Você está na página 1de 9

1

Medicamento
NOTA TÉCNICA NÚMERO 726
Material X

Solicitante: Exmo. Sr. Dr. Abraão Tiago Costa e Melo


Vara: 02ª Vara Cível da Comarca de Russas
Número do processo: 0050242-97.2021.8.06.0158
Data de envio da solicitação de parecer ao NAT-JUS: 23/11/2021
Data do Parecer: 08/12/2021

SUMÁRIO

TÓPICO Pág
1. Tema --------------------------------------------------------------------------------- 2
2. Considerações teóricas ---------------------------------------------------------- 2
3. Eficácia do tratamento e evidências científicas ---------------------------- 3
4. Sobre o registro pela ANVISA -------------------------------------------------- 4
5. Sobre a recomendação da CONITEC ---------------------------------------- 5
6. Sobre a presença de Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do
Ministério da Saúde ou órgão público --------------------------------------- 5
7. Dos tratamentos disponibilizados pelo SUS -------------------------------- 5
8. Custo do tratamento -------------------------------------------------------------- 5
9. Conclusões -------------------------------------------------------------------------- 5
10. Sobre as perguntas formuladas ------------------------------------------------ 6
11. Referências ------------------------------------------------------------------------- 8

nat.ceara@tjce.jus.br
2

NOTA TÉCNICA

1) Tema

Avaliação tecnológica da alimentação especial Aptamil AR, na quantidade de seis


latas mensais de 800 g, para criança de 15 meses com o diagnóstico de regurgitação
e ruminação do recém-nascido, filha de mãe portadora de HIV que, por este motivo,
não pode amamentá-la.

2) Considerações teóricas
O refluxo gastroesofágico (RGE) é um processo fisiológico normal que ocorre em
bebês, crianças e adultos saudáveis. A maioria dos episódios é breve e não causa
sintomas ou lesão esofágica, nem resulta em outras complicações. Em contraste, a
doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) ocorre quando os episódios de refluxo
estão associados a complicações como esofagite ou baixo ganho de peso. As
manifestações da doença podem incluir irritabilidade recorrente, aversão à
alimentação, bradicardia ou episódios cianóticos, particularmente em bebês
prematuros ou com deficiência neurológica.

A síndrome de ruminação, caracterizada por regurgitação sem esforço e/ou


reintrodução de alimentos, foi previamente reconhecida como um distúrbio em bebês
com privação emocional. Mais recentemente, foi reconhecido como um problema de
crianças mais velhas e adolescentes. A característica dessa condição é a presença de
regurgitação e remastigação ou expulsão dos alimentos logo após as refeições, sem
náuseas ou ânsia de vômito. Os sintomas desaparecem horas depois de comer, uma
vez que o material regurgitado se torna ácido, e não ocorrem durante o sono.

Na terapia de primeira linha do manejo da DRGE em lactentes deve-se: 1) Evitar a


“superalimentação”, modificando os volumes de alimentação e frequência de acordo
com a idade e o peso. 2) Engrossar alimentos se o lactente não estiver em aleitamento
materno exclusivo. 3) Manter o aleitamento materno, quando possível. Em casos
especiais, algumas crianças com refluxo em aleitamento materno exclusivo podem se

nat.ceara@tjce.jus.br
3

beneficiar do uso do leite ordenhado engrossado com espessantes comerciais, como


espessantes à base de alfarroba.

Na abordagem de segunda linha da DRGE no lactente, pode-se tentar um teste


terapêutico de 2 a 4 semanas com base em fórmula de proteínas extensamente
hidrolisadas (ou de aminoácidos), ou ainda, se criança em aleitamento materno
exclusivo, excluir proteína do leite de vaca da dieta materna, mantendo o aleitamento
materno. Essa recomendação é justificada com base no argumento de que há uma
sobreposição importante de manifestações entre DRGE e alergia à proteína do leite de
vaca. O uso de terapia farmacológica é controverso em crianças com regurgitação.

.3) Eficácia do tratamento e evidências científicas

Aptamil AR® é uma fórmula infantil indicada para o tratamento dietético da


regurgitação. É adequado para a alimentação de lactentes, como fonte alimentar
única, desde o nascimento até aos 6 meses de idade, quando não amamentados.

O produto tem, entre outros, os seguintes componentes:

- Amido – Um espessante natural e de digestão fácil, eficaz na redução da


regurgitação por espessamento do leite.

- Opti Proha – Uma mistura proteica hipoalergénica otimizada e de digestão fácil.

- L.reuteri – uma cultura probiótica ativa que, segundo o fabricante, tem a propriedade
de reduzir a regurgitação.

De uma forma geral, as fórmulas antirregurgitação reduzem em torno de 50% o


número de episódios de regurgitação diários. As fórmulas antirregurgitação à base de
goma jataí apresentam redução superior a 70%. Esses efeitos têm embasamento em
estudo que avaliou a persistência intragástrica de viscosidade elevada de fórmulas
antirregurgitação com goma jataí em relação a fórmulas antirregurgitação com amido.

nat.ceara@tjce.jus.br
4

Além disso, um estudo de revisão que ressalta as diferenças entre as fórmulas


antirregurgitação disponíveis também observou a maior viscosidade das fórmulas
antirregurgitação à base de goma jataí em relação às demais.

A fórmula é contraindicada para bebês com alergia declarada (ou suspeita) às


proteínas do leite de vaca. Não é indicado para utilização parenteral.

De acordo com o Protocolo Clínico Para Pacientes Portadores de Alergia à Proteína


do Leite de Vaca da Secretaria de Saúde do Estado do Ceará, a partir dos seis meses
de vida a criança deve receber alimentos saudáveis complementares ao aleitamento
materno (ou à fórmula prescrita em substituição ao leite materno, quando pertinente),
introduzidos de forma lenta e gradual, em consistência adequada, considerando seu
grau de desenvolvimento. O uso de fórmulas não deve prejudicar o consumo do
almoço, jantar e duas frutas diárias, atentando-se para não colocar o lactente em risco
de anemia ou outras deficiências nutricionais. A partir dos 12 meses de vida,
recomenda-se que a criança receba diariamente o valor máximo de 500 mL de fórmula
láctea sem adição de açúcar e farinhas, incluindo alimentação com frutas nos
intervalos das principais refeições. Este volume corresponde ao consumo mensal de
2,1 kg da fórmula Aptamil AR®, o que equivale a 3 latas de 800 g (e não 6 latas, como
demandado).

4) Sobre o registro pela ANVISA

Tabela De Produtos Para Saúde

Produto Indicação Registro Venciment Fabricante


para o do
saúde registro

Aptamil FÓRMULA INFANTIL PARA LACTENTES 665770018 02/2022 DANONE


AR E DE SEGUIMENTO PARA LACTENTES LTDA.
DESTINADA A NECESSIDADES

nat.ceara@tjce.jus.br
5

DIETOTERÁPICAS ESPECÍFICAS
ESPESSADA COM GOMA JATAÍ

5) Sobre a incorporação pela Comissão Nacional de Incorporação de


Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC)
A CONITEC não avaliou a incorporação ao SUS do produto Aptamil AR®.

6) Sobre a presença de Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) do


Ministério da Saúde ou de órgão público
Não há PCDT do Ministério da Saúde para o tratamento de regurgitação em crianças.

7) Dos tratamentos disponibilizados pelo SUS


Não há disponibilização de fórmulas nutricionais para crianças com
regurgitação/ruminação do recém-nascido pelo SUS.

8) Custo do tratamento

Tabela De Preços Para Insumos Para Curativo

Insumo Quantidade Mensal Custo Unitário Custo Mensal

Aptamil AR 800 g 06 latas 43,07 258,42

Levantamento foi realizado no intuito de obter valores referentes aos produtos


pleiteados em sites de empresas de produtos para saúde.

9) Conclusões

nat.ceara@tjce.jus.br
6

A parte autora é uma criança de 15 meses com o diagnóstico de ruminação do recém-


nascido. É filha de mãe portadora de HIV que, por este motivo, não pode amamentá-
la. A síndrome de ruminação é caracterizada por regurgitação e remastigação ou
expulsão dos alimentos logo após as refeições, sem náuseas ou ânsia de vômito. A
terapia de primeira linha desta condição inclui cuidados como a modificação dos
volumes de alimentação e o uso de ferramentas para engrossar o alimento. Na
abordagem de segunda linha, o uso de fórmulas nutricionais como o Aptamil AR ®
contribui para reduzir os episódios de regurgitação. A partir dos seis meses de vida, a
criança deve receber alimentos complementares ao leite materno (ou à fórmula
prescrita em substituição ao leite, como o Aptamil AR®). A partir dos 12 meses de vida,
recomenda-se que o consumo de outros alimentos seja aumentado e que a criança
receba o valor máximo diário de 500 mL de fórmula nutricional. Este volume
corresponde ao consumo mensal de 2,1 kg da fórmula infantil, o que equivale a 3 latas
de 800 g (e não 6 latas, como demandado). O relatório médico anexo ao processo foi
preparado quando a criança tinha seis meses de vida, em um momento em que as
demandas nutricionais eram diferentes da atual. É preciso considerar que, ao longo
do tempo, a necessidade do uso da fórmula nutricional deve ser reduzida e que dieta
da criança passa gradualmente a ser constituída por outros alimentos. Além disso, o
uso de estratégias para engrossar os alimentos é considerada uma abordagem de
primeira linha de manejo da criança com ruminação.

10) Sobre as perguntas formuladas pelo magistrado

a) há protocolos clínicos e terapêuticos no âmbito da Ministério da Saúde para o


tratamento da enfermidade que acomete o paciente? Justificar a conclusão à luz
da chamada “medicina baseada em evidências”.
Não.

nat.ceara@tjce.jus.br
7

b) quais as diretrizes nacional e internacional quanto ao uso do tratamento


requerido pelo paciente?
As diretrizes recomendam, como terapia inicial, modificações dos volumes e
frequências da alimentação, associada a medidas para engrossar os alimentos,
quando necessário. A abordagem de segunda linha inclui o uso de fórmulas
nutricionais como a Aptamil AR®, com redução progressiva do consumo ao longo do
tempo, à medida em que outros alimentos vão sendo incluídos na dieta.

c) o protocolo nacional para o tratamento da moléstia da paciente está em


consonância com a diretriz internacional? Sendo negativa a resposta, informar o
motivo.
Sim, o protocolo da Sociedade Brasileira de Pediatria está em consonância com
diretriz internacional. O SUS não tem protocolo de manejo da doença da paciente.

d) considerando a resposta dada ao quesito anterior, na opinião do Órgão


consultado, levando em conta a relação custo-benefício, seria recomendável a
alteração da diretriz praticada como forma de atender adequadamente demandas
de igual natureza, ou de promover a realização eficiente da correlata despesa
pública?
Não se aplica.

e) o tratamento requerido possui aprovação pela ANVISA e é disponibilizado


pelo SUS?
Sim, possui aprovação pela ANVISA. Não é disponibilizado pelo SUS. O sistema
público tem um programa de fornecimento de fórmulas nutricionais para pacientes com
alergia à proteína do leite de vaca, mas não para crianças com regurgitação.

f) Qual o custo do tratamento requerido?


O custo mensal, baseado na recomendação feita pela equipe médica quando a
criança tinha seis meses de vida, é de R$ 258,42. Considerando que após os 12
meses o consumo de leite ou fórmulas nutricionais deve ser gradativamente

nat.ceara@tjce.jus.br
8

substituído por outros alimentos e que há recomendação de restringir o uso de


fórmulas ao limite de 500 mL/dia a partir dessa idade, estima-se que o consumo do
produto pleiteado – e, portanto, também seu custo – seria reduzido à metade.

g) conforme o quadro de saúde apresentado pelo paciente, sendo positiva a


resposta ao quesito “a”, indaga-se, no caso de estar ela submetida ao citado
protocolo, se está a sofrer algum prejuízo no resguardo a seu direito à saúde?
Se a resposta for afirmativa, esclarecer e justificar.
Não há protocolo do SUS de manejo da doença.

h) considerando as respostas aos quesitos anteriores, pode-se afirmar que o


tratamento requerido na inicial é imprescindível à garantia de saúde ou da
dignidade da paciente?
Considera-se que o uso de fórmula nutricional como a demandada está bem indicada
para bebês com regurgitação/ruminação. Há evidência de que o uso do produto reduz
os episódios de regurgitação. Contudo, não há informação quanto à severidade do
sintoma ou ao uso de outra estratégia de manejo da doença, como modificações dos
volumes e frequências da alimentação e medidas para engrossar os alimentos. Além
disso, as necessidades nutricionais da criança são modificadas ao longo do tempo e, a
partir dos 12 meses, devem ser substituídas progressivamente por outros alimentos. O
relatório da equipe médica está desatualizado e o quadro atual da criança pode ser
distinto daquele que motivou o pedido do produto. Em casos selecionados,
intervenções farmacológicas disponíveis no SUS podem ser consideradas para
minimizar os sintomas.

i) existe alguma outra observação a ser feita especificamente em relação ao uso


do citado tratamento no presente caso?
Sugere-se uma atualização da recomendação médica, uma vez que a necessidade
alimentar da criança é progressivamente modificada ao longo do tempo.

11) Referências

nat.ceara@tjce.jus.br
9

1. Pediatric Gastroesophageal Reflux Clinical Practice Guidelines: Joint


Recommendations of the North American Society for Pediatric
Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition and the European Society for
Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition” Disponivel
gratuitamente, na integra no link:
https://www.naspghan.org/files/Pediatric_Gastroesophageal_Reflux_Clinical
.33.pdf

2. Sociedade Brasileira de Pediatria. Regurgitação do lactente (Refluxo


Gastroesofágico Fisiológico) e Doença do Refluxo Gastroesofágico em
Pediatria. Disponível em
https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/20031c-DocCient_-
_Regurg_lactente_RGEF_e_RGE.pdf

3. Danone. Aptamil AR: Monografia do Produto. Disponível em


https://www.academiadanonenutricia.com.br/pdf-material-cientifico/3801.

4. CONITEC. Fórmulas nutricionais para crianças com alergia à proteína do


leite de vaca. Novembro/2018.

5. Halland M et al. Rumination syndrome. UpToDate 2021. Acessado em


10/12/2021.

nat.ceara@tjce.jus.br

Você também pode gostar