos. Ainda assim, Özbeg, Gazã e
Oljeitu forneceram isenções de impostos, favores e outros privilégios aos
cristãos, especialmente missionários franciscanos, embora em menor escala
que no início do século XIII. Seus sucessores, Janibeg, filho de Özbeg, e Abu
Sa´id, filho de Oljeitu, mostraram ser menos acolhedores, pois até cristãos
viram seus privilégios serem revogados. É importante essa conversão de
Özbeg, porque é o que vai fazer com que os russos dominados pelo Horda
Dourada começem a resistir mais fortemente, até resultar na Batalha de
Kulikovo em 1380, onde uma coalizão de vários principados russos vencem a
Horda Dourada, numa espécie de Batalha dos Guararapes russa,
pavimentando o caminho para a independência que chegaria em 1480 no
reinado de Ivã III (1462-1505). A Horda Dourada seria desintegrada em 1502 e
os três canatos tártaros remanescentes, Cazã e Astracã ao longo do rio Volga,
e o Canato da Sibéria, no sul da Sibéria, seriam anexados à Rússia por Ivã IV,
o Terrível (1547-1584).

A peste negra atingiu todo o mundo conhecido e sendo a maior


pandemia da história, matou cerca de 40% da população global, matando mais
de 100 milhões de pessoas. Com o mundo islâmico não foi diferente, e se tinha
40 milhões de pessoas no mundo islâmico em 1320, em 1349 esse número foi
reduzido para 30 milhões, matando 25%. No entanto, a Europa foi um pouco
mais atingida, tendo 79 milhões de pessoas em 1346, e a população reduzida
para 52 milhões em 1353, matando 35% dos europeus. Em outros lugares
como a China, a população era de 75 milhões em 1331, e foi reduzida para 50
milhões em 1353, matando 34% da população chinesa.

Por volta de 1300, o enfraquecido Império Bizantino havia perdido a


maioria de suas províncias na Anatólia para dez beilhiques. Um desses
beilhiques eram liderados por Osmã I, filho de Ertogrul, da região de Esquiceir
na Anatólia Ocidental ou noroeste da Turquia. Durante seu reino como sultão,
Osmã estendeu as fronteiras otomanas até a fronteira do Império Bizantino e
estabeleceu um governo formal e cujas instituições iriam mudar drasticamente
a vida por todo o império. O governo usou a entidade legal conhecida
como millet, na qual minorias étnicas e religiosas podiam lidar com seus
assuntos independente de um poder central. No entanto, vamos detalhar
melhor esse sistema quando estivermos falando do Império Otomano já
formado.

Em 1302, Osmã derrotou o exército bizantino próximo de Nicéia. Seu


filho, Orcano I capturou a cidade de Bursa em 1324 e a tornou capital do
Estado otomano. A queda de Bursa em mãos otomanas significou o fim do
domínio bizantino no noroeste da Anatólia. Nicéia e Nicomédia caem por suas
tropas em 1331 e 1337, respectivamente. Em 1354, aproveitando que as
muralhas de Galípoli foram destruídas por um terremoto, os otomanos
finalmente cruzam para a Europa e tomam a cidade, e em 1365,
Constantinopla, a cidade mais protegida da Idade Média já estava cercada por
eles. Na próxima década, Adrianópolis, Povlov e Comotini foram conquistadas
pelos Otomanos e o novo líder Murade I mudou a capital otomana para
Adrianópolis.

O poderoso Império da Sérvia abrangia boa parte dos Balcãs e o norte


da Grécia, acima do Peloponeso. Em 1371, o rei sérvio Blucasino Demétrio
tentou tomar Adrianópolis e expulsar os Otomanos da Europa, aproveitando
que a maioria das forças muçulmanas estavam na Turquia. Com cerca de
35.000 tropas sob seu comando, ele se move para o vale do rio Maritsa, e
como nenhuma força significativa estava nessa área, o rei sérvio não enviou
batedores à frente e seu acampamento ficou praticamente desprotegido. Um
pequeno exército otomano de 1000 ou mais cavaleiros ataca seu
acampamento durante a noite e milhares de sérvios foram mortos enquanto
dormiam e muitos se afogaram no rio Maritsa durante o caos. O rei, seus
irmãos, e muitos aristocratas morrem nessa batalha, que destruiu o Império
Sérvio. Quase todos os aristocratas sérvios e búlgaros se tornaram vassalos de
Murade, entre eles, o príncipe da Sérvia Morávia, Lázaro. Apesar disso,
quando a maioria do exército muçulmano se moveu para a Anatólia Central,
Lázaro se rebelou ao lado de muitos outros senhores feudais. Suas tropas
derrotaram um pequeno exército em 1386 na Batalha de Plochnik e
empurraram os otomanos para fora do sul sérvio. Isso aumentou muito o
prestígio de Lázaro e ele conseguiu fazer uma grande aliança de sérvios,
búlgaros, bósnios e albaneses. Até alguns aristocratas boêmios e húngaros se
juntaram a seu exército, mas dessa vez ele enfrentaria o melhor que os
otomanos podiam oferecer.

A importante cidade de Tessalônica foi conquistada pelos venezianos


em 1387, e a vitória turca na batalha de Kosovo em 1389, marcando o fim do
poder sérvio na região e abrindo espaço para a expansão otomana na Europa.
No entanto, ambos os lados perderam muita forças nessa batalha, com Lázaro
e Murade I morrendo. As tropas dos otomanos consistiam de um número
significativo de cavalaria ligeira chamada Akindji, que era armada com arcos
compostos, machados e maças, e era usada geralmente para flanquear. A
cavalaria regular era chamada de Sipahi, era de cavalaria mais pesada com
lanças e arcos. A infantaria irregular era representada pelos Assapes, que
carregavam arcos, alabardas ou outras armas de haste longa. Os sultões
otomanos também começaram a prática de escravizar membros de povos
cristãos (geralmente crianças) para formar os Janízaros, unidades de elite. Os
otomanos também tinham canhões primordiais a ser serviço.

O novo sultão Bajazeto I se casou com a filha de Lázaro, Oliveira


Despina, e seu filho Estevão I se tornou vassalo. O sultão tentou conquistar o
sudeste da Anatólia, e Mircea I da Valáquia junto com Sigismundo I, sacro
imperador e rei da Hungria, aproveitou isso para ocupar a cidade estratégia de
Nicópolis em 1392 e também restauraram o domínio do principado búlgaro em
Trnavua. No entanto, em 1393 Bajazeto recuperou a maior parte das terras
perdidas e começou a atacar a Valáquia e Nicópolis foi recuperada logo depois.
Em 1395, Mircea derrotou Bayezid na batalha de Ravena, mas ele sabia que
precisava de mais forças para deter os otomanos e então clamou por uma
Cruzada. Inglaterra e França fizeram uma trégua da Guerra dos Cem Anos
(1337-1453) para ajudar os húngaros e valáquianos, e mesmo tendo o Cisma
do Papado de Avinhão, os dois papas apoiaram a Cruzada.

Em 1396 ocorre a batalha de Nicópolis, amplamente considerada como


a última cruzada em larga escala da Idade Média, visto que quase toda a
Europa foi para lutar contra os otomanos. Os países que participavam enviando
tropas foram: Hungria, Sacro Império Romano Germânico, França, Valáquia,
Polônia, Inglaterra, a Antiga Confederação Helvética (Suiça), República de
Gênova, República de Veneza, Ordem Teutônica e Ordem dos Hospitalários.
No início, os cruzados conseguiram inflingir pesadas perdas aos otomanos,
mas depois o jogo virou e essa foi uma vitória decisiva otomana. Atrocidades
foram cometidas por ambos os lados, e os católicos mataram ortodoxos e
muçulmanos no caminho, e o sultão executou milhares de cruzados,
escravizou a maioria e poucos puderam comprar sua liberdade pagando um
resgate. Isso mostra já a decadência dos dois lados, que mesmo sendo
inimigos mortais, antes tinham um certo respeito um pelo outro em batalha,
como Ricardo Coração de Leão e Saladino.
(Batalha de Nicópolis em 1396)

Com a extensão do domínio turco nos Bálcãs, a estratégica conquista de


Constantinopla tornou-se um objetivo fundamental. O império controlou quase
todas as terras ex-bizantinas que circundavam a cidade, mas os bizantinos
foram temporariamente aliviados quando Tamerlão invadiu a Anatólia
na Batalha de Ancara em 1402, prendendo o sultão Bajazeto I, o que gerou
caos entre os turcos, que entraram em guerra civil até 1413. Em 1370,
Tamerlão controlava grande parte da Ásia Central e começou a planejar sua
invasão. Em 1381, ele começa a conquista do Irã, que foi ocupado em 1386.
Qualquer cidade que ousasse resistir a ele era reduzida a cinzas e sua
população era massacrada ou escravizada. Entre 1391 e 1395, Tokhtamysh da
Horda Dourada foi derrotado por Tamerlão e perdeu o controle do Cáucaso.
Em 1398 e 1399 o sultão Bajazeto I tomou o controle dos pequenos Beilhiques
que sobravam no leste da Turquia, e agora o domíno otomano fazia fronteira
com o de Tamerlão. Alguns dominados do Irã fugiu para os domínios
otomanos, enquanto outros dominados dos Beilhiques do leste da Turquia
fugiram para o domínio de Tamerlão. Apesar disso, os dois não queriam
guerrar porque ambos eram poderosos, e então uma longa correspondência de
cartas começou entre os dois. Uma das cartas de Tamerlão dizia: “Seja sábio e
se arrependa, evite nossa vingança. Você não é nada mais que uma formiga,
não provoque os elefantes ou você será pisoteado.”. E Bajazeto respondeu:
“Se eu fugir de seus exércitos, todas as minhas esposas se divorciarão de
mim, mas se você ousa fugir de mim todas as suas esposas pertencerão a
outro homem.”.

Essa troca de insultos de nada adiantou e em 1400 Tamerlão conquista


a Armênia e Geórgia e milhares foram massacrados. Tamerlão tinha medo que
o Sultanato do Egito se aliasse aos Otomanos, e então ele saqueou Damasco
e Alepo nos próximos dois anos para tomar o controle da rota terrestre entre o
Sultanato e os Otomanos. No final de 1401, Tamerlão tomou Sivas dos
Otomanos e a transformou em sua base, e esse foi o começo da guerra.
Quando Tamerlão sitiou Ancara, Bajazeto aumentou o cerco de Constantinopla
e moveu suas tropas para a Anatólia, chegando na cidade em junho de 1402.
Tamerlão recuou para atrair e tirar Bajazeto de sua posição defensiva. Então
Bajazeto vai atrás de Tamerlão, mas este vai para sudoeste e toma Kayseri,
enquanto Bajazeto ainda tinha certeza que acharia seu inimigo no norte. Então
Tamerlão marchou até Ancara e começou a sitiar a cidade, e Bajazeto teve que
voltar para a cidade com suas tropas cansadas. Quando a batalha começou
em 20 de julho de 1402, o exército de Tamerlão venceu tendo 40.000 baixas do
seu exército de 140.000, enquanto Bajazeto foi capturado e seu exército de
85.000 homens teve 40.000 baixas, além de feridos ou capturados. Isso gerou
caos no Império Otomano, com os sucessores de Bajazeto lutando entre si
pela sucessão até 1413.

Durante a guerra civil, o filho mais velho de Bajazeto, Suleiman fugiu


para a Europa, usando navios de Gênova e Veneza. Tamerlão perseguiu ele
até a costa, mas como ele não tinha uma marinha, não podia cruzar para a
Europa, e então ele decide punir os cristãos que transportaram Suleiman,
capturando a fortaleza de Esmirna e executando a guarnição Hospitalária.
Tamerlão restaurou os beilhiques no sul e oeste da Anatólia, mas ele teve que
ir para o Iraque porque seus inimigos tomaram Bagdá. Suleiman conseguiu
assumir o controle do mercado europeu, mas suas forças ainda estavam fracas
e a Sérvia Morávia conseguiram a independência. Em 1403, Suleiman decide
que ele precisa negociar com os reinos cristãos vizinhos, e o tratado de Galípoli
firmou a paz entre Suleiman e os Hospitalários, Veneza, Gênova e o Império
Bizantino. Os gregos pararam de parar tributos e receberam várias áreas
costeiras nos Balcãs. Os bizantinos conseguiram recuperar alguns poucos
territórios na Grécia, como a cidade de Tessalônica e a região em volta, e
regiões no Peloponeso. As regiões de Tessalônica, incluindo a própria cidade,
seriam perdidas novamente em 1423 e 1430, deixando o Império Bizantino
novamente apenas com a cidade de Constantinopla, o Peloponeso e algumas
ilhas pequenas no mar Egeu.

O outro filho de Bajazeto, Musa, tomou o controle de Bursa e as terras


próximas como um vassalo de Tamerlão. Outro príncipe, Maomé I, foi
concedido Amasya como seu domínio por Tamerlão. No entanto, outro filho de
Bajazeto, Isa, se juntou à luta e atacou Musa e consegue derrotar seu irmão
em 1403. Musa encontrou refúgio na corte de Maomé I, que se rebelou contra
Isa e o espancou na batalha de Ulubad e tomou Bursa. Em 1404, Suleiman
lança sua invasão à Anatólia e inicialmente foi bem-sucedido. Ele conquistou
Bursa e depois Ancara, mas não conseguiu tomar Amasya e em 1409, Maomé
I enviou Musa com um grande exército para atacar os domínios europeus de
Suleiman, o que o obrigou a voltar para a Europa. Em 1410, Suleiman derrota
Musa na batalha de Kosmidon, mas as tropas não estavam felizes com
Suleiman e em 1411 ela desertaram para Musa, que matou Suleiman e se
tornou o governante dos Balcãs. Musa se rebelou contra Maomé I e em 1412,
sitia mais uma vez Constantinopla já que o imperador Manuel II Paleólogo era
aliado de Suleiman. Manuel II pediu ajuda de Maomé I e o príncipe otomano
cruzou até a Europa e ajudou o imperador na defesa da cidade. Finalmente,
Musa foi repelido e em 1413, Stefan Lazarevic e Manuel II apoiam Maomé I na
batalha de Camlru. Musa foi executado e a guerra civil chegou a seu fim, com
Maomé I, o Cavalheiro sendo o novo sultão.

Na década seguinte, Maomé I reconquistou alguns territórios perdidos


na Anatólia e tomou parte da Albânia. Seu filho, Murade II, começou seu
reinado em 1421 com uma rebelião. Mais um filho de Bajazeto apareceu,
Mustafa, e como era apoiado pelos bizantinos, conseguiu tomar o controle de
Europa e de declarar sultão. No entanto, seu ataque à Anatólia falhou e ele foi
morto no mesmo ano. Murade II continuou o cerco a Constantinopla, mas outra
rebelião, desta vez liderada por seu irmão mais novo Mustafa, e apoiada pelos
beilhiques turcos restantes, forçou ele a voltar para a Anatólia. O sultão
sufocou a revolta e anexou alguns dos beilhiques. Em 1424, Murade II forçou
os bizantinos a devolverem os territórios cedidos a eles e começar a pagar
tributo mais uma vez. Além disso, ele forçou o senhor albanês Gjon Kastrioti a
aceitar sua suserania. Uma série de ataques foram conduzidos na Croácia e na
Romênia atuais e ele também tomou mais terras na Anatólia. Stefan Lazarevic
morre em 1427, e os otomanos e húngaros começam a lutar pelo território da
Sérvia Morávia. Ocorre a batalha de Golubac, e partes da Sérvia são
devastadas mas a região ficou como um estado tampão entre húngaros e
otomanos, sob o comando de Durad Brankovic.

A praga de 1428-29 surpreendeu o movimento otomano, mas em 1430 a


conquista foi iniciada. Estratégicas demais, Tessalônica e Iona foram
ocupadas. No final de 1439, Murade II invadiu a Sérvia Morávia e a tomou
completamente. Após um período de incerteza, o rei Ladislau III da Polônia foi
coroado rei da Hungria. Alianças começaram a se formar em torno de Ladislau
e ele foi apoiado pela Igreja, e Ladilau e seu comandante John Hunyadi
conseguiram ganhar algumas batalhas contra os otomanos em 1441 e 1442.
No começo de 1443, o papa Eugênio IV convoca uma Cruzada e Ladislau III foi
acompanhado por Durad Brankovic da Valáquia e rei da Sérvia, também
chamado de Jorge I Brankovic, além de Mircea II e Fruzhin, príncipe da
Bulgária. Eles tinham 40.000 tropas e juntos se voltaram contra Nish. A
fortaleza foi sitiada e depois conquistada e três exércitos otomanos que
chegaram à região foram derrotados. Um lorde albanês conhecido como
George Castriot, mais tarde conhecido como Skanderbeg, desertou dos
Otomanos e resistiria a eles pelas próximas três décadas. Apesar da derrota
em Nish, os otomanos tinham um exército próximo e dessa vez sob o comando
de Murade II. Os cruzados se aproximam de sua posição em Zlatitsa, mas são
derrotados. Felizmente para os cruzados, no começo de 1444, eles
conseguiram vencer uma batalha contra um pequeno exército otomano que os
perseguia em Kunovica. Ambos os lados estavam exaustos e embora os
emissários papais fossem contra, uma paz provisória foi firmada. A Sérvia
devia ser restaurada como um estado tampão e os otomanos deviam pagar
uma indenização de guerra e a Hungria prometia não cruzar o Danúbio.

Os otomanos aproveitaram a paz para pacificar novamente a Anatólia, e


Murade II abdicou do seu trono para seu filho Maomé II, o Conquistador. Na
Europa, os senhores otomanos locais tentaram montar um ataque punitivo
contra Skanderbeg em junho de 1444, mas o último os superou na batalha de
Torvioll e os otomanos perderam pelo menos 10.000 soldados. Então Ladislau
III quebrou a paz e reiniciou a sua cruzada, e como Maomé II tinha apenas 12
anos, ele exigiu que se pai voltasse ao trono, por vontade própria ou
influenciado por seus conselheiros. O exército cruzado estava se movendo em
direção ao Mar Negro, já que o apoio da marinha veneziana e genovesa era
esperado. Nicópolis foi tomada e em 8 de novembro os cruzados chegam perto
de Varna. Murade II de fato assumiu o controle do exército e se aproximou de
Varna no dia seguinte. Os cruzados agora estavam bloqueados e tiveram que
lutar, e a famosa batalha de Varna ocorreu em 10 de novembro de 1444. Os
historiadores modernos concluem que os dois exércitos tinham pelo menos
20.000 a 25.000 soldados. Ladislau foi morto por um dos guardas de Murade II
na batalha, e quase todo o exército cruzado foi perdido. Os cruzados perderam
mais uma batalha, apesar dos otomanos mais uma vez sofrerem pesadas
baixas.
(Vladislau III da Polônia, por Jan Matejko)

Em 1444 e 1445, o penúltimo imperador bizantino, João VIII Paleólogo,


lança uma invasão partindo do Peloponeso bizantino para os territórios de
Atenas e da Grécia Central. No entanto, esses ataques são repelidos pelos
otomanos e ele consegue manter apenas a região de Atenas e Boécia, mas
que ficarão até 1458 sob o domínio do estado remanescente do Despotado da
Moreia, que cairá em 1460.
Como Skanderbeg era um vassalo otomano que os traiu, Murade II
enviou três expedições punitivas contra ele de 1444 a 1448, mas todos os três
exércitos foram emboscados e derrotados por forças militares albanesas
maiores. Enquanto isso, o sultão estava preocupado com rebeliões menores no
interior do Império e com a campanha contra o Despotado da Moreia em 1446.
Durante a campanha na Grécia, Murade II forçou o governador de Moreia e o
futuro último imperador bizantino Constantino XI, a se tornar seu vassalo e
pagar tributos. Em 1448, Murade II obteve uma vitória menor contra
Skanderbeg na batalha de Svetigrad, mas perseguir as forças de guerrilha do
albanês era impossível, e então ele retornou a Edirne. Enquanto isso, Hunyadi
na Hungria estava preparando outra cruzada e em setembro de 1448 ele
levantou uma força de 30.000 homens e iniciou uma nova campanha. Ele
esperava que o déspota da Sérvia, Durad Brankovic se juntasse a ele, mas
como ele era um vassalo otomano, ele se recusou, então as terras sérvias
foram invadidas por Hunyadi. Murade II sabia disso e começou a mover seus
exércitos para impedir que Hunyadi e Skanderbeg se unissem. Parece que em
outubro, Hunyadi se deslocou para o campo do Kosovo para esperar por
Skanderbeg. Alguns afiram que Skanderbeg foi bloqueado por Durad, enquanto
outros dizem que as guarnições otomanas locais desaceleraram a força
albanesa. Mas em qualquer caso, em 17 de outrubro de 1448, o sultão e seus
50.000 soldados chegaram e começa a Primeira Batalha de Kosovo entre
Hunyadi e Murade II. Os cristãos perdem mais uma batalha, com Hunyadi
conseguindo fugir mas mais da metade de suas tropas foram mortas, enquanto
o sultão perdeu poucas tropas.

Skanderbeg continuou sua resistência e algumas campanhas contra ele


continuaram sendo derrotadas. Mas o foco dos otomanos, o caminho para
Constantinopla, agora estava aberto. Em 1451, Murade II morre e Maomé II, o
Conquistador assume o poder. Constantinopla não era mais o que já foi em seu
ápice, com 500.000 habitantes, e agora possuia apenas algo entre 50.000 e
100.000. O último imperador bizantino, Constantino XI, agora controlava
apenas um pequeno território ao longo da costa, e tinha que pagar tributos ao
sultão otomano. Maomé II assinou tratados com Veneza, Gênova e Hungria,
para garantir que eles não o atacassem. Uma nova rebelião dos Caramânidas
judeus na Anatólia permitiu que ele consolidasse o poder na região.
Constantino XI ameaçava parar de pagar tributos ao sultão, e ameaçou apoiar
o primo de Maomé II, Orhan, para reivindicar o trono otomano. Isso deu
margem para os otomanos esquecerem seu tratado e começarem a se
preparar para uma guerra.

Em abril de 1452, Maomé II deu ordens para construir uma fortaleza


chamada Rumelihisari, no extremo norte do Bósforo, para impedir que qualquer
navio pudesse auxiliar Constantinopla pelo Mar Negro. O forte foi terminado em
agosto, e Constantino XI não teve escolha senão começar a trazer seus súditos
para a cidade, armazenando suprimentos e enviando pedidos de ajuda para
outros estados europeus. Apenas um contigente de navios venezianos com
cerca de 1000 soldados mercenários liderado por Giovanni Giustiniani chegou
para ajudar, enquanto a maioria dos reis católicos ignorou o chamado. Os
otomanos tinham mais de 100.000 guerreiros, 69 canhões e 126 navios, contra
7000 soldados bizantinos profissionais, entre eles 500 otomanos do príncipe
Orhan, uma dúzia de canhões e 26 navios, e mais de 30.000 moradores foram
colocados em serviço. Um dos canhões otomanos era particularmente grande
e teria um papel icônico no cerco.

Cada seção da muralha seria comandada por um dos comandantes


italianos com Giustiniani como líder. Enquanto Constantino XI e sua guarda
estavam na reserva no palácio Blachernae. Os defensores repararam as
muralhas e uma corrente de ouro foi colocada no Corno de Ouro para impedir
que os otomanos atacassem a muralha pelo mar. A vanguarda do exército
otomano chegou na cidade em 1 de abril de 1453, e o sultão chegou à cidade
no dia 5 e começou a preparar para sitiá-la. Os gigantes canhões otomanos
estavam no local no dia 6 e começaram a explodir as Muralhas Teodosianas,
mas com pouco efeito. Os canhões eram tão grandes que precisavam de três
horas para recarregar e os bizantinos conseguiram recuperar o dano causado
às paredes. No dia 7, o sultão ordenou que sua infantaria leve e escaramuças
atacassem as muralhas, mas os defensores repeliram facilmente os invasores.
Infelizmente para os otomanos, seus canhões maiores foram perdidos no
acidente e seus menores não foram capazes de causar muito dano. Os
bizantinos tentaram algumas investidas nos dias 8 e 9, mas nenhum resultado
positivo foi alcançado. Os otomanos começaram a golpear a muralha no dia 11
e esse bombardeio continuou até o final do cerco. Nos dias 17 e 18, os
otomanos tentaram assaltos noturnos, mas os defensores resistiram. Na água,
os navios otomanos não conseguiram passar pela corrente e entrar no Chifre
de Ouro. No lado contrário, alguns navios venezianos chegaram e se juntaram
aos defensores no dia 20. O sultão precisava empregar uma nova estratégia.

Maomé II ordenou que seus navios fossem movidos por terra perto da
colônia genovesa de Pera. Então os navios foram colocados atrás da corrente
no Chifre de Ouro no dia 28. Constantino XI enviou seus navios de fogo grego
para se livrar rapidamente dessa ameaça, mas os defensores perderam essa
batalha. A partir de agora, Constantino XI teve que manter pelo menos parte de
suas forças no muro norte e isso enfraqueceu suas defesas na muralha
teodosiana. Alguns canhões bizantinos foram movidos para a área, mas eles
falharam em defender os navios aliados que tiveram que retornar aos portos e
sua tripulação se juntou à defesa. No dia 6 de maio, os canhões otomanos
conseguiram destruir os portões de São Romano e durante a noite, suas forças
quase violaram as defesas da área, mas Giustiniani chegou e afastou os
atacantes. No dia 11 de maio, o portão Caligariano foi danificado e os
otomanos se moveram em direção ao palácio Blachernae, mas o próprio
Constantino XI foi capaz de empurrá-los de volta. O sultão comandou um
ataque total no dia 29 de maio, com um bombardeio massivo, seguido por um
ataque leve de infantaria, mas apesar da desvantagem numérica, eles não
conseguiram tirar as muralhas de Giustiniani. A artilharia de Maomé II destruiu
parte dos portões perto dos portões de São Romano e 3000 janízaros foram
mandados para atacar essa posição. Os bizantinos foram capazes de se
defender mais uma vez, mas os janízaros tomaram uma das torres e
hastearam a bandeira otomana. Nesse ponto, Giustiniani foi gravemente ferido
levado das ameias. Esse foi um grande golpe para a moral dos defensores, e
quando algumas centenas de janízaros entraram na cidade perto dos portões
de São Romano, as defesas bizantinas caíram.

Cidadãos e defensoes tentaram embarcar nos navios e deixar a cidade.


Fontes dizem que Constantino XI e seus últimos guardas tentaram um contra-
ataque desesperado perto dos Portões de São Romano, mas ele foi morto em
batalha.

(queda de Constantinopla em 1453)


(Sultão Maomé II, o Conquistador entra em Constantinopla, por Fausto
Zonaro (1854–1929))

Cerca de 4000 bizantinos morreram protegendo a cidade, enquanto as


baixas otomanos são desconhecidas, mas acredita-se que foram pesadas
devido a várias tentativas fracassadas. Os bizantinos foram ajudados um pouco
por Gênova, Veneza, Despotato Sérvio, Reino da Sicília e Estados Papais.
Lutaram ao lado de Constantino XI Paleólogo, Teófilo Paleólogo, primo do
imperador, Giovanni Giustiniani Longo, de Gênova, o cardeal Isidoro de Kiev,
bizantino defensor da reunificação da Igreja Católica e da Igreja Ortodoxa, e
por fim, Francisco de Toledo do reino de Castela. A queda de Constantinopla é
a data comumente usada para se referir ao fim da Idade Média, mas apesar
disso, os estados remanescentes de Moreia, Trebizonda, Teodoro na Criméia,
e Epiro, caíram respectivamente em 1460, 1461, 1475 e 1479.

A queda de Constantinopla chocou a Cristandade medieval, e suas


principais consequências foram o fechamento das rotas comerciais no Oriente,
o que dará início às Grandes Navegações, e a origem do conflito entre russos e
turcos, que durará por um bom tempo ainda, já que os dois povos clamaram
ser os sucessores do Bizâncio, como Terceira Roma. Ivã III se casou com Sofia
Paleóloga em 1472, que era sobrinha de Constantino XI e filha de Tomás
Paleólogo, que governou o Despotado da Moreia até sua queda em 1460. Com
isso, Ivã IV em 1547 será coroado Czar (César) de toda a Rússia, dando
continuidade ao legado bizantino, já que os russos eram cristãos ortodoxos
desde o batismo de Vladimir de Kiev em 980. Mas os Otomanos também
alegaram ser a Terceira Roma, já que  Maomé II assumiu o título de Kayser-i
Rûm ("César de Roma"). Isso vai levar os russos a brigarem com os otomanos
por séculos, porque além deles disputarem o título de sucessor de Bizâncio, os
russos também vão alegar que eles são os protetores dos cristãos ortodoxos
dentro do Império Otomano.
O Império Otomano na Idade Moderna (1453-1922)

De 1453 a 1455, o governante da Sérvia, Joraj Brankovic, não pagou


tributo nem ajudou no cerco de Constantinopla. Então Maomé II iniciou uma
campanha punitiva contra ele em 1454, com 30.000 soldados fortes e não
encontrou nenhuma resistência na Sérvia. Então a capital Smederevo foi
sitiada, e o governador da Transilvânia e o comandante do exército húngaro
John Hunyadi tinham também cerca de 30.000 homens e forçou o sultão a
levantar o cerco. Maomé deixou um exército na área, com ordens para evitar a
batalha, e ele retornou para Constantinopla para reunir mais forças. Hunyadi
reuniu suas forças com Jorad e em outubro conseguiu coagir as forças
otomanas na batalha perto de Krucevac, onde obteve uma vitória decisiva.
Como não havia ninguém para interceptá-lo, Hunyadi se moveu para terras
otomanos e saqueou Vidin, e depois retornou para sua base de operações em
Belgrado.

Então em junho de 1456, as forças de Maomé II chegam em Belgrado,


uma das cidades mais fortificadas da Europa até então. A cidade tinha 7000
soldados fortes sérvios e húngaros liderados por Laszlo, filho de Hunyadi, e
seu genro Michael. Enquanto isso, os otomanos tinham entre 50.000 e 100.000
combatentes. Os otomanos começaram a bombardear as muralhas da cidade
em 29 de junho, e bloquearam o rio Danúbio, que passava atrás da cidade.
Hunyadi chegou com 50.000 tropas, mas apenas de 10.000 a 15.000 eram
profissionais. Os húngaros também tinham uma marinha de 200 navios, que
chegaram em 14 de julho. Os navios otomanos foram pegos de surpresa e os
navios húngaros afundaram vários navios pesados deles e capturaram até 30
navios menores. Hunyadi se moveu para a cidade com algumas de suas tropas
e suprimentos e alimentos, e os otomanos continuaram o cerco. Em 21 de
julho, parte das muralhas foi destruída e o sultão enviou seus janízaros para a
cidade e os defensores foram esmagados no portão. No entanto, um incêndio
começou na área e impediu a entrada de mais forças otomanas. Os 5000
janízaros estavam presos dentro da cidade, e não tinham escolha senão
vencer. Eles quase conseguiram tomar uma torre no segundo andar das
muralhas da cidade, mas o plantel sérvio que defendia essa posição repeliu os
atacantes e a maioria dos janízaros dentro da cidade morreram.
O cerco tomou um rumo inesperado nos dias seguintes, e os
camponeses húngaros pobres decidiram saquear o campo otomano apesar de
não receber tal ordem. Muhammad Sabiha Al-Khafifa foi enviado para
responder a esse grupo, mas como eles estavam agora dentro do
acampamento, a cavalaria não tinha como empurrar os camponeses para trás.
Vendo isso, as forças de Hunyadi dentro da cidade se juntaram a esse ataque
improvisado. O enviado papal, João Capistrano, usou os navios para mover
alguns milhares de guerreiros atráves do rio Sava, e atacou o flanco esquerdo
do exército otomano. As forças do sultão estavam mal preparadas ou
frustadas, e parte fugiu em pânico. Mesmo Maomé II em si e seus janízaros
não conseguiram estabilizar a situação. O sultão foi ferido e teve de ser
carregado, e os muçulmanos perderam cerca de 20.000 soldados nesse cerco.

Hunyadi estava ansioso para perseguir seu inimigo, mas logo se iniciou
uma epidemia em seu acampamento e milhares morreram inclusive ele próprio.
No entanto, essa vitória fez com que eles retardassem o avanço muçulmano na
Europa por décadas. No entanto, os otomanos destruíram o Despotado da
Sérvia em 1457, e o rei da Bósnia foi forçado a pagar tributo. Em 1460, Maomé
II anexa o Principado da Moréia, um estado remanescente bizantino. O Império
de Trebizonda no nordeste da Turquia foi o próximo, e o imperador David
Comneno se rendeu quase imediatamente assim que Trebizonda foi sitiada em
1461.

Em 1462, o governante da Valáquia, o famoso Vlad III, o Empalador, se


recusou a pagar tributo, invadiu a Bulgária e matou mais de 20.000 turcos.
Então Maomé II respondeu liderando uma força de 100.000 soldados contra ele
no mesmo ano. Os valaquianos tinham cerca de 30.000 soldados e eles não
podiam vencer dos otomanos, então a campanha acabou com uma série de
emboscadas e escaramuças. A princípio, Vlad fez o seu melhor para impedir
que os otomanos desembarcassem em Vidin, e seus arqueiros mataram muitos
homens. Forçado a recuar, ele então usou táticas de terra arrasada. No início,
os otomanos montaram um acampamento perto de Targovisht (atual
Bucareste). Vlad entrou no acampamento do sultão durante a noite, para
encontrar a tenda de Maomé II. No final da noite, metade de seu exército
atacou o acampamento de um lado para chamar a atenção do inimigo,
enquanto ele liderou o resto em um segundo ataque por trás. Depois de matar
um pequeno grupo de aflitos, Vlad tenta assassinar o sultão, mas os janízaros
foram capazes de parar os valaquianos e Vlad perdeu 5000 homens nessa
batalha. Enquanto os otomanos perderam cerca de 20.000 homens, as
chances ainda eram maiores contra Vlad, que não pode fazer nada para
impedir a ocupação de Braila. Vlad pediu ajuda ao filho de John Hunyadi,
Matthew, que agora era rei da Hungria, mas Vlad foi preso.

(Pintura a óleo de Vlad Țepeș no Palácio de Ambras, Áustria, datada de 1560,


que alegadamente é uma cópia de um original pintado em vida)
Ao mesmo tempo, o rei bósnio Stephen II decidiu parar de pagar tributo.
Em 1463, a Bósnia foi anexada ao Império Otomano e perdeu sua
independência. Nesse ponto, a situação na Anatólia estava ficando volátil. Uma
outra dinastia turca, Ak Koenlu, estava ganhando poder no leste, e sua mera
existência fez muitos beilhiques turcos se rebelarem. O sultão Al Koenlu, Uzun
Hasan, era ambicioso e se casou com a filha do imperador de Trebizonda para
ganhar um aliado, mas ele não ajudou Trebizonda em 1461 porque estava
lutando contra os Timúridas. Uzun Hasan precisava de um porto que lhe
permitisse negociar com a Europa, e ele e Maomé II passam a disputar a
região dos Carâmidas, no sudoeste da Turquia. Em 1471, Maomé II envia sua
forças para assumir o controle da região, e Uzun fez uma aliança com Veneza,
que prometeu armas apoiadas por pólvora e o apoiou contra os otomanos. Em
1472, navios venezianos atacam Izmir enquanto 20.000 soldados de Uzun
invadem e atacam a região dos Carâmidas. No entanto, os navios venezianos
nunca chegam a Uzun, pois foram capturados pela marinha otomana. Ambos
os lados foram capazes de levantar entre 100.000 e 150.000 soldados, mas os
otomanos tinham armas e artilharia, e em agosto de 1473 eles se encontram.
Uzun vence inicialmente, mas 10 dias depois, Maomé II chegou com o resto de
seu exército em Otlukbeli, onde os otomanos com canhões e armas de fogo,
venceram o exército de Uzun, perdendo alguns milhares de homens, enquanto
as forças de Uzun perderam mais de 25.000. Depois dessa batalha, nenhum
outro poder iria desafiar os otomanos no leste nas próximas quatro décadas.

Em 1451, o príncipe da Moldávia, Bodgan II, foi assassinado pelo seu


irmão Peter, que se tornou o novo príncipe. O novo rei garantiu seu reino se
tornando vassalo de Casimiro IV, rei polonês, e ele também começou a pagar
tributos para os otomanos em 1456. No entanto, seu filho Stefan, foi apoiado
pelos líderes do exército húngaro John Hunyadi e Vlad III, que em 1457 invadiu
a Moldávia e derrotou Peter em Orbic e se tornou príncipe como Stefan III. Ele
fez reformas que domou o poder na nobreza e os servos se tornaram
arrendatários livres, sendo permitidos se juntar ao exército. Os militares foram
reforçados pela artilharia e novos castelos foram construídos. Stefan III
recebeu a cidade de Khotyn da Polônia, seja por diplomacia ou ação militar e
enquanto Peter estava em exílio, ele atacou a Transilvânia que estava sob
proteção húngara. Vlad III perdeu seu título para o vassalo otomano Radu em
1462. Stefan aproveitou essa situação para tomar a cidade de Chilia em 1465,
dando-lhe o controle do delta do Danúbio. Em 1466, Stefan apoiou a rebelião
anti-húngara na Transilvânia, que foi suprimida no final de 1467 pelo rei da
Hungria Matthias I. Além disso, Matthias invadiu a Moldávia com um exército
de 20.000 a 40.000 homens, mas em um lugar chamado Baia, Stefan e seus
15.000 soldados conseguiram derrotar os húngaros, matando mais de 10.000
soldados e ferindo Matthias. Stefan invadiu a Transilvânia algumas vezes mas
foi forçado a defender seu próprio reino. Em 1470, ele derrotou a Horda
Dourada em Lipnic, em uma batalha que foi uma das última ofensivas da Horda
Dourada. Um ano depois, seu rival Peter invadiu a Moldávia, mas foi derrotado
em Targu e executado. Outra invasão da Valáquia foi impedida em Soci em
1471, e foi nessa época que o relacionamento entre Stefan e Maomé II se
deteriorou.

Em 1471, os otomanos exigiram o retorno de Chilia aos valaquianos.


Stefan se recusou e em 1472 conspirou com Uzun Hasan contra os otomanos,
e usou a guerra dos dois a seu favor. Ele parou de pagar tributos, atacou a
Valáquia, derrotou Radu em Ramnicu Sarat e instalou Basarab III Laiotã no
trono. No final de 1473, Radu foi restaurado. Em 1464, Basarab III se tornou
príncipe novamente com a ajuda de Stefan. Maomé então emitiu um ultimato:
Stefan teve que prestar homenagem, devolver Chilia, e cessar os ataques
contra a Valáquia. Quando o príncipe se recusou, o sultão ordenou ao
governador da Rumelia, Hadim Suleiman Pasha, envolvido no cerco de
Skhoder controlado pelos venezianos, terminar a sua campanha e invadir a
Moldávia. Suleiman seguiu a ordem e chegou em Sófia em 1474 e 20.000
búlgaros se juntaram a ele. Basarab III mudou de lado e se juntou aos
otomanos com 15.000 tropas. Stefan então pede ajuda da Hungria, Polônia e
do papa, ficando com uma força final de 30.000 a 40.000 homens. Suleiman
cruzou o Danúbio em novembro de 1474, e em dezembro eles entram na
Moldávia. Stefan estava preparado e usou a tática de terra arrasada conta eles:
aldeias foram queimadas, poços envenenados, habitantes realocados.
Funcionou e ele continuou a intimidar os otomanos com suas táticas de bater e
correr.
Em 10 de janeiro de 1475, chegaram ao sul de Vaslui, com um nevoeiro
forte e neve caindo. Os otomanos ouviram tambores de guerra mais ao norte e
foram atrás achando que era todo o exército moldavo. O vale entrado pelos
otomanos eram muito estreito e inadequado para cargas de cavalaria.
Enquanto isso, as linhas de frente otomanas finalmente entraram em contato
com os moldavos, e a cavalaria leve de Stefan atacou os flancos, atraindo-os
para o vale. Eles deixaram os otomanos avançar, pressionado o exército
moldavo para trás. Chegou uma hora que os moldavos pararam em um ponto
designado e Stefan ordenou que seus escondidos arqueiros, artilheiros e
artilharia de fogo fossem com tudo pra cima dos otomanos. O tiro de canhão
moldavo acertou a ponte, retardando a chegada de reforços otomanos e os
valaquianos não cruzaram o rio. Enquanto isso, a infantaria moldava continuou
uma lenta retirada e Stefan enviou sua cavalaria para atrair a cavalaria
otomana para o vale onde ele armou sua armadilha. De repente, os tambores
de guerra moldavos começaram a ser ouvidos da floresta à esquerda das
linhas otomanas. Completamente expostos, os comandantes otomanos
entraram em pânico e Suleiman, tentou formar uma linha secundária contra a
ameaça à esquerda. Na direita, os moldavos lançaram seu ataque principal, e a
cavalaria pesada boiarda de Stefan apareceu e atacou a retaguarda do exército
otomano. Apesar de ainda terem números maiores, os otomanos pensaram
que estavam cercados pelos três lados e entraram em pânico. Eles tentaram
recuar, apenas para serem atropelados pela cavalaria da Moldávia. Essa
retirada continuou por três dias e as tropas de Stefan atacaram continuamente
as tropas de Suleiman. Fontes falam que Stefan perdeu 4.500 homens,
enquanto Suleiman perdeu 45.000. Stefan recebeu o título de Athleta Christi, o
Campeão de Cristo, título recebido do Papa.

Maomé II percebeu que teria que fazer o trabalho ele mesmo, e um ano
depois, ele marchou para a Moldávia com mais de 100.000 soldados, e seus
aliados do canato da Crimeia marcharam do leste e invadiram a Bessarábia.
Maomé tomou o importante castelo de Akkerman no Mar Negro, dando-lhes o
controle de todo o litoral da Moldávia. Stefan sabia que enfrentar Maomé II em
campo aberto seria suicídio, então ele continuou usando as táticas de guerra
de atrito e terra arrasada. No entanto, Maomé II não repetiu os erros de
Suleiman e marchou lentamente, e eventualmente o exército de 30.000
homens de Stefan teve que enfrentar o enorme exército otomano em Valea
Alba em 26 de julho de 1476. Não sabemos muitos detalhes dessa batalha,
mas sabemos que os moldavos aproveitaram do calor do verão para impedir o
avanço dos otomanos. A floresta onde os moldavos encontraram seus
oponentes foi incendiada e as tropas otomanas sofreram baixas, além dos
danos dos canhões e armas de fogo moldavas. No entanto, os otomanos os
superaram e em breve as barricadas de madeira feita pelos moldavos já era.
Stefan percebeu que esse seria um ponto importante da batalha e
desencadeou sua cavalaria forte de 4000 homens nas unidades do sultão.
Infelizmente para ele, essas forças foram empurradas para trás quando a
cavalaria otomana fez um contra-ataque e foi bem-sucedida. No entanto, esse
sucesso durou pouco, visto que Stefan escondeu 1000 cavaleiros na floresta e
eles atacaram a cavalaria otomana. Maomé II percebeu que ele teria que ir
com força total e sua presença fez com que os janízaros conseguissem destruir
os moldavos e perseguissem as tropas moldavas pela floresta densa. E no final
deste dia, começou uma era escura para a história da Romênia e Moldávia. No
entanto, isso não significaria a anexação da Moldávia pelos otomanos ainda.
Stefan recuou para a fronteira com a Polônia, recrutou um novo exército,
enquanto os otomanos falharam em tomar os castelos de Suceava e Neamt.
Eles começaram a sofrer de fome e surtos de peste, e também foram
perseguidos pela resistência local. E quando o comandante da Transilvânia,
Estêvão V começou a formar um novo exército com a ajuda de Vlad III, Maomé
II decide se retirar da Moldávia em agosto. No entanto, o príncipe moldavo fez
uma oferta de paz e começou a pagar tributo novamente.

Voltemos agora nossas atenções para a Albânia, onde tinha surgido o


grande herói da resistência George Kastrioti Skanderbeg. Em 1455,
Skanderbeg tentou tomar a cidade de Berat dos otomanos e sitiou a cidade.
Achando que não ia ser muito difícil, ele deixou para um subordinado seu
comandar o cerco. E um exército de 20.000 otomanos chegou e eles
reforçaram as defesas da cidade. Mesmo Skanderbeg voltando correndo para
a cidade e repelindo as forças de Evrenos, seu exército não tinha a capacidade
e nem a moral de continuar o cerco e tiveram que recuar. Depois do cerco de
Belgrado em 1456, quando Hunyadi venceu mas ele morreu, os otomanos
tiveram uma pausa na frente húngara, e então enviaram cerca de 65.000
soldados sob Evrenos para esmagar a Liga de Lezhe uma vez por todas.
Parentes e aliados de Skanderbeg se voltaram contra ele, além de venezianos
e a realeza de Aragão tentando manipulá-lo. No entanto, o prudente guerreiro
albanês conseguiu juntar um exército de 10.000 homens e se preparou para a
batalha contra Evrenos. Skanderbeg e seus homens experientes invadiram o
acampamento otomano perto de Albulena em 2 de setembro de 1457, e não
havia nada que os otomanos poderiam fazer apesar de seus números e mais
de 20.000 otomanos foram mortos. Albulena se tornou a maior vitória da
resistência albanesa.

Entre 1460 e 1462, Skanderbeg ajudou seu suzerano Ferdinando I de


Nápoles como diplomata e comandante. Mas uma nova incursão otomana o
forçou a voltar para a Albânia, e em julho de 1462, ele derrotou outro exército
otomano em Mokra. Em agosto, Skanderbeg entrou na Macedônia e derrotou 3
exércitos otomanos em rápida sucessão. Isso forçou o sultão a firmar um
acordo de paz em 1463. No entanto, quando mais tarde naquele ano o Papa
Pio II pediu uma Cruzada, Skanderbeg quebrou a paz e entrou em território
otomano e a Macedônia foi pilhada. No entanto, Pio II morreu antes de se
juntar à Cruzada, então Skanderbeg teve que lutar sozinho com assistência
veneziana mínima. Em setembro, Skanderbeg e seus 10.000 homens se
aproximaram da fortaleza otomana de Ohrid, defendida por 15.000. Ele não
tinha tropas o suficiente, então enviou apenas 500 soldados para atrair os
otomanos e este plano funcionou perfeitamente e as forças otomanas caíram
na armadilha albanesa, com mais de 10.000 otomanos sendo mortos. Apesar
disso, o remanescente do exército otomano conseguiu chegar na cidade e
defendê-la.

Maomé II então manda outro exército contra Skanderbeg em 1465, mas


novamente foi derrotado por ele. Essa foi a gota d´agua para que Maomé II
enviasse entre 50.000 e 100.000 homens contra Skanderbeg em maio de 1466.
O albanês tinha menos de 20.000 e apesar de seus pedidos, ele não recebeu
nenhuma assistência de Nápoles e Veneza. Apesar de pesada resistência
albanesa, Maomé II sitiou Kruje, que foi mantida sob fogo de canhão pesado
otomano, e Maomé decide recuar depois de pilhar o resto do país, criando uma
adminstração otomana na parte oriental da Albânia ordenando a construção de
muitas fortalezas. Isso limitou a atuação de Skanderbeg de continuar sua
resistência. E 1467, Kruje foi novamente sitiada, mas os resultados foram
semelhantes. Em 1468, Skanderbeg morre de malária e os venezianos
assumiram a defesa da Albânia, que continuou resistindo por mais uma
década. Kruje finalmente caiu em 1478, que acabou finalmente com a guerra
albanesa-otomana. Em 1479, Veneza estava desgastada e foi forçada a
assinar o Tratado de Constantinopla, onde Maomé II recebeu Eubéia na
Grécia, a ilha de Lemnos, e a maior parte da Albânia. Skanderbeg se tornou
um herói da Cristandade Européia, nomeado Campeão de Cristo, por atrasar
por tanto tempo o progresso da invasão muçulmana.
(retrato de Skanderbeg)

Vários ataques otomanos foram realizados na Transilvânia passando


pela Valáquia de 1478-79. O rei da Hungria Matthias I deu a Stephen V Báthory
forças suficientes e idênticas às forças otomanas no campo da batalha de
Breadfield em 14 de outubro de 1479. Os dois tinham basicamente as mesmas
forças e começa em 1480. O famoso general holandês Paul Konishi
comandava a ala direita de Stephen, e rapidamente atacou os otomanos da
direita e os dispersou. Sua cavalaria então atacou os otomanos do centro, e
logo todo o exército otomano bateu em retirada. De acordo com as fontes,
entre 5.000 e 10.000 guerreiros do sultão foram mortos, enquanto menos de
3000 do lado húngaro.

Os otomanos sempre tiveram a intenção de conquistar Roma, e a


Albânia seria um ponto de partida perfeito. A paz com Veneza ajudou porque a
marinha otomana não precisava mais cooperar com a frota veneziana. Em
maio de 1480, os otomanos lançam uma invasão naval da ilha de Rodes, mas
os cavaleiros hospitalários conseguiram repelir o ataque em agosto.

A conquista da Itália começou em julho de 1480, quando um exército


otomano forte de 20.000 homens partiu para o reino de Nápoles,
desembarcando perto de Otranto. A guarnição da cidade achou que as forças
otomanas eram pequenas e foi atrás, mas depois ao ver os números deles
voltou para a cidade. A cidade tinha cerca de 2000 soldados e conseguiram
enviar mensageiros para pedir ajuda. Em 29 de julho começou o cerco e os
canhões começaram a bombardear a cidade. Como a guarnição era muito
pequena para defender as muralhas, eles recuaram para defender a cidadela.
Os otomanos tomaram e pilharam a cidade, queimando-a. Os canhões foram
movidos para destruir a muralha, e o cerco continuou por 15 dias. Em 11 de
agosto, a artilharia otomana rompeu a muralha e suas tropas entraram na
cidadela, massacrando toda a guarnição e 10.000 cidadãos, e milhares foram
escravizados. De acordo com fontes, somente 800 sobreviveram e foi lhes
dada a oportunidade de se converter ao islã, eles recusaram e foram
decapitados e se tornaram mártires. Os otomanos então invadiram as cidades
de Lecce, Taranto, Brindisi e Versta. A maioria de suas tropas retornou para à
Albânia, deixando 1500 como guarnição em Otranto. Os reinos de Nápoles,
Sicília e Hungria cercaram a cidade em maio de 1481, e Maomé II morre em 3
de maio, com isso nenhum reforço chegou à guarnição, que se rendeu em
agosto.

Maomé II não tinha nomeado alguem para ser seu sucessor, então seus
filhos Bajazeto e Jin foram até a capital para tomar o trono. O primeiro foi mais
rápido e foi declarado sultão Bajazeto II em 21 de maio. Jin capturou cidades
na Anatólia e derrotou Bajazeto com suas forças em 28 de maio. Jin ofereceu
para os dois governarem o Império, mas Bajazeto se recusou e moveu suas
forças para derrotar seu irmão em Yenisehir. Jin fugiu para o Egito dos
Mamelucos e depois para os cavaleiros hospitalários de Rodes, e depois na
corte do Papa Inocêncio VIII que estava disposto a usar o príncipe otomano
como moeda de troca.

O novo sultão Bajazeto II lançou pequenos ataques para pilhar áreas de


fronteira ou para punir vassalos rebeldes. Um dos alvos foi o reino da Croácia,
que estava em união dinástica com o reino da Hungria, e ocorre a batalha de
Vrpile em 1491, onde os croátas venceram. Em 1493, o governante otomano
na Bósnia, Adim Jawbek Pasha fez outro ataque à Croácia, e os habitantes
locais levaram suas tropas para encontrá-lo em Krbava, onde ambos tinham
cerca de 10.000 soldados. Quase todo o exército croata foi massacrado,
enquanto os otomanos perderam apenas algumas centenas de homens.

Durante esse período, os otomanos recomeçaram as hostilidades com


Veneza e começaram suas guerras contra a Polônia na guerra Polaca-
Otomana (1485-1503), onde os otomanos venceram com a ajuda da Moldávia
e o Canato da Crimeia. A Moldávia se tornou um vassalo otomano e Veneza foi
forçada a ceder suas posses no Peloponeso depois de perder uma série de
conflitos navais.

As coisas na fronteira com o Irã estavam começando a esquentar


também. Em 1501, Irã, Iraque e parte do Cáucaso, estavam sob o controle da
dinastia Ak Koyunlu, que desafiou Maomé II em 1473. Depois disso, Ak
Koyunlu não estava mais interessado em expandir para o oeste, e devido a
conflitos internos, em 1501 um membro da dinastia safávida, Ismail I foi
apoiado por várias tribos turcomanas e ocupou Tabriz e se declarou Xá. Em
1503, ele derrotou o último ato do sultão Ak Koyunlu e logo assumiu controle
de seu vasto império. Essa dinastia Safávida era xiita, e isso colocou eles
contra o resto dos muçulmanos em volta que eram sunitas. Ismail decide testar
seus vizinhos otomanos e mamelucos atacando Dulgadir em 1507.

O sultão Selim I começa uma retaliação e invade o território Safávida. Ao


mesmo tempo, Bajazeto II pediu a outro líder xiita, Muhammad Shabani, para
atacar os Safávidas pelo leste. Shabani atacou pelo leste na Ásia Central, e
Ismail teve que se mover para o leste e o derrotou e o matou facilmente em
Merv em 1510, expandindo seu império até essa cidade. Em 1511, os seus
partidários xiitas se revoltam na Anatólia contra o governo de Otto. Embora
essa rebelião fosse facilmente derrotada, seria só o começo, porque muitas
das tribos turcomanas do leste da Anatólia eram xiitas.

O sultão otomano estava doente e declarou seu filho mais velho Ahmed
como herdeiro em 1511. Seu filho mais novo, Selim, se revoltou e tomou
Constantinopla em abril de 1512. Selim matou Bajazeto II e Ahmed e se tornou
o novo sultão, como Selim I. Selim usava a religião contra Ismail e declarou
que os xiitas eram hereges, e os dois governantes escreveram várias cartas
trocando insultos. Em 1512, Selim ordena a execução de mais de 40.000 xiitas
na Anatólia, e também enviou uma mensagem a família Shabani para preparar
outra invasão do reino Safávida.

Ismail foi forçado a enviar partes de suas tropas para o leste, e em 1514,
Selim começa sua campanha contra Ismail. Os otomanos tinham cerca de
70.000 soldados e Ismail tinha cerca de 50.000. Inicialmente Ismail usou táticas
de terra arrasada, mas quando os exércitos estavam se movendo para o
interior do Irã, e perto da capital Tabriz, Ismail precisou tomar uma posição em
agosto. Ismail decide fazer isso no Vale de Chaldiran, onde ambos tiveram
pesadas baixas, mas Selim acabou vencendo. Em setembro, Selim entra em
Tabriz, mas suas tropas estavam à beira de um motim, e ele teve que voltar.
Os otomanos assumiram o controle da Anatólia oriental, partes do Cáucaso e
do Iraque.

Na Anatólia, apenas os beilhiques de Dulkadir e Ramazânidas foram


deixados um tanto independentes, para servir como um estado tampão entre
os Otomanos e os Mamelucos. No verão de 1515, Selim acabou com essa
independência, completando assim a conquista da Anatólia, e a guerra com os
mamelucos era agora inevitável. Mas quem eram os mamelucos? No século IX,
o califado abássida começou a prática de escravizar meninos, principalmente
de tribos turcas, mas também tinham de circassianos e cristãos ortodoxos.
Esses escravos recebiam treinamento militar, aprendiam táticas, religião,
línguas, e ciências. Eles foram então libertados e serviam como guardas dos
sultões muçulmanos. Os mamelucos muitas vezes ganhavam influência e às
vezes até chegaram ao poder, fundando dinastias na Ásia Central
(Gasnévidas), Mesopotâmia (dinastia mameluca do Iraque) e Índia (Sultanato
de Délhi). Em 1260, os turcos do sultanato aiúbida conseguiram arrancar o
poder deles, e de 1260 a 1323 eles acabam com o que sobrou dos Estados
Cruzados e com a ameaça mongol do Ilkanato. Em 1375, os mamelucos
conquistam o reino armênio da Cilícia, às vezes considerado um Estado
Cruzado, mesmo que cristão ortodoxo. Em 1382, os sultões turcos estavam
perdendo influência sob os mamelucos e foram derrubados pela dinastia
circassiana Burji.

Os mamelucos esperavam que os Otomanos e Safávidas brigassem


entre si e enfraquecessem um ao outro, e eles permitiram que os safávidas
passassem por seu território durante a guerra com os otomanos. Depois que os
Otomanos venceram a guerra, o sultão mameluco Al-Ghawri sabia que eles
seriam os próximos, então em 1516, ele aceitou uma oferta de aliança de
Ismail. Al-Ghawri marchou para a Síria, deixando seu vizir Tuman no Cairo.
Infelizmente para os mamelucos, os otomanos estavam em paz com seus
vizinhos europeus, e Ismail não tinha força o suficiente para ameaçá-los, então
Selim conseguiu reunir todas suas tropas contra eles. Em abril de 1516, Selim
envia seu vizir Sinan Pasha com a vanguarda para capturar as passagens
cruciais pelas montanhas Taurus, mas o exército de cavalaria de Al-Ghawri foi
mais rápido e tomou primeiro as passagens. Sinan Pasha foi obrigado a
esperar por Selim, que chegou em Konya em julho. Alguns afirmam que Ismail
conseguiu enviar uma força para ajudar os mamelucos, mas esse exército foi
derrotado em algum lugar da Anatólia Oriental. De qualquer forma, Selim
decide contornar as montanhas Taurus e se mudar para Malatya. Ao mesmo
tempo, Al-Ghawri sabia que podia ser flanqueado, e então voltou para Alepo.
Selim estava agora indo para o sul e embora os mamelucos tentassem
oferecer paz, os otomanos mataram os enviados.

Então os dois se encontram em Alepo e ocorre a batalha de Marj Dabiq


em 24 de agosto de 1516. Os mamelucos tinham algo entre 20.000 e 50.000
soldados, enquanto os otomanos tinham cerca de 30.000 e 60.000. Os
otomanos obtem uma vitória decisiva e inclusive Al-Ghawri é morto em batalha.
A conquista otomana da Síria foi fácil, visto que a maioria das guarnições
mamelucas foram derrotadas nessa batalha. Mesmo assim, ele precisava de
tempo para segurar a sua posição, obter suprimentos e permitir que sua
marinha se juntasse ao exército da Síria. Então ele enviou Sinan Pasha no
comando da vanguarda para ocupar os castelos costeiros principais.

No Cairo, o vizir Tuman se tornou o novo sultão mameluco, e começou a


recrutar um novo exército. Ele recusou a ideia de se tornar um vassalo
otomano e os enviados foram mortos. Tuman sabia que manter as fortalezas
seria crucial, e então ele envia sua vanguarda para a região de Gaza, onde
ocorre a batalha de Khan Yunis em 28 de outubro de 1516. A batalha começou
com uma rajada da artilharia otomana, e os mamelucos atacaram com tudo.
Mas depois de pressionar os otomanos para trás, eles que começam a ser
pressionados. As coisas ficam equilibradas até as unidades de pólvora
otomana conseguissem flanquear os mamelucos, acabou a batalha e poucos
mamelucos fugiram.

Depois dessa derrota, o restante das forças mamelucas se


concentraram em Cairo. A passagem pelo Sinai foi difícil, mas Selim foi
abastecido por sua marinha, e em janeiro de 1517 eles entram no Egito. Em 22
de janeiro começa a batalha entre Tuman e Selim em um lugar chamado
Ridanieh, nos arredores do Cairo. Os mamelucos tinham comprado 300
canhões dos venezianos, e eles foram colocados no fosso. Enquanto isso, os
otomanos haviam colocado sua artilharia nas colinas atrás de suas posições. O
duelo de artilharia foi curto e terminou com a vitória otomana. Os otomanos
começaram a disparar contra a cavalaria mameluca, que começou a ir com
tudo para tomar a colina e a artilharia otomana. No entanto, essa carga foi
interrompida pelas rajadas dos janízaros, além de que Selim flanqueou eles e o
que sobrou fugir e dispersou. A vanguarda otomana tomou Cairo sem nenhuma
resistência, mas era uma armadilha e no dia 26 de janeiro, as forças de Tuman
entraram na cidade e destruíaram a vanguarda numa batalha rápida. Selim
soube disso e no dia 27 enviou os janízaros para retomar a cidade. Os
moradores da cidade se juntaram às forças de Tuman, e o combate na cidade
continuou até 3 de fevereiro, onde os otomanos recuperaram o controle. Dizem
que dezenas de milhares de cidadãos de Cairo foram mortos e junto com eles,
a maioria da nobreza mameluca. Tuman continuou a sua resistência por alguns
meses, mas foi capturado e executado em março. Todo o Egito e Síria foi
conquistado, além da faixa do Hejaz, onde a cidade de Meca e Medina estão. E
Selim duplicou o território otomano em apenas 3 anos.

O Império Otomano agora parecia ainda mais invencível e nenhuma


potência europeia pode deter o seu avanço, a não ser um país humilde,
pequeno, quem ninguém dá importância: Portugal.

A nobre e justa guerra da Cristandade portuguesa contra os mouros


invasores fez com que Portugal desenvolvesse uma marinha de fazer inveja a
Temístocles e toda a marinha ateniense. O acolhimento dos templários feito
pelo rei Dom Dinis (1261-1325) fez com que o remanescente da Ordem
trouxesse o resto de seu ouro à Portugal, o que patrocinou as grandes
descobertas em navegação pela Escolas de Sagres, fundada por um membro
da Ordem de Cristo, o famoso Dom Henrique de Avis (1394-1460). Em 1415 os
portugueses tomaram Ceuta dos infiéis, e descobriram as ilha de Cabo Verde.
Foi uma época que a imaginação e a fantasia correram soltas, e o desejo de
Dom Henrique de explorar os mares e quem sabe até encontrar o reino do
lendário rei sacerdote Preste João, e juntos combaterem os inimigos da
Cristandade, que embora já quase expulsos da Espanha, ainda dominavam
terras e mares orientais.

Em 8 de março de 1500, Pedro Álvares Cabral é abençoado por Dom


Manuel, e pelo papa. Partindo de Belém, em 9 de março, com 13 navios, 1500
soldados, negociantes, aventureiros, mercadorias e dinheiro em moeda. No dia
22 de abril de 1500, chegaram acidentalmente ao que ficou conhecida como
Terra de Vera Cruz, o Brasil. Cabral seguiu para a Índia, numa viagem árdua, e
que quase todos os navios naufragaram ao final de maio, com todos mortos.
Foi só em setembro que o resto da frota chegou em Calicute, onde
estabeleceram um ponto comercial. Nas disputas com os muçulmanos, um
ataque de cerca de 300 árabes muçulmanos e indianos hindus matou a maior
parte dos portugueses em Calicute de 15 a 17 de dezembro, inclusive Pero Vaz
de Caminha. Cabral retaliou, bombardeou a cidade e capturou 10 navios
muçulmanos, executou a tripulação. Foi só em janeiro de 1501 que ele
começou seu retorno a Portugal, que só se concluiu em junho.
Em 8 de abril de 1481, a bula Cogimur iubente altissimo oficializava a
cruzada portuguesa contra os turcos-otomanos. No entanto, só no reinado de
D. Manuel I é que decidiu participar nessa cruzada, com o rei preparando uma
esquadra que partiu para o Mediterrâneo sob o comando de D. Garcia de
Meneses, bispo de Évora. No entanto, os portugueses não precisaram
combater, pois quando chegaram a Otranto, no sul da Itália,  esta tinha sido
abandonada devido à notícia da morte súbita do Sultão, vítima da peste.

Quando Vasco da Gama chegou à Índia, eles ofereceram alguns


produtos em troca das especiarias. Só que o Samorim da Índia não achava
vantajoso e prendeu os portugueses companheiros de Vasco e o fez esperar
dois meses intermináveis nas Índias, obrigando Vasco a fazer vários favores.
Até 1508, os portugueses já tinham estabelecidos portos comerciais em várias
áreas do oceano Índico, até que os venezianos, mamelucos, otomanos e
indianos se uniram, para expulsar os portugueses de uma vez por todas. Então
essa coligação partem para Chaul, uma cidade indiana que estava sob o
controle de um jovem português chamado Lourenço de Almeida. E na batalha
de Chaul em março de 1508, Lourenço é despedaçado por balas de canhão e
seu corpo nunca foi encontrado, e dos 150 que lutaram, 80 portugueses
morreram. Os islâmicos perderam 700 dos 800 que lutaram. Só que os estados
islâmicos cometeram um erro imperdoável, porque o pai de Lourenço,
Francisco de Almeida, iria vingar a morte do filho. Então o governador de Diu,
Malik Ayaz, mandou uma carta desesperada à Francisco de Almeida, pedindo
desculpas, e implorando misericórdia e amizade do vice-rei português. E
Francisco respondeu:

"Eu, o vice-rei, me dirijo a vós, muito honrado Malik Ayaz,


Para informar-vos de que estou a caminho de vossa cidade com
meus cavaleiros, para procurar os que mataram um homem
conhecido como meu filho. E estou indo com a esperança de
Deus no Céu para descarregar vingança sobre eles e sobre os
que os ajudaram e se não os encontrar... Vossa cidade não me
escapará! Irá me pagar de volta por tudo! Estou informando-vos
disso para que estejais plenamente consciente quando eu
chegar! Estou a caminho! Você comeu o frango... agora vai ter
que comer o galo!".

Francisco de Almeida foi com 18 navios e 1200 homens, reunindo a


maior força da história do Oceano Índico. Desesperado, o governador de Diu
busca ajuda de todos os lados: Império Mameluco, Reino de Calicute, Veneza,
e o Império Otomano. Eles reuniram 200 galés de guerra e mais de 5000
homens. E estoura a batalha de Diu em 3 de fevereiro de 1509, e a frota
muçulmana ja estava pronta no canal, com um grande apoio de artilharia
terrestre. Então Francisco de Almeida decide colocar o seu maior e melhor
galeão, o Flor do Mar, na saída do canal, bloqueando a saída de dezenas de
galés. Francisco de Almeida dispara o tiro que dá início à batalha. Só que o
jogo vira quando o galeão Santo Espírito faz uma manobra militar inovadora: os
artilheiros posicionam seus canhões rente ao mar, dando disparos que faziam
as balas ganharem altura e ao mesmo tempo levantava uma cortina de água
que dificultava a visão dos inimigos. Uma chuva de balas descia sobre a
coalizão, que estava encurralada. Enquanto isso Francisco de Almeida e o Flor
do Mar castigavam as galés no canal que não resistiram ao bombardeio e não
tinham outra saída: o navio disparou mais de 600 balas sobre os inimigos,
afundando dezenas deles, e outras dezenas fugirem para Calicute. Nesse
bombardeio, o navio bandeira de Diu foi capturado, e o restante da frota entrou
em pânico generalizado. Todos os navios foram destruídos, com a exceção de
4 carracas indianas, que foram invadidas e capturadas pelos portugueses. Em
memória a seu filho, ele ordena que dezenas de prisioneiros mamelucos sejam
literalmente explodidos em pedaços por seus canhões, muitos eles explodidos
dentro dos próprios canhões. Outros eram queimados vivos, outros foram
amarrados em navios e afundados, outros foram obrigados a matar uns aos
outros, vários deles foram esquartejados e tiveram seus membros espalhados
pelo portão da cidade. E Almeida explica o porquê: "Através desse portões
entraram e saíram os muçulmanos que mataram o meu filho.".

O governador de Diu ofereceu rendição e vassalagem incondicional à


Portugal, devolveu os prisioneiros bem vestidos e cuidados, e com uma
indenização grandiosa. Portugal agora destruiria a antiga rota da seda,
dominaria sozinha a maior parte do comércio oriental, levaria Veneza e dezena
de estados islâmicos à falência, e se tornaria a primeira superpotência global.
Vale lembrar que Francisco de Almeida desobedeceu às ordens de seu próprio
rei. Segundo o historiador William Weir, em seu livro "50 Battles that changed
the World", a batalha de Diu está em 6º lugar, e: "Os muçulmanos estavam
prestes a dominar o mundo no século XVI, mas essa perspectiva afundou no
mar de Diu.".

Em 1535, os Otomanos sob o comando do sultão Khair ed-Din iniciaram


um ataque aos navios cristãos no mar Mediterrâneo a partir de Argel. Para os
combater, Carlos V reuniu um exercito sob a égide do Sacro Império Romano-
Germânico, com o apoio de Portugal, Gênova, Estados Papais e da Ordem de
Malta, conquistando Túnis, à altura, sob o controle do Império Otomano.

(Império Português com suas colônias e feitorias)

Apesar desse novo grande adversário, o Império Otomano ainda era


forte e ainda tinha grande força terrestre. Durante os últimos anos do reinado
de Selim, a Espanha começou a tomar algumas regiões costeiras da Argélia, e
o emir da Argélia decidiu convidar os corsários otomanos Oruj e Hayreddin,
que mais tarde seria conhecido como Barbarossa, para ajudá-los contra os
espanhóis em 1516. Em 1518, Hayreddin fez da Argélia uma província
otomana, e embora a Espanha continuasse a lutar por alguns anos, os
otomanos agora tinham um trampolim para atacar a Espanha e a Itália. Em
1520, o sultão Selim I morre, sucedido pelo seu filho Solimão, o Magnífico, o
mais famoso de todos os sultões otomanos.

Como a Hungria passava por um período de crises, Solimão reiniciou a


guerra contra os húngaros em 1521. Seu objetivo era Belgrado, que começou a
ser sitiada em 25 de junho, e no final de agosto, a cidade foi capturada. Ao
mesmo tempo, Solimão continuou seus preparativos navais, pois queria
conquistar a ilha de Rodes, que estava na mão dos cavaleiros Hospitalários.
Os Hospitalários foram uma pedra no sapato dos otomanos por mais de um
século e um ataque fracassado a eles já tinha sido feito em 1480.

Os hospitalários, ou Cavaleiros de São João, foi uma ordem religiosa


fundada na época da Primeira Cruzada (1095-1099), para operar hospitais na
Terra Santa para peregrinos cristãos. Na época da Terceira Cruzada (1189-
1192), eles se tornaram uma ordem militar também e se tornaram uma das
forças de combate mais formidáveis do Levante. No entanto, em 1291 os
hospitalários foram expulsos da Terra Santa quando a cidade de Acre caiu nas
maõs dos mamelucos. Em 1310, eles conseguiram conquistar a ilha de Rodes
do decadente Império Bizantino e a transformaram em sua nova base de
operações. Em 1521, os Cavaleiros de São João se tornaram piratas notórios,
marinheiros habilidosos que eram o flagelo dos navios mercantes otomanos no
Mediterrâneo.

A forteleza de Rodes era o baluarte mais fortificado da Cristandade,


projetada pelos melhores engenheiros italianos que o dinheiro podia comprar.
O Grão-Mestre da Ordem, Philippe Villiers de L´Isle-Adam, sabia que um cerco
em sua cidade estava próximo de acontecer. Ele enviou mensageiros
implorando aos líderes europeus que viessem em auxílio de Rodes, mas
apenas parte da guarnição veneziana do Chipre que veio ajudar.

Em junho de 1522, os 400 navios da forte marinha otomana estavam


prontos para navegar, liderados pelo cunhado do sultão, Mustafa Pasha. A ilha
foi bloqueada, e em 28 de junho o exército otomano chegou na ilha, liderados
pelo próprio Solimão. Os 100.000 do sultão eram compostos de trabalhadores,
engenheiros, soldados de infantaria, e a elite dos janízaros. Em contraste, as
tropas de Philippe Villiers somavam apenas 6703, dos quais apenas 703 eram
Cavaleiros de São João, e o resto eram os venezianos e a população nativa
latina e grega. Eles estavam preparados para um cerco, com todo o trigo da
ilha sendo colhido e armazenado, garantindo que os turcos não pudessem
viver da terra. Uma gigantesca corrente de ferro havia sido feita para bloquear
o porto da cidade, impedindo o acesso pelo mar.

No início de agosto, a artilharia otomana começou a bombardear as


muralhas da fortaleza. Os turcos estavam em seu pico de tecnologia militar e
usavam de tudo, desde grandes bombardas até bombas incendiárias para
semear caos e morte nos habitantes da cidade. Durante o cerco, os otomanos
criaram uma rede de trincheiras protetoras e paliçadas de madeira ao redor da
fortaleza. Os otomanos colocaram seus Assapes para cavar seus caminhos
sob as muralhas e colocar minas explosivas. Esses Assapes eram quase todos
cristãos, recrutados dos Balcãs, e tinham um trabalho traiçoeiro. No entanto,
muitos Assapes foram mortos pelos defensores da cidade. Os defensores
conseguiram desmoronar mais de 50 túneis otomanos. No entanto, em 4 de
setembro, duas minas otomanas sob o bastião inglês detonaram, derrubando
um segmento de 11 metros de comprimento de muro e enchendo o fosso
abaixo dele.

Com essa fissura, a infantaria otomana conseguiu entrar e expulsar os


defensores de Rodes. Eles levantaram seus estandartes nas ameias para
comemorar sua vitória, mas foram expulsos por um contra-ataque liderado
pelos cavaleiros ingleses e pelo próprio Grão-Mestre. Mais duas vezes os
otomanos atacaram a brecha, mas nas duas vezes os cavaleiros ingleses junto
com os cavaleiros alemães, mantiveram a linha. Ambos os lados sofreram
pesadas baixas nisso. No final de setembro, a moral otomana começou a
declinar. No dia 19 daquele mês, espiões muçulmanos conseguiram informar a
Solimão que os bastiões espanhóis e de Provença estavam menos protegidos.
Então o sultão ordenou um ataque total à essas porções da muralha. O
bombardeio pegou os cavaleiros de surpresa, e as forças otomanas
conseguiram ultrapassar as muralhas. Seguiu-se um feroz combate corpo a
corpo, com os janízaros de elite duelando com cavaleiros disciplinados. O
bastião espanhol mudou de mão duas vezes, mas no final, os otomanos foram
repelidos. Furioso com essa derrota, Solimão ordenou que Mustafa Pasha, que
liderou o ataque, fosse executado, mas devido a pedidos de seus funcionários
mais altos, fez o contrário. No entanto, Mustafa foi enviado ao Egito e
substituído por Ahmed Pasha, que era mais experiente.

Os combates de ida e volta continuaram ao longo de todo o mês de


outubro, principalmente em torno da parede desmoronada do bastião inglês.
Os cavaleiros e seus súditos de Rodes conseguiram manter os janízaros
afastados, mas cada surtida custaria vidas preciosas. Em dezembro, os dois
lados estavam completamente desmoralizados. Os otomanos sofreram uma
enorme perda de vidas, e a doença correu desenfreada em suas fileiras,
matando muito mais. No entanto, os defensores de Rodes estavam com
poucos homens capazes de defender a cidade, e sabiam que não durariam
muito tempo sem ajuda, Em 11 de dezembro, começaram as negociações de
paz entre ambos os lados. Solimão ofereceu comida e proteção se eles se
rendessem, mas morte e escravidão se ele tivesse que tomar a cidade à força.
As negociações logo descarrilariam, quando os cidadãos latinos e gregos
pressionaram demais por garantias do sultão, que ordenou que seus homens
voltassem a bombardear a cidade.

Em 17 de dezembro, as forças otomanas novamente invadiram o bastião


espanhol, e mataram seus defensores. Esse era o fim para os Cavaleiros de
São João, e uma paz foi feita no dia 20 e os termos foram até que amigáveis.
Os cavaleiros sobreviventes seriam poupados e receberiam navios do sultão
para navegar até a ilha de Creta. Os cidadãos de Rodes receberam a
promessa de segurança contra o massacre, a profanação de suas igrejas, e
liberdade de taxação otomana por 5 anos. Algumas fontes falam que depois
que os cavaleiros zarparam, houve um massacre e a Igreja de São João foi
convertida numa mesquita. Com a conquista de Rodes, os otomanos
dominaram completamente o Mar Mediterrâneo oriental, mas eles teriam que
enfrentar os hospitalários em batalha mais uma vez.
(pintura retratando Solimão, o Magnífico)

O Sacro Império Romano Germânico era governado por Carlos V, que


também era rei da Espanha e dos Habsburgos. Carlos V estava brigando com
a França nas Guerras Itálicas (1521-1526) e em 1525, os Habsburgos
esmagaram um exército francês em Pávia e capturaram o rei francês Francisco
I. Francisco foi forçado a fazer concessões territoriais aos Habsburgos e a
renunciar suas reivindicações na Itália. Em desespero, a França procurou ajuda
em todo lugar, e Francisco implorou aos otomanos para que fizesse uma
aliança com ele para que atacasse os Habsburgos.

No entanto, para atacar o Sacro Império Romano Germânico, primeiro


ele precisava passar pela Hungria. Em 1514, um homem chamado György
Dózsa formou uma cruzada camponesa de 40.000 agricultores para atacar os
otomanos. No entanto, os nobres ordenaram que os camponeses voltassem
para suas casas, e isso gerou uma revolta que devastou a Hungria. A revolta
foi brutalmente suprimida por John Zapolya da Transilvânia e mais de 70.000
camponeses foram capturados e torturados.

Em abril de 1526, Solimão deixou Constantinopla para atacar a Hungria


com um exército de 50.000 a 100.000 homens. De Belgrado, Solimão enviou
Ibrahim Pasha para capturar a fortaleza de Petrovaradin. Com Assapes
plantando minas e com os janízaros, eles conseguiram tomar a fortaleza
perdendo apenas 25 homens. A cidade de Ilok caiu em 8 de agosto com pouca
resistência. Quando ele chegou em Osijek, ele esperava encontrar um exército
húngaro enorme, mas não havia nenhum inimigo lá. O rei húngaro Luís II
reuniu um exército de 25.000 homens na cidade de Tolna, formado de
húngaros, croatas e boêmios. O exército húngaro e otomano se encontram
perto de uma aldeia ribeirinha conhecida como Mohacs em 26 de agosto.

Em 29 de agosto começaram os combates, com os húngaros atacando


primeiro. Eles atacaram às 3 da tarde, sabendo que os muçulmanos estariam
ocupados com a oração da tarde. A artilharia húngara começou a disparar, e a
ala direita húngara atacou, rompendo as duas primeiras linhas de defesa
otomana e abriram caminho em direção à terceira linha. Inspirados por esse
sucesso, a segunda linha de cavaleiros húngaros entrou na batalha, se
juntando ao feroz corpo a corpo e cercando a cavalaria rumélia do lado de fora.
Enquanto isso, a ala esquerda húngara esfaqueou no centro da desordenada
primeira linha otomana. Os húngaros lutaram bravamente, conquistando a
posição do sultão. No entanto, esse sucesso não era sustentável. Quando os
húngaros chegaram ao alcance da fortaleza de vagões otomanos, uma
saraivada de canhões e artilharia inflingiu pesados danos na primeira linha.
Depois, os janízaros formaram fileiras em torno do sultão e atacaram os
cavaleiros húngaros. A cavalaria rumeliana começou a se reagrupar e a
empurrar de volta os húngaros da direita. A partir daqui, o exército otomano
avançou em ambos os flancos para acabar com os inimigos restantes. Quando
a batalha parecia perdida, Luís II tentou fugir, e no caos, seu cavalo o jogou no
riacho inundado de Csele, e sua armadura pesada o arrastou para um túmulo
aquático.
(batalha de Mohacs)

Solimão ficou mais alguns dias na cidade, esperando para ver se


chegava mais forças húngaras. Quando nenhuma veio, ele marchou para a
cidade de Buda, e a tomou quase sem resistência. Alguns falam que Solimão
ordenou que a cidade fosse poupada, mas outras fontes afirmam que ele
saqueou e queimou a cidade. Os nobres húngaros ficaram tão desesperados
depois dessa batalha, que eles elegeram dois reis ao mesmo tempo: Fernando
I da Aústria, irmão do Sacro Imperador; e John Zapolya. Com a ajuda dos
Habsburgos, Fernando conquistou toda a Hungria restante, enquanto Zapolya
se tornou o favorito de Solimão por seu reino da Transilvânia se tornar vassalo
dos otomanos. A cidade de Buda ficou com os Habsburgos.

Em 1529, o próximo alvo seria Viena, capital dos Habsburgos. Solimão


marchou para a cidade com 125.000 homens e 20.000 camelos, e uma
significante quantidade de canhões. Mas como era na primavera, começou a
chuva e isso transformou a terra em lama, fazendo com que muitos canhões
tivessem que ser abandonados e muitos camelos morressem no caminho. Em
18 de agosto, o exército de Solimão chegou novamente em Mohacs, onde
Zapolya estava esperando com 4000 cavaleiros húngaros para ajudá-lo e
juntou suas forças com o sultão. Apesar das perdas, os otomanos varreram as
cidades dos Habsburgos a caminho de Viena, a maioria com pouco ou
nenhuma resistência. No dia 8 de setembro, Solimão toma a capital Buda e
coloca Zapolya no comando da cidade. Nas semanas seguintes ele conquistou
Gran, Tata, Komáron e Raab. Fontes europeias falam que por onde os
otomanos passaram, eles cometeram assassinatos e pilhagem, cometendo
várias atrocidades. Até chegar em Viena, outras tropas, cavalos e camelos
otomanos foram perdidos para as chuvas fortes. A ameaça otomana era tão
grande que até Martinho Lutero, que inicialmente era contra resistir aos
otomanos, agora publicou um livro obrigando a coroa dos Habsburgos para
defender o Império da expansão de Solimão.

Sabendo que o exército otomano estava perto de Viena, Ferdinando


fugiu e se refugiou na Boêmia. A população de Viena foi deixada às próprias
custas, mas eles começaram a reunir uma milícia de ralé, composta
principalmente de camponeses prontos para defender suas casas. Felizmente
para os defensores, Carlos V enviou um contigente de 17.000 mercenários
para a cidade, composta principalmente de lansquenetes, que eram soldados
profissionais de elite, principalmente da Alemanha, conhecidos pelas suas
roupas extravagantes, um símbolo de riqueza e poder. No comando deles
estava Nicholas Salm, um soldado de 70 anos que já tinha feito seu nome na
Batalha de Pávia.
(Lansquenetes, os famosos mercenários alemães)

Salm ficaria responsável por comandar as defesas da cidade, e ele


ordenou que a muralha fosse reforçada, pois a muralha já tinha 300 anos. Os
portões foram fechados com tijolos, os subúrbios fora da cidadela principal
foram demolidos, eliminando qualquer cobertura para os invasores otomanos.
Grandes bastiões de barro foram construídos ao longo das paredes para
fornecer aos defensores um maior raio de fogo. As dispensas da cidade foram
reabastecidas e os poços preenchidos.

O exército otomano chegou nas muralhas da cidade no dia 24 de


setembro de 1529. Eles tinham perdido muito de sua artilharia e muitos
homens sofriam de doenças. Daqueles aptos para o combate, cerca de um
terço era os caveleiros Sipahi, que eram ineficazes em cercos. No entanto, o
exército de Solimão ainda era grande, com algumas fontes dizendo que ele
tinha 100.000 homens e 300 canhões, enquanto os defensores tinham apenas
72 canhões. Então a batalha começou. Duas vezes os janízaros tentaram
assaltar as muralhas da cidade, mas nas duas vezes os lansquenetes os
repeliram. Os canhões otomanos eram fracos, mas algumas balas
conseguiram atravessar e causar dano colateral dentro da cidade. Então os
vienenses desmantelaram suas ruas, expondo-as ao solo abaixo, que as balas
de canhão afundaram inofensivamente.

Os assapes otomanos começaram a cavar até chegar aos muros da


cidade, criando uma rede de túneis e trincheiras, para detonar minas nas
muralhas da cidade. Mas os defensores estavam preparados, e tinham um
sistema de baldes de água ao longo das muralhas, e quando essa água
vibrava, quer dizer que os turcos estavam cavando e eles sabiam onde
estavam cavando. Em 8 de outubro, 8000 lansquenetes saíram nas valas,
matando muitos soldados turcos e detonaram muitas minas antes que elas
chegassem nas muralhas. No entanto, essa tática também levou a pesadas
baixas aos lansquenetes e muitos morreram retornando para a cidade pelos
túneis. E além disso, apesar de seus esforços, uma das minas detonou muito
perto da cidade, criando uma brecha nas muralhas perto do portão coríntio. Os
otomanos viram a oportunidade e foram com tudo, com os janízaros de elite,
mas os lansquenetes eram profissionais e formaram uma parede de piques e
repelindo os turcos.

Em 11 de outubro marcou o dia sagrado de São Miguel, e a chuva


atormentou mais ainda o acampamento otomano. As doenças eram
epidêmicas e os otomanos tinham feito pouco progresso nas muralhas da
cidade. Os soldados estavam começando a ficar com fome, e os comandantes
começaram a aplicar as mais duras penas capitais para impedí-los de desertar.
Esse foi o dia em que Solimão se gabou que ele estaria tomando café da
manhã na catedral vienense. Os janízaros começaram a expressar seu
descontentamento e exigiram saber se o cerco continuaria. Solimão convocou
um conselho no dia 12 de outubro, e decidiu que colocaria suas cartas sobre a
mesa. Ele ordenou um assalto final às muralhas da cidade, um último esforço
para salvar o cerco. No dia 14 de outubro, toda a força otomana marchou para
as muralhas da cidade, mas a artilharia austríaca agrediram os atacantes das
muralhas, enquanto os lansquenetes mantiveram a formação de lança pique e
voleios de fogo arquebus. Depois de apenas duas horas, os otomanos
começaram a ver que seus ataques eram inúteis e se retiraram. Na manhã
seguinte, a neve caiu sobre Viena, cobrindo a cidade e o acampamento
otomano, o que era um sinal de que o cerco não poderia continuar. É aceito
que os otomanos perderam 15.000 homens, enquanto as baixas dos
defensores são desconhecidas, mas são assumidas como pesadas. Na marcha
de volta para casa, os otomanos pilharam o estado austríaco de Styria.
Solimão, não aceitando que perdeu, falou que seu objetivo não era tomar
Viena, mas apenas testar a força de seus novos rivais.

De 1522 a 1537, o grande pirata otomano Barbarossa saqueou e


escravizou povo da Sardenha, Marselha, Ligúria e Sicília. Toda o Mediterrâneo
ocidental foi tomado pelo terror, e as cidades foram fortemente fortificadas, as
aldeias costeiras foram abandonadas, e uma fonte espanhola contemporânea
falava que “do estreito de Gilbratar ao de Messina, ninguém podia comer em
paz ou dormir com uma sensação de segurança.”. Em 1532, Barbarossa
recebeu uma missão especial em Constantinopla. O general genovês Andrea
Doria estava saqueando propriedades otomanas no Peloponeso. Barbarossa
foi atrás da frota genovesa e a interceptou em Preveza, onde ele capturou sete
galés e forçou o resto dos navios de Doria a fugir. Voltando a Constantinopla
triunfante, Barbarossa foi nomeado como Almirante da marinha otomana por
Solimão e deu o título Hayreddin, “O melhor da fé”. Barbarossa aprendeu 9
grandes ilhas de Veneza no mar Egeu, devastou a ilha de Corfu, aniquilando
suas fazendas e escravizando quase toda a população rural. Os venezianos
apelaram para o Papa para ajudá-los, e Barbarossa se tornou um grande
perigo para a Europa, e o Papa Paulo III reuniu uma grande aliança, a Santa
Liga. A Santa Liga era composta pelos Estados Papais, Gênova, Veneza,
Espanha, os Habsburgos, e os Hospitalários que agora estavam em Malta.

No verão de 1538, a grande coalizão cristã se reuniu nas costas de


Corfu. Ansioso para garantir o domínio costeiro na batalha que estava por vir, o
almirante papal despachou uma vanguarda de galés pela costa, tentando tomar
a fortaleza otomana de Preveza. Após uma curta escaramuça, eles foram
repelidos e foram forçados a esperar pela chegada do resto da coalizão. Em 22
de setembro, ninguém menos que Andrea Doria chegou no comando de uma
vasta frota genovesa e espanhola. No total, a Santa Liga tinha 112 galés, 50
galeões, 140 barcas, e mais de 60.000 soldados armados. O gigante galeão de
Veneza era comandado por Alessandro Condalmiero. Enquanto isso,
Barbarossa tinha 122 galés e 12.000 soldados armados. Seus navios eram
remados principalmente por escravos de galé, e portanto não dependiam do
vento favorável. Chegando lá, Barbarossa mandou um contigente de soldados
em terra, comandando o controle da fortaleza de Ácio, cuja artilharia forneceria
a seus navios apoio.

Os navios venezianos e papais atacaram nos dias 25 e 26 de setembro,


mas ambas as vezes foram repelidos pela flotilha de Murat Reis, subordinado
de Barbarossa. Doria ordenou que seus navios fossem a 30 milhas para o sul,
ancorassem em Sessola, uma pequena ilha ao largo de Lefkada. O plano era
lançar um ataque nas proximidades de Lepanto, forçando Barbarossa a sair de
sua toca. No entanto, coordenar uma frota de mais de 300 navios provou ser
um pesadelo logístico e a mudança deixou a Santa Liga espalhada e exposta.
Barbarossa aproveitou para atacar, e na manhã seguinte seus navios
emergiram do golfo de Preveza, e contornaram a ponta norte de Lefkada,
atacando a frota cristã. Os navios de Barbarossa assumiram um formato de “Y”
e sua abordagem foi completamente inesperada. Então os navios da Santa
Liga tiveram que virar e começar o ataque.

Na tarde de 28 de setembro, a luta começou. Os otomanos começaram


na vantagem, pois os navios venezianos eram à vela e dependiam do vento
para se locomoverem. No entanto, os cristãos possuíam uma vantagem: a nau
capitânia veneziana era semelhante a um encouraçado e possuía poder de
fogo considerável, que os otomanos não podiam igualar. Ondas de galeras de
Barbarossa assaltaram o grande galeão, com uma delas conseguindo derrubar
o mastro principal da nau capitânia. Mas, à medida que se aproximavam, foram
devastados por um canhão completo explodindo em todas as portinholas do
navio. Os otomanos foram forçados a recuar, mas continuaram essa dança por
algum tempo. A briga continuava intensa entre venezianos e otomanos,
enquanto Doria se movia lentamente para se juntar à briga. O almirante
genovês deixou os venezianos isolados, enquanto ele puxava seus navios para
o mar, atraindo os otomanos para mar aberto. Barbarossa não mordeu a isca, e
começou a ficar de noite com a luta continuando. A nau capitânia ainda estava
montando uma defesa galante, detonando qualquer um que tentasse abordá-la.
Ciente de que era impossível tomar o grande navio, Barbarossa ordenou que
seus navios se retirassem. O galeão de Veneza conseguiu se esgueirar de
volta para Corfu, mas as galés otomanas voltaram sua atenção para as barcas
silicianas e venezianas menores. Usando de sua maior capacidade de
manobra, os otomanos conseguiram capturar mais um punhado de navios
cristãos na última hora antes do anoitecer.

Ao amanhecer, Doria fez a fatídica decisão. Aproveitando de ventos


favoráveis, ele recuou do campo de batalha, indo para o norte de volta para
Corfu. Enviados das frotas venezianas, papal e maltesa pediram que ele
continuasse a luta, mas foram ignorados. Alguns dizem que ele não estava
acostumado a comandar os navios da Santa Liga, outros afirmam que como
ele era genovês, não ia se sacrificar muito pelos venezianos, e outros
simplesmente afiram que ele perdeu a coragem. Seja qual for a verdadeira, a
batalha estava perdida para os cristãos. No final, Barbarossa afundou 10
navios, queimou 3, capturou 36 e fez cerca de 3.000 prisioneiros. Apenas 400
soldados otomanos foram mortos e 800 ficaram feridos.
(Khizr Reis, também chamado de Khair ed-Din ou simplesmente Barbarossa)
(A Batalha de Preveza (Ohannes Umed Behzad))

Em 1530, Ferdinando I conseguiu recuperar algumas cidades da


Hungria que foram tomadas pelos otomanos em 1529, mas não conseguiram
tomar a capital Buda. Em 1531, Solimão parte com mais de 100.000 soldados
para a Hungria, e algumas fortalezas húngaras caíram para os otomanos,
enquanto as terras nas atuais Eslováquia, Eslovênia, Aústria e Croácia, foram
saqueadas. Então Ferdinando I recuou para Viena e deixou uma guarnição de
800 homens fortes na Croácia sob Nikola Jurisic para defender a fortaleza
crucial de Kõszeg. Ao mesmo tempo, como forma de evitar um conflito aberto
com os líderes protestantes do Império, Ferdinando foi forçado a assinar a Paz
de Nuremberg. Os otomanos pensaram que Kõszeg tinha muito mais gente
defendendo do que realmente tinha, e então usaram todas as táticas de cerco
e artilharia para cercar a cidade. No entanto, a guarnição repeliu 20 assaltos e
se recusou a se render. As chuvas começaram cedo naquele ano e um exército
imperial estava se formando em Regensburg para se mudar para a Hungria, e
então Solimão decide se retirar para Constantinopla.

Carlos V e seu filho Ferdinando I sabiam que os otomanos iriam atacar


de novo em breve, e então eles enviaram enviados para o xá Safávida
Tahmasp I entre 1529 e 1533, renovando os tratados assinados com seu pai,
Ismail I. Em 1533, Tahmasp I começou a incitar rebeliões contra Solimão na
fronteira, o que foi suficiente para o sultão otomano assinar o tratado de
Constantinopla em 1533 com os Habsburgos. John Zapolya foi reconhecido
como rei da Hungria oriental, enquanto Ferdinando poderia manter as partes
ocidentais desde que pagasse um tributo de 30.000 guldens anualmente aos
otomanos. Então Solimão começou suas campanhas contra Tahmasp,
enviando cartas aos Shabanidas da Ásia Central, e eles atacaram os safávidas
pelo norte, o que tirou as forças de Tahmasp do oeste. Isso permitiu que os
otomanos tomassem a capital Tabriz e depois Bagdá com facilidade, mas outra
invasão foi parada pelo xá safávida em algum lugar nas montanhas Zagros. Os
otomanos perderam dezenas de milhares durante a batalha nessas
montanhas, e devido a condições climáticas, Solimão decide abandonar a
campanha contra os Safávidas, mas mantendo as conquistas no Cáucaso
ocidental, Iraque e Irã.

Em 1537, os Habsburgos lançaram uma ofensiva contra os otomanos


tanto por terra quanto por mar. Um exército forte de 24.000 homens sob
Johann Katzianer atacou diretamente territórios otomanos e tentou tomar
Osijek na Croácia moderna. Embora a guarnição otomana tivesse apenas
3.000 homens, a fortaleza em si era muito bem projetada. Além disso, o
exército imperial não tinha artilharia e havia doenças se espalhando que
atrasaram o processo. Algumas tentativas de assalto falharam e Katzianer
decidiu esperar os defensores fora. Isso deu tempo para que o governador
otomano de Belgrado, Mehmet Pasha, reunisse uma força de cavalaria de
8000 homens e marchasse para ajudar Osijek.

De acordo com fontes, os otomanos atacaram os Habsburgos de


múltiplas direções. No entanto, os Habsburgos conseguiram pressionar os
otomanos de volta. Como apenas os cavaleiros atacaram, Katzianer pensou
que ainda chegaria mais gente dos otomanos e decidem abandonar o cerco e
bater em retirada. Durante essa retirada, que durou alguns dias, a cavalaria
ligeira otomana constantemente assedia as tropas imperiais, até que os dois
chegaram numa área chamada Gorjani. Os Habsburgos viram que o exército
otomano era muito menor do que eles esperavam e decidem contra-atacar. No
entanto, os reforços otomanos fingiram recuar e as tropas dos Habsburgos
foram atrás e a guarnição de Osijek cercou as tropas imperiais destruindo-as.
Com isso, Katizianer fugiu e o resto das tropas dos Habsburgos foram
massacradas. Os otomanos perderam apenas algumas centenas de homens,
enquanto os Habsburgos perderam mais de 20.000.

Ao mesmo tempo, a frota dos Habsburgos havia tomado a cidade


costeira de Castelnuovo, na costa do Montenegro atual. No entanto, a Santa
Liga havia sido dissolvida e os venezianos fizeram a paz com os otomanos. A
frota de Barbarossa bloqueou pelo mar, enquanto o governador da Bósnia
otomana, Ulamen, levaria um assalto pela terra, e a cidade seria pressionada
de ambos os lados. Em 1539 começou o cerco à cidade, e os Habsburgos
tinham apenas um Tercio, que era uma unidade espanhola de lanceiros e
arcabuzeiros, liderados por Francisco de Sarmiento, totalizando 3500 homens.
Enquanto isso, Barbarossa e Ulamen tinham juntos 50.000 homens e 200
navios.

No dia 12 de junho, uma vanguarda de 30 galeras otomanas chegaram


no golfo de Kotor, bloqueando-a. Um grupo avançado de 1000 soldados
desembarcou para procurar comida, água e capturar moradores para obter
informações. Sarmiento despachou 900 soldados de infantaria para os
encontrar, com os ferozes Tercios conseguindo despachar os otomanos de
volta a seus navios. Eles fizeram a mesma coisa à tarde, apenas para ser
espancados por uma força de 600 homens de Sarmiento.

Barbarossa chegou em 18 de junho com a maior parte da frota otomana


e ordenou que seus homens desembarcassem e o governador Ulamen chegou
alguns dias depois, e juntos eles começaram a cavar uma rede de trincheiras
ao redor da fortaleza, e montando 44 bombardeios pesados. Os Tercios então
fizeram vários ataques surpresa que custou caro aos otomanos, e isso
provocou os janízaros a atacar com tudo a fortaleza, mas foram pegos de
supresa por uma força de 800 espanhóis que devastou as fileiras dos
janízaros. Barbarossa ficou furioso e ordenou que suas tropas permanecessem
enclausuradas nas trincheiras. Ele ofereceu um ramo de oliveira para
Sarmiento, oferecendo paz e passagem segura para a Itália se ele se render, e
até subornou cada um de seus soldados com 20 ducados de ouro. Os
defensores se recusaram, preferindo morrer combatendo.

Então começou o bombardeio da cidade, e a infantaria invadiu as


muralhas. As perdas foram pesadas para os otomanos, já que os bombardeios
também causaram fogo amigo, enquanto a artilharia espanhola inflingiu um
pesado dano ao inimigo. Então os otomanos recuaram, dando mais um dia
para os espanhóis reforçarem as muralhas, enquanto um bispo chamado
Jeremias confessou a moribunda e manteve a moral da tropa alta. Logo após a
primeira onda de assaltos, um contigente espanhol de 600 soldados de
infantaria saíram da cidade de madrugada e lançaram um ataque surpresa ao
acampamento otomano. Mesmo os janízaros restantes foram pegos de
surpresa, rasgando seu próprio acampamento na tentativa de fugir. Os
espanhóis chegaram muito perto de Barbarossa, que teve que fugir para seus
navios.

No entanto, em 4 de agosto as bombardas otomanas conseguiram


derrubar parte da muralha do castelo e os turcos lançaram uma ofensiva em
larga escala sobre essa posição vulnerável. Os Tercios lutaram bravamente e
conseguiram inflingir pesadas perdas, mas eventualmente foram forçados a
recuar para as muralhas relativamente intactas da cidade, deixando
Barbarossa ocupar a Cidadela. Lutas ferozes continuaram nos dias seguintes,
com os defensores cansados e maltratados ainda conseguindo fazer os
otomanos pagarem caro por cada centímetro de terra tomada. Em 6 de agosto,
a muralha foi bombardeada e derrubada, e Sarmiento foi forçado a recuar
ainda mais para dentro da cidade, agora sem muralha alguma em um dos
lados. Todas as tropas espanholas restantes e o máximo de civis foram
trazidos para o castelo principal da cidade. Sarmiento morreu bravamente
defendendo a cidade e apenas 600 soldados espanhóis sobraram, e eles
lutaram bravamente até a morte, com apenas 100 soldados espanhóis sendo
poupados, mas sendo vendidos como escravos em Constantinopla. Do lado
otomano, mais de 10.000 homens morreram, mas algumas fontes afirmam que
suas baixar foram de cerca de 37.000.

De 1526 a 1568 teve uma pequena guerra entre Ferdinando e John I


Zapolya, apoiado pelos otomanos. Mas apesar da assistência militar de
Solimão, que permitia que Zapolya controlasse a maior parte da Hungria, os
monarcas cristãos pressionaram ele para reconciliar com Ferdinando. O rei da
Polônia Sigismundo I estava ansioso para proteger sua fronteira sul contra os
otomanos, enquanto sua esposa, Bona Sforza, tradicionalmente se opunha aos
Habsburgos, e queria casar sua filha Isabella com Zapolya. Essas duas partes,
junto com enviados do Sacro Império Romano Germânico e do clero local,
forçaram John I a assinar o tratado de Nagyvárad em segredo dos otomanos
em fevereiro de 1538. De acordo com o tratado, Ferdinando aceitou John como
rei da Hungria, enquanto John deu a Hungria ocidental para ele e prometeu
torná-lo seu sucessor. Em fevereiro de 1539, John se casou com Isabella, e
isso chocou os Habsburgos e Ferdinando enviou uma carta ao sultão falando
sobre o tratado, na esperança que Solimão abandonasse Zapolya. A reação de
Solimão não é clara, mas parece que ele esperou para ver o que isso ia dar.

Ao mesmo tempo, Stephen Majláth, que era partidário de Ferdinando,


iniciou uma revolta na Transilvânia na primavera de 1540. John marchou contra
esses rebeldes e obteve uma vitória fácil. Voltando para casa, sua rainha
estava grávida, e em julho ela deu a luz a um filho, John Sigismundo. O
nascimento de seu filho mudou a visão de John Zapolya sobre o tratado, já que
seu filho se tornou herdeiro do trono húngaro. John I morreu apenas duas
semanas depois. O bispo George Martinuzzi liderou alguns nobres que não
desejavam ser governados pelos Habsburgos e em agosto eles rejeitaram as
ofertas de Ferdinando. Menos de um mês depois eles declaram John
Sigismundo como seu rei, com Isabella como regente. Cartas foram enviadas
até Cracóvia e Constantinopla para obter apoio da Polônia e dos Otomanos. No
entanto, não eram muitos que apoiavam a rainha, e muitos nobres feudais
húngaros desertaram para os Habsburgos. Isso permitiu que Ferdinando
tomasse Visegrád, Pecs, Székesfehérvár e outras cidades com relativa
facilidade. Em 21 de outrubro, o general Leonhard von Fels, sitiou Buda, capital
da Hungria. As fontes não são claras, mas as fontes afirmam que uma praga
atingiu o exército sitiante quase imediatamente, enquanto os líderes imperiais
húngaros estavam brigando sobre tudo. Ao mesmo tempo, Martinuzzi espalhou
o boato de que o exército otomano logo estaria perto de Buda. Tudo isso forçou
os Habsburgos a recuar, mas eles não desistiriam facilmente.
Entre fevereiro e março de 1541, o exército imperial da Hungria ocidental
foi reforçado para quase 40.000 soldados, e o comando foi dado a um veterano
do primeiro cerco à Viena, Wilhelm von Roggendorf. Em resposta, o exército de
Solimão, que contava de 20.000 a 50.000 tropas, começou a marchar em
direção a eles. Quando Roggendorf chegou em Buda, a cidade era defendida
por menos de 3000 húngaros e sérvios, no dia 3 de maio. As forças de Isabella
tinham passado os últimos meses reforçando as fortificações da cidade.
Roggendorf tentou negociar com Isabella, prometendo a ela e seu filho a
passagem segura para a Polônia, em troca de Ferdinando assumir a Hungria.
A rainha até estava disposta a negociar, mas suas tropas se opuseram
veementemente e a prenderam. Os Habsburgos decidiram usar sua artilharia
para suavizar as defesas da cidade, e entre 4 e 6 de maio, eles conseguiram
danificar partes das muralhas, mas os defensores conseguiram reparar o dano.
Roggendorf ordenou que seus homens cavassem trincheiras para que a
artilharia pudesse ser trazida mais para perto da cidade. No dia 1 de junho, os
canhões fizeram duas brechas nas muralhas e essas brechas foram atacadas
pelas unidades dos Habsburgos, mas a resistência foi tão eficaz nessas áreas
que os húngaros não apenas conseguiram repelir o ataque, mas contra-atacar,
matando muitos dos que atacaram as brechas.

Infelizmente para os defensores, no final de junho eles perderam mais


da metade de seus números, enquanto os suprimentos estavam acabando. Foi
quando chegou a carta de Solimão dizendo que em breve sua vanguarda
estaria ao alcance. Alguns dias depois, um nobre húngaro chamado Bálint
Török conseguiu chegar na cidade com suprimentos e alguns reforços. No
começo de julho, um grupo que apoiava a rainha tentou abrir os portões para
os Habsburgos, mas os defensores impediram essa tentativa. Em 10 de julho,
a vanguarda da cavalaria otomana começou a perseguir as tropas imperiais do
sul. A tentativa de Roggendorf de esmagar o pequeno grupo otomano falhou,
pois eles recuaram rapidamente. Ao longo de julho, mais e mais tropas
otomanas chegaram na área, o que levou Roggendorf a enfraquecer o círculo
em volta da cidade, e concentrar tropas no flanco sul. Isso provou ser um erro,
pois Solimão chegou na cidade em 20 de agosto, mas ao invés de se juntar às
suas tropas, ele atacou os Habsburgos do leste, destruindo as tropas do leste.
Depois eles massacraram os Habsburgos do sul, e o resto fugiu, com os
otomanos os perseguindo. No total, 20.000 soldados dos Habsburgos foram
mortos, junto com seu comandante, que morreu de seus ferimentos. No
entanto, obviamente isso foi um truque para dominar a cidade pacificamente, e
Buda agora estava nas mãos dos otomanos.

No dia 29 de agosto, Solimão declarou que reconhecia o filho de Isabella


como rei, mas o território de John II seria limitado à Transilvânia e as terras à
leste do rio Tisza. E agora os otomanos tomaram boa parte do reino da
Hungria. Nem Isabella, nem Martinuzzi estavam felizes com suas terras e
influências reduzidas, e então em dezembro de 1541 eles assinam outro
tratado secreto com Ferdinando, prometendo abdicar o trono se ele
conseguisse retomar Buda. Então Ferdinando enviou um exército de 50.000
homens sob o comando de Joaquim II de Brandemburgo para atacar em
agosto de 1542. No entanto, sua movimentação lenta deu tempo para que os
otomanos concentrassem forças em Buda e Pest. Quando Joaquim sitiou Pest,
ela estava totalmente defendida e o cerco foi um completo fracasso.

Entre julho e agosto de 1543, o sultão conseguiu tomar muitas fortalezas


importantes ao norte de Buda, encerrando a campanha com a ocupação de
Esztergom. Os Habsburgos estavam detonados, e como Solimão também tinha
que controlar a situação na fronteira com os Safávidas, um tratado de paz foi
assinado em 1545, negociado pelo rei francês Francisco I. Em 1547, Solimão
assinou o Tratado de Edirne com Carlos V e Ferdinando I, e suas conquistas
na Hungria foram reconhecidas e Solimão aceitou que os Habsburgos
mantivessem partes da Hungria ocidental desde que pagassem 30.000 florins
de ouro anualmente.

Em 1549, Martinuzzi iniciou as negociações com Ferdinando para unir a


Hungria novamente. De acordo com o tratado, Isabella e John II abdicariam o
trono da Hungria em troca de terras da Silésia. Isso fez com que as alianças
entre o bispo e a rainha se rompessem. Isabella mandou uma carta ao sultão
reclamando das ações de Martinuzzi, mas Solimão não fez nada
imediatamente. E depois de uma curta campanha militar, Isabella foi derrotada
e forçada a tomar as terras da Silésia. Martinuzzi tentou jogar em ambos os
lados, esperando obter um acordo ainda melhor dos otomanos ou Habsburgos.
Em 1551, Ferdinando percebeu essa reverência e ordenou a execução de
Martinuzzi. O sultão ficou sabendo e tomou uma decisão rápida de marchar na
primavera do ano seguinte com uma força combinada de supostos 150.000
homens, mas historiadores modernos falam que foi de 40.000 a 50.000.

Como esperado, postos avançados e fortalezas caíram que nem dominó


para os otomanos, com eles capturando Szeged, Veszprém, Buják, Drégely,
Szécsény e Temesvár. Em 4 de setembro eles capturam Szolnok com pouco
esforço. Então os exércitos muçulmanos combinados atacaram Eger, onde
ocorre o famoso cerco de Eger. A guarnição de Eger tinha apenas 2000
homens, liderados por Istvan Dobo. Apesar dos húngaros nativos dentro da
cidade serem jurados ao rei Ferdinando, eles não lutaram por pilhagem ou
glória, mas para proteger suas casas, um terra onde eles cultivaram por
gerações.

Os otomanos chegaram na fortaleza em 11 de setembro, e cinco dias


depois, o bombardeio começou. Pasha Ali liderou o esforço de artilharia,
causando grande dano nas muralhas de Eger. Dobo sistematicamente enviou
onda após onda de cavalaria leve para atacar e assediar os bombardeios
otomanos. Eles causaram algumas baixas, mas essas táticas de bater e correr
se mostraram ineficazes e o bombardeio continuou. Inevitavelmente partes das
muralhas desmoronaram e uma brecha foi criada. A infantaria otomana sob
Kara Ahmed aproveitou e lançou um ataque total às muralhas. No entanto, os
defensores em número muito menor, conseguiram manter a linha, lutando
bravamente ao longo da brecha, em grande parte à bravura e carisma de seu
comandante veterano. A engenharia húngara provou ser crucial, pois
camponeses e soldados repeliram a maré turca dia após dia. O segundo em
comando, Gergely Bornemissza, cimentou seu legado como inventor de uma
série de armas anti-cerco. Graças à sua habilidade, os defensores empregaram
uma espécie de granada de mão primitiva, que causou destruição concussiva e
espalhou fogo pelas fileiras inimigas. Mas o mais icônico instrumento de
destruição inventado por Bornemissza foi um veículo improvisado da morte
formado por um conjunto de duas rodas de moinho cheias no centro com
explosivos e chamas, que rolava colina abaixo massacrando os otomanos.
(Mulheres de Eger, por Bertalan Székely)

Na virada do mês, os comandantes otomanos cansaram da ineficácia da


infantaria. Os assapes começaram a cavar os túneis, colocando minas
explosivas para minar as fundações das muralhas. No entanto, Dobo montou
uma série de contraminas que obliteraram os assapes otomanos. A moral do
exército otomano começou a ficar baixa, com as rações de comida sendo
reduzidas e as fortes chuvas de outono começando a cair, formando um inferno
lamacento. Para completar, os dois comandantes, Khadim Ali e Kara Ahmed,
começaram a brigar fortemente entre si. Em 11 de outrubro, os otomanos
lançaram um ataque final pelas muralhas danificadas de Eger, e mais uma vez
os defensores resistiram, muitos jogando óleo quente nos invasores. Depois de
dois dias, os otomanos se retiraram, e em 17 de outubro os dois vizires
ordenaram a total retirada da fortaleza. Estimativas modernas afirmam que
apenas 300 defensores húngaros morreram, enquanto mais de 8000 otomanos
morreram. No entanto, apesar do heroísmo dos habitantes de Eger, os
otomanos conseguiram capturar outras 24 fortalezas húngaros durante essa
investida.

Devido à importância dos cavaleiros hospitalários, Carlos V deu a eles a


ilha de Malta, junto com a de Gozo e a cidade de Trípoli. Em Malta, os
hospitalários recomeçaram sua atividade corsária contra os otomanos, e a
partir de 1550 se tornaram um grande incômodo para Solimão. Em 1551,
Dragut atacou os hospitalários em sua porta, devastando a ilha de Gozo e
escravizando quase toda a sua população. No entanto, ele foi repelido pelos
cavaleiros quando tentou tomar Malta. Dragut então apreendeu a guarnição
dos cavaleiros em Trípoli e a usou para lançar ataques. Nos próximos anos,
Dragut conseguiu ocupar partes das ilhas Baleares e da Córsega, o que
provocou um contra-ataque cristão. Em 1560, os Hospitalários se juntaram à
Coroa Espanhola, Veneza, Gênova e outros, em uma aliança para retomar
Trípoli dos otomanos. No entanto, sua frota foi atacada por Dragut na batalha
de Djerba e foi derrotada decisivamente. Os hospitalários sabiam que um
ataque à Malta estava próximo.

Em 1557, os hospitalários elegeram o francês Jean Parisot de La Valette


para ser o seu grão-mestre. Sob La Valette, os cavaleiros reabasteceram a sua
frota que tinha sido devastada em Djerba. Eles começaram a reforçar os três
fortes principais da ilha: Santo Ângelo, Santo Elmo, e São Miguel. Mais
importante, os hospitalários embarcaram em uma nova onda de pirataria, e
conseguiram capturar os governadores otomanos de Alexandria e Cairo.
Para invadir Malta, Solimão nomeou o vizir Mustafa Pasha como
comandante de seus exércitos. Ao lado dele estavam o almirante Piali Pasha e
Dragut. A maioria das fontes colocam o exército otomano como tendo 40.000
homens. La Valette ordenou que todos os edifícios fora da cidade fossem
destruídos para eliminar a cobertura de atiradores de elite. Os camponeses
locais foram ordenados a colher todas as suas colheitas e trazê-las para dentro
da fortaleza, deixando a terra estéril para os invasores, enquanto suprimentos
adicionais foram trazidos da Sicília. Acreditando que os otomanos iriam atacar
Birgu primeiro, La Valette ordenou que seus cidadãos fossem evacuados para
a cidade interior de Mdina. Apenas cerca de 500 cavaleiros defendiam Malta, e
completando suas fileiras havia 3000 milícias maltesas. Os nativos da ilha não
gostavam dos hospitalários, e os viam como exploradores, mas eram devotos
católicos e defenderiam sua ilha até a morte contra os invasores muçulmanos.
No dia 9 de abrill de 1565, a ajuda chegou na forma de 1000 soldados
profissionais espanhóis e italianos dos Habsburgos, enviados por Don Garcia
de Toledo, vice-rei da Sicília. Don Garcia informou La Valette que ele estava
reunindo mais reforços, mas que eles demorariam meses para chegar.

A grande frota turca chegou na ilha em 18 de maio, e eles


desembarcaram suas galeras sete milhas ao sul do Grande Porto do Cavaleiro.
Então o exército otomano desembarcou e marchou em direção a Birgu,
enquanto eram perseguidos pelos hospitalários lutando uma guerra de
guerrilha. No entanto, os invasores atingiram as muralhas das grandes
cidadelas portuárias. Eles estabeleceram seus grandes canhões em Santa
Margherita e Mt. Scriberras, colinas estratégicas que davam para o grande
porto. Em 21 de maio, Piali Pasha ordenou um assalto a Birgu, mas que foi
repelido por um regimento de soldados espanhóis. No dia seguinte, a hoste
turca avançou sobre Senglea, mais uma vez fazendo pouco progresso na
cidadela muito bem defendida.

Mustafa Pasha defendia que eles tinham que atacar primeiro Mdina, que
estava menos defendida, porque é para lá que os civis fugiram, e tomando o
forte, iria acabar com a moral dos cristãos. No entanto, Piali Pasha defendia
que eles tinham que tomar o Forte São Elmo, que era crucial para a vitória. No
final, eles decidiram atacar o Forte São Elmo, e La Valette despachou 150
cavaleiros para ajudar os defensores lá. Encorajados pelo movimento lento da
artilharia otomana, alguns cavaleiros saíram do Forte e envolveram o comboio
em uma escaramuça, mas ambos os lados sofreram perdas e o avanço
otomano não foi parado. Em 24 de maio, os escavadores otomanos
estabeleceram trincheiras a meros 600 passos das muralhas de São Elmo.
Assim, o bombardeio começou. Os canhões otomanos conseguiram danificar
as muralhas, deixando seus defensores presos dentro do Forte,
impossibilitanto um contra-ataque. La Valette observava tudo e ordenou que
sua artilharia disparassem através do porto contra o canhão otomano. Isso teve
um efeito devastador, causando caos entre as fileiras turcas, levanto até uma
pedra acertar Piali Pasha, que o deixou inconsciente e seus homens pensaram
que ele tinha morrido.

No entanto, quando a noite caiu, ficou claro que os otomanos


inevitavelmente romperiam as muralhas de São Elmo. Então o comandante do
forte implorou a La Valette que permitisse que seus homens abandonassem
seus postos e voltassem para São Ângelo. O grão-mestrer recusou, falando
que eles tinham que aguentar o máximo de tempo possível até chegar reforços.
Nos dias seguintes, os atiradores de elite otomanos apontavam para os
artilheiros em São Ângelo, mantendo-os presos e fornecendo cobertura para
seus artilheiros. Em 29 de maio, os assapes começaram a cavar trincheiras em
direção às muralhas de São Elmo. Naquela noite, duas companhias de
soldados espanhóis saíram do forte sob o manto da escuridão e lançaram um
ataque surpresa aos otomanos indefesos. Muitos escavadores foram
massacrados, mas rapidamente os janízaros acordaram e conseguiram
empurrar os espanhóis de volta para dentro do forte.

Em 2 de junho, Dragut finalmente chegou com sua frota de 13 galés e


1500 homens. Nesse ponto, os hospitalários estavam navegando em balsas
ágeis pelo porto sob a calada da noite para fornecer suprimentos frescos a São
Elmo vindos da Sicília. Dragut estabeleceu novas baterias de artilharia em
Gallows Point e em frente ao porto de Marsamxett, colocando-o em posição de
disparar contra qualquer navio de suprimentos, isolando ainda mais São Elmo
do resto da ilha. No entanto, em 9 de junho, um destacamento de cavalaria de
Mdina lançou uma emboscada contra os artilheiros otomanos em Gallows
Point, dispersando-os temporariamente e permitindo que as balsas de
suprimentos aliviassem São Elmo mais uma vez.

Em 3 de junho, uma ofensiva janízara conseguiu superar o revelin


triangular da fortaleza de São Elmo. De lá, eles construíram rampas de madeira
e se esconderam para subir nas paredes internas de São Elmo. Os cavaleiros
hospitalários, espanhóis e malteses manteriam a brecha, causando centenas
de baixas aos otomanos. A infantaria otomana se jogou sobre os escombros
nos dias 10, 15 e 16 de junho, mas foi repelida três vezes, com os malteses
lutando com tanta bravura quanto os hospitalários. Cada dia que São Elmo
resisitia, era um dia a mais para as fortalezas de Santo Ângelo e São Miguel se
fortalecerem e mais perto estava os reforços de Don Garcia de chegar.
("El Sitio de Malta" - pintura de Egnazio Danti do século XVI (Museu do
Vaticano). Ao fim da península que forma o Monte Sceberras, ocupada pela
artilharia turca, se encontra o Forte de São Elmo, onde ainda resistiam os
cavaleiros de Malta (atenção às bandeiras). No outro lado do Gran Puerto
pode-se ver Birgu e Santo Ângelo (com uma grande bandeira da ordem),
assediado por todos os pontos, exceto por Sengela e São Miguel. Abaixo, à
esquerda, mostra-se o plano de Valeta - aí denominada Melita, Mata em latim -
coroado por São Elmo.)

Em 17 de junho, Dragut foi mortalmente ferido nas trincheiras turcas.


Algumas fontes falam que foi fogo amigo e outras falam que foi um atirador de
São Ângelo, mas de qualquer modo ele foi afastado do combate. Em 22 de
junho, os janízaros concluíram uma ponte sobre a vala da fortaleza, permitindo
que o grosso das tropas otomanas atacassem as muralhas de todos os lados.
Os defensores resistiram por uma noite final, mas em 23 de junho, eles foram
finalmente dominados. Os cavaleiros de São Elmo morreram lutando quase até
o último homem. Nesse mesmo dia, Dragut morreu. A vitória sobre São Elmo
foi uma vitória pírrica aos otomanos, que perderam 6000 homens, junto com
mais da metade de seus janízaros, enquanto os defensores perderam 1500
homens.

Então agora era a vez de São Miguel ser bombardeada. Em 15 de julho,


1500 corsários atacaram Senglea pela terra, e 1000 janízaros tentaram um
ataque anfíbio. No entanto, um desertor grego avisou La Valette sobre o plano
de Mustafa, e os cavaleiros construíram uma paliçada de pregos na enseada
para evitar um desembarque otomano pelo mar. Eles também montaram uma
bateria na parede voltada para o mar, que fez chover fogo sobre as
embarcações de desembarque turcas, afogando centenas. E ainda, o ataque
por terra foi repelido.

O próximo grande confronto veio em 7 de agosto, Mustafa Pasha


ordenou uma invasão em larga escala, com 12.000 homens atacando as
muralhas de Birgu e Senglea, com peso total da artilharia turca golpeando os
defensores. As muralhas de Birgu foram reduzidas a escombros, e os
otomanos começaram a entrar na cidade pressionando os cavaleiros. Lutas
pesadas se seguiram nas ruas da cidade, e à medida que os turcos
avançavam, parecia que o porto finalmente cairia. No entanto, mais uma vez
Malta foi salva por pura sorte. Um contigente de 100 cavaleiros espanhóis e
cavaleiros saindo de Mdina por acaso pegou o acampamento otomano
desprotegido. Eles atacaram, massacrando os doentes, incenerando tendas, e
destruindo suprimentos. Quando essas notícias se espalharam para os
otomanos em Birgu, eles entraram em pânico. Acreditando que uma força
muito maior havia chegado, eles recuaram das muralhas da cidade, de volta ao
acampamento. A essa altura, a moral otomana estava extremamente baixa.
Além disso, Piali e Mustafa brigavam toda hora, e Solimão enviou uma carta
para Mustava descrever como estava indo o cerco.

Na virada do mês, Mustafa ordenou uma marcha sobre Mdina, apenas


para serem recebidos por balas de canhão. Os otomanos pensaram que eles
tinham muita munição de canhão e decidiram ir embora, mas era um blefe na
verdade, e eles tinham pouca munição. Em 7 de setembro, a salvação de Malta
finalmente chegou. Após meses de atraso, Don Garcia desembarcou na baía
de São Paulo com 8000 homens. Ao ver essa força, os otomanos finalmente
perderam sua determinação e fugiram para seus navios. Alguns cavaleiros
zelosos, atacaram os turcos em retirada, forçando a força de socorro de Don
Garcia a se juntar a eles em uma carga geral que viu centenas de soldados em
fuga serem massacrados. Em 13 de setembro, o exército otomano que restou
saiu de vez de Malta. Os defensores perderam 2500 soldados e um terço da
população da ilha, enquanto os otomanos sofreram pelo menos 10.000 baixas,
com algumas fontes estimando em até 30.000.

A última campanha de Solimão foi em 1566, no cerco de Szigetvar. Em


1561, o rico Melchior Balassa da Hungria desertou para Ferdinando I, trazendo
a maior parte do território húngaro para fora da Transilvânia e os pashiliks
otomanos diretos com ele. Sem apoio otomano, a tentativa de John II Zapolya
de trazer Balassa de volta terminou em um desastre na batalha de Hadad em
1562. Tensões étnicas na Hungria oriental também causaram mais revoltas, e
além disso, John se converteu ao Protestantismo, alimentou a divisão da corte
na Hungria, fortemente católica. Então Solimão, já velho e com gota, reuniu seu
exército em 1566 para atacar novamente Eger, para tomar a cidade e continuar
até Viena. Mas Solimão estava muito fraco para liderar ele mesmo o exército,
que caiu na mão do ambicioso vizir Sokollu Mehmed Pasha. Em Belgrado eles
se encontraram com John II Zapolya, juntando tropas e prometendo trazer toda
a Hungria para a mão de seus vassalos. Nesse meio tempo, Sokollu capturou
as cidades de Dvor e Krupa, na Bósnia moderna.

Enquanto Solimão e seu grão-vizir marchavam em direção a Eger, um


pequeno exército dos Habsburgos, composto principalmente de croatas, atacou
a cidade de Siklos ao sul de Solimão, expulsando o exército otomano vindo da
Grécia. Esse exército húngaro-croata era liderado por Nikola Subic Zrinski, um
general que tinha lutado no cerco de Viena décadas antes. Após sua vitória em
Siklos, ele executou o comandante otomano Sanjak-bey Mohammed de
Trikala. Isso atraiu a ira de Solimão, já que esse comandante era seu favorito.
Com isso, os otomanos deixaram a marcha para Eger, e foram para Szigetvar.
Além disso, a mudança de rota de Solimão para essa cidade, fez com que
várias cidades do norte da Hungria caísse para os austríacos. Mas com um
exército de mais de 100.000 homens, enfrentando menos de 3000 em
Szigetvar, Solimão esperava que fosse um cerco fácil.

Solimão chegou em Szigetvar no dia 5 de agosto de 1566. No entanto,


apesar de ter menos homens, o layout da fortaleza da cidade era complexo,
porque estava situada em três ilhas pequenas ligadas por uma ponte, e com
quatro pontes ligando as duas ilhas maiores à terra. Apesar do apoio de
grandes baterias de canhões otomanos, o ataque foi repelido com pesadas
perdas, e apesar de ter muito menos armas, os defensores conseguiram
realizar uma contra-barreira eficaz contra os canhões otomanos. No entanto,
essa vitória durou pouco. Sob a liderança agressiva de Sesuvar Bey, os
otomanos lançaram outro ataque feroz em 9 de agosto, capturando a Cidade
Nova, o primeiro dos três castelos. No entanto, para tomar isso, os otomanos
perderam 3000 homens, enquanto os defensores perderam apenas 300.

A Cidade Velha era ainda mais difícil de tomar, bem defendida e difícil
de abordar. A Cidade Nova os otomanos podiam vir de dois lados, por duas
pontes. Agora eles só podiam vir de uma ponte. No entanto, Sesuvar tinha
pouca paciência para uma estratégia mais elaborada, simplesmente fazendo
ofensivas diretas. Após dez dias, a Cidade Velha também caiu, em 19 de
agosto. Com apenas a Cidadela sobrando e os homens de Zrinski diminuindo,
o doente Solimão ofereceu condições favoráveis de rendição na esperança de
evitar mais tempo perdido. Se Zrinski entregasse a Cidadela, ele seria feito
senhor de toda a Croácia, como um vassalo dos otomanos. No entanto, após
esperar por reforços austríacos que nunca chegaram, Zrisnki se recusa e
decide lutar até a morte.

Aproveitando das águas mais rasas, o exército otomano usou detritos


para construir suas próprias calçadas para abrir mais pontos de ataque. Os
dois primeiros assaltos à Cidadela foram um fracasso, e após outro fracasso no
dia 1 de setembro, os implacáveis otomanos cessaram o ataque, depois de um
mês de cerco. No dia 5 de setembro, os assapes detonaram as minas nas
muralhas e uma explosão massiva destruiu um canto da muralha, criando uma
brecha e incendiando muitos dos edifícios internos. No entanto, nos próximos
dois dias nenhum ataque ocorreu, porque Solimão, o Magnífico, havia morrido
em sua tenda, aos 72 anos de idade. Mas para manter a moral da tropa,
Sokollu manteve isso em segredo por 48 dias.

Quando os otomanos prepararam um ataque final em 7 de setembro.


Após um discurso emocionante dito às suas tropas, Zrinski abriu a porta da
fortaleza e um grande morteiro disparou contra as tropas otomanas
concentradas na calçada da ponte em preparação para o ataque final. Com as
fileiras dos janízaros lançadas ao caos, Zrinski liderou seus soldados
remanescentes em um ataque frontal contra o inimigo, tomando a calçada
antes de ser envolvido pelos milhares da janízaros da Cidade Velha. O próprio
Zrinski foi atingido por duas balas e morto quando a carga começou, mas os
homens que ele liderou lutaram até o fim. Mas isso não foi o fim, porque
quando os otomanos entraram na Cidadela, o paiol de pólvora explodiu,
matando mais 3000 otomanos, depois de um cerco que já tinham lhe custado
20.000 por pouco ganho tangível. Essa última batalha de Solimão foi uma
vitória, mas uma vitória pírrica. E além disso, os otomanos não continuaram até
Viena, pois o inverno estava próximo deles. Sokollu Mehmed Pasha negociou o
tratado de Adrianópolis com os Habsburgos em 17 de setembro de 1568, com
o imperador Maximiliano pagando 30.000 ducados ao novo sultão Selim II e
concedendo aos otomanos autoridade sobre a Transilvânia, Moldávia e
Valáquia.
Durante o reinado de Solimão o Magnífico, outras áreas importantes vão
ser conquistadas. Em 1534, a Tunísia é conquistada, mas perdida um ano
depois. Em 1551, o norte da Líbia é conquistado, ligando o norte da Argélia
otomana com o Egito otomano. Em 1553, uma faixa litorânea do Egito até o
Sudão e o golfo de Aden é conquistada. Em 1554, o Iraque e parte do litoral
leste da Arábia é conquistado, mas essa última é perdida em 1559 e retomada
em 1560. Já em 1569, sob o novo sultão Selim II, os otomanos conquistam de
vez a Tunísia e anexam o norte da ilha da Sumatra, no arquipélago da
Indonésia. No entanto, a presença do islamismo na região já é antiga. Com a
chegada de comerciantes árabes de Gujarate (Índia) no século XII, o islã se
tornou a religião dominante na maior parte do arquipélago, iniciado no norte de
Sumatra. Outras áreas da Indonésia gradualmente adotaram o islamismo, o
que o tornou a religião dominante em Java e Sumatra no final do século XVI. O
islamismo se misturou a influências culturais e religiosas da região, que
moldaram a forma predominante do islamismo na Indonésia, particularmente
em Java. Sultanatos islâmicos como o de Mataram e de Bantém se instalaram
na região. Essa presença otomana no norte de Sumatra só vai acabar no final
do século XIX.

No início de seu governo, Selim II, que já era considerado fraco,


enfrentou um motim dos janízaros, onde eles exigiam pagamentos e privilégios
adicionais antes mesmo que o novo sultão pudesse entrar em Constantinopla.
Foi o grão-vizir Sokollu Mehmed Pasha que abriu o tesouro para os janízaros e
acalmou seu motim. A pirataria rolava solta no Mediterrânea, praticada por
cristãos e muçulmanos. O maior refúgio de pirataria era o Chipre, que era dos
venezianos, e tinha uma população majoritariamente cristã ortodoxa, e as
relações estavam longe de ser amigáveis com seus senhores católicos. Os
venezianos mantinuam grandes guarnições em cidades como Famagusta e
Nicósia, mas foram muito negligentes na manutenção e atualização dessas
fortificações. Além disso, Veneza pagava um tributo de 150.000 ducados
anuais aos otomanos para manter o Chipre.

Da mesma forma, os otomanos não conseguiram controlar a expansão


do czarado russo, que estava começando a crescer. No passado, os otomanos
tinham apoiado a Moscóvia contra os católicos da Comunidade Polaco-Lituana.
Então começa a Guerra Russo-Turca de 1568 a 1570, a primeira entre as doze
que tiveram. Em 1556, o Canato de Astracã na foz do rio Volga no Mar Cáspio
foi conquistado por Ivan, o Terrível, que tinha uma nova fortaleza construída
em uma colina íngreme com vista para o Volga. Em 1568, o grão-vizir Sokollu
Mehmet Pasha, que era o verdadeiro poder na administração de Selim II,
iniciou o primeiro encontro entre o Império Otomano e seu futuro arqui-rival do
norte. Os resultados pressagiaram os muitos desastres que estão por vir. Um
plano para unir o rio Volga com rio Don por um canal foi detalhado
em Constantinopla.

No verão de 1569, uma grande força Kasim Paşa de 20.000 turcos e


50.000 tártaros foi enviada para sitiar Astrakhan e começar as obras do canal,
enquanto uma frota otomana cercou Azov. No entanto, uma sortie da
guarnição Knyaz (príncipe) Serebrianyi-Obolenskiy, o governador militar de
Astrakhan, dirigiu de volta os sitiantes. Um exército de socorro russo de 30.000
atacou e dispersou os operários e a força tártara enviada para sua proteção. A
caminho de casa, até 70% dos soldados restantes e os trabalhadores
congelaram até a morte nas estepes ou tornaram-se vítimas dos ataques
de Circassianos. A frota otomana foi destruída por uma tempestade. O Império
Otomano, embora militarmente derrotado, insistiu em uma passagem segura
para peregrinos e comerciantes muçulmanos da Ásia Central, bem como na
destruição do forte russo no rio Terek.

Selim II culpou Sokollu pela derrota otomana contra a Rússia, e então


ele começou a cair na influência de Joseph Nasi, um rico judeu sefardita de
origem portuguesa. Rapidamente esse judeu foi feito duque de Naxos, e conde
de Andros e Paros, mas ele desejava ser rei do Chipre. Selim II é convencido e
então envia uma carta aos venezianos exigindo que eles entregassem o
Chipre. Os venezianos então desesperados começam a buscar aliados por
todos os lados. O doge de Veneza, Pietro Loredan, imediatamente começou a
reunir aliados, solicitando o papa Pio V que intercedesse em seu nome por
uma aliança com os Habsburgos. Com o Chipre ameaçado, Pio V abriu os
cofres dos Estados Papais, enviando 100.000 ducados para apoiar o esforço
de guerra veneziano. Filipe II concordou rapidamente, porque sua defesa naval
contra os otomanos no Mediterrâneo Ocidental dependia de subsídios papais e
de Veneza. Gênova, recentemente magoada com a recente perda de Quios,
também prometeu a sua frota sob o comando de Giovanni Andrea Doria.
Urbino, Saboia, Parma, Toscana, e os cavaleiros de Malta também ajudaram
com participantes menores.

A frota de Veneza partiu com 80 galés sob o comando de Girolamo


Zanne em 30 de março de 1570, mas duas semanas depois foi prejudicada por
um surto de doença em Zara. Levaria dois meses até que a frota veneziana
entrassem em movimento novamente. Enquanto isso, Piali Pasha trouxe sua
frota combinada de 140 galés, 30 galiotas e 170 transportes para o Chipre.
Nesses navios estavam 6000 janízaros de elite, 12.000 de cavalaria Sipahi e
14.000 soldados e marinheiros voluntários. O contigente maltês foi emboscado
e derrotado por Uluch Ali, e a frota veneziana reagrupou em Corfu. Enquanto
isso, o comandante Lala Mustafa desembarcou no Chipre em 1 de julho, e
começou o cerco de Nicósia, a capital mais bem defendida da ilha. Infelizmente
para os venezianos, sua defesa coube a Niccolo Dandolo, um comandante
inexperiente e sem talento. A defesa de Dandolo foi totalmente estática, com
nenhuma tentativa de interromper ou atrasar o cerco dos turcos. A defesa
desaijeitada de Dandolo em Nicósia durou apenas um mês e meio. Em 9 de
setembro, as muralhas foram rompidas e a cidade caiu pouco depois. Dandolo
e o resto dos defensores venezianos foram mortos à espada, e a pilhagem da
rica cidade começou.

Com a queda de Nicósia, a maior parte dos fortes do Chipre se rendeu


sem resistência aos otomanos. O único reduto remanescente era o porto de
Famagusta, sob o comando do governador Astorre Baglione e do general
Marco Bragadino. Em contraste com Dandalo, Baglione tinha feito uma
atualização defensiva há muito esperada nas fortificações de Famagusta. A
riqueza de Nicósia lhe deu algum tempo, já que muitos dos janízaros e Sipahis
voltaram para casa depois do grande lucro com a pilhagem.

No mar, Veneza fez alguns ataques menores nas Cíclades otomanas,


que ajudaram a interromper a campanha otomana no Chipre. Os genoveses,
espanhóis e venezianos chegaram na ilha de Creta, e os otomanos não
decidiram combatê-los. Ao invés disso, eles foram com o tesouro de Nicósia
para Constantinopla, o que fez com que Piali Pasha caísse em desgraça e seu
comando fosse revogado. No final de janeiro de 1571, o comandante
veneziano Quirini conseguiu trazer uma força de socorro de soldados e
suprimentos para Famagusta de Creta, destruindo no processo uma bateria
otomana e três galés. Os passageiros otomanos se tornaram remadores
escravos da marinha veneziana, mas os peregrinos ficariam como reféns com
Bragadino.

A campanha séria começou no início de abril de 1571. Para os cristãos


que estavam em Creta, Dom João da Aústria foi colocado no comando geral,
criando um comando mais organizado. Enquanto isso, em Famagusta,
Baglione estava defendendo ferozmente a cidade com seus números bem
menores de 9000 homens. Baglione mandou inúmeras surtidas devastadoras,
massacrando tripulações de armas otomanas e queimando obras de cerco. A
cavalaria albanesa estava acostumada com todo o seu efeito mortal, causando
um estrago nos otomanos sitiantes. Baglione liderou vários ataques, e em um
caso foi desafiado para um combate pessoal por um oficial otomano. Baglione
feriu mortalmente o homem e o trouxe de volta à cidade para desfilar diante
dos defensores.

No entanto, isso não foi suficiente e em 19 de maio, as trincheiras de


cerco otomanas cercaram completamente a cidade. No dia 21 e 29 de maio,
enormes minas foram lançadas sobre a muralha por assapes e embora cada
ataque fosse derrotado com pesadas perdas, os defensores estavam
diminuindo rapidamente. Lala Mustafa deu a eles termos de rendição, mas a
cidade ainda resistiu por todo o mês de junho e até meados de julho, quando
os otomanos estavam fazendo assaltos através das muralhas quebradas quase
diariamente. Em 9 de julho, uma seção da muralha sul foi derrubada por uma
mina veneziana que detonou prematuramente, matando turcos e venezianos
ao desmoronar em meio a um feroz ataque otomano. Finalmente em 1 de
agosto, o teimoso Bragadino levantou a bandeira branca acima de Famagusta.
No entanto, antes de fazer isso ele fez um último ato de resistência rancorosa,
executando os reféns peregrinos e os estoques de alimentos, munições e
algodão valiosos de Famagusta foram queimados para negar seu uso aos
otomanos.
Lala Mustafa ainda ofereceu termos favoráveis. Os cerca de 500
venezianos restantes poderiam deixar a cidade sob sua própria bandeira, e os
habitantes cipriotas poderiam sair imediatamente ou até dois anos após a
rendição da cidade. Nos primeiros quatro dias, a evacuação foi bastante
tranquila. No entanto, esses termos exigiam o regresso dos peregrinos em
segurança. Quando esses não se apresentaram, o próprio Bragadino foi
convocado ao acampamento otomano em 5 de agosto. Então as orelhas e
nariz de Bragadino foram cortadas, ele foi preso e depois executado. Isso foi
acompanhado de um massacre geral e a pilhagem descontrolada da cidade.

Agora voltando um pouco aos conflitos entre otomanos e portugueses,


um conflito importante é a guerra na África, mais precisamente na Etiópia.
Quando os exploradores portugueses chegaram pela primeira vez na Etiópia
durante as primeiras incursões pelo oceano Índico. Para os portugueses
parecia um reino exótico e eremita, escondido do mundo e da passagem do
tempo. Para eles, esse reino era devotamente cristão governado pela lenda da
época das Cruzadas de Prestes João, cercado de estados muçulmanos
costeiros e tribos pastoris. Eles não estavam muito errados, porque a Etiópia
era cristã desde 330 quando o reino de Axum se cristianizou mais ou menos na
mesma época que Roma. Mas eles erraram em achar que era um reino
eremita, porque eles negociavam e entraram em conflito com Roma e com a
Pérsia várias vezes, até dominando partes do sul da Arábia por um bom tempo.

No entanto, o Oceano Índico era praticamente dominado pelos


comerciantes e navios muçulmanos antes das Grandes Navegações.
Comerciantes e dinastias muçulmanas se estabeleceram ao sul de Zanzibar,
uma ilha da atual Tanzânia. Embora os sultanatos rivais tenham surgido e
caído entre os somalis, nenhum foi capaz de criar um único estado para
unificar as regiões costeiras do chifre da África, deixando-os geralmente aceitar
a suserania etíope. Os mercantes muçulmanos dominavam a região, mas
impostos e tributos iam parar na mão de Negus, rei da Abissínia, e escravos e
marfim da Etiópia fluíram inabaláveis para mercados no Egito e na Índia. Uma
delegação etíope chegou a aparecer no concílio de Florença em 1441, onde
foram recebidos com entusiasmo como súditos de Prestes João, apesar de
Negus se chamar na verdade Zara Yakob.
Ao longo do século XIV, a coisa mais próxima de um rival muçulmano ao
império etíope foi o sultanato de Ifat, sob a dinastia Walasma, ao sul da Etiópia.
Esse sultanato era governado por uma elite mercantil costeira, muitas vezes
leais a Negus, e com uma população pastoril e semi-nômade. Uma tentativa do
sultão Sabradin de invadir a Etiópia em 1332 levou o rei guerreiro Amda Seyon
a saquear e conquistar a maior parte de Ifat. Outros conflitos nas décadas
seguintes levaram a total anexação do sultanato sob o neto de Amda, Dawit,
em 1403. Quando Ifat desmoronou, a dinastia Walasma se dividiu em duas –
alguns membros da família governante optaram por permanecer nas antigas
terras de Ifat, mantendo alguma riqueza e influência. Os ramos mais militantes
da família se dirigiram para o leste, fundando o sultanato de Adal, centrado em
Harar. No século seguinte, crises de sucessão e monarcas fracos
enfraqueceriam o domínio da Etiópia sobre seus vizinhos muçulmanos
costeiros e a cada vez mais poderosa nobreza feudal cristã, enquanto Adal
prosperava com o comércio e reforçava seu poderio militar através da
conversão de pastores afar e somalis ao Islamismo.

Ainda assim, em 1516, a Etiópia permaneceu forte e com a ajuda de


uma frota portuguesa, Negus Lebna Dengel obteve uma vitória significativa
contra Adal, matando seu sultão Mahfuz e até queimando a antiga capital de
Ifat, Zeila. Em 1517, o sultão otomano Selim conquistou o Egito e Adal seria
rápido em estabelecer laços com este novo e poderoso vizinho, garantindo a
aquisição de armamentos modernos que a Etiópia não tinha. Os otomanos
viam Adal como aliado para bloquear os portugueses no mar Vermelho. Mas a
crise de sucessão causada pela morte de Mahfuz levou ao usurpador e ex-
soldado Imam Ahmad ibn Ibrahim a tomar o poder em 1520. Em 1529, ele
lançou suas primeiras incursões na Etiópia, desafiando Lebna Dengel e
provocando uma guerra.

O primeiro encontro entre os dois reis foi uma vitória decisiva para Imam.
Reforçado por armas de fogo otomanas e possivelmente até um contigente de
tropa otomanas, Imam inflingiu pesadas baixas ao maior exército etíope antes
de expulsá-lo do campo pantanoso na batalha de Shimbra Kure. Após isso,
Iman marchou para o norte e acabou com o poder etíope nas regiões
majoritariamente muçulmanas de Shewa e Amhara. O general etíope Wasan
Sagad, encarregado de proteger as províncias do sul e leste após a retirada de
Lebna Dengel, foi morto em batalha em Monte Busat em 1531. Durante a
segunda batalha entre Lebna Dengel e Imam em Ambassel em 1533, perto do
rio Bashilo, Lebna Dengel quase foi capturado por vitorioso Imam. No final de
1533, apenas as terras altas centrais fortificadas permaneceram etíopes.

Nas áreas mais cristãs, a resistência foi mais dura contra o avanço de
Imam. Axum representou um grande prêmio para Imam, sendo a sede do
primeiro grande império etíope. No entanto, aqui, alguns convertidos cristãos
turcos forneceram aos defensores etíopes suas próprias armas de fogo.
Embora Axum caísse junto com toda a região de Tigray depois de um cerco
difícil, com Imam destruindo a Igreja de Maria de Sião como punição por sua
forte resistência, eles impediram seu avanço até 1533. Após a queda do
complexo real de Amba Geshen, Lebna Dengel passou o resto da vida como
um fugitivo dentro de seu próprio reino, muito semelhantes aos anos finais do
Império Sassânida. A fome devastou as terras altas, cortou os tributos das
colheitas, e sujeitos a ataques frequentes.

Mas nem tudo estava perdido para o reino salomônico, porque logo
chegariam um novo player na jogada: os portugueses. Em 1535, com seus
próprios exércitos em fuga, o imperador etíope vencido enviou um pedido de
socorro ao rei de Portugal, Dom João III. A ajuda portuguesa não chegaria
durante sua vida, mas seu pedido salvou o reino. Pouco depois da ascenção
de seu filho Galawdewos, 400 mosqueteiros portugueses, junto com muitos
artesãos e armeiros, chegaram no porto de Massawa em fevereiro de 1541,
onde pequenos contigentes de guerreiros etíopes se juntaram a eles. Sebla
Wangel, mãe do novo rei, serviu como guia enquanto marchavam na
esperança de unir suas forças às forças de seu filho. Avançando para a região
de Tigray, eles venceram várias batalhas decisivas, apesar do número muito
superior das guarnições adalitas. O próprio Imam for ferido durante uma
derrota total em Jarte, levando ao cronista Miguel de Castanhoso, a declarar
que com cem cavalos para perseguir, toda a ameaça de Adal poderia ter
acabado.

No entanto, as chuvas retardaram o avanço dos portugueses em Tigray,


e várias fortalezas mantidas pelos adalitas ainda estavam entre Imam e
Galawdewos. Enquanto a população local apoiava o comandante português
Cristóvão da Gama como um companheiro cristão, as forças adalitas
continuaram a ser uma ameaça sempre presente. Em 1542, a guerra lusa-
otomana mais ampla estava no auge. Quando o pedido de socorro de Imam
trouxe a notícia da presença portuguesa na Etiópia a Solimão, a guerra de Adal
se tornou uma nova frente contra um grande rival. Solimão autorizou uma
expedição considerável para entrar na guerra do lado adalita. De Zabid, no
Iêmen, 900 soldados turcos e 2000 árabes embarcaram pelo Mar Vermelho
para ajudar seu aliado africano.

Quando Cristóvão da Gama retornou a Wofla em agosto de 1542,


recém-saído de sua vitória conquistando Ambassel, ele estava
involuntariamente entrando nas garras de um exército adalita-otomano muito
maior. Em 28 de agosto, a expedição portuguesa foi destroçada na batalha de
Wofla. Cerca de 120 portugueses conseguiram escapar junto com Sebla
Wangel, enquanto o resto caiu em batalha ou se tornaram prisioneiros do
sultão. Mas esses 120 se juntaram com Galawdewos, e como seu excesso de
pólvora e suprimentos havia sido armazenado com segurança em Ambassel,
eles conseguiram armar e treinar vários etíopes para lutar como mosqueteiros.
Em 6 de fevereiro de 1543, Galawdewos marchou para o lago Tana à frente
desse novo exército combinado. Então ocorre a batalha de Wayna Daga em 21
de fevereiro, onde apesar de estarem em menor número, eles pegaram as
tropas adalitas de Imam de surpresa, e apesar dos adalitas lutarem com
bravura e competência, Imam foi morto atingido por uma bala, e seu exército
perdeu completamente a moral. Apesar de perderem, a maior parte das tropas
de Imam sobreviveu após se render.
(Queima de Igrejas Muçulmanas e a Morte de Cristóvão da Gama e a Queda e
Morte de Ahmad ibn Ibrahim al-Ghazi Baleado por um Mosqueteiro Português)

A guerra se arrastaria por mais 5 anos, com o sultanato de Adal sob o


comando do sobrinho de Imam, Nur ibn Mujahid. Este não conseguiu inspirar o
mesmo pavor ou lealdade que seu tio, levando a uma gradual recuperação
etíope dos territórios perdidos. No entanto, Nur construiu as impressionantes e
ainda de pé muralhas de Harer. Logo a guerra se transformou em um impasse
e depois em paz entre os dois poderes ensanguentados e exaustos. Adal
manteve os domínios sob a costa, e livre dos tributos etíopes de outrora. As
décadas seguintes veriam uma nova força emergir para desafiar ambos os
reinos na forma da migração das tribos Oromo, com as duas nações
impotentes impedidas de combater essas forças. O sultanato de Adal
colapsaria em 1577, enquanto o Império Etíope perdeu os territórios ao sul, e
continuaria até o começo do século XX, quando foi conquistado pela Itália
fascista.

Em 1539, a frota de Hamad Khan tenta sitiar a cidade portuguesa de


Malaca na Malásia, mas falham miseravelmente. Em janeiro de 1541, o
governador da Índia portuguesa, Estevão da Gama, filho do lendário Vasco da
Gama, partiu para o mar Vermelho com uma frota de 40 navios e 2300
soldados. Enquanto Estevão e Cristóvão da Gama estavam passando pelo Mar
Vermelho, este último se engajou na guerra na Etiópia que acabamos de falar.
No entanto, quase metade dos navios de Estevão teve que ficar em Massawa,
e além disso, os portugueses não tinham familiaridade com o Mar Vermelho.
Eles atacaram Suakin e várias aldeias ao longo da costa árabe, enquanto o
calor e a falta de água cobraram seu preço. No final de março, apenas 16
pequenos navios a remos e 250 homens permaneceram com Estevão. Essa
pequena força chegou em Suez no final de abril, para encontrar a cidade bem
reforçada e com uma forte bateria de armas e 2000 da cavalaria Sipahi. Após
uma curta troca de tiros, uma retirada foi convocada pelos portugueses que
restaram.

Em 1546, Khadjar Safar e o sultão Mahmud de Gujarat lançaram um


segundo ataque a Diu. Esse ataque levou anos em preparação e teve todas as
possibilidades de sucesso, mas Rustem Pasha se recusou a enviar qualquer
suporte ao cerco. E novamente os portugueses conseguem resistir, apesar de
terem muitas baixas. De 1546, governadores e aliados otomanos na Arábia
saquearam Mascate no atual Omã, capturam o porto português de Qishn no Irã
Safávida, e derrubaram um governador tribal rebelde em Basra para colocar a
província crucial sob controle otomano direto. Em 1552, Rustem lançou uma
enorme ofensiva contra a fortaleza portuguesa de Ormuz. No entanto, um navio
de guerra português fortemente armado tinha chegado na cidade por mero
acaso, logo à frente da frota otomana em abril de 1552. Os otomanos
saquearam a cidade vizinha para obter suprimentos, mas decidiram que era
melhor retornar a Basra. Em 1556, os otomanos desembarcaram uma forte
força em Massawa sob Ozdemir Pasha, conquistando a moderna Eritreia. Uma
tentativa menor e fracassada de tomar o Bahrein foi feita em 1559, e foi dado
apoio a um ataque de Aceh a Malaca em 1568, mas os otomanos jamais
reuniriam outra frota de tamanho suficiente para desafiar os portugueses em
um confronto naval aberto. Até a anexação de Portugal pela Espanha em 1580,
apenas corsários e disputas por influência continuariam a existir entre os
portugueses e otomanos.
(golfo Pérsico e o estreito de Ormuz com as posseções portuguesas)

Em 1571 o Império Turco-Otomano invade com tudo o Mar


Mediterrâneo, com 278 navios. Filipe II e a Espanha, Veneza, Gênova, os
Estados Papais, se uniriam para expurgar os muçulmanos do Mediterrâneo, e
com as bençãos do papa Pio V formariam uma aliança católica pura,
imaculada, divina, a Santa Liga. Os europeus conseguem levantar 206 galés e
as novas galeaças de guerra desenvolvidas especialmente pelos velhos
mestres do Mediterrâneo, os venezianos. Os venezianos tinham se aliado aos
turcos para expulsar os portugueses do oceano Índico, mas depois de serem
traidos pelos muçulmanos, eles se aliaram aos portugueses, e fizeram uma
grande rendenção. Das 206 galés, 109 eram deles, além de 6 poderosas
galeaças de guerra. A Espanha contribiu com 49 galés, Gênova com 27, e 15
dos Estados Papais. E reuniu 170.000 homens. Os navios europeus levavam
de 160 a 400 remadores em três fileiras de remos, cada remo puxado por três
remadores, que totalizavam mais de 40.000 remadores. As principais técnicas
usadas em Lepanto eram alborroamento e abordagem. Na liderança cristã
estava João I da Áustria, o genovês Giovanni Andrea Doria, Marco Antônio II
Colonna dos Estados Papais, e os venezianos Sebastiano Venier e Agostinho
Barbarigo. Também estavam do seu lado, o Grão-Ducado da Toscana, Saboia,
Ducado de Urbino e os Cavaleiros de Malta. E do lado muçulmano estavam Ali
Pasha, Mehmed Siroco, e Uluç Ali Reis.

A frota turca estava no golfo de Patras na Grécia, e é pra lá que a Santa


Liga vai descarregar toda a sua ira. Eles chegam em 7 de outubro de 1571,
com Barbarigo ficando na esquerda, Andrea Doria na direita, e João da Áustria
no centro. E tinha dois contigentes reservas liderados pelo genovês Álvaro de
Bazán. Por volta de meio dia os europeus dão o primeiro disparo e a batalha
inicia na ala esquerda entre Barbarigo e Siroco, que leva à uma batalha corpo a
corpo brutal, e ambos os líderes acabam morrendo. Na direita, Andrea Doria
recua para o sul e abre um buraco na linha de frente, e ninguém entende nada.
E os turcos aproveitam para avançar com tudo pela direita, mas foram parados
pelo atento Álvaro de Bazán. No centro a Santa Liga estava imparável, e
depois de quase perder seu navio bandeira real naquela confusão de navios,
João da Áustria agora castigava severamente os muçulmanos. Enquanto os
turcos usavam seus arcos compostos, os europeus largravam o prego com
seus mosquetes. João e os tercios espanhóis capturam o navio bandeira turco
liderado por Ali Pasha, e exterminam todos os turcos ali. Foram mais de 30.000
turcos mortos, 50 galés destruídas e 117 capturadas. Enquanto os cristãos
perderam 7500 homens. Essa batalha impediu a total dominação otomana do
mar Mediterrâneo.
(A Batalha de Lepanto em 1571)

Os muçulmanos reconquistam Túnis em 1574, e em 1578 ocorre a


batalha de Alcácer-Quibir, provavelmente a mais famosa das guerras luso-
turcas. Os portugueses eram liderados pelo rei Dom Sebastião aliados ao
exército do sultão Maomé Mutavaquil (do Sultanato Saadiano) contra um
grande exército marroquino liderado pelo seu tio, o Sultão de Marrocos Mulei
Moluco com o apoio do exercito otomano. Essa batalha foi uma grande derrota
para Portugal, onde o rei e outros poderosos nobres morreram em batalha, e
isso culminou na Espanha assumindo o controle de Portugal de 1580 à 1640,
na União Ibérica.

Depois de Alcácer-Quibir, Portugal não vai participar das disputas contra


os turcos-otomanos até 1714, quando estoura a oitava Guerra Otomano-
Veneziana, e Portugal vai auxiliar Veneza, junto com os Estados Papais, e a
Ordem de Malta. Apesar dos portugueses vencerem a batalha naval de
Matapan travada a 19 de Julho de 1717, a guerra vai ser perdida, e os
venezianos vão perder o Peloponeso na península grega. E assim terminam as
guerras luso-turcas.
Em 1593 começa a Longa guerra contra os Habsburgos, ou também
chamada Guerra dos Treze Anos. A nobreza militar otomana, os Sipahi, era
paga principalmente pela concessão de pequenos feudos em territórios
conquistados, chamados Timars, um sistema que exigia constante expansão
militar para funcionar. Em 1592, Beylerbey Hasan Pasha da Bósnia, sitiou e
tomou a cidade de Bihac na Croácia dos Habsburgos. Um ano depois, ele
tentaria replicar o feito sitiando Sisak, mas dessa vez foi derrotado por
Ruprecht von Eggenberg, e perdeu 8000 homens. Um mês após essa batalha,
um poderoso exército otomano sob o comando de Koca Sinan Pasha marchou
para a Hungria, com Viena como seu objetivo. Gyor e Komárno caíram para os
otomanos nos estágios iniciais da guerra, mas os exércitos imperiais
equilibraram a balança capturando Filakovo e Nograd quando o inverno se
aproximava. No entanto, além dos Habsburgos, Sigismundo Barthory da
Transilvânia e os austríacos forneceram armas e ajuda aos rebeldes na Europa
Otomana.

Em Banat, cristãos ortodoxos se revoltaram em massa contra o Estado


otomano em 1594, e embora fossem esmagados, eles atrasaram o avanço
otomano e agravaram uma crise já premente de rebeliões em todo o Império.
Além disso, o papa era Clemente VIII, que sonhava em uma Cristandate unida
expulsando os otomanos da Europa. Clemente enviou missões às cortes da
Espanha, Rússia, Polônia e várias nações cossacas e eslavas dos Balcãs e da
Ucrânia. No entanto, Clemente VIII não enxergou que Rússia e Polônia eram
inimigas mortais desde a Guerra da Livônia (1558-1583), e ambas recusaram o
convite. No entanto, os espanhóis enviaram 8000 soldados da Holanda para
ajudar seus aliados austríacos, e os cossacos zaporozhianos da Ucrânia se
envolveram no conflitos brigando com o canato da Crimeia, que era vassalo
dos otomanos. E Sigismundo Barthory da Transilvânia renunciou à sua
condição de vassalo otomano e se juntou à Santa Liga como líder cristão.

Essas novas potências cristãs começaram a obter grandes vitórias, com


Miguel o Bravo da Valáquia derrotando os exércitos otomanos na Moldávia,
conquistando Nicópolis e até mesmo avançando para o sul para Adrianópolis
em outubro de 1594. No entanto, o exército otomano de Koca Sinan Pasha
estava inteiro e marchou contra a Valáquia para anexá-la completamente.
Miguel inicialmente fugiu, mas eventualmente teve que enfrentar os otomanos
em 23 de agosto de 1595 na batalha de Calugareni. O exército de Miguel tinha
20.000 homens, enquanto o de Koca Sinan Pasha tinha 90.000. No entanto,
Miguel conseguiu vencer essa batalha, com as perdas otomanas sendo
superiores a 10.000 homens e os valáquianos perderam apenas 1000. No
entanto, isso não conseguiu expulsar os otomanos do território da Valáquia.
Então Migual recuou para o norte, enquanto Koca Sinan Pasha marchava para
capturar Targoviste e a capital Bucareste. Apesar de partes da Valáquia ser
ocupada pelos turcos, o exército de Miguel estava quase intacto e mais tarde
os outros exércitos aliados chegariam para ajudar ele, e ele enfrentaria
novamente os otomanos.

No final do século XVI, o Sacro Império Romano Germânico tinha uma


população em rápido crescimento, que juntamente com o aumento de preços
dos alimentos causados pela Pequena Idade do Gelo, estimulou milhares a
assumir o serviço militar como meio de subsistência. Além disso, depois das
guerras contra a Holanda, o exército imperial estava muito experiente nas
novas táticas de piques e armas de fogo que caracterizavam o exército
Habsburgos.

Na Valáquia, a cidade de Giurgiu caiu juntamente com Bucareste e


Targoviste. Na Hungria, em 2 de setembro, depois de um cerco de dois meses
e duas tentativas fracassadas de socorro otomano, o exército do Sacro Império
sob o comando de Karl Mansfeld, capturou a estratégica fortaleza de
Esztergom. Outra força, desta vez da Transilvânia, comandada por Gyorgy
Borbely, marchou para oeste na região de Banat dominada pelos otomanos,
conquistando várias vitórias contra as forças otomanas de Suleiman Pasha, e
dois fortes haviam caído nas mãos da Transilvânia antes mesmo da batalha de
Calugareni. Enquanto Suleiman Pasha ficava firme em Temesvar, Borbely
conseguiu controle efetivo sobre Banat em meados de outrubro de 1595. A
maior parte do exército da Transilvânia, sob o comando de Sigismundo
Barthory e Stephen Bocskai, macharam para ajudar Miguel.

Sigismundo conseguiu reunir um exército de 40.000 homens, e quando


se juntou a Miguel, e eles pegaram Koca Sinan Pasha de surpresa, forçando os
otomanos a se retirarem para Bucareste. Em 18 de outubro eles recapturam
Targoviste, e em 22 de outubro expulsaram de Koca Sinan Pasha de Bucareste
também, até que os dois exércitos se encontram em Giurgiu, onde a coligação
cristão expulsa os otomanos da Valáquia. No entanto, em dezembro de 1595,
uma força polonesa invadiu a Moldávia e derrotou uma força da Transilvânia e
depôs Stephan Razwan.

Koca Sinan Pasha, desonrado depois de sua série de derrotas, foi


removido de seu posto e substituído por Lala Mehmed Pasha, mas que morreu
inesperadamente após 3 dias e Koca Sinan Pasha retornou ao posto. No
entanto, ele não lideraria mais exércitos até sua morte em abril de 1596. Em
seu lugar, a liderança do exército passou para ninguém menos que o próprio
sultão Maomé III. Karl Mansfeld também tinha morrido no meio de 1596, e
então assumiu o irmão mais novo do sacro imperador Rudolf II, Maximiliano III.
Em setembro, o exército de Maximiliano invadiram a fortaleza otomana de
Hatvar, passando todos os seus habitantes turcos à espada, incluindo não-
combatentes. Enfurecido, Maomé III sitou a vizinha Eger, retribuindo a
brutalidade com um massacre similar quando caiu em 13 de outubro. Então
Maximiliano o perseguiu e alcançou seu exército em 22 de outubro, na
pequena vila de Mezõkeresztes.

Os dois exércitos tinham quase o mesmo tamanho, com cerca de


100.000 homens. Os exércitos do Sacro Império e da Transilvânia começaram
ganhando, mas o excesso de confiança, e como Maximiliano não era um líder
militar tão bom quanto Karl Mansfeld, eles acabaram perdendo essa batalha.
Os otomanos perderam de 20.000 a 30.000 homens, enquanto a coalizão
católica perdeu mais ou menos 70.000. Após essa batalha, a guerra continuaria
até 1606, mas sem grandes batalhas e os otomanos não conseguirão obter
mais uma vitória decisiva como esta. Os confrontos continuariam entre os
Habsburgos, poloneses, pelo controle da Valáquia, Moldávia e Transilvânia,
mas isso só desgastou a todos, e no final os otomanos recuperaram esses três
estados como seus vassalos. O tratado de paz assinado em 1606 ficou
conhecido com paz de Zsitvatorok, onde acabou com os tributos anuais que o
Sacro Imperador deveria pagar aos otomanos e ele seria respeitado tal qual o
sultão em Constantinopla.
A "longa guerra" contra a Áustria (1593-1606) criou a necessidade de
um maior número de infantaria equipada com armas de fogo. Isto resultou em
um relaxamento da política de recrutamento e um crescimento significativo no
número de corpos de janízaros. Isso contribuiu para os problemas de
indisciplina e rebeldia definitivas nos corpos de janízaros que lutou com o
governo e que nunca foram inteiramente resolvidos durante (e depois) este
período todo. O aperfeiçoamento e aumento de armas de fogo e o uso de
táticas mais lineares pelos europeus mostrou-se mortal contra a infantaria
reunida em formação cerrada usado pelos otomanos. Sekbans (mercenários de
origem camponesa) também foram recrutados pelos mesmos motivos e na
desmobilização viravam-se para o banditismo em revoltas Jelali (1595-1610),
dos renegados Sipahi, que geraram a anarquia generalizada na Anatólia no
final do século XVI e início do XVII. Com a população do império atingindo 30
milhões de pessoas até 1600, a falta de terra colocava maior pressão sobre o
governo.

Agora parando um pouco de falar das guerras e da grande expansão


territorial feita de 1360 até 1566, vamos discorrer sobre como era alguns
assuntos da política interna otomana. Diferente das monarquias cristãs, o
sultão não se casava com apenas uma esposa e seus filhos eram os herdeiros.
O sultão possuía um harém, que é um lugar onde residem as concubinas do
sultão, o qual ele tem várias e possui vários filhos com elas. Além disso, o
harém também abrigava mães, irmãs, tias, avós, e outros parentes femininos
do sultão, além de seus filhos e os servos, incluindo eunucos que trabalhavam
lá supervisionando o bom funcionamento do harém. As concubinas e servas do
harém eram geralmente mulheres tomadas como espólios de guerra de terras
capturadas pelos otomanos ou às vezes presenteadas ao sultão como um sinal
de respeito ou tentativa de obter um favor. A maioria dessas mulheres eram
cristãs, que se converteriam ao islã, e receberiam treinamento rigoroso em
tricô, culinária, tocar instrumentos musicais, dança, poesia, modos da corte,
leitura do Alcorão e muito mais em meio a uma disciplina militar.

O harém era chefiado pela mãe do sultão, que decidia quais mulheres
do harém estavam prontas para entreter seu filho. Um sultão pode ter um
relacionamento com quatro mulheres de uma vez, que seriam chamadas de
Kadin, e as mulheres favoritas do sultão eram chamadas de Iqbal. A fim de
limitar o poder potencial das mulheres, as mulheres do harém foram
autorizadas a dar à luz apenas a um filho do sultão. Depois que os filhos
homens do sultão atingiam a idade adulta eles eram enviados para atuar como
governadores das províncias junto com suas mães para aprender o ofício da
governança, além de possivelmente minimizar o poder das mães se intrometer
em política. Lá, os herdeiros em potencial do trono otomano seriam criados por
suas mães, que muitas vezes exerciam muita influência nos seus filhos. Os
sultões tinham pouco contato com seus filhos, pois moravam longe da capital.

A regra de sucessão não era o filho primogênito, porque os sultões se


abstinham de nomear seus herdeiros, mas muitas vezes davam províncias
próximas à capital para seus filhos preferidos. Isso permitia que os filhos
obtivessem a notícia da morte do sultão primeiro, e se proclamasse sultão
antes de seus irmãos receberem a notícia. Até o século XVII, um novo sultão
matava seus irmãos para evitar qualquer chance de conflitos internos. A falta
de regras de sucessão clara foi um dos motivos que levou o Império Romano a
cair, porque com o tempo todo mundo poderia se tornar um imperador apenas
matando o imperador, o que gerou reinados extremamente curtos na crise do
terceiro século. Além disso, as mães protegiam seus filhos de serem
assassinados, e isso teria consequências mais cedo ou mais tarde. A
historiadora Leslie Pierce afirma que em meados do século XVI a própria
essência do estado otomano estava mudando. O Império estava se
transformando de um Estado militar para um Estado burocrático.

No reinado de Solimão (1520-1566), uma escrava de origem rutena


chamada Roxolana, provavelmente entrou no harém quando era adolescente.
Roxolana recebeu o nome de Hurrem (a alegre) e logo subiu na hierarquia das
mulheres no harém. No entanto, quando ela se tornou uma das favoritas de
Solimão, uma de suas consortes Mahidevran já havia dado à luz um filho
Mustafa. Logo, Hurrem se tornou a favorita do sultão e deu à luz a 6 filhos, 5
meninos e uma menina. Isso quebrou a tradição de dar à luz apenas um filho
para o sultão. Hurrem se tornou a pessoa mais poderosa no harém,
especialmente após a morte da mãe de Solimão, Sultan Hafsa.
Em 1534, Solimão rompeu com outra tradição do Império Otomano e se
casou legalmente com Hurrem depois de libertá-la da escravidão formal.
Hurrem se tornou igual em status às imperatrizes europeias. Além disso, ela se
mudou para o palácio imperial de Topkapi em Constantinopla se aproximando
assim do grande centro de poder político do Império. Outro rompimento de
tradição foi quando ela não saiu com seus filhos em suas atribuições de
governador regional e ficou em Constantinopla. Hurrem e Solimão tiveram um
relacionamento amoroso e ela era esperta e se transformou em confidente
político do sultão e um importante ator político na capital. Alguns afirmam que
Hurrem influenciou Solimão a ordenar a morte de seu filho mais velho Mustafa,
e do grão-vizir Ibrahim Pasha, a fim de garantir que um de seus filhos sobreviva
e se torne o novo sultão. Além disso, como ela era de origem rutena, ela
manteve boas relações com a Comunidade Polaco-Lituana. Hurrem morreu em
1558, mas suas atitudes inauguraram uma nova era na história otomana – o
Sultanato das Mulheres.

Após a morte de sua mãe, Hurrem Sultan, Mihrimah Sultan se tornou a


mulher mais influente do reino. Ela era casada com um governador otomano de
origem croata, Rustem Pasha, futuro grão-vizir. Mihrimah era única, porque não
era uma Haseki, nem uma Valide, mas ainda tinha uma enorme influência
política e financeira por ser uma das pessoas mais ricas do Império. Mesmo
depois da morte de Solimão e de Rustem, ela ainda manteve a influência,
enquanto seu irmão Selim II ascendeu ao trono e buscou seu conselho e apoio
financeiro. Na década de 1560, ela tentou instar seu pai para outra campanha
contra Malta, e prometeu a ele financiar a construção de 400 navios do seu
próprio bolso. Ela desempenhou papel fundamental na normalização das
relações entre o Império Otomano e seu vassalo, a República de Ragusa.

Outra figura proeminente foi Nurbanu Sultan, esposa de Selim II, onde
as fontes divergem sob sua origem judia, veneziana ou grega. Ela foi enviada
para Konya, para o harém de Selim II. Nurbanu era conhecida por sua beleza e
inteligência, e logo se tornou a favorita de Selim II e lhe deu três filhos,
incluindo o futuro sultão Murade III. Assim que Selim II se tornou sultão, ela se
mudou com ele para Constantinopla. O reinado de Selim II foi curto, durante
somente de 1566 a 1574, e Nurbanu fez de tudo para que seu filho se tornasse
o novo sultão, e deu certo, com Murade III assumindo o trono. Durante seu
governo, o poder de Nurbanu só aumentou e sua influência política só podia
ser comparada ao experiente grão-vizir Sokollu Mehmed Pasha. Durante seu
reinado, Murade III transferiou o harém para o palácio de Topkapi, um
movimento que só aumentou a influência do harém na governança da Sublime
Porta. Nurbanu também correspondia com a rainha da França, Catarina de
Médici, além de ser uma defensora das boas relações com Veneza. Ela
também lutava contra a influência da única concubina de Murade III em seu
governo inicial, a albanesa Safiye Sultan, que se tonrou Haseki Sultan após ter
um filho. Nurbane estava insatisfeita com o fato de que Murade III permaneceu
dedicado a Safiye e tinha apenas um herdeiro e basicamente o forçou a ter
relações sexuais com outras mulheres no harém na tentativa de diminuir a
influência de Safiye Sultan. Este último se tornou influente apenas após a
morte de Murade III em 1595 e a ascenção de seu filho Maomé III, o Justo.

Como sua antecessora, Safiye Sultan era muito poderosa, e tinha muita
influência sobre seu filho. Durante seu mandado como Valide Sultan, ela teve
um alto grau de poder sobre as finanças e assuntos políticos otomanos, pois
Maomé III daria quase todo o poder para sua mãe em momentos de suas
viagens e campanhas. Safiye Sultan pressionou ativamente por boas relações
com Veneza, além de ser conhecida por ter correspondência com a rainha
inglesa Elizabeth I, que lhe deu uma carruagem de presente, que Safiye Sultan
costumava usar em suas viagens dentro de Constantinopla, algo inédito para o
Império Otomano. O período de governo de Safiye é lembrado pela
instabilidade, já que vários grão-vizires foram apontados e removidos
frequentemente após alguns meses do início de sua carreira. Sua influência era
altamente impopular entre a classe militar otomana. Quando em 1603, o neto
dela, Ahmed I, chegou ao poder, ela foi banida para o Palácio Antigo e
removida da sede do poder para sempre.

Ahmed I gostava de uma de suas concubinas, Kösen, de descendência


bósnia, morena ou grega, e possivelmente sua esposa legal, que lhe deu 7
filhos, 4 filhos e 3 filhas. Apesar de sua afeição por Kösen, ele não partilhou o
poder com as mulheres da corte, e seu governo de 14 anos deve ser lembrado
como um período de interrupção do Sultanato das Mulheres. A morte de
Ahmed I abriu o caminho para uma série de crises de sucessão, sultões
mentalmente incapazes e instabilidade geral no Império. Após um reinado
muito curto de 3 meses, o irmão de Ahmed, Mustafa I, foi desposto e o filho de
Ahmed I com outra concubina, Osmã II, se tornou o novo sultão. Apesar de ser
apenas sua madrasta, Kösen tinha certa influência sobre Osmã II, que cresceu
nos mesmos aposentos do harém e tinha afinidade com ela. Mas o reinado de
Osmã II durou apenas 4 anos, pois ele tentou reformar as forças armadas e ele
foi assassinado pelos janízaros. Agora, Küsen Sultan se tornou a Valide Sultan
e a regente oficial de seu filho menor de idade, Murade IV. Ela frequentava o
Divan, reuniões de ministros de seu filho, atrás das cortinas que a cobriam de
outros participantes da reunião.

Depois que Murade IV atingiu a maioridade, ele removeu sua mãe do


poder, que no entanto, conseguiu persuadi-lo a não matar seu irmão Ibrahim.
Mas a morte prematura de Murade IV em 1640, levou ao trono Ibrahim como
Ibrahim I, mesmo ele sendo completamente incompetente para reinar. Kösen
sabia disso e fez o possível para reinar no seu lugar, enquanto encorajava
Ibrahim a se divertir com as mulheres no harém em vez de governar. Muito em
breve, outra panelinha com o objetivo de depor seu filho se reuniu e informou
Kösen de suas intenções, com as quais ela concordou apesar de ser sua mãe.
Mas mais uma vez ela se tornaria uma regente, desta vez de seu neto Maomé
IV, que tinha apenas 7 anos quando assumiu em 1648. No entanto, Kösen
tinha agora uma rival feminina, Terhan Sultan, mãe de Maomé, que não queria
ceder o controle para a sogra. A competição entre as duas gerou caos ao
Império, porque ele já sofria de conflitos internos e rebeliões. Ambos os lados
conspiravam um contra o outro, e no final, um grupo de apoiadores de Terhan
conseguiu entrar nos aposentos de Kösen e assassiná-la em 1651. Então
Terhan Sultan começou a exercer influência sobre os assuntos políticos do
Império, mas 5 anos depois, Koprolu Mehmed Pasha foi nomeado grão-vizir,
enquanto Terhan basicamente se aposentou da política. E assim termina o
período conhecido como o Sultanato das Mulheres (1534-1656).

E quanto às populações não muçulmanos no Império, o que acontecia


com essas pessoas? Lembra que eu falei do sistema de millet? Agora vamos
detalhar melhor esse sistema.
Antes do século XIX as relações entre muçulmanos e não muçulmanos
no Império Otomano era geralmente bastante portátil, consideradas cordiais. E
no século XIX a paz entre essas relações intercomunitárias declinam, e o
império começa a centralizar tudo. Antes disso, a administraçao central do
Império Otomano em grande parte ficou fora desta área. As relações entre
muçulmanos e não-muçulmanos vão ser codificadas no início do século XIX, e
essas relações vão se deteriorar. Antes do século XIX, teoricamente a Sharia
era a lei do Império, que era complementada pelos éditos imperiais, e pelas leis
consuetudinárias. E essas últimas duas foram codificadas e reorganizadas pelo
sultão Solimão, o Magnífico, ou em turco, Kanûnî (O Legislador). Os Kahuna
nessa lei consuetudinária não faziam parte da Sharia, mas também não podiam
contradizê-la. Os juízes às vezes misturavam essas coisas um pouco, e nem
todas as decisões se baseavam na Sharia, embora não pudessem contradizê-
la.

Durante os 200 primeiros anos do Império (1300 a 1500), a maioria dos


súditos não eram muçulmanos. E até o começo do século XX, os não
muçulmanos constituíam uma boa porcentagem da população no Império.
Depois de 1453, com a consquista de Constantinopla, o sultão estabeleceu três
millets, que eram os ortodoxos gregos, os armênios em relação a Alá, e os
judeus. E cada um dos verdadeiros cristãos eram chefiados por patriarcas
daquela fé particular, e o millet judeu era chefiado por uma pessoa com o título
de grande rabino, e todos os três tinham sua sede em Constantinopla. Os
otomanos construíram um sistema, em que os três diferentes millets eram
governados pelas suas próprias autoridades religiosas, e estes clérigos eram
responsáveis pela tributação da educação, a administração legal de cada
millet, e eram responsáveis perante seus respectivos patriarcas, conforme o
caso em Constantinopla, que por sua vez era de responsabilidade do sultão.

Então as comunidades não-muçulmanas eram bem segregadas das


muçulmanas, e quase nunca interagiam entre si. Por exemplo, os párocos
locais em Salem, no sudeste da Europa, eram livres para construir e equipar
suas próprias escolas, onde podiam ensinar na sua própria língua. De forma
análoga, os clérigos cristãos e judeus eram livres para organizar qualquer tipo
de debate teológico que pudessem ter um com o outro. A população não-
muçulmana tinha a opção de usar as suas próprias leis, seus próprios tribunais.
Por exemplo, se tivesse uma disputa entre dois membros de uma comunidade
católica ou judaica, eles podiam usar seus próprios funcionários e autoridades
clericais locais. Esses tribunais locais tinham ampla autonomia em questões de
direito pessoal, como casamento, herança, divórcio, etc. Algumas exceções
são crimes capitais, ou atos de rebelião ou sedição, que eram sempre julgados
nos tribunais da Sharia. Se um cristão tivesse um processo contra um
muçulmano, isso seria julgado pelo tribunal da Sharia, e os não-muçulmanos
não podiam testemunhar contra os muçulmanos. Mas obviamente, essa grande
autonomia dada aos cristãos e judeus era somente para governá-los com o
mínimo de resistência.

Um dos estudos da Síria otomana, e outro do Chipre por Kemal Chi


Check, sugerem que as populações muçulmanas e não-muçulmanas parecem
ter sido bem integradas, e não segregadas. E em tudo eles parecem estar
intimamente ligados por relações comerciais residenciais e pessoais. Também
é sugerido que os não-muçulmanos frequentemente usavam os tribunais da
Sharia. Por exemplo, tem um caso em que Yanni da vila de Samaria e Kyrenia,
trouxe uma reclamação contra a realeza, alegando que o legado que seu
falecido filho Seroquel, deveria ter sido dado à ela. Mas o primo do falecido
tomou como parte, 1 boi e 40 cabras, alegando que ele era um dos herdeiros.
De acordo com a lei islâmica sobre herança, é uma mulher cristã ortodoxa
pleiteando seu caso. De acordo com a lei islâmica, o primo não poderia ser
herdeiro da propriedade de seu filho, como um de seus primos tendo aprendido
e confirmado pelas testemunhas que não era o fato do primo falecido, e foi
ordenado que o réu devolvesse a propriedade. Em 1781, Miriam e Francis
foram para um tribunal muçulmano em Damasco, para terminar o seu
casamento.
(em verde os muçulmanos, em azul os cristãos ortodoxos, em amarelo os
católicos romanos, em rosa os cristãos armênios, e em laranja os judeus).

No final do reinado de Solimão em 1566, a população do Império era de


15 milhões de pessoas. Ou seja, é uma população muito baixa para o tamanho
deste Império, o que pode ser uma das causas das pessoas de outras religiões
terem um tratamento razoável, porque é mais difícil de dominar.

Entre 1618 e 1648 a Europa foi acometida pela terrível Guerra dos Trinta
Anos, um dos conflitos mais destrutivos da história, deixando um saldo de
8.000.000 de mortos, principalmente na Europa Central.

As rivalidades entre católicos e protestantes e assuntos constitucionais


germânicos foram se transformando num dos maiores conflitos da história
europeia. Apesar dos conflitos religiosos serem a causa direta da guerra, ela
envolveu um grande esforço político do Império Sueco e da França, para minar
a força dos Habsburgos.
O Sacro Império Romano Germânico no século XVI era composto de
centenas de estados amplamente independentes, tirando os territórios
controlados pelos Habsburgos (arquiducado da Aústria e o Reino da Boêmia).
Além das terras dos Habsburgos, o Sacro Império Romano continha várias
potências regionais, como o Ducado da Baviera, o Eleitorado da Saxônia,
o Magrave de Brandemburgo, o Eleitorado do Palatinado e o Condado de
Hesse.

Os conflitos religiosos ocorridos na Alemanha e solucionados em 25 de


setembro de 1555 com a assinatura da Paz de Augsburgo inauguraram um
período no qual cada príncipe podia impor sua crença aos habitantes de seus
domínios. O equilíbrio manteve-se enquanto os credos predominantes
restringiam-se às religiões católica e luterana, mas o advento do Calvinismo
complicaria ainda mais o cenário. Considerada uma força renovadora, a nova
linha religiosa conquistou diversos soberanos. Os jesuítas e a Contrarreforma,
por outro lado, contribuíram para que o catolicismo recuperasse forças. Assim
nasceu o projeto expansionista dos Habsburgos, idealizado por Fernando,
duque da Estíria, que foi educado pelos jesuítas. O perigo ameaçava tanto as
potências protestantes no norte como a vizinha França.

As tensões religiosas agravaram-se na Alemanha no reinado do


imperador Rodolfo II (1576-1612), período durante o qual foram destruídas
muitas igrejas protestantes. As liberdades religiosas dos crentes protestantes
foram limitadas, nomeadamente as relativas à liberdade de culto; os oficiais do
governo lançaram as bases do Tratado de Augsburgo, que criou condições
para o refortalecimento do poder católico.

Com a fundação da União Protestante em 1608, uma aliança defensiva


protestante dos príncipes e das cidades alemãs, e a criação, no ano seguinte,
da Liga Católica, uma organização semelhante mas dos católicos romanos,
tornava-se inevitável o recurso à guerra para tentar resolver o conflito latente, o
qual foi desencadeado pela secção da Boêmia da União Protestante.

No Reino da Boêmia (atual República Checa), teve início uma disputa


pela sucessão do trono, que envolveu católicos e protestantes. Fernando II de
Habsburgo, com a ajuda de tropas e recursos financeiros da Espanha, dos
germânicos católicos e do papa, conseguiu derrotar os protestantes da Boêmia.

Os protestantes, que constituíam a maior parte da população, estavam


indignados com a agressividade da hierarquia católica. Os protestantes exigiam
de Fernando II, o rei da Boêmia e futuro imperador do Sacro Império Romano-
Germânico, uma intercessão em seu favor. Todavia, as reivindicações foram
totalmente ignoradas pelo rei, pois este era um fervoroso católico e um
potencial herdeiro do poder imperial dos Habsburgos. Fernando II estabeleceu
o catolicismo como único credo permitido na Boêmia e na Morávia. Os
protestantes boêmios consideraram o ato de Fernando como uma violação
da Carta de Majestade. Isso provocou nos boêmios o desejo de independência.

A 23 de maio de 1618, descontentes com os católicos que destruíram


um de seus templos, os protestantes invadiram o palácio real em Praga
e jogaram pela janela dois dos seus ministros e um secretário, fato que ficou
por isso conhecido como Defenestrações de Praga, tendo despoletado a
sublevação protestante. Assim começava a guerra, que abrangeu as revolta
holandesas após 1621 e concentrou-se em um confronto franco-Habsburgo
depois de 1635.

Os principais campos de batalhas dos intermitentes conflitos foram as


cidades e principados que hoje formam a Alemanha, estes sofreram danos
graves em suas cidades e campos. Muitos dos combatentes eram mercenários
que tinham na pilhagem sua principal forma de pagamento. Assim, tomavam à
força, onde paravam ou por onde passavam, os suprimentos necessários a sua
manutenção e lucro, numa estratégia predatória que levou à destruição
completa de inúmeras comunidades; depois da guerra, esses mercenários se
tornaram ladrões e continuavam a assaltar as pessoas e roubar o que havia
restado da guerra. Hoje estima-se que a população das cidades e principados
da região alemã caiu pela metade depois da guerra; A destruição tomou
tamanha proporção que vilas e cidades pequenas simplesmente deixaram de
existir. Os Estados e Principados alemães levariam em torno de duzentos anos
para se recuperarem da Guerra dos Trinta Anos.
Entre os participantes temos de um lado: Reino da Suécia, Reino da
Boêmia, Reino da Dinamarca-Noruega (de 1625 a 1629), República dos Países
Baixos (Holanda), Escócia, Inglaterra, França, Saxônia, Eleitorado do
Palatinato, Brandemburgo-Prússia, Brunsvique-Luneburgo, Transilvânia e
rebeldes magiares anti-Habsburgos. Esse lado também foi apoiado pelo
Czarado Russo e pelo Império Otomano. Do outro lado temos: o Sacro Império
Romano Germânico, com Áustria e Santa Liga fazendo parte dele, Baviera,
Hungria, Croácia, Espanha, Dinamarca-Noruega (de 1643-1645). Esse lado
católico foi apoiado pelos cossacos de Zaporizhzhya e pela Comunidade
Polaco-Lituana.

Após essa guerra que causou 8 milhões de mortes, é assinada a famosa


Paz de Vestifália. Os resultados foram: os príncipes protestantes poderiam
continuar suas práticas religiosas; o poder e influência da Igreja Católica entrou
em declínio no norte da Europa; os Habsburgos perderam a supremacia e
poder; a Holanda se tornou independente da Espanha; a Holanda reconheceu
a soberania espanhola nos Países Baixos do Sul (Bélgica) e de Luxemburgo;
ascenção da casa de Bourbon e da França; ascenção do Império Sueco;
declínio do feudalismo na Europa continental; a acentuação da
descentralização do Sacro Império Romano Germânico no norte; a Guerra
Franco-Espanhola até 1659; e o Sacro Império perdeu os território não-
germânicos da Suiça para baixo. O mapa da Europa fica assim depois dessa
devastadora guerra:
(mapa da Europa em 1648 após a Paz de Vestifália)

A Paz de Vestifália levou a princípios geopolíticos péssimos, porque ela


colocou o interesse do Estado Nação acima da fé. Com isso, abre espaço para
a podridão que é a geopolítica moderna, onde os Estados Nações muito
poderosos brigam entre si inúmeras vezes e tenta-se fazer a paz a todo custo,
ignorando a moralidade, buscando apenas uma paz prática.

Após essa guerra, a Europa central ficou tão fraca que era a hora
perfeita dos otomanos atacarem, mas não tão cedo. No conturbado Sultanato
das Mulheres, o Império se expandiu permanentemente apenas para o interior
da Líbia em 1630, e outras invasões foram feitas em territórios Safávida, mas
que logo foram repelidas. Então o Império Otomano entrou num período
conhecido como Era Köprülü (1656-1703) durante o qual o controle efetivo do
império era exercido por uma sequência de grão-vizires da família Köprülü.

Em 15 de setembro de 1656, o octogenário Mehmed Köprülü aceitou os


selos do gabinete tendo recebido garantias de Turhan Hatice de autoridade e
liberdade sem precedentes de interferências. Um disciplinador e conservador
feroz, ele conseguiu reafirmar a autoridade central e o ímpeto militar do
império. Isto continuou sob seu filho e sucessor Köprülü Fazıl (grão-vizir 1661-
1676). O vizirado Köprülü viu o sucesso militar se renovando com a autoridade
restaurada na Transilvânia, a conquista de Creta concluída em 1669 e a
expansão para o sul da Ucrânia, com as fortalezas do Khotin e Kamianets-
Podilskyi e o território de Podolia cedendo ao controle otomano, em 1676.

No entanto, essa expansão otomana finalmente iria parar na famosa


Batalha de Viena em 1683. O rei da Áustria e Sacro Imperador era Leopoldo I,
e os otomanos cercam a cidade de Viena em 14 de julho de 1683, com
aterrorizantes 150.000 homens, incluindo 12.000 janízaros. Então Leopoldo
pede ajuda a João III Sobieski da Polônia, um rei igualmente católico,
conhecido como flagelo de Alá. Viena era uma cidade importantíssima porque
era o centro de uma vasta rede comercial que cruzava do norte ao sul da
Europa. Dentro de Viena havia apenas 11.000 cavaleiros e 5.000 cidadãos. O
comandante otomano era Merzifonlu Kara Mustafá Pasha e enviou uma carta
para que Leopoldo se rendesse. No entanto, para Ernest Rüddiger, não haveria
rendição. Ele lideraria a resistência europeia ao limite da força humana.

A batalha começa com 300 canhões otomanos disparando contra a


cidade, mas Viena estava firme e forte resistindo com suas grandes e largas
muralhas. Dias se passaram e os turcos não conseguiam nada, perdendo
centenas de homens em vão em cada ataque às muralhas. Mas o tempo corria
contra os austríacos, pois o cerco cortou toda a linha de suprimentos até a
cidade, que agora tinha suas muralhas explodidas por baixo, pelos famosos
assapes otomanos e suas minas. O caos toma conta da cidade! Durante dois
meses, milhares de homens eram explodidos nas muralhas e a fadiga extrema
começou a deixar os cavaleiros com fome e sem força. O desespero de
Rüddiger era tanto que ele ordenou que quem fosse pego dormindo seria
fuzilado na hora.

No entanto, das muralhas da cidade, Rüddiger viu as fogueiras do monte


Kahlemberg serem acesas, e isso só significava uma coisa: os poloneses e
seus famosos hussardos alados tinha chegado! Em 12 de setembro, 3000
hussardos alados com seus cavalos e lanças pesadas avançaram com tudo
contra os turcos em campo aberto. Liderados pelo seu próprio rei João III
Sobieski, as asas de aço cristãs levaram o caos ao exército turco. Em
desordem, um carregamento avassalador de 80.000 guerreiros em 4 grupos
saxônios, lituanos e bávaros avançavam para o ataque final contra os inimigos.
Depois de dois meses de cerco, os otomanos não aguentavam mais, e não
conseguiram resistir à fúria ocidental. Mais de 30.000 otomanos foram mortos
na batalha, enquanto os europeus perderam 10.000 homens. Mustafa Pasha
fugiu, mas quando chegou em Galípoli, ele recebeu a recompensa digna de um
desertor, a decapitação.

(Socoroo à Batalha de Viena, de Frans Geffels)


(Sobieski enviando a mensagem de vitória para o papa, após a Batalha de
Viena, por Jan Matejko)

Após 15 anos da batalha de Viena, foi assinado o Tratado de Karlowitz


em 1699, que pôs fim à Grande Guerra Turca, e o Império Otomano teve que
entregar grandes territórios aos cristãos, como toda a Hungria otomana, as
fortalezas do Khotin e Kamianets-Podilskyi e o território de Podolia na
Comunidade Polaco-Lituana, e a Transilvânia. Em 1668, a península do
Peloponeso foi anexada por Veneza, que tomou parte da Grécia em Atenas e
na Boécia, mas que essas foram reconquistadas no ano seguinte, e em 1715 o
Peloponeso voltava ao domínio otomano.  Mustafá II (1695-1703) levou o
contra-ataque otomano de 1695-96 contra os Habsburgos na Hungria, mas
este contra-ataque foi desfeito na desastrosa derrota em Zenta em 11 de
setembro de 1697.
(Império Otomano na sua máxima extensão em 1683)
(expansão otomana de 1300 a 1683)

A partir de 1699 o Império vai entrar em um período de estagnação


fortíssima, que durará até 1822. Certas áreas do império, como Egito e Argélia,
tornaram-se independentes em todos os aspectos e, posteriormente, tornaram-
se colônias da Grã-Bretanha e da França, respectivamente. No século XVIII, a
autoridade centralizada deu lugar a diferentes graus de autonomia provincial
apreciada por governadores e líderes locais. Várias guerras foram travadas
entre o Império Russo e o Império Otomano entre os séculos XVIII e XIX.

O longo período de estagnação otomana é tipicamente caracterizado por


historiadores como uma época de reformas falhas. Na última parte deste
período, houve reformas educacionais e tecnológicas, incluindo a criação de
instituições de ensino superior como a Universidade Técnica de Istambul
fundada em 1453; a ciência e a tecnologia otomana foram altamente
respeitadas na época medieval, como resultado da síntese de estudiosos
otomanos da aprendizagem clássica com a filosofia islâmica e matemática, e o
conhecimento de avanços chineses em tecnologia como a pólvora e a bússola.
As corporações de escritores denunciaram a imprensa como "Invenção do
Diabo", e foram responsáveis por uma desfasagem de 43 anos entre a sua
reinvenção por Johannes Gutenberg na Europa em 1450 e sua introdução na
sociedade otomana com a imprensa em Constantinopla, que foi estabelecida
pelos judeus sefarditas emigrados da Espanha em 1493.

Em 1717, tropas lideradas pelo príncipe Eugénio de Saboia capturam a


cidade de Belgrado dos otomanos, formando o reino da Sérvia, que seria
independente até 1739.

(Tropas lideradas pelo Príncipe Eugénio de Saboia capturam Belgrado em


1717)
A Era das Tulipas (ou Lâle Devri em turco), nomeada assim por causa
da apreciação da flor tulipa pelo sultão Amade III (1703-1730) e seu uso para
simbolizar o seu reinado de paz, trouxe mudanças para a política do Império
em relação a Europa. A região foi pacífica entre 1718 e 1730, após a vitória
Otomana contra a Rússia na Campanha Pruth em 1711 e o Tratado de
Passarowitz trouxe um período de pausa na guerra. O império começou a
melhorar as fortificações das cidades que faziam fronteira com os países
europeus nos Bálcãs agindo como uma defesa contra a reconquista europeia.
Outras reformas preliminares também foram aprovadas: os impostos foram
reduzidos, houve tentativas de melhorar a imagem do Estado otomano, e os
primeiros exemplos de investimento privado e empreendedorismo ocorreram.

Sobre os confrontos com a Rússia, na Guerra Russo-Turca de 1686 a


1700, a Rússia venceu e tomou as terras em Azov, e assume as fortalezas de
Taganrog, Pavlovsk, e Mius. Entre 1735 e 1739 ocorre a Terceira Guerra
Russo-Turca, onde acabou num impasse e foi assinado o tratado de Nis e de
Belgrado. Com o primeiro tratado, os otomanos puderam construir um porto em
Azov, e o segundo cedeu o reino da Sérvia aos otomanos, junto com sua
capital Belgrado, a parte sul da Banato de Temeswar, o norte da Bósnia e o
Banato de Craiova.

A Quarta Guerra Russo-Turca ocorreu de 1768 a 1774, no sul da


Ucrânia, na Crimeia e no norte do Cáucaso. Os turcos contaram com o apoio
de patriotas poloneses que estavam fazendo uma insurreição contra os russos,
e os russos contaram com apoio naval inglês. Os russos, comandados por
Potemkim e Suvorov avançaram sobre a Moldávia e a Valáquia, vencendo
a Batalha de Khotin e tomando Bucareste ao final de 1769. Uma segunda
frente de batalha foi aberta quando uma força expedicionária russa comandada
pelo conde von Tottleben, atravessou as montanhas do Cáucaso, unindo-se ao
exército de Heracles II, rei da Geórgia; que derrotou os otomanos na Batalha
de Aspindza. Juntos, russos e georgianos sitiaram sem sucesso a fortaleza
de Poti, defendida pelas forças otomanas.

A frota russa sob comando do conde Alexei Orlov deixou o Báltico e


adentrou pela primeira vez ao Mediterrâneo, infringindo aos otomanos a derrota
na batalha naval de Çesme em 1770. A presença da frota russa incentivou os
patriotas gregos, que se insurgiram contra o domínio otomano, dando início à
Revolta dos Maniotas (1770-1771), que se espalhou pelo Peloponeso e pela
ilha de Creta, sendo contida duramente pelos turcos, com o concurso de
mercenários albaneses. Ainda em 1771, os otomanos sofreram novo revés
com a revolta dos mamelucos do Egito sob comando de Ali Bey al-
Kabir apoiados pelo xeque de Acre, Zahir al-Umar. A frota russa forneceu ajuda
crítica aos rebeldes na batalha de Sidon e bombardeou e ocupou por quatro
meses a cidade de Beirute, que foi restituída ao emir pró-otomano
do Líbano, Yusuf Shihab, mediante o pagamento de um vultoso resgate em
1773.

Finalmente, em junho de 1774 o exército russo sob o comando


de Alexander Suvorov e Mikhail Kamensky derrotou mais uma vez aos
otomanos sob comando do general Abdul Rezaque Paxá na Batalha de
Kozludzha. O novo sultão Adul Hamid I viu-se forçado a assinar o
desfavorável Tratado de Küçük Kaynarca em 24 de julho de 1774, concluindo a
guerra e aceitando as condições impostas pela Rússia. Segundo os termos do
tratado, os otomanos cederam aos russos os portos-chave de Azov e Kerch,
permitindo à frota mercante russa o acesso direto ao Mar Negro; concederam a
independência do Canato da Crimeia (convertida num protetorado russo) e
cederam a Bukovina (noroeste da Moldávia) aos austríacos. Os russos
receberam ainda uma indenização de 4,5 milhões de rublos e obtiveram o
status de protetores dos cristãos ortodoxos residentes no Império Otomano.

Em 1786, Catarina, a Grande, realizou sua entrada triunfal na Crimeia


anexada na campanha de seu aliado, o sacro imperador José II. Isso, junto
com a fricção causada por mútuas acusações do Tratado de Kuchuk-Kainarji,
que havia terminado a guerra anterior, inflamaram a opinião pública de
Constantinopla. E assim começa a Quinta Guerra Russa-Turca de 1787 a
1792.

A guerra declarou-se em 1788, mas os preparativos da Turquia foram


inadequados e era um momento ruim, com a Áustria aliada à Rússia, que os
turcos só descobriram apenas quando já era tarde. Os turcos conseguiram com
que os austríacos se retirassem de Mehadia e conquistaram o Banato (1789).
Mas na Moldávia, o marechal de campo, Rumyantsev, apossou-
se Iaşi e Khotin. Em um grande campo de inverno em Ochakiv, foi morto o
príncipes Grigori Alexandrovich Potemkin, e todos seus habitantes foram
massacrados. Isso afetou tanto o sultão Abdulamide I, que lhe causou a morte.

 As expedições de auxílio à Bender e Akerman fracassaram, Belgrado foi


tomada pelo General Laudon da Áustria, a fraca fortaleza de Izmail foi
capturada por Suvórov mediante o uso de ataques surpresa e combinados de
infantaria e artilharia, Ushakov destruiu a frota otomana em Fidonisi,
Tendra, Estreito de Kerch e Cabo Caliacria, e a queda de Anapa diante de Ivan
Gudocivh completou a série de desastres turcos. Pelo Tratado de Jassy,
firmado com a Rússia, em 9 de janeiro de 1792, o Império Otomano
reconheceu a anexação russa do Canato da Crimeia (efetuada em 1783) e
cedeu Yedisán (Khadsibey e Ochakiv) a Rússia, passando o rio Dniéster a ser
a fronteira entre ambos os países. A fronteira asiática (o rio Kuban)
permaneceu intacto.

(Campo de Ochakiv, em 1788, por January Suchodolski)

No entanto, antes de continuar falando das outras seis guerras russos-


turcas que faltam, precisamos falar de um evento que chocou o mundo, a
Revolução Francesa. Esse é um evento muito complexo que eu não vou falar
em detalhes porque é muito extenso. Mas praticamente a Revolução Francesa
marca a vitória dos ideias iluministas e sua expansão para o resto da Europa
por meio das Guerras Napoleônicas. Mas afinal, o que é este Iluminismo?

O termo Iluminismo foi criado por Franco Venturi, na década de 30. Ele
era um italiano, que descontente em ver o fascismo surgindo em todo o mundo
de formas diferentes (Franquismo, Getulismo, Peronismo, Rooseveltismo,etc),
começa a olhar para o passado com uma certa saudade dos tempos da
Revolução Francesa. É um instinto natural do homem, que quando se sente
descontente com a época que vive, sempre relembra dos "velhos tempos" e
dos "bons tempos" do passado. Então os acadêmicos passam a olhar para o
século XVIII.

O Iluminismo era variado, mas no geral era uma forma de esquerdismo,


uma forma de populismo às vezes, ou até uma visão elitista esquerdista.
Alguns iluministas vão na contramão, como Voltaire que não estava
interessado na democracia. Os iluministas franceses se basearam nos
pensadores ingleses do século XVII, como John Locke, Francis Bacon, Isaac
Newton, e normalmente os filósofos franceses eram algum tipo de empirista
lockeano. D´Alembert por exemplo, era extremamente positivista. Um dos
filósofos franceses, no típico estilo Whig progressivo, descartou qualquer um ou
ideia antes do século XVI. Toda a filosofia moderna bebe do nominalismo, que
nega a existência de Universais. Para o nominalismo, não existe um conceito
absoluto do que é justiça, do que é beleza, do que é a bondade. Para eles,
tudo é uma nomeclatura que você aplica como desejar. Essa corrente de
pensamento vai surgir ainda na Idade Média, com Guilherme de Ockham
(1288-1347), e vai negar que existe a metafísica. David Hume, procurou
estender a filosofia em geral à abordagem metodológica da Revolução
Científica da Física Newtoniana. Ele era muito mais radical no seu empirismo
do que o do Locke, estando muito mais próximo da atual filosofia analítica.

Frederick Copleston, um grande historiador do pensamento jesuíta,


resume de forma linda o Iluminismo. Os iluministas assumem uma teoria do
progresso, em que o progresso consiste no avanço da racionalização do
homem, o qual significa uma emancipação da supertição religiosa, e das
formas irracionais de governo. Na opinião dos Iluministas, os frutos do
progresso eram melhor representados por eles mesmos, os livres pensadores
esclarecidos, e a remodelação da sociedade, com base nos ideias do
Iluminismo.

Se você for pra qualquer faculdade de filosofia britânica, tudo será


filosofia analítica. Uma oposição quase dogmática a tudo que possa parecer à
Escolástica. É tudo um raciocínio indutivo, e um afastamento da abordagem
dedutiva que caracteriza por exemplo o trabalho de Rothbard e Hoppe. o
Iluminismo é o pai do cientificismo. Eles criam um relativismo materialista, e
tentam aplicar o método científico em qualquer área, o que é impossível. Eles
tentam tratar filosofia, moralidade, e psicologia como se fosse Física. Eles tem
uma visão excessivamente mecanicista do mundo. A filosofia medieval tem
muito mais profundidade e riqueza do propósito e essência de uma coisa. Com
o iluminismo não há mais propósito final, qual o propósito de conhecer as
coisas? Não existe mais isso, o conhecimento se torna apenas poder.

A Revolução Francesa ocorreu de 1789 a 1799, marcada por várias


fases como a Convenção (1792-95), o Reino do Terror (1793-94), Diretório
(1795-99). Só para se ter uma ideia, a Insquisição Espanhola julgou mais ou
menos 140.000 casos em 300 anos, e matou menos de 2000 pessoas.
Somente no Reino do Terror, entre junho de 1793 e julho de 1794, cerca de
16.594 pessoas foram executadas, sendo 2639 mortes só em Paris. Apesar
disso, há um consenso de que o número é muito maior, com cerca de 10 mil
mortes que ocorreram sem julgamentos ou em prisões.

Os revolucionários eram em grande parte da maçonaria, uma seita


iniciática e gnóstica, que faz rituais satânicos e que desde 1717 influencia a
política mundial atrás dos panos. A maçonaria é a principal inimiga da Igreja
Católica, porque prega a liberdade religiosa e o Estado Laico. Mas eles não
pregam a liberdade religiosa porque respeitam todas as religiões, mas sim
porque querem continuar com sua seita gnóstica e satânica. Além disso, um
Estado laico não é um Estado que respeita todas as religiões, mas é um
Estado que se acha Deus. Para a Igreja Católica, o Estado deve estar
submetido à fé e não o contrário, e as outras religiões que não são antiéticas
como judaísmo, budismo, hinduísmo, devem ter liberdade de culto, mas o
Estado deve ser confessional e católico. Isso é muito simples de explicar: a
conversão católica sempre foi voluntária, como Alcuíno de York muito bem
mostrou e corrigiu Carlos Magno. No entanto, se a sua religião promove a
agressão a indivíduos pacíficos como o sectarismo político do Islã, ela deve ser
combatida.

O resultado da Revolução Francesa foi a abolição da monarquia,


aristocraica e da Igreja, e sua substituição por uma república democrática
secular radical, que por sua vez, foi muito mais autoritária, militarista e tirânica
que qualquer monarquia absolutista que o mundo já viu. Além disso, teve uma
mudança social radical baseada no nacionalismo, na democracia e no
princípios iluministas de cidadania e direitos inalienáveis.

De junho a agosto de 1792, o Império Russo acaba anexando toda a


Comunidade Polaco-Lituana, e partes ficam com a Prússia. Em agosto, alguns
estados pequenos do Sacro Império Romano Germânico começam a atacar e
entrar na França, mas são logo repelidos em outubro. Em fevereiro de 1793, já
estavam contra a França todo o Sacro Império, Prússia, a Áustria dos
Habsburgos, o Império Russo, Inglaterra, Espanha, Portugal, e quase toda a
Itália. Em 1795, Espanha e a Rússia saem da guerra. Em 1796, a Espanha
muda de lado e apoia a França. Em 1797, Áustria e Sacro Império saem da
guerra assinando um acordo de paz.

Em 3 de julho, o Império Otomano entra na guerra contra os franceses.


No mesmo mês, Napoleão invade o rio Nilo e toma as terras em volta do rio.
Em dezembro, a Rússia e Áustria declaram guerra novamente à França. Em
fevereiro de 1799, os franceses conquistam uma faixa litorânea de terra no
Levante até mais ou menos a Síria, mas são expulsos em maio. Em março de
1800, a Rússia novamente saí da guerra. Em julho de 1800, a faixa no Nilo é
reconquistada pelos Otomanos. Em fevereiro de 1801, o Sacro Império e a
Áustria saem da guerra. O Império Otomano saí da guerra em junho de 1801.
Em março de 1802, a Inglaterra saí da guerra, dando fim à guerra por
enquanto.

Em maio de 1803, a guerra recomeça, com apenas a Inglaterra contra a


França. Em dezembro de 1804, a Espanha novamente se alia à França. Em
abril de 1805, a Rússia entra na guerra contra a França. Em agosto do mesmo
ano, Áustria, Sacro Império, Suécia e o reino da Sicília entram na guerra contra
a França. Em 1806, o Sacro Império finalmente caí depois de 844 anos de
existência, sendo substituído pela Confederação do Reno, um estado fantoche
francês. Em outubro, a Prússia entra na guerra, mas é completamente anexada
até julho de 1807. Em novembro de 1806, o Império Otomano entra na guerra,
só que desta vez aliado aos franceses. A Rússia começa ao mesmo tempo a
Sexta Guerra Russo-Turca (1806-1812), onde em dezembro ela começa a
anexar os estados vassalos da Moldávia e Valáquia. Após essa guerra, os
turcos cedem o território da Bessarábia (atual Moldávia) aos russos.

Em julho de 1807, o Império Otomano saí da guerra, e a Rússia muda


de lado, se aliando aos franceses. Em agosto, a Dinamarca e Noruega entram
na guerra do lado dos franceses. Em abril de 1808, a Rússia anexa a Finlândia,
que fazia parte da Suécia. Em maio de 1808, a Espanha muda de lado
novamente e junto com Portugal começa a Guerra Peninsular contra os
franceses, uma guerra de guerrilha. Em abril de 1809, a Áustria novamente
declara guerra à França, mas perde e vira um aliado francês em outubro. Em
dezembro, a Suécia saí da guerra e fica neutra, mas em novembro de 1810
volta como aliado da França. Em abril de 1812, a Rússia novamente saí da
guerra, mas volta em junho, desta vez contra os franceses. Em agosto de
1812, as tropas de Napoleão chegam em Moscow, mas devido à tática de terra
arrasada, os franceses perdem quase todo o exército no caminho de volta. Em
dezembro, os russos começam a empurrar os franceses de volta, conquistando
partes da Polônia. Em março de 1813, Áustria e Prússia saem da guerra e a
Suécia e a Prússia voltam contra os franceses. Em agosto, a Áustria
novamente entra na guerra contra os franceses. Agora, Áustria e Prússia
começam a marchar e reconquistar as terras conquistadas por Napoleão. Em
abril de 1814, finalmente eles conquistam Paris e Napoleão é exilado na ilha de
Elba, perto do norte da Itália. No entanto, Napoleão consegue fugir e retornar à
França, e em março de 1815, recomeça a guerra, mas agora seu único aliado
era o reino da Sicília, que caí em maio. Então em 8 de julho de 1815, as
Guerras Napoleônicas finalmente chegam a seu fim, com Napoleão sendo
exilado em uma ilha muito mais longe, perto da costa sudeste da África, a ilha
de Santa Helena, onde ele morre em 1821.

A Revolução Francesa e as Guerras Napoleônicas são eventos muito


interessantes de estudar porque mostra que o Iluminismo é tão ruim e chocou
tanto a Europa, que por um momento em 1799, Católicos (Áustria),
Protestantes (Prússia), Anglicanos (Inglaterra), Ortodoxos (Rússia), e até
Muçulmanos (Império Otomano) se uniram contra o mal maior.

(Guerras Napoleônicas em 1799 – Ollie Bye)

As guerras também ocorreram em algumas colônias europeias e na


Índia, que estava quase toda sob o domínio do Império Mogol. O Império Mogol
foi fundado em 1526 por Babur, um descedente de Gengis Khan e Tamerlão, e
durou até 1857, quando foi conquistado pelos ingleses. Ele abrangeu o que
hoje é a Índia, Paquistão, Bangladesh e Afeganistão. A estrutura imperial
mogol, no entanto, às vezes é datada de 1600, para o governo do neto de
Babur, Aquebar. Esta estrutura imperial durou até 1720, até pouco depois da
morte do último grande imperador, Aurangzeb, durante cujo reinado o império
também atingiu sua extensão geográfica máxima. No seu auge, o império foi
possivelmente o Estado mais rico, sofisticado e poderoso do planeta. Contava
com uma população entre 158 milhões de habitantes, ou seja, 99% da
população indiana. A base da riqueza coletiva do império eram os impostos
agrícolas, instituídos pelo terceiro imperador mogol, Aquebar. Esses impostos,
que somavam bem mais da metade da produção de um agricultor
camponês, eram pagos na bem regulamentada moeda de prata e levavam
camponeses e artesãos a entrar em mercados maiores.

A era clássica do império iniciou-se com a ascensão ao trono


de Aquebar em 1556 e chegou ao fim com a morte de Aurangzeb em 1707.
Durante este período, o império caracterizou-se por uma administração
eficiente e altamente centralizada, que interconetou as diferentes regiões da
Índia. A exemplo do Taj Mahal, todos os monumentos significativos edificados
pelos mogóis — o seu mais visível legado — provêm desta época. Aquebar
permitiu a liberdade de religião em sua corte e tentou resolver diferenças sócio-
políticas e culturais em seu império estabelecendo uma nova religião, Din-i-
Ilahi, com fortes características de um culto governante. O filho mais velho de
Xá Jeã, o liberal Dara Xico, tornou-se regente em 1658, como resultado da
doença de seu pai. Dara defendeu uma cultura hindu-muçulmana sincrética.
Com o apoio da ortodoxia islâmica, no entanto, um filho mais novo de Xá Jeã,
Aurangzeb (reinou de 1658 a 1707), assumiu o trono. Aurangzeb derrotou Dara
em 1659 e executou-o. Aurangzeb estabeleceu totalmente a sharia ao compilar
Fatwa Alamgiri. Ele é considerado o rei mais controverso da Índia, com alguns
historiadores argumentando que sua intolerância minou a estabilidade da
sociedade mogol, enquanto outros questionam isso, observando que ele
construiu templos hindus, empregou significativamente mais hindus em sua
burocracia imperial do que seus antecessores fizeram, opôs-se ao preconceito
contra hindus e muçulmanos xiitas, e casou-se com a princesa hindu Rajput
Nawab Bai.

O filho de Aurangzeb, Badur I, revogou as políticas religiosas de seu pai


e tentou reformar a administração. No entanto, após sua morte em 1712, a
dinastia mogol afundou no caos. Após 1725 o poder mogol entrou em rápido
declínio, ao qual se atribuem variadas causas: guerras de sucessão, crises
agrárias que fizeram eclodir revoltas locais, o aumento da intolerância religiosa
para com a maioria não muçulmana e, finalmente, o golpe dado pelo
colonialismo britânico. A British East India Company assumiu o controle da
antiga província mogol de Bengala-Biar em 1793, após abolir o domínio local
(Nizamat) que durou até 1858, marcando o início da era colonial britânica no
subcontinente indiano. Em 1857, uma parte considerável da antiga Índia mogol
estava sob o controle da Companhia das Índias Orientais. Após uma derrota
esmagadora na guerra de 1857-1858 que ele nominalmente liderou, o último
mogol, Badur Xá Zafar, foi deposto pela Companhia Britânica das Índias
Orientais e exilado em 1858. Através da Lei do Governo da Índia de 1858, a
Coroa Britânica assumiu controle dos territórios controlados pela Companhia
das Índias Orientais na Índia na forma do novo Raj britânico. 

(Império Mogol em seu ápice)

O Império Safáfida, que deu algum trabalho ao Império Otomano, que


jamais conseguiu conquistá-lo, caiu em 1736. O maior dos monarcas safávidas,
xá Abas I (1587-1629) chegou ao poder em 1587 com 16 anos de idade na
sequência da forçada abdicação de seu pai, o xá Maomé Codabanda, depois
de ter sobrevivido às intrigas e tentativas de assassinatos da corte quizilbache.
Ele reconheceu a ineficiência de seu exército, que foi constantemente sendo
derrotado pelos otomanos, que haviam capturado a Geórgia e a Armênia e
pelos uzbeques que haviam capturado Mexed e o Sistão, no leste.

Primeiramente, Abas I promoveu a paz em 1590 com os otomanos


entregando-lhes territórios no noroeste. Em seguida, dois ingleses, Robert
Sherley e seu irmão Anthony, ajudaram Abas I a reorganizar os soldado do xá
em um exército permanente, oficial, pago e bem treinado, semelhante ao
modelo europeu (que os otomanos já haviam aprovado). Abas I primeiramente
lutou contra os uzbeques, recapturando Herate e Mexede, em 1598. Então se
voltou contra os otomanos recapturando Bagdá, o leste do Iraque e as
províncias caucasianas, em 1622. Ele também usou a sua nova força para
expulsar os portugueses do Barém (1602) e a Marinha Inglesa do estreito de
Ormuz (1622), no golfo Pérsico (uma ligação vital do comércio português com
a Índia). Ele expandiu as relações comerciais com a Companhia Britânica das
Índias Orientais e a Companhia Neerlandesa das Índias Orientais. Assim
Abas I foi capaz de quebrar a dependência em relação ao poder militar dos
quizilbaches e centralizar o controle.

Os safávidas recapturaram Bagdá em 1623, até perdê-la novamente


para Murade IV em 1638. Doravante um tratado, assinado em Qasr-e Shirin,
estabeleceu uma delimitação de fronteiras entre o Irã e o Império Otomano, em
1639, uma fronteira que ainda permanece no noroeste do Irã e sudeste
da Turquia. Os 150 anos de lutas acentuaram a divisão entre sunitas e xiitas no
Iraque. Em 1609-1610, uma guerra eclodiu entre as tribos curdas e o Império
Safávida. Depois de um longo e sangrento cerco liderado pelo grão-
vizir safávida Hatem Beg, que durou de novembro de 1609 até o verão de
1610, a fortaleza curda de Dimdim foi capturada. O xá Abas ordenou
um massacre geral em Beradost e Mucriã (Mahabad) (reportado por Escandar
Begue Monxi, historiador safávida (1557-1642) no livro "Alam Ara Abbasi") e
reinstalou na região os turcos da tribo afexar, enquanto deportou muitas
tribos curdas para o Coração. Atualmente, há uma comunidade de cerca de 1,7
milhões de pessoas que são descendentes das tribos deportados
do Curdistão para o Khurasan (nordeste do Irã) pelos safávidas.

Devido a seu obsessivo medo de ser assassinado, o xá Abas mandava


matar ou cegar qualquer membro de sua família que despertasse nele qualquer
suspeita. Desta forma um de seus filhos foi executado e outros dois deixados
cegos. Uma vez que dois outros filhos morreram antes dele, a consequência foi
uma tragédia pessoal para o xá Abas. Quando ele morreu em 19 de janeiro de
1629, não existia filho capaz de lhe suceder. No início do século XVII o poder
dos quizilbaches começou a declinar e o poder agora estava dividido entre a
nova classe de comerciantes, muitos deles de etnia armênia, georgiana e indo-
ariana.

À exceção do xá Abas II, os governantes safávidas após Abas I foram


ineficientes. O fim de seu reinado, em 1666, marcou o início do fim da dinastia
Safávida. Apesar da queda das receitas e ameaças militares, os
últimos xás tiveram estilos de vida suntuosos. O xá Sultão Hosain (1694-1722),
em particular, era conhecido por seu amor ao vinho e pelo desinteresse em
governar. O país teve várias vezes as suas fronteiras invadidas
- Carmânia pelas tribos balúchis, em 1698, Coração pelos afegãos, em 1717,
constantemente na Mesopotâmia pelos árabes da península. O xá sultão
Huceine tentou pela força converter seus súditos afegãos do leste do Irã da
seita sunita para a xiita. Em resposta, um chefe ghilzai pastós chamado Mir
Wais Khan iniciou uma rebelião contra o governador da Geórgia, Jorge XI,
de Candaar e derrotou o exército safávida. Mais tarde, em 1722, um exército
afegão liderado pelo filho de Mir Wais, Mahmud, marchou pelo leste do Irã,
sitiando e saqueando Ispaã. Maomé proclamou-se "Xá da Pérsia".

Os afegãos controlaram seus territórios conquistados por doze anos,


mas foram impedidos de fazer novas conquistas por Nadir Xá, um antigo
escravo que tinha assumido a liderança militar dentro da tribo afexar no
Coração, um Estado vassalo dos safávidas. Nadir Xá derrotou os afegãos
na Batalha de Dangã, 1729. Ele expulsou os afegãos, que ainda ocupavam a
Pérsia, em 1730. Em 1738, Nadir Xá reconquistou a Pérsia Oriental,
começando por Candaar; no mesmo ano ele ocupou Gázni, Cabul e Lahore,
indo em direção leste até chegar em Deli, mas não fortificou sua base persa e
esgotou as forças de seu exército. Ele tinha o controle efetivo sobre o
xá Tamaspe II e em seguida, governou como regente o infante Abas III até
1736, quando ele próprio se coroou xá.

Foram os safávidas que fizeram do Irã o bastião espiritual


do xiismo contra as investidas violentas dos ortodoxos sunitas e o repositório
das tradições culturais persas e da auto-consciência da nacionalidade iraniana,
atuando como uma ponte para o Irã moderno.

(Império Safávida no auge)

Esforços de reforma militar otomana começam com Selim III (1789-


1807) que fez as primeiras tentativas importantes para modernizar as forças
armadas otomanas com padrões europeus. Estes esforços foram prejudicados
por movimentos reacionários, em parte de lideranças religiosas, mas
principalmente a partir do corpo de janízaros, que se tornou anarquista e
ineficaz. Invejosos de seus privilégios e firmes opositores às mudanças, eles
criaram uma revolta janízara. Os esforços de Selim custaram-lhe o seu trono e
sua vida, mas foram resolvidos de forma espetacular e sangrenta pelo seu
sucessor, Mamude II, que massacrou o corpo de janízaros em 1826.
Em 1821, os gregos foram os primeiros a declarar guerra ao sultão.
Através da rebelião que se originou na Moldávia, e seguido pela revolução
no Peloponeso, essa última, juntamente com a parte norte do golfo de
Corinto se tornaram as primeiras partes do Império Otomano a ser totalmente
libertadas em 1829. A Rússia participou nos anos finais dessa guerra, na
Sétima Guerra Russo-Turca (1828-1829), que iniciou quando o Sultão fechou o
Estreito de Dardanelos para os navios russos e revocou a Convenção de
Akkerman em represália pela participação da Rússia na Batalha de Navarino.

No inicio das hostilidades, o exército russo de 92 mil homens foi


comandado pelo Imperador Nicolau I, enquanto as forças otomanas eram
comandadas por Hussein Paxá. Entre abril e maio de 1828, o comandante-
chefe russo, Príncipe de Wittgenstein, dirigiu as suas forças para os
Principados Romenos da Valáquia e Moldávia. Em junho de 1828, as principais
forças russas, sob comando do imperador, atravessaram o rio Danúbio e
avançaram até Dobruja. Os russos cercaram três das principais cidadelas
otomanas na Bulgária moderna: Shumen, Varna, e Silistra. Com o apoio
da Frota do Mar Negro, sob as ordens de Aleksey Greig, Varna foi capturada a
29 de setembro. O cerco de Shumen foi muito difícil porque os efetivos da
guarnição otomana, cerca de 40 mil homens, excediam o das forças russas.
Além disso, os otomanos conseguiram cortar as linhas de abastecimento dos
russos. As operações militares terminaram no Verão de 1829 e a paz foi
formalmente estabelecida pelo Tratado de Adrianópolis.
(Queima de uma fragata otomana por um brulote grego durante a Guerra de
independência da Grécia (1821–1829).)
(Batalha de Akhalzic (1828), por January Suchodolski)

O império perdeu território em todas as frentes, e não houve estabilidade


administrativa, devido às avarias do governo centralizado, apesar dos esforços
de reforma e reorganização, como a Tanzimat. A Tanzimat foi um período de
reformas que ocorreu de 1839 a 1876, para assegurar a integridade nacional
contra movimentos nacionalistas e que pudessem ameaçar o Estado. As
reformas encorajadas pelo Otomanismo contra diversos grupos étnicos do

Império possibilitou o surgimento de um movimento nacionalista otomano.

Essas reformas basicamente acabaram com aquele sistema de millets


que descrevemos, e muitas das reformas visavam adotar medidas europeias
supostamente bem sucedidas. Medidas como a conscripção universal;
reformas educacionais, institucionais e legais; e sistemático esforço contra
a corrupção. Basicamente o Império Otomano estava sofrendo influências do
Iluminismo e do Liberalismo, o que acelerou a sua queda.
Em 3 de novembro de 1839, Sultão Abdul Mejide lançou o Estatuto
Orgânico do General Hatt-ı Şerif de Gülhane (jardim imperial onde fora
proclamado pela primeira vez). É também chamado de Tanzimat Fermani.
Neste documento muito importante, o Sultão ordenou que desejava trazer os
benefícios de uma boa administração às Províncias do Império Otomano
através de novas instituições, e essas intituições referiam-se principalmente a:

 Garantia do Império Otomano pela perfeita segurança de suas vidas,


honra e propriedades;
 Introdução dos primeiros extratos bancários otomanos (1840);
 Reorganização do exército por meio de convocações regulares,
elevando o exército e fixando tempo no serviço militar (1843-1844);
 Adoção de um hino nacional e a bandeira nacional otomana (1844);
 Reorganização do sistema financeiro de acordo com o modelo
francês;
 Reorganização do código civil e criminal de acordo com o modelo
francês;
 Estabelacimento do Meclis-i Maarif-i Umumiye (1845), o primeiro
protótipo de parlamento otomano;
 Instituição de um conselho público de instrução (1846);
 Estabelecimento de modernas universidades e academias (1848);
 Extinção da taxa de captação sobre não muçulmanos, com o
estabelcimento de um sistema regular de impostos (1856);
 Não-muçulmanos autorizados a se tornarem soldados (1856);
 Muitas provisões para uma melhor administração do serviço público
e avanço do comércio;
 Construção de estradas de ferro;
 Recolocação de guildas e fábricas;
 A primeira Bolsa de Valores foi criada em Istambul (1866);

O Édito foi seguido do Hatt-ı Hümayun de 1856 que promovia a a


igualdade total para cidadãos de todas as religiões, e a Lei Nacional
de 1869 que criou uma cidadania comum a todos os otomanos, para pessoas
de todas as religiões ou etnia.
 Os cristãos eram oficialmente chamados (ou, aos olhos otomanos,
autorizados) a servir no exército, porém isto poderia criar tensões de difícil
controle dentro do exército, logo foi dada a eles a opção de pagar uma taxa (a
bedel-i askeri), opção preferida pela maioria deles, embora fosse muito cara.
Durante o reinado de Abdulazize (1861-76), a Marinha tornou-se a terceira
maior do Mundo, mas estava longe de ser a terceira melhor do mundo. Em
1840 uma reorganização maior do sistema de cobrança foi anunciada, com
apenas três impostos remanescentes: o ‘’ciziye’’ ou imposto comunitário para
não-muçulmanos, o ‘’aşar’’ ou dízimo, e o ‘’müretteba’’ ou “impostos de
alocação”, que na verdade são impostos de serviço.

Os otomanos ficaram cada vez mais dependentes de alianças com


potências estrangeiras, como em 1853 na Guerra da Crimeia, onde os
otomanos se uniram com os britânicos, franceses, e outros contra o Império
Russo, que perdeu a guerra. A Guerra da Crimeia causou um êxodo
dos tártaros da Crimeia. Da população total de 300 000 tártaros da província
de Táuride, cerca de 200 000 tártaros da Crimeia mudaram-se para o Império
Otomano em ondas contínuas de emigração. A Rússia teve que ceder uma
parte da Bessarábia (o sul) à Moldávia, neutralizando a sua posição no mar
Negro. Cedeu também a embocadura do rio Danúbio para a Turquia e foi
proibida de manter bases ou forças navais no Mar Negro. O tratado estabelecia
também a liberdade de navegação no Danúbio e assegurava uma
administração à Moldávia.

No fim da Guerra do Cáucaso (1817-1864), onde os russos anexaram


partes do Cáucaso ao seu Império, muitos circassianos fugiram de suas terras
no Cáucaso e se estabeleceram no Império Otomano. Desde o século XIX, um
êxodo pela grande parte dos povos muçulmanos (que são chamados de
"muhacir" sob uma definição geral) dos Bálcãs, Cáucaso, Crimeia e Creta,
refugiou-se na atual Turquia e moldou as características fundamentais do país
até hoje.

O período reformista culminou com a constituição, o chamado Kanun-ı


esası (que significa "Lei Básica", em turco otomano), escrito por membros do
grupo "Jovens Otomanos", que foi promulgada em 23 de novembro de 1876.
Ela estabeleceu a liberdade de crença e a igualdade dos cidadãos perante a
legislação. A primeira era constitucional do império (ou Birinci Mesrutiyet
Devri em turco), teve vida curta, porém, a ideia por trás dele (Otomanismo),
mostrou-se influente como um grupo amplo de reformadores conhecido como o
jovens otomanos, educados principalmente em universidades ocidentais,
acreditava que uma monarquia constitucional seria a solução para dar uma
resposta à crescente agitação social do império. Através de um golpe militar
em 1876, forçaram o sultão Abdulazize (1861-1876) a abdicar em favor
de Murade V. Entanto, Murade V tinha doenças mentais e foi deposto em
poucos meses. Seu herdeiro aparente Abdulamide II (1876-1909) foi convidado
para assumir o poder sobre a condição de que ele iria declarar uma monarquia
constitucional, o que ele fez em 23 de novembro de 1876. No entanto, o
parlamento sobreviveu por apenas dois anos. O sultão suspendeu, mas não
eliminou o parlamento até que ele foi forçado a reuni-lo. A eficácia do Kanun-ı
esası foi depois amplamente minimizada.

A ascensão do nacionalismo varreu vários países durante o século XIX,


e o Império Otomano não ficou imune. A consciência nacional crescente,
juntamente com um crescente sentimento de nacionalismo étnico, fez do
pensamento nacionalista uma das ideias ocidentais mais significativas
importadas para o Império Otomano, que foi forçado a lidar com o
nacionalismo, tanto dentro como fora das suas fronteiras. Houve um aumento
significativo no número de partidos políticos revolucionários. Levantes em
território otomano tiveram muitas consequências de longo alcance durante
o século XIX e determinaram grande parte da política otomana durante
o século XX. Muitos turcos otomanos questionavam se as políticas do Estado
não eram culpadas. Alguns sentiram que as fontes de conflitos étnicos eram
externos e não relacionados a questões de governança. Apesar de esta época
os otomanos terem tido alguns sucessos, a capacidade do Estado para ter
qualquer efeito sobre revoltas étnicas foi seriamente posta em dúvida.
Apoiadas pelo Império Russo, Sérvia e Montenegro declararam guerra ao
Império Otomano.

Em 1875, os principados afluentes da Sérvia, Montenegro e Romênia


declararam unilateralmente sua independência do Império, e após a Oitava
Guerra Russo-Turca de 1877-78, a independência foi formalmente concedida a
todas as três nações. A Bulgária também alcançou a independência (como o
Principado da Bulgária), cujos voluntários haviam participado da guerra russo-
turca, no lado das nações se rebelando.

(Belgrado, c. 1865. Em 1867, o Reino Unido e a França forçaram o exército


otomano a se retirar do norte da Sérvia, garantindo sua independência de fato
(formalizada após a Guerra Russo-Turca de 1877 a 1878 e o Congresso de
Berlim em 1878.))

O Vilaiete da Bósnia e do Sanjaco de Novi Pazar foram parcialmente


ocupados pelas forças do Império Austro-Húngaro na sequência do Congresso
de Berlim em 1878, mas permaneceram nominalmente como territórios
otomanos (Bósnia e Herzegovina até à crise da Bósnia em 1908, Novi Pazar
até à Primeira Guerra Balcânica em 1912), com a presença permanente de
soldados otomanos. O Chipre foi alugado para os britânicos em 1878 em troca
de favores da Grã-Bretanha, no Congresso de Berlim. O Egito, que já tinha sido
ocupado pelas forças de Napoleão I de França em 1798, mas se recuperou em
1801 por um exército otomano-britânico, foi ocupado em 1882 pelas forças
britânicas, sob o pretexto de trazer ordem, embora o Egito e Sudão
permanecessem como províncias otomanas de jure, até 1914, quando o
Império Otomano se juntou à Tríplice Aliança e a Grã-Bretanha anexou
oficialmente estas duas províncias e Chipre como resposta. Outras províncias
otomanas no norte da África foram perdidas entre 1830 e 1912, a partir
da Argélia (ocupada pela França em 1830), Tunísia (ocupada pela França em
1881), Egito (ocupado pela Inglaterra em 1882) e Líbia (ocupada pela Itália em
1912.).

Os armênios, que tiveram a sua constituição própria e assembleia


nacional com as reformas Tanzimat, começaram a pressionar o governo
otomano para uma maior autonomia após a Guerra russo-turca de 1877-1878 e
o Congresso de Berlim em 1878. Um número de levantes armênios ocorreu
nas cidades da Anatólia, levando o sultão Abdulamide II a responder a estas
rebeliões e ataques, que estabelece os regimentos Hamidiye no leste da
Anatólia, formadas principalmente de unidades de cavalaria irregular de curdos
recrutados. De 1894-96 algo entre 100.000 a 300.000 armênios que viviam por
todo o império foram mortos no que ficou conhecido como o massacre
Hamidiano. Militantes armênios tomaram a sede do Banco Otomano em
Constantinopla em 1896 para trazer a atenção da Europa para os massacres,
mas eles falharam nesse esforço.

Economicamente, o império tinha dificuldade em reembolsar a dívida


otomana pública para os bancos europeus, o que causou a criação do
Conselho de Administração da Dívida Pública Otomana. Até o final do século
XIX, a principal razão do império não ter sido totalmente tomado pelas
potências ocidentais vieram da doutrina do equilíbrio de poder. Tanto o Império
Austríaco quanto o Império Russo queriam aumentar suas esferas de influência
e território, em detrimento do Império Otomano, mas foram mantidos em xeque
principalmente pelo Reino Unido, que temiam o domínio russo na região do
Mediterrâneo Oriental.

A segunda era constitucional (İkinci Mesrutiyet Devri) começou após


a Revolução dos Jovens Turcos (3 de julho de 1908) com o anúncio do sultão
da restauração da Constituição de 1876 e a convocação do parlamento
otomano. Ela marca a dissolução do Império Otomano. Esta época é dominada
pela política do Comitê de União e Progresso (Ittihad ve Terakki Cemiyeti), e do
movimento que viria a ser conhecido como os "Jovens Turcos" (Jon Türkler).
Lucrando com a guerra civil, o Império Austro-Húngaro anexou
oficialmente a Bósnia e Herzegovina, em 1908, mas retirou suas tropas do
Sanjaco de Novi Pazar, outra região contestada entre os austríacos e
otomanos, a fim de evitar uma guerra. Durante a Guerra Ítalo-Turca (1911-
1912) em que o Império Otomano perdeu a Líbia, a Liga Balcânica declarou
guerra contra o Império Otomano, que perdeu seus territórios dos Bálcãs,
exceto a Trácia oriental e a cidade histórica de Edirne (Adrianópolis), com a
Guerra dos Balcãs (1912-13). Depois, cerca de 400 000 muçulmanos fugiram
com o Exército Otomano, por temor de uma eventual
perseguição grega, sérvia e búlgara. A Ferrovia Berlim-Bagdá, sob controle
alemão, tornou-se uma fonte de tensão internacional e desempenhou um papel
nas origens da Primeira Guerra Mundial. Agora o Império estava apenas com
os territórios da atual Turquia, Levante, Iraque e da costa do Hejaz.

(território otomano de 1914 a 1918 em verde escuro)

O governo dos Jovens Turcos assinou um tratado secreto,


estabelecendo uma aliança otomana com a Alemanha, contra um inimigo em
comum: a Rússia, com o alinhamento do império com a Tríplice Aliança. O
Império Otomano entrou na Primeira Guerra Mundial, após o incidente Goeben
e Breslau, na qual se deu porto seguro para dois navios alemães que estavam
fugindo de navios britânicos. Estes navios, em seguida, - depois de terem sido
oficialmente transferidos para a marinha otomana, mas efetivamente ainda sob
controle alemão - atacaram o porto russo de Sebastopol, arrastando o Império
na guerra ao lado das Potências Centrais, na qual tomaram parte no front do
Oriente Médio. Houve várias vitórias otomanas importantes nos primeiros anos
da guerra, como a Batalha de Gallipoli e no cerco de Kut, mas houve
contratempos, bem como a desastrosa campanha do Cáucaso contra os
russos.

Em 1915, com o exército russo a avançar na Anatólia Oriental, com a


ajuda dos batalhões de voluntários armênios da região do Cáucaso do Império
Russo, e ajudado por alguns armênios otomanos, o governo otomano decidiu
usar isso como pretexto para começar o seu extermínio de toda a população
armênia. Através de marchas forçadas e os massacres, os armênios que vivem
no leste da Anatólia foram tirados de suas terras natais e enviados para o sul,
como as províncias otomanas na Síria e Mesopotâmia. As estimativas sobre o
número de mortos durante o Genocídio armênio variam de um milhão de até
1,5 milhões de pessoas. Neste período, o setor financeiro otomano era quase
todo dependente de não islâmicos.
(Armênios escoltados por soldados otomanos marchando da cidade de Harput
(atual Elazığ) para um campo de prisioneiros, abril de 1915.)

(Mapa dos locais de massacres e campos de extermínio e deportação no


território otomano.)
A Revolta Árabe, que começou em 1916, virou a maré contra os
otomanos na frente do Oriente Médio, onde inicialmente parecia ter a vantagem
durante os primeiros dois anos da guerra. O T.E. Lawrence (1888–1935), ou
também chamado Lawrence da Arábia, era um oficial inglês, admirador do
deserto e do estilo de vida beduíno, que se ofereceu para ajudar os árabes a
se livrarem do domínio otomano. Sua história ficou tão famosa que foi feito um
filme sobre ele, lançado em 1962. O filme mostra cinco episódios principais da
vida de Lawrence durante a sua estada na Arábia: a conquista de Aqaba, as
ações de guerrilha contra o Império Otomano, o seu rapto e a tortura pelos
turcos em Deraa, o massacre de Tafas e o fim do sonho de união das tribos
árabe em Damasco. O filmes possui alguns erros históricos, mas essa revolta
realmente existiu e a maioria dos personagens do filme realmente existiram,
assim como boa parte dos acontecimentos do decorrer da revolta.

(trecho do filme Lawrence da Arábia)

Quando o Armistício de Mudros foi assinado em 30 de outubro de 1918,


as únicas partes da península Arábica que ainda estavam sob o controle
otomano eram o Iêmen, Assir, a cidade de Medina, porções do norte da Síria e
partes do norte do Iraque. Esses territórios foram entregues às forças britânicas
em 23 de janeiro de 1919. Os otomanos também foram obrigados a evacuar as
partes do antigo Império Russo no Cáucaso, que tinham ganhado no fim da
Primeira Guerra Mundial, após a retirada da Rússia da guerra com a Revolução
Russa em 1917.

Sob os termos do Tratado de Sèvres, a partilha do Império Otomano foi


solidificada. Os novos países criados a partir dos antigos territórios do Império
Otomano, atualmente são contados em 40 (incluindo a contestada República
Turca de Chipre do Norte). A ocupação de Constantinopla, juntamente com a
ocupação de Esmirna mobilizou a criação do movimento nacional turco, que
ganhou a guerra de independência turca (1919-1922) sob a liderança
de Mustafa Kemal Paxá. A monarquia foi abolida em 1 de novembro de 1922, e
o último sultão, Mehmed VI (que reinou de 1918 a 1922), deixou o país em 17
de novembro de 1922. A Turquia como república foi reconhecida com o
Tratado de Lausana, em 24 de julho de 1923. A Grande Assembleia Nacional
(GAN) da Turquia declarou oficialmente a República da Turquia em 29 de
outubro de 1923. O califado foi abolido pela constituição vários meses depois,
no dia 3 de março de 1924. O sultão e sua família foram declarados persona
non grata na Turquia e exilados.

(Esmirna em 1900, durante o período otomano)


(Mesquita Yeni e o mercado de Eminönü em Constantinopla em 1895)

O islã no século XX e XXI

Nos anos que antecedem a Primeira Guerra Mundial iniciou-se a


prospecção de petróleo no Oriente Médio, na qual os ingleses se revelarão os
mais ávidos. Durante a Primeira Guerra Mundial os Aliados exploraram o
descontentamento em relação ao Império Otomano existente em regiões como
a Arábia e a Síria. Apesar das promessas de apoio ao movimento nacionalista
árabe, o fim da guerra acabou por traduzir-se num aumento da colonização
europeia sobre os países árabes.

Os ingleses tinham prometido a Huceine ibne Ali que seria o rei de um


grande território formado por aquilo que é hoje o Líbano, a Síria, o Iraque, a
Palestina, a Jordânia e a Arábia. Esta promessa não foi cumprida e a queda do
Império Otomano em 1918 apenas fez com que os árabes mudassem de amo:
aos franceses seria atribuído, pela Sociedade das Nações, um mandato sobre
a Síria e o Líbano e aos ingleses sobre a Palestina. Os filhos de Huceine ibne
Ali governam dois territórios sob patrocínio britânico, a Transjordânia e o
Iraque. Na Arábia forma-se um reino liderado por ibne Saude, com o apoio
dos Estados Unidos.

Em 1928, é fundada no Egito a Associação dos Irmãos Muçulmanos por


Hasan al-Banna (1906-1949). Segundo Pace (2005), ela foi fundada como uma
espécie de ponte que interligaria a exigência de retorno às origens do Islã,
proposta por parte dos reformistas, à necessidade de reestruturar uma
identidade cultural e religiosa que, sob a influência da cultura ocidental, para
muitos, corria o risco de se perder. Na conjuntura que se seguiu à abolição do
Império Otomano em 1924, a trajetória inicial da Irmandade Muçulmana seria
fortemente influenciada pelas crenças de al-Banna, que avaliava a decadência
moral, a bancarrota econômica e a educação antirreligiosa liberal maçônica
como consequentes de um projeto desenhado pelas potências europeias para
enfraquecer e dominar o mundo muçulmano (Obaid, 2017).

Para solucionar os problemas enfrentados pelo país, a Irmandade


Muçulmana patrocinou serviços sociais locais que demonstravam a sua
preocupação com o bem-estar público (Obaid, 2017), desenvolvendo um
trabalho educativo e religioso a partir da base e criando centros sociais e
recreativos que, de acordo com Pace (2005), ajudam na compreensão da
densidade social que o projeto viria a conquistar.

A Irmandade Muçulmana era tradicional no que concerne à crença de al-


Banna de que a regeneração política e social do Egito estaria intimamente
ligada à restauração do Islã, bem como à defesa, sob o argumento de que os
males dos quais o país sofria poderiam ser atribuídos à substituição do Alcorão
por instituições seculares, da implementação da Sharia. Por outro lado, al-
Banna buscou tirar proveito dos avanços tecnológicos do século XX sem que
os mesmos sentissem que estavam comprometendo os seus deveres com os
valores islâmicos (Cleveland & Burton, 2009). A Irmandade atraiu jovens
profissionais que tiveram uma educação moderna e que viam suas ambições
sociais frustradas pela ordem política vigente.

A Irmandade, em seus anos de formação defendeu a jihad em relação


aos imperialistas e sionistas do Ocidente e se dedicou, sobretudo, a uma
reforma social que se desenvolvesse de baixo para cima na sociedade. A partir
dos anos 1930 evocaria os princípios da jihad contra grupos rivais e em relação
ao governo egípcio (Obaid, 2017). Aquele movimento, cuja originalidade
consistia na criação de uma micro sociedade islâmica dentro de uma sociedade
secularizada e corrompida pela colonização britânica, aceleraria a sua atuação
social e política somente a partir de 1939. Na ocasião, o consentimento das
autoridades egípcias em relação à crescente presença inglesa no país, bem
como a ausência de uma reação ao projeto de criação de um Estado judeu na
Palestina, levariam al-Banna a intensificar seus ataques ao governo, o que
resultaria, em 1941, em sua prisão e na marginalização dos Irmãos
Muçulmanos (Pace, 2005).

Na década de 1940, houve uma importante virada na história da


organização. Para resistir aos ataques que vinha recebendo, a Irmandade
Muçulmana entrou na clandestinidade, numa conjuntura em que o movimento
organizaria uma dura oposição aos ingleses e ao governo; e este último, frente
ao assassinato do Primeiro Ministro, al-Nuqrashi em 1948, encontraria um
pretexto para acusar os Irmãos Muçulmanos, os quais se veriam na
necessidade de debandar e que, poucos meses depois, em 1949, teriam seu
líder Hassan al-Banna assassinado (Pace, 2005). Pinto (2010) remete ao
apontamento de Mitchel (1969) quanto à aliança com grupos nacionalistas que
a Irmandade Muçulmana faria a partir da morte de al-Banna, bem como ao seu
apoio ao golpe dos oficiais que levaria, em 1952, Gamal ‘Abd al-Nasser ao
poder.

No entanto, Nasser traiu a Irmandade e instaurou um governo laico, e


com um de seus membros realizou um atentado contra ele, que fez com que
Nasser dissolvesse a organização e prendesse muitos de seus membros.
Dentre eles, um que se tornou uma das figuras mais influentes no islã, Sayyid
Qutb (1906-1966).  A abertura de Milestones, livro escrito por Qutb no período
em que ele esteve no cárcere e o qual tornou-se um de seus trabalhos mais
expoentes, evidencia o seu pensamento relativamente àquele período:
“A humanidade de hoje está à beira da destruição, não
por causa do perigo de aniquilação completa que está pairando
sobre a sua cabeça – sendo este apenas um sintoma e não a
doença real – mas porque ela é desprovida daqueles valores
vitais que são necessários não só para o seu desenvolvimento
saudável, mas também para o seu progresso real. Mesmo o
mundo ocidental compreende que a civilização ocidental é
incapaz de apresentar quaisquer valores saudáveis para a
orientação da humanidade. Ele sabe que não possui nada que
vá satisfazer sua própria consciência e justificar a sua existência.
(Qutb, 2006: 23, tradução nossa).”

Ademais, o governo de Nasser, como uma forma de demonstrar à


opinião pública nacional e internacional o seu comprometimento com a
modernização política e cultural do Egito, assassinaria Qutb em 1966. As ideias
de Qutb, entretanto, continuariam vivas; e, a partir de sua trajetória, seriam
agregados em diversos países árabes movimentos coletivos de base religiosa
e política que não mais estavam dispostos a se compromissarem com modelos
ocidentais ou com as classes dirigentes nacionais que sucederam o
colonialismo (Pace, 2005).

Nos anos 1970, quando quase todas as sociedades muçulmanas se


encontravam sob regimes autoritários, o descontentamento social e político
seria expresso principalmente através dos grupos islâmicos. A repressão
sistemática daqueles governos a toda forma de oposição, por sua vez,
estimularia uma lógica de radicalização que se materializaria de forma mais
violenta naquela década e nos anos 1980 (Pinto, 2010).

No período em questão, o sonho de um Estado Islâmico ganhou forma


no Irã, e apesar das diferenças e tensões entre o mundo sunita e xiita, a
Revolução Iraniana de 1979 reacenderia, assim, a esperança de grupos
militantes da conquista do poder a partir de uma tomada violenta (Pinto, 2010).

Em 1979, o mundo xiita seria palco de outro acontecimento de grande


relevância para o fortalecimento do radicalismo: a invasão soviética do
Afeganistão. O jihadismo transnacional emergiu como um produto do confronto
entre os EUA e a URSS na região em questão, e teria se desenvolvido, ainda,
sob a influência saudita naquele conflito, que transformou a resistência afegã
em uma guerra santa.
Na década de 1980, conforme aponta Pace (2005), o atentado da Jihad
Islâmica Egípcia contra Anwar Sadat – que por ter assinado um acordo de paz
com Israel seria acusado de traição à causa islâmica – levaria ao aumento da
dimensão armada sob justificativa religiosa por parte da interpretação de
movimentos coletivos radicais. Ainda de acordo com o autor, a Jihad liderada
por Salam Fara e a Jama’at Islamiyya constituiriam ramificações da Irmandade
Muçulmana, e as duas organizações viriam a direcionar os seus ataques
àqueles que simbolizavam o poder corrupto, quando:
[…] cristãos, judeus, turistas ocidentais, todos aqueles
que são acusados de serem ‘portadores de valores impuros’ e
cúmplices da ‘conspiração mundial contra o Islã’, tornar-se-ão
alvo de sua violência sagrada (Pace, 2005: 272).

Depois da Guerra do Afeganistão, Pinto (2010) sublinha que


a jihad transnacional iniciada naquele conflito se transformou numa jihad
globalizada, quando o horizonte político jihadista foi deslocado do Estado
Nacional para a presença norte-americana no mundo muçulmano. Para
compreendermos esse deslocamento, devemos considerar o pano de fundo do
período em questão: os Estados Unidos, no início dos anos 1990, emergiram
como a única potência global frente à queda da URSS, podendo, assim,
estruturar o sistema internacional que então emergia a partir dos valores
ocidentais.

A conjuntura em questão foi marcada, ainda, pela coalizão de países


liderada pelos Estados Unidos contra o Iraque na Guerra do Golfo (1990-1991).
Essa nova ordem global, por sua vez, acarretaria transformações no Oriente
Médio e no Norte da África que influiriam diretamente sobre os movimentos de
revivalismo islâmico de então.

E ainda, em 1948 é fundado o estado judeu de Israel, apoiado por todas


as potências ocidentais. Vale lembrar que a União Soviética de Stalin foi o
primeiro país a apoiar a criação do estado de Israel e também foi a primeira
nação a reconhecer sua independência. Em 30 de outubro de 1948, as Forças
de Defesa de Israel, durante a Operação Hiram, invadiram uma vila cristã de
800 cristãos desarmados e indefesos, executou 12 sumariamente e praticou a
migração forçada do resto para o Líbano, no que ficou conhecido como
massacre de Eilabun. Até hoje Israel tenta confiscar bens de igrejas nos
territórios ocupados por eles.

As tensões entre judeus e árabes começaram a emergir a partir


da década de 1880 do século XIX, quando judeus provenientes
da Europa começaram a emigrar, formando e aumentando comunidades
judaicas na Palestina, quer por compra de terras aos otomanos, quer por
compra direta a árabes proprietários de terrenos. Estabeleceram-se assim
comunidades agrícolas nas terras históricas da Judeia e de Israel, que eram
então parte do Império Otomano. De acordo com registros do Império
Otomano, que governou a Palestina durante vários séculos, no ano de 1900, a
população da Palestina era 600.000, dos quais 94% eram árabes. Enquanto
muitos árabes estavam dispostos a vender terras aos judeus que chegavam,
muitos outros árabes palestinos estavam preocupados com a possibilidade de
se tornarem minoria em seu próprio país. Assinado em janeiro de 1919,
o Acordo Faiçal-Weizmann promovia a cooperação árabe e judaica para o
desenvolvimento de uma Terra de Israel na Palestina e uma nação árabe numa
larga parte do Oriente Médio.

O líder religioso muçulmano Mohammad Amin al-Husayni opôs-se à


ideia de transformar parte da região da Palestina num Israel, objetando a
qualquer forma de Terra de Israel. Durante a década de 1920 do Século XX, as
tensões aumentaram dando lugar a episódios de violência tais como
as revoltas de Nebi Musa (1920) e as revoltas de Jaffa (1921). Para satisfazer
os árabes e devido à inabilidade britânica para controlar a violência instalada
no Mandato, foi criado, em todos os territórios a leste do rio Jordão, o
semiautônomo Emirado Árabe da Transjordânia (correspondente a cerca de
80% do território do Mandato). Apesar disso, a violência continuou a aumentar
durante as décadas de 30 e 40, resultando em perdas de vidas em ambos os
lados. Alguns dos fatos mais marcantes nesse período foram o Massacre de
Hebron de 1929, as atividades da organização islâmica Mão Preta, a grande
revolta árabe (1936-1939), os ataques realizados pelo grupo terrorista Irgun, os
massacres como o de Ein al Zeitun e o atentado do Hotel Rei Davi em 1946.

Tropas da Transjordânia, Egito, Síria, Líbano e Iraque invadiram a


Palestina, e Israel, Estados Unidos, União Soviética e Trygve Lie (Secretário-
geral da ONU) consideraram como uma agressão ilegítima. A China deu o seu
apoio às pretensões árabes. Os estados árabes declararam o propósito de
proclamar um "Estado Unido da Palestina" em detrimento de um estado árabe
e de um estado judaico. Eles consideravam que o plano das Nações
Unidas era ilegal porque vinha em oposição à vontade da população árabe da
Palestina. 

Cerca de dois terços dos árabes da Palestina fugiram ou foram expulsos


dos territórios que ficaram sob controle judaico; praticamente todos
os judeus (em número muito menor) que habitavam territórios ocupados pelos
árabes (como por exemplo na cidade de Jerusalém) também emigraram. A
ONU estima que cerca de 711.000 árabes tornaram-se refugiados como
consequência do conflito. As lutas terminaram com a assinatura do Armistício
de Rodes, que formalizou o controle israelita das áreas alocadas ao estado
de Israel juntamente com mais de metade da área alocada ao estado árabe.
A Faixa de Gaza foi ocupada pelo Egito e a Cisjordânia foi ocupada pela
Transjordânia (que passou a se chamar simplesmente de Jordânia), até junho
de 1967, altura em que Israel voltou a tomar posse desses territórios durante
a Guerra dos Seis Dias.

Aos palestinos que abandonaram ou foram expulsos das áreas


ocupadas pelos israelitas não foi permitido o regresso às suas casas.
Deslocaram-se para campos de refugiados localizados em países vizinhos tais
como o Líbano, a Jordânia, a Síria e para a área que mais tarde se tornaria
conhecida como a Faixa de Gaza. Durante as décadas seguintes ao fim da
guerra de 1948, entre 700 e 900 mil judeus abandonaram os países árabes
onde viviam. Em muitos casos isto foi devido a um sentimento anti-judeu, ou
devido a expulsão (no caso do Egito) ou ainda devido a opressões legais
(no Iraque). Deste número, cerca de dois terços acabaram por se deslocar
para campos de refugiados em Israel, enquanto que os restantes migraram
para França, Estados Unidos da América e para outros países ocidentais
(incluindo a América Latina).

A Guerra do Suez, de 1956, foi uma operação conjunta de Israel, Reino


Unido e França, na qual Israel invadiu a Península do Sinai e as forças
francesas e britânicas ocuparam o porto de Suez para ostensivamente separar
as partes conflituosas, apesar de a real motivação destes dois últimos países
ter sido a de proteger os interesses dos investidores no Canal do Suez. Esses
interesses tinham sido afetados devido à decisão do presidente egípcio, Gamal
Abdel Nasser de nacionalizar o canal. Israel justificou a invasão do Egito pela
necessidade de se proteger de ataques à sua população civil
pelos fedayin (guerrilheiros nacionalistas palestinos) e de restaurar os direitos
de navegabilidade pelo estreito de Tiran, que os egípcios reclamavam estar
nas suas águas territoriais. As forças invasoras concordaram em se retirar, sob
pressão internacional, particularmente dos Estados Unidos da América e
da União Soviética. Israel se retirou da Península do Sinai, que foi ocupada por
uma força da Nações Unidas (UNEF), em troca de garantias de utilização e
navegabilidade no canal, que afinal ficou sob o controle do Egito.

Durante este período deu o surgimento do Nasserismo; a proclamação


da República Árabe Unida (Egito e Síria) em 1958 e o seu colapso em 1961;
disputas entre Israel e Síria relacionadas com áreas fronteiriças terrestres e
marítimas: a continuação dos ataques dos fedayin, principalmente a partir
da Síria e da Jordânia e represálias israelitas; e o aumento do alinhamento dos
estados árabes com a União Soviética, principal fornecedora de armas. No
início da década de 1960, os estados árabes estabeleceram a OLP. O artigo
24º da carta (ou pacto) de fundação da OLP, de 1964 estabelecia: "Esta
Organização não exerce qualquer soberania territorial sobre a Cisjordânia,
sobre a Faixa de Gaza e sobre a Área de Himmah."

A Guerra dos Seis Dias decorreu entre 5 e 10 de Junho de 1967. Foi


desencadeada por Israel contra o Egito e a Jordânia nos termos de uma guerra
preventiva, já que o estado israelita sentia-se ameaçado pela política pan-
árabe do presidente egípcio Nasser (que se traduziu em alianças militares com
a Síria e a Jordânia) e pela partida de forças das Nações Unidas presentes
no Sinai desde 1956. Alegando um iminente ataque do Egito e da Jordânia,
Israel antecipou-se, atacando preventivamente. Reconhece-se atualmente,
entretanto, que não havia quaisquer intenções agressivas dos países árabes
atacados antes da guerra.

Em consequência da guerra, Israel ocupou a Cisjordânia (conquistada


à Jordânia), a Faixa de Gaza e a Península do Sinai (conquistadas ao Egito) e
os Montes Golã (conquistados à Síria). A parte da Cidade Antiga de Jerusalém,
tomada a 7 de junho por Israel à Jordânia, seria reunificada por Israel com a
Cidade Nova, formando um único município sob jurisdição israelita. Em 1980,
uma lei israelita declarou Jerusalém como capital eterna e indivísivel de Israel,
mas a ocupação de Jerusalém Oriental é considerada ilegal do ponto de vista
do direito internacional, tendo sido condenada por uma resolução das Nações
Unidas.

A Guerra de Desgaste foi uma guerra entre Egito e Israel de 1968 a


1970. Foi iniciada pelo Egito com o objetivo de reacapturar a Península do
Sinai, que foi ocupada por Israel na Guerra dos Seis Dias. A guerra terminou
com um cessar-fogo assinado entre os países em 1970 com as fronteiras no
mesmo lugar de antes de a guerra começar.

A 6 de Outubro de 1973 os exércitos do Egito e da Síria atacaram de


surpresa Israel durante a celebração do Yom Kippur, com o objectivo de
reconquistarem os territórios que tinham perdido. A Guerra do Yom
Kippur (1973) começou quando Egito e Síria lançaram um ataque surpresa em
conjunto, no dia do jejum judeu, no Sinai e nas Colinas de Golã. Os egípcios e
sírios avançaram durante as primeiras 48 horas, após o que o conflito começou
a balançar em favor de Israel. Na segunda semana da guerra, os sírios foram
completamente expulsos das Colinas de Golã. No Sinai ao sul, os israelitas
atacaram o ponto de encontro de dois exércitos egípcios invasores, cruzaram
o Canal de Suez (antiga linha de cessar-fogo), e cortaram todo o exército
egípcio assim que um cessar-fogo das Nações Unidas entrou em vigor. As
tropas israelitas finalmente retiraram-se da região oeste do canal e os egípcios
mantiveram as suas posições sobre uma estreita faixa no leste permitindo-lhes
a reabrir o Canal de Suez e clamar a vitória.
A Operação Litani foi o nome oficial da invasão de Israel no Líbano até
o rio Litani. A invasão foi um sucesso militar, já que as forças da OLP foram
empurradas para o norte do rio. No entanto, o clamor internacional levou à
criação das forças de paz FINUL e de uma retratação parcial israelita. Mas
foram pegos de surpresa devido a ajuda dos Estados Unidos em relação à
armamentos.

A Guerra do Líbano de 1982 começou quando Israel atacou o Líbano,


justificada por Israel como uma tentativa de remover os militantes Fatah
liderados por Yasser Arafat do sul do Líbano, onde tinham estabelecido,
durante a guerra civil do país, um enclave semi-independente utilizado para
lançar ataques terroristas a civis israelenses. A invasão, que levou à morte de
20 mil libaneses, foi amplamente criticada tanto dentro como fora de Israel,
especialmente após o ataque da milícia cristã a civis palestinos da região, no
episódio que ficou conhecido como massacre de Sabra e Shatila.

Embora o ataque tenha obtido sucesso em exilar Arafat na Tunísia,


Israel se indispôs com diversas milícias muçulmanas locais (especialmente
o Hezbollah), que lutava pelo fim da ocupação militar israelense. Em 1985,
devido a pesadas baixas militares e ao peso financeiro da ocupação, Israel se
retirou do território libanês, exceto por uma estreita faixa de terra designado
por Israel como a Zona de Segurança Israelense. A Resolução 425
do Conselho de Segurança das Nações Unidas confirmou que, a partir de 16
de junho de 2000, Israel tinha retirado completamente as suas tropas
do Líbano, após uma eficiente campanha de resistência do Hezbollah. Apesar
das resoluções 1559 e 1583 do Conselho de Segurança das Nações Unidas,
o Hezbollah mantém ativa participação no conflito.

A Primeira Intifada (1987-1993) começou como uma revolta


dos palestinos, em particular os jovens, contra a ocupação militar israelense
na Cisjordânia e Faixa de Gaza. Líderes da OLP exilados na Tunísia
rapidamente assumiram o controle, mas a revolta também trouxe um aumento
da importância dos movimentos nacionais palestinos e islâmicos. A Intifada se
iniciou por uma série de movimentos pacíficos. Tornou-se mais violenta depois
que os protestos foram brutalmente reprimidos pelo aparato de segurança
israelense. Tanto os protestos quanto os movimentos militantes tomaram como
inspiração o levante xiita do Líbano que, 1985, provocou a retirada das tropas
israelenses da maior parte dos territórios que ocupavam no Líbano.
A Intifada terminou com a assinatura dos Acordos de Oslo entre Israel e OLP.

A Guerra do Golfo (1990-1991) começou com a invasão iraquiana e


anexação do Kuwait e não teve inicialmente envolvimento militar direto
com Israel. Uma coligação internacional liderada pelos Estados Unidos, que
incluía forças árabes foi montada para retirar as forças iraquianas do Kuwait.
Para chamar Israel para o confronto e dividir a coligação multinacional,
o Iraque lançou mísseis Scud sobre cidades e instalações
nucleares israelenses perto de Dimona. No entanto, sob forte pressão
dos Estados Unidos, que temiam que o envolvimento direto de Israel pudesse
ameaçar a unidade da coalizão, Israel não promoveu retaliações ao Iraque e a
coalizão multinacional afastou as forças iraquianas do Kuwait. Durante a
guerra, a liderança palestina e o Rei Hussein da Jordânia apoiaram a invasão
iraquiana do Kuwait. O Kuwait e outras monarquias árabes do Golfo, em
seguida, expulsaram pouco menos de 400 mil refugiados palestinos e retiraram
seu apoio à causa palestina, o que se tornaria um dos fatores que levaram
a OLP a assinar os Acordos de Oslo.

A Intifada de Al-Aqsa começou no fim de setembro de 2000, na época


em que o líder da oposição israelense Ariel Sharon e um grande contingente de
guardas armados visitaram o complexo Monte do Templo/Al-Haram As-
Sharif em Jerusalém e declararam a área território eterno israelita. Amplos
motins e ataques eclodiram em Jerusalém e em muitas das grandes cidades
israelenses, e se espalharam por toda a Cisjordânia e a Faixa de Gaza. Um
grupo israelense de direitos humanos, B'Tselem, estimou o número de mortos
em 3.396 palestinos e 994 israelenses, embora esse número seja criticado por
não mostrar toda a imagem, e não distinguir entre combatentes e civis
(terroristas suicidas, por exemplo, são contados entre os mortos).

Em 2002, a Arábia Saudita ofereceu um plano de paz no The New York


Times e em uma reunião de cúpula da Liga Árabe em Beirute. O plano baseia-
se nas Resoluções 242 e 338 do Conselho de Segurança das Nações Unidas,
mas vai além: basicamente propõe a retirada plena, a solução para o problema
dos refugiados palestinos e a criação de um Estado palestino com sua capital
em Jerusalém Oriental, em troca de relações totalmente normalizadas com
todo o mundo árabe. Essa proposta recebeu o apoio unânime da Liga
Árabe pela primeira vez.

Em resposta, o Ministro das Relações Estrangeiras de Israel Shimon


Peres disse que "… os detalhes de cada plano de paz devem ser discutidos
directamente entre Israel e os palestinos, e para tornar isto possível,
a Autoridade Palestina tem de pôr um fim ao terror, às atrocidades que
assistimos ontem à noite em Netania", referindo-se ao ataque suicida realizado
em Netânia.

Em 2005, Israel evacuou de forma unilateral os assentamentos e os


postos militares avançados da Faixa de Gaza e do norte da Cisjordânia. O
plano de desocupação foi uma proposta apresentada pelo Primeiro-Ministro
israelense, Ariel Sharon, adotada pelo governo e aprovada em agosto de 2005,
para remover a ocupação permanente de Israel da Faixa de Gaza e de quatro
assentamentos ao norte da Cisjordânia. Os civis foram evacuados (muitos de
forma forçada) e os edifícios residenciais foram demolidos após 15 de agosto,
e a retirada da Faixa de Gaza foi concluída em 12 de setembro de 2005,
quando o último soldado israelita deixou a Faixa de Gaza. A retirada militar do
norte da Cisjordânia foi concluída dez dias mais tarde.

O conflito israelo-libanês de 2006 teve início em 12 de julho de 2006,


com um ataque pelo Hezbollah contra Israel. Três soldados israelenses foram
mortos, e dois foram capturados e feitos prisioneiros no Líbano. Alegando
como intenção a busca e o salvamento dos soldados capturados, uma
operação de mais cinco soldados da Força de Defesa de Israel foram mortos.
Isso marcou o início de uma nova onda de confrontos entre Israel e
o Hezbollah, que viu a capital libanesa, o único aeroporto internacional libanês,
e grande parte do sul do Líbano serem atacados por Israel enquanto milícias
libanesas, provavelmente do Hezbollah, bombardeavam o norte de Israel,
atingindo até a cidade israelense de Haifa, ao sul do país. Centenas de civis
foram mortos, inclusive 90% das vítimas libanesas de ataques aéreos
israelenses. Cresceram as preocupações de que a situação ficasse ainda pior,
com a possibilidade de Síria ou Irã envolverem-se. Mas um cessar-fogo foi
assinado, entrando em vigor em 14 de agosto de 2006.

O último império muçulmano, o Império Cajar (1794-1925), era no atual


Irã, que em 1905 se tornou uma monarquia constitucional, e em 1925 caiu.
Depois o Irã seria governado pela dinastia Pahlavi até a Revolução Iraniana em
1979, sendo uma monarquia constitucional até 1953 e autoritarismo até 1979.
Depois que os safávidas caíram no Irã em 1736, surgiu o Império Afexárida,
que durou até 1796. Depois veio o Império Durani, que durou de 1747 a 1826.
Depois em 1823 veio o Emirado do Afeganistão, que durou até 1926. E de
1926 a 1973 veio o Reino do Afeganistão, que era uma monarquia
constitucional.
Referências

https://www.youtube.com/watch?v=ClcbdD-
YUU8&list=PLaBYW76inbX6rwW39kRuJ-DvG4hE7vEFC&index=35 Como os
mongóis perderam a Rússia

https://templariodemaria.com/a-verdade-nao-contada-sobre-as-cruzadas/
https://lusomagyarnews.com/a-batalha-de-mohacs-1526-e-o-estabelecimento-
do-principado-da-transilvania-e-das-provincias-da-hungria-oriental/

https://stringfixer.com/pt/Millet_(Ottoman_Empire)

https://relacoesexteriores.com.br/isla-politico-irmandade-muculmana/

Você também pode gostar