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Copyright © 2020 MAÍNY CESAR

EVA: O DESEJO DE VINGANÇA

1ª Edição

FICHA TÉCNICA E EQUIPE EDITORIAL


Capa: Magnifique Design
Revisão: Bianca Bonoto
Diagramação Digital: AK Diagramações

Todos os direitos reservados à autora, desta forma é proibido o armazenamento e/ou a reprodução de
qualquer parte dessa obra, através de quaisquer meios, tangíveis ou intangíveis, sem o consentimento escrito
da autora. A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na lei nº 9.610/98 e punido pelo artigo 184
do Código Penal.
Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos que aqui serão descritos, são
produto da imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é mera
coincidência.
Esta obra segue as regras da Nova Ortografia da Língua Portuguesa.

Edição Digital | Criado no Brasil


Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Epílogo
Livro físico
Outras Obras
“Não julgue o livro pela capa, nem o homem pelos seus erros, antes de tudo você
precisa conhecer os dois lados de uma moeda”
Abro meus olhos com dificuldade e me arrependo no exato momento em
que o faço, uma vez que dores terríveis se espalham por todo meu corpo.
Mal consigo enxergar. Sinto meu peito pesar e uma forte ardência se
espalhar pelo meu tórax. É uma sensação estranha e ao mesmo tempo dolorosa.
Forço alguns movimentos, mas os vários fios enroscados em meus braços
não permitem que eu faça muito esforço. Gemo baixinho sentindo a dor
constante, insistente e sem piedade dominar meu peito.
Com muita resistência foco minha visão e percebo estar em um quarto de
hospital com vários médicos a minha volta, alguns me olhando de forma
assustada e desesperada, até que de repente um bombardeio de perguntas chove
em minha direção.
Eles estavam confusos e curiosos, mas eram perguntas das quais eu não
tinha respostas. A única coisa que conseguia lembrar era do par frio de olhos
azuis me encarando por constantes minutos enquanto apontava duas pistolas
negras em minha direção, até um som estridente sair de uma delas me jogando
para trás bruscamente.
Acabo consequentemente recordando a sensação de algo quente molhar
meu vestido azul bebê de cetim e logo em seguida tudo fica escuro rapidamente.
Ele deveria ser a minha salvação.
Aquele que me protegeria.
Porém ele decidiu ser minha perdição, ser a minha morte.
Acordo assustada e com a respiração irregular. Meus punhos fechados e
abraços estendidos em posição de ataque como se estivesse preparada para uma
batalha. O escuro domina o ambiente gélido do meu quarto, a porta da academia
estava entreaberta permitindo que ar gelado circulasse pelo pequeno ambiente.
Ainda era madrugada, porém, como todos os outros dias ele veio mais
uma vez atormentar os meus sonhos, despertando o meu desejo de vingança.
Levanto-me do futon1 seguindo para a sala de treinamento da academia, onde eu
poderia descontar todas as minhas frustrações e desespero, sentimentos dos quais
eu precisava aprender a dominar caso quisesse conquistar a liberdade e a minha
querida e doce Itália de volta.
Me posiciono desferindo incontáveis socos e chutes no boneco a minha
frente, imagens frustrantes daquela noite passam pela minha mente como flashes
vivos de algo que eu desejava imensuravelmente esquecer.
Um garoto de 17 anos anda tranquilamente pela sala de estar da mansão
Becker enquanto eu, minha mãe, meu pai e minhas duas irmãs mais velhas
estávamos amarrados e ajoelhados um ao lado do outro sobre o tapete persa
que a mamãe mais gostava.
Meu pai suplicava insistentemente pela vida de suas filhas, enquanto
Donatel Voyaller ria do seu desespero e eu tentava entender o porquê de tudo
aquilo.
Donatel sempre foi um amigo próximo da família, uma vez que ele era o
melhor amigo do meu pai, participando ativamente de todos os eventos que os
Beckers organizavam e apesar de sempre ter achado ele um homem frio e
medonho, papai confiava cegamente nele.
Dante, seu único filho tinha uma relação complicada e distante com o
pai, mas naquele momento não conseguia entender porque ele obedecia às
ordens daquele velho rabugento. Odiar Donatel fazia parte de mim, uma vez que,
eu sempre tive medo daqueles olhos vorazes e agora era obrigada a vê-los
estampados no rosto do meu amado Dante.
Donatel balança a cabeça dando a confirmação para Dante atirar, a
sede de sangue que ele emana é quase palpável. Sem se importar ele aponta
suas duas armas negras para minhas irmãs e atira sem se quer titubear ou
sucumbir.
O desespero toma conta do meu corpo ao ver minhas irmãs inertes no
chão, o sangue escorrendo de suas cabeças formando grandes poças vermelhas
sobre o tapete que um dia fora felpudo e delicado. Começo a gritar
desesperadamente na tentativa inútil de despertá-las, mas de nada adiantaria.
Donatel, caminha até mim com um sorriso demoníaco no rosto, mas
Dante se coloca a minha frente impedindo-o de continuar.
— Mate os outros dois. — Donatel dá a ordem para que Dante acabasse
com a vida dos meus pais.
— Donatel deixe Eva em paz, é a única coisa que eu te peço. — Meu pai
mais uma vez implora por minha vida e não pela sua enquanto Donatel ria
diabolicamente.
Dante se move lentamente em direção aos meus pais sem expressar
nenhuma reação ou dor em seu olhar frio e sanguinário.
Eu suplico e imploro na esperança de que isso o faça parar, mas ele não
me ouve, se quer olha dentro dos meus olhos e mais uma vez segue as ordens de
seu pai como um cachorro bem treinado mirando suas duas Taurus gêmeas em
direção aos meus pais e atira sem se preocupar.
O som estridente reverbera pelo meu corpo e fortes arrepios percorrem
minha coluna enquanto vejo os corpos inertes dos meus pais caírem no chão
sem vida. Inconscientemente começo a gritar desesperadamente para que meus
pais acordem, mas os meus gritos não são altos o suficiente para alcançá-los,
uma vez que eles não se mexem.
Tomada pelo desespero, mesmo com as mãos amarradas me levanto e
corro até o corpo da minha mãe, falando em seu ouvido como se dessa forma
ela pudesse me escutar e acordar.
Dotanel me ergue pelos cabelos e me arrasta pelo chão como um verme
insignificante até me arremessar fortemente contra a parede, fazendo o ar dos
meus pulmões sumirem por alguns instantes. Começo a tossir
incontrolavelmente quando percebo Dante entrar na minha frente, como se
finalmente a cabeça dele tivesse voltado a funcionar, o que infelizmente seria
tarde demais.
— Está protegendo essa putinha! Mesmo toda culpa sendo dela? —
Donatel ri debochadamente. — Dante, meu caro Dante, você sabe que não
existe amor para pessoas como nós, essa mulher com toda certeza acabará
sendo a ruína da família Voyaller se permanecer viva, sendo assim, já que você
será meu sucessor... mate-a — ele ordena sem se importar.
Dante observava o pai e a mim enquanto choro incontrolavelmente
vendo os corpos dos meus pais e irmãs estendidos no chão. Volto meu olhar
para o seu a tempo de vê-lo apontar suas armas em minha direção, observando-
me por incontáveis minutos sem esboçar qualquer reação.
Ele olha dentro dos meus olhos e posso ver um misto de arrependimento
e dor, mas logo em seguida puxa o gatilho. A ardência em meu peito é
instantânea e tudo fica escuro. Ouço as vozes distantes enquanto apago de vez e
a única coisa que fica marcada em minha memória são os frios olhos azuis de
quem um dia eu amei.
Não consigo para de pensar naquela noite, muito menos tirar dos meus
pensamentos a pergunto que repito todos os dias. Como um menino de 17 anos
conseguiu acabar com uma família inteira? O que eu fiz para merecer viver toda
essa dor?
Essas eram perguntas que jamais foram respondidas.
As dúvidas só cresciam dentro de mim e para me livrar delas projetava
incontáveis sequencias de socos e chutes no pobre boneco. Minha pele suada
queimava em contato com o ar frio da noite me causando intensos arrepios.
Dante Voyaller, afrontava meus pensamentos e tirava a paz do meu
coração, o homem de olhos frios e aura sombria que destruiu a família Becker
estava prestes a conhecer o inferno.
O inferno que eu causaria em sua vida.
Depois de tudo que aconteceu fui obrigada a vir para o Japão morar com
o único tio que me aceitou como membro de sua família. Quando cheguei a
Tóquio fiquei impressionada com aquela cidade, é simplesmente magnífica, seus
altos prédios chamavam a atenção de todos que passavam nas suas ruas
movimentadas, os banners iluminados e todos aqueles jogos de luzes faziam
você se impressionar com a grande quantidade de propagandas de produtos
desconhecidos.
Mas no fundo sendo bem sincera, nada é mais belo do que a Itália e a
saudades do meu país queimava dentro do meu peito.
Todos os registros ligados a mim e a família Becker foram arquivados
para que ninguém soubesse que eu havia sobrevivido, passei a usar um
codinome para esconder meu verdadeiro nome daqueles que quero destruir.
Omiti da polícia todos os fatos sobre o meu passado a fim de fazer justiça
com as minhas próprias mãos. Para eles o trauma havia sido tão grande que eu
não conseguia lembrar nada daquela fatídica noite.
O que é uma mentira, pois Dante Voyaller, ou melhor dizendo “O Dragão
de Veneza” jamais sairia da minha mente. Eu jamais esqueceria o garoto que me
fez juras de amor e promessas de proteção, mas exterminou minha família sem
hesitar com as próprias mãos.
Ansiedade me define. Nem mesmo posso acreditar que depois de onze
anos pisarei novamente em solo Italiano e a cada pequena turbulência do avião
em meio as nuvens espessas meu coração se acelera em ansiedade.
Apesar das cansativas horas de viagem do Japão à Itália finalmente ouço
o piloto anunciar nosso pouso.
E uma vez que coloco a planta dos pés em solo Italiano, abro os braços
respirando profundamente o ar do meu doce e amado país.
Desembarcar em solo norte Italiano me faz relembrar os bons momentos
do meu passado ignorando os ruins. Senti tanta falta desse lugar maravilhoso.
— Como eu senti falta desse país maravilhoso — falo para mim mesma,
sem me importar com as pessoas que desembarcam ao meu redor e me
observando desconfiadas.
Após pegar minha mala na esteira procuro por Robert, um amigo que
considero irmão.
A lotação de pessoas ao me redor me deixa ainda mais ansiosa e depois
de incontáveis minutos finalmente o encontro segurando uma placa com o meu
codinome.
Bom garoto. Penso com um grande sorriso nos lábios.
Sem pensar duas vezes corro em sua direção e me jogo em seus braços
fortes.
Ele era tão jovem quando me mudei e agora está totalmente diferente,
está um homem lindo e de tirar o fôlego de qualquer mulher que tenha bom
gosto.
Sem muita dificuldade, Robert me ampara em seus braços forte me
girando no meio do aeroporto, ao me colocar no chão novamente deixa um beijo
demorado em minha testa.
— Rob, que saudades. — Sorrio e ele bagunça meu cabelo.
— Sempre levada e sapeca. — Aperta minhas bochechas.
Não pensem que Robert é algum namorado, não mesmo, ele
simplesmente é um velho amigo que ficou encarregado de assumir todas as
empresas em nome dos Becker.
Na verdade, ele é quem sustenta toda a fortuna que ainda se mantém em
meu nome.
Robert é um homem alto e charmoso, seus fios grisalhos perdidos entre
os cabelos negros o deixam mais charmoso e elegante. Um verdadeiro
empresário cheio de si.
Para mim, Robert, é a minha família, ele é a única pessoa que se importa
comigo nesse mundo. O único que não me abandonou depois do que aconteceu
com os meus familiares. Além de ser um dos únicos que sabe que estou viva.
— Finalmente, depois de onze anos eu pude voltar para Itália. — Suspiro
aliviada.
— Achei que você não retornaria mais — diz cansado.
— Que isso, só fiquei um tempinho fora, você sabe que sou uma pessoa
morta. — Pisco, mas recebo uma carranca emburrada.
— Odeio quando você brinca com isso. — Revira os olhos dando um
peteleco na minha testa.
— Aí. — Passo a mão na testa chateada. — Se eu não brincar as coisas só
ficariam pior.
— Tente esquecer então.
— Impossível — resmungo.
— O quê? — Me fita com uma sobrancelha arqueada.
— Nada, vamos logo Rob. — Caminho para a saída do aeroporto o
deixando para trás.
Ele me ajuda com as malas as levando para o carro que estava a nossa
espera.
— O que você leva dentro dessas malas — murmura.
— Bom dentro dessa. — Aponto para mala que ele custa em colocar no
carro. — Minhas armas, então trate de tomar muito cuidado, pois foi
extremamente burocrático conseguir trazê-las para Itália. — Dou de ombros.
— Ainda não desistiu dessa vingança, Eva — diz chateado.
— Eu já disse para não me chamar assim. — Tampo sua boca com
minhas mãos. — Sabe que ele tem homens espalhados por todos os lugares.
— Entendi. — Segura minha mão. — Você deveria parar com essa
fascinação pelos Voyaller — fala chateado e ao mesmo tempo bravo.
— Isso não vem ao caso no momento, sabe que não ficarei em paz até
descobrir a verdade. — Passo a mão no peito me lembrando dos intensos olhos
azuis do Dragão.
— Eu queria que você me escutasse uma única vez. — Balança a cabeça
em negativo.
— Creio que isso seja impossível. — Me acomodo no banco do
passageiro e recebo um olhar de repressão.
— Você está mais abusada do que eu me lembro — comenta com
insatisfação.
— Somente não quero discutir sobre isso agora. Sabe que esse assunto
me deixa irritada, além de me trazer lembranças dolorosas. — Cruzo os braços
entristecida.
— Me desculpe, vamos para casa. Sua chegada é um momento especial
que devemos comemorar. — Seus lindos olhos escuros se voltam para mim
cheios de carinho.
— Com macarronada? — pergunto empolgada.
— Com macarronada! — afirma com um lindo sorriso nos lábios dando
partida no carro.
Sinto meu peito vibrar em felicidade ao saber que comeria novamente a
macarronada de Robert.
Como não tinha outro lugar para ir ou para morar, aceitei ficar na casa
dele, afinal ele não aceitaria que eu ficasse em outro lugar e, apesar de sua casa
ficar um pouco afastada da cidade, fica entre as localidades de Veneza e Verona,
para ser mais exato próximo a Pádua.
Observo Robert dirigindo e me pego sorrindo involuntariamente. Ele está
tão diferente do que me lembro.
— Você está tão diferente, alto e forte. — O observo curiosa.
— Foram onze anos Eva. — Me observa com a sobrancelha arqueada. —
Você também mudou muito, cadê aquela garotinha chorona de quinze anos que
não sabia fazer nada? Olha para você agora, me sinto um velho te vendo assim.
— Olha de soslaio enquanto dirige.
— Para, você não está velho. — Reviro os olhos.
— Ainda não gosto de pensar que pratica essas lutas brutais — fala com
desgosto.
— Não são lutas brutais — defendo.
— São sim, para qualquer mulher delicada como você. — Encara
convicto.
— Olha para mim Rob eu pareço mais bruta e menos delicada? — Faço
uma pose desajeitada e ele começa a rir.
— Nem bruta e nem sexy. — Ele rir tanto que chega a formar lágrimas
nos cantos de seus olhos.
— Otário de merda. — Bufo irritada.
— Desculpa, não queria ofendê-la. — Me observa sério reprimindo um
sorriso.
— Não quero graça com você vamos logo para casa que preciso
organizar meus planos para caçada de um certo dragão que gosta de usar os
números 371 para marcar as pessoas que mata. — Cruzo os braços olhando a
pista passar pelo vidro do carro.
— Você não irá desistir Eva? — Robert pergunta intrigado.
— É claro que não, e já vou avisando que sumirei por tempo
indeterminado, não adianta me ligar ou me procurar — digo irritada.
Com toda certeza ele tentará me impedir.
— De maneira alguma, você acabou de voltar e já está querendo sumir?
Acha mesmo que vou deixar você chegar perto daquele desgraçado que tentou te
matar uma vez? Não será sacrifício nenhum para ele acertar seu coração dessa
vez, já que dá outra ele errou. — Aperta firmemente o volante do carro irritado.
— Ele não errou — resmungo olhando novamente para a janela do carro.
Dante simplesmente não quis acertar meu coração, pois se quisesse teria
feito com maestria. Pessoas como ele não erram, pessoas como ele deixam o
assunto inacabado para brincar com suas vítimas no futuro.
— Como pode ter tanta certeza que ele não errou? É claro que errou Eva,
pare de ser teimosa e cabeça dura. Todos esses anos no Japão só te deixaram
ainda mais complicada e paranoica, se a mira daquele desgraçado fosse a alguns
centímetros para esquerda teria acertado seu coração. — Sua voz se altera e
acaba desferindo um soco no volante do carro.
— Eu sei que você me ama, mas ainda assim, eu vou atrás do Dragão. O
fato dele ter errado não vem ao caso. Ele não acertou meu coração porque
simplesmente não quis e eu vou descobrir o porquê disso tudo. Quero toda a
verdade para depois matá-lo lentamente e já te adianto os detalhes. Eu não vou
errar — afirmo irritada. — E outra coisa, não foi uma escolha ir para o Japão,
não se esqueça que fui obrigada — falo séria, o encarando com irritação. — Você
sabe que a única maneira de descobrir a verdade é entrando no jogo dele e
fazendo parte das suas sujeiras, então simplesmente entrarei em seu jogo.
Este assunto está chateando a nós dois.
— Convencida do caramba, quem disse que eu te amo garota abusada? —
Ele estaciona o carro em frente a uma casa enorme. — Não importa o que eu fale
ou faça, você não me dará ouvidos.
Robert está tentando desviar do assunto principal que é caçar Dante e
isso só me deixa ainda mais irritada, mas já que ele quer jogar dessa maneira
vamos entrar na dele.
— Você me ama mesmo. — Começo a rir da expressão de incredulidade
que ele faz.
— Tire logo essa bunda do meu carro antes que a chute, já chegamos. —
Com cara de poucos amigos ele sai do carro.
Fico boquiaberta ao olhar para casa que estava a minha frente.
Esses ricos de merda que não sabe dar valor no dinheiro suado que ele
mesmo ganha, desço do carro irritada.
— Está casa é sua? — pergunto indignada chutando sua bunda.
Como ele não esperava o ataque repentino bate a cabeça no porta-malas
do carro que estava aberto, pois estava pegando as minhas malas.
— Sua cretina. — Me lança um olhar mortal passando a mão na cabeça
onde havia batido. — Se você quisesse algo mais simples ficasse em um hotel —
grita irritado.
Sorrio cruzando os braços. Irritar Robert sempre foi algo maravilhoso e
nem depois de longos anos ele não perde seu jeito explosivo e carrancudo.
O bom de tudo isso é que posso usar sua própria fúria contra ele mesmo.
— Você me odeia é isso? — Faço um biquinho magoado com olhos
lacrimejando.
Drama psicológico funciona como luva para Robert e como eu previa
vejo ele amolecer e ceder gradativamente.
— Corta essa, não vou cair no seu jogo. — Ele fecha sua expressão, mas
seus olhos não negam que ele está preocupado.
— Rob — chamo ele com voz manhosa o cutucando com o dedo. — Você
acha justo depois de onze longos anos de treinamento não me deixar ir atrás do
Dragão? Você vai me ajudar, não vai? Vai conseguir uma maneira para que eu
me encontre com ele. — Me aproximo com cara de cachorro sem dono e abraço
ele esfregando meu rosto em seu peito. — Você acabou de gritar comigo e me
chamar de cretina, depois de tanto tempo longe está me tratando mal dessa
maneira. — Apelo para níveis alarmantes, pois sempre funciona com Robert.
Ele suspira pensativo e passa as mãos nos meus cabelos, preciso dele ao
meu lado para encontrar Dante Voyaller. Cheguei hoje e seria complicado
levantar pistas dos seus passos tão rapidamente, mas conhecendo bem Robert,
ele deve manter um tempo em especial para observar Dante e seguir seus passos.
E eu preciso das informações que ele tem para dar início ao meu plano
com urgência.
— O que eu não faço por você. — Ele me abraça apertado e eu sorrio.
— Obrigada Rob, eu sabia que você ficaria do meu lado. — Sorrio para
ele o abraçando com mais força.
— Pare de me olhar com essa cara de cachorro sem dono — diz bravo.
— Essa cara sempre me salva quando você está bravo comigo. — Dou
uma piscadinha o soltando do meu abraço de urso.
— Um dia desses vou me arrepender de tudo isso, vamos logo, você
precisa arrumar suas coisas. — Termina de pegar minhas malas.
O ajudo a levar minhas malas para dentro da enorme mansão que ele
chama de casa.
Deixo minhas coisas em um quarto que ele preparou para mim e resolvo
dar uma volta pela casa. A mobília é séria e de cores escuras, com pouco quadros
e alguns vasos em lugares estratégicos. Para um lugar tão grande falta móveis e
vida.
Não culpo Robert, pela falta de arte em sua casa. Ele vive mais na
empresa do que aqui e posso acreditar que seu escritório é bem diferente deste
lugar.
Robert assumiu as empresas Becker logo após a morte dos meus pais.
Às vezes custo a acreditar que meu pai não sabia o que iria acontecer
com a nossa família, pois seu testamento sempre me deixou intrigada.
Como se ele soubesse que todos iriam morrer, deixou claro em seu
testamento que Robert seria o responsável por assumir as economias e empresas
Becker se não houve nenhum de seus familiares para assumir seu lugar. Como eu
ainda era menor de idade, o testamento continuou válido.
Para toda a Itália o assassinato da família Becker levou a morte dos cinco
membros da família. O que é uma mentira, pois ainda estou viva, mas
pouquíssimas pessoas sabem da verdade.
A polícia vendo que o assassino poderia retornar para terminar o serviço
começado, achou viável manter minha morte e me mandar para outro país com
outro nome.
Eu ainda era jovem e poderia reconstruir minha vida com algum familiar
distante.
Eles sabendo que Robert também poderia sofrer com a liderança das
empresas, achou correto que ele não as assumisse como herança e sim como um
comprador qualquer. Então ele fingiu comprar as ações e dar continuidade aos
negócios mudando o nome da empresa Becker para Trion.
Foi uma ótima escolha já que tirou os olhares da mídia da família Becker
e se voltaram para o mais novo milionário da Itália.
Acredito que com isso, qualquer dúvida que Dante tenha sobre a minha
morte caíram por terra. Eu realmente quero colocar minhas mãos no homem que
um dia amei e ter o prazer de matá-lo junto de seu pai.
Desço as escadas e encontro Robert fazendo sua deliciosa macarronada.
O cheiro incendeia a casa e faz meu estômago roncar, e como já é noite na Itália
um o leve frio me faz sorrir.
Simplesmente amo esse clima que fica entre o frio e calor gerando uma
suave brisa de mudança de estação.
— Quer ajuda? — pergunto ansiosa e ele nega sorrindo.
— Ainda tenho amor a minha vida, não pretendo morrer com suas
comidas indigestas. — Sorri cheio de si me encarando com aqueles lindos olhos
castanhos brincalhões.
— Engraçadinho, aprendi muita coisa no Japão, mas vou aproveitar a
oportunidade para tomar um banho e deixar que você faça sua macarronada
deliciosa. — Ele assente e eu volto para o quarto.
Assim que entro no chuveiro deixo a água morna massagear meus
músculos cansados da viagem. Fecho os olhos e a única coisa que consigo
enxergar são intensos e frios olhos azuis envoltos de uma pesada nevoa de ódio.
Procuro concentrar meu foco no presente lavando meus longos cabelos
ruivos. Tento frustrantemente expulsar da minha mente a tormenta que aquele
homem me causa e sem muito sucesso saio do banho me trocando rapidamente.
Coloco uma roupa leve de frio e penteio os meus cabelos molhados.
Desço novamente para a cozinha onde Robert me esperava com a mesa posta.
Aproveitamos o tempo para jogar conversa fora já que a muitos anos não
tínhamos a oportunidade de nós sentar juntos e desfrutar da presença um do
outro.
A macarronada que ele faz é com toda certeza a melhor que já comi em
toda a minha vida e tenho certeza que não há restaurante no mundo que consiga
sabores tão especiais.
Procuramos evitar tocar o nome do causador de toda a nossa desordem
emocional, mas em meio a conversas simplistas Robert, acaba tentando me
convencer a deixar minha vingança de lado.
Eu entendo perfeitamente que para ele meus planos são algo arriscados
demais, mas quando sua vida é destruída sem motivos algum pela pessoa que lhe
jurou amor eterno, tudo em que você acredita se desfaz e mesmo que você tente
lutar com todas as forças para seguir em frente, o vazio e o buraco em meu peito
me puxam para trás querendo respostas.
Com uma pequena falha de informações exageradas e explicações falhas
na tentativa de me convencer, Robert deixa escapar que haverá uma festa na
mansão Voyaller no final de semana. Será um evento de alta classe fechado para
os convidados especiais.
Sabendo que não poderia perder essa oportunidade para observar o
território inimigo, obrigo Robert encaixar meu nome na lista de convidados.
Influência Robert Trion tem de sobra.
Rastejei, supliquei, implorei e beijei seus pés até finalmente conseguir
convencer esse cabeça dura a me ajudar. Em completo contragosto ele concorda
em dar um jeito de encaixar meu nome na lista de convidados.
A felicidade me consome por saber que encontrarei O Dragão de
Veneza mais rápido do que eu esperava.
Agora preciso treinar minha mente e o meu espírito para não me deixar
influenciar pela sua presença maçante, pois ver aqueles olhos medonhos como
um mar revolto cheio de ódio e malicia não é algo fácil de se enfrentar
pessoalmente.
Sei que não deveria estar tão focada nesta vingança, também sei que
antes de planejar qualquer ataque ao inimigo, devemos analisar o seu território e
é exatamente isso que farei essa noite.
Depois de chegar a Itália acreditei que teria um tempo para visitar os
meus lugares preferidos como o Coliseum, que apesar de ser um lugar antigo e
cheio de pedras me chama a atenção exatamente por ser assim. Queria também
dedicar um tempo especial a Robert que sempre cuidou de mim, mas a vontade
de encontrar Dante se sobrepõe a todas as outras em meu coração e não poderia
perder uma oportunidade tão grande como essa de entrar diretamente em sua
casa.
A semana passou como vulto e meu foco ficou completamente voltado
para a festa que me espera está noite.
Robert tentou de todas as maneiras me convencer a mudar de ideia, mas
meus pensamentos estão ligados ao Dragão.
Me observo através do espelho e me sinto satisfeita com a imagem que
vejo. O vestido que escolhi realça minhas belas curvas, deixando-as bem
delineada no pano agarrado ao meu corpo. Como não quero chamar atenção
mais do que o necessário optei por uma cor escura e muito simples. O famoso
preto básico. A fenda que se estende na perna me deixa desconfortável por
mostrar mais pele do que eu gostaria, entretanto é necessário para os meus
movimentos em uma possível luta.
Foi difícil escolher um vestido que se encaixasse no que eu realmente
estava buscando, todos os modelos eram ousados demais e a maioria deles
deixavam parte das minhas costas exposta o que não é uma boa coisa, pois levo
o brasão da família Becker — uma flor de lótus — escondido entre as penas de
uma fênix em uma belíssima tatuagem.
Respiro profundamente arrumando o coldre de facas na parte superior da
minha coxa.
Não costumo usar armas de fogo, apesar de muito práticas e rápidas,
gosto e opto por armas brancas, todos os tipos possíveis de armas brancas.
Termino de arrumar meus longos cabelos ruivos deixando seus cachos
caídos sobre minhas costas e ombros. Esfumo bem minha maquiagem para que
meus olhos castanhos esverdeados fiquem marcantes e retoco o batom vermelho
deixando meus lábios vivos e chamativo.
Sinto meus olhos marejados ao tocar minha orelha e analisar o pequeno
brinco de diamantes que brilha delicadamente. Uma peça exuberante e sensual,
um presente especial passado de geração em geração que guardo com carinho,
pois, foi o último presente que ganhei da minha mãe antes dela partir.
Aqueles pensamentos me deixam atordoada e entristecida, então procuro
dispersá-los, pois, não poderia me apegar ao ódio neste momento e com esses
pensamentos desço para sala onde Robert me esperava visivelmente chateado e
por mais que ele tente esconder seu nervosismo falha drasticamente
— Você deveria desistir — insiste assim que colo os pés na sala.
— Por Deus Rob, pare com isso. Estou indo apenas para analisar o local e
observar Dante Voyaller de perto. Se for favorável para mim colocarei meus
planos em prática. — Seguro minha pequena bolsa de mão que têm um fundo
falso onde escondo um pequeno punhal adaptado para se encaixar perfeitamente
no fundo e algumas maquiagens adaptadas a armas, como o batom que no lugar
do gloss leva uma pequena faca.
— Eva... — persisti transtornado.
— Nada de vir atrás de mim se eu não voltar. — O observo duvidosa.
— Não posso garantir nada. — Bufa irritado.
— Já conversamos sobre isso, nada de agir por impulsividade. Você sabe
que pode estragar todos os meus planos se fizer isso — o repreendo e ele suspira.
— -Você sabe que para tirar tudo o que quero de Dante precisarei da sua
confiança e para ganhar isso somente fazendo parte das falcatruas que ele se
envolve.
— Eu odeio esse homem — diz irritado. — E odeio ainda mais a ideia de
te ver fazer parte do mundo distorcido dele.
— Somos dois. — Pisco para ele sorrindo. — Não se preocupe, você sabe
bem o que eu quero Rob, apenas proporcionar dor e sofrimento aquele homem.
— Eva, não faça nada de imprudente. Sabe que eu não suportaria perdê-la
novamente. — Ele se aproxima acariciando os meus cabelos com carinho e
preocupação.
Respiro profundamente apoiando minha mão em seu peito em sinal de
conforto.
— Você não irá me perder, mas precisa confiar em mim. Talvez eu
precise passar alguns dias, semanas ou meses naquela casa para descobrir a
verdade. — Observo seus olhos cansados e preocupados. — Tudo é mais
complexo do que imaginamos e você sabe disso.
— Só tome cuidado. — Deixa um beijo na minha testa.
— Prometo tomar. — Sorrio gentilmente.
— Tarciso está a sua espera com uma Lamborghini. Não poderia deixar
minha maninha chegar de táxi — fala com um olhar entristecido, mas com um
sorriso de satisfação.
Balanço a cabeça em negação enquanto caminha até a porta. A
preocupação e tensão ainda estão estampadas em sua face e corpo.
Dou um forte e longo abraço me despedindo e como ele havia dito o seu
motorista estava à minha espera. Me acomodo no carro e sem demora Tarciso
segue para a mansão Voyaller, onde aconteceria uma das maiores festas da
redondeza.
A mansão fica no nordeste da Itália em uma localidade afastada muito
próximo a Veneza. É um lugar restrito comandado pela família Voyaller, e
somente convidados tem o direito de entrar e sair.
Conforme nos aproximamos observo a floresta ao meu lado pela janela
do carro e acabo por me lembrar dos intensos olhos azuis de Dante em meio a
escuridão. Os gritos de agonia dos meus familiares preenchem meu peito e o
desespero se espalha por todos os poros do meu corpo.
Sou obrigada a fechar os olhos fortemente e respirar profundamente
acalmando minha pulsação que se acelera drasticamente. Sei que treinei todos
esses anos para encontrá-lo, mas não importa quanto tempo passe essa dor em
meu peito jamais irá se amenizar.
Não posso perder o equilíbrio agora, não posso me dar o luxo de errar
com esse homem.
— Senhorita, estamos quase chegando. — A voz do motorista rompe
meus pensamentos e somente agora analiso a localidade.
Estive aqui poucas vezes, mas é tudo como me lembro. Um grande muro
cerca as terras e os seguranças fazem plantão sem descanso. Procuro gravar cada
pedaço de terra por onde passamos e tenho que admitir que essa sempre foi uma
belíssima casa.
Tarciso segue um caminho de pedras que nos leva até os grandes portões
da mansão.
Um dos seguranças pede o convite e após confirmar que o bilhete é
valido libera nossa passagem.
Já é noite e a pouca claridade da lua não colabora com a minha visão,
mas ainda consigo me lembrar vagamente que do lado esquerdo a um lindo
jardim que se perde em um labirinto como nos contos de fadas e a direita uma
imensa e densa floresta que se espalha ao nosso redor.
Quando pequena lembro vagamente de vir visitar Dante, mas conforme
fui crescendo suas visitas eram constantes na mansão Becker, mas isso não
importa agora. Tento dispersar esses pensamentos.
Tarciso segue até a entrada da mansão dando a volta em torno de uma
grande fonte muito bem iluminada, onde um dragão jorra água pela boca.
Estaciona em frente a uma escadaria que leva a porta de entrada.
A porta ao meu lado se abre revelando um dos homens de Dante que
educadamente estende sua mão em minha direção. Seguro com um lindo sorriso
no rosto enquanto meus olhos percorrem todo o local com cuidado.
Este lugar é o verdadeiro covil do dragão, concluo o pensamento ao
avistar muitos homens armados fazendo a guarda não somente da casa, mas de
todo o local.
Procuro me atentar a cada detalhe sem deixar passar uma única agulha
dos meus olhos e sinceramente, isto será mais difícil do que imaginei. Ele é um
homem esperto, calculista e intimidador. Gosta de mostrar que tem o poder e
manda em tudo que está a sua volta, no passado era assim e observando bem
tudo que encontro em minha volta percebo que nada mudou.
Subo as escadas que leva até as grandes portas de madeira e o símbolo da
família Voyaller entalhado na porta não me passa desapercebido, pois para
muitos é um simples desenho, mas para mim aquele dragão muito bem
desenhado e entalhado, significa mais do que um desenho bonito.
Me sinto atordoada em pensar que muitos anos da minha vida admirei
esse símbolo e hoje a única coisa que consigo sentir é ódio e nojo.
Procuro não focar minha mente em detalhes como esses e assim que
entro me surpreendo com a beleza do hall de entrada que não me lembrava ser
tão deslumbrante.
Que eu me lembre no passado essa casa era mais sombria e rústica, na
verdade, um lugar mais antigo, mas hoje o toque de modernidade misturado a
antiguidade deixa o local mais charmoso e luxuoso. Acredito que jamais vou
deixar de me surpreender com essa família, tanto em sua audácia quanto em suas
traições.
Fico encantada com a reforma nas escadas laterais que levam para o
segundo andar. A substituição do piso de madeira pelo granito ficou impecável,
como tudo ali presente. O local tem tons de bege e marrom escuro. O corrimão
preto das escadas quebra o tom de seriedade dando um charme inusitado ao
local. O grande lustre dependurado no meio do hall, logo abaixo de uma mesa
redonda entre as duas escadas, chega a ser impressionante, mas as poltronas de
couro preto encostadas nas paredes dão um ar de mistérios e seriedade.
— Qual o seu nome senhorita? — Um senhor vestido com smoking me
observa desconfiado fazendo com que eu saia do meu transe momentâneo.
— Dana Trion. — O encaro de cabeça erguida e ele procura meu nome na
extensa lista que estava em suas mãos.
— No final do corredor Srta. Trion. — Se curva indicando o local com
mão.
— Obrigada — digo gentilmente.
Faço o que me é pedido e vou diretamente para o jardim dos fundos.
Assim que passo pelas portas a música eletrônica invade meus ouvidos em
cheio. Muitas pessoas já se encontravam presentes, cada um em sua roda de
amigos rindo e conversando enquanto bebem seus champanhes e coquetéis.
Varo todo o local com os olhos a procura de quem me interessa, mas não
o encontro em lugar algum. Procuro aproveitar meu pouco momento de sossego
para analisar toda a sua casa bebericando uma deliciosa taça de vinho tinto suave
que se embala em minha língua com delicadeza e doçura.
Percebo os olhares desconfiados dos seus seguranças sobre mim e sei que
necessito socializar com as pessoas aqui presentes, pois querendo ou não sou
uma carne nova na toca do lobo. O único problema é não saber quais são os
mafiosos que estão aqui para marcar presença e quais são os empresários a fim
de fechar negócios com o dono do porto da Itália.
Sem me dar conta um senhor de meia idade se aproxima sorridente.
Estava mais entretida procurando minha caça do que no senhor que se
aproximava.
— Olá senhorita, sou Donzel Golodiev, és nova por aqui? Nunca havia
lhe visto nesta festa antes. — Dono de um sotaque forte sorri abertamente
segurando minha mão com delicadeza depositando um beijo nela.
Educadamente sorrio para ele, mas me sinto incomodada com a sua
presença marcante. Ele não parece ser um simples convidado e isso está me
cheirando a problemas.
— Prazer em conhecê-lo, represento as empresas Trion. Como irmã mais
nova de Robert, vim em seu lugar, já que lhe surgiu alguns imprevistos — minto
deslavadamente enquanto dou o meu melhor sorriso vendo a cara de surpresa do
homem.
— É uma novidade saber que um Trion tem envolvimento com um
Voyaller. Como este mundo é pequeno não. — Ele parece satisfeito em saber que
Robert tem envolvimento com Dante.
Sinto que Robert vai me matar quando souber disso, já estou prevendo
minha morte de várias maneiras possíveis.
— Às vezes precisamos expandir nossos horizontes. — Ergo a taça em
brinde tomando um grande gole de vinho.
— Tem razão. — Um sorriso sóbrio se estende por seus lábios e percebo
que socializar com aquele homem não é a minha melhor opção, então procuro
me afastar e somente agora percebo seu olhar lascivo sobre meu corpo, o que me
deixa desconfortável.
Caminho por entre os convidados procurando tomar distância do homem
que conheci a poucos segundos e inconscientemente minha mente voa para o
passado mais uma vez.
No inventario meu pai parecia prever os acontecimentos, pois deixou
claro que se acontecesse algo com os Becker, tudo seria passado para Robert
Trion, que assumiria seu lugar de CEO, mas manteria uma boa qualidade de vida
para sua família e cuidaria de suas filhas como se fossem dele.
Dito e feito. Robert parece uma sombra, ele quer saber de todos os meus
passos e de tudo que faço.
Procuro andar ao redor da festa para me lembrar perfeitamente de todos
os detalhes desta casa e vejo um grupo de mulheres conversando animadamente
e acredito que elas mal sabem o que seus maridos fazem, mas não se importam
em viver de aparências e engano apenas para subir na mídia.
A imagem e o dinheiro sempre têm mais valor do que os verdadeiros
princípios concluo esse pensamento com um sorriso sarcástico no rosto.
Dante comanda toda Itália, podemos dizer que ele está no topo da máfia,
mas pouquíssimas pessoas sabem disso. Para todos, ele é um querido e bondoso
empresário que ajuda muitas associações carentes, mas ele tem muita sujeira
escondida por baixo dos panos.
Lentamente me aproximo das mulheres e acabo sendo muito bem
recebida. Acabo jogando conversa fora enquanto espero o meu alvo aparecer.
Tive que treinar muito para não cair em seus encantos e sinceramente ainda não
sei se este treino surtiu efeitos.
Dante é lindo e isso eu não posso negar, na verdade, ele sempre foi lindo.
Seus olhos azuis te consomem e te faz delirar enquanto ele nem ao mesmo
encostou em você. Ele é intenso, sério e prepotente, sabe o poder que tem e
exerce com maestria sobre as pessoas a sua autoridade.
Finjo prestar a atenção na conversa das mulheres enquanto observo todos
os seguranças da festa que não são poucos.
O alvoroço de risadas desvia minha atenção para o local cheio de
mulheres aglomeradas e agitadas. Me viro lentamente para encarar meu inimigo
e nossos olhos se encontram automaticamente.
Ele crava seus intensos olhos azuis nos meus como garras que te
prendem sem que você consiga se libertar. O encaro estática por longos e
incontáveis segundos e só desviamos nossos olhares, pois uma jovem se agarra
ao seu braço. Neste momento sinto o peso e desespero de não ter ouvido os
conselhos do meu tio que sempre abominou vinganças e me aconselhou a não se
envolver com Dante, afinal os níveis de experiência de um mafioso se elevam
aos treinos que tive no Japão, que apesar de intensos não se compara ao homem
a minha frente que nasceu exatamente para isso.
Neste momento vejo o quão pesado foram suas palavras e como elas
eram sinceras, pois encarar de frente o assassino da sua família e não demonstrar
sentimentos é mais difícil do que imaginei.
Viro a taça de vinho de uma única vez na tentativa de acalmar os meus
batimentos cardíacos, mas essa bebida suave nem mesmo surte efeito no meu
organismo acelerado.
Desgraçado, como ele consegue ser tão incrível dentro de um terno como
aquele? Sempre com uma pose de poder e autoridade. Todos caem aos seus pés
como cachorros bem treinados.
Observo as árvores ao redor do local e decido me afastar do aglomerado
de pessoas que se reúnem em volta do Dragão. Não quero me aproximar de
Dante, quero apenas analisá-lo de longe e estudar toda a mudança que onze anos
lhe causaram.
Por mais que sua atenção esteja voltada para o grupo que se reuni em sua
volta, seus olhos estão atentos a cada movimento do meu corpo e cada tentativa
de aproximação mudo meu caminho me mantenho afastada.
A realidade é que ele sabe que não faço parte desse mundo e seus olhos
não negam a curiosidade e a vontade de me atacar. Ele me quer fora das suas
terras.
A festa segue normalmente, minha vontade é pedir um belíssimo uísque e
virar uma generosa dose de uma única vez, mas contenho minhas vontades já
que não posso ficar bêbada em um momento como esses.
Por mais que procuro mudanças em tudo que vejo a minha volta, percebo
que não há, nem mesmo no homem a minha frente. Ele apenas cresceu e se
tornou um verdadeiro homem que deixaria qualquer mulher caída aos seus pés.
Com seus cabelos negros penteados de uma maneira selvagem, seu rosto
triangular e olhos azuis marcantes. Ele é lindo, eu nunca neguei isso, mas a
frieza que aquele coração reserva o torna horrível.
Ainda assim, seus costumes do passado permanecem os mesmos, pois
ainda me lembro da maneira que ele enruga a testa e junta as sobrancelhas em
uma expressão de nervosismo ou indecisão como faz neste exato momento
observando meus olhos.
Sua postura é rígida e as mãos dentro do bolso da calça me diz que ele
está entediado e não gosta desta festa. Tudo continua o mesmo, a única coisa que
mudou foi a intensidade do seu olhar que no passado se banhavam em esperança
e, hoje só vejo escuridão.
Tudo isso me machuca, me magoa, eu amei esse homem até o último
momento, até uma das balas de sua arma atingir meu peito em cheio.
Desconfortável com o tudo o que passei e a dor que isso me causa opto por ir
embora, pois minha cota de espionagem já havia passado dos limites.
Ao voltar a analisar as redondezas da festa vejo que seus seguranças se
posicionam em lugares estratégicos para me observar.
Ele é esperto, perspicaz e inteligente, sorrio ao ver que já havia
comunicado os seus homens sobre a minha presença.
Desvio minha atenção de Dante por um momento para contar os
seguranças a minha volta que giram em torno de dez a quinze homens. Quando
ouso voltar minha atenção para Dante sinto um forte impacto em todo o meu
corpo ao observar as duas pistolas voltada em minha direção.
Aquele olhar, aquelas armas, a sensação de incapacidade e dor, o
desespero, o medo e a frieza daquele olhar. Me sinto acuada, me sinto
novamente no passado e não consigo negar o desespero estampado em meu
semblante, observar aquelas armas faz com que eu reviva aquela fatídica noite
novamente.
Três tiros seguidos faz o impacto do som reverbera por meu corpo me
deixando estática. Eu não esperava encarar aquelas armas tão cedo, não esperava
vê-las tão perto novamente.
Minha respiração irregular entrega o meu desespero, seus olhos não
desgrudam dos meus movimentos e eu sei que ele está jogando comigo, pois o
sorriso vitorioso em seu rosto o entrega.
Uma salva de palmas e muitos assovios o salda gloriosamente, a agitação
daquele lugar me traz de volta a realidade e antes que as coisas piorem caminho
apressadamente para a saída enviando uma mensagem para Tarciso, pois não
poderia perder tempo. Contudo, os seus homens seguem meus passos me
encurralando em direção a mansão.
Pelo que vejo não sairei sem uma boa luta.
Ao passar pelas portas procuro fechar a passagem para que os homens
não me alcancem. E o senhor que me atendeu educadamente me espera
segurando uma faca. Respiro profundamente atenta a cada um de seus
movimentos desviando do seu ataque repentino e brusco. Seguro seu braço o
virando para trás imobilizando os seus movimentos, forço seu punho fazendo
com que ele solte a faca gemendo de dor.
Vários homens entraram pelo hall e vejo que não posso perder tempo,
bato a cabeça do homem na parede fazendo-o cair desmaiado. Seguro a faca que
ele estava carregando e a lanço em um dos homens que vem em minha direção
acertando sua perna.
Vendo que não seguirei adiante sem lutar, pego meu punhal e jogo minha
bolsa em um canto qualquer do hall de entrada, junto com ela, deixo os meus
sapatos. Percebo que todos têm armas, mas nenhum ousa atirar em minha
direção, como o senhor Dragão é generoso, sorrio irônica.
Ataco os homens que vem em minha direção chutando o primeiro no
estômago e com um efeito domino ele acaba caindo sobre outros dois que
vinham logo atrás.
Por estar cercada acabo levando um belo soco na costela que me deixa
atordoada e renderá um belo roxo amanhã, além de vários chutes nas pernas que
não me derrubam por defendê-los da maneira que posso. Vendo que não tenho
chances de lutar sem machucá-los começo os contra-ataques levando a maioria
deles ao chão com as mãos limpas.
Dois deles me atacam em dupla e eu desvio do seu ataque, fecho minhas
mãos em punhos e acerto o nariz de um enquanto chuto a costela do outro.
Distribuo uma sequência de socos no homem mais próximo e deixo a maioria
deles impossibilitados.
Aproveito esse momento para correr em direção a saída, mas antes de
alcançar meu objetivo um batalhão de homens me cerca e acabo correndo para
as escadas que é o único lugar livre da casa.
Dois homens correm atrás de mim enquanto subo as escadas, desvio de
um deles que perde o equilíbrio rolando escada baixo levando com ele o outro
que subia.
Quando vou virar à direita vejo mais homens correndo em minha direção,
solto um suspiro sem entender o que está acontecendo. Eles parecem brotar do
chão, isso só pode ser uma grande brincadeira de mal gosto. Desta maneira irei
lutar a noite inteira.
Acabo por optar pela segunda opção que é correr para esquerda em busca
de uma saída.
Passo por vários quartos enquanto tento abrir as portas que estão
trancadas e cada erro os homens se aproximam cada vez mais. Corro para uma
das últimas portas do corredor, pois já estou me vendo sem saída e encurralada.
Por sorte ela está aberta e sem pensar duas vezes entro trancando a porta
atrás de mim. Suspiro aliviada tentado focar minha visão no quarto escuro,
pequenos fachos de luz entram pelas cortinas, mas não consigo enxergar
praticamente nada a minha frente com essa escuridão, preciso chegar o mais
rápido possível até a janela, pois meu objetivo aqui já está concluído e por fim,
cheguei à conclusão de que as coisas não seriam tão simples quanto eu esperava.
Começo a caminhar na escuridão com certo cuidado, dou alguns passos
em direção a janela na esperança de correr dali o mais rápido possível — já que
estou encurralada nesse quarto — e acabo trombando com algo duro batendo
meu nariz com tudo.
— Ai! — balbucio irritada esfregando a mão no nariz.
Apoio uma mão no objeto a minha frente e sinto um tecido grosso passar
pelos meus dedos, um forte cheiro de perfume invade meus sentidos. Não é um
perfume qualquer, muito pelo contrário, é o perfume de Dante, o mesmo
perfume de onze anos atrás, o mesmo cheiro amadeirado e forte, envolvente e
único. O cheiro que sempre dominou meus sentidos o cheiro que ficou gravado
em minha pele nas nossas noites mais quentes.
Meu coração dispara em meu peito e sinto um calafrio percorrer minha
coluna, um bip chama minha atenção e quando penso em me afastar as luzes se
acendem fazendo minha visão embasar. Fortes mãos agarram meus pulsos me
mantendo imóvel. Minhas vistas voltam devagar e quando foco meus olhos no
que está a minha frente vejo intensos e faiscantes olhos azuis me encarando com
raiva.
— O quer na minha casa? — Ele dispara me deixando paralisada por tê-lo
tão próximo.
Meu coração se acelera e minhas pernas ficam bambas, essa aproximação
repentina faz meus sentidos rodarem e um torpor estranho invadir minha mente.
— Dan. — Acabo chamando-o pelo apelido que costumava chamá-lo e
ele franze a testa em surpresa.
Meu coração descompassado não colabora com minha respiração
desregular e por mais que tente me acalmar, vê-lo tão próximo me assusta coloca
em prova todos os meus sentidos, porém foi um erro chamá-lo daquela maneira.
— Oras se não é Dante Voyaller o Dragão de Veneza. — Sorrio irônica
puxando meus pulsos, mas ele mantém seu aperto olhando dentro dos meus
olhos.
Sustento o olhar o encarando por incontáveis minutos, ele me observa
intrigado com suas sobrancelhas franzidas enquanto seu perfume invade cada
vez mais meus sentidos me tirando a concentração. Seu olhar se mantém firme
nos meus mais demonstra um misto de dúvida e incerteza. Perdido em seus
pensamentos seu semblante de irritação muda para tristeza e sofrimento.
O ódio dentro de mim cresce uma vez que ele me encara daquela
maneira, minha vontade era desferir uma sequência incontável de socos em seu
rosto e logo em seguida cravar meu punhal em seu coração lentamente, mas não
posso seguir meus instintos antes de descobrir toda a verdade por trás daquela
noite.
Seu rosto se aproxima dos meus cabelos inspirando profundamente. Seus
olhos se fecham como se ele relembrasse o passado assim como eu. Um arrepio
passa pelo meu corpo e meu coração se acelera de uma maneira diferente, não é
medo, é uma sensação estranha que a muito tempo não sentia.
Desnorteada com sentimentos incompreensíveis, me mantenho quieta e
imóvel esperando uma reação vinda dele.
— Ivi — ele sussurra em meu ouvido o apelido que costumava me
chamar. Aquilo me quebra, me desamar e me destrói. O tom de sua voz, a
suavidade, a dor por trás daquela palavra.
Por que ele sofre? Por que ele sofre como eu? Isso está errado. Não pode
ser real, eu o odeio e quero matá-lo.
Sinto um grande nó em minha garganta e quando menos espero ele solta
meus braços que cai em volta do meu corpo sem forças. Aquele apelido ressoa
pela minha mente como uma bomba relógio prestes a explodir.
Eu quero correr o mais rápido possível. Quero me manter longe, mas
meu corpo não obedece a meus comandos.
Dante me puxa contra seu peito em um abraço forte e inesperado, o
choque que recebo é tão grande que faz meu corpo estremecer em contato com o
seu.
Isso tudo não é real. Ele matou sua família, ele tentou matar você. Minha
mente insiste em me lembrar do passado e eu agradeço por isso.
Passo a mão pelo punhal que está guardado e deixo a lâmina afiada ferir
meus dedos, a dor e a ardência me tiram do meu estado de choque momentâneo
e faz toda a realidade cair perante os meus olhos. O ódio e a raiva dominam
meus sentimentos e pensamentos instantaneamente e com uma força exagerada o
empurro fazendo com que ele se afaste do meu corpo.
Desfiro um soco em seu rosto mesmo que seus olhos mostrem que ele
está atordoado assim como eu. Como esperado os seus reflexos são bons e antes
que minha mão chegue ao seu rosto seus dedos segurando meu braço
bloqueando o meu ataque.
Ergo rapidamente meu punhal em direção ao seu rosto e ele desvia dando
um passo para trás ainda segurando meu braço com uma força exagerada. Um
pequeno risco de sangue se forma em sua bochecha, pois acertei de raspão a
ponta da lâmina em seu rosto.
Em um movimento rápido ele gira meu pulso e meu braço prendendo-o
atrás das minhas costas. Com isso tem a oportunidade de me forçar a soltar o
punhal, mas antes que ele consiga imobilizar todos os meus movimentos,
consigo desprender meu pulso de suas mãos e chuto seu peito com força vendo
ele cair sobre a cômoda derrubando tudo o que tinha em cima.
Antes que as coisas piorem para nós dois, pois eu sei muito bem o meu
lugar e uma luta direta com ele me coloca em desvantagens por toda a sua
experiência, corro em direção janela, pois não estou psicologicamente preparada
para usar toda a minha força contra alguém que meche tanto com os meus
sentimentos.
Meu objetivo era estudar seu território e analisar de perto o quanto ele
mudou e já foram concluídos. A única coisa que preciso no momento é sair o
mais rápido possível desta casa, mas antes de chegar à janela algo atinge minha
cabeça me fazendo parar abruptamente.
Respiro profundo sentindo uma grande irritação tomar conta do meu
corpo ao ver o vidro de perfume caído sobre o tapete felpudo do quarto.
Irritada com sua atitude seguro o cinzeiro que estava sobre a escrivaninha
do lado da sua cama e devolvo o ataque, porem ele já esperava por aquilo e
desvia facilmente, mas ele não espera o relógio que acerta sua testa em cheio.
— Vadia — rosna com mão na testa.
Ignoro a sua falta de educação e me preparo para me jogar sobre uma
janela de vidro e rolar telhado abaixo. Ao pegar impulso pronta para sair daquele
local fatídico e nostálgico sinto as mãos de Dante me impedir de continuar ao
segurar meu tornozelo me levando ao chão juntamente dele.
Tento me soltar do aperto de suas mãos, mas ele me puxa em direção ao
seu corpo.
— Infernos — praguejo várias vezes.
Acerto uma cotovelada em suas costas na intenção de que ele me solte,
mas a única coisa que recebo é uma expressão de dor vinda de sua face. Mais
uma vez tento chutá-lo, mas quando vejo ele está montado em cima de mim
imobilizando minhas pernas. Forço meu corpo na tentativa de inverter as
posições, mas estou em desvantagem por ter as pernas presas entre seu corpo
pesado, então uso as mãos para atacá-lo em uma sequência de socos que acerta
sua costela, seu peito e seu rosto de raspão.
— Fica quieta. — Dante consegue segurar meus pulsos os prendendo no
chão subindo completamente em cima de mim com seu rosto bem próximo ao
meu.
— Me obrigue. — Acerto minha testa na dele e o vejo resmungar devido
a dor, mas antes mesmo de se recupera do baque que acabou de levar, ele
devolve a pancada com uma força maior por ter vantagens e estar por cima.
Solto um gemido de dor e vejo o quarto a minha volta rodar ao sentir a
pancada direta na lateral da minha testa. Aproveitando meu estado de delírio
momentâneo me vira de barriga para baixo sentando sobre meu corpo
imobilizando completamente qualquer e possível ataque que eu tente usar contra
ele.
— Acreditei que fosse algum tipo de repórter em busca de informações
para suas revistas de fofocas, mas vejo que foi muito bem treinada. — Mesmo
conseguindo ouvir o que ele diz, não consigo de fato prestar atenção em suas
palavras.
Me remexo tentando sair de baixo dele e levar minha mão a testa, pois
ainda dói, mas não tenho sucesso em me movimentar já que ele faz questão de
soltar todo o peso sobre e meu corpo e sendo sincera, esse homem é mais pesado
do que eu poderia esperar.
— Para quem você trabalha e porque está nas minhas terras?
Ignoro sua pergunta.
Não terei outra oportunidade como essa, não terei como me aproximar
dele novamente, então preciso arrumar uma maneira de permanecer nesta casa
para me aproximar, pois a muitas coisas que não entendo e somente ele pode me
responder.
A muitas coisas que não sei sobre o passado e tudo isso é muito errado.
Eu quero concluir minha vingança, quero vê-lo sofrer como sofri em onze anos
sozinha, mas antes preciso saber de toda a verdade por trás daquela noite.
— Quem? — Força ainda mais meu braço e posso sentir o osso do meu
ombro quase se deslocar.
Ele está usando a força para me fazer falar.
— Eu não trabalho para ninguém. — Não escondo o ódio em minha voz.
— Queria apenas conhecê-lo pessoalmente já que pretendo entrar para máfia
italiana — digo sem me importar com o nervosismo que emana dele.
— Qual é o seu envolvimento com Golodiev? — Sua voz soa calma, mas
ele está intrigado e contrariado, consigo perceber pelo tom de sua voz.
— Por que tantas perguntas? Eu sei que você pesquisara tudo sobre mim
e encontrará todas as respostas, então encurte o assunto, vai lá, sou Dana Trion e
quero entrar para máfia 371. Você sabe que coloquei vários homens seus para
dormir, eles são tão fracos. — Sorrio ao lembrar deles caindo um após o outro.
— Qual é o seu envolvimento com Golodiev? — torna a perguntar.
— Nem mesmo sei quem é este — falo com sinceridade.
— O senhor que conversou com você na festa. Tem certeza que não o
conhece? Ele parecia realmente animado e interessado em você.
— Aquele senhor estranho. — Suspiro. — Não tenho envolvimentos com
ele, sou apenas uma mulher que deseja vingança. — O instigo a saber mais sobre
mim.
— Por que um Trion, trocaria a vida de luxo por mera vingança? Sabe
que se entrar onde pretende não terá volta. — Afrouxa o aperto do meu braço.
— Quero vingar a morte dos meus pais, todos dizem que foi um acidente
de carro, mas eu sei que é mentira. Eles foram assassinados e somente aqui
conseguirei as informações que preciso. — As imagens do passado retornam a
minha mente e ter o autor do crime tão próximo me deixa completamente
atordoada.
Apesar de mentir para Dante sobre a minha verdadeira vingança, não
menti sobre os pais de Robert que morreram em um acidente de carro e até hoje
os polícias não conseguem explicar os motivos. Os Trion sempre foram
próximos da família Becker e quando Robert ficou órfão, meu pai se sentiu na
obrigação de adotá-lo indiretamente sem que as pessoas ou a mídia soubessem
Para despistar os assassinos Robert assumiu as empresas como um
comprador depois de meses da morte dos meus pais, se tornando um dos jovens
mais bem sucedido da Itália. Por esse fato, qualquer pesquisa que Dante fizer
sobre Robert, andará em círculos, pois tudo que envolve os Becker a Robert foi
apagado por ordens do juiz.
Meu braço começa a ficar dorme e não me sinto nem um pouco
confortável em me explicar naquela estranha posição.
— Será que poderia sair de cima de mim, eu não vou te atacar
novamente. — Minha voz sai baixa e calma indicando que eu estou cedendo a
ele.
Sem expressar nenhuma reação ele apenas solta minhas mãos e se
levanta. Suspiro aliviada e após me levantar massageio meu ombro dolorido por
ter ficado em uma posição desconfortável tempo demais. Ouso erguer meus
olhos em direção aquele homem que tanto odeio e me surpreende em vê-lo
imerso em seus pensamentos. Seus olhos azuis esconde a luta que ele trava
dentro de si e depois de inúmeros segundos imerso em seu próprio mundo ele
finalmente fixa seus olhos nos meus quebrando o silêncio com sua voz fria e
firme.
— A verdade é que a partir do momento em que você colocou os pés
nesta mansão sem ser chamada não sairia mais daqui. Todos os que sabem sobre
a máfia moram nestas localidades. E para alguém do seu tamanho, você sabe
mais do que deveria, então pare de colocar o seu nariz onde não foi chamada,
pois te renderá um confinamento particular nesta casa. — Suspira desgostoso. —
Eu não te aceito como membro da máfia 371 e muito menos confio em você,
mas não posso negar que é forte e muito bem treinada, inexperiente, mas bem
treinada. — Fico surpresa com o que escuto.
Por essa eu não esperava.
— Quer dizer que ficarei trancada aqui? — Uso um tom de indignação e
deixo todo o choque daquelas palavras transparecer em meu rosto.
— Exatamente. — Cruza os braços sobre o peito. — Ficarei de olho em
você. A partir de agora você trabalha para mim. Eu mando e você obedece. Você
ficará na mesma casa que eu e não sairá sem a minha permissão, posso pensar
em treiná-la já que você é boa o suficiente para isso, mas por enquanto
observarei as suas atitudes. — Ele passa as mãos pelos cabelos enquanto despeja
sobre mim aquele monte de baboseiras.
É claro que não me agrada saber que serei confiada a um ambiente em
que ele esteja vinte e quatro horas presente, mas como recusar uma oferta tão
perfeita que me leva a um grande avanço para conclusão da minha vingança.
É claro que aceitarei ficar aqui, porém não posso demonstrar minha
felicidade e como uma boa atriz rejeito aquelas palavras.
— Não vou ficar trancafiada na sua mansão somente porque você quer —
digo irritada.
— Não estou te dando opções, estou dizendo que será assim. Como você
disse, eu pesquisarei tudo sobre a sua vida e depois te encherei de perguntas. Se
por ventura você mentir, eu te mato. É assim que será. Pensasse antes de invadir
a minha festa, a minha casa e o meu mundo — ele diz arrogantemente, enquanto
eu reviro os olhos.
Um grande e incompreensível desejo de enfiar minha mão em sua cara
bonita surge em meu peito e quando vejo deixo a ironia me dominar.
— Se por ventura eu enfiar a minha mão na sua cara aqui e agora o que
você fará? — pergunto inocentemente vendo sua testa franzir em uma expressão
de surpresa e indignação.
— Você ficaria três dias trancada em um quarto sem comida, eu mando e
você obedece, Srta. Trion. Eu sou o chefe e não ache que serei gentil por ser uma
mulher. Não ouse me desrespeitar, pois os castigos que receberá não serão
agradav... — Antes que ele termine sua frase minha mão atinge seu rosto em
cheio fazendo o barulho reverberar pelo quarto.
Vejo ele fechar as mãos em punhos e travar o maxilar respirando
profundamente. Um sorrio de satisfação dança em meus lábios por ter acertado
seu rosto.
Ficar sem comer três dias não é nada quando tive que ficar mais de uma
semana por causa dos treinos no Japão.
Não gosto da ideia de ficar trancada nesta casa, mas vejo isso como uma
bela oportunidade para me aproximar dele e ganhar sua confiança. Somente
assim poderei retirar todas as minhas dúvidas sobre o passado.
DANTE

Observo as pessoas que passeiam no jardim da minha casa enquanto


saboreio o gosto amargo do uísque que desliza pela minha língua. Adoro o gosto
forte e amadeirado que desce queimando minha garganta.
Entre um gole e outro observo a variedade de pessoas falsas que existe
no mundo, ou melhor dizendo, no meu jardim. Vários empresários, vereadores e
mafiosos conversando entre si.
Suspiro semicerrando os olhos e imagino como seria prazeroso acertar a
cabeça de cada um com minhas Taurus gêmeas. Passo a mão pelas minhas armas
que estão presas em minha cintura.
Odeio cada pessoa presente nesta festa, mas negócios são negócios,
amizade a parte. Se eles querem fazer parte do meu jogo então deixem que
dancem nas minhas mãos.
Balanço levemente o copo de uísque vendo o líquido âmbar girar.
Aprendi da pior maneira que nada mudaria o fato de ser o que sou hoje...
Chefe da máfia Italiana.
Me tornei uma pessoa fria e sem sentimentos. Ver corpos ensanguentados
estirados no chão preenche o mais profundo do meu ser, mas nada apaga o que
fiz a anos atrás. Não importa quantas pessoas eu mate ou quantos torture, nada
muda aquela noite.
Eu matei a única mulher que amei em toda a minha vida. Por mais que
tenha tentado protegê-la, falhei, e com minhas próprias mãos a matei. Confesso
que junto com ela se foi o único pedaço ainda humano que restou dentro de mim.
Para todos sou um monstro, a casca de homem vazio, sem coração, sem
sentimentos, sem alma e com honra faço jus a todos esses adjetivos. Nenhuma
dessas pessoas entenderia o que passei no tratamento de fogo de Donatel
Voyaller — o homem que chamo de pai —, para que pudesse fazer parte da
máfia aos 17 anos.
Não foi algo agradável, mas escolhas era uma opção inexistente. Nesta
casa fomos criados de uma maneira diferente, ou faz e segue o que lhe é
mandado ou simplesmente pague com seu corpo as suas desobediências.
E sendo sincero, nunca fui um homem que aceitou receber ordens, por
isso levo marcas encobertas por tatuagens até hoje. Essas marcas provam que em
um passado existiu alguém pior do que eu, mas hoje não a ninguém que possa
me vencer dentro deste país, e esse fato eu tenho que agradecer ao infeliz que
chamo de pai. Foi ele que me enfiou nesse mundo de podridão, mas pelo menos
fez seu trabalho bem feito.
Nada muda o ódio que sinto por ele e a única vontade que tenho é matá-
lo com minhas próprias mãos. Ele deu um significado para minha vida depois o
arrancou da pior maneira.
Coloco o copo vazio sobre a mesa e pego um charuto cubano de dentro
da pequena caixa, seguro-o entre meus dedos o acendendo. Trago fortemente e
deixo a fumaça invadir meus pulmões enquanto o fogo consome lentamente o
papel.
Solto a fumaça em um longo e pesado suspiro quando uma cabeleira
vermelha desconhecida chama minha atenção do lado de fora.
Aqueles cabelos ruivos esvoaçantes andam elegantemente sobre o jardim
da minha mansão. Fixo o meu olhar em seus movimentos e decidida ela caminha
entre os convidados explorando o local como se fizesse parte daquele mundo.
Ela com toda certeza não foi convidada e a cor dos seus cabelos me irrita
profundamente.
Trago meu charuto lentamente observando cada passo da pequena
intrusa. Donzel a observa de longe com um sorriso malicioso nos lábios,
semicerro os olhos o analisando, aquele velho mal caráter.
Donzel é o chefe da máfia ucraniana e está de passagem pela Itália
justamente para marcar presença na minha festa, que tem como objetivo reunir
todos os contratantes e aliados dos Voyaller.
Não gosto de Donzel, ele se acha o melhor de todos e faz questão de
marcar presença por todos os lugares que passa. Ele simplesmente poderia
mandar algum de seus filhos, mas gosta de se mostrar o poderoso e incansável
chefão.
Não tenho medo dele, nós dois somos fortes o suficiente para saber que
se estourarmos uma guerra um dos dois morre. Então, preferimos manter as
pazes já que presamos nossas vidas, entretanto, ele sempre está procurando uma
maneira de me tirar do sério.
Nunca vi Donzel tão animado com uma mulher e isso me irrita. Qual
envolvimento dos dois? Me pergunto, e a curiosidade cresce dentro de mim.
Vejo que ela foi bem treinada, pois observa todos os pontos principais do
local e faz questão de localizar todos os meus homens, mas seu corpo está tenso
indicando que apreensivamente ela teme ser descoberta.
— Hora de descer e iniciar o meu show — digo para mim mesmo dando
mais um forte trago no meu charuto e logo em seguida o apago no cinzeiro que
fica sobre a mesa do meu escritório.
Passo pelos corredores da mansão e entro pelos fundos descendo as
escadas que levam a cozinha.
Assim que coloco meus pés para fora sou recebido por várias mulheres e
homens que se aglomeram ao meu redor. Por um momento a perco de vista, mas
assim que caminho nossos olhos se encontram e o choque que recebo é absurdo.
Meus olhos ficam fixos nos dela e meu corpo por um momento não
reage. Aqueles olhos e aqueles cabelos. Por que tão parecida com ela? Isso me
irrita mais do que deveria.
É como se Eva estivesse bem a minha frente e isso me deixa
completamente desestabilizado.
Meus pensamentos são quebrados quando a filha mais velha de Eduard
chama a minha atenção.
Ela está linda em um vestido azul turquesa que combinava com seus
olhos. Bridget, tenta de todas as maneiras chamar minha atenção, mas nunca
quis nada com ela.
Acredito que ninguém em sã consciência queira. Já que ela é
praticamente uma puta de aluguel, mas ela insiste em se jogar nos meus braços e
aparecer quase nua na porta da minha casa, não se importando que eu a rejeite
constantemente.
Agradeço por seu pai raramente vir a Itália, mas quando vem é uma
fatídica semana de perseguição e rejeição. Bridget, faz questão de me atormentar
e isso me irrita.
Quando vou procurar minha presa novamente não consigo achá-la,
caminho até alguns empresários que estão logo a frente e começo a conversar
amenidades com eles. Até que um deles entram no assunto das empresas
Voyaller, o que me deixa entretido por alguns minutos e finalmente a vejo
caminhar em lados opostos ao meu. O que me faz rir.
Quanta falta de educação, invade a minha festa e nem mesmo
cumprimenta o anfitrião, pequena rebelde.
Ela tenta se afastar de todas as maneiras, não importa o quão perto eu
tente chegar, ela simplesmente corre. Vejo três dos meus seguranças a cercando e
os três são tão indiscretos que tenho vontade de baleá-los aqui e agora. Bufo
irritado, até mesmo ela percebeu a presença indiscreta dos meus homens o que
não é para menos.
Apesar de atenta ela se mantém calma e alheia a tudo que se passa a sua
volta distraindo os imbecis que chamo de segurança.
Já que tenho um bando de imprestáveis trabalhando para mim tenho que
agir por mim e neste momento arrependo-me de ter mandado Max, Jack e Royal
em uma missão na Costa Amalfitana.
Eles cuidariam de tudo isso de olhos fechados, agora tenho que iniciar a
festa assustando uma pequena intrusa, pois se quer algo bem feito, faça você
mesmo.
Max, Jack e Royal são meus irmãos mais novos, digamos que nos damos
bem quando eles não estão tentando mandar no que devo ou não fazer. Max e
Royal são meus irmãos por parte de pai já que ele resolveu trair minha mãe com
minha tia e ela engravidou de gêmeos. Jack é o mais novo e temos a mesma mãe,
mas ele não chegou a conhecê-la já que ela morreu ao dar à luz a ele.
Volto minha atenção a ela que se distraí por um momento. Saco minhas
armas do cós da minha calça, pronto para oficializar o início da festa com três
tiros para cima que representa os números da máfia Voyaller, mas antes faço
questão de apontar as duas armas em sua direção.
Quando seus olhos se voltam em minha direção a expressão de horror e
repulsa explicita neles me surpreende. Seu corpo fica completamente tenso,
enquanto semicerro os olhos a observando.
Sem demora ergo uma das armas para o céu a disparando três vezes. O
som alto reverbera por todo o espaço fazendo que ela feche os olhos assustada.
As reações de seu corpo me colocam em alerta. Ela pode ser uma espiã ou uma
repórter a fim de desvendar meus negócios.
Seus olhos assustados se desviam dos meus observando a saída pronta
para se retirar.
A não, você não irá embora tão rápido, não antes de conversarmos
pessoalmente. Ignoro as pessoas a minha volta e apertando a escuta que fica
presa em meu pulso.
— Encurralem a moça ruiva e levem para o meu quarto. Usem a força se
necessário, mas não a machuquem — ordeno rapidamente.
Seus passos rápidos em direção a porta indicam que ela percebeu os dez
homens que a cercam e com rapidez ela segue para onde eu quero.
Com dificuldade e certa rapidez me esquivo das pessoas a minha volta
afim de me encontrar a minha mais nova convidada. Subo as escadas laterais e
sinto meu coração pulsar em ansiedade para colocar as mãos naquela mulher.
Ela realmente não deveria ter invadido minha casa.
Passo no andar de cima e a observo lutar. Ela não nota minha presença,
mas seus movimentos são incríveis e digno de uma profissional. Essa mulher
seria colocada na elite se viesse para o meu mundo, mas não quero envolvê-la
em tais negócios.
Me pego a observando mais do que deveria e me surpreendo quando ela
derrubar a maioria dos meus homens sem muita dificuldade. Movimentos leves e
graciosos. Parece dançar enquanto acerta cada golpe com precisão, rapidez e
agilidade.
Eu com certeza a quero e esse sentimento me assusta.
Ela não é Eva Becker. Minha mente traiçoeira me traz de volta a
realidade e antes que ela me veja aqui em cima sigo para o último quarto do
corredor, mas antes faço questão de trancar os demais quartos para que não corra
o risco de vê-la fugir debaixo do meu nariz.
O que seria impossível, pois se fosse necessário mandaria atirar para
matar, mas antes disso preciso conversar com essa mulher que consegue me
desequilibrar e me desestabilizar com seus cabelos vermelhos e olhos castanhos
esverdeados.
Fico ao lado da cama esperando a pequena presa. Isso será incrivelmente
interessante, estou irritado com essa invasão, mas vê-la lutar daquela maneira me
instiga em conhecê-la melhor.
Um estranho sentimento cresce em meu peito. Um forte desejo de
tortura. Sei que isso pode ser estranho, mas o fato dessa jovem se parecer com
minha Ivi, me intriga, irrita e me tira completamente do sério. Por esses motivos
quero vê-la sofrer.
Ivi é a minha perdição, minha destruição, jamais vou esquecer aqueles
cabelos cor de fogo correndo pelo jardim enquanto me desafiava. O que me
motivava a continuar vivendo dia após dia era protegê-la e mantê-la em meus
braços.
Sinto um tremor percorrer meu corpo ao lembrar dos seus olhos
castanhos esverdeados cheios de amor e ternura. Um vazio cresce dentro do meu
peito e se instala em meu coração quando lembro a decepção que aqueles olhos
me encaravam no dia da sua morte. Jamais me esquecerei da dor de vê-la
gritando meu nome ao me ver puxando o gatilho.
Eu tentei salvá-la. Eu juro que tentei. Mas tudo o que fiz não foi o
suficiente.
Fecho fortemente os punhos ao ver a porta do quarto se abrir e
rapidamente se fechar. Ela tranca a porta suspirando aliviada, está tudo escuro,
mas posso ouvir sua respiração acelerada e ofegante.
Procuro me manter quieto esperando que ela caminhe pelo quarto e como
imaginei sem muita demora seu corpo pequeno se choca contra o meu, sua
cabeça bate em meu peito fazendo que com que ela dê um passo para trás.
— Aí — balbucia irritada.
Sinto suas pequenas mãos sobre meu corpo, seus dedos se enroscam
delicadamente na lapela do meu terno e antes que ela possa se afastar aperto o
controle acendendo as luzes o jogando sobre a cama para ter a possibilidade de
agarrar seus punhos a impedindo de se mover.
— O que quer na minha mansão? — pergunto irritado.
Depois de alguns segundos finalmente consigo focar meus olhos nos dela
e o choque que tenho me deixa paralisado. Aqueles olhos, aqueles olhos não
podem ser reais. Por que tão igual a minha Ivi?
— Dan. — Ao escutar aquele apelido todo o meu corpo se tensiona, meu
coração acelera e mesmo que eu a queira encher de perguntas simplesmente não
consigo, pois, meu corpo não obedece aos meus comandos.
Seus cabelos, seus olhos, seu cheiro, tudo nessa jovem me lembra quem
eu mais quero esquecer. Aquele delicioso e suave cheiro cítrico invade meus
sentidos me deixando em choque.
Não costumo ser gentil com mulheres que tentam invadir meus negócios
em busca de informações desnecessárias, mas com essa jovem não consigo
reagir, eu apenas quero protegê-la e mantê-la perto de mim. Não posso perder Ivi
novamente, não posso deixar que ela desapareça mais uma vez.
O impacto que recebo é tão grande que acabo por aproximar meu rosto
dos seus cabelos inspirando seu cheiro profundamente. Aquele cheiro me faz
reviver momentos dos quais custo a esquecer todos os dias da minha vida.
A minha doce e meiga menina está morta.
— Ivi — sussurro soltando seus braços puxando seu corpo pequeno
corpo contra meu peito a abraçando fortemente.
Envolvo minhas mãos em seus cabelos deixando seu corpo contra o meu.
Sua presença me traz lembranças dolorosas.
O aperto em meu peito triplica e a vontade de abraçá-la me consome. Eu
daria tudo para tê-la em meus braços novamente.
Imóvel e tensa a mesma não esboça nenhuma reação, pois assim como eu
está paralisada e em choque.
Estava tão atordoado que nem mesmo percebo o seu ataque repentino e
quando vejo seu punho vem em direção ao meu rosto e por puro reflexo consigo
desviar, ainda assim, posso sentir a ardência do golpe mal concluído porem
certeiro que atinge minha bochecha de raspão.
Mesmo estando atordoado pelos pensamentos que me assolam e me
jogam em meu passado conturbado, meus reflexos e a experiência que ganhei
em anos de luta se colocam em prova e quando percebo já segurei seu punho
com uma força exagerada fazendo com que ela solte o punhal.
A ardência em minha bochecha me traz de volta a realidade aos poucos
me tirando do meu estado de choque, desespero e delírio. Quando penso em
travar seus braços para finalmente imobilizá-la, ela chuta meu peito fazendo com
que eu caia sobre a cômoda que fica logo atrás de mim. Meus perfumes e tudo
que há encima cai no chão com o impacto. Em um movimento gracioso ela
consegue manter o equilíbrio de seu corpo correndo em direção a janela.
Não querida, você não escapará tão facilmente. Passo a mão pela cômoda
e encontro um vidro de perfume que se manteve em pé e sem pensar duas vezes
jogo em sua direção acertando sua cabeça.
Seus olhos refletem todo o ódio que ela sente e mesmo tendo a
oportunidade de continuar ela devolve o ataque lançando em minha direção um
cinzeiro que desvio sem muita dificuldade, entretanto não esperava o relógio que
vem logo em seguida acertando minha testa em cheio.
— Vadia. — Coloco a mão na testa e a vejo correr mais uma vez.
Não mesmo querida. Antes que ela consiga pular a janela, salto em sua
direção segurando seu pé fazendo com que ela caia junto comigo. Sem perder
tempo puxo seu corpo em direção ao meu a fim de imobilizá-la, mas a sua
rebeldia e ousadia se colocam a prova e quando vejo sou atingido por várias
cotoveladas das quais ela desfere sem piedade me deixando atordoado.
Ignorando a dor e as marcas roxeadas que aquilo me deixará, finalmente
consigo prender seus braços e suas pernas com meu corpo. Não quero machucá-
la, mas é impossível quando ela não para quieta.
— Fica quieta. — Aperto seus pulsos, prendendo-os no chão.
— Me obrigue. — Fecho os olhos ao ser atingido em cheio por sua
cabeça no mesmo local que o relógio havia acertado. Minha vontade é levar as
duas mãos a testa, pois a dor nesse local é maior do que em qualquer outro golpe
que recebi vindo dela, porém se ameaçasse soltá-la por um momento ela irá fugir
e eu não permitirei isso.
Antes que ela consiga pensar em qualquer outro golpe devolvo a
cabeçada com um nível de força maior por estar encima e ela geme de dor
desconcertada.
Aproveito seu estado de delírio momentâneo para virá-la de costas
mobilizando qualquer movimento de seu corpo. Coloco brutamente seus braços
atrás de suas costas chegando ao limite de sua articulação. Qualquer movimento
em falso levara a um deslocamento nada confortável.
— Acreditei que fosse algum tipo de repórter em busca de informações
para suas revistas de fofocas, mas vejo que foi muito bem treinada. — Respiro
profundamente querendo respostas, mas ganho apenas o seu silêncio.
Ela é teimosa e não tem medo de lutar pelo que quer. Será uma grande
perda ter que matá-la quando descobrir quem está por trás de tudo isso.
— Para quem você trabalha e porque está nas minhas terras? — torno a
perguntar.
A irritação em minha voz é perceptível, odeio que não respondam minhas
perguntas, odeio que me questionem e que me desafiem e ela faz tudo que eu
odeio.
— Quem? — Forço ainda mais seu braço.
— Eu não trabalho para ninguém. Queria apenas conhecê-lo
pessoalmente já que pretendo entrar para máfia italiana. — Fico surpreso ao
ouvi-la citar a máfia 371 e a possível ideia de tê-la entre meus homens da elite
realmente me agrada, mas não quero alguém tão parecida com Ivi envolvida em
assuntos tão complexos.
— Qual é o seu envolvimento com Golodiev? — Tento manter a calma e
o tom da minha voz se ameniza.
— Por que tantas perguntas? Eu sei que você pesquisará tudo sobre mim
e saberá todas as respostas, então encurte o assunto, vai lá, sou Dana Trion e
quero entrar para máfia 371. Você sabe que coloque vários dos homens seus para
dormir, eles são tão fracos — diz desdenhosa.
Sua língua afiada me irrita, essa mulher só me trará dor de cabeça. Ela é
esperta e sabe muito mais do que eu gostaria que soubesse.
O que me intriga é porque uma Trion me procuraria? Robert Trion não
esconde o ódio que sente por mim e sempre evitou qualquer contato com a
minha família. Sinceramente não entendo todo o ódio que emana dessa família
contra nós, nunca fizemos nada para ele, mas isso pouco me importa.
Na verdade, nunca me interessei em pesquisar sobre a vida de um Trion.
Nem mesmo sabia que Robert tinha uma irmã. A única coisa que sei é que ele
comprou as empresas Becker quando tudo aconteceu e agora serei obrigado a
aprofundar minhas pesquisas sobre algo que não me chama nem um pouco a
atenção... A vida e passado dos Trion agora.
— Qual é o seu envolvimento com Golodiev? — torno a perguntar
ignorando as suas palavras, pois não estou a fim de falar sobre sua família no
momento.
— Nem mesmo sei quem é este. — Noto a sinceridade em suas palavras.
— O senhor que conversou com você na festa. Tem certeza que não o
conhece? Ele parecia realmente animado e interessado em você.
— Aquele senhor estranho. — Suspira. — Não tenho envolvimentos com
ele, sou apenas uma mulher que deseja vingança.
Aquelas palavras me chamam a atenção. Vingança? Por qual motivo
alguém como ela procuraria vingança?
— Por que um Trion, trocaria a vida de luxo por mera vingança? Sabe
que se entrar onde pretende não terá volta. — Afrouxo o aperto em seu braço.
— Quero vingar a morte dos meus pais, todos dizem que foi um acidente
de carro, mas eu sei que é mentira. Eles foram assassinados e somente aqui
conseguirei as informações que preciso. — A dor é explicita através de suas
palavras e noto que aquele assunto realmente mexe com seus sentimentos.
Permaneço em silêncio por longos segundos deixando minha mente
vagar no que seria certo ou não fazer com aquela jovem, mas a verdade é que
estou em um verdadeiro dilema entre sua aparência intrigante e sua ameaça por
saber tanto do que não deveria.
— Será que poderia sair de cima de mim, eu não vou te atacar
novamente. — Sua voz quebra meus pensamentos.
Respiro profundamente ponderando se deveria ou não a soltar, mas sei
que depois da nossa conversa ela não tentará nada imprudente então com calma
solto seu braço e seus pulsos me levantando.
— A verdade é que a partir do momento em que você colocou os pés
nesta mansão sem ser chamada não sairia mais daqui. Todos os que sabem sobre
a máfia moram nestas localidades. E para alguém do seu tamanho você sabe
mais do que deveria, então pare de colocar o seu nariz onde não foi chamada,
pois te renderá um confinamento particular nesta casa. — Suspiro desgostoso. —
Eu não te aceito como membro da máfia 371 e muito menos confio em você,
mas não posso negar que é forte e muito bem treinada, inexperiente, mas forte.
— Vejo o choque e a indignação explicita em seu semblante.
Ela é interessante e faz com que eu queria descobrir mais sobre sua vida,
afinal não posso deixá-la escapar tão facilmente. Tenho que mantê-la presa em
um lugar que posso vigiá-la. Ela sabe muito sobre a máfia e não posso
simplesmente deixar alguém com tantas informações solta por aí correndo o
perigo de denegrir a imagem e reputação de um empresário honesto e humilde
que custei a construir.
— Quer dizer que ficarei trancada aqui? — pergunta perplexa.
— Exatamente. — Cruzo os braços sobre o peito. — Ficarei de olho em
você. A partir de agora você trabalha para mim. Eu mando e você obedece. Você
ficará na mesma casa que eu e não sairá sem a minha permissão, posso pensar
em treiná-la já que você é boa o suficiente para isso, mas por enquanto
observarei as suas atitudes. — Respiro profundamente deixando claro todas as
minhas regras e possíveis planos para o futuro.
Ela luta muito bem e mesmo derrubando alguns dos meus homens ela
jamais derrubaria Jack, Max ou Royal. Com um pouco mais de treino para
aperfeiçoar sua inexperiência em um campo de batalha sei que se tornará uma
excelente assassina
— Não vou ficar trancafiada na sua mansão somente porque você quer.
— Bate o pé como se tivesse o direito de exigir algo.
— Não estou te dando opções, estou dizendo que será assim. Como você
disse, eu pesquisarei tudo sobre a sua vida e depois te encherei de perguntas. Se
por ventura você mentir eu te mato. É assim que será. Pensasse antes de invadir
a minha festa, a minha casa e o meu mundo. — Perco a pouca paciência que
ainda me restava.
Seus olhos se estreitam e me analisam flamejantes.
— Se por ventura eu enfiar a minha mão na sua cara aqui e agora o que
você fará? — pergunta calmamente.
Sinto todo o meu sangue correr mais rápido por minhas veias ao ouvir
aquelas palavras audaciosas.
Como ela pode ter a coragem de me desafiar dessa maneira?
Neste exato momento só penso em torturá-la lentamente por toda a sua
falta de respeito e ousadia, mas procuro limitar meus castigos por ser uma
mulher inocente sem envolvimento com qualquer meio que a levaria para uma
morte direta.
— Você ficaria três dias trancada em um quarto sem comida, eu mando e
você obedece, Srta. Trion. Eu sou o chefe e não ache que serei gentil por seu
uma mulher. Não ouse me desrespeitar, pois os castigos que receberá não será
agradav... — Antes mesmo que eu possa terminar a frase sinto sua mão pesada
em contato com meu rosto fazendo o impacto gerar um som alto que reverbera
pelo quarto.
Meu coração se acelera e travo fortemente o maxilar respirando
profundamente para não machucá-la, mas a minha verdadeira vontade é amarrá-
la em uma cadeira e deixar que jatos frios de água a torturem a cada minuto.
Com uma força incompreensível procuro reprimir os meus desejos mantendo a
calma que nem mesmo sabia existir dentro de mim.
Estou a três dias trancada dentro de um quarto, três malditos dias sem
poder fazer nada e o pior de tudo não é ficar sem comer. Isso eu consigo tirar de
letra, o que me irritada é ficar sem fazer nada, sem um livro, sem uma revista,
sem meu celular, meu dia se resume em ficar deitada nesta cama dura e fria.
Não me arrependo de ter acertado um belíssimo tapa em Dante, mas ele
não avisou que seria obrigada a ficar em um quarto deplorável, sem janelas, sem
banheiro e sem uma porcaria de um relógio para saber quanto tempo ainda me
resta aqui.
Pela centésima vez conto carneirinhos saltitantes para passar meu
precioso tempo de vida desperdiçado neste quarto imundo e sujo. Ele podia ter o
mínimo de consideração e me colocar em um quarto digno. Sou obrigada a fazer
minhas necessidades em um balde que fica ao lado da cama. Isso realmente é um
tremendo exagero.
Dante diz tanto que eu me pareço comigo mesma, ele poderia ter o
mínimo de consideração e ter me presenteado com um belíssimo quarto já que
matou toda a minha família. Mas não, me trancou aqui nesse quarto mofado e
sujo onde provavelmente ele tortura as pessoas.
Sem muita paciência, levanto batendo a mão no vestido preto de festa,
que encontra-se em um deplorável estado de calamidade. A dias não tomo banho
e meus cabelos cacheados e rebeldes tem nós que não sairão com facilidade.
Estalo meu pescoço e respiro profundamente observando a porta de metal
a minha frente, apesar de grossa tem uma aparência velha e desgastada, além de
muito enferrujada.
Sorrio com a possibilidade de derrubá-la.
Talvez alguns chutes e ela finalmente se abra. Não custa tentar, certo?
Me aproximo da porta e começo a chutar o trinco com força. Ela balança,
mas ainda se mantem em pé. Não desisto tão facilmente, então mudo os meus
ataques para o centro da porta e quando menos espero vejo as soldas
enferrujadas se romperem das dobradiças liberando a passagem.
Um alívio percorre meu corpo e o sorrio vitorioso dança em meus lábios
por finalmente sair desse quarto imundo. Sigo para fora, mas me surpreendo com
um homem parecido com Dante encostado na parede ao lado da porta que acabei
de derrubar.
Ele fuma seu cigarro lentamente com pé encostado na parede e as mãos
dentro do bolso da calça. Seus cabelos negros rebeldes e pele naturalmente
bronzeada chama a atenção. Ele é muito parecia com Dante, mas sua cabeça
baixa não permite que eu analise seu rosto com mais precisão.
Com um pesado suspiro solta a fumaça dos seus pulmões segurando o
cigarro entre seus dedos longos. Seus intensos olhos azuis se voltam para mim
me surpreendendo.
Eles com toda certeza são irmão, mas que eu saiba ou pelo menos sempre
soube, Dante é filho único.
— Dante, não vai gostar de saber que você quebrou a porta do quarto
senhorita. — Leva novamente o cigarro até os lábios o tragando com calma.
Dou de ombros pouco me importando se ele gostaria ou não.
— -Se ele quisesse me prender e me deixar passar fome, pelo menos que
me trancasse em um quarto digno e com banheiro. — Tento frustrantemente
passar as mãos nos meus cabelos na tentativa de abaixar o volume esvoaçante
que eles se encontravam.
— Prisioneira que exige tratamento cinco estrelas? Isso é novo para mim
— debocha apertando a ponta do cigarro entre os dedos o apagando.
— Faz dias que não tomo um banho ou escovo meus dentes, meus
cabelos estão emaranhados, provavelmente estou fedendo e para piorar tenho
que fazer xixi em um balde que fica ao lado da cama, meu humor não está dos
melhores e eu sinceramente não quero arrumar confusão, então você poderia me
dar licença por gentileza. Caso contrário não pouparei esforços para abrir
caminho até o andar de cima. — Caminho em sua direção pronta para uma briga
direta, pois minha paciência já se esgotou.
Ele sorri abertamente se desencosta da parede para parar a centímetros de
distância do meu corpo. A nossa diferença de altura não é tão grande, mas os
poucos centímetros a mais lhe dão vantagens fazendo com que eu olhe para cima
afim de encará-lo. O cheiro de cigarro misturado com o perfume caro
impregnado em suas roupas invade minhas narinas me deixando incomodada.
Eu deveria odiar esse tipo de cheiro, mas estranhamente gosto dessa
mistura indecente e bruta.
— Apenas quero encontrar o cretino que você provavelmente chama de
chefe. — Não abaixo minha guarda o encarando de frente.
— Ele realmente é um cretino e meu chefe. — Assente sorridente
gostando do que eu disse. — Mas acho importante ressaltar que ele é meu irmão
e pediu que ficasse de olho em sua prisioneira rebelde. — Cruza os braços na
altura do peito me encarando.
Observo seu corpo bem definido e musculoso que não passa
desapercebido mesmo que ele queira. Essa família é uma verdadeira perdição,
concluo o pensamento observando o homem a minha frente.
Realmente não esperava que Dante tivesse um irmão, em todos os anos
que o conheci e que visitei esta mansão não me encontrei com nenhuma criança
além de Dante. Isso é uma grande surpresa para mim.
— Não sabia que ele tinha um irmão. — Não nego a surpresa.
— Procuramos evitamos os falatórios. — Balança os ombros não se
importando muito com o assunto.
— -Então Sr. Voyaller, vai dar licença ou terei que usar a força? — Cruzo
os braços irritada.
— Longe de mim querer brigar com você, fiquei sabendo que derrubou
os homens de Royal. — Ele balança os braços em rendição. — Por favor me
chame de Jack, ser chamado de Voyaller, faz com que eu me sinta como Dante e
isso não me satisfaz. — Faz uma careta desgostoso.
— Royal? — balbucio, mais para mim do que para ele.
— Somos quatro. — Pisca com um sorriso charmoso nos lábios.
Quatro? Como eu nunca soube disso? Quatro irmãos? Isso é impossível.
Como não conheci nenhum deles antes? Não consigo compreender.
— Não gosto de brigar com mulheres entende? Por favor volte para
aquele quarto e espere as ordens do chefão — pede suplicante enquanto passa as
mãos no cabelo como Dante costuma fazer. — Hoje em vim paz — diz em uma
postura relaxada.
Como ele está próximo aproveito para passar minhas mãos por seu peito
com cuidado descendo por seu abdômen definido. Seu corpo tenciona em alerta,
mas ele não tenta impedir, muito pelo contrário a surpresa explicita em seu rosto
me faz querer rir. Sensualmente aproximo meus lábios do seu pescoço roçando
os mesmos naquele local sensível.
— É mesmo Jack? Você veio em paz? — sussurro próximo ao seu ouvido
ainda descendo minhas mãos em seu abdômen. — Quem vem em paz não traz
uma arma presa na cintura. — Seguro sua arma por cima da roupa e uma de suas
mãos rapidamente agarra a minha com uma força bruta enquanto a outra segura
meu pescoço indelicadamente.
Seus olhos faiscantes me encaram em um misto de curiosidade e
surpresa.
— Solte-a Jack. — Uma voz muito conhecida soa de trás dele.
Ele solta meu pescoço e acabo por soltar sua arma, Jack envolve seus
abraços sobre meu ombro como se fossemos velhos amigos encarando Dante
com um sorrisinho sacana nos lábios.
— Você tem uma bela dor de cabeça irmão — debocha ironicamente.
— Avisei que ela era esperta e perspicaz, mas você gosta de testar as
pessoas. Ela poderia muito bem ter usado sua própria arma para matá-lo. —Ele
suspira pesadamente.
Dante mantem sua pose forte e imponente, mas sua expressão não nega
seu canso físico, estou tão irritada com esse cretino que nem mesmo espero para
demonstrar toda a minha indignação.
— Você disse que me deixaria sem comida, mas me trancar em um
quarto deplorável desses é demais. É assim que você trata seus novos integrantes
da máfia? Minha vontade é enfiar minha mão na sua cara mais uma vez. —
Avanço em sua direção pronta para atacá-lo, mas Jack segura meus braços me
mantendo imóvel.
— Você não é uma integrante Srta. Trion, é somente uma prisioneira que
sabe demais e meteu o nariz onde não foi chamada — diz curto e grosso.
— Você não vai querer deixá-lo nervoso — Jack diz suplicante. — Ele é
um verdadeiro pé no saco quando está irritado. — Segura meus braços me
impendendo de acertar Dante.
— Cale-se Jack. — Dante lança um olhar duro para o irmão que se cala
imediatamente.
O olhar frio e expressivo de Dante sobre mim faz com que um estranho
calafrio percorra a minha coluna, mas aquele sentimento fraco logo é substituído
por nojo e raiva.
— Tranque-a no meu quarto Jack — ordena caminhando em direção as
escadas. Jack me reboca do porão com seus braços fortes e me arrasta pela
mansão sem muita delicadeza, até parar em frente ao quarto de Dante que fica no
andar superior.

— Não quero ficar trancada no quarto dele, não posso ficar trancada no
seu? — pergunto esperançosa.
— Adoraria mantê-la presa não só no meu quarto como na minha cama,
mas ainda tenho amor a minha vida. Se ele mandou te trazer até aqui é porque
você não é uma simples prisioneira. — Abre a porta do quarto forçando a minha
entrada.
Respiro profundamente sabendo que aquela conversa não chegará a lugar
algum.
— Apenas uma dica senhorita Trion. Não destruía está porta como fez
com a antiga, isso seria a mesma coisa de assinar sua própria morte. — Fecha a
porta, mas a abre rapidamente novamente. — Só mais uma coisa. Eu gostei de
você, tenho certeza de que Max e Royal também gostarão. — Pisca trancando a
porta com a chave ao sair.
Fico paralisada olhando para porta, eu não acredito que serei obrigada a
ficar neste quarto.
Talvez eu devesse ter me comportado no porão, mas parando para pensar
aqui pelo menos eu tenho um banheiro onde finalmente posso tomar banho.
Olho em volta e tudo está perfeitamente arrumado no seu devido lugar.
Observo o céu escuro pela janela do quarto indicando que é noite. O
relógio sobre a escrivaninha marca onze horas, e provavelmente faz dois dias
que estou trancada aqui. Robert a essa altura deve estar extremamente
preocupado sem notícias minhas.
Suspiro andando até a primeira porta que vejo, abro e encontro o seu
closet, ao adentrar o cômodo as luzes se acendem revelando seus ternos, camisas
e sapatos caros muito bem alinhados e enfileirados.
Eu poderia picotar todos esses ternos com uma tesoura, seria algo
extremamente infantil e imensamente prazeroso, mas dispenso essas ideias pois
reconheço os meus limites.
Fecho a porta a minha frente e caminho até a próxima onde há um lindo
banheiro e isso é tudo o que eu preciso no momento. Sem pensar duas vezes
retiro minhas roupas, deixando-as sobre a pia. No local há uma convidativa
banheira, mas a necessidade de sentir a água escorrer pelo meu corpo faz com
que me jogue embaixo do chuveiro sem muitos rodeios.
Tomo um demorado e relaxante banho, deixando a água quente passar
pelo meu corpo cansado. Estou me sentindo imunda, então faço questão de lavar
minuciosamente cada parte do meu corpo, principalmente os meus cabelos que
estão com terríveis nós emaranhados.
Depois do banho procuro uma escova de dente e um pente, por sorte acho
na última gaveta junto com outros produtos masculinos.
Saio do banheiro enrolada em uma toalha. Como não tenho nenhuma
roupa aqui e meu vestido já não pode mais ser utilizado sigo para o closet certa
que encontrarei alguma peça feminina.
Reviro todas as gavetas em busca de algo feminino e não encontro
absolutamente nada. Cansada de procurar, pego uma de suas camisas brancas e
visto não me importando se ele vai gostar ou não.
Já é tarde e meu corpo implora por uma cama macia e confortável, mas
meu orgulho não quer ceder a possível ideia de me deitar na mesma cama que
esse homem odioso.
Respiro profundamente observando àquela cama chamativa e confortável
e acabo deixando o cansaço vencer minhas razões. Sem pensar muito me deito e
ao encostar a cabeça nos travesseiros o familiar cheiro do seu perfume invade
meus sentidos trazendo boas e más recordações, e assim acabo pegando no sono
rapidamente.

Acordo sentindo calor e um peso desconfortável pressionar meu corpo.


Custo a abrir os olhos e quando faço assusto com o que vejo.
Dante está deitado ao meu lado, somente de cueca boxer branca, seu
braço envolve meu corpo e sua mão descansa sobre um dos meus seios
descaradamente. A coberta que cobria meu corpo está caída ao chão, a blusa que
cobre minha intimidade se enrolou mostrando mais do que deveria.
Fico tão chocada com o que vejo que acabo empurrando para o lado com
desdém e brutalidade, mas ele não acorda, apenas resmunga deitando de barriga
para cima. Aproveito para puxar novamente a coberta cobrindo meu corpo
desnudo.
As diversas tatuagens espalhadas pelo corpo de Dante chamam a atenção,
não lembro de vê-lo com tantas tatuagens espalhadas por seu corpo como agora.
Meus olhos se focam sobre o símbolo da família Voyaller e da máfia tatuado do
lado esquerdo de seu peito. Um dragão enrolado nos números 371. É uma
belíssima tatuagem, mas para alguém que entende e viveu o peso da dor marcado
por aqueles números não é nada agradável observá-los.
Sua pele naturalmente bronzeada se contrasta com todas as suas
tatuagens e somente agora percebo as profundas cicatrizes que algumas
tatuagens encobrem.
Tenho certeza que o causador de todas essas marcar é ninguém menos do
que Donatel. Esse velho é desumano, nasceu apenas para destruir vidas e
maldiçoar todos que estão a sua volta. Inconscientemente passo o dedo sobre
uma cicatriz de seu abdômen perdida em meus pensamentos.
Quando menos espero Dante está sobre mim segurando fortemente meu
pescoço com uma de suas mãos. Procuro me defender da maneira que consigo
segurando suas mãos que se envolvem em meu pescoço com uma força
exagerada, travo minhas pernas em sua cintura tentando inverter nossas posições
para que assim tenha a chance de me livrar de suas mãos pesadas.
Seus intensos olhos azuis estão perdidos em sentimentos dolorosos. O ar
começa a faltar em meus pulmões e minha reação é empurrar seu rosto com as
mãos.
A falta de oxigênio começa a deixar minhas vistas turvas e a qualquer
momento meu sistema se apagará em defesa a falta de ar. Sem pensar duas vezes
enfio meus dedos em seus olhos os forçando, imediatamente suas mãos pesadas
me soltam e começo a tossir a procura de ar, me sentando na cama com certa
dificuldade.
— Dana? — Ele apoia suas mãos em meus ombros preocupado, mas
tento afastá-lo não querendo contato.
Ignorando os meus protestos ele me puxa de encontro ao seu corpo
erguendo meu rosto para que eu consiga respirar melhor e quando finalmente
sinto o oxigênio retornar em meus pulmões me acalmo.
— Seu idiota — grito empurrando-o.
Ele segura meus braços me mantendo imóvel para que não o acerte e sinto minha
garganta arder quando a ar passa pela minha traqueia.
— Não estou acostumado a ser tocado quando estou dormindo — diz em
sua defesa.
Dante não é bom em esconder suas preocupações e neste exato momento
posso ver que ele realmente está preocupado com o que acabou de acontecer,
mas isso não faz com que minha raiva e meu ódio diminuam.
— Se não gosta de ser tocado enquanto dorme o que faz aqui? Se eu não
soubesse me defender estaria morta. — Deixo toda minha indignação explicita
em meu tom de voz.
— Primeiro: todos os quartos dessa mansão têm dono a não ser o porão
que você arrebentou com a porta. Segundo: esse quarto é meu. Terceiro, você
estava extremamente convidativa vestida com uma das minhas camisas sem
calcinha e sem sutiã. Não imaginei que fosse tão indecente assim Srta. Trion —
diz cada palavra em um tom acusatório e sensual, fazendo com que eu me sinta
culpada e constrangida.
— A culpa é sua por me trancar aqui — digo envergonhada.
— Essa é sua melhor desculpa Dana? Tem certeza que jogará assim?
— Sai daqui seu imbecil descarado. — Tento acertá-lo com um chute.
— Opa, acabei de ver algo mais interessante do que a sua bunda, abra
mais suas as pernas e me presentei com uma belíssima visão — ele sussurra
próximo ao meu ouvido. — Talvez você queira minha língua brincando entre
suas pernas, eu posso lhe proporcionar sensações incríveis. — Sinto um gelo se
formar em minha barriga descendo diretamente entre minhas pernas me
enviando uma sensação de desejo inconsciente.
Não acredito que meu corpo está reagindo as provocações dele, estou
mais irritada comigo do que com ele.
— Como seu eu quisesse fazer sexo com você — grito irritada.
Ele me solta e se levanta rindo das minhas reações. Sem se importar com
a sua nudez caminha em direção a porta fazendo questão de mostrar todo o seu
conjunto de músculos muito bem definidos e alinhados.
— Se vista seu pervertido de merda. — Arremesso o travesseiro em sua
direção e ele sai do quarto rapidamente rindo da minha cara.
Assim que ele sai me jogo na cama cansada, esse homem vai conseguir
me enlouquecer antes que eu consiga atingir meus objetivos e a única coisa que
paira em minha mente neste exato momento é seu estranho e repentino surto.
Ele deve esconder mais coisas do que posso imaginar.
DANTE

Deixo Dana trancada no quarto para não ter a possibilidade de uma


possível fuga, além de garantir meus homens muito bem postos e armados do
lado de fora.
Ela não costuma se comporta adequadamente e gosta de me desafiar. Não
que eu me importe com o que meus irmãos pensam, mas não posso dar regalias a
uma mulher que acabou de chegar, e por mais que queira deixá-la andar
livremente pela casa, tenho que delimitar limites e mostrar quem realmente
manda.
Robert Trion está na minha cola, não quero envolvimento com ele e para
evitar maiores conflitos como o possível sumiço de Dana Trion, fiz questão de
me comunicar com Robert explicando que sua irmã passaria alguns meses em
minha casa afim de melhorar suas habilidades nas artes marciais. Ele não se
mostrou satisfeito com a decisão da irmã, mas aceitou sua decisão como se
soubesse de algo que não deveria e isso me intriga. No momento não quero
pensar sobre isso e deixo Jack encarregado de observar todos os passos do Sr.
Trion.
Depois da morte de Eva, concentrei minha total atenção a máfia e as
empresas Voyaller. E nesse tempo não tive muitos relacionamentos duradouros,
na verdade, busco apenas satisfazer meus prazeres e nada mais, afinal, nenhuma
delas prende a minha atenção a ponto de levar uma relação adiante. Mas com
Dana as coisas são diferentes, todas às vezes que me perco em seus olhos
castanhos esverdeados sou levado de volta ao passado e quando menos espero
meu corpo reage a ela naturalmente e meus instintos se colocam a prova.
Ela é sagaz, selvagem, inteligente e isso faz com que eu a desejo. Na
verdade, quero possui-la, domá-la, prendê-la, fazê-la só minha e não deixar que
ninguém além de mim a toque. Essa possessividade que cresce em meu peito é
algo que desconheço a muito tempo e não ter o controle desse sentimento que
cresce em meu peito por alguém que nem mesmo conheço, mas que desperta em
mim desejos obscuros me irrita.
Talvez seja pelo simples fato de Dana Trion se parecer tanto com Eva
Becker que chega a confundir meus instintos, mas não posso me apegar isso.
Folheio a ficha que Jack acabou de me entregar com as informações de
Dana. Passo rapidamente meus olhos no que acho mais relevante já que Jack me
trouxe a ficha completa dela, desde o seu nascimento até os dias atuais.
Como somos em quatro tento ao máximo manter nossos assuntos entre a
família. Não gosto de envolver pessoas de fora para cuidar dos assuntos da máfia
371. Jack mais conhecido como “o gato” é o hacker e comanda tudo que
envolve tecnologia. Max mais conhecido como “o lobo” controla toda
exportação e importação de drogas e armas além de ter a função de encontrar
novos integrantes para a nossa equipe. Já Royal, irmão gêmeo de Max mais
conhecido como “a cobra” é um dos mais temidos por sua frieza e falta de
compaixão. Royal tem a função de comandar junto de Max a exportação e
importação de armas além de treinar todos os novos membros que são aceitos.
Na verdade Royal tem a função de aceitar ou não os membros que chegam até
nós.
E quanto a mim, organizo todos os contratos que temos e desvio a
atenção da mídia e de qualquer repórter que tente descobrir sobre nossos
assuntos ilegais. Somos dono do porto, o que facilita e muito a importação e
exportação de produtos ilícitos e ilegais, além de comandar tudo o que entra e sai
do nosso país. É obvio que muitas especulações rondam o nosso nome, mas até
hoje não tivemos problemas com a polícia ou com os governantes, na verdade,
faço dos meus inimigos os meus amigos.
Volto minha atenção para a ficha e me surpreendo ao ver que ela retornou
para Itália a pouco mais de uma semana. Procuro observar cada detalhe das
informações que me foram passadas e vejo que não há mentiras em tudo que ela
me contou, além de não ter nenhum envolvimento do seu passado com a Ucrânia
ou com Donzel.
Respiro profundamente tentando dispersar os pensamentos impróprios
que me surgem repentinamente, mas eles insistem em retornar nas imagens da
minha prisioneira deitada sobre minha cama seminua. Sua pele branca, seus
cabelos ruivos espalhados pelo colchão, seus lábios vermelhos e seu rosto
delicados me fazem suspirar. Apoio as mãos no rosto ao me lembrar da camisa
branca marcando seus seios redondos e fartos, além de mostrar descaradamente
parte de sua intimidade lisa e depilada. Sei que não foi intencional ela me
proporcionar imagens tão sensuais, afinal a camisa estava enrolada e a coberta
caída ao chão, mas isso não me deixa mais calmo ou simplesmente evita a minha
ereção.
Porra, eu sou um homem, não tem como não desejá-la, afinal ela é linda
e eu jamais neguei esse fato. Por mais que minha vontade fosse violá-la, jamais
teria a coragem de forçar uma mulher a se deitar comigo, pois isso não me
remete prazer e sim repulsa.
A porta do meu escritório se abre repentinamente me jogando de volta a
realidade, encaro Max irritado.
— O que quer Max? — pergunto indo direto ao assunto. — Já avisei para
bater antes de entrar. — Suspiro.
— Jack pediu para lhe avisar que Donzel tem se aproximado de Robert
Trion, é muito estranho ver ele se aproximar de uma família que não tem
envolvimento nenhum com assuntos ilegais — Max diz intrigado.
— Donzel foi rápido. Isso é estranho, não gosto nem um pouco desta
aproximação repentina. Ordene a Jack para ficar atento a todos os movimentos
de Donzel e de Robert. Não sabemos se eles estão trabalhando juntos e a
chegada de uma Trion em nossas terras não me agrada. — Levanto passando as
mãos no rosto.
— Falarei com Jack. — Max se retira da sala rapidamente.
Dana esconde algo que ainda não descobrimos, mas tenho certeza que
Donzel está diretamente envolvido nesta história. A única coisa que não consigo
compreender é os motivos dele escolher Robert Trion para me atingir. Não tem
sentindo nenhum e essa história está começando a me irritar.
Se Dana não quer contar a verdade por bem terei que arrancar por mal o
que não me agrada, pois odeio machucar mulheres e isso vai completamente
contra todas as minhas regras e princípios.
Odeio quando as coisas não saem como quero, meu pai me tornou assim.
Ele tornou a todos nós assim, pois tanto eu quanto meus irmãos passamos pelo
mesmo treinamento e levamos até hoje as marcas e cicatrizes em nossos corpos.
Ataquei Dana inconscientemente, na verdade, foi puro instinto de
proteção, pois Donatel costumava nós atacar enquanto dormíamos ou mandava
seus homens nos prender e nos asfixiar até que desmaiássemos. Depois disso ele
dizia que éramos fracos, incapazes de levar os negócios da família adiante, então
passávamos por uma sessão de tortura. Hora e horas trancados dentro de um
quarto sendo torturado e quanto mais gritávamos mais torturados éramos.
Suspiro olhando para o nada procurando dispersar esses pensamentos
fracos e indesejados.
Amanhã tenho uma reunião de negócios, será um jantar de inauguração a
um hotel, geralmente não levo acompanhantes, mas dessa vez levarei a senhorita
Trion, pois Donzel com toda certeza vai estar presente.
É claro que ele não mostra seus planos tão descaradamente, mas
conhecendo bem, aquele velho mau-caráter tentara de alguma maneira me
atingir e indiretamente jogar suas cartas na mesa para que eu dance em seu jogo.
O único problema disso tudo é que eu não ficarei esperando suas investidas e
atacarei sem pensar duas vezes.
Saio do escritório e sigo para cozinha afim de espairecer o emaranhado
de pensamentos que surgem em minha mente, mas no caminho encontro Jeff
meu motorista andando pela casa.
— Jeff — o chamo e ele vem em minha direção.
— Senhor. — Cumprimenta com um aceno de cabeça.
— Quero que compre roupas feminais de todos os tipos desde lingeries a
sapatos e tudo o que uma mulher tem direito de usar. — Ele me olha surpreso e
acanhado. — Aqui estão as medidas que você irá precisar, vou fazer uma ligação
e mandarei Esther, que é uma consultora de moda com você — digo por fim.
— As suas ordens, senhor. — Ele se curva pronto para sair.
— Jeff mais uma coisa. Fale para Esther que recebeu ordens diretas para
comprar um vestido de festa. Um vestido para um jantar, capriche. — Ele
assente e sai logo em seguida.
Antes de seguir para cozinha ligo para Esther solicitando seus serviços
como consultora de moda. Ela na verdade é uma médica especializada em
ortopedia que prestas serviços gerais dentro de sua área para família Voyaller no
lugar de seu pai que se aposentou. Nas horas vagas Esther gosta de trabalhar
como consultora de moda, então aproveito esse momento para usufruir de seus
serviços.
Após explicar o que eu preciso para Esther, volto o meu percurso para a
cozinha e encontro Tereza preparando o almoço. Ela está tão distraia picando os
ingredientes que não nota a minha presença e faço questão de me sentar apenas
para observá-la.
Depois de incontáveis minutos distraída com seus ingredientes e
temperos ela finalmente nota a minha presença.
— Menino que susto... — Ela apoia a mão no peito, mas logo se
aproxima limpando as mãos em um pano e beija a minha testa.
Sem que ela espere a pego de surpresa em um abraço deitando minha
cabeça em seu ombro. Teresa passa as mãos em meus cabelos em um gesto de
carinho e amor como uma verdadeira mãe.
— Tereza você deveria aceitar que eu contrate outra mulher para te
ajudar. — Mal tenho tempo de terminar e recebo um tapa de repreensão.
— Nem pensar essa cozinha toda é minha — diz brava apontando para
cozinha.
— Você não se cansa Tereza? — Ela abre um maravilhoso sorriso
negando com a cabeça.
— Não meu menino, desde a época do seu pai eu cuido de vocês. — O
brilho em seu olhar faz meu coração se aquecer, apesar de ter sido uma época
difícil para mim e meus irmãos, para ela traz boas memórias.
— Tereza temos uma “convidada” especial na casa. Ela se chama Dana
Trion, e quero deixar em suas mãos as refeições direcionadas a ela. Comece com
sua dieta somente amanhã — ordeno e ela assente animada com a possível
convidada, mas logo me observa desconfiada.
— Não me diga que está interessado em alguém Dante? A muito tempo
não vejo esse olhar confuso em seu rosto. Além de nunca termos convidados,
sejam eles homens ou mulheres. — Apoia a mão na cintura esperando minhas
explicações.
— Não é isso Tereza. Ela está mais para uma prisioneira do que
convidada, ela sabe demais assuntos que não deveria saber e ela me lembra
alguém que quero esquecer. — Foco meu olhar em um ponto qualquer me
perdendo em meus pensamentos.
— Eu te conheço desde que nasceu meu filho. Eva não vai voltar, não se
culpe por não ter protegido a sua amada. A família Becker foi vítima de um
ataque, você não poderia ter feito nada. Já se passaram muitos anos meu menino,
você precisa seguir em frente e esquecer o passado. — Me abraça mais uma vez.
Tereza trabalha para a família Voyaller a muitos anos e sabe do nosso
envolvimento com a máfia. Ela é uma das poucas pessoas que realmente
conhece a verdadeira face do meu pai. Teresa conheceu Eva e cuidou dela assim
como cuidou de mim e dos meus irmãos, mas ela não sabe que o causador do
suposto ataque a família Becker foi culpa da família Voyaller, na verdade nem
mesmo meus irmãos sabem, afinal, eles nunca tiveram contato com a família
Becker além de mim.
— Tentarei. — Dou o meu melhor sorriso apenas para acalmar o seu
coração de mãe.
— Eu sei que tentara. — Sorri acariciando meu rosto e logo voltando a
mexer as panelas.
Perdido em meus pensamentos nem mesmo escuto o que Teresa diz sobre
Jack. A angústia que cresce constantemente em meu peito não se ameniza e o
sofrimento que dilacera meu peito é constante. Jamais conseguirei me dar o
perdão pelo o que fiz, na verdade, eu não mereço perdão e estou destinado ao
inferno, mas garanto que antes de ir para lá levarei muitos comigo,
principalmente meu pai.
Me levanto e sigo para o escritório, Edgar Squared tem me dado trabalho
assim como Donzel Golodiev. Parece que esses antigos amigos do meu pai
resolveram se juntar para me tirar do sério, um bando de velhos que já passou da
hora de se aposentarem e dar lugar aos seus filhos como Donatel fez.
Edgar não tem um herdeiro, todas as suas filhas são mulheres e ele não
vê outra saída a não ser entregar seu legado a um Voyaller. O problema é que ele
quer casar sua filha mais nova com um dos meus irmãos.
Consigo imaginar a briga que esse assunto irá gerar, afinal nenhum deles
quer abrir mão de sua vida de solteiro. O que não é para menos, mas a pessoa
que chamamos de pai gosta e faz questão de destruir nossas vidas.
Royal e Max tem 26 anos, Jack é mais novo com 24, e provavelmente
será o escolhido já que a filha de Edgar tem 20 anos, mas o grande problema é
que Jack é devoto a sua vida de solteiro e presa sua liberdade acima de tudo.
Respiro profundamente me encontrando em um verdadeiro labirinto sem
saída, pois desfazer um contrato que meu pai assinou a anos seria a mesma coisa
de declarar guerra a Edgar e jogar nossa família em um campo minado
esperando ele explodir.
Difícil mesmo vai ser explicar todas essas porcarias ao possível escolhido
e fazê-lo entender que o culpado de tudo isso é Donatel, mas prevejo uma
acalorada discussão quando descobrirem sobre este assunto.
EVA

Permaneço deitada sobre a cama macia rolando de um lado para o outro


sem saber o que fazer. Suspiro pesadamente pensando no que aconteceu mais
cedo e me sinto completamente frustrada por saber que Dante ainda consegue
mexer com os meus sentimentos de uma forma que não me agrada.
Ao ouvir um barulho do lado de fora, me sento sobre a cama segurando o
relógio que se encontra mais perto de mim. Estou criando uma grande empatia
por esse relógio e quando a porta se abre me preparo para lançar o objeto pronta
para colocar Dante fora deste quarto a força, mas me surpreendo ao ver Jack.
— Ou, calma. — Ele ergue as mãos cheias de sacolas e eu seguro o
relógio antes de jogá-lo.
— Achei que fosse seu irmão — comento colocando o relógio sobre a
cama suspirando mais uma vez.
— Vou lembrá-lo de tirar todos os objetos perigosos do quarto antes que
fique com olho roxo. — Ele coloca as sacolas sobre a cama.
— Será um prazer deixar o olho dele roxo. — Sorrio com a ideia
maravilhosa.
— Se você se comportasse ele já teria liberado sua passagem pela casa,
mas acredito que você se comportar é algo impossível. Você é selvagem e eu
gosto disso, Dante está precisando de novas aventuras. — Jack sorri cruzando os
braços sobre o peito.
Como sua camisa está dobrada até a altura do cotovelo, tenho a
oportunidade de analisar as diversas tatuagens que cobrem seu braço esquerdo,
diferente do direito que reserva apenas alguns riscos e desenhos mais
diversificados.
— O que são essas sacolas? Minhas roupas? Já estava na hora mesmo. —
Me levanto a fim de encontrar uma calça ou um short, mas só encontro um
belíssimo vestido de festa.
— Para ser sincero muito me surpreende que Dante tenho comprado suas
roupas, muitas por sinal, mas ele ordenou que trouxesse apenas esse vestido. O
resto é maquiagem, sapatos e produtos pessoais. Dante pediu para lhe avisar que
você irá a um jantar com ele às oito da noite. — Jack anda pelo quarto
despreocupado.
— Não vou a lugar algum com ele. — Jogo o vestido em sua direção, e a
sua reação é jogá-lo de volta para mim.
— Ele imaginou que diria isso, então mandou lhe avisar que seu irmão
estará na festa e você irá com ele para que qualquer desconfiança da parte do seu
irmão contra nossa família seja dispensada. Disse também que se você se
comportar adequadamente terá a oportunidade de conversar com seu irmão
livremente sem que ele esteja por perto. Eu se fosse você não recusaria essa
oferta, ele está sendo incrivelmente bom com uma prisioneira que já deveria
estar morta. — Jack retira um cigarro do bolso da calça e leva até os lábios.
— Pensarei no caso. — Suspiro chateada.
Odeio ter que ir de acordo com as regras que Dante impõe, mas dessa vez
ele me pegou de jeito. Não posso recusar a oferta de me encontrar com Robert e
mostrar para ele que está tudo bem.
Eu sei que Robert não criou alardes pelo meu possível sumiço, pois
implorei que ele me desse a oportunidade de descobrir tudo o que aconteceu em
meu passado, mas sei que Robert não pensaria duas vezes em colocar tudo em
jogo pela minha segurança. Conhecendo Dante, se ele se sentir ameaçado não
pensará duas vezes em dar um jeito de acabar com a vida de Robert.
Não posso brincar com Dante, sei dos meus limites e até que ponto posso
provocá-lo. Dante não se importa em matar e tirar vidas com as próprias mãos e
ele já provou isso com a morte da minha família, simplesmente não posso
colocar a vida de Robert em risco por puro luxo e ódio, preciso apenas controlar
os meus sentimentos e o desejo de vingança que cresce em meu peito cada vez
que o vejo.
Para quebrar o clima pesado e constrangedor que se instalou entre nós
resolvo perguntar dos outros dois membros da família que ainda não conheço e
nem mesmo sabia da existência até poucos dias atrás.
— Gostaria de conhecer seus irmãos — falo por fim.
— Hum... Acredito que Max adoraria te conhecer, mas Royal é
antissocial, psicótico e egocêntrico. Ele provavelmente sentirá curiosidade em te
conhecer, mas evitará contanto direto ou indireto a menos que for extremamente
necessário. Nem mesmo eu não o entendo, Max é o único que consegue
compreendê-lo em todos os momentos já que são irmãos gêmeos. — Ele
acedendo o isqueiro levando o mesmo até o cigarro que segura em seus lábios.
— Por favor Jack, não fume — peço educadamente.
— Senhorita, sinto lhe informar, mas a família toda é fumante. Não nos
culpe por isso, fomos forçados a começar e simplesmente não conseguimos
parar. — Ele apaga o isqueiro voltando a colocar o cigarro no bolso. — Ou
talvez não queremos parar. — Sorri elegantemente.
— Não te culpo por nada, sei que foram forçados a fazer coisas que não
deveriam. — Acabo falando demais e vejo que minhas palavras têm ação direta
nele.
Sua expressão suave se torna sombria e triste, ele me observa em silêncio
fechando os punhos envolta do corpo.
Pelo pouco que conheço de Jack vejo que ele é sempre cheio de si, mas
olhando para ele agora parece apenas uma criança que precisa de amor. Uma
criança que precisa aprender a amar. Todos eles devem ser iguais, homens
perdidos em um mundo que não gostariam de estar, mas que foram jogados e
forçados a liderar.
— Jack — o chamo quebrando a sua linha de pensamentos sombrios.
— Sabe Dana... — Faz uma pausa. — Posso lhe chamar assim? —
pergunta incerto.
— Claro — concordo.
— Então Dana, às vezes custo em acreditar que você nunca teve
envolvimento com a nossa família. Você sabe demais até mesmo para uma
pessoa que voltou a alguns dias do Japão. — Ele passa as mãos no cabelo em
sinal de nervosismo.
— Que isso Jack. — Sorrio. — Eu apenas fui muito bem treinada e sou
boa em pegar pequenos detalhes que vocês gostam de me fornecer. Não sei o
porquê, mas você realmente gosta de me dar informações valiosas, apenas acato
tudo com muita sabedoria e tiro minhas próprias conclusões. — Sorrio
gentilmente desviando qualquer dúvida que surja em sua mente.
Me observando enquanto gargalha por alguns instantes ele se encosta na
parede com os braços cruzados.
— Você é incrível e eu adoro jogar com você, sempre tão perspicaz e
sagaz.
— Eu também gosto de você Jack. — Sorrio para ele.
— Desculpa atrapalhar a declaração dos dois, mais acredito que você foi
ordenado a um importante serviço Jack. — Dante aparece repentinamente me
assustando. — Além disso dei ordens diretas a Jeff para trazer as roupas desta
noite até a senhorita Trion. — Observa o irmão com irritação.
— Pode ficar tranquilo irmão, garanto meu serviço na segurança, e
quanto as ordens que recebi de Max iniciei minhas pesquisas a pouco mais de
três horas. Neste momento é necessário apenas aguardar os movimentos da nossa
presa. Em questão a Jeff dispensei seus serviços, pois queria ver se nossa
prisioneira estava bem e gostaria de acrescentar irmão que a Srta. Dana tem
belas coxas. Agora entendo o porquê a mantem tão isolada — Jack provoca.
— Sai Jack, meu humor não está dos melhores. — Ele semicerra seus
intensos olhos azuis em direção ao irmão que ergue os braços em sinal de paz.
— Eu só estou brincando irmão, sabe disso.
— Apenas saia — Dante ordena.
Opto por permanecer em silêncio observando a reação dos dois, tem algo
que está preocupando Dante e eu não consigo imaginar o que pode ser.
— Você tem a tarde toda para se arrumar, fique pronta antes das oito
horas da noite. — Ele mantém seu olhar frio sobre mim me deixando
incomodada.
— Pensarei no caso. — Cruzo os braços olhando diretamente em seus
olhos mostrando que não tenho medo dele.
— Isso é uma ordem. — Ele se aproxima irritado.
— Eu não aceito suas ordens. Faço porque eu quero, não porque você
manda — o provoco.
Dante segura meu braço com uma força exagerada aproximando meu
corpo do seu. Sua respiração está próxima da minha e seu olhar sombrio encobre
qualquer sentimento que mostre o seu estado crítico de humor.
— Você estará pronta às oito da noite e me acompanhará na festa como a
verdadeira dama que é, encontra seu irmão e garantirá a boa estadia que está
tendo nesta casa como eu fiz questão de explicar a ele e se não o fizer mandarei
te dopar e sujarei seu corpo de sangue, rasgarei suas roupas e tirarei várias fotos
do seu corpo inerte garantindo a sua possível morte. Acredito que seu irmão
adoraria saber que perdeu a irmã mais nova de uma forma brutal. — Suas
palavras soam frias e cruéis.
Dou um tapa em seu rosto me soltando de seu aperto sentindo o peso de
suas palavras me atingirem em cheio.
— Você é horrível. — Minhas palavras saem embargadas por lembrar
dos corpos dos meus familiares no chão da sala.
— Não tratarei com respeito quem não merece. Você está avisada Dana,
e sim, eu realmente sou horrível, sou sujo de uma maneira que você nunca será.
— Apesar de frias suas palavras são dolorosas e triste.
— Saia. — Abraço meu corpo me sentindo acuada diante de palavras tão
brutais.
— Oito horas. — Ele sai do quarto trancando a porta, mas faz questão de
deixar o aviso.
Me sinto frustrada e perdida. Não achei que seria assim, não achei que
teria que me submeter aos gostos e vontade de Dante para conseguir as
informações que quero, mas vejo que não será tão fácil quanto planejei.
Me sento sobre a cama remoendo a ameaça que ele acabou de jogar sobre
mim, não me importo de ser dada como morta, isso não faz diferença para mim e
muito menos me assusta, mas Robert entraria em desespero, ele certamente
desistiria de tudo afinal se sente na responsabilidade de me proteger acima de
tudo e todos.
Eu não posso me dar o luxo de deixar Dante ameaçar ou cogitar a
possibilidade de chegar perto de Robert, por mais que meu possível irmão tenha
uma grande influência no mundo dos negócios assim como Dante, a diferença é
que Dante é o chefe e comanda a máfia italiana e Robert não tem envolvimento
nenhum com assuntos desse nível.
Mesmo que eu treine cinquenta anos da minha vida nunca será suficiente,
pois nossas mentes são diferentes. Dante nasceu e vive na escuridão e na
podridão assim como os seus irmãos, já eu fui lançada neste mundo por mera
vingança e desejo de descobrir sobre o meu passado.
Talvez Jack tenha razão, eu devo seguir os jogos que Dante impõe e
assim serei tratada de forma diferente. Se quero sua confiança preciso conquistá-
la aos poucos e é exatamente isso que farei, me juntarei ao meu inimigo para
arrancar as verdades que preciso.

As horas passam rapidamente após a minha decisão de finalmente dar o


braço a torcer para seguir as vontades de Dante e conquistar sua confiança.
Tomei um banho demorado e hidratei toda a minha pele e meus cabelos
para garantir uma boa aparência nesta possível festa.
Se ele quer uma dama é realmente isso que ele terá e devo me lembrar de
agradecer pessoalmente ao comprador deste vestido, pois ficou um verdadeiro
espetáculo em meu corpo. A única coisa que me incomoda e me deixa
preocupada é o fato do vestido ser da cor marsala que realça e define minhas
curvas deixando meus peitos maravilhosos no lindo decote coração, fora ele ser
aberto nas costas expondo parte da minha tatuagem.
Respiro profundamente tentando não me abster a esses pensamentos
enquanto dou os retoques finais em minha maquiagem com tons suaves e leves,
pois a cor do vestido somado a cor dos meus cabelos chama mais a atenção do
que eu gostaria.
A porta do quarto se abre bruscamente revelando um par de olhos azuis
cintilantes que me medem de cima a baixo, diversas vezes, pelo que consigo
observar do espelho a minha frente.
Com calma e sem demonstrar arrependimentos me viro em sua direção
analisando-o da mesma maneira. Seu terno escuro bem cortado marca seus
músculos definidos. Dante, neste momento exala poder e riqueza, em vezes de
ódio e raiva. Ainda assim o ar sombrio e obscuro paira em sua volta como uma
aura protetor.
Seus olhos continuam me medindo de cima a baixo e sei que querendo
ou não consigo mexer com os seus sentimentos, mesmo que eu não queira. Isso é
natural entre nós dois, sempre foi assim e é praticamente impossível de se
controlar.
— Vamos. — Sua voz grossa rompe o ambiente pesado que havia se
instalado entre nós.
Respiro profundamente com vontade de revirar os olhos para suas ordens
e falta de educação, mas faço questão de caminhar elegantemente em sua
direção, passando por ele sem demonstrar importância para seu tom grosseiro
que me tira do sério.
Sem esperar por ele continuo caminhando em direção as escadas que me
levaria ao hall de entrada, mas logo sinto os dedos de Dante na base da minha
coluna me guiando pelo corredor.
Com calma e sem rodeios retiro sua mão da base da minha coluna
indicando que aquele contato não me agrada, obediente ele segue ao meu lado,
porém, seus olhos cintilavam irritação.
— O que foi? Você me ameaçou de uma forma horrível agora quer
demostrar poder sobre mim? Tenho que lembrá-lo que você não é meu dono. —
Desço as escadas que leva ao hall de entrada sem esperar por sua resposta.
Seu olhar perdido me deixa confusa e neste momento não sei dizer o que
se passa por sua cabeça. Muitas das vezes ele age por impulso e isso o leva a ser
extremamente hostil, não posso negar que o provoco na maioria das vezes que
recebo suas atitudes agressivas, mas realmente não tenho medo dele.
Escuto um assovio e minha atenção se volta para o homem alto de
cabelos negros, pele levemente bronzeada e olhos azuis acinzentados. A roupa
social esconde a maior parte de suas tatuagens, mas os pequenos riscos de tinta
em seu pescoço ainda são visíveis. Seus músculos ficam saltados e apertados
pela camiseta agarrada e vejo uma cópia exata encostado na parede ao seu lado.
Então esses são os dois irmãos que faltava. Essa família deve ter algum
problema na genética, acabo de confirmar isso.
— Dante você terá problemas com sua dama, ela é sensacional. — Ele
assovia mais uma vez me fazendo rir.
— Cala boca Max — o homem ao lado diz irritado.
— Fica quieto Royal, se você é antissocial eu sei apreciar as belezas da
vida.
Fico envergonhada com as suas palavras.
— Ela caiu no covil do dragão, Max. — Jack aparece atrás de mim
segurando minha mão com delicadeza depositando um beijo na mesma.
Olho para Dante e sua expressão é indiferente para a conversa que surgiu
repentinamente, mas vejo em sua postura que isso não lhe agrada.
— Parem de cobiçar nossa prisioneira. — Sua voz grossa faz Jack
reprimir um sorriso soltando a minha mão.
— Este vestido ficou sensacional em você Dana — Jack sussurra dando
uma piscadinha para mim.
— Obrigada — murmuro sorrindo educadamente para Jack. — É um
prazer conhecê-los, venho perguntando de vocês a Jack a alguns dias, como
percebem sou uma prisioneira privada de regalias, mas sirvo para ser
acompanhante do meu sequestrador. — Faço questão de indicar Dante ao meu
lado.
— Gostei dessa mulher. — Royal que se mantinha quieto e indiferente a
tudo que se passava a sua volta, me observa com um olhar surpreso e curioso o
que me muito me surpreende depois do que Jack havia me dito.
— Essa conversa não chegara a lugar algum e estamos atrasados. —
Dante caminha a minha frente me deixando para trás.
Observo os três a minha volta e balanço os ombros indicando indiferença
as palavras de Dante, mas para evitar mais grosseria e brutalidade me despeço
com um simples acenar de mão seguindo para o carro que está a nossa espera.
O caminho até a festa é feito em um silêncio constrangedor, Dante me
observa minuciosamente com seus olhos azuis faiscantes e procuro desviar
minha atenção para a janela observando as casas passar pelos meus olhos.
Voltei a poucos dias e não consegui apreciar uma grama da minha
liberdade, a saudade de andar livre por essas ruas me toma roubando todos os
meus pensamentos. Meus olhos passam pela cidade me trazendo boas lembras da
época da escola, quando saia com minhas amigas para me divertir. Parando para
pensar, na maioria das vezes estava rodeada de meninas e meninos e Dante
sempre esteve junto comigo, afinal ele quase nunca me deixava sozinha. Na
época dos meus quatorze anos estávamos envolvidos em um romance intenso e
acalorado, então sair com ele era agradável e satisfatório.
Respiro profundamente soltando o ar de meus pulmões calmamente
evitando questionamentos e perguntas desnecessárias. As coisas mudaram tanto
e olha para gente agora, minha única vontade é vê-lo morto.
— Você está linda. — Sua voz rouca me traz de volta a realidade.
Desvio o olhar da janela para observá-lo melhor. Dante fixa seus olhos
nos meus e suspira impacientemente tamborilando os seus longos dedos sobre o
estofado de couro caro esperando uma resposta da minha parte, porém opto por
permanecer em silêncio, pois não quero gerar brigas e intrigas ainda piores entre
nós dois, então apenas volto minha atenção para a cidade o ignorando.
— Não deveria ter lhe ameaçado daquela maneira, fui grosseiro. — O
tom de preocupação em sua voz me surpreende.
Ele está tentando se redimir por ter me ameaçado de uma maneira
horrível? Desconheço esse lado sensível de um homem sem sentimentos como
ele.
— Você sempre é grosseiro senhor Voyaller — me limito em dizer.
— Me chame apenas de Dante. — Me observa confuso.
— Me desculpe, acredito que sua prisioneira não deva lhe tratar tão
intimamente — falo ironicamente, soltando uma risadinha debochada.
Não consigo manter meus pensamentos e raiva contidos em meu interior
e quando vejo já estou provocando-o. Seus olhos confusos, perdidos e cheios de
dor me analisam em silêncio.
Eu não consigo entender, minha mente não compreende como ele pode
esconder tantos mistérios em um único olhar e porque a tristeza e o desespero
sempre estão presentes em sua íris celeste.
Às vezes um estranho sentimento de proteção surge em meu peito, pois
observar aqueles olhos perdidos em dor me faz entendê-lo. Dante parece sofrer
tanto quanto, porém ao me lembrar de tudo o que passamos o ódio domina e
mascara todo o sentimento de proteção que ousa surgir em meu peito.
— Estou tentando me redimir Dana. — Ele soa frio.
— Nunca vi um mafioso tentar se redimir. — Seu olhar surpreso e
intrigado faz com que eu junte as sobrancelhas esperando por sua resposta.
— Talvez eu seja diferente daquilo que você acredita e é acostumada a
ver. — Se limita em dizer me deixando pensativa.
— Talvez você realmente seja, mas até o momento você provou ser igual
a todos. Frio, calculista, arrogante e rude. Até o momento só vi em você um
homem que exige que eu siga suas regras e ordens, pois sei além do que você
gostaria.
Mantenho meus olhos fixos nos seus esperando pacientemente sua
resposta, mas a única coisa que recebo e um maxilar travado e uma expressão de
irritação.
— Estou tentando te tratar melhor, mas você não colabora. Você gosta de
me irritar. Não me satisfaz te ver trancada dentro daquele quarto se é isso que
está pensando.
Respiro profundamente sentindo toda a minha irritação dominar meus
pensamentos e quando vou lhe responder o frentista abre a porta revelando um
imenso tapete vermelho que leva até a entrada. Vários fotógrafos e repórteres
esperam os convidados com suas câmeras e microfones na mão e me sinto
exposta demais sendo alvo de tanta atenção.
Dante desce do carro e me espera do lado de fora com a mão estendida
para me ajudar. Procuro ignorar nossa conversa e por mais que minha vontade
seja deixá-lo plantado ali ignorando sua ajuda. Disse para mim mesma que faria
as coisas de acordo com as suas vontades, então a completo contragosto seguro
sua mão.
Ao caminharmos pelo tapete somos recebidos por vários flashes e uma
chuva de perguntas desnecessárias. Sua mão se envolve em minha cintura
fazendo com que eu caminhe ao seu lado e a minha vontade é de tirar suas mãos
dali, mas o sigo em silêncio.
Dante faz questão de passar por todos os repórteres ignorando suas
perguntas e os flashes, mas não perde a oportunidade de me provocar
aproveitando o momento para passar seu dedo indicador da base da minha
coluna até minha nuca onde permanece fazendo pequenos círculos no local.
Um arrepio indesejado passa pelo meu corpo e a vontade de cravar
minhas unhas em sua pele começa a dominar meus pensamentos.
Ao entrarmos no salão me afasto me sentindo sufocada com sua presença
maçante sobre mim. Não me agrada ter seu corpo tão próximo do meu, mesmo
que meus hormônios respondam positivamente a sua aproximação.
Ao tentar me afastar um pouco mais, suas mãos fortes seguram meu
braço fazendo com que nossos corpos fiquem colados e seus lábios fiquem bem
próximos dos meus, me pegando desprevenida.
— Não ouse desobedecer às minhas ordens e se mantenha perto de mim
Dana. Você só pode se afastar quando ver seu irmão e ainda está proibida de
comer ou beber qualquer coisa — sussurra bem próximo do meu ouvido roçando
sua barba rala por fazer em meu pescoço.
Um calafrio percorre meu corpo em resposta a sua aproximação
repentina.
Se ele quer brincar dessa forma então vamos brincar. Passo minha mão
pelo seu peito subindo até seu pescoço e suavemente puxo a lapela de seu terno
diminuindo ainda mais a distância entre nós deixando nossos lábios a poucos
milímetros de distância.
— As suas ordens mestre. — Roço meus lábios suavemente na lateral de
seu queixo bem próximo aos seus lábios.
Suas mãos agarram minha cintura com força suficiente para deixar as
marcas dos seus dedos em minha pele, mas me afasto e seus olhos azuis não
escondem o desejo que sentem por mim.
— Poderia me soltar, há vários convidados nós olhando. — Ajeito sua
gravata para disfarças os olhares curiosos sobre nós.
O lugar é decorado em tons de preto, bege e marrom. As mesas repletas
de comida fazem minha barriga roncar. Estou a três dias sem comer nada e
Dante ainda quer me castigar, mas ele está muito engado se acha que seguirei
suas ordens a noite toda.
Tento me afastar, mas suas pesadas não deixam que eu me mova
livremente, eu poderia facilmente me livrar dos seus toques, mas não quero dar
um show aqui. Seus olhos percorrem meu corpo com desejo e quanto mais ele
me observava, mas meu corpo traidor se aquece com a intensidade do seu olhar.
Vejo Robert conversando com alguns empresários e resolvo me
aproximar.
— Se me der licença meu irmão está bem ali. — Aponto para a direção
de Robert e Dante alivia a força que seus dedos pesados exercem em minha
cintura.
Sem pensar duas vezes me livro dos seus toques e ando em direção a
Robert que deveria estar preocupado.
— Robert — o chamo e seus olhos preocupados se voltam para mim.
Caminho o mais rápido que posso em sua direção e Robert acaba
deixando os empresários de lado para vir ao meu encontro. A aflição estampada
em seus olhos não esconde sua preocupação e medo.
— Rob — digo o abraçando.
— Ev... Dana... — Ele suspira me abraçando com força.
— Dante está aqui e me obrigou a acompanhá-lo — sussurro bem
próximo ao eu ouvido, afinal fiz questão de revistar todo o vestido em busca de
alguma escuta escondida.
— Eu sei, ele está nos observando de longe. Você está bem? — pergunta
preocupado.
— Sim, ele não me trata mal Rob — digo para acalmá-lo, mas não é
totalmente verdade.
— Isso é estranho, mas me sinto aliviado. — Ele sorri me abraçando
novamente. — Dante entrou em contato comigo. Disse que você passaria um
tempo na mansão para treinar, achei muito estranho.
— Não posso explicar o que está acontecendo, pois ele está observando
cada movimento meu. O importante é que está tudo sobre controle. — Sorrio
disfarçadamente evitando o olhar de curiosidade de Dante.
— Se ele te fizer algo eu juro... — Robert se irrita, mas eu o acalmo.
— Rob ele não me fez nada. Eu preciso que você mantenha a calma, vou
tentar descobrir tudo o mais rápido possível para voltar. — Tento acalmá-lo.
— Ele é esperto e está esperando um deslize seu, então tenha cuidado.
Ele não é o tipo de homem que joga para perder. — Suspira pesadamente e vejo
que a atenção de Dante está completamente voltada para nós.
— Vamos mudar de assunto, Dante foi bem treinado e sabe ler bem as
reações do seu corpo. — Apoio a mão em seu ombro. — E as empresas como
estão? — pergunto aleatoriamente.
— Bem, uma nova proposta surgiu do exterior e vai render uma boa
porcentagem de lucros — diz despreocupada e me sinto aliviada.
É assim que quero Robert, despreocupado e calmo, pois a cada segundo
que a tensão em seu corpo aumenta Dante se mostra cada vez mais interessado
em nossa conversa.
Um homem se aproxima de nós e Robert abre um grande sorriso o
recebendo com uma falsa alegria. Somente com essa reação já sei que esse
homem não é o tipo que devemos nos envolver.
Robert me apresenta ao homem que se chama Stuart e procuro não me
envolver muito na conversa dos dois. Esse não é um local para conversas mais
profundas e detalhadas sobre Dante e meu passado, então deixo que Stuart ganhe
a atenção de Robert, pois assim sua atenção sai do Voyaller que nos encara
indiscretamente.
Como tenho tempo e não me interesso nem um pouco pelos assuntos de
Robert com a empresa, aproveito o momento para me deliciar das comidas
dispostas sobre a mesa.
Os olhos de Dante faíscam ao me ver quebrando suas regras, mas ele
nada pode fazer quando está cercado por empresários, assim como Robert.
Aproveito para tomar várias taças de vinho e de champanhe e quando um
dos garçons passa por mim com um copo de uísque observo Dante de longe com
um sorrisinho sacana nos lábios. Seus olhos intensos só faltam me consumir e
ele faz um não com a cabeça. Levanto o copo em sua direção como um brinde e
me delicio com cada gota do álcool que escorre por minha garganta.
Uísque nunca foi uma das minhas bebidas preferidas por ser forte
demais, porém, nesta nova etapa da minha vida cheia de altos e baixos uma
bebida que lhe tire a razão está sendo muito bem-vinda.
Vejo Dante semicerrar os olhos e travar o maxilar em resposta as minhas
desobediências e audácia, contudo, nem mesmo me importo para o que ele está
pensando.
Os olhos de Stuart não saem do meu corpo e isso está começando a me
incomodar, procuro ignorar qualquer tentativa de aproximação vinda dele. Mas
quando Robert é puxado para uma nova roda de homens e mulheres, muito
concentrados em discutir sobre porcentagens e rendimentos Stuart, vê a
oportunidade de se aproximar.
Meio bêbado começa a segurar minha mão e apertar minha cintura mal
intencionado. Suas investidas desnecessárias começam a me irritar e o cheiro de
álcool que exala do seu corpo me causa náuseas e enjoos.
Tento afastá-lo sem usar a força, mas insistentemente ele volta tentando
passar a mão sobre meu corpo. Apesar de misturado algumas bebidas alcoólicas
não me sinto bêbada a ponto de me descontrolar, porém, o calor e a visão
levemente embasados faz com que eu me torne alheia a certas coisas que se
passam a minha volta.
Os pelos do meu corpo se eriçarem ao sentir as mãos fortes de Dante se
envolverem em minha cintura me puxando contra seu corpo, minhas costas
batem levemente contra seu peito fazendo minha bunda roçar em sua ereção. Ele
mantém seu corpo colado ao meu observando Stuart de cima.
— Stuart, o senhor Louis disse que tem uma ótima proposta para o
senhor. Essa é uma oportunidade única. — Dante aperta seus dedos em minha
barriga onde mantem suas mãos.
— Sr. Voyaller minha conversa com essa linda dama está mais
interessante no momento. — Ele desafia Dante diretamente e sinto que isso não
acabara bem.
— Eu sei me cuidar sozinha — murmuro somente para ele ouvir e
quando vou bebericar o uísque ele segura meu copo virando o resto do líquido.
— Fica quieta, você quebrou várias regras em uma única noite, quando
chegar na mansão resolvo o que fazer com você — diz ameaçadoramente em
meu ouvido.
Essa não é uma simples ameaça e sim uma promessa. Respiro
profundamente sabendo que terei que aguentar as consequências dos meus atos
mais tarde e isso só me instiga a provocá-lo ainda mais.
— Poderia me soltar. — Me remexer e acabo por me esfregar em sua
ereção.
— Não brinque comigo — sussurra na minha orelha com irritação.
E somente para provocá-lo me remexo novamente pressionando minha
bunda em entre suas pernas.
— Poderia soltar a donzela — Stuart insiste.
Dante se mantém na mesma posição, atrás de mim com nossos corpos
colados de maneira que evita olhares estranhos e desconfiados. Robert está de
costas para mim e tenho vontade de chutá-lo.
— Essa donzela é minha esposa Stuart, e se você encostar suas mãos
sujas nela novamente colocarei minha posição social de lado e acabarei com
você — ele cospe as palavras irritado.
Stuart arregala os olhos assustados e engole suas palavras com medo do
que lhe pode acontecer, e sem pensar duas vezes ele se despede com um aceno
de cabeça nos deixando ali.
— Jamais aceitaria ser sua esposa, somente para deixar claro. — Arrumo
meu vestido que está desalinhado.
— Vamos embora. Você já viu seu irmão. — Dante segura minha mão
pronto para sair, mas para ao ver um senhor vir em sua direção.
Esse homem, semicerro os olhos me lembrando de ter visto o mesmo em
sua casa no dia da festa e particularmente não gosto dele. Tem aparência de
alguém perigoso e o sorriso estampado em seu rosto é sinal de problema.
— Oras se não é Dante Voyaller e a senhorita Trion. — Ele segura minha
mão depositando um beijo demorado.
Incomodada com essa situação puxo minha mão de volta.
— Donzel Golodiev. — Dante cumprimenta com um aceno de cabeça.
Procuro me manter impassível ao que está acontecendo, mas a tensão nos
olhos de Dante me deixa atenta a cada movimento do senhor a minha frente.
Não é todos os dias que vemos o chefe da Itália erguer todas as suas
guardas para um senhor de quase 70 anos.
— Só Donzel por favor — ele diz sorridente estendendo a mão em
direção a Dante que segura a contragosto.
— Em que posso lhe ajudar Donzel? — Dante pergunta sem desviar os
olhos do homem a nossa frente.
— Você em nada meu caro amigo, mas a belíssima dama que lhe
acompanha muito me ajudaria. — Donzel tenta uma aproximação e
disfarçadamente me afasto.
Simplesmente não gosto da presença desse homem perto de mim, Dante
envolve a mão em minha cintura e dessa vez não reclamo apenas deixo sabendo
que o homem a minha frente tem segundas intenções.
— Seu irmão tem me ignorado, me sinto extremamente chateado, então
resolvi vir diretamente até você. — O sorriso estampado em seu rosto é
assustador.
— A Srta. Trion está comigo, Donzel. — Dante aparenta uma calma
intrigante, porém essa faixada barata não cola comigo.
Ele está irritado e como eu sei disso é bem simples, basta olhar para sua
postura ereta, seus olhos fixos em um único ponto e suas mãos inquietas que
circulam pelas minhas costas.
Eu conheço Dante a muito tempo e seus costumes antigos ainda
continuam os mesmos.
— Estão como par nesta festa, certo? Fiz algumas pesquisas e descobri
que chegou do Japão a pouco tempo. Foi uma grande surpresa saber que faz
parte da família Trion, nem mesmo sabia que Robert tinha uma irmã. —
Gesticula com as mãos falando sobre minha vida como se eu não estivesse ali.
Mordo minha língua e engulo a vontade de lhe responder à altura, mas
não causar escândalos para Dante em um momento como esses e muito menos
para Robert, então me contenho.
— -Bom isso não vem ao caso no momento, quero somente lhe
apresentar ao meu filho. Acho que será um bom negócio unir uma Trion com um
Golodiev, afinal você morou no Japão, mas ainda é uma belíssima italiana. —
Ele vai direto ao ponto.
— Você quer dizer que quer assumir parte das posses italianas, Donzel.
— Dante ri debochadamente e percebo que as coisas estão ficando mais serias
do que deveriam.
— Por direto — diz despreocupado.
— Eu não aceito essa proposta absurda — falo irritada e os dedos de
Dante pressionam minha cintura me mantendo parada
— Em primeiro lugar peço que se coloque no seu lugar e reveja as suas
propostas. — Dante respira profundamente mantendo a calma. — Em segundo
lugar Dana Trion, será minha esposa — Dante diz com convicção sem deixar
brechas para dúvidas ou discussões.
Tenho vontade de dizer umas verdades tanto a Dante quanto àquele
senhor, mas vendo a irritação do homem ao meu lado prefiro me manter calada e
seguir o seu jogo. Afinal, Donzel me parece mais perigoso do que posso
imaginar
— É uma pena mesmo. Agora compreende as recusas de Robert Trion.
Você foi mais rápido do que eu e já fechou um contrato de casamento com ele —
o velho diz com petulância. — Realmente não se deve brincar com um Voyaller.
— Sr. Golodiev avisei que Dana não estava disponível. — Robert
aparece atrás de mim irritado.
— Só queria ter as minhas certezas... Bom já vou indo. — Se despede
rapidamente e sai para conversar com um grupo de senhores ao lado.
— O que foi isso Robert? Por que não me avisou nada sobre esse senhor?
— pergunto brava.
— Não queria lhe preocupar. — Suspira.
— Não gosto quando esconde as coisas de mim. — Cruzo os braços
sobre o peito irritada.
— Não estou escondendo, apenas não tivemos tempo de conversar. —
Ele volta seu olhar rapidamente para Dante, e depois para mim.
— Tudo bem, como não pude concluir meu treinamento no Japão, o
senhor Voyaller irá me ajudar. Ele é muito bom com artes marciais. — Procuro
jogar o mesmo jogo que Dante apenas para ganhar sua confiança.
— Eu tenho certeza que ele cuidará bem de você. — Robert encara Dante
nos olhos e eles se entreolham por um tempo me deixando intrigada.
O que esses dois estão tramando? Me pergunto observando os dois
desconfiada.
— Já estamos estávamos de partida, certo Dana? — Dante pergunta e
vejo seus olhos curiosos sobre mim esperando uma resposta.
Fico tentada a provocá-lo, mas essa festa já deu o que tinha que dar.
Então simplesmente confirmo querendo uma noite de paz sem brigas e sem
chantagens.
Sendo assim me despeço de Robert com um abraço demorado sabendo
que pode demorar o nosso próximo encontro. Robert faz o mesmo se despedindo
de mim e sua relutância em se despedir de Dante é visível, mas a contragosto ele
se despede.
— Vamos? — Ele me observa, mas calmo.
— Sim. — Respiro profundamente.
Repentinamente um grande sorriso surge nos lábios de Dante e seus
olhos desejosos encaram meu corpo com volúpia.
— Gosto dessa obediência — sussurra próximo ao meu ouvido.
Essas palavras, nesse timbre de voz, faz meu corpo responder a sua
investida instantaneamente, um calafrio se instala em meu ventre e procuro
ignorar essas sensações que a muito tempo deveriam estar mortas dentro de
mim.
— Senhor Voyaller, você está muito abusado ultimamente. Acredito que
deve se colocar no seu lugar. — Passo a mão por seu peito subindo até seu
pescoço onde roço minhas unhas ali.
Seus olhos azuis queimam em desejo e seus lábios se abrem para me
responder, mas coloco meu dedo sobre seus lábios o calando. Em seguida
caminho em direção a saída o deixando para trás. Não demora nada e sua mão
está na base da minha coluna me guiando até a saída.

O caminho até a mansão é feito em um silencio constrangedor e maçante,


afinal os olhos vorazes de Dante não saem do meu corpo.
Ele me devora sem se importar em esconder qualquer resquício de desejo
e infelizmente meu corpo traidor responde àqueles olhares me enviando
sensações das quais não quero sentir por todo o meu corpo.
Procuro não focar minha atenção no homem a minha frente e me
concentrar na janela ao meu lado, mas é praticamente impossível.
A presença marcante e maçante de Dante jamais permitirá algo assim.
Ele não diz nada, apenas continua a me observar e sem pudor algum deixa suas
pernas entreabertas exibindo o volume de sua calça.
Eu deveria odiá-lo ainda mais nesse exato momento, mas a verdade é
que, apesar de querer sentir o seu sangue escorre entre minhas mãos sinto sua
falta, entretanto não posso deixar esses sentimentos baixos dominarem meus
pensamentos tirando meu verdadeiro foco.
Assim que a limusine para em frente a mansão saio o mais rápido que
posso e sigo para o quarto me sentando sobre a cama, retiro meus sapatos
sentindo um grande alívio ao ter meus pés livre.
Respiro profundamente tentando acalmar os hormônios que acabaram se
aflorando em meu corpo, mas acabo por ter um sobressalto ao ouvir a porta do
quarto se abrir em um baque.
Dante não diz nada, apenas observa minhas reações com atenção e o
sorriso sacana em seu rosto me faz semicerrar os olhos. Para evitar qualquer
discussão sigo para o banheiro a fim de tomar um banho relaxante e acalmar
meus músculos cansados além de aquietar os desejos estranhos que se instalam
em meu ventre.
Retiro meu vestido deixando-o dobrado sobre a pia, solto meu cabelo e
sem demora entro embaixo do jato de água quente. Deixo que a água limpe todo
o meu corpo relaxando cada pedacinho de pele.
Encosto minhas mãos sobre a parede e água morna escorrer pelos meus
cabelos até o chão, quando vejo já me perdi em meus pensamentos sobre o
passado sentindo o peso da culpa cair sobre os meus ombros, mas o misto de
desejo confunde minha mente me deixando atordoada.
Tenho um sobressalto quando a porta do box se abre e sei que Dante está
atrás de mim. Ainda de costas evito encará-lo.
— O mínimo que esperava era privacidade. Invadir meu banho é de mais
senhor Voyaller — falo ironicamente.
— Você quebrou várias ordens em uma única noite Dana. Meninas más
merecem castigos severos. — Sua voz rouca e cheia de promessas faz meu corpo
estremecer.
Uma estranha onda de prazer passa pelo meu corpo e aquela famosa
ardência insiste em se instalar entre minhas pernas, mas resisto a qualquer
mínimo desejo que passe pela minha mente.
— Saia — falo bruscamente. — Pense em fazer algo quando estivermos
com roupas.
Dante aproveita minhas mãos espalmadas sobre a parede para prendê-las
acima da minha cabeça. Nem mesmo tento me soltar apenas permaneço parada
sentindo seu corpo se encosta no meu. Ele ainda está de roupa e sua camisa fica
encharcada pela água que escorre entre nós fazendo o pano se grudar em minhas
costas.
— Nunca esperei isso de você. Sempre soube que respeita mulheres e
procura se afastar delas, entrar em meu banho e me prender contra a parede já é
demais. — Me prende pelos pulsos respirando profundamente.
— Você me provocou a noite toda e agora será minha. Você não deve
deixar ninguém lhe tocar além de mim — sussurra as palavras em meu ouvido
enquanto uma de suas mãos desce para o meu seio o apertando entre os dedos.
Com uma calma pressionando meu mamilo os massageando.
— Você não comanda minha vida, quem toca em mim ou deixa de tocar
sou quem decido. — Em um movimento rápido solto minhas mãos do seu aperto
me virando de frente para ele.
Seus cabelos negros e molhados estão grudados em sua testa, seus
intensos olhos azuis não escondem o desejo e a satisfação de observar meu corpo
nu. A camisa branca molhada marca cada pedacinho dos seus músculos muito
bem definidos.
Antes que eu possa reagir Dante segura minhas duas mãos com força me
prendendo contra a parede ao lado, sua perna esquerda se encaixa entre minhas
penas pernas pressionando minha intimidade com sua coxa impedindo qualquer
ataque que eu pudesse usar.
— Eu decido, eu mando, eu controlo, eu faço, eu sou o único que pode
aqui Dana. Pare de resistir, eu jamais me aproximaria de você se soubesse que
não quer meus toques, mas seu corpo não quer que eu te solte, então se entregue
— sussurra próximo ao meu ouvido roçando sua barba por fazer em meu
pescoço.
— Vá se foder. — Ameaço de lhe dar uma cabeçada, mas ele envolve sua
mão livre em meu pescoço contornando minha pele com o polegar suavemente.
— Errado. — Sobe sua mão ousada pela parte interna da minha coxa até
próximo a minha intimidade. — Eu vou te foder! — sussurra e antes que eu
tenha tempo de reagir as suas investidas, seus lábios se grudam aos meus.
Tento resistir, mas a verdade é que meu corpo quer se entregar a ele e por
mais que eu lute contra os meus desejos e vontades acabo por corresponder seu
beijo deixando sua língua adentrar minha boca em um beijo quente e intenso.
É tão estranho esse sentimento de ódio e desejo que se mescla em meu
peito ao mesmo tempo. As coisas não deveriam ser assim, mas neste momento
não estou me importando com nossas diferenças, apenas com a química que
nossos corpos exalam um pelo outro.
Subo minhas mãos pela sua blusa molhada até chegar em seus cabelos o
puxando com força suficiente para ouvi-lo gemer. Seus dedos ousados acariciam
entre minhas pernas me fazendo suspirar.
Seus olhos azuis analisam meu corpo o admirando e a intensidade do seu
olhar me deixa envergonhada. Somente ele me deixa assim, somente ele me leva
a loucura. Essa é uma triste verdade que sempre quis reprimir, mas agora, agora
eu só quero me entregar mesmo que minha mente lute contra o que é certo e o
que é errado.
Desço minhas mãos dos seus cabelos para o seu pescoço arranhando
aquele local até chegar em seu peito e sem pudor algum começo a desabotoar
sua camisa rebolando meu quadril em seus dedos. Jogo sua blusa de lado e
arrasto minhas unhas sobre seu abdômen bem definido vendo-o se contrair.
Seus olhos intensos observavam meus movimentos atentamente sem
deixar nenhum detalhe para trás e repentinamente suas mãos sobem pela lateral
da minha coxa me deixando frustrada.
— Acredito que você deva terminar o que começou, ou suas promessas
são sempre vazias? — Instigada em desafiá-lo, acabo o provocando além do que
deveria.
Aquelas palavras acendem uma chama diferente em seus olhos e agora
eles estão nublados de desejo mostrando toda a sua determinação. Suas mãos se
apertam em minha cintura e antes que eu posso dizer algo ele segura meu corpo
fazendo com que eu cruze as pernas em sua cintura.
— Você fala demais. — Seu tom de repreensão me faz rir.
Dante desliga o chuveiro rapidamente e me leva para o quarto entre
beijos e mordidas. Sem se importar com nossos corpos molhados ele me coloca
deitada sobre a cama aproveitando para deixar suas roupas de lado.
Seus olhos cintilam sobre meu corpo em pura luxuria e sem pensar duas
vezes sobe sobre a cama beijando a lateral da minha coxa até a minha
intimidade. Seus lábios se fecham em meu clitóris o chupando com intensidade.
Solto o ar pela boca em uma lufada de ar me contorcendo ao sentir o
prazer vibrar em meu interior. Dante não pega leva, muito pelo contrário ele está
sedento e sem piedade, me arrancando gemidos ao brincar com essa parte
sensível do meu corpo.
Agarro seus cabelos com força sentindo todo o prazer se acumular em
meu ventre, seus dedos ousados brincam em minha entrada e sem esperar
qualquer protesto penetra brincando em meu interior e é exatamente isso que eu
preciso para me entregar completamente a ele gozando em seus lábios.
Sinto meu corpo pulsar e meu sangue correr rapidamente em minhas
veias. Em vez de Dante parar, ele se vê ainda mais instigado em me enlouquecer.
Seus lábios agora sobem por minha barriga deixando pequenas mordidinhas por
aquele local até chegar em meus lábios.
— Por que tão parecida com ela? — Ele roça seu membro rijo em minha
entrada observando meus olhos.
Estou tão absorta nas sensações que me corpo recebe que nem mesmo
presto atenção em suas palavras.
— Você me enlouquece — murmura e sem pensar muito me penetra
entrando em meu interior com uma calma absurda.
Gemo apertando minhas unhas em suas costas sentindo-o deslizar por
meu interior se acomodando nesse espaço. Subo minhas mãos por seus braços
até chegar em seus cabelos.
Movo meu quadril querendo que ele intensifique seus movimentos e ele
grunhe em reposta ao nosso corpo suado e molhado que se mistura um no outro.
Passo minhas mãos pelo seu corpo sentindo todos os seus músculos com
as pontas dos dedos explorando cada parte dos seus músculos saltados.
Seus movimentos se tornam cada vez mais intensos me penetrando
profundamente me arranca gemidos de puro prazer.
Dante acaba sendo um pouco mais bruto do que eu esperava, mas posso
perceber que assim como eu, ele deixa seus sentimentos tomar contar dos seus
movimentos, e querendo ou não nossos corpos se conhecem e se conectam como
eu jamais poderia esperar.
Mesmo com nossas desavenças e a minha sede de vingança nossos
corpos pedem e clamam um pelo outro. Isso pode ser estranho eu sei, mas
consigo explicar essa conexão.
Os espasmos retornam e minha intimidade se contrai, todo o meu corpo
estremece e explodo em um intenso orgasmo que me arranca gemidos altos.
Com mais algumas investidas Dante retira seu membro do meu interior
gozando em minha perna. Ofegante e cansado ele acaba deitando seu corpo
pesado sobre o meu.
Nossas respirações ofegantes demoram para voltar ao normal. Ele se
deitada ao meu lado e suas mãos fortes me puxam protetoramente contra seu
corpo e acabo por me encaixar perfeitamente em seus braços de uma maneira
que não me agrada e não me satisfaz.
Eu não queria aproximação, muito menos esperanças de algo que não
dará certo. Eu na verdade quero distância, muita distância desse homem que me
leva a loucura e ao mesmo tempo me joga no abismo.
Dante me enlouque e coloca em prova tudo aquilo que acredito e que
custei a construir e conquistar, eu não posso colocar tudo a perder por mero
desejo e satisfação, mas sei que depois dessa noite nós estaremos mais próximos
e talvez assim consiga arrancar informações preciosas para mim.
Meus olhos pesados e cansados acabam entorpecendo meus sentidos e
naquele momento o cheiro de sexo e perfume caro invade minhas narinas me
deixando inebriada e, por mais que eu lute para não me entregar, acabo
adormecendo em seus braços com o rosto encostado em seu peito.
Acordo com a luz do sol batendo em meu rosto. Resmungo me
espreguiçando e sinto braços fortes envolverem meu corpo de uma forma
possessiva e dominante.
Me sinto sufocada com seu aperto e mais uma vez me remexo tentando
me livrar dos seus braços fortes e automaticamente Dante acaba me soltado do
seu aperto.
Respiro profundamente passando as mãos sobre os olhos e quando a
realidade começa a bater, a frustração de saber que cedi aos meus desejos em vez
da razão me deixam completamente indignada.
O que estou pensando? Respiro profundamente querendo socar alguém.
O que estou fazendo? Com raiva de mim mesma tento me levantar, mas
as mãos de Dante ainda me impediam.
Com certa raiva tento empurrá-lo sem encostar em nenhuma das suas
cicatrizes que lhe causam reações adversas, mas sua única reação é se remexe
deixando seu peito nu, suas cicatrizes e tatuagens a mostra.
Mordo os lábios fortemente e sinto meu coração perder algumas batidas
ao observar uma de suas tatuagens que não havia visto antes.
Embaixo da sua tatuagem de dragão envolto aos números 371 do lado
esquerdo do seu peito, há em sua costela em belíssimas letras itálicas meu nome
tatuado Eva Becker.
Um nó se forma em minha garganta como se eu tivesse acabado de levar
um soco na boca do estômago. Aquela tatuagem não deveria existir, nada disso
deveria existir. Passo levemente meu dedo sobre a letra itálica bem desenhada e
ele resmunga algo se virando novamente impedindo que lhe toque.
Muitas tatuagens. Muitas cicatrizes encobertas por tatuagens. Muitas
marcas de um passado sofrido e doloroso. Um homem tão jovem com o corpo
carregado de história. Ele nem mesmo parece ter a idade que tem.
Suspiro apoiando as mãos em minha cabeça. Eu quero saber tudo o que
aconteceu, quero saber toda a verdade e acabar com essa dor que dilacera meu
peito constantemente.
Meus olhos se enchem de lágrimas e a incerteza, raiva, desespero e
diversos sentimentos confusos se instalam em meu peito me deixando confusa e
atordoada.
O que farei agora? Essa é mais uma das muitas perguntas sem respostas
que pairam em minha mente.
Me levanto com uma imensa dor no peito e uma raiva incondicional.
Caminho em direção ao banheiro e fico por lá incontáveis minutos tentando
apagar seu cheiro do meu corpo, mas as marcas dos seus lábios sob minha pele
ficarão ali por dias e eu sei que isso foi proposital.
Minha sede de vingança cresce e quando menos espero quero vê-lo sofrer
e pagar por seus erros, mas todas às vezes que as tatuagens voltam em meus
pensamentos sinto uma forte vontade de chorar querendo acreditar que tudo o
que aconteceu não foi culpa dele, mas não há possibilidade disso acontecer,
afinal vi com meus próprios olhos ele arrancar a vida das pessoas que mais amei.
Me forço a engolir esses sentimentos fracos e indesejados saindo do banho
irritada comigo mesmo por acreditar que tudo poderia ser diferente.
A escuridão faz parte de Dante e nada será diferente não importa quanto
tempo passe ou as ilusões que minha mente crie.
Ao sair do banho Dante já não está mais na cama e eu sinceramente
agradeço por isso, pois não sei como encará-lo. Todos os meus pensamentos
estão desordenados e ficar ao seu lado agora não seria a melhor opção, pois
colocaria o pouco de confiança que ganhei com ele em prova, afinal meu
orgulho sempre vence minhas razões.
Eu preciso de um tempo sozinha e esse tempo será necessário para tentar
colocar todas as minhas dúvidas em ordem. Caminho até o closet para pegar uma
de suas roupas emprestadas e me surpreendo ao ver as roupas dívidas em dois
grupos.
Sim, realmente me surpreendi ao ver seus ternos alinhados em um lado e
uma variedade de roupas femininas do outro.
Quando digo uma variedade realmente não é um exagero, pois a pessoa
que escolheu as roupas além de ter bom gosto optou por vários estilos diferentes
e eu gosto disso, pois assim posso montar as peças de acordo com a minha
vontade.
Mesmo sabendo que ficaria trancada nesse quarto escolho uma calça
skinny jeans preta rasgada na perna e uma blusa cavada cinza com um
casaquinho preto por cima. Apesar dos dias estarem mais quentes o vento suave
sempre traz um pouco de frio. Para completar o look opto por um coturno de
couro preto que combina com minha roupa.
Sempre opto por roupas que não limitem meus movimentos, pois nunca
sabemos o que pode acontecer e quando será necessário usar a força, ainda mais
em uma casa como essas que todos em minha volta parecem suspeitos.
Jack tem razão, se você dançar nos jogos de Dante da maneira que ele
quer e propõe, ele cederá aos seus pedidos como um bondoso homem.
Respiro profundamente me espreguiçando, mas um pequeno bilhete
sobre a cama chama a minha atenção. Seguro o pequeno papel entre os dedos
observando aquela caligrafia mal feita e desajeitada. Passo o polegar sobre sua
letra desleixada e por um momento admiro sua caligrafia sentindo falta das suas
cartas escritas a mão. Procuro forçar meus olhos focar nas letras e ler o que está
escrito ali em vez de deixar o passado dominar meus pensamentos.

“Saia, mas lembre-se tripliquei a segurança.”

Como sempre gentil como um verdadeiro dragão, reviro os olhos


jogando o bilhete sobre a cama. Mal sabe ele que estou aqui porque quero e não
porque ele ordena. Já não fugiria dessa mansão mesmo que sua segurança fosse
falha. Ainda tenho muito o que descobrir.
Prendo meu cabelo em um coque bagunçado e resolvo explorar a casa, já
que não me lembro do seu interior como clareza. Quando vou dar um passo em
direção a porta ela se abre lentamente. Cruzo os braços esperando Jack ou Dante,
mas meus olhos se arregalam ao ver Teresa.
Não acredito que Teresa ainda trabalha para a família Voyaller. Dante
afirmou que só havia homens nesta casa.
Meu coração se acelera ao vê-la carregar uma bandeja cheia de comida e
ao fechar a porta e erguer seu olhar em minha direção a mesma paralisa me
encarando assustada.
Seu grito de horror me faz ter um sobressalto e automaticamente ela solta
a bandeja colocando as mãos sobre a boca. A comida e o copo se espalham pelo
chão e ela se abaixa correndo recolhendo os cacos. Assustada e desesperada
tento me aproximar dela para ajudá-la, mas mais uma vez ela grita fazendo meu
coração bater mais forte. Desse jeito ela vai chamar a atenção da casa toda para
nós.
Ao me aproximar mesmo com seus protestos escuto ela orar baixinho
pedindo proteção para Deus.
— Teresa pelo amor de Deus, pare de gritar e me deixe explicar. — Me
ajoelho ao seu lado ajudando-a a recolher os cacos.
— Você está morta. — Ela olha para mim assustada. — Estou vendo
fantasmas meu Deus. — Balança a cabeça afastando os pensamentos. — Não
estou vendo nada, não estou vendo nada. — Repete essa frase como um mantra
sagrado.
— Eu estou viva Teresa, mas você precisa me escutar. — Encosto minha
mão em seu ombro e ela acaba cortando a mão com um caco de vidro do copo
que havia se quebrado.
Retiro os cacos de sua mão observando o corte que apesar de superficial
sangrava bastante. Teresa puxa sua mão em direção ao seu peito erguendo seus
lindos olhos castanhos para mim.
— Teresa me escuta e pare de gritar. Dante e Donatel mataram meus pais,
foram eles os causadores da chacina da família Becker, mas por incrível que
pareça Dante errou o tiro que acertou meu peito propositalmente. Eu vi Teresa,
vi com meus próprios olhos. Você não pode falar nada para Dante, pois ele ainda
acredita que estou morta. Eu preciso descobrir a verdade por trás daquela noite,
tem muitas coisas que não foram explicadas. — Tento convencê-la.
— Eu não acredito. Meu menino sempre te amou. Ele sofre com sua
morte até hoje. Jamais faria algo assim. — Ela nega veementemente com a
cabeça.
— Mas ele fez Tereza, e eu sou a prova disso. Somente eu sei a verdade,
você precisa deixar eu me explicar. — Sou interrompida por um solavanco na
porta.
Os gêmeos Royal e Max me encaram com um olhar assustador e ao ver o
sangue nas roupas de Teresa, Royal muda sua expressão imediatamente e sem
pensar duas vezes ele me ataca com tudo o que tem.
Em um movimento rápido me coloco em pé defendo seu soco com meu
braço direito, mas acabo cortando a mão com o vidro do copo que segurava entre
os dedos. Antes que eu possa me recuperar do seu soco ele desfere uma
sequência de chutes atingindo minha costela, aproveito esse momento para
travar meu braço em sua perna imobilizando seus movimentos de perna.
Royal é um homem forte, bruto e não economiza sua força ao defender
aqueles que ama, sendo assim empurro sua perna fazendo com que ele se
desequilibre e aproveito o momento para fechar meu punho fortemente
encaixando perfeitamente um soco do lado esquerdo da sua costela seguido de
um chute, mas Royal trava sua perna esquerda no chão e para meu chute sem
muita dificuldade.
Seus olhos estão imersos em escuridão e ele me encara como seu único
inimigo. Pronta para atacá-lo novamente ameaço de lhe dar outro chute e quando
ele ergue sua defesa giro meu corpo encaixando meu punho em seu queixo,
porém suas mãos pesadas seguram meu punho me lançando contra a parede ao
lado e desajeitadamente bato minhas costas contra o concreto fazendo o ar dos
meus pulmões sair em uma lufada.
— Parem — Teresa grita e apoio minha mão na costela sentindo os
efeitos do seu primeiro chute.
Max entra na frente do irmão que parece extremamente nervoso e irritado
por ser impedido de continuar.
— Mas que merda toda é essa? — Jack aparece sem camisa na porta do
quarto sonolento com os cabelos bagunçados.
Lanço um olha de suplica a Teresa e ela desvia seu olhar do meu.
— Me solta droga. — Royal puxa os braços do aperto do irmão.
— Pare Royal, ela não fez nada só estava me ajudando, tropecei no
tapete da porta derrubando tudo no chão e quando fui pegar os cacos me cortei
— Teresa tenta explicar desajeitadamente.
— O que foi aquele grito agora pouco? — Max pergunta desconfiado.
— Me assustei ao cair — ela esclarece convincentemente.
— Já avisei a Dante para remover os tapetes da casa, Teresa já não é mais
jovem para ficar andando por aí com essa variedade de tapetes caros enfeitando
cada espaço vazio, infernos. — Royal se vira bruscamente empurrando Max que
estava ao seu lado saindo do quarto.
— Se você me chamar de velha mais uma vez vai tomar umas belas
palpadas mesmo depois de grande — Teresa retruca irritada.
Teresa sempre foi uma mãe para mim e para Dante. Ela cuidou e nos
mimou diversas vezes, mas eu não entendo porque todas às vezes que vim nesta
casa nunca havia visto os irmãos de Dante. Ele nunca comentou sobre nenhum
deles e isso me intriga.
Ergo minha postura ignorando o latejar insistente em minha costela,
minha mão sangra bastante devido ao corte, mas não demonstro dor em minhas
expressões, muito menos fraqueza, pois aprendi que jamais devemos mostrar
nossos pontos fracos para outros oponentes.
Por mais que segurei o chute de Royal não consegui parar toda a sua
força por ter me levantado repentinamente e desajeitadamente. Ele veio para
cima de mim com a intenção de me machucar e por pouco não ganhei algumas
costelas trincadas.
— Você está bem? — Max se aproxima preocupado.
— Sim. — Afasto sua mão que tenta se apoiar em meu ombro.
Jack caminha até mim com uma expressão irritada e sem minha
permissão segura minha mão com força mostrando o corte profundo.
— Ela parece bem para você? Royal é sempre inconsequente agindo por
impulso, você sabe que Dante vai descontar sua raiva em nós, por causa disso
vamos trabalhar cinco vezes mais essa semana. — Sua irritação aumenta ao
dizer isso.
— Estou bem Jack. — Puxo minha mão de volta querendo ficar sozinha.
— Deixem que eu cuido do dela, limpem essa bagunça. Royal agiu assim
para me defender. — Teresa se aproxima preocupada.
Max e Jack começam a limpar o chão enquanto Teresa olha o meu corte.
Foi um corte profundo devido a intensidade do soco de Royal, por me defender
não consegui soltar o caco a tempo.
— Estou bem Teresa. — Puxo minha mão de volta querendo ficar
sozinha.
Ela me lança um olhar triste soltando apoiando a mão em meu braço.
— O que está acontecendo aqui? Te deixo solta por alguns minutos e
quando chego a casa está destruída? — Os olhos flamejantes de Dante varrem o
local irritados.
Jack e Max terminam seu serviço de limpeza recolhendo o tapete que
levava a maior parte dos alimentos e antes que sejam incumbidos de mais
alguma tarefa somem da vista de Dante sem olhar para trás.
Suspiro cansada por todos acreditarem que sou o motivo de toda a
bagunça e desordem que acontece na casa.
Bom, indiretamente sou, mas diretamente não.
Teresa ignora Dante ainda olhando minha mão que não parava de
sangrar.
— Com licença. — Sorrio agradecendo sua preocupação e com um olhar
suplico a ela que não conste nada.
— Não se preocupe — ela sussurra sorrindo gentilmente, pois sei que
Teresa não falará nada antes de me escutar, afinal assim como eu ela conhece
bem Donatel.
Me viro para ir ao banheiro e quando dou o primeiro passo sinto uma
forte pontada na costela que me faz estremecer e perder a compostura, os olhos
de Dante me analisam minuciosamente e disfarçadamente recomponho a postura
caminhando em direção ao banheiro.
Fecho a porta atrás de mim me encostando nela e somente agora posso
apoiar a mão na costela. Minha respiração ofegante faz as batidas do meu
coração se acelerar e com um gemido de dor retiro minha blusa ficando apenas
de sutiã. Ainda encostada na porta examino minha costela a apalpando com
calma e a cada toque me faz tremer.
Respiro aliviada ao ver que não quebrou, mas aquela brincadeira me
renderá um roxo estampado em diversos tons. Me forço a caminhar até a pia
deixando a água corrente lavar o sangue que escorre da minha mão, abro as
gavetas a procura de algum curativo, mas encontro apenas algumas toalhas que
uso para estancar o sangue.
A porta se abre em um solavanco revelado através do espelho olhos azuis
preocupados e questionadores.
— Deveria bater ante de entrar Sr. Voyaller — falo com ironia.
Meu humor não está dos melhores e a dor não colabora com meu bom
estado de espírito.
— Hoje eu sou Sr. Voyaller? — ele pergunta com ironia.
— Sim, pode se retirar — falo com grosseria.
— Me poupe da sua ironia Dana. — Ele entra no banheiro e puxa minha
mão com força retirando o pano para observar o corte, mas sua indelicadeza faz
com que eu force minha costela e mesmo reprimindo um gemido de dor não
consigo disfarçar minha expressão.
— Você deve ter no mínimo umas duas costelas trincada. — Ele acaba
ignorando o corte e ergue meu braço para observar o local.
— Não estão trincadas, só estão sensíveis e você fica me virando como
se fosse uma boneca de pano. — Puxo meu braço e me arrependo
imediatamente.
— Calada — ordena rudemente.
Dante me puxa até a quarto me obrigando a sentar sobre a cama sem
muita delicadeza.
— O que está fazendo? — Respiro profundamente sem muita paciência
enquanto o observo revirar as gavetas.
— Deixei claro que Royal não é como os outros, mesmo assim você
conseguiu tirá-lo do sério, claro só tinha que ser você. — Ele puxa uma caixinha
de primeiros socorros de uma das gavetas.
— -Não era para você estar trabalhando ou cuidando das empresas da
família? Caçando algum bandido que tentou invadir seu território ou tentou
roubar uma de suas cargas preciosas de drogas, armas, bombas nucleares ou
plutônio super radioativo que mataria toda a humanidade em minutos se caísse
em mãos erradas? — O encaro sem entender.
— Para sua informação eu havia acabado de chegar de uma importante
reunião quando encontrei Royal com uma marca arroxeada no queixo. O que
sejamos sinceros, não é normal acontecer, afinal ele é o melhor lutador desta
casa e ninguém cai na besteira de enfrentá-lo de frente a não ser a novata da
casa. — Respira profundamente. — E de acordo com você sou um mafioso e não
um cientista louco que colocaria a vida da humanidade em perigo ou até mesmo
criaria super heróis com minha carga de plutônio extra radioativa. — Ele ri
debochadamente pegando o antisséptico de dentro da caixa.
A muitos anos não via um sorriso tão sincero vindo dele, um sorriso
verdadeiro e cheio de alegria. Dante ainda me olha com uma expressão divertida
me fazendo corar.
Ainda me lembro da época em que esse sorriso deixou os seus lábios, nós
tínhamos em torno de sete anos e apesar de não me lembrar de muitas coisas
dessa época, a falta do seu lindo sorriso que preenchia seus lábios e minha alma
me marcou profundamente e para ser sincera, não é bom ver esse lado brincalhão
vindo à tona assim.
— Talvez você queira explorar outros mundos. — Dou de ombros
envergonhada.
— O que fazemos já dá trabalho de mais, mas pensarei em desviar
algumas cargas de plutônio por aí, se isso existir. — Ele tira saro da minha cara.
Envergonhada o ignoro.
Como vou saber o que ele rouba? E quando menos espero ele passa o
antisséptico em meu machucado me fazendo ver estrelinhas.
— Ai droga, seu idiota isso arde. — Puxo minha mão a assoprando.
— Eu estou desinfetando e você está jogando milhões de bactérias de
volta, para quieta e me dá essa mão. Eu deveria chamar um médico, você com
certeza você levará belos pontos sua idiota. — Ele passa mais antisséptico sem
piedade.
Tento me manter quieta mais além da ardência e ele me irrita. Depois de
enfaixar minha mão ele cuidadosamente passa uma pomada na minha costela.
— Por ser um temido Dragão de Veneza e comandar a maior máfia da
Itália, você é bem gentil — as palavras acabam escapando dos meus lábios
enquanto o observava despreocupada.
Ele ergue uma de suas sobrancelhas me encarando com uma expressão
engraçada e surpresa.
— Posso ser um filho da puta a maior parte do tempo, mas sei ser gentil
Dana. Às vezes ajo mais pela emoção do que pela razão, mas sei reconhecer
meus erros. Tenho que levar três idiotas descabeçados nas costas e manter todo o
negócio da família. Não nego que gosto de atirar em pessoas e vê-las tombar
também não nego que gosto de torturá-los até que confessem e entreguem seus
chefes ou os seus segredos mais obscuros, mas só faço isso quando é necessário
e não faço isso com pessoas da família. Você querendo ou não faz parte da
família agora, faz parte da minha máfia, afinal você está na minha casa, sendo
assim você é uma das minhas responsabilidades e uma das pesadas por sinal. —
Suas palavras me deixam tão surpresas que fico sem saber o que dizer ou até
mesmo o que fazer.
Assinto para ele que continua a fazer os curativos e ainda ajoelhado a
minha frente ele enrola uma faixa na minha costela para que a pomada pudesse
fazer efeito.
Suas ações e palavras me deixam completamente perdida e confusa.
Por que ele tem que ser tão gentil comigo?
— Por que você é assim Dante? Por que você não deixa ninguém se
aproximar? Por que me mantem aqui e me faz parte da sua família? — as
palavras pulam da minha boca sem freios.
Preciso descobrir toda a verdade, me livrar desse buraco negro que
consome o meu peito diariamente, me libertar dele e de todos os sentimentos que
carrego. Preciso ficar distante deste homem, pois cada dia que se passa me vejo
mais presa e amarrada a ele.
DANTE

As perguntas de Dana me deixam pensativo, por mais que me negue a


aceitar ela simplesmente é uma cópia exata de Eva e abrir mão dela seria a
mesma coisa que deixar mais uma vez a mulher da minha vida escapar pelos
meus dedos.
Na noite anterior os seus gemidos me fizeram perder completamente o
controle e a forma como meu nome soa de seus lábios faz meu peito se rasgar. É
como se várias facas fossem cravadas em meu peito a todo instante, me matando
aos poucos, me engolindo e me consumindo.
Talvez essa seja a melhor maneira de pagar pelos meus pecados.
Morrendo aos poucos, diariamente e constantemente por uma dor sem fim que
me consome de dentro para fora.
Manter Dana por perto não é para aliviar meu fardo, muito pelo contrário
é para que ele se torne ainda maior. É uma forma de castigo para mim, para que
todos os dias me lembre do que fiz e do que perdi. Para que todos os dias eu
sinta na pele o inferno que é a minha vida e saiba o quão real e doloroso é viver
sem Eva.
— Não importa o que eu diga você jamais entenderia. — Evito olhar seus
olhos castanhos esverdeados que tanto me seduzem e me enlouquecem.
— Talvez eu possa lhe ajudar, afinal eu sei que algo lhe machuca
diariamente, isso é visível. — Ela passa as mãos pelos meus cabelos os
acariciando e automaticamente fecho os olhos deitando a cabeça em direção aos
seus toques, pois a muito tempo não sinto está sensação de afeto, carinho e paz.
Ivi... Minha mente e meu corpo gritam chamando por ela e a dor em meu
peito cresce, o aperto em me sufoca e o desespero me domina, mas por alguns
segundos me permito receber as carícias de suas delicadas mãos em meus
cabelos ignorando o mar de sentimentos que invadia minha alma.
— Você não tem que carregar o mundo sozinho Dante, apesar de ser um
homem com um poder absurdo sobre os ombros, ainda é um humano. Não seja
tão sombrio, os poucos dias que estive aqui vi que o passado consome não só
você como os seus irmãos — ela insiste.
Seguro sua mão fazendo com que ela pare com aquelas carícias e
inconscientemente analiso seu rosto, seus olhos e seus lábios. Meu corpo
estremece e grita dizendo que Dana Trion na verdade é Eva Becker, mas minha
mente sabe que isso é uma ilusão criada pelo desespero de tê-la de volta.
— Não posso te contar nada Dana. O homem que chamo de pai te caçaria
e mataria não somente a você, mas todos a sua volta. Nem mesmo de baixo do
meu poder você estaria segura daquele homem. Não quero correr o risco de te
perder também. — Me levanto tocando o seu rosto com suavidade.
Donatel é um dos piores homens que se pode existir, ele não tem amor
por ninguém e sua vida é regada de ódio e morte. Para ele nada é mais
importante do que o dinheiro e o poder. Sinto nojo de ser filho de homem desses,
mas agradeço por ele ter me tornado tão forte quanto ele.
Ele criou demônios que ceifam vidas e chegará o dia em que o matarei
com minhas próprias mãos.
— Não tenho medo Dante. Me conte quem você perdeu que o deixa tão
inquieto. — Ela me observa curiosa.
— Perdi alguém muito importante, mas isso não vem ao caso. Donatel
está viajando e cedo ou tarde ele voltará, você precisa manter distância dele —
digo em um tom sério evitando possíveis discussões e perguntas.
— Vou manter. — Sua pequena hesitação me faz crer que ela está
mentindo.
— Dana ele passou os negócios da família para mim a mais de um ano e
depois disso simplesmente sumiu, mas descobri que ele foi fazer uma visita para
Dimitri na Rússia, Edgar na Alemanha e Dom Pierre no México. Donatel não
brinca em serviço Dana, ele foi renovar contratos e com isso colocou nossas
vidas de cabeça para baixo, mais precisamente a vida de Jack. Quero que por
uma única vez você me escute e não se aproxime dele — falo irritado.
Ele só foi na Alemanha para vender a vida de Jack a Edgar como noivo
da sua filha mais nova, sendo assim Edgar não para de me ligar esperando uma
resposta concreta vinda do meu irmão. O único problema é que não sei porque
ele espera uma resposta sabendo que de qualquer maneira Jack será obrigado a
se casar, afinal, se eu me negar a aceitar entraremos em guerra com a Alemanha,
pois quebraremos um contrato direto.
Donatel só pensa em dinheiro e poder e não nego que o casamento de
Jack com essa jovem estenderá nossos horizontes até a Alemanha, mas simples,
acho um absurdo forçar meu próprio irmão a se casar para ganhar mais poder. Só
espero que ele não tenha ido até a Rússia e ao México para oferecer a mão de
Max e Royal.
Jack é mais maleável se comparado a nossos dois irmãos do meio. Max e
Royal tem personalidade forte, são dois gêmeos cabeça dura e explosivos.
Apesar de Max parecer mais calma perante Royal, sua personalidade gritante
não o coloca atrás do próprio irmão.
— Por que me mantém aqui? Você nem ao menos me deixa participar.
Você sabe que tenho capacidade suficiente de te ajudar Dante, mas você prefere
me trancar a sete chaves do que me deixar lutar. — Seu olhar triste me faz
suspirar.
— Ainda não confio totalmente em você para lhe contar coisas tão sérias,
mas se quer ajudar vou lhe pedir um favor — digo a observando.
— Sei que não confia em mim, mas acredito que já percebeu que não vou
fugir. Não é porque tenho medo de você ou porque não conseguiria passar pelos
seus homens, é porque decide que te ajudarei e até não saber toda a verdade por
trás dessas incontáveis cicatrizes em seu corpo não vou ir embora, nem mesmo
se você me expulsar. — Ela cruza os braços com uma expressão pouco
amigável. — Eu cheguei aqui em busca de um propósito, encontrar o causador
da morte dos meus pais, porém ao conhecer você e seus irmãos esses propósitos
acabaram se desviando um pouco. — Ela soa mais calma e cheia de compaixão,
como se pudesse arrancar o fardo que levamos de nossas costas.
— Onde estava com a cabeça quando te deixei ficar? — Penso alto e ela
me lança um olhar furioso. — Se quer saber das minhas cicatrizes eu posso
passar horas te contando sobre elas, mas cada história terá uma consequência. —
Sorrio maliciosamente e vejo seu rosto corar.
— Você é um idiota. Fale logo o que quer eu faça. — Ela se levanta
vestindo sua blusa com certa dificuldade devido a dor na costela.
— Por incrível que pareça Jack gosta de você e te escuta e nosso pai só
foi para Alemanha para vender Jack como noivo da filha mais nova de Edgar.
— Ela arregala os olhos surpresa.
— Você está forçando-o a se casar? Não quero fazer parte disso, nem
adianta me pedir para entregar a notícia. Ele é o único que não tentou me matar
ainda, Max também não, mas não confio nele. — Ela dá de ombros caminhando
de um lado para o outro impaciente.
— Não me acuse tão abertamente, desta vez eu não tenho culpa alguma.
Donatel não pensa nas consequências, só pensa no poder que vai ganhar quando
isso acontecer. — Suspiro pesadamente.
— Acho completamente injusto forçar Jack a se casar com alguém que
ele não ama — afirma de braços cruzados.
— Eu sei Dana, concordo com o seu modo de pensar, mas não posso
quebrar um contrato feito e assinado diretamente pelo meu pai. Edgar quer uma
resposta direta vinda de Jack, ele quer o consentimento do noivo e a resposta
precisa ser sim. Não posso negar e ir contra o contrato, porém, Jack jamais
aceitará esse absurdo e por mais que eu tente adiar essa conversa não vou
conseguir segurar por muito tempo. — Passo as mãos nos cabelos exasperado.
— Quando isso acontecer ele ficará extremamente furioso e acredito que você
conseguiria segurá-lo e convencê-lo a pelo menos tentar. — Vejo sua expressão
de raiva mudar para dúvida e incerteza.
— Isso vai muito além das minhas capacidades, mas tentarei ajudar.
Entretanto deixo bem claro que isso é um extremo absurdo e que tenho uma
enorme vontade de esbofetear a cara do seu pai — o tom de raiva expresso em
sua voz indica que ela não está brincando, porém acabo rindo com o comentário.
— Adoraria presenciar essa cena, mas jamais deixarei você chegar perto
dele — afirmo.
Um doce sorriso surge em seus lábios apesar da expressão de indignação
estampada em seus olhos e mesmo que eu me force a permanecer no presente
acabo sendo lançado mais vez ao passado.
Ao mesmo tempo que vejo Ivi diante dos meus olhos me lembro do dia
do seu enterro. Aquela noite ficou gravada em minha mente e torna a se repetir
diariamente em minha vida. Seus cabelos ruivos esvoaçantes contrastavam com
seus olhos castanhos esverdeados que me olhavam assustados com um silencioso
pedido de socorro. Eu não pude ajudá-la, não pude proteger a minha doce e
amada Ivi, e com isso paguei meus pecados vendo o caixão lacrado ser enterrado
diante dos meus olhos. Engulo em seco tentando descartar essas lembranças da
minha mente.
— Tente sair do quarto sem quebrar a casa por favor. — Mudo o assunto
e vejo ela desviar os olhos dos meus enquanto tento me concentrar no que estava
acontecendo no presente.
— A culpa não foi minha — diz chateada.
— Vou conversar com Royal depois — digo por fim e ela dá de ombros.
— Não espero um pedido de desculpas vindo dele, estou mais
preocupada com Jack. — Seus olhos entristecidos se voltam para mim. — Você
não deveria concordar com isso.
— Não tenho muitas escolhas Dana. Já procurei diversos meios de
cancelar o contratou, mas todos levam a uma guerra. Vou falar com Jack hoje
espero que você ajude e não tente pará-lo com força física, você está machucada.
Ele virá até você por livre e espontânea vontade. Não sei porque, mas ele confia
em você. — Arrumo minha gravata e a escuto suspirar.
Pensativa me observa incerta e depois de alguns segundos assente
concordando.
— Farei tudo o que estiver ao meu alcance. — Balança os ombros
desgostosa.
Agradeço e despeço dela seguindo para o escritório, pois em poucos
minutos terei uma reunião e preciso me apresar. Acabo encontrando Max à
minha espera.
— Que bom te encontrar aqui, chame Royal preciso conversar com os
dois — falo me sentando.
— Sua expressão diz que o assunto é sério. — Ele faz uma careta me
encarando preocupado.
— Vá logo atrás de Royal, ele provavelmente está na academia treinando
— comento sem paciência.
Assim que Max sai aproveito o momento para enviar alguns e-mails para
empresários e comerciantes da empresa, depois de alguns minutos os dois
voltam e Royal tem uma expressão fechada e irritada.
Ele ganhou um belo roxo no queixo e isso me surpreende.
— Sua prisioneira bate melhor do que eu esperava Dante. Fiquei
instigado a treiná-la, mas sinto que estaríamos cavando nossa própria cova. —
Royal usa um tom sarcástico com a mesma expressão séria de sempre.
Os dois se sentam nas poltronas em frente à minha mesa.
— Tente não quebrar nenhum osso dela Roya,l isso traria problemas para
nós. Sabe que agora temos um contrato direto de proteção. Então quero que
vocês a tratem bem.
— O coração de gelo está amolecendo irmão? — Max diz
sarcasticamente.
— Cala boca Max se não quer ter o traseiro chutado — digo irritado,
hoje não estou no meu melhor dia.
— Acredito que não precise se preocupar com sua protegida. Ela
conseguiu quebrar minha defesa com facilidade como pode perceber. — Aponta
para o rosto.
Seguro a risada, pois sei que isso deixaria Royal furioso e me surpreendo
ao perceber que ela conseguiu achar uma brecha na defesa de Royal.
— Ela tem agilidade Dante, vi potencial nessa garota. Ela rápida, esperta
e sagaz. Tem bons movimentos. — Me surpreendo ao ouvir Royal elogiando
Dana, porém isso só aconteceu por ela ser realmente boa no que faz.
— Gosto daquela mulher. Ela não demonstra medo e enfrenta o que
estiver em sua frente, mas ainda não confio nela. Sinto que ela esconda algo que
está embaixo dos nossos narizes, mas não conseguimos enxergar. — Max cruza
os braços se encostando na poltrona desajeitadamente.
— Vamos deixar esse assunto de lado por um momento. Chamei vocês
dois aqui, pois tenho algo importante para falar. — Suspiro sabendo que esse
assunto vai gerar ainda mais discussão.
— O que Donatel fez dessa vez? — Max pergunta se ajeitando na
poltrona de couro preto.
— Sabemos que ele foi para Rússia, para o México e para Alemanha
depois que passou o poder em minhas mãos. Por um momento acreditei que ele
tivesse se aposentado e deixado tudo para nós, mas vocês conhecem bem o pai
que temos e dessa vez ele ultrapassou todos os limites possíveis.
A expressão de Royal e Max mudam e os dois me observam sérios e
pensativos.
— Ele assinou um contrato com Edgar Squared obrigando Jack a se casar
com Jessye, a filha mais nova de Edgar — falo de uma vez encurtando o
assunto.
— Porra que velho desgraçado. — Royal acerta um soco sobre a minha
mesa fazendo tudo o que tinha sobre ela balançar, sou obrigado a segurar as
coisas mais importante para que não caia enquanto ele se levanta irritado. —
Juro que meu maior prazer seria matar aquele velho desgraçado que chamamos
de pai. — Anda de um lado para o outro irritado.
Max permanece em silêncio de braços cruzados perdido em seus
pensamentos.
— Não podemos permitir isso Dante — Max diz bravo.
— Procurei todas as maneiras possíveis, mas vocês conhecem Edgar. Ele
não é conhecido pela sua paciência e muito menos pelas quebras de contrato. —
Suspiro pesadamente.
— Jack ficará louco, ele preza sua liberdade mais que tudo. — Max
suspira.
— Estou adiando a conversa com nosso irmão, mas irei contar para ele
hoje e espero que vocês tentem enfiar na cabeça dele toda essa baboseira da
melhor forma possível. Precisamos que ele aceite ou podemos nos preparar para
um ataque nada agradável de Edgar. — Respiro profundamente.
— Deixe que venha, terei o prazer de arrancar a língua daquele velho
irritante. — Royal semicerra os olhos emanando ódio.
— Sei que aguentamos um ataque de Edgar, o problema é que Donzel
aproveitará o ataque. Vocês sabem que ele espera ansiosamente nos destruir e
não perderá uma oportunidade como essas, além disso, Donzel está de olho em
Dana e foi por esse motivo que Robert Trion assinou um contrato de proteção
para sua irmã, então devemos protege-la e não matá-la. — Lanço um olhar de
repreensão para Royal.
— Eu estava defendendo Teresa. — Cruza os braços sem um pingo de
remorso.
— Não podemos fazer nada? — Max pergunta.
— Ainda não encontrei nenhum meio que livre Jack desse absurdo. —
Cruzo os dedos pensativo.
— Então só podemos esperar e ver no que tudo isso vai dar — Max fala
se levantando absorto em seus pensamentos.
— Tentarei fazer tudo o que estiver ao meu alcance e até o último
momento lutarei pela liberdade de Jack, mas terei que contar a verdade para ele
então peça para Jack vir até aqui Royal.
Com um aceno de cabeça e uma expressão de raiva Royal sai do
escritório seguindo Max.
Solto o ar pesadamente e depois de alguns minutos arrumo minha postura
à espera do meu irmão. Não demora muito e ele entra se acomodando na
poltrona a minha frente me olhando preocupado com uma de suas sobrancelhas
erguidas.
— O que está acontecendo? Não me diga que Royal conseguiu quebrar a
costela da Dana? — ele pergunta preocupado. Eu acabei de vê-la perambulando
pela casa e ela parecia bem.
— Se o caso fosse costelas quebradas eu estaria agradecendo — digo o
observando.
— Ouvir isso não me agrada — ele comenta inquieto.
— Vamos direto ao assunto, você sabe que Edgar tem uma filha com
dezenove anos e que ele não tem filhos homens para assumir seu lugar. — Vejo
sua expressão preocupada mudar para um sorriso.
— Aquela pirralha minada? O que aconteceu com ela? Precisamos
participar de algum resgate da filha de Edgar? — ele diz sarcasticamente rindo.
Isso vai ser pior do que imaginei, me preparo para dizer a verdade e já
espero os gritos.
— Donatel vendeu sua mão para Edgar então agora você é oficialmente o
noivo de Jessye Squard. — Ele me encara sem expressão e começa a rir.
— Tem certas brincadeiras que não são legais Dante — ele fala rindo
esperando que eu desminta.
Mantenho minha expressão seria o observando e aos poucos a expressão
de desespero e raiva toma seu semblante. Ele se levanta bruscamente dando um
soco sobre a minha mesa e percebo que daqui a alguns dias não terei mais mesa
para contar história.
— Eu não vou me casar com Jessye. Faça alguma coisa Dante, você é o
chefe, aquele velho desgraçado está aposentado — Jack grita acertando a porta
com outro soco. — É tudo culpa dele. Sempre foi culpa dele. — Ele anda de um
lado para o outro passando suas mãos nos cabelos nervosamente.
— Você sabe que não podemos quebrar contrato feito por membros da
nossa família, infelizmente nosso pai teve a capacidade de ir pessoalmente a
Alemanha assinar os contratos. — Me levantando.
— Foda-se não vou me casar — grita se virando bruscamente para mim.
— Eu tentei de todas as maneiras achar uma forma de acabar com essa
porcaria. Você acha que isso me agrada Jack? Eu mais do que ninguém odeio
aquele velho, vocês não sabem de nada — grito de volta deixando a ira dominar
meus pensamentos e raiva me tomar.
Matei a única mulher que amei, um casamento forçado não é nada
comparado a dor que carrego diariamente. Eles não sabem o que é viver com o
peso da morte sobre seus ombros uma vida inteira.
— Não irei me casar irmão. — Seus olhos tomados pelo ódio me
encaram com desgostoso.
— Então esteja preparado para lutar Jack. — Respiro profundamente
sabendo que aquela conversa não chegaria a lugar algum.
Com um pesado suspiro ele me encara com raiva como se a culpa de tudo
isso estar acontecendo fosse minha, mas logo o ódio de seu semblante é
substituído por desgosto e dor. Sem nada a dizer ele sai do escritório batendo a
porta com força.
Massageio minhas têmporas a na tentativa de aliviar a dor que se instala
em minha cabeça e depois de incontáveis minutos olhando para o nada arrumo
meu terno e vejo que perdi mais uma reunião que irá tumultuar toda a minha
semana.
Uma batida na porta quebra meus pensamentos e sei que esse não é o
melhor momento para conversar com alguém, pois estou de cabeça quente e
quero descontar minha raiva em alguém, ainda assim, com uma calma que não
cabe em mim no momento ordeno que entrem.
Thales, um dos comandantes da área sudeste da Itália denominada como
saguão D adentra minha sala em uma postura rígida e sei que algo aconteceu
com as minhas cargas.
— Algo de errado com o carregamento de armas Thales? — pergunto
sem muita paciência.
— Senhor a carga principal foi invadida, mas conseguimos pegar o
culpado que leva o brasão da gangue Nosdragja. Ele está no galpão E3
esperando por Royal, optei por transferi-lo para cá. — Thales passa as
informações com precisão.
Respiro profundamente e um sorriso surge em meus lábios ao saber que
havia pego o culpado. A Nosdragja é uma gangue que insiste em procurar briga
conosco, mesmo sabendo que não tem a mínima chance de ganhar por serem
minoria se comparado a nós.
— Fale para Royal que cuidarei pessoalmente do caso. — Ele arregala os
olhos me encarando assustado, ergo uma sobrancelha o encarando.
— Sim senhor. — Sai da sala rapidamente.
Posso compreender a surpresa de Thales já que Royal sempre é o
encarregado de tirar informações de casos como esses, mas hoje preciso de uma
dose de tortura para aliviar a raiva que percorre minhas veias e será realmente
interessante saber o porquê a Nosdragja está tentando saquear minhas cargas.
EVA

Como ganhei a liberdade de sair e explorar a casa a primeira coisa que


faço é procurar Teresa para explicar tudo o que aconteceu no passado e
aproveitar para conseguir e coletar informações dela e bem como Dante disse,
ele realmente aumentou o número de seguranças.
— Ei senhorita brigona. — A voz de Max me faz parar.
Ele se aproxima sorridente e junto as sobrancelhas em surpresa pela
aproximação repentina. Por mais que tento agir naturalmente é difícil quando sei
o que acontecerá com Jack. Minha vontade é de socar a cara de Dante
incontáveis vezes, mesmo sabendo que a culpa não é totalmente sua. Não que
essa vontade eu não tenha todos os dias, mas hoje ela está mais forte do que o
normal.
— Você está bem? Royal pegou pesado — ele resmunga preocupado.
— Costelas roxas e um corte profundo na mão. — Mostro o curativo
feito por Dante. — Nada demais. — Concluo balançando os ombros.
— Você é engraçada. — Seu sorriso aumenta. — Fique boa logo, pois
quero treinar com você. — A ansiedade no tom de sua voz me faz rir.
— Espere alguns dias e estarei na ativa novamente. — Pisco para ele.
— Max preciso conversar com você — Royal chama o irmão com a
mesma expressão fechada de sempre.
Esse homem nunca sorri? Ele sempre carrega uma expressão de raiva e
irritação em seu semblante.
Sabe, por um momento acreditei que me daria bem com Royal, porém ele
é mais fechado e complicado que os outros, mas sinto que por trás de toda essa
máscara de ódio há um coração puro e cheio de amor esperando para florescer.
Royal me observa com uma expressão de poucos amigos e ergo uma
sobrancelha o encarando nos olhos, mas em nenhum momento ele demonstra
fraqueza desviando os seus olhos do meus. Ele leva uma marca roxa no queixo e
isso satisfaz meu ego por saber que o pelo menos o acertei com dignidade uma
única vez.
— Gosto de você. — Max passa por mim batendo em meu ombro.
Max segue em direção ao irmão que se mantem parado próximo a uma
porta e vejo a expressão de Royal mudar para confusão e indecisão.
— Não vou atacá-la novamente — Royal afirma olhando dentro dos
meus olhos e por um momento tenho vontade de rir, pois é muito engraçado a
maneira que os homens dessa casa encontram para se redimir ou pedir desculpas.
Na verdade, eu acredito que essa palavra não exista no vocabulário de
nenhum deles, mas me surpreende a forma como cada um encontra para se
redimir.
Assinto com um aceno de cabeça e me sinto estranha ao perceber que
estou sendo protegida por mafiosos.
Não sei explicar... É simplesmente fora do comum ser protegida por
quem deveria ceifar vidas. É como se tudo estivesse de ponta cabeça, afinal eu
sempre acreditei que homens como eles seriam brutais e desumanos, não que
eles não sejam, mas por trás de todos as histórias inventadas sobre máfias,
tortura e sangue, vejo apenas quatro homens tentando se aceitarem como são
pois nem mesmo eles acreditam em seu próprio potencial e isso me deixa cada
dia mais curiosa para desvendá-los.
E sendo sincera eu não odeio os Voyaller em si, odeio apenas o pai deles
e o irmão que me tirou tudo o que eu tinha.
— Você só defendeu uma pessoa que é importante para você Royal, no
seu lugar faria a mesma coisa. — Sorrio para ele com sinceridade e a expressão
de surpresa em seu rosto é evidente.
Royal assente com um leve aceno de cabeça e segue para os seus
afazeres me deixando sozinha. Volto a caminhar pela casa a procura da cozinha
pois tenho certeza de que Teresa estará lá.
Sigo um corredor e vejo uma porta que leva até a piscina, antigamente
não me lembro deste local ter um deque de madeira, mas o charme e a
delicadeza me encantam, pois as flores e as árvores plantadas dão ao lugar um ar
de paz e serenidade.
A alguns metros da mansão posso ver o um jardim bem cultivado e uma
academia ao lado. Curiosa para conhecer mais daquele lugar caminho pelo deque
e passo por um caminho de pedras que leva até as portas de vidro da entrada. É
um local grande com dois andares repleto de homens em treinamento.
Me limito em ficar ao lado, afinal não posso fazer nada com a costela
dolorida e a mão enfaixada.
Entretida com o local e doida para voltar com os meus treinamentos
acabo chamando mais atenção do que deveria. Os seguranças de Dante me
observam desconfiados e alguns até mesmo posicionam as armas com
tranquilizantes.
Eu não acredito que ele ordenou que atirem em mim com tranquilizantes.
Respiro profundamente querendo socá-lo, mas contenho minha irritação
e volto a caminhar ignorando os homens armados a minha volta. As árvores se
estendem ao longo do terreno e o verde domina o ambiente deixando a mansão
com um ar aconchegante.
Essa casa seria muito bonita se não tivesse tantos homens armados
andando despreocupadamente pela localidade
Caminho mais um pouco em volta da casa aproveitando para respirar o ar
fresco e admirar as flores e finalmente encontro Teresa que está concentrada em
seus afazeres na cozinha. A observo um pouco pela janela de vidro e finalmente
crio coragem para ir até ela.
Assim que passo pelas portas seus olhos surpresos se voltam para mim e
um grande sorriso cresce em seus lábios. Sem pensar duas vezes ela para o que
está fazendo para me abraçar.
— Minha menina. — Teresa acaricia os meus cabelos. — Que saudades
de você Eva, minha pequena, você está linda. — Ela coloca as mãos na minha
bochecha as apertando com carinho aproveitando para analisar cada detalhe do
meu rosto.
— Teresa eu estou bem — falo com dificuldade por mãos firmes me
virando de um lado para o outro para ver se estou realmente bem e viva.
— Achei que Royal tinha quebrado suas costelas. — Ela ergue uma
sobrancelha em dúvida.
— Aprendi a me defender nesses onze anos. — Seguro suas mãos que
insistem em me apalpar.
— Minha menina, acreditei que só te veria novamente no céu. — Ela me
abraça mais uma vez com força e acabo sorrindo com o seu comentário.
Teresa tem quase a mesma altura que a minha, sendo alguns poucos
centímetros mais baixa. Seu físico avantajado a deixa linda e apesar de ser uma
senhora ela gosta de se cuidar, pois está sempre bem arrumada e com os cabelos
negros preso em um coque.
Sinceramente a comida de Teresa sempre foi a melhor, os cozinheiros da
mansão Becker tentavam ganhar meu coração com excelentes pratos, mas Teresa
sem esforço algum já havia ganho ele por completo.
Ela sempre cuidou de mim como uma filha, assim como cuidou de Dante
e provavelmente dos seus irmãos.
— Eva não consigo compreender o que me contou naquele quarto. Não
acredito que meu menino tenha feito algo tão cruel e te adianto que seus pais não
são flor que se cheire. — Ela senta à minha frente.
Nunca acreditei que meus pais fossem certinhos, sempre acreditei que
eles escondiam, mas ninguém nunca me contou a verdade e talvez Teresa saiba
de algo que me ajude.
— Teresa não me chame de Eva, Dante não pode descobrir quem ainda
estou viva. Aqui me chamo Dana, não se esqueça, Eva está morta — digo
baixinho.
— Dana — repete pensativa. — Eu não gosto desse nome. — Faz uma
careta.
— Eu também não, mas é necessário. — Seguro suas mãos suplicando
que ela me entenda.
— Meu menino sofre tanto por você. — A expressão de tristeza em seu
rosto me deixa aflita.
— Teresa entenda que antes eu preciso saber da verdade, se Dante souber
que ainda estou viva ele nunca me contará tudo.
— Isso é verdade, Dante vai querer lhe proteger acima de tudo e enterrar
o passado de uma vez. Conheço bem o menino que criei. — Sorri com carinho
ao falar de Dante.
— Ainda bem que você me entende. —Solto o ar aliviada.
— Me conte o que aconteceu naquela noite? Foi chocante para mim
descobrir o assassinato dos Becker. — Apoia a mão sobre o coração como se
angustia ainda a consumisse.
Com calma começo a contar tudo o que sei, desde a noite em que tudo
aconteceu até os dias atuais. Conto também como foi meu treinamento no Japão
e como foi divertido morar em outro país apesar de estar focada em um único
objetivo.
As reações de Teresa variam de pavor a espanto em questão de segundos
e algumas vezes surge uma pitada de dúvida, mas como uma mãe ela
compreende fazendo questão de prestar atenção em cada detalhe do que conto.
— Compreendo tudo o que me contou, mas Dante te ama querida. Até
hoje não superou sua morte e tenho certeza que ele te mantém nesta casa por ser
tão parecida com você mesma. — Ela ri. — Ele só não consegue enxergar a
verdade como eu porque acredita veementemente que está morta.
— Por qual motivo ele matou minha família e atirou em meu peito? —
pergunto magoada.
— Eva minha querida... — interrompo.
— Dana, Teresa, você não pode se esquecer. — A corrijo.
— Vou tentar me acostumar, mas seu pai vivia nesta casa. Ele e Donatel
eram bem próximos e posso afirmar que Donatel não é o melhor homem para se
ter grandes amizades. Pelo pouco que sei seu pai comandava algumas coisas
com Donatel — diz pensativa. — Não posso afirmar com certeza afinal sempre
fui a cozinheira e ouvia apenas murmurinho dos dois pelos cantos da casa.
— Será que foi um acerto de contas? — pergunto curiosa e com ainda
mais dúvidas.
— Não sei, mas quando você era um bebê sua família sofreu uma crise
muito grande e quase veio a falência. E a primeira pessoa que Frank procurou foi
Donatel e posso afirmar que eles firmaram um contrato. Não tenho acesso a
todos os cômodos da casa, mas às vezes limpo o escritório de Donatel que fica
fechado e posso procurar alguns papeis que tirem suas dúvidas. — Teresa apoia
a mão nas minhas com carinho.
— Você faria isso Teresa? Muito obrigada! — A abraço novamente
ansiosa.
— Mas se acalme garota, não posso simplesmente querer entrar no
quarto de Donatel do nada. Tenho que pensar em algo para conseguir entrar lá —
diz pensativa e receosa.
— Esperarei o tempo que for necessário Teresa, confio em você. —
Sorrio e tenho certeza que meus olhos não escondem a minha felicidade.
— Agora menina preste atenção em uma coisa que vou lhe dizer. — Ela
segura novamente minha bochecha me forçando a olhar seus olhos.
— Ai Teresa, isso dói — reclamo.
— Não ouse fazer mal ao meu menino, pois tenho certeza que ele foi
forçado de alguma maneira a matar sua família. — Solta minha bochecha me
observando com uma expressão brava.
— Não irei fazer nada sem antes descobrir toda a verdade sobre a minha
família e sobre os planos de Donatel — afirmo a acalmando.
— Nem tudo está nos papeis. Algumas coisas ficam guardadas aqui e
aqui. — Ela aponta para cabeça e para o coração. — Então crie coragem e
pergunte a Dante toda a verdade, só ele pode tirar as dúvidas do seu coração.
Fico em silêncio ao perceber que Teresa tem razão, minha mente está
uma confusão e se minhas dúvidas são muitas depois de conversar com Teresa
elas se multiplicaram e por mais que eu evite uma conversa direta com Dante
chegará o dia em que não terá como fugir.
— Vou lhe contar algo que não deveria. — Teresa apoia o braço sobre a
mesa passando a mão no rosto incomodada.
— O quê? — pergunto curiosa a procura de todas as informações que eu
poderia ter.
— No dia do funeral da sua família Dante enterrou todos os sentimentos
de amor com você. Naquele dia ele não chorou, foi forte e não demonstro
fraqueza como fora ensinado desde pequeno, mas naquela noite ele destruiu mais
da metade de seu quarto e na manhã seguinte era um homem vazio e frio. O
pequeno brilho de esperança que havia em seus olhos se apagou e é assim até
hoje. — A expressão de tristeza no rosto de Tereza faz meu peito se apertar. —
Cuidado minha menina, sei muito bem que quer sua vingança, mas cuidado para
não caçar o homem errado e se arrepender no final, pois é visível que vocês se
amam. Você só está deixando o ódio e orgulho se sobrepor ao amor que sente. É
claro que ele fez algo terrível, mas manche suas mãos sem antes de ter certeza
dos verdadeiros culpados. — Seus olhos preocupados me encaram com
expectativa.
Minha mente dá voltas e as palavras de Teresa me causam um certo
desespero. Eu não quero que essa chama de esperança cresça em meu coração,
eu não que acreditar na inocência de Dante, meus olhos presenciaram cada
detalhe daquela noite, mas ao ouvir as palavras sinceras e as suplicas dessa
senhora a minha frente as barreiras que ergue envolta do meu coração balançam
querendo cair.
Para ser sincera meu peito dói e o nó em minha garganta me sufoca ao
perceber que Dante sofre com minha possível morte.
Por quê? Por que ele sofre?
Ele não deveria sofrer, foi ele o causador de toda nossa desgraça. Por que
ele carrega um olhar vazio, sem esperanças e sem vida?
As perguntas, dúvidas e incertezas dominam todos os meus pensamentos
e saber que todo o sentimento que tentei enterrar e deixar no passado ainda se
faz presente dentro de mim me irrita.
— Você o ama mais do que imagina Eva. — Teresa sorri satisfeita.
— É Dana — digo irritada. — Eva morreu a onze anos atrás e não
engane, pois eu não o amo — falo entre dentes apertando os punhos.
— Você o ama sim, apenas deixa seu ódio mascarar todos esses
sentimentos de amor...
— Teresa... — Ela me cala.
— Ele é homem vazio desde a sua morte e não pense que ele trouxe
mulheres para dentro desta casa, pois você está muito enganada. — Ela me
repreende.
— Eu não quero saber sobre isso — falo frustrada.
— Mas vai me ouvir. — Me obriga a ouvi-la. — Várias vezes ele correu
para os meus braços, pois não tinha ninguém que o compreendesse e entendesse.
Se você der a chance dele se aproximar ele te mostrará o homem incrível que é.
Claro que ele não deixará de ser o temido Dragão de Veneza, nem deixará de ser
o chefe da maior máfia italiana, muito menos poupará a vida daqueles que
tentam invadir seu território ameaçado sua família e aqueles que ele ama. Mas,
se você permitir que ele se aproxime ele mostrará somente para você o quão
gentil e amoroso ele pode ser. — Ela respira profundamente. — Seja Dana, ou
seja, Eva querida, mas eu te peço somente uma coisa. Traga de volte o sorriso
sincero e o brilho no olhar do meu menino, traga de volta a esperança que um
dia foi morta dentro daquele coração, você esteve onze anos atrás da sua
vingança e por onze anos eu vi esse menino sofrer. Abra seus olhos e salve não
somente ele, mas a você. — As lágrimas escorrem do rosto de Teresa enquanto
ela apoia a mão em meu coração e súplica para que eu permita e de uma segunda
chance a Dante.
O seu pedido cheio de sentimentos faz meu coração se apertar e meus
olhos automaticamente se enchem de lágrimas ao ver a dor explicita naquela
senhora de mais de sessenta e poucos anos. Mordo os lábios com força tentando
não dar espaço ao emaranho de sentimentos e o turbilhão de incertezas que me
tomam, mas ver Teresa retratar Dante de uma forma tão sofrida não condiz em
nada com as imagens que tenho dos seus olhos frios naquela noite e o pior de
tudo é que em poucos dias estando nesta casa consegui ver e sentir todo o
sofrimento de Dante transbordar atrás de sua frieza.
Ele é um homem vazio, triste e frio, mas também é presunçoso, não gosta
de dar o braço a torcer por nada, é mandão, orgulho e teimoso, além de safado e
sensual. Ele se acha superior a tudo e isso acaba me irritando.
— Por favor minha menina. — A voz de Teresa quebra meus
pensamentos.
— Prometo que não deixarei meu desejo de vingança dominar meus
pensamentos antes de saber da verdade, mas trazer Dante de volta, bom eu não
sei se tenho essa capacidade, pois acredito ser algo impossível até mesmo para
mim. — Me levanto abraçando-a com força.
Ela enxuga as lágrimas e sorri com sinceridade acariciando os meus
cabelos.
— Tenho certeza que você se sairá muito bem minha menina, você
descobrirá toda verdade e eu ajudarei com essa busca provando a inocência do
meu menino. — Ela sorri dando um beijo em minha testa. — Irei procurar os
papeis no escritório de Donatel.
— Obrigada Teresa é tão bom ter alguém para conversar. — Encho a
bochecha dela de beijinhos quebrando o clima pesado que havia se instalado.
Por não ter nada para fazer acabo ficando ali, jogamos conversa fora por
horas enquanto ajudo a preparar um de seus maravilhosos bolos de frutas
silvestres e me surpreendo ao descobrir que Max e Royal fazem aniversario em
novembro. Teresa ainda deixa claro que a nesta época a casa sempre se agita um
pouco, pois eles gostam de festas badaladas.
É outono e os dias na Itália nesta época são agradáveis e reservam um ar
aconchegante, as árvores com suas folhas avermelhadas enfeitam as ruas da
cidade. Está é uma época que me enche de felicidade e alegria.
— Não consigo ver Royal no meio dessa festa Teresa. — Acabo rindo e
continuo a bater a massa do bolo.
— A minha menina, ele só tem pose. Ele gosta de esconder o coração
bondoso que tem atrás da sua carranca. Royal é muito gentil e amoroso. — Ela ri
picando as frutas em pequenos pedaços para fazer a cauda.
— E Max me conte sobre ele também — peço animada com a sua forma
de falar sobre os meninos.
— Max, vamos ver. — Ela pensa um pouco antes de começar. — Max é
uma combinação de sedução, charme, encanto e atração. Por onde passa deixa
sua marca e seu carisma conseguindo cativar, atrair e deslumbrar as pessoas a
sua volta. — Ela acaba rindo. — Apesar de ser gêmeo idêntico de Royal suas
personalidades se distinguem um pouco.
— Não consigo ver eles dessa forma Teresa. — Acabo lambendo os
dedos sujo da massa do bolo de chocolate branco.
— Espere eles pegarem confiança que lhe mostraram lados que você
nunca imaginou conhecer.
— Me conte sobre Jack, afinal ele é o que mais me aceitou até agora. —
Deixo a massa de lado para ser enformada, lavo as mãos e bato as claras de ovos
que estavam separadas para preparar o glacê.
— Jack é o mais aberto entre os três e não esconde o lado sedutor e
garanhão, um verdadeiro conquistador. — Ela nega com a cabeça revirando os
olhos e dando de ombros. — Faz com que elas caiam como peixinho. — O seu
olhar não esconde o orgulho de falar sobre os seus garotos.
Com a forma nas mãos Teresa unta a assadeira e enforma o bolo o
colocando para assar.
— Jack realmente é sedutor. — Acabo rindo. — Ele é encantador e
deslumbrante consegue fazer com que você se aproxime dele naturalmente. Ele
não força uma amizade, ele simplesmente conquista seu espaço sem muito forço.
— Isso mesmo minha menina, esses são os três irmãos mais novos da
família Voyaller. — O seu semblante se enche de alegria e prazer.
— E como você vê Dante? — a pergunta escapa inconscientemente.
Tento disfarça a minha surpresa por perguntar sobre ele, mas Teresa não
esconde a dela. Um sorrisinho sacana surge em seus lábios e ela só falta cantar
vitória. Paro de bater as claras e reviro os olhos suspirando.
— Foi somente uma pergunta Teresa, se passaram onze anos e estou
curiosa — falo por fim não dando o braço a torcer.
— A minha menina, você tem muito o que aprender ainda, esse orgulho e
ódio será domado por esse amor reprimido aí dentro. — Ela aponta para o meu
peito.
— Só quero saber o seu ponto de vista. — Ignoro os comentários dela.
— Então terei o prazer de lhe contar. Dante é muito complexo, ele é um
homem de aparência assim como seus irmãos, mas por estar entre pessoas de
grande poder a maior parte do seu tempo acaba exalando maior riqueza. Dante é
um homem fechado como Royal, mas ainda consegue expor seus sentimentos
melhor do que o irmão. Não gosta de ser desafiado e muito menos leva desaforos
para casa. Dante é um homem de negócios e não envolve sentimentos no meio
do trabalho, ele é intenso, obstinado e obsessivo, mas quando tem alguém que
ama ele não é o tipo de homem que se reprime, muito pelo contrário ele gosta de
demonstrar todo o seu amor, gentileza e carinho. Ele se joga de cabeça, sem
medo de errar ou de demostrar seus sentimentos. — Enquanto ela fala apenas
presto atenção em cada detalhe de suas palavras.
Percebo que ele não mudou nada, apenas cresceu, pois realmente é um
homem intenso e se você não tomar cuidado se afoga no mar revolvo e enevoado
que é Dante Voyaller. Simplesmente não posso negar que apesar de tudo o que
passamos ele ainda me fascina, me encanta e me seduz.
— É minha menina, essa carinha de dúvida diz tudo. — Sua expressão de
vitória me faz revirar os olhos.
— Teresa pode ir parar de colocar coisas nessa sua cabecinha. — Cruzo
os braços irritada.
— Claro — sua resposta de duplo sentido me faz bufar. — Não bufe para
os mais velhos e sábios, está querendo levar umas palmadas depois de grande?
— Ela junta as sobrancelhas brava. — Deixe que o tempo vai te mostrar tudo o
que for necessário e também vai aflorar esse amor escondido aí dentro desse
coração. — Ela sorri como uma mãe que aconselha o seu filho.
Fico pensativa sem saber o que dizer para Teresa e como questionar
alguém mais velho e mais sábio que você. Aprendi que devemos escutar os mais
velhos e com eles termos olhares diferentes sobre o mundo e confesso que
conversar com Teresa hoje foi a melhor coisa que fiz.
Ela abriu meus olhos em vários pontos, principalmente na questão de
meu pai ter envolvimento com Donatel. Eu já desconfiava, mas nunca tive a
certeza e talvez meu olhar sobre Dante a partir de hoje seja diferente, mas isso
não quer dizer que meu ódio e minha sede de vingança diminuiu. Muito pelo
contrário quero mais do que nunca descobrir toda a verdade e vingar a morte dos
meus familiares.
Termino de ajudar com a cauda do bolo e vejo que hoje com a ajuda de
Teresa dei um grande passo em direção a verdade, pois se ela realmente
encontrar os papeis com o contrato do meu pai, saberei um pouco mais de seu
envolvimento com Donatel.
Sei que será necessário revelar quem sou a Dante, mas ainda é cedo para
isso, pois preciso descobrir uma maneira de ter essa conversa pacificamente sem
que estejamos rolando no chão entre socos e chutes.
DANTE

Colin solicitou minha presença na matriz das empresas Voyaller que está
localizada em Roma. Apensar de ser dono do porto também comando outros
negócios legais dentro da Itália. O único problema é que não tenho tempo de
atender a toda essa carga horária que me cerca, por isso homens de confiança
assumem meu lugar e comandam meus negócios enquanto Jack se encarrega de
ver o andamento dos lucros e baixas de cada empresa.
Com a Nosdragja nós perseguindo, não posso fazer uma viagem até
Roma, preciso descobrir o que eles estão planejando. Não me preocupo com seus
homens em si e muito menos com seu chefe, mas precauções nunca é demais e
saber a quem eles andam se aliando é de extrema importância. Sendo assim, sou
obrigado a resolver todos os problemas de Colin por uma chamada de vídeo,
afinal, meu foco principal é o porto e a máfia 371, já que as outras empresas só
encobrem nossas sujeiras.
Sigo com meu Jaguar até Pádua onde se localiza o galpão E3 e, confesso
que sentir o vento em meu rosto enquanto dirijo é realmente reconfortante e traz
paz ao meu coração. Uma paz que eu não costumo ter diariamente.
Depois de alguns minutos de viagem da mansão que fica nas localidades
entre Veneza e Pádua estaciono em frente as portas de ferro do galpão que está
localizado em uma fazendo mais afastada da cidade. Alguns dos homens do
batalhão de Royal me esperavam como o combinado, suas posturas rígidas me
fazem sorrir. Royal não é um treinador bondoso e não aceita falhas dentro do seu
batalhão.
Passo por eles e faço questão deixá-los assistir o que acontecem com
traidores, pois somos uma só família e a nossa função é protegem uns aos outros
não trair nossos irmãos.
— Entrem e apreciem — ordeno a todos antes de continuar.
Passo pelas portas e meu corpo vibra ao ver o homem seminu
dependurado de costas pelos braços no meio do galpão. Vergões vermelhos se
espalham por seu torço, sinais de uma possível tortura, mas me sinto satisfeito
em saber que ele está praticamente intacto para minhas brincadeiras.
A mesa com os equipamentos já está posta à minha espera e ao lado uma
caixa com charutos cubanos, o que me faz sorrir. Me aproximo da mesa e sem
pressa acendo um charuto tragando-o com calma. Observo cada utensílio com
cuidado deixando as ideias borbulharem minha mente e suaves tremores de
excitação tomam o meu corpo.
Caminho lentamente pelo salão girando o isqueiro entre os dedos, solto a
fumaça preza em meus pulmões em uma única lufada parando um frente ao
homem que leva o nome da Nosdragja no bíceps esquerdo.
Seus olhos mal focam em mim, mas o susto faz com que se debata nas
correntes tentando se soltar.
— Dante Voyaller — sussurra meu nome erguendo uma sobrancelha ao
me encarar melhor.
— Para você, Dragão de Veneza. — Retiro meu casaco e meu terno
jogando-os sobre a poltrona que fica próxima à mesa.
O desespero e a surpresa em seu olhar me fazem sorrir ainda mais, esse
homem me trará muita diversão. Levo meu charuto aos lábios o observando.
— Quem diria... Dante Voyaller, um empresário bem sucedido e muito
elogiado pela mídia ser o Dragão de Veneza. — Ele ri cinicamente. — Que
mundo pequeno — murmura.
— Isso mostra que não devemos confiar em ninguém. — Solto o ar
fazendo a fumaça do charuto chegar até ele.
Retiro minhas Taurus gêmeas da cintura analisando-as com calma.
— Poucos que conhecem minha verdadeira face estão vivos Draga — o
chamo pelo nome que os integrantes de sua gangue costumam usar para tratar
seus irmãos.
— Não me chame assim você não tem esse direito. — O desprezo fica
explicito em seus olhos.
— E você acha que tem o direito de roubar minhas cargas? — Rio com
ironia. — Se quer ser respeitado pela 371 faça por merecer. Agora roubar as
minhas cargas é burrice demais. — Observo meu charuto vendo as pequenas
fagulhas de fogo consumir o papel.
Seguro uma das minhas Taurus a girando entre os dedos hora ou outra e
percebo que seus olhos focam nelaassustados. Aponto para sua cabeça mirando
bem no meio da sua testa, mas seria uma morte rápida demais.
— Sinta-se privilegiado, pois poucas pessoas conhecem essas belezinhas
pessoalmente e você não terá só a chance de olhá-las, mas terá também o prazer
de senti-las. — Passo os dedos pelo cano negro sentindo os pequenos desenhos
em alto relevo esculpidos em ouro branco acariciar minha pele, enquanto sua
irmã repousa em meu colo.
Não deveria ter orgulho das armas que carrego em minha cintura, mas
isso se torna inevitável quando foram confeccionadas especialmente para você.
A família Voyaller tem a tradição e marca registrada nas armas de seus
membros consanguíneos. As minhas duas armas levam o símbolo da máfia e o
animal que me representa em seu cabo, um dragão envolvo aos números 371 e se
tornaram ainda mais conhecidas por cada membro morto por elas, serem
marcados com o símbolo dos Voyaller.
— Achei que essas armas eram um mito — diz desgostoso.
— Gostou? — Seguro a outra alisando o cano prata sentindo os desenhos
em ouro amarelo brincar entre meus dedos.
Ele não responde minha pergunta e isso só me instiga ainda mais.
— Eu sei que você gostou e anseia para senti-las o quanto antes, mas
ainda não é momento Draga. Iremos brincar muito está noite e você me contará
o que te trouxe até aqui, afinal Fabrizio não costuma ser tão irresponsável. —
Deixo minhas armas sobre a mesa pegando um alicate.
— Jamais contarei algo para você. Eu prefiro morrer — grita frustrado.
— Todos dizem isso. — Seguro o charuto nos dedos suspirando.
— Fabrizio ficará impressionado ao saber que o temido Dragão de
Veneza é Dante Voyaller. — Tenta uma ameaça psicológica me fazendo rir.
— O seu querido chefe está muito abaixo de mim e o máximo que ele
conhece é um dos meus capos.
— Não menospreza quem está por baixo, isso pode ser sua ruína —
cospe as palavras com ódio.
— Não será, pois você irá me contar os planos de seu chefe, sabe por que
Draga? Porque quando um pequeno ratinho despreparado resolve se mover na
toca do dragão significa que ele não consegue se manter calado sobre seus
planos e, sempre os mostra antes do necessário. Esse é o erro dos pequenos, falta
de estratégia e paciência. — Pego um alicate na bancada batendo-o levemente
em sua bochecha rindo.
— Você é nojento. — Tenta me acertar com uma cabeçada, mas falha.
— Obrigada Draga. — Posiciono o alicate em seu mamilo e ele se debate
tentando escapar, me afasto o observando. — Para quem Fabrizio está
trabalhando? — pergunto com calma.
— Morra... — grita com ódio.
— Já que você não irá colaborar, vamos começar nossa sessão especial.
— Pressiono o alicate em seu mamilo esmagando-o sem piedade.
Ele grita e se bate ao sentir a dor, posiciono o alicate em suas unhas
arrancando três unhas de sua mão e quatro do pé. Me levanto limpando minha
mão em pano.
— Pronto para entregar seu chefe? — pergunto observando-o.
— Vai se foder — diz ofegante tentando manter sua respiração calma.
Deixo uma sequência de socos em seu rosto e em sua costela, o sangue
de sua boca escorrer por seu pescoço e ele faz questão de cuspir em minha
direção fazendo seu sangue respingar em minha camisa branca manchando-a de
vermelho.
Respiro profundamente ao ver minha camisa manchada e tento
frustrantemente controlar os níveis de irritação e ódio que me dominam. Seguro
uma corrente entrelaçada em arame farpado batendo-a no chão algumas vezes.
Em um movimento rápido giro a corrente no ar acertando suas costelas,
os espinhos do arame entrelaçado na corrente se cravam em sua pele e ao puxar
sua pele se rasga deixando as feridas abertas. Os seus gritos de dor reverberam
por todo o galpão. Golpeio seu corpo mais duas vezes vendo-o se envergar, já
não conseguindo sustentar o peso do próprio corpo sobre os braços cansados
— Podemos encurtar a conversa Draga. — Solto as correntes no chão. —
Me diga quem mandou você saquear minha carga?
O seu silêncio indica que ele não vai colaborar. Sem muita paciência
seguro uma das minhas armas nas mãos atirando em seus dois joelhos. Encosto o
cano quente em seu peito deixando o símbolo da máfia estampado em seu peito.
Seu corpo estremece devido a e dor e ao cansaço, envolvo dois socos
ingleses em minhas mãos e desfiro vários socos em sua costela. Gritos e gemidos
saem de sua garganta abafados pelo sangue.
— Quem é seu chefe? — pergunto mais uma vez e o silêncio reina, sendo
quebrado apenas pelos gemidos de dor que saem constantes por sua garganta.
Volto até a mesa sorrindo ao ver uma faca de ponta fina, giro a mesma
entre os dedos com habilidade.
— Vou perguntar mais uma vez. — Respiro profundamente. — Fabrizio
não seria tão imprudente a ponto de saquear minhas cargas sem um mandante.
Quem lhe convenceu a saquear minhas cargas? — Semicerro os olhos o
observando.
Seu corpo dependura e sem forças só se mantém em pé devida as
correntes fortes que prendem seus pulsos. Sem a minha desejada resposta cravo
a faca lentamente em seu joelho baleado. Sem preocupação e sem demora brinco
com a faca no local vendo os músculos do seu abdômen se contraírem devido a
dor e os gritos que rompem sua garganta.
— Donzel. — Repete o nome de Donzel diversas vezes entre ofegos.
Agora a brincadeira está ficando interessante. Jogo a faca para o lado
deixando que ele respire e se acalme. Como imaginei Donzel não aceitaria tão
facilmente perder para mim algo que ele está obstinado a ganhar e o que está em
jogo neste momento com toda certeza é Dana, mas quero confirmar minhas
dúvidas com o homem a minha frente.
— Por que saqueou minha carga? — indago limpado minhas mãos em
um pano.
Minha camisa branca está toda respingada de sangue e a raiva que devia
ter diminuído aumenta ainda mais ao ouvir o nome de Donzel.
— Por quê? — Toda aquela demora me tira ainda mais do sério.
Quero ir para casa ver a cópia exata de Ivi deitada sob minha calma como
uma boneca de porcelana.
O galpão é antigo e a fiação de algumas luzes e ventiladores passavam
próximo a nós, puxo os fios mal colocados soltando-os, aproveito o trabalho mal
feito para utilizar a corrente elétrica a meu favor. Encosto a parte desencapada
dos fios em seu corpo deixando a corrente elétrica passar por todo seu corpo.
Retiro os fios deixando que ele respire, pois não quero matá-lo. Mesmo assim
repito o processo três vezes.
Depois de uma descarga elétrica ele finalmente súplica por sua vida.
— Para. — Ofegante luta para se manter consciente.
— Fale de uma vez ou começarei a cortar seus membros. — Seguro uma
cerra ameaçando-o.
— Donzel pediu para criar uma distração e afastar os quatro animais da
mansão — diz com dificuldade.
Permaneço em silêncio esperando-o continuar a sua belíssima história.
— Ele sabe que é impossível aquela casa estar sozinha e a única
possibilidade de isso acontecer séria causando um grande desastre em um dos
seus alojamentos de cargas, mas jamais imaginei que você séria o Dragão de
Veneza. — Respira com dificuldade. — Eu cheguei a acreditar que as histórias
sobre os quatro animais eram invenções de outras gangues, afinal nunca vemos a
verdadeira face dos causadores de tanta desordem e brutalidade. — Tosse
cuspindo sangue pela boca.
— Aprenda uma coisa Draga, não matamos por puro prazer e só
mostramos nossa face quando realmente é necessário. É uma pena que você
esteja pagando pelas imprudências do seu chefe. Diferente dele eu prezo e
estimo a vida de cada um dos meus homens. — Termino de limpar minhas mãos.
— O que mais Donzel queria?
— Vocês têm algo que pertence a ele, mas ele sabe que não conseguirá
enfrentá-los sozinho. — Respira com dificuldade. — Ele não vai parar até
conseguir o que quer.
— Agradeço as informações Draga. — Levanto jogando meu casaco
sobre os ombros, segurando o terno em um dos braços.
— Solte-o — ordeno para um dos seguranças que se mantém próximo a
nós. Ajeito minhas armas em minha cintura.
Sigo para o meu carro com a cabeça cheia. Com Jack tão instável não
considero uma boa hora para Donzel brincar conosco. A muitas coisas
acontecendo de uma única vez para que eu me preocupe com seus joguinhos. Ele
quer Dana em sua posse e isso ele não terá, aquela mulher pertence a mim
mesmo que eu não mereça uma redenção. Ela é a cópia exata da minha Ivi, e não
admitirei perdê-la uma segunda vez.
— Me mate — o homem grita me fazendo parar na porta.
Considero as possibilidades de mantê-lo vivo e deixar que seu chefe o
mate ou acabar com seu sofrimento agora. Como ele colaborou com as
informações que precisava saco minha atirando em sua cabeça.
— Deixe o corpo dele onde Fabrizio possa encontrá-lo e certifique-se de
que ninguém além dele o ache — ordeno e ando caminhando em direção ao meu
Jaguar.
Minha mente borbulha estratégias mesmo que eu queira por um momento
descansar e percebo que acabei passando tempo demais neste local. Em alta
velocidade sigo para mansão sentindo o vento bater contra o meu rosto em
rajadas cortantes bagunçando meus cabelos. Aproveito para respirar
profundamente e deixar que aquele emaranhado de novos problemas se esvaiam
por um momento, pois agora quero apenas pensar na pele aveludada e acetinada
daquela jovem e rebelde mulher que dorme sobre minha cama.
EVA

Ouço barulhos estranhos vindo do andar de baixo, procuro ignorar por ter
certeza que seria impossível alguém entrar nesta casa com a quantidade de
homens que se mantém do lado de fora, mas o som de coisas se quebrando me
deixam intrigada.
São quase quatro da manhã e o senhor manda chuva ainda não apareceu
para me importunar o que agradeço muito.
O silêncio reina no andar de baixo e me sinto tentada a tirar minhas
próprias conclusões. Jogo um robe sobre a camisola que visto e ando
despreocupadamente em direção ao hall de entrada onde ouço o barulho dos
cacos se arrastarem no chão.
Acreditei que encontraria Max, Jack ou Royal no corredor, mas nenhum
deles se fizeram presentes e a porta de seus quartos estão fechadas. Dou de
ombros imaginando que eles provavelmente estão dormindo e volto a andar até
as escadas que me dá a visão do andar de baixo.
Me surpreendo e arregalo os olhos ao ver Jack lutando para se manter em
pé em meio aos cacos de vidro. O belíssimo vaso de flores que enfeita a mesa de
centro do hall de entrada é somente um monte de migalhas brilhantes espalhadas
pelo chão.
Desço as escadas correndo ao ver que a qualquer momento ele vai cair
sobre os cacos e vai se machucar. Apoio minha mão em seu corpo o segurando e
o cheiro forte de álcool que emana de seu corpo me deixa enojada.
— Jack o que você está pensando? — O seguro com dificuldade por ele
ser alto e pesado.
— Não vou me casar, não vou — ele repete a frase embolada diversas
vezes.
— Vamos Jack vou te levar para o quarto. — Apoio seu braço em meu
ombro levando-o para escada com certa dificuldade. Suas pernas bambas não
seguem os comandos de seu corpo e encontram dificuldade para subir.
— Vamos lá Jack só mais alguns degraus. — Acabo amparando-o e
incentivando-o.
Ele resmunga coisas inaudível, mas continua a subir lentamente até
finalmente chegar ao andar de cima. O levo para seu quarto que fica ao lado do
de Dante, o amparo até sua cama e quando ele vai se deitar perde o equilíbrio
jogando todo seu peso sobre meu.
Uma forte pontada em minha costela me faz gemer de dor ao forçar
aquele local mais do que eu deveria, mas felizmente consigo mantê-lo em pé.
Economizando minhas forças e a dor empurro seu corpo fazendo com
que ele se desequilibre e caia sobre a cama.
Jack demora um pouco para perceber que está em um local seguro e
finalmente apoia o braço sobre os olhos, mas quando acredito que ele está
dormindo um fungar me chama a atenção.
— O que foi Jack? — Comovida com a cena na minha frente, sinto meu
peito se apertar e quero arrancar toda a dor desse homem.
Eu sei que não deveria me envolver tanto com essa família, sei que não
devo dançar de acordo com a música que envolve cada um deles, mas a verdade
é que já me embalei na sinfonia de suas almas e agora só quero compreendê-los.
Com dificuldade ele apoia as mãos no lençol se sentando sobre a cama.
Seus intensos olhos azuis estão perdidos, emergidos em mágoa, desespero e
solidão sem um único brilho de esperança.
Movida pela compaixão apoio minha mão em seus cabelos acariciando
os fios sedosos e suados com calma.
— Sana você também me odeia? — Ele embola as palavras errando meu
nome.
— Jamais te odiaria Jack — falo com sinceridade e calma.
Emburrado choraminga palavras que não compreendo esfregando os
olhos com os dedos.
— O que aconteceu? — Forço ele olhar para mim e por incontáveis
minutos ele me observa silencioso.
Seus braços se envolvem em minha cintura e sua testa repousa em meu
abdômen. Seu contanto tão íntimo e repentino me surpreende, mas procuro me
manter quieta deixando que ele receba o carinho que não costuma ter nesta casa.
— Odeio meu pai. — Suas mãos se apertam em minha roupa e o ódio
explicito em sua voz me faz compreendê-lo.
— Todos os seus irmãos odeiam Jack. Você não precisa se culpar ou se
julgar por isso. — –Acaricio seus cabelos negros com calma.
— Quero ir embora, mas a pessoas importante que preciso proteger. —
Ele suspira pesadamente.
— O que seu pai fez a vocês? — Continuo a passar meus dedos por seus
cabelos macios.
— Muitas coisas. — Sorri desgostoso. — Muitas coisas ruins —
murmura.
O ódio que sinto de Donatel se eleva e a vontade de colocar minhas mãos
nele me domina fazendo com que eu feche os punhos com força.
Escuto Jack resmungar e somente agora percebo que estou puxando seus
cabelos com certa força. Respiro profundamente apoiando minhas mãos em seus
ombros.
Donatel pagará por tudo o que ele fez. Respiro profundamente voltando
minha atenção a Jack.
— Não faço ideia do que ele possa ter feito, mas você não pode fugir e
abandonar seus irmãos Jack. Vocês não podem deixar que ele consiga desunir
vocês. Seja forte Jack. Eu sei que é difícil para você, mas não se esqueça que ela
também está sendo forçada a se casar. — Me afasto um pouco apoiando minhas
mãos em suas bochechas fazendo ele me olhar nos olhos.
Pensativo e incerto ele assente me observando.
— Você está certa. — Suspira derrotado.
— Eu sei que estou. — Pisco para ele rindo.
Repentinamente ele tenta se levantar e quase cai de cara no chão, forço
ele a se deitar novamente e tento mantê-lo quieto.
— Eu gosto de você. — Sorri com sinceridade se virando sobre a cama e
sem demora ele pega no sono.
Ver um homem como ele chorar é algo muito difícil, pois são homem que
se trancam em seus próprios mundos e não deixam ninguém de fora invadir sua
bolha protetora, mas Jack aceita e permite que eu entre em seu mundo sem se
preocupar com o que pode acontecer.
Cada um deles levam tristes cicatrizes do passado que o tornam ainda
mais fechados e resistentes. Comovida com seu estado crítico tanto físico quanto
mental. Retiro os seus sapatos os deixando do lado da cama, desabotoou seu
terno e sua camisa deixando que ele durma mais à vontade.
Sei que é errado fazer isso, mas vou aproveitar o momento único que
tenho em seu quarto para procurar por papeis que possam esclarecer minhas
dúvidas.
Sorrateiramente procuro em todas as gavetas e a única coisa que acho é
um álbum de foto antigo que contém fotos de todos quando eram pequenos.
Sorrio ao ver a alegria estampada no rosto dos quatro o que hoje é
impossível de se ver.
Na maioria das fotos os vejo sozinhos, mas em uma delas posso ver a
mãe deles e havia me esquecido da beleza natural e juvenil de Antonela.
Ela era uma mulher maravilhosa, glamorosa e sofisticada, mesmo que ela
estivesse em seu pior dia o sorriso doce em seu rosto escondia qualquer tristeza e
dor.
Em nenhuma das fotos vejo Antonela com Jack e, não sei dizer o que
pode ter acontecido. É um álbum aleatório que contém várias fotos de épocas
diferentes. Vejo também uma mulher parecida com Antonela e não lembro de
vê-la na mansão.
Me sinto em um verdadeiro labirinto quando se trata dos irmãos de
Dantes, pois a única pessoa que lembro nesta casa é ele, seu pai e Teresa.
Respiro profundamente ao passar pelas fotos e percebo que ao longo dos
anos o sorriso e a felicidade se apagam dos rostos de cada um dele.
Guardo novamente o álbum onde encontrei e observo a guitarra ao lado
da cama. Este é realmente o estilo de Jack. Acabo rindo e procuro deixar tudo
arrumado como estava para não perceberem minha invasão de privacidade.
Antes de sair do quarto, olho Jack mais uma vez e espero que ele possa
deixar essa moça entrar em seu coração e curar as suas feridas abertas que
sangram dia após dia.
Ao sair trombo com uma parede de músculos que cheira a sangue seco.
Me afasto observando Dante e ergo a sobrancelha ao olhar sua camisa toda
respingada de sangue. Seus olhos não nega o desgosto de me ver saindo do
quarto de seu irmão.
— O que faz no quarto de Jack? — diz grosseiramente.
— Nada que lhe interesse. — Cruzo os braços o ignorando. — Aliás
você deveria tomar um banho. — O meço de cima a baixo com desdém.
Seus olhos intensos e inexpressivos não permitem que eu leia os seus
pensamentos ou os movimentos de seu corpo. Para evitar uma briga tento passar
por ele, mas suas mãos me impedem de continuar.
— Dante... — Ele interrompe colando os lábios nos meus, enfiando sua
língua dentro da minha boca sem que eu tenha tempo para pensar.
Resmungo o empurrando pronta para acertá-lo com um soco, mas suas
mãos fortes são mais rápidas me imobilizando contra a parede.
Forço meu corpo contra o seu na tentativa de afastá-lo, mas seu corpo
musculoso me prende contra a parede fazendo com que sinta sua ereção contra
minha barriga.
Eu o odeio tanto, mas quando ele força uma proximidade tão grande não
consigo ignorar meus sentimentos e o meu corpo traidor responde
descaradamente aos seus toques e beijos. Colocando minhas razões acima dos
meus sentimentos mordo seus lábios com força fazendo ele se afastar passando a
língua nos lábios.
— Você está fedendo a sangue — falo irritada empurrando-o.
Me afasto o mais rápido possível e me desvencilho de seus braços que
tentam mais uma vez me segurar, seus olhos transbordam desejo e o acabo
ignorando.
— Vou limpar a bagunça de Jack no andar de baixo. — Tento passar, mas
seu corpo me impede de prosseguir.
— Você vem comigo pro banho. — Seu sorriso me faz revirar os olhos.
Esse homem consegue tirar qualquer um do sério somente com algumas
palavras e ações, mas ele também consegue me levar a loucura da mesma
maneira e percebo que meu jogo se torna a cada dia mais perigoso.
Já não posso mais confiar no meu corpo traidor, preciso que Teresa
encontre os papeis com o contrato de meu pai o quanto antes.

Dante
Observo a mulher a minha frente e não consigo controlar os desejos
desenfreados que percorrem meu corpo. Dana tem um poder sobre mim que
desconheço e me preocupa. Ela me seduz, suas curvas me tirando o fôlego e o
que mais me irrita é que tudo nela lembra minha preciosa Ivi, até mesmo o
cheiro natural de sua pele, mas chegar em casa e vê-la sair de dentro do quarto
de Jack com o cheiro amadeirado de seu perfume impregnado em seu corpo me
irrita mais do que deveria.
— Você chega fedendo a sangue e quer mandar em mim? Por favor
senhor Voyaller, me respeite. — Sua voz autoritária me instiga ainda mais.
Ela não me teme e adora me desafiar.
Vendo que não se livraria de mim tão facilmente, segue de braços
cruzados para o quarto com uma expressão irritada. Seus quadris fartos
balançam sensualmente. Esse lado selvagem só me instiga ainda a domá-la e tê-
la apenas para mim.
Descido a vê-la se desmanchar em meus braços caminho em direção ao
quarto atrás dela. Ela já está deitada coberta até a cabeça, mas seus olhos
raivosos seguem todos os meus movimentos com cuidado.
Retiro minhas armas da cintura depositando-as sobre a cômoda, logo em
seguida faço o mesmo com minhas roupas lentamente deixando que seus olhos
curiosos sigam meus movimentos.
Ao me ver completamente nu, se deita de costas para mim evitando me
olhar.
Aproveito esse momento para puxar as cobertas de seu corpo puxando
seu corpo de encontro ao meu. Em um movimento rápido ela acerta uma
joelhada em minha costela e aproveito esse momento para travar suas pernas a
jogando sobre meu ombro.
A força levo-a para o banheiro, ignoro completamente seus gritos e seu
ataque de raiva, pois sei que seu corpo quer o mesmo que eu.
Aproveito para morder sua bunda que está bem próxima ao meu rosto e
recebo uma cotovela na coluna que provavelmente vai me render dores amanhã.
— Eu juro que vou te matar enquanto você dorme. — Luta bravamente
para se desvencilhar de meus bravos.
Mesmo recebendo pancadas constantes em minhas costas a posição que
ela está desfavorece seus ataques. Entro no box e ligo o chuveiro molhando a
nós dois e depois de minutos lutando ela desiste ofegante.
Deixo seu corpo molhado escorregar pelo meu parando em minha frente,
apoio minha mão em seu rosto fazendo ela olhar em meus olhos.
— Acabou o ataque de raiva? — pergunto erguendo uma sobrancelha.
— Eu espero que você morra. — Ameaça de me dar uma cabeçada, mas
para ao sentir meus dedos se enrolarem em seus cabelos.
— Eu gosto dessa selvageria. Me excita — sussurro em seu ouvido.
— Te odeio — murmura, mas o tom de desejo explícito em sua voz me
indica que venci por hoje.
— O Cheiro de Jack está em seu corpo e isso me irrita. Você é minha. —
Passo as mãos em seus cabelos molhados que caem sobre os seus olhos.
— Não sou sua. Não sou de ninguém. Eu não pertenço a você. — Ela
apoia a mão sobre o meu peito me afastando sem brutalidade.
— Enquanto estiver aqui senhorita Dana. É minha e ninguém tem o
direito de te tocar a não ser eu. Espero que Jack não tenha tentado nada, senão...
— Ela me interrompe irritada.
— Me poupe das suas ameaças senhor Voyaller. Jack chegou bêbado por
sua culpa e só fiz o que me pediu, lhe ajudei. E só para deixar claro não te devo
satisfações, você nem mesmo é meu chefe, afinal não me aceitou na máfia. —
Franze as sobrancelhas focando seus olhos em meu rosto para evitar meu corpo
nu.
— Sagaz... — Sorrio.
— Sempre — ela rebate.
— Mesmo que se negue a aceitar seu corpo se entrega aos meus toques
— sussurro próximo ao seu ouvido a observando.
— Mesmo que meu corpo lhe queira, isso não te dá o direito de me tocar.
— Seus olhos faíscam irritados e raivosos.
— O que você esconde Dana? — pergunto inquieto. — Por que está
aqui? Eu sei que se mantém nesta casa por livre e espontânea vontade. Você é
forte e poderia exigir sua liberdade de várias maneiras, mas não o faz. —
Observo atentamente suas reações e uma expressão de dúvida e incerteza se
instala em sua face. — Eu não sou bobo Dana, sei que quer algo de mim, mas
ainda não descobri o que.
Ela tem capacidade suficiente para colocar meus homens para dormir por
horas. Seus movimentos são graciosos, leves e certeiro. A harmonia de seu corpo
com a luta parece fazer parte dos seus genes, da sua linhagem, ela é única, por
esses motivos ordenei que meus homens usem armas com tranquilizantes caso
seja necessário, pois não quero machucá-la.
— O que quer de mim? — ouso perguntar e um sorriso surge em seus
lábios.
— A princípio queria minha tão sonhada vingança. Já lhe expliquei os
motivos. — Desliga o chuveiro deixando apenas a fumaça da água pairar sobre o
ar. — Agora quero descobrir mais sobre você e seus irmãos. Entender o que faz
vocês serem tão fechados e solitários, então me deixa entrar no seu coração
Dante. — Seus olhos esperançosos me enviam uma estranha sensação de paz
algo que não sinto a muito tempo, mas por outro lado meus instintos me mantém
alerta.
— Meu coração é um lugar sombrio Dana. Não há nada de bom nele. —
Junto as sobrancelhas sentindo o peso da culpa pesar em meus ombros.
— O verdadeiro problema senhor Voyaller é que você não confia em
mim e eu estou cansada desse jogo de saber quem pode mais. — Cruza os braços
impedido qualquer aproximação. — Eu pelo menos estou tentando entendê-los e
você quer apenas se afogar em meu corpo. — Passa por mim deixando essas
palavras.
Derrotado suspiro pesadamente a deixando ir. Fecho os olhos lingando o
chuveiro novamente deixando o jato de água escorrer pelo corpo. Apoio as mãos
na parede sentindo meus pensamentos e sentimentos confusos.
Eu não deveria me submeter as vontades dessa mulher, mas a sinceridade
em todas as suas palavras me confunde e me destroem.
É um erro da minha parte acreditar que ela possa substituir Ivi, e a
resposta vem como um soco me bombardeando sem piedade.
Eva Becker está morta. Ela não irá voltar e muito menos reencarnar para
te fazer feliz Dante. Você é um homem vazio que merece toda a dor possível,
você merece sofrer.
Minha mente faz questão de me destruir sem piedade.
Suspiro pesadamente ensaboando meu corpo deixando meus
pensamentos me assombrarem e ao sair do banho visto um dos meus ternos
seguindo para o meu escritório mais cedo.
EVA

Depois da nossa conversa no banheiro — que não foi nem um pouco


normal, afinal não é fácil se concentrar quando um homem do nível de Dante
está nu em sua frente —, ele passou a me evitar e finalmente percebi que não
adianta atender as suas vontades e não obter sua confiança, pois na verdade
preciso que ele se abra comigo ou não terei resultados sobre o que quero.
Por mais que as palavras de Teresa me deixem pensativa quanto aos
sentimentos e eu saiba que ele se martiriza por achar que morri, pois é visível o
seu sofrimento. Nada muda o fato que atirou em meu peito pronto para me matar
mesmo tendo jurando lealdade e proteção na nossa infância, afinal sempre soube
do lado negro da sua família.
Para ser sincera faz três dias que não conversamos, ele tem me evitado e
não faço questão de mudar, afinal ele nem mesmo tenta melhorar. É claro que
não posso exigir nada, já que não temos uma relação, mas se ele quer uma
aproximação da minha parte como mostra seus olhares de desejos, o mínimo que
espero é que ele tente melhorar.
Como não tenho nada para fazer e o sono não colabora comigo está noite,
me troque e segui para academia às cinco da manhã. Desde que cheguei a essa
casa não treinei e sinto minhas articulações mais rígidas devido à falta de um
bom alongamento.
Irritada com meus próprios pensamentos que não saem de Dante e os
motivos do seu suposto mal humor, soco o saco de areia com força tentando
liberar toda a adrenalina reprimida dentro de mim.
Depois de onze anos lutando contra os meus desejos e minha própria
traição, focando apenas na minha vingança é frustrante saber que ainda me sinto
atraída por ele.
Meus dedos começam a doer por não ter colocado uma luva ou enrolado
as mãos com uma faixa de proteção e mesmo assim continuo a socar o saco com
uma sequência de socos e chutes desordenados e aleatórios.
Dante é um verdadeiro cretino que não se importa com nada além de si
mesmo. Esse pensamento faz minha raiva aumentar em níveis alarmantes e no
momento quero trocar o saco de box pelo seu rosto.
Talvez eu não devesse ter afastado Dante daquela forma, mas ter tanto
contato físico com ele me desperta desejos sexuais absurdos que me levam a
longos e frustrantes banhos gelados.
Nas poucas semanas que passei tranca nesta casa percebi que não
importa quanto tempo você treine sua mente, seu corpo reagirá aos estímulos de
um amor que você tentou de todas as maneiras matar, e mostrará que você
inutilmente segue os instintos carnais negando suas razões.
Teresa não pode entrar no escritório de Donatel todos os dias, muito
menos passar horas dentro daquele local o que dificulta a sua procura pelos
papeis assinados por meu pai.
Pensar em Donatel me faz lembrar de suas falas e de suas ordens a Dante
no dia da morte dos meus familiares, então aproveito o pobre saco de areia para
descontar todo meu ódio reprimido por dias e acabo percebendo que o corte em
minha mão sangra um pouco.
Respiro profundamente acertando mais um soco no meio do saco e sorrio
com a ideia de colar uma foto de Dante nele.
— O saco de areia não tem culpa de nada senhorita. — A voz de Max me
tira dos meus pensamentos.
Estava tão distraída em meus pensamentos que não percebi Max se
aproximar.
— Oi Max. — O cumprimento rapidamente voltando a socar o saco de
areia com a mão que não está machucada.
— Já disse que o pobre saco de areia não tem culpa de nada. — Ele
segura o saco o mantendo parado.
Respiro profundamente e fico o encarando sem resposta. Queria apenas
continuar meu treino sem ser interrompida.
— Que bicho te mordeu? — Ele ergue uma de suas sobrancelhas me
observando.
— Nenhum Max. — Apoio as mãos no saco de areia o observando do
outro lado e somente agora sinto os efeitos e falta da luva de proteção ao sentir
as articulações dos meus dedos latejarem.
— Você e Dante brigaram por um acaso? Por favor se reconciliem, pois
ele está insuportável. — A súplica em seus olhos mostra que a situação
realmente está feia.
Acabo rindo do seu comentário e balanço os ombros com ironia.
— Desde quando temos algo? — Acabo rindo.
— Desde que ele te colocou dentro desta casa.
— Até onde eu sei sou apenas uma prisioneira que sabe demais e pode
ameaçar a imagem de vocês.
— Você tem noção que ninguém entra aqui Dana? Isso é um forte da
família. Os melhores homens entram e os piores morrem não tem segunda
chance ou meio termo e você consegue manejar Dante da maneira que quer. Ele
nunca aceitou mulheres aqui, Teresa é nossa única exceção e ela tem mais de 60
anos. — Sua voz cheia de dúvidas me faz sorrir.
— Vai Max pergunte de uma vez o que quer saber. Sei que não está aqui
apenas por estar preocupado com meu relacionamento com seu irmão. — Sei
que apesar de muito brincalhão e carismático ele é mais perspicaz do que
aparenta.
Falando nesses homens instáveis e complexos estou preocupada com
Jack, não o vejo o vejo a exatos três dias, desde que o ajudei naquela noite.
— Você é perspicaz. — Ele acaba rindo e colocando suas mãos dentro do
bolso da calça.
— Eu sei que vocês têm muitas coisas para me perguntar, então apenas
pergunte. — Acaricio meus dedos com calma.
— O que você quer de nós? Eu não compreendo o que somos para você e
o que te faz permanecer nesta casa. — Ele se encosta na parece me observando
duvidoso.
— Bom que eu saiba sou uma prisioneira Max. — Ergo a sobrancelha o
encarado.
— Não seja irônica. — Ele semicerra os olhos com irritação.
Uma coisa que essa família não tem é paciência e senso de humor.
— Não se exalte, já não basta ser odiada por Royal... — Ele me
interrompe.
— Royal não te odeia, ele só... — Faz uma pausa pensativo. — Não
confia em você — conclui balançando os ombros.
— Você quis dizer “NÓS” não confiamos em você. — Dou ênfase na
palavra nós e me sento em um dos bacos próximo ao vestiário da academia.
— Você não respondeu a minha pergunta. — Ele se senta ao meu lado.
— O que quero de vocês? — Penso um pouco antes de responder. —
Nem mesmo eu sei Max. — Respiro aprofundamento. — A princípio queria um
meio e uma forma de vingar a morte dos meus pais, já que Robert sempre
acreditou que o acidente que levou a morte dos dois foi premeditado, mas hoje
eu me sinto confusa. Não esperei que conheceria pessoas como você, Jack e
Royal — falo com calma.
— Pessoas como nós? — Ele ri. — Achou que Dante era o único
membro da família?
Maneio a cabeça em um sim.
— Não há muitas informações sobre vocês, não me lembro de ter revistas
ou repórteres seguindo os seus passos. — Dou de ombros.
— Não somos acostumados a aparecer na mídia, Dante paga um valor
alto para que nossas imagens sejam preservadas e o foco acaba caindo sobre ele,
ainda assim, nossos rostos aparecem em várias matérias. Talvez o fato de você
morar no Japão por tanto tempo tenha colaborado para não associar nossos
rostos, então compreendo o fato de não nós conhecer, mas ainda não
compreendo o que você quer. — Ele suspira curioso.
— Quero entender porque vocês são tão solitários e inexpressivos. —
Suspiro fixando meu olhar em um aparelho qualquer.
— Que diferença isso fará em sua vida? O que você pode fazer por nós
Dana? — Me observa confuso.
— Eu não sei Max, ainda não obtivi minhas respostas, mas queria poder
tirar essa dor que vocês carregam no peito. Não sei explicar, mas não consigo vê-
los imersos em suas dores e ficar quieta. Vocês sorriem, mas seus olhos não
condem a tristeza, vocês brincam, riem e comemoram, mas isso é apenas uma
faixada para suprir a dor que está escondida dentro de cada um de vocês — falo
mais do que deveria.
Max fixa seus olhos no chão pensativo com os braços apoiados nos
joelhos e as mãos entrelaçadas apoiando o queixo.
— Sei que Dante me trata melhor do que eu realmente mereço. Também
sei que não tenho o direito de me envolver na vida de vocês, mas eu sou teimosa
demais para ouvir a voz da minha própria consciência.
— Não sei o que pensar ou que dizer. Você é estranha. — Seus olhos se
voltam para mim ainda confusos, mas um pequeno sorriso brinca em seus lábios.
— Vocês são fechados demais e às vezes me pergunto por qual motivo
vocês lutam tanto?
Ele permanece em silêncio pensando em minhas palavras.
— Eu estou em busca da verdade Max e vocês estão em busca do quê?
Seu olhar se perde pela academia procurando uma resposta que em seu
subconsciente.
— Somos assassinos. Fomos criados para matar, extorquir e torturar, que
esperança pessoas assim tem? — Ri irônico apertando seus próprios dedos com
raiva.
— A esperança de encontrar algo que se vale a pena lutar. — Sorrio. —
Você pode ter sido obrigado a matar, extorquir e torturar, mas ninguém pode tirar
sua verdadeira essência Max. Só você não enxerga o quão maravilhoso é e pode
ser — falo com sinceridade, pois é a mais pura realidade.
Seus olhos assustados e surpresos se voltam para os meus ao ouvir as
minhas palavras e o pequeno sorriso que dança em seus lábios agora preenche o
seu rosto.
— Você é estranha. — Ele ri balançando a cabeça negativamente.
— Hum... escuto muito isso de vocês. — Dou de ombros fazendo uma
careta. — Eu gosto de ser estanha.
— Você também é incrível. — Suas palavras me surpreendem, nunca
pensei ouvir isso de algum deles. –Mas há muitas coisas que você não entende.
— Só fui sincera. — Desvio o olhar envergonhada dando de ombros. —
O que eu não entendo?
— Que nascemos nas trevas e não há luz para nós Dana, uma vez aqui
dentro, não há como sair. Compreende? Somo isso e seremos até a morte, por
mais que odiamos nosso destino e o que nos tornamos.
— Nunca é tarde para mudar.
— Não tem mudança, muito menos escolhas, nascemos aqui dentro e se
sairmos seremos caçados. Você entende? — questiona me observando pensativo.
Maneio a cabeça em negação, pois era verdade, não compreendia aonde
ele queria chegar.
— No nosso mundo Dana, você vive em uma falsa liberdade, tem poder,
nome, dinheiro e pode usufruir das leis legais e ilegais, mas isso tudo é apenas
uma fachada, afinal nunca poderemos ser realmente livres. Não há como sair da
máfia ou na primeira oportunidade que seus inimigos tiverem você morre.
Quando você caça, passa a ser caçado. Quando mata para encobrir rastros ou
para provar seu poder ganha novos inimigos que buscaram vingança pelos seus
entes queridos no futuro. Esse é nosso mundo, somos engolidos pela própria
escuridão que causamos.
O peso daquelas palavras me calam, e de certa forma entendo cada
virgula expressa por ele. Ele tinha total razão e eu era a prova vida de tudo o que
ele havia acabado de explicar.
Uma pessoa que buscava vingança pela morte dos seus entes queridos e
que foi vítima da brutalidade e da frieza do mundo em que vivem.
Ele se levantando batendo a mão em minha cabeça como se eu fosse uma
criança, olho para ele irritada batendo minha mão em seu braço.
— Odeio que fazem isso — murmuro me sentindo uma criança.
— As baixinhas sempre são as mais irritadas. — Provoca. –Não queria
lhe deixar chateada, não deveria dizer essas coisas a você.
— Vai a merda Max eu tenho um e setenta de altura. Que culpa eu tenho
se essa família só tem homens com dois metros de altura e não se preocupe,
compreendo o que disse e entendo, só nunca tinha parado para visualizar as
coisas por esse ângulo.
— Isso é uma calúnia, não tenho dois metros. — Se finge de ofendido
ignorando o que havia dito, talvez para quebrar o clima pesado que se instalou
no ambiente depois da nossa conversa.
— Calúnia? — A voz grossa de Dante rompe a sala e automaticamente
me viro o observando caminhar.
Ele prende minha atenção com seu colete e calça cinza que lhe dão um ar
charmoso e despojado, junto ao seu sobretudo marrom. Calmamente caminha em
nossa direção com as mãos dentro do bolso da calça.
Respiro profundamente e neste exato momento percebo o quanto esse
homem acaba com minha sanidade mental.
— Acho bom você limpar a baba Srta. Trion — Max sussurra próximo
ao meu ouvido.
Lanço um olhar ameaçador para ele que ri descontroladamente
balançando os ombros.
— Retiro tudo de bom que disse sobre você e realmente espero que arda
no fogo do inferno — falo rapidamente fazendo com que ele ria ainda mais.
— Pare de ser durona Dana, eu sei que essas palavras não vêm do seu
coração.
— Foda-se. — Dou de ombros enquanto Dante se encosta em um dos
aparelhos nos observando de uma certa distância.
— Max você poderia nos dar licença? Preciso conversar com a senhorita
Trion por um momento. — Vejo a relutância em suas palavras.
— Claro irmão. — Max deixa um beijo em meu rosto e sai logo em
seguida deixando uma piscadinha para mim.
Contenho a risada, pois sei que o homem a minha frente viria com
sermões desnecessários para cima de mim. Procuro também ignorar sua presença
enquanto enrolo minhas mãos nas faixas de proteção, afinal já faz três dias que
não conversamos e não faço a mínima ideia do que ele quer comigo neste exato
momento.
Dante continua em silêncio a minha frente e seus olhos segue
milimetricamente cada um dos meus movimentos, após terminar de enfaixar
uma mão começo o mesmo processo com a outra.
— Olhe para mim Dana. — Sua voz mansa me deixa intrigada.
— Para conversamos não preciso te olhar Dante, fale de uma vez o que
você quer. — Respiro profundamente contendo minha irritação.
— Como sempre tem uma resposta na ponta da língua. — Um pesado
suspiro sai de seus lábios.
— O que você quer Voyaller? — provoco.
— Tão irônica e impaciente. — Ele sustenta um sorriso malicioso nos
lábios.
— Faz três merdas de dias que você está me ignorando. Que droga você
quer agora? — Paro de enrolar a faixa de proteção na mão nervosa.
E lá se vai minha paciência, pois esse era o efeito que ele causa em mim,
uma hora estava tudo bem e bastava apenas alguns segundos para ter a imensa
vontade de esganá-lo sem piedade.
— Vem aqui Dana — ele pede educadamente, mas não consegue
esconder o tom autoritário de sua voz.
— Não tenho que fazer o que você quer ou o que você manda. — Volto a
enrolar minha mão com raiva e acabo desistindo ao perceber que havia enrolado
errado.
Ele observa tudo em silêncio com uma sobrancelha arqueada e evito
observar sua pose imparcial.
— Estou pedindo com educação desta vez Dana — ele insiste.
Meu ódio e minha raiva dominam meus pensamentos. Finalmente
percebo que não estou aqui para deixar meus sentimentos prevalecerem sobre
minhas razões, eu preciso da verdade e só conquistarei isso com sua confiança e
desta vez ele tem razão.
Engulo meu orgulho e baixo minha guarda sabendo que preciso me
aproximar, porém não consigo conter minha ironia.
— Ó grande mestre dos mestres o que desejas? — Balanço as mãos para
o alto revirando os olhos.
Seus intensos olhos azuis me observam desafiadores e seu maxilar
travado indica que ele está tentando controlar seus impulsos.
Em um movimento rápido Dante segura minhas mãos me encostando na
parede com certa força e a sua “delicadeza” não me surpreende.
— Desejo que pare de me tratar com tanta hostilidade e que nenhum
homem te toque, nem mesmo meus irmãos. — Ele sobe os lábios pelo meu
pescoço passando a língua onde Max beijou.
Fecho os olhos mordendo os lábios na tentativa de reprimir um suspiro
que quase escapa pelos meus lábios.
Ficar tão próxima de Dante não é bom, não é nem um pouco bom por
isso preciso me afastar desse homem o mais rápido possível, afinal ele mexe
com todos os meus sentimentos colocando em prova todas as minhas regras.
— Quanta possessividade com uma simples prisioneira senhor Voyaller
— sussurro próximo ao seu ouvido o provocando.
Eu sei que poderia simplesmente ignorá-lo, mas não consigo manter
minha boca fechada e não provocá-lo da mesma maneira que ele faz.
— Sou um cretino, possessivo, fodido, desgraçado que vai queimar no
fogo do inferno com orgulho, mas enquanto estiver aqui você é minha. — Suas
mãos soltam meus punhos e passeiam pelo meu corpo até chegar em meus seios.
Instigada com sua audácia e prepotência subo minhas mãos pelo seu
peitoral passado meus dedos por trás de seu pescoço, seus olhos atentos não
desviam dos meus e eu sei que ele não confia em mim a ponto de baixar toda a
sua guarda. Suavemente envolto meus dedos em seus cabelos negros e macios o
puxando com força, seu pescoço e seu queixo ficam exposto e um suspiro
involuntário escapa de seus lábios com a minha selvageria.
— Nunca. — Passo meus lábios por seu pescoço suavemente o
provocando. — Serei. — Mordisco seu queixo brincando com minha língua
naquele ponto. — Sua. — Puxo seus cabelos com força mordiscando seus lábios
inferiores.
Suas mãos se apertam em meus seios em resposta as minhas investidas e
seus olhos tomados pelo desejo não escodem a irritação de ser desafiado tão
abertamente.
— Você já é. — Sua voz irritada me faz rir.
Dante espalma suas mãos em minha bunda a apertando com certa força e
sem dificuldade me tira do chão fazendo com que eu entrelace minhas pernas em
sua cintura. Sem delicadeza ele me prendendo contra a parede de uma forma que
seu membro rígido pressione minha intimidade.
Insisto em resistir as suas investidas ao lembrar de tudo o que ele fez,
mas a vontade de me entregar aos seus toques, de sentir o seu corpo e me afogar
nos sentimentos que renascem em meu peito começa a falar mais alto.
Seus lábios passeiam pelo meu pescoço deixando suaves mordidas no
local. Forço me corpo contra o seu pressionando ainda mais nossas intimidades o
que me faz estremecer em expectativa.
Sua barba rala por fazer roça em meu pescoço e um forte arrepio passa
pela minha coluna. Dante encosta seus lábios em meu pescoço provocando-me
com sua língua que sobe por minha pele suavemente contornando aquele espaço
até meus lábios.
— Ei espere. — Resisto tentando me afastar, mas uma de suas mãos
desce até minha intimidade a acariciando por cima da roupa.
Tomada pelo prazer e pela vontade de senti-lo por completo me entrego
aos seus toques sem tentar resistir as suas investidas. Ppor mais que seja errado
só penso em me afogar no prazer que domina meu corpo.
Envolvo meus dedos nos cabelos de Dante com suavidade e avanço em
sua boca deixando que nossas línguas se encontrem em um beijo quente e
selvagem.
Ao receber minha aceitação ele não pensa duas vezes em puxar minha
calça junto da minha calcinha deixando livre aquele local para seus dedos
habilidosos brincarem em meu clitóris me arrancando gemidos de expectativa e
prazer.
— Dante. — Choramingo ao sentir meu corpo vibrar em busca de mais.
— Ainda não — sussurra próximo ao meu ouvido.
Seus dedos deslizam para o meu interior massageando-o e ao clitóris no
mesmo tempo. Jogo a cabeça para trás ao sentir os espasmos de prazer
dominarem meu corpo, minhas unhas se cravam no tecido do seu casco e quando
menos espero me desmancho em seus dedos gemendo alto.
Ofego apoiando minha cabeça sobre a parede tentando normalizar minha
respiração, mas fica difícil quando ele cola seus lábios nos meus em um beijo
intenso.
Sem perder tempo desabotoa sua calça deixando seu membro livre e se
encaixa entre minhas pernas deixando que seu membro deslize em meu interior e
por mais que eu tente reprimir meus gemidos, falho frustrantemente.
Deslizo meus por dentro da sua camisa acariciando seus músculos
enquanto ele se mantém parado observando meus olhos.
Dante não esconde o desejo explícito em seus olhos e suavemente seus
dedos acariciando minhas bochechas me jogando ao passado, onde sentir suas
caricias e me entregar aos seus toques era o que eu mais ansiava.
Encaro seus olhos em silêncio e posso ver a luta que ele trava dentro de
si ao observar meu rosto.
Eu não queria entendê-lo, mas entendo e vejo que o sofrimento em não
me ter mais ao seu lado é explícito e por mais que ele não se abra comigo
consigo ver sua dor e desespero, por conhecer e ter vivido no passado
juntamente dele.
Eu não queria pensar sobre, não queria jogar no passado e me lembrar
dos momentos bons e ruins que passamos. Não queria me lembrar daquela noite
e não queria ver aquela expressão de dor explicita em seus olhos, então apenas
ignoro todos os pensamentos que começam a me desestabilizar e o
beijo.
E como se ele entendesse meus pensamentos e lesse minha mente segue
meus comandos retribuindo o beijo. Seus quadris começam a se mover e ofego
ao sentir suas investidas em meu interior.
Passo minhas mãos pelo seu corpo tentando senti-lo cada vez mais, como
se quisesse desvendá-lo por completo, mas suas roupas atrapalhavam nosso
contato.
A intensidade de suas investidas aumenta me fazendo jogar a cabeça para
trás e gemer alto.
Seus lábios brincam em meu pescoço e sua mão massageia meu seio, a
intensidade de suas investidas aumentam e uma nuvem de prazer toma todo o
meu corpo e meus sentidos. Sinto o orgasmo se aproximar quando vozes do lado
de fora me assusta. Tento reprimir meus gemidos, mas fica difícil quando os
espasmos tomam conta do meu corpo e Dante se sente ainda mais instigado em
me fazer gemer.
O prazer que sinto é tão intenso que todo o extasse do momento domina
meus pensamentos me fazendo gemer alto enquanto gozo pela segunda vez. Para
abafar meus gemidos Dante cola seus lábios nos meus fazendo com que o som
não ecoe pela sala vazia.
Com mais alguns movimentos ele retira seu membro de dentro de mim
gozando em minha barriga e perna, não desgrudo meus lábios dos seus abafando
seu gemido rouco.
Ele encosta sua testa no meu ombro tentando acalmar nossas respirações,
mas às vozes se aproximam e nós distanciamos o mais rápido possível. Arrumo
minha postura e tento me limpar, mas por sua culpa me encontro toda melada,
suja e com as pernas bambas.
Tento de alguma maneira parecer mais apresentável, mas todo o lugar
grita sexo principalmente os cabelos bagunçados de Dante. O que o deixa
extremamente charmoso e sexy.
Sem muita demora ele está arrumando e impecável tirando seus cabelos
completamente bagunçados e as marcas das minhas unhas em seu pescoço.
— Tira esse casaco — digo com presa.
— Para quê? — Ele me olha sem entender nada.
— Vai logo — digo aflita.
— Se você quer outra rodada indico que façamos isso no quarto. — Ele
me olha todo cheio de si.
Reviro os olhos contendo minha vontade de socá-lo. Esse homem tem
que aprender a ser menos orgulhoso.
Vários de seus homens se aproximam e sem pensar duas vezes ataco
Dante com uma sequência de socos planejados e atordoado ele se defende, mas
não revida por estar surpreso.
É difícil fingir uma luta quando se está com as pernas bambas e a
respiração acelerada, continuo com as minhas investidas até Dante começar a
revidar os ataques na defensiva.
Seus homens ficam parado na porta e nos observam assustados e por
sorte consigo causar o impacto que eu queria, mas Dante começa a levar a luta a
sérios e suas investidas começam a pesar já que não consigo usar as pernas
adequadamente.
Ao perceber que ele usaria um ataque com força bruta para me parar
recuo rapidamente, pois sei que não daria conta de segurar seu ataque e acabo
me embolando em minhas pernas caindo sentada no chão. Sem perder tempo ele
monta em cima de mim segurando meus braços e travando meu corpo, gemo de
dor batendo a mão no chão me rendendo.
É humilhante perder para ele dessa maneira, mas seria muito pior ser
pega no flagra fazendo sexo dentro de uma academia com o homem que
possivelmente te “sequestrou”.
Vendo minha rendição Dante sai de cima de mim irritado e em um rápido
movimento me coloca de pé arrastando-me entre seus homens para a casa.
— Vai mais devagar — peço ofegante ao sentir meu corpo pedir um
descanso depois de dois orgasmos seguidos e uma luta inesperada.
Ele ignora subindo as escadas para o segundo andar como um furacão e
ao abrir a porta praticamente me joga para dentro batendo a porta.
— Que merda toda foi aquela? Por que começou me atacar do nada?
Depois você me acusa de te atacar sem motivos — ele grita completamente
exaltado.
Ergo a mão pedindo para que ele espere um momento e depois de
respirar profundamente e acalmar meus batimentos cardíacos grito de volta.
— Seu imbecil era somente uma encenação, eles iam perceber o que
estávamos fazendo se não fosse pela minha ideia brilhante — digo irritada.
— Ideia brilhante? Eu estava começando a levar aquela merda de luta a
sério. — Ele passa as mãos pelos cabelos nervosamente.
— Você acha que não percebi? Caramba você me tirou dois orgasmos
achou mesmo que conseguiria parar aquela droga de chute que você estava
pretendo me dar? — Acabo falando demais e ele ergue uma sobrancelha com
uma expressão vitoriosa.
— Quando você está nervosa diz coisas muito interessantes. — Um
grande sorriso preenche seu rosto e como um predador caminha em minha
direção pronto para atacar.
— Pode parar. — Ergo a mão indicando que é para ele se afastar, mas
suas mãos envolvem a minha me puxando contra seu corpo.
— Você me tira do sério garota, por que tem que ser tão parecida com
ela? Esse cheiro, esses olhos e esse cabelo, não deveriam ser assim. — Sem
deixar que eu responda Dante me beija com volúpia e me deita sobre a cama
impendido qualquer protesto da minha parte.
E eu estou tão cansada de lutar contra os meus desejos e pensamentos
que apenas me entrego.
Acordo enroscada no corpo de Dante, minha perna jogada sobre as suas,
meus braços agarrados ao seu abdômen e minha cabeça em seu peitoral forte e
malhado, respiro profundamente vendo que mais uma vez sucumbi aos desejos
da carne e para piorar a minha situação seu perfume inebriante ainda está
grudado em sua pele e agora na minha também.
Sabe aquela sensação de arrependimento? Aquela que você tem vontade
de se jogar de cima de um prédio de tão burra que você foi? Então estou
sentindo-a nesse exato momento, mas não sei ao certo se deveria senti-la ou se
deveria seguir meu coração bobo e iludido.
Me remexo esfregando nossos corpos nus um no outro, passo minha mão
pelo seu abdômen bem definido inconscientemente e acabo sentindo seus
músculos sarado entre meus dedos.
Esfrego os olhos com as mãos acreditando que Dante ainda está
dormindo e quero aproveitar esse momento para correr de seus braços, mas seus
olhos azuis observam todos os meus movimentos minuciosamente e nesse
momento percebo que o arrependimento deve ser bem maior do que eu
realmente estou sentido, pois parte de mim gosta de estar em seus braços dessa
maneira.
— Boa noite bela adormecida. — Seus lábios se curvam em um sorriso
sensual e galante enquanto seus braços flexionados apoiam sua cabeça
sensualmente.
O relógio ao lado indica que dormi enroscada em seus braços
praticamente o dia todo.
— Boa noite — digo emburrada esfregando meus olhos mais uma vez
para ter a certeza de que realmente cai em seus encantos de novo e infelizmente
percebo que era verdade.
— Nós temos uma festa as oito horas. — Me observa com cautela.
— Nós? — comento. — Não entendi este “nós” na frase — digo irônica.
— E aqui está minha menina novamente com toda sua ironia. — Ele
zomba rindo.
— Minha menina? — Dou ênfase na palavra minha.
— Minha. — Ele monta em cima de mim travando minhas pernas e
braços em um movimento rápido.
Até poderia me desvencilhar de seus braços fortes se quisesse, mas
realmente não estou com ânimo para começar uma briga neste exato momento.
— Minha desde o momento em que coloquei os olhos nesses cabelos cor
de fogo. — Conclui a frase com um sorriso cativante no canto dos lábios.
Ergo uma sobrancelha o encarando e seus olhos desafiadores se
escurecem ao observar meu corpo nu.
— Se não fosse essa maldita festa iria lhe satisfazer novamente. — Olha
dentro dos meus olhos sem deixar resquícios de dúvidas no ar e conhecendo bem
o homem a minha frente ele concluiria suas palavras com maestria.
Envergonhada desvio o olhar sem palavras e acabo observando uma de
suas cicatrizes na lateral de seu abdômen coberta por uma tatuagem de mandala,
queria saber o porquê Dante não gosta que toquem suas cicatrizes.
Saindo de cima de mim ele se deita ao meu lado novamente me
observando com cautela.
— Foi uma facada. — Seus olhos se voltam para o teto do quarto e acabo
me surpreendo ao perceber que ele se refere a cicatriz.
Inconscientemente aproximo minha mão do local querendo tocar aquele
local, mas logo me retenho observando-o.
— Posso? — Peço sua permissão e ele assente em silêncio.
Encosto suavemente meus dedos em sua pele seguindo a cicatriz de
tamanho médio e sinto seu corpo se tencionar ao sentir meus toques, sua
expressão calma muda para alerta e vejo que ele está se esforçando ao máximo
para deixar que eu toque aquele local.
— Como foi? — Acabo seguindo o desenho de seus músculos com os
dedos para sentir seu corpo relaxar novamente.
— Estava dormindo e meu pai simplesmente me atacou dizendo que
homens como nós devem ficar atentos a ataques noturno ou seriamos alvos
fácies. — Sua expressão calma me surpreende, mas seus olhos não escondem a
raiva que ele sente ao falar de Donatel.
— Quantas foram causadas por ele? — pergunto sem esconder meu ódio.
— A maioria adquiri em sessão de torturas e as outras foram em ataques
noturnos. Facadas, tiros, chicotadas, queimaduras entre outras, então
praticamente todas foram ele. — Ele suspira segurando minha mão fazendo com
que eu pare de tocar sua pele.
— -Quando começou tudo isso? — Tento reprimir a dor que sinto no
peito ao saber de todo o sofrimento que ele passou e uma parte de mim sente
pena, mas outra vibra sabendo que de certa forma ele sofreu assim como eu.
— Quando eu tinha oito anos ele começou a me preparar para tomar seu
lugar, minha única escapatória era ir todas as tardes na mansão Becker. — Ele
não consegue esconder sua expressão de dor e tristeza.
Arregalo os olhos e aquela sensação de satisfação ao saber de seu
sofrimento se desmancha rapidamente. Foi exatamente nessa época que seus
sorrisos sinceros diminuíram e a tristeza e o medo o dominaram, mas ele sempre
se manteve forte e nunca deixou de me visitar.
Quantas vezes perguntei sobre seus machucados e com um sorriso no
rosto ele inventava uma desculpa qualquer para me convencer.
Sentando na cama me puxa contra seu corpo encostando minha cabeça
em seu peito enquanto acaricia meus cabelos com suavidade.
— Não faz essa cara é por isso que não queria contar nada. — Ele
suspira.
— Desculpa. — Mordo os lábios sentindo o aperto no peito se
intensificar e contenho as lágrimas ao me lembrar do passado.
— Vamos nos atrasar e infelizmente não posso deixar de ir a esse evento.
— Me solta de seu abraço.
— Vou tomar banho e me arrumar. — Me levanto indo em direção ao
banheiro.
Antes que eu consiga chegar até o banheiro ele me segura pela cintura
me prendendo contra a parede, retira os meus cabelos das minhas costas
observando a tatuagem das minhas costas com curiosidade.
— Essa tatuagem me lembra algo. — Ele passa a mão pela minha
tatuagem a contornando com calma.
— É apenas uma fênix. — Tento soar o mais calma possível. — Vamos
nos atrasar. — Lembro e logo ele me solta.
Sinto um grande alívio e sigo para o banheiro rapidamente. Esse não é o
momento para ele se lembrar do símbolo dos Becker e colocar tudo o que venho
conquistando em prova.

Dante

Depois de ficar três dias sem conversar com Dana não consegui conter
meus desejos de tê-la só para mim e saber que meus irmãos estão cada vez mais
próximos dela me irrita, pois eles podem tocá-la, abraçá-la e conversar
naturalmente sem enfrentar toda a sua ironia e raiva e, quando tento fazer o
mesmo ela me rejeita, não deixando com que eu me aproxime.
Chego à conclusão de que a melhor coisa a se fazer no momento é deixar
que ela conheça um pouco mais sobre mim então conto a ela sobre minhas
cicatrizes.
Odeio que toquem, pois tenho uma estranha sensação de desconforto
como se a qualquer momento alguém fosse me atacar novamente, mas cedi
àquele momento apenas para ganhar um pouco mais da sua confiança.
Termino de colocar meu smoking arrumando minha gravata borboleta
com calma em meu pescoço enquanto fumo um cigarro apenas para acalmar a
adrenalina que percorre meu corpo.
Passo as mãos nos cabelos e mais uma vez a tatuagem de Dana retorna
aos meus pensamentos me lembrando de algo familiar. Eu não sei o que ela
esconde e por mais que Jack tenho feito pesquisas sobre sua vida algumas coisas
não se conectam e mesmo que eu tente desvendá-la não consigo, por isso pedi a
Jack para fazer pesquisas minuciosas sobre o passado de Dana. Ela é uma
mulher linda, que me fascina e esse sentimento me assusta, afinal, depois da
morte de Eva meus relacionamentos foram puramente sexuais, mas com Dana é
diferente e eu custo acreditar que a mulher que vejo em minha frente não é a
mulher que sempre amei.
Com esses pensamentos conturbados desço para o hall de entrada onde
Jack, Royal e Max estão. Dana provavelmente ainda não terminou de se trocar
então aproveito o momento para dispersar meus pensamentos inapropriados e
revisamos nossas coordenas sobre essa noite.
Essas festas não são tão simples e inofensivas quanto parece, já que
estamos invadindo o “território de Tizzano Gaudine” que acredita ter domínio
sobre a parte oeste da Itália, mas na verdade ele só é um gangster mal sucedido
que vem tumultuando os becos da minha preciosa Itália de uma forma que não
venho gostando.
Desde do meu avô temos domínio sobre toda a Itália e sempre que surge
um gangster querendo tomar o nosso espaço deixamos que se afundem sozinhos,
mas Tizzano de certa forma se mostrou de grande ajuda, porém não estamos nos
agradando com as suas reações ultimamente, afinal ele vem achando que tem
posse da parte oeste da Itália o que é uma grande ilusão criada pela sua própria
mente.
Jack ainda acha que devemos formar uma aliança com Tizzano para usá-
la como bem entendermos, mas o que não gosto é fato de que se formamos uma
aliança ele estaria sobre a proteção da nossa família e as regras da família são
claras quando se trata de contratos.
Não aceitamos nenhum tipo de traição.
Por isso o plano é simples e não me agrada nem um pouco. Testar a
confiança de Tizzano usando a beleza de Dana como isca.
Se gosto desse plano absurdo? É claro que não. Mas, para ser sincero só
vamos conseguir desmascará-lo e ver suas verdadeiras intenções dessa forma,
pois mesmo sendo um completo imbecil é esperto quando quer conquistar algo,
mas é facilmente influenciado por mulheres.
Um pequeno barulho no piso de porcelana faz com que eu desvie meus
olhos do mapa em minhas mãos e fixe-os na escada a minha frente. Dana desce
as escadas com uma sandália de salto alto prata e um vestido longo em um tom
bege que marca todas as suas curvas e conforme desce as escadas seus quadris
fartos rebolam de um lado para o outro prendendo minha atenção.
O que diabos Esther, estava pensando ao comprar esse vestido?
— Se algo der errado juro que vou surrar vocês três sem dó. — Jogo a
ameaça no ar caminhando até ela, afinal até o último momento fui contra usar
Dana.
— Não sabia que seus irmãos iam também. — Ela observa os três atrás
de mim.
— Você demorou. — Mudo de assunto.
— Não foi fácil esconder o chupão que deixou no meu pescoço senhor
Voyaller. — Um pequeno sorriso surge em seus lábios. — Sabia que gostava de
marcar suas vítimas, mas não dessa forma. — Ela não esconde seu sarcasmo.
Parece que quando as coisas começam a caminhar algo surge para
atrapalhar e regredir tudo o que consegui conquistar.
— Talvez devêssemos repetir a dose e marcar o outro lado para que
ninguém ouse tocá-la. — Seguro sua mão quando ela desce os últimos degraus.
— Talvez você deva me explicar os seus planos, pois sei que essa festa
não será como a primeira e que com certeza terei que seguir seus planos. —
Caminha elegantemente rebolando seu quadril maravilhoso marcado pelo
vestido acentuado. — Só quero lembrá-lo que estou desarmada.
— Os planos não foram meus e sinceramente estou odiando-o e odiando
muito mais essa merda de vestido. — Suspiro pesadamente. — Além disso sei
muito bem que você não precisa de armas para se defender.
— Foram as roupas que você comprou para mim. — Ela sorri vitoriosa.
— Estamos atrasados — Royal diz impaciente.
Jack e Max assoviam quando Dana se aproxima e sou obrigado a conter
minha possessividade.
— Estava preocupada com você Jack. — Dana solta minha mão e o
abraça com carinho. — Você está bem? — pergunta o observando com cautela.
— Hum... digamos que levando. — Ele dá de ombros.
— Você me deixou preocupada — diz brava e logo em seguida abraça
Max dando um beijo em seu rosto, quanto a Royal ela apenas maneia a cabeça
em um aceno não se aproximando muito.
— Você está linda Dana. — Royal desvia o olhar ao dizer aquelas
palavras e me surpreendo ao ver que ele está tentando agradá-la.
— Obrigada Royal você também está lindo. — Ela sorri deixando Royal
constrangido e envergonhado.
Acabo rindo com a cena, pois Royal pode ser durão, mas também é o
mais tímido.
— Vamos parar com os elogios e seguir ao encontro de Tizzano e
aproveitem para explicar o plano para Dana, já que foram vocês os responsáveis
pela ideia. — Jogo a bola para os meus irmãos
Royal toma frente e explica todo o plano para Dana que assente
concordando em colaborar, mas é visível em sua expressão que ela não gostou de
estar sendo usada dessa forma e nem mesmo a culpo, pois desde o início avisei
que não daria certo.
Sem mais demoras seguimos para um local privado onde está
acontecendo a festa. Dividimos o grupo em dois carros e fiz questão de levar
Dana apenas comigo e sua expressão fechada e silenciosa estava me
incomodando.
— Não deixe que Tizzano te toque tão intimamente. — Observo a
estrada, mas vejo ela me lançar um olhar furioso.
— Minha função é seduzi-lo querido — diz raivosa.
— Sem toques Dana, você não precisa tocá-lo e nem deixar ser tocada —
insisto irritado.
— Sério Dante? Acha mesmo que será fácil assim? — pergunta irônica.
— Acredito que esteja menosprezando seu inimigo.
Sou obrigado a me manter em silêncio já que ela tem total razão no que
está dizendo.
— Foi para isso que você tentou uma aproximação depois de me ignorar
três dias? Por que precisava do meu consentimento para ser a isca dos seus
planos? A não, vamos recolocar essa frase. Para você me usar como uma vadia
para seduzir seus clientes? Sinceramente Voyaller eu esperava mais de você. —
Ela despeja sua ira de uma vez.
— O plano não foi meu e se você acha que estou gostando está muito
enganada... — Ela me corta irritada.
— Claro que não foi seu. — Ri cruzando os braços. — Mas não se
preocupe, vou fazer tudo o que preciso para ganhar a porcaria da confiança que
você e seus irmãos almejam, mas quero deixar claro que não sou a porcaria do
seu brinquedo. — Seus olhos flamejantes me encaram com ódio e irritação.
— Como faço para enfiar na sua cabeça que a culpa não é minha? —
Seguro o volante do carro com força.
— Como faço para enfiar na sua cabeça que você concordou em me usar
da mesma maneira. — O tom de sua voz se altera.
Ela respira profundamente tentando se acalmar.
— Eu não me recusaria em te ajudar Dante, eu sei que sou forte e que
tenho capacidade suficiente para derrubar muitos homens, mas em nenhum
momento vocês pensaram em me usar pela minha força. — Seus olhos
magoados se voltam para mim. — Vocês só pensaram em usar meu corpo. E
sendo sincera, se vocês precisam da minha confiança. Deixo claro que preferia
assassinar alguém ou saquear a carga de um inimigo, a ser usada pelo meu
corpo. — Seu tom de voz mostra toda sua mágoa e tristeza.
Depois de suas palavras sou obrigado a me manter em silêncio e enxergar
meus erros.
Queria que tivéssemos mais tempo para conversar e então tentaria reparar
meus erros idiota, mas infelizmente não é assim.
Acredito que nunca amarei ninguém como amei Ivi, mas Dana é única
mulher que meche com os meus sentimentos de forma tão intensa e por um
momento acreditei que poderia me permitir.
— Dana... — Toco sua coxa por cima do vestido.
— Não me toque. — Ela empurra minha mão se encolhendo no banco.
Desisto de tentar uma aproximação, afinal ela não cederá tão facilmente.
Depois de alguns pesados minutos que mais se pareceram horas finalmente
encosto o carro e Dana sai batendo a porta sem me esperar.
Suspiro pesadamente entregando a chave para o frentista e vejo que essa
será uma longa noite que poderia ter sido evitada, mas por teimosia não foi.
EVA

Não sei porque estou tão surpresa e magoada por estar sendo usada como
objeto. Eu já deveria esperar isso de mafiosos, mas o problema é que mesmo
sabendo que são mafiosos e levam uma vida regada a bandidagem e
desonestidade, não consigo vê-los com esses olhos, pois a gentiliza sempre
prevalece em suas ações. Mas, eu sabia que chegaria o momento em que me
surpreenderia com cada um deles.
Também não esperava ser alguém especial já que Dante nem ao menos
sabe quem sou, entretanto, o mínimo que esperei foi ganhar o seu respeito e
consideração, afinal, eu nem me importaria de ajudá-los se ao menos minha
força e minhas capacidades tivessem sido colocadas em jogo, mas a única coisa
que olharam foi a beleza exótica de uma ruiva.
Desço do carro sem esperar a ajuda de Dante, estou irritada demais para
suportar sua possessividade e falsa gentileza. Não demora muito e Royal se
aproxima apoiando a mão na base da minha coluna.
Pelo que entendi sobre o plano, hoje serei acompanhante de Royal já que
ele é o mais impaciente dos quatro. Após respirar profundamente uma centena
de vezes coloco um sorriso no rosto observando o homem ao meu lado, que por
sinal está incrivelmente impecável em seu smoking preto, cabelos desgrenhados,
intensos e atentos olhos azuis acinzentados.
Sim, Royal é o mais atento dos quatro, seus olhos não perdem nada, ele é
incrivelmente sagaz e não abaixa a guarda por um segundo se quer.
Dante não tenta aproximação após nossa discussão e sinceramente
agradeço por isso, pois acabaria colocando tudo a perder por puro orgulho e
raiva.
Assumindo o meu papel de acompanhante, caminho em direção a entrada
com um sorriso no rosto e como imaginei é uma festa luxuosa e muito bem
organizada.
— Dana, ouvimos a sua conversa com Dante — Royal diz caminhando
ao meu lado com uma expressão fechada e como sempre sem sorrisos.
— Ouviu? — Ergo uma sobrancelha o encarando com pouca vontade.
Diferente dos outros Royal não é o tipo de homem que tenta se esconder
atrás de sorrisos falsos. Ele é rude, mandão e nada carismático. Bom, ele não
esconde seu lado sombrio de ninguém, está sempre exposto para qualquer um
que queira ver e muito menos tenta agradar àqueles a sua volta, essa é a sua
personalidade.
— Nossos carros têm escuta para melhor comunicação caso haja algum
imprevisto. Dante esqueceu de desligar e acabamos ouvindo boa parte do que
vocês discutiam. — Observo sua face procurando resquícios de culpa, mas a
única coisa que encontro são olhos atentos a cada movimento a nossa volta.
— Que ótimo, isso me poupa e me priva de mais discussões — balbucio
chateada.
— Não queríamos usá-la apenas pela sua beleza, sabemos que é forte. —
Tenta frustrantemente me convencer.
— Ótimo Royal. Você não me deve explicações, afinal, você nem mesmo
tenta me conhecer e me julga como uma ameaça. Sei que você espera qualquer
deslize da minha parte como uma ótima oportunidade para tirar minha vida e
dizer aos seus irmãos que você tinha razão... A novata realmente era uma
ameaça. — Despejo sobre ele minhas frustrações e raiva.
Ao observar seus olhos percebo que o atinge de uma forma que não
esperava, seus olhos azuis acinzentados me observam cheios de culpa, algo que
nunca vi estampado em sua face antes.
— Já estamos aqui e não podemos facilitar para Tizzano, mas saiba que
estou fazendo isso por puro orgulho da minha parte, pois realmente não preciso
ajudar vocês, mesmo sabendo que isso me renderia possíveis castigos da parte
do seu irmão egocêntrico. — Deixo claro me referindo a Dante.
Royal apenas opta pelo silêncio como na maioria das vezes e me guia
pelo salão com se fossemos um casal feliz. Jack e Max se camuflam entre os
convidados enquanto Dante faz questão de observar cada um dos meus
movimentos de longe.
Poucas pessoas vem nos cumprimentar — afinal a expressão fechada de
Royal espanta qualquer aproximação —, e eu agradeço por isso, quanto a Dante
já não posso dizer o mesmo, ele chama atenção e sua fama o torna o centro das
atenções.
Um homem alto e elegante vem em nossa direção, ele não é feio, mas
também não é bonito se comparado aos quatro homens que me acompanha.
Posso afirmar que ele esbanja uma beleza um pouco forçada. Cabelos castanhos
milimetricamente espetados e um sorriso sombrio nos lábios, sua altura passa a
ser pequena comparado aos dois metros de Royal, mas seu corpo esbanja
músculos saltados e bem definidos.
— Que honra receber a família Voyaller em minha humilde residência.
— Ele cumprimenta Royal e se volta para mim. — Essa é nossa belezinha da
noite? — pergunta animado segurando minha mão.
Royal trinca o maxilar e observa o homem com irritação e neste exato
momento percebo que seja lá quem organizou esse plano estava certamente
errado. Eu poderia estar com qualquer um deles, mas Royal é menos indicado de
todos.
— Sabe das Regras Tizzano — Royal diz em um tom grosseiro.
— Eu sei cara, só estou brincando, você é tão fechado. — Tizzano ri
batendo a mão no ombro de Royal que observa o braço de Tizzano de soslaio.
Isso vai ser pior do que imaginei, mantenho minha cara de paisagem e o
sorriso forçado no rosto apoiando a mão no braço de Royal para desviar sua
atenção do homem a nossa frente antes que ele degole Tizzano com um único
golpe.
— Bom, fiquem à vontade — Tizzano diz dando uma piscadinha mal
intencionada para mim. — Preciso cumprimentar mais algumas pessoas. —
Indica Dante do outro lado da sala.
Sem esperar uma resposta ele sai e somente agora percebo a aproximação
de Jack e Max intimidando o anfitrião. Já Dante está ocupado demais
conversando com um grupo de senhores, mas seus olhos hora ou outra se
encontra com os meus.
— Ele não vai se aproximar enquanto eu estiver por perto. — Royal solta
minha cintura. — Irei me afastar um pouco, Tizzano gosta de agir em silêncio, se
realmente queremos pegá-lo, nós temos que te deixar a vontade.
Concordo com um simples aceno de cabeça.
— Cuidado, eu sei que você é forte, mas esse homem é esperto. Ele se
interessou por você e sabendo que é minha acompanhante tentará de tudo para
tê-la. Você é um troféu para ele Dana. A mulher de um Voyaller, entenda que
isso faz de você um dos alvos mais almejados dessa festa. Todos querem nossas
cabeças e se para nós atingir for necessário lhe atingir, eles farão sem hesitar,
principalmente Tizzano que está em busca de poder. — Royal me observa com
certa preocupação.
— Eu sinceramente acho que vocês deveriam ter me dito isso antes, mas
não se preocupe, eu não sou tão ingênua quanto pareço. — Sorrio bebendo a taça
de champanhe que peguei de um garçom.
— Só tome cuidado — Royal balbucia se afastando, mas Jack e Max
continuam a me rodear me impedindo até mesmo que chegar ao bar e me servir
de uma bebida mais forte.
— Será que vocês podem sair da frente e me deixar fazer a porcaria do
meu trabalho? — ergunto irritada.
— Não queríamos...
— Calem a boca e sigam a porcaria do plano como foi combinado,
enquanto isso, eu vou pegar uma bebida mais forte e esperar o anfitrião
pacientemente se interessar por mim — murmuro com irritação caminhando em
direção ao bar sem esperar respostas ou questionamentos.
Me sento em um banquinho disposto em frente a bancada e sem demora
o barman se aproxima com lindo sorriso no rosto.
— Em que posso ajudá-la senhorita — pergunta com simpatia.
— Um martíne por favor — falo em um suspiro.
— Parece cansada jovem. — Ele ri anotando o pedido.
— Alguns contratempos inesperados — reclamo passando as mãos nos
cabelos enquanto ele prepara o drink com agilidade e depois de alguns minutos
despeja o líquido em uma taça.
— Aqui está. — Desliza o copo sobre o balcão.
— Obrigada — agradeço voltando meus olhos em direção a Dante, que
continua imponente em uma postura rígida e ereta perante os homens a sua
frente, mas seus olhos não se desviam de mim.
Volto minha atenção para as pessoas ao redor e percebo que Jack e Max
não se encontram nessa parte do salão e mesmo que Royal tente se camuflar
entre as pessoas falha miseravelmente, pois sua altura exagerada lhe coloca em
desvantagem, então seguro meu copo nas mãos e resolvo dar uma volta pelo
salão.
Caminho por entre as pessoas cumprimentando algumas mulheres que
param para me fazer perguntas desnecessárias e sem muita relevância naquele
momento, mas faço questão de espairecer e me envolver na conversa em alguns
momentos.
As horas se arrastam lentamente e atentamente sigo cada movimento de
Tizzano que não escode o desejo explícito em seus olhos pelo meu corpo.
Não queria participar deste tipo de plano, mas sei que preciso de um local
reservado se quero que ele se aproxime de mim, afinal ele não seria bobo o
suficiente de se aproximar enquanto os olhos de Dante estão cravados em mim.
Bebericando meu drink ando pelo salão e resolvo dar uma volta na
sacada que leva a uma área externa mais ampla e arejada. Alguns fumantes se
reúnem nesse espaço e apesar de não gostar do cheiro do cigarro que está
impregnado no ar preciso me distrair e não olhar para a cara de Dante ou
acabarei fazendo uma burrada e acertarei sua cara bonita com um belo soco.
Caminho lentamente e me encosto na grade de proteção observando um
jardim bem cuidado se estender a minha frente. Uma escadaria de pedra ao lado
esquerdo contorna a sacada até o jardim. Pondero se deveria descer e sentar em
um dos bancos embaixo das belas árvores floridas, mas me abstenho neste
pequeno local permitindo o ar fresco da noite invadir meus pulmões. O cheiro
suave das flores abaixa o nível de adrenalina e ódio que percorrem minhas
veias.
— Não fomos devidamente apresentados. — Uma mão grande pousa na
base da minha coluna e Tizzano se encosta na grade assim como eu.
— Acredito que seja melhor assim. — Brinco bebericando meu drink,
afinal não quero ficar bêbada.
Um sorriso se estende pelo rosto do homem ao meu lado e seus olhos
curiosos se voltam para mim.
— Eu acredito que não, pois realmente quero saber o nome da mulher
misteriosa que reserva uma beleza tão exótica e cativante. — Se vira para me
observar melhor.
O observo com um grande sorriso no rosto e finjo ter gostado da sua
cantada barata.
— Sendo assim. — Estendo minha mão em sua direção. — Prazer Dana.
Sem perder tempo Tizzano segura minha mão levando até os lábios onde
deposita um beijo demorado.
Ele é o tipo de homem galanteador, que tenta conquistar mulheres com
palavras bonitas e charme, mas isso não funciona comigo.
— O prazer é todo meu — sussurra acariciando minha mão.
Como ele está virado em minha direção não pode ver os olhos de Dante
cravados em suas costas e, ousadamente toca a abertura lateral do meu vestido
acariciando minha coxa. O que me leva a ter um intenso calafrio de nojo e
repulsa ao me lembrar o que estou fazendo.
— Como uma mulher tão linda é trocada por um bando de homens
interesseiros? — Enrola uma mecha dos meus cabelos em seus dedos se
referindo a Royal que conversava com alguns homens.
— Beleza não traz dinheiro a conta deles. — Ergo o drink rindo.
— Você tem razão, mas eu no lugar deles daria mais valor a mulher que
está ao meu lado. — Enche o peito ao dizer aquelas palavras.
— Infelizmente nem todos pensam igual a você. — Apoio a mão em seu
peito fixando meus olhos em Dante que se mantém com o olhar fixo em mim
segurando um copo de uísque com força exagerada.
Os dedos de Tizzano sobem por minha coxa e isso não me agrada nem
um pouco. Procuro me afastar voltando minha atenção para o jardim ao meu
lado, mas Tizzano se vê instigado a continuar sua aproximação desnecessária me
causado repulsa.
— Que tal mudar de time donzela? Seja minha. — Desce a mão por
meus braços.
— Acho que você está confundindo as coisas Tizzano. — Sorrio bebendo
um pouco mais da minha bebida e vejo sua expressão mudar.
Suas mãos se envolvem em meu cabelo com possessividade fazendo com
que eu olhe em seus olhos a força.
— Eu sei que essa gentileza vinda de você é falsa — ele rosna. — Você é
mais selvagem do que aparenta. — Puxa meu cabelo com força me obrigando a
virar o rosto em sua direção quando tento me soltar das suas mãos.
Fecho os punhos me contendo para não acertá-lo com um golpe que
quebraria um de seus braços e acabo rindo das suas palavras.
— Nunca disse que era santa. — Seguro sua mão indicando que não
estava gostando dessa reação. — Sugiro que me solte. — Esboço um sorriso
sínico.
Mordo os lábios contendo minha raiva e observo o homem a metros de
distância com ódio, pois se estou sendo submetida a uma situação humilhante
como essa, a culpa é inteiramente de Dante e de seus irmãos e nesse momento
me sinto apenas um objeto a ser usado, pois nem mesmo posso me defender.
Ele segura ainda mais forte meus cabelos forçando meu rosto em direção
ao seu. Seu nariz passa pelo meu pescoço onde ele inspira profundamente
lambeando o local.
— Cheirosa — murmura. — Saber que anda com um Voyaller me instiga
ainda mais a tê-la para mim — confessa descaradamente.
— Você sabe que não deve brincar com eles — murmuro irritada.
— Eles estão entretidos demais fechando novos contratos para se lembrar
de você ruivinha. — Ri com sarcasmo. — O dinheiro é mais importante.
— As pessoas podem nos ver. — Tento mais uma vez me livrar
pacificamente, mas falho.
— Aqui dentro ninguém é santo. — Passa sua língua nojenta em meu
pescoço me causando ânsia e repulsa.
O ódio toma todos os meus sentidos e quando vejo já torci o punho de
Tizzano fazendo ele soltar meus cabelos a força.
— Não me toque — rosno com nojo.
— Vadia. — Ele se solta das minhas mãos acertando um tapa em meu
rosto com as costas da mão. A parte de seus ossos acertam minha bochecha e a
outra parte meu nariz fazendo com que o sangue quente escorra até minha boca.
Tenho tempo apenas de tocar meu nariz antes de ver o corpo de Tizzano
ser lançado contra a porta de vidro que separa o salão da sacada com força bruta
fazendo ela se quebrar e ele cair sobre os cacos dentro do salão.
— Dana. — Dante tenta se aproximar e tocar meu rosto com uma
expressão de preocupação, mas minha única reação é desferir um tapa em seu
rosto.
— Eu tinha uma visão completamente diferente sobre a máfia 371 e
cheguei até mesmo admirar vocês, mas neste momento eu só sinto nojo — cuspo
as palavras com ódio sabendo que elas atingiram diretamente Dante.
A expressão de dor explicita em seus olhos quase me convence de que
ele possa estar arrependido, mas aquela encenação não me engana mais. Ele é
somente um homem vazio que não se importa com mais nada além dos seus
negócios.
Mesmo machucado Tizzano se levanta e parte para cima de Dante que
tem a única reação esperada. Revidar, ele nem mesmo perde tempo em olhar os
movimentos do homem que o ataca, apenas acerta golpes aleatórios e recebe
alguns poucos em sua costela e rosto, mas é como se não surtissem efeito algum.
Os convidados abrem espaço para os dois homens e os seguranças de
Tizzano começam a se aglomerar em volta dos dois. Jack e Max não deixam que
nenhum deles cheguem perto de Dante e mesmo que Royal tente tirar o irmão de
cima de Tizzano, é praticamente impossível quando seus olhos estão tomados
por fúria e ódio. Neste momento compreendo perfeitamente o apelido dado a
Dante, pois seus ataques agíeis e certeiros realmente lembra um dragão em fúria
e em nem um momento ele tenta recuar.
Um dos homens de Tizzano aponta sua arma para Dante e
automaticamente o desarmo acertando sua nuca com uma coronhada.
A única pessoa que pode matá-lo sou eu, não deixarei ninguém ter esse
privilégio.
O local vira um verdadeiro campo de guerra e muitos convidados se
retiram as presas da festa. Me sinto suja e cansada, minha mente me culpa de
várias formas e ao observar os olhos sombrios de Dante as lágrimas acabam
rolando pelos meus olhos inconscientemente, pois o homem a minha frente é o
mesmo de onze anos atrás.
Um tremor passa pelo meu corpo e uma estranha sensação de alerta me
indica perigo. Seus olhos vazios e sem vida tomam sua face e olhar aqueles
olhos só faz com que todas as minhas crenças e esperanças morram. As palavras
de Teresa já não fazem mais sentido, pois diante dos meus olhos eu reencontro o
monstro que matou minha família.
— Dan — sussurro para mim mesma e como se ele pudesse me ouvir
seus olhos tomados pela escuridão se voltam rapidamente para mim
inexpressivos.
É como se tivéssemos conectados e eu sei que assim como eu, ele
também pode me sentir. Mesmo se passando onze anos, mesmo depois de tanto
tempo ainda estamos conectados. Isso é tão estranho. Jamais acreditei nessas
coisas, mas é difícil não acreditar quando se está vivendo.
Fecho os olhos me sentindo perdida e desnorteada, as coisas deveriam ser
diferentes. Dante deveria ser um homem frio, sem sentimentos e brutal, não que
ele não seja, mas na maioria das vezes suas boas intenções se sobrepõem as suas
maldades.
O aperto em meu peito pesa minha alma e a dor em minha cabeça me
deixa perdida. Me sinto suja e usada por cada um deles e o fato de Tizzano ter
encostado em mim me deixa irritada.
Cansada de tudo o que venho vivendo por 26 anos da minha vida, desisto
de tudo. Eu não quero mais permanecer ao lado deles, não quero mais tentar
entender o homem a minha frente ou continuar remoendo o meu passado.
Aproveito o momento de distração dos quatro homens a minha volta e
passo pelas portas que levam a saída. Ao descer as escadas vejo o frentista
admirando o Jaguar branco de Dante sem se importar com o que acontece no
interior da festa.
Sem pensar duas vezes entro no carro e acelero deixando tudo para trás.
Eu não tenho muitas coisas, além de Robert, minha experiência em luta e a
herança e lembrança dos meus pais, mas sei que isso é o suficiente para me levar
a um lugar distante e novamente recomeçar minha vida.
Talvez deixe de vez a Itália ou talvez me mudasse para outra cidade, mas
as localidades de Veneza e Pádua já não fazem mais parte de mim. Dante deveria
ser morto de uma vez por todos e arrancado de dentro do meu coração.
Meus sentimentos estão confusos, eu não sei mais o que esperar ou
pensar. O peso em meus ombros triplicou e a proximidade de Dante me fez por
um misero segundo acreditar que tudo poderia ser diferente, mas não, aquele
homem nunca irá mudar, ele sempre será o monstro criado pelo pai e seguira
veementemente as ordens que lhe forem dadas, afinal ele fora criado para isso.
Matar, mentir e usar as pessoas da forma que bem entender.
Dirijo o carro de Dante sem rumo, afinal nem mesmo tenho onde me
esconder a não ser na casa de Robert e sei que roubar o carro de Dante não foi a
melhor opção a ser tomada, mas no momento estou pouco me importando e a
única coisa que quero no momento é um demorado banho para retirar o cheiro
horrível do perfume adocicado de Tizzano do meu corpo.
Sem me importar acelero o carro luxuoso pela rodovia indo em direção a
casa de Robert tentando espairecer minha mente que insiste em me atormentar,
mas me assusto ao ouvir vozes saírem pelo painel do carro.
— Dana onde você está? Dante está furioso, acho melhor você voltar ou
seremos obrigados a te seguir. — Escuto a voz preocupada de Jack pelos
autofalantes do carro.
— Dana pelo amor de Deus, se você tem um pouco de amor pelas nossas
vidas não bata esse carro. — Agora é Max que súplica pelo carro luxuoso.
Ignoro a escuta e continuo a dirigir em direção a casa de Robert em alta
velocidade sem me importar com a porcaria do carro.
— Nossos carros têm localizadores e nós vamos te encontrar. — Agora é
Royal com uma voz impaciente.
— Vão a merda — grito irritada apertando os botões do painel na
tentativa de desligar a escuta, mas falho miseravelmente.
Estaciono o carro em um lugar qualquer próximo a uma praça antes de
pegar a rodovia e faço questão de deixar as chaves no contato. Estou pouco me
importando se for roubado, na verdade, é exatamente isso que eu quero. A ideia
de ver Dante completamente irritado ao saber do roubo de seu carro preenche
meu peito de felicidade, mesmo que essa seja uma felicidade momentânea.
Dou sinal para um táxi e me acomodo nos bancos traseiros me sentindo
levemente aliviada por estar deixando tudo isso para trás. Passo o endereço de
Robert e ele segue em direção a rodovia.
Depois de longos e cansativos minutos o taxista para em frente à casa de
Robert. Peço para que ele espere um pouco e corro em direção a porta tocando a
campainha desesperadamente.
Depois de um pequeno tempo de espera um dos homens que mais amo
abre a porta me observando assustado.
— Eva o que aconteceu? — pergunta preocupado apoiando a mão em
meus ombros me puxando para um abraço. — Você está machucada. — sussurra
preocupado.
Evolvo meus braços envolva do seu corpo e permito que as lágrimas
rolem por meu rosto.
— O que acontece Eva, eu juro que vou matar aquele desgraçado. — Ele
apoia a mão em meu rosto fazendo com que eu olhe para ele.
— Estou bem — murmuro voltando a abraçar seu corpo esbelto, porém
definido.
— O que aconteceu? — pergunta mais uma vez me analisando de todas
as formas possíveis e toca o local onde Tizzano havia acertado.
Automaticamente faço uma careta ao sentir dor, mas nada era comparado
a frustração e angústia que dominava e borbulhava meu peito.
— Estou tão cansada, cansada de enfrentar tudo sozinha e carregar esse
imenso peso nas minhas costas Rob, simplesmente não aguento mais —
desabafo e me permito desabar em seus braços deixando as lágrimas lavem
minha alma.
Seus olhos compreensivos se fixam nos meus e ele suspira frustrado
beijando minha testa.
— Desculpe por não poder ajudá-la quanto a isso. — Apoia a mão em
minha cabeça me puxando contra seu peito.
— Tudo bem — resmungo me sentindo mais leve por estar em seus
braços protetores e quentes. — Eu estou sem dinheiro, preciso pagar o taxista. —
Aponto para o homem que buzina sem parar.
— Suba e tome um banho e depois me conte o que aconteceu. — Ele
beija novamente o topo da minha cabeça e vai até o taxista.
Sem reclamações subo e faço o que ele manda, entro no quarto que
deveria ser meu e encontro minha mala de armas intacta depositado ao lado da
cômoda. Sigo até o closet e encontro todas as minhas roupas milimetricamente
arrumadas.
Pego um dos meus pijamas preferidos e tomo um banho demorado
aproveitando para lavar meus cabelos e esfregar minha pele com uma força
exagerada afim de tirar o cheiro doce do perfume de Tizzano que se impregnou
em minha pele.
Saio do banho vestida com um pijama folgado e aconchegante, penteio
meus cabelos com calma e agradeço mentalmente pela água morna ter relaxado
meus músculos tensos. Uma pequena batida na porta faz com que meus olhos se
voltem para ela.
— Pode entrar Rob — falo em um tom que ele consiga me ouvir.
Colocando somente a cabeça por entre a porta ele sorri me observando.
— Vem, vamos jantar — me chama me analisando com seus lindos olhos
preocupados e cheio de ternura.
— Não estou com fome — comento frustrada.
— Eu fiz carne enrolada com batata e bacon — diz cheio de si.
— Me convenceu. — Acabo rindo e aceito seu convite por saber que
precisávamos passar mais tempo juntos, pois sempre acabo deixando Robert em
segundo plano colocando Dante acima de tudo, diferente de Robert que sempre
deixou toda a sua vida de lado para me apoiar e me proteger.
— Eu sabia que você não iria resistir — fala cheio de si. — Estou te
esperando na cozinha. — Fecha a porta.
Termino de pentear meus cabelos e desço para a cozinha onde encontro
Robert arrumando a mesa para nos servir. Ele provavelmente já havia jantado,
mas faz questão de me acompanhar e me alegrar, afinal ele sempre fez isso em
toda a sua vida e nunca se dá por satisfeito até arrancar gargalhadas dos meus
lábios.
— Eu senti sua falta. — Sem que ele espere o abraço, pois é a mais pura
realidade.
— Ei, o que está havendo? Essa demonstração excessiva de carinho me
assusta — fala assustado fingindo desespero.
— Para de ser bobo. — Acabo rindo e já sinto o peso e ódio se esvair
momentaneamente do meu peito, pois esses são os efeitos que Robert causam
em mim.
Paz e tranquilidade.
O resto da noite é regada de histórias de quando não estive aqui. Robert
faz questão de contar uma por uma, mesmo já tendo me contado diversas vezes
por telefone e sou obrigada a confessar que tudo se torna ainda mais engraçado
quando tenho ele a minha frente, demonstrando sua indignação a cada burrada
que fez em sua vida. Me alegro ao saber que pelo menos alguém está se
divertindo e gastando a fortuna dos Becker com dignidade, diferente de mim que
parei no tempo por vingança, mas estou disposta e empenhada em mudar e
avançar.
Acabamos conversando por horas a fio e me delicio com o prato que
Robert preparou, a carne suculenta se desmancha em minha língua a cada
garfada desse maravilhoso prato que somente ele sabe preparar com tanta
perfeição.
— Acho que vou me deitar — falo sonolenta.
— Eva, eu quero que você me perdoe. — Ele suspira passando a mão no
cabelo enquanto analisa o celular com uma expressão de tristeza.
Acabo franzindo as sobrancelhas sem entender o que ele estava dizendo.
— Donzel está me ameaçando e colocando sua vida em perigo, ele me
enviou vários tipos de avisos anônimos e até mesmo mandou um de seus
capangas na empresa para me persuadir. Ele sabe que não pode fazer nada contra
mim, mas está colocando sua vida em risco já que quer de todas as formas que
eu lhe “venda” para ele.
— Eu sei me defender, não precisa se preocupar quanto a isso. — Tento o
acalmar.
— Não é essa a questão, Donzel não mede esforços para ter o que quer e
se ele não tem, não hesita em se desfazer daquilo que o incomoda, ou seja, isso
coloca sua vida em perigo. — Apoia a mão sobre a minha.
— Eu não tenho medo. — Deixo claro.
— Mas eu tenho Eva e eu não tenho toda a preparação que ele tem para
te proteger — diz com pesar e depois de segundos ouço a campainha tocar.
Demoro mais do que eu deveria para assimilar o que está acontecendo e
me sinto traída pelo homem a minha frente. Ele aperta minha mão contra a sua e
automaticamente a puxo deixando explicito em meu rosto toda a minha
indignação e decepção.
— Você chamou Dante?! — O observo magoada.
— Me perdoe Eva, eu espero que você me entenda, não gosto que fique
naquela casa, nem ao lado desse homem, mas ele é único que pode te proteger de
Donzel. — Robert se levanta com uma expressão de culpa estampado em seu
rosto.
— Podíamos ter conversado sobre isso e juntos entrado em um acordo,
mas você preferiu o meio mais fácil. — O observo com certa raiva. — Se aliar
ao dragão. — Acabo rindo com ironia. — É sempre assim, sempre o Dragão.
— Eva não me olhe assim. Sabe que isso não me agrada. — Ele tenta se
explicar, mas nesse momento não quero ouvir suas desculpas ou explicações.
Estou me sentindo traída pela pessoa que mais confiei em minha vida, eu
esperava tudo de Robert, menos que um dia ele se aliaria à Dante, mesmo que
isso fosse pelo bem da minha segurança.
— Eu sei que você sabe se defender, mas Donzel tem muitos homens.
Ele é pior do que você pode imaginar e você precisa estar ao lado de alguém que
entenda o mundo dele. Eu pensei em várias possibilidades e até mesmo cogitei a
ideia de ir até a polícia, mas não há provas concretas que incrimine Donzel. —
Se explica tentando se aproximar, mas me afasto.
— Chega Robert. — A campainha toca mais uma vez. — Eu entendo que
fez isso para o meu bem, mas ainda me sinto traída — falo a verdade e
imediatamente ele se cala.
— Quero apenas te proteger. — Ele insiste.
— Sabe, eu acreditei que teria um lugar para voltar, mas não tenho. —
Engulo os sentimentos de fraqueza e traição, não deixando que as lágrimas que
insistem em querer rolar pelo meu rosto caiam.
Eu aprendi a ser forte, aprendi a matar todos os sentimentos que crescem
dentro do meu peito e não será isso que me fará fraquejar.
— Não me odeie, eu não posso correr o risco de te perder novamente.
— Tudo bem, já chega. Não peça para não me sentir traída nesse
momento, pois é exatamente assim que me sinto. Já disse que compreendo os
seus motivos, mas ainda dói saber que se aliou a Dante. — Sigo em direção a
porta sabendo que o homem que me esperava do lado de fora deveria estar
cuspindo fogo pelas ventas.
— -E... — Ergo a mão calando Robert.
— Não diga o meu nome, eu havia desistido de descobrir tudo, mas
agora que serei obrigada a conviver com ele novamente, continuarei com as
minhas pesquisas a fim de realizar minha vingança, então não roube isso de mim
também. — As minhas palavras lhe atingem como um tapa e sei que naquele
momento eu queria feri-lo, pois estou me sentindo traída e usada. E por mais que
suas intenções sejam boas, ele não tinha o direito de tomar essas decisões por
mim.
— Me perdoe, nunca quis ficar no seu caminho, meu objetivo sempre foi
lhe proteger acima de tudo. — As palavras saem em um fio de voz dos lábios de
Robert e percebo que o feri profundamente.
Eu não queria que as coisas fossem dessa maneira, não queria brigar com
a única pessoa que posso chamar de família, mas a dor em meu peito acaba me
deixando frustrada demais para pensar em meus atos.
Eu estou cansada, o dia foi um grande desastre e ter ido aquela festa com
Dante só serviu para me deixar pior. Eu quero descanso e sossego. Havia
desistido da minha vingança apenas para dar paz ao meu coração e mesmo que
vivesse com a dúvida sobre o passado dos meus pais e a ligação da minha
família com Donatel, já havia me conformado que tem certas coisas que
precisamos simplesmente enterrar, mas agora me vejo novamente sendo jogada
nos braços do homem que destruiu minha vida.
Abro a porta antes que Robert diga mais alguma coisa ou que eu
simplesmente o machuque mais. Se ele tem culpa por ter se aliado a Dante? É
claro que tem, mas esse foi o único meio que encontrou para me proteger da sua
maneira, mesmo que dói, mesmo que me machuque e me destruía, ele mais uma
vez colocou a minha segurança acima de qualquer outra coisa. E conhecendo
bem o homem com respiração ofegante, cabelos desarrumados, lábios cortados e
bochecha vermelha que está a minha frente, Robert não deve ter economizado
dinheiro para ter assinado um contrato de segurança com um Voyaller.
— Dana. — Seus olhos me analisam de cima a baixo.
Ergo a mão para que ele não se aproxime e muito menos continue com
suas ladainhas. Estou me sentindo fraca e exposta, e esse sentimento começava a
me irritar e me deixa vulnerável.
O sangue seco em sua sobrancelha me chama a atenção, a lateral direita
do seu olho está um pouco arroxeada e suas roupas toda amarrotadas. Atrás dele
vejo o carro em que Royal veio dirigindo e não me surpreendo por eles ainda
não terem encontrado o Jaguar, na verdade, ao me lembrar do Jaguar sinto um
forte calafrio passar pela minha coluna.
Ele ficará extremamente furioso quando descobrir que deixei seu carro
em um lugar qualquer com as chaves no contato.
Suas mãos grandes seguram as minhas e quando vejo seus braços já estão
envoltos ao meu corpo. Tento me afastar, pois não quero sentir nenhum afeto
pelos homens que se encontram a minha volta, mas sentir o calor de seu corpo e
o aconchego de seus braços faz meus sentimentos mais profundos vir à tona e
mesmo que eu tente segurar as lágrimas de decepção e frustração, elas rolam
pelo meu rosto sem permissão.
— Me odeie mais não fuja. Sei que sou um completo canalha, que não
merece a porcaria de um pingo de felicidade e que jamais devia ter aceito aquele
plano ridículo, mas por favor me perdoe. — As suas palavras só fazem meu
coração se quebrar ainda mais, e a mágoa transbordar em sentimentos de
fraqueza e dor.
Dante me aperta contra o seu peito e o cheiro de cigarro, misturado com
perfume e suor invade meus sentidos. Eu deveria me afastar, deveria sentir nojo,
mas ao contrário de tudo isso eu me sinto em paz, me sinto calma e de certa
forma protegida nos braços do homem que eu deveria odiar, talvez, pelo simples
fato de ser ele a pessoa que sempre esteve ao meu lado todos os dias da minha
vida até meus quinze anos de idade, mas nesse momento estou magoada demais
para perdoá-lo e cansada demais para expulsá-lo, por fim acabo apenas me
entregando aqueles sentimentos de fracasso, traição e derrota momentâneo.
E quanto a Robert, bom, não me sentia preparada perdoa-lo, então
simplesmente me mantenho em silêncio seguindo Dante até o carro sem olhar
para trás, pois não adianta correr, fugir ou complicar ainda mais a situação.
Robert agora tem um contrato de proteção com Dante, então querendo ou
não tenho que segui-lo até mesmo contra a minha vontade e apesar de estar de
pijama isso nem mesmo me incomoda, a frustração e humilhação eram muito
maior.
A verdade é que as pessoas não mudam, elas nunca foram aquilo que
você pensou e espero que fossem.

Dante
As coisas saíram pior do que eu poderia imaginar. É claro que
desmascarar Tizzano fazia parte do plano, mas não da maneira que acabou
acontecendo.
Foi inconsciente o meu surto de ódio, afinal eu não poderia deixar
Tizzano colocar as mãos em Dana daquela maneira. Só de me lembrar quero
socar seu rosto até ver o sangue jorrar de seu nariz novamente.
Confesso que se não fosse por Royal que conseguiu me tirar de cima
daquele homem, eu certamente teria o matado sem ao menos me importar com
as consequências e agradeço por aquela ser uma festa restrita e exclusiva para
pessoas fora lei, pois, se não, estaria com sérios problemas ao ter meu rosto
estampado nas revistas e jornais.
E a confusão da noite passado não para por aí, achei que Dana havia
conseguido desligar o localizador do meu Jaguar, mas a verdade é que ela
deixou meu carro preferido em um beco qualquer.
Até o momento não consigo me conformar que ela foi capaz de deixar
meu Jaguar dessa maneira. Quando finalmente consegui localizar meu carro ele
estava na área de desmanche do senhor Damasceno, que por sorte reconheceu o
emblema da família e me ligou imediatamente.
Nesse momento eu juro que queria estrangular Dana e torturá-la
lentamente, mas cheguei à conclusão de que mereci isso e com muito custo
acalmei meus ânimos me forçando a aceitar o que está acontecendo. Contudo,
para recuperar meu Jaguar das mãos de Damasceno tive que desembolsar uma
grana preta , uma vez que seus serviços nunca são de graça e manter uma boa
amizade com ele acaba sendo importante, afinal ele é um bom informante.
Juro que por um momento toquei minha arma, mas respirei
profundamente e lembrei que matá-la não faria as coisas melhorar. E o fato dela
se parecer tanto com Ivi, sempre acaba livrando seu pescoço de situações
trágicas como essa. Mas, eu sei que errei e envolvê-la com Tizzano foi um
péssimo plano, pois ver aquele homem tocando a minha mulher daquela maneira
me irrita até mesmo agora. Ele não tinha o direito de tocá-la daquela forma. Sem
contar que seus lindos olhos esverdeados cheios de mágoas me deixaram ainda
mais fora do sério.
Passos as mãos nos cabelos respirando profundamente. As coisas
estavam indo tão bem. Ela começou a me aceitar, começou a me tocar por
vontade própria e o que fiz em troca? A afastei completamente.
Eu sou um completo imbecil. Nunca me aproximei de mulher alguma,
pois sempre achei que deveria pagar meus pecados sozinhos até Dana aparecer,
até ela mudar meus pensamentos e colocar em prova tudo aquilo que lutei para
esquecer.
Dana é meu inferno na terra, como ela pode ser tão parecida com a
mulher que mais amei em minha vida? Eu até mesmo cheguei a acreditar que
Eva não havia morrido.
Isso é impossível certo? Eu a vi tombar em minha frente, vi o sangue
vivo escorrer de seu peito.
Eu a enterrei.
Então mesmo que meu corpo e coração queira acreditar que a mulher ao
meu lado é a mesma do passado, minha mente insiste em discordar, me tirando
da triste ilusão e jogando para fria realidade de que Eva está morta.
Depois de tanto me culpar percebi que essa era a chance para tentar me
redimir comigo mesmo e recomeçar, mas fiz tudo errado e mais uma vez regredir
à estaca zero com maestria.
Ainda estou esperando a pesquisa de Jack sobre a tatuagem que ela leva
nas costas, pois algo me diz que aquela fênix estranhamente me lembra algo e
mesmo que eu force minha memória aquelas chamas não ajudam minha mente.
Falando em Dana ela ficou trancada no quarto sem comer por três dias.
Não interferi, não tentei aproximação, muito menos tentei puxar assunto com
ela, pois na verdade eu nem sei o que dizer, mas essa situação está começando a
me irritar.
Não nego que sou a merda de um homem possessivo, cabeça dura,
teimoso, prepotente, calculista e mandão, mas caramba essa mulher consegue
superar todos os recordes de teimosia.
E aqui estou quebrando a cabeça para conseguir de alguma maneira me
redimir, mas todos os meios que encontrei até agora foram barrados por uma
ferra brava que me ataca sem dó, não vejo uma maneira de fazer com que ela me
perdoe pacificamente.
Até mesmo tentei o usar o roubo do Jaguar a meu favor, mas foi a pior
coisa que fiz. Ela aproveitou a oportunidade para jogar toda a merda no
ventilador e fez questão de deixar o ventilador virado para o meu lado.
Nesses dias fiz coisas que jamais fiz na minha vida. Na verdade, fiz
coisas que nunca imaginei fazer, coisa que foge literalmente dos meus
paradigmas e ferem diretamente o meu orgulho.
Mandei flores com pedidos de desculpas e encontrei as flores na lata do
lixo. Teresa as pegou e colocou em um vaso, pois disse que as flores não têm
culpa por eu ser um idiota de nível superior.
Poxa até Teresa está do lado dela, isso me mágoa profundamente.
Preparei seu café da manhã e deixei uma carta com mais um pedido de
desculpa. Quando cheguei no quarto tudo estava da mesma maneira que eu havia
deixado.
Insisti em mais uma tentativa e comprei um conjunto de joias caríssimo
com esmeraldas, pois acho que combinam com seus lindos olhos e fiz questão de
escrever uma carta a mão com mais um pedido de desculpas. Ela simplesmente
deixou tudo sobre a cômoda junto com a carta intacta.
Aperto as mãos em punhos sinto e minha paciência se esgotar, ela não
tem a decência nem mesmo de ler o que está escrito.
Encaro o computador por mais tempo do que gostaria e desisto de enviar
presentes com pedidos de desculpas para essa mulher.
Meus pensamentos são quebrados quando Royal entra em meu escritório
sem ao menos bater na porta. Eu juro que odeio que entrem sem bater.
— Você deve ter um bom motivo para entrar assim. — Ergo uma
sobrancelha observando-o com irritação.
— Esse não é momento. — Suspira. — Donatel está voltando e você
sabe que Dana está em perigo. Ele não aceitará uma mulher nesta casa. Você
sabe que ele é imprevisível e pode aparecer a qualquer hora, como pode
simplesmente sumir como sempre faz. — Ele suspira pesadamente.
Não esperava ver nosso pai tão cedo e confesso que essa notícia não me
agrada nem um pouco.
— Temos uma aliança com Donzel e uma com Trion, sabemos que
Donzel está armando algo contra a Dana e conhecendo bem nosso pai ele ficará
no lado de maior força, ou seja, ao lado de Donzel — falo com calma coçando o
queixo.
Royal cruza os braços preocupado e tenta analisar a situação com calma,
mas o único problema neste momento é que não há como ter calma.
— Ele pode muito bem diminuir nossas defesas e deixar Donzel capturar
Dana como se não tivesse conseguido protegê-la, não dá para prever a mente
desse velho. — Me levanto acendendo um cigarro.
— Dana complicará tudo se continuar com essa teimosia de não falar
conosco e conhecendo bem a personalidade irritante daquela garota certamente
tentará enfrentar Donatel.
— Então acho bom você e Jack concertar o que fizeram na festa. —
Solto a fumaça dos meus pulmões o olhando com ira.
Suspira pensativo e sei que por mais durão e cabeça dura que Royal seja,
ele é um dos mais protetores e preocupados, pois quando o quesito é a segurança
de uma pessoa querida, ele realiza seu trabalho com perfeição, mas quando se
trata da própria segurança ele é relaxado e despreocupado.
Sem dizer nada e imerso em seus próprios pensamentos, Royal, sai da
sala da mesma maneira que entrou e antes que me irrite com sua falta de
educação, trago com cigarro em fortes lufadas tentando acalmar meus ânimos
que ultimamente estavam a flor da pele.
Odeio quando as coisas saem do meu controle dessa forma.
Arrumo a papelada que está sobre a mesa em um papel pardo para deixar
com um dos meus advogados e me levantando quando escuto uma batida na
porta.
— Entre. — Apago o cigarro no cinzeiro de cristal a minha frente.
Jack entra com um envelope nas mãos me olhando confuso e pensativo.
— A pesquisa que você pediu. — Coloca o papel sobre a mesa.
— O que encontrou? — pergunto curioso.
— Não consegui encontrar muitas coisas de início, tudo que se relaciona
ao nome Dana Trion é muito vago e superficial, então me senti um pouco
instigado a procurar mais, afinal, ninguém consegue ser tão certinho a ponto de
ter uma história tão supérflua. — Jack passa as mãos nos cabelos me entregando
o papel.
— Isso quer dizer que ela está mentindo? — Ergo a sobrancelha.
— Sim, ela está mentindo, assim como Robert Trion. Basicamente o que
encontrei até mesmo quebra nosso contrato com Trion, afinal, o contrato
esclarece que qualquer mentira levaria a uma multa e a quebra do contrato, mas
ele afirmou que faria qualquer coisa por sua irmã, porém ela não é irmã de
Robert...
— Não são irmãos? — rosno. — Como assim? — Seguro o envelope
com irritação.
— Não consegui entender muito bem, fui obrigado a hackear o
computador de assuntos internos da polícia — o que não foi nada fácil —, e sua
pasta estava no arquivo morto, mas ela foi a única sobrevivente depois de um
ataque criminoso a sua família. Agora quanto a tatuagem não encontrei nada
sobre a fênix, mas o símbolo de sua família era uma Lótus. Me desculpe irmão,
mas não encontrei muitas coisas, parece que sua história foi apagada — Jack diz
duvidoso.
Sinto meu coração bombardear meu peito com força bruta ao ouvir
aquelas palavras.
— Isso só pode ser uma grande brincadeira. — Acabo rindo e quando
vou abrir os papeis a minha frente minhas mãos estão tremulas.
— Irmão?
Ao puxar os papeis me sinto franco a ponto de ter que me apoiar na
mesa, mesmo estando sentado. Ver aquela Lótus me faz ter vontade de vomitar e
observar o nome Eva Becker no topo do papel me causa dormência no peito.
— Isso não pode ser real. — Acabo rindo com desgosto. — Por que ela
mentiu?
— Ei irmão, eu não sabia que você gostava tanto dela. — Jack se levanta
preocupado.
Minhas vistas se embaçam e uma rajada de ódio misturado com desgosto
e desespero rompe minha garganta em um rugido. Quando vejo me coloco de pé
acertando a mesa com força bruta vendo a mesma se quebrar.
Jack se levanta e se afasta assustado. Acredito que ele nunca me viu em
tamanho ódio e raiva como agora.
— Aquela filha da mãe me paga — grito.
Puxo minha mão de volta e vejo o sangue pingar dos meus dedos, mas a
dor neste momento não é nem um pouco relevante ao emaranhado de
sentimentos que me tomam. Por onze anos rastejei na minha própria desgraça e
ela estava viva. Viva e debaixo do meu teto, me fazendo de palhaço e de otário.
Nem mesmo vejo Jack apenas seguro os papeis com força abrindo a porta
com tudo.
Ela iria me ouvir e iria ouvir muito.
EVA

Estou cansada de ficar nessa casa e ter que olhar a cara do Dante e dos
seus irmãos, queria pelo menos passear por Veneza e visitar a Basílica de São
Marcos, mas não posso, pois tenho que ficar trancada nesta mansão e fazer as
vontades do senhor todo poderoso, suspiro irritada. Além de estar cansada de me
lamentar pela festa e pela traição de Robert, então simplesmente me levanto e
tomo um banho revigorante na intenção de me alegrar um pouco.
Ao sair do banho encontro mais uma carta com o pedido de desculpas do
Dante, porém, mais uma vez, ignoro a carta e vou para o closet me trocar para
encontrar Teresa. Ela é minha única salvação e desabafar com ela sempre faz
minha mente clarear e o aperto em meu peito diminuir.
Escuto baterem na porta e não respondo, não quero conversar com
ninguém, nem ouvir os pedidos de desculpas e as tentativas falhas de explicação
do Jack ou do Max, ou de qualquer um deles, mas a insistência nas batidas
começa a irritar.
— Não quero conversar Jack — grito pedindo aos céus que ele vá
embora.
— Não é o Jack, Dana. — Escuto a voz de Royal do outro lado e isso me
surpreende.
— Também não quero falar com você Royal. — Suspiro.
— Eu preciso que me escute. — Sua voz agitada me faz suspirar.
Devo ser a maior idiota de todos os tempos por estar cogitando a possível
aproximação de um deles, mas acabo cedendo por não conseguir ignorar aquela
voz suplicante.
— Entre. — Me encosto na porta do banheiro esperando.
Assim que entra fecha a porta se encostando nela enquanto me observava
do outro lado, seus olhos perdidos me fazem suspirar.
— Fale de uma vez o que quer Royal. — Balanço a perna
impacientemente.
— Sei que está brava, que neste momento se sente traída não só por nós,
mas pelo seu irmão, porém, quero que compreenda que ele fez isso para o seu
bem, mas não vim aqui para falar de Robert e sim da festa. Sei que deveria ter
pedido seu consentimento antes de te envolver em um plano como aquele, mas
tudo isso é novo para mim e confiar em você pode ser mais difícil do que parece
então acabei me sentindo instigado a testar sua confiança. — Ele olha para
baixo.
— Não te culpo Royal, você não precisa confiar em mim, eu sei que sou
uma intrusa no seu mundo, mas também não posso negar que me senti usada. —
Suspiro cruzando os braços.
— De alguma maneira queria provar a mim mesmo que você fazia parte
da família, queria te ver como Jack e Max te veem. Não conseguia entender por
que Dante te deu a liberdade de estar nesta casa ou porque você consegue
prender a nossa atenção, mas agora entendo que você é uma pessoa incrível.
Você não precisa de muito para que todos a sua volta se aproximem. — Ele olha
em meus olhos e não sei o que responder.
— Ainda não te entendo — digo por fim.
— Não quero que você odeie meus irmãos por minha culpa, foi um erro
tentar provar o que estava claro perante os meus olhos, mas simplesmente não
consegui ignorar minhas dúvidas. Te protegerei pela mulher incrível que você é,
mesmo em uma situação absurda você enfrentou tudo de cabeça erguida e seguiu
o plano como ordenado. — A sinceridade em seus olhos me deixa confusa. — A
culpa do final trágico que a festa teve não foi sua e sim do meu irmão ciumento.
— Suspiro pesadamente.
— Obrigada! — me limito em dizer.
— Sabe, mesmo por trás dessa mulher forte e durona, eu consigo ver que
por trás desses olhos flamejantes, você esconde uma dor tão profunda como cada
um de nós, então talvez não sejamos tão diferentes assim. — Sua expressão séria
e impassível continua a mesma, mas seus olhos intensos parece refletir todos os
segredos que custo a guarda e por um momento me sinto exposta.
E acredito que não consigo esconder a surpresa, pois a expressão em seu
rosto muda para compreensão.
— Sempre haverá alguém que conseguirá ver através de sorrisos
forçados, Dana. — Ele pisca cruzando os braços, após apoiar o pé na porta.
— Você me surpreende Royal, mas o fato de conseguir ver através de
mim não faz com que minha mágoa por você diminua. — Sorrio recuperando
minha sanidade mental depois de me sentir um livro aberto.
— Sabe, talvez precisássemos da sua presença para aprendermos a ser
mais humanos e não seguir os mesmos erros do nosso pai. — Ele conclui seu
pensamento em voz alto me fazendo sorrir.— Talvez Royal. —Acabo sorrio ao
ver um dos homens mais fechados que já conheci expor o mínimo de seus
sentimentos.
Royal é misterioso, curioso e intrigante, gosta de entender os fatos e
analisa tudo que está a sua volta. Ele é um grande homem reconheço isso.
— Somente mais uma pergunta. — Franze as sobrancelhas. — Por que
abandoou o Jaguar do Dante sabendo que ele ficaria furioso? — Sua pergunta
me deixa pensativa por alguns segundos.
— Naquela hora estava irritada demais para pensar nas consequências,
mas de certo modo foi porque não queria ser seguida por vocês e também a
possível ideia de alguém achar aquele carro e levá-lo me agradou, afinal eu
queria vê-lo sofrer assim como eu estava sofrendo naquele momento. — Balanço
os ombros sendo sincera.
— Você tem noção do que fez? Achamos o Jaguar em um desmanche de
carros. — Ele balança a cabeça em negativo. — Por sorte o homem é um dos
nossos aliados e reconheceu o brasão da família. Ele ama aquele carro mais do
que ama a ele mesmo.
— Foi merecido sejamos sinceros. — Dou de ombros rindo.
Ele me encara do outro lado do quarto com uma expressão séria e
perplexa.
— Às vezes acho que você não tem amor à vida. — Coça a cabeça
confuso.
— Não tenho medo Royal, mas sei do que ele é capaz e sei que terei
minhas consequências pelos meus atos, assim como ele teve a dele. — Seus
olhos azuis acinzentados me observam surpresos.
— Sabe Dana, nem sei porque estou dizendo isso, mas nosso pai está
voltando e ele provavelmente tentará algo contra você, então tome cuidado —
diz desgostoso e automaticamente aperto meus dedos contra os meus braços ao
pensar em Donatel.
— Tentará algo contra mim? Mas eu sou a prisioneira lembra? — Tento
soar o mais normal possível.
— Você não é mais uma prisioneira a partir do momento em que Robert
assinou um contrato conosco para a sua proteção. Donzel Golodiev é chefe da
máfia ucraniana e de alguma forma ele se encantou com sua beleza, por esses
motivos está sobre nossa proteção. Donzel não é conhecido pelas suas boas
ações, muito pelo contrário ele gosta de deixar explícito que é um homem de mal
caráter e não medira esforços para te atingir, além disso nosso pai também não é
lá um dos melhores homens que você pode esperar. Me preocupa o fato de saber
que os dois andam se encontrando, então evite maiores confusões. — Soa frio e
autoritário o que acaba me deixando ainda mais irritada.
Não me importo com Donzel, ou seja lá quem, apenas quero colocar as
mãos em Donatel e forçá-lo a cuspir toda a verdade.
— Você não consegue esconder a raiva que sente pelo nosso pai, assim
como nós o seu desejo é matá-lo, isso está explicito em seus olhos e até o
momento não sei o que te leva a esse sentimento, mas tome cuidado. — Royal se
desencosta da porta me observando. — Dante ainda tem um lado humano que
até você chegar eu desconhecia, mas Donatel, não se importa com nada além
dele mesmo. — Ele não escode o ódio que sente do próprio pai.
— Farei o possível para me manter longe desse homem. — Forço um dos
meus melhores sorrisos para acalmá-lo.
Preciso urgentemente encontrar Teresa e ver se ela finalmente encontrou
os papeis, pois não posso colocá-la em risco com Donatel voltando para Itália,
afinal diferente de Dante que acredita veementemente que estou morta o pai
pode ter lá suas dúvidas.
— Já vou indo. — Se despede com um aceno de cabeça e antes de
esperar que eu diga algo sai do quarto.
Sem perder tempo saio do quarto logo atrás de Royal indo diretamente
até a cozinha, pois quero sanar algumas dúvidas sobre minha família antes de me
encontrar com Donatel.
Encontro Teresa lendo um livro de culinária e ao me ver chegar com
tanta pressa se assusta.
— Que susto, quer matar essa velha do coração? — Apoia a mão no
peito.
— Desculpa Teresa. É que gostaria de saber se encontrou os papeis,
soube que Donatel está voltando e não quero te colocar em risco e outra ainda
estou com raiva de Dante — confesso magoada.
— Não vou negar que desta vez ele mereceu o seu desprezo, mas
também sei que todo casal tem seus dias de briga. — Ela sorri e eu reviro os
olhos.
— Não somos um casal, e ele é um idiota — a repreendo perdendo a
paciência.
Esse assunto sempre me tira o mínimo de paciência que tento manter.
— Claro que ele está errado, mas Royal tem a maior parcela de culpa e
não discuta comigo menina já ouvi a versão dos cinco. — Brava ela se
levantando me repreendendo como uma mãe.
— Mais Teresa... — Ela me corta.
— Nada demais... Você sempre está acusando o menino, é claro que ele
não está certo, mas você tem que colocar essa vingança de lado e deixar esse
amor florescer. — Ela vai até a gaveta da cozinha pegando uma pasta.
Faço um bico chateada por ela estar brava comigo. Não consigo ignorar
minha vingança por mais que ame Dante. Isso, essa é a verdade, eu amo aquele
homem e não tem como negar, mas também não vou gritar aos quatro ventos.
Teresa apoia a mão em meu ombro com uma expressão seria que me
deixa preocupada.
— Não gosto dessa expressão em seu rosto — confesso.
— Olha minha menina, dentro desta pasta tem um pouco da verdade,
tente abrir seu coração e deixar de lado todo esse ódio que está guardado dentro
do dele. Todos merecem uma segunda chance e o amor de vocês dois também.
— Ela me entrega a pasta. — Sei que quando se sentar e conversar com o
menino, ele lhe explicará tudo. — Fico intrigada com o que ela diz.
— Por que diz isso Teresa? — pergunto preocupada.
— Apenas leia. — Ela sorri me abraçando.
Retribuo o abraço me despedindo e cuidadosamente ando pela casa
mesmo sabendo que ainda é de manhã e não corro o risco de me encontrar com
Dante.
Parando para pensar nas ações de Dante esses últimos dias, ele até que
tentou se redimir e no final não o julgo por tentar comprar minhas desculpas.
Acho até legal da parte dele tentar se redimir para alguém que na mente dele é
uma desconhecida com a aparência de sua antiga namorada, mas talvez as suas
palavras valeriam por um milhão de presente.

Volto para o quarto o mais rápido que posso e me jogo sobre a cama com
certo receio de ler o que está dentro dessa pasta, mas tomada por uma coragem
que não cabe em mim, finalmente retiro os papeis analisando com cuidado cada
palavra que se encontra ali e uma parte de mim se sente completamente frustrada
por acabar de descobrir que meus pais na verdade eram assassinos de aluguel.
Eu não consigo acreditar que eles tinham um contrato com Donatel para
assassinatos. Eles na verdade limpavam a sujeira de Donatel?
Não consigo acreditar, não consigo acreditar no que estou lendo e nas
assinaturas a minha frente. Até mesmo as minhas irmãs, por que somente eu não
sabia disso?
Os papeis mostram uma pesquisa detalhada da vida dos meus pais e
irmãs, com fotos, locais de trabalho e alguns serviços prestados para o próprio
Donatel, mas aqui não diz nada sobre o massacre da minha família.
É por isso que Teresa sempre disse para não confiar em meus familiares,
pois eles sempre foram sujos como Donatel, e ela sabia disso.
As lágrimas de frustração se acumulam em meus olhos e a vontade de
correr para um lugar distante preenche meu peito, pois sempre me apoiei na ideia
de que minha família era inocente, mas agora eu não tenho tanta certeza disso.
E acabo percebendo que tudo isso é demais para mim. Eu já não sei mais
em quem confiar, em quem acreditar ou em quem me apoiar. Não sei se todos os
anos de solidão e dor que passei no Japão realmente valeram a pena. Se meu
ódio por Dante realmente deve ser levado a adiante ou se apenas me privei da
felicidade de reencontrá-lo por me apoiar na mentira da minha mente.
Eu estou perdida, chocada e desesperada, me sinto fraca e frágil sem
saber em quem realmente confiar.
Com mais dúvidas em minha mente jogo os papeis dentro da pasta
irritada o suficiente para não terminar de ler as folhas que seguiam anexada
umas às outras, pois só vão confundir ainda mais minha mente. A dor de cabeça
que sinto pela frustração que me assola é maior do que eu mesma poderia
esperar e agora começo a acreditar que talvez a culpa do massacre não seja de
Donatel e muito menos de Dante, afinal, ele poderia apenas estar protegendo os
filhos de algum plano do meu pai.
Acabo rindo com essa ideia absurda, se for assim, Dante não estaria
envolvido certo? Isso tudo não faz o menor sentindo. Eles tinham um contrato e
não podiam se matar. Bufo irritada com as inúmeras possibilidades que surgem
em minha mente e me assusto com o baque da porta bem atrás de mim.
Procuro disfarçadamente esconder a pasta sobre as cobertas e agradeço
por segundos antes ter arrumado todos os papeis dentro da mesma, mas ao me
virar para encarar o homem que se encontra atrás de mim me sinto em total
alerta.
Seus olhos azuis estão imersos em pensamentos e fúria, ele me observa
com irritação e por incontáveis minutos não diz uma única palavra me deixando
preocupada. Ainda assim, não quero conversar agora, pois meus pensamentos
estão um verdadeiro emaranhado de decepções e acabarei apenas descontando
minhas frustrações sobre ele.
— Quando ia me contar a verdade Eva? — Tranca a porta guardando a
chave no bolso.
Ouvir aquela pergunta me deixa tão chocada que nem mesmo consigo
fingir desentendimento.
Ele provavelmente descobriu tudo e esse não é o melhor momento para
isso acontecer.
— Eu acreditei que você estava morta por todos esses anos. — Sua voz
por um momento falha e um sorriso debochado e triste surge em seus lábios.
— Você está me confundindo... — Antes que eu possa terminar sua mão
vai de encontro com a porta acertando um soco nela e somente agora vejo que
seus dedos estão machucados.
— Para de mentir porra — grita me assustando.
Ele está bravo, extremamente bravo, acho que bravo passa longe do
homem que vejo a minha frente e isso me assusta. Nunca, em nenhum momento,
vi Dante tão descontrolado como agora.
É visível que ele está confuso, perdido e se sentindo traído assim como
eu, mas em seu caso é diferente, não sei explicar. Talvez esconder a verdade dele
não tenha sido uma boa ideia.
— Dante. — Ele me corta bruscamente.
— Eu acreditei que você estava morta por onze anos — grita. —
Malditos e ferrados onzes anos da minha vida. Me culpei e me julguei todos os
dias por não sido capaz de te proteger, Eva. — Sinto o arrepio de medo quando
ele chama meu nome naquele tom hostil e raivoso, mas meu coração se aperta ao
ver seus olhos marejados com as lágrimas.
Me sinto tão atônita que nem mesmo consigo discutir ou me defender e
para piorar meu corpo reage de uma forma diferente a cada reação de seu corpo
e tom de voz.
— O tempo todo você estava aqui. — Ele ri passando as mãos pelos
cabelos depois nos olhos.
Me mantenho quieta observando seus movimentos pelo quarto e sua
rápida diferença de humor. Não consigo baixar minha guarda, não consigo me
manter calma vendo-o tão instável a minha frente.
— Por que mentiu para mim? — Ele para abruptamente no meio do
quarto olhando dentro dos meus olhos e agora posso ver toda a dor refletida em
seus olhos e seu rosto. — Por que me deixou acreditar que estava morta Ivi?
Você não sabe o quanto dói. — Ele aperta as mãos no peito.
— Posso estar viva, mas já morri a muito tempo. Morri quando você
tirou tudo e todos de mim, até você se foi Dante. — Sinto o nó se instalar em
minha garganta e engulo a fraqueza da minha alma que insiste em querer
transbordar por meus olhos.
Seu olhar de repreensão havia ido embora e agora seu semblante
demonstra toda a dor que aquelas palavras lhe causaram.
— Dói ouvir a verdade Dante? Dói em mim também ter confiado quinze
anos da minha vida para uma pessoa vazia como você — cuspo aquelas palavras
com ódio querendo feri-lo, querendo vê-lo sofrer, sofrer tudo o que eu sofri. — E
sabe o que mais doeu? — Rio com escárnio. — Doeu ver com meus próprios
olhos o único homem que amei atirar em meu próprio peito.
Seu olhar triste e magoado mostra que não preciso de objetos para feri-lo,
basta apenas as minhas palavras.
— Eu tentei tudo o que pude para te salvar naquele momento. Tentei te
salvar de Donatel. Tentei te salvar dos seus pais. — Aquele tom de voz de
alguma forma toca meu coração e isso só me deixa com mais raiva.
Como posso ter esse sentimento de dor e piedade por alguém que matou
toda a minha família? Por alguém que tentou me matar? Fico inconformada
comigo mesma por saber que ainda o amo.
— Você atirou em mim — grito. — Tirou todos. Todos Dante. Todos. —
Dou ênfase na palavra. — Até você, eu te amei tanto e você se foi, você puxou o
gatilho. — Mesmo que me forço a ser forte as lágrimas de dor e tristeza
escorrem por meus olhos.
— Seus pais te venderam como um objeto antes mesmo de você nascer.
Te venderam por dinheiro, status e fama. Eles eram assassinos falidos. — Passa
as mãos nos cabelos nervosamente.
Aquelas palavras surtem o mesmo efeito de um tapa em minha cara me
deixando ainda mais confusa.
Me venderam? Não entendo o que ele diz. Na verdade, não estou
entendendo nada a muito tempo.
— Isso mesmo. — Ele suspira frustrado. — Você pertence à família
Voyaller desde o seu nascimento. — Sua voz calma me deixa ainda mais nervosa
e ousadamente ele caminha em minha direção.
— Não se aproxime — grito e ele para me observando a poucos metros
de distância.
— Eu te amo Eva, por todos esses anos eu sempre te amei. — Aqueles
intensos olhos azuis demonstra toda a verdade por trás de suas palavras.
— É mentira. — Apoio as mãos nos olhos confusas. — Fique calado,
você matou meus pais, tentou me matar e agora quer me deixar confusa. —
Avanço em sua direção acertando socos em seu peito ele é obrigado a desviar,
pois estou usando força bruta. — Eu te odeio — cuspo as palavras com ódio.
E por mais que meu corpo estremece ao ouvir aquele apelido e meu
coração se acelera com a honestidade de suas palavras, no fundo da minha alma
quero me apoiar em sua sinceridade, mas simplesmente não consigo.
A mais de onze anos não via seu sorriso, suas incontáveis expressões de
felicidade e seu olhar cheio de esperança, sua voz mansa e calma que demonstra
todo o seu alto controle para não dizer coisas erradas para a mulher que ele
sempre disse amar. E neste exato momento sou obrigada a encará-lo novamente
com todo o seu alto controle esbanjando paixão.
Isso me faz lembrar do pequeno menino que fez juras de amor eterno a
uma menina que nem sabia o que significava a palavra amor, mas que ao longo
dos anos provou toda a sinceridade e felicidade daquelas juras ao lado dele. Até
o próprio roubar tudo o que havia lhe dado e ensinado. Até o próprio destruir as
esperanças de um coração sonhador o jogando na profunda e obscura solidão.
— Eu te amo Eva — ele grita segurando meus braços com força
impedindo meus socos constantes e ritmados sobre seu peito. — Mesmo que me
odeie eu continuarei te amando.
Estou tão imersa em meus pensamentos que me surpreendo ao sentir seus
braços fortes me envolverem em um forte abraço e automaticamente encosto
minha cabeça em seu peito enquanto ele apoia sua mão em meus cabelos
forçando meu corpo contra o seu.
— Senti falta do seu cheiro, do seu corpo, dos seus braços, falta das
nossas brigas bobas, da sua possessividade e da sua honestidade. Falta dos
nossos dias juntos e das nossas brincadeiras. Foi tão difícil olhar para você e
custar a acreditar que a mulher diante dos meus olhos não era a mulher que
sempre amei. Foi tão difícil acreditar que você era irmã de Robert Trion, quando
meu corpo e alma gritava dizendo que era minha doce e amada Ivi — sussurra as
palavras enquanto me aperta contra seu corpo esfregando o rosto em meus
cabelos.
Me sinto um brinquedo, um verdadeiro brinquedo usado e jogado, tanto
pelos meus pais, como para Dante e até mesmo Robert. Eu já não sei mais quem
sou ou o que quero ser, para onde vou ou a que lugar pertenço. Minha mente está
confusa, meu coração se aperta a cada batimento descontrolado e o nó em minha
garganta me sufoca. Estou perdida e mesmo que queira acreditar em tudo o que
Dante me diz simplesmente não consigo. Ele mentiu no passado e pode mentir
no presente.
Meus pais me venderam? Dante tentou ou não me matar? Robert sempre
soube da verdade e mesmo assim me entregou por um contrato?
São tantas perguntas que rodam minha mente, tantas dúvidas e incertezas
mesclada ao medo de errar mais uma vez, que não consigo acreditar em mais
ninguém, nem mesmo nos meus próprios sentimentos desordenados.
— Não confio em você — sussurro. — Não confio e não quero que me
toque. Não quero ouvir suas juras de amor. — Engulo o nó preso em minha
garganta respirando profundamente. — Eu só quero saber a verdade que sempre
foi escondida de mim.
Ele me aperta mais contra seus braços ignorando minhas palavras,
mantenho meus braços soltos ao lado do meu corpo sem retribuir seu abraço.
— Por que matou meus pais Dan? Por que atirou em mim? — Perdida
tento encontrar as respostas certas em meio as lágrimas.
Por que eu ainda tenho que te amar colocando todos os meus planos em
risco? As lágrimas escorrem dos meus olhos sem permissão. Quero apenas saber
a verdade e vê-lo sofrer como eu sofri, mas ao mesmo tempo quero protegê-lo e
retirar toda a dor explicita em seu olhar.
— É uma longa história. — Se afasta me observando.
— Eu quero saber toda a maldita verdade. — O empurro, mas ele não
deixa eu me afastar segurando meus braços.
— Vou te contar Ivi, só que... — Ele engole em seco pensativo.
— Só que nada Dante, você vai me contar tudo, estou aqui não estou?
Era isso que você queria, não era? Essa é sua oportunidade de redenção. — O
empurro me livrando de suas mãos.
— Dói lembrar de tudo, dói te imaginar morta. — Ele engole em seco. —
Dói saber que te causei tanto sofrimento e dor. Quero seu perdão e quero
explicar que a culpa não é minha... — O interrompo.
— Então comece a contar a verdade, estou aqui para te escutar, nada
além de te escutar. — O provoco.
— Você é minha Ivi e jamais deixarei que fuja novamente ou que encoste
em outros homens. — Seu tom firme me faz rir.
— Dessa vez suas armas estarão apontadas para onde? — Vejo sua
expressão sombria tomar conta de seu rosto e sei que aquelas palavras lhe
atingiram em cheio. — Se quer tanto me dizer a verdade, apenas comece.
— Saiba que meu único pecado e pesadelo foi ter perdido você aquela
noite, do resto não me arrependo de nada. — A frieza em sua voz me machuca
de tal formal que o ódio domina meus pensamentos.
Me preparo para desferir um tapa em seu rosto, mas ele segura minha
mão puxando meu corpo próximo ao seu.
— Você não deveria defender tanto a sua família dessa maneira, afinal
eles assinaram os papeis do nosso casamento. Você é minha Eva. Minha esposa.
— Dante assume um papel irônico e irritado.
Semicerro os olhos rindo.
— Vá a merda seu cretino jamais aceitaria ser sua esposa — as palavras
saem da minha boca automaticamente.
— Não é uma questão de aceitar ou não, afinal, tenho todos os papeis
minha linda menina. — Seu sorriso vitorioso me surpreende.
Ele não está blefando ou tentando me intimidar, pois a certeza em seus
olhos me confirma isso.
Meus pais realmente me venderam para Donatel?
Esses pensamentos me deixam magoada, atordoada e triste, quero saber
de toda a verdade, mas arrancar elas de Dante está sendo mais difícil do que
imaginei.
— Já não sou mais aquela menina mimada e a única coisa que quero é te
ver morto junto com o desgraçado do seu pai — cuspo as palavras que não veem
totalmente do meu coração.
O baque que ele leva ao ouvir minhas palavras fica nítido em seu olhar
chocado e magoado.
— Não importa o que você fale, faça ou tente, nunca deixarei você se
afastar de mim novamente. Não importa o quanto me odeie, mesmo sendo você,
eu não serei gentil se tentar fugir. — Ele aperta meu braço semicerrando os
olhos.
— Você diz não ser tão culpado então porque não me conta a verdade —
grito irritada. — Eu só quero a porcaria da verdade Dante.
— Porque sou a porra de um mafioso e não lhe devo satisfações, afinal,
você não é nada minha, certo? Você me odeia e me quer longe. Você já deixou
claro que somos desconhecidos — cospe com ira. — Nem mesmo sei como devo
lhe chamar. Dana Trion ou Eva Becker? — O sarcasmo predomina em sua voz e
me surpreendo em vê-lo dessa maneira.
Tomada ainda mais pelo impulso de feri-lo eu não abaixo minha cabeça
ou entro em seu jogo, apenas permaneço firme.
— Você deve me chamar de tudo, menos de sua — digo com ódio.
— Você me julga pelo que seus pais fizeram, eu fui tolamente contra
tudo e todos tentando te proteger. Não te culpo por me culpar, eu realmente
puxei o gatilho, mais saiba que aquela era minha única opção, mas seu orgulho e
desejo de vingança te cegam, então não lhe contarei nada no momento, não
quando te tenho tão perto e corro o risco de te perder novamente.
— Donatel está de volta posso procurar a verdade direto da fonte. —
Sorrio.
— Não ouse se aproximar de Donatel. — Ele dá um passo em minha
direção e faço o mesmo encurtando nossa distância.
— O que fará para me impedir Dragão? Vai atirar em mim novamente?
Talvez agora você consiga concluir o seu verdadeiro objetivo — as palavras
escorrem por minha boca como um amargo veneno e posso ver todo o brilho de
seu olhar morrer diante e mim.
Nesse momento qualquer fio de esperança que se encontra em seu
coração se afunda no mais profundo abismo de dor e ressentimento.
— Da mesma maneira que você sofreu por onze anos eu também sofri
Eva, e sinceramente esperei um pouco mais de compreensão vindo da sua parte.
Eu sei que você tem um emaranhado de ressentimentos e mesmo que eu tente
expressar toda a verdade, você simplesmente não vai acreditar, mas se coloque
em meu lugar por um único momento. — Ele ergue sua postura me encarando de
cima. — Tudo o que fiz foi tentando te proteger e mesmo assim vi a mulher que
sempre amei tombar diante dos meus olhos por uma bala que saiu da minha
própria arma. Por anos e anos me reprimi e me culpei achando que ela havia
morrido e quando descubro que ela está viva a única coisa que recebo é ódio e
frieza, mesmo que eu grite e demonstre todo o meu amor. — Ele sorri
desgostoso. — Você quer a minha morte depois da verdade querida? É isso que
você quer? — pergunta com a voz embargada.
E mesmo que eu queira de alguma forma expressar todos os meus
sentimentos me sinto em um labirinto sem saber o que responder.
— A uma cópia do contrato de casamento que seus pais assinaram dentro
da pasta que você tem em mão. Conclua suas dúvidas e veja se estou mentindo.
— Suspira fechando os olhos.
O culpei, o julguei, o provoquei tentando machucá-lo, tentando fazer ele
sofrer a mesma dor que eu, mas na verdade, assim como eu, ele já vinha
sofrendo por esses longos onze anos.
— Dan. — Tento apoiar minha mão em suas costas, mas ele
simplesmente ignora meu toque caminhando até a saída e antes de destrancar a
porta solta aquelas palavras intrigantes.
— Meu único objetivo sempre e em todo o momento foi te proteger Ivi.
— Sem olhar para trás caminha em direção ao corredor me deixando plantada no
meio do quarto completamente destruída.
E neste momento percebo que sempre coloquei minhas dores acima de
tudo, mas em nenhum momento parei para pensar como ele se sentia. Apesar de
que eu jamais poderia imaginar que sua intenção desde o começo era me
proteger. Ainda assim, em todos esses meses eu pude presenciar a sua dor e
ignorei completamente todo o seu sofrimento colocando minha vingança acima
de tudo.
DANTE

Mágoa, confusão, dor e tristeza são sentimentos pequenos comparado ao


que sinto neste momento.
Nunca esperei reencontrar Eva, nunca acreditei que teria a oportunidade
de abraçá-la novamente e saber que ela está viva enche meu coração de alegria.
Porém, jamais esperei que nosso possível reencontro seria desta maneira. Me
sinto tão incapaz.
Eu sei que errei e posso imaginar o quanto ela me odeia por achar que
atirei em seu peito na intenção de matá-la, mas a realidade não é bem assim e me
senti tão frustrado com suas palavras que nem mesmo consegui me explicar.
Porra, será que ela em nenhum momento se colocou no meu lugar? Assim como
ela, por onze anos sofri.
Sorrio ironicamente com minha estranha imaginação de que tudo ainda
poderia ser como antes.
O que esperar Dante? Você está colhendo tudo aquilo que plantou.
A vida é assim mesmo, ela vem para esfregar na sua cara seus erros
mostrando as consequências do seu passado.
Viro o copo de uísque que está a minha frente enquanto me jogo no mar
de sentimento que transborda em meu peito.
Eu a amo tanto que não consigo me controlar. Não consigo me imaginar
mais um único dia sem ela, ainda mais sabendo que ela está viva. Eu queria tanto
me afogar em seu corpo e preencher o vazio que dominou meu coração todos
esses anos.
Em uma época da minha vida achei que esses sentimentos estivessem
mortos, mas revê-la trouxe à tona uma bomba de esperança que a muitos anos
não tinha. Mas verdade é que ela me odeia, todavia, isso não muda o fato dela
ser minha esposa por direito e simplesmente não tenho culpa se seus pais a
trocaram por dinheiro.
Diana Becker estava gravida de oito meses quando Frank sofreu uma
grande crise em sua empresa, quase todos os segredos da família Becker como
assassinos foram revelados por um policial que investigava os assassinatos em
série.
Para proteger o nome da família e se reerguer, Frank, veio atrás do seu
melhor amigo e quase irmão, Donatel. E mesmo que a amizade dos dois era
forte, negócios são negócios e o preço de Frank foi entregar sua filha mais nova
para o herdeiro da família Voyaller.
A princípio Frank hesitou em aceitar aquela oferta absurda, mas ao se ver
encurralado pela polícia e pelos detetives, finalmente cedeu entregando a sua
filha em troca de dinheiro e proteção, afinal a família Becker sempre viveu nas
sombras por ser uma família de assassinos.
Donatel é um homem sádico e doentio, mas muito sábio em suas
escolhas. Sem pensar e hesitar pegou um dos bens mais preciosos do amigo.
Na época eu tinha apenas dois anos e ela estava quase para nascer,
mesmo pequeno a única informação que me foi passada foi que minha noiva
estava prestes a nascer. Com dois anos não entendia nada do que tudo aquilo
significaria, mas a partir daquele momento fui criado para protegê-la, amá-la e
respeitá-la acima de tudo.
Com cinco anos entendia perfeitamente o meu papel, ela seria minha
noiva, seria a minha mulher que herdaria comigo o lugar do meu pai e apesar de
muito jovem fui obrigado a amadurecer rápido demais. Minha função e dever era
protegê-la em segredo e garantir que Eva se apaixonasse por mim sem saber da
verdade e quando finalmente completasse 16 anos se tornaria minha.
Dia a após dia compreendia a minha função e nossos pais faziam questão
de nos criar juntos, para o vínculo entre nós se tornar ainda mais forte, e por esse
mesmo motivos meus irmãos nunca a conheceram, pois poderia surgir a
possibilidade de se apaixonarem por ela ou vice-versa.
Frequentamos a mesma escola desde pequenos e homem nenhum
chegaria perto dela. Primeiro porque foram essas as ordens que recebi de Frank e
Donatel; segundo porque era relevante as ordens que recebi e jamais permitiria
que alguém a tocasse.
Possessividade? Talvez, mas pouco me importava com o que os outros
achavam, afinal, eu aprendi a amá-la desde que me conheço por gente.
Não nego que por causa do meu temperamento explosivo acabávamos
brigando. E sua personalidade sempre foi um verdadeiro desafio, pois além de
teimosa era desaforenta e adorava me provocar. Por sua culpa levei muitas
broncas e várias suspenções, além de quase ser expulso ao quebrar três dentes de
um de seus colegas de turma.
Suspiro com os pensamentos que insistem em dominar minha mente e
mesmo que tente me forçar a ler os e-mails que chegaram, não consigo.
Ivi nunca gostou do meu pai, ela jamais escondeu isso de mim e sempre
que ele aparecia para tentar interagir, ela simplesmente se escondia com medo do
seu olhar frio e impiedoso.
As sessões de torturas que passei nas mãos daquele homem nunca param,
as evidências daquela época levo gravado em meu corpo até hoje e as
incontáveis cicatrizes se espalham por ele. Foi assim que aprendi a ser frio e
trancar meus sentimentos, afinal, a cada grito, a cada lágrima ou a qualquer
demonstração de dor a sessão se tornava cada vez pior.
Fomos treinados para honrar o sobrenome que levamos, não somente eu,
como meus irmãos. Além disso nunca tivemos a chance de livre escolha, sempre
fomos comandados pelas vontades de nosso pai e diferente de mim que teve a
chance de conhecer e estudar em uma escola particular, meus irmãos não. Eles
tiveram aulas em casa e se libertaram somente aos 18 anos.
Royal e Max por serem fruto da infidelidade de Donatel deveriam ser
considerados uma desonra para família, mas isso nunca aconteceu. Fomos
criados de igual para igual, afinal, Donatel sempre deixou claro que um Voyaller
sempre será um Voyaller sem exceções.
Apesar de toda o ódio que carrego do meu pai, em certos momentos sou
grato, por sua causa ganhei respeito, mas nada disso paga o que me foi
arrancando sem piedade no passado.
Eu amo Eva, sempre amei, fui criado para isso e até hoje não
compreendo com clareza como um sentimento tão frágil pode ser tão forte, mas
o meu pecado não tem perdão e em troca ganhei seu ódio e seu desprezo.
Esse é o preço da minha traição o seu completo desprezo.
Desisto de focar meus pensamentos no trabalho e viro a garrafa de rum
que estava ao lado do uísque no gargalo me afogando em lembranças que custo e
quero esquecer.
Parando para analisar com cuidado o maior culpado por tudo o que
aconteceu foi Frank Becker. A irresponsabilidade e ganância de um homem o
leva a perdição e foi exatamente isso que aconteceu quando ele planejou quebrar
o contrato que havia feito com Donatel.
Quando Eva completasse dezesseis ela finalmente seria minha esposa e
descobriria a verdade por trás de sua família, mas seu pai por um momento de
fraqueza e bobeira sucumbiu ao desespero planejando uma fuga do país afim de
proteger sua filha das garras do amigo que ele conhecia muito bem.
Essa seria uma das maiores traições já ocorridas na história dos Voyaller,
mas Frank se esqueceu que Donatel é perspicaz o suficiente para perceber sua
mudança brusca de comportamento e apesar de suas intenções serem unicamente
de proteção, ele falhou.
Donatel se irou de tal forma com o amigo que não pensou em destruir
toda a sua família antes que seu nome fosse sujo por uma traição tão baixa. O
sobrenome dos Voyaller correria por todos becos e ruelas da Itália levando a
desonra da família.
Como um Voyaller permite tão traição bem abaixo do seu nariz? Isso
seria inaceitável, então Donatel protegeu o que ele custou a conquistar... Seu
nome.
Nessa época me lembro de ter meus dezessete anos, a idade exata para se
tronar um membro oficial da máfia. A idade para assumir os negócios da família
e começar a arcar com as responsabilidades de elevar o brasão da casa, mas
confesso que não estava preparado para começar os treinos de silêncio. Quando
se faz parte de uma missão, você está sujeito a ser pego ou morto e
obrigatoriamente tem o dever de se calar perante uma tortura.
Confesso que ver meus irmãos serem torturados perante os meus olhos e
não poder reagir a qualquer uma daquelas situações me apavorava, mas eu
precisava me manter firme ou pagaria com meu corpo e foi isso que Donatel
usou para jogar com a minha mente.
Caso eu não ouvisse suas ordens ele arrancaria a vida dos meus irmãos
diante dos meus olhos. Eu conheço o pai que tenho — se é que posso chamá-lo
assim —, e sei que ele não pouparia esforços para conseguir o que queria e o que
ele queria me assustava.
Ele queria me ver matar Eva com as minhas próprias mãos e
sinceramente não sei o que se passava em sua mente, mas acredito que ele a via
como uma ameaça para seu legado, pois o nosso amor sempre se sobrepôs a
qualquer situação que ele impunha e mesmo diante de toda aquela situação eu
tentei veementemente proteger Eva.
Não tenho vergonha em confessar que atirar em seus familiares não me
causou arrependimentos ou medo, mas jamais imaginei que Donatel obrigaria
tocar em minha menina, afinal ele havia prometido que não envolveria Eva, mas
quem em sã consciência confia em um homem como Donatel? Eu tolamente
confiei.
Donatel nutriu uma raiva tão grande de Eva que seus olhos de desprezo o
denunciam ao olhar para ela, ele a queria morta, talvez por ser a causa de toda
aquela desordem e me lembrar dos seus olhos assustados, do seu pedido de
socorro e do seu desespero, me quebra, me machuca e me destrói.
Eu havia prometido de todas as maneiras que a protegeria de todo o mal e
agora estava prestes a tirar sua vida? Essa realmente foi uma traição sem volta,
sem perdão e nem mesmo a culpo por me odiar tanto, mas infernos eu também
sofri, eu também entrei em desespero, me culpei e me julguei por todos esses
anos, mas eu não mereço o seu perdão.
Eu sei que não mereço!
Donatel foi um tremendo canalha, a princípio o plano era matar cada
integrante da família Becker separadamente deixando Eva livre de qualquer
incidente, mas ele fez questão de caçar um por um e fazer a minha doce e amada
Ivi, ver seus pais morrerem diante dos seus olhos.
Eu não podia hesitar, as ordens já haviam sido dadas e qualquer deslize
da minha parte, meus irmãos morreriam. Eu não sabia a quem proteger, não
sabia o que fazer? Era uma das minhas primeiras missões e eu estava sendo
obrigado a enfrentar a mulher que mais amei.
Os gritos, os pedidos de socorro e a decepção estampada em seus olhos
me faziam sangrar por dentro. Eu havia prometido o céu e a Terra e agora estava
lhe dando o inferno.
Doeu não poder abraçá-la e aconchegar sua pequena cabeça em meu
peito, doeu ser a pessoa que levou tudo o que ela tinha. Doeu fingir ser o
assassino que eu não era, doeu fingir odiá-la quando na verdade o meu maior
desejo era gritar o quanto a amava e como doeu, mas a minha função era me
manter firme diante dos olhos do homem que chamo de pai ou não somente ela
sofreria, mas todos a minha volta.
Donatel é sagaz e sabia que se ele apontasse sua arma para mim eu não
hesitaria em matá-lo ali mesmo, mas eu jamais permitiria que ele ameaçasse Eva
e foi o que ele fez apontando sua arma para a cabeça da minha menina e em uma
tentativa desesperadora de protegê-la atirei em seu peito para lhe dar a chance de
sobreviver até o resgate chegar.
Vê-la tombar com o meu tiro foi a pior cena que presenciei em minha
vida, quando seu corpo frágil tocou o chão sem pensar duas vezes soltei minhas
armas e corri em sua direção. Eu queria salvá-la, eu precisava salvá-la, mas a
única coisa que senti foi um for golpe na cabeça fazendo tudo ficar escuro.
Quando acordei percebi que da mesma forma que levei tudo o que ela
tinha, tudo o que eu tinha havia ido com ela. Eu havia matado com minhas
próprias mãos mulher da minha vida.
Depois da possível morte de Eva, foi difícil seguir em frente. Foi difícil
suportar o peso em meu peito e depois daquele dia nunca mais fui o mesmo.
Deixei a frieza e o ódio dominar meus pensamentos e me tornei tudo o que meu
pai queria, sua arma para matar. Eu ceifei vidas, muitas por sinal, em uma época
fui conhecido como “o ceifador” e muitos outros apelidos foram atribuídos a
mim até finalmente alcançar “o Dragão de Veneza”, o que para ser sincero não
me satisfaz, mas se eles querem me ver fazendo jus a cada um dos apelidos me
dado, terei sempre a honra de satisfazer os vossos desejos.
Olho para garrafa de rum quase vazia e suspiro ao perceber que minha
sanidade mental ainda está intacta. Aperto o copo entre os dedos apoiando a
cabeça em uma das mãos.
Mesmo que eu explique todas essas porcarias a Eva, ela jamais me
perdoara e nem posso culpá-la por isso, uma vez que nem mesmo eu me daria o
perdão.
Acendo um cigarro na intenção de deixar a nicotina acalmar minhas
emoções me dando a falsa sensação de paz, mas minha mente está tão
conturbada que a agitação em meu corpo só aumenta me tirando completamente
a paz.
Irritado jogo a garrafa de rum contra a parede e tudo que ainda resta
sobre a minha mesa ao chão, pois já havia deixado um rachado na mesma mais
cedo.
A porta do escritório se abre bruscamente revelando Max a minha frente.
Esse não era o melhor momento para um dos meus irmãos me irritar ou me tirar
ainda mais do sério. Ele observa todo o local e se vira rapidamente.
— Volto mais tarde. — Fecha a porta tomando a melhor decisão no
momento.
Suspiro tentando acalmar as batidas frenéticas do meu coração, mas nada
adianta e sinceramente não sei como contar toda a história do nosso passado para
ela.
Ela merece saber. Eu sei que merece, mas simplesmente não quero
reviver aquela noite mais uma vez em minha mente, todos os pesadelos que tive
por esses onze anos não me deixando dormir, já me fizeram pagar metade dos
meus pecados e talvez a volta de Ivi seja apenas mais o processo de tortura e
rejeição que eu mereça passar nesta terra.
“Para onde suas armas estarão apontadas”
Sua voz ecoa em minha mente e acredito que ser alvejado por balas doa
menos do que essa sensação angustiante em minha alma, mas posso afirmar que
mesmo tendo todo o seu ódio voltado e focado para mim, desta vez a protegerei
com tudo o que tenho mesmo que isso custe a minha vida.
Os efeitos do álcool começam a aparecer em meu corpo e repentinamente
sinto um pouco de tontura ao me levantar, mas ela rapidamente passa me
trazendo de volta a triste realidade.
A porta do meu escrito se abre lentamente e ao olhar para ela me sinto
decepcionado ao observar Donatel. Esse é o pior momento que ele poderia
aparecer.
— O que quer nesta casa? — Não abaixo minha guarda.
— Oras meu rapaz não sabia que para voltar a minha casa precisava de
permissão, mas posso afirmar que não está no seu melhor dia. Não é legal
destruir meu antigo escritório — como sempre seu sarcasmo é evidente.
— Você já destruiu a porcaria da minha vida, está destruindo a de Jack o
que mais você quer? — O encara com ódio.
Rever aquele rosto me causa náuseas, aqueles cabelos grisalhos e olhos
azuis intensos cheios de ódio e rancor, ele nunca vai mudar.
— Vim para concluir o que você não conseguiu a onze anos atrás meu
rapaz, você acha que eu seria tolo o suficiente de acreditar que você acertaria o
coração da sua amada protegida? — Ele ria me encarando. — Não sou tão tolo.
Aquelas palavras não me surpreendem mais do que deveriam. A todos
esses anos ele sempre soube que ela estava viva.
— Eva Becker está de volta e pelo estado do seu escrito vejo que as
coisas não vão bem entre vocês. Donzel vai amar saber disso, talvez eu deva
entregá-la a ele hoje ou amanhã. Tenho certeza que Victor Golodiev amará
brincar com a sua preciosa Ivi, é assim que a chama certo? — Sinto a raiva me
cegar e quando me dou por mim já estou socando a sua cara sem piedade.
Ele devolve alguns socos, mas a maioria de seus ataques não apenas para
se defender dos meus punhos certeiros.
— Juro que vou matá-lo seu velho desgraçado — grito sentindo todos os
meus sentimentos reprimidos transborda em raiva.
Ele sorri vitorioso enquanto diz.
— Você ainda tem que aprender muitas coisas meu caro rapaz,
principalmente a nunca confiar nas palavras de um velho. — E somente agora
percebo que quem ele realmente quer sou eu e não Eva. — Essa mulher sempre
foi e sempre será seu fracasso.
Sinto uma ardência na perna direita e ao olhar para baixo vejo a seringa
cravada nos músculos da minha perna, não acredito que cai em mais uma de suas
armadilhas.
Tento me manter em pé e acordado mais é impossível quando ele usou
uma dose exagerada de sedativo. Não demora muito até minha visão turva
começa a ficar negra e eu não enxergar mais nada.
Um estranho peso em meu corpo faz cada parte da minha pele queimar,
uma dor de cabeça infernal dificulta e atrapalha a minha visão e por mais que
tente abrir os olhos a luz faz minha íris doer intensamente desfocando a visão a
minha frente.
Remexo as mãos na tentativa de levá-la aos olhos, mas meus punhos
estão presos a correntes apertadas que ao me mexer balançam fazendo pequenos
barulhos.
Aos poucos me dou conta do que está acontecendo e me sinto frustrado
por permitir que meu pai concluísse seus planos com tanta facilidade.
Infelizmente a sua volta foi em um dos piores momentos da minha vida e agora
me encontro neste estado lastimável e caótico.
Respiro profundamente ousando abrir meus olhos mais uma vez e agora
consigo focar minha atenção no homem sentado em uma poltrona a minha
frente. Donatel fuma um dos meus charutos com as pernas cruzadas e o seu
típico sorriso sacana nos lábios.
Meus braços estendidos acima da minha cabeça doem por estarem
amarados com força e somente agora percebo que meu tórax nu está molhado.
Ele deve ter tentado me acordar algumas vezes com água gelada, mas sua
dosagem de sedativo foi alta demais, afinal, ele sabe que tenho um sistema
rápido contra venenos e sedativos, pois ele fez questão de nos treinar contra isso
também.
— Meu caro rapaz precisei usar uma dose extra de sedativo em você. —
O observo em silêncio.
Ver esse desgraçado em minha frente só me faz querer voar em seu
pescoço e estrangulá-lo lentamente.
— Esse olhar não me afeta, seu romance com sua pequena vadia não está
como planejava? — Minha vontade é socar sua boca até ele cuspir todas aquelas
palavras e junto seus dentes.
Resolvo que o melhor é permanecer em silêncio e deixar suas
provocações de lado, pois não ganharei nada ao revidar.
— Essa mulher sempre foi sua perdição meu filho. — Sua expressão
séria me alarma, mas evito demonstrar sentimentos perto dele. — Foi meu maior
erro.
Deixo apenas a frieza e a raiva estampada em meu rosto procurando
ignorar suas palavras. Depois de anos evitando essa sala, voltar aqui é totalmente
desanimador, este lugar me traz lembranças ruim de um passado que tento a todo
custo esquecer.
A sala 371 é o forte da nossa família. Os números que envolvem o dragão
se estampam junto ao brasão da família chamando a atenção dos nossos
inimigos. É uma sala altamente equipada com objetos e acessórios de tortura,
além de seus armamentos pesados e leves. É a sala que marcou a história dos
Voyaller e fez a fama de nossa família se elevar além dos membros que a
utilizam. É um lugar onde poucos entram e ninguém sai.
E foi exatamente aqui que nossos treinos começaram, a cada dia um
aparelho novo, uma arma diferente e assim éramos obrigados a aprender a
honrar, respeitar e manter os segredos da família.
— Vamos brincar um pouco? Será que já se esqueceu da utilidade dessa
sala? Percebo que não a utiliza muito, nem você e nem seus irmãos. Treinei
maricas por um acaso? — Estala o chicote de couro indiano no chão.
O barulho não me assusta, muito menos me surpreende, já sou
acostumado a levar surras com esse equipamento, então apenas permaneço
calado observando-o. E sinceramente eu já não tenho mais medo da dor, foram
muitos anos aprendendo a lidar com ela, você acaba se tornando imune.
Até poderia lutar pela minha vida, lutar pela minha liberdade, mas
simplesmente não quero. Eu mereço a dor, mereço a tortura, talvez assim o meu
pecado diminua e a dor incessante em meu peito se amenize, afinal nada se
compara aos olhos de desgosto de Eva.
Eu já mais serei perdoado, jamais poderei abraçá-la novamente e essa
vida já não me importa mais, apenas quero me desfazer dela. A minha única
esperança era um dia poder me reencontrar com Eva e isso já aconteceu, então
não tenho mais motivos para lutar e sua proteção pode ser feita pelos meus
irmãos, pois essa foi a última missão que dei a eles.
Protegê-la acima de tudo.
Meus pensamentos são quebrados ao sentir o chicote se encontrar com o
meu abdômen deixando vergões gotejados de sangue em minha pele. Me curvo
ao sentir a dor se espalhar pelo meu corpo, mas não emito qualquer reação de
dor desafiando Donatel com o um único olhar de ódio.
— Esse olhar me instiga ainda mais filho. Você foi tolo em acreditar que
queria sua vadia primeiro, mas não sou tolo o suficiente de caçá-la sem antes de
tirar do meu caminho filho, sei muito bem os homens que criei. — Ri batendo o
chicote entre os dedos.
Nojo é o que sinto quando ele me chama de filho dessa maneira. Limito-
me nos meus pensamentos e mais três chicotadas vêm de encontro ao meu corpo
fazendo a ardência e a dor se espalhar esporadicamente.
Curvo-me perante àquela sensação e apesar de tentar me manter quieto é
impossível controlar a reação do seu corpo junto aos sentimentos de
incapacidade que me assolam. Incapacidade essa que sinto ao lembrar das duras
palavras de Eva que me machucaram profundamente.
Ela deixou claro que preferia estar morta do que estar ao meu lado.
Fechos os olhos diante esses pensamentos e sinto os ossos de Donatel se
chocarem contra meu queixo.
— Reaja garoto, pare de ser tolo, não deixe uma mulher comandar quem
você é — ele grita com irritação, mas minha mente só consegue focar no olhar
de ódio que Eva direcionou para mim.
Ela me odeia, me odeia tanto que veio até está casa com a única intenção
de me matar e se esse é o desejo de seu coração conceberei com honra.
Donatel acerta meu rosto com vários socos e o sangue quente escorre do
meu nariz até minha boca.
— Aguente toda dor pela sua amada Dante, mas saiba que daqui a
algumas horas ela estará em seu lugar. — Sinto a raiva explodir em meu peito e
quando menos espero meu corpo reage as suas palavras mal intencionadas
tentando quebrar as correntes que prendem meus pulsos em vão.
Pouco me importo o que meu pai fará com meu corpo, pouco me importo
em ser torturado e morto, mas não permitirei que ele encoste suas mãos sujas em
Eva mais uma vez, ela se tornou uma mulher forte e incrivelmente batalhadora,
não merece passar por todo o desgosto que passou no passado. Ela merece viver
e encontrar a felicidade longe de mim.
Seguro as correntes com força tentando controlar a raiva que cresce em
peito, não posso deixar o meu lado sombrio se sobrepor a minha sanidade. Não
quero lutar, quero apenas descansar e finalmente deitar para a eternidade onde a
angústia e o peso do pecado não podem me alcançar. Afinal, se Eva quer a
verdade ela terá em suas mãos em breve, pois deixei uma carta com Jack
explicando todo o nosso passado. É claro que gostaria de falar pessoalmente,
mas ela jamais me escutaria sem antes me julgar e culpar.
— Vamos lá, eu sei que você tem a capacidade de quebrar essas correntes
e avançar em mim. — Ele caminha pela sala ansioso.
Não esboço nenhuma reação, apenas permaneço quieto à espera da morte
que tanto almejo.
— Você é tão fraco Dante, está se entregando a toda essa dor por culpar-
se pelo passado. — Nega com a cabeça.
Ele encosta os fios desencapados nas minhas feridas abertas deixando a
corrente elétrica passar pelo meu corpo, seguro fortemente as correntes de ferro
que me mantém em pé para aguentar àquela horrível sensação passar pelo corpo.
— Eu gostava dos seus gritos desesperados. — Ele faz uma cara de
decepção encostando novamente os fios no meu corpo.
Prendo a respiração agarrando as correntes com força enquanto meu
corpo chacoalha sentindo toda corrente elétrica passar pelo meu corpo.
— Sabe de uma coisa meu caro rapaz, sua menina só está viva porque eu
permiti que ela ficasse viva, me surpreendeu que ela voltou para essa casa em
busca de vingança. — Solta os fios, pois sabe que mais uma carga certamente
explodirá meu coração.
Respiro com dificuldade sentindo minhas vistas ficarem turvas e acabo
regurgitando um pouco de sangue. Aquela onda de choque provavelmente afetou
alguns órgãos internos, mas nada que me levasse a uma morte instantânea e
rápida.
Ele anda em volta do meu corpo rodeando a faca afiada entre as mãos e a
fina sensação de dor se espalha pelo meu corpo ao sentir a ponta aguda em
contato com minha pele.
— Desde o princípio sabia que ela estava no Japão, você acha que
somente Jack é bom o suficiente com computadores? Kraz, também sabe usá-los
com maestria e seguiu todos os passos da sua pequena flor, mas ao entrar nessa
casa eu perdi o total controle de seus movimentos. Tenho que admitir que Kraz,
não é melhor que Jack, mas ele fez um bom trabalho ao longo dos anos. — Ele
demonstra uma cara triste irritante.
Me enoja lembrar de Kraz, ele é o braço direito de Donatel e um dos
homens mais fiéis que conheço. Também é o homem que ficou ordenado a matar
meus irmãos caso eu descumprisse suas ordens naquela noite.
— Você não contou a verdade rapaz? Deveria ter explicado para ela que
o pai dela tinha toda a culpa.
Ele brinca com a faca em cima de uma das minhas cicatrizes me levando
a uma angústia tremenda. Eu odeio que toquem minhas cicatrizes, odeio que
encostem em minha pele sem a minha permissão.
— Conte a verdade, conte que ela foi vendida antes de nascer e seus pais
assinaram os papeis de seu casamento a entregando legalmente a você. Conte
que antes dela completar 16 anos eles me traíram. — Ele ri.
Encaro Donatel com raiva, mas permaneço quieto como devo ficar e sei
que isso o irrita mais do que minhas próprias palavras.
Minha menina já sofreu demais ao perder seus pais e suas irmãs, ela não
precisa saber da traição deles.
— Será que você é capaz de protegê-la dessa vez? Donzel está à procura
da garota que nos pensamentos dele você roubou. Donzel consegue ser mais
maluco do que aparenta. — Ele sustenta um sorriso sádico enquanto segurava
um saco plástico nas mãos.
Me debato nas correntes tentando acertá-lo, mas meu corpo está cansado
demais para fazer tal coisa.
Jamais permitirei que Donzel encoste em Ivi, mas pensar nisso me traz
um grande aperto no peito ao perceber que a função de protegê-la já não está
mais em minhas mãos.
Para mim já não existe mais esperanças, arrependimento ou redenção.
Ela me odeia e não tem nada que eu possa fazer quanto a isso, pois ela realmente
tem todo o direito de me odiar.
Por mais que Royal seja durão e complicado, ele não deixará que
ninguém encoste em Ivi, pois inconscientemente criou uma empatia por ela.
Royal sofreu nas mãos de Donatel assim como qualquer um de nós e, apesar de
sermos criados tão brutalmente e aprendermos que o dinheiro vale mais do que
uma vida e que o poder de estar no controle de toda a Itália te leva a plenitude,
para nós, nossa união vale mais do que qualquer coisa e assim conseguimos
proteger uns aos outros até o presente momento.
Insatisfeito com meu silêncio Donatel volta as suas torturas em meu
corpo, pois psicologicamente ele não conseguiu me atingir e mesmo que
conseguisse eu jamais demonstraria.
— Você se faz de forte meu caro, mas deixa eu te contar uma coisa, sua
pequena e possível esposa já tem outro homem. — Seu sorriso vitorioso me
irrita.
Jamais acreditaria em suas palavras, pois sei que Robert Trion não passa
de um dos sócios de Frank que herdou o total controle sobre as empresas Becker.
O seu sorriso morrer ao me ver sorrindo abertamente, meu corpo está
cansado, as feridas abertas queimam e latejam incessantemente, mas me
mantenho firme diante do homem que acredita ser melhor do que eu.
Donatel pode ter me criado, pode ter me treinado e me preparado para ser
a porcaria do seu herdeiro, mas ele jamais vai conseguir atingir meu coração e
minha mente. O que ele vem lutando incessantemente para domar.
Apendi que por mais frio que possa me manter e me tornar, sempre
restará um fio de humanidade em meu coração me lembrando do meu passado e
do que cometi.
Isso pode me fazer fraco, mas me mantém vivo. Vivo para sentir toda a
dor da perda e a mágoa de um desprezo.
— É mesmo? Então ela ainda pode ser feliz — sussurro com um sorriso
no rosto.
Suspiro puxando o ar com força por estar cansado demais, a descarga
elétrica que Donatel usou em meu corpo roubou todas as minhas forças e me
manter em pé, mesmo que dependurado pelas correntes é realmente difícil.
Insatisfeito com a minha reação ele assumi uma postura rígida. Aqueles
olhos mortais me lembram da minha infância onde ele perdia seu controle e me
batia até me ver desmaiado.
— Donzel amará ter um novo brinquedo ruivo para sua coleção e isso me
renderá um lucro inestimável. — Sinto o sangue subir aos meus olhos ao
perceber as intenções dele.
Ele quer vender Ivi para Donzel em troca de poder, mesmo ela sendo
casada comigo ele quer dar minha garota para satisfazer o ego errante de
Donzel? Eu não posso acreditar nisso, não posso permitir que isso aconteça
jamais.
Não por ela ser minha esposa ou qualquer coisa do tipo, mas
simplesmente porque nenhuma mulher merece passar por isso. Somos membros
da máfia e por mais que nossas vidas andem extremamente torta, jamais
permitiríamos o tráfico de mulheres, muito pelo contrário, lutamos
incessantemente para acabar com esse tipo de coisa e não seria Donzel que
quebraria um acordo tão rigoroso que não envolve somente a Itália e os Voyaller,
mas muitos países.
Segurando o saco plástico nas mãos ele se aproxima encaixando o
mesmo em minha cabeça, e inconscientemente me preparo psicologicamente e
mentalmente para agonia e o desespero que vou sentir.
Ele segura fortemente o saco plástico fazendo o ar dentro daquele local
abafado ser reduzido, sinto tremores passar pelo corpo, mas me mantenho
parado enquanto o oxigênio diminui gradativamente e taxa de gás carbônico
aumenta naquele local dificultando minha respiração.
Seguro fortemente as correntes, tendo me manter forte, mas aquela
sensação de incapacidade e desespero dominando meu corpo fazendo com que
eu me debata em busca de oxigênio.
Ele segura o saco com mais firmeza fazendo com que o saco cole em
seus lábios dificultando ainda mais minha respiração. Gradativamente meu corpo
perde as forças enquanto minha mente se apaga a cada segundo que se passa, os
sons ao meu redor se tornam baixos e minha visão se escurece aos poucos.
EVA

Perdi as contas de quantas vezes rolei nesta cama tentando me esquecer


do que aconteceu mais cedo e a culpa de ter sido tão inflexível com Dante me
consome lentamente. Culpa essa que não deveria sentir, afinal, mesmo que ele
tenha sofrido da mesma maneira que eu, ainda tirou a vida dos meus pais e quase
me matou, mas me lembrar dos seus olhos magoados depois das minhas duras
palavras pesa meu peito de uma maneira que não deveria.
Não sei como serão as coisas de agora em diante e não tenho para onde
ir. É claro que posso usar o dinheiro das empresas, mas dói pensar que a única
pessoa que ainda não me traiu está no Japão, pois até mesmo Robert fez isso.
Encarar Dante de agora em diante será um verdadeiro sacrifício, e não
posso negar que amo aquele homem prepotente, mas nada justifica a atrocidade
que ele cometeu com minha família, ainda assim, me pergunto como vou
descobrir toda a verdade depois de nossa discussão.
Por que temos que ser tão teimoso? Me sinto irritada ao pensar que assim
como eu o orgulho daquele homem se sobrepõe as suas razões.
Ele está magoado e irritado e não quer dar o braço a torcer assim como
eu, o único problema disso tudo é que nós não ganhamos nada com isso, muito
pelo contrário só complicamos ainda mais nossas vidas.
Sinceramente eu já não sei em quem devo confiar, muito menos quem
está certo ou errado em toda essa história, mas sei que a única coisa que almejo é
a minha paz interior e no momento não estou tendo. Para ajudar no meio de toda
essa bagunça tenho que pensar em Donzel. Não me preocuparia com esse
homem se o desespero de Robert e de Dante em me proteger não fosse tão
grande, então manter uma atenção dobra sobre ele nunca é demais.
Respiro profundamente observando o teto do quarto por mais tempo do
que deveria. Eu não quero que esses turbilhões de pensamentos me assolem
como assolam no momento, mas é impossível.
Parando para pensar no passado, é maravilhoso ter Dante ao meu lado.
Ele era meu melhor amigo e fomos criados praticamente juntos. Dante sempre
foi carinhoso e dedicado. Ele é um homem que não tem medo de demonstrar o
amor que sente e esbanja toda a sua autoconfiança em pura paixão.
No passado Dante era extremamente possessivo e ciumento e muitas
vezes nossas conversas acabavam em serias discussões, pois ele nunca soube
controlar seu alter ego e sua arrogância, mas sempre gostei desse lado turrão
dele, somente não podia concordar com todas as brigas que ele arrumava com os
meus colegas de turma.
Respiro pensadamente sentindo as lágrimas embasar minhas vistas e
mais uma vez as forço a não cair.
Dante é e sempre foi o único homem que realmente amei, não sei se esse
era o objetivo de nossos pais, mas desde que me conheço por gente ele foi o
único a se aproximar e me proteger.
As lágrimas começam a queimar meus olhos, mas resisto firmemente a
esses fracos sentimentos. Não posso deixar esses sentimentos dominarem meu
peito ou então realmente estarei em maus lenções.
Tenho vontade de descontar minha raiva em algo, liberar minha
adrenalina e peso do meu peito em treinamentos como sempre fiz, mas isso não
será possível agora e acabo por praguejar e culpar Teresa, já que foi ela quem
colocou esperanças dentro do meu coração.
Jogo o travesseiro no chão irritada e me assusto ao ouvir Jack pigarrear
ao lado da cama com a sobrancelha arqueada.
— O que está fazendo aqui? — quase grito com a mão no peito, após me
levantar com o sobressalto de susto que acabei de ter.
Não ouvi ele chegar e isso tudo é culpa desse mar de sentimentos que me
deixam atordoada e alheia a tudo que se passa a minha volta.
— Não me olhe assim... A culpa é sua por estar imersa em seus
pensamentos, já faz um bom tempo que estou batendo na porta e você não
responde. — Ele cruza os braços.
— O que você quer Jack? Ainda não te perdoei. — Cruzo os braços.
Eu só queria ficar sozinha me martirizado e criando incontáveis
possibilidades sobre a realidade.
— Não me venha com essa, eu sei muito bem que está mentindo para nós
e seu verdadeiro nome não é Dana e sim Eva. Desconheço os seus motivos, mais
saiba que me sinto decepcionado por ter acreditado tanto em você. — Ele bufa
irritado.
Abaixo minha guarda o observando com pesar.
— Eu tenho os meus motivos assim como seu irmão tem os deles — me
limito em dizer.
— Sinceramente não quero pensar sobre isso no momento, tenho ordens
para te proteger e para lhe entregar isso. — Me entrega um envelope pequeno.
— O que é isso? — pergunto confusa.
— Não sei, Dante apenas pediu para lhe entregar, mas você não tem
tempo de ver isso agora, Donatel está de volta — resmunga irritado.
— E o que tenho a ver com o pai de vocês? — pergunto igualmente
irritada.
— Não sei, mas tudo está estranho. As coisas que andam acontecendo me
parecem premeditadas demais para ser simples coincidência então decidimos te
tirar dessa casa. — Ele franze as sobrancelhas pensativo.
— As coisas que andam acontecendo? — Ergo uma sobrancelha
intrigada.
— A volta de Donatel, a verdade sobre sua vida, a irritação de Dante e o
ódio que emana de vocês. Nada está correto, as coisas não se coincidem dessa
maneira. Sem contar que Donatel sedou Dante e o levou para a sala 371. Isso
não acontece a mais de dez anos e para piorar Dante não tentou reagir uma única
vez. — Ele suspira me deixando preocupada.
Eu não entendi muito bem, mas todas as outras coisas são de pequena
importância no momento em que ouvi que Donatel pegou Dante.
Seria possível que em todos esses anos aquele velho sabia que eu estava
viva? Isso é possível certo? Eu não consigo acreditar que isso seja verdade.
E por que ele iria atrás de Dante? Minha mente entra em parafuso mais
uma vez.
— O que Donatel fará com Dante? — pergunto preocupada sem saber se
realmente quero ouvir a resposta.
— Se ele foi levado para sala 371 certamente será torturado. — Jack
suspira passando as mãos no rosto. — Nem mesmo sei porque estou te contando
essas coisas, mas sinto que você é a chave de toda a resposta.
— Você está certo Jack. Donatel provavelmente sabe que ainda estou
viva, mas não sei porque ele foi atrás de Dante. — Passo a mão na testa
pensativa.
— Eu não entendo. Pesquisei sobre sua família e sei que eles foram
mortos... — A expressão de choque no rosto de Jack fica evidente quando ele
finalmente liga os fatos.
— Sim Jack, seu pai e seu irmão causou a morte de toda a minha família
e eu fui a única sobrevivente daquela noite. Sei que pode ser errado, mas te
confesso que voltei em busca de vingança e de respostas, porém, tem muito mais
por trás desse breve resumo e sinceramente não sei se Dante é tão culpado assim
— falo por fim e recebo um semblante de puro desgosto.
— Sei que Dante cometeu muitas atrocidades e que lhe dar o perdão
pode ser mais difícil do que parece, mas tenho certeza que ele foi obrigado a
atacar sua família, pois nunca vi meu irmão tão atribulado e desesperado quando
descobriu sua verdadeira identidade. É notório e visível o quanto ele te ama —
diz com sinceridade e aquelas palavras faz um nó se formar em minha garganta.
O culpei sem nem mesmo ouvi-lo e agora mais uma vez posso perdê-lo.
Jack tem a total razão, Dante me ama e nunca escondeu isso de ninguém e os
erros do nosso passado só nos distanciaram.
Não posso deixá-lo ir também, não posso perdê-lo mesmo tendo tanta
mágoa dentro do meu coração. Já não me resta mais nada nesta terra e nem
mesmo vivo para mim, apenas pela minha vingança. Agora perderei o que ainda
me move? Não posso permitir que Donatel tire de mim uma das únicas pessoas
que me resta e apesar de toda a dor que sinto, estou colocando nossas diferenças
de lado para deixar que meu amor se sobressaía sobre as nossas diferenças,
afinal, o único que deve pagar é Donatel.
— Donatel vai matá-lo Jack! — afirmo em desespero.
— Como pode ter tanta certeza? Você fala de Donatel como se o
conhecesse a anos.
— Não posso explicar as coisas agora, mas precisamos chegar até Dante.
— Caminho em direção a porta com rapidez, mas ele segura meu braço me
parando.
— Se acalme. As coisas não são assim, temos que tomar cuidado.
— São sim Jack. Você não entende — falo irritada, pois sinto que algo
ruim vai acontecer se demorarmos mais um pouco.
— Realmente não entendo. Nem mesmo sei o que está acontecendo, eu
confiava em você e agora não sei mais no que acreditar e recebi ordens diretas
para lhe proteger acima de tudo. — Despeja sua frustração em mim.
— Jack, eu não quero me proteja, só quero me leve até Donatel. —
Suspiro apertando os papeis em minhas mãos e me lembro da carta que Dante
deixou.
— Está maluca — ele praticamente grita.
— Se Dante deixou essa carta, é porque tem algo de importante aqui,
então antes de tudo eu preciso ler. — Abro o envelope retirando os papeis de
dentro e me surpreendo ao ver a letra arrastada e muito bem esculpida de Dante
bordar o papel.

Carta
Eva, eu nem sei como começar a te contar tudo o que aconteceu no
nosso passado, mas tentarei resumir aquela noite de maneira que entenda todos
os lados e não somente o meu, mas antes preciso confessar que nunca acreditei
te ver nessa terra novamente, já que nossos laços foram cortados no passado,
porém essa carta foi o único meio que encontrei de te contar a verdade sem
sucumbir ao meu amor por você.
Em primeiro lugar vou começar falando sobre os nossos pais, mais
especificamente sobre os seus que se dedicavam a vida criminosa assim como os
Voyaller.
Por um deslize de um dos sócios de Frank, as empresas Becker começaram a
perder status e decaiu rapidamente.
Ele se viu desesperado quando isso aconteceu, pois o nome da família
estava envolvido em coisas ilegais, uma de suas irmãs não cumpriu o serviço de
assassinato corretamente e deixou vestígios gravíssimos para a polícia. Seu pai
estava passando por um momento difícil e o dinheiro para encobrir os vestígios
que a polícia encontrou estava em falta.
Ele com toda certeza perderia tudo, então se viu obrigado a procurar a
única pessoa que certamente lhe ajudaria, Donatel Voyaller. Não sei te
responder como eles se conheceram, ou por quantos anos seu pai já prestava
serviços para o meu, mas posso garantir que os dois eram amigos de longa data.
Frank precisava livrar o nome da família do fracasso, além de subir suas
ações que despencavam diariamente e Donatel tinha tudo o que ele precisava.
Fama, dinheiro e um bom comportamento perante a sociedade, entretanto, assim
como eu, você sabe que todo contrato tem um preço e o do seu pai foi você.
Diana estava gravida de sete meses e Donatel estava à procura de uma
noiva para seu herdeiro. É claro que ele se aproveitou da oportunidade que lhe
surgiu, pois poderia moldar a sua personalidade de acordo com suas vontades e
não teria erros de desistência no futuro, afinal, você era o pagamento de uma
dividida e agora pertencia a família Voyaller.
De começo Frank ficou receoso, achou a ideia um absurdo e se recusou
a aceitar tal absurdo, mas a situação de sua família começou a se apertar cada
vez mais e a polícia estava a um passo de chegar até os Becker. Seu pai não
vendo saída para a situação que se encontrava se viu obrigado a aceitar as
propostas de Donatel e finalmente firmar um contrato de noivado com a máfia.
Quando você completasse dezesseis anos, nós finalmente estaríamos
casados. Não se engane achando que Donatel, deixa brechas nos contratos que
firma, ele é analítico e calculista demais para cometer tal erro e esse é um dos
motivos do nome dos Voyaller ter crescido tanto em poucos anos.
Contudo, voltando ao assunto da sua família, Donatel, fez questão de
fazer seu pai assassinar o contrato de casamento antes mesmo de você crescer.
Uma das exigências de seu pai era que você não soubesse sobre o passado de
sua família e pudesse ter uma vida normal até os seus dezesseis anos.
Apesar de rígido com seus contratos, Donatel, não viu problema em
aceitar o pedido do amigo. E para facilitar nosso casamento, fui instruído desde
pequeno a permanecer ao seu lado. Por esses mesmos motivos você nunca
conheceu meus irmãos, nossos pais não queriam competição. Você estava
destinada a mim e a ninguém mais.
Eva, peço desculpas por isso, mas fui criado sabendo que você era
minha noiva e que meu dever era te amar e fazer você me amar. Quando
finalmente tinha idade para entender o que nossos pais fizeram me odiei e me
culpe, mas as intenções deles eram reais, pois eu realmente estava apaixonado
por você e não poderia deixá-la partir. Eu realmente te queria para sempre,
porém, quando isso estava prestes a acontecer seu pai se arrependeu.
Frank não queria entregar a filha para um homem como Donatel, que
era conhecido pelas atrocidades que cometia, então, sua família planejou uma
fuga meses antes do seu aniversário de dezesseis anos. É claro que Donatel
descobriu tudo.
Isso enfureceu Donatel de tal maneira que ele não pensou duas vezes em
agir. Uma traição dessas repercutiria de forma negativa dentro da máfia e faria
o nome dos Voyaller decair drasticamente. Ele não iria permitir que tudo o que
custou a construir fosse desfeito por uma traição e me usou para concluir seus
planos.
Eu não tenho muitas explicações para aquela noite Ivi, mas aos
dezessetes anos um herdeiro começa a assumir seu papel dentro da máfia e
concluir missões é uma dessas tarefas. Quando meu pai disse o que teria que
fazer, obviamente recusei, contudo, ele usou meus irmãos para me persuadir.
Ou seguia seus planos ou ele mataria meus irmãos diante dos meus
olhos. É claro que antes dessa ameaça ele fez questão de torturar os três em
minha frente sem que eu nada pudesse fazer.
Naquela época eu não tinhas muitas opções, era jovem e estava
ingressando em um mundo que até então desconhecia. Ouvir histórias enquanto
treina é uma coisa, participar ativamente das histórias é totalmente diferente e
na minha pequena humildade e ignorância aceitei o serviço pela vida dos meus
irmãos e fiz Donatel prometer que não lhe faria mal, mas ele fez.
Donatel tinha uma arma apontada para sua cabeça. Entende o meu
desespero? Ele não hesitaria em matá-la e até o último momento tentei te
proteger. Atirei primeiro para evitar que ele acertasse sua cabeça, mas seu
corpo tombou rápido demais me levando a acreditar que você estava morta.
Tirei sua vida com minhas próprias mãos, participei do seu enterro e
jamais me perdoaria por isso.
Viver sem você nunca foi fácil, a culpa e o peso do desespero me assolam
dia após dia e confesso que quando empunho minhas armas minhas mãos
tremem. Foram com elas que tirei a vida da minha amada.
Eu juro Eva, juro que meu único objetivo sempre foi te proteger, juro que
me martirizei todos os dias e segundos da minha vida. Sem você nunca fui feliz,
nunca segui em frente, apenas me tornei a máquina que meu pai sempre quis
como forma de pagamento para os meus pecados, porém a cada ordem que
seguia e a concluída me sentia ainda mais distante. Você com certeza herdaria o
céu, já eu sempre estive destinado ao inferno.
Queria ter tempo para lhe explicar tudo pessoalmente, mas não posso,
nem tenho coragem de olhar dentro dos seus olhos e mesmo que me doí dizer
isso você merece a felicidade longe de mim.
Donatel está de volta e eu sei que ele tentará lhe fazer mal porque
Donzel estar atrás de você, mas eu lhe protegerei, mesmo que me odeie
eternamente e que custe a minha vida, lhe protegerei com tudo o que tenho e o
que me resta, então te deixarei livre para sempre e a sua vingança finalmente
será concluída.
Para sempre seu, Dante Voyaller!

Minhas mãos tremem enquanto seguro os papeis, as lágrimas rolam


livres pelo meu rosto e desta vez não reprimo uma única gota. A tanto tempo
culpei Dante, o julguei e desejei sua morte, mas o culpado sempre foi meu pai e
no momento o emaranhado de sentimentos que me assolam me deixam em
desespero.
Me sinto um objeto que desde o início foi usado, na verdade, nunca tive o
direito de escolha, minha vida estava premeditada de acordo com as vontades do
meu pai e de Donatel.
Aperto os papeis nas mãos me sentindo atordoada e frustrada por ter
vivido cercada de mentira. Preciso ver Dante, preciso estar perto dele. É claro
que ele também mentiu para mim, que também tem sua parcela de culpa em toda
essa história, mas no momento o seu pecado se torna irrelevante perante tudo o
que nos fizeram passar.
— O que tem nessa carta? — Jack pergunta confuso ao me ver chorar.
— Vamos Jack, me leve até Dante. — Suspiro.
— -Você não pode passar pela casa, os homens de Donatel tomaram o
local e você pode ser um alvo se eles estiverem trabalhando para Donzel, sem
contar que tudo fica muito tumultuado quando nosso pai volta. — Me barra mais
uma vez.
— Jack, não é só eu que estou em perigo. — Suspiro. — Esse final. —
Seguro os papeis mostrando para ele com irritação. — Ele está se despedindo.
Deixo os papeis em suas mãos e ele rapidamente passa os olhos em
algumas frases.
— Vocês, eu juro que não entendo. — Dobra a carta guardando no bolso
a contragosto.
— No momento você só precisa confiar. — Suspiro e o vejo torcer o
nariz. — Vai me levar até Dante, ou não? — Cruzo os braços tentando conter o
emaranhado de sentimentos que me deixa atordoada.
Não posso me entregar a esses fracos sentimentos, não posso me deixar
levar pelo desespero que consome meu peito. Preciso ser forte por mim e por
Dante neste momento, pois não sei os planos de Donatel ou até onde esse velho é
capaz de ir, mas eu tenho certeza que ele sabe que ainda estou viva ou então não
forjaria meu enterro levando Dante a acreditar em minha morte.
— Vamos. — Jack indica a porta do quarto. — Mas pode ter certeza que
vou querer entender isso. — Indica os papéis do bolso.
— Somente seu irmão pode lhe explicar — falo impaciente querendo
chegar até Dante o mais rápido possível.
Jack me guia até se quarto e pede silêncio ao passar pelo corredor. Assim
que entramos ele fecha a porta e se certifica de estar trancada.
— Venha. — Indica uma porta que leva até seu closet muito bem
arrumado. Uma prateleira com sapatos dispostos a nossa frente me chama a
atenção e nunca imaginei que ele seria tão organizado, mas me surpreendo
quando ele puxa um pequeno teclado digitando algumas coisas e seus ternos
deslizam para trás e para o lado abrindo uma passagem.
— Vocês me surpreendem a cada dia — murmuro surpresa.
— Essa casa é cheia de segredos e passagens. Ela foi construída para
isso. — Sorri com satisfação
— Era de se imaginar — resmungo seguindo-o por uma escada em
espiral.
As luzes do local se acendem conforme descemos e logo em seguida se
apagam. Passamos por um corredor estreito e descemos mais alguns degraus até
Jack parar em frente a um computador acoplado a parede.
Seus dedos ágeis deslizam pelo teclado com habilidade e ele apoia os
cinco dedos da mão esquerda em um sensor digital abrindo a porta a nossa
frente.
Jack indica a passagem e entro na sala ampla e moderna. O local é
aconchegante, porém, cheio de computadores e monitores fixos nas paredes
passando em tempo real todas as câmeras da casa.
Acabo me surpreender por ver uma quantidade maior de homens
perambular pela casa em um dos monitores dispostos a minha frente, mas me
mantenho calada e alheia a tudo que se passa por ali, meu único objetivo é
encontrar Dante e nenhum dos monitores me mostra ele.
Uma única mesa em forma de meia lua no centro da sala me chama a
atenção e somente agora percebo Max e Royal atrás dos diversos monitores.
Quero chegar até Dante e esse local não vai me ajudar. Eu não posso
perder tempo, preciso encontrar Donatel e acabar com toda essa palhaçada de
uma vez.
— Bem-vinda ao meu mundo. — Brinca com um sorriso no rosto.
Acabo sorrindo ao ver como se sente à vontade entre as telas e
computadores, mas preciso ver Dante logo, pois um aperto em meu peito me
deixa receosa.
— Você disse que me levaria até Dante — murmuro observando-o
irritada.
Jack apenas maneia a cabeça indicando o local que os irmãos estão. Me
aproximo dos monitores e sinto todo o desespero me dominar ao ver Dante
dependurado pelos pulsos, sem camisa enquanto Donatel acerta seu corpo e seu
rosto já ensanguentados com socos certeiros.
Ele se curva ao sentir a dor se espalhar por seu corpo, porém nenhum
gemido sai de seus lábios.
Dante é um homem forte, corajoso e não se entregaria tão facilmente as
vontades e capricho do pai, mas observar aqueles olhos azuis sem vida e sem
esperanças me levam a crer que ele desistiu de tudo.
A voz de Donatel sai pelas caixas de som da sala e minha atenção se
volta para cada palavra que sai da boca daquele crápula.
— Você não contou a verdade rapaz? Deveria ter explicado para aquela
garota que o pai dela tinha toda a culpa.
Donatel brinca com a faca sobre a pele de Dante e posso ver a angústia
explicita em seu olhar.
— Conte como Eva foi vendida antes de nascer e seus pais assinaram os
papeis de seu casamento. Conte que antes dela completar dezesseis anos eles me
traíram tentando sair do país.
— Não estou entendo porra nenhuma. — Max passa as mãos no cabelo
nervosamente.
— Quem é Eva? — Royal pergunta confuso.
Sinto meu peito se apertar ao ver Donatel torturar o filho sem piedade.
Ele não cessa seus golpes e não deixa que seu corpo já cansado e tremulo
descanse, mesmo que Dante tenha a possibilidade de responder ou ao menos
tentar revidar ele não reage, apenas permanece calado recebendo toda a dor
como uma forma de castigo.
Reaja Dante, por favor, reaja.
Suplico em pensamento apertado as mãos envolta do meu corpo. Donatel
sabe que estou viva, sabe que provavelmente estou assistindo tudo e tomará de
mim a última pessoa que ainda me completa e me torna viva.
Eu não posso permitir que isso aconteça, preciso chegar até Dante.
— Eu preciso fazer algo. — Sigo em direção a porta, mas uma mão firme
segura meu braço me parando.
— Você está sob nossa proteção, não sairá daqui mesmo que Dante
morra. — O tom da voz de Royal me deixa ainda mais irritada.
— Eu sei me proteger, não preciso que vocês se preocupem, na verdade,
a única coisa que precioso neste momento é ver Dante antes que minha culpa
não me deixe mais viver e então a proteção de vocês será em vão. — Me livro
das mãos de Royal com hostilidade.
— Não queremos te machucar, mas se for necessário usar a força para
cumprir nossa missão de te proteger não hesitaremos. — Max cruza o braço
sobre o peito.
— A deixem ir. — Jack suspira.
— O quê? — Royal o observa perplexo. — Está maluco?
— O verdadeiro nome dela é Eva Becker, é a única sobrevivente da sua
família. Nosso pai e nosso irmão fizeram o trabalho sujo após uma traição da
família dela. Dante ama essa mulher e está disposto a se entregar a morte por ela.
— Jack suspira e posso ver a decepção estampada no rosto dos gêmeos.
— Me desculpem por mentir, entretanto, a muitas coisas que vocês não
sabem — murmuro.
— Ela não é culpada de nada, é apenas uma vítima. — Jack retira os
papeis da carta de Dante do bolso e entrega aos irmãos. — Eu sei que vocês dois
estão esperando nosso irmão reagir e quebrar as correntes que prendem seus
pulsos, mas ele não fará isso. Ele se entregou a nosso pai e não revidará nenhum
golpe. — Jack cruza os braços suspirando.
— Eu preciso salvá-lo, eu já perdi tudo o que eu tinha, não posso perdê-
lo também. — Sinto as lágrimas queimarem meus olhos.
— Nossa função é protegê-la independente do passado ou do presente. —
Max dá alguns passos à frente com uma expressão séria, mas Royal se coloca a
sua frente o parando.
— Eu não entendo um terço de tudo o que está acontecendo, mas eu sei
que você é a única mulher capaz de mexer com Dante a ponto de deixá-lo tão
vulnerável e submisso...
— O que está falando Royal? Logo você? Perdeu o juízo? — Max eleva
o tom de voz batendo o braço contra a mão do irmão que havia se pousado em
seu peito.
— Max, você sabe que ela é a única que pode salvar Dante. Olhe para
ele, não importa o que nosso pai fale ou faça, ele não se move. — Royal empurra
o irmão o afastando.
— Vá, essa sala fica ao lado da sala 371, basta sair pela a sua esquerda.
Eu seguro esse cabeça dura enquanto Jack te cobre contra os homens de Donatel.
— Royal passa o braço contra o pescoço do irmão tentando pará-lo, mas é difícil
saber quem tem a força maior ali, já que os dois são idênticos, tanto de altura,
quanto de aparência física.
Nem mesmo espero a confirmação de Jack, apenas corro em direção a
porta passando por ela sem me preocupar com os homens do corredor. Eu já
havia decorado as posições dos três homens pelos monitores, então não seria
difícil abatê-los.
Assim que saio pela porta a atenção dos três homens se voltam para mim
e antes que o primeiro deles consiga sacar sua arma acerto uma joelhada em seu
estômago o deixando atordoado. Os seus companheiros correm em minha
direção e acabo usando o corpo do homem a minha frente para me proteger dos
tiros, mas Jack é rápido e vejo os dois homens ao meu lado tombar.
Sem perder tempo empurro a pesada porta de aço com os números 371
estampados na mesma. Donatel nem se importa com o som dos tiros no corredor,
ele está mais interessado em asfixiar o filho com o saco plástico que se debate
em desespero em busca de ar.
Isso me cega e me deixa completamente tomada pela raiva e pelo ódio,
não penso nas consequências ou no que meus atos vão gerar, apenas corro em
direção a um dos homens que mais odeio chutando meu corpo com tudo o que
tenho, mas o velho tem um bom reflexo defendendo meu chute antes que
consiga derrubá-lo, porém consigo afastá-lo o suficiente para arrancar o saco da
cabeça de Dante permitindo que ele possa respirar novamente.
Eu não posso perder minha concentração nem mesmo por um segundo,
pois o homem a minha frente certamente me matará sem pensar duas vezes,
afinal, o ódio está estampado em seu olhar.
Não consigo concentrar minha atenção em Dante, já que Donatel desfere
pesados socos em minha direção, mas posso notar que ele está atordoado demais
e encontra dificuldade em permanecer em pé.
Basta desviar a atenção do meu oponente por um segundo que seu punho
se encaixa perfeitamente em minha bochecha me jogando para o lado. O gosto
do sangue se espalha pela minha boca e passo a língua no interior dela sentindo
o corte causado pelo atrito contra meus dentes.
— Juro que retornei apenas para acabar com você seu psicopata
desgraçado. — Aperto os punhos avançando em Donatel sem me preocupar com
seus golpes.
Eu não temo seus punhos, não temo suas armas e nem me importo com o
que pode me acontecer, nesse momento a minha única intenção é salvar o
homem que tanto odeie, mas aprendi a amar novamente. Dante sempre foi meu
tudo no passado e hoje isso não é diferente, nossos caminhos só haviam se
distanciado, mas por motivos maiores se cruzaram novamente.
— Que imprudência, voltar depois de onze anos, achei que finalmente
havia acabado com você. Deveria ter ficado no Japão. — Ri segurando um
chicote nas mãos, mas o que verdadeiramente me preocupa é o fato de sua
atenção estar inteiramente voltada a Dante e antes que eu possa pará-lo ele acerta
mais uma vez o corpo cansada e tremulo do filho.
— Desgraçado, deixe ele em paz — grito procurando por uma arma
próxima que possa usar contra Donatel. Apesar desse quarto ser um arsenal,
poucas são as armas de combate direto, a maioria são utilizadas em tortura e
queima de arquivos.
— Maldito o dia que fiz aquela proposta ao seu pai, deveria ter te matado
quando tive a oportunidade. — Ele caminha em direção a Dante novamente.
— Pouco me importa, vocês são um bando de mentirosos — rosno
desferindo uma sequência de chutes que acaba acertando sua costela em cheio,
mas ele aproveita aquele momento para travar minha perna com seu braço
puxando meu corpo próximo ao seu.
— Tenho que admitir que você luta bem, além de ser uma vadia linda
como sua mãe. — Aproveita o momento para acariciar meu rosto e a única coisa
que sinto é nojo.
Tomada pelo impulso e pela repulsa acerto minha testa na dele fazendo
com que me solte e xingue alguns palavrões por não esperar aquele ataque.
— Você é asqueroso e nojento.
Aproveito o momento em que ele fica atordoado para acertar golpes
certeiros em sua cabeça e corpo. Agarro sua jaqueta de couro preta acertando
várias joelhadas em seu abdômen deixando-o sem ar. E o chicote solto ao chão
me enche de ideias.
Seguro o chicote com firmeza acertando suas costas sem piedade, sua
jaqueta se rasgar e um gemido sai de seus lábios.
— É assim que você gosta de torturar seus filhos? Então vamos usar isso
contra você, verme asqueroso. — Bato mais uma vez o chicote em suas costas e
quando vou dar a terceira ele ergue seu olhar em minha direção colocando o
braço na frente fazendo o couro se enrolar ali.
Donatel puxa o chicote me levando junto e quando menos espero seu pé
vem de encontro ao meu estômago fazendo a dor reverberar por todo o meu
corpo. Acabo tossindo com o golpe certeiro e cambaleio ao me sentir atordoada
demais para revidar.
— Você é uma pequena órfã desiludida. — Ri ao dizer aquelas palavras
que tanto me magoam e me machucam.
Apoio a mão na barriga tentando me recompor, mas Donatel nem mesmo
se importa com meu corpo atordoado a sua frente, ele quer machucar Dante e
assim o faz ao desferir uma sequência de socos na costela do mesmo que já não
tem mais forças para lutar, mas estava se recuperando bem da asfixia.
Um forte aperto surge em meu peito e por mais que ignoro aquele
sentimento de impotência e incapacidade eles me dominam.
— Você vai morrer pelas mãos do seu amado da mesma maneira que seus
pais morreram. — Suas palavras maldosas fazem meu coração sangrar, mas ele
não consegue me vencer com lavagem cerebral, pois, por mais que aquelas
palavras doam, meu coração já está blindado da maldade daquela família e o
meu desejo de vencer é maior do que qualquer outro sentimento.
— Vou tirar tudo de você. Seu amado já está indo e depois seu precioso
guardião. — Ri se recompondo dos meus ataques. — Farei questão de deixar
você assistir Robert Trion morrer lentamente.
— Desgraçado — grito correndo em sua direção, mas um soco em meu
rosto faz com que eu caia para o lado.
— Você destruiu meu herdeiro, você o tornou fraco e incapaz de assumir
a liderança dos Voyaller. Amor? Quem precisa de amor? Só precisamos de
poder, dinheiro e fama. Amor é um sentimento supérfluo e desnecessário, só
serve para te deixar fraco e vulnerável.
Aquelas palavras me surpreendem e no fim sinto dó de Donatel por ser
tão vazio. Não posso deixar o ódio dominar meu peito ou perderia para o homem
a minha frente.
Ergo o olhar e me deparo com uma katana fixada a parede, não perco
tempo em me levantar e desembainhar a espada vendo que ela é muito bem
afiada. Já estou cansada de ouvir as ladainhas de Donatel, não posso deixá-lo
machucar ainda mais Dante e concluir seu objetivo de chegar até Robert, preciso
matá-lo o quanto antes.
Seguro a espada com as duas mãos e ataco Donatel sem piedade. Meus
movimentos são rápidos e certeiros, afinal, espada é a minha melhor modalidade
de luta. Eu amo esse item e sempre procurei aumentar minhas habilidades com
ele.
Assustado com meus ataques que o colocam em uma posição de grande
risco, Donatel desvia com certa dificuldade, pois estou atacando para matar e
quando finalmente o encurralo pronta para golpeá-lo no peito, mas ele consegue
parar minha lâmina com o primeiro pedaço de ferro grosso que encontra. A
espada afiada chega a entrar no ferro quase atravessando-o.
Chuto seu joelho fazendo-o cambalear, mas a voz de Dante tira meu foco
de Donatel por um único segundo.
—Ivi. — Dante geme e tosse me deixando preocupada.
Essa pequena distração é o suficiente para Donatel me desarmar e passar
o ferro que segurava em mãos em volta do meu pescoço me asfixiando.
Seguro a barra de ferro com força tentando me livrar dela, entretanto, é
difícil quando ele usa sua força para me imobilizar e me prender de frente contra
a parede dificultando meus movimentos.
Minhas vistas começam a embasar e o oxigênio falta em meu organismo,
mas não posso deixar o desespero dominar meus pensamentos e assim acabo
agindo por puro impulso e instinto. Apoio meus dois pés contra a parede
forçando meu corpo para trás fazendo Donatel se desequilibrar e cair de costas
no chão junto comigo.
Caio desajeitadamente sobre o corpo daquele velho e procuro me livrar
rapidamente das mãos dele, mas seus dedos se juntam em meus cabelos com
força me arrastando. As mãos de Donatel rapidamente me soltam e sua atenção
se volta complemente para o filho que lhe ataca sem piedade.
Jack me ampara enquanto Royal avança sobre o pai sem piedade ou
qualquer receio. Não tenho tempo para prestar atenção ao que acontece em
minha volta, apenas puxo o ar com força tentando me recuperar do ataque que
acabei de receber.
— Oras... Os três cavalheiros vieram salvar a moça indefesa — ironiza
sarcasticamente, mas logo se cala ao se ver encurralado por Max e Royal.
— Vocês sabem que não podem me matar ou me fazer mal, então saiam
da minha frente — diz de forma sarcástica.
— Já estamos cansados das suas mentiras. — Max desfere um golpe
contra o pai, mas é parado com facilidade.
— Eu conheço muito bem o estilo de luta dos quatro, não será fácil me
derrubar. Aquela ruivinha tem mais chance do que os três... — Se cala quando
Royal lhe acerta as pernas.
— Esqueceu que crescemos e aprendemos a lutar em equipe o que você
nunca deixou que praticássemos. — Os gêmeos se unem em golpes duplos e em
equipe forçando Donatel a se calar e defender.
Me livro das mãos de Jack e aproveito o momento para correr até Dante
com certa dificuldade.
— Dan. — Apoio a mão em seu rosto sentindo meu estômago doer, mas
procuro ignorar a dor.
Dante se remexe forçando as correntes contra seus punhos tentando se
libertar, seus olhos estão tomados pela raiva e pelo ódio. As grossas correntes
balançam rangendo com sua fúria e um grito de ódio rompe a sala me
assustando.
— Eva. — Meu coração se acelerar ao ouvir seus gritos de raiva.
Eu quero acalmá-lo, quero libertá-lo dessas correntes que o machucam,
quero mostrar que está tudo bem e que o perdoo por todo o nosso passado, mas
antes preciso acabar com Donatel.
— Jack, solte Dante — murmuro voltando minha atenção para o velho
que está tomando uma verdadeira surra dos filhos.
Cansado, ele se mantém em pé com dificuldade e tomada pelo desejo de
vingança que explode em meu peito. Pego a katana do chão caminhando em sua
direção a Donatel, mas a mão de Royal me para.
— Você não precisava fazer isso, só te trará problemas no futuro. — A
voz de Royal me faz sorrir.
— Vamos lá ruivinha, esse olhar é igual ao de Diana quando estava com
raiva. Ela era realmente linda, mas só tinha olhos para Frank. Uma verdadeira
pena — cospe com raiva e se cala ao receber um golpe na boca do estômago
enquanto o Max o imobilizava.
— Não fale da minha mãe. — Aperto o cabo com mais força me
preparando para enfiar a espada afinada no peito do homem que destruiu minha
vida.
Apoio a ponta da katana em seu peito forçando a ponta dela em seu peito
vendo uma expressão de dor tomar seu rosto por um momento.
— Acabe com isso — me instiga, mas acabar com a vida dele tão
facilmente não me satisfaz. Eu quero vê-lo sofrer e perder tudo o que tem assim
eu.
— Ivi não — Dante rosna com uma das mãos já soltas.
— A morte é um preço muito leve para os seus pecados, você merece
muito mais do que isso — murmuro apertando com força p cabo da katana
contendo meu ódio.
Solto a espada deixando-a cair no chão e sem demora Royal algema o pai
o imobilizando completamente.
— Fez certo Dana. Não impediríamos de matá-lo, mas se isso
acontecesse dentro do nosso território você nos colocaria em uma verdadeira
guerra, pois, por mais sádico que Donatel seja, ele faz parte da família e nossa
função é protegê-lo — Max explica me fazendo suspirar.
Apenas maneio a cabeça e me volto para Dante, Jack está com certa
dificuldade para soltar sua outra mão e procuro ajudá-lo. Mal tenho tempo de me
aproximar e sua mão me puxa contra seu corpo em um abraço desesperado.
— Senti sua falta — murmura em meu ouvido cheirando os meus
cabelos.
— Ei fica quieto, Jack está tendo te soltar — O repreendo passando meus
dedos por seu rosto machucado e Jack finalmente consegue soltar o outro braço
de Dante que geme se apoiando em mim.
— Acho que desloquei o ombro — sussurra próximo ao meu ouvido.
— Por que não reagiu a Donatel? — Apoio seu braço em meu corpo para
mantê-lo em pé.
— Não faz sentindo viver nesse mundo sem você. Eu aguentei todos
esses anos apenas para pagar pelos meus pecados, mas não consigo suportar o
fato de que você me odeia a ponto de desejar a morte, então apenas me
entreguei.
Sinto as lágrimas queimarem meus olhos.
— Só queria ter a oportunidade de me desculpar corretamente.
— Dante agora você... — Não tenho tempo de terminar minha frase
apenas sinto os braços de Dante me apertar contra seu corpo quando escuto a voz
de Donatel romper a sala.
— Mate-a Kraz — Donatel grita rindo.
O som de vários tiros faz meu ouvido zunir e não tenho tempo para
reagir, Dante apenas aperta meu corpo contra o seu e quando ergo a cabeça um
suave sorriso se espalha por seu rosto.
— Eu te amo Eva... — Algo quente molha minha mão e o corpo de
Dante começa pesar sobre meus braços.
Ao olhar o vermelho vivo manchar minhas mãos e roupas o desespero
domina todos os meus pensamentos.
— Dante? — Arregalo os olhos sentindo meu peito se dilacerar e se
rasgar enquanto seu corpo pesado desliza sobre meus braços até o chão.
Me ajoelho abraçando seu corpo sentindo sua respiração mais fraca a
cada segundo que se passa.
— Você não pode me deixar... — Pressiono a ferida tentando parar o
sangramento. — Eu ainda tenho muito o que te dizer — sussurro próximo ao seu
ouvido vendo minhas lágrimas se misturar com o vermelho que banha seu corpo.
O meu maior desejo era me vingar do homem que havia matado minha
família, mas jamais imaginei que me apaixonaria por ele uma segunda vez.
Jamais imaginei que ele colocaria novas esperanças em meu coração. Que Dante
se tornaria tão doce apesar de sua brutalidade e insensibilidade. Ele me amou por
todos esses anos e me fez perceber que eu também o amei, mas a vingança
tomou conta do meu coração me fazendo desperdiçar anos da minha vida longe
dele.
Agora percebo que nem sempre a vingança é doce como esperamos, às
vezes ela é amarga como o fel e toma de você tudo o que um dia acreditou ter.
O enorme vazio dentro do meu peito se espalha por toda a minha alma
me consumindo e me engolindo por completo. As risadas de Donatel enchem a
sala enquanto Royal tenta me tirar de cima do corpo de Dante.
As lágrimas rolam dos meus olhos e mesmo que Royal grite várias coisas
ao meu lado, simplesmente não consigo ouvir. Tudo em minha volta está cinza e
apagado, a única coisa que consigo ver é o corpo de Dante a minha frente e o seu
pai ao chão rindo.
Um grito de dor e raiva rompe minha garganta e quando vejo já me
levantei ignorando qualquer tentativa de Royal em me parar.
Max está sentado ao lado com a mão no ombro e meu único foco é o
homem algemado ao chão. Nada mais faz sentido e Donatel mais uma vez
tomou tudo de mim. Entre os borrões que se passam a minha volta o único som
que entra por meus ouvidos é a voz de Donatel que zomba da minha desgraça.
— Falta apenas Robert. Terei o prazer de matá-lo. E depois, Donzel se
divertirá muito com você.
Esse homem tirou tudo de mim, tirou minha liberdade, minha família,
minhas esperanças, tomou minha juventude, minha infância e agora levou Dante.
É insuportável esses pensamentos, desesperador e traumático. Já não tenho mais
sentido para viver, a dor me consome e as lágrimas rolam livres pelo meu rosto.
As palavras de Donatel não me machucam, eu estou destruída demais
para ouvir suas provocações, mas a raiva que cresce em meu interior toma conta
do meu corpo ao ver o homem que mais amei caído ao chão.
Não tive a oportunidade de me desculpar, de dizer o quanto o amava, não
tive oportunidade de perdoá-lo e dizer que seus pecados não eram nada. Fomos
usados.
Minhas lágrimas escorrem por meu rosto ao observar minhas mãos sujas
de sangue, as manchas vermelhas em minhas roupas fazem meu corpo tremer ao
me jogar no passado. Cenas dos corpos dos meus pais e irmãs invadem minha
mente, todo meu corpo estremece sem parar.
Tomada pelo impulso e pelo ódio, me vejo montada sobre o corpo de
Donatel socando seu rosto sem piedade e não demoro a arranca de seu rosto o
sorriso presunçoso e vitorioso que se espalhava. Meus punhos sangram com o
contato de osso com osso, mas a dor física é irrelevante se comparado com a dor
da minha alma.
Não sei quantos socos acerto em seu rosto e nem me importo com o fato
dele estar algemado e inconsciente embaixo de mim, quero apenas destrui-lo,
matá-lo sem piedade.
O homem a minha frente merece sofrer, merece presenciar toda a dor
física possível.
Mãos pesadas me imobilizam, mas eu não quero parar, quero gritar,
correr e deixar toda a dor extravasar do meu peito. Quero que o sentimento de
vazio e impotência saiam de dentro de mim, mas de nada adianta.
O perfume inebriante de Royal invade meus sentidos e tento me livrar de
seus braços, mas ele me abraça e me ampara me imobilizando com certo
cuidado. Cansada e sem forças para continuar aquela luta corporal, me entrego
ao desgostoso desespero que me consome.
Cheguei à conclusão que a vingança não te leva a lugar algum, ela apenas
te torna ainda mais fraco e vulnerável e toma de você aqueles que estão ao seu
lado.
Acordo com uma forte dor de cabeça, meu peito dói, minhas mãos
também, bom, para ser sincera todo meu corpo está pesado e dolorido. Um
estranho vazio consome cada parte do meu ser e a tristeza domina meu coração.
Abro os olhos com dificuldade gemendo com a claridade que recebo em
meus olhos. Levo as mãos até o rosto para afastar a luz que insiste em machucar
minha retina e me surpreendo ao sentir minhas mãos enfaixadas por bandagens.
Passo os dedos sobre as fitas e faço uma careta ao sentir sensibilidade em
certos locais. Respiro profundamente conforme meus olhos finalmente se
acostumam com a claridade e por um momento me sinto entorpecida pela
sonolência, mas flashes da noite passada me deixam em desespero. Meus olhos
transbordam ao perceber que havia perdido mais uma pessoa preciosa para mim.
Choro silenciosamente deixando que as lágrimas diminuam o nó que se
forma em minha garganta e mesmo que ainda reste Robert ao meu lado, dói
saber que perdi todos a quem amava.
A dor que se espalha em meu peito é sufocante, gritar não alivia o aperto
do meu coração e o nó de angústia engasga minha garganta dificultando minha
respiração.
Não tive tempo de me despedir, não tive tempo de me desculpar por
todos os anos que o culpei e o julguei. Dante morreu sem o meu perdão, se
culpado pelas minhas dolorosas palavras e acusações e agora assim como ele,
viverei meus dias de solidão na terra me culpando por aquilo que de fato fiz.
Matei uma das pessoas que mais amei.
Estou sozinha. Sozinha em um mundo onde não há mais esperanças.
Concluí minha tão sonhada vingança e ela me custou um preço tão caro que nada
neste mundo pode pagar.
Não há mais razões para permanecer neste mundo. Sei que é egoísmo da
minha parte e não deveria pensar desta maneira, pois lutei tanto para chegar até
aqui e agora simplesmente não tenho mais razões para continuar. Contudo,
descobrir toda a verdade foi doloroso e o pior é saber que as parcelas de culpa de
Dante eram quase nulas perante toda a situação. Sempre coloquei todo a culpa
no menino de olhos azuis frios que puxou o gatilho, quando os verdadeiros
culpados estavam mais próximo do que eu poderia imaginar, minha própria
família.
Não posso tirar a parcela de culpa de Donatel que ofereceu toda essa
ideia absurda, mas o interesse e o desespero momentâneo do meu pai foi o que
causou toda essa reviravolta desastrosa.
Para ser sincera em todos esses anos o que mais esperei foi ter a certeza
que ele errou aquele tiro na intenção de me salvar, mas a insegurança, o medo, as
lembranças dos meus familiares e o desespero me cegaram.
Por onze anos vivi longe do homem que mais amei por puro orgulho e
ódio, e agora o que mais me desespera é saber que viverei a eternidade sem ele.
Apoio as mãos nos olhos e aperto as mãos em meu rosto chorando
copiosamente na tentativa de diminuir a angústia maçante em meu interior.
A porta do quarto se abre e não tenho vontade de olhar para trás. Me
sinto tão fraca que meu único desejo é permanecer nesta cama até a dor
incessante diminuir.
Passos em minha direção fazem meu corpo estremecer. Estou me
sentindo vulnerável e exposta. A muitos anos aprendi a trancar meus
sentimentos, a muitos anos não deixo a dor dominar cada parte do meu ser, mas
hoje é impossível reprimir o turbilhão de sentimentos que me assolam, mas a
esperança de ouvir a voz de Dante atrás de mim preenche meu peito de uma
forma sufocante, mas a certeza de que isso não vai acontecer esmaga meu
coração.
— Eva? — A voz de Jack balbuciando meu nome quebra todas as minhas
esperanças de ter Dante ao meu lado. — É estranho te chamar assim. — Suspira.
— Jack? — Tento reprimir as lágrimas, mas elas não param de cair.
— Ei, se acalme garota. — Se aproxima com preocupação.
Soluço deixando as lágrimas levar o desespero da minha alma.
— O que foi? Se acalme. — Ele se senta ao meu lado me puxando para
um abraço apertado e mesmo não querendo ver ninguém naquele momento, ter
ele ali alivia o angustiante aperto em meu peito.
— Eu errei tanto. — Me permito chorar em seus braços.
— Nós sabemos que você mentiu Eva, mas também entendemos os seus
motivos. Você estava confusa e perdida, em busca de vingança pelo mal que toda
a sua família passou, mas saiba que apesar de fazer pouco tempo que está aqui,
gostamos de você. — Acaricia meus cabelos.
— Você não entende. Eu amo o Dante e agora eu não posso mais vê-lo.
— Estremeço me lembrando do seu corpo pesado em meus braços. — Minhas
mãos estão sujas com o sangue do homem que mais amei.
Jack segura meu rosto fazendo eu olhar para ele.
— Eva, o que você está falando? A bala que acertou Dante foi culpa de
Donatel não sua. — Ele acaricia meu rosto enxugando minhas lágrimas.
— Dante morreu — Me exalto. — Morreu por minha culpa e nada que
você diga vai mudar isso. — Me livro de seus braços querendo correr. Correr
para um lugar distante e silencioso, sem as inúmeras vozes que tormenta minha
mente.
— Mas Dante está vivo — fala confuso. — Eu achei que você tinha
notado naquele momento. — Balança as mãos confuso.
— Vivo. — Sorrio entre soluços. — Dante não morreu? — pergunto
esperançosa.
— Ei se acalme. — Ele se levanta apoiando as mãos em meus ombros.
— Não Jack, não há calma, eu tive calma por muito tempo. Não posso
esperar. — Gesticulo com as mãos em desespero. — Eu preciso vê-lo. Preciso
me desculpar por todos os anos que o julguei injustamente.
— Se acalme Eva, você pode vê-lo, mas ele está sedado — diz apertando
as mãos em meus ombros.
— Sedado? — pergunto frustrada.
— Donatel exagerou em alguns castigos e a carga de corrente elétrica
prejudicou seu rim direito e seu fígado. O tiro nem foi tão grave, apesar da bala
ter se alojado um pouco abaixo do seu ombro uma cirurgia resolveu o problema.
Os médicos estão mais preocupados com os órgãos internos. Nós passamos por
treinamentos desde pequenos e a ingestão de drogas e veneno em nosso
organismo era uma delas. Nosso sistema imunológico é resistente a várias drogas
e venenos, mas alguns de nossos órgãos sofrem com isso. Donatel gostava de
nos preparar para tudo, mas também gostava de nos ver sofrer e ás vezes deixava
até o último momento para aplicar o antídoto. Por esses motivos Dante
desenvolveu problemas renais, paralisia de órgãos internos, uma espécie de
veneno de cobra, Donatel quase perdeu Dante naquela época, mas eu não me
lembro muito bem, eu sou mais novo e sempre acabo sendo o último a saber das
coisas. — Aperta ainda mais meus ombros me observando fixamente. — Parece
que a corrente elétrica prejudicou ainda mais as funções do seu rim direito. —
Jack suspira. — Os médicos estão realizando uma bateria de exames para
diagnosticar se à falha em outros órgãos. Até o momento está tudo bem, eles já
entraram com as medicações necessárias e decidiram manter uma sedação leve
apenas para acalmá-lo. Você sabe que ele não ficaria trancado em um quarto. —
Jack faz uma careta.
— Eu não consigo acreditar em toda essa história. — Soluço ainda mais.
— Eu não deveria ter perdido a oportunidade de ter matado o seu pai. Ele é um
monstro impiedoso — grito em revolta. — Agora a vida de Dante corre ainda
mais perigo — murmuro em desgosto.
— Quanto a Donatel não se preocupe, ele está em um lugar seguro... —
Não o deixo terminar de falar o interrompendo.
— Eu quero ver Dante agora. Vamos, em qual hospital ele está? —
pergunto rudemente puxando a primeira coberta que encontro jogando em meus
ombros.
— Hospital? — Ele ri. — Está maluca? Ele está na enfermaria no
subsolo da academia.
Franzo as sobrancelhas sem entender o que ele diz.
— Não podemos nos envolver em escândalos e parar em um hospital
todas às vezes que somos baleados ou quando precisamos de alguns meros
pontos, seria realmente complicado Eva — diz como se isso fosse obvio. —
Temos nosso próprio meio de lidar com as coisas e procuramos manter tudo o
que podemos dentro destas localidades, mas vamos deixar esses assuntos de
lado. Dante sempre teve um ótimo processo de recuperação, o seu corpo tem
uma boa resposta aos tratamentos, mas é difícil para os médicos acertar os
medicamentos corretos devido a nossa resistência a maioria dos antibióticos. —
Faz uma pequena pausa. — Mais um motivo para termos uma junta médica
especializada. Agora vamos. — Caminha em direção a porta e sem pensar duas
vezes o sigo na esperança e ansiedade de ver Dante respirando.
Todo meu corpo estremece ao ver Dante ligado a tantos aparelhos. As
lágrimas que haviam cessado momentaneamente voltam a rolar pelos meus olhos
ao vê-lo tão debilitado.
Seu corpo se encontra cheio de escoriações e as marcas roxas em seu
rosto provavelmente demorarão para sumir.
Apoio meus dedos sobre sua mão deslizando os mesmos sobre sua pele
me sentindo culpada por tudo o que aconteceu.
— Eu sei que você é forte o suficiente para enfrentar seu pai, mas não fez
por se achar culpado demais. Você queria morte e isso me assusta, você não pode
morrer Dan — sussurro deslizando meus dedos por seus braços. — Sabendo de
toda a verdade, você jamais deveria me deixar. — Sorrio entre as lágrimas
esperando qualquer movimento de sua parte, mas a única resposta que tenho são
os bips dos aparelhos conectados a ele.
É triste vê-lo tão vulnerável e debilitado, mas confesso que apesar de não
querer vê-lo neste estado deplorável, estou feliz, feliz por saber que ele está vivo.
Por ver que seu coração ainda bate.
Como eu queria poder acordá-lo e finalmente esclarecermos juntos o
nosso passado, mas eu sei que isso não será tão simples assim e conhecendo bem
o homem a minha frente, ele se fechará ainda mais na intenção de me proteger.

Os dias passam lentamente e cada tic tac do relógio parece estar contra
nós. Meu coração bombardeia meu peito e o nó na minha garganta não diminui
mesmo sabendo que Dante está melhor.
De acordo com o doutor a sedação vem sendo diminuída dia após dia e a
qualquer momento ele pode acordar, isso só torna a minha ansiedade ainda
maior.
O desespero e a angústia de vê-lo deslizar por meus braços todo
ensanguentado ainda permanece em meu corpo e confesso que às vezes sinto
leves tremores ao me lembrar das cenas de Donatel torturando friamente o
próprio filho.
Fecho fortemente os olhos ao querer apagar aquelas imagens da minha
mente e automaticamente aperto minha mão sobre a de Dante que está apoiada
sobre a cama. Ao abrir os olhos me pego observando os roxos espalhados por
seu corpo e os vários curativos que tampam as escoriações do seu abdômen e
dorso.
Dante exala poder mesmo deitado sobre uma cama. É natural de um
homem com suas responsabilidades e deveres emanar virilidade desta maneira,
ainda mais quando foi criado para isso e não importa quantas vezes eu o observe
a cada momento que se passa sinto que o amo ainda mais, que o desejo e que o
quero ao meu lado para sempre.
A vingança pode ter mascarado todos os meus sentimentos por onze
anos. Os erros do passado ainda irão pesar em nosso futuro e o fato dele ter
acertado em cheio o meu peito com uma de suas balas ainda me machuca, mas o
fato de termos sido usados pelo egoísmo de nossos pais conta grandemente em
nossa história.
Meu coração dispara ao sentir os dedos de Dante apertar minhas mãos e
um gemido rouco escapa de seus lábios quando seus lindos olhos azuis brigam
com a claridade do quarto.
A felicidade de vê-lo acordado domina cada célula do meu corpo e
automaticamente me coloco de pé.
Sei que as coisas serão diferentes de agora em diante, mas posso afirmar
que apreendi muito com tudo o que aconteceu. Principalmente o fato de que a
vingança te mata de dentro para fora como um doce veneno, mas o perdão cura
por completo.
Livro Físico
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O MAGNATA DA MINHA VIDA
Sinopse: Megan Park Avallon sempre foi uma doce e sonhadora mulher
que apreciava sua vida da melhor forma possível e apesar do passado não ter
sido gentil com ela, procurou apagar de sua memória toda a dor e pânico que ele
lhe causara. O que ela não esperava era acordar de véu e grinalda em um quarto
de hotel com um homem totalmente desconhecido, do qual descobriu ser o seu
marido.

Airon Markcross sempre foi um homem inteligente, bem sucedido e rico,


mas dinheiro nunca pôde comprar o silêncio de seu tio que vivia lhe
perseguindo. Ainda assim, sempre concentrou toda a sua raiva nos negócios o
levando a patamares desejados por muitos, mas seu tio parecia não se cansar das
insistentes investidas em lhe destruir.
Cansado de carregar o seu pesado passado sobre os ombros, estava disposto a
dar um fim em tudo aquilo, mas o destino as vezes gosta de brincar com as
pessoas e o que ele nunca imaginou foi se ver casado, do dia para noite, com
uma completa desconhecida sem ao menos se lembrar de nada.
Notas

[←1]
Estilo de sofá.
Table of Contents
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Epílogo
Livro físico
Outras Obras

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