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Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Faculdade Mineira de Direito – Praça da Liberdade

Fernanda Santos e Silva

Exame Especial de Introdução ao Estudo do Direito I

Belo Horizonte, 2015


Fernanda Santos e Silva
Resumo dos capítulos específicos:
Do capítulo I, somente a parte 6: A Norma Jurídica,
de A Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen;
4º Capítulo do livro Introdução ao Estudo do Direito:
Dogmática Analítica ou a Ciência do Direito como
Norma (até o tópico 4.2.2), de Tércio Ferraz Júnior;
Capítulos XI, XII, XIII da seção de número 2 do livro
A Teoria Estruturante do Direito de Friedrich Müller;
Professor: Lucas de Alvarenga Gontijo.

Belo Horizonte, 2015


A Teoria Pura do Direito, Hans Kelsen
Capítulo I, parte 6: A Ordem Jurídica

Grande jurista austríaco, nascido em Praga (na época pertencente ao então Império Austro-
Húngaro) em 1881 e falecido em 1973, Hans Kelsen nos deixou um legado de suma
importância ao desenvolver em sua famosa obra A Teoria Pura do Direito, uma teoria jurídica
que, como explicitado no título, fosse realmente “pura” no sentido de ser livre de todas
ideologias e crenças e capaz de estruturar a sociedade de forma organizada.

Tendo isso, o autor dar início à parte seis (A Ordem Jurídica) com a tentativa de conceituar o
objeto da teoria do Direito, o que, em uma simples investigação se descobre que independente
do povo, da época ou da língua, o Direito vai se apresentar com uma ordem de conduta
humana. Essa ordem se fundamenta em uma norma superior a qual lhe dará validade
(escalonamento das normas).

Atualmente, o nosso sistema jurídico regula as ações humanas não só em relação a outros
humanos, mas também em relação aos animais e demais objetos, sob ameaça de alguma pena,
caso esses não sejam protegidos ou respeitados em sua integridade. O que nos leva ao
próximo ponto: a ordem jurídica como ordem social.

Pois de acordo com Kelsen, a conduta humana é positiva quando a ordem jurídica é também
uma ordem social visto que ela regulará a conduta de uma pessoa em relação à várias outras.
Essa regulação, que ela seja individual, que ela seja coletiva, prescreve comportamentos a fim
de se estabelecer uma ordem, ordem essa que caberá à autoridade jurídica decidir se ela
atende a interesse de todos na comunidade.

Prosseguindo, o autor atribuí ao Direito a característica de uma ordem coativa, dado que
diante de condutas humanas malquistas e indesejadas a reação sempre se dá com atos coativos
cuja função é de sanção, visando assim, o cumprimento da norma. Importante destacar que,
ainda que a ordem jurídica seja coativa, não implica que sempre se utilizará da força física
para sua eficácia, mas quando necessário, a comunidade jurídica tem legitimidade para aplicá-
la. Portanto, é nisso que difere o Direito de outras ordens sociais: seu caráter coativo.
Indivíduos que, caso, desviem dessa ordem, sofrerão com as medidas de coerção prescritas
pela ordem jurídica.

Ademais, não é da natureza do Direito impor certa conduta à força, embora dela se faça uso
quando verificado o não cumprimento de uma prescrição (nessa circunstância, aplica-se a
sanção, prevista em lei). O que se pretende é justamente o contrário: estimular aquilo que não
é proibido, aquilo que é considerado louvável e de grande utilidade, e apresentar punições
apenas para desencorajar condutas delituosas.

É de se notar que a evolução do Direito veio acompanhada de uma moderação no uso das
forças e de violência, não que ela foi extinta, pois, como dito, ela se faz necessária em
circunstâncias especiais, uma vez que sem a força não se pode aplicar certas medidas
coercitivas de forma eficaz. Essas medidas serão aplicadas por um monopólio da coação por
parte do Estado, centralizador do poder, cujo objetivo é assegurar a segurança coletiva,
julgando e aplicando sanções de forma a garantir a proteção dos indivíduos. Assim, para
Kelsen, se alcança a paz na comunidade. Entretanto, essa paz é apenas relativa, posto que o
Direito não é isento do emprego total da força, ele é coercitivo e, conforme vai evoluindo,
torna-se uma ordem de segurança procurando estabelecer a paz, ainda que restrita.

O austríaco reitera sobre os atos coercitivos e amplia para aqueles que não têm caráter de
sanção, para Kelsen, há casos em que é preciso prevenir a ocorrência de ato ilícito,
antecipando-se ao acontecimento do mesmo, em vez de aplicar a sanção só após consumado o
ato.

O Direito apresenta também um sentido negativo, dado que, se a lei não proíbe determinada
conduta, então ela é permitida, conferindo um mínimo de liberdade ao indivíduo para que ele
pratique determinada ação. Claramente que essa liberdade é diferente daquela assegurada
pela lei, sendo essa garantida de forma positiva.

Kelsen ainda completa dizendo que, embora a ordem jurídica possa limitar o indivíduo em sua
liberdade, fica a ele resguardado um mínimo dela, que é assegurada pelo Estado.

O autor constata em seu próximo tópico: O Direito como ordem normativa de coação,
comunidade jurídica e “bando de salteadores”, a distinção entre a ordem de um órgão
jurídico (que também é subjetiva, porém), objetiva e a de um bando de salteadores, que é
subjetiva. O crucial da distinção de ambas se baseia no fato de ser a ordem de um órgão
jurídico uma ordem válida. A atitude de um salteador de estrada, não é parte do ordenamento
jurídico, logo, não possui eficácia e nem validade, portanto, não vincula o destinatário.

Assim sendo, o Direito é coercitivo na medida em precisa ser eficaz e validado em uma norma
fundamental. Por isso, Kelsen contraria a ideia de que a Justiça deve ser condutora do Direito,
pois esse deve ser “puro”, um dever-ser e não somente um “ser” ponderando valores que são
relativos e, portanto, passíveis de outras interpretações, o que foge do objetivo primordial do
Direito, que não tem qualquer sentido axiológico.

É nesse pensamento que Kelsen em deveres jurídicos sem sanção, repudia a ideia existir uma
ordem jurídica sem a imposição de sanções, sem coerção, visto que se faz necessário seu uso,
como mostrado anteriormente, para assegurar a paz e manter a ordem da conduta humana.
Inclusive, se considerar o Direito como não aplicador de sanções, ele em nada se diferenciaria
de outras ordens sociais.

Ademais, o autor finaliza a parte seis do capítulo I, se dedicando à explicação das normas
jurídicas não-autônomas, que seria uma norma incompleta, carecendo de outra estatuidora de
um ato de sanção para ter validade.
Introdução ao Estudo do Direito, Tércio Ferraz Júnior

Capítulo IV: Dogmática Analítica ou a Ciência do Direito como Norma (até o tópico 4.2.2)

O professor Tércio Ferraz Júnior identifica no Direito uma norma que objetiva, antes de tudo,
a resolução de conflitos. Há, porém, que se ater ao fato de que para a aplicabilidade dessa
norma, ela precisa ser coerente à realidade.

Tendo isso, o critério para a decidibilidade de conflitos é que seu ponto de partida precisa ser
generalizado (isto é, atenda ao bem comum) e também seguir o princípio da legalidade,
buscando uma norma que seja apropriada para a situação em questão.

Contudo, ao se deparar com a norma faz-se necessário identificar o Direito, analisá-lo e


decompô-lo, ou seja, ele é separado em partes por um processo de diferenciação e ligação
(recurso analítico), a fim de que se possa defini-lo e só então, aplicá-lo.

Agindo dessa maneira, o jurista se encontra dentro de um sistema jurídico, cujas


características são a sistematização, a generalidade e coerência (pensamento Kelseniano, de
que as normas formam um sistema de encadeamento lógico). Porém, ainda que lógico esse
sistema não é de natureza matemática, em que se é possível reduzi-lo apenas à axiomas. É
importante, diante disso, acrescentar que Tércio reconhece o papel axiológico, visto que para
se chegar a um consenso de decidibilidade ocorrerá ponderação de valores.

Fazendo-se um apanhado geral das ideias, é distinguindo, definindo, classificando e


sistematizando que se é possível identificar o Direito e, assim, aplicá-lo resolvendo o conflito
em questão.

Buscando o conceito de norma, o autor, introduz o pensamento do jusfilósofo Hans Kelsen,


que por sua vez identifica a norma como o objeto central do Direito, pois, como já visto no
resumo anterior, o austríaco vê a norma como condutora do comportamento humano.

Porém, Kelsen nega a influência de axiologias absolutas, sendo assim, ele elabora um sistema
de pirâmide jurídica hierárquico que se fundará em uma norma fundamental, se esquivando de
qualquer conteúdo ideológico. Embora esse pensamento sofra diversas críticas, Tércio prefere
evitar esse assunto, relevando que se encontra na norma o tema central do Direito, e que este
último não é conjunto de normas dogmáticas, mas zetéticas, logo está aberta a diversas
interpretações.
Porém, por ser demasiadamente complexo para o entendimento de um aluno iniciante do
curso de Direito, o autor apresenta somente três conceitos básicos da norma:

Norma como proposição (de Kelsen), de dever-ser, ou seja, de como deve ser o
comportamento, resumido na máxima se A é, B será (o que significa que se um fato
corresponde à hipótese A será devido ao comportamento B, sua consequência).

Norma como prescrição (Austin), prescreve qual o comportamento desejado ou proibido que é
expresso pela vontade do legislador. Importante também salientar que a norma enquanto
prescrição é imperativa.

Tércio apresenta também um terceiro conceito de norma, chamada norma-comunicação que é


mais complexa que as apresentadas anteriormente, visto que ela decorre da troca de
mensagens de duas ou mais pessoas permitindo assim determinar a relação entre elas.

Tomando esse conceito de norma como comunicação em um sistema interativo, e já


enfatizando que o ser humano se comunica de tal forma que é impossível evitar quaisquer
trocas de mensagens, Tércio afirma que a comunicação se dá em dois níveis: o cometimento e
o relato. Sendo o relato por onde se manifesta o comando, e o cometimento onde se manifesta
a autoridade do emissor. Ressaltando que, para que isso ocorra, é preciso existir uma
diferença entre os dois indivíduos, uma diferença de hierarquia, visto que essa é uma relação
de autoridade.

Nessas trocas de mensagens vai existir uma expectativa mútua de comportamento, portanto há
uma complexidade envolvida nessa situação que pode se concretizar ou não, que seria a
contingência, outra característica do sistema comunicativo, o que dá uma característica
instável às essas relações humanas. Na tentativa de se amenizar essa instabilidade, procura-se
uma seletividade nas ações interativas, ou seja, se escolhe uma possibilidade e espera-se que
se realize. O que claro, nem sempre vai realizar.

Para tanto, cria-se regras que visem assegurar alguma confiança entre os envolvidos em tal
impasse, tais como as atitudes cognitivas e as normativas, cuja combinação formará as
estruturas sociais. A primeira se funda pela análise da generalização dos acontecimentos, e
pode ser contrariada se surge novas análises daquele fato observado, logo pode ou não
ocorrer. Quanto à segunda, ela está assegurada pelas normas, daí o nome: normativa, já que
não depende da observação e sim do seu cumprimento.
Assim sendo, é a atitude normativa que irá, de certa forma, dá mais estabilidade nas relações
sociais, visto que se estabelecerá relações de imputação: o que conduz de volta ao
pensamento kelseniano, de que, dada tal atitude A, imputará uma sanção B, prevista na
norma.

Tércio assevera que há mais normas em quantidades excedentes, por esse motivo se faz
necessário que apenas aquelas convenientes prevaleçam para que a seletividade se fortaleça,
gerando maior estabilidade às relações, como dito acima. O alcance dessa hegemonia, se dará
pela institucionalização, que é um mecanismo estrutural de estabilização da sociedade
(assegurada mais comumente pelo Estado), porém faz-se preciso dos núcleos significativos
que irá conferir validade às interações sociais.

O autor torna ainda a reiterar sobre a importância que tem a confiança nas relações humanas e
o papel da autoridade no caráter prescritivo das normas, visto que a relação que a caracteriza é
a entre a autoridade e aquele que se sujeita a ela.

Tércio trata do conteúdo dessas normas jurídicas, que numa visão kelseniana (positivista) tem
de ser neutra, em contrapartida os jusnaturalistas negam essa visão. Tércio salienta que não irá
entrar em discussão sobre antiga divergência, embora reconheça que não se pode ignorar o
conteúdo dessas normas jurídicas ao aplicá-las.

Dada a explicação e esclarecimentos de alguns conceitos, se é possível entender a


complexidade que envolve a norma.

Sua complexidade veio acompanhada pela evolução dos sistemas sociais, momento em que
surge o positivismo jurídico, que delega ao Estado um poder centralizado e coativo que
objetiva estabelecer garantias para que o Direito fosse cumprido. Essa prosperidade do
positivismo jurídico é atribuída, por Tércio, ao fenômeno do constitucionalismo visto que
aquilo que estava codificado estava consequentemente confirmado pelo Estado que aplicaria
as normas tal como escritas.

É por causa dessa complexidade das normas que o jurista antes de as aplicar precisa
simplifica-las e interpretá-las. Sendo essas normas institucionalizadas e cujo conteúdo seja
geral.

Assim, pode-se afirmar que a norma como comunicação é uma troca de mensagens que, como
sabido, ocorre em dois níveis: cometimento e relato.
O cometimento normativo define uma relação de complementaridade, em que um manda e o
outro obedece. Essa relação expressa-se de forma verbal.

O relato normativo se dá pela ação dos envolvidos, as condições nas quais acontecem e as
consequências do que acontece.

Dada uma condição de ação (interferência positiva), é possível realizar um ato como a
omissão (interferência negativa). Entende-se essa ideia de ação e omissão como uma mudança
no estado das coisas.

Para se analisar a norma enquanto comunicação é preciso conceituá-la dogmaticamente, cuja


pretensão é guiar a ação humana. Depois, categorizar as diferentes relações entre os
indivíduos, para assim qualificar essas ações.

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