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ABORTO

CONCEITO

Aborto, é a interrupção da gravidez com a morte do produto da concepção.


Consiste na eliminação da vida intrauterina.

Pode ser espontâneo, natural ou provocado, sendo neste último caso


criminoso, exceto se praticado em uma das formas do artigo 128 do Código
Penal.

O Código Penal, pune de forma diversa, dois personagens que estão


envolvidos diretamente no aborto: A gestante e o terceiro que nela realiza as
manobras abortivas,

No autoaborto só há um bem jurídico tutelado, que é o direito à vida do feto.


É, portanto, a preservação da vida humana intrauterina.

No abortamento provocado por terceiro, além do direito à vida do produto


da concepção, também é protegido o direito à vida e à incolumidade física e
psíquica da própria gestante.

1. CLASSIFICAÇÃO DOUTRINÁRIA

 Crime de mão própria – Quando realizado pela própria gestante


(autoaborto). Considera-se próprio quanto ao sujeito ativo, pois somente a
mulher grávida pode figurar nessa condição.

 Crime comum nas demais hipóteses – Quanto ao sujeito ativo.

 Pode ser comissivo ou omissivo (desde que a omissão seja


imprópria) - quando o omitente tinha o dever e o poder de evitar um resultado
e não o faz. Esse dever deriva da lei, da assunção voluntária da tarefa de
proteção ou da criação de um risco não permitido.
 É crime doloso; de dano; material; instantâneo de efeitos
permanentes (caso ocorra a morte do feto, consumando o aborto); não
transeunte (ou de fato permanente: são aqueles que deixam vestígios
materiais, tais como o homicídio (CP, art. 121) e as lesões corporais (CP,
art. 129); monossubjetivo (são aqueles que podem ser praticados por uma só
pessoa, como o homicídio, o furto, o estupro etc. Nada obsta, entretanto, que
duas ou mais pessoas se unam para perpetrar essas infrações penais,
havendo, em tais casos, concurso de agentes); de forma livre (admite variadas
formas para a prática da conduta típica. Ex., homicídio, que pode ser cometido
por golpes de faca, disparo de arma de fogo, envenenamento).
2. ESPECIES DE ABORTO

a) Natural ou espontâneo – Para fins da lei penal, o aborto natural ou


espontâneo não tem relevância, uma vez que o próprio organismo,
naturalmente, se encarrega de levar a efeito a seleção dos óvulos
fecundados que terão chances de desenvolver.
b) Provocado (dolosa ou culposamente - acidental)

 As espécies dolosas, são aquelas previstas nos arts. 124, (autoaborto


ou aborto provocado com o consentimento da gestante); 125 (aborto
provocado por terceiro sem o consentimento da gestante) e 126 (aborto
provocado por terceiro com o consentimento da gestante).

 Não há previsão legal para a modalidade de provocação culposa do


aborto. Se uma gestante, com seu comportamento culposo vier a dar
causa à expulsão do feto, o fato será considerado indiferente penal.

 Sujeito ativo e passivo

Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outro o provoque:

Pena - detenção, de um a três anos.


Aborto provocado por terceiro

 Sujeito Ativo: Somente a gestante (crime de mão própria)


 Sujeito Passivo: É o ser humano em formação (óvulo fecundado,
embrião ou feto)

No autoaborto ou aborto consentido, artigo 124 do Código Penal, somente a


gestante pode ser o sujeito ativo desse crime, pois trata-se de crime de mão
própria.

É discutida a possibilidade de coautoria ou participação no crime previsto no


artigo 124, mas nada impede o concurso de agentes, por instigação, auxílio
moral ou material. Se o agente atua em consonância com a gestante, por
instigação, acompanhamento etc., responderá por este delito; se presta
colaboração à conduta de terceiro, responderá pelo artigo 126.

Art. 125 - Provocar aborto, sem o consentimento da gestante:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos.

 Sujeito ativo: Qualquer pessoa (o tipo penal não exige nenhuma


qualidade especial do agente).
 Sujeito passivo: De forma essencial, o produto da concepção e, de
maneira secundária, a própria gestante – Nessa espécie de aborto, há
dupla subjetividade passiva: o feto e a gestante,
Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante: (aborto
provocado por terceiro)

Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.

Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior


de 14 (quatorze) anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é
obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.

 Sujeito ativo: Qualquer pessoa (o tipo penal não exige nenhuma


qualidade especial do agente).
 Sujeito passivo: Somente o fruto da concepção (óvulo fecundado,
embrião ou feto).

OBS.: Se a gestante permitir que com ela sejam praticadas as manobras


abortivas, as lesões de natureza leve, que venham a acontecer, não a
conduzirá ao status de sujeito passivo, uma vez que deu o seu consentimento.
Caso ocorra lesões graves ou morte da gestante, esta figurará como sujeito
passivo, mesmo que secundariamente, pois o seu consentimento fica
invalidado, em razão da gravidade dos resultados.

No aborto provocado por terceiro, com ou sem o consentimento da


gestante, artigos 125 e 126 do Código Penal, por tratar-se de crime comum, o
sujeito ativo pode ser qualquer pessoa.

Por ser crime de ação livre, a provocação do aborto pode ser realizada de
diversas formas, seja por ação, seja por omissão.

 Julgamento pelo Tribunal do Juri


O crime de aborto, nas suas três modalidades – autoaborto, aborto
provocado por terceiro, sem o consentimento da gestante e aborto provocado
por terceiro com o consentimento da gestante -, deve ser submetido a
julgamento pelo Tribunal do Juri, uma vez que a vida é o bem jurídico por ele
protegido.

 Meios de realização do aborto que provocam a intoxicação do


organismo da gestante e o consequente aborto:

a) meios químicos: substâncias que atuam por via de intoxicação do


organismo da gestante, com o consequente aborto: o fósforo, o chumbo, o
arsênio, o mercúrio, a quinina, a estricnina, ópio, etc.

b) meios psíquicos ou morais: susto, terror, sugestão, choque moral, etc;

c) meios físicos: são os meios mecânicos (traumatismo do ovo com punção,


dilatação do colo do útero; térmicos (aplicação de bolsas de água quente e fria
no ventre); ou elétricos (choque elétrico por máquina estática - dispositivo
eletrônico utilizado em diversas áreas, como na fisioterapia, na área rural e na defesa
pessoal).

 Bem juridicamente protegido e objeto material – É a vida humana em


desenvolvimento.
 Objeto material – O óvulo fecundado (se o aborto é cometido até os
dois primeiros meses de gravidez), o embrião (se o aborto é praticado
no terceiro ou quarto mês de gravidez) ou o feto (quando o produto da
concepção já atingiu os cinco meses de vida e daí em diante).

 Elemento subjetivo - É o dolo (vontade livre e consciente de


interromper a gravidez) de causar a morte do produto da concepção.
Não se admite a modalidade culposa.
 Consumação e tentativa - Crime material, o crime de aborto se
consuma com a efetiva morte do produto da concepção. Na qualidade
de crime material, podendo-se fracionar o itercrimines, a tentativa é
perfeitamente admissível.

 Crime impossível – (art. 17, CP)

Art. 17 - Não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do


meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o
crime.

Ex: a) a mulher supõe estar grávida e toma remédios abortivos, nesse caso
o crime impossível ocorre pela impropriedade absoluta do objeto; b) a gestante
usa meios que não são aptos a causar o aborto, ingerindo ervas, vendidas
como se fossem abortivas, mas que são inócuas. Nesses casos, a gestante
não pode ser responsabilizada penalmente pelo seu comportamento.

 Modalidades comissiva e omissiva – As condutas previstas nos


art. 124, 125 e 126, são comissivas.

 É possível a prática de aborto por omissão. Ex., A gestante percebe um


sangramento vaginal e não toma providências para verificar o porquê
dessa ocorrência. O médico, percebendo que a gestante está sofrendo
intensas dores, demora a prestar-lhe socorro, sendo negligente no
atendimento, e, em virtude dessa demora a gestante vem a abortar.

 CAUSAS DE AUMENTO DE PENA

Por uma impropriedade técnica, embora a rubrica do art. 127, CP, anuncie
forma qualificada, esse artigo trata de causas especiais de aumento de pena,
ou majorantes.
Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de
um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para
provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são
duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.

Assim, nas hipóteses dos arts. 125 e 126, a pena será aumentada:

a) 1/3 se o aborto causa a lesão corporal grave na gestante;


b) duplicada se o aborto causa a morte da gestante.

Existem aqui duas modalidades de crime preterdoloso. Tanto no caso de


lesão corporal grave, como no de morte, o crime tem dolo no antecedente e
culpa no consequente.

A causa de aumento de pena aplica-se apenas a quem for condenado com


incurso nos arts. 125 e 126. Se a gestante praticar um dos crimes do art. 124,
não sofrerá o aumento de pena se ela sofrer lesão corporal grave. A lei é
expressa ao prever o aumento de pena exclusivamente para os crimes do art.
125 e 126. Isso ocorre porque a lei penal brasileira não pune a autolesão.

 CONCURSO DE CRIMES

Na hipótese em que o agente mata a mulher, consciente de sua gravidez,


causando a morte do feto, haverá concurso formal de delitos, entre o homicídio
e o aborto sem consentimento (art. 125). Contudo, se ficar caracterizado o
feminicídio (art. 121, § 2º, VI, CP), o aborto fica absorvido pela causa de
aumento de pena.

Concurso formal. Consoante art. 70 do Código Penal, haverá concurso


formal quando “o agente, mediante uma só ação ou omissão, pratica dois ou
mais crimes, idênticos ou não”. No caso, há conduta única, mas multiplicidade
de resultados (dois ou mais crimes).

A Lei n.º 13.104/2015 acrescentou um sexto inciso ao rol do § 2º para tratar do


feminicídio.

Homicídio qualificado

§ 2º Se o homicídio é cometido:

Feminicídio

VI – contra a mulher por razões da condição de sexo feminino:

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.


 ABORTO LEGAL

O art. 128 do CP, prevê duas modalidades de aborto legal, ou seja,


aborto que pode ser realizado em virtude de autorização da lei penal. Essas
duas hipóteses, permitem que não será punido o aborto, desde que praticado
por médico:

a) Aborto necessário ou terapêutico (art. 128, I):

É uma hipótese específica de estado de necessidade. Em tal situação,


diante do confronto entre duas vidas, se não houver outro meio de salvar a vida
da gestante, a opção é pela vida da mãe em detrimento da vida do feto. É
dispensável o consentimento da gestante. Se cometido por pessoa que não
seja médico, desde que o perigo seja atual, não há crime em razão da exclusão
da ilicitude, pelo estado de necessidade (art. 24, CP).

Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:

Aborto necessário

I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

b) Aborto humanitário, sentimental ou ético (art. 128, II):

Se a gestação é decorrente de estupro, desde que autorizado pela


gestante ou por seu representante, se incapaz. “O fundamento da indicação
ética reside no conflito de interesses que se origina entre a vida do feto e a
liberdade da mãe, especialmente as cargas emotivas, morais e sociais que
derivam da gravidez e da maternidade” (Régis prado, Luiz. Comentários ao
Código Penal. 9ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 508).

Para que o aborto seja feito, duas são as exigências: a) gravidez


decorrente do estupro e b) consentimento prévio da gestante ou seu
representante legal. A lei não exige autorização judicial.

Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:

Aborto no caso de gravidez resultante de estupro

II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento


da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.
 ABORTO DE ANENCÉFALO

Colocando fim a uma demorada controvérsia jurídica, o Supremo Tribunal


Federal julgou a ADPF 54, declarando ser inconstitucional a interpretação dos
arts. 124, 126 e 128, que considere como crime de aborto a interrupção de
gravidez de feto anencéfalo.

ESTADO – LAICIDADE. O Brasil é uma república laica, surgindo


absolutamente neutro quanto às religiões. Considerações. FETO
ANENCÉFALO – INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ – MULHER – LIBERDADE
SEXUAL E REPRODUTIVA – SAÚDE – DIGNIDADE –
AUTODETERMINAÇÃO – DIREITOS FUNDAMENTAIS – CRIME –
INEXISTÊNCIA. Mostra-se inconstitucional interpretação de a interrupção da
gravidez de feto anencéfalo ser conduta tipificada nos artigos 124, 126 e 128,
incisos I e II, do Código Penal. (STF — ADPF 54 — Pleno — Rel. Min. Marco
Aurélio — j. 12/04/2012, in:
file:///C:/Users/Jose/Downloads/texto_136389880.pdf)

O entendimento do STF é no sentido de que não existe bem jurídico a ser


tutelado, pois o feto não tem a menor possibilidade de vida.

Bom
estudo!

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