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ADMINISTRAÇÃO JUDICIÁRIA – 3º Período - 2023

UNIDADE I
DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Plano de Estudo:
• Conceitos e Definições Gerais sobre Administração Pública;
• Princípios norteadores da Administração Pública;
• Poderes da Administração Pública;
• Gestão de Riscos na Administração Pública.
Objetivos de Aprendizagem:
• Conceituar e contextualizar a Administração Pública;
• Identificar os princípios norteadores e os poderes da Administração Pública;
• Analisar a gestão de riscos na Administração Pública.
1 DOS CONCEITOS INTRODUTÓRIOS, CARACTERÍSTICAS E FINALIDADE DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Administração Pública, a grosso modo, é a responsável pelos serviços públicos, ou seja, é de
responsabilidade da Administração Pública ordenar, satisfazer, proteger, assegurar, executar, fiscalizar,
dentre outros, a realização dos serviços que assegurem os direitos básicos, as necessidades e o bem-
estar da população.
Dessa visão geral, é possível afirmar, que “os interesses envolvendo a atuação do Poder Público são
diametralmente opostos àqueles que norteiam as atividades desenvolvidas pelos particulares”
(SPITZCOVSKY; LENZA, 2021, e-book). Referidos autores complementam afirmando que:
[...] pode-se afirmar que o único objetivo a ser perseguido pela Administração é a preservação dos
interesses da coletividade, apresentando-se ela como gestora dos interesses desta, mesma conclusão
que se extrai como consequência da previsão estabelecida no mesmo art. 1o, segundo o qual o Brasil se
apresenta como uma democracia, vale dizer, governo do povo. (SPITZCOVSKY; LENZA, 2021, e-
book)
A Administração Pública, desta feita, é administradora, ou seja, gestora dos interesses do povo, que é o
titular do poder, a fim de que esta atue em prol da preservação dos interesses da coletividade. Por
conseguinte, quando a Administração Pública atua, possui não apenas direitos (por exemplo,
legitimidade, autoexecutoriedade e imperatividade), mas também deveres e obrigações que não se
estendem aos particulares.
Quanto ao conceito e finalidade da Administração Pública, José Maria Madeira afirma que: “[...]
Administração Pública vai ser justamente o instrumento empregado pelo Estado para poder atingir
suas finalidades. É, portanto, o instrumento de concretização da vontade estatal”, complementando
dizendo que “os fins da Administração Pública, sendo esta entendida como o meio pelo qual se
caracterizam os atos de governo, resumem-se na defesa do interesse público” (MADEIRA, 2014).
Referido Autor - José Maria Madeira - nos aponta, igualmente, uma distinção quanto à utilização do
termo “Administração Pública”, com letras maiúsculas e minúsculas, para fins didáticos:

Administração Pública (letras maiúsculas) administração pública (letras minúsculas)


Conjunto de órgãos e entidades que Tem ligação com a função
exercem a função administrativa do administrativa do Estado. É a função que
Estado. É o Estado-administração. o Estado exerce, distinta das funções
legislativas e jurisdicionais.
Fonte: MADEIRA, 2014

Para tanto, a Administração Pública, nas quatro esferas de governo, isto é, federal, estadual, municipal
e distrital, é composta de uma estrutura direta e indireta, conforme aponta o art. 37, da Constituição
Federal (BRASIL, 1988): “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: [...]”.

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A Administração direta é composta, em essência, por órgãos que são instrumentos da vontade estatal
desprovidos, como regra, de personalidade jurídica. O Decreto-lei 200/67, em seu artigo 4o, I, assim
aponta:
“A Administração Federal compreende: I- a administração direta, que se constitui dos serviços
integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos ministérios”.
Por sua vez, a Administração indireta da Administração Pública é composta de pessoas jurídicas,
conforme art. 4o, II, do Decreto Lei 200/67:
“A Administração Federal compreende: II- a Administração Indireta, que compreende as seguintes
entidades, dotadas de personalidade jurídica própria”.
Quanto à indireta, é imprescindível que sua criação e extinção decorram de lei de iniciativa do Poder
Executivo, nos termos do art. 37, da Constituição Federal (BRASIL, 1988):
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,
do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
XIX – somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa
pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último
caso, definir as áreas de sua atuação;
XX - depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de subsidiárias das entidades
mencionadas no inciso anterior, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada;
Seja em relação à Administração Pública direta ou indireta, não se pode perder de vista que o objetivo
norteador deve ser a prestação dos serviços públicos. No caso da indireta, soma-se a esse objetivo, a
exploração de atividade econômica.
Como integrantes da estrutura indireta da Administração, ou seja, pessoas jurídicas dotadas de
personalidade jurídicas, é possível citar:
a) autarquias, que são pessoas jurídicas de direito público, criadas para a prestação dos serviços
públicos, que contam com capital exclusivamente público, por exemplo, o INSS - Instituto Nacional
de Seguro Social;
b) agências reguladoras, que são espécies de autarquias, cujo objetivo é a regulamentação, o controle
e a fiscalização da execução dos serviços públicos transferidos para o setor privado, por exemplo,
ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica;
c) associações públicas: ligadas à celebração de consórcios públicos, nos termos do art. 241, da
Constituição Federal;
d) conselhos profissionais, por exemplo, CRM, CREA;
e) fundações, que consistem em pessoas jurídicas dotadas de patrimônio personalizado, tendo
finalidade específica, por exemplo, Fundação Butantã, FUNAI;
f) agências executivas;
g) empresas públicas, que são pessoas jurídicas de direito privado, criadas para a prestação de
serviços públicos ou para a exploração de atividades econômicas, que são constituídas exclusivamente
por capital público e sob qualquer modalidade empresarial. Exemplos: BNDES - Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social, Caixa Econômica Federal, INFRAERO;
h) sociedades de economia mista, que são pessoas jurídicas de direito privado, criadas para a
prestação de serviços públicos ou para a exploração de atividades econômicas, que são constituídas por
capital misto e constituídas apenas como sociedade anônima. Exemplos: Banco do Brasil,
PETROBRAS, COHAB (Companhia de Habitação Popular).
A Administração Pública, por consequência, não pode perder de vista a finalidade precípua, que é a
prestação de serviços, sendo que a atuação deve ser pautada, dentre outros aspectos, pelos princípios,
que serão analisados no tópico seguinte.
2 DOS PRINCÍPIOS QUE ABRANGEM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
No tópico anterior, falamos sobre o contexto geral de Administração Pública, e vimos que a conduta
deve ser pautada visando o bem-estar social, assegurar os direitos e necessidades básicas da população,
mediante a prestação de serviços públicos.
Mas, a conduta pode ser indiscriminada? A Administração Pública pode fazer tudo para prestar os
serviços públicos? Há diretrizes basilares?

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A Administração Pública possui princípios que direcionam suas ações. Esses princípios estão dispostos
na Constituição da República Federativa do Brasil, no artigo 37 (BRASIL, 1988). Eles são conhecidos
como: impessoalidade, legalidade, eficiência, moralidade e publicidade.
Afinal, o que são princípios? Porque são tão importantes?
Os princípios, segundo Miguel Reale, são enunciados admitidos como condição ou como base de
validade das demais normativas, ou seja, são “verdades fundantes” de um determinado sistema
(REALE, 2003, p. 303).
Alexandre Mazza corrobora afirmando que os princípios:
São regras que a doutrina identifica como condensadoras dos valores fundamentais de um sistema,
verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas,
compondo-lhes o espírito e servindo de critério para exata compreensão e inteligência delas,
exatamente porque define a lógica e a racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhes a tônica
que lhes dá sentido harmônico. (MAZZA, 2020, e-book)
Vários são os princípios aplicados ao Direito administrativo, contudo, para os que compreendem
melhor, é imprescindível uma breve explanação acerca do que é interesse público. Interesse público é o
somatório dos interesses individuais representando a vontade da maioria na sociedade. Ele se divide
em: a) Interesse público primário: refere-se à vontade social, isto é, à vontade do povo; b) Interesse
público secundário: a vontade do Estado, enquanto pessoa jurídica. O art. 37 da Constituição Federal
(BRASIL, 1988) elenca cinco princípios da Administração Pública, são eles: legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Esses princípios são os chamados princípios
mínimos da Administração Pública. Vejamos sinteticamente cada um deles:
a) Princípio da Legalidade
A doutrina aponta que:
Trata-se, como se observa, de uma regra vital, porque está a revelar que a imposição de
comportamentos unilaterais pelo Poder Público só será possível se tiver respaldo em lei,
impedindo, dessa forma, a legitimação de atitudes arbitrárias por parte dos detentores desse poder.
(SPITZCOVSKY; LENZA, 2021, e-book)
Referido autor corrobora dizendo que:
Em outras palavras, essa regra consubstancia, simultaneamente, uma salvaguarda para o direito dos
administrados e uma limitação, uma fronteira para a atuação dos detentores desse do Poder Público.
[...] Em outro dizer, conclui-se, com meridiana clareza, que não existe interesse público que se
legitime sem que apresente apoio em lei. (SPITZCOVSKY; LENZA, 2021, e-book)
Para o particular, a regra é que ele pode fazer tudo, salvo o que estiver expressamente proibido, vedado
em lei. Já para o Direito Público, especificamente para o Direito Administrativo, a regra é contrária.
Neste, o Administrador só poderá fazer aquilo que a lei, expressamente, autorizar. Diante do referido
cenário, a doutrina afirma que: “no campo do direito privado a
atividade desenvolvida pelos particulares deve pautar-se por uma relação de não contradição com a lei,
enquanto para o Poder Público trata-se de uma relação de subordinação para com ela”
(SPITZCOVSKY; LENZA, 2021, e-book).
b) Princípio da impessoalidade
Segundo este princípio, o Poder Público deve manter uma posição neutra em relação aos
administrados, ou seja, somente é possível produzir discriminações que se justifiquem em vista do
interesse público. Como decorrência do princípio, é possível citar a necessidade de licitação para
contratação de serviços, para que seja possível a escolha com base apenas na proposta mais vantajosa
para o interesse público. Outro exemplo possível: concurso público.
O Administrador escolhe o melhor candidato independentemente de interesses pessoais, o que significa
agir de forma impessoal. Este princípio exige ausência de subjetividade. O Administrador não pode
agir com interesse pessoal.
Alexandre Mazza (2021, e-book) afirma que: “O princípio da impessoalidade estabelece um dever de
imparcialidade na defesa do interesse público, impedindo discriminações (perseguições) e privilégios
(favoritismo) indevidamente dispensados a particulares no exercício da função administrativa”. Desta
feita, é possível afirmar que, segundo este princípio, deve o administrador público praticar o ato para
que seja atingido o seu fim legal, ou seja, o objetivo do ato administrativo, de forma impessoal. Deve,
por consequência, agir visando atingir a finalidade pública prevista em lei, agindo com impessoalidade
e objetividade.

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c) Princípio da moralidade
A moralidade está prevista no art. 37, caput, da Constituição Federal (BRASIL, 1988), como
princípio fundamental aplicável à Administração Pública, ou seja, é possível afirmar, segundo
Alexandre Mazza, que “a moralidade administrativa constitui requisito de validade do ato
administrativo” (MAZZA, 2020, e-book). É por força deste princípio que o Administrador deve ser
bom o suficiente para escolher o melhor caminho, a melhor alternativa. Não basta que o administrador
pratique seus atos de forma correta, tem de fazê-los da melhor maneira possível. Assim aponta
Alexandre Mazza (2020, e-book):
O princípio jurídico da moralidade administrativa não impõem o dever de atendimento à moral
comum vigente na sociedade, mas exige respeito a padrões éticos, de boa-fé, decoro, lealdade,
honestidade e probidade incorporados pela prática diária ao conceito de boa administração.
Referido entendimento é sedimentado pela Lei 9.784/99 (BRASIL, 1999), em seu art. 2o, parágrafo
único, IV, ao definir a moralidade nos processos administrativos como um dever de “atuação segundo
padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé”. Ainda segundo a referida legislação, trata-se de um
dever imposto também aos administrados “proceder com lealdade, urbanidade e boa-fé” (art. 4o, II,
da Lei 9.784/99).
d) Princípio da Publicidade
O princípio da publicidade está ligado diretamente com o dever de divulgação oficial dos atos
administrativos, previsto no art. 2o, parágrafo único, V, da Lei n. 9.784/99 (BRASIL, 1999).
Segundo Alexandre Mazza, “tal princípio encarta-se num contexto geral de livre acesso dos
indivíduos a informações de seu interesse e de transparência na atuação administrativa” (2020, e-
book).
Logo, podemos afirmar que, o princípio da publicidade significa transparência, divulgação,
conhecimento, controle, visando dar conhecimento ao titular do direito, que é o povo. Trata-se de
coerência de um sistema no qual o Administrador é escolhido pelo povo para representar os interesses
deste, devendo, portanto, a comunicação e satisfação de todos os seus atos como exercente de uma
função pública.
Como exemplo de incidência do princípio da publicidade é possível citar a previsão do art. 5o,
XXXIII, CF (BRASIL, 1988): “XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos
informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo
da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da
sociedade e do Estado”. Além disso, segundo o aludido princípio, os agentes públicos, uma vez que
atuam na defesa dos interesses da coletividade, não podem exercer condutas sigilosas e atos secretos.
Isso porque, ao dever estatal de garantir a publicidade de seus atos, corresponde o direito do
administrado de ter ciência da tramitação de processos administrativos em que tenha a condição de
interessado, ter vista dos autos, obter cópia de documentos neles contidos e conhecer as decisões
proferidas (BRASIL, 1999, art. 3o, II, Lei n. 9.784/99).
A doutrina aponta que são diversas as finalidades que são almejadas através do cumprimento do
princípio, como, por exemplo:
a) exteriorização da vontade da Administração Pública, a fim de que haja o conhecimento público;
b) presunção de conhecimento dos atos pelos interessados e consequente possibilidade de tornar o
conteúdo exigível;
c) impedir a alegação de ignorância quanto ao conteúdo do ato;
d) permitir o controle de legalidade do comportamento (MAZZA, 2020, e-book).
e) Princípio da Eficiência
O princípio da eficiência foi acrescentado no art. 37, caput, da Constituição Federal (BRASIL, 1988),
pela Emenda Constitucional n. 19/98. A intenção é que haja “economicidade, redução de desperdícios,
qualidade, rapidez, produtividade e rendimento funcional” (MAZZA, 2021, e-book). Um serviço
adequado, portanto, tem que ser eficiente. Eficiência começa com ausência de desperdícios e com
certeza de produtividade. Também há necessidade de agilidade e economia, esta última entendida
como gastar o menor valor para se obter o melhor resultado possível. A eficiência envolve os meios e
os resultados.

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Alexandre Mazza, contudo, traz uma reflexão sobre o tema, de suma relevância:
[...] o princípio da eficiência não pode ser analisado senão em conjunto com os demais princípios
do Direito Administrativo. A eficiência não pode ser usada como pretexto para a Administração
Pública descumprir a lei. Assim, o conteúdo jurídico do princípio da eficiência consiste em obrigar
a Administração Pública a buscar os melhores resultados por meio da aplicação da lei. (MAZZA,
2020, e-book).
Embora o art. 37 da Constituição Federal (BRASIL, 1988) aponte apenas esses cinco
princípios mínimos a que a Administração Pública deve sempre observar, eles não são os
únicos. Assim, o estudo dos demais princípios é de fundamental importância. Vejamos alguns
outros princípios essenciais aplicáveis à Administração Pública:

f) Princípio da supremacia do interesse público


O princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, ou apenas, princípio do
interesse público ou da finalidade pública, é princípio implícito na atual ordem jurídica, segundo o
qual
Os interesses da coletividade são mais importantes que os interesses individuais, razão pela qual a
Administração, como defensora dos interesses públicos, recebe da lei poderes especiais não
extensivos aos particulares. (MAZZA, 2020, e-book)
Como exemplos decorrentes da incidência do princípio, é possível apontar:
a) possibilidade de transformar compulsoriamente a propriedade privada em pública, ou seja, a
chamada desapropriação;
b) autorização para utilização da propriedade privada em situações de iminente perigo público
(requisição de bens), por exemplo, requisição de veículo particular pela política para perseguir
criminoso;
c) prazos processuais em diferenciados para contestar, recorrer e responder recursos;
d) presunção de legitimidade dos atos administrativos.
Vale lembrar que a superioridade deve ser do interesse público e não do administrador público.
g) Princípio da indisponibilidade
O princípio da indisponibilidade do interesse público “enuncia que os agentes públicos não são donos
do interesse por eles defendido” (MAZZA, 2020, e-book), impondo, por conseguinte, que os agentes
públicos atuem conforme determinado pela legislação, e não segundo a própria vontade. O
administrador público exerce uma função pública, e, como tal, atua em nome e no interesse do povo.
Significa dizer que o Direito não é dele, o interesse não é dele, portanto, desse direito ele não pode
dispor. Infere-se, assim, que o princípio da indisponibilidade decorre do fato de que o Administrador
exerce atividade em nome e no interesse do povo.
Para entendermos melhor, utilizaremos o seguinte exemplo: a licitação serve para que a Administração
Pública possa escolher a melhor proposta, isto é, a proposta mais vantajosa ao interesse público. A
licitação, portanto, proporciona a possibilidade de se escolher a melhor proposta, se o Administrador
abre mão da oportunidade de escolher a mais vantajosa, ele abre mão do interesse público, violando-se,
assim, o princípio da indisponibilidade.
h) Princípio da participação
O referido princípio está previsto no art. 37, § 3o, da Constituição Federal (BRASIL, 1988).
Segundo Alexandre Mazza, de acordo com tal princípio
A lei deverá estimular as formas de participação do usuário na administração pública direta e
indireta, regulando especialmente:
a) reclamações relativas à prestação dos serviços públicos em geral;
b) o acesso dos usuários a registros administrativos e informações sobre atos de governo;
c) a disciplina da representação contra o exercício negligente ou abusivo do cargo, emprego ou
função da Administração Pública. (MAZZA, 2021, e-book)
Portanto, deve ser assegurada a participação da coletividade quanto aos atos praticados pela
Administração Pública.
i) Princípio da celeridade processual
Trata-se de princípio constitucional, previsto no art. 5o, LXXVIII, CF (BRASIL, 1988).

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Segundo o referido princípio, deve ser assegurado a todos, seja no âmbito judicial ou administrativo, a
razoável duração do processo e os meios que garantam celeridade na sua tramitação.
j) Princípio do devido processo legal
O princípio está previsto no art. 5o, LIV, da CF, segundo o qual “LIV - ninguém será privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (BRASIL, 1988).
Segundo a doutrina, o princípio comporta dois aspectos, ambos válidos no Direito Administrativo,
quais sejam:
a) devido processo legal, segundo o qual, é preciso que haja cumprimento de um rito predefinido na
lei, e, tal exigência é condição de validade da decisão;
b) devido processo legal material ou substantivo, que impõe que a decisão final seja justa, adequada e
proporcional (MAZZA, 2021, e-book).
k) Princípio do contraditório e da ampla defesa
Os princípios do contraditório e da ampla defesa estão previstos na Constituição Federal (BRASIL,
1988), em seu art. 5o, LV, que assim dispõe:
“LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados
o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Segundo o princípio do contraditório, “as decisões administrativas devem ser tomadas considerando a
manifestação dos interessados” (MAZZA, 2021, e-book), ou seja, é preciso assegurar o direito das
partes serem ouvidas no processo, antes do julgamento final.
Por outro lado, e, em complementação, o princípio da ampla defesa assegura aos litigantes, seja no
processo judicial ou administrativo, que sejam utilizados todos os meios de prova, de recursos, bem
como, os instrumentos necessários para a defesa de seus interesses (MAZZA, 2021, e-book).
A doutrina aponta, ainda, outros princípios, como, por exemplo, princípios da autotutela, da
obrigatória motivação, da finalidade, da razoabilidade, da proporcionalidade, da responsabilidade, da
segurança jurídica, da boa-administração, da continuidade do serviço público, da presunção da
legitimidade, da especialidade.
São princípios infraconstitucionais, razão pela qual sugere se à complementação do estudo.
3 DOS PODERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Mas, não apenas isso. Veremos ao longo deste tópico que, para que haja o adequado cumprimento das
suas atribuições, a Administração Pública possui competências especiais, que são consideradas
poderes-deveres instrumentais para a defesa do interesse público.
São os seguintes poderes-deveres, trazidos pela doutrina:
a) Vinculado
Segundo este poder, “quando a lei atribui determinada competência definindo todos os aspectos da
conduta a ser adotada, sem atribuir margem de liberdade para o agente público escolher a melhor
forma de agir” (MAZZA, 2020, e-book), este deve executar a vontade legal, ou seja, não há margem
de escolha. Ou seja, considera-se ato vinculado aquele resultante do exercício dessa competência.
Como exemplo, é possível citar o ato de realização do lançamento tributário, previsto no art. 3o, do
CTN.
b) Discricionário
Neste poder, é reservada à Administração Pública, margem de liberdade, “para que o agente público,
diante da situação concreta, possa selecionar entre as opções predefinidas qual a mais apropriada para
defender o interesse público” (MAZZA, 2020, e-book). Considera-se, portanto, ato discricionário, o
ato praticado no exercício de competência assim conferida.
Como exemplo, é possível citar o decreto expropriatório.
c) Disciplinar
O poder disciplinar, por sua vez, “consiste na possibilidade de a Administração aplicar punições aos
agentes públicos que cometam infrações funcionais” (MAZZI, 2021, e-book). Trata-se, desta feita, de
um poder interno (somente pode atingir agentes públicos), não permanente (incide apenas quando o
servidor cometer falta funcional) e discricionário (a administração pode escolher, respeitando os
limites previstos na legislação, qual a punição mais apropriada).
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d) Hierárquico
Segundo este princípio, é possível que o Executivo faça a distribuição e o escalonamento das funções
dos seus órgãos, assim como, rever a atuação dos agentes, a fim de que seja estabelecida relação de
subordinação entre os servidores e o quadro de pessoal (MEIRELLES, 2020, p. 117).
Segundo Alexandre Mazza,
É um poder interno e permanente exercido pelos chefes de repartição sobre seus agentes
subordinados e pela administração central em relação aos órgãos públicos consistentes nas
atribuições de comando, chefia e direção dentro da estrutura administrativa. (MAZZA, 2020, e-
book)
Assim como no poder anteriormente analisado, considera-se interno, porque não se aplica a
particulares. A grande diferença entre o disciplinar e o hierárquico, é que o poder hierárquico é
exercido de forma permanente, e não em caráter episódico.
e) Regulamentar
A doutrina aponta que o poder regulamentar decorre do poder hierárquico, já que “consiste na
possibilidade de os chefes do Poder Executivo editarem atos administrativos gerais e abstratos, ou
gerais e concretos, expedidos para dar fiel execução à lei” (MAZZA, 2021, e-book).
Possibilita, portanto, a criação de diversos atos abstratos, como, por exemplo, regimentos, instruções,
deliberações, resoluções e portarias.
Em situações excepcionais, admite-se atos regulamentares gerais e concretos, como, por exemplo, “os
regulamentos revogadores expedidos com a finalidade específica de extinguir ato normativo anterior”
(MAZZA, 2020, e-book).
f) De polícia
O Poder de Polícia é apontado pela doutrina como uma das três funções precípuas da Administração
Pública, sendo que, aludido poder, “representa uma atividade estatal restritiva dos interesses privados,
limitando a liberdade e a propriedade individual em favor do interesse público” (MAZZA, 2020, e-
book). Alexandre Mazza aponta que o Poder de Polícia possui duas acepções distintas:
Poder de Polícia sentido amplo Poder de Polícia em sentido restrito
Inclui qualquer limitação estatal à liberdade e Inclui somente as limitações administrativas à
propriedade privadas, englobando restrições liberdade e propriedade privadas, deixando de
legislativas e limitações administrativas fora as restrições impostas por dispositivos legais.
Exemplos: vigilância sanitária e polícia de trânsito.
Fonte: MAZZA, 2021, e-book.

Contudo, a questão não é unânime na doutrina, sendo que a maioria aponta apenas a vinculação do
poder de polícia em sentido restrito.
Para Hely Lopes Meirelles, por exemplo, o poder de polícia “é a faculdade de que dispõe a
Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos
individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado”. (MEIRELLES, 2020, p. 127).
Já Alexandre Mazza traz a seguinte definição:
Poder de Polícia é a atividade da Administração Pública, baseada na lei e na supremacia geral,
consistente no estabelecimento de limitações à liberdade e propriedade dos particulares, regulando
a prática de ato ou a abstenção de fato, manifestando-se por meio de atos normativos ou concretos,
em benefício do interesse público. (MAZZA, 2020, e-book)
Por fim, é possível citar a definição trazida por Celso Spitzcovsky e Pedro Lenza, para quem, “poder
de polícia é definido como aquele de que dispõe a Administração para condicionar, restringir, limitar e
frenar atividades e direitos de particulares para a preservação dos interesses da coletividade”
(SPITZCOVSKY; LENZA, 2021, e-book).
Diante dos conceitos apresentados, é possível afirmarmos que o exercício do aludido poder de polícia
decorre da supremacia do interesse público sobre o particular.
Cumpre mencionar, por fim, que o art. 78, do CTN, traz uma conceituação expressa do poder de
polícia.

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g) Normativo
Por fim, veremos o conceito do poder normativo.
Segundo Celso Spitzcovsky e Pedro Lenza, “o poder normativo ou regulamentar pode ser definido
pela faculdade atribuída ao administrador para a expedição de decretos e regulamentos” (2021, e-
book).
Contudo, ainda segundo a doutrina, os decretos e os regulamentos, “não podem inovar no ordenamento
jurídico, mas, tão somente oferecer à lei fiel execução, vale dizer, o melhor detalhamento”
(SPITZCOVSKY; LENZA, 2021, e-book).
Com isso, terminamos a análise relativa aos poderes da Administração Pública.
4 DA GESTÃO DE RISCOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Ao longo dos tópicos anteriores, vimos que a Administração Pública deve agir em prol do interesse
público, e que sua conduta deve ser lastreada por diversos princípios. Mas, não apenas obrigações
foram conferidas à Administração Pública para que seja atingida a finalidade, também foram
assegurados alguns poderes-deveres.
Ocorre que, não basta tais previsões, é preciso que haja uma gestão na Administração Pública, que vise
o auxílio na tomada de decisões, por exemplo, levando em conta, os riscos ambientais, de saúde,
econômicos, dentre outros. Trata-se da chamada gestão de riscos na Administração Pública.
O setor público trabalha com os riscos iminentes por meio de deveres, que se tornam direitos para os
cidadãos, como a educação, a saúde, a moradia e a segurança. A tentativa da administração pública é
gerir os riscos de forma que se consiga diminuir os custos com atividades incertas, aumentando
benefícios oferecidos para a sociedade, considerando sempre que a essência do serviço público é o
bem-estar da sociedade.
Importante, contudo, conhecermos as ideias gerais atreladas à chamada Gestão de Riscos.
Segundo Lorena Lucena Furtado, os riscos “caracterizam-se pela probabilidade de ocorrência
detectada de acontecimentos de determinado risco”, ou seja, são “fatores que podem ser previstos,
fazendo com que a entidade saiba como se comportar quando estes de fato ocorrerem” (2020, e-book).
Quanto aos riscos existentes no contexto da Administração Pública, é possível afirmar que:
O governo enfrenta riscos em muitas de suas funções: por exemplo, na sua função de proteger os
direitos públicos, de criar condições para a prosperidade econômica, de preservar a integridade do
meio ambiente, de tomar medidas para melhorar a saúde humana ou na prestação de serviços
governamentais. (ESCOLA NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, 2003, p. 15)
Portanto, a gestão de riscos seria um mecanismo para que seja garantida a boa governança, igualmente
aplicável à Administração Pública, isso porque, a adoção de uma gestão de riscos permanente tende a
melhorar os processos de tomada de decisão frente aos riscos para se obter, consequentemente,
melhores resultados. Ou seja, “o objetivo da gestão de riscos é aumentar os benefícios e reduzir os
custos das atividades cujos resultados são incertos”. (ESCOLA NACIONAL DE
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, 2003, p. 15). Ademais, o gerenciamento de riscos é apontado como
parte fundamental da governança, uma vez que se trata de instrumento de apoio à tomada de decisão,
visando melhorar o desempenho da organização (INSTITUTO BRASILEIRO DE GOVERNANÇA
CORPORATIVA, 2007). À luz do exposto, é possível citar como fatores importantes para que haja a
gestão de riscos (ESCOLA NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, 2003, p. 17-18):
a) a gestão de riscos reduz a probabilidade e a severidade de eventos negativos e indesejáveis;
b) abre portas para a inovação, considerando, por exemplo, inovações sociais e tecnológicas.
Mas, é preciso ter cautela, ou seja, para que sejam tomadas decisões por servidores públicos
“inovadores” que envolvam riscos desnecessários. Portanto, é necessário que este servidor possua
habilidades e competências necessárias para gerenciar referidos riscos. Podemos afirmar, como
consequência, que o gerenciamento de riscos é parte integrante das boas práticas administrativas, seja
no setor privado ou público. É fundamental, então, aprender a gerenciar os riscos de forma eficiente e
eficaz, pois possibilita que a instituição melhore os resultados que apresenta. Isso é possível a partir da
identificação, da análise e do monitoramento dos fatores de riscos que podem gerar impactos
negativos, de forma a possibilitar que estes sejam evitados, controlados ou mesmo transformados em
oportunidades. Para tanto, é preciso executar o gerenciamento de riscos de forma organizada e
estruturada, bem como, procurar motivar a capacitação e envolvimento das pessoas, pois isso
possibilita que sejam identificadas as oportunidades, melhorando os processos adotados, por
intermédio, por exemplo, da inovação.
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UNIDADE I I
DO PODER JUDICIÁRIO
Plano de Estudo:
• Conceitos e Definições de Introdutórias relativas ao Poder Judiciário;
• Estudo sobre a Organização e Estrutura do Poder Judiciário;
• Normas Constitucionais relativas ao Poder Judiciário;
• Análise da organização do Poder Judiciário, de acordo com as respectivas competências.
Objetivos de Aprendizagem:
• Conceituar o Poder Judiciário e analisar as respectivas noções introdutórias;
• Compreender a Estrutura e a Organização do Poder Judiciário;
• Apontar as normas previstas na Constituição Federal, bem como, ressaltar a organização do Poder
Judiciário de acordo com suas competências.
1 DA DEFINIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO E NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
Na contemporaneidade, prevalece a ideia da separação dos poderes, isto é, deve haver uma atuação
harmônica e autônoma entre os Poderes, quais sejam: Executivo, Legislativo e Judiciário.
Referida divisão, em verdade, teve as primeiras bases teóricas, na Antiguidade Grega, na obra Política,
de Aristóteles, que já apontava três funções distintas exercidas pelo soberano: edição de normas gerais
que deveriam ser observadas por todos, a de aplicação das referidas normas ao caso concreto e a
função de julgamento.
A teoria de Aristóteles foi sendo aprimorada com o passar do tempo, tendo como outro marco, a obra
O Espírito das Leis, de Montesquieu, segundo a qual, cada função corresponderia a um órgão
específico, ou seja, não mais se concentraria nas mãos do soberano. Portanto,
De acordo com essa teoria, cada Poder exercia uma função típica, inerente à sua natureza, atuando
independente e autonomamente, não mais sendo permitido a um único órgão legislar, aplicar lei e
julgar, de modo unilateral, como se percebia no absolutismo. (MAZZA, 2020, e-book)
A finalidade, por consequência, é assegurar a liberdade, ou seja, evitar que haja a concentração de
poder, exercido por uma mesma pessoa ou grupo de poderes. Assim, mediante a separação de poderes,
impõe-se que haja um consenso das autoridades estatais na tomada de decisões, bem como, criam-se
mecanismos de fiscalização e responsabilização recíproca, através dos “freios e contrapesos”.
O nosso foco de estudo, nesta unidade, atrela-se ao Poder Judiciário. A doutrina afirma no seguinte
sentido, a respeito da visão geral:
[...] o Judiciário aponta no horizonte como não apenas um organismo direcionado a resolver
conflitos de interesses surgidos na sociedade, mas também como ordenador da respeitabilidade dos
direitos humanos fundamentais, seu garante último, inclusive contra o próprio Estado-
administrador, ou Estado-legislador ou, ainda, Estado-Executivo. (TAVARES, 2012, e-book).
Mas, afinal, o que seria o Poder Judiciário?
O Poder Executivo?
O Poder Legislativo?
Em início, é preciso ressaltar que cada um dos Poderes exerce as chamadas funções típicas, ou seja,
atividades predominantes, inerentes e ínsitas à sua natureza, mas também funções atípicas, que são
típicas dos outros órgãos.
Desta feita, é possível a “conceituação” de um e de outro, com base nas atividades típicas por ele
desenvolvidas, quais sejam:

LEGISLATIVO EXECUTIVO JUDICIÁRIO


- Legislar; - Prática de atos de chefia - Julgar (função jurisdicional) dizendo o
- Fiscalização contábil, de Estado, chefia de direito no caso concreto e dirimindo os
financeira, orçamentária e governo e atos de conflitos que lhe são levados, quando da
patrimonial do Executivo. administração. aplicação da lei.

Fonte: MAZZA, 2020, e-book.

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E quanto às funções atípicas? Seria possível, a título de exemplificação, apontar a seguinte menção:
LEGISLATIVO EXECUTIVO JUDICIÁRIO
- Natureza executiva: ao - Natureza legislativa: o - Natureza legislativa: regimento
dispor sobre organização, Presidente da República, interno dos tribunais, nos termos do
provendo cargos, por exemplo, adota art.96, I, “a”, da CF/88;
concedendo licenças, etc. medida provisória, com - Natureza executiva: administra, por
- Natureza jurisdicional: o força de lei, nos termos do exemplo, ao conceder férias e licenças
Senado é o responsável por art. 62, da CF/88; aos magistrados, nos termos do art. 96,
julgar o Presidente da - Natureza jurisdicional: o I, “f”, da CF/88.
República, nos crimes de Executivo julga,
responsabilidade, conforme apreciando defesas e
art. 52, I, da CF/88. recursos administrativos.
Fonte: MAZZA, 2020, e-book
À luz da menção acima, podemos dizer que: o Poder Legislativo é aquele que atua, em essência, na
edição de regras gerais, abstratas, impessoais e inovadoras, ou seja, que cria as chamadas “leis”. Por
sua vez, o Executivo é aquele que “resolve os problemas concretos e individualizados, de acordo com
as leis”, abarcando a chamada função de governo e a função administrativa. Por fim, o Judiciário é
aquele que exerce, como atividade típica, a função jurisdicional, isto é, “tem por objeto aplicar o
direito aos casos concretos a fim de dirimir conflitos de interesses” (SILVA, 2015, p. 108).
Embora haja a referida divisão de “poderes”, não se pode perder de vista, que o poder é uno,
indivisível e indelegável, ou seja, o poder é um só, o que há é a manifestação através dos órgãos, que
exercem as funções típicas e atípicas. Como já mencionado anteriormente, iremos aprofundar o estudo,
nesta unidade, quanto ao Poder Judiciário. Segundo Alexandre Mazza,
O Poder Judiciário tem por função típica a jurisdicional, inerente à sua natureza. Exerce, ainda,
funções atípicas, de natureza executivo-administrativa (organização de suas secretarias
- art. 96, I, “b”; concessão de licença e férias a seus membros, juízes e servidores imediatamente
vinculados - art. 96, I, “f”), bem como funções atípicas de natureza legislativa (elaboração do
regimento interno - art. 96, I, “a”). (MAZZA,2020, e-book).
Ocorre, por conseguinte, que precisamos compreender o que se trata de jurisdição, ou seja: o que seria
essa função tipicamente jurisdicional? Este tema, ou seja, no que tange à “jurisdição”, será abordado
com maior afinco no nosso terceiro capítulo, porém, já neste momento, é importante entender o
conceito geral para o referido termo. Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e
Cândido Rangel Dinamarco, na obra “Teoria Geral do Processo”, afirmam que a jurisdição é
Uma das funções do Estado, mediante a qual este substitui aos titulares dos interesses em conflito
para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça. Essa
pacificação é feita mediante a atuação da vontade do direito objetivo que rege o caso apresentado
em concreto para ser solucionado; e o Estado desempenha essa função sempre por meio do
processo, seja expressando imperativamente o preceito (através de uma sentença de mérito), seja
realizando no mundo das coisas o que o preceito estabelece (através da execução forçada). (2006,
p. 129).
Diante de sua atribuição central, ou seja, diante da atuação do Poder Judiciário, foram atribuídas
algumas garantias, que visam assegurar, dentre outros aspectos, a independência do órgão, para que
este possa decidir livremente, sem sofrer qualquer tipo de pressão dos outros Poderes. Há, neste
contexto, garantias institucionais, que visam a proteção do Judiciário como um todo, e, também,
garantias funcionais ou de órgãos, relativas à independência e à imparcialidade dos membros do Poder
Judiciário. Como garantias institucionais do Judiciário, é possível elencar:
a) Garantias de autonomia orgânico-administrativa
Relativa à estruturação e funcionamento dos órgãos, vez que os tribunais podem:
a) eleger órgãos diretivos, sem participação dos outros Poderes;
b) elaborar o regimento interno;
c) organizar a estrutura administrativa interna.

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b) Garantias de autonomia financeira
Tanto a anterior, quanto esta, são garantias constitucionais, insculpidas no art. 99, caput, da
Constituição Federal de 1988:
“Art. 99. Ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira” (BRASIL, 1988).
Quanto à garantia de autonomia financeira, sua previsão está disposta, ainda, no § 1º, do referido
dispositivo constitucional: “Os tribunais elaborarão suas propostas orçamentárias dentro dos limites
estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de diretrizes orçamentárias” (BRASIL,
1988). Por sua vez, no que tange às garantias funcionais do Judiciário é possível citar:
a) Garantias de independência dos órgãos judiciários
São consideradas garantias de independência dos órgãos judiciários: vitaliciedade, inamovibilidade e
irredutibilidade de subsídios, que podem ser assim discriminadas:
Quadro 1 - Garantias de Independência dos Órgãos do Judiciário
IRREDUTIBILIDADE DE
VITALICIEDADE INAMOVIBILIDADE
SUBSÍDIOS
O magistrado somente perderá o Garante-se a impossibilidade de O subsídio dos magistrados não
cargo, uma vez vitaliciado, por remoção, sem o consentimento do poderá ser reduzido.
sentença judicial transitada em juiz, de um local para outro, de
julgado, após asseguradas as uma comarca para outra, ou
garantias inerentes ao processo. mesmo sede, cargo, tribunal,
câmara, grau de jurisdição.
Art. 95, I, da CF/88: “Art. 95. Art. 95, II, da CF/88: “Art. 95. Art. 95, III, da CF/88: “Os juízes
Os juízes gozam das seguintes Os juízes gozam das seguintes gozam das seguintes garantias: III -
garantias: I - vitaliciedade, que, garantias: II - inamovibilidade, irredutibilidade de subsídio,
no primeiro grau, só será salvo por motivo de interesse ressalvado o disposto nos arts. 37,
adquirida após dois anos de público, na forma do art. 93, X e XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e
exercício, dependendo a perda do VIII”. 153, § 2º, I”.
cargo, nesse período, de
deliberação do tribunal a que o
juiz estiver vinculado, e, nos
demais casos, de sentença judicial
transitada em julgado”.
Todos os membros dos tribunais Não é regra absoluta, vez que os O STF já se pronunciou dizendo
têm a garantia da vitaliciedade, magistrados poderão ser que a garantia é apenas nominal, e
independente da forma de acesso. removidos, por interesse público, não real, ou seja, os magistrados
nos termos do art. 93, VIII, da não estão livres da inflação.
CF/88.
Fonte: criação própria.

b) Garantias de imparcialidade dos órgãos jurisdicionais


As garantias de imparcialidade revestem-se de vedações que foram estabelecidas na Constituição
Federal, em seu artigo 95, parágrafo único. Trata-se de um rol taxativo, já que restringe direitos.
Assim versa o dispositivo citado:
Parágrafo único. Aos juízes é vedado:
I - exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério;
II - receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo;
III - dedicar-se à atividade político-partidária.
IV - receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades
públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei;
V - exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do
afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração. (BRASIL, 1988).
Uma vez analisado o conceito geral inerente ao Poder Judiciário, bem como, a sua principal função,
qual seja: a função jurisdicional, e, consequente garantias, para que possa atuar de forma livre e
autônoma, importante conhecermos a organização e a estrutura do Poder Judiciário, item que veremos
a seguir.

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2 DA ORGANIZAÇÃO E ESTRUTURA DO PODER JUDICIÁRIO
Vimos no tópico anterior que o Poder Judiciário é o órgão responsável pela interpretação das leis,
resolvendo pacificamente os conflitos mediante processos judiciais válidos para todos os cidadãos.
Mas, é preciso entendermos, para além de sua definição, a sua organização e estrutura.
No que tange à organização e à estrutura do Poder Judiciário é preciso analisar os arts. 92 e SS, da
Constituição Federal de 1988. Neste tópico, por conseguinte, falaremos sobre a organização e a
estrutura como um todo, destacando os principais pontos.
Afinal, quais são os órgãos que compõem o Poder Judiciário?
A resposta para a referida questão encontra-se no art. 92, da Constituição Federal de 1988:
Art. 92. São órgãos do Poder Judiciário:
I - o Supremo Tribunal Federal;
I-A o Conselho Nacional de Justiça;
II - o Superior Tribunal de Justiça;
II-A - o Tribunal Superior do Trabalho;
III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;
IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;
V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;
VI - os Tribunais e Juízes Militares;
VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. (BRASIL, 1988).
Segundo a doutrina (MAZZA, 2020, e-book) dentre os órgãos acima destacados, o Supremo Tribunal
Federal e os Tribunais Superiores, seriam “órgãos de convergência”, uma vez que exercem a jurisdição
sobre todo o território nacional, conforme art. 92, § 2º, da Constituição Federal de 1988. Ainda,
segundo Mazza, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça também seriam órgãos
de superposição, já que não pertencem a nenhuma Justiça, mas suas decisões se sobrepõem às decisões
proferidas pelos órgãos inferiores das Justiças comum e especial.
Quanto à estrutura é preciso, igualmente, conhecer a divisão das diversas Justiças, qual seja:
Quadro 2 - Divisão da Justiça
JUSTIÇA COMUM JUSTIÇA ESPECIAL
Composta pela: Composta pela:
a) Justiça Federal (Tribunais Regionais a) Justiça do Trabalho: Tribunal Superior do
Federais e Juízes Federais); Trabalho, Tribunais Regionais do Trabalho e
b) Justiça do Distrito Federal e Territórios Juízes do Trabalho;
(Tribunais e Juízes do DF e Territórios); b) Justiça Eleitoral: Tribunal Superior Eleitoral,
c) Justiça Estadual comum (juízos de primeiro Tribunais Regionais Eleitorais, Juízes Eleitorais
grau de jurisdição, incluindo o Juizado Especial e e Juntas Eleitorais;
a Justiça de Paz, e, os de segundo grau de c) Justiça Militar da União: Superior Tribunal
Jurisdição). Militar, Juízes Federais da Justiça Militar e/ou
Conselhos de Justiça, Especial e Permanente, nas
sedes das Auditorias Militares;
d) Justiça Militar dos Estados, do DF e
Territórios: Tribunal de Justiça ou Tribunal de
Justiça Militar e Conselhos de Justiça.
Ocorre que, pode surgir a seguinte dúvida: qual a competência das referidas “Justiças”? Todas
possuem competência penal? A resposta é não! Isso porque, a Justiça do Trabalho, ao contrário das
demais, não tem competência penal. A Justiça do Trabalho, por consequência, somente julga e concilia
dissídios individuais e coletivos que tenham origem nas relações de trabalho. Mas, afinal, essa divisão
em “Justiças” significa que o Poder Judiciário no Brasil é fragmentado? Não! Em verdade, “a presença
de um espaço próprio para atuação (competência jurisdicional) de cada uma das chamadas
vulgarmente ‘Justiças’ não pode conduzir à conclusão que seria de todo equivocada e indesejável, de
que o Poder Judiciário é fragmentado” (TAVARES, 2012, e-book). Ou seja, a nossa estrutura é
unitária, possui caráter nacional, conforme já sedimentado, inclusive, pela jurisprudência.
No voto proferido na ADI 3.367-1/DF, restou deliberado que “a Jurisdição, enquanto manifestação da
unidade do poder soberano do Estado, tampouco pode deixar de ser una e indivisível, é doutrina
assente que o Poder Judiciário tem caráter nacional [...]”. O que a divisão acima representa, na
verdade, é que o nosso Judiciário é composto por diversas unidades judiciárias, que possuem
atribuições e competências específicas. O campo de atuação de cada um dos órgãos jurisdicionais está
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previsto de forma expressa, na Constituição Federal de 1988, a partir do seu artigo 101, vejamos
alguns exemplos:
a) Supremo Tribunal Federal
A composição do STF está prevista no art. 101, da Constituição Federal de 1988, qual seja:
11 Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais 35 anos e menos de 65 anos de idade, sendo
imprescindível notável saber jurídico e reputação ilibada.
As funções/atribuições, por sua vez, estão arroladas no art. 102, da Constituição Federal de 1988,
como, por exemplo,
a) processar e julgar originariamente,
a.1) a ação direta de inconstitucionalidade de lei;
a.2) o Presidente da República, nas infrações penais comuns;
a.3) a revisão criminal e a ação rescisória de seus julgados;
b) julgar, em recurso ordinário, o crime político;
a.4) julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância quando a
decisão recorrida contrariar dispositivo da CF/88.
b) Conselho Nacional de Justiça
A composição deverá seguir a previsão do art. 103-B, da Constituição Federal de 1988.
103-B da Constituição dá competência ao Conselho para controlar a atuação administrativa e
financeira do Poder Judiciário e dos deveres funcionais dos juízes, além das demais atribuições
conferidas pelo Estatuto da Magistratura (Lei Complementar n. 35/79).
c) Superior Tribunal de Justiça
É composto de, no mínimo, 33 Ministros, nos termos do art. 104, da Constituição Federal de
1988, sendo que as atribuições estão previstas no art. 105, do aludido texto constitucional.
Art. 104. O Superior Tribunal de Justiça compõe-se de, no mínimo, trinta e três Ministros.
Parágrafo único. Os Ministros do Superior Tribunal de Justiça serão nomeados pelo Presidente da
República, dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de setenta anos de idade, de notável
saber jurídico e reputação ilibada, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado
Federal, sendo: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 122, de 2022)
I - um terço dentre juízes dos Tribunais Regionais Federais e um terço dentre desembargadores dos
Tribunais de Justiça, indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal;
II - um terço, em partes iguais, dentre advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual,
do Distrito Federal e Territórios, alternadamente, indicados na forma do art. 94.
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
I - processar e julgar, originariamente:
a) nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito Federal, e, nestes e nos de
responsabilidade, os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os
membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais
Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou Tribunais
de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que oficiem perante tribunais;
b) os mandados de segurança e os habeas data contra ato de Ministro de Estado, dos Comandantes da
Marinha, do Exército e da Aeronáutica ou do próprio Tribunal; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 23, de 1999).
c) os habeas corpus, quando o coator ou paciente for qualquer das pessoas mencionadas na alínea "a",
ou quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição, Ministro de Estado ou Comandante da
Marinha, do Exército ou da Aeronáutica, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral; (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 23, de 1999).
d) os conflitos de competência entre quaisquer tribunais, ressalvado o disposto no art. 102, I, "o", bem
como entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a tribunais diversos;
e) as revisões criminais e as ações rescisórias de seus julgados;
f) a reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões;
g) os conflitos de atribuições entre autoridades administrativas e judiciárias da União, ou entre
autoridades judiciárias de um Estado e administrativas de outro ou do Distrito Federal, ou entre as
deste e da União;

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h) o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de órgão,
entidade ou autoridade federal, da administração direta ou indireta, excetuados os casos de
competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral, da
Justiça do Trabalho e da Justiça Federal;
i) a homologação de sentenças estrangeiras e a concessão de exequatur às cartas rogatórias; (Incluída
pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
II - julgar, em recurso ordinário:
a) os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou
pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória;
b) os mandados de segurança decididos em única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou
pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando denegatória a decisão;
c) as causas em que forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, do
outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País;
III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais
Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão
recorrida:
a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;
b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004).
§ 1º Funcionarão junto ao Superior Tribunal de Justiça:
I - a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados, cabendo-lhe, dentre outras
funções, regulamentar os cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira; (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
II - o Conselho da Justiça Federal, cabendo-lhe exercer, na forma da lei, a supervisão administrativa e
orçamentária da Justiça Federal de primeiro e segundo graus, como órgão central do sistema e com
poderes correicionais, cujas decisões terão caráter vinculante. (Incluído pela Emenda Constitucional nº
45, de 2004).
§ 2º No recurso especial, o recorrente deve demonstrar a relevância das questões de direito federal
infraconstitucional discutidas no caso, nos termos da lei, a fim de que a admissão do recurso seja
examinada pelo Tribunal, o qual somente pode dele não conhecer com base nesse motivo pela
manifestação de 2/3 (dois terços) dos membros do órgão competente para o julgamento. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 125, de 2022).
§ 3º Haverá a relevância de que trata o § 2º deste artigo nos seguintes casos: (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 125, de 2022).
I - ações penais; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 125, de 2022).
II - ações de improbidade administrativa; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 125, de 2022).
III - ações cujo valor da causa ultrapasse 500 (quinhentos) salários mínimos; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 125, de 2022).
IV - ações que possam gerar inelegibilidade; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 125, de 2022).
V - hipóteses em que o acórdão recorrido contrariar jurisprudência dominante do Superior Tribunal de
Justiça; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 125, de 2022).
VI - outras hipóteses previstas em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 125, de 2022).
d) Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais
Segundo o art. 106, da Constituição Federal, a Justiça Federal é composta pelos Tribunais Regionais
Federais, cuja composição está descrita no art. 107 e as atribuições no art. 108, bem como, pelos
juízes federais, cuja competência está ventilada no art. 109, da Constituição Federal.
Art. 106. São órgãos da Justiça Federal:
I - os Tribunais Regionais Federais;
II - os Juízes Federais.
Art. 107. Os Tribunais Regionais Federais compõem-se de, no mínimo, sete juízes, recrutados, quando
possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de
trinta e menos de setenta anos de idade, sendo: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 122, de
2022)

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I - um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do
Ministério Público Federal com mais de dez anos de carreira;
II - os demais, mediante promoção de juízes federais com mais de cinco anos de exercício, por
antigüidade e merecimento, alternadamente.
§ 1º A lei disciplinará a remoção ou a permuta de juízes dos Tribunais Regionais Federais e
determinará sua jurisdição e sede. (Renumerado pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 2º Os Tribunais Regionais Federais instalarão a justiça itinerante, com a realização de audiências e
demais funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se
de equipamentos públicos e comunitários. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 3º Os Tribunais Regionais Federais poderão funcionar descentralizadamente, constituindo Câmaras
regionais, a fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo.
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
Art. 108. Compete aos Tribunais Regionais Federais:
I - processar e julgar, originariamente:
a) os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho,
nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, ressalvada a
competência da Justiça Eleitoral;
b) as revisões criminais e as ações rescisórias de julgados seus ou dos juízes federais da região;
c) os mandados de segurança e os habeas data contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal;
d) os habeas corpus, quando a autoridade coatora for juiz federal;
e) os conflitos de competência entre juízes federais vinculados ao Tribunal;
II - julgar, em grau de recurso, as causas decididas pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no
exercício da competência federal da área de sua jurisdição.
Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:
I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na
condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e
as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;
II - as causas entre Estado estrangeiro ou organismo internacional e Município ou pessoa domiciliada
ou residente no País;
III - as causas fundadas em tratado ou contrato da União com Estado estrangeiro ou organismo
internacional;
IV - os crimes políticos e as infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse
da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas as contravenções e
ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral;
V - os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o
resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;
V- A as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004)
VI - os crimes contra a organização do trabalho e, nos casos determinados por lei, contra o sistema
financeiro e a ordem econômico-financeira;
VII - os habeas corpus, em matéria criminal de sua competência ou quando o constrangimento provier
de autoridade cujos atos não estejam diretamente sujeitos a outra jurisdição;
VIII - os mandados de segurança e os habeas data contra ato de autoridade federal, excetuados os casos
de competência dos tribunais federais;
IX - os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar;
X - os crimes de ingresso ou permanência irregular de estrangeiro, a execução de carta rogatória, após
o "exequatur", e de sentença estrangeira, após a homologação, as causas referentes à nacionalidade,
inclusive a respectiva opção, e à naturalização;
XI - a disputa sobre direitos indígenas.
§ 1º As causas em que a União for autora serão aforadas na seção judiciária onde tiver domicílio a
outra parte.
§ 2º As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for
domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde
esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.

15
§ 3º Lei poderá autorizar que as causas de competência da Justiça Federal em que forem parte
instituição de previdência social e segurado possam ser processadas e julgadas na justiça estadual
quando a comarca do domicílio do segurado não for sede de vara federal. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
§ 4º Na hipótese do parágrafo anterior, o recurso cabível será sempre para o Tribunal Regional Federal
na área de jurisdição do juiz de primeiro grau.
§ 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a
finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos
humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em
qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça
Federal. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
e) Justiça do Trabalho
A Justiça do Trabalho, por sua vez, é composta pelos seguintes órgãos:
e.1) Tribunal Superior do Trabalho, tendo por base a composição descrita no art. 111-A, da CF/88;
e.2) Tribunais Regionais do Trabalho;
e.3) Juízes do Trabalho. A competência da Justiça do Trabalho está descrita no art. 114, da CF/88.
Art. 111-A. O Tribunal Superior do Trabalho compõe-se de vinte e sete Ministros, escolhidos dentre
brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de setenta anos de idade, de notável saber jurídico e
reputação ilibada, nomeados pelo Presidente da República após aprovação pela maioria absoluta do
Senado Federal, sendo: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 122, de 2022).
I um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do
Ministério Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício, observado o disposto no
art. 94; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
II os demais dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura da carreira,
indicados pelo próprio Tribunal Superior. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
§ 1º A lei disporá sobre a competência do Tribunal Superior do Trabalho. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004).
§ 2º Funcionarão junto ao Tribunal Superior do Trabalho: (Incluído pela Emenda Constitucional nº
45, de 2004).
I a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho, cabendo-lhe, dentre
outras funções, regulamentar os cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira; (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
II o Conselho Superior da Justiça do Trabalho, cabendo-lhe exercer, na forma da lei, a supervisão
administrativa, orçamentária, financeira e patrimonial da Justiça do Trabalho de primeiro e segundo
graus, como órgão central do sistema, cujas decisões terão efeito vinculante. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004).
§ 3º Compete ao Tribunal Superior do Trabalho processar e julgar, originariamente, a reclamação para
a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 92, de 2016).
Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004) (Vide ADIN 3392) (Vide ADIN 3432).
I as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da
administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
II as ações que envolvam exercício do direito de greve; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de
2004).
III as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre
sindicatos e empregadores; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
IV os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver
matéria sujeita à sua jurisdição; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
V os conflitos de competência entre órgãos com jurisdição trabalhista, ressalvado o disposto no art.
102, I, o; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
VI as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho;
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
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VII as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de
fiscalização das relações de trabalho; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
VIII a execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos
legais, decorrentes das sentenças que proferir; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
IX outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei. (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 45, de 2004).
§ 1º Frustrada a negociação coletiva, as partes poderão eleger árbitros.
§ 2º Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas,
de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho
decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as
convencionadas anteriormente.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Vide ADI n º 3423)
(Vide ADI n º 3423) (Vide ADI n º 3423)
(Vide ADI n º 3431) (Vide ADI n º 3432)
(Vide ADI n º 3520) (Vide ADIN 3392)
(Vide ADIN 3432)
§ 3º Em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o
Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho
decidir o conflito.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
(Vide ADI n º 3423) (Vide ADI n º 3431) (Vide ADI n º 3520)
(Vide ADIN 3392)
(Vide ADIN 3432)
f) Tribunais e Juízes Eleitorais
Compõe a Justiça Eleitoral, os seguintes órgãos: Tribunal Superior Eleitoral, cuja composição está no
art. 119, da CF/88; Tribunais Regionais Eleitorais, nos termos do art. 120, da CF/88; Juízes
Eleitorais; e Juntas Eleitorais. A competência dos tribunais, juízes de direito e juntas eleitorais é
regulamentada por meio de Lei Complementar, conforme art. 121, da CF/88.
Art. 119. O Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, no mínimo, de sete membros, escolhidos:
I - mediante eleição, pelo voto secreto:
a) três juízes dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal;
b) dois juízes dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça;
II - por nomeação do Presidente da República, dois juízes dentre seis advogados de notável saber
jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal.
Parágrafo único. O Tribunal Superior Eleitoral elegerá seu Presidente e o Vice-Presidente dentre os
Ministros do Supremo Tribunal Federal, e o Corregedor Eleitoral dentre os Ministros do Superior
Tribunal de Justiça.
Art. 120. Haverá um Tribunal Regional Eleitoral na Capital de cada Estado e no Distrito Federal.
§ 1º - Os Tribunais Regionais Eleitorais compor-se-ão:
I - mediante eleição, pelo voto secreto:
a) de dois juízes dentre os desembargadores do Tribunal de Justiça;
b) de dois juízes, dentre juízes de direito, escolhidos pelo Tribunal de Justiça;
II - de um juiz do Tribunal Regional Federal com sede na Capital do Estado ou no Distrito Federal, ou,
não havendo, de juiz federal, escolhido, em qualquer caso, pelo Tribunal Regional Federal respectivo;
III - por nomeação, pelo Presidente da República, de dois juízes dentre seis advogados de notável saber
jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Tribunal de Justiça.
§ 2º - O Tribunal Regional Eleitoral elegerá seu Presidente e o Vice-Presidente- dentre os
desembargadores.
Art. 121. Lei complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos juízes de
direito e das juntas eleitorais.
§ 1º - Os membros dos tribunais, os juízes de direito e os integrantes das juntas eleitorais, no exercício
de suas funções, e no que lhes for aplicável, gozarão de plenas garantias e serão inamovíveis.

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§ 2º - Os juízes dos tribunais eleitorais, salvo motivo justificado, servirão por dois anos, no mínimo, e
nunca por mais de dois biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo
mesmo processo, em número igual para cada categoria.
§ 3º - São irrecorríveis as decisões do Tribunal Superior Eleitoral, salvo as que contrariarem esta
Constituição e as denegatórias de habeas corpus ou mandado de segurança.
§ 4º - Das decisões dos Tribunais Regionais Eleitorais somente caberá recurso quando:
I - forem proferidas contra disposição expressa desta Constituição ou de lei;
II - ocorrer divergência na interpretação de lei entre dois ou mais tribunais eleitorais;
III - versarem sobre inelegibilidade ou expedição de diplomas nas eleições federais ou estaduais;
IV - anularem diplomas ou decretarem a perda de mandatos eletivos federais ou estaduais;
V - denegarem habeas corpus, mandado de segurança, habeas data ou mandado de injunção.
g) Tribunais e Juízes Militares
Segundo o art. 122, da CF/88, a Justiça Militar é composta pelo Superior Tribunal Militar (a
composição está no art. 123, da CF/88) e pelos Tribunais e Juízes Militares instituídos por lei, sendo
que, nos moldes do art. 124, da CF/88, “À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes
militares definidos em lei” (BRASIL, 1988).
Art. 122. São órgãos da Justiça Militar:
I - o Superior Tribunal Militar;
II - os Tribunais e Juízes Militares instituídos por lei.
Art. 123. O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros vitalícios, nomeados pelo
Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo três dentre
oficiais-generais da Marinha, quatro dentre oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais-generais
da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, e cinco dentre civis.
Parágrafo único. Os Ministros civis serão escolhidos pelo Presidente da República dentre brasileiros
com mais de trinta e cinco e menos de setenta anos de idade, sendo: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 122, de 2022)
I - três dentre advogados de notório saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva
atividade profissional;
II - dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do Ministério Público da Justiça
Militar.
Art. 124. À Justiça Militar compete processar e julgar os crimes militares definidos em lei.
Parágrafo único. A lei disporá sobre a organização, o funcionamento e a competência da Justiça
Militar.
h) Tribunais e Juízes dos Estados
Os Estados organizarão sua Justiça, conforme determina o art. 125, da Constituição Federal de 1988.
Após o estudo, ao longo do presente tópico, da organização e do funcionamento do Poder Judiciário, é
imprescindível falarmos um pouco mais sobre a previsão constitucional, o que veremos no tópico
seguinte.
Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta
Constituição.
§ 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização
judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.
§ 2º Cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos
normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual, vedada a atribuição da
legitimação para agir a um único órgão.
§ 3º A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de Justiça, a Justiça Militar estadual,
constituída, em primeiro grau, pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e, em segundo grau,
pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos Estados em que o efetivo
militar seja superior a vinte mil integrantes. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de
2004).
§ 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes
militares definidos em lei e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a
competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente decidir sobre a perda do
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posto e da patente dos oficiais e da graduação das praças. (Redação dada pela Emenda Constitucional
nº 45, de 2004).
§ 5º Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar, singularmente, os crimes
militares cometidos contra civis e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao
Conselho de Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os demais crimes militares.
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
§ 6º O Tribunal de Justiça poderá funcionar descentralizadamente, constituindo Câmaras regionais, a
fim de assegurar o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo. (Incluído
pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
§ 7º O Tribunal de Justiça instalará a justiça itinerante, com a realização de audiências e demais
funções da atividade jurisdicional, nos limites territoriais da respectiva jurisdição, servindo-se de
equipamentos públicos e comunitários. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).
3 DAS NORMAS PREVISTAS NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ATRELADAS AO PODER
JUDICIÁRIO
Ao longo dos tópicos anteriores, falamos sobre o Poder Judiciário e suas principais características.
Restou evidenciado, igualmente, que a Constituição Federal de 1988 possui significativo papel, vez
que regula e traz os pontos centrais quanto ao tema.
O Poder Judiciário, conforme analisamos, consiste em um dos três Poderes, cuja previsão expressa,
está no art. 2o, da Constituição Federal de 1988, que assim versa: “Art. 2º São Poderes da União,
independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário” (BRASIL, 1988).
Referida divisão é importante para assegurar e tutelar o Estado Democrático de Direito, vez que
confere a independência e autonomia aos aludidos poderes. Lenio Luiz Streck e Fábio de Oliveira
afirmam que:
Entende-se que a separação não é propriamente do poder político-jurídico, considerado
uno, indivisível, e sim das funções. O poder não se divide, as funções provenientes do
poder sim. [...] O princípio da separação de poderes é ancorado na acepção de
discricionariedade: um poder está proibido de invadir a discricionariedade dos outros. Este
o ponto de equilíbrio, a linha fronteiriça. (MENDES, G. F.; SARLET, I. W.; LTDA, I.
C. E. P.; LTDA, I. C. E. P.; CANOTILHO, J. J. G.; LEONCY, L. F.; STRECK, L. L,
2017, e-book).
Martins (2020, e-book) também versa sobre a separação de poderes, dizendo que se trata de um
modelo político no qual “o Estado tem suas funções divididas e delineadas em órgãos diferentes e
independentes, cada qual com distintas áreas de responsabilidade e, em regra, indelegáveis”.
Quanto ao Judiciário, vimos que seu papel é fundamental, pois a ele compete, dentre outros objetivos,
por intermédio do Supremo Tribunal Federal, a guarda da Constituição Federal, nos moldes do art.
102, da Constituição Federal de 1988: “Art. 102.
Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: [...]”
(BRASIL, 1988). Sobre a relevância do Poder Judiciário, assim afirma Moraes:
[...] sua função não consiste somente em administrar a Justiça, sendo mais, pois seu mister
é ser o verdadeiro guardião da Constituição, com a finalidade de preservar, basicamente, os
princípios da legalidade e igualdade, sem os quais os demais tornariam-se vazios. Esta
concepção resultou da consolidação de grandes princípios de organização política,
incorporados pelas necessidades jurídicas na solução de conflitos (MORAES, 2014, p.
520).
Lenio Luiz Streck e Fábio de Oliveira destacam a relevância do Poder Judiciário, destacando que
“de uma maneira ou de outra, o tema da separação de poderes é sempre presente em todas as decisões
jurisdicionais, haja vista que qualquer julgado expõe ou pontua uma posição sobre a matéria”,
apontando, igualmente que, “a divisão de poderes não está mais guardada apenas dos direitos
individuais, mas sim de todas as dimensões dos direitos fundamentais” (MENDES, G. F.; SARLET,
I. W.; LTDA, I. C. E. P.; LTDA, I. C. E. P.; CANOTILHO, J. J. G.; LEONCY, L. F.; STRECK,
L. L., 2017, e-book).
É inegável, por consequência, o significado e importância do Poder Judiciário em nosso ordenamento
jurídico, razão pela qual, a normativa está insculpida na Constituição Federal de 1988, conforme
analisado ao longo de toda a nossa unidade.

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Mas, seria possível sua alteração? Por exemplo, por intermédio de emendas constitucionais? Ou
estaríamos diante das chamadas “cláusulas pétreas”?
A separação de poderes é considerada cláusula pétrea, conforme estabelece o art. 60, § 4º, da
Constituição Federal de 1988: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a
abolir: III - a separação dos Poderes” (BRASIL, 1988).
O que isso significa? Significa dizer que, em se tratando de cláusula pétrea, não pode haver sua
supressão da Constituição Federal, nem mesmo por emenda constitucional. Sendo assim:
[...] não será apenas inconstitucional a Proposta de Emenda Constitucional que suprime
integralmente a separação dos Poderes, mas também a Emenda Constitucional que acaba
por concentrar poderes nas mãos de uma só pessoa ou só órgão, ou cria controles ou
interferências indevidas de um Poder sobre o outro. (MARTINS, 2020, e-book).
Então não seria possível que uma Emenda Constitucional verse sobre os Poderes?
É preciso ter cuidado neste ponto, uma vez que a Constituição Federal de 1988 aponta como cláusula
pétrea a separação dos poderes, e não a tripartição de Poderes propriamente dita. Por consequência:
“será possível uma Emenda Constitucional aperfeiçoando cada Poder (como já houve, por exemplo, a
Reforma do Poder Judiciário - Emenda Constitucional m. 45.2004)” (MARTINS, 2020, e-book).
A Constituição Federal, igualmente, versa sobre toda a organização e funcionamento do Poder
Judiciário, como visto no tópico anterior, trazendo, por exemplo, a composição de cada um dos órgãos
da Justiça e suas atribuições.
Neste contexto, é imprescindível ressaltar o art. 92, da Constituição Federal de 1988, que elenca de
forma expressa quais os órgãos que compõem o Poder Judiciário, tópico elucidado e estudado
anteriormente nesta mesma unidade. Cumpre-nos, porém, a análise quanto ao chamado “quinto
constitucional”, regra insculpida no art. 94, da Constituição Federal:
Art. 94 Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos
Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros, do Ministério
Público, com mais de dez anos de carreira, e de advogados 4 Do Poder Judiciário de
notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade
profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas
classes. (BRASIL, 1988).
Pedro Lenza destaca que, embora o art. 94, da Constituição Federal apenas se refira a determinados
tribunais, a regra do quinto também se aplica para os tribunais do trabalho e o procedimento orienta a
composição do STJ (LENZA, 2021, e-book).
Contudo, você pode ficar com a seguinte dúvida: qual seria este procedimento? O autor acima
apontado, afirma quanto ao procedimento que:
Os órgãos de representação das classes dos advogados e Ministério Público elaboram lista
sêxtupla, ou sejam indicam 6 nomes que preencham os requisitos acima citados. Recebidas
as indicações, o tribunal para o qual foram indicados forma lista tríplice (escolhe 3 dos
6). Nos 20 dias subsequentes, o Chefe do Executivo (em se tratando de Tribunal Estadual,
o Governador de Estado; na hipótese do TJ do DF e Territórios, o Presidente da República,
e para indicação ao TRF, também o Presidente da República) escolherá 1 dos 3 para
nomeação. (LENZA, 2021).
O procedimento, como dito acima, está previsto e regulamentado no próprio texto constitucional, não
sendo permitido, por consequência, outros procedimentos, como, por exemplo, eventual sabatina do
legislativo. Trata-se de um tema polêmico em nosso ordenamento, vez que aponta “indicações”, mas
encontra respaldo em nossa Constituição Federal. Com a análise desses pontos específicos, encerramos
a complementação realizada neste tópico no que tange à previsão constitucional relativa ao Poder
Judiciário, sendo que, no tópico seguinte falaremos um pouco mais sobre as competências específicas
atreladas ao Poder Judiciário e respectivos órgãos.
4 DA ORGANIZAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO DE ACORDO COM SUAS
COMPETÊNCIAS
Ao longo desta unidade, estamos estudando o Poder Judiciário, que consiste em um dos Poderes
previstos na Constituição Federal de 1988, ao lado do Poder Executivo e do Poder Legislativo.
Em essência, compete ao Poder Judiciário o exercício da atividade jurisdicional, sendo que deve atuar,
conforme a previsão da Constituição Federal. Nesse norte, é o art. 92, da Constituição Federal, já
anteriormente apontado, que define quais são os órgãos do Poder Judiciário.
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Pedro Lenza aponta o seguinte organograma:

Fonte: LENZA, 2021, e-book.


Para o citado autor, “o STF e os Tribunais Superiores (STJ, TST, TSE e STM) são órgãos de
convergência, têm sede na Capital Federal (Brasília) e exercem jurisdição sobre todo o território
nacional” (LENZA, 2021, e-book).
É possível dizer que o STF e o STJ são, também, órgãos de superposição, pois não pertencem a
nenhuma Justiça e suas decisões se sobrepõem às decisões proferidas pelos órgãos inferiores. Sobre o
tema, Pedro Lenza afirma que: “As decisões do STJ se sobrepõem àquelas da Justiça Federal comum,
da Estadual e daquela do Distrito Federal e Territórios, ao passo que as decisões do STF se sobrepõem
a todas as Justiças e Tribunais” (2021, e-book).
Além dos órgãos de superposição (STF e STJ), há as diversas Justiças, que podem ser divididas em
comum e especializada/especial:
COMUM ESPECIAL/ESPECIALIZADA
a) Justiça Federal (composta pelos Tribunais a) Justiça do Trabalho (composta pelo
Regionais Federais e Juízes Federais); Tribunal Superior do Trabalho, Tribunais
b) Justiça do Distrito Federal e Territórios Regionais do Trabalho e juízes);
(Tribunais e Juízes); b) Justiça Eleitoral (TSE, TREs, Juízes
c) Justiça Estadual Comum (juízos de Eleitorais e Juntas Eleitorais);
primeiro e segundo grau, inclusive Juizados c) Justiça Militar da União, dos Estados, do
Especiais e Justiça da Paz). DF e Territórios.
No que tange à competência, apenas a Justiça do Trabalho não possui competência penal, sendo que
todas as demais (Federal, Eleitoral, Estaduais e do DF e Territórios), têm tanto competência penal
quanto civil. Importante destacar os chamados Juizados Especiais. No que tange aos Juizados
Especiais Estaduais, a disciplina encontra respaldo, em linhas gerais, na Lei 9.099/95, sendo que a
formação dos Juizados Especiais dos Estados e do Distrito Federal é composta pelos:
a) Juizados Especiais Cíveis;
b) Juizados Especiais Criminais e;
c) Juizados Especiais da Fazenda Pública.
Assim aponta o art. 1o, da Lei 9.099/95: “Art. 1º Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da
Justiça Ordinária, serão criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para
conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência” (BRASIL, 1995).
Por sua vez, o art. 2o, elenca a competência relativa ao Juizado Especial Cível, sendo a matéria
regulada até o art. 59. A regulamentação dos Juizados Especiais Criminais se dá a partir do art. 60.

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O segundo grau de jurisdição, em se tratando de Juizados Especiais, é exercido pelas Turmas
Recursais, cuja composição é: três juízes togados, em exercício no primeiro grau de jurisdição,
reunidos na sede do Juizado.
Por sua vez, quando falamos de Juizados Especiais Federais, a disciplina está na Lei n. 10.259/2001,
que institui os:
a) Juizados Especiais Cíveis;
b) Juizados Especiais Criminais, ambos da Justiça Federal.
A competência de um e de outro, está expressa na referida legislação:
Lei 9.099/95
Art. 2o Compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os feitos de
competência da Justiça Federal relativos às infrações de menor potencial ofensivo,
respeitadas as regras de conexão e continência. [...]
Art. 3o Compete ao Juizado Especial Federal Cível processar, conciliar e julgar causas de
competência da Justiça Federal até o valor de sessenta salários mínimos, bem como
executar as suas sentenças. [...] (BRASIL, 2001)
Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia
processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação.
Art. 59. Não se admitirá ação rescisória nas causas sujeitas ao procedimento instituído por esta Lei.
Art. 60. O Juizado Especial Criminal, provido por juízes togados ou togados e leigos, tem
competência para a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial
ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência. (Redação dada pela Lei nº 11.313, de 2006).
Parágrafo único. Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o tribunal do júri, decorrentes da
aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da
composição dos danos civis. (Incluído pela Lei nº 11.313, de 2006).
Os Juizados Especiais são, portanto, importantes órgãos do Poder Judiciário, pois visam proporcionar a
todos os integrantes da sociedade que solucionem seus conflitos de forma rápida e eficiente, a
depender da complexidade do conflito, sendo que vigora, dentre outros aspectos, os princípios da
economicidade, da celeridade e da informalidade. Com isso, encerramos as nuances atreladas ao Poder
Judiciário, elencadas de forma global, sendo imperioso analisarmos os aspectos da jurisdição, tema
central da nossa próxima unidade.

UNIDADE III
DA JURISDIÇÃO
Plano de Estudo:
• Conceitos e Características Gerais da Jurisdição;
• Princípios atrelados à Jurisdição;
• Tipos de Jurisdição;
• Estudo sobre Competência.
Objetivos de Aprendizagem:
• Conceituar e apontar as principais características da jurisdição;
• Compreender os princípios da jurisdição e suas modalidades;
• Analisar os pontos centrais no que tange à competência.

1 DOS CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS DA JURISDIÇÃO


Vimos na unidade anterior que o Poder Judiciário exerce precipuamente a atividade jurisdicional. Mas,
afinal, o que seria essa atividade? O que é a jurisdição? Para tanto, precisamos compreender a origem
de tal previsão. Como cediço, o homem é um ente social, que, como regra, não vive isoladamente,
possuindo diversas necessidades humanas. Para que haja o convívio harmônico, aos poucos foram
sendo estabelecidas regras de conduta, se intensificando aos poucos, a ideia do “direito”.
Ocorre que, mesmo com as regras insculpidas pelo ordenamento, há os chamados conflitos de
interesses, e consequente necessidade de resposta a seguinte questão: como solucionar os referidos
conflitos?
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Inicialmente, os conflitos eram solucionados pelas próprias partes, através da chamada autotutela, ou
seja, o titular de um direito fazia com que ele valesse por intermédio da força, da esperteza, etc.
Mas, a situação não era suficiente, não gerava segurança para a coletividade razão pela qual, com o
surgimento dos Estados, este assumiu para si o direito-dever de solucionar os conflitos, ou seja,
“Compete ao Estado-juiz à solução de conflitos de interesses, que, desde então, passou a ser imparcial.
O Estado substituiu-se às partes, incumbindo a ele dar a almejada solução para o litígio”
(GONÇALVES, 2021, e-book).
Em verdade, agora o Estado não apenas regra os comportamentos, por intermédio das regras de
conduta, mas, em caso de desobediência a elas, é possível comparecer em juízo, buscando uma
formulação pelo Estado de uma norma para o caso concreto. Portanto, o Estado, não apenas edita
normas e princípios regulamentadores, mas também emite a regra concreta que soluciona o conflito de
interesses (GONÇALVES, 2021, e-book).
Diante de tal contexto, como podemos conceituar a jurisdição? Segundo Marcus Rios Gonçalves, a
jurisdição
[...] é uma das funções do Estado, que se substitui às partes na solução dos conflitos de
interesses. [...] Ao aplicar a lei, que é geral e abstrata, a um caso concreto, busca o Estado a
pacificação social. Cumpre ao Poder Judiciário fazer atuar a vontade concreta da lei.
(GONÇALVES, 2021, e-book).
Cássio Scarpinella Bueno, no que tange ao conceito, afirma que “ela pode ser entendida como a
função do Estado destinada à solução imperativa, substitutiva e com vocação de definitividade de
conflitos intersubjetivos” (BUENO, 2021, e-book).
Qual seria, então, a finalidade da função jurisdicional? Segundo Cassio Scarpinella Bueno:
A finalidade da função jurisdicional é dupla: é ela quem atua nos direitos controvertidos
(independentemente de quem seja seu titular ou, até mesmo, de tais direitos poderem ser
titularizados por alguém, como ocorre com os chamados ‘direitos metaindividuais’) e é ela
que realiza os fins sociais, políticos e jurídicos do próprio Estado (art. 3o, da CF).
(BUENO, 2021, e-book).
André Ramos Tavares aponta, neste contexto, a relevância do Poder Judiciário na efetivação dos
direitos humanos, dizendo que “o Judiciário aponta no horizonte como não apenas um organismos
direcionado a resolver conflitos de interesses na sociedade, mas também como ordenador da
respeitabilidade dos direitos humanos fundamentais”, ou seja, o Judiciário seria “seu garante último,
inclusive contra o próprio Estado-administrador, ou Estado-legislador ou, ainda, Estado-Executivo”.
(TAVARES, 2012, e-book)
Você pode estar se perguntando: como seria possível o Judiciário agir contra o próprio Estado por
intermédio da jurisdição? A título de exemplo, pense nas demandas que são movidas em face do
Estado (União, estados e municípios) para que haja o fornecimento de determinados medicamentos.
Neste caso, estamos falando de direito fundamental (saúde) e que há uma ação movida em face do
próprio Estado, para que o Judiciário, resolva o conflito de interesses: determine o fornecimento ou
não do medicamento.
É possível dizer, então, que “é para exercer adequadamente a ‘função jurisdicional’ (a jurisdição) que o
Estado Democrático de Direito se vale de um método específico que garanta o atingimento de seus
devidos fins pelos devidos meios” (BUENO, 2021, e-book).
E qual seria este “devido meio”? Este método? O chamado processo! O processo, por conseguinte, “é
o instrumento de manifestação” do Estado-juiz na solução dos variados conflitos de interesses,
devendo “espelhar e adequadamente realizar as opções políticas, os valores espraiados na própria
Constituição Federal” (BUENO, 2021, e-book).
Diante do exposto anteriormente, podemos sintetizar o conceito da jurisdição da seguinte forma:
Jurisdição, assim, é a função exercida pelo Estado-juiz para declarar e concretizar o direito,
mesmo que de maneira forçada, isto é, independentemente da colaboração, compreendida a
palavra em seu sentido mais amplo, daquele em face de quem a função jurisdicional será
prestada. (BUENO, 2021, e-book)
Uma vez visto o conceito geral quanto ao termo “jurisdição”, precisamos conhecer e entender as suas
principais características, quais sejam: substitutividade, imperatividade, imutabilidade,
inafastabilidade, indelegabilidade e inércia.

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a) Substitutividade
Referida característica está ligada diretamente ao conceito geral de jurisdição, uma vez que a jurisdição
é substitutiva da vontade dos litigantes.
O nosso ordenamento, como visto anteriormente, não permite mais a chamada autotutela (salvo em
casos excepcionais, como, por exemplo, em caso de legítima defesa), por consequência, é necessária a
intervenção do Estado-juiz para dirimir eventual conflito de interesse, ou seja, impõe-se a atividade
jurisdicional, substituindo a vontade das partes, na qual o Estado-juiz representará, após o devido
processo, a vontade do ordenamento jurídico para o caso (BUENO, 2021, e-book).
b) Imperatividade
A imperatividade também decorre do fato de que a jurisdição é manifestação do poder-dever do
Estado. Isso porque, o Estado-juiz “imporá o resultado que, mediante odevido processo, entender
aplicável ao caso, independentemente da concordância dos litigantes” (BUENO, 2021, e-book).
Nesse sentido, é possível afirmar que a imperatividade é um complemento da substitutividade, já que a
imperatividade opera no plano concreto e a substitutividade no plano ideal.
c) Imutabilidade
Segundo essa característica, é possível afirmar que a “atividade jurisdicional tende a se tornar imutável
no sentido de impedir que ela seja rediscutida por quem quer que seja, inclusive pelo próprio Estado-
juiz” (BUENO, 2021, e-book).
A justificativa para que haja a imutabilidade das decisões consiste em evitar a eternização dos litígios e
também evitar que sejam postos à apreciação os mesmos litígios e situações que já foram apreciadas
pelo Estado-juiz, além de assegurar a chamada segurança jurídica.
d) Inafastabilidade
Referida característica reflete dois aspectos: o primeiro, “no sentido de não ser legítimo recusar-se a
atividade jurisdicional a nenhum título” e o segundo atrelado à chamada vedação do non liquet, isto é,
“rompida a inércia da jurisdição, o Estado-juiz tem que dar alguma resposta ao jurisdicionado, mesmo
que seja contrária a seus interesses” (BUENO, 2021, e-book).
e) Indelegabilidade
A atividade jurisdicional, com a configuração e características aqui analisadas, somente pode ser
exercida pelo próprio Poder Judiciário. Segundo Bueno:
É correto acentuar, portanto, que a indelegabilidade deve ser compreendida no sentido de que os
órgãos que podem exercer a função jurisdicional são única e exclusivamente aqueles que a
Constituição Federal cria e autoriza como tais. (BUENO, 2021, e-book).
Além disso, a jurisdição deve ser exercida pelos órgãos e respeitando os limites expostos na
Constituição Federal. Este tema será aprofundado no quarto tópico da presente unidade, quando
falaremos sobre competência.
f) Inércia
Segundo esta característica, a jurisdição não é e não pode ser prestada de ofício, ou seja, deve haver a
provocação das partes interessadas para que haja o exercício da atividade jurisdicional, pelo Estado-
juiz. Porém, uma vez provocado, o Estado-juiz deverá atuar, inclusive através do chamado “impulso
oficial”. Uma vez que analisamos o conceito geral de jurisdição e suas principais características,
encerramos aqui o conteúdo do nosso primeiro tópico. Em seguida, veremos os princípios atrelados à
jurisdição.
2 DOS PRINCÍPIOS ATRELADOS À JURISDIÇÃO
Neste tópico, iremos complementar o estudo quanto à jurisdição, analisando os princípios a ela
inerentes.
De início, precisamos compreender: o que são os princípios?
Segundo a doutrina, “os princípios fundamentais erigem-se em verdadeiras premissas, pontos de
partida, nos quais se apoia toda ciência”, isto é, “o conhecimento científico não prescinde de sua
existência e exige que os estudiosos os respeitem e obedeçam” (GONÇALVES, 2021, e-book).

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Devido à relevância da atividade jurisdicional, pela qual o Estado-juiz soluciona os conflitos de
interesses decorrentes da vida em comunidade, é preciso que a atuação seja conduzida, norteada, por
princípios, para que se assegure a segurança jurídica e a paz social.
Muitas vezes, a depender da doutrina objeto de estudo, algumas disposições são apontadas como
características ou como princípios, por consequência, alguns princípios aqui analisados já foram
descritos no tópico anterior.
Segundo Marcus Vinicius Rios Gonçalves (2021, e-book) são considerados princípios da jurisdição:
a) Inevitabilidade
O princípio da inevitabilidade demonstra que uma vez que a jurisdição consiste em uma forma de
exercício do poder estatal, as partes não podem evitar o cumprimento de suas decisões. Se assim o
fizerem, poderá haver o cumprimento coercitivo, isto é, a tutela executiva.
b) Indeclinabilidade ou Inafastabilidade
A indeclinabilidade refere-se ao fato de que nenhuma lesão de direito deixará de ser apreciada pelo
Poder Judiciário, ou seja, o Estado tem o dever de solucionar os conflitos de interesse quando
provocado. Assim dispõe o art. 3o, do Código de Processo Civil: “Art. 3º Não se excluirá da
apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito” (BRASIL, 2015).
Poderia, por exemplo, o juiz deixar de emitir julgamento, alegando que não formou nenhuma
convicção? Não! Segundo a doutrina, “mesmo que não haja lei que se possa aplicar, de forma
específica, a um determinado caso concreto, o juiz não se escusa de julgar invocando a lacuna”
(GONÇALVES, 2021, e-book). Trata-se da normativa exposta no art. 140, do Código de Processo
Civil: “Art. 140. O juiz não se exime de decidir sob a alegação de lacuna ou obscuridade do
ordenamento jurídico” (BRASIL, 2015).
c) Investidura
A atuação do Estado, a jurisdição, é realizada por meio de órgãos, ou seja, somente os agentes que
foram investidos do poder estatal de aplicar o direito ao caso concreto é que poderão exercer a
jurisdição. Referida situação está exposta, de forma expressa, em nosso Código de Processo Civil, em
seu artigo 16, que assim versa: “Art. 16. A jurisdição civil é exercida pelos juízes e pelos tribunais em
todo o território nacional, conforme as disposições deste Código” (BRASIL, 2015).
d) Indelegabilidade
A jurisdição não pode ser objeto de delegação pelo agente que a exerce com exclusividade.
e) Inércia
A ideia da inércia decorre do princípio da ação. Mas, qual seria o princípio da ação? Segundo a
doutrina, “importa dizer que o juiz não pode exercer a jurisdição de ofício, isto é, por iniciativa
própria”, ou seja, “é indispensável a ação ou atividade de um autor ou acusador” (TESHEINER, e
KRÜGER, 2021, e-book).
Por decorrência, podemos afirmar que a jurisdição não pode ser exercida de ofício pelos agentes
detentores da investidura. É preciso, portanto, a provocação das partes.
Após a provocação das partes, isto é, uma vez provocada a jurisdição, o processo será levado até o fim
pelo juiz, conforme dispõe o art. 2o, do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015): “Art. 2º O
processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções
previstas em lei”.
f) Aderência
A aderência está diretamente ligada ao princípio da territorialidade da lei processual, ou seja, “os juízes
só têm autoridade dentro do território nacional, respeitados os limites da sua competência”
(GONÇALVES, 2021, e-book).
Desta feita, o item será aprofundado no quarto tópico da presente unidade, quando falaremos
especificamente sobre competência.

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g) Unicidade
A jurisdição é una e indivisível, sendo que as divisões, em jurisdição civil e penal, Justiça Federal e
Estadual, refletem tão somente uma repartição administrativa entre os órgãos.
Ainda no que tange aos princípios fundamentais da jurisdição, Daniel Willian Granado e Eduardo
Aranha Ferreira apontam que seriam os seguintes:
a) princípio do juiz natural;
b) princípio da indelegabilidade;
c) princípio da ubiquidade e da indeclinabilidade;
d) princípio da publicidade.
Passemos, pois, à exposição feita pelos aludidos doutrinadores.
a) Princípio do juiz natural
Segundo este princípio, “os juízes são aqueles que ocupam os cargos nos juízos e tribunais previstos
no art. 92, I a VII, da CF, proibindo-se, doutra parte, que sejam criados juízos ou tribunais de
exceção (art. 5o, XXXVII e LIII, da CF” (ALVIM; GRANADO; FERREIRA, 2019, e-book).
Desta feita, somente pode exercer a atividade jurisdicional os órgãos aos quais a Constituição Federal
atribuiu tal função, dentro dos limites impostos por ela.
b) Princípio da indelegabilidade
A atividade jurisdicional não pode ser delegada, nem transferida, sob pena de ofensa à própria
separação de poderes, já que ao Poder Judiciário compete o exercício da atividade jurisdicional.
c) Princípio da ubiquidade e da indeclinabilidade
Como decorrência do art. 5o, XXXV, da Constituição Federal, que assim versa: “XXXV - a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito (BRASIL, 1988), é possível
afirmar que “a jurisdição alcança a tudo e a todos” (GRANADO; FERREIRA, 2019, e-book).
A indeclinabilidade decorre desta previsão, “pois de nada adiantaria garantir a todos o acesso ao
Judiciário se o juiz, diante do caso concreto, pudesse, por qualquer razão, eximir-se de decidir”
(GRANADO; FERREIRA, 2019, e-book).
Infere-se, assim, que a prestação da tutela jurisdicional é um dever e não mera faculdade.
d) Princípio da publicidade
Segundo este princípio, como regra, a atividade jurisdicional deve ser exercida publicamente. Trata-se
da previsão do art. 93,IX, da CF (BRASIL, 1988):
Art. 93, IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas
todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às
próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à
intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; (BRASIL, 1988)
Mas, como o próprio dispositivo acima retrata, é possível que se limite a publicidade, quando assim o
exigir o interesse público.
3 DA JURISDIÇÃO CONTENCIOSA E VOLUNTÁRIA
Ao longo da nossa unidade, estamos falando sobre a função precípua do Poder Judiciário, qual seja: a
função jurisdicional, que, como vimos, não se refere apenas a tarefa de dizer o direito aplicável ao caso
concreto, mas também de realizá-lo coativamente, através da execução ou do cumprimento de
sentença, caso haja a necessidade.
Isso porque, o que se almeja é, antes de tudo, a preservação da ordem jurídica e da paz social.
Uma das marcas da jurisdição, da atividade jurisdicional, reveste-se no fato de que as decisões do
Judiciário possuem a chamada coisa julgada, ou seja, “esgotados os recursos cabíveis no processo em
que são proferidas, desde que tenha havido a resolução de mérito, tornam-se imutáveis, não podendo,
em linha de princípio, ser rediscutidas, nem naquele, nem em outros processos” (GRANADO;
FERREIRA, 2019, e-book).
Diante desse contexto geral, é preciso compreendermos as espécies apontadas pela doutrina.
De início, precisamos relembrar que a jurisdição é una e indivisível, razão pela qual a distinção em
espécies é apenas para razões didáticas.

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Uma primeira divisão, já apontada ao longo do nosso estudo, consiste na chamada jurisdição civil,
trabalhista ou penal, tratando-se, assim, de divisão quanto ao objeto.
Segundo Granado e Ferreira, “aquilo que não cabe na esfera de atuação, ou, em linguagem
estritamente técnica, que não seja da competência das jurisdições especializadas (trabalhista, eleitoral e
militar), será da atribuição da jurisdição ordinária ou comum”, ressaltando, igualmente que, “dentro
desta, aquilo que não souber na jurisdição penal, por exclusão, caberá na jurisdição civil”
(GRANADO; FERREIRA, 2019, e-book). Referida divisão se amolda com maior precisão à
chamada jurisdição contenciosa, que veremos na sequência.
Uma segunda divisão apontada pela doutrina é quanto ao organismo que a exerce, podendo ser:
a) comum, quando exercida pela justiça comum estadual ou federal;
b) especial, quando exercida pela justiça trabalhista, militar e eleitoral.
Quanto à hierarquia, é possível afirmar que pode ser superior ou inferior, a depender da origem quanto
às decisões: se de órgão de instâncias superiores ou inferiores.
A doutrina, ainda, aponta que a jurisdição pode ser contenciosa ou voluntária, cuja definição e
característica central pode ser assim apontada:
JURISDIÇÃO CONTENCIOSA JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
Atividade inerente ao Poder Judiciário, com o Não é propriamente jurisdição na acepção jurídica do
Estado-juiz atuando substitutivamente às partes termo, vez que corresponde mais a uma administração
na solução dos conflitos, aplicando, ao final, o pública de interesses privados.
direito ao caso concreto. Por exemplo, quando se exige, para determinados negócios
jurídicos, a participação de autoridades públicas para que
haja validade, como no casamento.
Não há, portanto, atuação propriamente da jurisdição pelo
juiz.
Principais características: Principais características:
● Lide; ● Acordo de vontades;
● Partes; ● Interessados;
● Sentenças; ● Homologação;
● Função jurisdicional. ● Atribuição administrativa.
Fonte: BARROSO, 2020, e-book
É possível, contudo, que o procedimento de jurisdição voluntária torne-se contencioso?
Sim, se desaparecer o acordo de vontades nele exigido, e caso haja resistência de uma das partes, é
possível falar em litígio, em lide, se enquadrando como jurisdição contenciosa.
E o contrário? É possível? É igualmente possível, que um procedimento de jurisdição contenciosa se
transforme em voluntária, bastando que a lide seja solucionada pela autocomposição. Com isso,
encerramos a análise quanto à divisão doutrinária no que tange à jurisdição, sendo que em nosso
último tópico desta unidade, falaremos sobre competência.
4 DA COMPETÊNCIA
O último assunto que abordaremos nesta unidade consiste no estudo sobre competência.
Você pode estar se perguntando: o que isso tem haver com a jurisdição? Os temas se conectam, ou
seja, são inter relacionados, vez que a competência consiste na divisão do poder estatal entre os
agentes políticos, para que haja o exercício da jurisdição. Barroso afirma que:
Competência é a medida ou quantidade de jurisdição atribuída aos seus órgãos de exercício. A
jurisdição, muito embora una, necessita ser distribuída entre os agentes nela investidos, tudo
visando a melhor administração da justiça. (BARROSO, 2020).
A competência, por consequência, é o atributo que legitima o exercício jurisdicional. O vocábulo
competência deriva do latim competentia, que, por sua vez, corresponde ao significado
proporção, simetria, ou, conforme definição exposta por Martins (2016, p. 93):
Competência vem do latim competentia, de competere (estar no gozo ou no uso de, ser capaz,
pertencer ou ser próprio). A competência é uma parcela da jurisdição, dada a cada juiz. É a parte da
jurisdição atribuída a cada juiz, ou seja, a área geográfica e o setor do Direito em que vai atuar,
podendo emitir suas decisões [...]. A jurisdição é o todo. A competência é a parte. A competência
não abrange a jurisdição, mas envolve aquela. Competência é a determinação jurisdicional
atribuída pela Constituição ou pela lei a um determinado órgão. (MARTINS, 2016, p. 93)
Sobre o tema, o primeiro aspecto a ser levado em consideração reveste-se na chamada jurisdição
internacional, para, depois, analisarmos as regras de competência interna, de forma sucinta.
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Segundo o art. 16, do Código de Processo Civil, “Art. 16. A jurisdição civil é exercida pelos juízes e
pelos tribunais em todo o território nacional, conforme as disposições deste Código” (BRASIL, 2015),
portanto, “não tem o juiz brasileiro jurisdição em outros territórios, porque, sendo ela uma
manifestação do poder estatal, deve respeitar a soberania dos outros países” (GONÇALVES, 2021, e-
book).
Mas, há hipóteses elencadas pela legislação em que há exercício concorrente da jurisdição, ou seja,
“hipóteses para as quais o país coloca sua jurisdição à disposição do interessado, embora aceite ser o
litígio solucionado por autoridade estrangeira” (BARROSO, 2020, e-book). São as hipóteses arroladas
nos arts. 21 e 22, do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015).
O Código de Processo Civil prevê, ainda, no art. 23 (BRASIL, 2015) hipóteses de exercício exclusivo
da jurisdição nacional, isto é, “hipóteses nas quais a autoridade judiciária brasileira se diz a única com
soberania para resolver o conflito, negando nosso ordenamento processual qualquer validade a
eventual decisão proferida por país estrangeiro” (BARROSO, 2020, e-book).
Além disso, segundo Gonçalves, “também são excluídos de nossa jurisdição aqueles conflitos que não
tragam qualquer interesse para a justiça brasileira” (2021, e-book).
Não podemos perder de vista, contudo, a possibilidade de incidência da chamada “cooperação
internacional”, que “tem por objeto todos os atos requeridos por Estado estrangeiro, de cunho judicial
ou extrajudicial e não proibidos por lei brasileira, cuja prática deve ser aqui realizada” (BARROSO,
2020, e-book). Por outro lado, o estado brasileiro também pode solicitar a cooperação de outros
Estados, tratando-se, nesse caso, de cooperação internacional ativa.
A cooperação internacional, por consequência, pode ser:
ATIVA PASSIVA
Solicitada pelo estado brasileiro a outras Atos requeridos por Estado estrangeiro, cuja
nações. prática deva ser aqui realizada.
Fonte: criação própria.
Sobre a cooperação internacional, Gonçalves assim afirma:
Com a globalização dos interesses econômicos e a facilidade de comunicação e de mobilização das
pessoas, têm sido cada vez mais frequentes as situações em que um estado necessita da cooperação
do outro para a melhor aplicação da justiça, e para fazer valer as decisões por ele proferidas.
(GONÇALVES, 2021, e-book).
De suma importância a regulação específica sobre a cooperação internacional, sendo que, em nosso
ordenamento, a questão foi retratada no art. 26, do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015).
Por fim, é preciso tecer alguns comentários no que tange à Competência Interna. Segundo Barroso,
“estabelecidas as hipóteses de soberania da jurisdição pátria, são as regras de competência interna
aquelas que indicarão quais os órgãos locais responsáveis pelo julgamento de cada caso concreto
apresentado em juízo” (BARROSO, 2020, e-book).
Neste ponto, nosso estudo precisa ser integrado com as noções que vimos no tópico 2, quanto à
organização e estrutura do Judiciário.
A primeira divisão administrativa da jurisdição consiste na atribuição dos órgãos jurisdicionais da
Justiça Federal e da Justiça Estadual, que consistem na divisão da chamada “justiça comum”.
Justiça comum federal: a competência é dada:
a) ratione personae, pela participação, no processo, como parte ou interveniente, das pessoas jurídicas
de direito público federais e empresas públicas federais;
b) quanto à matéria objeto de análise, por exemplo, as causas fundadas em tratado ou contrato da
União com estado estrangeiro ou organismo internacional. As hipóteses estão retratadas no art. 109,
da Constituição Federal (BRASIL, 1988).
Justiça comum estadual: é supletiva ou residual, ou seja, é de sua competência todas as demandas
que não sejam de competência das justiças especiais, nem da justiça comum federal.
Ocorre que, mesmo dentro das justiças civis, há critérios para a definição da competência, entre vários
órgãos possíveis, que podem ser usados de forma cumulativa ou sucessiva, para determinação do juízo
competente:

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a) Territorial ou de Foro (Ratione Loci)
Indica em qual local deverá ser ajuizada a ação. Segundo Barroso:
Foro é a delimitação territorial onde o juiz exerce sua atividade, sendo esse local chamado de
comarca (Justiça Estadual) ou seção judiciária (Justiça Federal). Portanto, a competência territorial
é aquela que indica qual a comarca ou seção judiciária onde deverá a demanda ser proposta.
(BARROSO, 2020, e-book)
As regras, quanto à competência territorial, estão retratadas, de forma expressa, no Código de Processo
Civil, nos artigos 46, 47 a 53, 63 a 65 (BRASIL, 1988).
b) Matéria (Ratione Materiae)
Trata-se da criação de órgãos especializados, ou seja, cuja jurisdição será desenvolvida por juízes com
conhecimento específico e profundo da matéria, visando uma melhor prestação da justiça.
Como exemplo, é possível citar as varas especializadas, como as de família, as de acidentes do
trabalho, as de registros públicos, ou, mesmo, “justiças” especializadas, como, a Justiça do
Trabalho, Justiça Eleitoral.
Como visto anteriormente, a competência por matéria é igualmente, o critério de atribuição da
competência da Justiça Federal.
c) Pessoa (Ratione Personae)
A nossa legislação, atribui à algumas pessoas que haja o julgamento por juízes especializados, em
virtude do interesse público que representam. O maior exemplo é a criação da Justiça Federal, sendo
possível citar, ainda, a criação das chamadas varas da Fazenda Pública da Justiça Estadual.
Possui caráter absoluto, ou seja, não pode haver alteração da competência, nem mesmo diante de
consenso das partes.
d) Valor da causa
Toda causa deve ter determinado valor atribuído em sua inicial, que pode ser um critério distintivo de
competência. Por exemplo, no que tange aos Juizados Especiais Estaduais, que possibilita, dentre
outros requisitos, o ajuizamento de ações de até 40 salários mínimos.
Os critérios aqui arrolados dependem da doutrina utilizada, sendo que vimos tão somente a visão geral
sobre o conteúdo atrelado à competência, sendo recomendável, por consequência, o aprofundamento
do estudo sobre o tema.

UNIDADE IV
DA ADMINISTRAÇÃO JUDICIÁRIA
Plano de Estudo:
• Conceitos Gerais relacionados à Administração Judiciária;
• Campos de estudo sobre Gestão de Pessoas e Conflitos no Judiciário;
• Análise sobre a Gestão das Unidades Judiciárias;
• Estudo quanto ao planejamento estratégico, indicadores de desempenho e da gestão de processos.
Objetivos de Aprendizagem:
• Conceituar e contextualizar a administração judiciária;
• Compreender a gestão de pessoas e conflitos no Judiciário, assim como, a gestão das unidades
judiciárias;
• Analisar as nuances relacionadas ao planejamento estratégico, indicadores de desempenho e da
gestão de processos.

1 DOS CONCEITOS GERAIS RELACIONADOS À ADMINISTRAÇÃO JUDICIÁRIA


Na nossa primeira unidade, falamos sobre a Administração Pública como um todo, momento no qual
vimos que a sua atuação é voltada para o interesse público, para os interesses da coletividade. A
Administração Pública concentra as seguintes esferas de governo: municipal, estadual e federal, tendo
atribuições definidas na nossa Constituição Federal.
Na sequência, falamos sobre a divisão de poderes, quais sejam: Executivo, Legislativo e Judiciário,
cada qual com funções típicas e atípicas, sendo que o nosso foco de estudo é o Poder Judiciário.
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Chegado o momento, portanto, de tecermos considerações em relação à Administração Judiciária, por
exemplo: Como o Judiciário deve distribuir suas atividades? Deve seguir os princípios norteadores da
Administração Pública? Há controle de produção? Há planejamento estratégico? Indicadores? Como
deve ocorrer a gestão de pessoas e conflitos?
Buscaremos ao longo da nossa unidade responder estas e outras ponderações quanto à chamada
Administração Judiciária. Antes de adentrarmos na temática, é importante definirmos o termo
“Administração Judiciária”. Segundo Nagib Slaibi Filho, “a expressão Administração Judiciária
designa o ramo da Administração Pública cujo objeto é a atividade administrativa do Poder Judiciário,
compreendendo, inclusive, o relacionamento com os demais entes estatais e com as entidades sociais”
(SLAIBI FILHO, [s.d], online).
Desta feita, uma vez que se trata de ramo da Administração Pública, deve atuar conforme os princípios
já analisados na primeira unidade, conforme pontua o magistrado Nagib Slaibi Filho:
Evidentemente, a autonomia administrativa e financeira do Poder Judiciário, assim como as
autonomias do Ministério Público e de alguns outros entes essenciais à Justiça, não pode ser
interpretada sectariamente de forma a excluir o dever jurídico de seus membros e servidores de
cumprir os princípios administrativos que são aplicáveis aos demais Poderes em todos os níveis
federativos, como se vê no art. 37, caput, da Lei Maior. (SLAIBI FILHO, [s.d], online).
Não se pode confundir, contudo, a atuação típica do Poder Judiciário, qual seja, a prestação
jurisdicional, com as funções administrativas. Porém, a análise quanto às normativas atreladas ao
desenvolvimento da atividade, ou seja, os instrumentos utilizados, é de suma importância, inclusive
para fiscalização da atuação do Poder Judiciária, bem como, para buscar soluções para eventuais
problemas e formulação de planejamentos.
Bacellar destaca que, os órgãos do Poder Judiciário existem para prestar serviço público, qual seja, a
prestação jurisdicional, ao povo, ressaltando que “cabe ao Poder Judiciário concretizar a promessa de
resolver oficialmente, no âmbito do Estado, em tempo razoável, as controvérsias existentes entre as
pessoas e alcançar a coordenação dos interesses privados, a restauração das relações e a paz na
sociedade” (BACELLAR, 2016).
Nesse contexto, é preciso compreender a previsão constitucional, a relevância dos regimentos internos
dos tribunais, as atribuições do Conselho Nacional de Justiça, as leis de organização judiciária, dentre
outros.
No que tange à previsão constitucional, não restam dúvidas. Vimos ao longo de todo o nosso material
de estudo que a Constituição Federal disciplina e regulamenta a atuação do Poder Judiciário, razão
pela qual suas normativas devem ser respeitadas, inclusive no momento da elaboração das
constituições estaduais. É na Constituição Federal que encontramos a disciplina quanto à
Administração Pública como um todo, como, por exemplo, os princípios a serem observados.
Os regimentos internos, por sua vez, disciplinam a estrutura interna e a competência dos órgãos
administrativos e jurisdicionais.
O poder regulamentar dispõe sobre o modo de atuação dos serviços, sendo faculdade administrativa.
Nesse contexto, contudo, há o Conselho Nacional de Justiça, cuja previsão é expressa na
Constituição Federal de 1988. Segundo o art. 103-B, § 4º “Compete ao Conselho o controle da
atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos
juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da
Magistratura: [...]” (BRASIL, 1988).
A doutrina aponta que “O CNJ serve ao combate dos males que acometem o Poder Judiciário, a saber,
a delonga em exercer a função jurisdicional e a ausência de transparência, decorrente de sua natureza
tradicionalmente fechada”, sendo assim, o CNJ pode, dentre outras atribuições:
a) desconstituir ou rever atos ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato
cumprimento da lei;
b) controlar em que e como está sendo utilizado os recursos econômicos. (TAVARES, 2012, online)
Há, igualmente, as chamadas Corregedorias de Justiça, que é uma unidade que compõem o
respectivo tribunal, tendo como principal atuação a fiscalização dos serviços judiciários, além de
investigar, quando for o caso, desvios da conduta funcional.
As Ouvidorias de Justiça, possuem atribuição, segundo o texto constitucional, de receber “reclamações
e denúncias de qualquer interessado contra os membros ou órgãos do Poder Judiciário, ou contra seus
serviços auxiliares”, nos termos do art. 103-B, §4o, III, CF/88 (BRASIL, 1988). Caso seja
procedente a reclamação ou denúncia, as Ouvidorias representarão diretamente ao CNJ.

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Não podemos deixar de mencionar o papel dos Cartórios Judiciais, sejam os cartórios propriamente
ditos ou do foro judicial, vez que “integram a estrutura-base do Poder Judiciário”, sendo que suas
funções “se resumem, basicamente, a duas: organizar a movimentação processual e realizar seu
‘processamento’” (TAVARES, 2012, online).
Na primeira instância normalmente há um cartório para cada vara, visando o equilíbrio entre as tarefas,
sendo que cada cartório tem liberdade para estabelecer sua estrutura interna de funcionamento.
Tavares aponta a seguinte composição (comum) para os cartórios:
Oficial- Escrevente-
Diretor-geral Escreventes e escrivães Auxiliares e estagiários
maior chefe
Responde na Supervisão de Realizam a generalidade
Responsável Atendem a demanda
ausência do um determinado das rotinas que
pela gestão da externa e executam os
diretor-geral conjunto de conferem andamento
unidade deslocamentos
e o auxilia escreventes aos
Fonte: TAVARES, 2012, online.
Uma vez apontadas as considerações gerais sobre a Administração Judiciária, passaremos a seguir a
analisar alguns aspectos importantes para que haja uma efetiva prestação do serviço público e que o
mesmo seja prestado com qualidade.
2 DA GESTÃO DE PESSOAS E CONFLITOS NO JUDICIÁRIO
Quando falamos em Administração Judiciária dois fatores são importantes, quais sejam: gestão de
pessoas e conflitos no Judiciário. Mas, o que significa os referidos termos? Qual seu impacto na gestão
do Poder Judiciário como um todo? Abordaremos os referidos temas ao longo deste tópico.
Em primeiro lugar, precisamos compreender o termo “gestão”. Segundo Sandro Trescastro Bergue,
“o termo gestão pode ser compreendido como sinônimo de administração”, complementando dizendo
que “administrar, por sua vez, constitui um processo complexo com diversas definições possíveis”,
sendo que, “uma delas, e talvez a mais simples, é: executar de forma contínua e virtuosa o processo
administrativo” (BERGUE, 2010, online).
Por sua vez, quando falamos em processo administrativo é preciso ter em mente quatro elementos
básicos, quais sejam: planejamento, organização, direção e controle.
É preciso, pois, que os princípios que regem a Administração Pública, já estudados em nossa primeira
unidade, sejam respeitados e observados, destacando-se os princípios da legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência.
Uma vez compreendido o conceito geral de gestão, como é possível definir a chamada gestão de
pessoas?
Segundo Bergue, é possível definir a gestão de pessoas, em específico no setor público, como:
“esforço orientado para o suprimento, a manutenção e o desenvolvimento de pessoas nas organizações
públicas, em conformidade com os ditames constitucionais e legais, observadas as necessidades e
condições do ambiente em que se inserem” (BERGUE, 2010, online).
Referido autor complementa dizendo que
A gestão de pessoas envolve um conjunto de ações preliminares de planejamento das necessidades
mútuas entre a organização e as pessoas, o arranjo dos recursos necessários à satisfação dessas
necessidades, seguido dos esforços de direção desse conjunto, orientados pelo vetor resultante do
produto dos objetivos institucionais e individuais, constantemente balizado pelo cotejo entre o
desempenho efetivo e previsto com vistas às correções de curso do processo. (BERGUE, 2010,
online).
Você pode estar se perguntando: a gestão de pessoas não é um conceito atrelado apenas às
organizações? Não envolve a ideia de produtos que são gerados? Trata-se de um conceito aplicável
também a Administração Pública, sendo possível afirmar que os “produtos” gerados são os bens e
serviços públicos que são colocados à disposição da coletividade. E quais seriam os “insumos”
necessários? Há que se falar em duas categorias: recursos materiais e recursos humanos. Os
primeiros seriam os recursos financeiros, as máquinas, os equipamentos, as instalações, dentre outros.
Os segundos, por sua vez, são os agentes públicos, que “são todas as pessoas que prestam serviços ao
Estado e às pessoas jurídicas da administração indireta” (BERGUE, 2010, online).

31
Quando falamos de gestão de pessoas está se atrela aos assuntos relativos às pessoas que atuam na
organização. Outro questionamento possível é: porque é importante a gestão de pessoas? Porque, a
partir dos modelos, técnicas e métodos é possível traçar soluções para os problemas ou intervenções à
realidade organizacional. Isso porque, a gestão de pessoas, envolve-se em todos os processos
gerenciais, definindo políticas e práticas de gestão, atribuindo funções e competências, avaliando o
desempenho e monitorando as pessoas, buscando sempre o crescimento e o desenvolvimento
organizacional.
Ademais, “os colaboradores representam uma das ferramentas essenciais de sucesso e qualidade do
produto ou serviço de uma organização” (TEIXEIRA; RIBEIRO, 2017, online).
Mas, porque falar em pessoas é tão importante? Seja no setor privado ou público, é preciso
“colaboradores integrados a objetivos, metas e visão das organizações, ou seja, precisam ‘pertencer’ à
organização”, isto é, “o colaborador deve ser muito mais do que mero cumpridos de tarefas; deve
transformar e motivar as ações executadas para as organizações e em prol delas” (TEIXEIRA;
RIBEIRO, 2017, online).
Um fator relevante, neste contexto, refere-se à capacitação dos colaboradores, no caso da
Administração Pública, dos seus agentes públicos. Para tanto, tem-se estimulado cada vez mais, em
especial, no que tange à Administração Judiciária, a formação dos servidores. Bacellar destaca que:
A formação e o aperfeiçoamento contínuo de todos os magistrados brasileiros é um dos caminhos
para que a Administração Judiciária alcance seu objetivo de promover justiça de maneira efetiva
com o melhor e mais adequado atendimento ao cidadão. (BACELLAR, 2016, online)
É de suma importância, igualmente, que haja um planejamento, um gerenciamento estratégico, sendo
que “a motivação e a liderança são com certeza fatores altamente impactantes, principalmente quando
se trata da gestão da Administração Pública” (TEIXEIRA; RIBEIRO, 2017, online).
Teixeira e Ribeiro ressaltam que “gerir pessoas é como organizar um setor com base nas
potencialidades e zelar constantemente para que estas sejam mantidas, tendo a percepção de que elas
são impulsionadas sincronicamente e conjuntamente” (TEIXEIRA; RIBEIRO, 2017, online), para
tanto, é indispensável que conheçam os objetivos a serem alcançados, e, que haja capacitação para a
busca desses objetivos, o que ressalta a necessidade de formação e aperfeiçoamento contínuos, como já
mencionado acima.
É preciso, pois, traçar estratégias, por exemplo, através do chamado modelo estratégico para a
Administração Pública, pois, desta feita, será possível visualizar o cenário como um todo, identificar
propósitos e necessidades da gestão pública. Por consequência, será possível “traçar o caminho que
leve à qualidade e à eficiência do serviço prestado para a sociedade e, ao mesmo tempo, que mantenha
um ambiente saudável e prazeroso aos colaboradores" (TEIXEIRA; RIBEIRO, 2017, online).
Sendo assim, a motivação é fator relevante para o ambiente de trabalho, igualmente aplicável na
Administração Pública. Sobre o tema, Teixeira e Ribeiro afirmam que:
Os planos de progressão de carreiras dentro da rotina de servidor público vieram com a intenção de
suprir a necessidade de manter o servidor alinhado aos propósitos da organização ou do órgão e, ao
mesmo tempo, apesar da estabilidade, promover a motivação e a reinvenção na rotina trabalhista,
independentemente do nível hierárquico de cargo ou função. (TEIXEIRA; RIBEIRO, 2017,
online).
A gestão de pessoas, portanto, consiste em uma realidade cada vez mais presente também na
Administração Pública, visando assegurar que o serviço público seja prestado com qualidade e maior
eficiência, sempre preservando os princípios norteadores de tal sistema.
Nesse cenário, criou-se o chamado “Centro de Formação e Aperfeiçoamento do Poder Judiciário
(CEAjud) que possui a missão de coordenar e promover, mediante o auxílio dos tribunais, a educação
corporativa e o desenvolvimento das competências necessárias ao aperfeiçoamento dos servidores,
bem como, para que se alcance os objetivos estratégicos do Poder Judiciário.
A Administração Pública, portanto, na atualidade, tem estimulado a “valorização do servidor público,
buscando a qualificação e a capacitação para afinar-se às necessidades sociais”, sendo implementada a
gestão de competências, vez que imprescindível ao alcance da qualidade e da eficiência do serviço
público”, sendo que esse modelo gerencial, busca “orientar esforços para planejar, captar, desenvolver
e avaliar, nos diferentes níveis da organização e das pessoas que dela participam, as competências
necessárias à consecução dos objetivos organizacionais” (GESTÃO por competências passo a passo:
um guia de implementação, 2016).

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Outro fator que merece destaque é o relativo à gestão de conflitos. Já ouviu falar? Sabe o que
significa?
Primeiramente, precisamos compreender o termo “conflito”. Segundo Yamamoto e Robbins (2015,
online), o conflito pode ser dividido em três modalidades:
CONFLITO DE
CONFLITO DE TAREFA CONFLITO DE PROCESSO
RELACIONAMENTO
Relaciona-se com o teor e os Foca as relações interpessoais Refere-se a como o trabalho é executado
objetivos da atividade
Fonte: YAMAMOTO; ROBBINS, 2015, online.
Referidos doutrinadores complementam dizendo que:
O conflito é construtivo quando melhora a qualidade das decisões, estimula a criatividade e a
inovação, incentiva o interesse e a curiosidade entre os membros do grupo, provê o meio pelo qual
problemas podem ser ventilados e tensões liberadas e promove um ambiente de autoavaliação e
mudança. (YAMAMOTO; ROBBINS, 2015, online).
No que tange à gestão de conflitos no Poder Judiciário um dos fatores mais discutidos refere-se à
quantidade de processos e respectiva duração, até que haja a solução dos mesmos. Aqui, atrela-se
diretamente ao conceito de jurisdição visto na unidade anterior. Você pode estar se perguntando:
porquê? Ora, ao Poder Judiciário compete o exercício da jurisdição, isto é, possui o poder-dever de, em
substituição às partes, solucionar o conflito de interesse posto para sua apreciação, formulando, assim,
uma norma concreta. Mas, essa resposta do Poder Judiciário pode perdurar por tempo indeterminado?
Vige o princípio da duração razoável do processo em nosso ordenamento, contudo, trata-se de um dos
problemas/ conflitos mais recorrentes no que tange à gestão. Neste contexto, tem-se cada vez mais
buscado incentivar a autocomposição, os meios alternativos para a solução de conflitos.
Conforme consta no sítio eletrônico do Conselho Nacional de Justiça:
Com a missão de aperfeiçoar o sistema judiciário brasileiro, o CNJ implantou, de maneira
definitiva, os métodos consensuais de resolução de conflito na engrenagem da Justiça brasileira ao
criar a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do
Poder Judiciário (Resolução CNJ n. 125/2010), considerada um marco regulatório nesse tema. Ela
rendeu frutos expressivos: a Lei de Mediação (Lei n. 13.140/2015) e a mudança no Código de
Processo Civil (Lei n. 13.105/2015), prevendo o oferecimento da conciliação, etapa obrigatória na
tramitação do processo. (NOTÍCIAS CNJ, 2020).
Essa visão proposta pelo Conselho Nacional de Justiça demandou uma análise em conjunto com a
gestão de pessoas, mediante a capacitação dos agentes da Justiça, dos operadores de Direito e da
sociedade como um todo, e, ainda, formação de instrutores em mediação e conciliação.
Por exemplo, fora criado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), curso à distância (EAD), para a
formação de mediadores e conciliadores.
3 DA GESTÃO DAS UNIDADES JUDICIÁRIAS
No tópico anterior, iniciamos o assunto quanto à gestão no Poder Judiciário. Sobre o assunto, é preciso
verificarmos o conteúdo disponibilizado pelo Conselho Nacional de Justiça, em seu portal eletrônico
(https://www.cnj.jus.br). Isso porque, o Conselho Nacional de Justiça, dentre outras atribuições e
atividades, disponibiliza item específico sobre “GESTÃO DA JUSTIÇA”, composto, por exemplo,
de estatísticas, gestão estratégica e planejamento, gestão documental, gestão processual. Veremos,
a seguir, apontamentos gerais sobre referidos temas.
No que tange à Gestão Documental e Memória do Poder Judiciário, fora criado, pelo CNJ, em
2009, o chamado Programa Nacional de Gestão Documental e Memória do Poder Judiciário
(PRONAME), cuja previsão, na atualidade, está na Resolução CNJ n. 324/2020. Segundo o art. 2o,
da referida Resolução:
Art. 2º Para fins desta Resolução, compreendem-se:
I – Gestão Documental como o conjunto de procedimentos e operações técnicas referentes à
produção, à tramitação, ao uso, à avaliação e ao arquivamento de documentos e processos
recebidos e tramitados pelos órgãos do Poder Judiciário no exercício das suas atividades, inclusive
administrativas, independentemente do suporte de registro da informação; e
II – Gestão da Memória como o conjunto de ações e práticas de preservação, valorização e
divulgação da história contida nos documentos, processos, arquivos, bibliotecas, museus,
memoriais, personalidades, objetos e imóveis do Poder Judiciário, abarcando iniciativas

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direcionadas à pesquisa, à conservação, à restauração, à reserva técnica, à comunicação, à ação
cultural e educativa. (CNJ, 2020).
Referida previsão, atrela-se ao princípio da publicidade, já elencado em nossa primeira unidade, vez
que, dentre outras diretrizes, visa garantir o acesso a informações.
Há também a Gestão Estratégica e Planejamento, que reveste-se em um dos pilares de atuação do
Conselho Nacional de Justiça, enquanto órgão de controle do Poder Judiciário. Divide-se o tema em
dois pontos centrais: Estratégia Nacional do Poder Judiciário e Planejamento Estratégico do CNJ,
mas sobre o tema falaremos no quarto e último tópico da nossa unidade.
Como terceiro exemplo de Gestão da Justiça, há a Gestão Processual, tendo sido criado, para tanto,
dentre outras medidas, o chamado Centro de Inteligência do Poder Judiciário (CIPJ). Segundo
informações disponibilizadas pelo Conselho Nacional de Justiça:
As atividades dos centros de inteligência abrangem o monitoramento das demandas judiciais e o
gerenciamento de precedentes. O monitoramento serve à prevenção de litígios na origem e à gestão
de demandas repetitivas. Ao mapear os precedentes em instâncias e tribunais superiores, os centros
de inteligência buscam identificar soluções comuns a causas semelhantes, que se repetem em
milhares de processos judiciais em tramitação. Um primeiro efeito prático dessa nova sistemática é
a segurança jurídica: dar decisões idênticas para problemas idênticos em seus fundamentos.
(CENTRO DE INTELIGÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO, [s.d])
Por fim, cumpre-nos destacar novamente a Gestão de Pessoas, através da capacitação e formação, da
governança de gestão de pessoas, medidas devolvidas atreladas à saúde dos magistrados e servidores e
também de segurança jurídica. No que tange à saúde dos magistrados e servidores do Poder
Judiciário, fora criada a Política de Atenção à Saúde de Magistrados e Servidores do Poder
Judiciário, através da Resolução CNJ n. 207/2015.
Há também medidas implementadas pelos órgãos especificamente no que tange à Gestão de suas
Unidades Judiciais.
Como exemplo, é possível citar o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, no qual a
Corregedoria-Geral da Justiça, realiza estudos visando ao aprimoramento da gestão de unidades
judiciais, buscando a otimização da prestação da jurisdição, da tutela jurisdicional. Para tanto,criou-se:
a) Diretrizes de Gestão de Gabinetes, contendo orientações gerais, modelo de portaria gerencial,
tabelas de fluxos processuais e também a listagem dos modelos de despachos, decisões e sentenças
disponíveis no sistema informatizado;
b) Programa Triagem Complexa, que refere-se à metodologia de gestão de lançamento de decisões
em gabinete, de modo sinérgico com as atividades devolvidas pelos cartórios (GESTÃO de Unidades
Judiciais, [s.d]).
4 DO PLANEJAMENTO ESTRATÉGICO, INDICADORES DE DESEMPENHO E DA
GESTÃO DE PROCESSOS
Chegamos ao último tópico da nossa disciplina e o nosso objeto de estudo será o planejamento
estratégico, além de mencionarmos os indicadores de desempenho e a gestão de processos, como
um todo, complementando assim, o estudo feito nos itens anteriores. O primeiro passo, desta feita, é
buscarmos uma definição para o termo “planejamento”. Segundo Milton de Almeida Barbosa,
Planejamento é o processo de busca de equilíbrio entre meios e fins, entre recursos e objetivos,
bem como a elaboração de estratégias de ações para sua execução, visando ao desenvolvimento
futuro de empresas, instituições, setores de trabalho, organizações grupais e outras atividades
humanas, baseando-se nas condições externas e internas. (BARBOSA, 2020, online)
O planejamento, portanto, considera as ações necessárias no presente, mas já pensando em soluções
para o futuro, ou seja, visando atingir os objetivos traçados. Para tanto, é fundamental a gestão. No que
tange, à Administração Pública, “o planejamento público visa criar metas, objetivos e programas de
ação para a sua execução, podendo-se dizer que o planejamento é uma ferramenta da gestão estratégica
no benefício ao cidadão” (BARBOSA, 2020, online).
Quando falamos em planejamento estratégico, alguns fatores precisam ser considerados, como, por
exemplo, os instrumentos de gestão, os planos, os programas e projetos, análise de estratégias, formas
de implementação e controle.
De início, é preciso traçar os objetivos e as metas.
No que tange à estratégia, tem sido utilizada a matriz FOFA: forças, oportunidades, fraquezas e
ameaças. Por sua vez, no que diz respeito à elaboração/implementação do planejamento, a doutrina
tem apontado com exemplo a ferramenta BSC (Balance Scorecard).
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Segundo Barbosa,
no caso da Gestão Pública, o BSC considera essa visão governamental como atenção a quatro
fatores: os recursos humanos (capacitação dos servidores ao objetivo em questão); aos processos
internos, que sejam adequados e eficazes; às finanças públicas visando eficiência; e à sociedade, de
modo a satisfazer a demanda dos cidadãos. (BARBOSA, 2020, online).
Outro instrumento importante e também utilizado é o mapa estratégico, no qual a estratégia fica
visualmente mais inteligível ao apontar os objetivos da instituição suas relações, apontando as ações e
indicadores para justificar e atestar os resultados. Não se pode perder de vista, contudo, que a gestão
pública tem características peculiares, como, por exemplo, observância aos princípios estudados em
nossa primeira unidade. Portanto, todo e qualquer planejamento deve levar em consideração assegurar
o interesse público, e, quanto ao Judiciário, assegurar uma melhor qualidade e eficiência na prestação
dos serviços, qual seja, da atividade jurisdicional.
No que tange à Gestão Estratégica e ao Planejamento, as diretrizes do Poder Judiciário são
apresentadas através da Estratégia Nacional do Poder Judiciário, sendo que a atual prevê o período de
2021 a 2026, na qual houve a fixação da missão, da visão, dos atributos, dentre outros fatores.
A referida Estratégia foi instituída pela Resolução CNJ n. 325, de 30 de junho de 2020, sendo que
sua execução, segundo o art. 6o, compete aos “ministros, conselheiros, magistrados de primeiro e
segundo graus, servidores e colaboradores do Poder Judiciário”. Ademais, segundo o art. 7o, “a
execução da Estratégia do Judiciário consistirá na implementação de políticas judiciárias nacionais e
de programas, projetos e ações dos órgãos do Poder Judiciário”.
Por fim, o art. 8o, da Resolução CNJ n. 325, de 2020, aponta que “os órgãos do Poder Judiciário
manterão unidade de gestão estratégica para assessorar a elaboração, a implementação e o
monitoramento do planejamento estratégico”.
Vide organograma apresentado pelo Conselho Nacional de Justiça:
Figura 1 - Organograma da Estratégia Nacional do Poder Judiciário 2021-2026

Fonte: ESTRATÉGIA Nacional do Poder Judiciário 2021-2026. CNJ. Disponível em:


https://www.cnj.jus.br/gestao-estrategica-e-planejamento/estrategia-nacional-do-poder-judiciario-
2021-2026/. Acesso em: 20 set. 2021.

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Para tanto, o Conselho Nacional de Justiça tem estimulado e desenvolvido diversas práticas atinentes à
Gestão Processual, às quais estão disponíveis para consulta diretamente no sítio eletrônico do CNJ
(https://boaspraticas.cnj.jus.br/por-eixo/1). Na sequência, falaremos brevemente sobre algumas.
Primeiramente, cumpre esclarecer que falaremos sobre práticas que estão ligadas à eficiência na gestão
processual, sejam em gabinetes ou varas, cujo maior impacto esteja na celeridade processual, sem,
contudo, que haja perda da qualidade na prestação jurisdicional. Essa é a ideia geral quando falamos
em Gestão Processual.
O Tribunal Regional Federal da 5a região, por exemplo, desenvolveu o sistema “Gestão Judiciária -
BI/eCorreição” (https://boaspraticas.cnj.jus.br/pratica/278), pelo qual visou-se a criação de
ferramentas, a partir do sistema e-Gestão, buscando, dentre outros aspectos, diagnosticar, desenvolver
e fiscalizar os trabalhos e atividades das Unidades Jurisdicionais e respectivos magistrados. O sistema
é atualizado diariamente, permitindo aos gestores uma análise rápida e apuração dos processos que
estão impactando no resultado final.
Criou-se, também, a chamada “Gestão Processual Estratégica no Tribunal do Júri”
(https://boaspraticas.cnj.jus.br/pratica/261), visando otimizar os atos preparatórios e os atos
realizados durante as audiências de instrução e também as sessões de julgamento do Tribunal do Júri.
Como terceiro e último exemplo, é possível citar o projeto que promove a “Padronização das Rotinas
Cartorárias” (https://boaspraticas.cnj.jus.br/pratica/142).
Por fim, quanto aos números e/ou indicadores, é imprescindível apontar o “Justiça em Números”, que
consiste na principal fonte de estatísticas oficiais do Poder Judiciário, sendo divulgado pelo Conselho
Nacional de Justiça. Referido relatório aponta detalhamentos da estrutura e litigiosidade, bem
como, os indicadores e análises essenciais, aspectos que auxiliam na Gestão Judiciária.
No referido relatório é possível verificar, dentre outros aspectos, os recursos financeiros e humanos,
tempo de tramitação dos processos, índice de conciliação, bem como, a Gestão Judiciária estruturada
em três pontos, quais sejam: litigiosidade, primeiro grau de jurisdição em números e gargalos da
execução.

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