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Registros Clínicos: cuidado e não relacionados ao episódio de cuidado

(identificação, sexo, idade, ou seja, os que não necessitam


O registro médico orientado por problemas (RMOP) tem ser atualizados a cada encontro).
sido empregado em diversos sistemas de atenção primária Obs: o registro deve ser sempre um sumário, para que as
à saúde e atua nas três esferas da competência informações estejam disponíveis, sem necessidade de
(conhecimento, habilidade e atitudes). frases completas.
Por causa da multiprofissionalidade das equipes de APS no Os registros podem não conter todas as informações sobre
Brasil, esse registro é denominado registro de saúde a pessoa, mas deve conter toda informação útil sobre o
orientado por problemas (ReSOAP), com a proposta de que motivo da consulta ou o problema de saúde apresentado,
todas as categorias profissionais se apropriem desse bem como dados de problemas inativos/resolvidos.
formato de registro e o incorporem em sua prática. Com
isso, essa ferramenta de trabalho apresenta o cuidado Lista de problemas:
qualificado e continuado pela equipe, levando em
“Problema ou condição é tudo aquilo que requer ou pode
consideração as especificidades de cada profissão e sua
requerer uma ação do médico ou da equipe de saúde e, em
prestação de cuidado.
consequência, motivará um plano de intervenção.”
O ReSOAP é um dos caminhos para o efetivo trabalho em
Os fatos passados que podem afetar ou afetaram a
equipe, funcionando como instrumento de comunicação
capacidade funcional e qualidade de vida da pessoa
das informações na equipe, na contribuição que traz ao
também são considerados problemas.
ensino e à pesquisa e também por facilitar a auditoria das
ações realizadas.

A história clínica hospitalar, em geral denominada história


da doença atual (HDA), apresenta aspectos estruturais que
dificultam sua utilização na APS. Por esse motivo, o ReSOAP
é mais adequado para a prática ambulatorial na APS. Dentre
esses aspectos, podem ser destacados os seguintes:

• Dificuldade para encontrar uma informação


específica, pois, da forma como está estruturada,
frequentemente se torna necessário ler todo o
registro.
• A sistematização do registro é feita em forma de Para constituir um problema, nem sempre a pessoa precisa
“funil” para se chegar a um diagnóstico específico. concordar com isso, o que é diferente do motivo da consulta
• Dificuldade para prestar o cuidado preventivo à e dos dados subjetivos. A única exceção aponta para os
pessoa, tendo em vista ser foco o diagnóstico dos dados sociais, incluindo pobreza e violência, ou seja, a
motivos imediatos de consulta. pessoa deve concordar que a condição em questão afeta a
• Possibilidade de induzir a repetição de condutas ou sua saúde, a fim de ser incluída na avaliação do dia em que
estudos diagnósticos, pois a forma de estruturação está sendo relatada, bem como na LP, evitando, assim, um
de seu conteúdo dificulta a compreensão julgamento muitas vezes moral do profissional. Caso a
longitudinal. pessoa não concorde, o profissional que entende que afeta
• Abordagem de cada profissional em separado, o a saúde deve primeiro convencê-la disso, para, então,
que limita a informação compartilhada por registrar.
diferentes membros da equipe da APS e pode
fragmentar o cuidado. Pode-se considerar que existem pelo menos duas LPs no
prontuário: uma que se pode chamar de principal, que
Um prontuário médico adequado deve dar acesso fácil e serve de capa do prontuário individual, na qual são
claro às informações sobre a pessoa, como dados colocados os problemas de grande relevância; e outra que
socioeconômicos, aspectos clínicos, diagnósticos, ações faz parte do registro de cada consulta realizada, sendo
implementadas, informações continuadas e principais representada pela letra A do SOAP. Além destas, pode-se
mudanças emocionais, sociais ou familiares. Os dados incluir a LP secundária (de menor relevância) e a LP
podem ser divididos entre relacionados ao episódio de
resolvida (correspondendo aos antecedentes pessoais da pessoa e inclusive de familiares sobre o que está
anamnese hospitalar), ambas no resumo clínico. acontecendo, sem deixar informações subentendidas.

SOAP: Sobre as queixas, é necessário incluir data de início, fatores


que causaram ou contribuíram para o surgimento do
O SOAP foi desenvolvido para poder visualizar o cuidado problema, história prévia de problema semelhante, como a
longitudinal e é um meio de autoavaliar a qualidade dos pessoa está manejando o problema, o que faz o problema
cuidados prestados, constituindo-se como um fator melhorar ou piorar, objetivos da pessoa com a consulta,
importante para a educação continuada. O SOAP ajuda a outro(s) profissional(is) que a pessoa está consultando ou
sistematizar as informações com vistas a validá-las e consultou, bem como modelo explicativo para o que está
aprofundá-las. Ao contrário da anamnese hospitalar, o sentindo.
diagnóstico tende a se fechar ao longo do tempo, e não ao
longo de uma única consulta ou encontro. Na revisão de sistemas, deve-se perguntar sobre mudanças
no estado geral de saúde nos últimos 12 meses. Também se
deve investigar sobre doenças e cirurgias passadas, levantar
a lista de medicações em uso e as utilizadas recentemente,
sempre com as doses, e perguntar sobre exames realizados
e hábitos como uso de álcool, tabagismo, atividade física.
Deve-se questionar sobre a história familiar para doenças
que tenham relevância familiar ao caso ou para fins de
prevenção.

No contexto, é importante incluir aspectos culturais e


religiosos que possam afetar o cuidado, como composição
da família, rede social e de apoio, além de perguntar sobre
emprego, tempo, local e condições de trabalho. No caso de
visita domiciliar, deve-se incluir descrição da casa e do
ambiente.

Ao se referir à pessoa que consulta, o ideal é usar o nome


próprio da pessoa e evitar o termo paciente.

Em reconsultas ou consultas de revisão, é importante


registrar a resposta aos tratamentos realizados e às
É importante que o registro no SOAP reflita o que realmente intervenções feitas, escrevendo (sempre que possível) com
se conhece sobre um determinado problema, com a maior as palavras da pessoa.
especificidade possível. Não se devem registrar informações
duvidosas, incorretas ou exageradas. O = objetivo:

O SOAP deve ser utilizado pelo médico em todas as A parte do O do SOAP trata do exame da pessoa, em que é
consultas com as pessoas atendidas, e seus principais relacionada a descrição da pessoa que está à sua frente,
objetivos são desenvolver um registro exato, breve e claro, suas emoções percebidas, os procedimentos do exame
contribuindo, assim, para um raciocínio e uma tomada de clínico realizado (sempre de acordo com as queixas) e os
decisões com qualidade. resultados de exames ou procedimentos. É a única parte do
SOAP que pode deixar de ser preenchida durante em uma
S = subjetivo: nesse primeiro item, coloca-se a história consulta (em situações que o motivo do encontro com a
relatada (fala espontânea) ou referida (resposta às pessoa não envolve a necessidade explícita de realizar
perguntas). É a parte em que se registram o que a pessoa exame clínico).
diz assim como informações qualitativas referentes a
queixas ou sintomas. Os componentes gerais e a ordem aceita do O são:

É importante registrar tendências de melhora ou piora (p. • Impressões do médico sobre aparência ou estado
ex., intensidade da dor, frequência e nível de temperatura geral da pessoa, procurando evitar siglas;
corporal), as alterações na funcionalidade, os indicativos de • Sinais vitais;
complicações, o grau de adesão, a percepção de resultados • Exame físico – estado mental, cardiológico,
na terapia instituída, entre outras informações. Enfim, deve- respiratório e abdominal. Em geral, preconiza-se
se incluir avaliação, entendimento e interpretação da realizar sempre aferição da PA e ausculta cardíaca,
e o restante do exame deve ser focado no problema anotadas as solicitações de consultoria ou
que motivou a consulta. referenciamentos.
• Resultados do laboratório e testes diagnósticos
Plano terapêutico: registra as indicações terapêuticas
complementares apresentados.
realizadas para buscar resolver o problema. Inclui tanto
Nesse item, são registradas as informações mensuráveis e indicações farmacológicas como dietéticas, de estilo de
observáveis. Os exames anotados nessa parte do SOAP vida, de terapias complementares, entre outras orientações
devem ter sua data de realização registrada. relevantes ao caso.

Além dos aspectos básicos de exame clínico e do exame Plano de acompanhamento: seleciona indicadores que
direcionado pela queixa ou pelos problemas apresentados, devem ser coletados regularmente ou solicitados de
observam-se e registram-se: maneira seriada, para controlar a evolução de cada
problema. Incorpora desde aspectos próprios do cuidado
• Habilidades de comunicação (aspectos relativos à (peso, exames auxiliares) até aspectos do automanejo e do
comunicação da pessoa, p. ex., se está apropriada autocuidado da pessoa (medida da glicemia capilar, diário
para a idade, se está normal ou alterada). de sintomas). Nos casos agudos, utiliza-se intensidade da
• Afeto (aspectos relativos ao afeto da pessoa, p. ex., dor, distribuição da dor, frequência da febre, intensidade da
se está adequado, se está normal ou alterado). febre, número de evacuações, disposição, etc. O importante
• Cognição (aspectos relativos à sua capacidade é que esses parâmetros sejam válidos para mostrar a
cognitiva). evolução e a análise do problema. Esses indicadores de
• Barreiras (informações sobre barreiras na seguimento, idealmente, devem ser confiáveis, de custo
comunicação ou no aprendizado, p. ex., visão, suportável, estabelecendo-se de forma antecipada a
audição, dificuldade para falar, dificuldades para frequência com a qual serão avaliados e o nível de alerta
entender, barreiras de idioma e outras situações para tomada de decisões. Podem-se usar folhas de fluxo
que podem dificultar a comunicação. Nesse caso, é quando forem relevantes no registro em papel ou
importante assinalar qual o melhor modo de desenvolver alertas ou checklist em registro eletrônico.
comunicação: desenhos, escrita, demonstração,
etc.). Plano educativo: contempla breve descrição que a pessoa
• Necessidades de educação (necessidades de deve receber sobre sua enfermidade, seu manejo e seu
educação também podem ser ressaltadas). prognóstico.

A = avaliação: Há também o plano de estudo, em que se anotam os temas


e aspectos que precisam ser estudados para melhorar o
A Avaliação é o lugar para colocar, no registro do encontro, desempenho no caso específico atendido.
a LP do dia, sejam problemas novos ou episódios já
iniciados. Deve incorporar a percepção do cumprimento do Prontuário eletrônico:
plano pela pessoa e pela equipe de saúde.
O prontuário eletrônico do cidadão e a coleta de dados
P = plano: simplificada do e-SUS AB são utilizados de forma
complementar nos cenários possíveis de informatização das
No P, são explicitadas as decisões tomadas: alterações de UBS nos municípios e no distrito federal.
manejo terapêutico, exames solicitados, referenciamentos
realizados, orientações e recomendações à pessoa, Vantagens e desvantagens do prontuário eletrônico:
aspectos a serem vistos ou revistos na próxima consulta.

Para cada problema identificado na consulta, torna-se


necessário elaborar em conjunto com a pessoa um plano de
manejo. Os aspectos a serem registrados nesse item podem
ser organizados por problemas (p. ex., S1-S2 / O / A1-A2 /
P1-P2) ou por uma forma geral, por lista única, por ordem
de prioridade ou não.

Plano diagnóstico: programa os meios diagnósticos


considerados necessários para esclarecer a origem do
problema. Essa parte do plano engloba informações a serem
recolhidas em nova consulta, exames de laboratório, de
imagem ou complementares. Aqui também devem ser
CIAP:
Classificação Internacional de Atenção Primária – é uma
ferramenta adequada à Atenção Básica que permite
classificar questões relacionadas às pessoas e não as
doenças. A CIAP2 evidencia os motivos de procura do
cidadão (sofrimento ou enfermidade) ao serviço de saúde,
mesmo que não sejam doenças objetivamente evidenciadas
por qualquer tipo de exame.

Referência:

DUNCAN, Bruce B.; SCHMIDT, Maria I.; GIUGLIANI, Elsa R J.;


e outros. Medicina ambulatorial: condutas de atenção
primária em prova . 5ª edição. Grupo A, 2022.

GUSSO, Gustavo; LOPES, José M. C.; DIAS, Lêda C. Tratado


de medicina de família e comunidade - 2 volumes:
princípios, formação e prática . 2ª edição. Grupo A, 2019

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