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AUTOS: 0006914-61.2018.8.16.

0056
RECLAMANTE: LUCAS FERNANDES PIANOVSKI
RECLAMADOS: UNIAO NORTE DO PARANA DE ENSINO LTDA

PROJETO DE SENTENÇA

I. RELATÓRIO
Dispensado nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95.

II. FUNDAMENTAÇÃO
Aplicação do Código de Defesa do Consumidor
Aplica-se, in casu, o contido no Código de Defesa do Consumidor, haja
vista que se trata de relação de consumo. Deve-se considerar que o CDC traz normas de
ordem pública e interesse social (artigo 1º), em atenção ao mandamento constitucional
exposto no artigo 5º, XXXII, CF, direito fundamental do cidadão. Por tal razão, a
incidência da legislação consumerista pode ser analisada de ofício e a qualquer tempo
pelo Magistrado.
Analisando detidamente os autos, conclui-se que as partes qualificam-se
como consumidor e fornecedor, formando uma relação de consumo.
A parte reclamante é destinatária final e usuária do serviço prestado pelo
reclamado, amoldando-se, por certo, ao conceito de consumidor exposto no artigo 2º do
mesmo diploma legal. Sendo assim, reconheço a relação de consumo entre as partes.
Julgamento antecipado
Inicialmente, cabe ressaltar que o presente feito comporta julgamento
antecipado, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil de 2015, porquanto
as provas trazidas aos autos são suficientes para o julgamento da lide. Ademais, o
magistrado como destinatário da prova, tem o dever de indeferir as diligências inúteis
ou protelatórias (art. 370, parágrafo único, do CPC), garantindo, assim a razoável
duração do processo (arts. 5°, LXXVIII, da CF e 4° e 6° do CPC).
Da retificação do polo passivo
Não verificando qualquer prejuízo para a parte autora e nem sendo
impugnado, defiro o pedido da parte ré para que sua denominação passe a constar como
“EDITORA E DISTRIBUIDORA EDUCACIONAL S/A”.
MÉRITO
Trata-se de ação de indenização por danos morais c/c repetição de indébito,
em dobro de LUCAS FERNANDES PIANOVSKI em face de UNIAO NORTE DO
PARANA DE ENSINO LTDA.
O ponto controvertido nos autos reside nas supostas cobranças indevidas
sofridos pelo autor que resultaram na sua inscrição nos órgãos de proteção ao crédito.
O reclamante alega que após realizar um pagamento no mês de janeiro,
pensando que este se referia as suas disciplinas pendentes, começou a ser cobrado como
se tivesse feito uma nova matrícula.
Alega também que tentou diversas soluções administrativas, mas que todas
foram infrutíferas.
A ré, por sua vez, resumidamente, alegou que a inscrição indevida foi por
culpa do autor uma vez que o mesmo não cancelou a sua matrícula.
Analisados os autos verifico que a pretensão do autor deve prosperar.
Não é cabível exigir do consumidor que o mesmo, após terminar o seu
curso, tenha que cancelar a sua matrícula. Tal ônus de controle é de responsabilidade da
instituição de ensino.
O que a ré tenta realizar é transferir a sua responsabilidade para o autor.
Entretanto, totalmente descabida tal pretensão, afinal os fatos aqui discutidos estão
dentro da atividade econômica/comercial da instituição de ensino.
Nesse sentido, são práticas comerciais abusivas todas as condutas tendentes
a ampliar a vulnerabilidade do consumidor. O comportamento do fornecedor tanto na
esfera contratual quanto à margam dela, abusam da boa-fé e da situação de inferioridade
econômica/técnica do consumidor.
Ao exigir que o consumidor tome providências que não são de sua
responsabilidade e falhar na prestação da solução administrativa, o reclamado age em
desconformidade com os padrões mercadológicos de boa conduta e demonstra uma
tentativa de agravar o desequilíbrio da relação jurídica om o consumidor, impondo sua
superioridade e vontade, que se traduz na eliminação do direito do consumidor .
A preocupação central do código de defesa do consumidor é a de
proporcionar o equilíbrio da relação de consumo, a partir do reconhecimento da
vulnerabilidade do consumidor, estabelecendo uma série de normas protéticas que
buscam equilibrar a relação de consumo.
Uma das mais importantes finalidades do código de defesa do consumidor é
a prevalência da boa-fé objetiva, a fim de evitar que o fornecedor abuse de sua
preponderância técnica, jurídica e econômica, importando ao consumidor condições
injustas de contratação. É “um conjunto de padrões éticos de comportamento, aferíveis
objetivamente, que devem ser seguidos pelas partes contratante (...)”. (GARCIA,
Leonardo de Medeiros. Direito do consumidor: código comentado e jurisprudência, op.
Cit., p. 46.). Consubstancia, portanto, no dever de lealmente e confiança que precisa ser
buscado em todas as fases da relação comercial, principalmente analisando a
vulnerabilidade do consumidor.
A parte fornecedora, em nenhum momento buscou demonstrar suas
alegações por meio de prova, não contribuindo para a estabilidade da relação de
consumo em comento. Ficou demonstrado o desinteresse do reclamado em atender as
necessidades do reclamante, configurando a quebra dos princípios de boa-fé e lealdade
que devem nortear essas relações.
Por outro lado, o autor juntou provas (seqs. 1.5 a 1.14) de que tentou
resolver o problema de forma administrava.
Da inscrição nos órgãos de proteção ao crédito
Quanto as inscrições nos órgãos de proteção ao crédito, tenho que as
mesmas foram indevidas. De forma abusiva a ré cobrou mensalidades do autor que
sequer estava cursando qualquer graduação.
O sistema da ré falhou ao dar a opção de rematrícula para o autor e não dar a
opção de somente pagar os valores referentes as disciplinas pendentes. E, ainda,
continuou cobrando as mensalidades como se o autor fosse aluno. Portanto totalmente
indevidas foram as cobranças e por consequência as inscrições referentes a elas.

Conforme precedentes do Superior Tribuna de Justiça, a inscrição indevida


do consumidor em serviço de proteção ao crédito é causa de dano moral in re ipsa, não
sendo necessária a demonstração do dano sofrido. Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.


PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL.
INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE
INADIMPLENTES. ATO ILÍCITO. DEVER DE INDENIZAR.
REEXAME DE PROVAS. DANO MORAL 'IN RE IPSA'.
OCORRÊNCIA. VALOR. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE.
FIXAÇÃO COM BASE NO CRITÉRIO DA RAZOABILIDADE.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISÃO. DESCABIMENTO.
SUMULA 07/STJ. INCIDÊNCIA. 1. A modificação das conclusões a
que chegaram as instâncias ordinárias, relativas à presença dos
requisitos ensejadores do deve de indenizar da instituição financeira,
nos moldes em que pretendido, encontra óbice no enunciado sumular
nº 7 desta Corte, por demandar o vedado revolvimento de matéria
fático-probatória. 2. Nos casos de protesto indevido de título ou
inscrição irregular em cadastros de inadimplentes, o dano moral
configura-se 'in re ipsa', prescindindo de prova. 3. O valor da
indenização por danos morais deve ser fixado com moderação,
considerando a realidade de cada caso, sendo cabível a intervenção da
Corte quando exagerado ou ínfimo, fugindo de qualquer parâmetro
razoável, o que não ocorre neste feito. 4. O valor fixado pelas
instâncias ordinárias, a título de honorários advocatícios, somente
pode ser alterado se for excessivo ou irrisório, sob pena de incidência
da Súmula 7/STJ. 5. Decisão agravada mantida pelos seus próprios
fundamentos. 6. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (STJ -
Ag 1387520 SC - Rel.: Ministro PAULO DE TARSO
SANSEVERINO - J.13.03.2012 - Terceira Turma)
Ainda, segundo entendimento da Turma Recursal do Paraná:

RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR


DANOS MORAIS. TELEFONIA. INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE
PROTEÇÃO AO CRÉDITO. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS
SERVIÇOS. REGRA DO ARTIGO 14 DO CDC. DANO MORAL
CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO MANTIDO
(R$10.000,00). SENTENÇA MANTIDA. Recurso conhecido e
desprovido. 1. Tratam os autos de ação declaratória de inexistência de
débitos c/c de indenização por danos morais, onde a autora alega que
foi inscrita indevidamente. 2. A sentença (item 31) julgou procedente
o pedido inicial formulado pela promovente JUREMA CORREIA DA
MAIA para condenar a promovida OI S/A no pagamento da
indenização no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos
morais. 3. Inconformada, a parte reclamada interpôs o presente
recurso inominado (item 39), para o fim de minorar o valor da
condenação, sob os argumentos de que o valor da condenação não
pode ser utilizada como forma de enriquecimento pelo agente passivo
da demanda. 4. Não existindo preliminares, passo a análise de mérito.
5. No presente caso temos que houve inscrição do nome do autor nos
órgãos de proteção ao crédito, mesmo tendo esse efetuado os
pagamentos dos serviços mediante débito em conta, portanto devendo
ser aplicado por analogia o entendimento de que a pessoa que não
celebrou contrato com a empresa de telefonia não pode ser reputada
devedora, nem penalizada com a inscrição de seu nome em órgãos de
restrição ao crédito, em razão da vulnerabilidade do sistema. Ante o
exposto, esta Turma Recursal resolve, por unanimidade de votos,
CONHECER e NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto, nos
exatos termos deste voto. (TJPR - 1ª Turma Recursal - 0003187-
70.2014.8.16.0174/0 - União da Vitória - Rel.: Camila Scheraiber
Polli - Rel.Desig. p/ o Acórdão: FERNANDA DE QUADROS
JORGENSEN GERONASSO - J. 26.10.2015)

Ainda, o enunciado nº12.15 das Turmas Recursais do Paraná vai no mesmo


sentido:

Enunciado N.º 12.15- Dano moral - inscrição e/ou manutenção


indevida: É presumida a existência de dano moral, nos casos de
inscrição e/ou manutenção em órgão de restrição ao crédito, quando
indevida. (Res. nº 0002/2010, publicado em 29/12/200, DJ nº 539)
(g.n.)

Promover a inscrição de uma pessoa inadimplente é um direito da empresa


credora, entretanto, quando essa inscrição ou manutenção ocorre de forma indevida, há
o abuso de direito. Sobre o abuso de direito o Código Civil em seu art. 187 estabeleceu
que a responsabilidade se dá de forma objetiva.

Ainda, o Código de Defesa do Consumidor estabelece em seu art. 6º, VI que


é direito básico do consumidor a reparação dos danos morais e patrimoniais. No caso
em tela, como já foi demonstrado a ilegalidade da inscrição, notadamente ocorreu dano
moral.

Existe, portanto, o direito a reparação do dano moral sofrido.


Do pedido de restituição em dobro
A parte autora requer que seja restituída em dobro pelos valores
indevidamente cobrados.
Entretanto, conforme o art. 42, paragrafo único do CDC, a restituição em
dobro é devida apenas nos casos em que há o efetivo pagamento. Portanto, não assiste
razão ao autor.
Do pedido de condenação pelo desvio produtivo e do pedido de
condenação pela ineficiência de call center
No caso em tela não observo que houve um real desvio produtivo do autor e
nem falha na prestação do serviço de call center.
Pelas provas nos autos, especialmente pelos e-mails de seq. 1.12, é possível
observar que boa parte das tratativas foram feitas com um professor, sendo que o
mesmo informou que não poderia ajudar o autor por estar fora do seu alcance.
Portanto, por mais que o autor tenha gastado tempo nas tratativas, se
utilizou do meio incorreto. Dessa forma, a ré não pode ser penalizada por isso.

Do quantum indenizatório

A indenização pelos danos morais deve proporcionar ao lesado uma


vantagem de caráter patrimonial, que servirá de lenitivo, atenuando as consequências do
dano, bem como considerando as circunstâncias em que os fatos ocorreram.

O valor da indenização deve ser arbitrado em quantia moderada, atentando-


se para a capacidade econômica das partes, em valor suficiente apenas a compor os
danos sofridos, evitando indenização simbólica ou que represente enriquecimento
injusto da vítima.

Ante ao exposto, tudo bem ponderado, arbitro em R$ 8.000,00 (oito mil


reais), a indenização a ser paga pela reclamada, a título de indenização por danos morais
pela inscrição indevida, quantia que julgo justa e adequada a compor os danos sofridos
pela parte reclamante em decorrência do dano moral suportado.

III. DISPOSITIVO

Por todo o exposto e pelo que consta nos autos, com fulcro nos artigos 5º e
6º da Lei 9.099/95, bem como no art. 487, I do CPC, no mérito, JULGO
PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para:

1. Declarar como indevidas as seguintes inscrições:

 Contrato 180367253, no valor de R$ 1.202,92 com data de


disponibilização 10/07/2018.
 Contrato 181841094, no valor de R$ 1.202,92 e data de disponibilização
10/07/2018.
 Contrato 133907211, no valor de R$ 962,40 e data de disponibilização
10/07/2018.
 Contrato 180955011, no valor de R$ 1.202,92 e com data de
disponibilização 10/07/2018.
 Contrato 133907210, no valor de R$ 962,40 e com data de
disponibilização 10/07/2018.
 Contrato 179479920 no valor de R$ 1.503,65 e com data de
disponibilização 10/07/2018.

2. Condenar a reclamada ao pagamento de R$ 8.000,00 (oito mil reais) à


título de indenização por danos morais pela inscrição indevida, corrigido
monetariamente pelo INPC a contar a partir da presente data e
acrescidos de juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (Enunciado
das Turmas Recursais Nº12.13 A e B).

Sem custas nem honorários nesta fase (artigo 55 da Lei 9.099/95).

Nos termos do artigo 40 da Lei 9.099/95, submeta-se a decisão à apreciação


da juíza togada para homologação.

Cambé, datado e assinado digitalmente.

Gregory Tonin Maldonado

Juiz Leigo

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