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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Colégio Recursal - Santos

Processo nº: 1026852-46.2019.8.26.0562

Registro 2020.0000107949

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Inominado Cível nº


1026852-46.2019.8.26.0562, da Comarca de Santos, em que é recorrente IFOOD.COM
AGÊNCIA DE RESTAURANTES ON LINE S/A, é recorrido LIFE FIT GOURMET
COMÉRCIO DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS CONGELADOS E PRATOS
PRONTOS - EIRELI.

ACORDAM, em 5ª Turma Cível - Santos do Colégio Recursal de Santos,


proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso, por V. U.", de
conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento tevê a participação dos MM. Juízes CLÁUDIO TEIXEIRA


VILLAR (Presidente sem voto), JOSÉ WILSON GONÇALVES E FÁBIO SZNIFER.

Santos, 11 de novembro de 2020 .

Walter Luiz Esteves de Azevedo


RELATOR

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Colégio Recursal - Santos

Processo nº: 1026852-46.2019.8.26.0562

Recurso nº: 1026852-46.2019.8.26.0562 - Fórum de Santos


Recorrente: Ifood.com Agência de Restaurantes On Line S/A
Recorrido: Life Fit Gourmet Comércio de Produtos Alimentícios
Congelados e Pratos Prontos - Eireli

Voto nº 141 - 20
Contrato de prestação de serviços e conta corrente
–Recorrido que é restaurante credenciado na
plataforma do e-commerce do recorrente (Ifood) –
Ausência de repasse das vendas – Existência do
crédito bem demonstrada – Críticas aos documentos
comprobatórios do débito improcedentes – Alegada
mora do credor não comprovada – Condenação ao
pagamento do débito e seus acréscimos bem
decretada – Dano moral caracterizado – Recorrido,
restaurante de pequeno porte, que se viu na
contingência de suspender suas atividades por falta
de recursos financeiros – Abalo ao bom nome
comercial – Dano moral configurado – Indenitária
fixada dentro dos critérios da razoabilidade e
proporcionalidade – Condenação mantida – Recurso
não provido

Vistos, etc

IFOOD.COM AGÊNCIA DE RESTAURANTES


ONLINE S/A recorre da r. sentença proferida pelo d. Juízo da 3ª Vara do Juizado
Especial Cível de Santos, no processo que lhe move LIFE FIT GOURMET
COMÉRCIO DE PRODUTOS ALIMENTÍCIOS CONGELADOS E
PRATOS PRONTOS, ato que a condenou 1) a recompor os danos materiais
fixados em R$ 4.734,52 correspondentes aos valores não repassados relativos a
vendas ocorridas nos meses de junho de 2019 (R$ 394,80) e julho de 2019 (R$
4.339,72), corrigidos desde o inadimplemento, bem como 2) a reparar danos
morais, estimando a indenitária em R$ 2.000,00, com correção monetária a partir
do arbitramento, fixando a citação como termo inicial dos juros moratórios que se

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acrescem a ambas as verbas.


Repisa o recorrente suas razões e argumentos.
Discorre acerca do funcionamento de sua atuação no mercado. Destaca que,
conforme cláusula contratual, os repasses constituem o valor das vendas, uma vez
abatidos o percentual de comissões e mensalidades. Salienta que o restaurante é o
único responsável por fornecer e manter atualizados os seus dados cadastrais para
que haja regularidade dos repasses. Conclui que os repasses somente não puderam
ser creditados dentro do prazo estabelecido em contrato por erro de cadastro da
conta bancária do recorrido. Assevera que, após o restaurante ter feito a correção
de seus dados bancários, os repasses foram reprocessados e realizados
normalmente. Concluiu que não houve os alegados prejuízos materiais
consistentes na ausência dos repasses das vendas ocorridas em junho, julho e
agosto de 2019. Acrescenta que, como o recorrido, na verdade, possui uma conta
consolidada, em que recebe os repasses devidos a dois estabelecimentos
cadastrados (Life Fit Gourmet e Life Fit 2 Go) em um único CNPJ, todo o
faturamento era vinculado ao cadastro principal, o do restaurante Life Fit
Gourmet. Afirma que o recorrido age de má-fé ao reclamar crédito já satisfeito.
Aduz que, ausente ilícito, indevidas são indenizações. Diz que a manutenção da
condenação a título de danos materiais provocará enriquecimento sem causa.
Assevera que não houve dano moral. Pede a reversão do r. julgado.
Subsidiariamente, pede a redução da indenitária.
Em contrarrazões, o recorrido aduz que foi
demonstrada documentalmente a ausência dos repasses referentes a junho e julho
de 2019. Rebate a alegação de que ocorreu erro cadastral imputável a ele.
Acrescenta de que sempre recebeu os valores do I-Food na mesma conta bancária.
Sublinha que não houve impugnação aos cálculos apresentados. Sustenta a
ocorrência de dano moral indenizável. Pede a manutenção integral da r. sentença.
É o relatório.
Fundamento e voto.
Recurso próprio, tempestivo e bem processado.
Presente, também, a sucumbência.
Portanto, possível é o conhecimento do recurso.
Por meu voto, nega-se provimento ao recurso.

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Ficou incontroverso e está demonstrado que, em


05.06.2019, as partes celebraram negócio jurídico, segundo a qual a recorrente
disponibilizaria ao recorrido plataforma virtual para comercialização de seus
produtos e para os clientes dele forneceria meio de pagamento consistente em um
cartão.
Conforme consta da cláusula 2.1. do instrumento, o
negócio tem por objeto:
”a promoção, pelo iFood, das atividades do Restaurante no território
brasileiro por meio da Plataforma iFood, nos termos do art. 710 da Lei n.
10.406/2002; e (b) o licenciamento não exclusivo do uso dos Softwares
pelo iFood ao Restaurante.”
A cláusula 6.1., por sua vez, prevê que o recorrente
disponibilizará aos clientes do recorrido sistema de pagamento on line integrado à
sua plataforma, que pode ser fornecido, total ou parcialmente, pelo recorrente ou
por terceiros por ele contratados.
Ainda, nos termos das cláusulas 6.1.2. e 8., os
pedidos pagos por meio do sistema de pagamentos recorrente são repassados ao
recorrido no prazo de trinta dias.
Pela contraprestação dos serviços o recorrido
comprometeu-se a pagar "ao iFood Remuneração composta pelos seguintes
valores: (a) “Comissão”, correspondente a um percentual sobre a Receita Bruta
obtida pelo Restaurante em decorrência dos Pedidos realizados pelos Clientes
Finais; (b) “Mensalidade”, correspondente a uma remuneração mensal fixa,
como contrapartida ao licenciamento não exclusivo do uso dos Softwares; e (c)
Taxa de Pagamento Online.”, como consta da cláusula 7.1.
Como consta da inicial, o recorrido cadastrou o
estabelecimento com nome fantasia LIFE FIT 2 GO na plataforma da recorrente
em junho de 2019. Ele já havia cadastrado outro restaurante, o LIFE FIT
GOURMET. Ambos os estabelecimentos estavam vinculados ao mesmo CNPJ, o
do LIFE FIT GOURMET.
O recorrido ainda alegou que, nos meses de junho,
julho e agosto de 2019, o LIFE FIT 2 GO utilizou a plataforma da recorrente e
realizou diversas vendas, apresentando planilhas das operações (fl. 7/11).

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Todavia, segundo ele, o recorrente não fez os


respectivos repasses nos prazos estabelecidos no contrato, sob a alegação de erro
dos dados bancários, pois a conta bancária estaria equivocadamente cadastrada
como poupança e não como conta corrente. O recorrente alega que, retificado o
cadastro da conta, fez os repasses.
As alegações do recorrente são improcedentes.
O crédito do recorrido está bem demonstrado pelas
planilhas que ele juntou com a inicial.
Não há qualquer indício de que os documentos
produzidos pelo recorrido foram manipulados. Eles encontram respaldo em
documentos emitidos por terceiro estranho a lide, o Santander.
Com efeito, cotejando-se as planilhas e os extratos
bancários apresentados a fl. 117/201, contata-se que não houve o repasse das
vendas dos meses de junho e julho de 2019 feitas pelo LIFE FIT 2 GO, mas
somente aqueles concernentes às vendas feitas pelo LIFE FIT GOURMET.
Em uma análise, por amostragem, da planilha de fl.
185 é possível perceber que os créditos de R$ 543,42 e R$ 845,07, decorrentes de
pagamentos realizados com o “CARTÃO DE CRÉDITO IFOOD MASTER TO”
foram creditados contabilmente em 01.07.2019 (fl. 186) e 31.07.2019 (fl. 192),
para a LIFE FIT GOURMET, conforme declarou o Banco Santander. As
operações apontadas pelo recorrido estão bem detalhadas e encontram amparo nos
extratos bancários.
O crédito, repito, foi cabalmente demonstrado.
Ademais, as críticas do recorrente às planilhas foram
genéricas. Ele não impugnou nenhum lançamento especificamente.
Para se livrar da acusação de inadimplemento, o
recorrente aduziu que o recorrido não fornecera número de conta corrente
habilitada a receber os repasses.
Anoto que se tratando de alegação de mora do
credor cabia ao devedor o ônus de provar. O recorrido não se desincumbiu do
ônus.
Pelo contrário, há indicação de que a alegação é
vazia, visto que os repasses devidos à LIFE FIT GOURMET foram feitos na

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mesma conta que o recorrente ora diz ser inábil.


A alegação de emenda da mora, ou seja, de
pagamento posterior também não foi comprovada. Cabia ao recorrente devedor
demonstrar sem sombra de dúvida ao juízo quais os valores que repassou,
discriminando as datas e a forma de pagamento.
Todavia, o recorrente não comprovou os repasses,
com exceção dos créditos do mês de agosto de 2019, o que, inclusive, já foi
reconhecido em primeiro grau. De fato, a planilha de fl. 194 e o extrato bancário
de fl. 200 indicam o repasse dos valores relativos a agosto.
A condenação era mesmo de rigor.
Houve abalo ao bom nome comercial do recorrido.
Ele viu-se na contingência de suspender suas atividades por falta de recursos
financeiros. Os consumidores deixaram de contar com a oferta do recorrido no
mercado. A inexistência de oferta abalou a boa fama comercial.
Logo, reconheço que houve dano moral indenizável.
O valor da indenização observou os princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade. Foram bem sopesadas as circunstâncias do
fato, as condições econômicas das partes envolvidas, assim como o grau da ofensa
moral e sua repercussão.
Este valor repara o dano sofrido pelo recorrido e
admoesta adequadamente o recorrente.
Posto isso, por meu voto, nega-se provimento ao
recurso. Condena-se o recorrente ao pagamento das custas e despesas processuais
atualizadas e dos honorários advocatícios de dez por cento da condenação.

WALTER LUIZ ESTEVES DE AZEVEDO


Juiz de Direito Relator

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