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1 - Trish
2 - Jordy
3 - Trish
4 - Archer
5 - Trish
6 - Trish
7 - Trish
8 - Trish
9 - Jordy
10 - Trish
11 - Jordy
12 - Trish
13 - Trish
14 - Trish
15 - Trish
16 - Archer
17 - Archer
18 - Trish
19 - Trish
20 - Jordy
21 - Trish
22 - Archer
23 - Trish
24 - Trish
25 - Trish
26 - Harrison
27 - Harrison
28 - Trish
29 - Trish
30 - Trish
31 - Trish
32 - Harrison
33 - Trish
34 - Jordy
35 - Jordy
36 - Trish
37 - Archer
38 - Archer
39 - Trish
Epílogo
Visualizar - Uma babá para los Bombeiros
Autora
Uma babá
para os
Mercenários
Copyright © 2023 Juicy Gems Publishing
Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação pode
ser reproduzida, distribuída ou transmitida de nenhuma forma sem
consentimento prévio da autora.
Editado por Robin Morris
Traduzido por Moema Sarrapio

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Trained At The Gym
Undercover Action
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Tiger Queen
Triple Play
Nanny With Benefits
Extra Credit
Hail Mary
Snowbound
Frostbitten
Unwrapped
Naughty Resolution
Her Lucky Charm
Nanny for the Billionaire
Shared by the Cowboys
Nanny for the SEALs
Nanny for the Firemen
Nanny for the Santas
Shared by the Billionaires
1

Trish

“Vamos lá, Trish! Você aguenta mais dois!”, Lisa me


repreendeu. “Boa! Isso! Mais um… e acabou!”
Gemi e recoloquei a barra de volta no suporte, então me sentei
e limpei o suor escorrendo pela minha testa com uma toalha.
Enquanto Lisa caminhava ao redor do supino para trocar de lugar
comigo, tentei recuperar o fôlego, respirando fundo e sentindo todos
os tipos de cheiro que só uma academia oferece. Me levantei e Lisa
se inclinou para limpar o banco antes de se deitar para começar sua
série
“É estranho pegar tanto peso,”, eu disse, “não quero ficar
tipo… grande e musculosa. Quero ficar tonificada.”
Lisa tirou a barra do suporte e começou a supiná-la como se
ela não pesasse nada. “Isso é mito. Você não vai ficar musculosa a
não ser que esteja comendo muito.”
“Você já viu quantos pedaços de pizza eu como nos fins de
semana?”, eu disse enquanto a assistia. “Sem contar meu café da
manhã de sábado: batatas Pringles.”
Ela revirou os olhos. “Treino de força não te deixa musculosa.
Acredite em mim. E queima mais calorias do que cardio.”
Eu acreditava em Lisa. Ela era minha melhor amiga e sarada e
seca como uma chita. Não que eu estivesse infeliz com o meu
corpo, ou pelo menos não mais do que o usual, mas o verão estava
chegando e eu queria ficar mais sexy usando biquini.
“Tudo correndo bem no abrigo?”, perguntei enquanto ela
descansava entre as séries.
Ela sorriu: “Melhor do que nunca. Bom, na medida do possível
considerando que é um abrigo para mulheres. Mas tudo bem. Várias
doações e novos voluntários. estamos fazendo um bom trabalho? E
o seu emprego?”
Os pesos bateram forte no suporte. “Melhor do que nunca,”,
respondi com sarcasmo, “fazer café é extremamente gratificante.”
“Eu me referia a sua busca por um trabalho mais duradouro.”,
ela respondeu, me encarando. “Sem sorte ainda?”
Sacudi a cabeça.
Lisa abriu a boca para dizer algo encorajador—ela sempre
fazia isso—mas seu olhar se desviou para algo atrás de mim. “Olha.
Caramelo e Bombom estão aqui.”
Me virei e segui olhar dela para o lado de fora da academia e
para o hall de entrada. Dois caras enormes e musculosos—que
eram chamados afetuosamente por nós de Caramelo e Bombom por
causa das cores dos seus cabelos—estavam se aproximando da
recepção para escanear suas pulseiras de membros. Ambos
usavam calça social e camisa polo azul marinho que abraçavam
seus corpos musculosos perfeitamente. Ambos carregavam bolsas
de ginástica nos ombros. Eles pareciam guarda-costas à paisana,
ou agentes do Serviço Social tentando passar despercebidos.
“Isso é novidade.”, disse Lisa acenando. Uma garotinha de
cabelos loiros e longos presos em uma trança os abraçou antes de
correr para dentro da creche ao lado e se juntar às outras crianças.
Ela batia na cintura de Bombom. Então os dois gostosões entraram
no vestiário masculinão.
“Não sabia que Caramelo tinha uma filha.”, eu disse.
“Não muda nada.”, Lisa disse enquanto se deitava para mais
uma série. “Nenhum deles usa aliança.”
“Talvez eles as tirem antes de se exercitarem?”, sugeri.
A voz de Lisa ficou tensa porque ela levantava a barra ainda
mais rápido do que antes. “Eu já os vi de perto antes de se
trocarem. Nada de aliança em nenhum dedo, amiga. Eles são
solteiros. E falando nisso, você ainda não me disse qual dos dois
quer.”
“Não gosto de secar os caras na academia.”, protestei.
“Bom, então eu fico com o Caramelo. Gosto do sotaque.”, ela
mordeu o lábio e grunhiu um som de satisfação.
“Nós odiamos quando os homens nos encaram na academia.”,
pontuei. “Não deveríamos fazer o mesmo.”
“Certo. Hm. Você é tão desmancha-prazeres quando está
desempregada, sabia?”
Ignorei o comentário e me posicionei no banco para completar
a última série de supinão. Então guardamos os pesos e fomos na
direção dos equipamentos de agachamento.
“Tem certeza de que minhas coxas não vão ficar enormes?”,
perguntei depois da minha primeira série.
“Não é assim que funciona!”, ela insistiu. “É um treino de corpo
inteiro. Especialmente sua musculatura central.”
Enquanto Lisa fazia sua série, Caramelo e Bombom entraram
na área dos pesos. Eles tinham se trocado e usavam bermudas
folgadas e regadas: a de Caramelo era cinza e a de Bombom era
azul e rosa neon. Meus olhos permaneceram neles um pouco—mais
especificamente nos seus músculos dos ombros de fora das regatas
—mas logo desviei o olhar. Porém, alguns segundos depois, eles se
aproximaram de nós.
“Ei, Anilha!”, Bombom me chamou. “Podemos usar este?”, ele
perguntou, apontando o rack de agachamento ao lado do nosso.
Bombom e eu só tínhamos interagido uma vez antes, e nós
estávamos na área das anilhas. Uma pitada de empolgação me
invadiu porque ele tinha me reconhecido.
“Ah, vocês podem me usar muito.”, Lisa respondeu
murmurando.
Olhei para ela com reprovação e respondi: “Podem sim.
Estamos revezando este aqui.”
Bombou me deu um sorrisão que fez seu rosto inteiro se
iluminar. Ele tinha olhos castanhos escuros, intensos e doces ao
mesmo tempo, que combinavam com os cabelos grossos e
exuberantes. Eu nunca tinha me atraído pelo cabelo de um homem
até conhecer esse cara. Imaginei a sensação de tê-los entre meus
dedos.
Pare agora, eu disse a mim mesma. Estamos aqui para fazer
exercícios. Não para ter pensamentos obscenos.
“Cento e cinquenta?”, Caramelo disse ao seu amigo em um
sotaque suavemente inglês. Eu não conhecia todos os sotaques da
Inglaterra, mas o dele era definitivamente da cidade dos gostosos.
“Setenta.”, Bombom respondeu. “Vou começar uma nova série
de cinco repetições com o máximo de peso.”
Era impossível não assisti-los de canto de olho. Eles reuniram
todos os pesos e os colocaram nas laterais da barra. Para pegar
meus pesos de quinze quilos eu precisava respirar fundo e
concentrar minhas forças, mas aqueles caras levantavam vários
pesos de vinte quilos com uma só mão como se eles não pesassem
nada.
Tudo bem assistir um pouco, pensei.
“Desculpa pela distração mais cedo.”, Lisa disse enquanto
fazia a próxima série de agachamentos. Depois que os caras
chegaram, ela começou a fazer agachamentos mais longos,
empinando mais ainda a bunda propositalmente. “Perguntei sobre o
trabalho. Nenhuma nova prospecção de emprego duradouro?”
“Nada. Nem uma única fagulha de esperança.”, respondi.
“Desisti da ideia de ser Au Pair na França. Eu ficaria feliz sendo
babá em qualquer lugar da Carolina do Norte. Ou do Sul. Ou até
mesmo em Virginia.”
“Você não está sendo muito exigente com os clientes?”, Lisa
perguntou. Ela colocou o peso de volta no suporte e se apoiou na
barra. “Eu sei que você prefere cuidar de uma criança só…”
Sacudi a cabeça. “Já abri mão das minhas preferências. E
ainda assim, nada.”
“Talvez eu consiga algo temporário para você no abrigo.”, disse
Lisa. “Surpreendentemente, temos muito serviço administrativo por
lá. Geralmente contratamos estudantes e estagiários, mas…”
“Obrigada, mas vou esperar um pouco,”, eu disse, “enquanto
isso… trabalhar de barista não é tão ruim.”
“Não foi o que você disse dois dias atrás.”
“Dois dias atrás eu estava especialmente puta.”, respondi
defensivamente. “Nem todos os dias são assim.”, a desculpa
pareceu fraca para os meus ouvidos e Lisa me olhou com pena.
Paramos de falar e voltamos a concentração para os
exercícios. Caramelo e Bombom estavam conversando sobre uma
crise internacional na Venezuela. Mas em algum momento o
assunto mudou e chamou minha atenção.
“Não sei o que vamos fazer com Kaylee.”, disse Bombom.
Kaylee, pensei com uma pontada de ciúme. Meu crush da
academia tinha uma namorada. Aquilo era totalmente inaceitável.
“Kaylee vai aprender a aceitar.”, Caramelo disse com seu
sotaque elegante.
Bombom sacudiu a cabeça. “Você lembra o que aconteceu ano
passado. Ela diz que gosta da colônia de férias, mas depois de
alguns dias já está com saudade. Se viajarmos por um longo tempo,
vai ser ruim. Ela vai ser expulsa na primeira semana, e fazemos o
que?”
“Vamos dar um jeito quando chegarmos nessa etapa.”
Colônia de Férias. Kaylee não era a namorada, era a
garotinha! Aprumei o corpo um pouco mais sabendo que meu crush
ainda podia ser solteiro.
Bombom se posicionou debaixo da barra e começou a fazer
agachamentos. O peso era tão intenso que a barra parecia ter se
curvado um pouco. Suas pernas se flexionavam e alongavam
poderosamente a cada agachamento. O suor escorria pelo seu
pescoço e ombros quando ele colocou a barra de volta no apoio e
deu espaço para o amigo.
“Você, que sempre tem tesão por logística, parece não estar se
preocupando nadinha com isso.”
“Aprendi que só devo me preocupar com coisas que posso
controlar. Você não dá crédito o suficiente a ela. Kaylee pode ser
bem independente quando precisa.”
“Ela precisa dos pais.”, Bombom insistiu, abaixando a voz.
Do meu lado, Lisa gemeu suavemente. “Merda.”
“O que foi?”, murmurei de volta.
Ela se inclinou para mais perto, para eles não ouvirem. “Pais.
Ele enfatizou. Eles são gays, Trish. Eu deveria ter imaginado que
eles eram bons demais para serem verdade.”
Olhei para ela, mas senti a mesma pontada de decepção no
peito. Fazia sentido, os dois estavam sempre juntos e perfeitamente
arrumados. Eles tinham uma filha que abraçou os dois antes de
entrar na creche. E Bombom estava usando uma regata rosa-neon.
O mundo é muito injusto as vezes.
Lisa e eu terminamos nossos agachamentos e começamos a
fazer o que ela chamava de Prensa Militar de Pé, o que consistia em
levantar a barra até acima da cabeça. os dois caras pegaram outra
barra e começaram suas séries de deadlifts perto de nós. Passamos
dez minutos concentrados nos exercícios em silêncio.
Quando eles terminaram, Caramelo caminhou até os pesos do
outro lado da sala, Bombom ficou por ali mais um pouco.
“Até a próxima, Anilha.”, ele disse, acenando. “E até onde eu
sei, não somos gays. Ou pelo menos, eu não sou. Não posso falar
por Archer. Acho que os britânicos são todos meio gays. Mas eu?
Definitivamente gosto muito do sexo oposto.”
Minhas bochechas coraram. “Não era para vocês terem
ouvido…”
“Sem problemas, só queria esclarecer.”, seu sorriso
permaneceu um pouco mais e seus olhos me encararam com
intensidade. Então ele se virou para ir embora.
“Quer tomar um drinque uma hora dessas?”, deixei escapar.
“Tipo hoje a noite?”, Lisa se engasgou com a água atrás de mim.
Bombom parou e se virou na minha direção, com uma
expressão surpresa cobrindo o belo rosto. Ele correu uma mão
pelos cabelos castanhos que voltaram para o lugar perfeitamente.
“Eu… hm, não posso.”, ele respondeu.
“Ou qualquer hora dessas.”, acrescentei esperançosamente.
“Não precisa ser hoje.
Seu sorriso mudou e uma pontada de tristeza o invadiu. Ou
talvez uma pontada de pena. “Não posso. Vou ficar fora do país por
um tempo.”, ele acenou e acrescentou: “Obrigado mesmo assim.”
O assisti se afastar com as bochechas ardendo de vergonha.
2

Jordy

Geralmente homens não são convidados para sair com


frequência. Nem mesmo homens como eu.
Ok, isso provavelmente soou muito arrogante, não foi minha
intenção. Mas é a verdade. Quando eu não estava fora de casa para
uma missão, fazia exercícios todos os dias, sem exceção. Manter
meu corpo em forma era literalmente parte do meu trabalho. E
acontece que eu também era bonito. E tinha um senso de humor
ótimo, na minha opinião totalmente imparcial. Eu nunca tive
problemas com mulheres. Quando eu estava no Exército, sempre
me dava bem enquanto os outros caras da minha unidade só davam
azar.
Mas o fato é: mulheres não me convidavam para sair com
frequência. Era sempre eu quem iniciava. Coisas da vida. Então
quando Trish, minha crush da academia a quem eu jocosamente
chamava de Anilha, me convidou para sair foi como ter recebido mil
elogios ao mesmo tempo. eu sorri com tanta intensidade que
minhas bochechas ficaram doloridas.
Mas então me lembrei que não podia aceitar.
Três porras de contratos. Por que eles tinham que ter
aparecido todos ao mesmo tempo?
“É assim meu karma…”, eu disse a Archer enquanto nos
trocávamos no vestiário. “Faz meses que eu penso nessa garota.
Meses. E ela me convida para sair hoje. Bem antes da nossa
viagem.”
“Que lamentável é a sua vida.”, Archer respondeu secamente.
“E a pior parte é que eu nem posso contar a ela a verdade.”,
tirei minha regata e vesti minha camisa polo. “Ela provavelmente
está pensando que eu menti. Que dei uma desculpa esfarrapada.”
Archer resmungou.
“O que foi?”, perguntei. “Te conheço o suficiente para saber
que você está pensando em algo e não quer dizer. Desembucha,
cara.”
Ele dobrou sua regata cuidadosamente, a colocou na bolsa e
se levantou para me encarar. “Você sempre faz isso, Jordy.”
“Faço o que?”
“Fica gamado em uma garota bem antes de um contrato
longo.”
Gargalhei. “Não fico não.”
Ele cruzou os braços e se encostou no armário. “Mel, logo
antes de Praga. Depois Amy, bem antes de voarmos para Kioto. Ah,
e aquela insolente que você quis sair sabendo que passaríamos
nove meses na Amazônia.”
“Eloise.”, sorri, me lembrando. “É, ela era ótima. Pena que
começou a namorar antes de voltarmos para os Estados Unidos.”,
sacudi a cabeça. “Mas não é a mesma coisa. essa garota… cara,
essa garota é diferente.”
É, eu tinha o hábito de me apaixonar intensamente. O que eu
posso dizer? Talvez eu fosse um combatente, mas eu tinha o
coração de um amante. Trish não era como as outras garotas de
quem eu tinha gostado. Havia uma faísca forte entre nós. Bem, só
tínhamos nos falado algumas vezes e compartilhado alguns olhares
e flertes na academia. Mas tinha algo no ar, droga! Eu queria
explorar a ideia, ver onde íamos parar…
Não tão cedo, pensei melancolicamente.
“Você precisa parar.”, disse Archer secamente. “Harrison e eu
precisamos que você se concentre nas missões sem passar a
viagem inteira sofrendo por amor por alguém do outro lado do
mundo.”
“Sofrendo por amor?”, zombei. “Eu sou sempre profissional!”
Ele levantou uma sobrancelha, o que era o equivalente
britânico de gargalhar na minha cara.
“Certo, eu admito. Eu estava mandando uma mensagem para
Eloise quando fomos emboscados em Manaus. Mas não significa
que eu faça isso sempre. Porra, nem fui eu que comecei o contato
dessa vez. Trish me chamou para sair!”
“Sim, de fato. E talvez quando voltarmos, você possa aceitar.
Mas por enquanto…”
Cerrei a mandíbula. “Não se preocupe comigo. Ficarei
concentrado.”
“Propriamente concentrado.”, ele disse, me dando um tapinha
no ombro. “Vão ser longos dois meses.”
Saímos da academia e passamos pela creche para pegar
Kaylee. Ela correu na nossa direção e se chocou contra minha
perna como um míssil. “Senti sua falta, papai!”, ela disse, agarrando
minha perna e depois indo na direção de Archer. “Senti sua falta,
papai!”
Senti uma torção entre as costelas. Só tínhamos passado uma
hora na academia, e ela já tinha sentido nossa falta tanto assim.
Como ela lidaria com a nossa ausência por meses?”
Saímos do complexo e dirigimos para a casa. me virei para
olhar Kaylee no banco de trás: ela jogava no iPad com fones nos
ouvidos.
Não vou vê-la por dois meses. Talvez três, dependendo da
missão.
“Nunca terminamos a conversa,”, eu disse a Archer, “o que
vamos fazer com ela?”
“Colônia de férias integral.”, Archer respondeu. “Até onde eu
sei, o plano não mudou.”
“Você sabe que ela não vai durar uma semana sem
enlouquecer.”
“Não sabemos,”, ele disse incisivamente, “o incidente do ano
passado pode ter sido uma casualidade. Ela está mais velha agora.”
“Não o suficiente.”, mordi o lábio e encarei as ruas de
Wilmington pela janela. “Que tal Trish?”
Archer me encarou. “É sério que você está falando nela de
novo?”
“Ela mencionou alguma coisa sobre ser au pair! Esse não é só
o nome rebuscado para babá?”
“Kaylee não precisa de babá. Ela precisa interagir com outras
crianças da sua idade, brincar e desenvolver habilidades.”
“É se for um sinal?”, sugeri.
Archer apertou os olhos na minha direção. “Sinal?”
“Precisamos de alguém que cuide de Kaylee enquanto
estivermos fora. E a garota que nós dois temos secado na academia
de repente menciona que quer ser babá rebuscada. Não te parece
um sinal?”
“Não acredito em tomar decisões importantes na vida baseado
na sua interpretação do que é ou não um sinal.”, Archer disse
enfaticamente. “E mesmo se eu concordasse com o seu ponto—
com o qual eu não concordo—eu preferia contratar alguém com
quem você não quer trepar.”
“Alguém com quem você também quer trepar.”, respondi.
Archer revirou os olhos. “Ela é bonita, não é a mesma coisa.
além disso, ela te chamou para sair. Qualquer competição que
possa ter existido acabou. Você ganhou. Parabéns.”
“Papai,”, Kaylee interrompeu, “o que é trepar?”
O tom de Archer mudou para a suavidade paternal. “Namorar
alguém, minha filha.”
“Eca.”
“Isso mesmo, eca.”, Archer me olhou. “Aumente o volume,
fofinha.”
Assisti Kaylee aumentar o volume do iPad e continuar a jogar.
Por mais que Archer tivesse me provocado por me apaixonar antes
de missões, nada se comparava ao impacto emocional que nossa
filha tinha sobre mim. Por mais clichê que parecesse, Kaylee era
meu tudo. eu odiava ficar longe dela por mais de alguns dias. Dois
meses seria uma tortura. E se ela não suportasse a saudade?
Ou pior: e se ela não sentisse saudade?
“As vezes eu odeio meu trabalho.”, eu disse amargamente.
“Certamente odeia.”, disse Archer. “Você odeia ser seu próprio
chefe e escolher suas próprias missões. Você preferia o tempo em
que era recruta, obedecendo ordens de um capitão gordo que não
consegue diferenciar sua arma da sua bunda gorda.”
“Eu não sinto saudade do Exército. E as duas coisas podem
ser verdade. só não entendo o porquê de você ter agendado tantos
contratos na sequência um do outro…”
Archer suspirou. “É a melhor coisa a se fazer, logisticamente.
Três missões longas, uma do lado da outra. Voamos para a Europa,
completamos tudo e voltamos para casa. vamos ganhar mais
nesses dois meses do que ganharíamos em anos. Isso significa
mais flexibilidade para passar tempo com Kaylee. Uma
inconveniência a curto prazo em troca de benefícios a longo prazo.”
“Nunca trabalhamos em missões assim antes.”, respondi. “Pelo
menos um de nós sempre ficou para trás para cuidar de Kaylee.”
“Estou ciente disso, Jordy.”
“Papai?”, Kaylee perguntou, tirando os fones de ouvido. “Vocês
vão viajar de novo?”
O nó entre as minhas costelas se apertou, mas eu dei um jeito
de sorrir. “Não sabemos ainda, Kaylee.”
Ela refletiu com toda a seriedade dos seus oito anos e colocou
os fones de volta. Archer me olhou, eu sabia no que ele estava
pensando. Precisaríamos dizer a verdade a ela logo: que
estaríamos fora por dois meses. Mas eu não queria ter aquela
conversa com ela. eu ainda não estava preparado.
Isso é um problema para o Jordy do futuro, pensei enquanto
encarava o lado de fora pela janela. Vou deixar o pobre diabo lidar
com isso.
Passamos no supermercado e fomos para casa. Na metade do
caminho, Archer disse: “Preciso de café.”, ele levantou a voz:
“Fofinha, você quer chocolate quente?”
O gritinho de empolgação de Kaylee foi o suficiente. Archer
saiu da rodovia e entrou na fila do drive-thru da Starbucks. Fizemos
nosso pedido pela janela: chocolate quente para a nossa filha, um
café regular para Archie e um Frapuccino de caramelo para mim.
O que foi? Não me julgue por tomar algo tão açucarado. Café
amargo é para pessoas amargas.
Archer parou na segunda janela e esperou nosso pedido. Não
sei o que me fez olhar para dentro, mas quando virei a cabeça para
a barista que estava pegando o cartão de crédito de Archer, acabei
olhando para dentro da Starbucks. Lá estava ela, no fundo, parada
perto do caixa, com os cabelos loiros amarrados no mesmo rabo-de-
cavalo que ela usava na academia. Era um contexto totalmente
diferente, e as roupas de academia deram lugar ao uniforme de
barista, mas reconheceria Trish em qualquer lugar. Um senso de
entendimento avassalador me abateu.
Isso é definitivamente um sinal, pensei. Não importa a opinião
de Archer.
Eu nem pensei no que estava fazendo, quando me dei conta,
tinha tirado o cinto de segurança e estava descendo do carro. “Vou
tirar água do joelho, volto em um minuto.”
A última coisa que ouvi foi a vozinha de Kaylee perguntando o
que era tirar água do joelho.
3

Trish

Quando foi que convidei um cara para sair pela última vez? Eu
nem me lembrava. Provavelmente nunca. Eu sempre esperei os
caras falarem comigo. Era difícil demais para mim iniciar qualquer
interação romântica. Convidar um cara na academia? Nunca
imaginei que teria coragem de fazer algo do tipo, mas acabei
fazendo… e fui prontamente rejeitada. Com uma desculpa péssima
ainda por cima. Sair do país por um tempo? ah, me poupe.
Eu não sabia como tinha conseguido terminar meu treino sem
morrer de vergonha. Pelo menos Lisa tinha sido solidária e tinha me
confortado.
Nunca mais chamo um cara para sair na vida.
Levei minhas frustrações para a esteira e acelerei até quase
não conseguir acompanhar o ritmo. O que mais me deixava
chateada era que eu estava em uma seca danada. Já faziam seis
meses desde que eu tinha dormido com alguém—não, espera, na
verdade nove meses. E tinha sido sexo casual de uma noite. Desde
então, eu tinha sido agraciada com primeiros encontros horrorosos e
uma infinidade de bizarros no Tinder. Conhecer alguém legal era
difícil.
E além do mais…
Seria legal ter sorte em pelo menos uma área da vida, pensei.
Eu estava ensopada de suor depois da corrida na esteira.
Depois de me secar e trocar de roupa, me despedi de Lisa e fui
trabalhar. Eu não me importava em ser barista na Starbucks.
Certamente existiam trabalhos piores e o salário era bom. Eu tinha
até benefícios sólidos e uma escala de trabalho flexível.
O que fazia o emprego ser ruim era o meu péssimo chefe. Ele
tinha vinte e nove anos, um metro e meio de altura e um grande
complexo de Napoleão por causa disse. sua concepção de liderança
consistia em ridicularizar todo mundo pela menor das infrações.
Ou em alguns casos, por infração nenhuma.
“Atrasada.”, ele disse quando caminhei para trás do balcão.
Sua voz tinha um tom que me fazia pensar que ele nunca tinha
atingido a puberdade.
Olhei para o relógio na parede. “Atrasada? Faltam cinco
minutos para o meu turno começar.”
“Mark Twain diz que se você não chega dez minutos antes, já
está trinta minutos atrasada.”, ele mencionou sabiamente.
“Isso não faz o menor sentido. E eu duvido que Mark Twain
disse isso realmente.”
“Se apresse, apenas.”, ele disse. “Preciso que você limpe os
moedores.”
Resmunguei, mas não disse nada. Meu chefe amava quando
as pessoas respondiam porque isso dava a ele a chance de usar
sua mísera autoridade. O melhor a fazer era abaixar a cabeça e
evitar sua fúria.
Limpar os moedores era um processo lento e tedioso que
sempre era reservado para quem ele desgostava mais naquela
semana. por alguma razão a pessoa designada fui eu. Tirei todas as
peças e as limpei com a solução própria, enxaguei minuciosamente
e as coloquei de volta no lugar. Quando terminei, peguei meu
telefone e conferi as vagas no meu aplicativo de empregos. Eu não
tinha olhado ainda naquele dia e senti uma pontada de esperança.
Não. Nada novo. Só as duas vagas de babá temporária para
as quais eu já tinha me candidatado e não tinha obtido nenhuma
resposta.
“Ei!”, meu chefe gritou, aparecendo ao meu lado de repente. “O
que você está fazendo?”
“Só checando meu telefone.”, eu disse. “Já terminei de limpar
os moedores como você pediu.”
“Celulares devem ficar dentro dos armários dos funcionários.”,
ele disse, curvando os lábios petulantemente. “Vou precisar te dar
uma advertência.”
Suspirei. “Sério? Só olhei para a tela por um segundo. Prometo
que não vai acontecer de novo.”
“Você gosta de ser desobediente?”, ele perguntou, levantando
a voz para os outros baristas ouvirem. Não fazia sentido em xingar
alguém a não ser que fosse para servir de exemplo. “Porque eu
tenho a impressão de que você não faz o seu trabalho direito
intencionalmente.”
“D-Desculpa.”, eu disse, engolindo o orgulho. “Você está certo.”
“Não me importo com as suas desculpas. Me importo com a
sua produtividade. Isso é um negócio, Patricia, não é caridade.”
Alguns clientes estavam assistindo. Senti minhas bochechas
ficarem vermelhas pela segunda vez no dia. “Entendido.”
“Você entendeu mesmo?”, ele disse, continuando o discurso.
“Você frequentou a universidade. Acho que ter um diploma não faz
ninguém inteligente, não é?”
O ódio me consumiu feito um incêndio, mas eu não pude dizer
nada porque um dos clientes foi mais rápido.
“Ei, relaxa, cara.”, disse um homem de ombros largos, vestindo
uma camisa polo. “Você não precisa ser tão cuzão assim.”
Bombom? Pisquei quando o vi do outro lado do balcão, com as
duas mãos apoiadas e encarando meu chefe de forma alarmante.
“Senhor, isso não tem nada a ver com você—”, meu chefe
começou.
“Você está sendo um cuzão com a minha amiga.”, disse
Bombom. “Então isso é meu problema também. você vai pedir
desculpas ou o que?”
Meu chefe zombou. “Desculpas? Por repreender uma
funcionária ruim?”, ele olhou para mim. “Patricia, você conhece este
homem?”
“Na verdade, não. Já volto.”, sai de trás do balcão e puxei
Bombom pelos braços até um canto reservado. Seu bíceps era
sólido feito mármore, mas quente ao toque.
“O que você está fazendo aqui?”, perguntei.
“Seu chefe é meio um merda.”, disse Bombom. Ele olhava por
cima do meu ombro e parecia estar pronto para brigar.
“Você está me criando problemas.”
“Não quero discutir com você, Anilha.”, ele disse, piscando.
“Mas parece que você já tinha problemas quando cheguei.”
“E você está piorando tudo. Eu preciso desse emprego.”
Seus olhos castanhos encararam os meus. “Ei, queria mesmo
falar com você sobre isso. Escutei você dizer a sua amiga na
academia que queria ser au pair?”
Pisquei. “Você estava bisbilhotando?”
“Estávamos do lado um do outro por vinte minutos. Não deu
para evitar. Mas se você estiver falando sério, talvez eu tenha uma
proposta de trabalho para você.”
Aquilo despertou meu interesse. “Mesmo? Um emprego? Tem
a ver com a menininha que vocês trouxeram para a creche? A que
não gosta de colônia de férias?”
As sobrancelhas dele se ergueram. “Quem é a bisbilhoteira
agora?”
Comprimi os lábios. “Como você disse, não deu para evitar.”
Ele sorriu astutamente e respondeu: “Sim o trabalho envolve
cuidar dela.”
“É temporário?”, perguntei, sentindo minha esperança
aumentar. “Ou por longo tempo?”
“Definitivamente por um longo tempo.”, ele respondeu.
Antes mesmo de pensar, respondi: “Topo!”
Bombom ficou surpreso. “Espera, sério?”
Eu faria qualquer coisa para me livrar daquele trabalho, mas
especialmente o que eu queria de verdade: cuidar de crianças. E o
fato dele aparecer de repente no meu trabalho e me oferecer a
oportunidade? Parecia que alguém estava me jogando um colete
salva-vidas. E eu certamente não ia ficar só olhando.
“Se for uma vaga para babá por longo tempo, eu topo.”
Ele hesitou. “Fico feliz em saber, mas não te demos detalhes
ainda, sabe… você tem certeza de que quer o trabalho?”
Atingida pelo raio do impulso, caminhei até o balcão de onde
meu chefe me encarava o tempo todo. ele sorriu cruelmente
enquanto me aproximei, provavelmente pensando em como iria me
punir.
Sorri de volta para ele: “Me demito.”
A forma como seu sorriso se dissipou foi mais satisfatória do
que uma dúzia de orgasmos. “O que? Você não pode sair, Patricia.
Seu turno acabou de começar.”
Tirei meu avental e meu boné e os joguei no balcão. “Só olha.”
Virei de costas e caminhei até Bombom que me encarava
incrédulo. Ele exalava sensualidade mesmo completamente
surpreso.
“Respondendo sua pergunta: sim. Tenho certeza.”
Ele sorriu com alívio e empolgação e aquilo fez meu peito
esquentar. Ele tirou um cartão do bolso e me entregou.
“Presumo que você esteja disponível agora. Me encontre neste
endereço em uma hora para falarmos sobre isso.”
Bombom sorriu e saiu da loja. Olhei para o cartão que trazia
letras brancas impressas:

Jordan Mackey
Mathos S.A.

Fiz uma careta. “Que diabos é Mathos S.A.?”


4

Archer

“Você fez o que?”


Me esforcei para manter a voz calma enquanto nos
afastávamos da Starbucks. Kaylee estava no banco de trás,
cantarolando feliz enquanto bebia seu chocolate quente. Desejei
que nossa filha não estivesse ali para eu poder dizer ao Jordy o que
eu realmente pensava.
“Fofinha?”, eu disse por cima do ombro. “Você está ouvindo
música?”
Ela assentiu sem desviar os olhos do iPad.
“Que bom! Aumente seu volume um pouquinho, por favor?”
“Escuta,”, disse Jordy, “as duas podem ir para a Europa
conosco!”
Mais uma vez precisei de esforço para manter minha voz
inalterada enquanto respondia: “Você quer levar nossa filha de oito
anos para missões fora do país?”
“Não estou dizendo para levarmos Kaylee para os lugares das
missões. Elas podem ir conosco e ficar na cidade mais próxima. Na
nossa base de operações. Pense nisso, Archer, podemos vê-las
quase todas as noites.”
“Kaylee,”, sibilei, “nós podemos ver Kaylee quase todas as
noites. Não elas.”
“Certo, foi o que eu quis dizer. Vamos lá, cara. Quais eram as
chances de ela estar trabalhando justamente na Starbucks que
paramos? Isso tem que ser um sinal, não é?”
Sacudi a cabeça, descrente. Jordy tinha o hábito de se
apaixonar assim. Era a coisa mais previsível do nosso amigo e que
enlouquecia a mim e a Harrison. Vê-lo fazer isso de novo era
inacreditavelmente frustrante. Como assistir um acidente de carro
em câmera lenta sem poder fazer nada.
Uma pinoia que eu não posso fazer nada.
“Não podemos.”, eu disse.
“Por que não?”, ele perguntou.
“Porque é imprudente.”, respondi. “E não deveríamos tomar
decisões importantes assim tão impulsivamente.”
“Você quer passar meses sem ver nossa filha?”
“Claro que não, mas isso não significa que…”
Parei de falar quando Jordy esticou o braço e removeu os
fones de ouvido de Kaylee. “Docinho, você ama seus papais?”
“É claro.”, ela disse simplesmente, como quem constata que o
céu é azul.
“Você ficaria triste se não pudesse nos ver por um longo
tempo?”
“Muito triste!”, ela exclamou. “Quem vai me colocar na cama a
noite?”
Olhei lentamente para Jordy. “Isso é jogo sujo e você sabe
disso.”
Em sua defesa, ele fez uma careta. Ele tinha vergonha na cara
mesmo quando estava sendo insistente.
O mais frustrante era ele pensar que eu não queria aquilo o
mesmo tanto que ele. O que, é claro, não era verdade. Eu queria
desesperadamente passar cada dia da minha vida com Kaylee. Meu
coração doía só de pensar em estarmos separados. Eu temia
aquela viagem o mesmo tanto que Jordy. Eu só não queria uma
solução meia-boca.
Mas se Kaylee fosse conosco…
Me permiti pensar no caso por um momento. Ver Kaylee todos
os dias na Europa. Se não fosse todos dias, pelo menos
frequentemente o suficiente para fazer diferença. Colocá-la na cama
a noite, ler uma historinha, estar lá quando ela acordar de manhã e
abraça-la ainda meio sonolenta.
Era tentador e minha alma desejava muito aquilo. Sem
mencionar o fato de ter uma mulher como Trish conosco, depois de
secá-la por meses na academia…
“Não.”, respondi.
“Ela vai nos encontrar em casa em uma hora.”, Jordy
respondeu.
“Mas não vai mesmo.”, respondi. “Temos que organizar as
coisas. O equipamento precisa ser enviado amanhã para estar lá
quando chegarmos. Sem mencionar o resto da logística toda que
precisamos rever.”
“Vamos conversar todos.”, Jordy insistiu. “Nada mais. Só
conversar.”
“Harrison não gosta de estranhos.”
“Ele vai gostar dela se ela nos possibilitar ver Kaylee todos os
dias.”
Olhei para ele.
“Ok, talvez não.”, ele admitiu. “Mas ele vai aceitar se nós dois
aceitarmos.”
Olhei para ele de novo.
“Ok, ele é teimoso feito uma mula.”, disse Jordy. “Mas talvez
ele goste do planão.”
Vamos ver o que acontece.
Quando chegamos em casa, Kaylee imediatamente correu
para o andar de cima para brincar no quarto. Jordy e eu
encontramos Harrison, o terceiro sócio da nossa equipe, dentro do
armário de armas na garagem. O grandão tinha aberto uma M9A1
personalizada sobre a mesa e limpava meticulosamente cada
componente com uma esponja de aço. Sua barba ruiva
desordenada estava coberta de graxa.
“Jordy tem algo para te dizer.”, eu disse como uma saudação.
Harrison colocou o rifle na mesa sem dizer uma palavra e virou
seus olhos intensos para Jordy.
“Então, hm. Eu tive uma ideia. Mas ela envolve uma quarta
pessoa…”
A última coisa que ouvi foi um rugido baixo emitido por
Harrison enquanto eu caminhava de volta para a casa. descarreguei
as compras e comecei a preparar o jantar. Parecia uma coisa tão
pequena e mundana. Realizar todas as atividades diárias como se
não estivéssemos prestes a ficar fora por dois meses.
Seria mais fácil se Kaylee fosse conosco…
Comecei a pensar um pouco mais no assunto. Kaylee não
correria risco nenhum. Durante a primeira missão ela poderia ficar
no centro da cidade enquanto cumpríssemos nosso contrato com o
tratado de paz. Os outros dois trabalhos seriam mais complicados…
mas talvez desse certo.
Entretanto, será que ela se daria bem com Trish? Nós três
éramos um grupo difícil de lidar até na melhor das circunstâncias.
Imagina enquanto estivéssemos trabalhando em um contrato, com
os nervos a flor da pele e o temperamento não muito amigável. Ela
veria o pior de nós.
Tenho medo disso, me dei conta. Se Trish me conhecer melhor,
quero que seja nos meus próprios termos.
Depois que Jordy voltou da garagem, ele se sentou na mesa
da cozinha com seu laptop e começou a trabalhar. Havia muita
papelada e logística envolvida no envio de equipamento no dia
seguinte—três tipos diferentes de equipamento para três missões
completamente diferentes. Sem mencionar o equipamento local que
precisaríamos conseguir. Enquanto eu terminava o jantar, Jordy
ficou de pé e começou a caminhar em círculos. Fazia muito tempo
que eu não o via nervoso daquele jeito.
Quando a campainha tocou, ele praticamente pulou e correu
para a porta como um adolescente nervoso esperando pelo seu par
para o baile de formatura. Terminei de mexer o molho do macarrão,
coloquei a colher sobre uma toalha e me virei para encarar a porta
aberta.
Trish era uma mulher atraente. Aquilo era óbvio na academia,
mas quando ela entrou na nossa casa, vestindo uma saia lápis e
uma camisa como se estivesse prestes a ser entrevistada para uma
vaga em um escritório. Seus cabelos loiros não estavam presos em
um rabo-de-cavalo, mas sim soltos e suas ondas passavam dos
ombros.
Ela sabe se vestir muito bem. Consegui entender por que Jordy
gostava dela. Não que eu nunca a tivesse admirado na academia…
mas eu era muito mais contido do que Jordy. Se ele não tivesse por
perto…
“Você está muito… profissional.”, eu disse.
Trish sorriu estranhamente. “Não sei como me vestir para este
tipo de entrevista! Geralmente peco pelo excesso. Mas é melhor do
que usar calças de moletom!”
“Não sei se oficialmente fomos apresentados, mas sou Jordan
Mackey. Você pode me chamar de Jordy. Ou de J-Mac.”
“Ninguém te chama de J-Mac.”, eu disse.
“Eu tenho um amigo do Exército que me chama de J-Mac faz
anos!”
Fiz contato visual com Trish. “Isso não é nem um pouco
verdade.”
Jordy fez um gesto. “Meu amigo desmancha-prazeres aqui é
Archibald Caspian, mas você pode chama-lo de Archer. Ou de
Archie, se você estiver de bom humor.”
Me aproximei dela e apertei sua mão. “Archer, por favor. Prazer
em conhecê-la, Trish.”
“É um prazer conhecer vocês dois de verdade,”, ela disse, “e
saber quais são os seus nomes reais.”
“Nomes reais?”, perguntei. “Ao invés de…?”
“Nada. Ao invés de… nada.”, sua pele alva ficou corada.
Harrison escolheu justamente aquele momento para entrar na
casa. Ele vestia uma regata verde e tinha graxa e produtos de
limpeza para armas espalhados pelo corpo e pela barba ruiva
desgrenhada. Não era uma cena bonita. Ele ignorou Trish e foi
diretamente para a pia, lavar as mãos. Então pegou uma cerveja na
geladeira e a abriu.
Ele está ignorando Trish, pensei, isso é um mau sinal.
“O terceiro membro da equipe é Harrison Gray.”, Jordy
explicou.
Trish deu um sorriso. “Vou adivinhar. Posso te chamar de
Harry?”
Os lábios de Harrison se curvaram em um grunhido
animalesco. Trish deu um passo inconsciente para trás.
“Você pode chamá-lo de Harrison.”, eu disse secamente.
“É melhor não cutucar a onça com vara curta.”, Jordy
acrescentou sussurrando.
“Hm, ok. Desculpa. Muito prazer, Harrison.”
Harrison a encarou por um longo tempo, investigando-a. Então
se virou e se afastou sem dizer uma palavra.
“Eu fiz algo de errado?”, Trish perguntou.
“Honestamente, nunca o vi tratar alguém novo assim tão bem.”,
Jordy respondeu com uma gargalhada nervosa. “Agora que todos
fomos apresentados, vamos falar sobre o trabalho. Precisamos de
uma babá para nossa filha, Kaylee. Alguém para viajar conosco,
assim poderemos ver Kaylee mesmo estando longe de casa.”
Se ela achou estranho chamarmos Kaylee de nossa filha, ela
não deu nenhum sinal. “Para onde vocês vão viajar?”
Respondi antes que Jordy pudesse falar: “Não podemos falar.”
Trish gargalhou, mas parou de repente. “Ah, não foi uma
piada!”
Sacudi a cabeça. Seu rosto parecia um pouco pálido.
“O cartão diz Companhia Mathos. O que vocês fazem? Vocês
trabalham com tipo, exploração de petróleo ou algo assim? Tentei
pesquisar, mas não achei nenhuma informação na internet.”
Jordy e eu nos entreolhamos.
“Somos um grupo de empreiteiros qualificados que,
ocasionalmente facilita o movimento ou o descarte de artigos ou
pessoas.”
Ela olhou para nós dois, um de cada vez. “O que isso significa?
Vocês são tipo… caminhoneiros?”
“Não.”, respondi. “Não somos caminhoneiros.”
Ela gargalhou suavemente. “Olha, eu quase poderia supor que
vocês são assassinos ou mercenários…”
Mantive meu rosto o mais inexpressivo possível. Jordy fez o
mesmo e fiquei muito grato.
“Ah.”, Trish engoliu em seco. “Entendi.”
“O contrato é por dois meses,”, expliquei, “possivelmente três,
dependendo do tempo que levaremos para completar nossos
objetivos.”
Trish ficou surpresa. “Espera um minuto. Pensei que você tinha
dito que era um trabalho por um longo tempo!”
“Bem, e é,”, Jordy respondeu, “dois meses é muito tempo,
especialmente comparado a ser babá só por um fim de semana.”
“Mas existe a possibilidade de virar um trabalho mais
duradouro?”, ela perguntou incisivamente.
“Não.”, respondi. “Seus serviços não serão mais necessários
depois dessa viagem. Dois meses, três meses no máximo.”
Trish se virou e caminhou na direção de Jordy. “Eu me demiti
da Starbucks por isso! Você disse que era por um longo tempo!”
Jordy ficou cabisbaixo. “Não me dei conta de que tínhamos
conceitos diferentes para o termo. Não tentei te engambelar nem
nada.”
“Preciso de algo mais permanente.”, ela disse. “Não do tipo
permanente, permanente. Mas tempo o suficiente para ser
consistente. Por que eu aceitaria este trabalho? Depois de três
meses vou ter que começar a procurar outra coisa de novo!”
“Lamentamos ouvir isso,”, eu disse, apontando para o corredor,
“te acompanho até a porta.”
“Dê uma chance.”, Jordy pediu, pulando na frente dela. “Três
meses é melhor do que nada, certo?”
“Se ela quer ir embora, deixe-a ir.”, eu disse.
Me dei conta de que me senti um pouco triste. Parte de mim
esperava que o acordo funcionasse e que levaríamos Kaylee
conosco. Mas bem no fundo, eu sabia que o melhor era não a
levarmos. Não queríamos pressionar alguém a cuidar da nossa filha.
Só daria certo se a pessoa se dedicasse completamente ao
trabalho. E bom, considerando tudo, era melhor para nossa filha
ficar nos Estados Unidos.
Eu estava prestes a dizer isso quando Kaylee desceu as
escadas.
5

Trish

Eu não conseguia acreditar em como eu tinha arruinado tudo.


O trabalho não era estável, era temporário. Três meses, no máximo.
Depois disso, eu voltaria à estaca zero.
E o pior… aqueles caras eram nada do que eu esperava. Eles
eram mercenários. Assassinos de aluguel. Soldados da fortuna.
Eles matavam pessoas? E outras práticas sombrias e ilegais? Eu
não tinha ideia e nem queria descobrir.
Será que eu conseguiria voltar para o meu emprego antigo?
Meu chefe não me aceitaria de volta, e se o fizesse, ele me faria
rastejar primeiro. Será que meu orgulho aguentaria a humilhação
pública?
“Papai! Papai! Eu construí um avião… quem é essa?”
A garotinha—Kaylee—parou no meio do corredor quando me
viu. Ela estava usando um vestido amarelo florido e sua longa
trança loira sacudia por cima de um dos ombros. Meu coração
derreteu quando eu a vi. A garotinha que eles tinham deixado na
creche. A filha deles.
Quando eu era mais nova, odiava crianças. Eu era a mais
velha de três e minhas irmãs mais novas me enlouqueciam. Foi só
quando fui para a faculdade que me dei conta do quanto eu as
amava, sentia sua falta e gostava de ajudar a minha mãe na criação
delas. Às vezes, você só precisa ficar longe para perceber como
uma pessoa é importante para você.
E passei a amar crianças. Trabalhar de babá ou de cuidadora
fazia parte de mim, preenchendo meu coração e minha alma. Ver
Kaylee acionou aquele amor dentro de mim.
“Meu nome é Trish.”, eu disse, me abaixando para ficar da
altura dela.
Sem hesitação, Kaylee correu e se jogou nos meus braços.
“Meu papai gosta de abraços, então também gosto.”
“Isso é bom. Também gosto de abraços.”
“Esta é Kaylee, nossa filha.”, disse Jordy.
Nossa filha. Aquela frase de novo. Mas Jordy tinha dito que
eles não eram gays. Como funcionava aquilo exatamente? Eu
estava muito curiosa, mas certamente não perguntaria nada na
frente da garota.
“Você quer brincar de K’nex comigo?”, ela perguntou.
“O que é K’nex?”,
“Te mostro!”, ela agarrou minha mão e me puxou. Mas de
repente, ela se lembrou, parou e perguntou: “Tudo bem se eu
brincar com a Trish?”
“É claro que sim.”, Jordy disse rapidamente. “Aposto que ela
vai adorar seu quarto de brinquedos.”
Kaylee me guiou para fora da cozinha, atravessamos o
corredor e entramos no quarto de brinquedos. Era um tipo de jardim
de inverno, com uma parede toda de vidro e duas claraboias no teto.
Havia uma escrivaninha em um dos cantos, mas o resto todo tinha
sido planejado para uma criança. Brinquedos coloridos se
espalhavam pelo chão.
“Seu cabelo é bonito.”, disse Kaylee.
“Obrigada! O seu também. Especialmente a trança.”
“Meu papai trança meu cabelo para mim.”
Será que ela está falando de Archer ou de Jordy? Pensei.
Provavelmente de Jordy, Archer parecia muito nobre para trançar
cabelos.
“Isso é K’nex?”, perguntei, apontando para um balde de
plástico.
“Sim.”, Kaylee respondeu muito séria. “Alguns dos meus
amigos brincam de Lego, mas K’nex é melhor.”
Ela se sentou no chão e eu me juntei a ela, me sentando de
lado por causa da saia que vestia. As peças de K’nex eram feitas de
plástico com hastes finas que poderiam ser encaixadas em outras
peças conectoras.
“O que você quer montar?”, perguntei.
“Meus papais voam muito de avião,”, ela explicou, “eu montei
um avião.”, ela levantou um objeto triangular formado por três
peças: um conector e duas hastes formando as asas.
“Uaaaau.”, eu disse, com aprovação. “Ficou muito bom!”
“Pode ficar melhor.”, disse Kaylee. “Vamos montar mais aviões.
Você faz um eu, eu faço outro.”
“Gostei do seu plano!”
Pegamos as peças de K’nex do balde e começamos a
trabalhar. Kaylee estava concentrada em silêncio construindo um
avião maior e mais complexo do que o que ela tinha me mostrado.
Eu assisti a garotinha e tentei fazer o meu o mais parecido possível
com o dela, embora tenha montado um avião com as asas curvadas
e não retas.
“O que você acha dessa viagem?”, perguntei depois de alguns
minutos de silêncio.
Ela respondeu sem me olhar. “Que viagem?”
“A viagem que seus papais me contaram. Que vai durar dois
ou três meses.”
Ela me olhou bruscamente. “Eles vão ficar fora por três
meses?”, havia pânico na sua voz e em um piscar de olhos ela
estava prestes a chorar.
“Não, está tudo bem! você vai com eles!”, eu disse
rapidamente. “Não quis te assustar!”
Ela relaxou visivelmente. “Que bom. Gosto de viagens.”, ela
levantou seu avião. “O que você acha?”
“Ficou muito bom.”, eu disse, mostrando o meu próprio avião.
“Muito melhor que o meu.”
“O seu está bom.”, ela disse. “Da próxima vez te ensino a fazer
um melhor.”
“Ok, obrigada.”, eu disse. “Sou iniciante. Preciso de ajuda.”
Kaylee assentiu. “Vamos mostrar para os meus papais!”, ela
pulou de pé e saiu correndo do quarto. Precisei acelerar para
conseguir acompanhá-la.
Os três homens estavam ao redor da ilha na cozinha,
discutindo algo em voz baixa. Harrison—o grandão mau humorado
que praticamente rosnou para mim—me deu outro olhar escaldante.
Tentei ignorar e levantei meu avião para eles examinarem.
“Que avião ótimo!”, disse Jordy, se inclinando para beijar a
testa de Kaylee. “Estou tão orgulhoso de você. Você vai ser
engenheira quando crescer.”
“É tipo o avião da viagem?”, Kaylee perguntou.
Archer piscou. “Como assim, fofinha?”
“A viagem.”, ela apontou para mim. “Trish me contou que vocês
vão viajar por três meses.”
Imediatamente soube que tinha cometido um erro. Os olhos de
Archer se arregalaram de surpresa e Jordy ficou boquiaberto. Tentei
não olhar na direção de Harrison, mas ouvi seu suspiro de
infelicidade.
“Eu não sabia que não podia falar nada.”, me desculpei.
“É minha culpa.”, Jordy disse rapidamente aos colegas. “Eu
não disse a ela que era segredo.”
Archer estava totalmente concentrado na filha. “O que você
acha disso, fofinha? Você não parece chateada.”
“É claro que não.”, ela respondeu. Os homens pareceram
relaxar até Kaylee continuar: “Porque Trish me disse que também
vou com vocês.”
Senti todos os olhos na minha direção. E dessa vez Harrison
rosnou feito um lobo. Ele tinha uma cicatriz debaixo do olho que
sumia no meio da sua barba, dando um ar ainda mais perigoso ao
homem. Considerei se deveria me manter firme ou sair correndo
antes que eles tivessem a chance de me matar.
“Então,”, disse Jordy com um sorriso estranho, “você pode
começar semana que vem?”
6

Trish

Eu podia sentir que eles começariam a brigar logo que eu


fosse embora. Ela pairava no ar, como o cheiro antes de uma
tempestade.
“Entraremos em contato com os detalhes.”, disse Jordy me
guiando para a porta da frente. “Obrigado por vir. Vai ser ótimo.
Muito ótimo!”
“Não tenho certeza ainda,”, eu disse, “realmente estava
procurando por algo mais duradouro. É mais fácil assim. E não só
para mim—para Kaylee também. Não é ideal ela se aproximar de
mim, passar todos os dias comigo por três meses e eu desaparecer
de repente.”
“Vamos ver.”, Jordy respondeu. “Por enquanto, vamos fazer a
coisa certa por você. Te pagaremos a mais ou te daremos algum
tipo de bônus pela viagem. Mas ei, fazer isso por alguns meses é
melhor do que voltar para a Starbucks, não é?”
“Sim.”, admiti. “Vamos ver se ainda vou me sentir assim
quando tudo acabar. Viajar com uma criança pode ser difícil. Você
não pode mesmo me contar para onde vamos?”
Jordy parecia querer me contar, mas ele sacudiu a cabeça.
“Não até você assinar alguns papeis. Archer cuida dos documentos
e da coisa toda. Entramos em contato nos próximos dias, ok?”
Ele esticou seu punho e eu bati nele com o meu próprio. Eu
não tinha reparado no tamanho das mãos dele até aquele momento.
o sorriso de Jordy era caloroso e convidativo, e me fazia me sentir
como se tudo fosse dar certo.
“Ok.”, respondi.
Caminhei até meu carro mas segundos depois ouvi o som de
pezinhos descalços contra o pavimento. Kaylee abraçou minha
perna.
“Quero brincar mais com você!”
Meu coração inflou. “Ainda teremos muito tempo para
brincarmos juntas. Prometo.”
Quando finalmente consegui tirá-la das minhas pernas, ela
correu de volta para dentro. Jordy ainda me olhava da porta quando
dirigi para longe da casa. Depois de dois quarteirões, liguei para
Lisa.
“Vamos tomar um vinho hoje. Tenho muita coisa para te
contar.”
Eu já estava na segunda taça quando Lisa chegou na minha
casa. “Bombom mudou de ideia sobre o encontro?”, ela perguntou.
“Ele descobriu seu número e te chamou para sair?”
“Não exatamente…”
Servi uma taça para ela e expliquei o que tinha acontecido. O
fato de Jordy aparecer no meu trabalho e me oferecer um emprego.
Minha ida a casa deles… ter conhecido Kaylee. Lisa reagiu
engolindo seu vinho e se servindo de mais uma taça.
“Três mercenários? Tipo o filme que meu pai adora? Tipo
criminosos de guerra?”
“Sim. talvez? Eu não sei. Nunca conheci mercenários antes!”
“Isso explica todos aqueles músculos. Eles tinham armas na
casa?”
“Vi Harrison, o terceiro cara, carregando uma caixa enorme
para fora da garagem, mas não sei o que era.”
“Harrison. Hmm, gosto desse nome. Ele é tão sexy quanto
Caramelo e Bombom?”
“Ele é bem assustador, na verdade.”, respondi. “Ele não é feio,
mas é tipo um leão de mau humor, à espreita. Você nunca sabe se
ele vai te atacar ou não.”
“Um leão sexy? Hmm. Sim, por favor. Ele é sarado?”
“Ah, sim. Mais forte que os outros dois.”
Ela se recostou na cadeira e suspirou desejosamente. “Eu
gosto do tipo fortão e quieto. Não precisa falar nada. É só me jogar
na parede, por favor.”
Estalei os dedos na frente dela. “Lisa. Foco. Eu tenho um
problema real aqui. O que devo fazer?”
“Me parece que você já aceitou o trabalho.”
“Mais ou menos. Verbalmente. Mas não assinei nada ainda. Eu
deveria fazer isso?”
Ela me olhou confusa. “Por que não? Você vai trabalhar
fazendo o que ama.”
“Mas só por dois ou três meses.”
“E você vai passar mais tempo com Bombom e Caramelo!”
“Eles se chamam Jordy e Archer.”
Ela acenou irritada. “Eles vão sempre ser Bombom e Caramelo
para mim. E se eles me oferecessem uma viagem com eles, eu iria
de graça.”
“Eu estou falando sério.”, insisti. “Não sei se posso fazer isso.
viajar para fora do país por tanto tempo…”
“Por que não? Não tem nada que te segure aqui.”
“Não sei. É que… é muito tempo? Nunca saí do país antes e
agora vou ficar fora por meses... não sei para onde eles vão me
levar. É tipo aprender a nadar na parte funda da piscina.”
“Vai ser empolgante!”, disse Lisa. “E se você for para Paris?”
“E se eu for para um lugar ruim?”, rebati. “Pode ser a África
Subsaariana, por exemplo. Não sei se você sabe, Lisa, mas sou
uma grande fã de água encanada. Banheiros internos. Ar-
condicionado. Essas coisas estão todas no alto da minha lista de
necessidades.”
Lisa revirou os olhos. “Pare de imaginar o pior cenário possível.
Eles não levariam a filha de oito anos para um lugar assim. Na pior
das hipóteses, você vai para uma cidade, não para uma fazenda.
Ou para uma casa de veraneio! E se for uma casa na beira da praia
na Itália? Até que se prove o contrário, você pode escolher no que
acreditar.”
Ela tinha razão: eles não levariam Kaylee junto se fosse
perigoso. Ou para algum lugar sem água encanada. Aquilo aliviava
a maioria dos meus medos. Mas ainda havia uma dúvida irritante no
fundo da minha cabeça dizendo que aquilo poderia ser um erro…
De repente, a campainha tocou. Nós duas olhamos para a
porta. Lisa colocou a taça de vinho na mesa e bateu palmas
empolgadamente.
“E se for o Bombom? Vai atender!”
“É provavelmente minha entrega semanal da Amazon.”, eu
disse, me levantando para abrir a porta. Mas quando olhei pela
janela, não havia nenhuma van da Amazon estacionada. Também
não era Jordy.
Abri a porta.
“Archer?”
Seus olhos me estudaram rapidamente, como um soldado
analisando dados e descartando ameaças em potencial. Só então
ele acenou suavemente e perguntou: “Posso entrar?”, com seu
sotaque britânico.
Segurei a porta para ele passar. Assim que a fechei atrás dele,
ouvi Lisa gritar da cozinha. “É você!”
“Archer,”, insisti antes que ela pudesse chamá-lo pelo apelido.
“O nome dele é Archer.”
“Você é a mulher da academia.”, disse Archer. “Prazer em
conhecê-la.”
Lisa olhava para ele como quem ia ataca-lo a qualquer
momento, então coloquei uma mão nas costas de Archer e o guiei
até a sala de estar. “Vamos conversar aqui. Longe da minha amiga.
Que vai permanecer na cozinha.”
Lisa suspirou de infelicidade e voltou a beber seu vinho.
“Sua amiga é interessante.”, disse Archer.
“Ela tem uma queda por você faz um tempo.”, revelei.
“Não reparei.”, ele respondeu sarcasticamente.
“O que você está fazendo aqui?”, meu coração parou. “Vocês
vão retirar a oferta, não vão? Ai Deus, não quero voltar para a
Starbucks…”
Archer levantou um tablet que eu não tinha notado que ele
trazia nos braços. “Na verdade, tenho alguns documentos para você
assinar.”
Suspirei aliviada. “Jordy disse que isso demoraria alguns dias.”
“Jordy está incorreto com muita frequência quando se trata de
prazos e datas.”, ele se sentou no sofá e colocou o tablet na mesa
de centro. “Posso ler os termos com você, se você quiser.”
Me sentei ao lado dele no sofá e ele se inclinou mais para
perto para me mostrar os documentos no tablet. Seu cheiro era
inconfundível—tipo madeira misturada com livros muito velhos.
Parecia combinar com sua personalidade seca. Talvez tenha sido
minha imaginação, mas pensei ter sentido o calor que exalava dos
seus músculos.
Archer me explicou os termos do contrato. Eu trabalharia para
eles por um período de sessenta a noventa dias. O pagamento era
substancial, na faixa mais alta de salário de babá. E havia um bônus
gordo depois do término do contrato.
“Para compensar a duração curta do contrato.”, ele explicou.
Fiquei feliz com aquilo, no geral. Mais do que feliz. Eu aceitaria
um trabalho mais curto, mas pelo menos seria bem paga por isso.
“Isso é tudo?”, perguntei depois de assinar.
Uma das sobrancelhas loiras de Archer se ergueu. “Temos
mais onze documentos para você assinar.”
“Uau.”
Em seguida, uma serie de autorizações a respeito da minha
saúde e bem-estar. E dois acordos de confidencialidade. Depois um
documento explicando meu seguro de saúde durante o período do
contrato e meu seguro de viagem.
“E o seguro de vida?”, Lisa perguntou de fora do cômodo.
“Você está mesmo bisbilhotando do corredor?”, perguntei.
Houve uma longa pausa. “Não.”, então a ouvimos se afastar
pé-ante-pé.
Archer sorriu ironicamente para o portal. “Alguma pergunta,
Trish?”
“Estou preocupada com o perigo que vou correr.”, admiti. “Vou
correr perigo legítimo? Ou estas autorizações são mera
formalidade?”
O sorriso de Archer sumiu tão rápido quanto tinha aparecido.
“Jamais colocaríamos nossa filha em perigo nenhum. E a mesma
preocupação se estende a você, por regra. Você não precisa se
preocupar.”
Suspirei aliviada. “Ok, que bom. Pensei isso mesmo, mas…
você ainda não me contou para onde vamos, então minha
imaginação correu solta.”
“Não podíamos te contar até você assinar o acordo de
confidencialidade. Discrição é importante. e falando nisso…”, ele
olhou para o corredor de novo. “Você não pode divulgar nossa
localização enquanto estivermos fora. Para ninguém.”
“Ah, para!”, Lisa gemeu do outro cômodo.
“Enquanto cumprimos nossos contratos, não queremos que
ninguém saiba a localização de Kaylee. Sinto muito, mas isso é
inegociável.”
“Por que não?”, perguntei. “Ela vai correr perigo se alguém
souber?”
Archer me estudou por um longo momento. Parecia que ele era
capaz de ver através de mim, até ler meus pensamentos.
Finalmente ele sacudiu a cabeça, os cabelos loiros ondulando
gentilmente.
“Quase certo que não.”, ele disse. “Mas quase não é a mesma
coisa que definitivamente. Então estamos tomando todas as
precauções apropriadas. Isso é um problema?”
“Não.”, eu disse, e me dei conta de que estava falando sério.
“Não vou dizer a ninguém onde estaremos. Nem para a minha
amiga extremamente enxerida.”
“Muito bem.”, ele parecia esgotado, como se tivesse tido essa
conversa dez vezes antes do café da manhã. “Assine este último
documento concordando com isso, por favor.”
“Vocês já fizeram isso antes?”, perguntei.
Archer piscou suavemente os olhos verdes passivos. “Não.”
“Você parece já ter feito isso antes. Contratar alguém para
cuidar de Kaylee durante essas missões aí de vocês.”
“Não fizemos. Na verdade, vou ser honesto com você: não
gosto nada desse planão. Mas Jordy…”, ele parou e sacudiu a
cabeça. “Apenas assine o último documento por favor.”
O que Jordy quer? Me perguntei.
Peguei o tablet e assinei com o dedo indicador. Archer fechou
o dispositivo e o colocou debaixo de um dos braços, ficando de pé.
“Terminamos por aqui. Partimos no sábado. Esteja na nossa
casa as dez da manhã. Temos um longo voo pela frente e
discutiremos os detalhes durante esse tempo.”
“Espera!”, eu disse. “Agora que assinei tudo, você pode me
dizer para onde vamos, certo?”
Archer olhou por cima do ombro e então se inclinou até seus
lábios estarem a um centímetro do meu ouvido. Sua respiração
estava quente e senti cócegas quando ele respondeu.
“O primeiro contrato é na Noruega.”
7

Trish

No Sábado, partimos de Wilmington, Carolina do Norte e


voamos até o Aeroporto Internacional de Dulles, para pegar o voo
para Oslo. Durante o trajeto mais curto, me sentei entre Jordy e
Kaylee. Archer estava logo atrás de mim e a figura gigante de
Harrison estava espremida no assento da janela atrás de Kaylee.
“Então vocês são mercenários…”, eu disse na metade da
viagem.
“Sim…”, respondeu Jordy cuidadosamente.
“Vocês não são tipo os caras do filme, não é? Que cometem
crimes de guerra e etc…”
Ele apertou os olhos na minha direção. “Provavelmente você
deveria ter perguntado isso antes de assinar o contrato de trabalho
e entrar em um avião conosco.”
Senti um aperto no peito. “Não estou brincando. Vocês não são
tipo eles, são?”
“Danos colaterais acontecem.”, ele disse suavemente. “Na
semana passada nós queríamos atingir uma célula terrorista no
Catar, mas acabamos destruindo um asilo no Kansas. Uma grande
bagunça. Andadores, tanques de oxigênio e balinhas espalhados
por todos os lados.”
Gemi quando ouvi o fim da história. “Isso não é nem um pouco
engraçado.”
Ele sorriu e me cutucou com o cotovelo. “Não somos como os
mercenários do filme. Raramente vamos para zonas de combate
ativas e somos muito exigentes com os contratos que aceitamos.
Cuidamos muito bem dos detalhes da segurança. Treinamos muito.
Ocasionalmente fazemos coisas mais… delicadas. Mas a maioria
dos nossos trabalhos é segura e entediante.”
“E que tipo de trabalho vocês vão fazer em Oslo?”, perguntei.
Atrás de mim, Archer limpou a garganta incisivamente.
Jordy olhou para ele e abaixou a voz. “Vamos fazer
reconhecimento e segurança para uma grande reunião de cúpula.
Não tenho ideia do assunto.”
Archer suspirou exasperadamente atrás de nós.
“Espera um minuto. A grande reunião de cúpula da paz?”,
perguntei.
“Acho que sim.”
“É um evento gigante!”, eu disse. “Li na revista enquanto
esperávamos no aeroporto. Mais ou menos uma dúzia de líderes
mundiais vai estar lá!”
“Legal,”, disse Jordy, “acho que é por isso que eles vão nos
pagar tanto.”
“Passei um tempo absurdo digitando as instruções para a
missão,”, Archer resmungou, “e ele não leu nada.”, Harrison
resmungou em resposta, talvez concordando, talvez desaprovando,
não dava para saber.
Senti um alívio tremendo ao descobrir que eles não eram caras
maus. Eu tinha passado a última semana preocupada exatamente
com aquilo. Jordy e Archer não pareciam do tipo mercenário
sanguinário que mataria indiscriminadamente, mas quem vê cara
não vê coração. E Harrison definitivamente tinha um quê de
violência calma.
“Então não vamos correr perigo.”, eu disse, mais para mim
mesma do que para Jordy. “Archer mencionou o fato de vocês
jamais levarem Kaylee para um lugar perigoso, mas é bom saber
disso com certeza.”
“Sem muito perigo dessa vez. Agora, a missão que tivemos em
Praga um ou dois anos atrás, quando fomos atrás de Anton
Novak…”
Archer finalmente falou: “Acredito que seja partilha o suficiente
para uma tarde, Jordy. Especialmente em um local público como
esse.”
Jordy fez uma careta. “Sim, ele está certo. Discrição é
importante. Entretanto, se você nos pagar algumas cervejas, te
contamos a história toda.”
“Você é impossível.”, Archer grunhiu.
Praga. Pensei. Preciso me lembrar de perguntar sobre isso
mais tarde.
Kaylee se comportou muito bem durante o voo. Ela brincou
com seu iPad por um tempo, depois mudou para o Kindle. Perguntei
se ela já tinha lido Harry Potter e ela disse que não. “Você está
quase na idade certa para ler. Talvez em um ano…”
“Bruxos e magia?”, Jordy disse. “Não achei que você fosse do
tipo de mulher que lê isso.”
Levantei uma sobrancelha. “Que tipo de mulher você acha que
sou?”
As bochechas de Jordy ficaram vermelhas. “Ah, não sei. Não
deveria te julgar. Desculpa. Você pode ler Harry Potter, docinho.”,
ele disse para Kaylee. “Mesmo que se passe em um país super
ridículo.”
Senti que Archer dava o seu melhor para não comer pilha do
banco de trás.
Aterrissamos em Dulles e pegamos um grande Boeing 767
para o voo internacional. Fiquei surpresa—e feliz—em ver que
tínhamos cinco passagens Executivas, com cabines individuais e
diagonais ao invés de assentos regulares.
“Eu não esperava esse tipo de luxo.”, eu disse aceitando uma
taça de vinho tinto da aeromoça.
“Despesas não são um problema.”, disse Archer da cabine na
frente da minha. “Pelo menos não para estes três trabalhos que
aceitamos.”
“Ouvi vocês mencionarem que vão fazer três trabalhos
diferentes? E não só um superimportante?”
Archer aceitou uma taça de vinho da aeromoça. “Correto.”
“O que são os outros dois?”
A cabeça de Archer apareceu acima da parede que dividia as
cabines. “Ainda vamos discutir isso. Agora não.”
Certo, não vamos falar sobre isso em público. Pensei.
O jantar foi servido: estrogonofe de carne, salada e
cheesecake de sobremesa. Do outro lado do corredor, Harrison
engoliu sua comida como se tivesse cronometrado o tempo, então
imediatamente colocou seu boné de beisebol sobre os olhos. O ouvi
roncar dez segundos depois.
A aeromoça veio nos ajudar a transformar os assentos das
cabines em camas. Harrison não acordou, mesmo quando ela tocou
no seu ombro. “Anos dormindo entre tiros de morteiro.”, disse Jordy
à aeromoça. “É melhor você não tentar acordá-lo. Ele geralmente
não morde, mas…”, ele deu de ombros.
A cabine era surpreendentemente confortável, especialmente
depois que vesti meu pijama no banheiro. Fechei os olhos e peguei
no sono ouvindo Jordy ler uma historinha para Kaylee duas cabines
atrás de mim.
Ele é um bom pai, pensei enquanto caía no sonão. Mesmo que
eu ainda queira saber quem é a mãe e porque ela chama a todos de
pai.
Fomos acordados na manhã seguinte com toques gentis da
aeromoça para o café da manhã: omeletes, frutas e bolos que eram
tão macios e folhados que eu podia jurar que eles tinham sido
acabado de ser assados enquanto sobrevoávamos o Atlântico.
Kaylee soltou um gritinho de empolgação e se virou para olhar pela
janela.
O oceano gigante se espalhava sob nós com uma pequena
faixa de água se estendendo no horizonte, cercada pela terra verde
escura dos dois lados. O mapa na minha TV informava que era o
estreito de Skagerrak, guiando até o fiorde de Oslo. Assisti com
deleite enquanto seguíamos o fiorde que terminava em uma cidade
esticada acentuadamente até o céu azul da manhã. Fiquei
maravilhosa. A cena não era nada como o que eu já tinha visto nos
Estados Unidos antes.
Aterrissamos e passamos pela imigração. Archer então nos
guiou para um dos estacionamentos. Uma Range Rover preta
estava estacionada no fundo, sozinha. O mercenário loiro—que eu
ainda chamava de Caramelo na minha cabeça—pegou seu celular e
tocou na tela: as luzes piscaram duas vezes e as fechaduras se
abriram.
“De quem é esse carro?”, perguntei.
“É o carro que eles forneceram.”, ele disse simplesmente.
“Como eu disse: despesas não são um problema nessas missões.”
Archer dirigiu para fora do aeroporto e entramos na cidade.
Pressionei meu rosto contra o vidro e olhei para o lado de fora como
uma boa turista.
“Tudo é tão lindo!”
“Primeira vez na Noruega?”, Jordy perguntou.
Zombei. “Primeira vez no mundo.”
“No mundo?”, Jordy perguntou.
“Nunca saí do país.”
“Nunca?”, Archer perguntou, me encarando pelo retrovisor. “Só
pode ser galhofa!”
“Ga-o que?’
“Piada.”, disse Jordy. “É uma palavra mais pomposa. Ele é
britânico, sabe…”
“Por favor, não menospreze minha erudição.”, disse Archer
categoricamente.
“Não é piada.”, eu disse. “Nunca saí dos Estados Unidos. O
mais longe que viajei foi quando meus pais me levaram para o Sul
da fronteira.”
Archer fez uma careta. “Bom, neste caso é o México, outro
país, fora dos Estados Unidos.”
“Não, o Sul da fronteira, uma armadilha para turistas na rodovia
que divide a Carolina do Norte da Carolina do Sul.”
“Não conheço.”, disse Archer.
“Bons Tamales.”, Harrison resmungou. “Banheiros imundos.”
Ah, então ele fala. Pensei, olhando para ele por cima da
cabeça de Kaylee. Talvez ele só demore um tempo para se abrir.
Jordy se virou para mim e fez uma careta. “Espera um minuto,
se você nunca saiu do país, por que você tem um passaporte?”
“Ah, hm…”, engoli a seco. “Eu não sei. Tirei faz um ano porque
eu planejava viajar algum dia. Acho que deu certo porque acabei
precisando para esta viagem, certo?”
“Sorte a nossa. Você não ter um passaporte teria arruinado
tudo. Até conseguimos contornar algumas regras de fronteira, mas
traficar uma pessoa inteira para a Europa requereria mexer muitos
pauzinhos.”
“Sorte.”, concordei, aliviada por eles terem acreditado na minha
desculpa. Mas então Harrison me olhou de lado, seus olhos escuros
penetraram os meus como se ele soubesse que não era verdade,
mas não soltou nenhum sinal vocálico de ceticismo.
Apesar de estarmos na Escandinávia, Oslo era exatamente
como eu achava que Paris e Roma seriam: ruas de paralelepípedos,
muitos pedestres e prédios que pareciam mais velhos do que
qualquer coisa em Wilmington, na Carolina do Norte. Archer dirigiu
para o nordeste da cidade, subindo ruas cheias de casas com
terraços até chegarmos num prédio de quatro andares. A garagem
abriu e a Range Rover quase não coube dentro.
Harrison esperou até o portão da garagem estar totalmente
fechado antes de abrir o porta-malas para retirar nossa bagagem.
Ele me entregou minha mala pesadíssima como se fosse nada e
colocou as duas mochilas de Kaylee sobre os ombros.
“O que são essas coisas?”, perguntei, apontando para as
caixas verde-oliva no fundo do porta-malas. Elas eram da largura do
carro. “Não trouxemos isso no avião.
Harrison me encarou por um longo tempo e começou a
descarregar tudo com cuidado minucioso.
Bom, acho que ele não vai se abrir mesmo.
O apartamento era espaçoso e arejado, com o pé direito alto e
várias janelas para a luz natural entrar. Nos Estados Unidos, o
imóvel provavelmente custaria pelo menos um milhão de dólares.
Me encolhi pensando no quão caro seria numa cidade como Oslo.
“Temos um problema que falhei em prever.”, disse Archer do
topo da escada. “Só temos quatro quartos.”
Demorei um tempo para fazer as contas. Éramos quatro
adultos… e Kaylee. Ela certamente tinha idade o suficiente para ter
seu próprio quarto.
“Merda.”, disse Jordy. “Reservamos o apartamento meses
atrás. Pensamos que seríamos só nós três.”
“Posso dormir no sofá!”, eu disse rapidamente. “Parece mais
confortável do que minha cama em casa e o banheiro fica bem ao
lado.”
Archer já ia concordar, mas Jordy interrompeu. “Absolutamente
não. Dois de nós dormimos juntos. As camas são grandes, não são,
Archer?”
“Um dos quartos tem uma cama de casal. Pode ser o de
Kaylee. Os outros tem camas queen size.”
“Perfeito.”, disse Jordy. “Problema resolvido.”
“Você tem certeza absoluta?”, perguntei. “Eu realmente não me
importo de dormir no sofá.”
Jordy sorriu para mim. “Archer e eu dividimos camas bem
menores nessa vida. E em condições bem piores. Não é, amigão?”
No topo da escada, Archer fez uma careta e se afastou.
A geladeira já estava cheia de comida: frutas, legumes, carne
orgânica, tofu e queijo. E tudo parecia fresco.
“Acho que é o suficiente,”, disse Jordy aprovando, “a
conferência é em seis dias, mais um dia de preparação.”
“Falando em preparação,”, Archer disse se juntando a nós,
“quero dar uma olhada no lugar antes. Verificar se os mapas que
nos enviaram são precisos e caminhar pelo perímetro a pé.”
Harrison apareceu atrás dele com uma mochila cheia de
equipamentos nas mãos. Ele acenou, concordando.
“Guardamos o forte enquanto você estiver fora.”, Jordy disse
sorrindo.
Nós, pensei, rolando a palavra pela minha cabeça. Gosto do
som de nós.
“Sim, nós vamos!”, Kaylee concordou, correndo e agarrando a
perna de Harrison.
Ah, certo. Pensei. Não sou a única outra pessoa aqui.
“Vou checar meu quarto.”, eu disse, correndo da cozinha antes
que eles pudessem me ver corar.
8

Trish

Meu quarto era bem mobiliado e estava impecável, parecia um


hotel sofisticado. Desfiz minha mala e dobrei as roupas todas dentro
das gavetas da cômoda. Aquilo me deu um senso de ordem e
estabilidade, mesmo que só fossemos ficar ali por uma semana.
O quarto tinha um banheiro anexado, então aproveitei para me
limpar da viagem, tomar um banho e vestir roupas limpas. Desci as
escadas me sentindo fresca, mas ainda exausta por causa da
diferença de fuso horário. Eram três da tarde horário local e nove da
manhã nos Estados Unidos, mas graças ao jet lag eu só queria
deitar a cabeça no travesseiro e dormir.
“Não faça isso.”, disse Jordy quando eu contei a ele o que
estava sentindo. “A melhor forma de lidar com essa diferença é se
adaptando. Fique acordada até a noite e durma no horário normal
local. Acredite, vai ajudar.”
“Obrigada.”, respondi enquanto o assistia vasculhar a
geladeira. Ele tinha se trocado e vestia calças cáqui e uma camiseta
verde-oliva que parecia ter sido moldada ao seu torso como uma
segunda pele, revelando cada centímetro dos seus músculos. “O
que você está fazendo?”
“Jantar.”, ele pegou uma travessa de alumínio do freezer. “Tudo
é pré-pronto. Só precisamos descongelar e colocar no forno por
uma hora. Lasanha hoje.”, ele cheirou a travessa. “Lasanha
vegetariana, eu acho. Não conte ao Harrison, ele fica mau
humorado quando não come proteína o suficiente.”
Senti uma mãozinha puxando minha blusa. “Trish? Você quer
que eu te ensine a jogar Minecraft?”
“O que é Minecraft?”, perguntei.
Jordy deu uma risadinha. “Se prepare para entrar no buraco do
coelho.”
Ela me guiou até a sala de jantar, onde seu tablet tinha sido
conectado a um teclado e um mouse. Aprendi que Minecraft é um
jogo pixelado que envolve cavar e cortar árvores e caçar certos tipos
de minerais em cavernas. Kaylee era muito fã do jogo e tinha
opiniões fortes sobre a melhor forma de coletar ferro e como evitar
aranhas e esqueletos que apareciam durante a noite.
Jordy apareceu na porta da cozinha e sacudiu duas cervejas
no ar. Comecei a sacudir a cabeça… mas me dei conta de que já
era seis horas. Eu tinha passado muito tempo jogando com Kaylee.
“Isso é muito divertido. E nós chegamos bem fundo naquela
caverna,”, eu disse a ela, “mas preciso de uma pausa agorra.”
“Ok. Sem problemas.”, Kaylee respondeu com os olhos
grudados na tela. “Vou continuar explorando.”
Aceitei uma cerveja que Jordy segurava e me sentei na
cozinha. “Te disse que era a toca do coelho.”, ele sorriu.
“Ela realmente gosta desse jogo.”, respondi. “Vocês limitam o
tempo de tela dela?”
Ele sacudiu a cabeça. “Não precisamos impor nada até agora.
Durante o verão, ela é bem equilibrada. Ela joga isso ou assiste
vídeos no YouTube sobre tecnologias primitivas, ou lê livros.
Quando as aulas começarem, precisaremos lembrá-la de fazer os
deveres.”
“Naturalmente.”
Ele abriu o forno, colocou a travessa de alumínio dentro e o
fechou. Uma onda de calor pairou no ar e esquentou meu rosto.
Jordy tirou as luvas de cozinha e foi para a sala de estar, para onde
Kaylee pudesse vê-lo. Ele se sentou no sofá e eu me sentei na
cadeira de frente para ele.
“Então,”, ele disse, “qual é a sua história?”
“Minha história?”
“Claro. Eu não sei muito sobre você, mesmo que você esteja
aqui tomando conta de Kaylee. Mal me livrei da ideia de que você é
a Anilha, a garota da academia.”
“Parece que foi meio tonto de vocês me contratarem, não é?”,
eu disse com um sorrisinho.
“Você está parecendo o Archer agora.”, ele disse, revirando os
olhos. “Vamos lá, desembucha. Me fala sobre você.”
A pergunta e a forma como ela foi feita enquanto tomávamos
cerveja, fez parecer que era um encontro. Novas sensações, nos
conhecendo melhor… coisas básicas.
Dei de ombros. “O que você quer fazer?”
“Como você se tornou babá?”
“Minhas irmãs.”, eu disse. “Sou a mais velha de três. Quando
éramos crianças, eu as odiava. Não nos dávamos bem, sempre
brigávamos e discutíamos. Um dia, eu estava deitada de barriga no
chão vendo TV e Rebecca se sentou nas minhas costas. Eu pedi a
ela que parasse, ela não obedeceu, então eu me levantei… e a
lancei contra a tela da TV. Ela tomou quatro pontos na testa!”
Jordy deu um meio-sorriso. “Você não está criando uma boa
impressão como babá…”
Gargalhei e respondi: “Eu melhorei! Quando me mudei para
fazer faculdade, me dei conta do quanto eu as amava e sentia
saudade. Eu tinha ajudado a criar minhas irmãs. Não demorou muito
para eu ir para casa todos os finais de semana para visitá-las. E
quando eu me graduei, decidi que tomar conta de crianças era o
que eu realmente queria fazer.”
“No que você se graduou?”
“Literatura Francesa.”
“Bom, não dava pra usar esse diploma para muita coisa
mesmo.”, ele provocou.
Olhei de cara feia para ele e bebi minha cerveja. “Eu gostava
do Camus! E demorei um tempo para consegui descobrir o que
queria de verdade. Arrumei um emprego em uma creche e odiava.
Tomar conta de vinte crianças não era satisfatório. Eu queria dar a
eles amor e cuidado individualmente. Para um grupo menor. Uma
única família.”
“Então você virou babá.”
“Por acidente,”, admiti, “eu disse a um amigo que que estava
saindo do emprego na creche e ele perguntou o porquê… acontece
que ele conhecia uma família que estava procurando uma babá. Fui
entrevistada naquela tarde e comecei no dia seguinte.
Imediatamente eu soube que era a melhor coisa para mim. Os pais
trabalhavam juntos e seus dois filhos—um menino e uma menina—
eram tão amáveis. Eu realmente ficava empolgada para ir trabalhar
todos os dias. Fiquei com eles por dois anos.”
“E por que acabou?”, Jordy perguntou.
Suspirei. “Cerca de seis meses atrás, ambos foram trabalhar
com tecnologia em São Francisco, para uma startup de
criptomoeda.”
“Você não quis ir com eles?”
“Eles ofereceram, mas eu recusei. Eu nunca tinha ficado longe
de casa e a perspectiva de, de repente me mudar para o outro lado
do país me aterrorizou.”
E eu tinha outras coisas que me prendiam a Wilmington.
“E agora aqui está você, trabalhando de babá do outro lado do
mundo.”, Jordy pontuou.
“Temporariamente.”, eu disse. “Há uma grande diferença. Eu
não tinha a menor ideia de para onde estava indo até assinar os
documentos que Archer preparou.”
Jordy tomou um gole longo de cerveja. “Você não trabalhou de
babá nos últimos seis meses?”
Levantei uma sobrancelha. “Você está implicando que vocês
não fizeram uma verificação dos meus antecedentes?”
“Essa é a especialidade de Archer.”, ele respondeu. “Ele que
lida com os detalhes. Então, nenhum outro trabalho?”
“Não.”
“Estou surpreso por você não ter conseguido encontrar mais
nada. Você realmente parece se dar bem com crianças. Bom, pelo
menos com base no pequeno exemplo que vi até agora.”
“Inflação e economia.”, eu disse amargurada. “As pessoas não
conseguem mais pagar uma creche, quem dirá uma babá particular.
Só consegui um trabalho de babá faz uns meses, mas recusei.”
“Por que?”
“O pagamento era quase nada. Literalmente menos do que um
salário mínimo, se eu levasse em consideração quantas horas
trabalharia por mês. Eu odiei ter que recusar porque as crianças
pareciam adoráveis, mas eu não consegui fazer os números
funcionarem em meu favor. Seis dias da semana por só três mil por
mês? Isso não é o suficiente para eu conseguir sobreviver.”
Jordy gargalhou. “Eles ofereceram isso? Que se fodam. Eles
não te merecem. E ei, pelo menos isso te fez vir trabalhar para nós!”
“Sim, mas este é um contrato temporário.”, eu o lembrei.
“Ah, certo.”, ele engoliu o resto da cerveja e se levantou do
sofá para pegar duas novas garrafas. Terminei a minha primeira
rapidamente e a troquei por uma nova.
“Sua vez.”, eu disse. “Me conta sobre sua vida de mercenário.”
Jordy deu de ombros. “Acho que parece autoexplicativa.”
“Faz quanto tempo que você faz isso?”
“Assinamos com a Companhia Mathos quatro anos atrás.”, ele
respondeu. “Cinco, em outubro. Eu acho.”
“Eu queria te perguntar sobre isso. Procurei Companhia
Mathos no Google e não encontrei nada. Não havia nenhum site no
cartão que você me deu. Você sabe que não estamos mais em
1995, certo? Vocês precisam ter um site.”
Seus olhos castanhos piscaram com malícia. “É por definição.
A Companhia Mathos é uma empreiteira militar particular. Ênfase
em particular. As pessoas que precisam de nós sabem como nos
encontrar. O resto do mundo não precisa saber que existimos.”
“De onde o nome veio? Mathos é o sobrenome do fundador ou
algo assim?”
“O nome é de um grupo antigo de mercenários que lutou por
Cártago. Ou contra Cártago. Não me lembro. Archer vai saber te
explicar.”
“Parece meio estúpido não saber a história da empresa para a
qual você trabalha.”, brinquei.
“Você sabe todos os fatos históricos de todas as creches para
as quais trabalhou? Ou escolas que frequentou?”
Dei de ombros. “Faz sentido.”
“É um trabalho.”, disse Jordy. “Só isso.”
Examinei a forma como ele se afundou de volta no sofá. Ele
parecia exausto. Como se a frase fosse mais pesada do que eu
soubesse.
“Como alguém entra nessa indústria?”, perguntei. “Havia um
cara na feira de empregos entregando rifles e granadas para os
recrutas?”
“Eu era do Exército.”, ele respondeu. “Alistado logo depois do
Ensino Médio. Minha mãe não tinha dinheiro para me mandar para a
faculdade e mesmo que tivesse, eu não sabia o que queria fazer.
Acontece que também não encontrei o que queria fazer no Exército.
Não me leve a mal, foi o que fez de mim o homem que sou hoje.
Adquiri vários bons hábitos, fiz amigos de longa data. Mas eu estava
indo por um caminho que não gostava. Então dei baixa.”
“Eu nem sabia que era possível sair do Exército cedo assim.”
“Tecnicamente, não é.”, ele disse com um sorriso irônico. “Mas
eu tinha um bom amigo que era o médico do quartel, e consegui
uma Reforma Antecipada a Pedido.”
“O que é isso?”
“A maioria dos soldados servem por vinte anos. Saí em dez.”
Aquilo atingiu minha cabeça: “Você já… foi para a guerra? Não
sei exatamente como perguntar isso.”
“Se eu já estive em combate? Alguns. Menos do que a maioria.
De modo geral, eu era um dos sortudos. Mas eu não gostava.
Mesmo quando não estava correndo perigo real, eu sentia que
estava. E aquilo me perseguia todos os dias, até quando eu dormia.
Semanas se passaram e eu me aborrecia e me perguntava se
alguma coisa podia me acontecer. Se de repente um morteiro iria
atingir nossa base. As vezes eu sinto falta de algumas coisas.
Nunca me senti tão vivo quanto naqueles anos. Mas…”, ele sacudiu
a cabeça. “Estou feliz por estar fora.”
“Deve ser bom escolher suas missões agora.”, eu disse.
“Aposto que te dá um senso de controle, melhor do que apenas
seguir ordens.”
“Ah, sim, é muito melhor, certamente,”, ele concordou,
“gostamos de escolher nossos contratos. Mas nem sempre sai como
o esperado. Tivemos um contratempo em Praga faz alguns anos.
Chegamos perto, nós três. Mas o cara que fomos enviados para
capturar, Anton Novak, conseguiu fugir. Não fizemos nada nem
moderadamente perigoso desde então.”
Os olhos de Jordy estavam distantes. Esperei que ele fosse
revelar mais sobre a missão, mas ele apenas suspirou
pesadamente.
“Honestamente? Estou exausto. Vai ser bom terminar esses
três contratos e ter tempo para relaxar. Passar mais tempo com
Kaylee. E talvez até mesmo me aposentar como mercenário.”
“Sério? E o que você gostaria de fazer depois disso?”
Ele bebeu um gole da cerveja e fez uma careta. “Gostaria de
saber.”
“Ah, vamos lá. Você deve ter pelo menos uma ideia.”
“Não tenho.”, ele respondeu. “Nem sei se sou bom em outra
coisa.”
“Não pode ser verdade.”, eu disse, o pressionando um pouco
mais. “Vamos falar sobre isso. quais são seus interesses?”
Jordy cruzou as pernas e comprimiu os lábios, pensativo. Ele
ficava bonito concentrado. “Eu gosto de cozinhar. E sou bom com
carros.”
“Que tal virar mecânico?”
Ele grunhiu. “Não. eu sou bom nisso, mas não
necessariamente gosto disso. Fui meio que forçado a trabalhar com
carros porque minha mãe tinha um carro velho que usava para
trabalhar e ele sempre precisava de reparos. Não podíamos pagar
um mecânico de verdade, então precisei aprender sozinho. Se eu
não tivesse conseguido, provavelmente não teríamos sobrevivido.”
Meu coração se apertou com a ideia de um jovem Jordy
passando aperto financeiro com a sua mãe solteira. “Que tal virar
chef de cozinha?”
Ele riu como se fosse uma piada. “Bom, Trish, eu não sou
realmente bom cozinheiro. Só gosto de cozinhar. Para mim, é tipo
uma preliminar antes da comida de verdade. Todos os aromas e
temperos e o calor… realmente criam um clima e me fazem querer
atacar.”. ele deu uma piscadela.
Tomei um longo gole da minha cerveja. Ele estava flertando
comigo? ou era só uma brincadeira educada? Quando abaixei
minha garrafa de cerveja, Jordy estava me encarando. Seu olhar era
interrogativo, como se ele quisesse saber como encarei o
comentário vagamente sexual. Eu me sentia estranhamente
confortável com ele, como se nos conhecêssemos mais do que
aquelas pequenas interações na academia e um voo internacional…
A porta se abriu e os outros dois mercenários entraram. Kaylee
pulou da mesa e correu para abraçá-los, sua trança loira
chacoalhava.
“Também senti saudade, fofinha.”, disse Archer. Então ele se
virou para Jordy e disse: “O layout da conferência é igual ao dos
mapas que temos.”
“Ótimo.”, Jordy disse, evitando olhar na minha direção.
Harrison farejou o ar. “Que cheiro bom.”
Jordy pulou do sofá. “O jantar está no fornão. Já deve estar
pronto.”
O assisti se levantar e ir para a cozinha, me perguntando onde
nossa conversa pararia se não tivéssemos sido interrompidos.
9

Jordy

Archer gostava de dizer que eu flertava naturalmente.


Acontecia automaticamente, sem eu pensar. Quando eu ficava perto
de uma mulher bonita, principalmente se eu estivesse interessado
nela, eu tinha uma forma de agir que nem me dava conta.
E com Trish não foi diferente. Ela era muito bonita e eu estava
interessado nela.
Foi olhar que ela me deu que me fez me dar conta de que eu
talvez tivesse ido longe demais. Comparar comida com sexo e
piscar para ela. Ela bebeu a cerveja e me encarou como se
estivesse pensando em como se sentia em relação ao que eu disse.
Ela provavelmente acha inapropriado se envolver comigo já
que ela é a baba de Kaylee. E honestamente, ela estaria certa. Era
uma má ideia, especialmente no início da nossa viagem. Nós mal
nos conhecíamos. Se as coisas ficassem estranhas, teríamos vários
momentos constrangedores antes de finalmente voltarmos para
casa.
Afastei o pensamento enquanto tirava a forma do fornão. Eu
tinha prometido a Archer que me concentraria na missão, e eu faria
isso custasse o que custasse.
Passamos o dia seguinte com o chefe da segurança da
conferência de paz, discutindo os detalhes do trabalho e os
potenciais pontos fracos que poderiam ser explorados. A
conferência começou no terceiro dia. acordei cedo porque meu
corpo ainda estava desacostumado com o fuso horário.
E por causa do sonho que eu tive na noite anterior.
Eu não sabia onde estávamos—os arredores eram confusos,
coisa típica de um sonho, mas Trish estava muito clara na minha
cabeça. Seus cílios longos. Seu rosto em formato de coração. Os
lábios exuberantes implorando para serem beijados, pressionados
um contra o outro enquanto ela se aproximava…
“Se recomponha,”, falei comigo mesmo no espelho. A maioria
dos seguranças da conferência estaria usando ternos, mas nós
estávamos a paisana para nos misturarmos do lado externo do
perímetro. Calças jeans e camiseta. Mais uma jaqueta para proteger
contra o vento frio que vinha do mar Báltico… e para cobrir o que
estava na minha cintura.
“Odeio trabalhar de babá,”, Harrison resmungou enquanto
passava pelo quarto que Archer e eu dividíamos, “prefiro atirar em
coisas.”
“Cuidado com o que você deseja.”, eu disse enquanto apertava
meu coldre na cintura. A Noruega tinha leis muito rigorosas sobre o
porte de armas, mas elas tinham sido contornadas pelo governo por
causa das circunstâncias especiais da conferência de paz. A Glock
P80 que eu carregava no meu coldre era a versão norueguesa da
Glock 17, uma arma com a qual eu estava intimamente
familiarizado. Harrison e Archer tinham armas idênticas, além de
Archer também portar um rifle porque ficaria em de vigia no telhado.
Espero que não precisemos usá-las, pensei enquanto vestia a
jaqueta e cobria o coldre facilmente. É melhor que esse seja como
qualquer outro trabalho de segurança. Sem bagunça. Sem
confusão.
Nos três nos despedimos de Kaylee em turnos. Cada um de
nós tinha um tipo diferente de rotina: eu a abraçava e dizia que a
amava, Archer fazia piadas sobre como era melhor ela não crescer
mais nenhum centímetros enquanto estivéssemos fora e Harrison
levantava a garota, a rodopiava e apertava contra seu peito tão
apertado que Kaylee sempre gritava que estava sendo esmagada.
Meu coração doía toda vez que partíamos em uma missão.
Mas pelo menos ela estava na Noruega conosco, e não do outro
lado do mundo. E nós a veríamos todas as noites quando
chegássemos em casa.
Trish assistiu a rotina toda de uma distância respeitosa e só se
aproximou quando terminamos. “O que você diz para alguém que
está indo para uma missão de segurança? Boa sorte? Quebre a
perna?”
“Tanto faz.”, respondi.
Ela hesitou, mas se aproximou para me abraçar. Foi um abraço
confortante e quente, e não havia nada sexual nele, mas eu ainda
assim saboreei seu corpo enquanto a envolvia. Ela cabia
perfeitamente, como se ali fosse seu lugar, apertada contra meu
peito. Dei um tapinha nas suas costas e precisei resistir forte ao
impulso de acariciar seus cabelos.
Ela é a babá, pensei. Não sua namorada.
“Boa sorte!”, ela repetiu com um sorriso. “Quebre a perna!”
A conferência ficava a vinte minutos, no centro de Oslo.
Encontramos o chefe da segurança em um prédio vizinho ao da
conferência. Havia pelo menos outros cinquenta membros da equipe
zanzando pelo local enquanto apertavam seus fones no ouvido.
“Vamos cuidar do perímetro externão.”, disse Archer depois de
conferir. Ele ergueu um mapa para nos mostrar. “Lado norte, desta
praça até esta interseção. Vou ficar no telhado aqui, de onde
consigo ver estas duas praças públicas.”
“Vamos logo, então.”, eu disse. Harrison grunhiu descontente.
Nosso trabalho era simples: ficar de olho em qualquer
movimento não ordinário. Ou avisar antecipadamente caso alguém
tentasse invadir a conferencia de carro, mesmo com barricadas
posicionadas para evitar este tipo de ataque. Harrison e eu
patrulhamos a rua, caminhando por entre os pedestres.
Era tão monótono quanto parece. Patrulhávamos, nos
comunicávamos com o chefe da segurança e seguíamos alguns
indivíduos que pareciam suspeitos. Foi o que aconteceu por cerca
de uma hora. Então mais uma. No momento em que o primeiro dia
da conferência acabou, nove horas haviam passado sem nada
notável acontecer. Eu estava feliz de caminhar de volta para o carro
no final de um dia sem nenhuma empolgação, mas Harrison parecia
querer socar uma parede.
“Tédio é o melhor cenário.”, Archer o lembrou enquanto
dirigíamos para casa. “Toda vez que somos pagos e não precisamos
arriscar nossas vidas é uma vitória.”
Harrison encarava o lado de fora da janela como um pastor
alemão a caminho do veterinário.
Kaylee ficou feliz quando chegamos em casa—e eu fiquei tão
feliz quanto ela. A presença da nossa filha era um lembrete
constante de que tudo valia a pena.
Harrison pegou uma garrafa de vodca, foi para o seu quarto e
fechou a porta. A próxima coisa que ouvimos foi Led Zeppelin VI
tocando alto lá de dentro. Archer abriu uma garrafa de Merlot e
começou a ler um livro, bebendo casualmente. Peguei uma cerveja
e me sentei no sofá com Kaylee que estava jogando cartas
interativas no tablet.
“Como foi?”, Trish perguntou. “Bom primeiro dia?”
“Não tão ruim—”, comecei.
“Receio que não possamos discutir.”, Archer interrompeu.
“Sim, claro.”, Trish respondeu rapidamente, puxando os
cabelos para um dos lados da cabeça e mexendo neles
nervosamente. Dava para ver que ela estava curiosa com o que
tínhamos passado o dia fazendo.
Eu quero me abrir com ela, me dei conta. Quero compartilhar
coisas com ela no fim do dia. Tratá-la como…
Afastei o pensamento e bebi minha cerveja mais rápido.
O dia seguinte foi idêntico ao primeiro. Dirigimos até a
conferência, vigiamos uma seção do perímetro o dia todo e
voltamos para casa para as meninas. Trish se sentou ao meu lado
no sofá e falou sobre sua vida na Carolina do Norte, e como era
maravilhoso sair de lá para ver o mundo. Ela tinha levado Kaylee ao
parque mais cedo e só aquela pequena aventura a fez se sentir
como uma viajante do mundo.
Foi difícil dormir naquela noite. Primeiro porque Archer roncava
tão violentamente que deveria ser proibido pela Convenção de
Genebra dormir no mesmo quarto que ele. Eu também estava muito
agitado por causa do dia, mesmo não tendo acontecido nada, eu
estava desgastado por causa do estado de alerta constante. E ainda
por cima, Trish não me saia da cabeça. Fiquei pensando nela
sentada no sofá, sobre os pés, sorrindo com um drinque na mão. A
forma fácil com a qual ela falava com Kaylee e cuidava dela. O
sorriso que ela me deu quando eu fiz uma piada e ninguém mais riu.
Archer está certo. Eu tenho uma queda por ela.
Três xícaras de café não bastaram para me fazer me sentir
acordado na manhã seguinte, e eu bocejei o tempo todo no caminho
para o quarteirão no qual trabalharíamos naquele dia. Era a oeste
da conferência de paz, com uma estrada direta que dava na área de
segurança onde alguns membros desciam dos seus carros. Mais
uma vez, Harrison e eu ficamos no solo enquanto Archer nos cobria
do alto.
“Alvo suspeito do seu lado direito.”, disse Harrison de repente
pelo transmissor.
Os cabelos da minha nuca se arrepiaram. Continuei
caminhando como se nada tivesse acontecido, mas olhei para o
meu lado direito. “Descrição?"
“Cabelos escuros, vestido verde.”, Harrison respondeu com o
tom sério. “Sapatos pretos, sem linha marcando a calcinha.
Provavelmente uma tanga.”
Ouvi Archer gemer. “Pare de encarar as mulheres dos
diplomatas.”
Harrison grunhiu em resposta.
“Nada mal.”, eu disse quando vi a mulher a quem ele se referia.
Ela era jovem, provavelmente alguns anos mais nova do que eu,
que tinha trinta e três, mas se comportava como uma rainha.
“Nada mal?”, Harrison respondeu zangado. “Você está cego.”
“Não faz meu tipo.”
“Essa garota faz o tipo de todo mundo.”, ele latiu. “Você está
doente?”
“Ele está caidinho pela nossa querida babá.”, disse Archer.
Ele provavelmente não conseguia me ver, mas eu olhei para o
telhado onde ele estava posicionado. “Tenho sido um perfeito
cavalheiro desde que chegamos.”
“Me dói admitir, mas você tem mesmo.”, Archer respondeu.
“Talvez você esteja finalmente amadurecendo.”
Harrison gargalhou com o comentário.
“Obrigado.”, eu disse secamente, mas eu estava grato por
Archer admitir. Eu tinha tentado muito não flertar com Trish desde
que chegamos. Todas as nossas interações foram perfeitamente
platônicas. Exatamente como um homem deve agir com a mulher
que está cuidando da sua filha.
Mas apesar das aparências, havia definitivamente uma
conexão mais profunda entre nós. Depois que Archer e Harrison
foram dormir naquela noite, ficamos conversando até tarde. Trish e
eu tínhamos uma química inegável e manter a amizade só estava
acentuando o que eu sentia. Ela se sentia da mesma forma ou era
coisa da minha cabeça?
“Você viu isso?”, Harrison disse de repente pelo transmissor.
“Estou trabalhando, não secando todas as mulheres que
passam.”, respondi.
Mas a voz de Harrison estava mortalmente séria. “Terraço, à
esquerda. Atrás da chaminé.”
Olhei para o prédio em questão. “Não vejo nada.”
“Minha visão está obstruída.”, disse Archer.
De repente eu vi: um clarão do sol refletido, tão claro quanto
um sinalizador. “Tem alguma coisa lá em cima. Vi um reflexo.
Podem ser binóculos ou…”
Eu não precisei dizer o resto: ou o cano de um rifle.
Atravessei a rua correndo desesperadamente. “Entrando no
prédio. Me avise se eles se mudarem.”
“Ainda não vejo nada.”, Archer deve ter mudado a frequência
do rádio porque de repente, seu tom estava diferente. “Aqui é
Mathos Dois. Temos algum outro esquadrão nos telhados da
vizinhança?”
“Negativo, Mathos Dois.”, alguém respondeu. “A unidade de
segurança mais próxima está a três quarteirões de vocês.”
“Continuamos investigando, aguarde confirmação.”, Archer
respondeu.
Eu estava vagamente consciente da conversa quando corri
pelo prédio. Era um edifício de apartamentos, com um elevador e
escadas do meu lado direito. peguei as escadas e corri de dois em
dois degraus até chegar no terraço. O rádio fazia um barulho no
meu ouvido enquanto eu corria.
“Enviando outra unidade para o outro lado deles. Cuidado com
o fogo-cruzado.”
“Mathos Três, subindo para o terraço do hotel ao lado.”, disse
Harrison.
“Guardar posição ou procurar um ângulo melhor?”, Archer
perguntou.
“Guardar posição, Mathos Dois.”
“Estou no telhado do hotel ao lado,”, disse Harrison, “de olho
no al—merda, ele correu. Deve ter me visto.”
“Armado?”
“Não tenho certeza.”
“O suspeito tem a conferência na linha de visão?”
“Daquele prédio, possivelmente.”
A resposta veio em norueguês, soou como um xingamento.
Alcancei a porta do terraço. Estava trancada, mas a chutei e
ela se separou do portal e dos tijolos velhos com uma nuvem de
poeira. Corri para fora, sob a luz do sol, me virando para onde eu
esperava que o alvo estava.
O homem estava correndo na direção oposta, sua jaqueta
preta flutuava atrás dele. Havia algo de familiar nele, mesmo de
costas. Peguei minha pistola e gritei para ele parar, mas antes que
eu pudesse terminar o comando, ele pulou pela borda do prédio,
desaparecendo da minha visão.
“Suspeito pulou do prédio.”, eu disse, correndo para a borda.
Em um dos prédios ao lado vi Harrison com a pistola também nas
mãos.
Me apoiei na borda e olhei para baixo. Havia um beco entre
aquele prédio e o outro. Esperei ver um corpo no chão, mas não
havia nada no beco a não ser dois gatos revirando um saco de lixo.
Estamos a pelo menos vinte metros do chão.”, eu disse.
“Como…”
“Ele entrou em uma janela do outro lado,”, disse Harrison,
“Prédio dois-nove-quatro, do outro lado da feira…”
“Suspeito veste jaqueta preta e calça social.”, eu disse.
“Cabelos escuros. Rabo-de-cavalo.”
“Confirmo.”, Harrison adicionou.
“Temos mais dois times no solo.”, alguém disse no rádio.
“Guardar posição caso ele reapareça.”
Fechei meus punhos e soquei a lateral da borda do prédio. O
suspeito, quem quer que fosse, tinha fugido. Cheguei tarde demais
por alguns segundos.
“Você o reconheceu?”, perguntei a Harrison.
Ele colocou a arma no coldre e inclinou a cabeça. “Não, por
que reconheceria?”
“Por nada.”, eu disse, mesmo tendo uma sensação estranha de
déjà vu. Olhei ao redor e xinguei mais uma vez.
“Merda!”
10

Trish

Cuidar de Kaylee era incrivelmente fácil. Muito mais fácil do


que qualquer outra criança nos meus trabalhos anteriores. Ela
comia de tudo sem reclamar e era grande o suficiente para tomar
banho sozinha—apesar de eu me sentar na borda da banheira e
ajuda-la a lavar os cabelos e a se secar.
Kaylee tinha uma personalidade única. Aos oito anos, ela tinha
opiniões sobre as coisas mais estranhas de todas. Ela gostava de
manteiga, mas odiava margarina. E por alguma razão, ela era
obcecada pelo fato de que Brexit tinha sido um erro—uma opinião
que ela certamente herdou de algum dos seus pais. Archer,
provavelmente. Eu duvidava que alguém da idade dela tinha algum
entendimento legítimo sobre os prós e os contras de permanecer
entre os membros da União Europeia.
No geral, era uma alegria cuidar dela. Era satisfatório em um
nível emocional e profissional também. Um outro lembrete de que
aquilo era o que eu queria fazer da minha vida, e não trabalhar no
comércio, fazendo café para pessoas irritantes. Ser babá me fazia
querer ter minha própria filha um dia—e talvez um filho também.
Desde que ele não fosse um pequeno terrorista.
Também era uma oportunidade tremenda de ver o mundo.
Fiquei um pouco nervosa no primeiro dia ali, sozinha, mas no
terceiro eu já estava levando Kaylee para passear por Oslo depois
do almoço. Caminhamos por quase um quilômetro e meio até a feira
local e compramos alguns presentes turísticos para eu levar para
casa. Eu sabia que precisaria de uma oferta de paz para Lisa já que
eu não podia contar a ela nada sobre o lugar nem o trabalho. E
minhas irmãzinhas definitivamente ficariam chateadas se eu não
levasse nada para elas da minha primeira viagem internacional.
Já que eu não podia contar a ninguém onde eu estava,
comecei um diário com tudo o que fazíamos e as pequenas
peculiaridades de Oslo. Gasolina—que eles chamavam de bensin—
era super cara, mas frutos do mar frescos eram baratos. Não me
surpreendia porque era uma cidade costeira. As pessoas eram
incrivelmente amistosas. A Noruega era um dos países mais felizes
do mundo, seja qual fosse o instrumento de medição. E a maioria
das pessoas falava inglês. No geral, parei de me sentir uma
forasteira e imediatamente senti que era bem-vinda em todos os
lugares que eu ia.
Quando Kaylee e eu voltamos da feira, fomos surpreendidas
porque os rapazes já tinham voltado para casa. Kaylee soltou seu
saquinho de doces e correu para abraçá-los.
Eu soube imediatamente que algo estava errado. Senti uma
tensão no ar, como se estivéssemos interrompendo alguma coisa.
Eles esperaram Kaylee correr para o quarto antes de continuarem
conversando.
“O que estou dizendo é que não gosto dessas regras.”, disse
Harrison.
“Nós nem sabemos quem era,”, respondeu Archer, “pode ter
sido um cidadão local inofensivo querendo ver Justin Trudeau. E
você quer atirar três vezes no cara sem nem identificar se ele é de
fato uma ameaça?”, ele zombou alto.
“O que aconteceu?”, perguntei.
Harrison virou a cabeça para me olhar. “Nada que seja da
porra da sua conta.”
“Ei!”, disse Jordy. “Por que você não vai dar uma volta?”
Harrison me encarou furiosamente por mais um tempo,
murmurou um palavrão e saiu. A porta da frente bateu com tanta
força que sacudiu a casa toda.
“Desculpa.”, eu disse. “Eu não devia ter perguntado.”
“Não, você não devia.”, disse Archer secamente. “Você não
precisa ser informada sobre tudo o que acontece durante nosso
contrato aqui, Trish. Você veio para cuidar da nossa filha.”
Dobrei minhas mãos no meu colo e disse humildemente.
“Desculpa.”
Archer suspirou e se virou para Jordy. “Todo mundo está
exagerando sobre o que aconteceu hoje. Quem quer que ele fosse,
provavelmente não era uma ameaça real. Só um civil.”
“Um civil que pulou do telhado e entrou pela janela de um
apartamento do outro lado em uma queda de vinte metros?”, Jordy
respondeu. “Concordo com Harrison dessa vez.”
“Fizemos nosso trabalho.”, Archer insistiu. “Identificamos uma
ameaça e o assustamos. Não precisamos ficar remoendo mais
nada. O chefe da segurança acha que fizemos um bom trabalho.
Pronto.”
“Sim, bem, o que eu penso é mais importante do que quem
está nos pagando.”, Jordy murmurou. “Vou começar o jantar.”
Depois que ele saiu, caminhei para a escada para checar
Kaylee, mas fui impedida porque Archer agarrou meu braço.”
“Me desculpa por ser duro, mas eu falo sério sobre o que
disse.”, ele disse. Seus olhos azuis estavam frios como gelo. “Você
está aqui para fazer um trabalho. Um trabalho que não requer que
você tenha todas as informações sobre o nosso trabalho. Espero
não precisar dizer isso de novo.”
“Entendido.”, eu disse.
Kaylee e eu jogamos Minecraft no quarto por uma hora. Ela
parecia alheia ao fato de que uma discussão tinha acabado de
acontecer no andar de baixo, e estava mais preocupada em obter
ouro para fazer uma picareta especial no jogo. Quando chegou a
hora de comer, todo mundo se sentou à mesa, menos Harrison.
“Cadê o papai?”, Kaylee perguntou.
“Ele foi resolver algumas coisas,”, Jordy respondeu
suavemente, “e se você comer todos os seus legumes, vai ganhar
um chocolate norueguês que eu comprei para você.”
Kaylee gritou animada e se esqueceu da ausência de Harrison.
O clima depois do jantar estava tenso. Archer encontrou uma
partida de cricket entre Paquistão e Austrália na TV e passou a
maior parte do tempo tentando explicar as regras para Kaylee. Jordy
assistiu Netflix no seu laptop usando fones de ouvido. Eu não tinha
certeza de como agir depois da discussão, então pedi licença e fui
para o meu quarto ouvir um podcast.
Eu estava escrevendo sobre o dia quando ouvi alguém subir as
escadas. Esperei que fosse Jordy, mas foi Harrison quem passou
pelo corredor. Ele desacelerou e caminhou de costas até chegar na
porta do meu quarto. Sua presença me deixou inconfortável,
especialmente depois da forma como ele tinha me tratado, então
fingi que não sabia que ele estava ali e continuei escrevendo no
meu cadernão.
Depois de um longo silêncio, ele disse: “Fui um imbecil mais
cedo. Desculpa.”, então ele se afastou antes que eu pudesse
responder. Assim que ouvi sua porta se fechar, soltei o ar que nem
tinha me dado conta de que estava segurando.
Isso foi estranho. Eu não esperava que Harrison fosse do tipo
que pedia desculpas, muito menos para mim.
Colocar Kaylee na cama melhorou meu humor. Depois do seu
banho, Jordy assumiu e leu uma historinha para ela. Eu não sabia o
que fazer, então me despedi de todos e fui para a cama cedo.
Mas rapidamente notei que não ia conseguir dormir. Eu estava
cansada, mas meu relógio biológico ainda estava bagunçado por
causa da diferença de fuso horário. Me revirei na cama por um
tempo até resolver me levantar. Eu tinha ouvido em algum lugar que
leite quente ajuda no sono, então fui até o andar debaixo para
preparar um copo. Cruzei a sala de estar pé-ante-pé até um vulto no
sofá me fazer pular.
“Caralho!”, exclamei.
Jordy se sentou no sofá. “Porra, Trish, eu não sabia que você
xingava feito um caminhoneiro. Que bom que Kaylee não está por
perto.”
Minha pulsação ainda tremia minhas têmporas, então respirei
fundo para relaxar. “Eu geralmente consigo me controlar, mas você
me assustou! O que você está fazendo aqui?”
Ele acendeu o abajur perto do sofá. “Eu ia perguntar a mesma
coisa?”
“Sofrendo com o fuso horário ainda. Vou buscar um copo de
leite quente.”
“Eu tenho remédio para dormir, se você precisar.”, ele
respondeu.
Eu já ia recusar, mas parei. “Na verdade, sim. Eu aceito
qualquer coisa que você tiver.”
Ele se levantou do sofá, usando somente uma cueca boxer que
abraçava suas coxas musculosas. Ele desapareceu na cozinha e
voltou com uma pílula e um copo d’água.
“Não se preocupe, não é forte.”, ele disse. “Mas vai ajudar.”
“Valeu.”, tomei o remédio e o engoli com a água.
“Ah!”, ele disse.
“O que?”
Ele deu de ombros e voltou para o sofá. “Estou surpreso por
você aceitar uma pílula de um estranho sem pensar nisso.”
“Você não é um estranho.”, eu sei. “E além disso, eu sei que
posso confiar em você. Ou pelo menos, eu acho que sim.”
Estava muito escuro para saber como ele reagiu, mas eu tive a
sensação de que Jordy estava corado. “Sim, tudo bem.”, ele disse
finalmente.
“Então, o que você está fazendo no sofá?”
“Archer ronca.”, ele respondeu. “E parece o barulho de uma
caixa de ferramentas lançada em uma betoneira. Estou surpreso por
você não ouvir do seu quarto. Caramba, estou surpreso por ele não
acordar toda a Escandinávia.”, ele se mexeu nas almofadas.
“Infelizmente, este sofá não é tão confortável quanto eu esperava.”
“Por que você não toma remédio para dormir?”, sugeri.
As sombras do seu rosto viraram um sorriso. “Tecnicamente,
estamos de sobreaviso. Não posso arriscar enquanto estou de
alerta.”
“Ah.”, eu ia me despedir, mas me virei para ele: “Jordy, isso é
estupidez. Você deveria dormir na minha cama.”
Ele sacudiu a cabeça. “Estou bem.”
“Você não está bem. Você precisa dormir! Você precisa
trabalhar amanhã!”
“Você também.”
“Meu trabalho não requer o mesmo nível de alerta do que
carregar uma arma e proteger dignatários internacionais.”
Jordy deu uma risadinha. “Agora você me pegou. Mas sério,
esse sofá é horrível. Sem chance de eu te deixar dormir aqui.”
Eu poderia desistir ali. Eu ofereci, conversamos, ele recusou
educadamente minha oferta. Eu poderia ter voltado para a cama e
me deixar pegar no sono quando o remédio começasse a fazer sua
mágica.
Mas ao invés disso, eu disse: “Podemos compartilhar a cama.”
Jordy ficou surpreso. “Ahn?”
“É muito grande, mais do que o suficiente para duas pessoas.
Posso até criar uma barreira de travesseiros entre nós. Não é nada
estranho. Só duas pessoas tentando dormir. E eu sei que não
ronco.”
Ele hesitou. Parecia que ele estava considerando a ideia. Meu
coração acelerou—e se ele aceitasse? Será que eu poderia
realmente dividir a cama com o homem pelo qual eu tinha um crush
por meses na academia?
“Tentador, mas eu vou ficar por aqui mesmo,”, Jordy finalmente
respondeu, “mas aprecio a oferta.”
Suspirei, mas eu não tinha certeza se era de alívio ou
decepção. “Vou deixar a porta destrancada e metade da cama vazia
se você mudar de ideia. Sério, não vou me importar.”
“Valeu, Anilha.”, disse Jordy enquanto eu voltava para o andar
de cima.
O remédio que ele tinha me dado funcionou rapidamente e eu
peguei no sono minutos depois que minha cabeça encostou no
travesseiro. Mas ele também me causou sonhos vívidos.
Eu estava no sofá do andar de baixo assistindo televisão com
todos os outros. Em um piscar de olhos, todos tinham sumido,
menos Jordy. Em outro piscar de olhos, ele estava sentado do meu
lado no sofá, virado na minha direção para ver a TV. Então se
inclinou e riu, me dando um tapinha na coxa. Eu ri com ele.
Então ele estava recostado de volta no sofá enquanto eu o
cavalgava. Meus cabelos estavam soltos e criavam uma cortina
entre nossos rostos enquanto nos beijávamos. Seus lábios pareciam
familiares nos meus, e não os lábios de alguém que eu estava
beijando pela primeira vez. Sua língua forçava a entrada na minha
boca e eu a aceitava ansiosamente, gemendo.
Sem se separar de mim, Jordy se sentou reto e enrolou seus
braços ao meu redor enquanto eu o cavalgava. Então ele me
afastou, me colocou deitada de costas para me cobrir com seu
corpo. Sua pele pressionava a minha porque, de repente, não
estávamos usando roupas. Abri minhas pernas mais ainda, o
aceitando, convidando-o na minha direção. E com a facilidade
peculiar que só os sonhos trazem, ele escorregou para dentro de
mim, cada centímetro, até não sobrar mais nada para me dar.
Agarrei um punhado dos seus cabelos, cabelos que tinham
originado o apelido Bombom que habitava minha cabeça fazia muito
tempo. Ele se guiava para dentro de mim desenfreadamente e
apaixonadamente, sem nenhum pensamento ou consciência. E em
segundos, nós dois gozamos juntos.
Acordei antes do meu alarme, grogue e com tesão. Já fazia um
tempo desde a última vez que eu tinha tido um sonho erótico como
aquele! Eu ainda conseguia me lembrar de como era senti-lo dentro
de mim, aquela dor maravilhosa de ser preenchida completamente
por um homem. Mas naquele momento, a única dor que eu sentia
entre as pernas era uma dor de insatisfação.
Foi só quando abri os olhos que me percebi que não estava
sozinha. Havia um mamilo na minha cara. Mamilo masculinão. Na
verdade, um corpo masculino inteiro na minha cama, e eu estava
pressionada contra aquilo.
Aquilo não, percebi. Jordy.
Ele estava deitado de costas. Minha cabeça estava encostada
na dobra do seu braço, seu bíceps estava duro e quente. Sua
respiração mexia meu cabelo enquanto ele dormia. Mas o mais
notável era minha perna sobre o seu corpo. Sobre seu volume. Eu
podia sentir seu pau debaixo da minha coxa desnuda, o tecido da
sua cueca era fino demais para conter o calor que vinha da sua vara
dura.
Ai meu Deus.
Por um longo tempo fiquei ali, na mesma posição. Eu não
sabia o que fazer. Chequei rapidamente e constatei que não, não
tínhamos transado. Aquela parte tinha sido definitivamente um
sonho. Mas ali estava ele, na minha cama, e eu estava de
conchinha com ele.
Conchinha com aquele corpo estonteante.
Indo contra meu julgamento, me permiti ficar ali por alguns
instantes. O calor da sua pele. Seu cheiro. A forma como minha
cabeça contra o seu peito se erguia a cada respiração dele. Eu
estava imensamente excitada, e não só pelo sonho, e eu sentia que
estava ensopada. Eu queria desesperadamente transformar o sonho
da noite anterior em realidade.
Mas será que eu conseguiria iniciar? Eu não era boa nisso. A
última vez que eu tinha tentado alguma coisa, convidando Jordy
para sair na academia, ele tinha me rejeitado—embora seu motivo
fosse legítimo, eu tinha descoberto. Mas ainda assim eu estava
paralisada pela indecisão.
Antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, senti Jordy se
mexer. Ele suspirou longa e satisfatoriamente.
Então seu corpo todo ficou tenso.
“Merda,”, ele murmurou, “o que é isso?”
“Desculpa.”, eu disse, me afastando dele. Havia muito espaço
do meu lado da cama.
Ele pulou da cama, ficando entre ela e a parede. Um momento
depois ele pareceu notar o volume enorme dentro da sua cueca,
então agarrou um travesseiro e se cobriu antes de perguntar. “O que
diabos aconteceu?”
“Você veio para a cama sem me contar!”
Jordy se engasgou com a resposta: “Você—você me
convidou!”
“Eu nem vi! O remédio que você me deu… acho que desmaiei.”
“Era só melatonina.”, ele respondeu. Ele estava claramente
frustrado. “Melatonina quase não tem efeito nenhum. E eu coloquei
uma barreira de travesseiros entre nós para me certificar de que
nada acontecesse por acidente.”
Olhei para a cama e vi que ele tinha razão: um dos longos
travesseiros estava posicionado verticalmente no centro da cama.
Eu o tinha ultrapassado enquanto dormia.
Mas ele acreditaria naquilo?
“Jordy…”, eu comecei.
“Preciso me arrumar.”, ele disse e correu para fora do quarto.
11

Jordy

Todo mundo responde lutando ou fugindo. E a minha tinha sido


aperfeiçoada em anos de treinamento. Eu era um guerreiro e na
maioria das situações, eu lutaria.
Mas naquela manhã, após acordar com o corpo de Trish de
conchinha com o meu como se pertencesse àquele lugar, algo no
meu cérebro mudou. Eu nunca tinha sido treinado para aquela
merda. Então eu fiz algo que era totalmente diferente da minha
personalidade.
Eu fugi.
Corri pelo corredor e fui direto para o banheiro que Archer e eu
compartilhávamos. Foi só quando fechei e tranquei a porta que
recomecei a respirar. Eu não sabia o porquê de sentir vergonha. Eu
não queria que aquilo acontecesse, mesmo não tendo sido capaz de
tirar Trish da cabeça desde que chegamos em Oslo. Caramba,
desde antes daquilo. Desde que ela reuniu coragem e me convidou
para sair na academia.
Ela me pegou desprevenido, pensei. É só isso.
Tirei minha cueca e entrei no banho. Mas a água quente que
correu pelo meu corpo fez pouco para afastar o pensamento de
Trish de conchinha comigo na cama. Eu ainda estava meio
sonolento quando aquilo aconteceu, mas eu conseguia me lembrar
dela roçando na minha coxa enquanto dormia, choramingando
suavemente. Meu braço tinha ficado preso debaixo dela e meus
dedos tocavam sua pele. Sua pele impossivelmente macia. E a
forma com que sua perna estava apoiada no meu volume…
Antes que eu me desse conta, comecei a me masturbar no
chuveiro. Eu precisei. Do contrário eu explodiria. Logo aquilo evoluiu
para fortes estocadas, agarrando meu pau enquanto imaginava seu
corpo sobre o meu. Eu geralmente demorava vários minutos quando
assistia pornografia, mas acabei despejando meu carregamento em
segundos. Engasguei-me e gemi contra os azulejos noruegueses
lisos do banheiro.
Me senti satisfeito enquanto me secava depois, mas aquilo era
inadequado. E eu queria mais.
Eu queria Trish.
Quando desci as escadas, Trish estava passando geleia em
duas torradas à mesa enquanto Archer engolia um prato de ovos
mexidos. Os dois estavam falando sobre uma série do Netflix que eu
nunca tinha ouvido falar. Trish olhou para mim e imediatamente
desviou o olhar, corada.
Merda.
A culpa cresceu dentro de mim como um gêiser. Ela estava
desconfortável naquele momento. E era definitivamente minha
culpa. Ela tinha sido gentil e oferecido sua cama para eu conseguir
dormir… e então aquilo aconteceu. Ela provavelmente me achava
um tarado. Ou pior, um tipo de predador que tinha planejado que
aquilo acontecesse.
Depois do café da manhã, nos despedimos de Kaylee e nos
preparamos para sair. Dei a Trish um sorriso estranho, mas não
disse nada quando saí pela porta. Eu não conseguia decidir se
aquela era a forma correta de lidar com aquilo, ou se eu deveria
simplesmente quebrar o gelo sobre o que tinha acontecido.
Estávamos na metade do caminho para a conferência quando
Harrison perguntou: “Vocês treparam ou o que?”
Se eu estivesse bebendo naquele momento, teria cuspido tudo
nas costas do assento de Archer. “O que? Hm? Do que você está
falando?”
Harrison se virou para me olhar. “Cara.”
“Ele te ouviu sair correndo do quarto de Trish como um
atacante que vê uma possibilidade imperdível de gol.”, disse Archer.
“Eu também ouvi. Kaylee também, provavelmente. Você fez muito
barulho.”
“Não gosto das suas metáforas esportivas estúpidas.”,
resmunguei.
“Futebol, seu idiota. O legítimo. E pare de fugir do assunto.”
“Claro que não transamos! Nada aconteceu. Ela me viu
dormindo no sofá e ofereceu metade da sua cama. Foi totalmente
inocente. Eu até construí uma barreira de travesseiro entre nós.”
“Então por que você correu daquele jeito como—”
“Como qual é a analogia britânica estupida que você vai usar
agora?”, antes que ele pudesse responder com sarcasmo, eu
continuei. “Quando acordamos, estávamos meio que... de
conchinha. Por acidente.”
Harrisou zombou alto e se virou para o outro lado.
“Você prometeu que isso não ia acontecer.”, Archer começou a
bronca. “Eu estava preocupado com exatamente este cenário, e
você me garantiu sem nenhuma incerteza que se comportaria.”
“Não aconteceu nada! E além disso, é sua culpa por roncar!”
Ele me olhou pelo retrovisor. “E é sua culpa por precisarmos
dividir uma cama. Teríamos quartos adequados se você não tivesse
se precipitado em contratar esta mulher.”
“Mas agora temos Kaylee aqui conosco. E você não reclamou
disso.”
Aquilo o fez se calar.
“Eu divido a cama com Trish.”, disse Harrison.
Me virei para ele. “Desde quando você gosta dela?”
Ele fez uma careta. “Quem falou em gostar?”
“Será que podemos todos evitar situações embaraçosas?”,
Archer respondeu exasperadamente. “Nós tempos pelo menos mais
sete semanas juntos, talvez mais tempo. Assim que terminar, vocês
podem brincar de conchinha com a babá o quanto quiserem.”
“Mais uma vez: foi um acidente.”, eu disse, com os dentes
cerrados. “Eu me senti estranho com a situação toda.”, olhei para
Harrison. “Posso dormir com você hoje?”
“De jeito nenhum.”, ele rosnou enquanto estacionávamos no
centro de conferência. “Mantenha sua bunda no sofá.”
A manhã continuou como qualquer outra. Harrison e eu
patrulhamos a seção do perímetro enquanto Archer nos cobria de
cima. Havia mais agentes de segurança nos telhados naquele dia.
Se o mesmo cara voltasse para tentar alguma coisa, ele teria que
encontrar outra forma.
Era difícil permanecer concentrado por incontáveis horas todos
os dias. Eu analisei os rostos dos pedestres e conferi com meus
colegas, mas nada empolgante aconteceu. Finalmente, na hora do
almoço, minha cabeça voltou para os eventos daquela manhã.
Agora que tempo suficiente tinha passado, eu queria mandar
uma mensagem para Trish. Quebrar o gelo de uma vez, e não
esperar até eu chegar em casa e estarmos cara-a-cara. Seria mais
fácil explicar as coisas em um texto, também. Eu conseguiria falar
sobre tudo sem bagunçar meus pensamentos. Quanto mais eu
pensava naquilo, mais eu compulsivamente precisava falar com ela.
“Tenho que ir ao banheiro.”, eu disse no rádio.
“Sem problemas.”, Archer respondeu. Seu tom mudou quando
ele trocou de frequência. “Aqui é Mathos Dois. Precisamos de
cobertura extra no setor nove enquanto um dos nossos soldados do
solo se ausenta por cinco minutos.”
“Positivo, Mathos. Enviando uma unidade de reforço.”
O Grand Hotel Oslo ficava a um quarteirão, e do outro lado da
rua havia um McDonald’s. Pensei que o banheiro do hotel deveria
ser melhor e entrei. Era um prédio antigo, com uma escada grande
que se curvava para a sacada no segundo andar. Dúzias de
mulheres e homens estavam vagando vestindo roupas sociais,
parecia um casamento ou algo assim. Presumi que a placa em
norueguês “BADEROM”, significava banheiro e depois de seguir um
corredor, descobri que estava certo.
“Brilhei,”, murmurei para mim mesmo enquanto entrava. Eu
realmente precisava fazer xixi, mas eu queria mandar a mensagem
antes. Entretanto, aquela tarefa acabou se tornando mais difícil do
que eu esperava. Eu digitei e apaguei pelo menos uma dúzia de
vezes antes de finalmente conseguir escrever algo simples.

Eu: Ei, estamos bem? Algo estranho?


Anilha: Como assim? Por que não estaríamos bem?

Olhei para a resposta. O que ela quis dizer com como assim?
Não havia nenhuma chance de ela ficar confusa com o que eu
estava me referindo! Ou ela queria que eu repetisse o que tinha
acontecido naquela manhã?
Meu cérebro imediatamente pressupôs o pior dos cenários: ela
quer um documento admitindo o que aconteceu. Ela nos processaria
ou algo do tipo. Bem, foda-se. Eu tinha arruinado as coisas, mesmo
que nada tivesse de fato acontecido e tudo tenha sido apenas um
mal-entendido.
Antes que eu pudesse continuar no meu espiral de ansiedade,
ouvi um barulho em uma das cabines do banheiro. Não qualquer
barulho: um clique. Tudo sumiu da minha mente, porque eu
conhecia aquele som intimamente.
Era o som de alguém colocando o tambor de volta em uma
arma.
Me encolhi lentamente. Os banheiros europeus não têm
aqueles vãos idiotas na porta como os americanos, então eu não
consegui ver nada. Fiquei de pé sem fazer nenhum barulho. Será
que era alguém do casamento? Ou outro segurança da
conferência? Não, não poderia. Outro segurança não estaria
recarregando sua arma na porra de um banheiro.
Lavei minhas mãos e saí do banheiro. No corredor, um bando
de madrinhas estava dando risadinhas enquanto assistiam um vídeo
no telefone de alguma delas. Teria sido melhor se elas não
estivessem ali, mas não havia nada que eu pudesse fazer sem
levantar suspeitas.
Me encostei na parede e fingi que estava checando meu
telefone enquanto tentava ouvir mais barulhos dentro do banheiro.
Dois minutos se passaram. Três. O homem estava demorando. Será
que eu deveria comunicar a suspeita pelo rádio? Comecei a
questionar o que eu tinha ouvido. Eu tive certeza por um momento,
mas agora já não sabia mais…
A porta se abriu e um homem de uniforme de cozinheiro saiu
de dentro do banheiro. Ele se virou para a direita e caminhou para
longe de mim, em direção ao lobby. Um crachá da conferência de
paz estava pendurado na sua cintura. Debaixo dele, um volume, que
deveria ser a arma.
Decidi segui-lo. “Com licença, senhor?”, mostrei minha própria
credencial de segurança. “Eu gostaria de pedir que—”
No momento em que ele viu meu rosto, saiu correndo. Eu
estava preparado para aquela reação, e diminuí a distância em
alguns segundos. Ele tinha levado a mão ao coldre quando eu o
agarrei por trás, o que fez as madrinhas do casamento gritarem e
correrem para o lobby.
Quando sua mão se ergueu, ele segurava a arma. Uma
Tokarev 25mm, alguma parte dolhosportante do meu cérebro notou
enquanto meus instintos agarravam seu punho e o torciam até ouvir
um estalo. Ele gritou e soltou a arma, que eu chutei para longe
antes de dar uma joelhada nas suas costas. Toda a movimentação
deve ter durado quatro segundos.
“Transnistria tilhører Russland!”, ele gritou. Parecia norueguês
com um sotaque russo. “Død for NATO!”
Eu amarrei seus punhos juntos, ignorando os gritos e olhares
da festa de casamento. “Comando, aqui é Mathos Um. Preciso de
assistência no Grand Oslo Hotel. Capturei alguém.”
12

Trish

“Trish?”, Lisa respondeu ao telefone. Ela parecia meio grogue.


“Que horas são?”
“Merda! Esqueci da diferença de fuso!”, respondi. “Desculpa, já
é de tarde aqui, posso te ligar depois se você quiser…”
Ouvi minha melhor amiga resmungar. “Não, hm, tudo bem. Já
estou acordada. Está tudo bem?”
Parei para olhar para Kaylee. Ela estava colorindo um livro no
chão, vários gizes de cera se espalhavam ao redor dela como
escombros coloridos. “Algo aconteceu. Com Jordy.”
“Quem?”
“Bombom,”, respondi, “seu nome real é Jordy.”
“Bombom?”, Kaylee de repente ficou de pé animada. “Vamos
fazer bombom?”
Merda. “Talvez mais tarde. Não sei se temos os ingredientes.”
“EBA!”, ela gritou e voltou para seu livro de colorir.
“Valeu,”, eu disse a Lisa enquanto entrava na cozinha, para
manter aquela conversa privada sem tirar os olhos da garota, “agora
vou ter que fazer bombons para ela.”
“Esquece isso!”, Lisa respondeu, parecendo bem mais
acordada. “O que tem Jordy? O que aconteceu?”
Resumi os eventos do quarto rapidamente para ela. E contei
da mensagem que Jordy me mandou.
“Ele nunca respondeu?”, Lisa suspirou. “Isso é um mau sinal.”
Resmunguei. “Era disso que eu tinha medo, mas eu não
pretendi me aninhar nele!”
“E como foi a experiência?”, ela perguntou.
“Maravilhosa. Ele é enorme e quente. Só durou um minuto,
mas enquanto eu estava enrolada nele, me senti… não sei. Segura.”
“Isso é ótimo e tudo mais, mas não foi o que perguntei. Eu
queria saber sobre a experiência lá embaixo…você sabe… o
tamanho. É grande?”
“Lisa!”, sibilei. “Estou no meio de uma crise aqui e você
preocupada com as coisas dolhosportantes.”
“Não entendo como estar no meio de uma crise elimina o fato
de eu saber sobre os detalhes suculentos…”, ela resmungou.
“Não existem detalhes suculentos para eu compartilhar. Nada
aconteceu.”, eu parei. “Mas sim, é grande.”
“EU SABIA!”, ela praticamente gritou.
“Não tipo obscenamente grande,”, acrescentei, “mas grande,
eu acho. É difícil dizer porque ele estava de cueca.”
“E o meu cara?”, ela perguntou. “Você chegou a ver Caramelo
de cueca?”
“Lisa…”
“Aposto que ele usa cuecas boxers com a bandeira do Reino
Unido estampada.”, ela disse desejosamente. “Ou daquelas
esportivas, tipo Speedo.”
“Se você não vai me ajudar, vou desligar.”
“Ok! Está bem! Jesus, você me acorda no meio da madrugada
e nem me deixa desfrutar de imagens mentais deliciosas.”, eu ouvi o
bipe do seu micro-ondas do outro lado. Provavelmente reaquecendo
café. “Meu conselho é ficar de boa.”
“Você se esqueceu com quem está falando? Eu não tenho a
menor ideia de como ficar de boa, Lisa.”
“Finja que não é nada demais.”, ela disse. “Aja normalmente.
Sorria para ele.”
“Se eu sorrir para ele, ele vai achar que eu tive a intenção de
fazer o que fiz.”
Lisa gargalhou. “Eu disse sorrir, não secar o cara com os olhos.
Você é realmente péssima nisso.”
“Sim! É o que estou tentando dizer!”
“Só vai ser estranho se você agir estranhamente.”, ela disse.
“Honestamente, ele provavelmente não respondeu sua mensagem
porque está ocupado matando pessoas ou algo do tipo.”
“Ele não está matando pessoas. Eles são só seguranças do—”,
eu parei de falar. “Não posso falar nada. Você vai me causar
problemas.”
“Você e sem graça. Mas eu espero ouvir tudo quando você
voltar. Você vai voltar para Wilmington, não vai?”
“É claro que vou!”, respondi. “Já sinto falta de casa. Viajar para
fora é divertido, mas não é a mesma coisa.”
“Eles pelo menos tem pizza aí? Na verdade, não responda.
Por mais que eu queira saber, não quero te causar problemas. Fique
em segurança, ok?”
Depois de desligar, voltei aos livros de colorir com Kaylee.
Ficar de boa. Eu não sabia como fazer isso. Na melhor das
circunstâncias, eu já me comportava esquisitamente perto de caras,
e aquela era uma circunstância longe de ser normal. Eu não tinha
ideia do que aconteceria quando eles voltassem para casa.
Entretanto, debaixo do meu constrangimento, havia outro
sentimento com o qual eu estava lutando. Desejo. A sensação do
corpo de Jordy no meu ficou permanentemente na minha cabeça.
Quando eu fechava os olhos, o via espalhado debaixo de mim, sua
pele bronzeada pulsando por causa dos músculos poderosos.
“Você joga outra coisa além de Minecraft?”, perguntei a Kaylee
para distrair minha cabeça.
Aquilo foi o suficiente para uma hora de conversa. Ela parecia
apaixonada em todos os outros jogos que jogava no computador
também, e era capaz de dar longas palestras sobre as melhores e
piores estratégias para cada um deles. Por um tempo, ela me
distraiu de tudo o que estava acontecendo entre mim e seu pai.
Eu realmente gostava de cuidar de uma garota da idade dela.
Meu último trabalho tinha sido cuidar de crianças de três e cinco
anos. Comparada a eles, Kaylee praticamente cuidava de si mesma.
E por mais bobo que fosse, eu adorava jogar Minecraft com ela.
Meu laptop mal dava conta do jogo, mas eu conseguia entrar no
mundo dela e ajudá-la a construir coisas. Era fascinante ver sua
criatividade aflorar enquanto ela construía um castelo em uma
montanha feita de blocos de pedra pixelados.
Os rapazes não chegaram em casa na hora usual, então
coloquei uma das refeições pré-prontas no fornão. Quando o jantar
ficou pronto, uma hora depois, eles ainda não estavam em casa. Eu
disse a Kaylee que provavelmente eles ainda estavam ocupados
com o trabalho e que não havia motivo para nos preocuparmos, mas
senti minha ansiedade aumentando o tempo todo. Especialmente
por causa da forma que Jordy parou de me mandar mensagens
abruptamente mais cedo naquele dia.
Li uma historinha sobre dinossauros para Kaylee dormir e dei a
ela um beijo de boa noite. Então voltei para o primeiro andar e me
servi de uma taça de vinho para acalmar meus nervos. Não
funcionou. Nem a segunda taça.
Quando ouvi o portão da garagem abrir, praticamente pulei do
sofá de alívio. Me forcei a me sentar de novo e parecer relaxada
quando eles entraram no apartamento.
“Desculpa pelo atraso.”, disse Archer. “Foi um dia cheio de
eventos.”
“Eventos? Isso não parece bom.”, eu disse.
“Bons eventos.”, Archer respondeu. “Muita papelada e
reuniões.”
“Jordy pegou um terrorista.”, Harrison disse sem rodeios.
“O que?”
Jordy entrou no apartamento com um sorriso no rosto. “Ele
está exagerando.”
“Foi meio que literalmente o que aconteceu.”, Archer disse.
“Vamos deixá-lo explicar a você. Agora preciso de comida, banho e
minha cama, não necessariamente nessa ordem.”
“Deixei o que sobrou no forno para ficar quente. Kaylee foi para
a cama faz mais ou menos uma hora, então já deve estar
dormindo.”
Jordy subiu para tomar banho enquanto os outros dois
comiam. Harrison comia como um cachorro que não sabia quando
seria alimentado de novo. Eu estava ansiosa e queria interrogá-los
sobre o que tinha acontecido naquele dia, mas dava para ver que
ambos estavam muito exaustos para conversar. E quando eu fiz
uma busca rápida online sobre a conferência de paz, não encontrei
nada sobre o tal terrorista.
Eles foram para a acama bem quando Jordy descia as
escadas, ele estava usando uma calça de moletom e uma camiseta
azul marinho de gola V. Seus cabelos ainda estavam molhados e
suas bochechas rosadas por causa do vapor.
“Ok, me comportei nos últimos trinta minutos,”, eu disse,
entregando a ele um prato de comida, “mas vou explodir se ninguém
me contar o que aconteceu hoje!”
Ele olhou para o prato. “Você é a babá de Kayleen, não nossa
empregada. Você não precisa fazer meu prato.”
“Pare de argumentar e me conte o que aconteceu! Você
capturou um terrorista?”
O estômago dele roncou e ele se sentou sem protestar mais.
“Eu estava no banheiro do hotel quando ouvi alguém carregar uma
arma. Esperei até ele sair e o apreendi. Acontece que ele era um
terrorista russo que tinha opiniões bem fortes sobre Transnístria.”
“Onde fica Transnístria?”
“E eu lá sei,”, ele disse com a boca cheia, “algum lugar perto
da Moldávia, eu acho. Archer deve saber.”, ele apontou para mim
com o garfo. “Eu estava falando com você quando tudo aconteceu.
Por isso parei de responder de repente. Você provavelmente ficou
preocupada.”
“Não, não pensei em nada disso.”, respondi. “Desculpa por te
distrair hoje.”
Ele engoliu sua comida e sorriu jovialmente. “Você está
brincando? Eu só fui ao banheiro para te mandar uma mensagem.
Você é o motivo pelo qual eu capturei o cara!”
Senti minhas bochechas corarem. “Nada tanto assim. Você me
mandou uma mensagem primeiro. Só uma coincidência de sorte.”
Jordy deu de ombros e continuou comendo. Eu bebi mais
vinho. O silêncio se alargou e quando mais o tempo passava, mais
tenso o ar ficava.
Finalmente, ele terminou de comer e colocou o garfo na mesa.
Então se recostou na cadeira e disse: “Te devo desculpas.”
“O que? Por quê?”
“Fui para a sua cama tarde ontem enquanto você dormia. E
você estava dormindo profundamente porque eu te dei um remédio.
Você deve achar que eu sou um tipo de predador.”
“Foi só melatonina.”, comecei, mas ele me fez parar.
“Quero que você se sinta segura. Que você confie em mim. E
nos outros dois, é claro. Violei essa confiança ontem. Ou, bem, eu
acho que foi hoje de manhã. De qualquer forma, só queria te dizer
que não vai acontecer de novo.”
Gargalhei, incrédula. “Jordy, você não fez nada de errado. você
só estava lá, deitado, e eu cruzei a barreira de travesseiros e me
aninhei em você. Falando nisso, foi totalmente acidental. Eu nem
sabia o que estava fazendo. Se alguém deve desculpas aqui, esse
alguém sou eu.”
Ele deu uma risadinha. “Passei o dia enlouquecendo por causa
disso e pensando que você estava brava comigo.”
“Eu também!”
“Somos dois patéticos, não somos?”, ele perguntou.
“Muito patéticos.”
Jordy sorriu mais uma vez e meu coração derreteu. “Que tal
isso: estamos quites e nada aconteceu. Combinado?”, ele esticou a
mão.
“Combinado.”, sua palma era tão grande que envelopou minha
mão completamente e seus calos roçaram minha pele.
“Estou exausto.”, ele disse, ficando de pé e se espreguiçando.
“Não sei se você vai ficar acordada até mais tarde, mas vou me
esticar aqui no sofá, se você quiser levar seu vinho para o quarto.”
“Não!”, exclamei. Jordy piscou, surpreso. A paixão na minha
voz surpreendeu até a mim mesma. “Jordy, somos dois adultos.
Podemos dividir a cama. Eu coloco um travesseiro maior entre nós e
me certifico de ficar do meu lado. se você quiser.”
Ele uniu as sobrancelhas pensando. Me dei conta de que
queria desesperadamente que ele concordasse. E não só porque eu
não queria que minha presença fosse um inconveniente.
Eu queria que ele dormisse ao meu lado.
“A cama é confortável.”, ele admitiu relutantemente. “Bem mais
do que o sofá. Desde que você não se importe, eu topo dividir.”
“Não me importo.”
“Mas para o próximo contrato,”, ele disse, “vou me certificar de
que temos melhores condições de acomodação. Assim isso não vai
acontecer de novo.”
“É claro,”, eu disse, “é apenas temporário.”
13

Trish

Um clima estranho se abateu sobre mim enquanto eu


escovava os dentes e me preparava para ir dormir. Talvez tenham
sido as três taças de vinho. Ou as horas que passei preocupada
com os rapazes que estavam atrasados para chegar em casa. Ou
talvez estar do outro lado do mundo, longe da única cidade que eu
conhecia, sem saber o que fazer.
Não é nada disso, pensei. É porque estou prestes a
compartilhar a cama com Bombom, meu crush da academia. De
novo.
Quando entrei no quarto, encontrei Jordy já na cama. Ele tinha
dividido a cama em duas partes perfeitamente com o travesseiro
longo. Apesar de já estar debaixo das cobertas, ele ainda estava
vestindo uma camiseta.
“Bem, boa noite!”, eu disse, assumindo meu lado da cama e
apagando a luz.
“Boa noite, Trish.”, ele respondeu.
Passei um bom tempo encarando o teto e ouvindo Jordy
respirar. Eu estava supersensível a todos os ruídos que eu fazia, até
o menor movimento me virando na cama. Como se qualquer coisa
pudesse perturbá-lo, tipo o ronco de Archer. Eu desesperadamente
não queria ser uma perturbação para aquele homem, por mais tolo
que parecesse.
Depois de alguns minutos, ele tirou sua camiseta e a jogou no
chão do quarto. Então ficou em total silêncio de novo. Não ouvi mais
nada. A água corria pelos encanamentos na parede. Limpei minha
garganta. O cobertor se esticou quando ele se virou para o outro
lado.
“É muito quieto aqui,”, ele sussurrou, “eu sinto que consigo
ouvir meu próprio coração bater. Sinto falta do barulho do mar.”
“Sim”, respondi. “Aqui não existe barulho de fundo. Eu estava
me perguntando o que havia de estranho por aqui.”
“Melhor do que ficar no centro da cidade.”, sua voz era um
estrondo suave. “Faz alguns anos que ficamos no centro de Praga.
Nada mais do que buzinas de carros e falação de pedestres a noite
toda. Harrison dorme em qualquer situação, mas Archer e eu
sofremos durante aquela missão.”, ele sacudiu a cabeça. “E então
tudo foi por água abaixo. Foi o maior perigo que já passamos. E o
cuzão que tínhamos ido capturar, Anton Novak, escapou.”
“O que aconteceu?”
Ele encarou o nada. “Hmm, eu não quero falar sobre isso, tudo
bem por você?”
“Sim, não, é claro.”, olhei para ele no escuro e vi o perfil do seu
rosto recortado na janela atrás dele. “Posso te perguntar outra
coisa?”
“Claro. É sobre a mãe de Kaylee?”
“Não, na verdade eu ia perguntar se vocês fizeram Harrison me
pedir desculpas ontem.”
Ele zombou. “Harrison foi um imbecil com você. Aquilo me
irritou. Dei uma bronca nele depois, mas não. Não o fiz se
desculpar. Ele é sutil como um elefante em uma loja de louças, mas
ele é capaz de perceber quando comete um deslize.”
“Isso é bom,”, eu disse, “fiquei surpresa quando ele me pediu
desculpas. Mas apreciei o gesto, causado por você ou não.”
“Não fui eu. Iniciativa todinha dele.”
Ficamos em silêncio por alguns minutos.
“Posso te perguntar outra outra coisa?”, eu disse.
“Manda.”
“É sobre a mãe de Kaylee.”
Jordy deu uma risadinha. “Eu sabia que você estava pensando
nisso.”
“Eu não ia perguntar, mas você tocou no assunto. Onde está a
mãe dela? Ela chama vocês três de pais, mas quem é o pai
biológico dela?”
“Nenhum de nós, na verdade.”
Fiquei surpresa. “Sério?”
“Em 2014, Harrison e eu estávamos posicionados do lado de
fora de Sebastopol. Uma grande cidade portuária na Península da
Criméia. Os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a Ucrânia estavam
praticando juntos. Nada oficial, a maioria das manobras eram
mantidas escondidas para evitar a irritação de certos poderes da
região. Estávamos no meio de um treinamento quando a Rússia
decidiu invadir.
“Oh, não.”
“Hmm-hmm. Um oh não muito grande. Invasões são, em
termos técnicos, grandes merdas. Durante as primeiras horas,
ninguém sabia o que estava acontecendo. Estávamos anexados a
uma unidade ucraniana que tinha sido destacada para proteger o
porto. Seria um incidente internacional se alguém da OTAN se
envolvesse em qualquer combate direto contra tropas russas, então
precisamos nos separar e ir embora assim que a noite chegou. A
cidade estava um caos enquanto tentávamos chegar até o ponto de
extração. A energia estava falhando. Misseis sendo lançados pela
cidade. Blocos inteiros sendo dizimados, nada além de escombros.
E nós estávamos passando por um desses blocos quando ouvimos
um bebê chorar dentro de uma loja. Chorando muito. Um som
horrível. Fez meus ossos doerem. Harrison e eu corremos para
dentro e o encontramos sozinho dentro de uma cesta. Metade da
loja tinha desabado e a outra metade estava prestes a fazer o
mesmo. Então Harrison pegou o bebê e o carregou conosco até a
zona de extração.
“Chegamos lá,”, ele continuou, “e um helicóptero britânico nos
esperava. Fomos os últimos a chegar. E o comandante da unidade
era um cuzão elegante que nos disse para abandonar o bebê.”
Coloquei a mão sobre a boca. “Ai meu Deus.”
Jordy deu uma risada sarcástica. “Harrison não gostou daquilo.
Ele pegou sua arma e ameaçou acabar com o comandante ali
mesmo. O embate aconteceu, nenhum dos dois queria ceder.
Enquanto isso, a cidade continuava sendo bombardeada. Misseis
explodiam tão poderosamente que meus dentes doíam mesmo a
milhas de distância. Finalmente o piloto do helicóptero disse ao
comandante que não decolaria a menos que o bebê estivesse a
bordo. O comandante cedeu e nós voamos de volta para a base na
Romênia.”
“E o bebê era Kaylee? O que aconteceu depois?”
“O bebê era de fato Kaylee.”, ele disse. “E quando o
helicóptero aterrissou, o comandante fez com que a PM—Polícia
Militar—nos levasse sob custódia. Eu, Harrison e piloto. As forças
da OTAN não deveriam estar em Criméia naquela época, então
Harrison e eu recebemos dispensas médicas falsas. Aquilo manteria
tudo em segredo. E como parte do esquema, eles falsificaram a
certidão de nascimento dela. Eu não sei realmente todos os
detalhes, mas eu sou seu pai adotivo no papel. Harrison e eu nos
mudamos de volta para Wilmington e alugamos uma casa juntos
para nos focarmos na criação de Kaylee por um tempo. E tentar
entender os próximos passos, o que fazer.”
Eu ri. “Aposto que foi uma grande experiência.”
“Você não tem ideia.”, ele riu comigo. “A irmã de Harrison foi
nos visitar e ensinar algumas coisas. Depois de alguns meses, já
tínhamos conseguido alguns avanços. Mas um dia recebemos uma
ligação do piloto do helicóptero que confrontou o comandante. Um
cara chamado Archibald Caspian. Ele também tinha sido desligado
da corporação e queria visitar a garotinha por quem ele tinha
abdicado da sua carreira. Era para ele ter ficado só um dia conosco,
mas ele não conseguiu mais ir embora. Ele se apaixonou pela
garotinha assim como Harrison e eu tínhamos nos apaixonado.
Então ele nos disse que a Companhia Mathos tinha uma
oportunidade para nós, para trabalharmos como mercenários.
Assinamos o contrato naquela semana e o resto é história.
“Vou ser honesta,”, eu disse, “quando comecei a pensar na
situação de Kaylee, não teria adivinhado isso nem em um milhão de
anos. Eu só presumi que um de vocês era o pai e que a mãe não
era presente.”
Eu não conseguia vê-lo no escuro, mas ouvi um sorriso na sua
voz. “Sim, é uma situação complicada. Mas oito anos depois, estou
mais feliz do que nunca pensei que seria. Eu não mudaria nada
nessa história. E mesmo que eu seja o cara cujo nome está na
certidão de nascimento dela, Harrison e Archer são tão pais de
Kaylee quanto eu. Nenhum de nós é mais do que u outro. Todos
juntos somos uma pequena e estranha família.”
Ele parou de falar e eu pensei na doçura daquilo tudo. Aquela
era a família mais incomum que eu conhecia, mas me fazia tão feliz
pensar que eles tinham arrumado uma forma de fazer tudo dar
certo.
“Certamente é difícil ter uma vida normal.”, Jordy acrescentou.
“Ter uma filha torna namoros difíceis. Ou pelo menos mais difíceis.
Muitas mulheres não querem se envolver com homens que já tem
uma filha, sem contar nas complicações de acrescentar mais dois
outros homens na história. Archer namorou uma mulher uns anos
atrás que era perdidamente apaixonada por ele, mas não gostava
da ideia de ele ter uma filha conosco. No final, Archer nos escolheu,
mas aquilo doeu por um tempo.”, a cama tremeu quando ele
sacudiu a cabeça. “Entretanto, Kaylee nos mantem com os pés no
chão. Raramente selecionamos missões perigosas por causa dela.
É diferente quando estamos potencialmente abandonando nossa
filha sozinha se algo ruim acontecer. E isso é difícil, porque os
trabalhos mais bem pagos são os mais perigosos. E é por isso que
estamos fazendo essas três missões dessa forma. Para ter dinheiro
na nossa conta pelos próximos anos, nos dando o luxo de sermos
mais seletivos nas próximas missões. Talvez até tenhamos a
flexibilidade de nos demitir juntos.”
Ele suspirou longamente. “Falei muito. Desculpa por isso.”
“Não! Não peça desculpas. Fui eu quem perguntei. E é bom
conhecer a situação toda.”
O silêncio nos abateu. Olhei para ele no escuro. Jordy era só
uma silhueta, mas dava para ver que ele estava deitado de costas
com um braço atrás da cabeça.
Eu já sentia atração por ele, não preciso dizer. Mas saber
aquela história toda, a forma como ele arriscou sua carreira militar
para salvar uma criança indefesa e que ele a pegou para criar… foi
demais. A parte do meu cérebro de mulher das cavernas ordenava
que eu o atacasse antes que alguém mais o fizesse. Que eu rolasse
para cima dele e realizasse o sonho que eu tinha tido na noite
anterior.
Mas enquanto eu encarava o teto, me questionei. Era difícil
tomar a iniciativa. Especialmente porque eu já tinha feito isso na
academia e tinha sido rejeitada. Certamente eu tinha sido rejeitada
por um motivo legítimo, mas aquilo tornava tudo mais difícil para
mim agora.
“Ei, Trish?”, ele sussurrou.
“Jordy.”
“Posso perguntar uma coisa?”
“É o mais justo, depois de eu ter te perguntado sobre Kaylee.”,
respondi.
Ele não disse nada por um longo momento. Ouvi a água pelos
encanamentos de novo. Segurei a respiração me perguntando o que
ele queria saber.
“Posso te beijar?”
14

Trish

Demorei alguns segundos para registrar as palavras dele. “Me


beijar?”
Jordy se virou para me encarar. “Sim. Eu realmente quero te
beijar. E depois de tudo o que aconteceu hoje… não dou a mínima
para as consequências.”
Abri a boca, mas nenhuma palavra saiu. Meu corpo estava
falhando. Eu deveria gritar sim, sim, eu quero que você me beije,
seu gostoso! Mas ao invés disso, eu apenas assenti e aquilo deve
ter sido o suficiente porque Jordy removeu a barreira de travesseiros
e se aproximou. Eu me virei de lado para encará-lo e nossas peles
se encostaram—os dedos dos pés se misturando e os braços
colados um no outro.
Jordy chocou seus lábios nos meus com uma atração
magnética. Testa com testa, nariz com nariz, nos beijamos debaixo
do calor das cobertas. Ele escorregou uma mão pelo meu braço,
testando minha pele sob seus dedos e finalmente enrolando a parte
de trás do meu braço e me puxando ainda mais para perto. Seus
lábios eram estonteantes e viciantes, mais doces que o mais fino
dos vinhos e fiquei embriagada por ele rapidamente. Sua boca
engolia a minha no escuro, boca com a qual eu tinha fantasiado na
academia por meses e que finalmente era minha.
Estávamos ofegantes quando nos afastamos. Nossos rostos
ficaram a alguns centímetros e seus olhos amendoados procuraram
os meus. Eu não conseguia pensar no que dizer, nas palavras
adequadas para o momento depois do nosso primeiro beijo. Tudo o
que eu conseguia pensar era: eu quero mais de você.
Meus olhos devem ter dito a ele o que eu queria, porque ele
me empurrou de costas e subiu em mim, renovando o beijo como se
fosse sua vingança. Meus sentidos estavam todos aguçados
quando seu corpo pressionou o meu, duro e quente e tudo o que eu
sempre imaginei que um homem deveria ser. Enquanto ele me
devorava com beijos, eu me ascendia com desejo, abrindo as
pernas e arqueando as costas, desesperada para sentir o peso dele
através do meu short de pijama. Seu pau estava duro contra a
minha barriga, impossível de ser ignorado, mesmo debaixo do
tecido da sua cueca, um farol de desejo sexual que era inteiramente
por mim.
Sua língua forçava seu caminho na minha boca, conquistando
e reivindicando. Eu gemi suavemente e ele respondeu retumbando
de prazer, do fundo da sua garganta, vibrando sua língua na minha.
Meu corpo estava em chamas de desejo, sinalizando para ele a
cada beijo apaixonado.
Do outro lado do mundo, longe de casa, seus braços me
faziam me sentir aquecida, segura e intimista.
Jordy afastou seus lábios dos meus e disse: “Preciso de você,
Trish.”, ele me encarou por um momento e tirou minha blusa. Na
sequência, arrancou meu short de pijama e o ar fresco tocou minha
pele por um instante antes de ele me cobrir de novo com seu corpo
quente. Estiquei a mão para remover sua cueca, porque eu estava
totalmente nua e ele não, uma situação que precisava ser
remediada o mais rápido possível. Ele usava uma cueca boxer
terrível e opressiva que eu odiava com cada centímetro do meu
corpo. Mas antes que eu a pudesse remover, ele escorregou na
cama, beijando meu pescoço.
“Ahh,”, gemi quando ele roçou o nariz em um dos meus
mamilos, e em seguida o alcançou com a língua, enviando novos
jatos de eletricidade pelo meu corpo. Ele continuou escorregando
pelo meu corpo, suas mãos me explorando pelo caminho, cavando
minha pele com necessidade. Eu senti sua respiração quente contra
o meu sexo, o que me fez tremer e fechar as pernas instintivamente,
mas ele se enfiou entre as minhas coxas antes que eu pudesse
fazê-lo.
No momento que sua língua tocou meu clitóris, meu corpo todo
derreteu contra o dele. terminações nervosas que eu nem sabia que
tinha dispararam no meu cérebro. Tive que fechar os olhos quando
ele começou a me chupar com cada vez mais entusiasmo, me
devorando como se estivesse faminto por mim.
Uma vez na vida fui capaz de parar de pensar no que estava
fazendo e só deixar acontecer. Eu estava segura em seus braços.
Segura e muito bem cuidada. A língua de Jordy subia e descia na
minha entrada ensopada, ao redor do meu clitóris e descia de novo.
Ele agarrava minhas coxas com seus braços poderosos enquanto
pressionava seu rosto na minha boceta, e eu erguia meu quadril na
direção dele a cada carícia da sua língua. Quando senti meu clímax
se aproximando, diferente das outras vezes, eu simplesmente fui
tomada por ele antes que me desse conta. O orgasmo me arrastou
até o penhasco e me jogou no abismo de puro êxtase. Minhas
costas se arquearam violentamente e minhas pernas se enrolaram
em volta da cabeça de Jordy. Precisei morder o lábio para não gritar
e acordar todo mundo naquele apartamento.
Jordy beijou meu corpo até meu pescoço, voltando para a
posição original enquanto eu me recuperava. O suor escorria pelas
minhas têmporas e eu me esforçava para recobrar o fôlego.
“Você… é… muito bom… nisso…”, eu consegui dizer.
Ele sorriu para mim de forma charmosa. “De onde eu venho,
um homem sempre cuida de uma donzela antes de cuidar de si
mesmo.”
“Falando nisso…”, estiquei a mão entre nós e apertei seu pau
através da cueca. Ele pulsou ao meu toque e Jordy gemeu
suavemente, agitando uma mecha dos meus cabelos.
“Trish?”, ele sussurrou. “Não precisamos.”
Fiquei surpresa. “Como não? Eu tomo pílula, se é isso que te
preocupa…”
Ele ergueu as sobrancelhas, o que acentuou as linhas ao redor
dos seus olhos amendoados. “Eu realmente gosto de você, Trish,
não quero arruinar nenhuma chance indo rápido demais.”
Grunhi. “Você cuidadosamente estruturou essa frase para me
fazer te querer ainda mais?”
“Estou falando sério. Eu já fui apressado antes. E quero me
certificar de não cometer este erro de novo.”
“E eu estou falando sério que se eu não te sentir dentro de mim
agora mesmo,”, respondi, “eu vou gritar.”
Ele sorriu. “Bom, espero te fazer gritar por outro motivo então.”
Jordy tirou sua cueca e me beijou com ternura. Senti meu
próprio gosto nos seus lábios, principalmente quando o beijo se
intensificou e ele moldou seu corpo no meu. Estiquei a mão entre
nós e segurei seu pau, quente e duro e macio. Eu o acariciei
gentilmente enquanto o guiava para dentro dos meus lábios,
movendo-o para cima e para baixo, cobrindo-o com meu líquido.
Apesar de dizer que o queria imediatamente, eu estava
aproveitando cada momento daquela provocação. Eu sentia a
tensão do seu corpo sobre o meu, a antecipação de me sentir por
dentro. Por mais que eu o quisesse, a antecipação estava me
excitando ainda mais.
“Não posso mais aguentar isso.”, ele gemeu.
“Você não precisa.”, eu sussurrei de volta. “Faça o que quiser
comigo.”, eu olhei para ele. “Como você me quer?”
Jordy sorriu. “É assim que eu te quero.”, ele disse, me virando
de lado. Dei um gritinho quando ele enfiou seu pau dentro de mim
por trás—eu estava ensopada e ele escorregou facilmente para
dentro. Senti sua vara pressionar intensamente minhas paredes
internas e abri a boca num grito silencioso de êxtase, finalmente
saboreando nossos dois corpos em um.
“Meu Deus,”, ele gemeu na minha nuca, “você é mais gostosa
do que eu jamais imaginei.”
Ainda de lado, me virei para beijá-lo. Enfiei minha língua na
sua boca, e ele começou a torcer a sua contra a minha. Puxei sua
língua para dentro da minha boca e a chupei, como se estivesse
fazendo um mini-boquete.
Ele respondeu aumentando o ritmo, me fodendo com mais
força. Os pelos do seu caminho da felicidade roçavam minha bunda
enquanto ele entrava e saía, molhado e grosso e duro.
O ângulo era intenso, mas exatamente na medida certa.
Comecei a empinar a bunda e me guiar na direção dele,
encontrando suas estocadas na metade do caminho.
“Trish.”, meu nome era uma oração e uma maldição nos seus
lábios.
“Sim,”, gemi, “mais forte. Me fode mais forte. Isso. Mais forte!
Não para!”
Ele não parou, e começou a bombear com força até seus
dedos se afundarem na minha carne. Então ele gritou em êxtase e
enfiou em mim o mais profundamente que pôde, gozando e me
enchendo com seu calor.
Me virei novamente para beijá-lo enquanto ele gozava, a
paixão nos nossos lábios diminuindo assim como os esguichos do
seu pau. Nos afundamos nos travesseiros, esgotados demais para
nos movermos.
Saboreei a sensação do seu pau dentro de mim, lentamente
amolecendo enquanto eu o apertava. Eu não queria que ele me
deixasse.
“Você queria que isso acontecesse, não queria?”, perguntei.
Ele vibrou, gargalhando silenciosamente, e eu senti porque
nossas peles estavam grudadas. “Tudo o que eu queria era uma
boa noite de sono em uma cama confortável. Eu juro.”
Fechamos os olhos, em silêncio e em paz por um momento.
Normalmente, eu não ousaria provocar alguém na cama. Você
nunca sabe como um cara pode reagir. Mas eu sentia que podia ser
eu mesma com Jordy e o momento pedia uma provocação suave.
“Então,”, eu disse calmamente. “Eu sou gostosa demais ou
você normalmente só dura alguns minutos?”
Sua cara de choque me fez gargalhar.
“Você não é nada engraçada.”, ele respondeu.
Dei a ele um olhar confrontador. “Quem disse que foi uma
piada?”
Ele riu maquiavelicamente. “Então acho que vamos ter que
fazer de novo.”
“O que você está esperando?”
Dei um gritinho quando ele pulou de volta para cima de mim.
15

Trish

Pensei no quanto era bom ter um banheiro privativo anexo ao


meu quarto enquanto tomava banho. Ter que andar pelo corredor
para fazer isso e acabar encontrando Harrison ou Archer seria muito
estranho. Eles não teriam como saber com certeza o que eu e Jordy
tínhamos feito, mas me perguntei se era impossível descobrir.
Saí do banheiro e Jordy entrou, apertando minha bunda
quando passava por mim. Tentei fazer o mesmo e agarrar seu
traseiro esculpido e duro, mas ele desviou rapidamente, sorrindo
vitorioso enquanto fechava a porta.
Quando ele saiu depois de um minuto, parou do lado da cama.
“O que é isso?”
“O que?”, perguntei inocentemente. Ele ficava magnífico
pelado, com seu torso em formato de V, ombros largos e pele
bronzeada. Sem mencionar o lindo pau pendurado entre as pernas,
ainda meia-bomba depois da nossa “diversão”.
Ele apontou: “Você colocou a barreira de travesseiros de volta
na cama.”
“Já me diverti o bastante, não preciso mais de você.”,
provoquei, me virando. “Por favor, respeite meu espaço enquanto
durmo. Boa noite.”
Jordy soltou um palavrão e se deitou na cama, então lançou o
travesseiro do outro lado do quarto. “Você não vai conseguir se livrar
tão fácil.”, ele disse, me abraçando de conchinha com um braço. Ele
me segurou apertado contra seu peito e eu me recostei nele e
suspirei alegremente.
“Não acredito que acabamos de fazer isso,”, eu disse, “duas
vezes.”
“Nem eu,”, ele murmurou no meu ouvido, “mas estou feliz por
termos feito.”
“Foi só a empolgação de hoje que te fez querer me beijar?”
Ele zombou. “Faz muito tempo que eu quero te beijar.”
“Quanto tempo?”
“Desde a primeira vez que te vi na academia.”, ele admitiu.
“Semanas antes de nos falarmos perto das anilhas. Você estava
fazendo repetições de prensa militar com a barra e seu rosto estava
contorcido de concentração. Lábios comprimidos, fazendo beicinho.
Tentei não ser bizarrão porque sei que as mulheres não gostam de
ser encaradas na academia, mas depois daquele dia não consegui
mais te tirar da cabeça.”
“Por que você nunca me chamou para sair?”
“Como eu disse: mulheres não gostam de ser encaradas na
academia,”, ele respondeu, “e eu estava tentando te respeitar. Mas
quando você me chamou para sair…”, ele soltou um gemido que foi
tão sexual quanto os que eu tinha ouvido minutos antes. “Confiança
é sexy. Homens geralmente não são chamados para sair, mas
quando isso acontece, dá uma sacudida.”
“Fico feliz por você pensar isso. Eu nunca faço isso, ainda mais
com alguém feito você!”
“Alguém feito eu?”
“Ah, dã? Um grande gostoso!”
Jordy deu uma risadinha. “Você já conseguiu me trazer para a
cama, Trish. Não precisa mais me bajular.”
Me virei no seu abraço para encarar seu rosto. “Bajular? Você
está apenas sendo obtuso agora. você é absolutamente sarado.
Olha só isso.”, arrastei a ponta de um dos dedos pelo seu peito.
“Você tem um peitoral incrível e uma barriga de tanquinho. Mas aí
você tem músculos aqui também, entre os dois. Eu nem sabia que
caras poderiam ter músculos aqui! Reuni toda a coragem que eu
tinha para te chamar para sair.”
Os olhos castanhos de Jordy brilharam no escuro. “Ah sim?
Bem, mas e você?”
“Eu o que? Eu sou no máximo mediana.”
Sua palma escorregou pela curva do meu quadril. “Há muitas
mulheres bonitas na academia. Tem um grupo de meninas do
CrossFit que usam as esteiras entre seus treinos, tem o time de
vôlei da UNCW que treina com os pesos às terças e quintas…”
“Essa é uma forma realmente estranha de elogiar a garota com
quem você acabou de transar.”, alertei.
“Estou chegando lá,”, ele disse rapidamente, “há muitas
mulheres na nossa academia que são um colírio para os olhos. Mas
mesmo assim, meus olhos sempre vão parar em você como se você
fosse um tipo de farol. Eu sou capaz de apreciar um corpo bonito e
depois ignorá-lo, mas você? É difícil não te encarar o tempo todo
quando estou levantando pesos. Se eu sou um grande gostoso,
você é uma grande gostosa.”
Fiquei feliz pela escuridão esconder meu rubor. “Grandes
gostosas geralmente tem grandes peitões.”
Ele gargalhou. “Eu amo seus peitos.”, e como se precisasse
provar, agarrou um deles e se aproximou para beijar meu colo. “É
perfeito para a minha mão, mais do que isso é apenas excessivo.”
Não pude evitar rir. “Eu queria que a Trish de quatorze anos
pudesse te ouvir dizendo isso. Eu tinha tanta vergonha dos meus
peitos…”
“Aposto que você já era linda naquela época. Eu
definitivamente me interessaria.”, o sorriso de Jordy desapareceu.
“Não que eu me interesse por meninas de quatorze anos. Isso é
asqueroso. Eu quis dizer que se eu tivesse te conhecido quando
ambos éramos adolescentes…”
Eu o beijei para calar sua boca. “Você fica muito fofo
constrangido.”, me virei para ele me abraçar por trás de novo e ele
imediatamente o fez. Eu gostava de sentir seu pau mole
pressionando minha bunda.
“Agora precisamos decidir o que fazer.”, ele sussurrou.
“Acho que precisamos é dormir. E acordar para tomar café.”
“Me referia ao que fazer sobre nós.”
“E por que é que precisamos fazer alguma coisa?”, perguntei.
“Bem… é o seguinte: Archer foi categórico ao dizer que nada
poderia acontecer entre nós durante essa viagem. E ao dormir com
você hoje, eu meio que quebrei minha promessa a ele.”
Resmunguei. “Então Archer vai ficar bravo comigo por te
cortejar com meus gracejos femininos? Ótimo.”
“Eu te garanto que toda a culpa vai ser direcionada a mim. Ele
vai no máximo achar que eu te cortejei com a minha… como foi que
você disse? Grande gostosidade.”
“Acho que essa palavra não existe,”, eu disse rindo, “mas sim,
te chamei de um grande gostoso. E a respeito do que fazer… não
acho que vamos conseguir esconder isso dele. Sou péssima em
esconder coisa das pessoas. Fico toda nervosa, suando…”
“Era o que eu temia.”
“Vamos contar a verdade a ele,”, insisti, “aconteceu. Nós dois
queríamos. Somos todos adultos. Podemos manter as coisas
profissionais, independente do que aconteça.”
“E se eu te dissesse que já consegui o suficiente,”, ele suspirou
no meu ouvido, “e que não quero transar de novo? Você ficaria bem
e continuaria cuidando de Kaylee até o fim do nosso contrato?”
“É claro.”, eu disse. “Mas isso não é verdade, ou é?”
“Definitivamente não.”
Me aninhei nele. “Ah, graças a Deus. Porque eu
definitivamente quero fazer isso de novo.”

“Seu idiota estúpido!”, Archer grunhiu.


Estávamos assentados ao redor da mesa da cozinha tomando
café da manhã. Kaylee ainda estava dormindo e já tinha passado da
hora de eu acordá-la, mas ainda precisávamos terminar aquela
conversa.
“Jesus, me fale como você realmente se sente.”, Jordy
murmurou.
“Se eu te disser como eu realmente me sinto, vou fazer nossa
filha chorar.”, ele jogou o resto da sua torrada no prato com
repugnância. “Eu te pedi uma coisa. Uma única coisa em toda essa
história de babá. E você não conseguiu manter sua promessa.”
“É tão minha culpa quanto dele.”, expliquei. “Talvez até mais.
Fui eu quem propôs dividirmos a cama.”
Archer me encarou com os olhos azuis frios feito gelo. “Isso
não é novidade. Jordy já fez isso antes.”
“O que?”, perguntei. “Você já dormiu com outra babá da
Kaylee?”
“Não!”, Jordy se engasgou.
Harrison deu uma risadinha enquanto comia cereal.
“Eu nunca fiz isso antes!”, Jordy protestou. “O que Archer quer
dizer é que eu sempre me apaixono por mulheres toda vez que
temos um contrato. Mas nada desse tipo me aconteceu antes.”
Archer sacudiu a cabeça. “Eu devia manda-las de volta para os
Estados Unidos. É a coisa mais segura a se fazer. Tentamos fazer
isso dar certo, mas agora é hora de voltarmos ao plano original.”
“Nós vamos manter isso profissional!”, insistir. “Minha
prioridade número um é cuidar da Kaylee. Não vou deixar nada
atrapalhar isso. Você tem minha palavra.”
Archer pegou sua xícara de chá, viu que estava vazia e a
chocou contra a mesa de volta. “Isso é uma complicação.
Complicações levam a outros problemas imprevisíveis. A coisa mais
segura a se fazer é mandar você e Kaylee de volta para casa.”
“Você só está bravo porque ele agiu antes de você.”, Harrison
disse com a boca cheia.
Nós três nos viramos para encarar o homem barbado.
“Isso…”, Archer começou. “Você está totalmente equivocado. E
mesmo que fosse verdade—o que não é—não mudaria o fato de
que Kaylee estar aqui é—”
“Não,”, Harrison o interrompeu, e depois de beber o resto do
leite direto da sua tigela de cereal, limpou a boca com a manga da
blusa e encarou Archer com o olhar duro antes de continuar, “Kaylee
fica.”
Os dois se encararam por vários segundos. Então Harrison
calmamente se levantou da cadeira e levou sua tigela para a pia.
Aí está um homem que consegue tudo o que quer, pensei
enquanto ouvia seus passos pesados. Um homem com atitude de
macho-alfa é incrivelmente sexy, mas Harrison parecia mais um
cachorro não adestrado que me morderia a qualquer momento.
“Acho que está decidido,”, Jordy disse com um sorriso
estranho, “sério agora, faço minhas as palavras de Trish. Não
vamos deixar isso mudar nada. Vamos tentar manter…”
Ele parou de falar quando Archer se levantou e deixou a mesa.
“Ei, e sobre o que Harrison disse...”, eu comecei, mas ouvi
passos na escada. Kaylee estava caminhando com dificuldade,
esfregando os olhos com uma mão.
“Bom dia, fofinha!”, disse Jordy. “Já íamos te acordar.”
“Eu estava muito cansada.”, ela disse.
“É a diferença de fuso horário.”, ele explicou. “As vezes demora
um pouco para as pessoas se acostumarem a dormir em um lugar
diferente. Vou fazer panquecas para você acordar.”
Ela se iluminou. “Quero ajudar! Posso bater a massa?”
Jordy fez uma careta para ela. “Não sei, bater a massa é um
trabalho realmente muito importante…”
Enquanto ele cuidava dela, fui para o andar de cima tomar
banho. Pensei no que Harrison tinha dito. Será que Archer sentia
alguma coisa por mim, também? Eu achava que não. Ele sempre
tinha sido educado comigo na academia, mas não aparentemente
amigável como Jordy.
Voltei para o andar de baixo a tempo de ajudar Kaylee a
terminar seu café da manhã. Quando ela terminou, vi Jordy
preparando um lanche na cozinha.
“Ei, rapidinho…”, sussurrei. “Harrison falou sério sobre Archer?
Ou ele estava só provocando?”
Jordy deu uma risadinha. “Mais ou menos. Nós dois
pensávamos em você como nosso crush da academia.
Brincávamos, pensando em qual dos dois você preferiria.
Honestamente, eu achava que ele tinha vantagem, com o sotaque
elegante e tudo. Até você me convidar para sair.”
“Sotaque britânico é definitivamente sexy.”, admiti. “Minha
amiga Lisa vai ficar devastada quando souber. Ela tem fantasiado
com Caramelo por meses.”
Jordy fez uma careta. “Caramelo?”
Merda.
“Nosso apelido para ele.”, respondi. “Não diga a ele.”
Ele sorriu diabolicamente. “Não posso prometer.”
Nos reunimos na porta da garagem para as despedidas antes
de os homens saírem para a conferência. Eles se despediram de
Kaylee individualmente e então saíram pela porta.
Kaylee correu imediatamente para o andar de cima para pegar
seu laptop e jogar Minecraft. Eu ainda estava pensando no que iria
fazer quando a porta da garagem se abriu de novo e Jordy
reapareceu.
“Esqueceu alguma coisa?”, perguntei.
Ele me tomou em seus braços e me beijou longa e
apaixonadamente. Do tipo de beijo que geralmente leva a mais do
que apenas beijar. Me senti zonza quando ele finalmente me soltou
e eu sabia que estava rindo de orelha a orelha.
“Se Archer é Caramelo,”, ele perguntou, “qual é o meu
apelido?”
“Bombom.”, respondi.
“Eu deveria ter imaginado. Gostei.”, ele piscou. “Até mais,
Anilha.”
16

Archer

Eu era durão. Não ficava envergonhado com facilidade.


Aprendi a ser assim porque eu era o mais gordinho da escola e
precisava aguentar piadas e risadinhas. Eu raramente deixava um
comentário me atingir.
Mas o que Harrison disse durante o café da manhã me deixou
perturbado. Na maioria das vezes eu guardava meus sentimentos
para mim mesmo e não os deixava transparecer descuidadamente
na frente dos outros. Especialmente na frente de Trish, o objeto do
comentário.
Jordy correu para dentro da casa e depois voltou para a
garagem. Se sentando no banco do passageiro, ele disse: “Ok,
vamos.”
“Cadê o café?”, perguntei.
Jordy mexeu a cabeça como um pastor alemão confuso.
“Café?”
“Foi a sua desculpa para voltar lá dentro. Você disse que
queria pegar uma xícara de café para a viagem. E aí está você, sem
café.”
“Ele queria algo mais quente do que café.”, Harrison disse do
banco de trás.”
“Liga esse carro logo.”, Jordy respondeu sorrindo.
Saí da garagem e fomos em direção a conferência.
“Por favor, me diga que você não fez nada na frente da nossa
filha!”, eu disse depois de um tempo.
“É claro que não.”, ele respondeu. “Conferi e ela estava no
quarto.”
“Pelo menos você tem bom senso nesse aspecto.”, murmurei.
“Não preciso de Kaylee perguntando sobre isso. Eu nem saberia
como começar a explicar.”
Jordy revirou os olhos. “Nada demais. Podemos dizer a ela que
papai tem uma amiga especial.”
“Que por acaso é a babá dela.”, acrescentei. “Que já ocupa
uma posição maternal na sua vida. Isso complica as coisas.”
“Eu concordo com você! Foi por isso que me certifiquei de que
ela estava em outro cômodo! Relaxa, cara.”
“Archie está tudo menos relaxado desde que entramos no
carro.”, disse Harrison.
Olhei para ele pelo espelho retrovisor. “Porque eu não apreciei
o que você disse no café da manhã.”
“O que ele disse no café da manhã?”, Jordy perguntou.
“Que eu também tinha uma queda pela Trish.”, eu disse
defensivamente. “O que é uma completa inverdade.”
Harrison gargalhou. Jordy me olhou com ceticismo.
“Era uma quedinha.”, eu disse defensivamente. “Eu gostava de
olhá-la na academia. Só isso. E não importa mais, ela está saindo
com Jordy.”
“Eles não se casaram.”, disse Harrison. “Foi só uma trepada
até agora.”
Jordy se virou no banco. “Ei! Foi bem mais que uma trepada.”
“Ela não pertence a você.”, Harrison reiterou. “A menos que
vocês oficializem. E se vocês não estão dispostos a tornarem a
coisa pública na frente de Kaylee, na minha cabeça não é nada
oficial.”
“Eu certamente não vou dar em cima da babá, menos ainda
porque agora ela está envolvida com o meu melhor amigo,”, eu
disse, “e tenho certeza de que Trish se sente da mesma forma.”
Harrison zombou. “Se fosse o contrário e eu estivesse
dormindo na mesma casa que três líderes de torcida do Dallas
Cowboys por um tempo, aproveitaria o máximo que pudesse. É
assim que Trish se sente.”
Pensei naquilo durante a viagem até a cidade. Eu entendia o
ponto de Harrison, mas era uma visão simplista. Não éramos líderes
de torcida. Éramos mercenários. Certamente, raramente
aceitávamos contratos perigosos, mas ainda assim tínhamos uma
vida dura.
E nosso segundo contrato vai ser mais perigoso, pensei. E o
terceiro…
O resto do trabalho em Oslo foi deliciosamente tranquilo.
Apesar de alguns alarmes falsos, não vimos nada suspeito na
conferência. Aquilo entediava Harrison demais, mas era exatamente
o que eu esperava.
Em casa, Trish e Jordy mantiveram sua palavra. Eles foram
totalmente respeitosos e fingiam que nada estava acontecendo
perto de Kaylee. Trish parecia completamente devota ao seu
trabalho de cuidar da nossa filha, e Jordy nunca fez nenhum tipo de
insinuação maliciosa, olhou ou tocou Trish de forma sexual mesmo
quando achava que ninguém estava olhando. E a noite, se eles
estavam fazendo alguma coisa, o fizeram em silêncio o suficiente
para nenhum de nós ouvir. No geral, tudo parecia normal.
Mas eu ainda estava incomodado com a situação. Por um
momento, pensei que fosse porque eu estava bravo por Jordy ter
quebrado a promessa. Ele era ótimo em encontrar formas de me
incomodar, mas naquela viagem ele realmente se superou. Mesmo
com o bom comportamento do casal, a situação estava longe de
estar ideal.
Depois de um tempo, me dei conta de que era mais do que
mera irritação pelo fato de Jordy ter pensado com a cabeça de
baixo. Eu me sentia especialmente chateado toda vez que olhava
para Trish.
Eu estava com ciúme.
Por mais que eu odiava admitir, Harrison estava certo. Ou pelo
menos, parcialmente. Eu estava com ciúme porque Jordy agiu e eu
não. Eu estava com ciúme porque ela o convidou para sair na
academia e não a mim. E todas as vezes que eu admirava as
curvas de Trish abraçadas pelas suas calças jeans, sentia ciúme
porque Jordy podia tocar sua pele macia desnuda.
E era mais profundo ainda. Trish cuidava impecavelmente da
nossa filha, como se fosse sua própria. Cada ação, cada palavra,
cada gesto dela para a garota era maternal e amoroso. Ela levava
um jeito natural que me fazia ter certeza de que Kaylee estava em
boas mãos.
E é claro, aquilo me fazia desejar Trish ainda mais. Porque
cada mulher pelo qual eu me interessava, não podia ser só uma
namorada em potencial para mim—ela teria que ser uma figura
materna em potencial para a minha filha. Ver Trish e Kaylee juntas
preenchia a metade dos requisitos. Provavelmente, a metade mais
difícil. Lidar com mulheres é difícil para pais solteiros, mas aquela
situação parecia que daria certo de alguma forma.
Só que Jordy agiu primeiro.
A medida que os dias passavam, eu me perguntava se poderia
ter sido diferente. Se eu tivesse sido proativo e a convidado para um
encontro na academia ao invés de esperar até voltarmos da nossa
viagem. Como estaria minha vida naquele momento? Eu estaria
feliz? Tudo era mais complicado pelo fato de Trish estar radiante e
ser muito amistosa todos os dias, me tratando da exata mesma
maneira como ela tratava Jordy.
Agora não importa mais, pensei. Qualquer chance que eu
pudesse ter, já era.
A conferência de paz terminou sem muita pompa ou
empolgação. Passamos por uma reunião com o chefe da
segurança, assinamos vários documentos para finalizar o contrato e
fomos para casa arrumar as malas. Normalmente, a rotina do fim de
um contrato era cheia de alívio e animação. Mas daquela vez, não
iriamos para casa, voaríamos para o destino da próxima missão.
Estávamos fazendo check in no aeroporto quando recebi a
notificação de que o pagamento do nosso contratante tinha sido
efetuado. Aquilo me animou como sempre me animava.
Mais alguns contratos como esse e talvez já possamos pensar
em aposentadoria.
“Istanbul.”, Trish disse quando entreguei a ela os cartões de
embarque. “Not Constantinopla?”
“That’s nobody’s business mas the Turks.”, respondi,
completando a letra da canção.
Jordy fez uma careta para nós dois. “O que é isso?”
“Uma música antiga. Dos They might Be Giants.”
“O que?”, ele perguntou. “Isso lá é nome de banda?”
Trish me olhou e gargalhou. “Então, o que vamos fazer em
Istambul?”
“Discutiremos em um lugar mais privado.”, respondi.
“Ai. Ok, ok. Entendi.”, mas enquanto esperávamos no portão
de embarque, vi Trish fazer uma pesquisa no Google sobre
conferências de paz em Istambul.
Embarcamos e nos sentamos na classe econômica. “O que?
Nada de assentos na primeira classe dessa vez?”, Trish perguntou.
“É uma viagem curta dentro da Europa.”, respondi. “Tipo voar
de Wilmington para Dallas.”
“Me acostumei com um certo padrão de luxo.”, ela respondeu,
dando uma piscadela.
Não faça isso, pensei. Não faça meu coração dar cambalhotas.
Ajudei Kaylee a apertar o cinto de segurança evitando olhar na
direção de Trish.
17

Archer

O voo para Istambul foi rápido. Kaylee e eu passamos a maior


parte da viagem jogando forca em um pedaço de papel. Eu ficava
constantemente impressionado com ela ter se tornado mais
inteligente no último anão. Principalmente na escrita. Era
provavelmente minha parte favorita da paternidade: assisti-la
crescer. Virar um ser humano de verdade, com pensamentos,
inteligência e opiniões. Eu não podia imaginar como ela estaria dali
a um ano ou dois, menos ainda quando ela se tornasse
adolescente. E eu não queria ter que pensar naquilo.
Aterrissamos em Istambul e passamos pela segurança. Nossos
passaportes tinham um visto especial para a maioria dos países da
OTAN que nos permitia viajar sem responder muitas questões. Eu
era muito grato porque sem ele, bastava um único funcionário
alfandegário de mau humor para arruinar um contrato inteiro.
Havia um carro nos esperando naquele aeroporto também.
Nós cinco entramos e eu dirigi para a casa que alugamos em
Maslak, nos arredores de Istambul.
“Eu não pude deixar de notar que não havia caixotes de
equipamento esperando no carro como em Oslo.”, disse Trish.
“Não precisamos de equipamentos nessa missão.”, respondi.
“Ah, que bom! Significa que é menos perigosa então?”
Jordy e Harrison gargalharam. Trish fez uma careta para eles.
“Perdi alguma coisa?”, ela perguntou.
Olhei no retrovisor para me certificar de que Kaylee estava com
os fones no ouvido antes de responder. “Istambul é a nossa base de
operações porque temos um contrato falso aqui para usar como
álibi. Nosso contrato real envolve um voo… para outro país. E
treinar as forças armadas locais a usarem um certo tipo de
armamento moderno da OTAN. O equipamento já está onde
precisamos que esteja.”
“Que resposta vaga.”, Trish disse. “Para onde vocês
possivelmente voariam daqui? Cruzar o Mar Negro em direção a
Rússia?”
“Absolutamente não.”, respondi imediatamente. “Não vamos
trabalhar com russos.”
“Meio que o oposto, na verdade.”, Jordy acrescentou.
Trish ficou quieta por alguns minutos. “Então, Ucrânia?”
Nenhum de nós respondeu. O único som no carro por um
momento foi o dos dedos de Kaylee na tela do iPad.
“Sim.”, Harrison finalmente respondeu.
“Ah”, ela disse, “parece perigoso.”
“Não vai ser tanto assim.”, disse Jordy. “Gosto desse tipo de
missões. Ajudar pessoas a se protegerem. É tipo ser professor. É
satisfatório, sabe?”
“Desde que vocês não sejam atacados!”, Trish disse.
“Não vamos chegar nem perto das fronteiras.”, expliquei. “Não
podemos te contar mais que isso, mas você não precisa se
preocupar.”
Nossa acomodação era uma residência privada no topo de
uma colina de Maslak, que dava vista para uma parte de Istambul
ao sul.
Havia um portão elétrico com um código para entrar na
propriedade. Kaylee correu para dentro assim que estacionamos.
“É enorme!”, ela gritou de um dos quartos mais longes. “Tem
quarto para todo mundo!”
Trish e Jordy sorriram secretamente.
Como antes, a geladeira e o freezer estavam cheios de comida
para pelo menos um mês. Nosso contrato duraria pelo menos três
semanas, mas era bom estarmos preparados para uma duração
maior.
Cansados da viagem, todos foram para a cama cedo. Peguei
no sono rapidamente e quando acordei na manhã seguinte me dei
conta de que tinha sonhado com Trish a noite toda. Eu não me
lembrava de nenhuma especificidade, apesar do fato de que eles
não tinham sido sonhos sexuais, mas eu tinha certeza de que ela
estava em todos os sonhos que eu tive.
“Dia!”, ela disse felizmente quando a encontrei na cozinha.
“Bom dia!”, respondi, procurando por chás no armário. Ela tinha
um brilho, um sorriso genuíno que era impossível não melhorar meu
humor.
Depois da nossa rotinha matinal, nós três nos preparamos para
ir para o aeroporto. “Eu não gosto mesmo de helicópteros.”, disse
Trish enquanto nos despedíamos. “Ouvi histórias horrorosas sobre
quedas…”
“Não se preocupe, Archer é profissional.”, disse Jordy.
“Sou mesmo.”
“Me mandem uma mensagem quando chegarem em
segurança.”, ela insistiu. “Para eu saber que nada ruim aconteceu.”
“Alguma coisa ruim pode acontecer?”, Kaylee perguntou
quando se aproximou vindo do seu quarto.
“É claro que não, nanica.”, Harrison disse, pegando-a em seus
braços. “Voltaremos para jantar com você.”, ele começou a cobri-la
de beijos e ela gritava e gargalhava e reclamava que sua barba
estava pinicando.
“Infelizmente, não podemos te mandar mensagem quando
chegarmos,”, expliquei, “na verdade, vou recolher nossos chips
assim que chegarmos no aeroporto.”
Trish murchou. “Ok, acho que entendo.”, ela abaixou a voz
para Kaylee não ouvir. “Mas por favor, se cuidem.”
“Vamos nos cuidar.”
Jordy a abraçou e disse: “Ah, falando nisso. Preparei uma
surpresa para você e para Kaylee hoje. Quando Mehmet chegar no
portão, deixe-o entrar. Você pode confiar nele.”
“Ah, sim!”, Trish o abraçou novamente. Então, depois de uma
pausa curta, ela me abraçou também. Seu corpo era quente e macio
e cabia perfeitamente nos meus braços, mas tão bem que foi um
esforço soltá-la. Ela olhou para Harrison que a encarava desafiante,
mas ela apenas acenou para ele.
Dirigimos para o aeroporto em silêncio, retiramos nossos chips
e o colocamos dentro de um armário, trancamos e entramos em um
helicóptero de transporte Sikorsky S-61R. O mesmo modelo usado
primariamente para busca e resgate nos mares Mediterrâneo e
Negro, e que esperávamos não levantar suspeita. Também era um
modelo no qual eu tinha mais de centenas de hora de experiência
de voo.
Assim que decolamos e fomos para o norte, suspirei
alegremente. Era bom pilotar um helicóptero. As últimas missões
não requereram este tipo de transporte, então era um músculo que
eu adorei alongar. Se algum dia conseguíssemos nos aposentar da
vida de mercenários, eu queria fazer algo que envolvesse voar, mas
eu não sabia o que ainda.
Isso é um problema para o futuro. Agora preciso me concentrar
no presente.
Paramos em Constança, na Romênia, para abastecer antes de
continuar o resto do caminho para a Ucrânia. Atravessar o espaço
aéreo do país me deu uma pitada de ansiedade. Estávamos em
uma zona de guerra ativa. Certamente estávamos distantes das
linhas de front onde o combate estava acontecendo, mas mesmo
assim. Também me lembrei da última vez que estivemos naquela
parte do mundo, em 2014, quando escapamos de Criméia
rapidamente durante a invasão da Rússia.
Um aglomerado de oficiais ucranianos estava esperando no
aeroporto. Depois de apresentações curtas, Harrison e Jordy foram
levados para conhecer o resto da base. Não fui com eles, meu
trabalho era preparar o helicóptero para partir a qualquer momento,
então foi o que fui fazer.
Então meus pensamentos imediatamente voltaram para Trish.
Desejei poder mandar uma mensagem para ela. Não só para avisá-
la que chegamos em segurança, mas porque eu queria falar com
ela.
Deve ter uma forma, pensei enquanto examinava o
equipamento do helicóptero.
18

Trish

Fazia meia hora que os rapazes tinham partido quando o


interfone tocou. Apertei o botão que me pareceu o certo e disse:
“Sim, alô?”
“Sou Mehmet.”, um homem respondeu. “Estou no portão da
garagem.”
“Ah, certo! Vou abrir para você…”
Mehmet parou seu carro preto urbano perto da porta da frente.
Ele tinha uns cinquenta ou sessenta e usava roupas casuais. Ele fez
uma mesura suave quando nos apresentamos.
“Sr. Jordan preparou um tour particular de Istambul para você e
Kaylee hoje.”, ele disse em inglês fluente, com um sotaque turco.
Seu sorriso era caloroso e acolhedor. “Vai durar mais ou menos três
horas.”
Ajudei Kaylee a se vestir e então entramos no carro. Enquanto
íamos para a cidade, Mehmet nos contou rapidamente a história de
Istambul. Desde a sede o Império Romano Oriental, passando pelo
Império Otomano até os tempos modernos.
Assim que estacionamos o carro e descemos, me senti muito
intimidada em estar em uma cidade nova. Especialmente uma que
era tão culturalmente diferente de tudo o que eu já tinha visto antes!
Eu estava bem ciente de que era uma americana privilegiada sem
nenhuma experiência de mundo. Mas depois de dez minutos
caminhando pela praça da cidade, me senti completamente segura.
Caminhamos por feiras em becos e entramos em lojinhas. Então
traçamos nossa rota até a Santa Sofia, onde Mehmet nos deu um
tour privado da mesquita. Kaylee achou que era higiênico tirar os
sapatos antes de entrarmos em algumas partes.
A única exceção da segurança que eu senti foi quando
voltamos por uma praça pública para onde o carro estava
estacionado. Os cabelos da minha nuca se arrepiaram e eu tive a
impressão distinta de que estava sendo vigiada. Rapidamente me
virei e pensei ter visto alguém me encarar de um beco distante.
Então pisquei e logo que o fluxo de pedestres da praça se dissipou,
a figura também tinha desaparecido.
Estou sendo paranoica, pensei. Quem seguiria uma babá da
Carolina do Norte?
Mehmet dirigiu pela cidade nos mostrando tudo, então
voltamos para casa. Kaylee fez várias perguntas sobre o país.
Aparentemente ela estava aprendendo sobre as capitais do mundo
na escola e estava curiosa sobre o fato de Ankara ser a capital da
Turquia ao invés de Istambul. Mehmet era paciente e amistoso e
respondeu a todas as perguntas melhor do que eu possivelmente
teria conseguido.
Depois de nos despedirmos e entrarmos na casa, coloquei
Kaylee na cama para um cochilo. Assim que fechei a porta do seu
quarto, meu celular vibrou no meu bolso. Era uma mensagem de um
número desconhecido.

DESCONHECIDO: Chegamos sãos e salvos. Não precisa se


preocupar.
Eu: Jordy?
DESCONHECIDO: Na verdade, Archer.
Eu: Achei que vocês não podiam enviar mensagens?
DESCONHECIDO: Encontrei uma forma de usar o WIFI do
veículo como ponto de acesso com o VPN ativado para esconder a
localização. Enquanto fala comigo, por favor, não use nenhum tipo
de localização específica nas mensagens, por segurança.
Sentei-me no sofá e fiz uma careta para a tela.
Eu: Parece um teste para saber que não vou estragar o
disfarce de vocês. Como vou saber se é você mesmo?
Archer: Bom, sei de algo que só eu de verdade saberia: Jordy
e eu nos referíamos a você como Anilha. E seu apelido para nós era
Caramelo e Bombom.
Eu: AI, NÃO! Pedi a Jordy que não te contasse!
Archer: Você deveria ter negado. Agora nunca mais vou te
deixar esquecer disso. ;-)
Archer: Como foi seu passeio pela cidade?
Eu: Muito divertido! Fiquei nervosa no começo, mas Mehmet
me fez me sentir confortável. Tomei café turco quatro horas atrás e
ainda estou agitada por causa de toda a cafeína.
Archer: Kaylee se comportou?
Eu: Na maior parte sim, ela fez uma ceninha quando não a
deixei tomar meu café.
Archer: Você deveria tê-la deixado experimentar um golinho.
Ela mudaria de ideia rapidinho.
Eu: E ter uma criança com cafeína nas veias para cuidar
durante o resto do passeio todo? Não, obrigada.

Archer não respondeu por um momento e eu me perguntei se a


conversa tinha acabado. Ele estava provavelmente ocupado, afinal
de contas. Mas finalmente ele respondeu.

Archer: Estou muito feliz por você estar aqui, Trish. Enquanto
colocamos nossas vidas em risco, por menor que ele seja, sempre
sentimos ainda mais saudade da nossa filha. É reconfortante saber
que vamos vê-la novamente hoje a noite. Desculpa se te dei a
impressão de não querer te trazer nesta viagem. Eu queria, mas não
sabia se era o melhor para Kaylee.
Eu: Não precisa pedir desculpa. Jordy me parece terrivelmente
teimoso.
Archer: Esta é a declaração mais verdadeira que alguém já fez
na história.
Eu: Ok, agora sério: por que você está me escrevendo? Vocês
não deveriam estar fazendo… coisas? Desculpa, quase escrevi
mais do que deveria.
Archer: Bem observado. E não, eu estou basicamente à toa o
dia todo. Eu realmente deveria ter trazido um livro.
Eu: Pode pegar meu Kindle se quiser. Eu tenho todos os livros
da saga Crepúsculo!
Archer: Meu Deus, você leu aquele disparate?
Eu: Ei! Não julgue. As vezes tudo o que uma garota quer é
fantasiar sobre um vampiro e um lobisomem lutando pelo seu amor!
Archer: Nunca entendi essas histórias com triângulo amoroso
e drama.
Eu: Você é um homem. Eu provavelmente as odiaria se você
fosse.
Archer: Não, estou falando que não entendo o drama sobre
isso. Se uma mulher não consegue decidir, por que não namorar os
dois?
Eu: Hahahaha, se fosse ao menos uma opção.
Archer: E por que não é?
Eu: Hm, porque qualquer mulher que fizesse isso seria
chamada de vadia?
Archer: Poligamia tem se tornado cada vez mais popular
atualmente. A sociedade não é mais tão julgadora quanto antes.
Eu: Poligamia só me parece uma boa desculpa para transar
com todo mundo. Ou para pessoas que tem medo de se relacionar.
Duvido que alguém tenha feito isso de verdade na vida real e tenha
obtido sucesso.

Archer não respondeu depois daquilo, o que me deu uma


sensação estranha. Como se eu tivesse tocado em algum ponto
fraco. Mas eu não entendia o motivo. Archer não me parecia o tipo
de cara que se ofendia com facilidade, principalmente por causa de
Crepúsculo. Então imaginei que ele apenas tivesse ficado
preocupado com o trabalho deles.
Eles chegaram em casa por volta das sete, bem na hora que
eu tirei o jantar do fornão. Kaylee gritou alegremente e abraçou os
três pais no outro cômodo. Os três enfiaram a cabeça na cozinha
enquanto passavam.
“O jantar está pronto quando vocês estiverem.”, eu disse.
Eles subiram para tomar banho, mas Jordy fez uma pequena
pausa na cozinha para me beijar antes que Kaylee pudesse ver.
Archer estava assistindo do corredor e deu um sorrisinho para a
cena.
Quando eles desceram dez minutos depois, Harrison não
estava com eles. “Ele foi direto para a cama.”, disse Jordy enquanto
nos sentávamos à mesa.
“Ele não quer jantar?”, perguntei.
Archer pegou a colher de servir. “Confio em Harrison para
decidir o que precisa para suprir suas necessidades básicas. Não se
preocupe—ele não vai morrer de fome.”
“Papai disse que é como um urso.”, Kaylee anunciou
felizmente. “As vezes ele precisa hibernar quando está realmente
cansado!”
“Foi um longo dia.”, Jordy disse.
Comemos enquanto Kaylee contava sobre a nossa diversão
em Istambul. “E você se sentiu segura o tempo todo?”, Archer
perguntou.
Assenti. “Perfeitamente segura. E não só porque Mehmet
estava conosco o tempo todo. Teve um momento que senti que
alguém estava me olhando, mas provavelmente foi apenas
paranoia.”
“Se eu fosse um dos locais, também ficaria de olho em você.”,
Jordy disse com uma piscadela secreta acima da cabeça de Kaylee.
Depois do jantar, os rapazes se revezaram brincando com
Kaylee, então peguei meu Kindle e me enrolei no sofá. Archer olhou
o dispositivo e revirou os olhos provocativamente. O encarei de
volta, eu nem estava lendo Crepúsculo naquela hora.
Um pouquinho mais tarde, Kayle se aproximou e puxou minha
manga. “Quer jogar Dutch Blitz com a gente?”
“O que é isso?”, perguntei.
“Te mostro! É muito divertido.”
Me juntei aos três na mesa da cozinha que tinha sido limpa
para dar lugar a um maço de cartas. Kaylee explicou as regras—
com a ajuda dos dois pais. Era como uma combinação de Uno e
Paciência, com o objetivo de reunir cartas para ganhar pontos. Mas
era muito rápido e tudo ao mesmo tempo, o que criava um clima
caótico.
Jordy e Archer jogavam devagar para privilegiar Kaylee e eu
copiei a velocidade deles. O jogo era simples e divertido e cada
rodada só durava alguns minutos. Depois de algumas rodadas, senti
minha natureza competitiva despertar e eu precisei me lembrar de
desacelerar para dar chance a Kaylee.
Em uma das rodadas finais, peguei uma das minhas cartas—
um seis vermelho—e rapidamente a coloquei no topo de um cinco
vermelho no meio da mesa. Archer tentou fazer o mesmo, mas ele
foi meio segundo mais lento e colocou seu próprio seis vermelho em
cima do meu. Fizemos contato visual e gargalhamos, mas sua mão
permaneceu sobre a minha por alguns outros segundos antes dele
retirá-la.
Pare com isso, pensei. Não importa se ele tinha um crush em
mim na academia, eu dormi com Jordy. Tomei minha decisão.
Mas eu não conseguia parar de pensar no que Archer tinha
dito sobre o triângulo amoroso de Crepúsculo e me perguntei se ele
estava tentando me dar algum tipo de indireta…
19

Trish

Colocamos Kaylee na cama e voltamos para o andar de baixo


para jogar uma rodada de Dutch Blitz só entre os adultos. Era muito
mais rápido e caótico com só nos três e descobri rapidamente que
Archer era muito competitivo.
“Ele odeia perder.”, Jordy sussurrou, mas alto o suficiente para
o inglês ouvir. “Fica de péssimo humor.”
“Meu humor está muito bem, obrigada.”, Archer respondeu
curtamente enquanto embaralhava as cartas entre rodadas.
“Ei, falando em humor,”, eu disse, “quando estávamos
conversando por mensagem de tarde, você parou de repente. Foi
alguma coisa que eu disse?”
Jordy se sentou mais reto. “Vocês estavam trocando
mensagens? Mas você nos fez tirar os chips dos celulares!”
“Me conectei usando WIFI e VPN.”, Archer respondeu.
“Viu só?”, Jordy me disse. “As regras se aplicam a nós, mas
não a ele!”
“Não entendo o motivo da sua reclamação. Você e Harrison
passaram o dia treinando ucranianos. Sem tempo para mandar
mensagens.”
“Tivemos algumas pausas!”, Jordy reclamou.
Archer sacudiu a cabeça e se virou para mim. “Você não disse
nada de errado. Eu só não queria mais discutir o assunto por
mensagem.”
“Que assunto?”, Jordy perguntou.
“Mencionei que estava lendo Crepúsculo e ele disse que Bella
poderia resolver todos os problemas se tivesse uma relação
poliamorosa com Edward e Jacob.”
Jordy olhou para o amigo. “Você sabe os nomes de todos os
personagens de Crepúsculo?”
“Eu não sei nada!”, ele disse defensivamente.
“Ele não citou nomes, mas sugeriu a poligamia como sugestão.
E eu discordei.”
“Ah,”, Jordy fez uma careta, “provavelmente é um tema
sensível para ele por causa de sua família.”
Olhei para Archer: “Sua família?”
Ele terminou de embaralhar as cartas e as colocou
cuidadosamente empilhadas sobre a mesa, rodando um milímetro
para nivelar a pilha com o grão de madeira. “Meus pais são
poligâmicos.”
“Eles são hippies velhos.”, Jordy acrescentou.
“Eles são perfeitamente normais, uma família inconvencional.”,
Archer respondeu. “Eles ainda estão juntos, e não posso dizer o
mesmo dos seus pais.”
Jordy ergueu as palmas e disse: “Viu? Assunto sensível.”
Pensei no que eu tinha dito na mensagem. “Não quis insultar
sua família! Me conte um pouco sobre eles…”
“Não precisamos falar sobre isso.”, Archer respondeu.
“Ahh, vamos lá. Me conte. Quero saber. Como eu disse mais
cedo, eu nunca conheci ninguém poligâmico de verdade. Sou
ignorante nesse assunto. Quantos pais você tem?”
Archer tomou um gole longo de água antes de responder:
“Sete.”
Tentei, mas falhei em esconder meu choque. “Sete?”
Jordy pegou um caderno e uma caneta e começou a escrever.
“Tenho dois pais biológicos, é claro.”, Archer explicou. “Pierce e
Cornelia. E eles são um trisal. Eles e Camilla.”
“Trisal?”
“Significa que os três estão envolvidos romanticamente uns
com os outros. Minha mãe é bissexual.”
“Mas achei que você tinha dito sete pais.”
Jordy riu para si mesmo e continuou escrevendo alguma coisa.
Archer assentiu. “É meio que o terceiro núcleo. Eles estavam
todos juntos quando eu nasci. Quando eu era muito novo, Pierce
começou a sair com um casal bissexual: Priscilla e Kate. Elas são
minhas outras duas mães. Elas são casadas.”
“Ok, espera,”, interrompi, “estas mulheres são casadas, mas
namoram seu pai, Pierce?”
“Correto.”
“Mas por que elas só estão envolvidas com Pierce e não com
sua mãe, Cornelia, já que ela é bissexual?”
Ele me olhou de forma divertida: “Porque minha mãe não sente
atração por elas.”
“Mas seu pai sim.”
“Sim.”
Jordy gargalhou alto.
“Não entendi.”, eu disse.
“Só porque Cornelia é bissexual, não significa que ela se
envolveria romanticamente automaticamente com Kate e Priscilla. É
como presumir que você se interessou por Mehmet, o guia turístico,
só porque vocês são ambos heterossexuais.”
Pisquei. “Ah, sim. Bem pensado.”
Harrison entrou na sala usando calças de moletom cinza e uma
regata preta. Ele abriu a geladeira, pegou a panela que tinha
sobrado do jantar e começou mexer dentro com uma colher.
“Archer explicando sua família para Trish.”, disse Jordy.
Harrison gargalhou e voltou para o seu quarto com a panela.
“Bom, esses são cinco dos meus pais.”, Archer continuou.
“Quando eu era criança, Cornelia começou um relacionamento com
o bartender do pub perto da nossa casa, Ambrose.”
“E Ambrose sai com mais alguém além de sua mãe?”
“Não. Ele não se envolveu com ninguém mais.”
“Ok…”, respondi.
“E finalmente, Hector. Ele e Camilla tem um relacionamento
sexual, mas não afetivo.”
“Tipo amizade colorida.”
“Essencialmente sim.”
“Se eles só transam, por que o incluir na família?”
Archer deu de ombros. “Já faz pelo menos vinte anos que eles
estão assim. E eles são grandes amigos, todo mundo gosta de
Hector. Ele é um exímio jogador de Tranca e passa as festas de fim
de ano conosco desde que eu me entendo por gente.”
Sacudi a cabeça, confusa. “É muito difícil tentar visualizar isso
tudo.”
“Ajuda quando você esquematiza.”, Jordy escorregou o papel
no qual estava escrevendo na minha direção. Era um desenho com
os sete pontos conectados por linhas, como uma constelação. Havia
uma ampulheta no meio, com o nome de Pierce. O triângulo
esquerdo da ampulheta eram Priscilla e Kate e o triângulo direito
Cornelia e Camilla, todas conectadas à Pierce. Uma outra linha
ligava Cornelia a Ambrose e uma linha similar a Hector, finalizando a
equação.
“Ok, agora sim fez mais sentido.”, eu disse.
“Parece uma molécula, por isso eles chamam nossa família de
polécula.”, disse Archer.
“Por que não apenas dizer que você tem dois pais que gostam
de swing?”, perguntei.
“Porque não tenho só dois pais que gostam de swing.”, ele
disse pacientemente. “Camilla morava conosco quando eu era
pequenão. Quando nos mudamos de Londres para Stratford, eu
tinha quatro anos, e Priscilla e Kate também foram morar conosco.
Todos eles me criaram igualmente. Um pouco depois, Ambrose e
Hector passavam tantos feriados e férias conosco que fatalmente
viraram parte da família. Eles são mais como tios, menos como pais
para mim.”
“Essa situação foi o que nos deu segurança para criarmos
Kaylee.”, Jordy entrou na conversa. “Depois de ouvir sobre a história
toda—e conhecer a família toda no Natal, sete anos atrás—nós três
criando uma filha juntos não pareceu estranho mais.”
“Talvez eu tenha ficado sensibilizado com a sua mensagem.”,
Archer admitiu. “Quando você disse que poligamia é só uma
desculpa para as pessoas transarem com todo mundo. Talvez seja
verdade para algumas pessoas. Mas no meu caso, passei minha
vida inteira rodeado pelo amor dos meus pais. Todos eles. E me
considero muito sortudo por isso.”
Estiquei o braço por cima da mesa e toquei sua mão. “Isso é
realmente maravilhoso. Qualquer pessoa se consideraria sortuda
por ter o que você tem. Sinto muito ter julgado tão rápido. É
estranho pensar na forma complexa de sexo que seus pais fazem?”
“Sim,”, ele disse, inexpressivo, “e ainda mais estranho precisar
explicar isso detalhadamente para outra pessoa.”
Fiz uma careta. “Eca, eu imaginão. Não gosto nem de pensar
nos meus pais, só os dois, fazendo isso, imagina com um bando de
outras pessoas que… ok, vou parar por aqui porque já fui longe
demais.”
Archer ajustou a pilha de cartas na mesa. “Seja como for, é por
isso que é muito difícil para mim levar Crepúsculo e outros
romances a sério porque uma garota não consegue tomar uma
decisão sobre com quem quer ficar. Existe uma solução muito fácil
se você estiver disposto a esquecer o ciúme! Ok, agora que tal mais
um Dutch Blitz? Jordy e eu estamos empatados em primeiro…”
Jogamos outra queda—e Archer ganhou—e fomos para a
cama. A casa tinha duas alas separadas dos lados opostos da sala
de estar e Jordy e eu estávamos estrategicamente dormindo na
mesma ala, separados do resto todo. Assim, não precisaríamos ficar
em perfeito silêncio, um pequeno luxo do qual rapidamente
desfrutamos.
Assim que entramos no quarto, Jordy me jogou na parede e
me beijou como se não houvesse amanhã. Derreti sob seu toque
possessivo e exigente. Ele me virou de costas e beijou minha nuca
enquanto seus dedos escorregavam pela frente do meu pijama,
pressionando meu clitóris com força. Gemi enquanto ele me roçava
por trás, esfregando cada vez mais rápido. Enquanto nos
despíamos das nossas roupas de baixo, eu podia sentir o quão
faminto ele estava por mim. Especialmente quando ele guiou seu
pau para dentro de mim e me encheu com uma estocada frenética,
se enterrando o mais profundo que conseguia chegar.
Não sei como, mas consegui suprimir um grito de prazer
enquanto ele me estocava contra a parede, e outros gritos de êxtase
também precisaram morrer na minha garganta. Senti seu hálito
quente no meu ouvido e seus gemidos tão baixos que pareciam ser
só tremores na sua garganta. Ele colocou uma mão nas minhas
costas e me dobrou para a frente, me fodendo forte e rápido,
mergulhando em mim tão intensamente que não demorou para eu
me engasgar e tremer com um orgasmo intenso, que fez meus
dedos dos pés se curvarem e meus joelhos cederem. Comprimi
minhas paredes internas e senti seu pau explodir dentro de mim. Ele
agarrou minha cintura com força com as duas mãos e soltou um
gemido que foi tão intenso que quase soava como um gemido de
dor.
Depois de nos limparmos e nos deitarmos de conchinha na
cama, pensei na química que tínhamos. Geralmente, eu me sentia
estranha com um cara depois de dormir com ele pela primeira vez,
mas nós ficávamos tão confortáveis um com o outro que apenas
éramos o que éramos. Jordy e eu nos conectamos tão fácil que era
quase natural.
Será que se ele se sente da mesma forma?
“Pensei nisso o dia todo.”, ele murmurou enquanto me
acariciava.
“Eu também.”, respondi. “Bem, talvez não o dia todo. Não
pensei nisso enquanto estávamos passeando por Istambul. Mas
assim que chegamos em casa, comecei a fantasiar com você.”
“Gostei do que você disse mais cedo.”
“Quando?”
“Agora, enquanto transávamos. Você disse: me fode, meu
mercenário!”
“Ah,”, me virei para olhar para ele, “não me dei conta de que…
de que falei em voz alta.”
“Você também disse isso enquanto gozava, eu acho,”, Jordy
continuou, “foi por isso que eu gozei tão rápido. Isso e a visão da
sua bunda magnífica balançando na minha frente.”
Sorri e o abracei mais apertado. “Que bom que gostou.
Normalmente eu não…”
“Não o que?”, ele perguntou.
“Normalmente, demora mais para eu me sentir confortável com
um homem.”
Jordy fez uma careta. “Confortável o suficiente para transar
naquela posição? De quatro?”, ele parecia incrédulo.
“Eu sei! É bobagem, mas geralmente não gosto de fazer isso a
não ser que eu já esteja com a pessoa por algum tempo.”
Senti Jordy ficar tenso. “Ah, merda. Eu não queria te deixar
desconfortável ou te pressionar a—”
“Não, não, não!”, respondi rapidamente, me sentando na cama
para poder olhar para ele. “Foi ótimo! É este meu ponto.
Geralmente, demoro mais para me sentir confortável com alguém,
mas com você…”
“Parece natural?”, ele terminou por mim.
“Sim!”
“Como se nos conhecêssemos a mais tempo do que apenas
algumas semanas?”
“Exatamente!”, respondi. “Você sente isso também?”
Ele colocou um braço atrás da cabeça, o que fez seu bíceps se
flexionar deliciosamente. “Fiquei com medo de dizer qualquer coisa
porque não queria te assustar. Mas sim.”
Beijei seus lábios e me deitei contra seu peito de novo. “Jamais
esperaria isso quando te convidei para sair na academia. Voar pelo
mundo, transar em cidade exóticas. Noruega. Turquia.”
“O que você esperava?”, ele perguntou.
“Não sei. Café?”
Sua risada fez meu peito vibrar. “Faço café de manhã.”, ele se
esticou. “Falando nisso… acho que devemos dormir cada um no seu
quarto.”
Fiz uma careta. “Ah.”
“Para o caso de Kaylee acordar antes de nós. Ou no meio da
noite.”
“Certo.”
“Não quero que ela tenha uma má impressão.”, ele explicou.
“Archer tem razão sobre isso. E nós prometemos manter esse
relacionamento longe dela, pelo menos agora. Eu já descumpri
promessas que fiz a Archer, então queria me certificar de manter
essa. Tudo bem, por você?”
“Não, sim, claro!”, eu disse. “Vou para o meu quar…”
Ele agarrou meu braço e me puxou de volta para ele. “Talvez
mais cinco minutos de chamego. Não quero ficar longe de você
ainda.”, sua mão escorregou pelas minhas costas e deu um tapinha
suave na minha bunda.
Relacionamento, pensei enquanto fechava os olhos e
saboreava seu corpo no meu. Gosto de como isso soa.
20

Jordy

Treinar os ucranianos era um trabalho satisfatório, mas


exaustivo. Acordávamos cedo, cruzávamos o Mar Negro,
passávamos o dia treinando e voávamos de volta. Mesmo que
estivéssemos totalmente seguros e longe do front de batalha da
guerra com a Rússia, ainda tínhamos medo de que um navio russo
pudesse confundir nosso helicóptero com os do inimigo e tentar nos
derrubar com um míssil. Eu ficava tenso durante os voos e não
relaxava até tocarmos o solo de Istambul.
Mas então quando chegávamos em casa e víamos Kaylee,
tudo valia a pena. Vê-la era um lembrete diário do motivo pelo qual
estávamos vivendo no limite. Eu marcharia até o inferno e voltaria
se fosse o necessário para dar a ela uma vida melhor. E eu estava
feliz por não precisarmos esperar meses para vê-la novamente,
como teríamos que fazer no plano original, enviando-a para a
colônia de férias durante nossas missões. Voltar para ela todos os
dias acalmava minha alma de forma que eu nunca tinha entendido
antes de me tornar pai.
E ainda por cima, tínhamos Trish…
Depois que Kaylee ia dormir, Trish e eu íamos nos divertir.
Virou uma rotina noturna, mas não havia nada de rotineiro nas
nossas transas. Éramos como adolescentes com tesão ansiosos
para experimentar todas as posições possíveis. Uma noite, Trish
ficou de joelhos no chão do quarto e me fez um boquete rápido e
ávido. Ela praticamente sugou minha alma e me fez gozar em
minutos. E não me largou—ela manteve os lábios ao redor do meu
pau e me encarou enquanto eu gozava, assistindo meu prazer
explodir. E quando ela engoliu cada gota, me puxou para a cama e
me cavalgou como se eu fosse seu brinquedo sexual particular.
Descansar para que? Foi tão gostoso que eu permaneci de pau
duro dentro dela e acabei gozando de novo entre o segundo e o
terceiro orgasmo dela.
No dia seguinte, enquanto estávamos na Ucrânia, fomos
informados de que havia tráfico aéreo extra na nossa rota para
casa, então decidimos passar a noite na base ucraniana por
segurança. Os locais adoraram e abriram uma garrafa de vodca
Odessa para celebrar. Tomamos shots com eles, comemos guisado
de carne que tinha um gosto forte de páprica e cantamos canções
marciais ucranianas até um bom tempo depois do sol se por.
Finalmente fomos para o nosso quarto no alojamento. Harrison
começou a roncar no segundo que sua cabeça atingiu o travesseiro.
Mas no beliche ao lado do meu, o rosto de Archer estava iluminado
pelo brilho da tela do seu telefone.
“Jogando Termo?”, perguntei.
“Terminei essa manhã. Acertei em três tentativas.”
“Avisando Trish que estamos bem.”
“Você tem trocado muitas mensagens com ela.”, eu disse.
Ele deu de ombros. “Ela tem me mandado fotos de Kaylee.”,
ele jogou o celular na minha direção. A mensagem mais recente era
uma selfie das duas na cama, lendo uma história. Sorri ao ver nossa
filha, mas meus olhos focaram em Trish. Arrastei a tela para
procurar mais fotos e vi que eles tinham trocado muitas mensagens.
Antes que eu pudesse xeretar demais, devolvi o celular para Archer.
“Que bom que você mudou de ideia,”, eu disse, “a respeito de
trazê-la conosco.”
“É uma coisa boa.”, Archer respondeu, com os dedos voando
pela tela do telefone enquanto ele digitava em resposta. “Trish é
uma mulher maravilhosa. Não posso te culpar por ter se aproximado
dela durante a viagem e não ter esperado até voltarmos para casa.”
Fiz uma careta para ele. Archer odiava admitir que estava
errado, especialmente em situações na qual ele podia agir com
superioridade. Aquela suavidade repentina na sua atitude era
estranha.
Estou feliz por ele estar se afeiçoando a ela, pensei, rolando na
cama.
Trabalhamos com as tropas no dia seguinte e voamos de volta
para casa de tarde. Kaylee estava radiante em nos ver e me apertou
mais apertado do que o de costume quando entramos pela porta.
“Quanto tempo mais nesse contrato?”, Trish perguntou
enquanto jantávamos mais cedo.
“Cansada da Turquia?”, Harrison perguntou.
“Não, estou me divertindo muito, na verdade!”, Trish
respondeu. “Fomos na feira ontem e compramos algumas delícias
turcas. Vocês sabiam que são balas de goma?”
“Eu amei!”, Kaylee gritou. “Compramos para vocês também!”
“Estamos aqui por oito dias e parece que vamos ficar por mais
dez.”, Archer explicou. “Ou quinze. Depende da velocidade que eles
aprenderem a manusear o equipamento que vai chegar.”, Archer fez
uma careta. “Desculpa não poder te dar uma data mais concreta.”
“Está tudo bem!”, Trish respondeu, gesticulando com o garfo.
“Eu só estava curiosa para saber se você já tinha a data. Kaylee e
eu vamos continuar nossa diversão pelo tempo que for, não
vamos?”
Nossa filha estava de boca cheia, então só assentiu com a
cabeça.
Depois do jantar, Harrison pegou Kaylee no colo e a carregou
para seu quarto para eles brincarem de K’nex. Trish, Archer e eu
ficamos na sala de estar. Não havia nada de bom na TV, então
coloquei um episódio de Os Sopranos pessimamente dublado em
turco. Archer inventou um jogo e deveríamos tomar um gole da
nossa bebida toda vez que o dublador falasse com sotaque italiano-
inglês estranho.
Quando o episódio acabou, estávamos bêbados.
“Estou me divertindo muito e não quero ir para a cama agora.”,
disse Trish. “Vocês querem jogar um jogo?”
“Receio estar muito temulento para jogar Dutch Blitz.”, disse
Archer.
Trish fez uma careta. “Temulento?”
“Esse chato insiste em usar sinônimos rebuscados para
bêbado.”, expliquei.
“A língua é o reflexo do homem. Um cavalheiro como eu deve
se utilizar de meios adequados de comunicação.”, Archer
respondeu.
“Que tal outro jogo de bebida, então?”, Trish sugeriu. Ela
esticou as pernas ao longo do sofá. “Tipo Verdade ou Shot?”
“É um tipo de Verdade ou Consequência?”, perguntei.
“Sim,”, ela explicou, “mas ao invés da consequência, se você
não quiser responder à pergunta, toma um shot. Muito bom para
ficar bêbado rápido e muito popular entre universitários.”
“Me alistei logo depois do Ensino Médio.”, lembrei.
“Ah, certo. Bom, os caras do Exército tem a reputação de
serem bons de copo, certo?”
Archer gargalhou. “Errado não está.”
“Já estou bêbado,”, eu disse, “e Archer está, usando seu
sinônimo idiota, temulento.”
Trish sorriu maliciosamente e fez algo se mexer dentro de mim.
“Então vocês respondem todas as perguntas, simples. Eu começo.
Quando vocês perderam a virgindade?”
Archer limpou a garganta. “Quando eu tinha quinze anos,
Ensino Médio. Eu e Mary Kane nos beijamos depois de uma partida
de futebol. Os pais dela não estavam em casa, então fomos para lá.
Perdi a virgindade no sofá.”
“Quinze anos, impressionante. Aposto que ela era bonita.”,
disse Trish.
“Ela certamente não era.”, Archer respondeu. “Não quero soar
cruel, mas ela era o que Jordy chama de Raimunda.”
Trish fez uma careta, então expliquei: “Feia de cara, boa de
bunda.”
“Ahh.”
“Bom, eu mesmo era mais gordinho na época,”, Archer
explicou, “antes das Forças Armadas Britânicas me endireitarem.
Deus salve a Rainha!”
“Lamento te corrigir,”, Trish disse, levantando o dedo, “mas o
certo é Deus salve o Rei agora.”
Archer fez uma careta. “Ainda não me acostumei com isso.”
“Eu achava que ninguém gostava de Charles…”, me intrometi.
Eu não tinha muito conhecimento do assunto além do que eu lia
online. “Eles não poderiam passar a vez de Charles e coroarem
William? Todo mundo gosta dele, não gosta?”
“Charles poderia ter abdicado, mas nunca faria isso.”, Archer
disse. “Ele esperou a vida toda até Elizabeth finalmente passar o
trono para ele.”, ele suspirou. “Diana teria sido uma Rainha
Consorte muito mais amável do que Camilla… estou tagarelando
agora. Sua vez de responder à pergunta, Jordy.”
“Sim!”, disse Trish. “Sua vez. Quando você perdeu a
virgindade?”
Pausei dramaticamente antes de responder. “Campo de
treinamento. Havia três mulheres na nossa unidade e uma delas
tinha uma queda por mim. Um dia, voltamos para o alojamento
durante o dia e… bom, executamos a missão. O nome dela era
Vanessa.”, saboreei o som do nome na minha boca. Mesmo treze
anos depois, aquilo fazia uma parte da minha alma formigar.
“Campo de treinamento?”, perguntou Trish. “Você era virgem
até os dezoito anos de idade?”
“Não me julgue.”, eu disse com uma atitude defensiva teatral.
“Eu era tímido na época.”
“Não consigo imaginar Jordan Mackey sendo tímido.”, Archer
murmurou.
“Nem eu!”, Trish acrescentou. “E o que aconteceu com
Vanessa?”
“Nada. Só transamos. Algumas outras vezes. Mas então ela
partiu para outro cara da unidade um pouco depois. Ela parecia uma
criança em uma loja de doces entre todos aqueles homens.”,
levantei uma mão rapidamente. “Não estou criticando. Não posso
culpá-la. Se fosse o contrário, eu faria o mesmo.”
“Só consigo imaginar,”, disse Trish “como é ficar rodeada por
militares saradões o tempo todo…”
Ela parou de falar e suas bochechas coraram. Por um
momento fiquei confuso, mas então me dei conta de que Trish
estava na mesma situação. Cercada por mim, Archer e Harrison o
tempo todo durante aquela viagem.
“E você?”, perguntei para aliviar a tensão.
Trish fez um sinal negativo com o dedo. “Não é assim que o
jogo funciona. É sua vez de perguntar. Outra pergunta. Não é
permitido repetir.”
Suspirei dramaticamente. “Está bem. Deixe-me pensar. Qual
foi o momento mais embaraçoso da sua vida?”
Ela ficou ainda mais corada e hesitou antes de responder. E
não porque ela estava tentando pensar na resposta. Me perguntei
se tinha tocado em um ponto sensível.
“Fiz xixi nas calças no Jardim de Infância.”, ela disse
finalmente. “Na aula da Senhora Wall. Estávamos praticando letra
cursiva e ela não me deixou ir ao banheiro quando pedi. Segurei até
não conseguir mais, então pulei de pé e tentei correr da sala, mas
era tarde demais…”
“Nãããão!”, eu disse. A história era verdade ou ela estava
escondendo uma verdade ainda pior?
“O meu foi no Ensino Médio de novo.”, Archer respondeu.
“Acidentalmente chamei a professora de mãe. Na frente da turma
toda. Ninguém nunca deixou a história morrer.”
Continuamos jogando e gargalhando das respostas. Archer foi
ficando mais criativo e perguntou quanto dinheiro nos faria pular
numa piscina cheia de esgoto—cem mil para mim, dez milhões de
dólares para Trish. Perguntamos sobre nossas comidas menos
favoritas e com qual celebridade transaríamos.
“Ok, aqui vai uma difícil.”, eu disse. “Relacionamento mais
duradouro?”
“Lexi Parker, dezoito meses,”, Archer respondeu, “namoramos
enquanto eu estava na tropa. Mas nos afastamos.”, ele deu de
ombros como se tivesse sido inevitável.
Nos viramos para Trish. Ela levou a cerveja aos lábios e bebeu.
“Aaaah, vamos lá.”, eu disse. “Não beba e evite a pergunta.
Nos conte.”
Ela abaixou o copo e o encarou, como se o conteúdo fosse
oferecer algum tipo de escapatória. “Meu ex, Daniel.”
“Daniel. Típico nome de imbecil.”, eu disse.
“Ei, dois dos meus melhores amigos se chamam Daniel.”
“Não tenho mais nada a dizer.”, me virei para Trish. “Por quanto
tempo vocês ficaram juntos?”
Ela dobrou as pernas e seus joelhos quase encostaram no seu
queixo. “Nos conhecemos na Universidade. Namoramos por dois
anos. Sério. Pensei que nos casaríamos. Mas aí a família para a
qual eu estava trabalhando de babá se mudou para o outro lado do
país e me convidou para ir junto. E eu considerei aceitar. Aquilo
enfureceu Daniel. Ele agiu como se eu o estivesse abandonando,
mesmo eu o tendo convidado para ir comigo. Ele transformou aquilo
em um escândalo, falou sobre não querer se mudar da Costa Leste,
mesmo sendo motorista de aplicativo sem nenhuma outra razão
para ficar. Então eu recusei o trabalho.”
Trish respirou fundo. “E então, um mês depois, ele terminou
comigo e se mudou para Denver para ficar com uma garota que
conheceu online.”
“Caraaaalho.”, eu disse.
Ela fez uma careta. “Aquilo doeu. Todo aquele papo sobre
abandono era apenas projeção. Várias coisas que ele disse quando
terminamos foram projeção, descobri mais tarde. Esse é o motivo
real pelo qual eu já tinha um passaporte. Daniel sempre disse que
queria viajar pela Europa comigo. Nunca tivemos a chance. Sempre
conversávamos sobre o assunto, mas nunca tomamos nenhuma
providência.”
“Que merda.”, disse Archer. “Um imbecil.”
“Um grande cuzão.”, acrescentei e ignorei a encarada de
Archer por causa do palavrão, tentando olhar com a maior simpatia
que pude para Trish. “Sinto muito. Isso é uma merda.”
Ela deu de ombro. “Já superei isso. Ou pelo menos parte
disso.”
“Ele era bom de cama, pelo menos?”, Archer perguntou. “Se
vocês ficaram juntos por tanto tempo, devia ser…”
“Essa é a parte mais frustrante: ele não era! Um pudico total.
Dois anos juntos e ele nunca gostou de ficar pelado perto de mim.
Luzes apagadas, debaixo das cobertas. Totalmente softcore.”, ela
mordeu o lábio. “Durante o tempo todo em que estivemos juntos, eu
tive no máximo cinco orgasmos reais.”
Ela olhou para mim e eu sorri. Ela já tinha tido mais orgasmos
comigo em uma semana e eu tinha certeza de que ela não fingiu
nenhum.
Trish sacudiu o corpo. “Ok, chega de depressão. Agora uma
pergunta picante: qual é a maior fantasia sexual de vocês?”
“Aaah, essa é boa.”, eu disse. “Você primeiro, amigo.”
Archer prontamente levou o copo aos lábios e tomou um
grande gole da sua bebida.
“Ah, para!”, disse Trish. “Contei a vocês sobre meu ex.”
Archer sacudiu a cabeça. “Não. Não é hora disso.”
Ela se inclinou na direção dele. “Deve ser algo bem pervertido,
já que você não quer compartilhar.”
“Receio que não.”, ele apontou para mim.
Encarei minha bebida e decidi que seria mais corajoso do que
Archer. “Sempre quis fazer sexo a três.”
Trish assentiu com apreço. “Sexo a três. Legal. Bem padrão.
Acho que todo cara fantasia em transar com duas mulheres.”
Ri e sacudi a cabeça. “Não, não desse tipo. Apesar de que
seria bom também. Mas eu sempre quis dividir uma mulher com
outro cara.”
“Ah.”, ela ficou corada de novo.
“Nunca tive a chance.”, continuei. “Deveria ter feito isso com
Vanessa. Ela curtia umas bizarrices. Provavelmente minha melhor
chance.”, dei de ombros. “Não sei por que isso me excita. Eu e outro
cara compartilhando uma garota. Passando seu corpo de um para o
outro. Adorando a mesma mulher juntos. Só me excita. Sem
explicação.”
“Eu entendo.”, disse Trish. “É sexy mesmo. Que pena que você
perdeu sua chance.”
Archer virou o resto da sua cerveja e colocou o copo na mesa
de centro. “Não sei qual é o problema. Somos três.”, ele sorriu.
“Podemos realizar essa fantasia quando você quiser.”
21

Trish

Eu estava me divertindo, bebendo e conhecendo Archer e


Jordy melhor. Especialmente as informações travessas sobre perder
a virgindade e fantasias sexuais. Aquilo preenchia várias lacunas do
que eu sabia deles, especialmente Jordy, com quem eu já tinha
dormido, mas sabia muito pouco sobre. E apesar de algumas das
respostas mais sérias (como a minha história com Daniel), o jogo foi
tranquilo e despreocupado.
Até Archer falar.
Ele não estava bêbado, mas estava altinho. O suficiente para
falar o que de fato estava pensando. Nós três nos entreolhamos,
sem saber o que dizer.
Finalmente, Jordy quebrou o silêncio. “Ah, que divertido!
Transformando minha fantasia sexual em uma grande piada.”
“Ah, claro. Piadas.”, Archer piscou para mim e se recostou na
cadeira.
Eu não estava bêbada, mas tinha bebido o suficiente para
pensar sobre o assunto. Sexo a três. Nunca considerei fazer aquilo.
Era algo que acontecia em filmes pornográficos ou ruins, mas não
na vida real. E mulheres que faziam aquilo caiam no ostracismo e
eram chamadas de nomes horríveis. Me lembrei de algumas garotas
cujos rumores as perseguiam na faculdade. Eu não queria que
ninguém falasse de mim como falavam delas.
Mas eu não estava na faculdade, não havia uma dúzia de
colegas ali para rir e me chamar de vagabunda se descobrissem.
Mas aquela residência particular na Turquia me parecia um espaço
seguro para experimentar. Com dois caras que eu tinha conhecido
melhor nas últimas semanas. Dois caras nos quais eu confiava.
Dois caras que gostavam de mim.
Dois caras que eram incrivelmente gostosos.
Archer estava sorrindo para mim, me dei conta. Ele tinha uma
beleza jovial, cabelos dourados perfeitos e algo que atraía
intensamente meus olhos toda vez que entrava em um cômodo.
Isso sem contar o sotaque britânico sexy que fluía dos seus lábios
quando ele falava. E apesar de não termos feito nada ainda, nós
tínhamos trocado mensagens a semana toda enquanto ele
trabalhava. Eu me sentia mais conectada a ele do que quando ele
era só um cara aleatório da academia a quem nós chamávamos de
Caramelo.
Jordy também me olhava. Seus olhos brilhavam de
curiosidade. Ele está mesmo considerando a ideia? Aquilo me
excitava ainda mais. Se ambos estivessem interessados…
Mordi meu lábio. “Eu não sei.”
Jordy colocou sua cerveja na mesa e escorregou para mais
perto de mim no sofá. “Não vou te pressionar a fazer algo que ainda
é hesitante para você. Mas eu vou te beijar, porque você é linda
demais para eu não fazer isso.”
Ele se inclinou e eu aceitei seus lábios como em qualquer outro
beijo. e de muitas formas, era. Mas eu estava muito consciente de
que Archer nos assistia da poltrona ao meu lado esquerdo. Olhei
para ele e nos encaramos um pouco. um mundo de paixão e
possibilidades passou entre nós e de repente me lancei nos braços
de Jordy com um entusiasmo ainda maior.
Senti o olhar de Archer como se fosse uma carícia enquanto eu
beijava Jordy. Aquilo me excitou de uma forma nova e empolgante
que eu nunca tinha experimentado. Eu não pensava que pudesse
ter um quê de exibicionista, e a ideia de beijar alguém—ou fazer
mais do que beijar—enquanto outros assistiam sempre me
aterrorizava. Mas aquilo era diferente. Aquilo acionava vários dos
meus botões.
Jordy se afastou e respirou. “Não precisamos fazer nada que
você não se sinta confortável para fazer.”
Segurei seu rosto com as duas mãos e o beijei com mais
intensidade. Ele aceitou minha língua faminto, gemendo
suavemente. Então interrompi o beijo.
“Mas eu não estou confortável em fazer isso. Imagina se
Kaylee entra aqui. Vamos voltar para o seu quarto.”
“Sim, entendo o que você está dizendo.”, Jordy se levantou e
pegou minha mão, me guiando para fora da sala. Já estávamos na
metade do caminho quando olhei para Archer por cima do ombro.
“Vai bancar o durão agora?”
Ele ficou de pé e passou uma mão no cabelo. “Durão ainda
não, mas em breve, espero que sim.”
Jordy gargalhou. “Isso foi ridículo…”
Archer fez uma careta. “Bom, se você não quer realizar sua
fantasia…”
“Não!”, eu e Jordy gritamos ao mesmo tempo. Então olhamos
um para o outro e gargalhamos.
A caminhada para a nossa ala da casa pareceu mais longa do
que o normal. Eram só vinte segundos mais ou menos, mas tempo o
suficiente para pensar no que eu estava fazendo e talvez desistir.
Não quero desistir, me dei conta. Eu quero fazer isso. ou pelo
menos tentar. Era libertador até mesmo pensar em algo assim,
especialmente depois de dois anos de julgamento puritano do meu
ex. Andar até o quarto com Jordy e Archer parecia uma rebelião
contra Daniel e toda as bobagens que eu precisei aguentar. Senti
que estava prestes a compensar o tempo que eu tinha
desperdiçado. Eu estava aterrorizada e podia sentir minha pulsação
acelerada.
Mas ao mesmo tempo, eu estava mais empolgada do que
jamais estive na vida.
Jordy me guiou até o seu quarto. Archer nos seguiu e trancou a
porta. A última coisa que vi foi Archer se sentando na cadeira perto
da cama e Jordy começou a me beijar mais apaixonadamente do
que antes. Caímos na cama e eu me perdi nos seus lábios macios e
seu corpo duro. Sua mão escorregou para o meio das minhas
pernas e ele começou a me esfregar por cima do pijama.
“Tudo bem por aí?”, Jordy perguntou.
Paramos para olhar para o loiro inglês. “Gosto de assistir.
Parece meu filme pornô pessoal.”
“Sinta-se à vontade para fazer solicitações,”, eu disse, me
surpreendendo com a minha própria audácia, “sou boa em seguir
ordens.”
Archer sorriu. “Parece que meu amigo está fazendo todo o
trabalho sozinho. Por que você não pega o pau dele e faz a sua
parte?”
Obedeci a seu pedido, puxando as cordinhas das calças de
moletom de Jordy e puxando para baixo o suficiente para revelar
seu pau duro. Arrastei as pontas dos meus dedos pela lateral do seu
pau, e ele se engasgou com a própria respiração. Seu pau tremeu
com desejo enquanto eu o provocava, até eu finalmente envolver o
membro com os dedos e o masturbar continuamente. Ele soltou sua
respiração longamente e continuou a me masturbar por cima do
pijama. Em minutos eu estava me contorcendo sob seu toque.
“Você tem um belo rosto,”, Archer disse de repente, “e uma
bela boca. Acho que ficaria ainda mais linda com um pau dentro.”
Ansiosa para obedecer, afastei Jordy e me abaixei na frente
dele. Senti o calor irradiando do seu pau enquanto me aproximava,
o deixando sentir minha respiração na sua pele. Ele gemeu quando
eu comecei a lamber a lateral, da base até a cabeça.
“Eu não mandei lamber.”, disse Archer. “Eu disse que queria
ver um pau na sua boca.”
Estar na cama com um homem recebendo comandos de outro
era insanamente bom. Aquilo disparou algo no meu cérebro que
estava totalmente ansioso para obedecer. Sem hesitar. Agarrei o
pau de Jordy e enrolei meus lábios em volta, empurrando para
dentro o máximo que eu conseguia sem me engasgar.
“Muito bem.”, Archer aprovou da sua cadeira.
Enquanto eu chupava Jordy, pude ver Archer pelo canto do
meu olho. Ele abriu as pernas na cadeira e se ajustou gentilmente.
Seus olhos estavam arregalados e famintos. Aquilo me excitou
ainda mais enquanto eu me concentrava na minha tarefa com Jordy.
“Chega.”, Archer ordenou. “Você quer que ela te cavalgue,
Jordy?”
“Eu quero muito.”, ele respondeu.
“Que bom. Tire as roupas e o cavalgue, Trish.”
O comando foi rápido e intimidador, e era melhor eu obedecer.
Minha virilha formigava com empolgação enquanto eu tirava minha
calcinha e a camiseta que eu vestia. Fiquei de pé perto da cama e
saboreei os dois pares de olhos escaneando meu corpo desnudo. O
suspiro longo de Archer quando me viu nua pela primeira vez foi
muito audível. Me ajoelhei lentamente na cama, montando o corpo
de Jordy. E quando eu estava sobre ele, estiquei o braço e guiei seu
pau duro para dentro dos meus lábios.
“Eu não disse provocá-lo.”, disse Archer. “Eu disse cavalgá-lo.
Faça isso, agora.”
Me empalei com o pau de Jordy, tomando cada centímetro seu
em uma longa estocada. Relâmpagos de prazer invadiram meu
corpo, prazer que eu vi refletido nos gemidos de Jordy. Eu queria
saborear o sentimento, agarrá-lo dentro de mim e memorizar a
sensação, mas eu estava sob as ordens de Archer e suas
instruções eram claras.
Comecei a cavalgar Jordy, me movendo lentamente para cima
e para baixo. Sabendo que nosso amor estava sendo exibido,
arqueei minhas costas e joguei meus cabelos. Me inclinei para beijar
Jordy e corri minhas mãos pelo seu peito escultural enquanto me
movia mais rápido.
O álcool tinha me deixado solta o suficiente para aproveitar do
momento, mas sem perder de vista o que estava acontecendo. Era
a combinação perfeita.
“Curtindo o show?”, perguntei a Archer.
“Muito.”
“Então por que?”, perguntei. “Por que você não está se
masturbando?”
Archer abriu o zíper da calça. “Excelente pergunta.”
Ele tirou o pau de dentro, ele era duro e grosso, e começou a
se tocar lentamente. Eu estou causando isso, pensei. Ele está
excitado por minha causa. E por causa de Jordy. E eu sou a razão
do prazer de ambos.
Parei de pensar e me perdi nos movimentos. Eu o cavalgava,
para cima e para baixo, tomando o pau duro de Jordy enquanto
encarava Archer, que estava se masturbando mais rápido. Era uma
coisa travessa, que eu nunca tinha feito em Wilmington. E eu estava
amando cada momento fumegante daquilo.
“Por que você não se junta a nós?”, Jordy perguntou
casualmente.
Desacelerei e olhei para Archer de novo. ele queria. Eu podia
sentir, mas ele hesitou. “A adorável Trish está pronta para isso?”
Sim, por favor, eu quero estar pronta. Pensei, implorando com
os olhos. me tome, do jeito que você quiser.
Mas a única coisa que consegui dizer foi: “Não sei.”
“Talvez devamos começar devagar.”, disse Jordy. “Por que
você não vem aqui e beija a nuca dela?”
Archer ficou de pé e tirou sua camisa, revelando uma tapeçaria
de músculos. “Pensei que era eu quem estava dando ordens.”
“Não são ordens.”, disse Jordy apertando minha cintura.
“Apenas sugestões.”
Jordy nos abaixou na cama até seus pés estarem no chão. Eu
o cavalguei no limite, tremendo de ansiedade enquanto Archer
caminhava ao redor da cama, agonizantemente lento. Por um
momento, ele parou atrás de mim sem fazer nada. Eu podia
praticamente sentir sua presença, alto e sarado e pelado.
No momento que seus lábios tocaram minhas costas, uma
pontada de surpresa percorreu meu corpo. Cada um dos meus
músculos ficou tenso quando suas mãos gentilmente agarraram
meus ombros. Então eu relaxei sob seu toque e continuei
cavalgando Jordy enquanto Archer beijava minhas costas. Eram
beijos suaves, que refrescavam cada ponto que tocavam da minha
pele. Eu senti como uma provocação. Ele estava ali, tão perto de
mim, mas sem fazer nada. Me inclinei para trás enquanto girava em
cima de Jordy, praticamente implorando para Archer, mas ele
permaneceu ali, me tentando com sua presença.
Me virei para olhar para ele. Seus cabelos loiros eram tudo o
que eu conseguia ver porque ele beijava a base da minha nuca,
línguas acariciando o topo da minha espinha. Meu coração batia
forte no peito porque estávamos muito perto do que eu queria. E
então, quando eu não aguentava mais, agarrei um punhado dos
seus cabelos loiros e puxei seus lábios para os meus.
Archer ficou surpreso, mas se recuperou rapidamente quando
forcei minha língua na sua boca. Um gemido maravilhoso vibrou na
sua garganta e ele agarrou minha nuca, me segurando contra ele
enquanto o beijo se intensificava. Então ele se inclinou mais para
perto, enrolando seus braços ao meu redor, apertando um dos meus
peitos com a mão. Nossas línguas dançavam juntas e molhadas, se
rendendo ao que nós dois queríamos.
“Caralho, isso é muito sexy.”, disse Jordy.
Interrompi o beijo e me virei para ele: “Realizando sua
fantasia?”
“Surpreendentemente melhor do que eu esperava.”, Jordy
agarrou um punhado do meu cabelo e me puxou para me beijar.
Seu beijo foi tão sensual quanto o de Archer, mas diferente de forma
única, e o contraste entre os dois iniciou um fogo de prazer entre as
minhas pernas. aumentei a intensidade das minhas cavalgadas,
procurando aquela chama de êxtase que me queimava por dentro.
Archer se inclinou na minha direção, pressionando seu peito
nas minhas costas, pele com pele. Seu pau roçou minha nádega,
ansioso, esperando sua vez. Ele gemeu no meu ouvido e disse com
seu sotaque britânico: “Isso, monta nele. Ele gosta disso. Não
desacelere. Continue.”
“Se ela continuar, vou gozar.”, Jordy disse por entre os dentes
travados.
O peito de Archer retumbou em uma risada, eu o senti tremer.
“Não sei como você ainda não gozou.”
“Você vai saber quando tentar.”, Jordy agarrou minha cintura
com as duas mãos e afastou seu quadril até seu pau sair de dentro
de mim. “Eu acho que já está na hora, inclusive. Você não acha,
Trish?”
Eu não confiava na minha voz, então só acenei vigorosamente.
Archer mordeu minha orelha por trás, então escorregou uma
mão pela minha nádega até encontrar minha boceta ensopada. Ele
usou três dedos para roçar minha entrada, testando, saboreando.
Então eu senti a cabeça do seu pau. Novas chamas de paixão me
queimaram só com o mero pensamento dele me penetrar, tomando
o lugar que Jordy tinha acabado de ocupar. Na saída, ele roçou sua
cabeça para cima e para baixo, me provocando.
Cheguei no ponto em que eu não conseguia mais aguentar,
então empurrei minha bunda e enfiei metade do seu pau dentro de
mim. Nós dois gememos juntos e seus dedos se enterraram no meu
quadril com desejo.
“Achei que eu era o chefe aqui.”, ele provocou.
“Desculpa.”, retumbei no peito de Jordy. “Eu não consegui mais
esperar.”
Ouvi o sorriso na voz de Archer quando ele respondeu: “Acho
que você precisa de uma lição.”
Então ele agarrou meu quadril e chocou seu dentro de mim
com tanta força que eu até escorreguei para a frente no peito de
Jordy. Ele me puxou de volta possessivamente e se enfiou em mim
de novo, mas me segurando no lugar enquanto me fodia,
esmagando a pele da minha bunda com o seu umbigo a cada
estocada.
Gritei de êxtase enquanto ele me comia, com força e
velocidade, depois de assistir por tanto tempo. Um momento de
claridade me abateu durante o ato sexual e me dei conta de que
estava enfiada entre dois lindos homens, Caramelo e Bombom,
sendo divididas por eles de uma forma que eu nunca tinha
imaginado. A percepção me fez gritar com uma alegria renovada,
uma liberdade sexual que eu não sabia que era possível.
“Estou quase,”, sussurrei, esticando a mão para esfregar meu
clitóris, “não para, bem assim, não para…”
Mas Archer parou. “Não acho que estamos prontos para te
deixar gozar, estamos?”
“Acho que não.”, Jordy concordou. “Ela não merece ainda.”
Gemi de frustração e os dois riram.
“Sua vez.”, Archer me empurrou de volta para a posição inicial,
no topo de Jordy, que guiou seu pau para dentro de mim sem
hesitar. Suspirei com a sensação de ser preenchida de novo,
mantendo meu quadril parado daquela vez, enquanto Jordy se
enfiava em mim. Archer agarrou minha bunda com as duas mãos
enquanto aquilo acontecia, e deu um tapa na minha nádega que
ecoou pelo quarto.
Ai, eu gosto disso, me dei conta.
Archer deve ter percebido pelos meus gemidos, porque me deu
outro tapa, na outra nádega, com um pouco mais de força dessa
vez. A dor era pequena, mas pulsante e fresca, e fazia minha virilha
arder de uma forma nova e erótica. Senti meu orgasmo chegando
de novo, mais desesperado, como se fosse a reta final de uma
maratona.
Mas de novo quando eu estava prestes a gozar e fechei meus
olhos, sentindo a chegada como um sol nascendo, Jordy parou
abruptamente. “Aí está ela de novo no limite.”
“Minha vez de provocá-la.”, Archer me levantou do pau de
Jordy e me penetrou por trás de novo, mas só com a cabeça dessa
vez. Ele entrava e saía me preenchendo só com o mínimo. Tentei
empurrar minha bunda para trás, para fazê-lo entrar mais, mas
Jordy me segurava firme.
“Vamos te avisar quando você puder gozar, gata.”, Archer disse
no meu ouvido.
Havia algo de libertador em não estar no controle. Em me
render aos dois homens que estavam me compartilhando. Abri mão
do poder e senti a vulnerabilidade de ser total e completamente
deles.
Archer me fodeu por mais um tempo, então Jordy assumiu.
Cada vez que eu me aproximava do limite de me aliviar, eles
paravam e se revezavam, fazendo meu orgasmo retroceder um
pouco. Rapidamente aquela pressão dentro de mim ficou tão
grande, ainda maior do que da primeira vez que eu tinha gozado
com Jordy.
E eu cedi. Aceitei que pertencia a eles, que eu não tinha
controle nenhum dos próximos passos. Era libertador. Aquilo me
levava às alturas do prazer enquanto o pau de Archer me
arrebatava por trás. Eu implorava, choramingava e gemia enquanto
eles se revezavam me fodendo toda.
Assim que Jordy assumiu seu posto em seguida, senti algo
diferente. Sua respiração estava mais pesada e seus olhos mais
abertos. Suas mãos seguravam minha cintura com tanta força que
quase ardia. Então, sua boca se abriu e ele gemeu, aumentando a
velocidade das estocadas e eu me dei conta de que ele estava
prestes a gozar.
“Trish,”, ele se engasgou, com os olhos cheios de surpresa e
êxtase. “Ai, Trish!”
Senti-o explodir dentro de mim como ele já tinha feito antes,
mas daquela vez não fui impedida. Meu orgasmo atingiu o meio das
minhas pernas como uma supernova, o alívio de uma tensão que
tinha sido construída pelo que pareceram horas. Arqueei as costas e
gritei silenciosamente em êxtase. Minha visão ficou branca e o
mundo todo em silêncio, avassalados pelo redemoinho de pura
alegria.
Archer me puxou de volta só o suficiente para Jordy sair e me
penetrou por trás pela última vez. Suas estocadas também estavam
mais urgentes, me dilacerando por dentro com um abandono
imprudente. Jordy ainda estava gozando, jatos longos de creme
branco jorrando na minha barriga e nos meus peitos, e seus lábios
encontraram os meus, bebendo meu prazer. Archer gemeu e
agarrou meus ombros enquanto também gozava dentro de mim.
Senti seu pau pulsar, jorrando sem parar, e o apertei com as minhas
paredes internas, sedenta por cada gota dele enquanto nós três nos
afogávamos juntos em êxtase.
22

Archer

Nunca achei que aquilo aconteceria de verdade. Quando


sugeri que realizássemos a fantasia de Jordy, eu estava meio que
brincando. Não esperava que ele fosse aceitar, menos ainda como
Trish reagiria.
Mas quando estávamos ali no quarto, os três juntos, com a
porta trancada, tudo meio que se encaixou. Sentei-me no sofá e dei
ordens—o que, para a minha surpresa, era muito excitante para
mim. Trish obedeceu entusiasmada, o que me deu ainda mais
confiança e a fez aproveitar muito mais. Foi uma reação em cadeia
sexual que elevou tudo o que fizemos.
Quando agarrei Trish por trás e enterrei meu pau nela, sentindo
suas esferas perfeitas balançando enquanto ela tomava ansiosa
cada centímetro meu, fiquei chocado por não ter ejaculado antes.
Se Jordy e eu não a tivéssemos revezado, eu certamente não teria
durado mais do que um ou dois minutos.
Quando terminamos, caímos na cama juntos—Jordy de um
lado, eu do outro e Trish esticada entre nós. Ela parecia uma deusa
iluminada pelo abajur em cima da mesa de cabeceira, com uma
perna dobrada e um braço sobre os seios. Encostei minhas pernas
na dela e me senti incrivelmente próximo de Trish. Como se tudo o
que tivesse acabado de acontecer fosse mais do que apenas sexo.
É só o efeito pós-sexo, pensei. Todo mundo se sentiria assim
depois da trepada que tivemos.
“Então,”, disse Trish, “realizamos sua fantasia?”
“Sim!”, Jordy respondeu. “E foi melhor do que eu imaginei!”
Trish se virou para se aninhar nele, o que criou um vão entre
nós. “Foi muito sexy para mim também.”
“O que? Você gostou de transar com dois homens lindos?”,
Jordy perguntou. “Estou chocado.”
“Um homem lindo e Jordy.”, provoquei.
Trish se virou para me olhar por cima do ombro. “Falando em
dois homens lindos, você vai ficar aí ou me abraçar? Está frio?”
Me virei e moldei meu corpo no dela—meu pau na sua bunda e
suas costas no meu peito. Era como a forma como havíamos feito
amor, mas bem mais sensual. Enfiei meu rosto no cabelo dela e
respirei fundo. Seu cheiro era tão intoxicante que o álcool que nos
tinha levado àquele affair.
“Eu nunca nem imaginei fazer isso.”, disse Trish.
“Quer dizer, com nós dois?”, Jordy perguntou.
Trish sacudiu a cabeça. “Nunca. Com ninguém. Cresci num
pequeno subúrbio de Wilmington, não muito progressista. Do tipo
que julga as garotas por suas reputações.”
“Você nunca nem fantasiou?”, perguntei. “Achei que todas as
mulheres pelo menos pensassem nisso.”
“Nem todo nós crescemos em uma família poligâmica e liberal
sexualmente.”, ela respondeu. “Você pode estar acostumado com o
fato de os seus pais fazerem sexo grupal, mas eu não estou!”
Resmunguei. “E foi assim que meu pau amoleceu para
sempre.”
Trish deu uma risadinha. “Ops, desculpa.”
“Não peça desculpas.”, Jordy interrompeu. “A mãe dele é uma
gata. Priscilla e Kate também. Eu mentiria se dissesse que nunca
pensei…”
“Isso é mais do que suficiente!”, intervi. “A não ser que você
queira que eu vomite em vocês dois.”
“Bom, voltando ao assunto, isso foi muito gostoso.”, disse
Jordy. “Somos todos adultos aqui. Três pessoas podem trepar sem
isso se tornar um grande problema.”
“Hmm, sim, é apenas sexo.”, Trish respondeu se aninhando
mais nele.
Ali, abraçado nela, pensei no conceito. Apenas sexo. Será que
era possível transar sem transformar a situação em algo mais? Era
possível ter uma conexão intensamente sexual sem desenvolver
sentimentos pela outra pessoa? Eu já gostava de Trish e me dei
conta de que não queria que aquilo fosse um caso de uma noite. Eu
queria fazer de novo.
Espero que ela também queira.
“Deveríamos voltar cada um para o seu quarto.”, eu disse.
Antes que eu pudesse me afastar, Trish me segurou. “Não!
Ainda não. Cafuné. Cinco minutinhos só.”
Jordy sorriu do outro lado dela. “Não deixe a moça infeliz.
Fique mais um tempinho.”
Eu não precisava de muito convencimento para abraçar Trish
de novo. Descansei minha cabeça nos cabelos dela, permitindo que
seu cheiro penetrasse minhas narinas e fechei os olhos.
TOC TOC TOC.
Meus olhos se arregalaram. Era um sonho ou minha
imaginação? Eu tinha acabado de cochilar. Olhei no relógio e me
encolhi. Tínhamos dormido por duas horas. Já era de madrugada.
TOC TOC TOC. “Papai?”, a porta se mexeu. “Papai, tive um
pesadelo…”
Jordy e Trish se sentaram na cama. “O que vamos fazer?”, ela
sussurrou.
“Hm, só um minuto, fofinha!”, disse Jordy.
A maçaneta girou de novo. “Papai…”
Jordy se vestiu rapidamente, mas eu e Trish não tínhamos
tempo. me levantei da cama e olhei ao redor. O banheiro de Jordy
ficava do lado de fora, no corredor. “O closet.”, murmurei, segurando
a mão de Trish e a guiando naquela direção. Ele era fechado por
uma cortina e não por uma porta. Eu a abri e fiz uma careta. Não
havia muito espaço. Me espremi lá dentro e puxei Trish. Fechamos
a cortina e prendemos a respiração.
Jordy abriu a porta. “Aaah, docinho. Você teve um pesadelo?”
“Hmm-hmm.”, minha filha murmurou. “O que você está
fazendo?”
“Como assim?”, Jordy respondeu.
“Sua luz estava acesa.”
“Esqueci de apagar.”
Trish se pressionou em mim no closet. O que fez sua bunda
apertar meu pau amolecido. E eu o senti endurecer.
“Onde está papai Archie?”, Kaylee perguntou. “E Trish?”
Houve uma longa pausa. “Como assim?”
“Papai Archie não está no quarto dele. Fui lá primeiro. Então
procurei por Trish. Eles sumiram.”
Apesar da situação precária, meu pau estava ficando
rapidamente duro na bunda de Trish. Ela se virou e me encarou no
escuro, com um olhar de “Sério mesmo?”.
“Não consigo evitar!”, murmurei o mais baixo que pude. “Bom,
a culpa é sua por ser sexy.”
Ela sorriu.
“Vamos voltar para a cama, docinho,”, disse Jordy, “fico com
você até você dormir. Prometo.”
“Mas cadê o papai? E para onde Trish foi?”
“Hm, talvez eles tenham ido dar uma volta! Sim! Exatamente.
Eles foram caminhar. As vezes eles não conseguem dormir. Como
você.”
“Ah,”, disse Kaylee, “ok.”
Os ouvimos caminhar para fora do quarto e pelo corredor. Só
então voltamos a respirar novamente e saímos do closet.
“Que momento infeliz.”, eu disse, pegando minhas roupas.
“Fomos literalmente pegos com a boca na botija, como dizem.”
Trish vestiu sua calcinha. “Eu gosto da sua boca na minha
botija. E da minha boca na sua botija.”, seus olhos encontraram
minha ereção.
“Você não está ajudando!”, protestei.
“Ah, então estou fazendo ficar mais duro?”
Olhei para ela e consegui vestir minhas calças, enfiando meu
pau duro em uma das pernas das calças. Trish já estava vestida.
“Sério agora. Isso foi muito divertido.”, ela se aproximou o
suficiente para o seu cheiro delicioso me rodear de novo e me olhou
piscando os longos cílios. Ela ficou nas pontas dos pés e me beijou.
Me inclinei, desejando que o beijo durasse mais tempo, mas ela se
afastou.
“Bons sonhos.”, ela sorriu pela última vez e desapareceu pela
porta.
Demorei um bom tempo para me recuperar antes de segui-la.

Apesar da empolgação que tinha acontecido no quarto de


Jordy, todo mundo fingiu que nada tinha acontecido na manhã
seguinte. Preparei chá enquanto os outros bebiam café. Tomamos
banho. Quando era hora de partir, nos despedimos de Kaylee—e
por extensão, de Trish.
Jordy arrumou uma desculpa para voltar e ter um momento
privado com a nossa babá. Aquilo me fez ficar com um pouco de
ciúme. Eu também queria beijar Trish secretamente. Mas era
impossível fazê-lo sem tornar tudo estranho.
Além disso, não sei como Jordy está se sentindo. Pensei. Ele
tem sentimentos fortes por Trish. Será que ele ficaria com ciúme se
eu me despedisse dela com um beijo? Seria menos estranho do que
transar com ela? Eu não sabia como deveria agir.
Dirigimos para o aeroporto e embarcamos no nosso
helicóptero. Já estávamos na metade do Mar Negro para a primeira
parada em Constança, Romênia, quando Harrison falou pelo rádio.
“Vocês se divertiram ontem.”, era uma afirmação, não uma
pergunta.
Mantive os olhos à frente e disse: “Certamente. Assistimos Os
Sopranos e fizemos um jogo de beber com a série.”
Harrison gargalhou. “Sim, certo. Você quer fingir que nada
aconteceu, eu não vou te impedir.”
Olhei por cima do ombro para Jordy, cujos olhos estavam tão
arregalados quanto os meus. “Como assim?”
Harrison riu de novo. “Eu não me importo a mínima com o que
vocês fazem com a babá. Vamos lá, mantenham seus paus
ocupados. Façam todas as noites. Desde que Kaylee fique bem.
Não façam merda de novo.”
“Você nos ouviu?”, Jordy perguntou.
“Levantei para mijar e te ouvi voltando para o quarto com ela,”,
Harrison respondeu, “então vi Archer voltando para o seu quarto
tentando esconder uma ereção do tamanho de Tennessee.”
Jordy gargalhou. “Porra. Você nos pegou.”
Uma onda intensa de vergonha me abateu. Na semana
anterior tinha sido eu a criticar Jordy por sua falta de noção com
Trish. Por ser descuidado e incapaz de manter o pau dentro das
calças. Agora era eu naquela situação, pensando com a cabeça de
baixo e quase sendo pego por Kaylee.
“Como eu disse: façam o que quiserem.”, Harrison reiterou. “Se
divirtam o quanto quiserem. Não me afeta em nada quem vocês
namoram.”
“É só sexo.”, Jordy disse rapidamente. “Eu não sei o que vai
acontecer quando voltarmos para Wilmington. Nem sei se quero que
algo aconteça. Por agora é só sexo e por mim é o suficiente.
“Só sexo.”, repetiu Harrison inexpressivo. “Certo.”
Eu pude ouvir a dúvida na sua voz. Ele tinha vários defeitos,
mas Harrison era bom em ler as pessoas. Ele tinha uma forma de
eliminar todas as bobagens e ver a situação claramente.
Só sexo. Passei o resto do voo me perguntando se ele estaria
certo.
23

Trish

Na manhã seguinte, depois que os caras saíram para a


missão, eu flutuei em uma nuvem pelo apartamento. Preparei o café
da manhã de Kaylee e corri na esteira por meia hora enquanto ela
jogava no computador. Eu geralmente odiava exercícios físicos, mas
naquele dia, me pareceu fácil. Tudo no mundo parecia fácil, simples
e maravilhoso.
Eu fiz sexo a três ontem.
O ato por si só foi maravilhoso. Ser compartilhada por dois
caras ridiculamente gostosos e que me achavam gostosa também.
Foi escandaloso, suado e muito divertido. Mas havia um nível de
intimidade que que fazia tudo muito mais satisfatório do que apenas
sexo. Eu gostava de Jordy e eu gostava de Archer. Eu tinha
passado o tempo das duas primeiras missões, na Noruega e na
Turquia, os conhecendo melhor. E os dois eram muito namoráveis,
como diria Lisa.
Merda. Lisa! Eu tinha dormido com Caramelo. Ela nunca me
perdoaria por isso. Certamente, ela não tinha nenhum direito sobre
Archer, mas ainda assim eu me sentia como se a tivesse traído. Ela
era minha melhor amiga e eu tinha que ter pensado na nossa
amizade em primeiro lugar.
Isso é um problema para depois. Agora só quero sonhar com a
noite passada.
Kaylee e eu passamos o dia lendo um dos livros dela que
contava a história de todos os países da Europa. “Esta é a Noruega.
Estávamos aqui na semana passada.”, eu disse, apontando para o
país no mapa.
“E onde é a Turquia?”, ela disse, dando uma risadinha. Ela
achava engraçado um país em que os habitantes eram todos
chamados de turcos.
“A Turquia não está aqui. Porque tecnicamente é parte da Asia.
Acho que Ásia Menor. Mas dá para ver a fronteira aqui, perto da
Grécia.”, apontei para a borda do mapa, porque dava para ver uma
lasquinha da Turquia.
Kaylee traçou uma linha entre os dois países nos cantos
opostos da página. “Nós viajamos daqui até aqui? Uaaau.”
“A viagem dos Estados Unidos até a Noruega foi ainda mais
longa! Precisamos de um globo para eu te mostrar. Você vai
realmente ter a perspectiva do quão longe de casa estamos.”
“Para onde vamos depois?”
“Não sei.”, respondi. “Seus papais vão nos dizer quando for a
hora. Por agora, é surpresa!”
“Adoro surpresas. Você tem uma mamãe?”
A mudança de assunto me pegou desprevenida. “O que?”
“Você. Tem. Uma. Mamãe.”, ela repetiu pausadamente, como
se eu fosse estúpida demais para entendê-la.
“Eu tenho uma mamãe! Ela mora na Carolina do Norte com o
meu papai. E eu tenho duas irmãzinhas.”
“Sou feliz porque sou filha única.”, ela disse, dobrando a página
do livro. “Meus papais são só meus. Sou feliz porque tenho três
papais também. É bem melhor do que só uma mamãe e um papai.”
Meu coração derreteu. “Você é uma garota sortuda, sabia?
Seus papais te amam muito.”
“Você ama meus papais?”
“Ah, eu… eu gosto dos seus papais. Eles são meus amigos.”
Ela assentiu. “Que bom. Que país é esse?”
Suspirei aliviada quando o interrogatório acabou. “Aqui é a
Itália. País do macarrão e da pizza. Aposto que você gosta de
pizza.”
“Eu amo pizza!”
Meu telefone vibrou depois que terminamos de ler o livro. Já
passava da hora em que Archer e eu trocávamos mensagens todos
os dias. Kaylee e eu estávamos jogando Minecraft, então pausei
para checar meu telefone.

Archer: Chegamos em segurança.


Eu: Que bom! Obrigada por avisar.

“Trish…”, Kaylee reclamou. “Você não está me ajudando a


coletar madeira. Precisamos de madeira para fazermos bastões, aí
podemos fazer tochas e ir mais fundo para explorar as cavernas.”
“Desculpa! Colete sem mim. Preciso de uma pausa rápida.”

Archer: O que as donzelas adoráveis estão fazendo?


Eu: Jogando Minecraft.
Archer: Espera aí. Será que entendi direito? Alugamos uma
propriedade inteira com três acres de jardins e vocês duas estão
dentro da casa jogando videogame?
Archer: E sim, estou ciente de que pareço mais um velho
descontente do que o jovem animado de 32 anos que eu sou.
Eu: Fomos caminhar mais cedo! Eu tenho feito Kaylee andar
por pelo menos meia hora todos os dias.
Archer: Você não quer ir para a cidade?
Eu: Passeamos por lá dois dias atrás. Já comprei todas as
lembrancinhas para a minha família. Vou voltar na feira em dois dias
para comprar mais pão fresco.
Eu: Além disso, tive uma sensação esquisita lá. Parecia que
alguém estava me vigiando.
Archer: Que pena. Deste lado do mundo as mulheres são
muito olhadas. Não quero te forçar a fazer algo que não seja
confortável.

Eu já ia dizer que não, não era aquele tipo de olhada. Quando


eu estava na feira, senti que estava sendo vigiada por alguém
específico. Alguém que estava lá para me espionar. Já tinha
acontecido duas vezes e mesmo que eu não tivesse provas, eu não
conseguia afastar o sentimento.
Mas eu não queria preocupar Archer, então mudei de assunto.

Eu: Falando em forçar novas situações, eu me diverti MUITO


ontem.
Archer: Nossa, MUITO? Com letras maiúsculas?
Eu: Sim, foi exatamente o que eu quis dizer.
Archer: Foi estimulante para mim também. Jordy e eu falamos
sobre isso enquanto aterrissávamos. Nós adoraríamos fazer isso de
novo. Entenderemos absolutamente se você gostou da experiência
como algo único e não quiser fazer isso de novo. Foi assim comigo
e curry. Provei uma vez e gostei, mas não estou necessariamente
ansioso para comer comida indiana de novo.

Senti um alívio em ler seu texto. Também gargalhei um pouco,


porque eu conseguia sentir a incerteza nas suas palavras, fazendo
um grande esforço para me garantir que estava tudo bem se eu não
quisesse repetir o ato.

Eu: Primeiramente, comida indiana é tudo de bom. Eu poderia


comer pão indiano com manteiga três vezes por dia pelo resto da
minha vida, e estou te julgando por não compartilhar da mesma
opinião. Segundamente, é claro que eu quero fazer isso de novo! E
da próxima vez seremos mais cuidadosos com Kaylee, e não
dormiremos imediatamente após terminarmos.
Archer: Que bom. Vou dizer ao Jordy como você se sente. Sei
que ele vai ficar aliviado em ouvir.
Archer: Afinal de contas, é apenas sexo. Não precisamos nos
preocupar com a bagagem emocional.
Archer: Somos apenas três adultos nos divertindo como
adultos juntos. E quando parar de ser divertido, podemos parar
também.

Li as mensagens três vezes. É apenas sexo. Então era assim


que ele pensava. Certamente, foi assim que eu concebi a ideia
quando concordei na noite anterior, mas eu me sentia diferente no
dia seguinte. Archer não era só um cara aleatório com quem eu
estava transando, nem Jordy. Eu não sabia o que nós éramos, e se
seria possível continuar qualquer coisa com eles quando
voltássemos para casa, mas eu não achava que era apenas sexo.
Eles não querem nada além disso? E o mais importante, eu
quero? Pensei duas, três vezes antes de finalmente responder em
um tom que eu achei que era indiferente.

Eu: Sim, totalmente. Sem bagagem. Vamos fazer isso


enquanto for divertido para nós todos. Te vejo mais tarde!

A conversa deixou um gosto amargo na minha boca pelo resto


da tarde, mas ele desapareceu assim que os caras chegaram em
casa. Eles estavam felizes e cheios de energia, o que encheu
Kaylee de empolgação infantil. Era difícil não ser contagiada pela
alegria deles. Sua chegada carregava extra significado, mais do que
apenas três homens que iam trabalhar em um escritório. Eles
estavam correndo riscos. Sua volta para casa deveria ser celebrada
todos os dias.
Naquela noite, Jordy e Archer me guiaram para o meu quarto
sem nenhuma palavra. Não precisamos de álcool para reduzir
nossas inibições daquela vez, nós três estávamos ansiosos e cheios
de expectativas. Archer começou, me inclinando na cama e me
beijando profundamente. Ele se arrastou pelo meu corpo e enfiou o
rosto na minha boceta, me devorando até me fazer arquear as
costas e gritar. Jordy rapidamente se juntou a nós na cama, se
ajoelhando perto do meu rosto e usando seu pau para abafar meus
gritos de prazer enquanto Archer continuava me chupando. Meu
segundo orgasmo foi mais rápido e mais intenso e eu gritei o mais
alto que pude com o pau de Jordy na boca.
Só então, depois de me transformarem em uma poça de prazer
que mal podia se mexer, eles se revezaram me fodendo enquanto o
outro assistia. Fui de um para o outro como na primeira noite. Só
que daquela vez, quando ambos estavam quase no clímax, eles
decidiram me assar no espeto (termo que só aprendi depois). Archer
pulou sobre meu rosto na cama e gozou na minha garganta ao
mesmo tempo que Jordy gozava na minha boceta. Me senti no céu.
A semana passou e estabelecemos uma rotina maravilhosa: eu
me despedia deles de manhã, passava o dia com Kaylee,
jantávamos juntos e quando o sol se punha, nos perdíamos nos
impulsos irracionais dos nossos corpos. Na terceira noite, aquilo não
me escandalizava mais. Depois de uma semana inteira de sexo a
três alucinante, comecei a pensar nos motivos para alguém transar
com uma única pessoa por vez.
Suspeitei que Harrison soubesse. Ele sorria para mim todas as
vezes que eu dizia estar indo dormir. Em uma noite, depois de
Kaylee dormir, ele disse algo como: “Não quero segurar vela, então
vou dormir.”, mas sem ser rude. Ele nunca me fez me sentir
ridicularizada. Ele só nós dava o espaço que precisávamos para nos
divertir.
Já tínhamos passado duas semanas em Istambul e a terceira
semana estava começando. Nós quatro estávamos tomando café da
manhã juntos e chegou a hora de nos despedirmos dos rapazes.
Kaylee correu pelo corredor para pegar seu livro de adesivos porque
ela queria dar a eles um amuleto da sorte. Quando ela saiu do
cômodo, Jordy me agarrou e me deu um beijo longo e apaixonado
que me fez perder o fôlego.
“Papai?”
Nós dois fizemos uma careta e nos afastamos como se
estivéssemos sido flagrados fazendo algo de errado. E bom, era
mais ou menos isso. Kaylee estava parada na sala de estar com o
olhar confuso. Congelei, tentando pensar em uma desculpa.
“Hm, docinho… achei que você tinha ido buscar seus
adesivos.”, Jordy disse.
Kaylee apontou. “Me lembrei que tinha deixado no sofá.”, sua
careta se intensificou. “O que você e Trish estão fazendo?”
Nos entreolhamos, incapazes de responder. Parecia que um
gato tinha comido nossa língua, graças ao fato de que nós dois
estávamos literalmente comendo a língua um do outro, segundos
antes.
“É assim que adultos se despedem em alguns países.”, Archer
disse rapidamente. Ele acenou com a cabeça e olhou para todos no
cômodo. “Jordy e Trish estavam se despedindo.”
Kaylee contorceu o rosto enquanto considerava a informação.
“Todos os adultos fazem isso? Trish se despediu de várias pessoas
na feira, mas nunca beijou ninguém.”
“Nós só fazemos isso com adultos que conhecemos.”, eu
disse. “Não com estranhos.”
“Então por que você não beija meus outros papais?”
Olhei para Jordy. Dava para saber o que ele estava pensando:
merda. ela nos pegou. Archer parecia igualmente desconfortável,
mas Harrison cobria a boca e se esforçava para não rir.
“Era o que eu estava fazendo.”, me aproximei de Archer e o
beijei rapidamente na boca. Foi totalmente inocente, mas imagens
da noite anterior lampejaram na minha cabeça, quando estávamos
nos beijando em um contexto totalmente diferente. “Até logo,
Archer.”
“Até logo, Trish.”, ele respondeu formalmente.
Então me virei para Harrison. Eu não queria beijá-lo, mas
Kaylee estava ali parada, pacientemente, se certificando de que
estávamos falando a verdade. Harrison, aquele urso enorme,
arqueou uma sobrancelha e sorriu. Ele estava se divertindo muito as
nossas custas. E eu não podia culpá-lo.
Vamos lá, acabar logo com isso.
“Tenha uma boa viagem.”, eu disse. Harrison estava imóvel.
Ficar tão perto dele fazia sua cicatriz abaixo do olho se destacar
mais do que de costume. Dei um passo a frente e me levantei para
beijá-lo. Só um selinho rápido. Nada demais. Mas quando eu o fiz,
ele me envolveu com seus braços e me puxou para perto, me
abraçando. Ele tinha hálito de hortelã e seus lábios se chocaram
contra o meu em um beijo mais intenso do que eu esperava.
E apesar de tudo naquele homem, seu exterior áspero, sua
atitude retraída e sua barba que fazia cócegas no meu queixo, eu
gostei do beijo. Não parecia inocente ou performático para
convencer Kaylee. Fechei meus olhos por um momento e pareceu
que estávamos sozinhos.
Finalmente ele me soltou. Dei um passo para trás
instintivamente. Meu coração batia forte nas têmporas e eu respirei
fundo. Harrison estava parado, sorrindo com o canto da boca como
se tudo aquilo fosse uma piada.
É só porque estou excitada depois de beijar Archer e Jordy,
pensei. É isso.
“Aí está, fofinha.”, Archer disse. “Todos nos despedimos. Onde
está meu adesivo de boa sorte?”
“Por que vocês não se beijam?”, Kaylee perguntou de repente.
“Vocês são meus papais e não são estranhos, então vocês também
deveriam se beijar.”
Por um segundo, um olhar de medo passou pelo rosto de
Harrison e me fez dar uma risadinha. Então Jordy disse: “Não
precisamos nos despedir porque estamos indo juntos.”
“Ah.”, Kaylee inclinou a cabeça pensativa. “Faz sentido. Aqui
estão seus adesivos.”
O alívio se espalhou pelo corpo de Harrison com obviedade
enquanto ele aceitava um adesivo e o colava na sua camisa. Archer
e Jordy fizeram o mesmo. Então eles abraçaram Kaylee, se
despedindo, e partiram.
Lambi meus lábios. Eles ainda tinham um rastro de hortelã.
24

Trish

Pensei no beijo a manhã toda. Era muito confuso. Eu não


gostava de Harrison, tampouco me sentia atraída por ele. Sua barba
era muito longa e despenteada. Ele falava menos de vinte palavras
comigo quando estava em casa. E caminhava com um ar de
perigoso, como um lobo, sempre a espreita da presa.
Talvez seja por isso que eu goste, me perguntei. Ele é
perigoso.
Afastei o pensamento e voltei para a minha rotina. Jordy,
Archer e eu transávamos todas as noites em todas as posições
possíveis combinadas. Eu era dobrada na cama enquanto era
fodida e fazia um boquete ao mesmo tempo. Cavalgava um deles
enquanto o outro me acariciava por trás, nos revezando como da
primeira vez. Uma vez, depois de eu já ter gozado duas vezes, eles
me fizeram ficar de joelho e os masturbar até eles gozarem no meu
peito.
Era a coisa mais sexy que eu já tinha feito na vida. Eu transava
uma, talvez duas vezes por semana com meus ex-namorados. Mas
agora eu estava sendo revezada por dois homens toda santa noite e
longe de me cansar daquela situação. Eles me excitavam o mesmo
tanto desde o início.
Finalmente, nosso tempo em Istambul terminou. Os rapazes
saíram uma manhã para o último dia do contrato e voltariam para
casa, dormiríamos na cidade uma última noite e voaríamos para o
próximo destino—fosse onde fosse.
Archer insistiu em contratar um serviço de limpeza para cuidar
da casa depois que saíssemos, mas ainda assim eu passei o dia
organizando tudo. Reunindo todos os brinquedos de Kaylee,
desmontando as estruturas de K’nex que tínhamos construído e no
geral, eliminando todas as evidências de que tínhamos estado ali.
Archer me mandou a mensagem usual para me informar que
eles tinham chegado bem, que coincidiu com o cochilo da tarde de
Kaylee naquele dia.

Archer: Sãos e salvos.


Eu: Que bom! Tive medo de alguma coisa ruim acontecer bem
no último dia.
Archer: Ei, sem maus agouros! Ainda não terminamos.
Eu: Merda. Des-agourando! Como eu faço para des-agourar?
Archer: Acho que uma foto sexy é o suficiente.
Eu: E como isso cancela um mau agouro?
Archer: Não cancela. Mas me faz feliz.
Eu: E o que eu ganho em troca?

Houve uma longa pausa entre os textos. Me perguntei se


Archer estava esperando que eu enviasse alguma coisa. Mas então
ele respondeu—não com palavras, mas com uma foto.
Uma foto do seu pau longo e duro feito pedra, espetado pelo
zíper das suas calças cargo. Era largo o suficiente para fazer a mão
que o segurava parecer pequena.
Eu: AI
Eu: MEU DEUS
Archer: E isso que você ganha em troca. Agora é sua vez de
cumprir sua parte do trato.
Eu: Não me lembro de fazer nenhum trato.
Eu: E acredito que você tenha acabado de me enviar uma foto
não solicitada do seu pau. E como uma garota inocente de
Wilmington, Carolina do Norte, estou chocada e horrorizada com
este comportamento.
Archer: Vou informar o RH da Companhia Mathos.
Archer: Exceto pelo fato de que não temos um departamento
de Recursos Humanos. Porque somos um grupo de mercenários.
Archer: Estou dentro da cabine do helicóptero sem nada para
fazer pelas próximas seis horas. Você realmente vai me deixar na
vontade?

Prestei atenção para me certificar que o quarto de Kaylee


continuava silencioso, e então fui para o meu quarto e fechei a
porta. Tirei meus jeans e troquei a calcinha que estava usando por
uma de renda vermelha bem sexy. Puxei a calcinha para o lado,
coloquei os dedos sobre os meus pelos pubianos e tirei uma foto.

Eu: Pronto, mas só porque você é um bom garoto.


Eu: [foto]
Archer: Você mandou a foto? Deu erro aqui.
Eu: Sim
Archer: A mensagem diz erro no download
Archer: Ah, é provavelmente a merda do VPN!
Eu: Ah não. Que triste para você.
Eu: E era uma foto bem boa.
Archer: Você é, provavelmente, a mulher mais malvada que já
conheci. E eu morei em Glasgow.
Eu: E o que você vai fazer a respeito?
Archer: Hmm. Acho que Jordy e eu vamos precisar descontar
nossas frustrações sexuais em você esta noite.
Eu: Ah, é?
Archer: Sim.
Eu: Me diz o que você vai fazer.
Archer: Ah, eu acho que você vai precisar esperar para
descobrir.
Eu: Me dá uma dica?
Archer: Não.
Eu: AH, PARA COM ISSO.
Eu: Eu vou morrer aqui.
Archer: Ah não. Que triste para você.
Archer: Viu só? Copiei sua mensagem, exatamente. Não é
legal quando é você quem recebe, certo?
Eu: Acabei de me lembrar que vou ficar menstruada hoje. Bem
na hora que vocês chegarem em casa. Desculpa.
Archer: Preciso ir. Temos uma situação.
Eu: Sério? Está tudo bem?
Achei que ele estava me zoando, mas uma hora passou e não
obtive resposta. Duas horas. Procurei notícias sobre a Ucrânia na
internet, mas não encontrei nada relacionado a americanos.
Foi um alívio imenso quando ouvi o portão da garagem abrir e
o carro deles entrar mais tarde naquela noite. Corri para fora e vi
que os três estavam no carro. Kaylee me seguiu, tão ansiosa quanto
eu, mas por motivos diferentes.
“Você me deixou preocupada.”, eu disse quando Archer saiu do
carro. “Pensei que…”, parei quando Jordy desceu do banco de trás.
Ele estava mancando e fazia uma careta de dor.
“Tivemos uma situação.”, Archer repetiu.
“Você está bem?”, perguntei.
Jordy fez uma careta. “Não.”
“Estávamos ensinando aos caras como usar os novos mísseis
portáteis,”, Harrison disse com uma gargalhada, “um recruta,
chamado Vlad não estava segurando firme o suficiente. O recuo fez
o míssil voar para trás, na direção de Jordy, atingindo suas bo—”,
ele parou quando notou que Kaylee estava por perto. “Atingindo
seus feijões.”
“FEIJÕES!”, Kaylee gritou, abraçando as pernas de Jordy. O
homem soltou um grunhido pelo menos duas oitavas mais alto do
que o normal.
“Vamos dar espaço para o papai Jordy, fofinha.”, disse Archer,
afastando sua filha.
Entramos na casa e encontramos um saco de gelo para Jordy.
Ele o colocou dentro das calças, se sentando no sofá. “Sinto muito!”,
eu disse enquanto os outros estavam na cozinha. “Está doendo?”
“Eu sei que a dor do parto é ruim, mas acho que isso se
assemelha…”, Jordy fez uma careta. “Estou brincando. Não quero
ser insensível. A dor do parto é pior. Mas agora, isso parece pior.”
“Eu sei, tudo bem.”, eu disse, gentilmente afastando os cabelos
dos seus olhos. “Pobrezinho. Você precisa de alguma coisa?”
Ele olhou para mim desamparado. “Ainda tem sorvete?”
“Para tomar ou colocar dentro das calças?”, perguntei.
“Sim.”, ele respondeu.
“Você não vai ter espaço para a comida.”, Archer respondeu.
“Vamos jantar em um restaurante na cidade. Uma última refeição
antes de irmos embora. Presumindo que você consiga andar.”
“Posso tentar.”, Jordy ficou de pé e gemeu. “Não sinto tanta dor
assim desde Praga…”
Archer fez uma careta. “Não precisa tocar no assunto.”
Praga, pensei. O que aconteceu lá? E por que o assunto é tão
sensível?
“Estou triste por você estar machucado.”, eu disse a Jordy. “Eu
estava toda feliz com a diversão planejada para esta noite.”
Archer deu um sorrisinho. “Sua boca ainda funciona.”
“Ah, bem pensado.”, rocei meu queixo. “Me pergunto o que
você é capaz de fazer com a sua boca.”
Jordy fez uma careta de dor. “Qualquer coisa que seja
excitante vai doer para caralho. E usar minha boca em você vai
definitivamente me excitar.”
“Ahh, que pena.”, eu disse.
Jordy apontou para nós dois. “Isso não significa que vocês não
podem se divertir.”
Pisquei, incrédula. “Sério?”
“Claro. Se vocês estão ok com o fato regressivo de fazer sexo
a dois.”, ele respondeu. “Provavelmente vai ser entediante depois de
tudo o que nós três fizemos todas as noites.”
“Tem certeza?”, Archer perguntou.
“Sim. Por que não teria?”
“Presumi que você ficaria com ciúme.”, sugeri.
Jordy ajustou o saco de gelo dentro das calças e suspirou.
“Não sou do tipo possessivo. Além disso, não é como você dormir
com um idiota aleatório. É com Archer.”
“É muito gentil da sua parte.”, respondeu o inglês.
“Não me sinto ameaçado por você.”, Jordy continuou. “Eu sei
que sou melhor de cama, meu pau é maior, etc…”
“Você é um cuzão.”, Archer respondeu.
“Não sei se eu diria maior…”, me intrometi. “Talvez seja alguns
milímetros mais longo. Nada para se vangloriar.”
“Ainda conta!”, Jordy levantou o punho, então fez uma careta
porque o movimento o fez sentir dor de novo.
Dirigimos para o centro da cidade para um restaurante que
ficava no estreito de Dardanelos, cheio de barcos iluminados e
lampiões acesos depois do pôr do sol. Nossa mesa ficava no
segundo andar e nos dava uma vista da rua do lado de fora, cheia
de pedestres indo e voltando da feira. Kaylee estava muito
aventureira e decidiu que amava humus.
Enquanto comíamos, continuei olhando para Archer. Ele estava
sorrindo e falando, mas algo estava estranho. Como se ele
estivesse tentando não me olhar de volta. Será que ele estava se
sentindo estranho com o que Jordy disse?
Harrison arrastou sua cadeira e ficou de pé. “Vou dar uma
volta.”, ele disse se afastando.
Archer e Jordy se entreolharam.
“O que houve?”, perguntei.
“Nada.”, Archer disse suavemente. “Tudo perfeito.”
Jordy, que estava ao meu lado, se inclinou o suficiente para
sussurrar. “Algo assustou Harrison, ele foi verificar.”
Olhei para fora da janela. Será que estávamos em perigo?
Certamente não, ou eles não permaneceriam ali naquela mesa. Eles
estariam evacuando a área, da mesma forma que militares faziam
em filmes. Escaneei todos os rostos que caminhavam do lado de
fora. Eu tinha uma boa visão do segundo andar e tudo parecia
normal.
Havia uma movimentação atrás da barraca de pão e os pelos
da minha nuca se arrepiaram. De repente tive a distinta impressão
de que alguém estava me olhando. Nos olhando. Foi a mesma
sensação que eu tive na feira.
Harrison de repente apareceu do lado de fora. Ele desceu a
rua preguiçosamente, como se estivesse matando tempo. Olhando
os itens vendidos pelas barraquinhas. Ele desapareceu do nosso
campo de visão e voltou para a nossa mesa alguns minutos depois.
“E aí?”, Archer perguntou.
Harrison deu de ombros. “Alarme falso.”
Foi mesmo? Me perguntei. Ou só estou sendo paranoica?
Terminamos o jantar e fomos para casa. Depois que Kaylee
dormiu, os rapazes foram fazer as malas. Fui para o meu quarto
fazer o mesmo.
Algum tempo depois, alguém bateu na minha porta. Quando
abri, Archer estava parado no corredor.
“Entra.”, eu disse. Um calafrio de nervoso correu pela minha
espinha. Eu não tinha certeza do motivo. Archer e eu estávamos
dormindo juntos já fazia mais de uma semana. Não era mais
novidade.
Nós dois sozinhos é novidade. É a primeira vez que Jordy não
está aqui.
Archer se encostou na porta e cruzou os braços. “Então,
minhas mensagens te deixaram toda animadinha?”
Assenti. “Especialmente a foto. Não acredito que você fez
isso.”
Ele arrastou os cabelos loiros para trás e sorriu. “Devo admitir:
nunca tinha feito isso antes. Espero que você tenha gostado.”
“Eu gostei! Só estou triste porque minha foto não chegou.”
“Eu também.”, ele disse me encarando. “Talvez possamos
consertar este infortúnio agora.”
Mordi o lábio e me sentei na cama. me lembrei do que Archer
tinha escrito mais cedo, sobre descontar sua frustração sexual em
mim. Aquele pensamento me fez tremer de ansiedade. Eu amava a
forma como eles me usavam, e estava ansiosa para saber como
Archer se comportaria sozinho.
Me tome. Eu disse com os olhos. Me use para o que quiser.
Archer manteve a distância por um tempo. Lentamente, ele
desabotoou sua camisa e a tirou. Ele removeu seu cinto e o deixou
cair no chão, mas antes de tirar as calças, ele deu um passo na
minha direção e eu segurei a respiração. Seus dedos entrelaçaram
meu cabelo e ele virou minha cabeça na direção dele.
Seu beijo era suave e molhado. Parecia a primeira vez, nós
dois tentando conectar nossos lábios. Ele tirou minha blusa por cima
da cabeça e se abaixou na direção dos meus seios. Suspirei quando
ele envolveu meu mamilo com os dentes, mordiscando suavemente,
com pressão o suficiente para me deixar ardendo de prazer, mas
sem sentir dor.
Então ele me beijou de novo, com mais paixão enquanto
tirávamos nossas calças. Ele inclinou seu corpo sobre o meu e o
beijo se intensificou, sua língua forçava a entrada na minha boca.
Me conquistando e me reivindicando. Ali no quarto, só nós dois, eu
me sentia reivindicada por ele. Senti que era dele e ele era meu, e
era só o que importava.
Ele roçou seu pau contra minha entrada, para cima e para
baixo antes de finalmente escorregar para dentro. Eu estava
ensopada naquela altura e aceitei-o facilmente. Enrolei minhas
pernas ao redor do seu corpo e o puxei para perto, centímetro por
centímetro, enquanto nos beijávamos lentamente, porque não
tínhamos pressa naquela noite. Jordy não iria tomar o lugar de
Archer e me comer. Éramos só nós dois.
E quando ele me preencheu completamente, enterrando cada
centímetro duro dentro de mim, ele suspirou com contentamento e
me envolveu com seus braços. Era como se ele quisesse que seu
corpo todo se encostasse no meu—pernas e braços e peito. Ele
soltou seu peso sobre mim por um momento com uma pressão
maravilhosamente masculina que me fez me sentir segura.
Ele ficou dentro de mim por um tempo, sem se mover,
saboreando o momento. E quando ele finalmente começou a me
foder, foi cauteloso e lento. Seu quadril girava o mínimo possível.
Me foder não, pensei quando sua língua rolava na minha. Aquilo era
totalmente diferente do que tínhamos feito até então. Estávamos
fazendo amor.
Apesar da lentidão, o ato era intenso. Havia desespero sob a
superfície, um desejo crescente que pingava da sua boca na minha.
E aquilo ficava mais forte a cada segundo, a cada gota de suor entre
nossos corpos.
Fizemos amor daquele jeito por segundos, ou minutos, ou
horas… era difícil precisar a duração. Então Archer se inclinou para
trás, se levantando e me puxando com ele, se ajustando na cama.
Ele se sentou comigo no colo, minhas pernas ainda enroladas ao
redor de ele. Eu o beijei ainda mais apaixonadamente enquanto me
roçava nele e ele movia seu quadril sincronizado com os meus
rodopios. Então ele afastou seus lábios do meu e segurou minha
nuca, encarando meus olhos. Seus olhos pareciam mais azuis do
que o normal.
Com os braços enrolados e nos encarando ardentemente, nós
dois fizemos amor pela noite afora.
25

Trish

Eu ainda estava acordada na cama pensando no que tinha


acontecido por um longo tempo depois de nós dois atingirmos o
clímax e Archer ter me dado um beijo de despedida e ido para o seu
quarto.
Antes daquela noite, tudo o que havíamos feito juntos era sexo.
Jordy e eu tínhamos tido algumas noites de paixão sozinhos antes
de começarmos a incluir Archer nas aventuras sensuais, mas até
então, era tudo muito físico. Sessões de sexo a três rústicas, suadas
e contorcidas que me faziam me sentir uma safada todos os dias.
Nós três estávamos usando nossos corpos para aliviar a tensão.
Confortando uns aos outros depois do stress de um dia de missão.
Mas naquela noite? Foi mais do que apenas físico. Quando
Archer me agarrou com força e pressionou sua testa na minha
enquanto gozávamos juntos, eu senti muito mais do que apenas
alívio sexual. Me senti próxima dele. Intimidade de uma forma que ia
além do sexo irracional. Naquela noite, eu senti que Archer tinha me
dado uma parte da sua alma. Pode soar estúpido, mas não consigo
pensar em uma descrição melhor.
E aquela constatação me fez me sentir culpada em relação a
Jordy. Como ficaríamos agora? Nós dois gostávamos um dos outros
quando começamos nosso rala e rola em Oslo. A inclusão de Archer
foi apenas a realização de uma fantasia sexual. O que ele diria se
eu dissesse que passei a nutrir sentimentos por Archer?
Eu tenho sentimentos por Archer. Ouvir aquele pensamento na
minha cabeça me fez ter ainda mais certeza. O que, é claro, me
deixava ainda mais confusa do que antes.
Eu mal dormi naquela noite. O que foi péssimo, porque meu
alarme tocou cedo na manhã seguinte por causa do nosso voo. Bebi
duas xícaras de café turco extremamente forte e passei a viagem
até o aeroporto praticamente balançando para cima e para baixo no
meu assento.
“Hora da grande revelação!”, disse Archer quando chegamos
no aeroporto. Ele tirou um monte de passagens de avião do bolso e
as distribuiu com um toque dramático. E ele sorriu para mim por um
segundo a mais do que o normal quando minha mão tocou a dele.
Olhei para o código do aeroporto na passagem. “GYD.
Aeroporto Internacional Haydar Aliyev?”
“Bacu.”, disse Jordi, ele não precisava mais da compressa de
gelo na virilha, mas ainda andava devagar de mãos dadas com
Kaylee pelo aeroporto. “Capital do Azerbaijão.”
“Um buraco aquele país.”, Harrison resmungou.
“Explicamos tudo quando chegarmos.”, disse Archer me
olhando prolongadamente.
Assim que embarcamos, paguei pelo Wi-Fi a bordo para
pesquisar sobre o país. O Azerbaijão é um país da antiga república
soviética, situado a leste da Turquia e que faz fronteira ao norte com
o Irã. Um país rico em petróleo cuja capital, Bacu, fica às margens
do Mar Cáspio.
Sacudi a cabeça maravilhada. O Mar Báltico, o Mar Negro e
agora o Mar Cáspio. Eu tinha acabado três mares que eu tinha
aprendido sobre nas aulas de história. Só faltou ser em ordem
alfabética, pensei, dando uma risadinha. Agora preciso mudar de
categoria, quem sabe… conhecer o Rio Danúbio ou o Golfo Pérsico.
O voo durou pouco menos de três horas, mas pareceu mais
sinistro que os anteriores. Continuamos indo para o leste, que era
ainda mais longe de casa do que antes. A Noruega e a Turquia
eram países sobre os quais eu sabia alguma coisa, mas o
Azerbaijão era totalmente novo para mim. Era mesmo um buraco
como Harrison tinha descrito? Como eles tratariam as mulheres?
Olhei pela janela e fiquei pensando como seria nossa última etapa
antes de voltar para casa.
Mas quando aterrissamos e dirigimos para a cidade de Bacu,
minhas preocupações desapareceram. Podíamos até estar na Ásia
central, mas a cidade parecia Oslo ou Istambul. Os prédios eram
antigos e feitos de ardósia cinza. O centro da cidade era moderno,
movimentado e cheio de arranha-céus. Archer apontou para três
prédios revestidos de vidro azul que eram chamados de Flame
Towers.
Ficaríamos em um hotel no centro, a um quarteirão da água. O
lobby era antigo mais ricamente construído, com chão de mármore e
teto abobadado e pintado. O carregador nos guiou até o último
andar, onde nossa suíte ficava. Me engasguei quando entrei: era um
cômodo enorme, com janelas do chão até o teto que nos dava uma
vista extensa do Mar Cáspio. Só essa sala de estar é maior que
minha casa inteira em Wilmington.
Harrison se aproximou imediatamente de uma mala que estava
entre o sofá e a parede. Ela era primorosamente feita de couro
italiano marrom. Eu já ia perguntar se a mala era de alguém que
tinha se hospedado antes de nós, mas ele abriu o zíper e enfiou a
mão dentro, tirando uma pistola de dentro. Ele abriu a arma
rapidamente e verificou tudo com movimentos peritos.
“Está tudo aqui.”, ele disse. “Mas nada de alto calibre.”
“Porque essas serão usadas apenas em último caso.”, Archer
explicou. “Se você precisar usá-las, significa que nossa missão
falhou de verdade.”
Harrison grunhiu, fechou a mala e a carregou para outro
cômodo.
Havia uma mesa de xadrez no corredor, cujas peças eram
feitas de vidro grosso. Peguei o Rei, senti o peso e impulsivamente
o movi duas casas para a frente. Fazia muito tempo desde a última
vez que eu tinha jogado. Pensei em ensinar Kaylee a jogar, se ela
não soubesse.
“Não temos cozinha.”, Jordy disse. Ele estava andando pela
suíte, agitando um dispositivo eletrônico perto das paredes.
Verificando a existência de escutas, eu presumi. “Mas temos uma
geladeirinha e alguém deixou compras na mesa perto do bar.”
Archer soltou sua mala no chão e acenou. “Pedi ao concierge
que nos comprasse itens básicos. Pão, manteiga, manteiga de
amendoim, queijo, leite. Para nossos lanches. As outras refeições
serão fornecidas pelo restaurante do hotel.”
“Eu amo serviço de quarto!”, Kaylee gritou.
“Você já pediu serviço de quarto?”, perguntei.
“Ficamos em um hotel no Vale uma vez. Eu pedi sorvete no
quarto!”
“Raleigh, não Vale.”, Archer corrigiu, e se virou para mim. “Toda
vez que você pedir comida, peça a eles que deixem do lado de fora
da porta. Nunca os deixe entrar. Se você precisar explicar, diga que
ficou paranoica com a pandemia de COVID.”
“Entendido.”
Harrison voltou para pegar sua mochila, mas não a levou com
ele, apenas pegou alguma coisa dentro e voltou para o banheiro.
Ele deixou a porta aberta e ouvi a torneira sendo aberta.
“Fofinha? Por que você não vai para o seu quarto desfazer a
mala enquanto os adultos conversam?”, Archer disse.
Kaylee não precisava ser persuadida, e simplesmente correu
da sala. Archer esperou a porta fechar, pegou um arquivo dentro da
sua pasta e o colocou sobre a mesa de centro. Ele abriu e na
primeira página vimos a foto em preto e branco de um homem
careca com uma barba fina.
“Este é Aldi Kadyrovic. Ele é o líder não oficial da República
Chechênia. Enquanto o chefe oficial da Chechênia se senta atrás de
uma mesa assinando a papelada, Kadyrovic sai e faz todo o
trabalho sujo”.
“Animal de merda.”, Harrison rosnou do banheiro, de onde
ainda se ouvia a água correndo. O que ele estava fazendo?
Lavando as mãos?
“Kadyrovic reporta diretamente a Vladimir Putin. Ele envia
gangues pela cidade, forçando homens a se alistarem para a guerra
contra a Ucrânia. Quando os homens se recusam, ele os tortura.
Suas famílias também. Às vezes, mesmo depois de eles
concordarem, também são torturados. Ele sente prazer nisso, um
sádico psicopata. Ele tem um apelido em Moscou, eles o chamam
Cão Raivoso do Putin. Kadyrovic é, sem dúvida, um homem mau.”
Jordy concordou. “Eu li o relatório todo. Não precisa me
convencer.”
“Vamos ficar aqui por uma semana.”, Archer continuou,
principalmente para o meu benefício. “Vai demorar alguns dias até
estabelecermos e solidificarmos nossos disfarces. Nossos
informantes dizem que Kadyrovic vai visitar Bacu esta semana.
Quando ele fizer isso, vamos agir e pegá-lo.”
“Isso é muito mais perigoso do que as duas últimas missões.”,
eu disse. “Vocês não vão trabalhar como seguranças ou treinar
nativos a usarem armas. Vocês vão tipo… sequestrar um cara!”
Archer e Jordy olharam um para o outro.
“O que?” Perguntei.
“Não estamos aqui para sequestrá-lo.”, Jordy disse lentamente.
“Então o que vocês vão fazer? Se sentar com ele e negociar?
Acho difícil acreditar que vocês vão negociar com um cara que é
chamado de Cão Raivoso.”
Os dois me encararam impávidos. Eu não entendi o motivo.
Até que entendi.
“Não…”
“Só estamos detalhando a missão por cortesia.”, disse Archer.
“Aceitamos o trabalho e estamos sendo lindamente pagos por isso.”
“Vocês vão matá-lo!”, exclamei. “Vocês vão assassinar um
homem!”
“Um homem mau.”, disse Jordy. “Esse cara é um lunático,
Trish.”
“Ainda assim! E a ética…”
Archer deu um tapinha na minha perna. “Você não precisa se
preocupar com a ética porque não faz parte disso.”
Comecei a sentir o cômodo ficar quente. “Não diretamente!
Mas estou cuidando da filha de vocês, permitindo que vocês façam
isso. Eu sou tipo uma cúmplice ou algo do tipo!”
“Queríamos te contar para você saber o perigo que
corremos…”, Jordy explicou. “Para você entender se chegarmos em
casa com o humor azedo ou se estivermos muito tensos. Ajudaria
se pretendêssemos estar em um contrato de segurança de novo?”,
ele sorriu para mim. “Podemos começar de novo e criar uma história
diferente.”
Ignorei a piada dele. “Quem ordenou o assassinato? Os
Estados Unidos? Outro país?”
“A OTAN provavelmente.”, Harrison respondeu do banheiro.
Archer sacudiu a cabeça. “Não te contaríamos nem se
quiséssemos. É um cliente confidencial. Seu palpite é tão bom
quanto o meu. Mas, em no fim das contas, não importa.”
“É claro que importa!”, olhei para eles desesperada. Só podia
ser uma pegadinha. Não podia ser real. “Vocês estão falando sobre
matar alguém! O contexto é a única coisa que diferencia o que
vocês vão fazer de, sei lá… crime de guerra!”
“Você quer contexto?”, Harrison veio do banheiro e eu precisei
olhar duas vezes. Ainda havia creme de barbear no seu rosto, mas
ele tinha tirado a barba toda, revelando um maxilar esculpido e um
queixo forte.
Uau, pensei. Ele é… bonito. De verdade.
Ele apontou a lâmina de barbear na minha direção. “O contexto
é que esse cara é um babaca do caralho. A putinha do Putin. Nós
vamos acabar com ele. E vamos fazer isso com extrema habilidade.
Você tem algum problema com isso? Pegue um avião e volte para
Wilmington então.”
Harrison voltou para o banheiro sacudindo a cabeça irritado.
“Nosso amigo foi um pouco duro, mas ele está correto.”, Archer
disse suavemente. “Essa é a missão. E vai acontecer. E se você
não quer fazer parte disso, podemos enviar você e Kaylee de volta
para casa.”
“Por que vocês não o prendem?”, barganhei. “Se o cara é tão
mau, entreguem-no às Nações Unidas. Ou para o Tribunal de Haia.
Ou qualquer outro tribunal. Façam alguma coisa.”
Jordy colocou uma mão no meu joelho. “Trish…”
“Desculpa, não podíamos falar sobre a missão antes.”, Archer
disse calmamente. “Mas é assim que tem que ser. Você está dentro
ou não?”
Eles me olharam com dureza. Para eles aquilo era normal.
Mais perigoso do que a maioria das missões, mas ainda assim uma
parte completamente normal do trabalho deles. E não importava o
que eu dissesse, nenhum deles seria convencido do contrário.
“Certo.”, me levantei, carreguei minha mala para o quarto de
Kaylee e fechei a porta.
26

Harrison

Ouvi a babá correr para o outro cômodo. Se ela queria fazer


uma ceninha, por mim, tudo bem. Eu não dava a mínima.
Limpei o resto de creme de barbear com as costas da mão e
me olhei no espelho. Eu parecia mais novo. Eu me sentia mais
novo, o que era estúpido porque eu só tinha feito a barba, nada
mais tinha mudado em mim nos últimos cinco minutos. Se algo tão
simples poderia mudar tanto minha atitude, era um mal sinal.
Odiei.
Eu não era exatamente apegado a minha barba. Ela coçava e
esquentava naquela época do ano. Mas eu me sentia um estudante
do Ensino Médio. Um desses riquinhos que dirigiam a BMW dos
pais para a escola e tinham tudo de mão beijada. Rosnei para mim
mesmo.
É só para esse trabalho. Depois você deixa crescer de novo.
Quando voltei para a sala de estar, Jordy e Archer estavam
discutindo suavemente. Seu comportamento não mostrava, mas eu
conhecia aqueles dois. Fazia oito anos que nos conhecíamos—até
mais tempo que eu conhecia Jordi. Nós tínhamos a porra de uma
filha juntos, por mais louco que parecesse. Então quando eles
brigavam, eu notava.
Não consegui ouvir exatamente o que eles estavam falando,
mas deduzi. “Foi muita estupidez contar a ela. Quem de vocês
concorda comigo está certo.”
Jordy acenou vitoriosamente. Archer se virou para mim,
irritado: “Estou feliz por ter contado a ela?”
“Mesmo depois dela surtar?”, Jordy respondeu.
“Especialmente por isso.”, Archer disse incisivamente. “Se for
para ela ter um problema com o que fazemos, prefiro descobrir
agora. enquanto ainda podemos mandar as duas para casa.”
Jordy cerrou os dentes. “Eu não quero mandar Trish para casa.
Eu quero que ela fique. E eu esperava o mesmo de você, mas
aparentemente estava errado.”
“É claro que eu quero que Trish fique,”, Archer disse, mordendo
todas as palavras, “mas esconder a verdade dela para fazê-la ficar
seria um engano. Nós a informamos sobre as duas outras missões.
Se de repente não disséssemos nada, levantaríamos suspeitas e
ela presumiria o pior.”
“Kaylee.”
Os dois olharam para mim. “Ahn?”, Jordy perguntou.
“Kaylee,” repeti, “vocês querem que Kaylee fique conosco.
Tenho certeza de que foi isso o que vocês quiseram dizer.”
“Sim, é claro.”, Archer respondeu. “Foi claramente o que eu
quis dizer.”
Uma pinoia. Pensei.
“É tarde demais.”, Archer continuou. “A sorte está lançada, por
assim dizer. Por que não discutimos nossas preparações?”
“Já era hora.”, murmurei.
“Começando pelo começo: que bom que não precisei te
lembrar de fazer a barba para a missão.”
“Não tem porquê falarmos disso.”, respondi.
Jordy se inclinou e deu um tapinha na minha bochecha. “Macio
com uma bundinha de bebê. Você parece um novo homem.”
Segurei seu punho antes dele afastar a mão do meu rosto. “Se
você me encostar de novo, vai ter que usar a mão esquerda para
comer pelo resto dessa missão.”
“Tudo relacionado ao helicóptero esta preparado,”, Archer nos
interrompeu como um pai desapontado, e esperou que eu soltasse a
mão de Jordy para continuar, “Jordy e eu vamos passar todos os
dias guiando turistas pela cidade. Kadyrovic já entrou em contato
querendo um passeio guiado particular, com foco na visita aérea da
pista de Fórmula 1. Ele ainda não escolheu a data, suspeito que ele
vá chegar de última hora e esperar que deixemos tudo o que
estamos fazendo para acomodar suas necessidades. E obviamente
faremos isso.”
“Por que você tem tanta certeza de que ele vai escolher nossa
empresa?”, perguntei. “E se ele mudar de ideia?”
“Porque prometemos um meet and greet com Daniel Ricciardo,
e Kadyrovic é um grande fã de corridas de carro.”
Jordy se sentou mais reto. “Ricardo vai trabalhar conosco na
missão? O piloto?”
“Não. Daniel Ricciardo, o famoso piloto de Formula 1, não vai
trabalhar conosco na missão.”, Archer disse secamente. “Essa é
apenas a isca que usaremos para atrair Kadyrovic.”
“Ahh.”, Jordy murchou de volta contra o encosto do sofá.”
“Ok.”, eu disse lentamente. “E o que vai acontecer quando
essa merda russa aparecer e seu namoradinho famoso não estiver
conosco? É nesse momento que acabaremos com ele?”
Era o plano perfeito, depois que pensei: guiar Kadyrovic até
uma sala privada onde Ricciardo supostamente espera por ele, dizer
que seus seguranças—presumo que ele tenha uma equipe de
segurança—não podem entrar, estrangular o vagabundo com a
corda do piano e fugir antes que seus guarda-costas se deem conta.
“Não é nesse momento que acabaremos com ele.”, Archer
limpou a garganta. “As especificidades da nossa missão mudaram.”
Fiquei surpreso. “Mudaram como?”
“Os parâmetros da missão nunca mudam depois que o
contrato é definido.”, disse Jordy.
“Isso não é ortodoxo e eu levei as preocupações até o
administrador do contrato no QG da Mathos em Frankfurt.”, Archer
respondeu. “Aparentemente, eles abriram uma exceção especial
neste caso. A morte de Kadyrovic tem que parecer um acidente.”
“Merda.”, xinguei baixinho.
“Por quê? Quem se importa?”, perguntou Jordi. “Putin anda por
aí dando chá com polônio para todos os desertores russos sem
nenhuma repercussão, mas nós precisamos ser cuidadosos com o
nosso trabalho?”
“Nada disso é da nossa alçada. É assim que foi decidido. E
estamos sendo extremamente bem pagos para este contrato.
Vamos terminar essa discussão, por favor.”
“Um acidente.”, repeti a palavra. Ela tinha um gosto amargo. “O
que, vamos soltar um piano de cima de um prédio enquanto ele
passa na calçada? Ou amarrar seus cadarços para ele tropeçar e
cair das escadas?”
“As mudanças no plano são simples.”, Archer respondeu. Ele
estava sorrindo com o canto da boca, como se estivesse orgulhoso
de si mesmo. “Bem simples, na verdade. Querem tentar adivinhar?”
“Não estou no clima de joguinhos.”, eu disse.
“Te dou uma dica. Envolve um negócio que estamos
temporariamente requisitando para a missão."
“Eu disse que não estou no clima de joguinhos.”
“Caras!”, Jordy nos interrompeu de repente, mostrando a tela
do seu celular: “Daniel Ricciardo está em Bacu agora. Quais são as
chances?”
“É claro que ele está em Bacu,”, Archer disse secamente. “É
por isso que nosso plano vai funcionar bem.”
Jordy abaixou o celular. “Ah!”
“Conte-nos logo sobre a merda do plano!”, eu disse.
Archer suspirou pesadamente. “Vou levá-lo para um passeio
pela cidade. E então derrubarei o helicóptero.”
Jordy se engasgou. “Mas… você vai morrer.”
“Eu não vou morrer, porque vou pular antes do helicóptero
cair.”, ele respondeu. “De paraquedas, no caso de não ter ficado
claro.”
Resmunguei. “Genial.”
“Mas e eu?”, perguntou Jordy. “Nunca pulei de nada antes.
Nada no ar, pelo menos. Pulei do carro de um amigo em movimento
uma vez porque fui desafiado.”
“É claro que pulou.”, eu disse. Jordy sorriu para mim.
“Há uma cordilheira no oeste da cidade. É para onde voaremos
antes de iniciar a queda. Isso vai impedir qualquer pessoa de me ver
saltar de paraquedas no último minuto.”, Archer se virou para Jordy.
“Paraquedas é um dispositivo que permite que você caia sem
morrer.”
“Eu sei o que um paraquedas é.”
“Você tem ficado cada vez mais ignorante, queria me
certificar.”
“Não sou ignorante! Peguei o terrorista em Oslo, lembra?”
“E desde aquele dia?”
Jordy ficou em silêncio.
“Você tem estado distraído.”, Archer dissertou. “No passado,
você nunca teria deixado um recruta segurando um míssil portátil
ricochetear em você daquele jeito. E o mesmo vale para a descarga
acidental da arma dois dias antes. Você tem sorte de ninguém ter se
ferido.”
“É você quem fica trocando mensagens com Trish todos os
dias.”, ele respondeu.
Me recostei na minha cadeira. Isso está ficando bom.
“Ninguém está falando de Trish,”, Archer respondeu, “só falei
que você tem se distraído facilmente ultimamente. E isso é um fato.”
“Que tal você se preocupar com você mesmo?”, Jordy
murmurou.
“Então você vai direcionar o helicóptero para a cordilheira e
saltar no último minuto?”, eu disse. “Só há um problema com o seu
plano.”
Archer me olhou entediado. “E qual é, por obséquio?”
“Quedas de helicópteros.”, mexi a mão, imitando o ato
destrutivo. “Os bombeiros chegam. Ou qualquer outro órgão
responsável aqui no Azerbaijão. E eles encontram Kadyrovic, seus
guarda-costas… e ninguém mais.”
“É mesmo!”, Jordy exclamou. “Eles vão se perguntar onde está
o corpo do piloto. E isso vai levantar suspeitas e todos saberão que
não foi um acidente.”
“Este é um cenário que eu previ.”, Archer disse simplesmente.
Jordy e eu nos entreolhamos.
“Conte-nos mais.”, eu disse.
“Vai haver um quarto corpo, presumivelmente o do piloto, no
helicóptero.”, o inglês loiro respondeu.
Dei uma risadinha. “Caramba. Sangue frio. Gelado.”
Jordy nos olhou. “Não entendi.”
“Um corpo.”, eu disse. “Não o de Archer.”
“O que? É claro que não.”, Archer respondeu. “Pelo amor de
Deus. Trish está derretendo seu cérebro. Eu comprei um corpo no
necrotério de Bacu. Nenhuma pergunta foi feta. O corpo vai ficar no
compartimento traseiro do helicóptero durante o voo.”
“E como eu suporia isso sem nenhum contexto?”, Jordy
argumentou.
“Suporia. Uau. Palavra difícil.”, eu disse.
Jordy me olhou com censura e voltou sua atenção para Archer.
“Você disse que não sabe o dia exato em que Kadyrovic vai fazer o
passeio pela cidade.”
Archer assentiu. “Correto.”
“O que acontece quando ele aparecer?”, Jordy perguntou. “Nós
o faremos sentar-se e esperar enquanto carregamos um corpo para
o heliporto? Isso não é um pouco suspeito?”
“Você está certíssimo. Seria suspeito. E é por isso que o corpo
já estará no helicóptero a partir de amanhã. E para responder sua
próxima questão, ele vai fresco, por causa do gelo seco.”
Jordy se arrepiou. “Odeio corpos.”
“Que triste para você.”, Archer disse. “Porque vai ser sua
responsabilidade carregar o manequim antes e depois da missão.”
O queixo de Jordy caiu. “O que?”
Soltei uma gargalhada. “Fins de semana típicos para Jordy.”
Ele me censurou de novo. “Por que eu fico encarregado dos
corpos? Por que você não faz isso?”
“Porque vou pilotar o helicóptero e conduzir os passeios,”,
Archer respondeu, “fazer o trabalho de verdade.”
“CARREGAR UM CORPO POR AÍ ME PARECE UM
TRABALHO DE VERDADE.”, Jordy gritou.
A porta de um dos quartos se abriu e Trish colocou a cabeça
para fora. “Vocês se importam em manter a voz baixa? A não ser
que vocês queiram explicar para a filha de vocês de oito anos o
motivo de você estarem discutindo corpos.”
“Desculpa.”, disse Jordy, levantando um polegar para ela. Trish
revirou os olhos, me olhou e então fechou a porta novamente.
O que foi esse olhar? Me perguntei. Ela nunca me olhou assim
antes.
Algo se mexeu dentro de mim. Fiz uma careta. Trish não era
feia. Ok, estou subavaliando a situação. Ela era gostosa para
caralho. E depois de passar as últimas três semanas pensando na
diversão sexual da qual ela estava desfrutando com Jordy—e
depois Archer—fiquei pensando no quão boa ela seria.
Ela é a babá de Kaylee, tentei me lembrar. Diferente desses
dois, para mim, onde se ganha o pão. Não se come a carne.
“Corpos, quedas de helicópteros, etc, etc.”, eu disse para me
distrair do volume que crescia na minha cueca. “Só há uma coisa
que você ainda não me contou e que não estava contida nas
instruções. Qual é o meu papel nisso tudo?”
“Você pode cuidar do corpo.”, disse Jordy.
“Seu trabalho,”, Archer disse, “é manter o olho em Kadyrovic
logo que ele chegar na cidade. Grude nele. Avise-nos quando ele
estiver indo para o heliporto, para termos alguma vantagem. E
quando tudo estiver feito e ele estiver queimando no inferno russo,
você vai me ajudar a evacuar a área. Tomei a liberdade de alugar
um carro quatro por quatro para ajudar no ato.”
“Anotado.”, eu disse. “O que eu faço até Kadyrovic chegar em
Bacu?”
“Qualquer coisa que você quiser.”, ele respondeu.
Pisquei. “Então vou ficar com a bunda na cadeira até lá?”
“Eu troco com você.”, Jordy insistiu.
Foi minha vez de olhá-lo com censura.
Archer revirou os olhos para nós dois. “Você vai receber
informações de hora em hora dos nossos informantes, atualizando
os movimentos de Kadyrovic na Chechênia. Preciso que você esteja
pronto no exato momento em que ele chegar.”
“Que trabalho de corno.”, eu disse.
“Bombeiros fazem isso o dia todo,”, disse Jordy, sorrindo, “você
está dizendo que o trabalho dos bombeiros é de corno?”
“Sim. Bombeiros são grandes cornos comparados ao que nós
fazemos.”
Me virei para ele. “Incêndios não atiram de volta.”
“Estes são as diretrizes para a missão e o plano.”, Archer disse
em voz alta. Ele olhou para mim e para Jordy, transmitindo com os
olhos a importância das suas próximas palavras. “É isso,
cavalheiros. O último contrato deste trabalho. Se tudo der certo aqui
em Bacu, podemos relaxar no próximo ano e decidir o que
queremos fazer no futuro. Este contrato vai determinar o resto das
nossas carreiras e das nossas vidas. Se vocês tem alguma
pergunta, eu gentilmente solicito que desapareçam da minha vista.
E depois que vocês tiverem desaparecido de verdade, venham e me
perguntem o que quer que seja. Jordy, você e eu partimos amanhã
as sete, então esteja pronto. E coloque um sorriso nessa cara. Você
é o recepcionista da nossa agência de turismo.”
Ele sorriu rapidamente. “Não me importo. Eu gosto de
pessoas.”, seu sorriso desapareceu. “Desde que essas pessoas não
sejam psicopatas russos.”
Pedimos serviço de quarto para o jantar. Meu bife estava
passado demais, mas eu comi metodicamente e engoli cada
pedaço. Comida naquela altura era combustível. Kaylee pediu bufê
de sorvete de sobremesa e deu gritinhos de felicidade quando
dissemos que ela poderia colocar quanta calda de chocolate ela
quisesse no seu sundae.
Eu mataria por essa garota, pensei enquanto a observava.
Outra pessoa ou a mim mesmo. Eu faria qualquer coisa sem pensar
duas vezes.
Na manhã seguinte, Jordy e Archer acordaram cedo e foram
para o heliporto, de onde sairiam os passeios guiados pela cidade.
Também acordei porque não sabia mais o que fazer. Trish os beijou,
se despedindo, e eu não consegui desviar o olhar. Os três estavam
construindo algo juntos, contrariando a tudo. Eu não sabia o que
era, nem a profundidade, mas eu sabia que era algo.
E aquilo me fazia me sentir excluído, como se eu não fosse um
deles.
E eu não podia beijar Trish porque não estava indo trabalhar.
Aquilo me fez me sentir ainda mais excluído. Era um instinto
estúpido e eu me odiava por me sentir daquele jeito. Mas tentar
evitar, só fazia a sensação aumentar.
Ela é uma gostosa, eu disse a mim mesmo. Nada além disso.
Qualquer cara gostaria de se divertir com ela.
Mas, assim que os caras saíram e nós ficamos relaxando no
apartamento o dia todo, me perguntei se havia mais do que isso.
27

Harrison

Passei a maior parte do dia sentado na cobertura do hotel.


Atualizei meu email mais ou menos dez vezes por minuto. Tomei
banho, café da manhã e outro banho, porque não sabia o que mais
fazer.
Eu não gostava de não ter o que fazer. Me fazia me sentir que
não estava no controle. Da missão ou da minha vida, como diria um
psicólogo. Mas principalmente, eu estava entediado. E eu odeio
tédio.
Trish e Kaylee estavam sentadas à mesa da sala de jantar,
jogando Minecraft. Eu sabia que era o jogo favorito da minha filha e
eu já a tinha visto jogar antes, mas sem prestar atenção. Naquele
dia, já que eu não tinha nada para fazer, puxei uma cadeira e a
assisti jogar um pouco.
“Essa é uma cesta especial,”, ela explicou, “para guardarmos
nosso ouro. E nossos diamantes.”
“Diamante é especial?”, perguntei.
“Papai! É claro que é. Diamante. O mais raro do jogo.”
“Ah, uau.”, respondi.
Trish tirou os fones de ouvido e olhou para mim. “Qual é seu
trabalho no… contrato?”, ela perguntou. Provavelmente ela tinha
pensado em dizer assassinato, mas parou a tempo.
“Sentar e esperar.”, eu disse por cima da cabeça de Kaylee.
“Não sei quando vou ter o que fazer.”
“Estou surpresa por você não estar explorando o bar.”, ela
disse. “Tem vários uísques bons lá. Um Yamazaki de cinquenta
anos. Não sei muito sobre uísque, mas pesquisei e custa tipo mil
dólares a dose!”
“Legal.”
“Archer disse que é tudo incluído, então você pode tomar, se
quiser.”
Virei a cabeça na direção da mulher. “E por que eu quereria?”
Ela piscou rapidamente. “Não sei. Você parece gostar de
beber. espera, não foi o que eu quis dizer. Você parece apreciar
uma boa garrafa de uísque. Isso soa melhor, não estou de
chamando de alcoólatra.”, ela sorriu meio desajeitada.
Qual é a dessa garota?
“Não sei quando eles vão precisar de mim, então preciso estar
pronto para sair a qualquer momento.”, respondi. “Sem álcool para
mim.”
“Ah, que pena.”
“Uísque é nojento.”, Kaylee se intrometeu.
“Como você sabe o gosto que uísque tem?”, Trish perguntou.
“Porque o papai me deixou experimentar. Foi horrível!”
Trish me encarou com os olhos arregalados. “Você deu uísque
para uma menina de oito anos?”
“Acho que ela tinha seis na época.”, Respondi.
“Isso não te ajuda em nada.”
“Ela experimentou. Um golinho minúsculo. E odiou. Agora ela
não se interessa por álcool de nenhum tipo.”
Trish me encarou. “Isso é na verdade bem perspicaz da sua
parte.”
“As vezes eu sou bom nesse negócio de ser pai.”
Trish assentiu e colocou os fones de ouvido de volta. Mas eu
notei que ela só estava encarando a tela do laptop, sem jogar.
Depois de alguns minutos, ela tirou os fones de novo e olhou para
mim.
“Gosto de você sem barba.”
O comentário me pegou totalmente desprevenido. Só consegui
resmungar.
“Sua barba não te ajuda em nada.”, ela disse. “Ela cobre seu
maxilar quadrado. E parece suja. Você fica muito melhor assim, não
é Kaylee?”
“Sim!”, ela disse. “A barba do papai faz cocegas.”
“Gosto da minha barba.”, respondi curtamente. Por que ela
tinha que opinar sobre a minha barba? “Precisei fazer para a
missão, porque Archer disse que eu chamo muita atenção com ela.
Vou deixar crescer de novo assim que a missão acabar.”
“Ah, ok.”, Trish hesitou, mas então disse: “Essa missão é
perigosa, não é?”
“Atravessar a rua é perigoso.”
“Você entendeu o que eu disse. Perigosa para vocês. Muito
mais perigoso do que trabalhar de segurança na conferência de paz
ou treinar ucranianos a usarem foguetes.”
“Já realizamos missões perigosas antes.”, respondi
cuidadosamente.
“Tipo Praga?”
Tentei esconder minha surpresa, mas provavelmente falhei. Eu
não era bom em esconder minhas emoções como Archer ou Jordy.
“O que você sabe sobre Praga?”
Ela se inclinou para a frente e vi um pouco do seu decote. “Não
muito. Ninguém me conta nada.”
Me esforcei para não olhar para baixo. Ela não era muito
fornida na região toráxica, mas o que ela tinha era bem desenhado.
“Por bons motivos.”
“O que aconteceu?”, ela me deu um sorriso sexy. “Vamos lá,
você está aqui, sentado em casa, entediado.”, ela colocou as mãos
sobre os fones de ouvido de Kaylee para abafar o que disse a
seguir. “Também estou entediada. E gosto de ouvir sobre o trabalho
de vocês. Até mesmo as missões das quais eu discordo. O que
aconteceu em Praga?”
Eu queria contar a ela. Eu queria fazer qualquer coisa que a
deixasse feliz, me dei conta. Ela estava sorrindo para mim e
inclinada de uma forma que me deixava ver seu decote e ela tinha
que saber o que estava fazendo. E estava funcionando. Quando
percebi, estava inclinado na direção dela e prestes a responder.
Mas então eu parei. Bem a tempo. Deixar Trish me manipular
assim? Eu sou tão péssimo quanto Jordy ou Archer.
“O que aconteceu em Praga é que você deveria cuidar da
porra sua vida.”
Ela recuou. “Ei…”
“Você está aqui para trabalhar. Cuidar da nossa filha. Você tem
sorte de termos te contado qualquer merda sobre as missões de
agora, imagina sobre as do passado. Já está na hora de você
entender seu papel e parar de meter o nariz onde não é chamada.
Você não é parte dessa família. Você está de fora.”, movi a mão ao
redor da mesa. “Isso aqui? Nós três e Kaylee… e você? Isso é
temporário. Acaba assim que a missão acabar e voltarmos para
casa. Já passou da hora de você se lembrar disso.”
Trish se encolheu como se tivesse sido atingida e por um
instante me senti culpado pelo que tinha dito. Eu fui muito duro. Eu
sempre era duro com as pessoas de fora da família. Abaixar a
guarda era muito difícil.
Mas ignorei a culpa como quem joga fora um guardanapo
usado. Eu não devia nada para aquela mulher. Ela era apenas
nossa babá.
Antes que ela pudesse começar a argumentar, me levantei e
fui para o quarto. Ela não tentou me impedir, embora eu esperasse
aquilo dela. Abri meu laptop e verifiquei meu email por lá, como se
fosse ser diferente do que eu tinha acabado de fazer pelo celular.
Ainda não tinha novidades sobre Kadyrovic. A última notícia
recebida foi de uma reunião da qual ele participaria em Volgogrado.
Enquanto eu atualizava meu navegador mais uma vez, me
senti aborrecido. Com o fato de Trish ter se intrometido, mas
também comigo. eu não sabia que ela tinha esse tipo de efeito nas
minhas sensações. Geralmente eu era bom em afastar pessoas
sem muita dificuldade. Eu deveria ter conseguido mantê-la a uma
distância segura, assim como todas as pessoas que cruzavam meu
caminho. Especialmente todas as mulheres.
Já passou muito tempo desde Karina, pensei. Eu tinha me
esquecido a sensação de traição.
Mas ainda assim, ouvi Trish e Kaylee gargalhando no outro
cômodo e me dei conta de que queria me aproximar dela. Me abrir,
nem que fosse só um pouco. Quebrar um pedacinho da minha alma
e compartilhar com ela. Ver se ela aceitaria.
Isso é temporário, tentei me lembrar. E mesmo que não fosse,
não posso me abrir. Isso só leva à decepção.
Apertei a tecla de atualização do meu laptop pela centésima
vez e xinguei Archer por me fazer ficar sentado em casa.
28

Trish

“Papai usou uma palavra feia.”


Olhei para o corredor onde Harrison tinha acabado de bater
uma porta. “Ele certamente usou.”
“Ele usa palavras feias as vezes,”, ela disse, “mas ele tenta
evitar quando estou perto. Meus três papais tentam, mas Harrison é
muito barulhento e as vezes eu escuto.”
Dei uma risadinha. “Ele é barulhento mesmo, não é?”
“E é por isso que eu o amo!”, ela disse alegremente. “Você
coletou mais ferro? Precisamos fazer ferramentas melhores.”
“Ah, desculpa.”, eu disse, voltando minha atenção para o
computador. Kaylee levava Minecraft muito a sério.”
Enquanto eu voltava para o jogo, pensei no que Harrison tinha
dito. Você está de fora. Isso tudo é temporário.
Por fora, eu sabia que era verdade. E eu tinha evitado pensar
nisso desde que saímos de Wilmington. Mas ouvi-lo dizer isso tão
abertamente, como se ele estivesse fazendo contagem regressiva
para a minha volta para casa, foi o que me surpreendeu. Desde que
eu tinha começado a cuidar de Kaylee, Harrison tinha deixado bem
claro que não gostava de mim. Ou que não aprovava minha
presença. Então seus comentários não eram exatamente uma
surpresa para mim.
Mas ainda assim, me esforcei para não chorar com as coisas
que ele disse.
Por que eu me importo tanto com o que ele pensa? Não estou
envolvida com ele como estou com Archer e Jordy.
O trabalho estava quase no fim. Estávamos na terceira de três
missões. E quando acabasse, eu iria embora. E sim, eles estavam
sendo muito generosos, me pagando vários meses extras, mas eu
ainda assim precisaria achar outro emprego. E aquele pensamento
era deprimente, não só porque significava que eu tinha que voltar a
estaca zero, mas também porque eu ficava triste em deixar Kaylee e
os rapazes.
Me perguntei o que aconteceria depois. Será que eu ainda
sairia com Jordy ou Archer? Ou com os dois? Mesmo que eles
quisessem, eu não tinha certeza de que seria o certo para a minha
carreira como babá. Seria melhor ter flexibilidade, poder me relocar
pelo trabalho certo. Eu poderia ser enviada para qualquer lugar. E
ficar em Wilmington e namorar um deles—ou os dois!—limitaria
minhas oportunidades futuras. Eu não queria priorizar um
relacionamento ao invés da minha carreira de novo.
Relacionamento, pensei com escárnio. Neste momento eu nem
sei o que temos. Sexo, que é ótimo, mas então passamos o resto do
tempo fingindo que nada está acontecendo.
Independente do que estivesse acontecendo entre Jordy,
Archer e eu, meu apego a eles era poderoso. Até mesmo a
Harrison, mesmo com todos os seus defeitos. Olhei na direção do
seu quarto cuja porta estava fechada. Sem a barba, ele tinha um
maxilar poderoso e quadrado. Sua pele parecia macia e clara, a não
ser pela cicatriz embaixo do olho, que ficava mais evidente sem
barba. O rosto barbeado fazia seus cabelos acobreados parecerem
mais limpos e penteados também. Ele me lembrava de alguém
famoso, mas eu não sabia exatamente quem.
Kaylee e eu ligamos para o concierge para pedir brunch.
Seguindo as instruções de Archer, eu pedi a eles que deixassem
tudo no corredor porque estávamos preocupados com COVID.
Quando a comida chegou, olhei pelo olho mágico e esperei até o
entregador ter chegado no fim do corredor para abrir a porta.
Ao empurrar o carrinho para dentro do quarto, vi que ele
acenava para mim do outro lado do corredor. “Bom apetite,
madame!”, ele disse com um sotaque exótico, pontuando a frase
com uma mesura antes de desaparecer no elevador.
Um homem gentil, pensei. Era uma coisa simples, mas a
interação me fez me sentir mais bem-vinda ali.
Já estávamos na metade dos nossos waffles quando Harrison
finalmente saiu do seu quarto. Ele se movia lentamente e meio
curvado, o que me lembrava um urso saindo da hibernação. Ele se
sentou na cadeira perto de Kaylee e limpou a garganta.
“Me desculpa por mais cedo.”, ele retumbou.
“Pelo que?”, Kaylee perguntou.
“Perdi a calma. E falei palavras feias.”
“Tudo bem.”, ela respondeu. “Não me importo quando você fala
palavrão. As vezes eu fico zangada quando estou jogando e um
Creeper me ataca.”
Seus olhos focaram em mim por um segundo breve. Eles
pareciam esmeraldas brilhantes, ainda mais acentuadas pelo rosto
barbeado. “Não diga nada ao papai Archer, ok?”
Kaylee deu uma risada. “Por que não? Vai te causar
problema?”
“Talvez.”
“Prometo não contar a ele,”, disse Kaylee, “se você pedir
desculpas a Trish.”
Os olhos verdes me encararam de novo. “Eu já ia fazer isso.
Desculpa por ter perdido a calma, Trish.”
“Não há do que se desculpar.”, eu disse curtamente.
“Somos todos amigos de novo?”, Kaylee perguntou.
“Nunca deixaremos de ser amigos.”, eu respondi.
Ela assentiu enfaticamente uma única vez. “Que bom.”
Harrison sorriu. Ele tinha um sorriso charmoso, agora que dava
para ver seus lábios. “Você já terminou de comer? Por que você não
vai para o seu quarto jogar e me deixa conversar com a Trish
sozinho?”
Ela enfiou o último bocado na boca e saiu correndo. Harrison a
assistiu sair do cômodo até ficarmos sozinhos. Ele se moveu na
cadeira e eu estava bem ciente da sua presença ao meu lado. Ele
tinha uma aura de perigo, mas estava transbordando com um tipo
novo de energia. Como se se nossos cotovelos se encostassem,
uma corrente elétrica nos uniria. Era uma coisa quase sexual,
embora eu não achasse ser possível.
“Sobre Praga…”, ele começou.
Sacudi a cabeça imediatamente. “Eu não deveria ter
perguntado. Fui—”
Ele levantou uma mão para me fazer parar de falar. “Faz
alguns anos. Nosso contrato consistia em reunir evidências sobre
um certo indivíduo, Anton Novak, apreende-lo e transporta-lo para a
Alemanha, para ser julgado. Não me olhe assim—ele era um cara
mau. Traficante sexual. Um grande merda. passamos três semanas
lá, seguindo o cara, gravando seus movimentos, passando tudo
para os chefes. Novak gostava de visitar um clube de strip-tease,
ele ia lá todos os dias almoçar e voltava no fim do dia. E por causa
disso, viramos frequentadores do lugar também. E enquanto isso
estava acontecendo… me envolvi com alguém.”
“Harrison,”, comecei com uma pitada de provocação, “você se
apaixonou por uma stripper?”
Ele recuou. “O que? Claro que não. Eu tenho um padrão.”
“Ah, desculpa.”
“Me apaixonei pela gerente do clube.”, ele explicou. “Karina.”
Seu nome saiu da boca dele impregnado de significado. Seu
rosto permanecia impávido como sempre, mas eu podia notar que
aquele não era um assunto fácil para ele.
“Karina e eu tivemos um caso. Apenas sexo. Nada mais.”, ele
disse enfaticamente, como se estivéssemos em uma briga. “Até
evoluir para algo mais. Um envolvimento mais sério. O pior erro da
minha vida.”, ele sacudiu a cabeça. “Não acredito que fui tão
estúpido.”
“Você a deixou ficar no caminho da missão?”
“Pior.”, ele respondeu. “Karina trabalhava para o cara que
estávamos perseguindo. Me vigiando. E eu não me dei conta.
Quando finalmente juntamos evidências o suficiente e era hora de
raptarmos Novak para o levarmos para a Alemanha, Karina acionou
sua armadilha. Ela me drogou, mas eu tenho uma tolerância alta,
então não fui nocauteado como ela esperava e quase funcionou.”,
ele tocou a cicatriz no seu rosto. “Karina fugiu e esse foi o resultado
da minha estupidez.”
“E o alvo? Anton Novak?”
“Ele também fugiu,”, ele disse, derrotado, “apreendemos seus
dois irmãos, mas não ele. E ele era o mais importante. Foi a maior
falha da nossa carreira. E a pior parte é que Novak ainda está por aí
em algum lugar. Ninguém sabe onde. E tudo porque não fizemos
nosso trabalho. Jordy ainda se sente mal com a coisa toda porque
ele estava trocando mensagens com uma garota com quem saía
nos Estados Unidos também. Mas eu fui o grande responsável pela
merda. Nós quase morremos, ou pior, quase perdemos nossa
parceria com a Companhia Mathos. Nós três fizemos um pacto de
nunca mais deixar isso acontecer de novo.”
Ele abriu as mãos. “E o que o Jordy fez? Te trouxe para cuidar
de Kaylee. E então vocês dois começaram a brincar de pica-e-pega
a noite, pensando que todos estavam dormindo.”
O trocadilho foi tão rude que eu não consegui não rir.
“E então Archer se juntou a vocês. Archer, o cara cuja
qualidade mais marcante é ser mais sagaz. Olha, eu não estou de
julgando. Vocês são adultos e é tudo consensual. Façam o que
quiserem. Eu faria o mesmo se fosse o contrário e eu estivesse
viajando com três líderes de torcida do Dallas Cowboys, mas…”
“Você queria que eu não estivesse aqui.”, eu terminei por ele.
“Já entendi.”
Harrison sacudiu a cabeça. “Não. Não mais. Estou feliz por
você estar aqui. Eu faria qualquer coisa por Kaylee. Qualquer coisa
de verdade. Eu mataria e morreria pela minha filha. E depois de ver
vocês duas juntas, eu tenho a impressão de que você faria qualquer
coisa por ela também. E isso te fez virar uma pessoa ok na minha
lista. Mas ter você aqui e ver o que você está fazendo com Archer e
Jordy…”, ele deu de ombros. “Me traz memórias ruins. É só isso.
Então… sinto muito por ter sido um cuzão.”
Ele respirou fundo e suspirou. Parecia que a conversa o tinha
deixado exausto. E quando eu pensei bem, eu nunca o tinha visto
falar tanto antes. Ele provavelmente tinha falado mais nos últimos
cinco minutos do que tinha falado nas últimas cinco semanas.
“Sinto muito também,”, eu disse, “isso tudo é horrível. Não é de
se admirar que você não se abre sobre sua vida.”
Coloquei uma mão no seu braço. Eu estava tentando confortá-
lo. Sua pele estava quente e seu bíceps era duro como o piso de
mármore daquela cobertura. Por um breve segundo, senti um tipo
de corrente elétrica passar por nós.
Ele olhou para a minha mão no seu braço e se afastou. “Não
estou me abrindo. Só estou te contando o que você queria saber.
Contextualizando.”, ele bateu na mesa com um dedo. “Esta missão
é perigosa e eu tenho um mal pressentimento. Então, divirta-se com
seus parceiros, faça o que quiser, mas não atrapalhe nosso
trabalho. Quando as coisas ficarem feias, você precisa se afastar e
nos deixar fazer a nossa parte sem virar um empecilho. Entendido?”
Seus olhos de esmeralda penetraram os meus intensamente.
Esperando pela minha resposta. Eu assenti. “Vou tentar.”
“Ótimo.”
Inclinei minha cabeça. “Tem certeza de que é esse o motivo
dessa conversa? Eu virar um empecilho na missão?”
Harrison piscou lentamente. “E qual outro motivo eu teria?”
“Você não se sente deixado de fora?”, eu não sabia por que
estava perguntando aquilo, mas era tarde demais para mudar de
ideia, então continuei. “Você tem certeza de que isso não é…
ciúme?”
Ele ladrou uma risada, enfatizando o quão ridícula a ideia era.
“Não. não estou com ciúme.”, seus olhos me encararam por um
momento. “Diferente daqueles dois, não gosto de dividir.”
Harrison abruptamente se levantou e voltou para o seu quarto,
me deixando sozinha na mesa com meu waffle meio comido.
29

Trish

Durante o jantar naquela noite, Jordy e Archer nos regalaram


com histórias do dia, nas quais eles fingiam ter uma empresa de
passeios de helicóptero em Bacu. Eles tinham levado três grupos
para ver a cidade, e um deles incluía um russo famoso no TikTok do
qual nenhum de nós tinha ouvido falar, mas que aparentemente
tinha mais de dez milhões de seguidores. Jordy reclamou das
dificuldades de ficar na recepção porque os clientes faziam várias
perguntas sobre a cidade que ele não sabia responder.
“Você poderia responder,”, disse Archer secamente, “se
passasse tempo o suficiente estudando o material do relatório que
eu meticulosamente desenvolvi para você.”
“O documento tem sessenta páginas!”, Jordy reclamou,
procurando apoio ao redor da mesa. “Por que você fez uma coisa
tão longa?”
“Porque é quantidade de informação que um guia turístico
precisa saber.”, Archer sacudiu a cabeça. “Felizmente, você só está
no escritório e não guiando os passeios propriamente ditos. E eu
leio relatórios.”
“Não me parece que você está fingindo ser guia turístico.”, eu
disse. “Parece que você se tornou um!”
“É divertido, devo admitir.”, Archer disse. “Pena que não é em
uma cidade mais interessante.”
“E como foi seu trabalho com o…”, Harrison parou de falar
quando Kaylee olhou para ele. “O sorvete?”
Jordy piscou. “Sorvete?”
“Sim, você sabe. Aquele pote grande que vocês mantem no
helicóptero. Para os clientes.”
“Ah,”, Jordy arregalou os olhos, “aaah, foi horrível. Mantive os
olhos fechados o tempo todo.”
“O que o fez quase chutar a maca.”, Archer murmurou. “Muito
profissional da parte dele.”
“Como pode um sorvete ser horrível?”, Kaylee perguntou.
“Era de uva.”, Harrison respondeu.
A garotinha fez uma careta. “Eca!”
“Ei! Eu gosto de uva!”, eu disse.
Kaylee mostrou a língua para mim. “Eca.”
“Qual é o problema com o sabor uva?”, olhei ao redor da mesa.
“É perfeitamente normal.”
Jordy riu enquanto comia.
A divisão dos aposentos da cobertura era: três quartos em uma
ponta do corredor e dois na outra. Kaylee e eu ficamos com quartos
perto um do outro, caso ela precisasse de alguma coisa no meio da
noite. Mas as paredes não eram muito grossas e eu e os caras nos
esgueirávamos até um dos seus quartos do outro lado do corredor
no meio da noite.
Na primeira noite, Jordy recusou se juntar a nós—sua virilha
ainda estava dolorida por causa do acidente. Archer e eu ficamos
felizes em ficarmos sozinhos, e nos jogamos na cama e fizemos
amor. Eu encarava seu belo rosto enquanto ele mergulhava em
mim, seu pau duro o suficiente para fazer meu corpo tremer na
cama. Estar com ele era tão bom quanto estar com Jordy, mas
completamente diferente, de uma forma que eu não conseguia
entender. Embalei seu rosto e apertei meus músculos interiores ao
redor dele o mais apertado que pude, e então apreciei sua
expressão de prazer enquanto ele gozava dentro de mim.
Na noite seguinte, Jordy ainda estava apreensivo com o estado
das suas partes baixas—mas alguns olhares sensuais e
movimentos sugestivos meus acabaram o convencendo. Eu fui o
mais gentil possível com ele em seu quarto, correndo meus dedos
pela sua vara e o acariciando ternamente. Ele devia estar bem
porque os dois finalmente me revezaram de novo, trocando a cada
minuto como estávamos acostumados a fazer e Jordy não pegou
leve. Seu pau estava tão duro, tão grosso e tão sedento por mim
quanto sempre esteve.
“Eu sabia que poderia te convencer a se juntar à festa.”, eu
disse enquanto nos acariciávamos na cama depois de terminar. Era
uma cama de casal, então tínhamos que realmente nos aninhar uns
nos outros para cabermos todos.
“Seu argumento foi bem persuasivo.”, Jordy disse.
“Que argumento?”, Archer perguntou. “Até onde eu vi, Trish
piscou para você e tocou sua coxa depois do jantar.”
“É só disso que preciso.”, Jordy disse alegremente. “Sou um
homem simples.”
“Presumi que fosse ciúme.”, me intrometi. “Pensando na nossa
diversão sem você.”
“Esse fato realmente me tentou,”, Jordy respondeu, “mas
nunca senti ciúme.”
“Sério?”
Ele sacudiu a cabeça e seus cabelos castanhos roçaram meu
braço. “Estranhamente não. Archer e eu somos bons parceiros.
Pelos últimos oito anos nós dividimos basicamente tudo, por que
não uma mulher?”
“Ainda não gosto de dividir o banheiro com você em casa.”,
Archer disse do meu outro lado. “Só tem uma pia e você deixa seus
produtos todos espalhados no balcão.”
“É muito difícil ficar belo assim.”, Jordy levantou a cabeça e
sacudiu, como um modelo em um comercial de xampu. “Mas não,
eu não sinto ciúme algum. Desde que você sempre goste mais de
mim.”
Fiz uma careta. “Ah, bem, agora que você tocou no assunto…”
Archer retumbou em uma gargalhada. Jordy parecia um
cachorrinho abandonado, mesmo sabendo que era uma piada.
“Que bom que estamos na última missão.”, eu disse. Não foi
uma grande transição, mas eu queria perguntar a eles o que viria a
seguir e não consegui pensar em um momento melhor. “Vocês
sabem o que vão fazer quando tudo terminar?”
“Voltar para Wilmington,”, Jordy respondeu, “relaxar. Talvez
fazer alguns contratos fáceis. Vamos nos dar ao luxo de sermos
exigentes depois do pagamento dessa viagem.”
“Eu gostaria de tirar férias de verdade.”, Archer refletiu. “Viajar
por diversão e não a trabalho. Talvez uma ilha, tipo os Açores.”
“Seria ótimo. Ouvi várias coisas legais sobre Ibiza.”
Archer se apoiou em um cotovelo. “Você quer dizer Ibi-ç-a.”
Jordy bufou. “Não, cara, a ilha que eu estou falando se escreve
com Z. É no Mediterrâneo. Achei que você conheceria.”
“E eu conheço.”, Archer respondeu secamente. “Visitamos a
ilha quando eu era criança. E a pronúncia correta é certamente Ibi-ç-
a.”
“Sim, ok.”, Jordy revirou os olhos. “Vou fingir que acredito.”
“Não é mentira. É literalmente a forma certa de se pronunciar.”
“Certamente é.”
Enquanto os dois discutiam, suspirei. Minha pergunta se referia
ao que aconteceria conosco depois que a missão terminasse. Nós,
comigo inclusa. Mas claramente aquilo não estava na cabeça deles.
Isso é bom ou ruim?
30

Trish

Bacu era uma cidade interessante. Uma combinação de


arquitetura antiga e cultura com a indústria high-tech crescente.
Enquanto eu caminhava pela feira com Kaylee pensei: será que é
assim que a maioria das cidades antigas é? Istambul não me
pareceu tão velha e Oslo era bem moderna de modo geral.
Visitar a feira local era uma desculpa para sair do hotel e
esticar as pernas. Não precisávamos comprar nada no quesito
comida: o restaurante do hotel servia algumas das melhores
refeições que eu já tinha comido na vida. Eles tinham um menu
extenso, diverso e tudo era refinado. Talvez minha opinião fosse a
de alguém sem cultura de uma cidade pequena, mas era realmente
muito bom.
Nossa comida era entregue pelo mesmo funcionário todo dia.
Um simpático camareiro de uns trinta anos, cabelos escuros, sardas
e um sorriso perpétuo que parecia ser completamente genuíno. Ele
sempre deixava o carrinho de comida na porta e se apressava pelo
corredor para me dar espaço. Depois da terceira entrega, ele
começou a deixar lenços desinfetantes em cima do carrinho.
“Se você estiver preocupada com as vasilhas,”, ele disse do fim
do corredor, “use-os para limpá-las. Você vai se sentir mais
protegida do que nunca!”
Kaylee começou a me ajudar a pegar a comida, porque
gostava de se sentir útil. O camareiro sempre sorria para ela e as
vezes fazia alguma careta divertida. Rapidamente Kaylee começou
a dar risadinhas todas as vezes que o via.
Mantive uma certa distância de Harrison. Desde que ele tinha
se aberto comigo—que era claramente o que ele tinha feito, não
importava o que ele pensava—ele parecia ter reforçado a guarda.
Mais do que o usual. Eu deveria ter aceitado que aquela era sua
personalidade no geral, mas era um contraste muito alto com a
forma que ele agia com a filha. Ele brincava com Kaylee durante o
dia enquanto não estava lendo os relatórios dos informantes de hora
em hora. Ele esticava seu corpo musculoso no chão e brincava de
K’nex com ela. Ele a assistia explicar pacientemente os meandros
do mundo Minecraft, incluindo instruções sobre como lutar contra as
aranhas. Ele era um gigante gentil com ela, uma visão que fazia
meu coração ficar quentinho e me fazia olhar para ele de forma
totalmente diferente.
Um dia, eu estava pegando toalhas extras no armário do
corredor quando ele saiu do banheiro. Ele tinha acabado de tomar
banho e só vestia uma toalha enrolada na cintura. Gotas de
umidade escorriam por toda a extensão da sua pele e eu precisei
me controlar para não encará-lo.
Ele não é tão enxuto quanto os outros, pensei, mas é
definitivamente maior. Mais poderoso.
Me dei conta de que estava no seu caminho no corredor e
rapidamente me movi, murmurando um pedido de desculpas.
Harrison me olhou com um sorriso maroto e disse: “É sua vez,
você sabe.”
“Já tomei banho de manhã.”, respondi.
Ele zombou e desapareceu no corredor, entrando no seu
quarto e me deixando confusa com o que quer que ele queria dizer.
Demorei um dia inteiro para entender. Eu estava voltando pelo
corredor depois de colocar Kaylee na cama para um cochilo quando
notei alguma coisa no tabuleiro de xadrez. Eu tinha movido uma das
peças brancas… agora uma peça preta tinha avançado duas casas.
Será que foi isso que ele quis dizer?, pensei. Ou não?
Fiz outro movimento e me sentei no sofá para relaxar e ler um
livro. Harrison apareceu no corredor, preparou um sanduíche e
desapareceu de novo. Por alguns segundos parei de ouvir seus
passos. Assim que ouvi a porta do seu quarto fechar, me levantei e
caminhei em silêncio pelo corredor.
Um cavalo preto tinha sido movido para a terceira fileira.
Passamos o resto do dia jogando naquele esquema. Harrison
ia até a cozinha para comer alguma coisa, beber água ou fazer um
telefonema e movia uma peça. Finalmente me cansei da palhaçada
e movi o tabuleiro de xadrez para a mesa de centro da sala de estar.
Então quando Harrison saiu de dentro da sua caverna de novo,
o ouvi parar no corredor. Sua figura larga apareceu na sala um
momento depois. Encarei-o de volta com uma sobrancelha
arqueada.
Ele se serviu de água, arrastou o otomano para o outro lado da
mesa de centro e se sentou. Ele fez outro movimento, e eu o segui,
avançando meu bispo. Harrison moveu seus peões para a frente e
eu o ataquei com um roque. Não foi uma partida rápida, tampouco
lenta. Ele movimentava as peças de forma cuidadosa e metódica.
Dez minutos depois me dei conta de que estava em apuros. Depois
de mais cinco minutos, meu rei estava preso em um canto sem
chance de escapar.
“Bom jogo.”, eu disse, deitando meu rei no tabuleiro, derrotada.
“Não esperava que você jogasse xadrez.”
“Por que não?”, ele perguntou.
Dei de ombros. “Não sei. Você é meio…”, parei quando notei
que ele me encarava atentamente. “Não combina com a sua
personalidade.”
“Ou talvez,”, ele sugeriu enquanto se levantava, “você não
entenda nada da minha personalidade porque fica presumindo
coisas ao meu respeito.”
Pensei naquilo pelo resto do dia. Harrison tinha uma superfície
unidimensional. Um soldado com as bordas ásperas que
rapidamente fica com raiva e se sentia confortável com violência. E
mais uma vez, eu não tinha tido tempo de conhecê-lo melhor da
mesma forma que tinha feito com Jordy ou Archer. Em partes,
porque ele tinha sido hostil comigo desde o momento em que nos
conhecemos, mas eu também nunca tinha tentado, então também
tinha culpa no cartório.
Fiquei ainda mais surpresa no dia seguinte quando desci para
correr na esteira da academia do hotel. Quando voltei, encontrei
Harrison e Kaylee sentados no chão da sala. As pernas de Harrison
estavam abertas em V e sua filha estava sentada entre elas.
E ele estava habilidosamente trançando seus cabelos.
“Você está fazendo uma trança!”, exclamei.
Os dois me olharam surpresos. “E por que não faria?”, ele
perguntou.
“Papai sempre faz minhas tranças.”, Kaylee explicou. “Ele é
muito melhor do que meus outros papais.”
De repente me lembrei dos cabelos trançados de Kaylee na
primeira vez que nos vimos, um mês antes, na casa deles em
Wilmington. Ela disse que seu pai tinha feito aquela trança e eu
presumi, na época, que tinha sido Archer ou Jordy. Eu não pensaria
em Harrison nem em um milhão de anos.
Quando parei de presumir coisas sobre o homem, descobri que
ele era surpreendentemente sexy. Eu estava definitivamente atraída
pela versão dele sem barba. Sim, isso foi fútil da minha parte e eu
não deveria ter deixado uma alteração física mudar a forma como
eu o via. Mas eu não conseguia evitar. Era como colocar um lixo
incrivelmente fedido para fora de uma casa belíssima. Mudava a
atmosfera toda.
Gostaria de saber como é beijá-lo agora, pensei. E comparar
ao beijo que ele me deu quando ainda tinha barba.
Notei outras coisas a respeito de Harrison quando comecei a
me esforçar melhor. Ele era uma criatura de hábitos. Todas as noites
ele tomava um copo comprido de leite e comia um pacote inteiro de
Oreos. Toda as manhãs ele se exercitava na academia do hotel por
duas horas. E comia a mesma coisa no almoço todos os dias: dois
sanduíches de manteiga de amendoim, com muita manteiga de
amendoim.
Ele geralmente comia depois de Kaylee e eu, então comecei a
fazer seus sanduíches. No primeiro dia ele saiu do quarto, olhou
para o prato, mas mesmo assim fez seus próprios sanduíches. No
dia seguinte, quando ele começou a fazer a mesma coisa, me
levantei e o confrontei.
“Uma coisa é ser teimoso, outra é desperdiçar comida. Você
está dando mau exemplo para Kaylee.”
Fiquei com medo do meu comentário o irritar, mas na verdade
parece tê-lo despertado. Ele pegou o prato de sanduíches e levou
para o seu quarto, e passou a aceitar a oferta todos os dias. Me
senti vitoriosa.
Também passamos a jogar xadrez todos os dias. Uma partida
à tarde, enquanto Kaylee cochilava. Ele ganhou pela segunda vez,
mas por pouco. Na terceira, ganhei depois de ele cometer um
engano e perder sua rainha cedo demais. O quarto jogo acabou
empatado.
Eu estava ansiosa para um desempate, mas no dia seguinte
Harrison estava andando pela casa com pressa. Quando ele
finalmente passou pela sala de estar, vestia calças cargos, moletom
cinza e óculos escuros.
“Atualização,”, ele disse, pegando um dos sanduíches que fiz e
mordendo um pedaço grande, “o alvo está em Bacu. Tenho que ir.”
“Qual alvo?”, Kaylee perguntou, saindo do seu quarto.
“Tiro ao alvo,”, ele respondeu sem perder tempo, “vou trabalhar
na loja de Tiro ao alvo hoje. Espero voltar para o jantar.”
“Ok!”, Kaylee o abraçou e Harrison a pegou no colo, girando
pela sala. Ela deu gritinhos alegres até ele a colocar de volta no
chão.
“Obedeça a Trish.”, ele instruiu e se virou para sair.
“Espera!”, Kaylee gritou. “Você não deu um beijo de tchau na
Trish.”
Harrison hesitou. “Não precisamos dar um beijo de tchau.”
“Mas você disse que você e Trish são amigos. E amigos
adultos dão beijos de despedidas. Significa que vocês não são mais
amigos?”
Harrison e eu nos entreolhamos. Fomos pegos pela lógica
impecável de uma menina de oito anos de novo. E não fazer o que
ela pedia levantaria ainda mais suspeitas. Especialmente
considerando o que Archer e Jordy e eu fazíamos atrás de portas
fechadas.
“Adeus, Trish.”, disse Harrison, se inclinando para me beijar.
Foi rápido. Um selinho. Nossos narizes se tocaram
brevemente. Um beijo suave e inocente.
Ainda assim um raio de excitação passou por nós naquele
momento. meu coração acelerou e senti minha respiração falhar. Os
olhos de Harrison brilharam por um momento, então ele se virou e
saiu pela porta. Fiquei parada no lugar por um momento depois de
que ele saiu. Algo estava se movendo dentro de mim.
Isso responde minha pergunta sobre o beijo. Pensei, me
virando de volta para a sala. O beijo dele é muito, muito melhor sem
barba.
31

Trish

Não consegui parar de pensar naquele beijo pelo resto do dia.


Não deveria ter sido tão gostoso quanto foi. Eu não deveria estar me
sentindo tão excitada. Mas foi o que aconteceu e eu não pude evitar.
Harrison voltou naquela noite todo misterioso sobre o que tinha
feito durante o dia. Ele, Jordy e Archer se sentaram e conversaram
silenciosamente quando chegaram em casa. Ficou claro que eles
não tinham assassinado seu alvo ainda. Me perguntei quando
aconteceria e por quanto tempo eles ainda esperariam.
O único momento no qual parei de pensar no beijo de Harrison
foi quando eu e meus dois homens estávamos transando naquela
noite. Jordy me inclinou na cama e me tomou por trás enquanto
Archer, sentado na borda, puxava minha cabeça contra o seu pau.
Não conseguimos revezar com sucesso naquela noite, nós três
estávamos nos divertindo naquelas posições e rapidamente
atingimos nossos respectivos orgasmos um atrás do outro.
Mas assim que tudo acabou, comecei a pensar no tipo de
amante que Harrison seria. Será que ele seria surpreendentemente
delicado? Ou do tipo que joga a mulher na parede? O pensamento
de ser manipulada me deu um calafrio sensual na espinha, e
naquela noite, meus sonhos foram repletos de fantasias envolvendo
uma quarta pessoa.
No dia seguinte, Harrison deixou a propriedade de manhã com
os outros dois. O beijo foi um pouco mais longo do que o primeiro e
menos performático. No terceiro dia, ele ficou em casa até a hora do
almoço, quando finalmente saiu para vigiar o alvo. Naquele dia,
Kaylee não nos assistia plenamente da sala quando nos
despedimos.
Harrison segurou minha bochecha e beijou meus lábios. Eu
fechei os olhos e derreti. Um longo tempo depois de ele ter saído,
senti que estava tão leve que poderia flutuar pelo hotel em uma
nuvem.
Havia definitivamente alguma coisa entre nós. Algo poderoso.
Até a forma como ele me olhava tinha mudado.
No entanto, eu me sentia mal com a situação. Eu já estava
envolvida com dois homens e havia questões e complicações sobre
o que aconteceria quando voltássemos todos para casa. E agora eu
ainda estava pensando em um terceiro? Me senti egoísta. Como
uma menina com a qual eu tinha estudado: seu pai comprou um
estábulo e um pônei para ela, mas ela decidiu que queria outro
cavalo. Depois que Kaylee se deitou para cochilar, desejei ter
alguém para conversar sobre o assunto.
Foi quando eu me dei conta de que tinha alguém para
conversar.
“Trish!”, Lisa exclamou ao atender o telefone. “Já era hora de
você me ligar!”
“Não está muito cedo por aí, está?”, perguntei.
“Estou na varanda, tomando meu café matinal.”, ela
respondeu. “É o horário absolutamente perfeito para falar no
telefone. Como estão Caramelo e Bombom?”
“Jordy e Archer estão bons.”, respondi.
“Ah, eu aposto que eles estão B-O-N-S mesmo! Vocês ainda
estão transando loucamente?”
Dei uma risadinha. “Você não faz ideia. Lembra daquela garota
que conhecemos no primeiro ano de faculdade que dormiu com um
monte de caras do nosso andar? Acho que a julgamos demais, Lisa.
Sexo a três é muito bom.”
Houve uma longa pausa. Pensei que a ligação tinha caído.
“Vocês estão fazendo sexo a três?”, Lisa perguntou com a voz
baixa. “Você, Bombom e Caramelo?”
Me engasguei. “Ah, não… eu não tinha te contado isso ainda?”
“NÃO, VOCÊ NÃO TINHA ME CONTADO!”, ela praticamente
gritou. “Merda. Gritei tão alto que assustei o gato do vizinho. Ele
quase caiu da sacada. Mas não, você não me contou! Quando
aconteceu? Me dê todos os detalhes!”
Voltei no tempo algumas semanas e expliquei tudo desde o
começo. Nossas rodadas de Verdade ou Shot que nos levaram a
descobrir que a maior fantasia de Jordy era transar com duas
pessoas. E o que era supostamente para ser só uma noite divertida
virou um evento rotineiro, a sobremesa depois do jantar todos os
dias da nossa viagem. Então contei a ela que dormi só com Archer
também.
“Desculpa.”, eu disse no final. “Eu sei que você tinha uma
queda por Caramelo. Quer dizer, Archer. Mas aparentemente ele
tinha uma queda por mim. E nós… ai… nem consigo dizer. Sou a
pior amiga do mundo, não sou?”
“Isso definitivamente vai para a sua ficha criminal.”, Lisa
respondeu. “Felizmente para você, não estou chateada com isso.”
“Sério? Não mesmo?”
“Acho que o fato de eu estar…”, ela disse casualmente. “Hm…
saindo com alguém… ajuda no seu caso.”
“O que? Quem é? É sério?”
“Brent, meu colega de trabalho. Um gatinho que trabalha perto
da impressora. Não é sério ainda, mas tem potencial. Ok. Chega de
falar de mim! Me conta tudo sobre suas aventuras!”
“Bom, infelizmente não posso te contar onde estamos.”,
comecei.
Lisa fez um barulho impaciente. “Não me importo com o país
no qual você está. Estou falando de aventuras sexuais!”
Olhei na direção do quarto de Kaylee, mas abaixei a voz de
qualquer forma. “Nós três fazemos isso quase todas as noites…”
Passei alguns minutos detalhando o suficiente para saciar sua
curiosidade. Então mencionei o fato de Archer ter crescido em uma
grande família poliamorosa e não convencional.
“Não é de se admirar que ele topa dividir você com Bombom.
Me pergunto se Brent tem qualquer interesse em coisas excêntricas.
Ele tem sido tão reservado na cama até agora, mas dá para ver que
ele está indo devagar. Quando vocês voltarem, fico feliz em te
substituir quando você estiver doente. Ou se ficar muito ardida.
Aposto que você está ficando seriamente ardida.”
“Quando voltarmos… bom, esse é um dos problemas na
verdade. Estou preocupada com isso…”, expliquei. “E mais ainda
ultimamente porque tenho um tipo de pressão externa. Estou meio
que flertando com o terceiro cara do grupo, Harrison.”
“Achei que ele fosse… como foi que você disse? Um
desmazelado de cara feia?”
“Sim, ele era…”, respondi. “Mas ele fez a barba e agora eu não
sei…”
“Sua opinião mudou completamente porque o cara fez a
barba? Uau, e você diz que eu sou fútil…”
“EU SEI!”, exclamei. “É tão estúpido! Mas agora que ele está
com a cara limpa e me lembra uma versão caliente do Damien
Lewis. Além do mais, ele está se abrindo comigo. Ele é
definitivamente um coração mole. E joga xadrez. E outro dia estava
trançando os cabelos de Kaylee.”
“Aaah,”, Lisa arrulhou, “eu amo quando um pai é afeiçoado à
filha e deixa a masculinidade tóxica de lado para brincar de
casinha.”
“Então, o que eu faço?”, perguntei.
“Não é óbvio?”, Lisa disse. “Você tem dois caras insanamente
gostosos para ocupar seu foco. Não estrague a dinâmica
adicionando um terceiro. Mesmo que seja tentador.”
Ouvi um barulho no corredor e a porta de Kaylee se abriu.
“Você está certa.”, eu suspirei. “Vou aproveitar o que já tenho.
Preciso ir, Kaylee acabou de acordar do seu cochilo.”
“Acho bom você me trazer vários presentes!”, Lisa disse. “E
dos bons! Para comprar meu perdão pelas suas travessuras com
Caramelo.”
“Isso me cheira a suborno.”, eu disse.
“Não é suborno,”, ela provocou, “é amizade!”
Ajudei Kaylee a se vestir e então perguntei se ela queria ir até
a feira me ajudar a escolher lembrancinhas para meus amigos e
família. Instantaneamente os vestígios de sono desapareceram do
seu rosto e ela estava pronta para ir. Enquanto caminhávamos pelo
lobby, Kaylee apontou para a mesa do concierge. O camareiro
amistoso estava lá, mostrando um mapa da cidade para outro
hóspede. Ele nos viu e prontamente fez uma careta para Kaylee
antes de voltar para o homem que estava auxiliando.
A caminhada até a feira de Bacu era curta. Ela ficava em uma
praça aberta e tinha várias barracas distribuídas na área externa,
onde vendedores exibiam seus produtos. Metade da feira consistia
em comida e a outra metade focava mais em produtos turísticos.
Guiei Kaylee pela mão na direção dos presentes, pensando no que
Lisa havia dito.
Bem no fundo, eu sabia que era ridículo pensar em adicionar
um terceiro cara quando eu já tinha dois na cabeça. Não só na
cabeça, mas no resto do corpo. Eu estava ativamente envolvida
com os dois, praticamente todas as noites. Eu deveria primeiro
tentar descobrir de qual dos dois eu gostava mais—uma tarefa
impossível naquele momento—antes de considerar um terceiro
homem.
Ainda assim, eu não conseguia parar de pensar em Harrison.
Sua energia quieta e mortal. Seus lábios tocando os meus. A forma
protetiva com a qual ele tratava sua filha, que fazia meus instintos
maternos se aflorarem e tomarem conta de mim.
Eu estava pensando no que fazer sobre aquilo tudo quando
senti alguém segurar meu braço e me virar. Um homem de dentes
amarelos e rosto fino rosnou para mim.
“Te peguei.”
32

Harrison

O vento batia no meu rosto enquanto eu pilotava uma moto


rapidamente por Bacu, costurando o tráfego pelas ruas estreitas.
Bastava só um motorista desatento não me ver e eu cairia no chão
ou acabaria esmagado no para-brisa de alguém. Mas eu nem
pensei nisso. Eu tinha uma missão com objetivos muito claros e
felizmente era um cara muito focado.
Mais dois quarteirões, pensei, me posicionando no mapa da
cidade dentro da minha cabeça. Se is informantes estiverem certos.
Alcancei a interseção que precisava e virei à direita. E bem na
minha frente, vi o que estava procurando. Uma Mercedes-Benz
preta. A mesma que Kadyrovic estava usando para se locomover
desde que tinha chegado na cidade. Desacelerei e me misturei ao
tráfego como qualquer outro cidadão de Bacu.
Segui o carro de Kadyrovic por mais meia milha antes do seu
motorista parou para ele descer. Casualmente parei na calçada,
deixei minha moto encostada na parede de um supermercado e o
segui a pé. Tirei um boné de beisebol velho do bolso e o coloquei na
cabeça, escondendo meus olhos. Eu não parecia um habitante
local, mas era o suficiente para me misturar à multidão.
Kadyrovic estava acompanhado por um guarda-costas
enquanto caminhava pela grande feira. Sacudi minha cabeça com
repulsa. Aquele cara era um dos cachorrinhos de Putin, um
criminoso de guerra em tudo, menos no nome, e ele tinha a
coragem de caminhar pela cidade como um turista. Convencido, ou
melhor, arrogante. Ele achava que era intocável.
Peguei minha câmera, tirei algumas fotos dos meus arredores
e mantive distância enquanto Kadyrovic se movia entre as
barraquinhas. Ele comprou um kebab de um dos vendedores e
mordiscou enquanto apreciava a vista. O guarda-costas não vigiava
seu entorno; mal fazia seu trabalho. No primeiro dia que nosso alvo
chegou na cidade, pensei que havia outros homens espalhados
para vigiá-lo. Certamente seu guarda-costas pessoal não se
comportaria tão casualmente, a menos que eles tivessem algum tipo
de carta na manga.
Mas não, não havia ninguém mais fazendo sua segurança. Me
certifiquei do fato depois de monitorá-lo por vários dias. Era apenas
um segurança e um mar de gente aleatória.
Pensei, e não pela primeira vez, em como seria fácil abatê-lo
bem ali, naquele momento. Eu poderia tirar minha pistola do bolso,
caminhar até eles e acabar com suas vidas em um piscar de olhos.
Sem nem suar.
Mas Archer tinha sido muito claro sobre a missão: deveria
parecer um acidente. Aquele era um requerimento de quem quer
que tivesse nos contratado. Sem acidente, sem pagamento.
Entretanto, não consegui parar de fantasiar sobre o assunto.
A maior parte da minha carreira no Exercito tinha sido sentado
esperando. Eles não mostram essa parte nos comerciais de
alistamento. Você fica lá sentado fazendo nada, aí tem treinamento
uma vez por mês, depois fica mais um tempo sentado fazendo
nada. E todos os momentos de empolgação, quando acontecem,
são tão rápidos que se você pisca, perde.
Eu gostava de trabalhar para um grupo de mercenários como a
Companhia Mathos porque podíamos escolher nossas missões.
Éramos soldados da fortuna, assassinos de aluguel, mas ainda
assim tínhamos que sentar e esperar fazendo nada. Mesmo agora,
silenciosamente seguindo nosso alvo pelo mercado, eu não estava
realmente fazendo alguma coisa. Tive inveja de Archer ser o
responsável por finalmente colocar aquele cara em uma cova rasa.
E então Kadyrovic olhou por cima do ombro e desapareceu da
minha vista em um dos becos. Rapidamente circulei o perímetro até
o centro da feira para conseguir um ângulo melhor bem a tempo de
ver meu alvo se esconder em uma loja de tapetes. O guarda-costas
ficou parado na frente e o dono da loja virou a placa na porta para
“FECHADO”.
O que ele está fazendo em uma loja de tapetes? Me perguntei.
Foi por isso que ele veio para a cidade?
Dois minutos se passaram, então três. Eu estava encostado
em uma barraca que vendia tortas e o vendedor começou a
reclamar da minha presença. Enfiei a mão no bolso, peguei um
punhado de moedas sem olhar e as depositei no balcão sem tirar
meus olhos da loja de tapete. O dono da barraquinha de repente
passou a me amar e tentou me dar uma torta, mas bastou um olhar
meu para ele caminhar até o outro lado da barraca sem mais
nenhuma palavra.
O que será que Kadyrovic estava fazendo? Alguma coisa
importante estava definitivamente acontecendo. Uma movimentação
no canto do meu olho chamou minha atenção e eu olhei o que era.
Trish estava caminhando pela feira, segurando a mão de nossa
filha.
A visão das duas foi repentina e inesperada. Trish estava
olhando souvenires em uma lojinha e os descrevendo para Kaylee,
que estava na ponta dos pés tentando ver. Meu primeiro instinto foi
o pânico. Se elas me vissem, meu disfarce acabaria. Puxei mais o
boné sobre os olhos.
Meu segundo instinto foi notar o fato de Trish estar se saindo
muito bem ali. Uma mulher que nunca tinha saído da Carolina do
Norte, de repente totalmente confortável passeando por uma feira
em Bacu. Eu tinha pensado nela muito ultimamente. Eu sempre
soube que ela era atraente, mas de repente comecei a achá-la sexy.
Seus cabelos dourados se moviam ao redor do seu rosto como uma
aura, enquanto ela mexia a cabeça, recusando o que o vendedor
oferecia. Suas calças jeans a abraçavam e delineavam suas pernas
longas e aquela bunda em forma de maçã na qual eu queria
desesperadamente afundar meus dedos. E como não querer? Os
beijos que trocamos, mesmo forçados, tinham um grau de faísca
inegável. Eu não conseguia tirar meus olhos dela.
Sacudi a cabeça e voltei a olhar para a loja de tapetes. Eu só
precisava transar. Eu estava ali por três ou quatro meses. Eu não
era um grande fã de pagar por sexo, mas talvez eu precisasse abrir
uma exceção naquela cidade se nossa missão durasse mais.
Eu não quero uma acompanhante aleatória, pensei enquanto
olhava mais para ela.
Resmunguei em voz baixa, o que fez o vendedor de tortas dar
um salto. Eu precisava me concentrar no meu trabalho. Dava para
ver pela vitrine, então levantei a câmera para usar as lentes
telescópicas. Kadyrovic estava entregando alguma coisa para o
dono da loja. Tirei algumas fotos e abaixei a câmera. O que quer
que estivesse acontecendo naquela loja…
Uma movimentação no canto dos meus olhos me fez me virar
de novo. Ali estava Trish, parada na entrada de um beco, mas algo
estava errado. Um homem a segurava pelo braço. Ela tentou se
afastar, mas ele a apertou mais. Ao lado dela, Kaylee
cuidadosamente se afastava.
Eu nem pensei, só soltei minha câmera e corri feito maluco.
Minhas botas atingiam o pavimento com força enquanto eu corria na
direção de Trish e da minha filha, porque ambas estavam em perigo.
Atingi um grupo de turistas e me movi entre as barracas. Tudo ao
meu redor desapareceu no desimportante vazio porque só o que
importava era que eu as alcançasse o mais rápido possível.
Quando cheguei no beco, o homem estava arrastando Trish
com uma mão sobre sua boca. E ela estava tentando reagir,
chutando e surrando o ar, mas não ajudava muito contra a força
daquele homem. Kaylee ainda estava se afastando lentamente,
congelada de medo, seu pequeno cérebro de oito anos entendendo
o que estava acontecendo.
Pensei naquilo tudo sem desacelerar. O agressor me viu no
último momento, quando o atingi com o ombro em velocidade total.
Todos saíram voando, incluindo Trish. Minha cabeça atingiu a do
agressor e por alguns instantes minha visão ficou branca. Uma luz
brilhante invadiu meus olhos e eu pisquei rapidamente tentando
recuperar minha visão.
Quando as formas começaram a voltar, pude ver o contorno do
beco. O agressor estava segurando Trish pela cintura, então ele
pegou um chumaço de notas coloridas de Manat do bolso dela e
fugiu, escapando do beco e se misturando à multidão. Algumas
notas flutuaram com o vento atrás dele.
Comecei a correr atrás dele, mas de repente senti Kaylee
agarrar minha perna e gritar meu nome. Com muita restrição, parei
de prestar atenção no agressor e me virei para as duas mulheres
que realmente importavam para mim.
33

Trish

Sonhei que estava voando, ou talvez flutuando. De qualquer


forma, eu estava nas nuvens e a terra estava abaixo de mim.
Pássaros me rodearam, mergulhando e se precipitando de forma
divertida. A sensação do vento no meu cabelo me fez me sentir viva.
Me fez me sentir livre.
Quando abri meus olhos, percebi que não estava voando. Eu
estava sendo carregada por braços poderosos. Olhei para cima e vi
um olhar determinado no rosto de Harrison, que caminhava com
dificuldade.
“O que…”, murmurei.
“Trish!”, Kaylee gritou perto de mim. “Papai disse que você
estava só dormindo, mas eu sei que ele está mentindo e não quer
me contar a verdade. você está bem?”
Minha memória foi voltando lentamente. Estávamos na feira,
eu estava recusando as echarpes que o vendedor insistia que eu
precisava ter. Quando me dei conta, um homem estava me puxando
pelo braço para um beco, então ele cobriu minha boca antes que eu
pudesse gritar.
E algo se chocou contra nós e eu caí no chão.
“Harrison,”, eu disse, com a voz mais viva a cada segundo, “me
coloca no chão.”
“Não.”, ele respondeu sem nem me olhar.
“Estou bem. Me coloca no chão. Não preciso que você me
carregue.”
Ele grunhiu e continuou andando.
“O que é isso no seu… meu Deus. Harrison, você está
sangrando.”
“Ele disse que é só um cortezinho.”, Kaylee explicou. “E que
ele já teve cortes piores. Foi o que ele disse.”
“Me coloca no chão.”, repeti.
“Já estamos quase chegando em casa.”, ele disse.
Tentei resistir, me sacudindo nos seus braços, mas era inútil.
Ele era uma ordem de magnitude mais forte do que eu. Eu teria
mais sorte tentando dobrar barras de ferro, provavelmente.
Entretanto, ele estava certo sobre uma coisa: chegamos no
hotel um minuto depois. Foi só então que ele me colocou
cuidadosamente no chão. Mas não sem manter uma mão na minha
cintura para me dar estabilidade enquanto caminhávamos para
dentro. Fiquei grata pelo suporte quando comecei a caminhar. Sua
outra mão segurava a de Kaylee.
O camareiro simpático estava atrás do balcão da recepção e
seus olhos se arregalaram quando ele nos viu. Dei a ele um sorriso
fraco para que ele soubesse que estava tudo bem, mas ele pareceu
mais preocupado do que aliviado.
Quando entramos no elevador, eu disse: “O homem que me
atac-”
“Não.”, Harrison interrompeu. “Quieta. Sem falar nada ainda.”
Chegamos no último andar e entramos na nossa cobertura.
Harrison colocou um dedo nos lábios, sinalizando que ficássemos
quietos e silenciosamente examinou os quartos. Quando ele voltou,
pegou o dispositivo eletrônico que Jordy tinha usado quando
chegamos e fez mais uma varredura por toda a cobertura.
Finalmente ele se deu por satisfeito e nos guiou até o sofá.
“A barra está limpa.”, ele disse. “Me conte tudo o que
aconteceu.”
“Estou um pouco zonza,”, admiti, “mas me lembro de estar na
feira, procurando presentes para minha amiga Lisa. Então um
homem agarrou meu braço e disse te peguei. Ele cobriu minha boca
e me arrastou para o beco. Aí tudo ficou preto.”
“Foi o que aconteceu.”, Kaylee disse assentindo. Seus olhos
estavam arregalados, parecia que ele entendia a importância
daquilo tudo. “Eu vi tudo. E ficou tudo escuro porque papai o
derrubou. Então o homem mau enfiou a mão no seu bolso, pegou
um punhado de dinheiro e correu.”
“Ele era de fato um homem mau.”, Harrison disse, ternamente
acariciando a bochecha de Kaylee com o polegar. O sorriso que ele
deu para ela continha todo o amor do mundo. “Às vezes, homens
maus fazem maldades. Você precisa tomar cuidado com isso. Mas
sem ter medo, porque seus papais sempre estarão por perto para te
proteger. Sempre.”
“Eu sei.”, ela o abraçou e beijou sua bochecha. “Sempre me
sinto segura com você, papai.”
“Preciso conversar em particular com Trish. Você pode ir
brincar no seu quarto, por favor?”
Kaylee assentiu e saltou do sofá. Ela hesitou, mas então me
deu um abraço apertado. “Tudo vai ficar bem, Trish. Você tem meu
papai para te proteger.”
Me forcei a sorrir. “Eu sei.”
Assistimos Kaylee ir para o seu quarto. Harrison só começou a
falar quando ouvimos a porta fechar.
“Olhe diretamente para mim.”, ele usou os dois polegares para
abrir minhas pálpebras e olhou diretamente nos meus olhos. “Olhe
para a esquerda. Agora para a direita. Para cima. Para baixo.”, ele
cuidadosamente partiu os cabelos acima da minha orelha. “Você
bateu no chão. Só um hematoma, nada grave. Sem traumatismos.”
“Mas e você?”, perguntei apontando para o sangue correndo
pela sua têmpora.
“Estou bem. Caralho, eu estava com medo disso.”, ele rosnou
com raiva.
“Eu não sabia que isso podia acontecer,”, respondi
defensivamente, “Archer disse que era seguro visitar a cidade…”
Ele rapidamente moveu a mão com desdém. “Não estou bravo
com você. Estou bravo com Jordy por ter trazido vocês duas. Eu
sabia que vocês poderiam virar um alvo. Os homens de Kadyrovic
devem ter me visto seguindo-o. Caralho.”
“Kadyrovic…”, sacudi a cabeça. Eu ainda estava meio zonza.
“Acho que não. O homem queria me roubar. Kaylee disse que ele
pegou meu dinheiro do bolso…”
“Ou talvez ele estivesse tentando pegar sua chave do hotel.
Que não estava no seu bolso. Preciso pedir ao gerente que mude a
fechadura.”
“Você acha… você acha que Kadyrovic enviou aquele homem
para tentar me roubar e obter meu cartão do hotel?”
“Não sei o que eu acho. Caralho.”, Harrison se levantou e
começou a caminhar. “Merda. Também perdi minha câmera. Preciso
encontrá-la e apagar os registros. Merda. Há muita evidência lá. A
missão toda vai ser comprometida. Caralho. Eu fodi a porra toda.”
“Muitos caralhos.”, eu disse. “E não do tipo bom.”
Minha piada não surtiu nenhum efeito. “Você disse que alguém
estava te vigiando em Istambul. Você viu a pessoa? Era o mesmo
homem?”
“Eu… eu não sei. Talvez eu tenha imaginado. Se bem que
agora vou ficar toda paranoica. Kaylee também. Pobrezinha, ela é
muito nova para testemunhar algo assim…”
“Kaylee é mais forte do que qualquer criança de oito anos.”,
Harrison disse. “Precisamos todo o país. Ir para casa imediatamente
agora.”
“Ir para casa? E a missão?”
“Foda-se a missão!”, ele gritou. “A vida de Kaylee está em
perigo. Assim como a sua. Nunca deveríamos ter feito isso.”, ele
sacudia a cabeça. “Não sei por que deixei Jordy me convencer.
Archer é bem influenciável as vezes, mas eu deveria saber. Eu—”
Ele parou de falar quando o interrompi com um beijo.
Eu não tinha planejado. Não foi premeditado. Mas eu vi o quão
perturbado ele estava, pensei no fato de ele ter me salvado de um
assalto ou de coisa pior… e simplesmente não podia não beijá-lo.
Assim como das outras vezes, seus lábios ganharam vida
quando tocaram os meus. Mas daquela vez, mais do que nunca.
Entretanto, durou só um instante, como se fosse um raio de prazer.
Então ele me afastou com uma palma forte.
“Não,”, ele gritou, “distrações são os motivos de estarmos
nessa bagunça.”
“Eu sei que você tem pensado nisso.”, sussurrei.
“É claro que eu tenho. E essa é a merda do problema!”
Harrison se aproximou de mim, com raiva, desejo e medo. Eu
podia praticamente sentir o calor irradiando do seu corpo. Ele estava
cheio de emoções, mais do que eu jamais tinha visto. Aquilo me fez
perder o fôlego de uma forma que eu não conseguia entender.
Que bom que ele está do meu lado.
“Preciso fazer umas ligações.”, Harrison disse e foi para o seu
quarto.
Eu me sentia suja então tomei um banho. Não que tenha
ajudado muito. Eu tinha perdido algo que não poderia ser
substituído. Minha inocência.
Eu queria estar na Carolina do Norte agora. De repente, o
mundo não parecia mais um lugar empolgante.
Eu também me sentia incrivelmente culpada por beijar
Harrison. A vida de Kaylee estava em risco e minha reação foi
pensar em romance? Aquilo só mostrava que minhas prioridades
estavam fora de ordem. Harrison estava certo: eu era uma
distração.
Jordy e Archer voltaram para casa e ficou imediatamente claro
que eles não sabiam o que havia acontecido. Mas aquilo mudou
quando Kaylee os abraçou e começou a tagarelar.
“Fomos para a feira e Trish queria comprar presentes, mas
então um homem agarrou o braço dela, roubou o dinheiro dela, aí o
papai atingiu o homem e salvou o dia.”
Harrison saiu do quarto e explicou a situação com mais
detalhes. Jordy xingou. Archer sacudiu a cabeça, então pegou seu
telefone e atendeu.
“Você está bem?”, Jordy me perguntou.
Assenti. “Acho que sim. Só meio abalada. Poderia ter sido
pior.”
Ele se sentou no sofá e me abraçou. Em segundos, toda a
minha ansiedade derreteu. Eu me sentia segura nos seus braços e
não queria que ele me soltasse.
“Abandonei meu posto para salvá-las.”, Harrison disse. “Perdi a
câmera. Fiz algumas ligações, mas ninguém a encontrou.
Provavelmente uma criança pegou.”
“Compramos outra.”, Jordy acariciava minha perna de forma
reconfortante. “A única coisa que importa é que todos estão bem.”
“Não, não é a única coisa que importa.”, Harrison argumentou.
“Tirei fotos de Kadyrovic com aquela câmera e se alguém as vir,
arruína nosso disfarce. Porra, já deve estar arruinado!”
“Olha a boca, papai.”, disse Kaylee.
O peito de Harrison se encheu quando ele respirou fundo.
“Pomba. Eu disse pomba.”, então ele se virou para Jordy. “Não acho
que foi um roubo aleatório. Acho que alguém estava tentando obter
o cartão do nosso quarto. Pedi ao gerente que desabilitasse o
número de ID. É melhor trocarmos todos os cartões.”
“E quem poderia querer entrar no nosso quarto?”, Jordy
perguntou.
“Kadyrovic,”, Harrison respondeu como se ele fosse um idiota,
“provavelmente ele já sabe sobre nós.”
“O que mais te faz pensar isso?”, Jordy perguntou.
“Não preciso de mais evidências. É realmente óbvio para
caralho.”
“Roubos aleatórios acontecem o tempo todo. Especialmente
com pessoas que tem uma cara irremediável de turista.”, Jordy me
olhou. “Sem ofensas.”
“Sem chance de isso ser uma aleatoriedade do car—”,
Harrison parou de falar. “Do carvalho.”, Archer, me ajuda aqui. Você
é o cuidadoso.”
Archer tinha acabado de desligar o telefone. Ele se virou para o
resto de nós com olhar determinado.
“Nada disso importa, porque acabei de receber uma ligação.
Kadyrovic quer conhecer a cidade no nosso helicóptero amanhã.”,
ele assentiu. “É hora de agir.”
34

Jordy

Assim que descobri tudo o que tinha acontecido, uma chave


virou na minha cabeça. Entrei em modo protetivo, me certificando de
que Kaylee estava bem—e na sequência Trish. As duas ainda
estavam agitadas com o possível roubo, mas a parte disso,
pareciam bem.
Então comecei a pensar no que eu queria fazer com o cara que
a atacou. Provavelmente havia câmeras de segurança das lojas da
feira; eu podia ver tudo até achar o cara. A polícia de Bacu era
notoriamente corrupta, então o suborno certo nos levaria até as
câmeras de segurança da cidade. Dava para rastrear o cara, era
possível encontrá-lo.
E então eu o surraria até ele ficar no limite da vida.
Me chocou a forma como eu me sentia protetivo em relação a
Trish. Eu sempre tinha sido assim com Kaylee, é claro. Não existe
nada comparado à forma como um pai se sente em relação a
filhinha. Mas Trish não passava longe, mesmo que eu só a
conhecesse por no máximo um mês.
Temos algo especial, pensei enquanto a tranquilizava no sofá.
E é mais do que apenas físico.
O que faríamos quando voltássemos para casa?
Aquele era um problema para depois. E eu o arquivei
mentalmente. Era hora de me concentrar na missão. Sem mais
distrações.
“Esqueçam a missão.”, disse Harrison. “Deveríamos partir
hoje.”
Archer ficou surpreso. “Depois disso tudo você quer arrumar as
malas e ir embora?’
“Sim. Isso cheira a armadilha.”
Archer gargalhou. E eu gargalhei com ele.
“Quais são as chances?”, Harrison insistiu. “Estamos
esperando esse imbecil checheno marcar um passeio e por acaso
ele marca algumas horas depois de Trish e Kaylee serem atacadas?
É coincidência demais.”
“As vezes uma coincidência é de fato só uma coincidência.”,
disse Archer. “Eu não acho que esses dois eventos estão
relacionados.”
“Se Kadyrovic soubesse que algo estava para acontecer,”, eu
disse, “não ficaria assustado? Por que cair diretamente na nossa
armadilha?”
Harrison cerrou os dentes. “Eu não sei. Mas não gosto disso. A
coisa toda não me cheira bem. Eu posso sentir nos ossos.”
“Vamos tomar precauções extras amanhã,”, disse Archer, “eu
levo uma arma no helicóptero, contratamos alguém para levar as
garotas para o aeroporto.”
As garotas. Não sei por que, mas gostei de como aquilo soou.
Nossa pequena família mercenária.
“E se alguma coisa parecer suspeita amanhã,”, Archer
terminou, “cancelamos tudo. Mas até lá, seguimos com o plano. Tem
muito dinheiro em jogo. Não queremos abandonar o contrato e
comprometer nossa relação com a Companhia Mathos.”
Foi aquela parte que convenceu Harrison. Se desistíssemos do
contrato tão tarde, toda a empresa se prejudicaria. Poderíamos ser
banidos de contratos futuros, ou pior, sermos dispensados
completamente.
“Não gosto disso.”, Harrison repetiu.
“Não gosto de vários aspectos do meu trabalho.”, Archer
concordou. “Mas ainda assim, faço. Foco na extração de amanhã.”,
ele deu um tapinha no ombro do homenzarrão. “Vai correr tudo bem,
Harrison, prometo.”
Ele soltou um grunhido de desaprovação.
Pedimos jantar no quarto. Harrison e eu pegamos o carrinho no
corredor. O camareiro que tinha entregado estava parado no fim do
corredor, perto dos elevadores, e acenou e fez uma mesura
educadamente. Quando voltamos para dentro do quarto, Harrison
removeu as tampas das vasilhas e cheirou a comida de forma
suspeita. Mas depois de experimentar algumas colheradas, ele
relaxou.
Kaylee estava totalmente inabalada pelos acontecimentos na
feira. Ela parecia pensar que era um tipo de jogo, e explicou que
queria ter um arco-e-flecha como seu personagem em Minecraft.
“Eu sou realmente boa em atingir aranhas.”, ela disse
confiantemente. “Os Creepers são mais difíceis.”
“Talvez possamos te dar um no Natal.”, eu disse.
Archer me olhou de cara feia.
“No Natal de 2029,”, adicionei rapidamente, “quando você for
adolescente.”
Depois do jantar, nós três fomos para o escritório da cobertura
para revisar os planos do dia seguinte pela última vez. Archer
levaria Kadyrovic até o helicóptero e o pilotaria. Eu ficaria no solo,
como em todos os passeios. Eu fecharia o escritório para o almoço,
mas na verdade estaria a caminho do aeroporto.
“Vou levá-los a uma altitude segura, travar o manche
direcionado para a frente,”, Archer explicou, “então pegarei o
paraquedas debaixo do meu banco e saltar da cabine. O helicóptero
vai cair em vinte ou trinta segundos. Harrison, você vai esperar em
algum lugar na zona da queda para me extrair. Então vamos direto
para o aeroporto e tomaremos chopes celebratórios em Bucareste
antes do nosso voo de conexão de volta para os Estados Unidos.
Moleza.”
“Se tudo sair conforme o plano.”, Harrison murmurou.
Um clima inquieto e sombrio pairou entre todos naquela noite.
Era como se ninguém soubesse o que fazer. Assim que Kaylee
dormiu, Trish disse que ainda estava tensa e que iria para a cama
cedo. E eu li as entrelinhas: ela não queria transar naquela noite.
Fiquei um pouco desapontado, mas entendi. Meus nervos
estavam à flor da pele também. Era sempre difícil para mim relaxar
antes de uma missão realmente grande.
Entretanto, depois de escovar os dentes, eu não queria ir para
a cama. Então atravessei o corredor, bati suavemente na porta de
Trish e entrei. Ela estava sentada na cama, mexendo no seu celular.
“Oi.”, eu disse.
Ela sorriu apologeticamente. “Desculpa, mas não estou no
clima para nada hoje. Tudo bem?”
“É claro que tudo bem.”, eu disse, fechando a porta atrás de
mim. “Não foi para isso que vim aqui.’
Ela fez uma careta. “Então por que você veio aqui?”
Sem nenhuma palavra, me deitei debaixo das cobertas com
ela. Puxei sua cabeça para o meu peito e gentilmente acariciei suas
costas.
“As vezes um cara só quer carinhos.”, eu disse.
Ela gargalhou. Carinhos são sempre bons! Desde que você
fique de pijama. Não tente me provocar.”
“Combinado.”
Trish me abraçou e eu saboreei sua pele na minha. Ela
provavelmente pensou que eu estava ali para confortá-la, quando na
verdade era o oposto. Sua presença era calmante. Me ajudava a
parar de me preocupar com o dia seguinte.
“Você está preocupado com amanhã?”, ele perguntou
suavemente.
Bufei. “Você leu minha mente. Estar com você ajuda.”, arrastei
meus dedos pela nuca dela. “Quando estou com você, sinto que não
preciso me preocupar com nada no mundo.”
Ela fez um barulhinho feliz e me abraçou com mais força. Sim,
mesmo se sexo fosse uma opção, eu escolheria carinhos. Isso é
muito melhor que fazer amor.
“Posso te pedir uma coisa?”, perguntei.
“Ahm”, ela respondeu, “o que?”
“Nada ruim. Só um pequeno favor.”
“Qualquer coisa.”
Estiquei o braço até meu pescoço e removi minhas chapas de
identificação do Exército. As depositei em uma de suas palmas e
fechei sua mão.
“Cuide delas para mim. Até nos encontrarmos no aeroporto.”
Ela encarou as plaquinhas na mão. “É claro. Eu as mantenho
em segurança.”
Vê-la pendurar o cordão no pescoço e colocar as placas dentro
da blusa do pijama me fez relaxar. Achei que ela não fosse
concordar. Mesmo que fosse por um só dia, para mim era um
grande compromisso. Como dar as chaves do meu apartamento
para alguém.
Mais como as chaves do meu coração. Pensei e dei uma
risadinha com a metáfora estúpida.
Trish me olhou com seus olhos grandes. “O que é tão
engraçado?”
Eu queria contar a ela a piada ridícula, mas não queria
transformar aquilo em algo grande. “Nada.”
Antes que ela pudesse insistir, alguém bateu na porta
suavemente. Nós dois ficamos tensos, com medo de ser Kaylee,
mas quando a porta abriu, Archer entrou no quarto.
“Não estou aqui para transar, posso te garantir. Eu queria—
ah.”, ele piscou quando me viu. “Eu vim te confortar.”
“Não preciso de conforto.”, provoquei. “Mas acho que Trish
apreciaria um pouco mais de calor masculino.”
Trish gargalhou da piada, Archer também. Ele se aproximou do
outro lado da cama e Trish se virou para abraçá-lo. Eu me virei junto
com ela e a abracei por trás.
“Eu preciso de um pouco de conforto, na verdade.”, Archer
revelou.
“Sério? Você ainda fica nervoso antes de missões?”, Trish
perguntou.
“Geralmente não, mas já faz algum tempo que não participo de
um acidente de helicóptero. E vai ser a primeira vez que derrubo um
de propósito."
“Eu achava que derrubar um helicóptero era
surpreendentemente fácil.”, ela disse.
“E é. Bem fácil na verdade. O difícil é derrubá-lo e sair vivo.”
“Ah, sim, essa parte é importante.”
Archer me olhou e então voltou a olhar para Trish. “Na
verdade, tenho outro motivo para estar aqui essa noite. Se algo der
errado amanhã, não pode haver nenhuma evidência de que somos
mercenários americanos ou britânicos. Vou remover tudo o que
pode ser identificável do meu corpo. Mas eu gostaria que você
ficasse com as minhas plaquinhas de identificação…”
Rolei meus olhos. “Ah, pelo amor de Deus…”
“Eu não pretendia fazer disso uma grande coisa.”, disse Archer,
me encarando. “Só queria que alguém cuidasse delas por
segurança. E eu confio mais em Trish do que nas companhias
aéreas com a minha bagagem.”
Trish gargalhou. “Isso é muita pressão.”
Archer fez uma careta. “Sinto muito. Eu não pediria se
pensasse…”
“Não, não é isso.”, ela puxou minhas plaquinhas de dentro do
pijama. “É por isso que estou rindo.”
Archer olhou para as plaquinhas e então para mim. “Ah, para!”
“O que? Cheguei primeiro!”
“Só porque eu fui gentil o suficiente para garantir que nossa
filha estivesse dormindo antes de invadir o quarto da babá.”, ele
justificou.
“Kaylee dormiu faz uma hora. Você só está bravo porque
venci.”
“Posso cuidar dos dois!”, Trish insistiu. Então pegou o cordão
das plaquinhas e o colocou em volta do pescoço. “Vocês dois estão
confortáveis em dormir comigo ao mesmo tempo, mas é estranho
que eu use os cordões de ambos enquanto vocês trabalham? Isso é
ridículo!”
Archer e eu nos entreolhamos. “Este é um ponto válido.”
“Tudo bem, por mim, desde que esteja bom para você.”, eu
disse. “Desde que nada seu encoste em nada meu.”
“Concordo. Nada de encostar.”
Trish fez uma careta engraçada. “Quem se importa se os
cordões se encostarem? Não é como se vocês…”, ela parou. “Ah,
entendi. Ha ha.”
Ela ajustou as plaquinhas dentro da blusa do pijama, então se
ajustou entre nós novamente. Moldei meu corpo no dela e suspirei
rapidamente.
“Eu sou uma distração?”, ela perguntou.
“Sim.”, eu disse.
“Bastante.”, Archer concordou.
“Sério?”
“Sim, mas você é uma boa distração.”
“Então não atrapalhei a missão?”
“O que? É claro que não.”, respondi.
“Nem um pouco.”, Archer disse.
“Ok. Que bom.”, ela parou. “Não quero ser uma má distração
nunca.”
“Não precisa se preocupar com isso,”, eu disse, beijando sua
nuca, “só temos mais um dia aqui. E fim. Voltamos todos para casa.”
Eu disse aquilo com a intenção de tranquilizar, mas tive a
impressão de que só consegui deixar Trish mais tensa.
35

Jordy

Com a cabeça enfiada nos cabelos loiros sedosos de Trish,


peguei no sono quase imediatamente. Dormi mais profundamente
do que em muito tempo—a última vez que eu tinha dormido tão bem
daquele jeito tinha sido na minha primeira noite com Trish, na qual
acidentalmente acordamos abraçados. Me aproximei mais dela e
enrolei um braço ao redor do seu corpo, segurando-a mais perto de
mim e evitando Archer do outro lado.
Foi quando me dei conta de que mais alguém estava me
abraçando por trás. Me virei lentamente para olhar.
Os olhos castanhos de Kaylee me encaravam arregalados,
totalmente despertos.
“Docinha? O que você está fazendo aqui?”
“Tive um pesadelo com o homem mau.”, ela sussurrou.
“Ah.”
“É por isso que vocês estão aqui com Trish?”, ela perguntou.
“Por que ela também teve um pesadelo com ele?”
“Hm… sim. É exatamente por isso.”
Archer deve ter ouvido alguma coisa, porque se ergueu na
cama. “Fofinha! Bom dia! Estamos fazendo, hm, uma festa do
pijama!”
Trish se mexeu entre nós. “Seria mais divertido se não
estivéssemos usando—”, tapei a boca dela com a mão antes que
ela pudesse terminar.
“Diga bom dia para Kaylee,”, eu disse, “ela teve um pesadelo.
Eu estava dizendo a ela que você também teve um, por isso
estamos aqui te confortando.”
“Ah, sim! Um pesadelo!”
Kaylee se espreguiçou e rolou da cama. “Quero café da
manhã!”
Todo mundo se levantou e se mexeu, preparando tudo para a
manhã. Tomei banho, me barbeei e fiz minhas malas. Quando entrei
na sala de estar, Archer estava pronto para ir e explicando tudo para
Trish.
“…vai chegar as onze e levar vocês para o aeroporto. A
recepção vai verificar a credencial dele e liberar sua entrada aqui.”
“Ok.”, disse Trish.
“Depois de ontem, não queremos arriscar,”, Archer continuou,
“então espere que ele chegue até a porta. Ele vai escoltar vocês até
o carro.”
“Entendido.”, disse Trish.
Do lado deles, Harrison assentia. Aquilo tinha sido sua
requisição. E mesmo com todas as precauções, ele não parecia
satisfeito.
Então nos despedimos de Kaylee. Eu a abracei apertado e
disse que nos encontraríamos no aeroporto com uma surpresa
especial. Harrison a ergueu e girou a garota pelo quarto e sua
trança loira flutuou atrás dela enquanto ela gritava. Archer a beijou e
pediu que ela cuidasse bem de Trish.
“Ela é a babá!”, Kaylee respondeu. “É ela quem precisa cuidar
de mim.”
“Ah, certo,”, Archer disse, dando um tapinha na própria testa,
“imensas desculpas, eu vivo esquecendo essas coisas.”
Beijei Trish e a abracei por um longo tempo. Dava para ouvir as
plaquinhas de identificação tilintando logo acima dos seus seios.
Archer fez o mesmo, segurando sua bochecha por alguns
momentos antes de se afastar.
“Você não deu um beijo de tchau na Trish.”, Kaylee disse a
Harrison.
O homenzarrão se zangou e sacudiu a cabeça. “Chega de
joguinhos. É hora de ir.”
O seguimos para o corredor. “Não precisava ser rude.”, eu
disse.
Ele não desacelerou. “Que se foda. Vamos terminar esse
trabalho e ir embora para casa.”
Não conversamos dentro do elevador. Eu sabia que era inútil
argumentar com Harrison. Para ser completamente honesto, eu
sabia que tínhamos sorte por ele ainda estar concordando com o
plano original.
Enquanto caminhávamos pelo lobby, notei alguns olhares da
equipe do hotel. Estávamos acostumados com aquilo, três
americanos musculosos e grandes se destacavam entre os outros
hospedes do hotel. Mas havia um homem específico, um camareiro
atrás do balcão da recepção, que nos olhou por tempo demais. E
quando eu me virei para ele, ele imediatamente sorriu—e parou de
sorrir assim que achou que eu não estava mais olhando.
Um alarme soou na minha cabeça. Estou sendo paranoico ou
tem alguma coisa estranha com esse cara?
“É aqui que nos separamos.”, Archer disse a Harrison do lado
de fora. “Te vejo no ponto de extração.”
Ele apertou nossas mãos. “Boa sorte.”, e então nos separamos
em direções diferentes.
Archer e eu seguimos em silêncio enquanto dirigíamos para o
escritório de turismo. Antes de chegarmos, era um negócio falido.
Havia vários lugares do mundo onde passeios de helicópteros eram
procurados, mas Bacu não era um desses lugares. Entretanto, a
Companhia Mathos, que havia nos contratado, comprou a empresa
como fachada para canalizar dinheiro. E seria muito útil para aquela
missão. A queda do helicóptero aconteceria e eles receberiam
dinheiro do seguro. Seria uma vitória para todos.
Assim que chegamos lá, fiz o trabalho sujo de uma vez. Fui até
o freezer industrial para pegar o corpo. Ele estava enrolado em
plástico, que derreteria na queda, mas eu ainda assim senti meu
estomago embrulhar quando coloquei o corpo em uma maca e o
empurrei até o helicóptero dentro da garagem do heliporto.
“Não acredito que fiz isso todo santo dia.”, murmurei.
“Totalmente sem necessidade porque tínhamos avisos prévios…”
“Pare de reclamar.”, Archer disse enquanto verificava sua lista
de afazeres antes de voar. “Este é o cenário ideal. Estamos mais
preparados.”
“Não estou reclamando. Só comentando.”
“Comente em silêncio. Estou tentando me concentrar.”
Voltei para o escritório para cuidar das outras coisinhas que
precisavam ser feitas antes de o passeio falso começar, como se
fosse um dia normal. Mas não era. Eu não conseguia parar de
pensar que aquele dia não tinha nada de normal.
Naquele dia, mataríamos um homem.
Eu já tinha matado antes. Não era novidade. Mas em todas as
situações, eu estava atirando em alguém que atirava em mim. Era
justo. Ou pelo menos autodefesa.
Mas aquilo?
“Vai dar tudo certo.”, disse Archer. Ele deve ter sentido minha
tensão.
“Eu sei que ele merece isso,”, respondi, “mas ainda acho difícil
me acostumar com a ideia.”
“Pense nisso como o abate de um cachorro raivoso.”, Archer
disse.
Olhei para ele. “Cara, isso não me faz me sentir nem um pouco
melhor. Isso é ainda pior! Cachorros raivosos não tem culpa de
nada!”
Ele suspirou e colocou uma mão no meu ombro. “Vai ser rápido
e você nem vai estar lá. Pense nas vidas que estamos salvando ao
eliminarmos este homem. Ou ainda melhor, não pense em nada.”
Aquilo era impossível. Quando me sentei na mesa e encarei o
calendário do computador com a lista dos passeios do dia, só o que
me vinha a cabeça era o que estávamos prestes a fazer.
Exatamente na hora marcada, uma Mercedes-Benz preta
parou na porta do escritório. A porta do carro, estacionado
horizontalmente, usando três vagas, se abriu e dois seguranças
usando moletons de capuz desceram e abriram a porta de trás. Os
capuzes escureciam suas faces.
Mas o homem que saiu do carro não se importou em cobrir seu
rosto. Aldi Kadyrovic tinha um nariz de gavião e olhos pequenos.
Seus cabelos escuros estavam tão sebosos que pareciam
molhados. E ele tinha uma cara permanente de escárnio. Ele
encarou a sala como se tudo aquilo fosse uma piada para ele.
Se eu o tivesse conhecido aleatoriamente na rua, eu saberia
que ele tinha mal no seu coração. Então relaxei um pouco. Aquilo
tornava tudo mais fácil. Sorri forçadamente quando seu guarda-
costas abriu a porta da sala.
“Bem vindo a Elite - Passeios de Helicóptero.”, eu disse. Fazer
aquilo a semana toda tinha me ajudado no meu tom falso. “Sr.
Kadyrovic, o senhor chegou na hora. Por favor, sente-se enquanto
pego alguns documentos que precisam ser assinados. Posso te
oferecer água? Café?”
Ele olhou ao redor. “Onde está Daniel Ricciardo?”, ele
perguntou com um tom rude, com a voz carregada de sotaque. Era
a voz de um homem mau.
Sorri apologeticamente. “Ele vai se juntar a nós depois do
passeio, receio. Mas acredite. Vai valer a pena esperar. Sr.
Ricciardo está ansioso para conhecê-lo. Ele é muito seletivo com as
pessoas que escolhe para meets and greets individuais.”
Kadyrovic não aceitou minha oferta de se sentar e permaneceu
de pé com os braços cruzados. Um de seus guarda-costas
preencheu sua papelada e o outro ficou parado no canto me
encarando. Seu capuz cobria o rosto, e eu não conseguia ver bem,
mas tive a impressão de que ele me olhava com raiva.
Ele tem direito de suspeitar, pensei. Vamos matar seu mestre
hoje.
Archer entrou pelo fundo da loja e se apresentou. Ele apertou
as mãos de Kadyrovic, mas nenhum dos guarda-costas fez menção
de fazer o mesmo. O clima era tenso. Forçado.
“Estamos prontos para partir ao seu lazer.”, Archer disse.
“Acabei de estacionar o pássaro na pista. Por favor, me siga…”
“Anton também vai.”, Kadyrovic disse, gesticulando para o
segurança que estava me encarando. “Vasili vai ficar aqui
esperando.”
Archer olhou para mim. Não era parte do plano. Kadyrovic
havia especificamente solicitado um passeio individual. Só ele. Sem
guardas.
Não importa, Archer disse com o olhar. Não muda nada.
“Tudo perfeitamente bem.”, ele disse com um sorriso
desarmante. “Temos muito espaço. Vamos? O dia está lindo para
estar nos céus…”
O outro segurança e eu ficamos parados na porta de trás do
prédio, assistindo os demais embarcarem no helicóptero. As hélices
giraram e eles ganharam altura. Esperamos que eles estivessem
fora da nossa visão antes de voltar para o escritório.
Olhei para o outro homem, ele se sentou em uma das cadeiras
e encarou o nada. Aquilo também não era parte do plano.
Esperávamos que ele fosse ficar no carro. Mas ultimamente, não
importava. Quando eu fosse sair para o meu almoço falso, ele
poderia esperar lá dentro ou ir para o carro. Não importava.
Espero muito que o plano funcione.
36

Trish

Kaylee adorava fazer as malas. Ela achava que era um jogo,


tipo Tetris, encaixar tudo na sua malinha rosa. Ela fazia careta com
a seriedade de uma menina de oito anos, arrumando os itens aqui e
ali.
Eu estava uma pilha de emoções estranhas enquanto fazia
minha mala. Parecia que tinha sido no dia anterior que eu tinha
empacotado tudo para uma aventura de um mês. Eu estava
nervosa, mas mais animada na época. Eu não tinha ideia do que o
futuro próximo me reservava.
Nunca em um milhão de anos eu teria adivinhado o que
aconteceria.
Havia uma energia nervosa envelopando minhas emoções
enquanto eu dobrava minhas roupas. Eu ainda me sentia meio
violada depois do ataque na feira. Me sentia triste por ir embora. E
me sentia profundamente e pessoalmente insegura sobre o que
aconteceria a seguir. O futuro era uma massa obscura,
completamente desconhecida e imprevisível.
Aparentemente, eu não era a única pensando naquilo.
“O que você quer fazer assim que chegar em casa?”, Kaylee
perguntou, fechando o zíper da sua mala.
“Como assim?”
“Podemos jogar um jogo novo.”, ela disse. “Ou podemos
brincar de K’nex. Eu só trouxe uma caixa de peças, então quando
chegarmos em casa podemos construir coisas muito grandes. Ou
podemos brincar de outra coisa, se você quiser.”
Sorri com a inocência da garotinha. “Não sei o que vai
acontecer. Devo ir para casa. Para a minha casa.”
“Mas você vai voltar, não vai?”,
“Talvez.”
“Ela se virou para mim e respondeu rapidamente: “Talvez é o
que os meus pais dizem quando na verdade é não, mas eles não
querem dizer. Por que você não vai brincar comigo? Não
precisamos fazer nada novo. Podemos continuar jogando Minecraft.
Nós precisamos terminar o jogo. Quase temos diamantes o
suficiente para fazer um conjunto completo de armadura. Então
podemos usar um portal e ir para Nether!”
“Você está certa, que tolice da minha parte,”, eu disse, “temos
que terminar nosso jogo no Minecraft! E pensar no que fazer a
seguir…”
Ela assentiu como se aquela fosse a resposta certa desde o
início. Sorri tristemente. Se ao menos fosse simples assim.
As onze horas em ponto, o telefone da cobertura tocou. “Bom
dia, Senhora Caspian?”
Senhora Caspian. Eles devem ter pensado que eu era casada
com Archer. Aquilo me fez ter novos e confusos sentimentos. “Aqui
é Trish.”
“Sim, olá. Aqui é o gerente do hotel. Seu motorista chegou. Já
conferi suas credenciais e tudo parece estar em ordem.”
“Perfeito.”, respondi. “Por favor, peça para ele subir.”
“Imediatamente, madame.”
Desliguei o telefone e me virei para Kaylee. “Nosso motorista
chegou. Você está pronta para ir?”
Ela olhou em volta e apontou para os objetos: “Mala. Mochila.
Tablet. Sim! Tudo pronto!”
“Você precisa de um lanche antes de irmos? Posso fazer um
sanduíche rápido. Acho que temos um saco de salgadinhos
ainda…”
“Posso esperar até o aeroporto.”, ela respondeu. “Papai Jordy
disse que eles tem uma surpresa para mim no aeroporto. Tomara
que seja sorvete!”
Bateram na porta. Para reforçar nossa segurança, usei o olho-
mágico. O homem parado do lado de fora parecia a descrição que
Archer tinha me dado, e usava o distintivo no peito com três anéis
que eu deveria conferir. E o mais importante, não era o homem que
tinha me agredido. Aquilo era óbvio, mas eu deveria me certificar de
qualquer forma. Tudo parecia bem.
Abri a porta. “Olá, sou Trish, esta é Kaylee.”
O homem sorriu e pisou no vão da porta. “Já me contaram tudo
sobre você, madame. Estou aqui para escoltá-las.”
Ele se mexeu tão rápido que eu não percebi o que estava
acontecendo. Seu primeiro soco atingiu minha bochecha e eu vi
estrelas. O chão se moveu e atingiu a lateral da minha cabeça, mas
eu consegui amaciar a queda com o braço antes e não perder a
consciência.
“O que…”
“Mas não é para o aeroporto que estamos indo.”, ele disse,
tirando uma arma do bolso da jaqueta. Seu olhar era frio e
insensível.
“Kaylee…”, tentei me levantar, mas o cômodo girava. Não
importava o quanto eu piscasse, não conseguia recuperar o sentido
totalmente. Kaylee estava em perigo, aquilo era a coisa mais
importante. Tentei dizer a ela que corresse, mas ela ficou lá parada,
com o olhar confuso.
“Por que você machucou Trish?”, ela perguntou.
O homem afastou sua mão levantada, então se virou para mim:
“Isso é por Praga. Pelos irmãos de Anton. Certifique-se de que eles
saibam o porquê.”. Ele terminou levantando uma arma na direção de
Kaylee.
Tentei gritar, mas nenhum som saiu da minha boca, minhas
cordas vocálicas não estavam funcionando como deveriam. Eu não
conseguia me levantar. Fiquei paralisada, impotente, o pior
sentimento do mundo, e ainda pior do que o que eu tinha sentido no
dia anterior na feira, quando o assaltante me agarrou pelo braço.
Kaylee também estava congelada, encarando a pistola com olhos
inocentes, olhos que não reconheciam aquilo que viam. A cena era
horrível demais, eu não queria ver, então fechei os olhos.
Por favor, rezei. Por favor, não deixem isso acontecer.
O tiro soou opressivamente alto nos meus ouvidos. Tão alto
que tudo ficou abafado depois, como se meus tímpanos estivessem
cobertos por algodão. Abri meus olhos, não porque eu queria ver,
mas porque me perguntei se minhas preces haviam sido atendidas.
Se de alguma maneira, ele só tinha me pegado uma peça cruel.
O agressor e Kaylee ainda estavam ali parados, no mesmo
lugar de antes. O homem abaixou a arma e parecia tão confuso
quanto Kaylee. O que era estranho. Minutos antes, ele parecia
totalmente no controle. No que ele tinha atirado?
Uma mancha vermelha se espalhou no peito da sua camisa
branca, quase invisível sob a jaqueta. Ele olhou para a mancha,
tocou o vermelho e encarou as pontas dos dedos como se não
acreditasse. A arma caiu com força no chão e o homem cambaleou
e também caiu. A porta da cobertura, que se movia
automaticamente, foi bloqueada pelo seu corpo.
Ouvi passos pesados pelo corredor, então Harrison apareceu
no portal. Ele chutou alguma coisa e ouvi a arma deslizar pelo
mármore que revestia o chão. Ele abraçou Kaylee apertado, disse
alguma coisa no seu ouvido e se ajoelhou ao meu lado.
“O que ele fez?”, ele perguntou. “Onde você está ferida?”
“Ele atingiu meu rosto. Um soco.”, consegui dizer. “Minha voz
soava mais forte a cada seguindo. “O que você está fazendo aqui?”
“Não gostei desse plano.”, ele explicou enquanto me levantava
do chão e me depositava gentilmente no sofá. “Então confiei no meu
instinto. Voltei para o hotel. Ainda bem. Se eu tivesse chegado
segundos mais tarde…”
Toquei sua bochecha macia. “Você chegou bem a tempo. E
nos salvou. Duas vezes no mesmo dia.”
“Papai, o que é Praga?”, Kaylee perguntou.
Harrison virou sua cabeça na direção dela. “Onde você ouviu
isso?”
Ela apontou para o homem no chão. “Ele disse isso. E alguma
coisa sobre irmãos.”
Harisson se virou para o homem com o olhar mortal. “Docinho,
vá para o seu quarto. Preciso de privacidade.”
Assim que ela saiu, Harrison cutucou o homem com seu pé e o
virou com as costas para o chão. Então pisou no tiro no seu peito. O
homem gritou de dor.
“Você falhou, cuzão.”, Harrison rosnou para ele. “Se você me
disser por que veio aqui, talvez eu te deixe viver. Mas é melhor você
dizer rápido, porque está perdendo muito sangue.”
“Falhei?”, o homem gargalhou. “Não falhamos. Uma empresa
falsa de passeios de helicóptero? Vocês acharam que ia funcionar?”
Harrison me olhou e pela primeira vez desde que nos
conhecemos, vi que ele estava com medo.
“Fomos nós que contratamos vocês!”, o homem disse,
cuspindo sangue no processo. “Vocês caíram diretamente na
armadilha!”
Então entendi o que ele quis dizer. Ah, não. Archer e Jordy!
E sua gargalhada moribunda ecoou pelo cômodo.
37

Archer

“Se você tentar alguma coisa, matamos sua filha.”, Anton


Novak disse com escárnio.
“Vocês vão matá-la de qualquer forma.”, eu disse. As palavras
me fizeram querer vomitar. Kaylee. Meu Deus. Kaylee não.
“Talvez!”, Novak admitiu. “Mas talvez não! Ha ha ha!”
Kadyrovic manteve a arma pressionada contra o meu pescoço
durante o voo todo. Minha mente acelerou. Eu tinha certeza que
poderia jogar o helicóptero no chão antes que Kadyrovic pudesse
puxar o gatilho… mas é claro, eu morreria no processo. E aquilo
asseguraria a perdição de Kaylee. Eu não podia fazer isso. Eu
precisava sobreviver.
Então eu nos levei de volta para Bacu sem brigar, e aterrissei
no heliporto atrás do nosso escritório. Novak desceu primeiro e
apontou a arma para mim enquanto Kadyrovic fazia o mesmo. Então
eles me fizeram descer do helicóptero e atravessar a pista.
Como eu temia, Jordy estava de joelhos do lado de fora, com
as mãos amarradas nas costas. O outro guarda-costas estava ao
lado dele, apontando uma pistola na direção da sua cabeça. Jordy
me deu um olhar de derrota.
“Não é culpa sua.”, eu disse, escolhendo minhas palavras com
cuidado, sabendo que poderiam ser as últimas. “Não é culpa de
ninguém.”
“É culpa de vocês dois!”, Novak disse cantarolando
lunaticamente. Ele parecia ter usado drogas. “Vocês selaram seus
destinos fazendo o que fizeram em Praga. Meus irmãos estão
apodrecendo em uma cadeia em Hamburgo por causa de vocês!”
“Estávamos cumprindo um contrato.”, eu disse. “Não tomamos
decisões. Culpe a União Europeia, não nós.”
“Grandes governos são tão vagos e sem rosto,”, disse Novak,
“eu os culpo, mas gosto de culpar vocês também. E toda a
Compania Mathos.”, ele gargalhou novamente, sua risada beirava a
loucura. “Me dá muito prazer saber que eu usei sua própria empresa
contra vocês!”
“Como assim?”, Jordy perguntou.
Kadyrovic deu uma risadinha. “Americanos estúpidos.
Arrogantes demais para ver o que é óbvio para o resto de nós.”
“O contrato para assassiná-lo.”, disse Novak, gesticulando na
direção de Kadyrovic. “Nós assinamos este contrato. Colocamos o
dinheiro em custódia e tudo mais. O suficiente para atraí-los até
aqui. E requisitamos sua equipe especificamente. E vocês correram
para cá o mais rápido que puderam! Como mariposas na direção do
fogo! Ha ha ha!”
O guarda-costas que estava perto de Jordy interrompeu. “Amir
ainda não reportou. Suspeito que ele tenha falhado.”
“Seus homens são inúteis.”, Novak disse com acidez.
“Meus homens são muito capazes, posso te assegurar.”,
Kadyrovic pegou meu telefone e aproximou do meu rosto para
desbloquear a tela. “Merda. O grandão nos impediu de capturar a
filha e a babá.”
“Harrison Gray.”, Novak disse o nome como um palavrão. “Era
ele quem eu queria. Me dê isso.”, ele rolou a tela. “Eles estão com o
compartilhamento de localização ativado. Ele está na estrada, na
metade do caminho entre o hotel e este lugar.”, ele tocou na tela
mais algumas vezes e levou o telefone ao ouvido.
“O que vocês vão fazer?”, Kadyrovic perguntou.
Novak acenou irritado para ele. “Sr. Gray! Ou eu deveria
chamá-lo de Harrison? Não, não, espera. Vou te colocar no
autofalante. Todo mundo vai gostar disso.”
Ele tocou a tela e levantou o telefone. A voz de Harrison saiu
do dispositivo com apenas um pouco de distorção. “Eu perguntei
quem diabos está falando?”
Respondi o mais rápido que pude. “Harrison, fomos capturados
por Anton Novak e—”
O cabo da pistola de Kadyrovic atingiu a parte de trás da minha
cabeça. Caí com as mãos e os joelhos no chão, gemendo.
“Seu comparsa inglês está correto.”, Novak respondeu no
telefone. “Estamos aqui com ele e com o Sr. Mackey. Adoraríamos
que o senhor se juntasse a nossa festa.”
“Ah, mas eu estou indo mesmo.”, Harrison gritou de volta. “Eu
deveria ter te matado em Praga quando tive chance!”
“Que pena que você estava ocupado com Karina.”, Novak
respondeu. “Fiquei com medo de vocês terem se tornado mais
disciplinados desde aquela época, mas posso ver que vocês
seguem sendo desleixados. Venha para o escritório. Sozinho. Se
você trouxer mais alguém, mataremos seus sócios. E então
localizaremos sua filha.”, ele disse a palavra lentamente,
enfatizando-a. “Mas se você fizer o que estou mandando, vamos
deixá-la em paz. É você que queremos.”, ele olhou para o relógio.
“Te vejo em dez minutos.”
A última coisa que ouvimos foi Harrison gritando um palavrão
antes de Novak desligar.
“O que você quer conosco?”, Jordy perguntou.
“Ele vai nos matar.”, eu disse fracamente. Eu ainda estava de
joelhos. Não fazia sentido lutar. Pelo menos não naquele momento.
“Ah, não vamos matar vocês!”, Novak provocou. “Temos planos
muito melhores. Vou vender vocês para Kadyrovic, junto com o
contrato, evidência de que vocês iam mata-lo. Ele vai levá-los para
Moscou. Vocês vão ser expostos na televisão pelos crimes que
cometeram. Um exemplo de intervencionismo ilegal da OTAN e dos
Estados Unidos.”
“Não representamos a OTAN nem os Estados Unidos.”, disse
Jordy. “Somos mercenários autônomos. Caralho, foi você quem nos
contratou para vir atrás de Kadyrovic!”
“Não importa.”, disse Kadyrovic com um sorriso. “Vamos
conseguir a propaganda que queremos.”
“E eu vou me tornar um homem rico.”, disse Novak. “Talvez rico
o suficiente para tirar meus irmãos da cadeia. Veremos. Aldi? Meu
dinheiro!”
Kadyrovic zombou. “Você vai receber quando o trabalho
terminar.”
Novak caminhou e chutou a canela de Jordy. “Eu entreguei
dois terços deles. Certamente já mereço dois terços do dinheiro.
Vamos lá. Dinheiro me faz feliz. Mais feliz do que ver esses dois de
joelhos, implorando por suas vidas.”
O olhei com desprezo, mas não disse nada. Não tínhamos
implorado por nossas vidas. Ainda não. Ainda nos restava
dignidade.
Ah, Kaylee. Sinto muito.
Kadyrovic suspirou e pegou seu celular. “Como você quiser.
Iniciarei a transferência…”, ele parou quando o telefone tocou. Com
uma careta, ele atendeu. “Da?”
Não estava no autofalante, mas o volume estava alto o
suficiente para que eu pudesse ouvir. “Coloquem suas armas no
chão.”
Kadyrovic grunhiu. “O que?”
“Coloquem suas armas no chão e fiquem de pé no centro do
heliporto com as mãos para o alto. Falam isso e vocês vão todos
viver.”
“Quem é?”, Novak perguntou.
Quem é? Repeti mentalmente. Não reconheci a voz. Parecia
estrangeira.
Kadyrovic começou a se virar. “Não gosto de ameaças.”
“Este é seu último aviso.”, a voz alertou.
“Quem é?”, Novak repetiu. Ele estalou os dedos no ar. “Aldi.
Quem é? Responda agora!”
“É o segurança do perímetro?”, Kadyrovac perguntou.
O guarda-costas que estava próximo de Jordy ficou tenso. “Era
ele quando eu conferi pela última vez. Vinte minutos atrás.”
Kadyrovic escaneou a área ao nosso redor e eu fiz o mesmo.
Estávamos em um setor industrial da cidade, com armazéns de
todos os lados. Senti uma pontada de esperança.
“Escute aqui seu pedaço de merda…”, Kadyrovic começou.
E tudo aconteceu muito rapidamente.
Assim que ele disse as últimas palavras, ouvimos o disparo de
um rifle. Quase no mesmo instante, a perna de Kadyrovic explodiu
em sangue. Ele caiu no chão gritando. O outro guarda-costas
levantou a pistola, procurando ao redor. O rifle oculto disparou
novamente e o atingiu no peito.
Novak era rápido. Ele pulou no chão quando ouviu outro
disparo. Uma bala sibilou no ar e atingiu o chão perto de nós. A
parte treinada do meu cérebro me informou que o atirador estava
em algum lugar elevado. Provavelmente no telhado de algum
daqueles armazéns. Novak escorregou pelo chão e se aproximou de
mim, enrolando uma mão no meu pescoço e pressionando a pistola
na minha têmpora.
“Vou atirar!”, ele gritou. “Renda-se ou eu o mato!”
O clichê de ver a vida passar diante dos olhos quando se está
prestes a morrer não acontecia comigo—não naquele dia nem nas
outras duas vezes que pensei que estava perto da morte na vida.
Meu corpo todo relaxou. Uma sensação arrebatadora de calma me
invadiu. Eu estava totalmente confortável com o meu destino,
porque não estava no controle. Havia um certo tipo de paz naquilo
tudo. Na aceitação de qualquer coisa que o universo tinha para mim.
Eu te amo, Kaylee. Pensei. E então, um segundo depois, Trish
apareceu na minha mente, ao lado da minha filha.
Houve um disparo, mas ele não veio do mesmo rifle de antes.
Veio de trás de nós. Senti uma pontada na minha escápula, seguida
imediatamente por uma dor entorpecente.
Novak soltou meu pescoço e caiu no chão. Me virei para olhar,
embora já soubesse o que veria. Jordy estava parado, apontando a
arma do guarda-costas para nós. E Anton Novak, o homem que
tinha fugido em Praga tantos anos antes, estava esticado no chão
como o próprio Jesus Cristo. Um dos seus olhos era um borrão de
sangue, por onde a bala tinha saído do seu cérebro e me atingido
nas costas.
E como se pensar no assunto tivesse conjurado toda a dor,
minha escápula de repente parecia estar em chamas. Gemi e cai
para a frente, deslocando meu peso para o braço esquerdo.
Jordy se aproximou em um instante, e rasgou minha camiseta
com a monograma da empresa falsa de turismo na altura do
ferimento.
“Bela pontaria!”
“Ei, eu fiz o meu melhor.”, ele respondeu. “Só tive meio
segundo para decidir o que fazer.”
“Não. Foi. Sarcástico.”, eu disse com os dentes cerrados.
Parecia que meus nervos estavam mergulhados em suco de limão.
“Foi. Um. Bom. Tiro. Como estou?”
“Não é profundo. Acho que consigo ver a bala, mas atingiu seu
osso.”, ele olhou ao redor, “Quem diabos nos salvou? Harrison?”
“Não foi ele.”, eu disse. “Voz diferente. E nós não. Temos. Arma
de. Calibre Grosso.”
Jordy apontou. “Lá.”
Do outro lado da área aberta, a pelo menos um campo de
futebol de distância, um homem com um rifle se pendurava para
descer uma escada anexada à parede de um armazém. Ele jogou o
rifle no chão, pegou uma pistola da cintura e se aproximou correndo.
Ele me parecia vagamente familiar, mas eu não sabia exatamente
de onde.”
“Você!”, disse Jordy. “Você trabalha no hotel. O camareiro!”
O homem o ignorou e verificou o pulso de Kadyrovic e do outro
guarda-costas. Seus movimentos eram cuidadosos e tinham
precisão militar. Ele não se deu ao trabalho de verificar o corpo de
Novak. “O trabalho no hotel é meu disfarce.”
“Então quem…”
“Sou auditor na Companhia Mathos.”, ele carregava um kit
médico e começou a abrir um rolo de gaze. “O contrato aqui em
Bacu levantou alguns alertas no escritório, então eles me enviaram
para monitorar a situação. Garantir que era tudo legítimo.”
“Claramente não.”, eu disse, fazendo uma careta enquanto ele
aplicava gaze na minha ferida.
“Eu sabia que tinha alguma coisa acontecendo com você.”,
disse Jordy. “A forma como você nos olhou hoje de manhã.”
“Chamei uma equipe de limpeza completa.”, o falso camareiro
explicou enquanto fazia meu curativo. “Eles vão cuidar dessa
bagunça. Por enquanto vamos levá-lo para um hospital e cuidar
desse buraco.”
Uma moto de trilha fez a curva rugindo ao longe, atirando pelo
beco entre os dois armazéns como se o mundo estivesse em
chamas. O cheiro de borracha queimada invadiu o ar quando
Harrison derrapou e parou na nossa frente, pulando da moto e a
deixando atingir o solo enquanto corria para o meu lado.
“Você está vivo.”, ele analisou a cena toda com uma única
olhada ao redor. “Você. Te conheço. Do hotel.”
“Ele é auditor da Companhia Mathos. Eles acharam que o
contrato era suspeito, então enviaram-no para nos monitorar. Que
sorte.”
Harrison se eriçou. “Eu sabia que vocês estavam nos vigiando.
Parte do motivo que me fez manter a guarda alta a semana toda.”
O homem suspirou. “Preciso melhorar. Em um mundo ideal,
vocês nunca saberiam da minha existência.”, seus olhos se
acenderam. “Trish e a garota estão bem? Precisei deixar meu posto
para vir aqui…”
Harrison chutou levemente o braço de Kadyrovic com a ponta
dos pés. “Um dos homens dele foi até o hotel, imitando o segurança
que você contratou para leva-las ao aeroporto. Mas eu fiquei lá um
pouco e o peguei no flagra.”
“Você não estava na zona de extração?”, perguntei. “Você não
planejava estar lá?”
Harrison pausou. “Não.”
Jordy gargalhou. “Essa é a primeira vez que fico feliz por você
não ter seguido o plano, seu filho da puta teimoso.”
38

Archer

“Se você tentar alguma coisa, matamos sua filha.”, Anton


Novak disse com escárnio.
“Vocês vão matá-la de qualquer forma.”, eu disse. As palavras
me fizeram querer vomitar. Kaylee. Meu Deus. Kaylee não.
“Talvez!”, Novak admitiu. “Mas talvez não! Ha ha ha!”
Kadyrovic manteve a arma pressionada contra o meu pescoço
durante o voo todo. Minha mente acelerou. Eu tinha certeza que
poderia jogar o helicóptero no chão antes que Kadyrovic pudesse
puxar o gatilho… mas é claro, eu morreria no processo. E aquilo
asseguraria a perdição de Kaylee. Eu não podia fazer isso. Eu
precisava sobreviver.
Então eu nos levei de volta para Bacu sem brigar, e aterrissei
no heliporto atrás do nosso escritório. Novak desceu primeiro e
apontou a arma para mim enquanto Kadyrovic fazia o mesmo. Então
eles me fizeram descer do helicóptero e atravessar a pista.
Como eu temia, Jordy estava de joelhos do lado de fora, com
as mãos amarradas nas costas. O outro guarda-costas estava ao
lado dele, apontando uma pistola na direção da sua cabeça. Jordy
me deu um olhar de derrota.
“Não é culpa sua.”, eu disse, escolhendo minhas palavras com
cuidado, sabendo que poderiam ser as últimas. “Não é culpa de
ninguém.”
“É culpa de vocês dois!”, Novak disse cantarolando
lunaticamente. Ele parecia ter usado drogas. “Vocês selaram seus
destinos fazendo o que fizeram em Praga. Meus irmãos estão
apodrecendo em uma cadeia em Hamburgo por causa de vocês!”
“Estávamos cumprindo um contrato.”, eu disse. “Não tomamos
decisões. Culpe a União Europeia, não nós.”
“Grandes governos são tão vagos e sem rosto,”, disse Novak,
“eu os culpo, mas gosto de culpar vocês também. E toda a
Compania Mathos.”, ele gargalhou novamente, sua risada beirava a
loucura. “Me dá muito prazer saber que eu usei sua própria empresa
contra vocês!”
“Como assim?”, Jordy perguntou.
Kadyrovic deu uma risadinha. “Americanos estúpidos.
Arrogantes demais para ver o que é óbvio para o resto de nós.”
“O contrato para assassiná-lo.”, disse Novak, gesticulando na
direção de Kadyrovic. “Nós assinamos este contrato. Colocamos o
dinheiro em custódia e tudo mais. O suficiente para atraí-los até
aqui. E requisitamos sua equipe especificamente. E vocês correram
para cá o mais rápido que puderam! Como mariposas na direção do
fogo! Ha ha ha!”
O guarda-costas que estava perto de Jordy interrompeu. “Amir
ainda não reportou. Suspeito que ele tenha falhado.”
“Seus homens são inúteis.”, Novak disse com acidez.
“Meus homens são muito capazes, posso te assegurar.”,
Kadyrovic pegou meu telefone e aproximou do meu rosto para
desbloquear a tela. “Merda. O grandão nos impediu de capturar a
filha e a babá.”
“Harrison Gray.”, Novak disse o nome como um palavrão. “Era
ele quem eu queria. Me dê isso.”, ele rolou a tela. “Eles estão com o
compartilhamento de localização ativado. Ele está na estrada, na
metade do caminho entre o hotel e este lugar.”, ele tocou na tela
mais algumas vezes e levou o telefone ao ouvido.
“O que vocês vão fazer?”, Kadyrovic perguntou.
Novak acenou irritado para ele. “Sr. Gray! Ou eu deveria
chamá-lo de Harrison? Não, não, espera. Vou te colocar no
autofalante. Todo mundo vai gostar disso.”
Ele tocou a tela e levantou o telefone. A voz de Harrison saiu
do dispositivo com apenas um pouco de distorção. “Eu perguntei
quem diabos está falando?”
Respondi o mais rápido que pude. “Harrison, fomos capturados
por Anton Novak e—”
O cabo da pistola de Kadyrovic atingiu a parte de trás da minha
cabeça. Caí com as mãos e os joelhos no chão, gemendo.
“Seu comparsa inglês está correto.”, Novak respondeu no
telefone. “Estamos aqui com ele e com o Sr. Mackey. Adoraríamos
que o senhor se juntasse a nossa festa.”
“Ah, mas eu estou indo mesmo.”, Harrison gritou de volta. “Eu
deveria ter te matado em Praga quando tive chance!”
“Que pena que você estava ocupado com Karina.”, Novak
respondeu. “Fiquei com medo de vocês terem se tornado mais
disciplinados desde aquela época, mas posso ver que vocês
seguem sendo desleixados. Venha para o escritório. Sozinho. Se
você trouxer mais alguém, mataremos seus sócios. E então
localizaremos sua filha.”, ele disse a palavra lentamente,
enfatizando-a. “Mas se você fizer o que estou mandando, vamos
deixá-la em paz. É você que queremos.”, ele olhou para o relógio.
“Te vejo em dez minutos.”
A última coisa que ouvimos foi Harrison gritando um palavrão
antes de Novak desligar.
“O que você quer conosco?”, Jordy perguntou.
“Ele vai nos matar.”, eu disse fracamente. Eu ainda estava de
joelhos. Não fazia sentido lutar. Pelo menos não naquele momento.
“Ah, não vamos matar vocês!”, Novak provocou. “Temos planos
muito melhores. Vou vender vocês para Kadyrovic, junto com o
contrato, evidência de que vocês iam mata-lo. Ele vai levá-los para
Moscou. Vocês vão ser expostos na televisão pelos crimes que
cometeram. Um exemplo de intervencionismo ilegal da OTAN e dos
Estados Unidos.”
“Não representamos a OTAN nem os Estados Unidos.”, disse
Jordy. “Somos mercenários autônomos. Caralho, foi você quem nos
contratou para vir atrás de Kadyrovic!”
“Não importa.”, disse Kadyrovic com um sorriso. “Vamos
conseguir a propaganda que queremos.”
“E eu vou me tornar um homem rico.”, disse Novak. “Talvez rico
o suficiente para tirar meus irmãos da cadeia. Veremos. Aldi? Meu
dinheiro!”
Kadyrovic zombou. “Você vai receber quando o trabalho
terminar.”
Novak caminhou e chutou a canela de Jordy. “Eu entreguei
dois terços deles. Certamente já mereço dois terços do dinheiro.
Vamos lá. Dinheiro me faz feliz. Mais feliz do que ver esses dois de
joelhos, implorando por suas vidas.”
O olhei com desprezo, mas não disse nada. Não tínhamos
implorado por nossas vidas. Ainda não. Ainda nos restava
dignidade.
Ah, Kaylee. Sinto muito.
Kadyrovic suspirou e pegou seu celular. “Como você quiser.
Iniciarei a transferência…”, ele parou quando o telefone tocou. Com
uma careta, ele atendeu. “Da?”
Não estava no autofalante, mas o volume estava alto o
suficiente para que eu pudesse ouvir. “Coloquem suas armas no
chão.”
Kadyrovic grunhiu. “O que?”
“Coloquem suas armas no chão e fiquem de pé no centro do
heliporto com as mãos para o alto. Falam isso e vocês vão todos
viver.”
“Quem é?”, Novak perguntou.
Quem é? Repeti mentalmente. Não reconheci a voz. Parecia
estrangeira.
Kadyrovic começou a se virar. “Não gosto de ameaças.”
“Este é seu último aviso.”, a voz alertou.
“Quem é?”, Novak repetiu. Ele estalou os dedos no ar. “Aldi.
Quem é? Responda agora!”
“É o segurança do perímetro?”, Kadyrovac perguntou.
O guarda-costas que estava próximo de Jordy ficou tenso. “Era
ele quando eu conferi pela última vez. Vinte minutos atrás.”
Kadyrovic escaneou a área ao nosso redor e eu fiz o mesmo.
Estávamos em um setor industrial da cidade, com armazéns de
todos os lados. Senti uma pontada de esperança.
“Escute aqui seu pedaço de merda…”, Kadyrovic começou.
E tudo aconteceu muito rapidamente.
Assim que ele disse as últimas palavras, ouvimos o disparo de
um rifle. Quase no mesmo instante, a perna de Kadyrovic explodiu
em sangue. Ele caiu no chão gritando. O outro guarda-costas
levantou a pistola, procurando ao redor. O rifle oculto disparou
novamente e o atingiu no peito.
Novak era rápido. Ele pulou no chão quando ouviu outro
disparo. Uma bala sibilou no ar e atingiu o chão perto de nós. A
parte treinada do meu cérebro me informou que o atirador estava
em algum lugar elevado. Provavelmente no telhado de algum
daqueles armazéns. Novak escorregou pelo chão e se aproximou de
mim, enrolando uma mão no meu pescoço e pressionando a pistola
na minha têmpora.
“Vou atirar!”, ele gritou. “Renda-se ou eu o mato!”
O clichê de ver a vida passar diante dos olhos quando se está
prestes a morrer não acontecia comigo—não naquele dia nem nas
outras duas vezes que pensei que estava perto da morte na vida.
Meu corpo todo relaxou. Uma sensação arrebatadora de calma me
invadiu. Eu estava totalmente confortável com o meu destino,
porque não estava no controle. Havia um certo tipo de paz naquilo
tudo. Na aceitação de qualquer coisa que o universo tinha para mim.
Eu te amo, Kaylee. Pensei. E então, um segundo depois, Trish
apareceu na minha mente, ao lado da minha filha.
Houve um disparo, mas ele não veio do mesmo rifle de antes.
Veio de trás de nós. Senti uma pontada na minha escápula, seguida
imediatamente por uma dor entorpecente.
Novak soltou meu pescoço e caiu no chão. Me virei para olhar,
embora já soubesse o que veria. Jordy estava parado, apontando a
arma do guarda-costas para nós. E Anton Novak, o homem que
tinha fugido em Praga tantos anos antes, estava esticado no chão
como o próprio Jesus Cristo. Um dos seus olhos era um borrão de
sangue, por onde a bala tinha saído do seu cérebro e me atingido
nas costas.
E como se pensar no assunto tivesse conjurado toda a dor,
minha escápula de repente parecia estar em chamas. Gemi e cai
para a frente, deslocando meu peso para o braço esquerdo.
Jordy se aproximou em um instante, e rasgou minha camiseta
com a monograma da empresa falsa de turismo na altura do
ferimento.
“Bela pontaria!”
“Ei, eu fiz o meu melhor.”, ele respondeu. “Só tive meio
segundo para decidir o que fazer.”
“Não. Foi. Sarcástico.”, eu disse com os dentes cerrados.
Parecia que meus nervos estavam mergulhados em suco de limão.
“Foi. Um. Bom. Tiro. Como estou?”
“Não é profundo. Acho que consigo ver a bala, mas atingiu seu
osso.”, ele olhou ao redor, “Quem diabos nos salvou? Harrison?”
“Não foi ele.”, eu disse. “Voz diferente. E nós não. Temos. Arma
de. Calibre Grosso.”
Jordy apontou. “Lá.”
Do outro lado da área aberta, a pelo menos um campo de
futebol de distância, um homem com um rifle se pendurava para
descer uma escada anexada à parede de um armazém. Ele jogou o
rifle no chão, pegou uma pistola da cintura e se aproximou correndo.
Ele me parecia vagamente familiar, mas eu não sabia exatamente
de onde.”
“Você!”, disse Jordy. “Você trabalha no hotel. O camareiro!”
O homem o ignorou e verificou o pulso de Kadyrovic e do outro
guarda-costas. Seus movimentos eram cuidadosos e tinham
precisão militar. Ele não se deu ao trabalho de verificar o corpo de
Novak. “O trabalho no hotel é meu disfarce.”
“Então quem…”
“Sou auditor na Companhia Mathos.”, ele carregava um kit
médico e começou a abrir um rolo de gaze. “O contrato aqui em
Bacu levantou alguns alertas no escritório, então eles me enviaram
para monitorar a situação. Garantir que era tudo legítimo.”
“Claramente não.”, eu disse, fazendo uma careta enquanto ele
aplicava gaze na minha ferida.
“Eu sabia que tinha alguma coisa acontecendo com você.”,
disse Jordy. “A forma como você nos olhou hoje de manhã.”
“Chamei uma equipe de limpeza completa.”, o falso camareiro
explicou enquanto fazia meu curativo. “Eles vão cuidar dessa
bagunça. Por enquanto vamos levá-lo para um hospital e cuidar
desse buraco.”
Uma moto de trilha fez a curva rugindo ao longe, atirando pelo
beco entre os dois armazéns como se o mundo estivesse em
chamas. O cheiro de borracha queimada invadiu o ar quando
Harrison derrapou e parou na nossa frente, pulando da moto e a
deixando atingir o solo enquanto corria para o meu lado.
“Você está vivo.”, ele analisou a cena toda com uma única
olhada ao redor. “Você. Te conheço. Do hotel.”
“Ele é auditor da Companhia Mathos. Eles acharam que o
contrato era suspeito, então enviaram-no para nos monitorar. Que
sorte.”
Harrison se eriçou. “Eu sabia que vocês estavam nos vigiando.
Parte do motivo que me fez manter a guarda alta a semana toda.”
O homem suspirou. “Preciso melhorar. Em um mundo ideal,
vocês nunca saberiam da minha existência.”, seus olhos se
acenderam. “Trish e a garota estão bem? Precisei deixar meu posto
para vir aqui…”
Harrison chutou levemente o braço de Kadyrovic com a ponta
dos pés. “Um dos homens dele foi até o hotel, imitando o segurança
que você contratou para leva-las ao aeroporto. Mas eu fiquei lá um
pouco e o peguei no flagra.”
“Você não estava na zona de extração?”, perguntei. “Você não
planejava estar lá?”
Harrison pausou. “Não.”
Jordy gargalhou. “Essa é a primeira vez que fico feliz por você
não ter seguido o plano, seu filho da puta teimoso.”
39

Trish

Caminhei pelo hotel a tarde toda. Conferi meu telefone, conferi


de novo. Resisti à urgência de ligar para os caras, ou de enviar
mensagens. Harrison tinha deixado muito claro que estávamos
operando com o rádio em silêncio e que qualquer contato colocaria
nossas vidas em risco.
Falando em vidas em risco, Kaylee e eu ficamos escondidas na
cobertura do hotel, com as fechaduras trancadas por dentro e as
cortinas abaixadas. Harrison tinha colocado um revólver reserva que
estava na mala de couro e colocado no alto da estante que Kaylee
não alcançava e me disse para usar se necessário fosse. De vez em
quando meus olhos voavam para a arma e eu arrepiava. Eu nunca
tinha usado uma arma antes e esperava que aquilo não mudasse
naquele dia.
Já era fim de tarde quando ouvi um cartão encostar na
fechadura, mas a porta não abriu porque estava trancada por
dentro. Congelei, me perguntando se deveria falar alguma coisa ou
permanecer em silêncio.
“Por que minha chave não funciona?”, ouvi Jordy perguntar.
“Pedi a ela que trancasse.”, Harrison respondeu. “Trish, você
pode abrir.”
Apressadamente destranquei a porta e a abri. Eles estavam na
minha frente, sorrindo com caras de cansados. Harrison era o
primeiro, então me joguei em seus braços.
“Fiquei tão assustada.”, sussurrei.
“Estamos aqui agora.”, Jordy disse.
“Não! Me assustei por vocês.”, eu o abracei a seguir, apertando
tão forte que meus braços doeram. Então o afastei do meu caminho
e fiz o mesmo com Archer.
“Ai.”, ele gemeu, resistindo ao meu abraço. “Não tão forte.
Estou um pouco ferido, sinto muito.”
“Ferido!”
“Tomou um tiro na escápula.”, respondeu um quarto homem
que eu não tinha visto. “Tudo certo agora, mas dolorido por um
tempo.”
Olhei para o homem, era o camareiro gentil que estava
entregando nossa comida todos os dias. Mas seu comportamento
estava diferente—ele usava o mesmo uniforme de hotel, mas a
atitude era diferente. Ele estava mais confiante e no comando.
“Estou seriamente confusa.”, eu disse.
“Este é o nosso anjo da guarda em Bacu.”, disse Jordy. “Um
reforço enviado pela Companhia Mathos. Devemos nossas vidas a
ele.”
O homem deu de ombros e entregou uma pilha de envelopes
para Jordy. “Suas informações de voo. Mais um bônus pela missão.
Considerem um pedido de desculpas da Mathos por não verificar
propriamente o contrato.”
“Bônus?”, disse Jordy, abrindo o envelope. “Quer dizer que
ainda vamos ser pagos?”
“Novak e Kadyrovic depositaram o valor do contrato em
custódia.”, ele respondeu. “Tinha que parecer legítimo para atrair
vocês para cá. O dinheiro é de vocês. Felicitações.”
Ele se inclinou e pegou um urso de pelúcia do seu bolso. “Isso
é para você, Kaylee.”
Ela olhou para os pais, confirmando que podia aceitar, então
pegou o urso. “Ele tem nome?”
“Você pode chamá-lo de Patrick. Ou de Pat, é o apelido dele.”,
então ele murmurou baixinho. “Ele tem o mesmo nome que eu.”
“Obrigada, Patrick!”, ela disse, agarrando o urso contra o peito.
O camareiro se levantou, sorriu para mim e apertou as mãos
dos outros homens. Então ele partiu e ficamos sozinhos.
“Estou seriamente confusa.”, repeti lentamente. “Mas feliz por
vocês estarem todos bem.”
“Estamos felizes por vocês estarem bem.”, Archer disse,
acariciando minha bochecha e pressionando sua testa contra a
minha. “Não queríamos que você e Kaylee corressem risco nunca.”
“Não estávamos correndo risco.”, Kaylee disse. “Harrison disse
que o homem que veio aqui só estava brincando.”
“Correto. Ele estava.”, Jordy disse enfaticamente. “Foi tudo
brincadeira. Você já fez as malas e está pronta para ir?”
“Eu estava, mas ficamos mais tempo!”, ela respondeu. “Então
peguei meu laptop para jogar Minecraft.”
“Bem, vá buscar suas coisas. Vamos para o aeroporto em dez
minutos.”
Ela correu para o seu quarto.
Harrison se aproximou de mim. “Te devo desculpas, Trish.”
Fiquei surpresa. “O que for?”
“Te culpei por estar aqui. Te chamei de distração.”, ele coçou o
queixo, como se sentisse falta da barba. “Acontece que a sua
presença nos ajudou. Você foi o alerta de que algo estava errado.
Se eu não tivesse voltado para checar você, eu estaria na zona de
extração. Onde os homens de Kadyrovic estariam me esperando.”
“Você foi nosso sinal de alerta.”, Archer concordou.
Harrison me abraçou e eu relaxei em seus braços. Seu abraço
era forte, mas ainda assim terno. Gentil para alguém como ele, que
até entrelaçou os dedos nos meus cabelos.
“Obrigada.”, sussurrei no seu peito largo.
“As coisas poderiam ter acabado seriamente ruins.”, disse
Jordy. “Tivemos sorte.”
“Muita sorte, de fato.”, Archer concordou. “Acho que serviu
para abrir nossos olhos. Talvez esteja na hora de encerrarmos essa
carreira.”
“Sério?”, perguntei.
“Vamos discutir quando chegarmos em casa,”, Harrison
interrompeu, “não deveríamos tomar decisões de cabeça quente.”
“Harrison Gray…”, disse Jordy melancolicamente, “…falando
sobre não tomar decisões de cabeça quente. Se eu não te
conhecesse bem, diria que você amadureceu desde que deixamos
Wilmington.”
Harrison olhou para mim e deu de ombros estranhamente.
“Mas a coisa mais importante é: estamos indo para casa.”,
disse Jordy alegremente. “Vai ser bom dormir na minha própria
cama.”
“Não vejo a hora de pedir a pizza do Sal.”, disse Harrison.
“Quase dois meses longe de casa e pizza é a coisa da qual
você mais sente falta?”, Archer perguntou.
“Não qualquer pizza. A pizza do Sal.”, ele lambeu os lábios.
“Merda, agora estou com fome.”
“Eu sinto falta dos milkshares do Cookout.”, Jordy acrescentou.
“Comemos bem nessa viagem, mas às vezes um cara só quer a boa
e velha fast-food americana.”
“É por isso que vocês são todos obesos.”, Archer disse
secamente.
“Ei! Não somos obesos.”, Jordy flexionou um braço. “Todas as
minhas calorias são usadas para construir estas armas.”
“Eu quis dizer vocês, americanos.”
“Vocês britânicos não passam muito longe.”, Harrison
respondeu.
Suas piadas e risadas não me afetavam. Havia uma pitada de
vazio no meu estômago, que crescia a cada segundo. Antes que eu
pudesse evitar, estava debulhada em lágrimas.
“Anilha.”, Jordy colocou um braço ao meu redor. “O que está
acontecendo?”
“Eu não quis insultar todos os americanos.”, disse Archer. “Na
verdade, eu só estava tirando sarro dos meus parceiros idiotas.”
“Não é isso.”, eu disse. “É que… ir para casa. Está me
deixando sentimental.”
“Não tinha reparado que você estava com tanta saudade.”,
disse Jordy. “Mas dois meses é muita coisa…”
“É por causa de vocês!”, eu finalmente explodi. Os três se
encolheram. “Agora que a viagem acabou, meu trabalho de babá
acabou. E tudo isso acabou. E eu preciso procurar outro emprego.”
Archer e Jordy se entreolharam. “É com isso que você está
preocupada?”
“É claro que sim! Por que eu não me preocuparia? O trabalho
está acabando, vou ter que me despedir de Kaylee, e talvez
conseguir um emprego em uma cidade diferente, e… e…”, eu não
consegui terminar.
“Nós discutimos isso na verdade ontem.”, disse Archer.
“Queríamos esperar até chegarmos em casa para mencionar, mas
acho que agora é um bom momento…”
“Queremos que você continue cuidando de Kaylee.”, Jordy
segurou meus dois braços e sorriu para mim. “Você é muito boa
para ela. Nós três passamos muito tempo com ela e a criamos
melhor do que a maioria das pessoas nas mesmas circunstâncias,
mas você foi capaz de se conectar com ela de uma forma que nós
nunca conseguimos. Talvez ela precise de uma influência feminina.
Ou talvez porque você tenha ficado totalmente por conta dela,
enquanto nós temos que conciliar com o trabalho.”
“Independentemente do motivo, gostaríamos de estender
formalmente nosso contrato por um ano.”, disse Archer. “Talvez por
mais tempo se você quiser, mas um ano para começar.”
Eu não esperava nada daquilo. Eles tinham deixado muito
claro que meus serviços tinham sido contratados apenas para
aquelas três missões. Era como se eu implorasse por um colete
salva-vidas para não me afundar e recebesse um iate no lugar.
“Vocês têm certeza?”, perguntei, olhando para Harrison. “Você
não se importa?”
“Me importar?”, ele gargalhou. “Porra, foi minha ideia.”
Pisquei, surpresa. Aquilo ajudou a acalmar meus nervos. Mas
ainda havia outro assunto, que eu não sabia como abordar…
“Você não está animada com isso?”, Jordy perguntou confuso.
“Achei que você ia dar pulinhos de empolgação!”
“Mas e nós?”, perguntei rapidamente. “E eu e você? E eu e
Archer? E nós três? Vamos ficar juntos e ver no que dá? Não sei o
que vocês querem. Caramba, eu nem sei o que eu quero. É tudo
confuso, mas eu sei que gosto de vocês dois e não quero que isso
termine. Mas se esse relacionamento atrapalhar minha relação com
Kaylee ou se ela estranhar…”
Eles se encararam de novo e fizeram a última coisa que eu
esperava.
Eles caíram na risada.
“O que é tão engraçado?”, perguntei.
“Você.”, Jordy respondeu.
Senti lágrimas invadirem meus olhos de novo. “Eu não sabia
que eu era uma piada para vocês.”
“É claro que você não é!”, Archer disse, afastando uma lágrima
das minhas bochechas com o polegar.
“Então por que você está rindo?”
“Porque você é uma tolinha. É por isso.”, Jordy respondeu. “É
claro que queremos ficar juntos e ver no que dá.”
“Sério?”, perguntei.
Archer assentiu. “Honestamente, nunca pensei que isso fosse
uma questão. Você achava que nós íamos apenas… te dispensar?”
“Eu não sei o que achava.”, eu disse, limpando as lágrimas
com as costas da minha mão. Eu me sentia muito tola, de fato.
“Tudo isso era uma grande incógnita na qual eu não queria pensar.”
Jordy me tomou em seus braços e olhou nos meus olhos.
“Temos algo realmente especial. Tenho certeza disso e sei que você
também se sente assim.”
Archer colocou uma mão nas minhas costas. “Tenho quase
certeza de que não é físico. Ou pelo menos, não apenas físico.”
“Definitivamente físico.”, Jordy concordou. “Mas tem muito mais
além disso. Quero ver onde vai dar. Nós dois queremos.”
“E eu esperava que isso acontecesse mesmo que você não
aceitasse o contrato por mais um ano.”, Archer disse, e levantou
uma sobrancelha: “Você vai aceitar a extensão do contrato, não
vai?”
“É claro que vou!”, me joguei nos braços dele e o abracei
apertado.
“Não tão forte, gata.”, ele me lembrou. “Tiro, etc.”
“Desculpa!”
Olhei por cima do ombro, Harrison ainda estava parado perto
de nós. E eu não conseguia ler sua expressão. Me afastei e limpei
minha garganta.
“Se vamos continuar isso, preciso ser completamente honesta
com vocês três. Eu acho… acho que me sinto atraída por Harrison
também. Sim, eu sei que é absolutamente ridículo eu não ficar
satisfeita com apenas dois homens, mas eu não posso negar a
faísca que sinto entre nós. E se você não se sente assim, Harrison,
eu entendo completamente. Mas eu precisava desabafar, em prol da
sinceridade total. Eu não quero que haja nenhum segredo entre
nós.”
Houve um longo momento de silêncio enquanto eles
pensavam.
“Tudo isso porque ele fez a barba?”, Jordy perguntou
finalmente. “Eu te falei, cara. Aquela barba não te ajuda.”
Harrison fez uma careta e tocou o maxilar. “Vá se foder.”
“A barba feita é apenas uma pequena parte disso.”, admiti.
“Não sei o que. Vocês estão bravos?”
“Por que ficaríamos bravos?”, Jordy perguntou. “Já estou te
dividindo com Archer. Um cara a mais não muda nada.
Especialmente Harry.”
Harrison rosnou quando ouviu o apelido.
“Fui criado em uma família poliamorosa.”, Archer me lembrou.
“Não tenho nenhum problema com estruturas não tradicionais de
namoro, quer isso signifique três ou quatro de nós.”
Suspirei aliviada. Eu não sabia como a conversa terminaria,
mas certamente aquele era o melhor resultado possível.
Até Harrison falar.
“Eu te disse: não gosto de dividir.”
Nós todos viramos as cabeças para ele.
“Isso tudo é estranho para caralho.”, ele continuou,
gesticulando para nós três. “E eu não me importo com coisas
estranhas. Meu primo fez transição uns anos atrás. É estranho
chamá-lo de Brian e não de Brandi, mas foda-se, a vida é dele, e eu
estou feliz por ele ser seu eu verdadeiro. É assim que me sinto com
todo mundo. Faça o que te faz feliz, desde que você não machuque
ninguém.”
“É assim que me sinto assistindo vocês. É estranho. Não cresci
em uma família poliamorosa nem nada do tipo, então ainda não me
acostumei com isso. Mas mesmo que eu queira que vocês sejam
felizes, não significa que quero fazer parte. Não sei se consigo
dividir uma mulher com alguém, quem dirá com dois alguéns.
Preciso pensar no caso. Me acostumar. Eu não tenho ideia se vou
querer fazer parte de algo assim em algum momento.”
“Isso é totalmente compreensível.”, eu disse sorrindo. “Se você
não quer explorar, tudo bem.”
“Nunca disse que não quero explorar.”, ele respondeu
rapidamente. De repente, ele pareceu envergonhado, encarando os
dedos dos pés atentamente. “Só estou dizendo que preciso de
tempo. Só isso. Eu meio que gosto de você. Quer dizer, você é
gostosa e tal. Droga. Nem sei o que estou tentando dizer.”
Eu o abracei para ele se calar, e ele me abraçou de volta.
Jordy se juntou a nós, seguido por Archer. Os três me abraçaram
juntos, por um longo momento de alívio e vitória. Aquela viagem
tinha sido um furacão e estava terminando, mas nós não. Nós
continuaríamos, de alguma forma. E eu estava ansiosa para
descobrir como seria.
“Vou deixar minha barba crescer de novo.”, disse Harrison
teimosamente. “Meu rosto parece pelado sem ela.”
“Você pode fazer o que quiser.”, eu disse. “Não quero que você
mude nada que seja importante para você.”
“Que bom. Porque eu não vou.”
“Ok.”, respondi.
“Ok.”
De repente, me lembrei de algo. Enfiei a mão pela gola da
minha blusa e puxei os dois conjuntos de plaquinhas de
identificação. “Guardei para vocês.”
Jordy me impediu de tirar os cordões. “Por que você não fique
com o meu por um momento?”
“Eles estão em melhores mãos com você.”, Archer concordou.
Coloquei os cordões de volta dentro da minha blusa. Manter
suas plaquinhas era um grande gesto, como se eu tivesse sido
convidada para conhecer suas famílias. Ou para vivermos juntos.
Mas por algum motivo, não parecia ser muito intenso, ou muito
cedo. Me parecia certo.
Se me parece certo, não vou lutar contra. Pensei. Uma lição
que aprendi nessa viagem.
De repente, outro par de braços envolveu nossas pernas.
“ABRAÇO COLETIVO! Já arrumei tudo e estou pronta para ir! Por
que estamos nos abraçando? Porque somos realmente bons
amigos?”
“Somos mais do que amigos, fofinha.”, Archer disse. Ele roçou
seu nariz no meu, me dando um beijo de esquimó. “Somos quase
como uma família.”
Epílogo

Trish
Um ano depois

Sonhei que estava em uma cidade da Europa que eu não


conhecia. Parecia Paris, mas era efêmera de um jeito difuso que só
os sonhos são. Além disso, eu nunca tinha ido a paris, então não
dava para saber como a cidade era de verdade.
Meu sonho foi se dissipando enquanto eu abria meus olhos. Eu
estava deitada de lado na cama com Jordy e Archer. O loiro estava
na minha frente com os olhos fechados e roncando suavemente. E
Jordy…
Esfreguei a bunda no homem que estava gentilmente beijando
minha nuca. “Ei, olá você.”
“Já era hora de você acordar.”, ele murmurou no meu ouvido.
“Estou te provocando já faz cinco minutos.”
Comecei a dizer que não estava no clima para sexo matinal,
mas sua mão escorregou pelo meu quadril e alcançou o meio das
minhas pernas. Eu as abri, dando a ele maior espaço para alcançar
meu clitóris e massageá-lo circularmente. Expirei mais e mais.
Jordy gargalhou quietamente. “Eu sabia que conseguiria te
convencer.”
“Você. É. Bem. Persuasivo.”, suspirei enquanto ele me
masturbava mais rápido.
Empurrei minha bunda contra ele, uma versão de lado de uma
dança erótica suave. Seus dedos mergulharam mais fundo, se
curvando dentro de mim. Seu dedo indicador e seu dedo médio
juntos. Ele fazia um gesto de venha cá dentro de mim, fazendo a
base da palma da sua mão roçar meu clitóris. Mordi meu lábio e
tentei não fazer nenhum barulho, e quando meu orgasmo me
invadiu intensamente, Jordy colocou uma mão na minha boca para
me manter em silêncio.
Eu mal tinha voltado do meu estado de júbilo quando ele enfiou
o pau em mim. Um prazer novo invadiu meu corpo e eu arqueei as
costas e me virei para beijá-lo.
Archer ainda estava dormindo e eu decidi que era inaceitável.
Enfiei a mão debaixo das cobertas e encontrei sua cueca,
deslizando meus dedos para dentro. Seu pau estava mole, mas
aquilo mudou rapidamente enquanto eu o masturbava e Jordy me
penetrava por trás.
As pálpebras de Archer se abriram e seus olhos de safira
encontraram os meus. “Esse é meu tipo preferido de despertador.”,
ele disse, escaneando a cena.
“Não ative o modo soneca!”, disse Jordy, colocando uma mão
na parte de trás da minha cabeça. Ele me empurrou para a frente,
me dobrando, até minha cabeça estar debaixo das cobertas,
próxima da virilha de Archer. Arranquei sua cueca e o enfiei na
boca, rodopiando a língua na cabeça do seu pau como ele adorava.
Os dois grunhiam acima de mim, um dueto de prazer
masculino que era música para os meus ouvidos. Jordy agarrou
meu quadril com força, me usando como alavanca enquanto me
fodia cada vez mais rápido, com longas estocadas que me
arrebatavam, imprudentes de desejo. Archer segurou seu pau e o
enfiou na minha boca enquanto eu o chupava. Ficar encaixada nos
dois, preenchida pelas duas extremidades, me fez gemer
rapidamente, ainda sentindo os efeitos do orgasmo anterior. A forma
com que eu me apertava no pau de Jordy o fez se engasgar e
tremer dentro de mim, enchendo minha boceta inchada com sua
semente. Meus gemidos abafados vibraram no pau de Archer, e
então ele comprimiu as coxas e também gritou em advertência.
Mantive meus lábios presos com força ao redor da sua cabeça
quando ele explodiu na minha boca, e cada jato salgado atingiu
minha garganta.
Beijei Archer quando terminamos, então me virei para aceitar a
língua de Jordy na minha boca. Se ele estava incomodado como
fato de o pau de outro homem ter estado ali segundos antes, não
demonstrou. Na verdade, ele me beijou ainda mais
apaixonadamente.
O celular de Archer de repente vibrou na mesa de cabeceira.
Ele gemeu, um tipo diferente de gemido, e se virou para desligar.
Dei um tapa na bunda dele quando ele fez isso. “Bem a tempo
do seu despertador real. Você programou para muito cedo.”
“Eu queria acordar e correr um pouco hoje,”, ele disse, rolando
de volta e colocando um braço atrás da cabeça, de barriga para
cima, “mas tenho quase certeza de que minhas pernas estão muito
fracas nesse momento.”
“Suas pernas estão fracas?”, Jordy respondeu. “Você só ficou
ai deitado!”
“Eu te garanto que estava tensionando cada músculo do meu
corpo, de uma forma bem abrangente.”
“Posso confirmar a informação.”, eu disse sorrindo.
Ficamos de carícias na cama, nos provocando, por mais
alguns minutos, mas Jordy finalmente se levantou. Me abracei no
corpo nu de Archer até Jordy emergir.
“Sua vez.”, ele disse. “Hora de se levantar, Bela Adormecida!”
Dei um gritinho quando Jordy agarrou minha cintura e me
levantou da cama como se eu não pesasse nada. Depois de um ano
juntos, uma das coisas que eu mais amava naquele relacionamento,
era a forma como eles facilmente me manipulavam fisicamente. Eles
eram incrivelmente fortes, o que despertava a mulher das cavernas
antiga dentro da minha cabeça.
Homem, forte.
Dois homens? Mais forte.
Forte é bom.
Ri sozinha.
“O que é tão engraçado?”, Jordy perguntou.
Dei um beijo na sua bochecha. “Só estou pensando em como
me sinto uma mulher das cavernas sendo arrastadas por dois
homens das cavernas fortões.”
Archer se sentou na cama. “Eu meio que desgosto do resumo
do nosso relacionamento.”
“Eu não estava reclamando!”, eu disse. “Você já preparou o
contrato de babá para o próximo ano? Estou pronta para assinar
assim que você me entregar os documentos.”
Archer deu de ombros casualmente. “Acho que ainda não
decidimos sobre isso...”
“Estamos considerando outras candidatas.”, Jordy concordou
com uma seriedade falsa.
Mostrei a língua para os dois e entrei no banheiro.
Depois que nossa diversão acabou, era hora de nos
arrumarmos para o resto do dia. Archer e Jordy tinham abandonado
a vida de mercenários e pedido demissão da Companhia Mathos.
Archer estava trabalhando como piloto de helicóptero de evacuação
do Hospital de Wilmington. As vezes ele também pilotava outros
helicópteros como autônomo. Todos os dias ele deixava a casa com
um sorriso enorme no rosto e voltava sem o stress do trabalho
anterior.
Jordy tomava seu café da manhã lentamente enquanto
brincava com Kaylee até as dez da manhã, quando ligava seus
aplicativos de entrega. Sim, você entendeu direito: o grande e forte
mercenário agora ganhava a vida fazendo entregas o dia todo. Ele
tinha começado com o intuito de ganhar um dinheirinho e manter a
cabeça ocupada até descobrir o que queria realmente fazer da vida,
mas já tinham se passado meses e ele ainda não tinha parado.
“Tem certeza de que você está feliz?”, perguntei enquanto me
despedia dele com um beijo.
“E por que eu não estaria?”
“Não é muito gratificante. Entregador de aplicativo não é
exatamente o tipo de trabalho com o qual as pessoas sonham na
infância.”
Ele levantou uma sobrancelha e me encarou: “Quando eu era
pequeno, não existiam aplicativos de entrega.”
“Você me entendeu.”
Ele me deu um beijo suave. “Eu levo comida aos que tem
fome. Todo mundo ama comida. É bem gratificante para mim. Muito
mais do que o que eu fazia antes, como mercenário.”
“Desde que você esteja feliz.”
Ele acariciou minha bochecha. “Mais feliz do que jamais pensei
que seria.”
No meu relacionamento anterior, me sentia insegura a ponto de
sempre duvidar de tudo o que meu parceiro me dizia. Se ele dizia
que estava feliz, eu pensava que secretamente ele não estava. Se
ele dizia que me amava, eu passava o dia todo pensando que era
só da boca para fora. Mas essas inseguranças tinham acabado.
Quando Jordy dizia que estava mais feliz do que jamais pensou que
seria, eu sabia que era absolutamente verdade.
Depois que Jordy saiu, Kaylee e eu passamos duas horas
jogando Minecraft. Tínhamos construído um mundo enorme juntas e
ela estava sempre pensando em coisas novas para criar. Naquele
dia, trabalhamos na réplica do Coliseu Romano. Era muito mais
difícil do que parecia e precisamos consultar o Google Maps para
achar um modelo em 3D do prédio real.
Paramos para almoçar e iniciamos a segunda parte do dia com
uma nova rotina: ler. Kaylee tinha quase dez anos, idade perfeita
para começar a ler Harry Potter e a Pedra Filosofal. Era um ótimo
projeto de leitura de verão e ajudava a diminuir seu tempo de tela—
que já era bem alto.
Passávamos duas horas por dia lendo. Nos sentávamos no
quarto de Kaylee e cada uma de nós lia uma cópia do livro. No final
de cada capítulo, parávamos e discutíamos tudo o que havia
acontecido. Kaylee lia devagar, então eu fingia continuar lendo
depois de terminar o capítulo. Entretanto, eu já havia notado uma
grande melhoria nas suas habilidades de leitura desde que
começamos. E ela estava seriamente absorvendo o material e
compartilhando comentários próprios muito perspicazes.
Por volta de quatro da tarde ouvi a porta da frente se abrir.
“Dividiram seu turno no meio de novo?”, gritei da cozinha, enquanto
batia massa para uma fornada de cupcakes.
O homem que apareceu na porta da cozinha não era Jordy.
Aquele homem preenchia o espaço com ombros mais largos e uma
aura silenciosa e perigosa ao seu redor. Quase derrubei a tigela em
surpresa.
“HARRISON!”
Ele me olhou sorrindo com satisfação. “Parece que você viu
um fantasma.”
Coloquei a tigela na pia e me joguei em seus braços. “Você
deveria voltar só amanhã.”, murmurei no seu peito.
Ele acariciou meus cabelos com os dedos. “Mudança de
planos.”
Eu amava tudo no meu relacionamento com Jordy e Archer,
mas havia uma forma especial de Harrison me tomar em seus
braços que me fazia me sentir ainda mais segura. Como se eu
namorasse um urso pardo grande e rabugento.
Diferente dos outros dois, ele tinha ficado na Companhia
Mathos. Trabalhar sozinho dava a ele uma flexibilidade maior de se
juntar a outros grupos por missões ao redor do mundo e fazer
trabalhos solitários de reconhecimento quando necessários. O
dinheiro era fantástico e ele insistia que não queria fazer mais nada
da vida. Por mim estava tudo bem, desde que ele evitasse missões
perigosas. Ele prometeu nunca mais aceitar nada perigoso, como
Praga ou Bacu.
Me afastei e acariciei sua bochecha. “Achei que você tinha dito
que deixaria a barba crescer de volta enquanto estivesse fora.”
Ele deu de ombros. “Não deu. Vou parar de me barbear
amanhã.”
Fazia um ano que ele dizia aquilo, mas sempre acordava e se
barbeava na primeira hora do dia. E aquilo virou nossa piada interna
secreta.
Eu o beijei e por alguns momentos me esqueci da minha lista
de tarefas. A forma apaixonada e faminta com a qual Harrison me
beijava sempre me fazia esquecer das coisas.
“Papai?”, Kaylee perguntou, e sua surpresa virou animação.
“Papai!”
Paramos de nos beijar quando ela agarrou o pai por trás. “Você
cresceu desde a última vez que te vi?”
“Um centímetro!”, ela respondeu orgulhosa.
“Uau. Um centímetro. Você vai estar mais alta que eu no
Natal.”
O sorriso de Kaylee desapareceu. “Estamos fazendo cupcakes
para comemorar sua volta. Mas ainda não estão prontos.”
Harrison enfiou um dedo na tigela e lambeu a mistura. “Eu
gosto mais de massa crua.”
“Papai! Não estão prontos ainda!”
Ele enfiou o dedo de novo, mas daquela vez, passou a massa
no rosto de Kaylee. Ela deu um gritinho e tentou o ataca de
brincadeira, mas ele segurou seus punhos e os prendeu um de cada
lado.
“Não é justo,”, ela choramingou, “você é muito forte!”
“Preciso ser grande e forte para proteger minhas garotas.”, ele
olhou para mim e sorriu. “Advinha para onde fui dessa vez.”
“Hm,”, ela uniu as sobrancelhas, “Raleigh.”
Harrison gargalhou. “Fui para bem mais longe que Raleigh.”
“Asheville?”
“Eu não estava no estado, docinho. Nem no país. Vou te dar
uma dica.”, ele enfiou a mão na mochila e pegou um canguru de
pelúcia. “Tem muitos desses onde eu estava.”
Seus olhos se arregalaram. “Austrália!”
Ele entregou o brinquedo a ela. “Uau, boa! Você é tão esperta.”
“Trish e eu temos feito testes de geografia todos os dias. Você
sabia que a Antártica é o sétimo continente? Mas só poucas
pessoas moram lá.”
“Uaaaau,”, disse Harrison, exageradamente impressionado, “eu
não sabia.”
Kaylee sorriu, mas de repente pareceu ficar triste. “O que foi?”,
Harrison perguntou.
“Eu não sabia que você voltaria para casa hoje. Maggie me
convidou para dormir lá essa noite.”
“Você pode ir dormir com Maggie.”, ele olhou para mim. “Se
Trish concordar, é claro.”
“Mas eu senti saudade,”, ela insistiu, “você ficou fora duas
semanas e eu me sinto mal…”
“Te levo lá e te conto tudo sobre minha viagem,”, ele disse,
pegando a garota no colo, “então, amanhã, passamos o dia todo
juntos. Que tal?”
“Ok!”
“Maggie é muito querida.”, expliquei. “Elas fizeram uma noite
do pijama aqui semana passada.”
“Maggie tem dois papais!”, Kaylee exclamou. “Ela ficou com
muita inveja quando eu disse a ela que tenho três.”, ela enrugou o
rosto, pensativa. “Mas acho que os papais dela são diferentes. Eles
se beijam do mesmo jeito que vocês beijam Trish.”
Harrison e eu nos entreolhamos e caímos na risada.
“Ela é sortuda por ter dois papais.”, Harrison disse enquanto
Kaylee organizava as coisas para ir. “Algumas crianças não têm
nenhum.”
Terminei os cupcakes enquanto Harrison a levava para a casa
da amiga. Eu tinha acabado de tirá-los do forno quando ele voltou
para casa.
“Bem na hora. Eles vão ficar prontos assim que eu colocar a
cobertura.”
Harrison se aproximou por trás de mim. “Não é a cobertura que
eu quero lamber.”
Dei uma risadinha. “Esse é o tipo de piada que eu esperaria de
Jordy. Vocês têm passado tempo demais juntos.”
“Quero passar tempo demais aqui ó.”
Gargalhei mais. “Isso é ainda mais brega!”
Ele beijou minha nuca. “Você tem esse efeito em mim.”
Comecei a responder, mas parei, saboreando sua boca na
minha pele. Duas semanas não era muito tempo, mas o suficiente
para me deixar mais sedenta do que tudo pelo seu toque. Me
inclinei para trás e o deixei me acariciar até não conseguirmos mais
aguentar. Ele me abraçou, me carregou para o quarto—seu quarto
—e me jogou na cama.
“Tirei os lençóis hoje de manhã.”, eu disse. “Ia colocar novos
antes de você voltar.”
Suspirei enquanto ele praticamente arrancava minhas roupas,
e então as suas. Eu amava a forma como Harrison me tomava.
Como se ele não pudesse respirar se não me fodesse o mais rápido
possível. Eu estava sempre ensopada quando ele se enfiava no
meio das minhas pernas, me enchendo com facilidade, uma
reconexão depois de duas semanas. Não haviam palavras enquanto
fazíamos amor como animais, não precisávamos delas. Apenas
engasgos e gemidos e grunhidos frenéticos de duas pessoas que
não queriam mais nada no mundo a não ser um ao outro.”
Estávamos ambos arfando deitados na cama depois de
terminarmos, exaustos demais para nos movermos. “Eu amo a
forma como você me toma.”, suspirei.
“E eu amo você.”
Demorei um momento para perceber o que ele tinha falado.
Não foi eu amo seu corpo ou eu amo te sentir. Apenas: eu amo
você. A frase mais simples, mas ao mesmo tempo a mais
complicada que alguém pode dizer.
Me virei de lado e olhei para ele: “Finalmente.”
Seus olhos brilhavam quando esmeraldas quando ele piscou
para mim. “Hm?”
“Eu estava me perguntando quando é que você finalmente
diria.”, me inclinei sobre ele e beijei seus lábios. “Também amo você,
Harrison Gray.”
Ele enrolou os dedos nos meus cabelos e segurou minha testa
contra a sua. “Faz quanto tempo que você está esperando para
dizer isso?”
“Ah, pelo menos três ou quatro meses.”
Ele ficou surpreso. “E você guardou esse segredo?”
“Eu não queria te assustar!”, respondi.
Harrison se sentou na cama e rolou os ombros para a frente.
“E por que você acha que eu me assustaria?”
“Porque você é a pessoa que mais esconde sentimentos que
eu conheço.”, me sentei e beijei seu peito. “E isso faz parte do que
eu amo em você.”
“É difícil dizer isso para alguém.”, ele explicou. “Especialmente
quando você não sabe se eles vão dizer a mesma coisa de volta.”
“Exatamente! Foi por isso que segurei e não disse nada até
você dizer.”
“Você e Jordy disseram isso um para o outro depois de apenas
três meses.”
“Sim, bem, nós tivemos um início intenso.”, inclinei a cabeça.
“Estou detectando ciúme?”
Ele fez uma careta. “Não sinto mais ciúme.”
“Você sente um pouquinho.”
“Só quando ele te monopoliza.”, ele disse. “Estou feliz por ter
chegado mais cedo. Assim tivemos tempo de tirar o atraso.”
Escorreguei um dedo pelo seu abdômen. “Kaylee está fora até
amanhã. Então temos muito tempo para continuar tirando o atraso.”
Ele sorriu. “Eu estava planejando isso mesmo.”
Dei um gritinho quando ele mergulhou em mim de novo,
atingindo meus lábios com os seus. Então ele me virou de lado e me
abraçou de conchinha.
“Você não me trouxe nada da Austrália?”, perguntei.
Eu consegui ouvir a desaprovação na sua voz, mesmo sem vê-
lo. “Não sabia que você era carente como uma menina de dez anos.
“Uma garota gosta de ser apreciada!”
“Mas eu tenho uma surpresa para você.”
“Sério?”, respondi animada.
“Duas surpresas, na verdade.”
“Me dá, me dá, me dá!”, exigi, me virando para olhá-lo. “Quero
minha surpresa agora, por favor.”
“Temos que esperar Jordy e Archer chegarem em casa.”
“Não é justo! Kaylee ganhou presente bem rápido.”
“Quem é a criança e quem é a babá?”, ele provocou.
Fiz um beicinho exagerado. “Eu sou a babá, mas só até
amanhã. Archer ainda não me deu a extensão do contrato.
Geralmente, ele é muito rápido com essas papeladas…”
A porta da frente abriu e fechou. “Ah, merda, essa é a mochila
do Harrison?”, Jordy perguntou.
“Tenho certeza de que cheira como a mochila dele.”, Archer
concordou.
“Aqui!”, gritei. “Rápido!”
Archer e Jordy vieram correndo. Harrison saiu da cama e
vestiu sua cueca antes de abraçar os dois homens. Sorri ao vê-los
se abraçando e dando tapinhas nas costas um dos outros. Meus
três homens. Quem teria pensado?
“Algo errado?”, Archer perguntou. “Por que você nos pediu
para vir rápido?”
“Trish está preocupada com o contrato de babá.”, disse
Harrison.
“Ah,”, Archer olhou para os próprios pés, “bem, sim…”
“O que foi?”, perguntei. “Vocês não querem prorrogar por mais
um ano?”
“Não por mais um ano.”, Jordy respondeu.
Fiz uma careta. “Então por mais tempo? dois anos?”, eles me
olharam sem expressão. “Três?
“Trish,”, Archer disse, se sentando na borda da cama, “nós
conversamos e discutimos o assunto. Decidimos não prorrogar seu
contrato mais.”
Eu o encarei. “Isso é uma piada?”
“Estamos falando sério.”, disse Jordy solenemente. “Não
queremos que você continue sendo a babá de Kaylee?”
Algo no meu peito se apertou. “Essa manhã você brincou sobre
estar considerando outras opções. Achei que fosse uma piada. É
sério isso?”
“Kaylee vai fazer dez anos em alguns meses,”, disse Archer,
“ela é grande o suficiente para esperar o ônibus sozinha. E pode
ficar em casa sozinha até sairmos do trabalho. Especialmente
porque Harrison está trabalhando em menos contratos agora.
Apenas não precisamos mais de uma babá em tempo integral. Nem
parcial.”
“Espero que você entenda.”, disse Jordy.
Senti lágrimas brotarem dos meus olhos e tentei afastá-las
desesperadamente. “Eu não… não sei o que dizer.”
“Isso é para você,”, Archer disse, me entregando uma caixinha.
“um presente pelo ano de bom trabalho.”
Eu não queria abrir um presente nem fingir animação, mas
meus dedos desamarraram o laço automaticamente e abriram a
tampa. Dentro, havia uma chave de aço inoxidável. Eu reconheci o
formato, era a chave da casa deles. A casa na qual estávamos.
“Não entendi.”
“É uma chave para a nossa casa.”, Jordy explicou.
“Já tenho a chave da casa de vocês.”, estiquei o braço
apontando o bolso dos meus jeans no chão. “Vocês me deram
aquela chave quando voltamos de Bacu, um ano atrás.”
“Sim, mas…”, disse Archer. “Essa é diferente.”
“Me parece a mesma coisa.”
“Eles estão te convidando para se mudar para cá.”, Harrison
disse, sem rodeios.”
“Ah.”, olhei para a chave novamente. “Ah.”
“Você faz parte da vida de Kaylee. E da nossa.”, Jordy
explicou. “Não queremos mais que você seja Trish, a babá.
Queremos que você seja apenas Trish.”
As lágrimas rolaram pelas minhas bochechas, mas por um
motivo completamente diferente. Abracei Jordy e os outros dois se
juntaram a nós.
“O que você vai fazer?”, Archer perguntou.
“Eu vou dizer sim!”, respondi. “É claro que me mudo para cá.
Eu praticamente já moro aqui. ah, Lisa vai ficar muito feliz. Ela tem
me perguntado constantemente quando eu vou me mudar para cá.”
“Não,”, Archer disse suavemente, “eu quis dizer o que você vai
fazer quando Kaylee voltar para a escola… você vai ter tempo para
fazer o que quiser.”
Fiz uma careta pensando no assunto. Eu tinha fantasiado
sobre algumas coisas no ano anterior. Sobre o que faria se deixasse
de ser babá. Por tanto tempo na vida eu soube que queria cuidar de
uma criança—ou crianças, se eu tivesse sorte, e ser babá de Kaylee
realizou aquele desejo. Entretanto, eu era mais do que uma babá
naquela altura. Eu era parte da família. Eu sentiria aquela satisfação
mesmo sem ser meu trabalho integral.
“Acho que vou voltar a estudar.”, eu disse. “Ou pelo menos
assistir algumas aulas como ouvinte na UNCW.”
“Sério? O que você quer estudar?”, Harrison perguntou.
“Design de vídeo games. Eu adoraria criar o meu próprio. Tipo
Minecraft, mas com mais opções de jogabilidade para criar uma
família. Criar um exercito de pessoas para lutar contra as aranhas e
creepers do jogo. Algo assim. Ainda não pensei muito sobre o
assunto.”
“É uma ideia maravilhosa.”, disse Archer. “Kaylee vai amar.”
Eu sorri. “O jogo foi meio que ideia dela. Ela disse que queria
que Minecraft tivesse mais jogadores. Foi aí que comecei a pensar
nisso criativamente.”, me virei para Harrison. “Essa foi uma.”
“Uma o que?”
“Surpresa. Você disse que tinha duas. Qual é a outra?”
Jordy e Archer se entreolharam. “Você só nos falou sobre a
chave.”
“Sim. Eu tenho algo em mente.”, Harrison se sentou na borda
da cama. “Tenho pensado muito nisso. Nós quatro. Estou
confortável com tudo, mesmo tendo demorado um pouco. Agora
estou. E quero tentar algo novo. algo que vocês vão gostar muito.
Algo que requere nós quatro.”
Ele me olhou incisivamente. Olhei de volta, sem entender.
Mas, de repente, entendi. “Sério?”
Ele sorriu maliciosamente. “Sério.”
“Mas eu não achei que fosse seu tipo de coisa. Você não gosta
de compartilhar!”
“Eu não gosto.”, ele admitiu. “Prefiro ter você só para mim. Mas
vou tentar uma vez. Por você. Quando você se excita, eu me excito,
Trish. Você é meu tipo de coisa.”
Eu o beijei, com amor e gratidão. Foi um gesto de amor no
início. Mas então os lábios de Harrison se chocaram mais
intensamente com os meus, e ele me puxou para o seu colo na
borda da cama. Senti seu pau se mexer.
“Aqui está o presente que eu trouxe da Austrália.”, ele disse,
tirando algo da sua jaqueta no chão. Era longo e feito de lã azul,
vermelha e branca entrelaçadas.
“Um cachecol?”, perguntei. “Não quero parecer ingrata, mas
estamos em julho.”
“É inverno no hemisfério sul.”, ele respondeu. “Além disso, o
cachecol não é o presente. Mas sim o que quero fazer com ele.”
Antes que eu pudesse perguntar, Archer pegou o cachecol e o
amarrou ao redor dos meus olhos. A lã era grossa o suficiente para
bloquear toda a luz.
Então Harrison se levantou e me jogou na cama. Não
conseguir enxergar era uma experiência estranha, muito mais do
que simplesmente fechar os olhos por minha própria vontade, e
aquilo parecia potencializar meus outros sentidos. Eu ainda estava
nua depois do meu ato sexual com Harrison e podia sentir minha
umidade exposta ao ar fresco. Fiquei deitada de barriga por um
longo tempo. Esperando. Os segundos se arrastaram e minha
ansiedade cresceu.
Um pau forçou sua entrada na minha boceta sem nenhum
anúncio. Gritei com a sensação repentina e inesperada. Os
melhores prazeres contêm uma pitada de dor, e naquele momento
senti só a quantidade certa para me fazer tremer e gemer. Como a
quantidade exata de pimenta, que queima sua boca, mas não muito.
Eu achava que conhecia meus amados intimamente naquela
altura, mas sem vê-los, era surpreendentemente difícil saber qual
pau era de quem. Sabendo que eu estava aquecida e pronta, o
homem desconhecido agarrou meu quadril e começou a me foder
como se eu fosse sua boneca pessoal. Decidi que era Harrison ou
Jordy, com base nos dedos enfiados na minha carne. Enfiada na
cama, não havia nada mais que eu pudesse fazer a não ser aceitar
o ansioso ato sexual. Eu não era nada além de um acessório para o
prazer deles.
E aquilo me deixava maluca de luxúria.”
“Aai,”, gemi, arqueando as costas, “assim, não para.”, estiquei
o braço entre as minhas pernas e comecei a roçar meu clitóris.
“Estou quase…”
Apesar da minha súplica, o homem parou repentinamente.
Ouvi o gemido e presumi que fosse Harrison. Fazia sentido ele
começar.
“Eles me disseram que é divertido te provocar.”, ele disse.
“Então é o que nós vamos fazer.”
Archer foi o próximo—ou pelo menos achei que fosse ele—a
me tomar. Ele se movia lentamente, agonizantemente se comparada
à forma como eu tinha acabado de ser tomada. Mas ainda assim,
não ser capaz de ver e o jeito que eles me usavam me catapultaram
na direção de um orgasmo intenso.
E como Harrison, assim que senti o prazer crescer e estiquei o
braço para ajudar no alívio, ele parou.
Soltei um gemido frustrado. “Não para.”
Archer—e era ele, afinal de contas—deu uma risadinha. “Você
não está na posição de pedir nada.”
Então foi a vez de Jordy. Eu tive certeza quando ele tomou seu
lugar atrás de mim e enfiou a cabeça do seu pau na minha entrada
ansiosa. Mas diferente dos outros dois que me tomaram
rapidamente, Jordy hesitou.
“Eu te quero muito.”, eu disse.
Ele deu uma risadinha. “Quanto?”
“Muito.”
“Não estou convencido.”, Harrison se intrometeu. “Acho que ela
precisa implorar.”
“Gostei da ideia.”, Jordy concordou, colocando uma mão na
minha lombar para me segurar para baixo. “Implore.”
“Por favor.”, implorei, cedendo totalmente ao jogo. “Por favor,
me fode. Eu preciso disso. Preciso de você.”
“De quem você precisa?”
“De vocês três.”, suspirei. “Por favor.”
O pau de Jordy me invadiu sem aviso. Gritei de surpresa e
êxtase enquanto meu corpo todo ganhou vida debaixo dele,
queimando com seu toque. Ele me fodia e eu não precisava mais
implorar. Jordy agarrou minha bunda com as duas mãos e me
comeu com força e velocidade, nossas peles estalando uma na
outra enquanto ele gemia.
Então, outro homem se ajoelhou na cama, na minha frente,
seus dedos fortes seguraram meu queixo e abriram bem a minha
boca. Eu sabia que era o pau de Harrison que deslizou entre os
meus lábios. Ele retumbou e gemeu do fundo do seu peito e
começou a foder minha boca, me usando de uma forma que só
intensificava o que Jordy estava fazendo comigo por trás.
Meu orgasmo me assolou como um tsunami no litoral. Todos
os meus pensamentos desapareceram quando o prazer explodiu
por todo o meu corpo, forte e intenso, me fazendo me contorcer.
Outro homem estava na cama, ajoelhado ao lado de Harrison, se
aproximando para chegar até a minha boca. Archer, eu sabia. Um
pau foi substituído por outro e eu comecei a chupá-lo.
Senti Harrison se movendo na cama para tomar o lugar de
Jordy. Ele estava apaixonadamente desesperado, seu pau grosso
praticamente me atingia como um raio a cada estocada
desesperada. Assim que ele me assumiu, Jordy ajoelhou ao meu
lado e colocou uma das minhas mãos no seu pau, demandando que
eu o masturbasse.
Eles se alternaram daquele jeito, tipo uma dança das cadeiras
com as partes do meu corpo que eles queriam usar. Acontece que
um homem pode durar muito tempo se mudar de posição em alguns
segundos. E eles pareciam saber que estavam me enlouquecendo.
E tiveram força de vontade o suficiente para se segurarem. Outro
orgasmo me invadiu, então um terceiro. Eles vinham tão rápido que
era difícil saber quando um terminava e o outro começava. De
repente me vi em um ciclo sem fim de êxtase intenso. E não parava.
Nunca. Fui compartilhada por eles em um ciclo infindo. Três
homens, os três meus.
Quando Harrison estava prestes a gozar, vibrei com a
eletricidade. Seu rugido climático ecoou pela casa toda enquanto ele
tirava o pau de dentro e gozava nas minhas nádegas. Jordy e
Archer estavam logo atrás dele, me empurrando na cama para
poderem gozar na minha lombar. A sensação dos seus líquidos
misturados martelava minha alma. Os músculos dentro da minha
boceta espasmaram e esguicharam quando gozei pela última vez. O
orgasmo mais intenso que já tive na vida, segurada pelos meus três
homens enquanto eu tremia com aquele alívio lindo.
Eles foram gentis depois que terminamos, um contraste
gritante com a forma rude com que eles me tomaram. Os três
brilhavam de suor causado pelos seus esforços, mas sorriam larga e
genuinamente.
“Viu só, companheiro?”, Archer disse com um sorriso torto.
“Não foi tão ruim, foi?”
Harrison grunhiu. “Na verdade, foi gostoso para caralho.”
“Demais.”, Jordy disse, virando meu queixo para me beijar.
“Eu ainda prefiro tê-la só para mim.”, Harrison adicionou,
empurrando Jordy para o lado para poder me beijar também. “Não
gosto de encostar as coxas nas deles.”
Archer se jogou nos travesseiros. “Ah, é?”
“Acho que estamos nos esquecendo de Helsinki em 2013.”,
Jordy disse.
Harrison ficou duro.
“O que aconteceu em Helsinki?”, Perguntei.
Jordy sorriu largamente. “Harrison aqui dormiu de conchinha
comigo para se manter aquecido.”
“Foi diferente!”, Harrison argumentou. “Estávamos tentando
não morrer congelados!”
“E foi por isso que você estava de pau duro no dia seguinte
quando acordamos?"
“Não posso evitar.”, ele olhou para mim suplicante. “Não posso
evitar.”
“Sem julgamentos, grandão.”, eu disse.
“Acho que eu conseguiria evitar.”, Archer provocou, com um
sorrisinho invadindo seu belo rosto. “Se passasse por essa
situação.”
“Eu também.”, Jordy concordou. E me deu uma piscadela.
“Certo, garota-kettlebels?”
“Certo, Bombom.”
Gargalhei quando meus três homens, três amantes, três
amados continuaram alfinetando uns aos outros na cama.
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Clara

Eu odiava – do verbo odiar muito – trabalhar no restaurante da


mama.
“Clara!”, ela gritou da cozinha com seu sotaque siciliano
pesado. “O temporizador está tocando!”
“Já ouvi!”, gritei de volta, entregando o troco a um cliente. Com
a voz mais doce, disse a ele, “Sua pizza ficará pronta logo.”
Outro cliente entrava pela porta, mas me virei e apertei o botão
do forno para interromper o bipe incessante. Então peguei a pá
gigantesca para tirar a pizza do forno e abri a porta. Uma lufada de
ar quente atingiu meu rosto, enquanto eu tirava a pizza lá de dentro
e a depositava na caixa de papelão, esferas de suor se formavam
nas minhas têmporas e na minha testa.
Eu nunca quis trabalhar lá. Eu fiz isso na época do ensino
médio porque era mais fácil do que sair procurando trabalho e
porque papa precisava de ajuda. Então fui para a faculdade e passei
quatro anos maravilhosos longe de um forno de pizza. A única vez
que me aproximei de uma caixa registradora foi como cliente,
comprando alguma coisa.
Mas voltei para a casa dos meus pais depois de me formar,
mais por culpa do que por vontade. Supostamente só ficaria lá por
alguns meses para ajudar a mama com o funeral do Papa.
Um ano depois e eu ainda estava ali. E o restaurante ainda se
chamava Pizzaria do Tony, mesmo que meu pai fosse só uma
memória persistente.
“Obrigada, bom apetite”, eu disse ao cliente enquanto
entregava a caixa para ele. Virei para a mulher que entrava e disse,
“Bem-vinda à Pizzaria do Tony, como posso ajudar?”
Enquanto eu anotava o pedido dela, o telefone tocou duas
vezes. Minha mãe atendeu da cozinha, onde preparava as pizzas.
Depois de anotar o pedido da mulher, a cabeça da mama apareceu
na quina da parede.
“Entrega!”, ela disse. “A pizza sai em cinco minutos.”
Resmunguei. A única coisa pior do que trabalhar na cozinha
eram as entregas. Havia muitos caras estranhos por ali, do tipo que
oferecia uma grande gorjeta com uma piscadela. Não era à toa que
a maioria dos entregadores eram homens.
A maioria dos restaurantes já tinha adotado pedidos digitais,
mas minha mãe insistia em fazer tudo manualmente. Cada pedido
era anotado em um pedaço de papel e afixado a um varal na
cozinha. Peguei o papel e conferi o endereço. A rua estava legível,
mas o número era só um amontoado de riscos.
“South Henderson…”, meu coração acelerou. “Na esquina?”
Só tinha um lugar que eu amava ir para fazer entregas: o
quartel dos bombeiros. Os caras eram maravilhosos! E não só
porque eles eram heróis de verdade que salvavam pessoas de
incêndios. Os bombeiros de Riverville, Califórnia eram deliciosos.
Uns galãs de calças largas e camisetas brancas. Sorrisos
charmosos e músculos pulsantes.
Eu gostaria de duas fatias com molho extra, por favor,
senhores.
Mas minha mãe chacoalhou a cabeça. “Na esquina não.
Seiscentos e vinte e três”, ela limpou a testa com uma das mangas.
“Alguns quarteirões pra baixo.”
Merda, pensei. Sexta-feira era dia deles pedirem pizza, mas
nada ainda. Talvez eles estivessem tentando mudar a rotina
alimentar.
“Por que o Dan não leva?”, perguntei.
“Dan ainda está fora com as últimas entregas”, minha mãe
respondeu impacientemente.
“Porque ele sempre para pra fumar antes de voltar”, murmurei.
Ela me encarou.
“Tá bom, tá bom! Tô indo.”
Mama resmungou em italiano.
Eu ainda estava suada de trabalhar na cozinha, mas não tinha
tempo para me trocar. Coloquei duas pizzas na caixa térmica e a
carreguei para o carro.
Riverville era uma cidadezinha pitoresca da Califórnia que
ficava perto de Fresno. De um lado, subúrbios se espalhavam
misturados à centros comerciais e do outro, fazendas cobriam todo
o trajeto até as montanhas. Riverville ficava estranhamente no meio
do caminho. Não era exatamente uma zona rural, mas tampouco
super urbana.
O endereço para entrega ficava a cinco minutos. Tudo em
Riverville ficava a cinco minutos de tudo, dependendo dos sinais de
trânsito. A casa que pediu a pizza ficava a um quarteirão da avenida
principal. Não havia carros estacionados, mas as luzes estavam
ligadas.
Bati na porta e um garotinho magricelo de doze anos abriu.
“Entrega”, eu disse.
“Finalmente!”, o menininho arrogante respondeu. Atrás dele, no
corredor, vi um bando de pré-adolescentes dando risadinhas. “Não é
grátis se vocês demorarem para entregar?”
Sorri educadamente e olhei no relógio. “Demorei exatos seis
minutos e quarenta e cinco segundos pra chegar aqui. São vinte e
cinco dólares.”
O menino me entregou duas notas de vinte. Enfiei a mão no
bolso e tirei uma nota de dez e uma de cinco dólares. Ele pegou o
troco, as pizzas e começou a fechar a porta.
“Sabe, faltou a gorjeta”, eu disse.
Ele zombou. “Cala a boca, tia.”
“Tia? Eu só tenho vinte e quatro anos!”
Ele deu de ombros e bateu a porta na minha cara. Comecei
bem a noite.
Dirigi para casa de mau humor, não só por causa dos clientes
chatos. A grande merda de trabalhar em uma pizzaria era que as
noites mais cheias eram os finais de semana. Eu sempre passava
minhas noites de sexta, sábado e domingo trabalhando. Depois de
um tempo, eu já tinha me cansado.
Mama estava no telefone quando entrei no restaurante. “Outra
entrega”, ela disse.
Resmunguei. “Dan ainda não voltou?”
“Voltou, mas guardei essa pra você”, ela respondeu. Ela tentou
manter o rosto sério, mas o sorriso escapuliu por entre seus lábios.
Corri para trás do balcão para ver o endereço da entrega.
South Henderson. Quartel dos bombeiros.
Tentei não comemorar. “Quanto tempo até a pizza ficar
pronta?”
“Dois minutos”, minha mãe disse por cima do ombro.
Corri para o banheiro de funcionários e freneticamente tentei
parecer mais apresentável. Limpei o suor do pescoço, desamarrei
meu rabo de cavalo e o refiz deixando algumas mechas soltas.
Tinha um respingo de molho de tomate no meu peito que eu removi
com um papel higiênico molhado.
“Anda logo!”, minha mãe gritou da cozinha.
Corri para fora do banheiro e peguei a pizza na mesa. Eu ainda
não estava como queria para encontrar os bombeiros, mas pelo
menos estava mais decente do que antes.
“Não demore muito dessa vez!”, minha mãe advertiu.
“Não sei do que você está falando.”
Mama me deu uma piscadela e eu corri para fora do
restaurante.

Uma babá para los Bombeiros


Cassie Cole é uma escritora de Romances de Harém Reverso
que vive em Forth Worth, no Texas. Uma apaixonada piegas de
coração, acredita que romances são melhores com um enredo
picante!

Otros livros de Cassie Cole (em


Português)
Uma Babá Colorida
Tentação Tripla
Uma babá para os Fuzileiros
Uma babá para os Bombeiros
A garota dos Bilionários
Uma babá para o Natal
A garota dos Caubóis
Ardente
Uma babá para os Mercenários

Otros libros de la misma autora


(em Inglês)
Broken In
Drilled
Five Alarm Christmas
All In
Triple Team
Shared by her Bodyguards
Saved by the SEALs
The Proposition
Full Contact
Sealed With A Kiss
Smolder
The Naughty List
Christmas Package
Trained At The Gym
Undercover Action
The Study Group
Tiger Queen
Triple Play
Nanny With Benefits
Extra Credit
Hail Mary
Snowbound
Frostbitten
Unwrapped
Naughty Resolution
Her Lucky Charm
Nanny for the Billionaire
Shared by the Cowboys
Nanny for the SEALs
Nanny for the Firemen
Nanny for the Santas
Shared by the Billionaires

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