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A Respiração como Caminho de Cura – Parte 3

O significado da respiração no dia a dia

A respiração associada pode nos ensinar que somente podemos controlar os


problemas quando lidamos com eles.
Se integramos o que nos falta, conseguimos o equilíbrio tanto interior como
exterior, ficando em condições de dominar a nossa vida individual e, assim,
elaborar os âmbitos que superam o nosso âmbito pessoal.
Numa época de progresso tecnológico cada vez mais acelerado, precisamos
de uma grande medida de tranquilidade interior para podermos manter o
passo com o desenvolvimento externo acelerado, sem sermos vítimas da
agitação.
Talvez na necessidade de espiritualidade exista um conhecimento
inconsciente do contrapeso que nos pode dar o necessário apoio em nosso
estilo de vida superficial.
Em nenhuma época os homens tiveram tanto tempo livre como hoje,
apesar de que muitos sofrem de uma sensação aflitiva de falta de tempo.
Nunca tivemos tanto tempo para nós mesmos e nunca soubemos fazer tão
pouco com esse tempo.
Os ritmos da vida ficaram confusos, e muitos fenômenos paradoxais podem
ser observados.
Muitos clientes aos quais aconselhamos integrar mais reflexão na sua vida,
talvez na forma de um método de meditação, afirmam que não têm tempo
suficiente ou não se sentem psiquicamente em condições de fazê-lo.
Mas nem a falta de tempo nem os problemas psíquicos em geral são a
causa original da recusa, porém a incapacidade de lidar com o tempo
existente.
Nosso tempo de vida não terá valor enquanto não estivermos em condições
de estruturar nossas possibilidades de desenvolvimento.
E só quando conseguirmos passar da medição puramente quantitativa do
tempo para uma vivência qualitativa o nosso desenvolvimento psíquico
poderá ser estimulado.
Nesse campo, a lida atenta com a respiração pode ajudar de modo suave e
maravilhoso.
Basta que alguém expire mais longa e conscientemente, e contemplará sua
vida com mais descontração e, além disso, conseguirá controlá-la melhor
por meio de sua longa respiração.
Quem literalmente fica "dependurado" em seu tempo livre e o desperdiça
com ninharias, mas não se sente em condições de sentar-se em silêncio
durante trinta minutos para prestar atenção na respiração que flui
suavemente, obviamente tem um problema.
Mesmo quando reduzimos o tempo de exercício, pouca coisa se modifica.
Por outro lado, se sugerirmos começar com cinco minutos duas vezes ao
dia, os implicados modificam a estratégia e afirmam que cinco minutos não
valem a pena.
É bom tomar consciência antes dessas estratégias.
Em última análise, depende da nossa própria responsabilidade
transformarmos os espaços livres em stress da liberdade ou em momentos
de reflexão.
Infelizmente, na maioria das vezes medimos a formação do tempo livre com
critérios do princípio do desempenho.
Só a atividade exterior é que conta.
Depois de umas férias ou final de semana são contadas as atividades e
ganha quem apresentar o maior número delas.
A filosofia básica da respiração associada pode ser descrita como um
caminho de aceitação da responsabilidade pessoal.
Como toda sabedoria, essa filosofia vale para todo momento e toda situação
de vida.
A qualquer momento é possível iniciar esse caminho.
Queremos apresentar aqui alguns exercícios respiratórios simples porém
eficazes, que são apropriados para estimular o efeito da respiração
associada, mas que, por si mesmos, podem trazer profundidade e sentido à
vida.
Alguns mestres orientais partem do pressuposto de que não é a falta de
disposição e boa vontade que impede o desenvolvimento espiritual dos
homens ocidentais, mas a nossa constante movimentação.
Eles falam de inconsciência ativa.
Enquanto os homens orientais tendem a cair em letargia inconsciente, os
ocidentais praguejam numa exagerada atividade.
É por isso que para eles o primeiro passo é deter-se e ficar mais silenciosos.
Por assim dizer, precisamos praticar o "não fazer nada", para que possa
surgir espaço para o desenvolvimento da alma.
Lao-Tsé descreve essa necessidade no Tao Te King:

Faça sem fazer.


Trabalhe sem atividade.
Experimente o que não tem sabor.
Reconheça o grande no pequeno
E o muito em um só.
Recompense a inimizade com a bondade."

E em outro trecho Lao-Tsé escreve:

Sem sair de casa,


Conhecemos o mundo todo.
Sem olhar pela janela,
Vemos o tao do céu.
Quanto mais longe saímos,
Menos sabemos.
É por isso que o sábio:
Ele não viaja
E, contudo, sabe.
Ele não vê,
No entanto, reconhece.
Ele não age,
E concretiza.

A arte da redução
Em muitos âmbitos da nossa vida uma abundância de estímulos corporais,
psíquicos e também espirituais forma um indesejável círculo vicioso.
Em vez de levar a mais satisfação, nosso excessivo input leva à frustração e
a mais desejos.
Muitas vezes temos trocado qualidade por quantidade.
Nós nos assemelhamos a um burro em nossas tentativas de salvação, sobre
cujas costas está preso um bastão, em cuja ponta está pendurada uma
cenoura, que ele mesmo carrega à sua frente.
Por causa da sua inconsciência, ele corre cada vez mais depressa para afinal
alcançar a cenoura.
Essa situação banal mostra um padrão básico que vale para muitas
pessoas.
Elas buscam a realização interior à medida que a encobrem com estímulos e
atividades exteriores, sem reconhecer que primeiro precisam parar uma vez
para recuperar o fôlego e poder pensar.
Em vez de correr atrás do inalcançável, devemos usar a paz e o silêncio
para descobrir as verdadeiras soluções.
Com frequência esse “não fazer nada" nos possibilita alcançar novos
estágios de consciência.
Ali reconheceremos qual é o nosso verdadeiro problema, ou o problema
perde seu significado.
É indiferente se contemplamos assuntos físicos, psíquicos ou espirituais.
Sejam problemas de alimentação, sexualidade ou busca mental/espiritual —
sempre teremos de aprender a ver onde está o problema, no bastão que
carrega a cenoura ou na distância até a cenoura.
Portanto, em muitas situações basta parar e começar atividades não
essenciais para poder progredir em outro âmbito.
Nosso desenvolvimento dá certo quando eliminamos o supérfluo em vez de
acrescentar o novo.
Uma das práticas mais eficazes em todos os três âmbitos da vida humana
é, por exemplo, o jejum, que usamos em nosso trabalho psicoterapêutico
ao lado da respiração consciente.
No jejum começamos a nos desintoxicar física, psíquica e espiritualmente.
O desnecessário é eliminado e nossos sentidos despertam outra vez.
Nós vemos, ouvimos e cheiramos melhor e estamos em condições de
descobrir novamente aqueles conteúdos psíquicos que se perderam ou
foram abalados no mundo profano do dia a dia.
Quando reduzimos alimentos, impressões da mídia e tudo o que jorra sobre
nós vindo de fora, correspondentemente mudam as funções físicas e psico
espirituais.
Assim que as impressões diminuem, o nosso mundo interior pode começar
a se expressar.
Assim, acontece que muitas pessoas que jejuam, sonham mais durante o
jejum, e sentem mais intensamente e conseguem usar melhor as medidas
terapêuticas.
Do ponto de vista da medicina natural, os efeitos físicos como a
desintoxicação e eliminação dos resíduos nocivos dos tecidos conjuntivos e
gordurosos ocupa o primeiro plano.
Mas nas culturas antigas o jejum era e é usado principalmente para
conseguir uma consciência elevada e clara.
Jesus foi ao deserto, jejuou e enfrentou a tentação na forma do diabo e
conseguiu vencê-lo.
Na vida muitas vezes é necessário entrar em contato com o conhecimento
interior para conseguir vencer as crises e as modificações decisivas da vida.
No âmbito físico as toxinas estão armazenadas principalmente nos tecidos
conjuntivos e gordurosos.
Durante o jejum elas voltam aos vasos sanguíneos e podem ser excretadas.
O agradável efeito purificador do jejum, portanto, tem um lado
desagradável também.
Na boca se formam placas feias, a urina fica mais ácida e todas as
excrescências tendem a ter um cheiro mais forte do que de costume.
No âmbito psíquico/espiritual acontece algo semelhante.
Tudo o que nós reprimimos porque não correspondia à imagem da própria
personalidade, vem novamente à tona e é percebido e revivido como
disposição ou sonho.
Seja o que for que vivamos e sintamos durante o jejum ou na terapia com a
respiração associada ou até mesmo nos menores exercícios respiratórios é
parte de nós e, portanto, digno de atenção.
Por fim nós iremos descobrir outra vez temas em todos os âmbitos que
realmente são desagradáveis à primeira vista e que por isso foram
reprimidos, mas que são importantes no caminho para a totalidade.
No fundo acontece o mesmo que acontece com uma caixa em que parte das
maçãs estão podres.
Podemos nos empenhar em retirar todas as maçãs podres.
Mas, ao fazer isso, temos de lidar intensamente com o lado feio da caixa de
maçãs, e, como recompensa pelo nosso esforço, conseguimos algumas
maçãs perfeitas.
O pressuposto básico para esse processo é contemplar o que existe e não
acrescentar constantemente coisas novas.
Entre os métodos de auto experiência são mais eficientes aqueles que
parecem simples, quase banais à primeira vista.
Quem jejua e respira conscientemente, tem as melhores oportunidades de
entrar em contato com os próprios âmbitos da vida realmente importantes.

Exercícios respiratórios para o dia a dia


Todo momento em que nos sentimos entediados ou preguiçosos convida à
reflexão, e há muitos desses momentos na nossa vida.
Se somássemos as horas de paralisação de um dia, o resultado seria uma
soma considerável.
Na maioria das vezes, passamos esse tempo com resistência interior,
ficamos inquietos ou nos aborrecemos.
Quando conseguimos encher esse tempo com meditação e reflexão,
podemos integrar ao nosso dia a dia o nosso desenvolvimento psíquico e
mental, sem usar nem um pouco de tempo a mais.
Se estamos na fila do supermercado, podemos nos aborrecer com a perda
de tempo e porque mais uma vez escolhemos a fila mais lenta.
Mas, em vez disso, podemos relaxar à medida que voltamos a nossa
atenção para o fluxo da nossa respiração, talvez aprofundando-o e
deixando-nos embalar por ele.
O tempo de espera passará mais depressa e, ao mesmo tempo, praticamos
o "não fazer nada".
As visitas à repartição perdem um pouco do seu inconveniente.
Bastam alguns segundos para executar essa meditação da respiração.
Durante a espera no semáforo vermelho é possível recostar-se também
interiormente e fazer três inspirações profundas conscientes e exalar o ar
devagar, em vez de inconscientemente ficar tamborilando no volante.
O comportamento agitado quando o telefone toca, em muitas pessoas
também é um sinal de inquietação interior.
Por que nesses momentos não nos damos um pouco mais de espaço?
Ao primeiro toque poderíamos inspirar profunda e conscientemente; ao
expirar, deixar os ombros cair e então pegar no telefone com toda a calma,
respirando conscientemente.
O mestre budista Thich Nhat Han, famoso por transmitir exercícios orientais
aos homens ocidentais, dá muitos exemplos dessa lida lúdica e, contudo,
eficiente com a meditação no dia a dia em seu livro Ich pflanze ein Lächeln
[Eu planto um sorriso].
De início ainda constatamos com frequência que somos inconscientes
demais e que perdemos muitas oportunidades.
Mas, com o tempo, vemos como esses momentos de consciência se
desenvolvem em verdadeiras joias no dia a dia e o aprofundam e
enriquecem de maneira maravilhosa.
Para superar as dificuldades iniciais manteve-se a orientação de deitar-se
ou sentar-se diversas vezes por dia e aumentar a consciência da respiração.
No contexto terapêutico a respiração associada tornou-se o iniciador do
desenvolvimento da necessária consciência: mas experiências intensivas,
como as que podem surgir numa sessão de respiração de duas horas, não
podem nem devem ser feitas todos os dias.
No entanto, em muitas tradições há exercícios respiratórios que podem nos
preparar para a respiração associada ou completá-la.
No cantão chinês dos taoístas há diversas doutrinas sobre a respiração
como caminho para a longevidade.
Muitas vezes surgem lá exercícios que se ocupam com a suspensão da
respiração.
Essas escolas da respiração levam por caminhos longos e complicados, mas
em forma simplificada os correspondentes exercícios podem nos ajudar a
descobrir a pista da força primordial da respiração.
Alguns animais aquáticos podem reter o ar por longo tempo.
Chama a atenção se tratar dentre eles, dos habitantes de vida mais longa
na nossa Terra.
Baleias azuis, tartarugas marinhas e também golfinhos e focas atingem
idade avançada.
Tartarugas gigantes podem passar até oito horas sem tomar o ar e elas
detêm o recorde de velhice entre as criaturas vivas.
Poderíamos contrapor a isso que os pescadores de pérolas, embora
aguentem muito tempo sem oxigênio, morrem cedo.
Mas isso talvez se deva às extremas oscilações de pressão às quais estão
sujeitos durante o seu trabalho.
Além disso, as tartarugas se adaptaram às suas condições de vida durante
um espaço enorme de tempo, e durante o tempo de vida de um ser
humano uma criatura da terra não pode transformar-se numa criatura
aquática.
Em todo caso, podemos pressupor que exista um inter-relacionamento
entre capacidade respiratória, saúde e longevidade.
Uma pessoa com respiração lenta não só tem sucesso, mas é agraciada
também com uma vida longa.
Existe um mito oriental que diz que cada pessoa tem garantido um número
de respirações.
Então tudo depende de lidar economicamente com elas.
Em todo caso chama a atenção que a respiração arrastada das pessoas
agitadas ou daquelas que praticam seu programa de esportes seja um sinal
de perigo, enquanto a respiração fluente e longa indica tranquilidade
interior e favorece uma vida longa.
Na respiração associada surge um fenômeno semelhante.
Com a respiração longa e intensiva inundamos o nosso organismo de
oxigênio, ou seja, de energia vital (prana).
Isso faz com que haja pausas de respiração de minutos sem riscos.
Durante esse período os clientes muitas vezes fazem experiências
profundas e comoventes.
Parece que durante a não respiração eles são afastados do mundo polar e
podem sentir impressões espirituais das esferas superiores.
O modelo chinês descreve de modo interessante que encontramos
realização e paz interiores assim que aprendemos a respirar desse modo.
Sung-Shan, cujo nome significa "Mestre do Grande Nada", descreve, no seu
livro sobre a respiração, entre outros o seguinte exercício:
Este é o segredo, deixar a respiração entrar para experimentar o tipo de
respiração inicial, não falsificada: deite-se diariamente, aquiete o seu
espírito e deixe o rio de pensamentos cessar.
Cerre as suas mãos em punhos, inspire o ar pelo nariz, e solte-o outra vez
pela boca.
Faça isso de tal modo que a sua respiração não faça nenhum ruído.
O andamento da sua respiração ficará muito leve e sutil.
Quando você tiver enchido os pulmões, retenha a respiração.
Isso fará a sola dos seus pés suar.
Conte cem vezes "um e dois", ou tanto quanto puder e assim que você não
conseguir mais segurar o ar, respire devagar e sem ruído.
Então inspire um pouco mais e novamente retenha o ar nos pulmões.
Assim que você tiver bastante prática e conseguir contar até cem enquanto
retém o ar, você não precisará mais de alimento (grãos) nem de remédios.

Mesmo que possa parecer difícil alcançar o objetivo desse exercício, logo
podemos descobrir que ele faz a nossa respiração tornar-se mais calma e
forte.
Um outro exercício descrito por Sung-Shan mostra um antigo modo de lidar
com as doenças:
Este é o segredo de encerrar a respiração: se você ficar doente entre num
aposento fechado e faça o seguinte: deite-se com as mãos e os pés
esticados.
Aquiete a sua respiração e a engula, dirigindo-a na mente para onde está a
sua doença.
Depois de inspirar corte a respiração.
Regule a respiração com vontade e juízo para eliminar o mal-estar.
Quando a respiração for detida até você não aguentar mais, deixe-a fluir.
Dirija outra vez a respiração seguinte para onde dói.
Se estiver respirando depressa demais, pare.
Quando o fluxo respiratório se tornar regular e tranquilo, lide novamente
com o problema.
Se começar a suar e perceber que fez contato com o seu problema, termine
a sua ação.
Se o mal-estar não for eliminado com isso, continue trabalhando da
maneira descrita, duas vezes por dia — à meia-noite e entre três e cinco
horas da manhã.
Se for conveniente, também durante o dia, até melhorar.
Faça isso também quando o sofrimento for na cabeça, nas mãos ou nos
pés.
Onde e seja ele qual for, use este exercício.
Tudo pode ser curado com ele.
Pois é verdade: o juízo leva a respiração para os membros e órgãos; é
como uma mágica, pois o efeito é imensurável.

Esse exercício também provém da sabedoria milenar das culturas orientais.


Partimos do pressuposto de que a força do pensamento domina o âmbito
material inferior como a vibração mais elevada.
A Física moderna com base em conhecimentos semelhantes levou a um
renascimento desse conhecimento no Ocidente.
Nos últimos tempos, direções isoladas da psicoterapia também os
descobriram novamente para nós.
Apenas como exemplo: o médico norte-americano Carl Simonton provou
que as pessoas com câncer que lutam contra a doença com imagens
interiores têm mais do que o dobro de tempo de sobrevida.
A força da imaginação tem efeitos enormes sobre o corpo humano, e, em
ligação com a respiração, ela está em condições de influenciar
positivamente a cura em muitos âmbitos.
Por assim dizer, a respiração e a consciência representam o remédio interior
de cada pessoa, e nós podemos usá-lo a qualquer momento e sem efeitos
colaterais.
O centro físico da respiração está na medula espinhal alongada que forma a
base do nosso cérebro.
Todas as outras partes cerebrais se desenvolveram posteriormente no curso
da evolução.
O controle consciente da respiração, ao contrário, acontece na camada
cortical do cérebro.
Isso significa que cada respiração consciente estabelece uma ligação entre
as formas primordiais arcaicas (arquicórtex ou cérebro dos répteis) e as
regiões mais novas do nosso cérebro (mesocórtex e neo-córtex).
É por isso que a respiração consciente pode nos ligar com antigas fontes de
cura que ainda estavam à disposição dos nossos primeiros antepassados.
Os xamãs e mulheres médicas das mais diversas tradições já entendiam
muito bem como curar, mesmo que para isso não usassem o hemisfério
esquerdo do cérebro como os médicos tradicionais fazem exclusivamente.
Eles dispunham naturalmente da capacidade de viajar para dentro das
profundezas dos mundos das imagens psíquicas.
E com estas encontramos mais uma região ricamente influente do nosso
cérebro.
Paul MacLean, um dos pesquisadores de vanguarda do cérebro, divide o
nosso cérebro em três partes:

Arquicórtex ou cérebro reptilíneo


A região mais antiga fica na base do crânio acima da medula alongada do
cérebro original.
Ela corresponde à estrutura do cérebro dos répteis e está correndo perigo
devido ao nosso comportamento e, portanto, é responsável pela capacidade
de sobrevivência.
Essa região cerebral não tem condições de expressar oralmente os
sentimentos e está longe de poder avaliar os pensamentos.
A tarefa principal desse âmbito cerebral é assegurar a capacidade de
sobrevivência do organismo.

Mesocórtex ou cérebro dos mamíferos ancestrais


A segunda região mais antiga do cérebro participa competentemente do
nosso comportamento emocional.
O desenvolvimento de réptil para mamífero corresponde à passagem de
sangue frio para sangue quente e, com isso, à intensidade emocional.
Paixão, inveja, raiva e outras formas de expressão dos sentimentos, bem
como sua transposição ao comportamento estão sujeitas a essa região
cerebral.
A primeira e a segunda regiões do cérebro formam juntas o sistema límbico,
que está ligado ao hipotálamo e à glândula cerebral (hipófise).
Nesse entrelaçamento, a hipófise representa um papel importante, visto
que regula o nosso sistema hormonal (endócrino).
A partir dela são enviados transmissores (hormônios) para o sangue, os
quais cuidam de um grande número de reações como o corar de vergonha,
o susto, a raiva e outros fenômenos que não podem ser conscientemente
regulados.
Essa região do sistema límbico também é responsável pela alimentação,
sexualidade e agressão, ou seja, aqueles impulsos que provocam algum
tumulto na vida de muitas pessoas e, com isso, também na prática
psicoterapêutica.
A origem e elaboração de todos esses processos, portanto, está muito longe
da terceira região cerebral, a mais jovem, o nosso cérebro.
Em nossas diversas escolas e sistemas de formação nós nos ocupamos
exclusivamente com essa região mais nova, também anatomicamente mais
superficial e, nela, com seu hemisfério esquerdo, isto é, a metade
arquetipicamente masculina.
Nesse sentido, a respiração consciente pode corrigir alguma coisa, uma vez
que une os três areais e, além disso, cria uma ligação com os mundos de
imagens interiores do hemisfério cerebral direito.
Aqui, naturalmente, também está a razão mais profunda do motivo pelo
qual chegamos àqueles impulsos mais escondidos, mais arcaicos como
talvez o instinto de urinar e, naturalmente, também às origens das nossas
emoções e sentimentos, pelo processo da respiração associada.

Neocortex (camada cortical do cérebro)


Esta é a central do nosso pensamento consciente, racional.
Aos seus complicados entrelaçamentos deve-se um grande número de
capacidades intelectuais e descobertas.
Mas, infelizmente, esse âmbito é totalmente incapaz de fazer trocas com as
regiões mais profundas do cérebro.
Sendo assim, o conhecimento racional não basta para modificar o nosso
comportamento.
Ao contrário, a respiração e as imagens interiores alcançam até as
profundezas dos nossos hemisférios cerebrais mais antigos e podem ali
colocar em andamento aqueles processos que transformam interiormente.
Todo alcoólico sabe que o vício da bebida arruína a sua vida; no entanto,
conselhos bem intencionados são tão ineficazes como a indicação de que o
fumo faz mal à saúde nos maços de cigarro.
Apresentações plásticas e impressões emocionais comoventes são muito
mais eficazes para nos levar à mudança dos nossos hábitos.
Ao contrário, a visão real de um pulmão enegrecido pelo alcatrão de um
fumante percorre todas as regiões cerebrais e pode nos atingir na medula
prolongada.
Pelo mesmo motivo toda sabedoria genuína aprendida em forma de
imagens e, provavelmente, os mitos e ditados só sobreviveram porque não
foram expressos na forma intelectual, porém por meio de imagens
psíquicas.
Se transpusermos esses conhecimentos para a respiração associada, torna-
se compreensível por que praticamente nenhum outro caminho de auto
experiência consegue penetrar tão bem na personalidade humana.
Dirigir a respiração consciente para os nossos problemas e conforme as
circunstâncias apoiá-la com as imagens interiores, como nos exercícios de
Sung-Shan, pode curar males físicos, mas também ajudar com problemas
mentais e espirituais.
É aconselhável concentrar-se sempre no âmbito problemático para, em
seguida, respirar consciente e profundamente sobre esse problema.
Com o tempo, a respiração muda o alcance da nossa visão e traz à tona os
conhecimentos das profundezas do nosso inconsciente.
Os problemas se expressam sempre por imagens e devemos incentivar isso,
pois, como vimos, os pensamentos abstratos quase não alcançam a nossa
alma.
Tudo o que é "palpável" é superior aos conceitos intelectuais.
Nesses exercícios convém imaginar tudo muito plasticamente, o rosto de
uma pessoa relacionada com o problema ou uma construção conhecida.
Podemos confiar ao nosso médico interior o restante desenvolvimento da
nossa cura e do crescimento da sabedoria interior, como Paracelso chamava
essa instância interior.
Caso se trate de uma doença física, aprofundamos um pouco nossa
respiração e a cada inspiração enviamos energia e força vital à região
implicada.
Um cirurgião certa vez descreveu a dor como o grito dos tecidos pedindo
alimento; e a respiração "alimenta" nossos tecidos corporais com oxigênio.
Podemos completar esse ditado: dor ou mal-estar são o grito de um âmbito
de vida por alimento e atenção.
O resultado de toda experiência dolorosa é a atenção, pois inevitavelmente
voltamos mais consciência para a região atingida, assim que ela se faz
perceptível.
Por isso é muito curativo enviar a respiração e a consciência para as nossas
zonas problemáticas.
Assim que abastecemos voluntariamente de energia os âmbitos doentes,
não é mais necessário eles chamarem a nossa atenção por meio da dor ou
de outros sintomas.
A inspiração leva energia vital fresca para o local correspondente, enquanto
a expiração transporta para fora e se livra de tudo o que é supérfluo.
A inspiração sempre deve ser feita pelo nariz, que é chamado de Portal
Celeste na tradição chinesa, enquanto os resíduos da expiração se tornam o
estrume das formas inferiores de vida vegetal e, portanto, são descritos
como janela terrestre.
Imagens diferentes podem apoiar o caminho da energia vital através do
nosso organismo.
Por exemplo, a inspiração pode ser vista como um rio, que derrama sua
borbulhante energia vital nas nossas células famintas.
Podemos imaginar a expiração, quente como o corpo, como um adubo
escuro e fumegante que serve de alimento para as plantas.
O gás carbônico exalado por nós transforma as plantas verdes em novo
oxigênio, que nos dá outra vez energia vital.
Estamos ligados com todas as criaturas vivas e com a vida propriamente
dita no círculo infinito, e essa ligação se mostra para nós na respiração.
Portanto, convém usá-la para cuidar da nossa saúde e desenvolvimento.
Atenção e desvelo são pressupostos de cura e crescimento.
Assim como uma criança precisa da atenção dos pais ou de outro adulto,
cada região do nosso mundo interior precisa de atenção e alimento para
poder se desenvolver e regenerar-se.
A respiração associada e forçada representa a aceleração desses processos.
Um outro exercício básico das escolas orientais refere-se ao assim chamado
‘hara’, a base energética do ser humano ou o centro do seu mundo, como
disse Karlfried Graf Dürckheim.
Ele fica na região do baixo-ventre, e seu centro é o ponto entre o umbigo e
o cóccix.
O hara é ao mesmo tempo a raiz espiritual e o ponto de gravidade corporal
do homem.
De acordo com a tradição do Oriente distante, cada ação provém do hara,
pois somente quando o homem age a partir do centro do seu ser, ele pode
conferir força à sua ação.
No kyudo (arremesso com arco japonês) a respiração flui no hara.
Ali fica toda a atenção, enquanto os braços e o tronco esticam o arco.
O mirar o alvo e o arremessar acontecem a partir do centro do corpo.
Algumas artes marciais enfatizam o significado do hara, sede daquelas
forças que decidem a vitória ou a derrota.
Dirigir a respiração para o hara é a forma ideal de respiração e faríamos
bem em praticá-la todos os dias.
Assim que respiramos na profundeza da barriga, fazemos da energia vital a
base do nosso ser e fortalecemos a autoconfiança.
Somente o movimento causado por esse tipo de respiração na barriga é útil
para melhorar as tensões, os medos e outros problemas com a nossa
confiança primordial.
É indiferente que âmbito do hara os problemas não elaborados levaram ao
endurecimento; a respiração da barriga massageará suavemente os nossos
órgãos internos e solucionará as situações arraigadas.
Os homens do Ocidente tendem a uma postura de atenção.
Por exemplo, um soldado precisa ficar ereto, puxar a barriga para dentro e
estufar o peito.
O mestre oriental de arte marcial, ao contrário, fica descontraído: os pés
paralelos, talvez à distância dos ombros, de joelhos levemente dobrados e a
bacia levemente inclinada para a frente.
No kyudo se diz que o estado do hara tem de ser tão forte que, se
estivéssemos com os dois pés sobre o rabo de um leão, o animal não
conseguiria mais fugir.
A postura da cabeça é ereta, pendurada no céu, como se ela fosse o
prolongamento da medula espinhal.
As mãos ficam penduradas na altura da cintura e espalmadas sobre a
barriga.
A respiração flui descendo até as mãos.
Ela se enraíza na terra que pisamos e, ao mesmo tempo, cria uma ligação
com o céu.

Continua

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