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A Teoria Pura do Direito de Hans Kelsen foi uma das obras mais importantes do

século XX. Em relação ao conceito de teoria pura do direito, dois pontos são enfatizados: o
conceito de pureza e o “ a quê” essa pureza se refere. Neste caso pureza é vista como algo
que cumpria viabilizar uma leitura específica de juridicidade, sem a interferência de outras
esferas. Enquanto “pura” se refere a doutrina, e não, ao direito em si. Isso porque o direito é
campo da disputa política, ou seja, o papel da ciência jurídica é diverso da ciência política. À
ciência jurídica cabe identificar e escrever as normas que compõem determinada ordem
jurídica, além disso pode e deve ser separada da política. Kelsen, ainda diz que, a teoria pura
do direito se refere a ciência do direito, não ao seu objeto, o direito.
Nesse sentido, para Kelsen, ciência é o conhecimento que explica e torna possível a
predição, cujo possibilita afirmações em certo sentidos “seguras” com respeito às ocorrências
futuras. Tem como referência o modelo da ciência da natureza, onde os fatos naturais são
regidos pelo princípio da causalidade e por consequência, fornece previsão acerca das
possibilidades de certos eventos ocorrerem novamente. Através deste pensamento, Kelsen,
quer formulações que permitam trazer segurança ao que se diz sobre as normas jurídicas.
Entretanto a presença do campo moral e religioso no dever jurídico também devem ser
levados em consideração.
Divide as normas jurídicas em três: o direito como técnica social específica, como
coercitiva e como diversa da ordem natural. O direito inato técnica social é uma técnica de
motivação indireta da condutas humanas, relacionado ao uso de sanções punitivas e que usa
estas sanções como forma de reflexão entre as opções de se agir conforme os próprios desejos
e ser punido, ou agir conforme as leis e evitar prejuízos futuros. Logo a “paz” produzida pelo
direito é relativa, pois representa a ausência de força, e é através da coerção que se consegue
“paz”. Na coercitiva, Kelsen relaciona a essência dos deveres normativo-jurídicos com a
essência dos deveres morais, pois ambos se baseiam em comportamentos devidos. Tanto o
direito, quanto a moral prescrevem normas de conduta. A ordem jurídica se diferencia da
ordem normativa moral pelo modo qual prescreve ou proíbe certa conduta. O direito procura
impedir certos comportamentos, atribuindo à conduta contrária um ato de coerção
socialmente organizado, logo, o direito possui caráter coercitivo. Kelsen intitula sanções
punitivas socialmente organizadas de ordens primárias e/ou normas verdadeiras. Entretanto,
nem todas as normas possuem sanções, e para isso Kelsen apresentou duas respostas.
Também diz que a ordem social não apenas regula as condutas humanas quando vincula um
específico comportamento a uma sanção, mas também quando não proíbe uma conduta ou
deixa de prescrever algo como devido, gerando assim um “mínimo de liberdade”. Já na
diversa da ordem natural, o jurista Hans, difere o princípio de regência, como princípio
social, de princípio de regência dos fenômenos não-normativos. Afirma que, enquanto as leis
do fenômenos da natureza são julgados com base no princípio da causalidade, os de
acontecimento normativos se apoiam no princípio da imputação. Neste sentido, constrói sua
ideia de direito em 3 formas: o primeiro é formal, o segundo é material e o terceiro é
funcional. Assim, neste caso em particular, o papel da ciência jurídica é descrever as
estruturas de dever com base nessa tríplice composição, isto de acordo com o princípio da
imputação.
Quando se diz fundamentar o direito, significa responder o porquê devem ser seguidas
as normas de um ordenamento jurídico positivo, nesse caso é preciso atribuir um sentido
objetivo, que auxilie na distinção entre um acontecimento relevante e irrelevante para o
direito, a fim de descobrir se é válido ou não. Para Kelsen, uma norma válida é uma norma
que existe no no conjunto normativo e que deve ser obedecida e aplicada juridicamente.
Sendo dois, os critérios para se validar uma norma, sendo dois tipos de derivações possíveis:
derivação estática e derivação dinâmica. Sendo a estática uma sequência de deduções lógicas,
enquanto o dinâmico pode ser traduzida por sucessivas autorizações. Deste modo, chega a
conclusão de que todos os sistemas jurídicos são dinâmicos, porque as normas têm origem
em uma complexa organização de produção normativa por competência. Logo é possível
dizer que o campo moral é formado apenas por normas de conduta, enquanto o normativo-
jurídico necessita de normas atributivas de poderes jurídicos.
Kelsen diferencia o ato de um saltador de estradas de um ato jurídico. Inferindo que o
direito não regula apenas sua própria criação, mas que também toda criação do direito, é
aplicação do direito. Inclusive, tal teoria teve influência de um aluno, Adolf Julius Merkl, que
veio a se tornar um célebre autor. Merkl possui pensamentos diferentes do seu professor,
onde a sua pirâmide é invertida, pois em sua base, está a Constituição, e no alto, os atos
decisórios, provimentos e negócios jurídicos, diferentemente da pirâmide de Kelsen. Apesar
da teoria da construção escalonada jurídica ser diferente da teoria da norma fundamental,
ambas estão claramente associadas por conta da relação de “validade”, presente entre as
normas de uma mesma ordem jurídica.
A teoria fundamental foi criada justamente para responder ao regresso provocado pelo
imperativo de se indicar sempre a “norma validamente superior”, entretanto não é uma teoria
totalmente original de Kelsen, sendo essa desenvolvida primeiramente por Alfred Verdross.
Encontrou na teoria da norma fundamental expressiva relação com os escritos de Emmanuel
Kant, isto porque Kant em suas ideias, disse que enxergamos os mundos com os nosso
“óculos” e que nosso alcance não é a dos “objetos como eles são”. Onde o próprio Kelsen
afirma que que a teoria pura do direito é teoria do direito positivo e que transpõe da lógica
transcendental de Kant vendo no dever, uma categoria lógica das ciências sociais normativas
em geral e da ciência social do direito em particular.
Hans diz que a teoria fundamental desempenha papel similar ao exercido pelas
categorias do entendimento de Kant, onde dois pontos são fundamentais: a “teoria de
conhecimento” de Kant que Kelsen aplica por analogia, e o que significa a “condição lógico-
transcendental” dessa interpretação kantiana. Em relação a teoria do conhecimento, Kant se
pergunta o que pode ser conhecido legitimamente e que tipo de conhecimento não tem
fundamento plausível, neste sentido, chega a conclusão de que para se conhecer, é preciso da
“matéria”, é preciso de uma experiência no qual a sensibilidade seja usada. Assim, afirma que
os enunciados devem ser divididos por quatro ângulos: quantidade, qualidade, relação e
modalidade. Já transcendental, significa “o que é anterior a toda a experiência”, o ponto de
vista que considera as condições de possibilidade de todo o conhecimento. Logo, é uma
forma de pensar construída a partir de estruturas que não dependem da experiência, mas que
ao mesmo tempo estejam abertos a todas as possibilidades. Assim como Kant, Kelsen
concebe as normas sob uma única ideia ou razão.
De acordo com Kelsen, uma Constituição pode ser considerada não mais disputada
em sua afirmação de fundamento da ordem jurídica quando a ordem jurídica for globalmente
eficaz. Dois são os critérios para se atestar essa eficácia global: a primeira é a comprovação
de que as normas estão servindo de parâmetro de obediência, ou seja, se serve de referência
para as condutas, e a segunda é no caso de não estarem sendo obedecidas e verificar se os
funcionários estão aplicando punições a aqueles que não obedeceram à norma. Não havendo
mais disputa sobre a referência da Constituição, esta poderá ser lida como a norma positiva
primeira. Todavia para isso é necessária a norma fundamental, pois é ela que torna
inicialmente possível pensar o sentido subjetivo dos fatos de modo objetivo.
Não cabe a ciência do direito responder o que é “justo”, ela tem por fim, a
compreensão de ordens jurídicas independentemente de suas peculiaridades de conteúdo, não
se importa com a pretensão moral ou da validade moral particular dos regimes políticos.
Deve, ao considerar a juridicidade, proceder à leitura dos enlaces de atribuição normativa e
relatar suas possibilidades por duas razões: devido ao caráter valorativo do conhecimento
científico e a impossibilidade racional de julgar o que é justo. Kelsen diz que ao se analisar
certo fenômeno jurídico, o conhecimento científico deve ser formulado sem interferências
valorativas, devendo se permanecer no caráter descritivo. Neste caso, o papel da ciência é
conhecer, mas cabe aos outros julgarem com deve ser utilizado o conhecimento obtido.
Enquanto ao segundo ponto, a impossibilidade racional de se dizer o que é justo, a ideia de
justiça está ligada aos desejos e temores das pessoas, logo o conhecimento total do justo se vê
impossibilitado pela oscilação de opiniões. Assim fica evidente a distinção entre ciência do
direito e política, onde o primeiro visa fornecer um conhecimento seguro acerca das normas
jurídicas, informando quais são válidas e quais não são, enquanto a segunda cabe a
elaboração das normas.
O controle que deve ser utilizado, segundo Hans, é o controle por coerência, isto é,
deve se partir de algumas informações iniciais, e a partir delas, aferir a correção do afirmado
em relação a um caso dado. Assim, deve verificar a sucessão de delegações até a norma
fundamental nos termos da descrição dos enlaces de imputação. Desta forma, a ciência
jurídica descreve o caráter que uma determinada ação tem diante das normas estudadas,
estabelecendo o sentido objetivo que um comportamento social tem. Kelsen, designa certas
descrições de proposições jurídicas, e afirma que proposições normativo-jurídicas verdadeiras
são análogas às leis naturais. A pluralidade de normas gerais e individuais criadas pelas
diferentes autoridades jurídicas se convertem em um sistema unitário e coerente, que permite
tanto prognoses, quantos pós-gnoses. Kelsen ainda sustenta que os princípios da lógica são
aplicáveis diretamente a proposições jurídicas e por seu intermédio, indiretamente, às normas.
E o motivo de não poder aplicar diretamente à lógica às normas se encontra na razão de que
os princípios lógicos de contradição e a regra de inferência têm sido definidas em termos de
verdade.
Logo, a Teoria Pura do Direito teve como objetivo elevar o Direito à posição de
ciência jurídica, ao patamar de conhecimento científico.

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