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PROVA ESCRITA

DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Via Académica

34.º CURSO DE FORMAÇÃO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

AVISO DE ABERTURA: AVISO N.º 15620 /2017, PUBLICADO NO


DIÁRIO DA REPÚBLICA, 2.ª SÉRIE, N.º 249/ 2017, DE 29 DE
DEZEMBRO DE 2017

DATA: 22 DE FEV EREIRO DE 2018

2.ª CHAMADA

HORA: 9H 15M (DE ACORDO COM O DISPOSTO NO ART. 12.º DO


REGULAMENTO INTERNO DO CENTRO DE ESTUDOS
JUDICIÁRIOS, O TEMPO DE DURAÇÃO DA PROVA INICIA -SE
DECORRIDOS 15 MINUTOS APÓS A HORA DESIGN ADA)

DURAÇÃO DA PROVA: 3 HORAS


PROVA ESCRITA DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL
Via Académica – 2.ª Chamada – 22 de fevereiro de 2018

1 – A presente prova é composta por três casos, todos de resolução obrigatória:

2 – Cotações:
- Caso 1 (7 valores)
1 – 1 valores
2 – 2 valores
3 – 4 valores
- Caso 2 (7 valores)
1 – 1,5 valores
2 – 1,5 valores
3 – 4 valores
- Caso 3 (6 valores)
1 – 4 valores
2 – 2 valores

3 – A atribuição da cotação máxima em cada resposta pressupõe um tratamento


completo das várias questões suscitadas, que deverá ser coerente e corretamente
fundamentado, com indicação dos preceitos legais aplicáveis.

4 – Na cotação atribuída serão tidos em consideração a pertinência do conteúdo, a


qualidade da informação transmitida em relação à questão colocada, a
organização da exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o
domínio da língua portuguesa.

5 – As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a


grafia do “Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa” (aprovado pela Resolução da
Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da
República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-lo expressamente
no quadro “Observações” da folha de rosto que lhes será entregue, escrevendo
“Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da Assembleia da
República n.º 26/91, não está em vigor com carácter de obrigatoriedade”, sendo a
prova corrigida nesse pressuposto.

6 – Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até
um máximo de 3 valores, para o total da prova.

7 – As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento


identificativo da/o candidata/o (a identificação constará apenas do destacável da
folha de rosto), sob pena de anulação da prova.
Caso 1

(7 valores)

Alta Casa - Construção Civil, Lda., com sede em Faro, demandou Branca e Bernardo,
residentes em Lisboa, pedindo que os Réus lhe paguem a quantia de € 50.300 e juros
moratórios desde a citação, alegando ter realizado os trabalhos de remodelação da moradia
de que estes são proprietários em Lagos, o que fez a pedido destes e conforme orçamento e
caderno de encargos por eles aceite em 3 de janeiro de 2014, correspondendo o capital em
dívida ao remanescente da fatura n.º 123.
Em sede de contestação, Branca e Bernardo arguiram a exceção do caso julgado,
alegando que a pretensão da Autora é exatamente igual à que foi objeto da ação que correu
termos entre as mesmas partes, na qual foi proferida sentença que julgou improcedente a
ação, dada a procedência da exceção de não cumprimento do contrato pela existência de
defeitos na obra que se discriminaram na sentença, decisão confirmada por acórdão do
Tribunal da Relação, transitado em julgado. Acrescentaram ainda que, até à data da
propositura da acção agora intentada, a Autora não eliminou os defeitos da obra descritos na
sentença, pelo que não têm de pagar a quantia reclamada.
Na audiência prévia, a Autora alegou já ter reparado os defeitos em causa, embora com
uma única ressalva, que respeita à pintura dos tetos de três divisões do rés do chão,
permanentemente húmidos, situação impossível de resolver enquanto os Réus não
impermeabilizarem o terraço do 1.º andar (trabalhos não contemplados no orçamento) e/ou,
pelo menos, removerem ou deixarem de regar as floreiras que aí existem. Conclui, assim, que
não se verifica a exceção do caso julgado.
Mais alegou que, independentemente deste facto, não é oponível a exceção de não
cumprimento, como causa de não cumprimento da obrigação de pagamento de uma dívida de
capital de € 50.300, pelo motivo de existirem três tetos nos quais não foi aplicada a pintura
final.

1 - Indique, justificadamente, qual o tribunal competente para a ação intentada por Alta
Casa - Construção Civil, Lda. contra Branca e Bernardo.

(1 valor)

2 - Indique de forma fundamentada qual a decisão a proferir a respeito da exceção de caso


julgado.

(2 valores)

(continua na página seguinte)


(continuação da página anterior)

3 - Suponha que:

i) não existiu uma ação anterior;


ii) a Autora procedeu à reparação dos defeitos denunciados pelos
Réus, com ressalva da pintura dos três tetos; e
iii) os Réus recusam pagar a quantia peticionada, invocando a
persistência de defeitos.

Apresente a solução do litígio, considerando a hipótese de resultar provada quer a


factualidade acima descrita a respeito da invocada impossibilidade das reparações ainda
em falta, quer a hipótese de não resultar provada tal factualidade.

(4 valores)
Caso 2

(7 valores)

Em dezembro de 2013, no âmbito da sua atividade comercial, Arnaldo - Organização de


Festas, Lda. forneceu a Bernardo e Carlota os serviços de catering do casamento da filha
destes, Débora, os quais importaram o valor total de € 35.484, montante não pago por
aqueles.
Arnaldo - Organização de Festas, Lda. intentou, em fevereiro de 2014, ação para
reconhecimento do seu crédito e condenação de Bernardo e Carlota no pagamento da
referida quantia, confiando o seu gerente, Arnaldo, que lograria obter, em ulterior acção
executiva, a penhora da moradia, no valor de € 70.000, de que aqueles eram então
proprietários, situada na rua dos Amores Perfeitos, em Leiria. Em abril de 2014, Bernardo e
Carlota apresentaram contestação no âmbito desta ação.
Em maio de 2014, Débora celebrou um contrato de mútuo com a Caixa de Poupanças,
S.A., tendo os seus pais, em garantia do pagamento de tal mútuo, constituído hipoteca
voluntária sobre o aludido prédio, até ao montante máximo de € 67.400.
Quando o seu gerente tomou conhecimento deste facto, em junho de 2014, a Arnaldo –
Organização de Festas, Lda. intentou ação declarativa contra Bernardo, Carlota e Débora,
alegando que os dois primeiros Réus agiram com o claro objetivo de se subtraírem ao
cumprimento da obrigação de pagamento dos serviços que lhes tinham sido prestados,
concluindo pelo pedido de declaração de ineficácia da constituição dessa hipoteca e de
cancelamento do respetivo registo, em relação à Autora, na medida do necessário para
integral satisfação do seu crédito sobre os Réus devedores.
Os Réus contestaram, sustentando, em suma, que a decisão judicial proferida na ação
declarativa condenatória intentada em fevereiro de 2014 ainda não havia transitado em
julgado no momento da propositura desta última acção. Mais alegaram que, ao contrair o
empréstimo e constituir a hipoteca, não tiveram qualquer intenção de prejudicar a Autora,
sendo que o mútuo celebrado teve como objetivo a regularização de dívidas fiscais de Débora.
Concluem, por isso, pela improcedência da ação.
A convite do tribunal, foi requerida a intervenção da Caixa de Poupanças, S.A., a qual,
uma vez citada, ofereceu contestação, alegando, em síntese, que nunca pretendeu prejudicar
qualquer credor dos Réus e que sempre atuou de boa-fé, concluindo igualmente pela
improcedência da ação.
Na pendência desta última ação, a Arnaldo - Organização de Festas, Lda. cedeu o seu
crédito à sociedade Finantia - Cessão de Créditos, S.A..
1 - Explicite o fundamento do convite do tribunal e o meio processual que possibilitou a
intervenção da Caixa de Poupanças, S.A., indicando a respetiva base legal.

(1,5 valores)

2 - De forma fundamentada, explique se a sociedade Finantia - Cessão de Créditos, S.A.


poderá também intervir na ação intentada por Arnaldo - Organização de Festas, Lda. contra
Bernardo, Carlota e Débora.

(1,5 valores)

3. Aprecie do ponto de vista jurídico-substantivo a viabilidade das pretensões conflituantes


na ação intentada por Arnaldo - Organização de Festas, Lda. contra Bernardo, Carlota e
Débora.

(4 valores)
Caso 3

(6 valores)

A sociedade Terra Brava - Recolha e Transformação de Metais, Lda. é proprietária de


um prédio constituído por rés do chão e 1.º andar, destinado a unidade industrial, cujo acesso
se fazia pelo lado poente, através de caminho de terra batida, com cerca de seis metros de
largura.
Bianca e Cristiano são proprietários do prédio rústico que se situa a poente do referido
caminho e que confronta a nascente com o prédio da aludida sociedade.
No prédio da sociedade Terra Brava, Lda. iniciaram-se obras de construção da unidade
industrial de recolha e transformação de metais, necessárias ao funcionamento da unidade
fabril, obra essa adjudicada à sociedade Ernesto Construções, Lda..
No dia 20 de setembro de 2016, Bianca e Cristiano, arrogando-se proprietários do
referido caminho e sustentando que este apenas dá servidão ao terreno de um outro vizinho,
impediram a circulação dos camiões que carregavam o betão para a obra que a sociedade
Terra Brava, Lda. tinha em curso. Para tanto, depositaram no caminho blocos de cimento de
grandes dimensões que, além de impedirem a passagem, provocaram no local o abatimento
de terras.
Naquele dia, a obra ficou parada e as cargas de betão que iam ser descarregadas na
obra tiveram de ser inutilizadas. Foi necessário encontrar soluções alternativas para poder
manter a obra em curso e assim cumprir os prazos de conclusão.
No dia em que o acesso à obra ficou impedido por Bianca e Cristiano não foi possível
efetuar a betonagem, tendo sido desperdiçado o carregamento de betão que a Terra Brava,
Lda. tinha pago, no valor de € 4.280.
Para o trabalho de reposição do caminho no estado em que este se encontrava, a
sociedade Terra Brava, Lda. celebrou um contrato com a empresa Oliveira - Terraplanagens,
Lda., a qual procedeu à remoção dos blocos de cimento, de molde a possibilitar a circulação
pelo caminho tal como se verificava antes, tudo no valor de € 10.000.
Por forma a não parar totalmente a obra em causa, a Ernesto Construções, Lda.
solicitou permissão à proprietária de um prédio vizinho para nele efetuar um novo acesso à
obra, tendo realizado trabalhos no valor de € 8.000.
Esta impossibilidade de acesso dos camiões carregados da betonagem teve ainda como
consequência a alteração dos planos de obra e originou despesas de mão de obra e
maquinaria no valor de € 7.000, que a sociedade Terra Brava, Lda. pagou à Ernesto
Construções, Lda..
A sociedade Terra Brava, Lda. intentou uma ação contra Bianca e Cristiano, pedindo a
condenação dos Réus na restituição da posse do caminho identificado, na abstenção da prática
de quaisquer atos que impeçam ou dificultem o acesso ao prédio da Autora, a pé e de carro,
pelo referido caminho e no pagamento de uma indemnização no valor de € 29.280 pelos
prejuízos causados. Alegou que o prédio de que é proprietária sempre foi servido pelo lado
poente pelo referido caminho, o que sucedia há mais de 20 anos, à vista de todos e sem
oposição.
Na contestação, os Réus deduziram reconvenção, pedindo a condenação da sociedade
Terra Brava, Lda. a reconhecê-los como únicos donos do prédio rústico no qual se inclui o
referido caminho e a abster-se da prática de qualquer ato ofensivo desse direito.
Da instrução da causa não resultou provado que o caminho fazia parte integrante do
prédio dos Réus, nem a utilização pública e pacífica do mesmo por parte da Autora há mais de
20 anos, tão pouco se provando que o caminho se destinava ao trânsito público.

1 - Aprecie as pretensões da Autora e dos Réus e indique a solução que reputa mais
adequada, fundamentando a sua resposta.

(4 valores)

2 - Supondo que se apurou que o caminho se situa no prédio dos Réus e que o prédio de
que a Autora é proprietária sempre foi servido pelo lado poente pelo referido caminho, o
que sucedia há mais de 20 anos, à vista de todos e sem oposição, analise a viabilidade das
pretensões das partes, indicando, de forma fundamentada, a solução que considera mais
adequada.

(2 valores)
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL

(artigo 16.º, n.º 2, alínea a), da Lei n.º 2/2008, de 14/1)

Via académica

2.ª Chamada – 22 de fevereiro de 2018

Grelha de Correção

Nota:

As indicações constantes da grelha refletem as soluções que se afiguram ser as mais


corretas para cada uma das questões formuladas.
Porém, não deixarão de ser valorizadas outras opções, desde que plausíveis e
alicerçadas em fundamentos consistentes.

1
Caso 1
(7 valores)

1 - Indique, justificadamente, qual o tribunal competente para a ação intentada por


Alta Casa – Construção Civil, Lda. contra Branca e Bernardo.
1 valor

O Tribunal competente é o Juízo Central Cível de Lisboa (do Tribunal Judicial da Comarca
de Lisboa) - artigos 71.º do Código de Processo Civil, artigos 33.º e 117.º, n.º 1, alínea a), e
Anexo II, da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei de Organização do Sistema Judiciário) e
mapa III anexo ao Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março (Regime aplicável à organização e
funcionamento dos tribunais judiciais).

2 - Indique de forma fundamentada qual a decisão a proferir a respeito da exceção de


caso julgado.
2 valores

Analisar a verificação dos requisitos da exceção dilatória do caso julgado (artigos 580.º e
581.º do Código de Processo Civil), tendo ainda em atenção o disposto no artigo 621.º do
Código de Processo Civil.
Concluir que a Autora não poderia ficar impedida de propor nova ação contra os Réus
peticionando a mesma quantia, desde que procedesse à eliminação/reparação dos defeitos da
obra que executou.
É o que resulta do artigo 621.º do Código de Processo Civil, normativo que se aplica
designadamente quando a absolvição do pedido resulta de ter sido julgada procedente uma
exceção dilatória de direito material, como é o caso da exceção de não cumprimento do
contrato, e a situação fáctica se altera mais tarde, mormente pela realização da prestação
devida.
Não obstante os Réus argumentem que a Autora ainda não eliminou todos os defeitos
da obra, a Autora alegou já ter reparado os defeitos em causa com uma única ressalva, cuja
resolução depende da colaboração dos Réus.
Assim, não poderá o Tribunal, sem mais, concluir pela procedência da exceção de caso
julgado. Será mais acertado relegar o seu conhecimento para a sentença, de forma a permitir
que a Autora prove ter procedido à reparação dos defeitos em causa, sendo a exceção julgada
improcedente.

2
3 - Suponha que: i) não existiu uma ação anterior; ii) a Autora procedeu à reparação
dos defeitos denunciados pelos Réus, com ressalva da pintura dos três tetos; iii) os Réus
recusam pagar a quantia peticionada, invocando a persistência de defeitos.
Apresente a solução do litígio, considerando a hipótese de resultar provada quer a
factualidade acima descrita a respeito da invocada impossibilidade das reparações ainda em
falta, quer a hipótese de não resultar provada tal factualidade.
4 valores

Enquadramento da situação na figura do contrato de empreitada, regulado nos artigos


1207.º e ss. do Código Civil, e, sendo os Réus consumidores, no Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8
de abril (venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas).
A provar-se que as reparações ainda em falta (pintura dos três tetos) não podem ser
realizadas enquanto os Réus não impermeabilizarem o terraço do 1.º andar (trabalhos não
contemplados no orçamento) e/ou, pelo menos, removerem ou deixarem de regar as floreiras
que aí existem, estamos perante um caso em que a prestação a cargo da Autora parece
depender da colaboração dos Réus. De outro modo, o trabalho de pintura poderá ser inútil.
Assim, verifica-se um cumprimento parcial da prestação devida pela Autora, mas não culposo
(artigo 799.º do Código Civil).
No caso de não se provar o circunstancialismo fáctico alegado pela Autora, ainda assim
considerar que não parece justificada a recusa dos Réus em efetuarem o pagamento da
totalidade da quantia peticionada. Com efeito, à luz do princípio geral da boa fé no
cumprimento dos contratos consagrado no Código Civil e das suas manifestações (artigos
762.º e 802.º, n.º 2, do Código Civil) será manifestamente abusiva, por desproporcional, a
recusa por parte dos Réus em procederem ao pagamento da quantia de 50.300,00 € quando
apenas faltam pintar três tetos.
Atentar em que a excepão de não cumprimento do contrato tem ainda como
pressuposto geral, dado ser comum à generalidade dos direitos subjetivos, não ser contrária à
boa fé, o que emerge da necessidade de preservar o equilíbrio entre as obrigações
sinalagmáticas e subentende, que a invocação da exceção seja necessária e proporcional.
Concluir, assim, que, em qualquer dos casos, a solução mais adequada do litígio será a
de condenar os Réus a pagarem à Autora a quantia a liquidar, até ao montante máximo
peticionado (50.300€), deduzido do valor do custo da pintura dos três tetos em falta (artigo
609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), acrescida dos juros moratórios.

3
Caso 2
7 valores

1. Explicite o fundamento do convite do tribunal e o meio processual que possibilitou


a intervenção da Caixa de Poupanças, S.A., indicando a respetiva base legal.
1,5 valores

Verificar que a Autora pede a declaração de ineficácia, em relação a si, da hipoteca


constituída a favor da Caixa de Poupanças, S.A., sobre o prédio pertencente aos Réus
devedores, Bernardo e Carlota, e enquadrar jurídico-substantivamente a questão no âmbito
do instituto da impugnação pauliana, previsto no artigo 610.º do Código Civil.
Constatar que a impugnação pauliana pressupõe necessariamente a participação na
ação do adquirente ou do beneficiário da garantia constituída sobre os bens, se for esse ato
impugnado, ou seja, é uma ação que tem de ser dirigida pelo credor contra o devedor e o
terceiro em litisconsórcio necessário passivo, nos termos do disposto no artigo 33.º, n.º 2, do
Código de Processo Civil.
Concluir, com fundamento no disposto nos artigos 6.º, n.º 2, e 590.º, n.º 2, alínea a), do
Código de Processo Civil, que o Tribunal devia convidar a Autora a, por sua iniciativa, requerer
a intervenção principal provocada da Caixa de Poupanças, S.A., nos termos do disposto nos
artigos 33.º e 316.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, mecanismo que habilitaria
aquela a intervir na causa como associada das outras Rés, desse modo suprindo a ilegitimidade
passiva, por preterição do litisconsórcio necessário.

2. De forma fundamentada, explique se a sociedade Finantia – Cessão de Créditos, S.A.


poderá também intervir na ação intentada por Arnaldo – Organização de Festas, Lda. contra
Bernardo, Carlota e Débora.
1,5 valores

Configurar a cedência do crédito de Arnaldo – Organização de Festas, Lda. à sociedade


Finantia – Cessão de Créditos, S.A. como um caso de transmissão entre vivos de uma coisa ou
direito litigioso.
Verificar que à sociedade Finantia – Cessão de Créditos, S.A. assistia o direito de deduzir
o incidente de habilitação de cessionário, nos termos do disposto no artigo 356.º do Código de
Processo Civil.

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Concluir que, sendo deferido o incidente, a Finantia – Cessão de Créditos, S.A.
ocuparia o lugar da Arnaldo – Organização de Festas, Lda..

3. Aprecie do ponto de vista jurídico-substantivo a viabilidade das pretensões


conflituantes na ação intentada por Arnaldo - Organização de Festas, Lda. contra Bernardo,
Carlota e Débora.
4 valores

Identificar como requisitos gerais da impugnação pauliana a anterioridade do crédito e


resultar do ato a impossibilidade ou o agravamento da impossibilidade para o credor de
obter a satisfação integral do seu crédito - artigo 610.º, alíneas a) e b), do Código Civil,
acrescendo, quando de ato oneroso se trate, a exigência de que o devedor e o terceiro
adquirente tenham agido de má-fé, nos termos do artigo 612.º do referido diploma.
Verificar que nos atos que diminuam a garantia patrimonial do crédito está incluída a
concessão de garantias, encontrando-se, por isso, abrangida a hipoteca constituída pelos Réus
Bernardo e Carlota.
Constatar que o crédito da Autora é também anterior à constituição da hipoteca,
sendo irrelevante a data do trânsito em julgado da sentença proferida na primeira ação,
porquanto se deve atender ao momento da constituição do crédito, reportado a dezembro de
2013.
Referir que a constituição de hipoteca sobre o imóvel de Bernardo e Carlota pode
impossibilitar ou agravar a possibilidade de o credor obter a satisfação integral do seu crédito.
Anotar que a hipoteca foi constituída para garantir um empréstimo de que apenas
Débora beneficiava, nada tendo Bernardo e Carlota recebido em troco pela constituição do
referido ónus, motivo pelo qual o ato deve ser considerado gratuito no que respeita a
Bernardo, Carlota e Débora.
Quanto à Caixa de Poupanças, S.A., verificar que a constituição da garantia da
hipoteca em seu benefício é um negócio oneroso, porque associado à concessão de um
mútuo, sendo necessária a prova da sua má fé.
Concluir que a procedência da ação pauliana quanto à constituição da hipoteca
dependerá assim da verificação de todos os requisitos da ação pauliana acima referidos,
nomeadamente o requisito da má fé quanto à Caixa de Poupanças, S.A..

5
Caso 3
(6 valores)

1 - Aprecie as pretensões da Autora e dos Réus e indique a solução que reputa mais
adequada, fundamentando a sua resposta.
4 valores

Afastar a pretensão da Autora no sentido do reconhecimento da aquisição por si de uma


servidão de passagem pelo caminho de terra batida situado a poente do seu prédio destinado
a unidade industrial, por via da figura da usucapião, uma vez que não se apurou a utilização
pública e pacífica de tal caminho há mais de 20 anos - artigos 1546.º, 1557.º e 1558.º do
Código Civil.
Rejeitar a pretensão dos Réus no sentido do seu reconhecimento como únicos donos do
prédio rústico no qual se inclui o referido caminho e da condenação da Autora a abster-se da
prática de qualquer ato ofensivo desse direito, uma vez que não ficou demonstrado que esse
caminho faz parte integrante do prédio dos Réus - cf. artigo 1311.º do Código Civil.
Enquadrar jurídico-substantivamente a questão no âmbito da responsabilidade civil
extracontratual, referindo que, no campo aquiliano, a imputação delitual pode resultar da
violação de direitos subjetivos de outrem ou de disposições legais destinadas à proteção de
interesses alheios - artigo 483.º do Código Civil.
Constatar que as despesas resultantes da reposição do caminho no seu estado inicial, da
preparação de acessos alternativos e da paragem da obra no prédio da Autora não resultam
da violação de qualquer direito absoluto desta ou de outra posição jurídica de natureza
equivalente, tutelada nos termos do artigo 483.º, n.º 1, primeira regra, do Código Civil.
Identificar tais danos como reconduzíveis à categoria de “danos económicos puros”,
também designados “danos puramente patrimoniais” ou “danos patrimoniais puros”, os quais
podem ser definidos como aqueles em que há uma perda económica (ou patrimonial) sem que
tenha existido afetação de uma posição jurídica absolutamente protegida, como acontece no
direito de personalidade ou no direito real.
Referir a problemática da ressarcibilidade dos danos económicos puros, concluindo que
na responsabilidade delitual a ressarcibilidade dos referidos danos só é admissível nos
seguintes casos:
a) Quando tiver sido violada uma norma de proteção ou “disposição legal destinada a
proteger interesses alheios” - artigo 483.º, n.º 1, segunda regra, do Código Civil;

6
b) Quando exista previsão delitual específica que contemple os danos económicos
puros, como por exemplo, as normas dos artigos 485.º e 495.º do Código Civil;
c) Quando se verifique abuso do direito, nas condições em que este constitua fonte de
responsabilidade civil - artigo 334.º do Código Civil.
Analisando a hipótese, ponderar se a conduta dos Réus, ao impedirem a circulação no
caminho, constituiu violação de norma legal destinada a proteger interesses alheios prevista
no artigo 3.º do Código da Estrada, a qual tutela a liberdade de trânsito.
Concluir pela exclusão da alternativa de fundar a ressarcibilidade dos danos económicos
puros na violação de norma destinada a proteger interesses alheios, uma vez que o
impedimento da circulação rodoviária constitui uma conduta ilícita desde que estejam em jogo
“vias do domínio público” ou “vias do domínio privado quando abertas ao trânsito público” -
artigo 2.º, conjugado com o artigo 3.º, n.º 1, do Código da Estrada, e não há dados que
permitam aquilatar se o caminho constitui via do domínio público ou via do domínio privado
aberta ao trânsito público.
Indagar da admissibilidade do abuso do direito como cláusula geral de ilicitude e, em
caso afirmativo, analisar a sua aplicação à liberdade genérica de agir. Considerar a noção de
“direito” reportada a quaisquer situações jurídicas e não apenas aos direitos subjetivos ou
aportar para o sistema vigente, sem auxílio do abuso do direito, uma proibição destinada a
assegurar o mínimo ético-jurídico no relacionamento entre os membros da comunidade
jurídica - cf. doutrina citada no acórdão do STJ de 8 de setembro de 2016, in www.dgsi.pt.
Ponderar que, das três vertentes do abuso do direito - excesso manifesto dos limites
impostos pela boa fé, bons costumes e fim social ou económico -, a segunda aparece como
essencial para efeitos de responsabilidade civil.
Analisar a conduta dos Réus de interrupção da passagem em caminho relativamente ao
qual não tinham qualquer direito, utilizando blocos de cimento de grandes dimensões a fim de
inviabilizar a circulação dos veículos da Autora ou dos veículos de terceiros que lhe prestavam
serviços.
Concluir que a atuação dos Réus pode configurar uma manifesta violação dolosa dos
limites impostos pelos bons costumes (artigo 334.º do Código Civil) ou uma grave afetação do
mínimo ético-jurídico exigível na convivência social, sem que estejam preenchidos os
pressupostos da ação direta - artigo 336.º do Código Civil.
Verificados todos os pressupostos da responsabilidade civil, concluir pelo dever de os
Réus indemnizarem a Autora, ao abrigo dos artigos 562.º e ss. do Código Civil, pelas despesas
em que esta incorreu com a perda do carregamento de betão no valor de 4.280 € e com o
trabalho de reposição do caminho no estado em que este se encontrava, no valor de 10 000 €

7
(pago a uma terceira empresa), sendo de excluir da indemnização a parcela de 8 000 €, por
não resultar da hipótese que a Autora tenha pago tal valor à empresa encarregue de efetuar
as obras.

2 - Supondo que se apurou que o caminho se situa no prédio dos Réus e que o prédio
de que a Autora é proprietária sempre foi servido pelo lado poente pelo referido caminho, o
que sucedia há mais de 20 anos, à vista de todos e sem oposição, analise a viabilidade das
pretensões das partes, indicando, de forma fundamentada, a solução que considera mais
adequada.
2 valores

Enquadrar jurídico-substantivamente a pretensão da Autora de reconhecimento da


aquisição por si de uma servidão de passagem pelo caminho de terra batida, com seis metros
de largura, situado a poente do seu prédio, por via da usucapião - artigos 1543.º, 1546.º,
1547.º e 1548.º do Código Civil.
Verificar que a constituição da servidão por usucapião repousa na posse - artigos
1252.º, n.º 2, e 1287.º do Código Civil - e que esta se caracteriza, além do mais, pela boa fé
(ignorância de lesar direito alheiro) ou má fé - artigo 1260.º, nº 1, do Código Civil -, pela
pacificidade - artigo 1261.º do Código Civil - e pela publicidade - artigo 1262.º do Código Civil.
Atento o decurso de mais de 20 anos desde o início da posse - artigo 1296.º do Código
Civil -, concluir pela aquisição da servidão de passagem por usucapião.
Constatar que a atuação dos Réus se traduz na violação de um direito real de gozo sobre
coisa alheia, mediante o qual o dono de um prédio tem a faculdade de usufruir ou aproveitar
de vantagens ou utilidades de prédio alheio (ius in re aliena) em benefício do seu, o que
envolve correspondente restrição ao gozo efetivo do dono do prédio onerado, na medida em
que este fica inibido de praticar atos susceptíveis de prejudicar o exercício da servidão.
Considerar atendível a pretensão da Autora no sentido do reconhecimento da servidão
de passagem a favor do seu prédio pelo prédio dos Réus.
Perante o acolhimento da pretensão da Autora, rejeitar a pretensão dos Réus no
sentido do seu reconhecimento como únicos donos do prédio rústico no qual se inclui o
referido caminho e da condenação da Autora a abster-se da prática de qualquer ato ofensivo
desse direito - cf. artigo 1311.º do Código Civil.
Enquadrar jurídico-substantivamente a questão no âmbito da responsabilidade civil
extracontratual, a título de imputação delitual que resulta da violação de um direito subjetivo
de outrem - artigo 483.º, n.º 1, primeira regra, do Código Civil.

8
Como referido na resposta anterior, verificado todos os pressupostos da
responsabilidade civil, concluir pelo dever de os Réus indemnizarem a Autora, ao abrigo dos
artigos 562.º e ss. do Código Civil, pelas despesas em que esta incorreu com a perda do
carregamento de betão no valor de 4.280 € e com o trabalho de reposição do caminho no
estado em que este se encontrava, no valor de 10 000 € (pago a uma terceira empresa), sendo
de excluir da indemnização a parcela de 8 000 €, por não resultar da hipótese que a Autora
tenha pago tal valor à empresa encarregue de efetuar as obras.

9
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Via Académica

34.º CURSO DE FORMAÇÃO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

AVISO DE ABERTURA: AVISO N.º 15620 /2017, PUBLICADO NO


DIÁRIO DA REPÚBLICA, 2.ª SÉRIE, N.º 249/ 2017, DE 29 DE
DEZEMBRO DE 2017

DATA: 24 DE FEV EREIRO DE 2018

1.ª CHAMADA

HORA: 14H 15M (DE ACORDO COM O DISPO STO NO ART. 12.º DO
REGULAMENTO INTERNO DO CENTRO DE ESTUDOS
JUDICIÁRIOS, O TEMPO DE DURAÇÃO DA PROVA INICIA -SE
DECORRIDOS 15 MINUTOS APÓS A HORA DESIGNADA)

DURAÇÃO DA PROVA: 3 HORAS


PROVA ESCRITA DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Via Académica – 1.ª Chamada – 24 de fevereiro de 2018

1 – A presente prova é composta por dois Grupos, ambos de resolução obrigatória.

2 – Cotações:
- Grupo I (14 valores)

- Grupo II (6 valores)
1 – 2 valores
2 –
2.1. - 1 valor
2.2. - 1 valor
3 – 2 valores

3 – A atribuição da cotação máxima em cada resposta pressupõe um tratamento


completo das várias questões suscitadas (afastando, inclusive, a responsabilidade
jurídico-penal de determinado/a agente, quando tal se justifique), que deverá ser
coerente e corretamente fundamentado, com indicação dos preceitos legais
aplicáveis.

4 – Na cotação atribuída serão tidos em consideração a pertinência do conteúdo, a


qualidade da informação transmitida em relação à questão colocada, a
organização da exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o
domínio da língua portuguesa.

5 – As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a


grafia do “Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa” (aprovado pela Resolução da
Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da
República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-lo expressamente
no quadro “Observações” da folha de rosto que lhes será entregue, escrevendo
“Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da Assembleia da
República n.º 26/91, não está em vigor com carácter de obrigatoriedade”, sendo a
prova corrigida nesse pressuposto.

6 – Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até
um máximo de 3 valores, para o total da prova.

7 – As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento


identificativo da/o candidata/o (a identificação constará apenas do destacável da
folha de rosto), sob pena de anulação da prova.
GRUPO I

(14 valores)

Aprecie a eventual responsabilidade criminal de cada uma das pessoas infra


mencionadas.

No dia 5 de janeiro de 2018, ANTÓNIO, sócio-gerente da Agência Funerária “O QUE É


BOM SEMPRE ACABA, Lda.”, com sede em À-dos-Ricos, descontente com a atuação de
BERTA como Presidente da Câmara Municipal local, que dava muita atenção às
rotundas e pouca aos cemitérios, decidiu ser tempo de divulgar publicamente no
Facebook o que dela pensava. Porém, temendo que o responsabilizassem por isso,
criou de imediato uma página com o nome de CARLOS, apoiante de BERTA, nela
colocando ainda uma fotografia de rosto do mesmo, que este publicara na respetiva
página no Instagram.

Ainda nesse dia, ANTÓNIO publicou na referida página do Facebook o seguinte texto:
BERTA SERVE OS INTERESSES DOS CONSTRUTORES CIVIS E NÃO DO POVO! ELA
ENRIQUECE E NÓS EMPOBRECEMOS! SERVILISMO NÃO, DEMISSÃO SIM!

Junto a esse texto, inseriu uma foto de BERTA a inaugurar uma estrada, que retirou da
página oficial da Câmara Municipal na internet, sobre a qual colocou, com um
programa de edição de imagens, umas barras de ferro cruzadas como se fossem as
grades de uma cela.

Essa publicação foi vista por dezenas de habitantes de À-dos-Ricos, nomeadamente


por DINIS, que, no dia seguinte, logo às 09h00, foi para a Praça do Município, junto à
entrada do edifício da Câmara Municipal, empunhando um cartaz pregado num pau,
onde escrevera, bem legível: BERTA, DEMITE-TE! Por ali ficou, circulando e exibindo
esse cartaz a todos os que entravam e saíam do edifício.

Pelas 15h00, BERTA, incomodada com a demorada presença de DINIS e do seu cartaz, e
preocupada com os danos que isso poderia causar à sua imagem pública, telefonou a
EMÍLIA, cabo da Guarda Nacional Republicana no Posto sito na mesma Praça, e sua
amiga de infância, a quem pediu o favor de ali se deslocar e forçar o DINIS a abandonar
o local. EMÍLIA respondeu-lhe não saber se legalmente o poderia fazer, mas acabou por
dizer que o faria desde que, no Verão, BERTA a deixasse passar uma semana com a
família na sua casa (de BERTA) no Algarve. BERTA prometeu-lhe que iria pensar nisso,
mas que agora, a bem ou a mal, EMÍLIA teria de retirar dali o DINIS.

Logo após, EMÍLIA, devidamente fardada, saiu do Posto e caminhou até DINIS, a quem
ordenou que abandonasse o local imediatamente. DINIS respondeu-lhe “não me
chateies” e, ato contínuo, desferiu-lhe uma pancada na cabeça com o pau do cartaz.
Atordoada pela pancada, EMÍLIA disse a DINIS que estava detido e que teria de a
acompanhar ao Posto. De seguida, retirou-lhe o cartaz das mãos, dizendo que estava
apreendido. Segurando DINIS por um braço, começou a puxá-lo em direção ao Posto.

FERNANDO, irmão de DINIS, e GONÇALO, amigo do DINIS, estavam sentados no banco do


jardim e a isto assistiram. De imediato, GONÇALO correu na direção de EMÍLIA e
empurrou-a, dizendo a DINIS para fugir. Como consequência, EMÍLIA largou DINIS e caiu,
momento em que saltou do coldre a sua pistola de serviço, semiautomática, de calibre
9 mm. DINIS, que nunca antes tocara numa arma de fogo, nem para tal tinha licença
legal, pegou na pistola e fugiu correndo, ao mesmo tempo que a disparava para o ar e
gritava “REVOLUÇÃO, REVOLUÇÃO!”. FERNANDO pegou no cartaz, que ficara caído no
chão, empunhou-o e correu para longe dali com GONÇALO e DINIS, pondo-se os três em
fuga.

Entretanto, no jardim ali perto, ANTÓNIO e seu irmão gémeo HUGO presenciavam e riam
com tudo o que passava, facto que desagradou a CARLOS, que também via o que se
passava do interior da sua loja de limpeza a seco. Irritado, CARLOS decidiu humilhar
ANTÓNIO. Para evitar ser reconhecido, vestiu uma farda da Guarda Nacional
Republicana de EMÍLIA, que ali tinha para limpar, e dirigiu-se a ANTÓNIO e HUGO. Sem
proferir qualquer palavra, CARLOS desferiu um soco na face de HUGO, pensando tratar-
se de ANTÓNIO, e logo fugiu a correr. HUGO, que havia bebido vários copos de
aguardente desde o almoço – facto que era do conhecimento de ANTÓNIO, mas não de
CARLOS –, cambaleou e, tentando manter-se de pé, deu uns passos para trás e outros
para o lado, até que caiu de face para baixo, no lago dos patos, que tinha um metro de
profundidade.
De imediato, ANTÓNIO, vendo o seu irmão caído no lago, mas confiando que o mesmo
se levantaria, correu atrás de CARLOS, tentando repetidamente sem sucesso pontapeá-
lo, até que este, alguns minutos depois, conseguiu entrar na sua casa e fechar a porta.

Entretanto, HUGO, devido ao estado de embriaguez em que se encontrava, não foi


capaz de se levantar da água e faleceu devido a asfixia por afogamento.
GRUPO II
(mantém-se a situação factual descrita no Grupo I, com os desenvolvimentos agora indicados)

(6 valores)

1. No dia em causa, pelas 20h00, tendo tomado conhecimento do descrito, JOSÉ,


sargento da Guarda Nacional Republicana no Posto de À-dos-Ricos, dirigiu-se às
instalações da agência funerária “O QUE É BOM SEMPRE ACABA, LDA.”, onde
encontrou a funcionária LUÍSA a tratar da contabilidade. Perguntou-lhe se poderia
entrar, ao que ela respondeu “a polícia pode sempre entrar!”. JOSÉ entrou, procurou
pelo computador de ANTÓNIO e apreendeu-o, levando-o para o Posto.

Aprecie a legalidade da conduta de José e a possibilidade de utilização processual


dos elementos de prova por ele recolhidos.
(2 valores)

2. Recebendo a notícia dos factos supra descritos, o Ministério Público abriu inquérito.

2.1. No primeiro despacho, o magistrado do Ministério Público determinou que o


inquérito ficasse sujeito a segredo de justiça, ordenando ainda que o processo fosse
remetido de imediato ao Juízo Central de Instrução para que aí fosse concluso ao Juiz
de Instrução para validação dessa sua decisão.

Se, após a decisão do Ministério Público, mas antes da apreciação pelo Juiz de
Instrução, ANTÓNIO, arguido, requerer a consulta do processo, há fundamento legal
para tal lhe ser recusado?
(1 valor)

2.2. Nesse mesmo dia, o oficial de justiça do Juízo Central de Instrução recebeu o
processo. Porém, afundado em centenas de despachos por cumprir, apenas o
apresentou ao Juiz de Instrução uma semana depois.

O a.
JuizOde
Juiz de Instrução
Instrução aindaainda
pode pode validar
validar a decisão
a decisão do Ministério
do Ministério Público?
Público?
(1 valor)
3. Durante o inquérito, a testemunha MARIA relatou que no dia 7 de janeiro de 2018,
quando estava no cabeleireiro, ouviu INÁCIA – casada com o arguido FERNANDO – contar
que, na noite anterior, este chegou a casa com um cartaz pregado num pau, onde se
lia: BERTA, DEMITE-TE!

Chamada a depor, INÁCIA recusou testemunhar, invocando o disposto no artigo 134.º,


n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal.

Pode ser valorado o depoimento de MARIA?


(2 valores)

(1 valor)
34.º CURSO

VIA ACADÉMICA – 1.ª CHAMADA

GRELHA DE CORRECÇÃO

GRUPO I

Aprecie a eventual responsabilidade criminal de cada uma das pessoas infra mencionadas.

(14 valores)

FACTOS NOTAS DE APRECIAÇÃO VALOR

I – ANTÓNIO

ANTÓNIO cria página de Facebook em nome Não há crime de falsidade informática (artigo 3.º, n.º 1, da
de Carlos e aí insere foto deste. Lei 109/2009), pois ANTÓNIO não tem intenção de provocar
engano nas relações jurídicas e essa página não é considera-
da ou utilizada para finalidades juridicamente relevantes
como se o fosse.
Pode defender-se a integração da conduta no crime previsto
1 e punido pelo artigo 3.º, n.º 3, da Lei 109/2009. 1

Quanto à foto, só poderá haver crime de (uso de) fotografia


ilícita (artigo 199.º, n.º 2, alínea b), do Código Penal) se se
considerar que é relevante a vontade presumida de CARLOS
para se opor a essa, o que, porém, poderá ofender os princí-
pios da tipicidade e da segurança jurídica no direito penal.

ANTÓNIO publica no Facebook: BERTA SER- Haverá que fazer o confronto entre a liberdade de expressão
VE OS INTERESSES DOS CONSTRUTORES e o direito à honra, relevando particularmente o facto de
CIVIS E NÃO DO POVO! ELA ENRIQUECE E BERTA ser titular de cargo político. Note-se que há insinua-
NÓS EMPOBRECEMOS! SERVILISMO NÃO, ção, mas não afirmação de que BERTA enriquece pelo servi-
2 DEMISSÃO SIM! lismo aos construtores; não há juízo sobre a pessoa, mas 1,2
sobre as suas acções. Afigura-se inexistir crime de difamação
– artigo 180.º, n.º 1, do Código Penal. Sendo Berta titular de
cargo político, está sujeita a crítica pública, mesmo que ex-
cessiva.

Junto a esse texto, ANTÓNIO insere foto de Não há crime de fotografia ilícita, pois sendo a foto da Presi-
BERTA que retirou da página oficial da Câ- dente da Câmara em local e acto público não ofende o seu
mara Municipal na internet, sobre a qual direito à imagem (não há tipicidade objectiva - há redução da
colocou, com um programa de edição de área de tutela típica do direito à imagem – artigo 79.º, n.ºs 1
imagens, umas barras de ferro cruzadas e 2, do Código Civil.
3 como se fossem as grades de uma cela. 0,8
Pelos fundamentos antes expostos, o colocar as grades sobre
a imagem de BERTA (com isso insinuando que a mesma co-
meteu crime e deve ser presa) também não integra o crime
de difamação.

ANTÓNIO corre alguns minutos atrás de O crime de ofensa à integridade física tentada não é punível
CARLOS, tentando repetidamente sem su- porque ao crime não cabe pena de prisão superior a 3 anos e
4 cesso pontapeá-lo. a punibilidade não está expressamente prevista – artigos 1
143.º, n.º 1, e 23.º, n.º 1, do Código Penal.

1
Não sendo punível esta tentativa, deve questionar-se a exis-
tência do crime de ameaça (artigo 153.º, n.º 1, do Código
Penal), pois ANTÓNIO ao correr durante vários minutos atrás
de CARLOS, manifesta intenção de o ofender na sua integri-
dade física e deixou-o com medo (razão por que foge).

ANTÓNIO não presta auxílio ao seu irmão ANTÓNIO comete, como autor material e na forma consu-
HUGO e este acaba por falecer devido a mada, por omissão, um crime de homicídio por negligência,
asfixia por afogamento previsto e punido pelas disposições conjugadas dos artigos
137.º, n.º 1, e 10.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal.
Ele sabe que o seu irmão está embriagado devido à aguar-
dente ingerida e tem dever de garante (ex vi do artigo 2009.º,
5 n.º 1, alínea d), do Código Civil). Vê-o caído no lago, mas 1,3
confia que o mesmo se levantaria. Ou seja, está em erro
quanto à necessidade de o auxiliar, o que exclui o dolo (o
crime de homicídio previsto e punido pelo artigo 131.º do
Código Penal), mas não a negligência – artigo 16.º do Código
Penal. O homicídio é-lhe assim imputável a título de negli-
gência (consciente). Há previsibilidade, evitabilidade e nexo
causal.

II – O QUE É BOM SEMPRE ACABA, L.DA

Crimes cometidos por ANTÓNIO, seu sócio- Nenhum dos crimes imputáveis a ANTÓNIO pode ser da res-
gerente ponsabilidade da pessoa colectiva - não constam do catálogo
6 do artigo 11.º, n.º 2, do Código Penal. 0,2
ANTÓNIO também nunca agiu em nome e no interesse da
sociedade.

III – BERTA

BERTA pede a EMÍLIA (Cabo da GNR) que, a Não comete, em autoria material, o crime de abuso de po-
bem ou a mal, force DINIS a abandonar a der (artigo 26.º da Lei 34/87), pois não exerce qualquer po-
Praça do Município. der sobre EMÍLIA, poder que nem sequer tem. Porém, é ins-
7 0,8
tigadora do crime de abuso de poder que EMÍLIA vem a
cometer, pois incita-a a retirar o DINIS a bem ou a mal (tem
pelo menos dolo eventual).

BERTA promete a EMÍLIA pensar na solicita- BERTA não comete crime de corrupção activa (artigo 374.º,
8 ção desta para passar uma semana na sua n.º 1, do Código Penal), pois não promete a vantagem, mas 0,7
casa no Algarve apenas pensar sobre a vantagem.

IV – CARLOS

CARLOS veste farda da GNR de EMÍLIA Não há crime de abuso de uniforme (artigo 307.º, n.º 2, do
Código Penal), pois não actua com intenção de fazer crer que
9 0,5
o uniforme lhe pertence, mas apenas de ocultar a sua identi-
dade.

CARLOS desfere soco na face de HUGO, Comete, como autor material e na forma consumada, um
10 pensando tratar-se de ANTÓNIO crime de ofensa à integridade física simples – artigo 143.º, 0,7
n.º 1, do Código Penal.

V – DINIS

2
DINIS exibe cartaz “BERTA, DEMITE-TE”. Ao exibir o cartaz, DINIS está no exercício de direito de liber-
dade de expressão. Não comete qualquer crime.
DINIS desfere uma pancada na cabeça de
EMÍLIA com o pau do cartaz Ao desferir a pancada, comete, em autoria material e na
forma, o crime de ofensa à integridade física qualificada -
11 artigos 143.º, n.º 1, 145.º, n.º 1, alínea a), e n.º 2, e 132.º, n.º 1
2, alínea l), do Código Penal, sendo de afastar o crime de
resistência e coacção sobre funcionário (artigo 347.º, n.º 1,
do Código Penal) por EMÍLIA estar em abuso de poder. Não
há legítima defesa.

Após GONÇALO ter empurrado EMÍLIA, DINIS comete, como autor material e na forma consumada,
DINIS foge um crime de evasão – artigo 352.º, n.º 1, do Código Penal. A
12 detenção já se efectivara. 0,7

DINIS leva a pistola de serviço de EMÍLIA, DINIS comete, como autor material e na forma consumada,
que caiu ao chão quando GONÇALO a em- um crime de furto simples, previsto e punido pelo artigo
purrou 203.º, n.º 1, do Código. Comete ainda, como autor material
e na forma consumada, um crime de detenção de arma
13 0,8
proibida – artigo 86.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º Lei n.º
5/2006, de 23.II, por referência aos artigos 2.º, n.º 1, alíneas
p), q) e ae), e 3.º, n.º 3, da mesma lei. Este crime está numa
relação de concurso efectivo com o de furto.

VI – EMÍLIA

EMÍLIA, Cabo da GNR em exercício de fun- Comete, como autora material, um crime de corrupção
ções, solicita a BERTA a utilização da sua passiva – artigo 373.º, n.º 1, do Código Penal. O crime con-
casa de férias a troco de um acto que é sumou-se com a mera solicitação. Os militares da GNR, pela
contrário aos deveres do cargo. natureza das funções de polícia que exercem, que está com-
14 preendida na função pública administrativa, incluída no Títu- 0,8
lo IX da CRP, também se incluem na previsão do artigo 386.º,
n.º 1, al d), do Código Penal.

EMÍLIA ordena a DINIS para abandonar a DINIS estava a exercer um direito, não existindo qualquer
Praça. fundamento legal para EMÍLIA proferir tal ordem. Fê-lo abu-
sando dos seus poderes e violando os deveres de imparciali-
15 dade e respeito pela lei inerentes às suas funções, tendo 0,8
ainda a intenção de beneficiar BERTA. Cometeu assim, como
autora material e na forma consumada, um crime de abuso
de poder – artigo 382.º do Código Penal.

VII – FERNANDO

FERNANDO pega no cartaz, que ficara caído FERNANDO não é comparticipante nos crimes de DINIS e
no chão, empunha-o e corre para longe dali GONÇALO, pois neles não teve qualquer tipo de participação.
com GONÇALO e DINIS, pondo-se de imedia-
Ao subtrair o cartaz, que estava apreendido, comete, como
to em fuga.
autor material e na forma consumada, um crime de desca-
16 minho – artigo 355.º do Código Penal. Poderia ainda conside- 0,8
rar-se o crime de favorecimento pessoal (artigo 367.º, n.º 1,
do Código Penal), pois o cartaz poderia ser elemento de pro-
va. Porém, sendo FERNANDO irmão de DINIS, a sua conduta
não é punível – artigo 367.º, n.º 5, alínea b), do Código Penal.

VIII – GONÇALO

3
GONÇALO correu na direcção de EMÍLIA e Comete, como autor material e na forma consumada, um
empurrou-a, dizendo a DINIS para fugir crime de tirada de presos – artigo 349.º, alínea a), do Código
17 0,8
Penal. DINIS estava regularmente detido pelo crime de ofen-
sa à integridade física. A detenção já se efectivara.

IX – HUGO

HUGO ri com tudo o que se passa envolven- Não comete qualquer crime.
18 0,1
do DINIS, EMÍLIA, FERNANDO e GONÇALO

4
GRUPO II

Questão 1

[Legalidade das busca e apreensão realizadas pelo sargente JOSÉ]

2 valores

O Sargento JOSÉ procurou por objectos relacionados com um crime ou que pudessem servir de prova nas instalações
de uma pessoa colectiva, que é lugar reservado ou não livremente acessível ao público, embora não domicílio. O re-
gime de tal diligência é, pois, o das medidas cautelares e de polícia e das buscas – artigos 249.º, n.º 1, alínea c), e
174.º, n.ºs 2 a 6, do CPP. Como regra, tais buscas apenas podem ser autorizadas ou ordenadas por autoridade judici-
ária. Excepcionalmente, poderão os OPC's realizá-las sem autorização ou despacho prévio de autoridade judiciária –
n.º 5 do artigo 174.º.

No caso, o único fundamento que poderia existir seria o da alínea b), consentimento dos visados, que deveria ficar,
por qualquer forma, documentado. Há que apreciar se a frase “a polícia pode sempre entrar!” é efectivo consenti-
mento, sendo de considerar que é.

Depois, há que decidir se uma funcionária que trata da contabilidade se pode considerar “visado” para efeitos de ter
legitimidade para consentir na busca. Deve entender-se que é sempre necessário o consentimento do titular do do-
micílio que seja visado pela diligência processual, não bastando o consentimento de quem tem a disponibilidade do
local. No caso, quem autorizou não representava de forma alguma a titular do direito à privacidade, que era a O QUE
É BOM SEMPRE ACABA, L.da, e que só poderia ser representada pelo seu gerente, ANTÓNIO. Por outro lado, o consen-
timento não ficou documentado por forma alguma.

Afigura-se mais defensável o entendimento de que não existe método proibido de prova (artigo 126.º, n.º 3, do Códi-
go de Processo Penal, que reproduz a segunda parte do n.º 8 do artigo 32.º da CRP), pois o domicílio aí referido não
abrange a sede das pessoas colectivas. A protecção é conferida apenas à esfera da intimidade da vida privada e fami-
liar em que se baseia a inviolabilidade do domicílio.

Quem, fundamentando devidamente, considere que na expressão “domicílio” prevista no n.º 3 do artigo 126.º do
CPP se inclui também a sede das pessoas colectivas, deverá então considerar que se verifica uma proibição de prova,
não podendo a busca e consequentes apreensões ser valoradas.

Quem, fundamentando devidamente, conclua em sentido contrário, terá depois de concluir que existe apenas uma
irregularidade, pois, não estando em especial prevista a nulidade (para uma situação de busca a sede de pessoa co-
lectiva por OPC sem autorização de autoridade judiciária e com consentimento de quem não é visado), aplica-se a
regra geral – artigo 118.º, n.ºs 1 e 2, do CPP.

Os actos irregulares produzem os seus efeitos enquanto a irregularidade não for declarada. Qualquer irregularidade
do processo só determina a invalidade do acto a que se refere e dos termos subsequentes que possa afectar quando
tiver sido arguida pelos interessados no próprio acto ou, se a este não tiverem assistido, nos três dias seguintes a
contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em algum acto nele
praticado – artigo 123.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

Questão 2

[Segredo de Justiça]

5
a. A decisão de sujeição do processo a segredo é do Ministério Público, não do juiz de instrução. Assim, é válida e
eficaz só por si, embora fique sujeita a uma condição (resolutiva). Apenas deixará de ser eficaz se o juiz de instrução a
não validar. (1 valor)

b. A resposta deve ser afirmativa. O incumprimento do prazo não tem qualquer consequência jurídica, pois a decisão
está eficaz. Mesmo que assim não fosse, nada impediria o Ministério Público de decretar novamente o segredo, ha-
vendo novo prazo para validação pelo juiz de instrução. Note-se, ainda, que o incumprimento do prazo não é imputá-
vel nem ao Ministério Público, nem o juiz de instrução.

Questão 3

[Depoimento de Maria]

(2 valores)

Note-se, desde logo, que a questão respeita à admissibilidade de valoração e não ao concreto valor probatório (natu-
ralmente, sujeito à livre apreciação do julgador).

Existe divisão sobre a questão colocada, havendo jurisprudência no sentido que a recusa de depoimento da testemu-
nha-fonte impede a valoração do depoimento da testemunha-inicial e jurisprudência em sentido contrário.

O candidato deveria apresentar argumentos para a resposta apresentada.

Afigura-se-nos mais correcta a resposta afirmativa. O depoimento indirecto tem valor probatório autónomo face ao
da testemunha. É claro na letra do artigo 129.º, n.º 1, do CPP, que é um verdadeiro meio de prova. Não é apenas uma
forma de identificar a testemunha-fonte ou de aferir da credibilidade do seu depoimento. O artigo 129.º, n.º 1, ape-
nas obriga a que se chame a testemunha-fonte (e mesmo aí com excepções), não a que esta efectivamente deponha
e confirme o declarado pela testemunha inicial. O facto de alguém recusar o depoimento não apaga tudo aquilo que
ela disse antes; o mesmo sucede com o arguido e o seu direito ao silêncio. O fundamento da possibilidade de recusa
de depoimento (artigo 134.º, n.º 1, do CPP) é evitar que alguém, sendo obrigado à verdade, seja colocado na situa-
ção/dilema de, para não cometer um crime, ter de contribuir para a condenação de um familiar; ora, tal não sucede
no regime do depoimento indirecto, pois as declarações foram feitas fora do processo, de forma livre e espontânea,
não havendo qualquer “dilema” por parte de quem as proferiu. Finalmente, se não fosse admissível tal depoimento
indirecto, também nunca poderiam ser alvo de escuta telefónicas as pessoas que se enquadram nas categorias do
artigo 134.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, e podem; de igual modo, se não pudessem ser utilizadas essas, por
maioria de razão, também não poderiam ser utilizadas as do próprio arguido quando ele se remete ao silêncio e do-
cumentos ou correspondência desse familiar, e podem.

6
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Via Académica

34.º CURSO DE FORMAÇÃO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

AVISO DE ABERTURA: AVISO N.º 15620 /2017, PUBLICADO NO


DIÁRIO DA REPÚBLICA, 2.ª SÉRIE, N.º 249/ 2017, DE 29 DE
DEZEMBRO DE 2017

DATA: 01 DE MARÇO DE 2018

2.ª CHAMADA

HORA: 14H 15M (DE ACORDO COM O DISPO STO NO ART. 12.º DO
REGULAMENTO INTERNO DO CENTRO DE ESTUDOS
JUDICIÁRIOS, O TEMPO DE DURAÇÃO DA PROVA INICIA -SE
DECORRIDOS 15 MINUTOS APÓS A HORA DESIGNADA)

DURAÇÃO DA PROVA: 3 HORAS

1
PROVA ESCRITA DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Via Académica – 2.ª Chamada – 01 de março de 2018

1 – A presente prova é composta por quatro Grupos, todos de resolução


obrigatória.

2 – Cotações:
- Grupo I (13 valores)

- Grupo II (2.5 valores)

- Grupo III (2 valores)

- Grupo IV (2.5 valores)


a) 0,5 valores
b) 2 valores

3 – A atribuição da cotação máxima em cada resposta pressupõe um tratamento


completo das várias questões suscitadas (afastando, inclusive, a responsabilidade
jurídico-penal de determinado/a agente, quando tal se justifique), que deverá ser
coerente e corretamente fundamentado, com indicação dos preceitos legais
aplicáveis.

4 – Na cotação atribuída serão tidos em consideração a pertinência do conteúdo, a


qualidade da informação transmitida em relação à questão colocada, a
organização da exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o
domínio da língua portuguesa.

2
5 – As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a
grafia do “Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa” (aprovado pela Resolução da
Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da
República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-lo expressamente
no quadro “Observações” da folha de rosto que lhes será entregue, escrevendo
“Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da Assembleia da
República n.º 26/91, não está em vigor com carácter de obrigatoriedade”, sendo a
prova corrigida nesse pressuposto.

6 – Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até
um máximo de 3 valores, para o total da prova.

7 – As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento


identificativo da/o candidata/o (a identificação constará apenas do destacável da
folha de rosto), sob pena de anulação da prova.

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GRUPO I

(13 valores)

Aprecie a eventual responsabilidade criminal de cada uma das pessoas infra


mencionadas.

Em momento indeterminado do ano de 2016, António André, sucateiro, com vista a obter
ganhos económicos, decidiu constituir um grupo de pessoas para se apoderarem de
veículos automóveis de propriedade alheia que se encontrassem na via pública para, de
seguida, os desmantelar e os vender em peças.
Com tal desiderato, no mesmo ano, o António abordou o Bruno Bastos, mecânico de
automóveis com larga experiência, que se encontrava desempregado e que, por isso,
prontamente acedeu ao convite para desmantelar veículos automóveis para serem
vendidas as respetivas peças.
Cerca de uma semana depois, o António abordou Carlos Castro e David Damásio, que sabia
serem exímios na arte de se apoderarem de veículos automóveis através do uso de
imitações de chaves, tais como gazuas e outros instrumentos similares e ligação direta dos
respetivos motores.
Por último, no mesmo ano, o António abordou um indivíduo chamado Eduardo Espinhaço,
convidando-o a participar no grupo, pois sabia que este tinha inúmeros contactos de
pessoas pertencentes ao ramo de compra e venda de peças automóveis e que, inclusive, as
exportavam para fora da União Europeia, nomeadamente para o Brasil, Rússia, Marrocos,
Egito e Argélia.
O Bruno, o Carlos, David e Eduardo aceitaram o convite do António para fazerem parte do
dito grupo e praticarem os atos necessários no âmbito dos já aludidos conhecimentos
especializados de cada um, com o fim de obterem proventos económicos. O grupo em
questão, inclusive, constituiu, para efeitos da dita atividade e para agir a seu coberto, uma
sociedade comercial por quotas, com a firma “Velozes&Curiosos, Lda.”, com o objeto social
“Sucata, comércio por grosso e a retalho de peças auto e veículos a motor”, com um capital
social igual a 5.000,00€ e sede na Rua da Quintela, n.º 26, Lisboa. No contrato de sociedade

4
de tal pessoa jurídica, para além dos elementos referidos, foram indicados como sócios os
cinco indivíduos do dito grupo, com quotas e entradas de capital de 20% quanto ao Carlos e
David, 15% em relação ao Bruno e Eduardo, e 30% quanto ao António. O António, com o
acordo de todos os demais, foi indicado, no respetivo contrato de sociedade, como sócio-
gerente, com os inerentes poderes de administração e representação da sociedade. O
registo definitivo daquela sociedade por quotas junto da competente Conservatória de
Registo Comercial ocorreu em 15 de dezembro do ano de 2016.

Em execução do descrito plano, de janeiro a novembro de 2017, o Carlos e o David, agindo


cada um de forma isolada, apoderaram-se, contra a vontade dos respetivos donos, de um
total de 34 veículos automóveis (17 apoderados pelo Carlos, 17 pelo David) que se
encontravam na via pública, sempre através dos ditos métodos (uso de imitações de chaves
e ligação direta), com exceção de duas ocasiões infra descritas.
Destes 34 veículos 2 tinham um valor de mercado igual a 5.000,00€ cada (1 o Carlos, 1 o
David), 28 tinham um valor de mercado igual a 20.400,00€ cada (14 o Carlos, 14 o David), e
4 tinham um valor de mercado de 42.000,00€ cada (2 o Carlos, 2 o David).

Um dos referidos veículos de maior valor de que o Carlos se apoderou tinha o acesso
condicionado por uma chave virtual, cuja introdução no computador do automóvel era
necessária realizar através de uma comunicação via smartphone, quer para aceder ao
interior do veículo (sem estragos materiais), quer para desbloquear e ligar o respetivo
motor. Em tal contexto, no dia 2 de maio de 2017, pelas 14:00, o Carlos, para se apoderar
deste veículo - e porque o uso de imitações de chaves materiais e a usual ligação direta não
eram métodos viáveis - recorreu a uma aplicação digital que tinha instalada no seu
smartphone, denominada “Besthack.03”. Esta aplicação tinha sido adquirida pelo mesmo
pouco tempo antes na darknet, por um valor correspondente a 2.000,00€, a um indivíduo
que se identificava com o nome de Lord Hackney. Tal aplicação, após ligação ao respetivo
servidor, permitiu-lhe copiar os dados referentes à chave virtual do dito veículo e, após,
introduzi-la no computador deste através do seu smartphone, para aceder ao interior e
colocar o motor em funcionamento.
Por seu turno, o David, para se apoderar também de um dos veículos automóveis de maior
valor, em vez de recorrer ao método das imitações de chaves e ligação direta, resolveu

5
abordar um indivíduo solitário que conduzia um BMW 520i na via pública, enquanto parado
num semáforo com luz encarnada para, de seguida, o retirar do veículo puxando-o com
força para o efeito, e, assim, se apoderar do carro. Com tal fim em vista, o David aproximou-
se do veículo e abriu a porta do condutor. Contudo, ao abri-la o David deparou-se com o
condutor que proferiu de imediato a seguinte expressão, “então meu cabrão, achavas que
eras o único bandido na cidade? Já vais ver como é que é…” para, logo de seguida, fazer um
gesto para retirar algo do seu casaco. Nesse momento, receando que o condutor do veículo
estivesse munido de uma arma de fogo, o David, veloz e habilmente, sacou de uma pistola
semiautomática, carregada com 8 munições de calibre 9 mm, com cano de alma estriada de
8,3 cm de comprimento, que transportava consigo naquela ocasião, por debaixo do casaco,
e prontamente disparou dois tiros atingindo o condutor na zona do coração, provocando-
lhe de forma direta e imediata a morte. Ato contínuo, o David retirou o corpo inerte do
condutor para o lugar do passageiro, introduziu-se no interior da viatura e, aproveitando o
facto de estar já em funcionamento, ausentou-se do local. No caminho para o local onde
iria armazenar o veículo, o David parou numa quinta que sabia ter inúmeros porcos, para ali
se desfazer do corpo do condutor, pois sabia que tais animais comeriam o cadáver sem
deixar vestígios. Nesta senda, retirou o corpo do veículo e atirou-o para o meio dos ditos
animais, que devoraram o cadáver, tal como previsto pelo David.
Cada um dos 34 veículos, de que Carlos e David se apoderaram, foi guardado num armazém
arrendado em nome da sociedade “Velozes&Curiosos, Lda.”. Logo após, o Bruno procedeu
ao respetivo desmantelamento em peças, as quais foram subsequentemente vendidas
durante o mesmo ano através do Eduardo, a Fábio Fagundes e Gustavo Gato, comerciantes
de peças auto, que as adquiriram por preços bastante abaixo dos de mercado, sem
questionar a respetiva origem.
Os pagamentos das compras de tais peças eram feitos à supra aludida sociedade, em nome
da qual eram passados os respetivos recibos, elaborados e assinados pelo António
enquanto seu sócio-gerente. Acresce que o António, na mesma qualidade e no mesmo ano
de 2017, vendeu a terceiros 15 veículos automóveis usados, após os adquirir, em nome da
“Velozes&Curiosos, Lda.”, aos respetivos proprietários através de contratos de compra e
venda, cujo preço foi pago. Tais transações também foram faturadas em nome da
sociedade e emitidos recibos em nome desta.

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Com a supra descrita atividade de apoderamento de veículos contra a vontade dos
respetivos donos, e subsequentes vendas de peças auto, o grupo obteve 156.134,00€, ao
que acresceram 96.789,00€ derivados da venda dos 15 veículos aludidos, proventos estes
que foram distribuídos, no final do ano de 2017, por todos os elementos do grupo, na
proporção das quotas supra aludidas e na forma de lucros da “Velozes&Curiosos, Lda.”.

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GRUPO II
(mantém-se a situação factual descrita no Grupo I, com os desenvolvimentos agora indicados)

(2,5 valores)

Imagine agora que órgãos de polícia criminal, no âmbito de um inquérito penal onde
se investigam os factos supra descritos, com vista a seguirem os movimentos do
António, à revelia deste, colocam num veículo automóvel por este utilizado um
dispositivo de tracking via GPS, através do qual descobrem que armazena os veículos
apoderados por Carlos e David num armazém sito no Parque das Nações, Lisboa.

Aprecie a descrita conduta dos órgãos de polícia criminal e respetivas


consequências em sede de prova, à luz da Lei Processual Penal.

8
GRUPO III
(mantém-se a situação factual descrita no Grupo I, com os desenvolvimentos agora indicados)

(2 valores)

Logo após Carlos se ter apoderado de um veículo que se encontrava estacionado na via
pública (através do uso de uma gazua e ligação direta) e enquanto o conduzia, foi
intercetado por órgãos de polícia criminal (OPC), no âmbito da mesma investigação.
Ato contínuo, os OPC efetuaram uma revista ao Carlos e apreenderam-lhe, além do
mais e com finalidades probatórias, o seu smartphone. De seguida, à revelia do Carlos,
fizeram uma pesquisa no dito aparelho e descobriram o software denominado
“Besthack.03”, detetando que a aplicação tinha sido utilizada no dia 2 de maio de
2017, pelas 14:00.

Aprecie a descrita conduta dos órgãos de polícia criminal e respetivas


consequências em sede de prova, à luz da Lei Processual Penal.

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GRUPO IV
(mantém-se a situação factual descrita no Grupo I, com os desenvolvimentos agora indicados)

(2,5 valores)

Em sequência do descrito no Grupo anterior, os órgãos de polícia criminal procederam


à detenção do Carlos, ao abrigo do artigo 255.º/1/a, do CPP.

a) Ao deterem o Carlos, quais as formalidades processuais que os órgãos de


polícia criminal devem cumprir? (0,5 valores)

b) Após a detenção do Carlos, os órgãos de polícia criminal conduziram-no a


uma esquadra policial, onde permaneceu durante 49 horas.
Imediatamente após esse período, o Carlos é apresentado ao Ministério
Público que, logo de seguida, apresenta o arguido ao Juiz de Instrução
Criminal (JIC) competente, requerendo a realização de primeiro
interrogatório judicial e a aplicação de medida de coação.
Caso fosse o JIC que decisão proferiria sobre a detenção e sobre a
realização do primeiro interrogatório requerido? (2 valores)

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34.º Curso

Via Académica: 2.ª Chamada


GRELHA DE VALORAÇÃO E CORRECÇÃO

GRUPO I

Total: 13 valores

Enunciado: [Em face dos factos descritos, aprecie a responsabilidade jurídico-penal de cada
uma das pessoas referidas]

Notas prévias:
a) A cotação máxima no âmbito do crime de associação criminosa (art. 299, do CP),
pressupõe a descrição do bem jurídico (paz pública), a diferenciação das formas de
comparticipação e justificação da punição autónoma, e a análise dos seus requisitos essenciais,
a saber: pelo menos 3 pessoas – no caso concreto, são 5 indivíduos, AA, BB, CC, DD, EE;
duração no tempo - a estrutura em causa dura pelo menos durante grande parte do ano de
2017; estrutura organizativa – existe uma organização bem determinada, com distribuição de
tarefas especializadas pelos referidos elementos (o que o distingue de um bando); processo de
formação de vontade coletiva – inerente ao próprio conceito de uma sociedade por quotas;
unidade diferente de qualquer uma das individualidades componentes (o todo ultrapassa a
mera soma das partes) – o grupo constitui, no caso concreto uma sociedade comercial por
quotas (Velozes&Furiosos, Lda.), entidade que transcende os membros do grupo, e visa,
fundamentalmente a prática de factos ilícitos (crime de branqueamento – art. 368-A, do CP).
De notar que a constituição de uma sociedade comercial com finalidades criminosas deve ser
considerada, pelo menos no que toca ao crime de branqueamento a analisar infra,
especialmente perigoso para a paz pública, dada a vocação natural daquele tipo de pessoa
coletiva para interagir no comércio, com todas as implicações da respetiva atuação ilícita para
a propriedade alheia e o mercado. Tal justifica, portanto, a punição autónoma da associação
criminosa.
b) Em sede dos crimes descritos no texto, em especial dos crimes contra o património, é
essencial ter presente o art. 26, do CP, que distingue 4 formas de ação que devem ser punidas
a título de autoria, em primeiro lugar, a autoria imediata (domínio da ação). Naturalmente
esta figura está presente no caso concreto. Em segundo lugar a lei enuncia a autoria mediata

1
(“quem executar o facto… por intermédio de outrem” - o homem da frente é mero
instrumento ou meio do homem-de-trás, que detém o “domínio da vontade”). No caso
concreto inexiste a figura da autoria mediata. Em terceiro lugar, a lei expõe a coautoria
(“quem tomar parte direta na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros”
– “condomínio do facto”). Esta figura também é importante para o caso concreto. O coautor,
conforme realça o art. 26, deve tomar parte direta na execução do facto ilícito-típico. Ou seja,
não pode ser considerado coautor do facto típico quem não participa na execução, sendo
certo que o conceito de execução é dado pelo art. 22/2, do CP. Por último, no texto do art. 26,
encontramos uma 4.ª alternativa de punição como autor, a instigação, que também assume
particular relevância para o caso concreto. Como se sabe o instigador é aquele que produz no
executor, de forma cabal, a decisão de atentar contra um bem jurídico-penal, inculcando-lhe a
ideia, revelando-lhe a sua possibilidade, as suas vantagens ou o seu interesse, ou aproveitando
a sua plena disponibilidade e acompanhando de perto e ao pormenor a tomada de decisão
definitiva pelo executor, detendo, também ele, o “domínio da decisão”. Ainda de acordo com
a nossa lei, e no que é pertinente para o caso concreto, torna-se necessário distinguir o
instigador do indutor (art. 27, do CP - cúmplice na forma de “auxílio moral”). A distinção entre
o instigador e o indutor ocorre porquanto o primeiro determina, de forma cabal, uma vontade
alheia a praticar o facto ilícito típico – comparticipação essencial no facto -, enquanto o
segundo apenas fortalece-o na vontade de praticar o crime – participação acessória no facto.

Isto posto, descrevemos a subsunção jurídica considerada correta.


AA:
1. Fundou e dirige uma associação criminosa, crime previsto no art. 299.º/1/3/5, do CP.
Valoração: 0,2.
2. É instigador, relativamente a CC e DD, de 30 crimes de furto qualificado valor
elevado e/ou por modo de vida (art. 204/1/a/h, 202/a, do CP), e de 3 crimes de furto
qualificado por valor consideravelmente elevado (art. 204/2/a, 202/b, do CP). Valoração:
0,2.
3. É instigador, relativamente a BB e EE, de 34 crimes de recetação (art. 231/1, do CP).
Valoração: 0,4.
4. É coautor, com os demais elementos da associação criminosa, de um crime de
branqueamento, p. e p. pelo art. 368-A/1/2, do CP. De notar, que os proventos da venda
de peças de veículos furtados/roubados são distribuídos entre os 5 elementos do grupo
criminoso, na proporção das quotas de sócio, na forma de lucros da sociedade comercial
“Velozes&Curiosos, Lda”. O catálogo de crimes previsto no art. 368-A/1, do CP, apenas

2
abrange, no que aqui é pertinente, crimes puníveis com mínimo superior a 6 meses ou
máximo superior a 5 anos. Os furtos simples e furtos qualificados do art. 204/1, do CP,
não se subsumem em tal previsão. Ou seja, apenas pode haver crime de branqueamento
quanto aos proventos dos bens de valor consideravelmente elevado infra referidos. Com
estas precisões, AA (e os demais elementos da associação criminosa) pratica o crime de
branqueamento. Valoração: 0,2.
BB :
5. É parte de uma associação criminosa, crime previsto no art. 299/1/2/5, do CP.
Valoração: 0,2.
6. É autor imediato, de 34 crimes de recetação (art. 231/1, do CP). Valoração: 0,3.
7. É indutor, relativamente a CC e DD dos crimes de furto qualificado pelos quais estes
devem ser punidos (cúmplice moral, pois fortalece a vontade destes, sabendo CC e DD, de
acordo com o plano comum, que terão sempre meios ao seu dispor para se
desembaraçarem mais facilmente dos bens de origem ilícita – art. 27, do CP). Valoração:
0,5.
8. É coautor, com os demais elementos da associação criminosa, de um crime de
branqueamento, p. e p. pelo art. 368-A/1/2, do CP. Valoração: 0,2.
CC
9. É parte de uma associação criminosa, crime previsto no art. 299/1/2/5, do CP.
Valoração: 0,2.
10. É autor imediato de 15 crimes de furto qualificado por valor elevado e/ou por modo
de vida (art. 204/1/a/h, 202/a, do CP), e 2 crimes de furto qualificado por valor
consideravelmente elevado (art. 204/2/a, 202/b, do CP). Valoração: 0,3.
11. O CC ao aceder, sem autorização, ao computador de um dos veículos que subtraiu,
após aceder a dados confidenciais para o efeito (cópia dos dados da chave virtual contidos
no servidor), cometeu, em autoria imediata, um crime de acesso ilegítimo agravado –
art. 6/1/4/b, da LCC (Lei do Cibercrime ou LCC – Lei n.º 109/2009, de 15/09). O dolo de
cada um dos demais elementos do grupo também envolve estes factos? Adotando o
critério da previsibilidade, a resposta só pode ser negativa. Valoração: 0,3.
12. É indutor, relativamente a DD dos crimes de furto qualificado pelos quais este deve
ser punido (cúmplice moral, pois fortalece a vontade deste, tendo em conta que a final,
de acordo com o plano comum, receberá sempre uma percentagem fixa dos lucros, de
acordo com a sua quota societária – art. 27, do CP). É também cúmplice moral dos crimes
de recetação praticados por BB e EE, por igualdade de razões. Valoração: 0,5.

3
13. É coautor, com os demais elementos da associação criminosa, de um crime de
branqueamento, p. e p. pelo art. 368-A/1/2, do CP.). Valoração: 0,2.
DD
14. É parte de uma associação criminosa, crime previsto no art. 299/ 1/2/5, do CP.).
Valoração: 0,2.
15. É autor imediato de 15 crimes de furto qualificado por valor elevado e/ou modo de
vida (art. 204/1/a/h, 202/a, do CP), e 1 crime de furto qualificado por valor
consideravelmente elevado (art. 204/2/a, 202/b, do CP). Valoração: 0,3.
16. No que à morte do condutor do veículo BMW 520i diz respeito, a resolução criminosa
inicial de DD envolve apenas o uso de força física para se apoderar do veículo (crime de
roubo). Contudo, porque o condutor o ameaça com um gesto indiciador de que irá puxar
de uma arma, interpretando o DD que tal gesto é no sentido de puxar de uma arma de
fogo, dispara uma pistola 9 mm contra o condutor, por duas vezes, atingindo-o numa
zona vital, matando-o de imediato. Apesar de alguma doutrina afirmar que “contra
legítima defesa não há legítima defesa” (Taipa de Carvalho, “Direito Penal, Parte Geral”,
3.ª ed., Católica, Porto, 2016, p. 369; Claus Roxin, “Derecho Penal, Parte General”,
Editorial Civitas, Madrid, 1997 p. 615), cremos que pode ser argumentado que no caso
concreto DD reage a uma ação do condutor de proteção da propriedade/posse do carro
que poderá colocar em causa a vida daquele. Pode, assim, ser sustentado que estamos
perante uma legítima defesa para tutela da vida de DD, ocorrida perante uma legítima
defesa do condutor para proteger a propriedade/posse do veículo, sendo certo que a
defesa exercida por DD é manifestamente excessiva no que toca ao meio. De notar que,
apesar de não podermos afirmar que DD se encontra em erro, a expressão do condutor,
“… achavas que eras o único bandido na cidade? Já vais ver como é que é…”, seguido de
um gesto para retirar algo de um bolso, induz um destinatário comum a pensar que irá
sacar efetivamente de uma arma (arma branca ou de fogo, é coisa que se desconhece e é
irrelevante para o caso). Não se sabe, contudo, se tal retirar de uma arma é apenas para
intimidar DD ou para o atingir no corpo. Assim sendo, DD, ao disparar de imediato sobre o
condutor, dirigindo os disparos a uma zona vital (coração), age manifestamente em
excesso, mesmo que se considere que estava munido de animus de defesa perante uma
previsível agressão iminente por parte do condutor. É, pois, autor imediato, de um crime
de homicídio simples (art. 131, do CP), cometido em excesso de legítima defesa, cuja
pena pode (mas, em bom rigor, não deve, atenta a situação criada pelo próprio DD) ser
especialmente atenuada (arts. 32 e 33, do CP). O dolo de cada um dos demais elementos

4
do grupo também envolve estes factos? Adotando o critério da previsibilidade, a resposta
só pode ser negativa. Valoração: 2,5.
17. Quanto ao apoderamento do veículo BMW 520i. O crime de roubo (art. 210, do CP),
como se sabe, é um crime de execução vinculada, apenas podendo ser cometido, quando
o bem apropriado o foi através do uso, no que aqui é pertinente, de violência física. DD
queria praticar um crime de roubo, através do uso de violência física, mas, porque foi
surpreendido pelo condutor e o matou em excesso de legítima defesa, acabou por não ter
necessidade de recorrer a tal violência. Comete, assim, em autoria imediata, um crime de
furto qualificado consumado (bem com valor consideravelmente elevado, trazendo arma
de fogo oculta - arts. 202/b, 204/2/a/f, do CP) em concurso aparente com um crime de
roubo agravado na forma tentada (arts. 210/1/2/b, 202/b, 204/2/a/f, 22/1/2/c, do CP),
prevalecendo este sobre aquele porque punido de forma mais grave. É, ainda, autor
imediato e em concurso efetivo, de um crime de detenção de arma proibida (arts. 2/1/q,
3/3, 5/1, 13, 86/1/c, da Lei 5/2006, de 23/02, Lei das armas). O dolo de cada um dos
demais elementos do grupo também envolve estes factos? Adotando o critério da
previsibilidade, a resposta só pode ser negativa. Valoração: 3.
18. É autor imediato de um crime de profanação de cadáver, p. e p. pelo art. 254/1/b, do
CP. Valoração: 0,2.
19. É indutor relativamente a CC dos crimes de furto qualificado pelos quais este deve
ser punido (cúmplice moral, pois fortalece a vontade deste, tendo em conta que a final,
de acordo com o plano comum, receberá sempre uma percentagem fixa dos lucros, de
acordo com a sua quota societária – art. 27, do CP). É também cúmplice moral dos crimes
de recetação praticados por BB e EE, por igualdade de razões. Valoração: 0,5.
20. É coautor, com os demais elementos da associação criminosa, de um crime de
branqueamento, p. e p. pelo art. 368-A/1/2, do CP. Valoração: 0,2.
EE
21. É parte de uma associação criminosa, crime previsto no art. 299/1/2/5, do CP.
Valoração: 0,2.
22. É autor imediato, de 34 crimes de recetação (art. 231/1, do CP). Valoração: 0,3.
23. É indutor relativamente a CC e DD dos crimes de furto qualificado pelos quais estes
devem ser punidos (cúmplice moral, pois fortalece a vontade destes, sabendo CC e DD, de
acordo com o plano comum, que terão sempre meios ao seu dispor para se
desembaraçarem mais facilmente dos bens de origem ilícita – art. 27, do CP). Valoração:
0,5.

5
24. É coautor, com os demais elementos da associação criminosa, de um crime de
branqueamento, p. e p. pelo art. 368-A/1/2, do CP. Valoração: 0,2.

A sociedade “Velozes&Curiosos, Lda”


25. É responsável, nos termos previstos no art. 11/2/a/4, do CP, por um crime de
associação criminosa (art. 299, do CP), e um crime de branqueamento (art. 368-
A/1/2, do CP). Valoração: 0,5.
FF e GG. Valoração: 0,5.
26. FF e GG praticam, como autores imediatos, crimes de recetação (art. 231/2, do CP).
Valoração: 0,3.
Lord Hackney
27. O “Lord Hackney” comete, em autoria imediata, um crime de acesso ilegítimo (art.
6/2, da Lei 109/2009, de 15/09 - LCC). Valoração: 0,4.

GRUPO II

2,5 valores
Questão: [Uso de dispositivo de tracking via GPS: Aprecie a descrita conduta dos
órgãos de polícia criminal e respetivas consequências em sede de prova, à luz da
Lei Processual Penal]

O aparelho conhecido como GPS tracker permite saber, em tempo real, onde está, neste caso,
um veículo automóvel, bem como o respetivo percurso, os tempos e locais de paragem, o
período de funcionamento do motor e a velocidade a que o automóvel circula. Este meio de
obtenção de prova é diferente da interceção de comunicações e não existe lei que o preveja,
bem como aos seus limites e às garantias inerentes à sua aplicação. É um meio oculto de
investigação que, por isso mesmo, só poderia ser admitido se existisse lei que o consagrasse
como um meio de obtenção de prova legítimo e regulasse os aspetos essenciais do seu
regime. Assim é, porque a utilização destes aparelhos, pelo sistemático e permanente registo
de dados que propicia e pela natureza dos mesmos, é suscetível de violar a vida privada dos
utilizadores dos veículos em que se encontrem instalados (neste sentido, TRL 13.04.2016, proc.
n.º 2903/11.8TACSC.L1-3; bem como Paulo Pinto de Albuquerque e Manuel de Costa Andrade,
“Bruscamente no Verão Passado, A Reforma do Código de Processo Penal”, Coimbra Editora,
2009, pp. 113 e 184).

6
Nestes termos, é um método proibido de obtenção de prova (arts. 32/8, CRP, 126/3, do CPP).
Em consequência, a localização da garagem através daquele meio não pode ter valor
probatório (proibição de valoração).
Em sentido divergente, Santos Cabral, “Código de Processo Penal Comentado”, Almedina, 2.ª
ed., 2016, p. 780; TRP 21-03-2013, proc. n.º 246/12.9TAOAZ-A.P1; TRE 07.10.2008, proc. n.º
2005/08-1.

GRUPO III

2 valores
Questão: [Pesquisa em smartphone: Aprecie a descrita conduta dos órgãos de
polícia criminal e respetivas consequências em sede de prova, à luz da Lei
Processual Penal]

A pesquisa a sistema informático, nas circunstâncias descritas no texto, em especial, na falta


de consentimento do titular (Carlos), carece de autorização judicial nos termos previstos no
art. 15/1/3, da LCC – Lei 109/2009. Nestes termos, o acesso aos dados contidos no
smartphone foi efetuada fora das condições legais com violação da vida privada e,
consequentemente, existe uma proibição de prova (arts. 32/8, CRP, 126/3, CPP). Em
consequência, as informações verificadas pelos órgãos de polícia criminal naquelas
circunstâncias não têm valor probatório (proibição de valoração).
Em sentido divergente, Ac. TRE de 07-04-205, proc. n.º 13/15.8PAOLH-A.

GRUPO IV

0,5 valor
Questão 1: [Ao deterem o Carlos, quais as formalidades processuais que os órgãos
de polícia criminal devem cumprir?]

Deve proceder-se à constituição de arguido e comunicação ao Ministério Público, nos termos


previstos no art. 58, do CPP.

GRUPO IV

7
2 valores
Questão 2: [Após a detenção do Bruno, os órgãos de polícia criminal conduzem-no
a uma esquadra policial, onde permanece durante 49 horas. Imediatamente após
esse período, o Bruno é apresentado ao Ministério Público que, logo de seguida,
apresenta o arguido ao Juiz de Instrução Criminal competente, requerendo a
realização de primeiro interrogatório judicial e a aplicação de medida de coação.
Caso fosse o JIC que decisão proferiria sobre a detenção e sobre a realização do
primeiro interrogatório requerido?]

O juiz deve declarar que a detenção, para além das 48h previsto no art. 28/1, da CRP, art.
141/1 e 254/1/a, do CPP, é inválida, dando ordem de libertação do arguido. Contudo, tal não
impossibilita uma nova detenção para a realização do 1.º interrogatório, nem a validade das
medidas de coação aí eventualmente aplicadas.
- Ac. TC. n.º 396/2003, de 30 de Julho de 2003:
Conclui que o facto de os arguidos, em anterior ocasião, terem sido soltos por se haver
esgotado o prazo de 48 horas, previsto nos arts. 28, n.º 1, da C.R.P. e 141, n.º 1, do C.P.P., para
serem apresentados ao Juiz, não impede a sua posterior detenção e sujeição às medidas de
coação que se afigurem adequadas e necessárias, designadamente à prisão preventiva.
- Ac. TRL de 30-09-2004, proc. n.º 7025/2004-9:
“… a tardia apresentação do detido, ocorra ela por ato espontâneo da autoridade que levou a
cabo a detenção ou na sequência de requerimento de habeas corpus, não obsta à realização
do interrogatório e à aplicação de qualquer medida de coação. Como a tanto não obsta, por
maioria de razão, a circunstância de, tendo o detido sido apresentado ao juiz em tempo útil, o
interrogatório não poder iniciar-se ou concluir-se no prazo de 48 horas após a detenção (isto
para quem entenda que o juiz deve ouvir o detido dentro desse prazo).
É que, a admitir-se que o detido tinha que ser libertado obrigatoriamente no termo das 48
horas, nada impediria que, continuando a verificar-se os pressupostos necessários à aplicação
de uma medida de coação, se ordenasse nova detenção com tal finalidade.”.

**

8
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL
Via Profissional

34.º CURSO DE FORMAÇÃO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

AVISO DE ABERTURA: AVISO N.º 15620 /2017, PUBLICADO NO


DIÁRIO DA REPÚBLICA, 2.ª SÉRIE, N.º 249/ 2017, DE 29 DE
DEZEMBRO DE 2017

DATA: 17 DE FEV EREIRO DE 2018

1.ª CHAMADA

HORA: 9H 15M (DE ACORDO COM O DISPOSTO NO ART. 12.º, DO


REGULAMENTO INTERNO DO CENTRO DE ESTUDOS
JUDICIÁRIOS, O TEMPO DE DURAÇÃO DA PROVA INICIA -SE
DECORRIDOS 15 MINUTOS APÓS A HORA DESIGN ADA)

DURAÇÃO DA PROVA: 4 HORAS

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PROVA ESCRITA DE
DIREITO CIVIL, COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL
Via Profissional – 1.ª Chamada – 17 de fevereiro de 2018

1 - A presente prova disponibiliza o seguinte conjunto de peças, contidas


em autos de um processo judicial (nomes, moradas e restantes elementos de facto
fictícios):
i) Petição inicial apresentada pelos Autores em 3 de setembro de
2015 e documentos juntos com a mesma;
ii) Contestação apresentada pelos Réus e documentos juntos com a
mesma;
iii) Réplica apresentada pelos Autores;
iv) Dois requerimentos apresentados pelas partes;
v) Ata da Audiência Prévia (inclui despacho saneador, bem como
despacho de fixação do objeto do litígio e de enunciação dos temas da prova);
vi) Extrato da decisão sobre a matéria de facto integrada na
Sentença elaborada pelo Juiz do processo.

2 - Pretende-se que, mediante o conjunto das peças e elementos


disponibilizados e com base nos elementos de facto conhecidos, redija a
Sentença, integrando na decisão sobre a matéria de facto todos os factos
relevantes, entre os quais, necessariamente, os constantes do extrato junto,
podendo fazê-lo - nesta parte - por remissão para os respetivos pontos e/ou
alíneas.

3 - Apesar de a prova consistir na elaboração de uma Sentença, não


poderá conter qualquer assinatura, ainda que fictícia, pelo que, no final da
peça, as/os candidatas/os só deverão escrever as palavras seguintes:
“Data”
“Assinatura”.

4 - Cotação: 20 valores
- Fundamentação de Direito - 11,5 valores
- Demais componentes estruturais da Sentença - 8,5 valores.

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5 - A atribuição da cotação máxima nesta prova pressupõe um tratamento
completo das várias questões suscitadas, que deverá ser coerente e corretamente
fundamentado e com indicação dos preceitos legais aplicáveis.

6 - Na apreciação da prova relevarão, nomeadamente, a pertinência do


conteúdo, a qualidade da informação transmitida em relação à questão colocada, a
organização da exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o
domínio da língua portuguesa.

7 - Os erros ortográficos serão considerados negativamente: 0,25 por cada


um, até um máximo de 3 valores.

8 - As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a


grafia do "Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa" (aprovado pela Resolução da
Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da
República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-
lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que lhes será
entregue, escrevendo "Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela
Resolução da Assembleia da República n.º 26/91, não está em vigor com carácter
de obrigatoriedade", sendo a prova corrigida nesse pressuposto.

9 - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer


elemento identificativo da/o candidata/o (a identificação constará apenas do
destacável da folha de rosto), sob pena de anulação da prova.

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PETIÇÃO INICIAL

Ex.mo Sr. Juiz de Direito da Comarca de...

José Dionísio e Maria Dionísio, casados entre si no regime de comunhão de adquiridos,


reformados, e residentes na rua...

Vêm instaurar a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra

1. Elisa Dionísio, viúva, reformada, residente em..., por si e na qualidade de


interessada no inventário adiante referido, bem como na qualidade de cabeça-de-
casal e interessada na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito do seu marido,
Mário Santos, residente que foi no mesmo local,
E filhos
2. António Santos
3. João Santos, ambos solteiros, maiores, na qualidade de interessados na mesma
herança e residentes na morada da sua mãe, ora Ré,

Com os seguintes fundamentos:

1.º

Por morte de Jorge Dionísio, residente que foi em B, ocorrida em 19/12/1986, procedeu-se a
inventário facultativo com o n.º 8/95, do 1.º Juízo do Tribunal de ..., no qual exerceu o
cabecelato a sua viúva, Joana Dionísio, com quem fora casado sob o regime de comunhão
geral de bens, tudo conforme documento n.º 1 que agora se junta.

2.º

Nesse inventário, foram habilitados como herdeiros do falecido, entre outros, os filhos de
ambos:

- José Dionísio, aqui autor;

- Elisa Dionísio, aqui primeira Ré, casada então com Mário Santos, posteriormente
falecido.

3.º

Na relação de bens do inventário, de que se junta cópia certificada como documento n.º 2, foi
relacionado, como verba n.º 1, o seguinte imóvel da herança:

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- terreno de sequeiro, com a área de 960 m2, sito em L., freguesia e concelho de
A..., a confrontar do norte com Eva Santos (e atualmente o Autor), sul com Alberto
Santos, nascente com caminho (atualmente estrada asfaltada, com o nome de rua
do Lameiro), e poente com caminho, omisso na Conservatória do Registo Predial, e
inscrito na matriz rústica sob o art. 0000.

4.º

Nesse terreno, a primeira Ré e o seu falecido marido construíram a casa que se vê no


levantamento topográfico junto como documento n.º 3.

5.º

Essa casa, na mesma relação de bens, foi descrita como benfeitoria sob a verba n.º 11, pela
forma seguinte:

- casa para habitação composta de rés do chão com quatro assoalhadas, uma
cozinha, uma casa de banho, um corredor, uma varanda com logradouro, superfície
coberta de 96 m2, logradouro de 200 m2, a confrontar do norte com caminho
público, sul com Alberto Santos, nascente com caminho público e poente com
Miguel Isidro, omissa na Conservatória do Registo Predial e inscrita na matriz
predial urbana sob o artigo 3333.

6.º

A casa está inscrita na matriz em nome da primeira Ré.

7.º

No referido artigo rústico n.º 0000, a primeira Ré e seu falecido marido construíram também,
encostados à casa, para o lado poente desta, alguns cómodos, designadamente um abrigo
para automóveis, como se vê do levantamento topográfico acima referido.

8.º

As confrontações do terreno constantes da matriz, da responsabilidade da primeira Ré, estão


intencionalmente erradas.

9.º

Porque as confrontações se fazem de norte não com caminho público, mas com outro prédio,
como se vê do levantamento topográfico, e que se vai passar a referir.

10.º

Na conferência de interessados havida em 20/01/2000, e constante do doc. 1, descreveu-se


como verba n.º 2-A o seguinte imóvel:

- terra de sequeiro sita em L., freguesia e concelho de A., com a área de 1283 m2, a
confrontar do norte com João Loureiro (atualmente o Autor) e outro, do sul com
Jorge Dionísio (o inventariado referido, pai do Autor e da primeira Ré), do nascente

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com caminho (atualmente asfaltada, com o nome de rua do Lameiro) e poente
caminho, inscrito na matriz predial sob o artigo 1111 e descrito na Conservatória do
Registo Predial de A. sob o n.º 4444/A.

11.º

Este prédio havia sido objeto de uma escritura de justificação notarial feita pela viúva Joana
Dionísio, em que invocou a usucapião.

12.º

Com base na usucapião, o prédio foi descrito na Conservatória do Registo Predial de A. sob o
n.º 4444/A, e aí inscrito a seu favor, conforme documento n.º 4 que ora se junta.

13.º

Joana Dionísio moveu contra a filha Elisa Dionísio, aqui primeira Ré, e contra o marido, então
ainda vivo, ação sumária que correu termos sob o n.º 1/96, em que pedia que fossem
obrigados a reconhecer que ela era dona do prédio.

14.º

Mas, em 20/01/2000, teve lugar a conferência de interessados, na qual todos os herdeiros


intervieram pessoalmente, incluindo a primeira Ré e seu marido, então ainda vivo, estando os
ora Autores representados por advogado signatário.

15.º

E, na respetiva ata (cfr. documento n.º 1) ficou a constar que “por todos os interessados... foi
declarado que nos autos foi omitida a relação de um bem que faz parte da herança deixada
por óbito de Jorge Dionísio, e que agora pretendem relacionar...”.

16.º

Essa declaração foi motivada por, no momento da conferência, a Joana Dionísio ter
concordado em entregar, para figurar nos bens da herança e ser incluído no inventário, o
referido prédio, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 1111.

17.º

Em despacho (cfr. documento n.º 1), o Ex.mo Juiz ordenou que se descrevesse de seguida,
como verba n.º 2-A, o mesmo bem, o que foi feito, aí se identificando o prédio pelo modo
constante do antecedente art. 10.º deste articulado.

18.º

Os prédios referidos foram, logo, na conferência de interessados, adjudicados por


unanimidade, do modo seguinte:

- o prédio inscrito na matriz rústica sob o artigo 0000 foi adjudicado à Ré e seu falecido
marido, a quem também foi reconhecida a propriedade da casa relacionada como benfeitoria

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e que já estava implantada no terreno;

- o prédio inscrito na matriz rústica sob o artigo 1111 foi adjudicado ao ora Autor.

19.º

É de notar que, embora na ata de conferência de interessados e no mapa de partilha conste


que esses prédios foram adjudicados à primeira Ré e marido, e ao Autor e mulher, estes (o
marido da primeira Ré e a mulher do Autor), porque casados em regime de comunhão de
adquiridos, como consta das declarações de cabeça de casal (cfr. documento n.º 1) não
ficaram a ser proprietários, por a isso obstar tal regime.

20.º

Elaborado o mapa de partilha, que não sofreu reclamações, veio a ser proferida em 15 de
setembro de 2000 a respetiva sentença homologatória, transitada em julgado em 18 de
dezembro de 2000 (cfr. documento n.º 1).

21.º

Assim, o prédio do Autor pertence-lhe por força de sentença homologatória de partilha


judicial, esta acordada por unanimidade, em conferência de interessados em processo de
inventário em que foram partes quer o Autor quer a primeira Ré, e o marido dela, e em que
estes intervieram pessoalmente.

22.º

Acresce que, por si e seus antepossuidores, designadamente por sua mãe e por seu pai e os
pais deste, o Autor está na posse do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 1111,
em nome próprio, direta e imediatamente, há mais de 20 e 30 anos, ininterruptamente, com
exclusão de quaisquer outras pessoas, à vista e com o conhecimento de toda a gente da zona e
dos próprios Réus, sem oposição de ninguém, com a convicção de exercer direito próprio e de
a ninguém causar prejuízo, traduzindo-se os atos de posse em se ocuparem da terra,
cuidarem-na, zelarem-na, demarcarem-na, defenderem-na, inclusive dos atos de agressão da
primeira Ré e de seu falecido marido, cultivarem-na, colhendo os frutos e fazendo-os seus,
optando alguns anos por mantê-la em pousio, para repouso, e pagando os respetivos
impostos.

23.º

Era suposto, ao entregar a Joana Dionísio à herança o prédio de que formalmente era
proprietária para ser incluído na descrição de bens do inventário e ao ser o mesmo adjudicado
ao Autor, na conferência de interessados por unanimidade de todos os intervenientes nela,
incluindo a primeira Ré e seu falecido marido, que estes abririam mão de quaisquer
pretensões sobre o prédio e o entregariam ao Autor, pelo menos após o trânsito em julgado
da sentença homologatória da partilha.

24.º

E foi nessa suposição que o Ex.mo Juiz da ação sumária n.º 1/96 que a Joana movia contra a

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ora primeira Ré e seu marido, declarou extinta a instância por inutilidade superveniente da
lide.

25.º

Só que inexplicavelmente tal não aconteceu, antes a primeira Ré e o seu falecido marido
mantiveram as atitudes que adiante se descrevem.

26.º

A não reagir contra a situação, o ora Autor ficará sem quaisquer bens da herança de seu pai,
pois nenhum outro bem lhe foi adjudicado.

27.º

Ao passo que a primeira Ré e seu falecido marido ficariam injustamente enriquecidos à custa
do Autor, pois receberam o terreno do artigo rústico 0000 (no qual já tinham a casa) e
acabariam por ficar com o prédio adjudicado ao Autor, o artigo 1111, objeto da presente ação.

28.º

O prédio do Autor, como se disse no art. 9.º desta petição, situa-se a norte do terreno da
primeira Ré e da casa dela e da herança do seu falecido marido.

29.º

Mas tem a “desgraça” de a norte dele se situar outro prédio da primeira Ré e dessa herança.

30.º

Esse outro prédio acha-se inscrito na matriz rústica como terreno de sequeiro com 13 oliveiras,
sito em L., freguesia e concelho de A., com a área de 1280 m2, a confrontar do norte e
nascente com caminho, sul com Miguel Dionísio e poente com Miguel Loureiro, inscrito na
matriz predial rústica sob o artigo 2222.

31.º

Portanto, no local, um observador que esteja na estrada asfaltada a nascente dos prédios (a
rua do Lameiro), e virado para poente, para os mesmos prédios, tem sucessivamente da sua
esquerda para a sua direita (e de sul para norte):

- primeiro, o terreno do artigo rústico 0000, com a casa do artigo 3333 implantada no
mesmo;

- segundo, o prédio do artigo 1111;

- terceiro, o prédio rústico da primeira Ré e da herança do seu falecido marido, artigo


rústico 2222.

32.º

O primeiro e segundo prédios acabados de referir desenvolvem-se de poente a nascente,

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desde um caminho público a poente até à estrada asfaltada (rua do Lameiro), a nascente, com
dimensões sensivelmente iguais, sendo as suas linhas ou de divisão constituídas por retas
paralelas, tudo como consta do levantamento topográfico (documento n.º 3).

33.º

Aliás, de acordo com o levantamento topográfico, ambos têm a mesma área: 1283 m2, que é a
área que consta da descrição predial do prédio do Autor (documento n.º 4).

34.º

Aliás, resultam ambos da divisão em dois prédios iguais de um prédio anterior que foi
partilhado entre dois irmãos.

35.º

Mais propriamente, o prédio do artigo rústico n.º 1111 (do Autor) estende-se do caminho
público a poente, por onde mede cerca de 13,20 m2, até à estrada asfaltada (a rua do Lameiro)
a nascente, por onde mede cerca de 16,50 metros, sendo que a sua confrontação sul, por onde
mede cerca de 95,02 m2, se faz com o terreno e casa da Ré e da herança de seu marido (artigo
rústico 0000.º e artigo urbano 3333), fazendo-se a sua confrontação norte, por onde mede
cerca de 86,30 metros, com o outro prédio da primeira Ré e da herança de seu marido (o do
art. 2222.º) e com um prédio de terceiros.

36.º

As estremas norte e sul são sensivelmente paralelas uma à outra e a estrema poente é-lhes
perpendicular, como aliás se alcança do levantamento.

37.º

A estrema nascente faz-se em linha reta, ao longo da estrada asfaltada (rua do Lameiro), que
obriga a mesma estrema a fazer-se em diagonal, como no levantamento se vê.

38.º

Procurando fazer-se valer da circunstância de serem donos do terreno com o artigo rústico
0000 e da casa do artigo 3333, situados a sul do prédio do Autor, e donos do prédio rústico
com o artigo matricial 2222, situado a norte do prédio do Autor, a primeira Ré e a herança de
seu falecido marido, cujos titulares são os três Réus, vêm tentando apoderar-se dele, uma vez
que fica entalado entre aqueles dois, impedindo de o usar e fruir plenamente.

Assim,

39.º

No topo poente do prédio dos Autores, construíram um barracão em tijolo, que se vê no


levantamento topográfico (documento n.º 3).

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40.º

Os pais do Autor, anteriores proprietários do prédio atualmente dele, e o próprio Autor, não
contrataram a ninguém a constituição do direito de superfície, nem nunca deram à primeira Ré
e seu falecido marido, nem aos Réus, autorização para construção do barracão.

41.º

Além disso, os Réus utilizam o prédio do Autor para, junto do barracão acima referido, fazerem
depósito de variados materiais, tais como mato, estrume, lixos, lenhas, madeiras, materiais de
construção, plásticos e mangueiras.

42.º

Apesar das várias advertências feitas à primeira Ré e seu falecido marido, e aos Réus, estes
nunca se dispuseram a retirar o barracão e os materiais supra referidos, construído e
depositados no prédio do Autor.

43.º

Ao agir da forma descrita, os Réus atuaram livre, consciente e deliberadamente, bem sabendo
que atingiam os direitos do Autor, procurando diretamente lesá-los, o que estão a conseguir.

Nos termos expostos, e nos mais de direito aplicável, designadamente nos do art.
1311.º do Código Civil, devem os Réus, por si e nas qualidades atrás invocadas, ser
condenados:

a) a reconhecer e a ter de acatar que o Autor é dono e legítimo possuidor do


prédio rústico de sequeiro identificado no art. 10.º desta petição inicial;

b) a restituir ao Autor tal prédio;

c) a demolir o barracão mencionado no art. 39.º deste articulado;

d) a reconhecer que o prédio do Autor não está sujeito a depósito de


quaisquer materiais, sendo condenados a retirar dele todos e quaisquer
materiais que têm lá depositado, nomeadamente os referidos no art. 41.º
deste articulado, deixando o solo limpo;

e) a abster-se em geral da prática de quaisquer atos que possam impedir ou


dificultar ou perturbar o pacífico, cómodo e pleno uso, fruição e disposição
por parte do Autor do prédio rústico identificado no art. 10.º desta petição
inicial.

Prova:

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Documentos: os agora juntos aos autos.

Testemunhas:

1. Maria...
2. José...
3. António...
4. Manuel...

Valor: € 50.001,00 (cinquenta mil e um euros).

Junta: quatro documentos, procuração e comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial.

O Advogado

Assinatura

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Documento n.º 1

Tribunal Judicial da Comarca de ...

Certidão

Manuela..., Escrivã-Adjunta do Tribunal acima identificado:

Certifica que neste Tribunal e Juízo correram termos uns autos de Inventário (Herança) n.º
8/1995, em que são Inventariado Jorge Dionísio e cabeça-de-casal Joana Dionísio.

Mais certifica que as fotocópias juntas e que fazem parte integrante desta certidão estão
conforme os originais constantes dos autos, pelo que vão autenticadas com o selo branco em uso
nesta Secretaria.

Certifica-se ainda que a sentença transitou em julgado em 18.12.2000.

É quanto me cumpre certificar em face do que dos autos consta e aos quais me reporto, em caso
de dúvida.

A presente foi solicitada pelo interessado José Dionísio.

A presente certidão vai por mim assinada e autenticada.

Data e assinatura

O Oficial de Justiça

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Tribunal Judicial da Comarca de...

Declarações de cabeça de casal

Aos vinte e sete dias do mês de Fevereiro de mil novecentos e noventa e cinco, no Tribunal
Judicial de..., onde se encontrava presente o Ex.mo Juiz de Direito Dr. ..., comigo escrivão
adjunto, sendo a hora marcada no competente despacho, ordenou o referido Magistrado que
interpelasse a pessoa indicada para desempenhar o encargo de cabeça de casal, nos presentes
autos de inventário facultativo n.º 8/95, a que se procede por óbito de Jorge Dionísio, residente
que foi em..., o que cumpri, verificando estar presente a cabeça-de-casal Joana Dionísio,
residente em ....

Depois de ter prestado pessoalmente o juramento de bem desempenhar as suas funções, o


Ex.mo Sr. Juiz passou a tomar-lhe as declarações exigidas nas alíneas do n.º 3 do art. 1327.º do
CPC, que ela prestou da seguinte maneira:

“Que o inventariado Jorge Dionísio faleceu no lugar de sua residência sita em ..., em ../../1986,
no estado de casado em comunhão geral de bens com a declarante, em primeiras e únicas
núpcias de ambos, sem ter deixado testamentos, doações ou qualquer outra disposição de última
vontade, deixando a suceder-lhes os seguintes herdeiros:

Cabeça-de-casal

Joana Dionísio, a declarante, viúva, residente em....

Filhos

Primeiro

Elisa Dionísio, casada em comunhão de adquiridos com Mário Santos, residentes em...;

Segundo

José Dionísio, casado em comunhão de adquiridos com Maria Dionísio, residentes em....

Não há dívidas passivas nem activas e os bens a partilhar são constituídos por bens imóveis
situados na área desta comarca.

Que não apresenta neste acto a relação de bens, e respectiva certidão devido a dificuldades na
sua obtenção nas respectivas repartições públicas, requerendo a relevação da falta e um prazo
não inferior a trinta dias para a junção dos referidos documentos”.

Finalmente, o Ex.mo Sr. Juiz deferiu ao requerido, relevando a falta.

Para constar se lavrou a presente acta que lida e achada conforme vai ser devidamente assinada.

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Assinatura do Juiz

Assinatura do Funcionário

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Tribunal Judicial da Comarca de...

Descrição de bens

Aos trinta dias do mês de Setembro de mil novecentos e noventa e sete, neste Tribunal Judicial,
à vista da relação de bens, passo a fazer a descrição dos mesmos nestes Autos de inventário
facultativo n.º 8/95, por óbito de Jorge Dionísio, residente que foi em..., em que exerce funções
de cabeça-de-casal Joana Dionísio, residente em ....

Bens Imóveis

Verba n.º 1

Terreno de sequeiro, com a área de 960 m2, sito em L..., freguesia e concelho de A..., a
confrontar do norte com Eva Santos, sul com Alberto Santos, nascente com caminho e poente
com caminho, omisso na Conservatória do Registo Predial, e inscrito na matriz rústica sob o art.
0000, com o valor patrimonial de mil trezentos escudos..........1.300$00

Verba n.º 2

Terra de..., com o valor patrimonial de dois mil escudos.....................................2.000$00

Verba n.º 2-A (aditada conforme despacho de fls.___)

Terra de sequeiro sita em L., freguesia e concelho de A., com a área de 1283 m2, a confrontar
do norte com João Loureiro e outro, do sul com Jorge Dionísio, do nascente com caminho e
poente caminho, inscrito na matriz predial sob o artigo 1111, com o valor patrimonial de mil
trezentos escudos..........................................................1.300$00

Total dos bens descritos........................................................................................4.600$00

Dívidas passivas

Verba n.º 3 (eliminada conforme despacho de fls.__).

Deve a herança à interessada Elisa Dionísio o valor de um prédio urbano que esta construiu sob
o prédio descrito na verba n.º 1 (artigo rústico 0000), composto por casa de habitação de rés-do-
chão com quatro assoalhadas, cozinha, casa de banho, corredor, varanda, com logradouro, sito
em Rua do Lameiro, com a superfície coberta de 96 m2, logradouro de 200 m2, a confrontar do
norte com caminho público, sul com Alberto Santos, nascente com caminho público e poente
com Miguel Isidro, omissa na Conservatória do Registo Predial e inscrita na matriz predial
urbana sob o artigo 3333, e com o valor de quinhentos mil
escudos............................................................500.000$00

E por nada mais haver a descrever, encerro esta descrição.

Assinatura

O Oficial de Justiça,

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Tribunal Judicial da Comarca de...

Acta de Conferência de Interessados

Autos de inventário facultativo n.º 8/95

Data: 20 de Janeiro de 2000

Magistrado Judicial: ...

Mandatários: ...

Escrivão-Adjunto: ...

Presentes: todas as pessoas para este acto convocadas.

Iniciada a conferência, o Ex.mo Sr. Juiz expôs os motivos da convocação, passando-se de


seguida à realização da conferência, que deu o seguinte resultado:

Por unanimidade de todos os interessados, foi requerido que a verba n.º 3 fosse eliminada da
descrição, tendo o Mmo Juiz deferido ao requerido.

Por todos os interessados foi ainda declarado nos autos que foi omitida a relação de um bem que
faz parte da herança aberta por óbito de Jorge Dionísio, e que agora pretendem relacionar. Estão
de acordo quanto à partilha, pelo que prescindem de todos os prazos relativamente ao bem
relacionado agora adicionalmente, fazendo-o da seguinte forma:

“Verba n.º 2-A

Terra de sequeiro sita em L., freguesia e concelho de A., com a área de 1283 m2, a confrontar
do norte com João Loureiro e outro, do sul com Jorge Dionísio, do nascente com caminho e
poente caminho, inscrito na matriz predial sob o artigo 1111, com o valor patrimonial de mil
trezentos escudos.......................................................1.300$00”.

Mais acordam preencherem os respectivos quinhões da forma seguinte:

À cabeça-de-casal é adjudicada a verba n.º 2 pelo valor da descrição.

À interessada Elisa Dionísio é adjudicada a verba n.º 1, pelo valor constante da descrição.

Ao interessado José Dionísio é adjudicada a verba n.º 2-A, pelo valor constante da descrição.

Por todos os interessados foi declarado prescindir do depósito de tornas, por já as terem

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recebido em mão.

Seguidamente, pelo Mmo Juiz foi proferido o seguinte

Despacho

Admito a relação de bens adicional, ordenando a descrição da verba n.º 2-A.

Deferindo ao requerido por unanimidade, elimine-se a verba n.º 3.

Cumpra-se o disposto no art. 1373.º do CPC.

Nesta altura, foram todos os presentes notificados nos termos e para os efeitos do art. 1373.º do
CPC, os quais declararam ficar bem cientes.

Para constar se lavrou a presente acta, que vai ser devidamente assinada.

Assinatura do Juiz

Assinatura do Funcionário

Página 17 de 48
Conclusão: Em 15/09/2000

Nos presentes autos de inventário instaurados por óbito de Jorge Dionísio, em que
desempenha as funções de cabeça-de-casal Joana Dionísio, homologo por sentença a partilha
constante de fls. ___ destes autos.

Custas pelos interessados.

Registe e notifique.

d.s.

Assinatura

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Documento n.º 2

Tribunal Judicial da Comarca de ...

Certidão

Ana..., Escrivã-Adjunta do Tribunal acima identificado:

Certifica que neste Tribunal e Juízo correram termos uns autos de Inventário (Herança) n.º
8/1995, em que são Inventariado Jorge Dionísio e cabeça-de-casal Joana Dionísio.

Mais certifica que a certidão por fotocópia, constituída por uma folha, está conforme o original
de fls. ___.

É quanto me cumpre certificar em face do que dos autos consta e aos quais me reporto, em caso
de dúvida.

A presente foi solicitada pelo interessado José Dionísio.

A presente certidão vai por mim assinada e autenticada.

Data e assinatura

O Oficial de Justiça

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Relação de bens que ficaram por óbito de Jorge
Dionísio, residente que foi em..., e que apresenta a
cabeça-de casal Joana Dionísio, residente em...

Activo

Bens Imóveis

Verba n.º 1

Terreno de sequeiro, com a área de 960 m2, sito em L..., freguesia e concelho de A..., a
confrontar do norte com Eva Santos, sul com Alberto Santos, nascente com caminho e poente
com caminho, omisso na Conservatória do Registo Predial, e inscrito na matriz rústica sob o art.
0000, com o valor patrimonial de mil trezentos escudos..........1.300$00

Verba n.º 2

Terra de..., com o valor patrimonial de dois mil escudos.....................................2.000$00

Passivo

Benfeitorias

Verba n.º 3

Deve a herança à interessada Elisa Dionísio o valor de um prédio urbano que esta construiu sob
o prédio descrito na verba n.º 1 (artigo rústico 0000), composto por casa de habitação de rés-do-
chão com quatro assoalhadas, cozinha, casa de banho, corredor, varanda, com logradouro, sito
em Rua do Lameiro, com a superfície coberta de 96 m2, logradouro de 200 m2, a confrontar do
norte com caminho público, sul com Alberto Santos, nascente com caminho público e poente
com Miguel Isidro, omissa na Conservatória do Registo Predial e inscrita na matriz predial
urbana sob o artigo 3333, e com o valor de quinhentos mil
escudos............................................................500.000$00

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Documento n.º 3 – Levantamento topográfico

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Documento n.º 4

Conservatória do Registo Predial de ...

Certidão

Certifico que a fotocópia apensa a esta certidão foi conferida e está conforme o original, tendo
sido extraída da descrição n.º 4444/A e dos registos em vigor sobre a mesma – Ap. 15 de
1996/01/18.

Data e assinatura

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Conservatória do Registo Predial de ... Freguesia de A.....

4444/960118

DESCRIÇÕES – AVERBAMENTOS – ANOTAÇÕES

RÚSTICO

SITUADO EM L...

ÁREA TOTAL: 1283 M2

VALOR TRIBUTÁVEL: 7,54 euros

MATRIZ Nr. 1111

COMPOSIÇÃO E CONFRONTAÇÕES

Terra de sequeiro – Norte, João Loureiro e outro; Sul, Jorge Dionísio; Nascente e Poente,
caminho.

O Conservador

...

INSCRIÇÕES – AVERBAMENTOS – ANOTAÇÕES

G19960118015 – AP. 15 de 1996/01/18 – AQUISIÇÃO

CAUSA: Usucapião

SUJEITO(S) ACTIVO(S)

**Joana Dionísio, viúva

Morada: ...

O Conservador

----------------------------------------------------------------------------------------------------------

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CONTESTAÇÃO

Ação comum n.º __/__

Contestando e reconvindo nos autos à margem


identificados, dizem os Réus Elisa Dionísio,
António Santos e João Santos

1.º

Embora irrelevantes para o desfecho da causa, impõe-se precisar os seguintes aspectos a que
os Autores aludem no seu articulado para enquadrarem os factos que constituem a causa de
pedir.

2.º

Não se percebe o que pretendem com as afirmações constantes dos arts. 8.º e 9.º, já que
tanto quanto se depreende do seu articulado, designadamente do art. 3.º, o imóvel aí referido
confronta do norte com Eva Santos, e não com qualquer caminho ou estrada.

3.º

Também não se percebe qual a responsabilidade da Ré Elisa Dionísio na definição das


confrontações do referido imóvel, ou o interesse para a causa dessa questão.

4.º

Quanto aos arts. 11.º, 12.º, 13.º e 24.º da petição inicial, deve salientar-se que a Joana Dionísio
não podia ter outorgado a escritura de justificação notarial aí mencionada, pela simples razão
de não ter “corpus” nem “animus” para o fazer.

5.º

Daí que não tivesse legitimidade para intentar a ação declarativa que se identifica e tivesse
que reconhecer, como ressalta da ata da conferência de interessados realizada no processo n.º
8/95, ter sido “omitida a relação de um bem que faz parte da herança deixada por óbito de
Jorge Dionísio”, e que veio a ser adicionalmente relacionado como sendo a verba n.º 2-A.

6.º

A sua inclusão entre os bens a partilhar não resultou, pois, de gesto magnânimo da Joana
Dionísio, mas uma imposição determinada pela própria natureza das coisas.

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7.º

No processo de inventário atrás referido, e contrariamente ao afirmado no art. 18.º da petição


inicial, não foi reconhecida à Ré e seu falecido marido a propriedade da casa aí relacionada
como benfeitoria, mas como da ata resulta, simplesmente eliminada a verba correspondente,
a benfeitoria relacionada sob a verba n.º 3.

8.º

Cingindo-nos agora à matéria de facto que tem efetiva correspondência com os pedidos
formulados, analisa-se cada um deles separadamente.

9.º

É incontroverso que no processo de inventário a que se vem fazendo referência foi adjudicado
ao Autor o prédio inscrito na matriz sob o artigo 1111.

10.º

Mas se é inegável ter sido transmitido ao Autor o direito de propriedade sobre esse bem, ele
não é nem nunca foi seu possuidor, pois não foi investido ou entrou na sua posse, sendo falso
o que se alega no art. 22.º da petição inicial.

11.º

Com efeito, quem há mais de 28 anos amanha esse prédio é a Ré Elisa Dionísio, primeiro em
conjunto com o seu falecido marido, e agora com a ajuda dos restantes Réus, nele plantando
cereais, sem qualquer interrupção.

12.º

Contudo, esses atos materiais de posse não foram acompanhados por qualquer intenção
possessória.

13.º

Com efeito, todos sempre consideraram que os imóveis em questão – os artigos 0000 e 1111 –
pertenciam aos pais da Ré Elisa Dionísio, e passaram a fazer parte da herança de Jorge
Dionísio, depois da sua morte.

14.º

Se, depois de realizada a conferência de interessados, os Réus permaneceram na posse do


prédio correspondente ao artigo 1111, tal ficou a dever-se a razões que a seguir se explicarão e
que nada têm a ver com qualquer intenção de aquisição originária do respetivo direito de
propriedade.

15.º

Relativamente à configuração e localização dos dois terrenos, aceita-se o alegado nos arts.
28.º, 29.º, 30.º, 31.º, 33.º, 34.º e 37.º.

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16.º

E também o que consta do art. 32.º, com exceção da afirmação de serem as “suas linhas de
estrema ou de divisão constituídas por retas paralelas”.

17.º

Quanto ao artigo 36.º, é igualmente verdade que, até certo ponto, as estremas norte e sul
sejam paralelas entre si e que a estrema poente lhes seja perpendicular.

18.º

Não se aceita, porém, o que consta do art. 35.º, impugnando-se as medidas aí referidas e o
levantamento topográfico que é junto.

19.º

Efetivamente, os dois imóveis têm rigorosamente a mesma área, sendo esta a de 1.258,25 m2
para cada um deles.

20.º

A estrema norte do imóvel dos Autores, contrariamente ao que sustentam, não é definida por
uma linha reta entre dois pontos, mas por dois segmentos de reta, unindo três pontos.

21.º

De facto, sensivelmente a meio da propriedade e demarcando a sua estrema norte, está


implantado um marco, que se situa entre marcos cravados junto à rua da Mó e à rua do
Lameiro, ou seja, entre os seus topos poente e nascente – documento n.º 1.

22.º

O marco que se situa junto à rua do Lameiro está colocado mais para sul do que aquele que se
encontra junto à rua da Mó.

23.º

Daí que a partir do marco colocado a meio da propriedade, a linha divisória inflita ligeiramente
para sul.

24.º

Resta, nesta fase, explicar a razão pela qual os Réus se mantêm, não obstante a partilha, na
posse do imóvel que foi adjudicado ao Autor.

25.º

É que essa partilha foi feita no pressuposto de ser dada nova configuração aos terrenos
correspondente aos artigos 0000 e 1111.

26.º

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Uma vez que os Réus tinham construído a sua casa de habitação e respetivos anexos no que
era o artigo 0000, junto à rua do Lameiro, e tinham construído um barracão em terrenos que
faziam parte do artigo 1111, ficou combinado entre todos que aos Réus seria adjudicado o
artigo 0000, que passaria a ocupar toda a frente para a rua do Lameiro, enquanto o artigo
1111 ocuparia toda a frente que dava para a rua da Mó, com exceção da parte ocupada pelo
barracão.

27.º

Ou seja, em vez de sensivelmente paralelos entre si e ligando duas ruas, cada um dos imóveis
ficaria com frente para a via pública, passando a confrontar entre si ao longo dos quadrantes
nascente/poente, nas traseiras dos anexos da habitação dos Réus – documento n.º 2.

28.º

Além desse entendimento, de que resultariam para ambas as partes áreas de terreno iguais, os
Autores negociaram com o falecido marido da Ré a cedência da área que passariam a dispor na
traseira do barracão, para permitir o acesso direto a este daquela que passaria a ser a sua
propriedade, chegando a receber a quantia de 50.000$00 (cinquenta mil escudos) à data, por
conta desse negócio, e que nunca devolveram aos Réus.

29.º

Esse acordo nunca chegou a ser formalizado nem lhe foi dada execução, mantendo-se os Réus
até agora, como vêm fazendo desde 1976, na posse de todo o conjunto predial formado pelos
imóveis correspondentes às inscrições matriciais supra referidas, incluindo o que veio a ser
adjudicado aos Autores.

30.º

Prosseguindo agora na apreciação dos pedidos formulados.

31.º

Relacionando-se com o reconhecimento do direito de propriedade, que não está em causa, e


com a restituição do prédio, que também não se questiona, está o reconhecimento de que tal
imóvel não está sujeito a depósito de materiais.

32.º

Obviamente que os Réus também assim consideram, e dele retirarão tudo o que nele está
depositado.

33.º

Pretende-se também que os Réus procedam à demolição de um barracão.

34.º

Esse barracão foi construído, em 1976, pela Ré e seu falecido marido no prédio rústico inscrito
sob o artigo 1111, cujo direito de propriedade veio a ser adjudicado ao Autor em vida dos

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então proprietários do terreno.

35.º

Estes autorizaram essa construção e foram eles próprios quem indicou o local onde devia ser
efetuada.

36.º

Esta obra, construída em terreno alheio, é suscetível de possibilitar ao Réu a aquisição do


terreno onde foi feita, de harmonia com as regras estabelecidas no art. 1340.º do Código Civil,
pretensão que se deduzirá em reconvenção.

EM RECONVENÇÃO:

37.º

Em 1976, a Ré Elisa Dionísio e seu marido Mário Santos construíram um barracão em tijolo,
coberto a telha, assente em vigas de pré-esforçado, com o piso acimentado e com fossas
sépticas no seu interior, com a superfície coberta de 184 m2.

38.º

Essa obra foi construída no prédio rústico sito em L, freguesia e concelho de A, inscrito na
matriz predial rústica sob o art. 1111, que era então propriedade de Jorge Dionísio e de Joana
Dionísio, pais da Ré.

39.º

Em inventário facultativo a que se procedeu por óbito de Jorge Dionísio, com o n.º 8/95, já
referido nos autos, esse imóvel foi adjudicado ao Autor, tendo a sentença que homologou a
partilha sido proferida em 15 de setembro de 2000.

40.º

Enquanto proprietários do referido imóvel, Jorge Dionísio e Joana Dionísio autorizaram a filha,
primeira ré, a nele edificar o referido barracão.

41.º

A área de terreno afeta ao barracão tem o comprimento de 23 metros, por 14 metros de


largura, formando um retângulo com a área de 322 m2.

42.º

Considerando a época da construção, o valor que a edificação do barracão trouxe ao prédio


rústico onde foi construído foi maior do que o valor que este tinha antes dessa obra.

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43.º

Na verdade, a parcela ocupada por tal obra tinha, à data da incorporação, um valor não
superior a 80,00 euros.

44.º

Na construção do barracão, a primeira Ré e o seu falecido marido despenderam a quantia de


10.000,00 euros.

45.º

O art. 1340.º do Código Civil atribui ao autor da construção em prédio alheio o direito
potestativo de adquirir o direito de propriedade do terreno onde a incorporação for feita, se
tiver agido de boa fé, e o valor que as obras tiverem trazido à totalidade do imóvel for maior
do que o valor que este tinha antes.

46.º

Por boa fé entende-se o desconhecimento, por parte do autor da obra, que o terreno era
alheio, ou se o seu dono autorizou a incorporação.

47.º

No caso relatado, estão verificados os dois pressupostos enunciados.

48.º

A obra efetuada pela primeira Ré e seu falecido marido, em prédio alheio, trouxe à parcela do
imóvel em que foi feita um valor superior ao que antes dela tinha.

49.º

Por outro lado, os donos do terreno autorizaram a incorporação que nele foi feita.

50.º

Os Réus ficaram assim com a prerrogativa de adquirir o direito de propriedade da parcela do


prédio rústico afeta à construção que nele foi feita, pagando aos Autores o valor que ela tinha
antes da obra.

Termos em que devem os pedidos formulados pelos Autores,


nas partes não confessadas, serem julgados improcedentes e
procedente, por provada, a reconvenção deduzida e, em
consequência:

a) Se declarar realizada a aquisição, por acessão industrial


imobiliária, por parte dos Réus/Reconvintes, em comum e

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sem determinação de parte ou de direito, e enquanto
interessados na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito
de Mário Santos, da parcela de terreno com a área de 322
m2, que faz parte do prédio rústico sito em L, freguesia e
concelho de A., inscrito na respetiva matriz sob o artigo
1111 e descrito na Conservatória do Registo Predial de ...
sob o n.º 4444/A, parcela essa que se situa junto ao limite
norte/poente do referido imóvel e que tem 23 metros de
comprimento, a contar do limite poente da propriedade,
por 14 metros de largura, a contar da sua estrema norte, e
sobre a qual se acha construído um barracão, integrado na
referida herança, mediante o pagamento de 80,00
(oitenta) euros, valor que o terreno onde a obra em causa
foi feita tinha antes da incorporação.

Valor da Reconvenção: € 80,00 (oitenta euros).

Prova:

Documental: os documentos ora juntos.

Testemunhas:

1. Abílio...
2. Zacarias...
3. Ermelinda...

Junta: dois documentos, procuração e comprovativo do pagamento da taxa de justiça inicial.

O Advogado

Assinatura

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Documento n.º 1

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Documento n.º 2

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RÉPLICA

TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE...

RÉPLICA DE JOSÉ DIONÍSIO E MARIA


DIONÍSIO na ação que movem contra ELISA
DIONÍSIO E FILHOS

Ex.mo Sr. Juiz de Direito

1.º

Reafirma-se tudo o alegado na petição inicial.

2.º

Impugna-se o que em contrário da petição inicial consta da contestação-reconvenção.

3.º

Reafirma-se que o terreno inscrito no artigo 0000 confronta de norte com Eva Santos, mas o
que consta da matriz (confrontação de norte com caminho público) é errado.

4.º

A contestação e respetivas exceções não têm pertinência, pois o imóvel objeto da presente
ação foi pura e simplesmente adjudicado ao Autor, em inventário, onde estiveram todos os
interessados presentes, incluindo a Ré e seu falecido marido, tendo os mesmos aderido, sem
qualquer reserva, condição ou restrição, ao que foi deliberado por unanimidade na
conferência:

- a adjudicação do imóvel inscrito no artigo 1111 ao Autor;

- a adjudicação do imóvel inscrito no artigo 0000 à Ré, tendo-lhe sido reconhecida a


ela, e ao seu falecido marido, a propriedade da casa relacionada como benfeitoria e já
implantada no terreno.

5.º

No inventário não foram levantados, nomeadamente pela Ré e seu falecido marido, quaisquer
problemas de posse ou acessão, nem opostos limites, restrições, ónus ou encargos à
propriedade do Autor.

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6.º

Aliás, todos os atos praticados pela Ré e seu falecido marido no prédio inscrito no art. 1111.º
foram-no sem consentimento e contra a vontade dos pais do Autor e da Ré, exercida com
violência contra eles, a ponto de os intimarem a não entrar no local, levando-os a coibirem-se
de lá ir com medo que a Ré e marido lhes fizessem mal.

7.º

É falso que o barracão tenha sido construído em 1976, tendo-o sido muito mais tarde, sendo
ainda falso que tenha sido autorizada tal construção pelos então proprietários do terreno, os
pais do Autor e da Ré.

8.º

Ao invés, tal barracão foi construído sem autorização dos mesmos, sabendo a Ré e falecido
marido que agiam contra a vontade dos pais de Autor e Ré.

9.º

Impugna-se, por desconhecimento, as medidas do barracão e áreas adjacentes, bem como os


valores do terreno e de construção alegados pelos Réus.

10.º

Não há assim lugar ao fenómeno da acessão industrial imobiliária, o qual pressupõe a boa fé.

11.º

Aliás, tendo as obras sido feitas de má fé, como o foram, tem o dono do terreno direito de
exigir, como se exige no final, que sejam desfeitas e que o terreno seja restituído ao seu
primitivo estado, à custa do autor delas – art. 1341.º do Código Civil.

12.º

É manifesto, por todo o exposto, que a violência da Ré e do seu falecido marido, agora da Ré e
dos restantes Réus, contra os seus pais e sogros, veio sempre desde o início e mantém-se
ainda atualmente contra os Autores.

13.º

A tudo acresce que nunca poderia proceder a pretensão de aquisição por acessão da parcela
de terreno pretendida pelos Réus, por violar o disposto no art. 1376.º do Código Civil (cfr.
ainda o art. 1379.º do Código Civil).

14.º

Por todo o exposto, importa concluir que a reconvenção não pode também por este motivo
proceder.

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Termos em que devem:

- as exceções ser julgadas improcedentes, delas se


absolvendo os Autores e condenando-se os Réus a entregar
de imediato o imóvel ao Autor;

- a reconvenção ser julgada improcedente, por não


provada, dela se absolvendo os Autores, com as legais
consequências.

Quanto ao mais, termina-se como na petição inicial.

O Advogado

Assinatura

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REQUERIMENTO

AC. COMUM NR. __/__

Ex.mo Sr. Juiz de Direito

José Dionísio e Maria Dionísio, Autores na ação acima referenciada, vêm requerer a junção
aos autos do despacho proferido pelo Ex.mo Sr. Conservador da Conservatória de Registo
Predial competente, em como não é necessário o registo da presente ação – pois não estão
sujeitas a registo as ações de reivindicação intentadas pelo titular inscrito nem aquelas em que
se pede a declaração de inexistência de direitos –, requerendo-se assim o prosseguimento dos
autos.

Junta: 1 documento.

O Advogado

Assinatura

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Documento n.º 1

Conservatória do Registo Predial de ...

Ex.mo Sr. Dr______,

Notificação de despacho

Nos termos do art. 71.º do Código do Registo Predial, fica V. Ex.ª notificado de que,
relativamente aos documentos apresentados nesta Conservatória em __/__/__, sob Ap. n.º 29
recaiu o seguinte despacho conforme cópia que se junta.

Data e assinatura do Conservador

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Conservatória do Registo Predial de ...

ATOS DE REGISTO/DOCUMENTOS

Registo da ação comum n.º ___/__, do __ Juízo ____ do Tribunal Judicial de ___, movida por
José Dionísio e Maria Dionísio contra Elisa Dionísio, António Santos e João Santos.

Prédio: 4444/A.

Documentos:

a) Petição inicial apresentada no Tribunal Judicial de ___ em __/__/__;

DESPACHO

Recusado o ato requerido por não estar sujeito a registo as ações de reivindicação
intentadas pelo titular inscrito nem aquelas em que se pede a declaração de inexistência de
direitos – cfr. art. 69.º, n.º 1, al. c), conjugado com os arts. 1.º, 3.º, 5.º e 6.º, todos do Código do
Registo Predial.

Data e assinatura

O Conservador do Registo Predial

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Conservatória do Registo Predial de ... Freguesia de A.....

4444/19960118

DESCRIÇÕES – AVERBAMENTOS – ANOTAÇÕES

RÚSTICO

SITUADO EM L...

ÁREA TOTAL: 1283 M2

VALOR TRIBUTÁVEL: 7,54 euros

MATRIZ Nr. 1111

COMPOSIÇÃO E CONFRONTAÇÕES

Terra de sequeiro – Norte, João Loureiro e outro; Sul, Jorge Dionísio; Nascente e Poente,
caminho.

O Conservador

...

INSCRIÇÕES – AVERBAMENTOS – ANOTAÇÕES

G19960118015 – Ap. 55 de 2003/04/22 – AQUISIÇÃO

CAUSA: Sucessão

SUJEITO(S) ACTIVO(S)

**José Dionísio, casado com Maria Dionísio na comunhão de adquiridos

Morada: ...

O Conservador

...

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----------------------------------------------------------------------------------------------------------

Anotação: Ap. 29 de ___/___/___ - RECUSA

OUTRAS MENÇÕES DA ANOTAÇÃO:

Recusado o registo da ação.

O Conservador

...

----------------------------------------------------------------------------------------------------------

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REQUERIMENTO

AC. COMUM NR. __/__

Ex.mo Sr. Juiz de Direito

Elisa Dionísio e outros, Réus na ação acima referenciada, vêm requerer a junção aos autos de
certidão emitida pela Conservatória de Registo Predial competente comprovativa do registo da
reconvenção.

Junta: 1 documento.

O Advogado

Assinatura

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Documento n.º 1

Conservatória do Registo Predial de ...

Certidão

Certifico que a fotocópia apensa a esta certidão foi conferida e está conforme o original, tendo
sido extraída das descrições n.º 4444/A.

Data e assinatura

Página 42 de 48
Conservatória do Registo Predial de ... Freguesia de A.....

4444/19960118

DESCRIÇÕES – AVERBAMENTOS – ANOTAÇÕES

RÚSTICO

SITUADO EM L...

ÁREA TOTAL: 1283 M2

VALOR TRIBUTÁVEL: 7,54 euros

MATRIZ Nr. 1111

COMPOSIÇÃO E CONFRONTAÇÕES

Terra de sequeiro – Norte, João Loureiro e outro; Sul, Jorge Dionísio; Nascente e Poente,
caminho.

O Conservador

...

INSCRIÇÕES – AVERBAMENTOS – ANOTAÇÕES

G19960118015 – Ap. 55 de 2003/04/22 – AQUISIÇÃO

CAUSA: Sucessão

SUJEITO(S) ACTIVO(S)

**José Dionísio, casado com Maria Dionísio na comunhão de adquiridos

Morada: ...

----------------------------------------------------------------------------------------------------------

F20160322032 – Ap. 32 de 2016/03/22 – AÇÃO

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PROVISÓRIO POR NATUREZA

SUJEITO(S) ATIVO(S):

** Elisa Dionísio, viúva, residente em...

** António Santos, solteiro, residente em...

** João Santos, solteiro, residente em...

SUJEITO(S) PASSIVO(S)

** José Dionísio e Maria Dionísio, casados em comunhão de adquiridos

PEDIDO RECONVENCIONAL: seja declarada a aquisição por acessão industrial imobiliária a


favor dos sujeitos ativos, em comum e sem determinação de parte ou direito, em representação
da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Mário Santos, de uma parcela de terreno com a
área de 322 m2, a desanexar deste prédio, onde está implantado um barracão.

O Conservador

...

----------------------------------------------------------------------------------------------------------

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ATA DE AUDIÊNCIA PRÉVIA

Data: 2 de setembro de 2016, pelas 14.30 horas


Juiz de Direito: ...
Oficial de Justiça: ...
Autores: José Dionísio e Maria Dionísio
Réus: Elisa Dionísio, António Santos e João Santos
Mandatário dos Autores: ...
Mandatário dos Réus: ...

Presentes: Todas as pessoas para o ato convocadas.


*
A presente audiência ficou gravada no sistema integrado de gravação digital disponível na
aplicação informática em uso neste tribunal (artigo 591.º, n.º 4, do Cód. Proc. Civil).
*
Aberta a audiência, pelo Mm.º Juiz foi tentada a conciliação entre as partes, nos termos do
disposto nos artigos 591.º, n.º 1, al. a), e 594.º do Cód. Proc. Civil, o que não foi possível obter,
por as partes terem mantido as posições expressas nos articulados.
*
Seguidamente, o Mm.º Juiz deu a palavra aos Ilustres Mandatários das partes nos termos e
para os efeitos do disposto no artigo 591.º, n.º 1, al. c), do Cód. Proc. Civil, e proferiu, ao abrigo
da al. d) do citado preceito, o seguinte

DESPACHO SANEADOR

Fixo o valor da causa em € 50.081,00 (cinquenta mil e oitenta e um euros).


*
Por ter sido deduzido em tempo, no articulado próprio e respeitar os demais requisitos
substantivos e processuais fixados nos artigos 266.º e 583.º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Proc. Civil,
admito o pedido reconvencional deduzido pelos Réus.
*
O tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
O processo mostra-se isento de nulidades que o invalidem de todo.
As partes são dotadas de personalidade e capacidade judiciárias, estão devidamente
patrocinadas e são legítimas.
Não há outras exceções dilatórias, nulidades processuais nem questões prévias de que
importe conhecer nesta fase.
*
Os autos não permitem ainda uma decisão conscienciosa, pois a mesma depende de
factos controvertidos, pelo que cabe proceder à prolação do despacho a que alude o artigo
596.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil.

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DESPACHO

Objeto do litígio

Reconhecimento do direito de propriedade do Autor sobre o imóvel inscrito na matriz


predial rústica sob o art. 1111, melhor identificado nos autos, bem como em ver os Réus
condenados a restituírem tal imóvel limpo e a demolirem o barracão nele edificado.
Reconhecimento do direito dos Réus à aquisição por acessão industrial imobiliária em
comum e sem determinação de parte ou direito, em representação da herança ilíquida e
indivisa aberta por óbito de Mário Santos, de uma parcela de terreno com a área de 322 m2, a
desanexar daquele prédio, e onde está implantado o barracão.

Temas da prova

1. Apurar quais as características físicas do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo
1111.
2. Apurar se os Réus, e antes a Ré e seu falecido marido, ali construíram um barracão.
3. Apurar se a construção do barracão foi precedida do consentimento dos então proprietários
do prédio em questão.
4. Apurar os valores do prédio inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 1111, do barracão e
da parcela onde o mesmo foi construído à data da construção.
*
Por legais e tempestivos, admito a junção aos autos dos róis de testemunhas dos
Autores e dos Réus – artigo 498.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil.
*
A audiência será gravada.
*
Para a audiência final, tendo em consideração as agendas dos Ilustres Mandatários e do
Tribunal, designo o dia ____, pelas 10.00 horas.
Notifique.
*
Deste despacho, foram devidamente notificados os presentes.
De seguida, pelo Mm.º Juiz foi declarada encerrada a presente audiência.
Para constar se lavrou a presente ata que, lida e revista, vai ser devidamente assinada.

O Juiz de Direito,
_____________________________

A Oficial de Justiça,
_____________________________

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EXTRATO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO

Dos factos controvertidos com relevo para a decisão da causa, resultaram provados os
seguintes:
1. O prédio correspondente ao artigo rústico 1111.º estende-se do caminho público a poente
até à estrada asfaltada (rua do Lameiro) a nascente, sendo que a sua confrontação sul se faz
com o prédio correspondente ao artigo rústico 0000.º, onde está implantado o artigo urbano
3333.º, e fazendo-se a sua confrontação norte com outro prédio da primeira Ré e da herança
do seu falecido marido, correspondente ao artigo rústico 2222.º, e ainda com outros prédios.
2. Os prédios correspondentes aos artigos rústicos 0000.º, 1111.º e 2222.º confrontam com o
antigo caminho público, atualmente estrada asfaltada, que passa a nascente dos mesmos (rua
do Lameiro), com o/a qual sempre confrontaram.
3. Desde cerca de 1978 que a primeira Ré, primeiro em conjunto com o seu falecido marido,
e agora com a ajuda dos restantes Réus, vem praticando atos de agricultura no prédio
correspondente ao artigo rústico 1111.º, nomeadamente plantando cereais, sem qualquer
interrupção.
4. A estrema norte do prédio correspondente ao artigo 1111.º é definida por três segmentos
de reta, unindo quatro pontos constituídos por quatro marcos, sendo que, considerando o
sentido poente-nascente, o primeiro deles está implantado junto à rua da Mó, o último deles
está implantado junto à rua do Lameiro, estando os dois restantes implantados entre os
primeiros.
5. O marco que se situa junto à rua do Lameiro está, em relação aos marcos que o precedem
a poente, colocado mais para sul; a partir do marco colocado imediatamente antes (para
poente) do marco que se situa junto à rua do Lameiro, a linha divisória inflete para Sul,
considerando o sentido poente-nascente.
6. A partilha a que se alude no processo de inventário n.º 8/95 foi feita no pressuposto de ser
dada nova configuração aos terrenos correspondentes aos artigos rústicos 0000.º e 1111.º;
assim, considerando que os Réus tinham construído a sua casa de habitação e respetivos
anexos no art. 0000.º junto à rua do Lameiro, e tinham construído um barracão no terreno do
artigo 1111.º, ficara combinado nomeadamente entre o Autor, a primeira Ré e o seu falecido
marido que: à primeira Ré e seu falecido marido seria adjudicado o art. 0000.º; ao Autor seria
adjudicado o art. 1111.º; mas ainda que o Autor venderia à primeira Ré e ao seu falecido
marido a parte de terreno do art. 1111.º onde tinha sido feita tal construção e ainda uma
parcela de terreno do art. 1111.º que permitisse o acesso da casa dos Réus ao barracão supra
referido.
7. O Autor recebeu do falecido marido da primeira Ré a quantia de Esc. 50.000$00 (cinquenta
mil escudos), equivalente a € 249,40 (duzentos e quarenta e nove euros e quarenta cêntimos),
a título de sinal desse negócio, valor que nunca devolveu aos Réus.
8. Esse acordo nunca chegou a ser formalizado nem lhe foi dada execução, mantendo-se os
Réus até agora, como vêm fazendo desde cerca de 1978, a ocupar todo o conjunto formado
pelos terrenos correspondentes aos artigos 0000.º e 1111.º.
9. Entre 1978 e 1981, a primeira Ré e o seu marido, Mário Santos, construíram um barracão
com paredes em tijolo, cobertura em pré-esforçado e telha cerâmica, com a área de 184 m2.
10. Jorge Dionísio e Joana Dionísio não se opuseram à edificação dessas construções.
11. Considerando a época da construção, o prédio correspondente ao artigo rústico 1111.º
tinha um valor de cerca de € 62,91 (sessenta e dois euros e noventa e um cêntimos),
considerando apenas a sua aptidão como terreno rústico; considerando a sua aptidão como

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terreno para construção urbana, o seu m2 tinha um valor situado entre Esc. 15$00 (quinze
escudos), equivalente a € 0,07 (sete cêntimos) e Esc. 100$00 (cem escudos), equivalente a €
0,50 (cinquenta cêntimos).
12. Considerando ainda a época da construção, o barracão tinha o valor de cerca de €
4.600,00 (quatro mil e seiscentos euros).
13. Quando fizeram tal obra, a primeira Ré e o seu marido, Mário Santos, ocupavam o prédio
onde a ergueram com a convicção de que assim o podiam fazer.
14. Aquando da conferência de interessados e do trânsito da sentença homologatória de
partilhas no processo n.º 8/95, já se verificava o descrito nos parágrafos anteriores.

Factos não provados


Com relevância para a decisão da causa, e com respeito aos factos controvertidos, não ficou
provado que:
A) Por si e por sua mãe e seu pai, e os pais deste, o Autor, com referência ao prédio
inscrito no artigo rústico 1111, direta e imediatamente, há mais de 20 e 30 anos,
ininterruptamente, com exclusão de quaisquer outras pessoas, à vista e com o conhecimento
de toda a gente da zona e dos próprios Réus, sem oposição de ninguém, com a convicção de
exercer direito próprio e de a ninguém causar prejuízo, vem cuidando, zelando, demarcando,
defendendo, inclusive dos atos de agressão da primeira Ré e de seu falecido marido,
cultivando, colhendo os frutos e fazendo-os seus, optando alguns anos por mantê-la em
pousio, para repouso, e pagando os respetivos impostos.
B) As linhas de estrema ou de divisão entre os artigos 0000 e 1111 são constituídas por
retas paralelas.
C) As medidas de 13,20 metros, 16,50 metros, 95,02 metros e 86,30 metros referidas no
art. 35.º da petição inicial.
D) Os prédios inscritos nos artigos 0000 e 1111 têm rigorosamente a mesma área, sendo
esta de 1.258,50 m2 para cada um deles.
E) Joana Dionísio e Jorge Dionísio autorizaram expressamente as construções efetuadas
pela Ré e seu falecido marido no prédio inscrito no artigo 1111, indicando o local onde deviam
ser efetuadas.
F) A área de terreno afeta ao barracão tem o comprimento de 23 metros por 14 metros
de largura, formando um retângulo com a área de 322 m2.
G) Na construção do barracão, a Ré e seu falecido marido despenderam a quantia de dez
mil euros.

(…)

O Tribunal formou a sua convicção, positiva e negativa, quanto à matéria de facto


controvertida relevante para a decisão da causa através da análise crítica e ponderada, à luz
das regras da lógica e das máximas da experiência de vida, dos documentos juntos aos autos e,
ainda, dos depoimentos prestados pelas testemunhas na audiência final.
Concretizando. (…)

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PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL

(artigo 16.º, n.º 3, da Lei n.º 2/2008, de 14/1)

Via profissional

1.ª Chamada - 17 de fevereiro de 2018

Grelha de Correção

Nota:

O conteúdo que a grelha disponibiliza reflete o que se afigura ser abordagens possíveis
corretas, quer do ponto de vista de forma, quer do ponto de vista de substância, em função
das peças facultadas e dos dados do processo, desde que devidamente fundamentadas.
Sem prejuízo, outros tipos de abordagem, seja de forma, seja de substância, que se
mostrem razoáveis e plausíveis, e desde que se revelem suportados em fundamentos
consistentes, serão igualmente valorizados na precisa medida do respetivo mérito.

COTAÇÃO TOTAL DA PROVA 20 valores


Cotações parciais
Relatório e questões a decidir 1,5 valores
Fundamentação de facto 5 valores
Fundamentação de direito 11,5 valores
Dispositivo 2 valores
SENTENÇA

I – RELATÓRIO

José Dionísio e Maria Dionísio demandaram, em ação declarativa de condenação com


processo comum, Elisa Dionísio, António Santos e João Santos, pedindo que os Réus sejam
condenados:
a) a reconhecer e a ter de acatar que o Autor é dono e legítimo possuidor do
prédio rústico de sequeiro identificado no art. 10.º da petição inicial;
b) a restituir ao Autor tal prédio;
c) a demolir o barracão mencionado no art. 39.º da petição inicial;
d) a reconhecer que o prédio do Autor não está sujeito a depósito de
quaisquer materiais, sendo condenados a retirar dele todos e quaisquer materiais que têm lá
depositado, nomeadamente os referidos no art. 41.º da petição inicial, deixando o solo limpo;
e) a abster-se em geral da prática de quaisquer atos que possam impedir ou
dificultar ou perturbar o pacífico, cómodo e pleno uso, fruição e disposição por parte do Autor
do prédio rústico identificado no art. 10.º da petição inicial.
Alegaram em síntese o seguinte:
- o Autor adquiriu, por sucessão (em processo de inventário aberto por óbito
de Jorge Dionísio, pai de Autor e primeira Ré) e usucapião, o direito de propriedade sobre o
prédio composto de terra de sequeiro sita em L., freguesia e concelho de A., com a área de
1283 m2, inscrito na matriz predial sob o artigo 1111.º e descrito na Conservatória do Registo
Predial de A. sob o n.º 4444;
- porém, procurando fazer-se valer da circunstância de serem donos do
terreno com o artigo rústico 0000.º e da casa do artigo 3333.º, situados a sul do prédio do
Autor, e donos do prédio rústico com o artigo matricial 2222.º, situado a norte do prédio do
Autor, a primeira Ré e a herança de seu falecido marido, cujos titulares são os três Réus, vêm
tentando apoderar-se dele, uma vez que fica entalado entre aqueles dois, impedindo de o usar
e fruir plenamente e assim, no topo poente do prédio dos Autores, construíram um barracão
em tijolo, sem autorização quer dos anteriores proprietários quer do Autor, além de que
utilizam o prédio do Autor para, junto desse barracão, fazerem depósito de variados materiais;
- apesar das várias advertências feitas à primeira Ré e seu falecido marido, e
aos Réus, estes nunca se dispuseram a retirar o barracão e os materiais supra referidos,
construído e depositados no prédio do Autor.
*
Contestaram e reconvieram os Réus nos termos que, resumidamente, se passa a
expor:
- aceitaram parte dos factos alegados pelos Autores, impugnando os restantes,
nomeadamente no que diz respeito à configuração física dos prédios indicados nos autos;
- alegaram que, sendo incontroverso que no processo de inventário foi
adjudicado ao Autor o artigo 1111.º, e assim sendo inegável ter sido transmitido ao Autor o
direito de propriedade sobre tal bem, porém o Autor nunca foi possuidor do mesmo, pois
quem amanha esse prédio é a primeira Ré, primeiro em conjunto com o seu marido, e agora
com os restantes Réus, sem interrupção, pese embora sem qualquer intenção possessória,
pois todos sempre consideraram que os imóveis em questão pertenciam aos pais da Ré e
passaram a fazer parte da herança aberta por óbito de Jorge Dionísio;
- mais alegaram que a partilha foi feita no pressuposto de ser dada nova
configuração aos terrenos correspondentes aos artigos 0000.º e 1111.º. Além desse
entendimento, de que resultariam para ambas as partes áreas de terreno rigorosamente
iguais, os Autores negociaram com o falecido marido da Ré a cedência da área de que passaria
a dispor na traseira do barracão para permitir o acesso direto a este a partir daquela que
passaria a ser a sua propriedade, chegando a receber a quantia de Esc. 50.000$00 por conta
desse negócio, que nunca devolveram aos Réus;
- esse acordo nunca foi formalizado nem lhe foi dado execução, mantendo-se
os Réus até agora, com vêm fazendo desde 1976, na posse de todo o conjunto predial formado
pelos imóveis correspondentes àquelas duas inscrições matriciais;
- o pedido dos Autores de reconhecimento de propriedade não está em causa,
o mesmo sucedendo com a restituição do prédio e, relacionado com tal pedido, está o
reconhecimento de que tal imóvel não está sujeito a depósito de materiais, o que os Réus
também assim consideram, e dele retirarão tudo o que nele está depositado e lhes pertence;
- em reconvenção, alegaram que, em 1976, a primeira Ré e o seu marido
construíram um barracão no artigo 1111.º, que então era propriedade dos pais do Autor e da
primeira Ré, com autorização dos mesmos, sendo que a área afeta ao barracão tem 322 m2, e
que valor da construção (10.000,00 euros) foi maior do que o valor que a parcela por elas
ocupada tinha à data da incorporação (80,00 euros);
- assim, nos termos do art. 1340.º, n.º 1 do Código Civil, os Réus ficaram com o
direito potestativo de adquirirem o direito de propriedade da parcela do prédio rústico afeta à
construção que nele foi feita, pagando aos Autores o valor que ela tinha antes da obra;
Concluíram os Réus pedindo que:
- os pedidos formulados pelos Autores, nas partes não confessadas, sejam
julgados improcedentes, por não provados;
- seja julgada procedente a reconvenção e, em consequência, se declare
realizada a aquisição, por acessão industrial imobiliária, por parte dos Réus/Reconvintes, em
comum e sem determinação de parte ou de direito, da parcela de terreno com a área de 322
m2, que faz parte do prédio rústico sito em L, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 1111.º e
descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 4444/A, parcela essa que se situa
junto ao limite norte/poente do referido imóvel e que tem 23 metros de comprimento, a
contar do limite poente da propriedade, por 14 metros de largura, a contar da sua estrema
norte, e sobre a qual se acha construído um barracão, integrado na referida herança, mediante
o pagamento de 80,00 (oitenta) euros, valor que o terreno onde a obra em causa foi feita tinha
antes da incorporação.

*
Os Autores replicaram, impugnando factos alegados pelos Réus e sustentando, muito
em síntese, que não há lugar ao fenómeno da acessão industrial imobiliária, o qual pressupõe
a boa fé, sendo certo que a construção do barracão foi feita de má fé, pelo que, nos termos do
art. 1341.º do Código Civil, tem o dono do terreno direito de exigir que sejam desfeitas e que o
terreno seja restituído ao seu primitivo estado, à custa do autor delas.
Mais alegaram que nunca poderia proceder a pretensão de aquisição por acessão da
parcela de terreno pretendida pelos Réus, por violar o disposto no art. 1376.º do Código Civil
(cfr. ainda o art. 1379.º do Código Civil).
Concluíram pedindo que:
- as exceções sejam julgadas improcedentes, delas se absolvendo os Autores e
condenando-se os Réus a entregar de imediato o imóvel ao Autor;
- a reconvenção seja julgada improcedente, por não provada, dela se
absolvendo os Autores, com as legais consequências.

*
Realizou-se a audiência prévia, tendo na mesma sido proferido despacho a fixar o valor
da causa e a admitir a reconvenção, saneando-se em seguida o processo, afirmando-se a
regularidade da instância, e fixando-se também o objeto do litígio e temas da prova.
Realizou-se então o julgamento, cumprindo agora proferir sentença.
*
Mantêm-se os pressupostos de regularidade e de validade da instância verificados no
despacho saneador.
*

II - SÃO AS SEGUINTES AS QUESTÕES A DECIDIR


a) Saber se deve ser reconhecido ao Autor o direito de propriedade sobre o
imóvel inscrito na matriz predial rústica sob o art. 1111.º, melhor identificado nos autos, bem
como em ver os Réus condenados a restituírem tal imóvel limpo e a demolirem o barracão
nele edificado;
b) Saber se deve ser reconhecido aos Réus o direito à aquisição por acessão
industrial imobiliária, em comum e sem determinação de parte ou direito, e em representação
da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de Mário Santos, de uma parcela de terreno
com a área de 322 m2, a desanexar daquele prédio, e onde está implantado o barracão, e mais
concretamente:
- se tal barracão foi incorporado no terreno de boa fé;
- se tal aquisição pode ser realizada tendo por objeto apenas uma parcela do
prédio supra referido, e não já a totalidade, e na afirmativa, quais os requisitos necessários
para que tal suceda;
- em caso afirmativo ainda, qual o valor a pagar pelos Réus ao Autor.

III - FUNDAMENTAÇÃO

Factos provados
Com relevância para a decisão da causa, estão provados os seguintes factos:

a) Está descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., com o número 4444, o


seguinte prédio: prédio rústico, composto de terra de sequeiro, inscrito na matriz com o artigo
1111.º, com a área de 1283 m2, a confrontar do norte com João Loureiro e outro, do sul com
Jorge Dionísio, do nascente e poente com caminho. A aquisição do direito de propriedade
sobre tal prédio encontra-se inscrita definitivamente a favor do Autor desde 22 de Abril de
2003, tendo com causa “sucessão”.
b) Por morte de Jorge Dionísio, residente que foi em B., ocorrida em 19 de
Dezembro de 1986, procedeu-se ao inventário facultativo, o qual teve o n.º 8/95 do 1.º Juízo
do Tribunal de ..., no qual a sua viúva, Joana Dionísio, com quem fora casado sob o regime da
comunhão geral de bens, exerceu o cargo de cabeça-de-casal.

c) Nesse inventário, foram habilitados como herdeiros do falecido, entre outros,


os seguintes filhos de ambos: José Dionísio, ora Autor, e Elisa Dionísio, ora Ré.

d) Na relação de bens do inventário foi relacionado como verba n.º 1 o seguinte


imóvel da herança: terreno de sequeiro, com a área de 960 m2, sito em L., freguesia e
concelho de A..., a confrontar do norte com Eva Santos (e atualmente o Autor), sul com
Alberto Santos, nascente com caminho (atualmente estrada asfaltada, com o nome de Rua do
Lameiro), e poente com caminho, omisso na Conservatória do Registo Predial, e inscrito na
matriz rústica sob o art. 0000.º.

e) Nesse terreno, a primeira Ré e seu falecido marido construíram uma casa de


habitação, a qual, na mesma relação de bens do dito inventário, foi descrita como benfeitoria
sob a verba n.º 3, pela forma seguinte: “Deve a herança à interessada Elisa Dionísio o valor de
um prédio urbano que esta construiu sob o prédio descrito na verba n.º 1 (artigo rústico
0000.º), composto por casa de habitação de rés-do-chão com quatro assoalhadas, cozinha,
casa de banho, corredor, varanda, com logradouro, sito em Rua do Lameiro, com a superfície
coberta de 96 m2, logradouro de 200 m2, a confrontar do norte com caminho público, sul com
Alberto Santos, nascente com caminho público e poente com Miguel Isidro, omissa na
Conservatória do Registo Predial e inscrita na matriz predial urbana sob o artigo 3333.º, e com
o valor de quinhentos mil escudos”.

f) Nesse terreno do artigo rústico n.º 0000.º, a primeira Ré e seu falecido marido
construíram também pegado à casa, para o lado poente desta, alguns cómodos,
designadamente um abrigo para automóveis.

g) Na conferência de interessados, ocorrida em 20 de janeiro de 2000, na qual


todos os herdeiros intervieram pessoalmente, incluindo a primeira Ré e seu marido, então
ainda vivo, ficou a constar que:
“Por unanimidade de todos os interessados foi requerido que a verba n.º 3 fosse eliminada da
descrição, tendo o Mmo Juiz deferido ao requerido.
Por todos os interessados foi ainda declarado nos autos que foi omitida a relação de um bem
que faz parte da herança aberta por óbito de Jorge Dionísio, e que agora pretendem relacionar.
Estão de acordo quanto à partilha, pelo que prescindem de todos os prazos relativamente ao
bem relacionado agora adicionalmente, fazendo-o da seguinte forma:
“Verba n.º 2-A Terra de sequeiro sita em L., freguesia e concelho de A., com a área de 1283
m2, a confrontar do norte com João Loureiro e outro, do sul com Jorge Dionísio, do nascente
com caminho e poente caminho, inscrito na matriz predial sob o artigo 1111.º, com o valor
patrimonial de mil trezentos escudos.......................................................1.300$00”.
Mais acordam preencherem os respetivos quinhões da forma seguinte:
À cabeça-de-casal é adjudicada a verba n.º 2 pelo valor da descrição.
À interessada Elisa Dionísio é adjudicada a verba n.º 1, pelo valor constante da descrição. Ao
interessado José Dionísio é adjudicada a verba n.º 2-A, pelo valor constante da descrição.
Por todos os interessados foi declarado prescindir do depósito de tornas, por já as terem
recebido em mão.
Seguidamente, pelo Mmo Juiz foi proferido o seguinte
Despacho
Admito a relação de bens adicional, ordenando a descrição da verba n.º 2-A.
Deferido ao requerido por unanimidade, elimine-se a verba n.º 3 (...)”.

h) Em 15 de Setembro de 2000, foi proferida a sentença homologatória da


partilha, transitada em julgado em 18 de Dezembro de 2000.

i) O prédio correspondente ao artigo rústico 1111.º estende-se do caminho


público a poente até à estrada asfaltada (Rua do Lameiro) a nascente, sendo que a sua
confrontação sul se faz com o prédio correspondente ao artigo rústico 0000.º, onde está
implantado o artigo urbano 3333.º, e fazendo-se a sua confrontação norte com outro prédio
da primeira Ré e da herança do seu falecido marido, correspondente ao artigo rústico 2222.º, e
ainda com outros prédios.

j) Os prédios correspondentes aos artigos rústicos 0000.º, 1111.º e 2222.º


confrontam com o antigo caminho público, atualmente estrada asfaltada, que passa a
nascente dos mesmos (Rua do Lameiro), com o/a qual sempre confrontaram.
k) No local, um observador que esteja na estrada asfaltada a Nascente dos
prédios (a Rua do Lameiro) e virado para poente, para os mesmos prédios, tem
sucessivamente da sua esquerda para a sua direita (e de sul para norte): 1.º, o terreno do
artigo rústico 0000.º, com a casa do artigo 3333.º nele implantada; 2.º, o prédio do artigo
rústico 1111.º; 3.º, o prédio rústico da primeira Ré e da herança do seu falecido marido, artigo
rústico 2222.º.

l) O 1.º e 2.º referidos prédios desenvolvem-se de poente a nascente, desde um


caminho público a poente até à estrada asfaltada (Rua do Lameiro) a nascente.

m) A estrema nascente desenvolve-se em linha reta, ao longo da estrada asfaltada


(Rua do Lameiro), que obriga a mesma estrema a fazer-se em diagonal.

n) A estrema norte do prédio correspondente ao artigo 1111.º é definida por três


segmentos de reta, unindo quatro pontos constituídos por quatro marcos, sendo que,
considerando o sentido poente-nascente, o primeiro deles está implantado junto à Rua da Mó,
o último deles está implantado junto à Rua do Lameiro, estando os dois restantes implantados
entre os primeiros.

o) O marco que se situa junto à Rua do Lameiro está, em relação aos marcos que
o precedem a poente, colocado mais para sul; a partir do marco colocado imediatamente
antes (para poente) do marco que se situa junto à Rua do Lameiro, a linha divisória inflete para
Sul, considerando o sentido poente-nascente.

p) Desde cerca de 1978 que a primeira Ré, primeiro em conjunto com o seu
falecido marido, e agora com a ajuda dos restantes Réus, vem praticando atos de agricultura
no prédio correspondente ao artigo rústico 1111.º, nomeadamente plantando cereais, sem
qualquer interrupção.

q) A primeira Ré e o seu marido, Mário Santos construíram, entre 1978 e 1981,


no topo poente do artigo rústico 1111.º, um barracão com paredes em tijolo, cobertura em
pré-esforçado e telha cerâmica, com o piso cimentado e com fossas sépticas no seu interior,
com a área de 184 m2.
r) Jorge Dionísio e Joana Dionísio não se opuseram à edificação dessas
construções.

s) Considerando a época da construção, o prédio correspondente ao artigo


rústico 1111.º tinha um valor de cerca de € 62,91 (sessenta e dois euros e noventa e um
cêntimos), considerando apenas a sua aptidão como terreno rústico; considerando a sua
aptidão como terreno para construção urbana, o seu m2 tinha um valor situado entre Esc.
15$00 (quinze escudos), equivalente a € 0,07 (sete cêntimos) e Esc. 100$00 (cem escudos),
equivalente a € 0,50 (cinquenta cêntimos).

t) Considerando ainda a época da construção, o barracão tinha o valor de cerca


de € 4.600,00 (quatro mil e seiscentos euros).

u) Quando fizeram tal obra, a primeira Ré e o seu marido, Mário Santos,


ocupavam o prédio onde a ergueram com a convicção de que assim o podiam fazer.

v) A partilha a que se alude no processo de inventário n.º 8/95 foi feita no


pressuposto de ser dada nova configuração aos terrenos correspondentes aos artigos rústicos
0000.º e 1111.º; assim, considerando que os Réus tinham construído a sua casa de habitação e
respetivos anexos no art. 0000.º junto à Rua do Lameiro, e tinham construído um barracão no
terreno do artigo 1111.º, ficara combinado nomeadamente entre o Autor, a primeira Ré e o
seu falecido marido que: à primeira Ré e seu falecido marido seria adjudicado o art. 0000.º; ao
Autor seria adjudicado o art. 1111.º; mas ainda que o Autor venderia à primeira Ré e ao seu
falecido marido a parte de terreno do art. 1111.º onde tinha sido feita tal construção e ainda
uma parcela de terreno do art. 1111.º que permitisse o acesso da casa dos Réus ao barracão
supra referido.

w) O Autor recebeu do falecido marido da primeira Ré a quantia de Esc.


50.000$00 (cinquenta mil escudos), a título de sinal desse negócio, que nunca devolveu aos
Réus.

x) Esse acordo nunca chegou a ser formalizado nem lhe foi dada execução,
mantendo-se os Réus até agora, como vêm fazendo desde cerca de 1978, a ocupar todo o
conjunto formado pelos terrenos correspondentes aos artigos 0000.º e 1111.º.
y) Aquando da conferência de interessados e do trânsito da sentença
homologatória de partilhas feitas no processo n.º 8/95, já se verificava o descrito nos
parágrafos anteriores.

z) A primeira Ré e os Réus, seus filhos, utilizam o prédio inscrito no artigo rústico


1111.º para nele fazerem depósito dos mais variados materiais, como mato, estrume, lixos,
lenhas, madeiras, restos de materiais de construção, plásticos e mangueiras.

*
Factos não provados
1. Por si e por sua mãe e seu pai, e os pais deste, o Autor, com referência ao prédio
inscrito no artigo rústico 1111.º, direta e imediatamente, há mais de 20 e 30 anos,
ininterruptamente, com exclusão de quaisquer outras pessoas, à vista e com o conhecimento
de toda a gente da zona e dos próprios Réus, sem oposição de ninguém, com a convicção de
exercer direito próprio e de a ninguém causar prejuízo, vem cuidando, zelando, demarcando,
defendendo, inclusive dos atos de agressão da primeira Ré e de seu falecido marido,
cultivando, colhendo os frutos e fazendo-os seus, optando alguns anos por mantê-la em
pousio, para repouso, e pagando os respetivos impostos.
2. As linhas de estrema ou de divisão entre os artigos 0000.º e 1111.º são constituídas
por retas paralelas.
3. As medidas de 13,20 metros, 16,50 metros, 95,02 metros e 86,30 metros referidas
no art. 35.º da petição inicial.
4. Os prédios inscritos nos artigos 0000.º e 1111.º têm rigorosamente a mesma área,
sendo esta de 1.258,50 m2 para cada um deles.
5. Joana Dionísio e Jorge Dionísio autorizaram expressamente as construções
efetuadas pela Ré e seu falecido marido no prédio inscrito no artigo 1111.º, indicando o local
onde deviam ser efetuadas.
6. A área de terreno afeta ao barracão tem o comprimento de 23 metros por 14
metros de largura, formando um retângulo com a área de 322 m2.
7. Na construção do barracão, a Ré e seu falecido marido despenderam a quantia de
dez mil euros.

Motivação
Os factos provados sob as als. a) a h), k), l), m) e z) decorrem do acordo das partes e da
prova documental junta - cf. artigo 607.º, n.º 4, segunda parte, do CPC.
Explicitando:
- o facto descrito na al. a) resulta da certidão de registo predial junta a fls. __
com o requerimento apresentado pelos Autores em como foi recusado o registo da ação,
sendo confirmado pela certidão de registo predial junta pelos Réus comprovativa do registo da
reconvenção;
- os factos descritos nas als. b), c), d), g) e h) estão provados pelas certidões
extraídas do processo de inventário 8/95, e que foram juntas como documentos n.º1 e n.º2
com a petição inicial;
- o facto descrito na al. e) resulta da ponderação conjugada do acordo das
partes resultante dos articulados e dos documentos n.º1 e n.º2 juntos com a petição inicial;
- o facto descrito nas al.s f), k), l), m) e z) resultam do acordo das partes nos
articulados.
No que respeita aos factos descritos na al. q) dos Factos Provados, estava já provado
por acordo resultante dos articulados que fora construído, no topo poente do artigo rústico
1111.º, um barracão com paredes em tijolo, cobertura em pré-esforçado e telha cerâmica,
com o piso cimentado e com fossas sépticas no seu interior, sendo que o demais resulta da
prova feita em julgamento, conforme a seguir se vai explicitar.
Assim, quanto aos factos controvertidos relevantes considerados provados, e aos
factos não provados, o Tribunal formou a sua convicção, positiva e negativa, quanto à matéria
de facto relevante para a decisão da causa através da análise crítica e ponderada, à luz das
regras da lógica e das máximas da experiência de vida, dos documentos juntos aos autos e,
ainda, dos depoimentos prestados pelas testemunhas na audiência final.
Concretizando. (…)

*
O DIREITO

TÓPICOS DE APRECIAÇÃO – POSIÇÕES POSSÍVEIS

I – Do alegado direito de propriedade e da alegada posse do Autor e do pedido de


reivindicação do prédio inscrito no artigo 1111.º
Passa-se a analisar os pedidos formulados pelo Autor de reconhecimento do direito de
propriedade e da posse do prédio supra indicado; e de condenação dos Réus a restituir ao
Autor tal prédio, a reconhecer que o prédio do Autor não está sujeito a depósito de quaisquer
materiais, sendo condenados a retirar dele todos e quaisquer materiais que têm lá depositado,
nomeadamente os referidos no art. 41.º da petição inicial, deixando o solo limpo, e a abster-se
em geral da prática de quaisquer atos que possam impedir ou dificultar ou perturbar o
pacífico, cómodo e pleno uso, fruição e disposição por parte do Autor do prédio rústico
identificado no art. 10.º da petição inicial.

1. Analisar a pretensão do Autor como ação de reivindicação (art. 1311.º do Código


Civil), indicando qual a causa de pedir da mesma e as regras do ónus de prova aplicáveis.
Ter nomeadamente em atenção a jurisprudência maioritária no sentido de que, na
ação de reivindicação, cabe ao demandante a prova do direito de propriedade sobre a coisa
reivindicada, o qual terá de ser feita através de factos dos quais resulte demonstrada a
aquisição originária do domínio, por sua parte ou por qualquer dos antepossuidores; quando a
aquisição for derivada, têm de ser provadas as sucessivas aquisições dos antecessores até à
aquisição originária, exceto nos casos em que se verifique a presunção legal da propriedade,
como a resultante da posse ou a resultante do registo – cfr., a título exemplificativo, o Acórdão
do Tribunal da Relação de Lisboa de 21 de Junho de 2012, processo n.º 7213/11.8TBOER.L1-2;
e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14 de Janeiro de 2014, processo n.º
224/12.8TBCTB-C.C1; ambos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt.
Atento o facto provado descrito na al. a) dos Factos Provados, verifica-se que está
inscrita, a título definitivo e a favor do Autor, a aquisição da propriedade do prédio rústico
inscrito na matriz respetiva sob o artigo 1111 da freguesia e concelho de A., e descrito na
Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º 4444.
A inscrição da sua aquisição a favor do Autor faz presumir que a titularidade desse
direito cabe ao Autor, nos termos do art. 7.º do Código do Registo Predial, sem que dos autos
resulte ter-se provado matéria de facto que permita ilidir tal presunção.

2. Por outro lado, não tendo os Réus invocado, na presente ação, uma eventual
aquisição, por usucapião, da propriedade do prédio rústico inscrito na matriz respetiva sob o
artigo 1111.º, não cumpre apreciar então se tal eventualmente sucedeu ou não visto que a
aquisição de direito real por usucapião carece de ser invocada – cfr. art. 1288.º, primeira parte,
e art. 303.º, ex vi do art. 1292.º, todos do Código Civil.
3. O mesmo se diga quanto à eventual aquisição da propriedade de todo o prédio
rústico inscrito na matriz respetiva sob o artigo 1111 por acessão industrial imobiliária pela
primeira Ré e falecido marido, pois que a acessão industrial imobiliária não é, automática,
antes confere, verificados determinados pressupostos, ao autor da obra incorporada o direito
potestativo de adquirir a propriedade do prédio onde a obra foi construída.
É certo que tal entendimento não é unânime.
- Pires de Lima e Antunes Varela defendem que estas normas contêm um
verdadeiro princípio imperativo de aquisição (cf. “Código Civil Anotado”, Vol, III,
Coimbra Editora, 2.ª edição, 1987, pág. 165), posição que igualmente é defendida por
Augusto da Penha Gonçalves e por Júlio Gomes (respetivamente em “Curso de Direitos
Reais”, 2.ª edição, Universidade Lusíada, Lisboa, 1993, p. 353, e “O conceito de
enriquecimento, o enriquecimento forçado e os vários paradigmas do enriquecimento
sem causa”, Universidade Católica Portuguesa, Porto, Maio de 1998, pp. 354 a 367);
- porém, a doutrina maioritária (cfr. Oliveira Ascensão, “Direito Civil: Reais”, 5.ª
edição, Coimbra Editora, 1993, págs. 306 a 309; Carvalho Fernandes, “Lições de
Direitos Reais”, 6.ª edição, Quid Iuris, Lisboa 2009, págs. 349 a 351; José Alberto Vieira,
“Direitos Reais”, Coimbra Editora, Abril de 2008, págs. 710 a 711; Rui Pinto Duarte
“Curso de Direitos Reais”, 2ª edição, Principia, Fevereiro 2007, págs. 92 a 93, “Dois
apontamentos sobre acessão industrial imobiliária” in Estudos em Homenagem ao
Prof. Doutor Manuel Henrique Mesquita, Coimbra Editora, 2009, págs. 789 e 790, e “A
jurisprudência portuguesa sobre acessão industrial imobiliária – algumas
observações”, in Themis, Revista da Faculdade de Direito da UNL, Ano III, n.º 5, 2002,
págs. 260 e 261; Menezes Cordeiro, “Direitos Reais”, Lisboa, Imprensa Nacional – Casa
da Moeda, 1979, págs. 503 a 504; A. Santos Justo, “Direitos Reais”, Coimbra Editora,
págs. 269 a 271; A. Carvalho Martins, António Carvalho Martins, “Acessão”,
reimpressão, Coimbra Editora, 1999, pag. 122; e José Alberto González, “Direitos Reais
e Direito Registal Imobiliário”, Quid Juris, 4.ª edição, 2009, págs. 422 a 423) tem
entendido que a aquisição do direito de propriedade é potestativa;
- por sua vez, Quirino Soares, em “Acessão e Benfeitorias” (Coletânea de
Jurisprudência - Acórdãos do S.T.J. - ano IV (1996), tomo I, pág. 22) segue a tese
potestativa para os n.os 1 e 2 do art. 1340.º, mas quanto ao n.º 3 entende que a
aquisição é automática.

Adotando-se a posição segundo a qual estamos perante uma aquisição potestativa, e


não automática, e a qual tem sido maioritariamente seguida pela jurisprudência (cfr., entre
outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Abril de 2011, 108/1999.P1.S1, e o o
Acórdão do STJ de 19 de Abril de 2012, processo 34/09.0T2AVR.C1.S1, ambos em
www.dgsi.pt), verifica-se que, no caso dos autos, os Réus não manifestaram vontade de
adquirir por acessão a totalidade do prédio inscrito na matriz respetiva sob o artigo 1111.º
(mas apenas uma sua parte), pelo que não importa, em consequência, apreciar se tal
configuraria um impedimento ao reconhecimento do direito de propriedade do Autor.
Assim, e sempre sem prejuízo de se vir a reconhecer alguma limitação, ónus ou
encargo sobre tal direito de propriedade em sede de apreciação do pedido reconvencional, e
tendo ainda em atenção que os Réus confessam os pedidos agora em apreço, resta concluir
desde já que os mesmos devem ser julgados procedentes com a limitação apontada.
Não se julga, porém, procedente a ação na parte em que o Autor pede que se
condenem os Réus a reconhecer que aquele é possuidor do prédio, porquanto não foi
confessado nessa parte nem se provou que o Autor tenha adquirido e mantido posse sobre o
prédio.

*
II – Da propriedade do barracão construído no prédio inscrito no artigo 1111.º e da
parcela de terreno onde foi incorporado

1. Analisar o regime da acessão industrial imobiliária, em contraponto com o das


benfeitorias – art. 216.º e arts. 1325.º e seguintes do Código Civil, em especial o art. 1340.º,
n.º 1.
Critério de distinção das duas figuras (acessão e benfeitorias) - cfr., entre outros, Pires
de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, em comentário ao artigo 1340.º; Revista dos
Tribunais, 92, página 306; ou Vaz Serra, Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 108, página
265), concluindo-se que, no que respeita ao barracão em questão, se deve integrar a sua
construção na figura da acessão industrial imobiliária.

2. Elementos constitutivos da acessão industrial imobiliária – regime dos arts. 1340.º e


1341.º do Código Civil.

3. Apreciar a questão de saber se se pode adquirir por acessão apenas uma parcela do
prédio e, em caso afirmativo, como conjugar tal possibilidade nomeadamente com as regras
de direito público que regulam as edificações e o ordenamento do território e com o disposto
no art. 1376.º do Código Civil.
Cfr. por exemplo, na Jurisprudência
- o Acórdão do STJ de 10 de Fevereiro de 2000, processo n.º 99B1208,
consultável em www.dgsi.pt:
- o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11 de Outubro de 2017
(processo n.º 2523/12.0TBPBL.C1, em www.dgsi.pt);
- Acórdão do STJ de 13 de Dezembro de 2009 (processo n.º
1102/03.7TBILH.C1.S1, em www.dgsi.pt),
- o Ac. do STJ de 1 de Junho de 2010 (processo n.º 133/1994.L1.S1, mesma
fonte);
- o Acórdão do STJ de 19 de Abril de 2012 (processo 34/09.0T2AVR.C1.S1, em
www.dgsi.pt);
- o Acórdão do STJ de 20 de Maio de 2014, processo 11430/00.8TVPRT.P1.S1
(mesma fonte);
- o Acórdão do STJ de 26-1-2016 (processo n.º 5434/09.2TVLSB.L1.S1, mesma
fonte, onde se faz um estudo detalhado das divergências doutrinárias e
jurisprudenciais na matéria:

Na Doutrina:
- o estudo de Quirino Soares, já acima referido:
- Fernanda Paula Oliveira, “Loteamentos, Reparcelamentos e Destaques”,
eBook publicado pelo Centro de Estudos Judiciários “A Interação do Direito Administrativo
com o Direito Civil”, em
http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/civil/eb_Interacao_Adm_Civil.pdf:
- José Fernando de Salazar Casanova Abrantes, “Usucapião, Acessão Industrial
e Construção Clandestina”, págs. 73 e seguintes”, mesma fonte;

POSIÇÃO SEGUNDO A QUAL NÃO É POSSÍVEL A ACESSÃO INDUSTRIAL IMOBILIÁRIA INVOCADA PELOS RÉUS

Seguindo o entendimento seguido em tais decisões e estudos, é necessário que os


Réus demonstrem, para ver proceder a sua pretensão, (art. 342.º, n.º 1 do Código Civil), factos
que permitam concluir que, aquando da incorporação da obra aqui em causa, a parcela que se
pretende ver autonomizada constituía já uma unidade económica autónoma, ou que, após a
incorporação do barracão, passou a verificar-se a existência de duas unidades económicas
autónomas: a constituída pelo barracão e área de terreno ao mesmo afeta; e a constituída
pelo remanescente do artigo 1111.º, sendo defensável que não está afastado pela natureza
das coisas que um barracão, como o descrito dos autos, possa servir de apoio à atividade a
desenvolver no terreno de sequeiro onde foi incorporado, e que não se demonstrou que tal
barracão se destinasse a atividade económica distinta da que era praticada no remanescente
do artigo 1111.º;
Por outro lado, e tendo por referência a Portaria n.º 202/70, de 21 de Abril, em vigor à
data da incorporação (cfr. art. 1317.º, al. c) do Código Civil), constata-se que a área do prédio
aqui em causa é inferior ao mínimo da unidade de cultura para terrenos de sequeiro, o mesmo
sucedendo, aliás, também no contexto da Portaria atualmente em vigor (Portaria n.º
219/2016, de 9 de Agosto).
Acresce que os Réus não demonstraram que tivesse sido autorizado, pela autoridade
administrativa competente, o fracionamento do prédio correspondente ao artigo 1111.º, nos
termos pretendidos (autonomização de uma parcela de terreno com a área de 332 m 2,- ou
mesmo com a área correspondente apenas ao barracão, ou seja, 184 m2), por forma a dar
lugar a um prédio autónomo.
Assim sendo, tal fracionamento viola o disposto no art. 1376.º do Código Civil, sendo
certo, por outro lado, que não se verifica nenhuma das exceções previstas no art. 1377.º do
Código Civil:
- o “prédio mãe” em apreço destina-se a cultura (de sequeiro) – cfr. al. a) do
art. 1377.º;
- nada se provou que permita o funcionamento da al. b) do art. 1377.º;
- finalmente, quanto à al. c) dessa norma, era necessário, pelos motivos já
expostos, que o destaque da parcela onde foi construído o barracão, sendo entendido como
destaque para construção, estivesse autorizado pela autoridade administrativa competente, e
em harmonia com as normas de direito público aplicáveis, o que não se demonstrou.
Seguindo este entendimento, o fracionamento pretendido pelos Réus não pode ter
lugar, o que impede a aquisição, por meio da acessão, do direito de propriedade sobre a
parcela do prédio do Autor tal como está identificada na al. a) do pedido reconvencional –
determinando a sua improcedência.
A consequência que daqui se retira, ainda, é que a obra incorporada ficou a fazer parte
do prédio onde foi construída e, não se reconhecendo aos Réus o direito a adquirirem, por
acessão, a propriedade do prédio, não se lhes pode reconhecer então a propriedade da obra.
Têm os Réus, eventualmente, direito a ser indemnizados nos termos do art. 1340.º, n.º
3 do Código Civil, mas disso não cabe cuidar nestes autos, porquanto não foi formulado pedido
nesse sentido (cfr. art. 609.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).

*
III – Do pedido de condenação dos Réus a demolirem o barracão

Vejamos agora, então, se os Autores podem ver julgado procedente o pedido de


condenação dos Réus a demolir o barracão.
Tal depende de, nos termos do art. 1341.º do Código Civil, se provar que obra foi feita
de má fé – má fé que, por oposição ao conceito de boa fé definido no art. 1340.º do Código
Civil, consiste na falta de autorização por parte do dono do prédio.
Ora, os Autores não lograram provar que os seus pais, donos do artigo 1111.º à data
da incorporação, não autorizaram a mesma.
Ao invés, provou-se que Jorge e Joana Dionísio não se opuseram à edificação da
mesma, provando-se ainda que, quando fizeram tal obra, a primeira Ré e o seu marido, Mário
Santos, ocupavam o prédio onde a ergueram com a convicção de que assim o podiam fazer.
Pelo que não demonstraram os Autores fundamento bastante para obter a
condenação dos Réus a demolir tais obras, improcedendo o seu pedido nesta parte.

*
IV – Da responsabilidade tributária
Quanto às custas, importa estabelecer qual a medida da responsabilidade das partes.
Considerando o disposto no art. 527.º, n.º e e n.º 2.º do Código de Processo Civil, e a
sorte da presente ação, considera-se que as custas da ação devem ficar:
- parcialmente a cargo dos Autores, na parte em que improcedem os pedidos
de condenação dos Réus a demolir o barracão e a reconhecerem o Autor como possuidor do
prédio inscrito no artigo 1111.º;
- parcialmente a cargo dos Réus, na parte restante, visto terem ficado vencidos
nesse remanescente.
Não decorrendo dos autos qual a percentagem exata a que corresponde, em termos
de valor global, a utilidade económica dos pedidos formulados pelos Autores que são julgados
improcedentes, fixa-se a proporção com recurso à equidade: as custas da ação ficam a cargo
dos Autores na proporção de 20% e dos Réus na proporção de 80%.
Também por força do disposto na norma acima referida, as custas da reconvenção
devem ficar integralmente a cargo dos Réus, atenta a sua improcedência total.

*
IV – DECISÃO

1. Pelo exposto, julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência,


a) condenam-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos a
reconhecer e acatar que o Autor José Dionísio é proprietário do prédio rústico inscrito
na matriz respetiva sob o artigo 1111.º, e descrito na Conservatória do Registo Predial
de... sob o número 4444.º, ali descrito como “prédio rústico, composto de terra de
sequeiro, inscrito na matriz com o artigo 1111.º, com a área de 1283 m2, a confrontar
do norte com João Loureiro e outro, do sul com Jorge Dionísio, do nascente e poente
com caminho”;
b) condenam-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos a
restituir esse prédio ao Autor José Dionísio;
c) condenam-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos a
reconhecer que o prédio do Autor José Dionísio, acima identificado, não está sujeito ao
depósito de quaisquer materiais, e a retirar desse prédio todos e quaisquer materiais,
nomeadamente como mato, estrume, lixos, lenhas, madeiras, restos de materiais de
construção, plásticos e mangueiras, que lá têm depositados, deixando o solo do prédio
completamente limpo desses materiais;
d) condenam-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos a
abster-se em geral da prática de quaisquer atos que possam impedir ou dificultar ou
perturbar o pacífico, cómodo e pleno uso, fruição e disposição, pelo Autor José
Dionísio, do seu prédio acima identificado;
e) absolvem-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos do
restante que é pedido pelos Autores.

2. Mais se decide julgar a reconvenção improcedente, absolvendo-se os Autores José


Dionísio e Maria Dionísio do pedido reconvencional.

3. Condenam-se Autores e Réus a pagar as custas do processo nos seguintes termos:


a) as custas da ação ficam a cargo dos Autores José Dionísio e Maria Dionísio
na proporção de 20% e dos Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos na
proporção de 80%;
b) as custas da reconvenção ficam a cargo dos Réus Elisa Dionísio, António
Santos e Mário Santos.

4. Registe e notifique.

5. Após trânsito em julgado da presente decisão, cumpra-se o disposto nos arts. 3.º,
n.º 1, al. c), 8.º-A, n.º 1, al. b) e 8.º-B, n.º 3, todos do Código do Registo Predial.

*
(Data e assinatura)

*********************************

POSIÇÃO SEGUNDO A QUAL É POSSÍVEL A ACESSÃO INDUSTRIAL IMOBILIÁRIA INVOCADA PELOS RÉUS

(...)
Tudo ponderado, concorda-se com a posição segundo a qual pode haver aquisição de
apenas parte do prédio, quando a construção dê origem a duas unidades económicas distintas,
acompanhando os argumentos acima expendidos que sustentam esta posição,
desempenhando aqui papel fundamental o critério económico de definição do que seja os
limites de um prédio e que, nas palavras de Quirino Soares (obra citada, pág. 23), se concretiza
na ideia de que à unidade predial deve corresponder aquela área contínua que, para o
respetivo dono, funciona como uma unidade económica.
Ora, analisadas as características do barracão, conclui-se que o mesmo não se destina
a apoiar a exploração de um terreno de sequeiro, constituindo assim uma unidade económica
autónoma, independente da área rústica sobrante do prédio ocupado.
Por outro lado, é certo que o artigo 1111.º tem área inferior à unidade de cultura,
sendo assim, à partida, insuscetível de fracionamento nos termos do art. 1376.º, n.º 1 do
Código Civil – conjugado com a Portaria n.º 202/70, de 21 de Abril, em vigor à data da
incorporação (cfr. art. 1317.º, al. c) do Código Civil), o mesmo sucedendo, de todo o modo,
também no contexto da Portaria atualmente em vigor (Portaria n.º 219/2016, de 9 de Agosto).
Porém, como se demonstrou, o barracão foi construído com paredes em tijolo,
cobertura em pré-esforçado e telha cerâmica, com o piso cimentado e com fossas sépticas no
seu interior.
Ou seja, a atividade a desenvolver no barracão não é manifestamente a de cultura,
verificando-se assim a exceção prevista no art. 1377.º, al. a) do Código Civil.
Donde não haver o referido impedimento ao fracionamento do prédio do Autor e não
haver dúvidas de que se deve considerar como preenchido o requisito relativo ao valor
acrescentado – a diferença entre o valor desta nova realidade económica resultante da
incorporação e o valor que o “lote de terreno” onde a edificação foi construída tinha antes,
conforme resulta das als. s) e t) dos Factos Provados.
Considerar verificado o requisito da boa fé, na forma de autorização dada em termos
de declaração tácita, de forma fundamentada – cfr. nomeadamente Ac. TRG de 8 de maio de
2014, processo 3376/08.8TBBCL.G, em www.dgsi.pt.
(se se entender que não está preenchido, a decisão será semelhante à acima
proposta).
Segundo este entendimento, a pretensão dos Réus deve ser reconhecida, pese embora
limitada à área do barracão, visto não se ter provado (prova que aos Réus competia, nos
termos do art. 342.º, n.º 1 do Código Civil) que estivesse afetada ao barracão uma área de
terreno superior.
Por outro lado, essa aquisição deve ser acompanhada do pagamento do valor que o
prédio tinha antes da incorporação.
A este respeito, provou-se que o prédio correspondente ao artigo rústico 1111.º tinha
um valor de cerca de € 62,91 (sessenta e dois euros e noventa e um cêntimos), considerando
apenas a sua aptidão como terreno rústico; considerando a sua aptidão como terreno para
construção urbana, o seu m2 tinha um valor situado entre € 0,07 e € 0,50.

O valor que aqui releva é (necessário justificar a opção fundamentadamente):

ALTERNATIVA 1: o valor da parcela enquanto com aptidão rústica. Considerando a área


constante da descrição predial, e que o valor do metro quadrado ascendia a cerca de 0,05
euros, tal valor multiplicado por 184 m2 corresponde ao valor de 9,20 euros.

ALTERNATIVA 2: o valor da parcela enquanto com aptidão rústica. Considerando a área


constante da descrição predial, o valor do metro quadrado ascendia a cerca de 0,05 euros o
que, multiplicado por 184 m2, corresponde ao valor de 9,20 euros. Porém, os Réus oferecem
valor superior (0,25 euros por metro quadrado), pelo que deverá ser este o valor a considerar.
Assim, 184 m2 ao valor de 0,24 metros quadrados corresponde a 46 euros.

ALTERNATIVA 3: o valor do prédio enquanto com aptidão para construção urbana,


sendo o metro quadrado entre € 0,07 e € 0,50 – o que dá uma média de € 0,285 por m2.
Multiplicando por 184 m2, temos o valor de € 52,44.

Julga-se assim parcialmente procedente o pedido reconvencional, declarando-se


realizada a aquisição, por acessão industrial imobiliária, por parte dos Réus/Reconvintes, em
comum e sem determinação de parte ou de direito e enquanto interessados na herança
ilíquida e indivisa aberta por óbito de Mário Santos, da parcela de terreno com a área de 184
m2, que faz parte do prédio rústico sito em L, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 1111.º e
descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 4444, parcela essa situada no topo
poente do referido imóvel e sobre a qual se acha construído um barracão, melhor descrito na
al. q) dos Factos Provados, integrado na referida herança, mediante o pagamento de _____
euros, valor que o parcela de terreno onde a obra em causa foi feita tinha antes da
incorporação.
Consequentemente, improcede o pedido formulado pelos Autores no sentido de
serem condenados os Réus a demolir o referido barracão.

*
III – Da responsabilidade tributária
Quanto às custas, importa estabelecer qual a medida da responsabilidade das partes.
Considerando o disposto no art. 527.º, n.º e e n.º 2.º do Código de Processo Civil, e a
sorte da presente ação, resta concluir que as custas da acção devem ficar:
- parcialmente a cargo dos Autores, na parte em que improcedem os pedidos
de condenação dos Réus a demolir o barracão e a reconhecerem o Autor como possuidor do
prédio inscrito no artigo 1111.º;
- parcialmente a cargo dos Réus, na parte restante, visto terem ficado vencidos
nesse remanescente.
Também por força do disposto na norma acima referida, as custas da reconvenção
devem ficar:
- parcialmente a cargo dos Réus, atenta a sua visto improceder o seu pedido
quanto à área total que pretendem ver reconhecida a aquisição;
- parcialmente a cargo dos Autores, na parte relativa à procedência da
reconvenção.
Não decorrendo dos autos qual a percentagem exata a que corresponde, em termos
de valor global, a utilidade económica dos pedidos formulados pelos Autores e Réus que são
julgados respetivamente procedentes e improcedentes, fixa-se com recurso à equidade a
seguinte proporção: as custas da ação e da reconvenção ficam a cargo dos Autores na
proporção de 50% e dos Réus na proporção de 50%.

*
IV – DECISÃO

1. Pelo exposto julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência


a) condenam-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos a
reconhecer e acatar que o Autor José Dionísio é proprietário do prédio rústico inscrito na
matriz respetiva sob o artigo 1111.º, e descrito na Conservatória do Registo Predial de... sob o
número 4444 como “prédio rústico, composto de terra de sequeiro, inscrito na matriz com o
artigo 1111, com a área de 1283 m2, a confrontar do norte com João Loureiro e outro, do sul
com Jorge Dionísio, do nascente e poente com caminho”, na parte não abrangida pela
procedência do pedido reconvencional;
b) condenam-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos a
restituir esse prédio ao Autor José Dionísio, na parte não abrangida pela procedência do
pedido reconvencional;
c) condenam-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos a
reconhecer que o prédio do Autor José Dionísio, acima identificado, na parte não abrangida
pela procedência do pedido reconvencional, não está sujeito ao depósito de quaisquer
materiais, e a retirar desse prédio todos e quaisquer materiais, nomeadamente como mato,
estrume, lixos, lenhas, madeiras, restos de materiais de construção, plásticos e mangueiras,
que lá têm depositados, deixando o solo do prédio completamente limpo desses materiais;
d) condenam-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos a
abster-se em geral da prática de quaisquer atos que possam impedir ou dificultar ou perturbar
o pacífico, cómodo e pleno uso, fruição e disposição, pelo Autor José Dionísio, do seu prédio
acima identificado, na parte não abrangida pela procedência do pedido reconvencional;
e) absolvem-se os Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos do
restante que é pedido pelos Autores.

2. Mais se decide julgar a reconvenção parcialmente procedente:


a) declarando-se realizada a aquisição, por acessão industrial imobiliária, por
parte dos Réus/Reconvintes Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos, em comum e sem
determinação de parte ou de direito e enquanto interessados na herança ilíquida e indivisa
aberta por óbito de Mário Santos, da parcela de terreno com a área de 184 m 2 (cento e oitenta
e quatro metros quadrados), que faz parte do prédio rústico sito em L, inscrito na respetiva
matriz sob o artigo 1111.º e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º 4444,
parcela essa situada no topo poente do referido imóvel e sobre a qual se acha construído um
barracão melhor descrito na al. q) dos Factos Provados, mediante o pagamento de _____
euros (extenso);
b) absolvendo os Autores José Dionísio e Maria Dionísio do restante que é
pedido pelos Réus Elisa Dionísio, António Santos e Mário Santos.

3. Condenam-se Autores José Dionísio e Maria Dionísio e Réus Elisa Dionísio, António
Santos e Mário Santos a pagar as custas da ação e da reconvenção na proporção de metade
para os Autores e de metade para os Réus.

4. Registe e notifique.

5. Após trânsito em julgado da presente decisão, cumpra-se o disposto nos arts. 3.º,
n.º 1, al. c), 8.º-A, n.º 1, al. b) e 8.º-B, n.º 3, todos do Código do Registo Predial.

*
(Data e assinatura)
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL
(artigo 16.º, n.º 3, da Lei n.º 2/2008, de 14/1)

Via profissional

2.ª Chamada - 22 de fevereiro de 2018

Grelha de Correção

Nota:
A decisão judicial que a grelha disponibiliza reflete o que se afigura ser uma
abordagem correta, quer do ponto de vista de forma, quer do ponto de vista de
substância, em função das peças facultadas e dos dados do processo.
Outros tipos de abordagem, seja de forma, seja de substância, que se
mostrem razoáveis e plausíveis, e desde que se revelem suportados em
fundamentos consistentes, serão igualmente valorizados na precisa medida do
respetivo mérito.

COTAÇÃO TOTAL DA PROVA 20 valores


Cotações parciais
Relatório 1 valor
Saneamento e questões a decidir 2,5 valores
Fundamentação de facto 4 valores
Fundamentação de direito 11,5 valores
Dispositivo 1 valor
I - Relatório

Banco X, S.A., com sede na Rua Pedro Gordo, n.º 7, na cidade do Porto, NIF 500 XXX
XXX, intentou a presente ação declarativa com processo comum contra :
- Pardal, Lda., com sede na Rua Torta, n.º 1, na cidade do Porto, e NIF 502 XXX XXX;
- Tecnoazienda, com sede na Via Guido Galli, 63, Castelminio, Itália; e
- Agrimacchine, com sede na Via Riva, 82, Castelminio, Itália,

Formulou o pedido de condenação das Rés no pagamento a si Autor da quantia de


9.639,00 €, acrescida de juros legais à taxa de 4%, contados desde a data da citação até
integral pagamento.
Para tanto, alegou, em síntese, que, por erro seu, procedeu em 30 de março de 2012
à transferência da quantia agora peticionada para conta titulada pela Ré Tecnoazienda,
quando devia tê-la transferido, face a instruções expressas da Ré Pardal, Lda., sua cliente,
para conta titulada pela Ré Agrimacchine. Apercebendo-se do erro, solicitou a restituição da
quantia indevidamente transferida, o que a Ré Tecnoazienda recusou, alegando acertos de
contas com a Ré Pardal, Lda., em resultado de incumprimento contratual por parte desta,
bem como a emissão de uma factura pró-forma em seu favor.
Acrescentou o Banco Autor que, em 11 de abril de 2012, creditou a conta da Ré
Pardal, Lda. com o valor de 9.639,00 €, a pedido desta, que alegou ter que proceder a
pagamento em falta à Ré Agrimacchine.
Concluiu que a Ré Tecnoazienda viu o seu património acrescido no montante de
9.639,00 €, de que o Autor ficou despojado, e que também a Ré Pardal, Lda. viu a sua
situação patrimonial melhorada, por ter visto saldadas obrigações perante a Ré
Tecnoazienda, tendo ainda beneficiado de uma factura pró-forma emitida por esta segunda
Ré, no valor de 4.430,00 €.
Regularmente citadas todas as Rés, contestaram apenas a Ré Pardal, Lda. e a Ré
Tecnoazienda.
A Ré Pardal, Lda. sustentou na contestação a sua absolvição do pedido, por entender
que o erro do Autor lhe é totalmente alheio, tão-pouco lhe dizendo respeito a devolução,
sua falta ou o ganho de que a Ré Tecnoazienda terá beneficiado. Acrescentou não ser
verdade que tenha incorrido em incumprimento perante a Ré Tecnoazienda, nem que tenha
beneficiado de qualquer factura pró-forma, pelo que em nada beneficiou com o erro do
Autor, não tendo, desde a data da transferência, quaisquer relações comerciais com a Ré
Tecnoazienda.
A Ré Tecnoazienda concluiu também pela sua absolvição do pedido. Alegou, em
síntese, que não obteve qualquer vantagem injustificada à custa do Autor, uma vez que era,
e continua a ser, credora da Ré Pardal, Lda., não tendo sido o montante transferido
suficiente para saldar o valor total em dívida à data e o valor de nova encomenda feita pela
Ré Pardal, Lda., que identifica. Assim, sustentou que a única responsável pela situação será
a Ré Pardal, Lda.
*
Realizou-se audiência prévia, para os fins previstos nas alíneas a) e b) do n.º 1 do
artigo 591.º do Código de Processo Civil.
Conforme ata que antecede, frustrou-se nesta audiência a tentativa de conciliação, foi
debatida a questão da ilegitimidade da Ré Agrimacchine, e facultada às partes a discussão
de facto e de direito, face à então expressa intenção do tribunal de conhecer de imediato o
mérito da causa.
Os mandatários das partes declararam na mesma audiência acordar considerar
provada a matéria de facto constante dos artigos 12.º, 13.º, 14.º e 19.º da contestação da Ré
Tecnoazienda.

II - Saneamento

O Tribunal é competente.
O processo é o próprio e não enferma de nulidades que o invalidem no seu todo.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias.
O Autor e as Rés Pardal, Lda. e Tecnoazienda têm legitimidade.

Da ilegitimidade da Ré Agrimacchine:
- Considerado o teor da petição inicial, analisar a questão da ilegitimidade passiva da
R. Agrimacchine, pese embora a falta de contestação por parte desta, e a falta de invocação
de tal exceção, por estar em causa matéria de conhecimento oficioso (artigos 577.º, alínea
e), e 578.º do Código de Processo Civil);
- Verificar que, face à forma como o próprio Autor articula a matéria de facto, e a
fundamento jurídico que invoca (que se reconduz à alegação de enriquecimento sem causa),
inexiste matéria articulada que sustente a obrigação desta Ré de proceder a pagamento a
Autor da quantia em causa nos autos.
- Não tendo sequer invocado que a Ré Agrimacchine recebeu qualquer quantia no
âmbito das transferências bancárias referidas nos autos, o Autor não a configura como
sujeito da relação material controvertida, pelo que importa concluir pela sua ilegitimidade,
com a consequente absolvição desta Ré da instância (artigos 30.º, n.ºs 1, parte final e 3, e
278.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil).
*
Fixar o valor da causa em 9.639,00 € (artigos 296.º, n.º 1, 297.º, n.º 1 e 306.º, n.º 1, do
Código de Processo Civil).
*
Enunciar como questões a decidir:

a) Avaliar se deve ser restituída ao Autor a quantia peticionada nos autos de 9.639,00
€, a título de enriquecimento sem causa;
b) Na afirmativa, decidir se tal obrigação impende sobre ambas as Rés Pardal, Lda. e
Tecnoazienda ou apenas sobre uma delas.

III - Fundamentação

- Elencar como factos provados, face a acordo das partes, a teor dos documentos
constantes dos autos e por serem apenas estes os relevantes para a decisão a proferir, os
constantes dos artigos 1.º a 5.º (parte), 6.º (parte) da petição inicial;
- Desconsiderar a matéria dos articulados com carácter conclusivo;
- Desconsiderar a matéria de facto dada por assente por acordo das partes em sede de
audiência prévia, por ser insuscetível de relevar para a decisão a proferir;
- Concluir pela inexistência de factos não provados com relevo para a decisão a proferir;
- Elaborar motivação da decisão em matéria de facto, mencionando o acordo das partes
e, especificamente para cada facto, o documento correspondente.

Exemplo:
1. Em 30/03/2012, a Ré Pardal, Lda. ordenou a Autor a transferência da sua conta D/O
n.º XXXXXXXXXXX, domiciliada na sede do Autor, no Porto, da quantia de 5.000,00 € para a
Ré Tecnoazienda IBAN IT XX XXXX XXXX XXXX XXXX XXXX 902, e a transferência do montante
de 9.639,00 € para a Ré Agrimacchine, IBAN IT XX XXXX XXXX XXXX XXXX XXXX 620;
2. Por erro, o Autor em 2/04/2012 transferiu para o IBAN da Ré Tecnoazienda não
apenas a quantia de 5.000,00 €, mas também a quantia de 9.639,00 €;
3. O Autor solicitou à instituição bancária na qual está domiciliada a conta da Ré
Tecnoazienda a devolução do valor de 9.639,00 €, o que foi recusado face a instruções da Ré
Tecnoazienda;
4. Em 11/4/2012, o Autor creditou, a solicitação desta, a conta da Ré Pardal, Lda. com
o valor de 9.639,00 €.
*
Não ficaram por demonstrar quaisquer factos com relevo para a decisão a proferir.
*
Fundamentação da decisão acerca da matéria de facto:
Para a fixação da matéria de facto, o Tribunal considerou quanto a 1. o acordo das
partes nos articulados e o teor dos documentos 1 e 2 juntos com a petição inicial; quanto a
2., o acordo das partes nos articulados e o teor dos documentos 3 e 4 juntos com a petição
inicial; quanto a 3., o acordo das partes nos articulados e o teor dos documentos 5, 6 e 7
juntos com a petição inicial; quanto a 4., o acordo das partes nos articulados.

Fundamentação de direito :

- Enquadrar a situação de facto apurada no instituto do enriquecimento sem causa,


explorando os respetivos requisitos à luz do disposto no artigo 473.º e segs. do Código Civil;
precisar estar em causa o segmento que no preceito se refere a indevidamente recebido;
- Configurar as várias formas sob as quais o enriquecimento se pode apresentar,
designadamente podendo este configurar um acréscimo patrimonial tout court, a
diminuição de uma situação debitória, a poupança de despesas, o uso de coisa alheia;
- Referir o carácter subsidiário do instituto (artigo 474.º do Código Civil), com relevo
para a situação dos autos, face à ausência de relação jurídica e outra fonte de obrigação
entre o Autor e a Ré Tecnoazienda;
- Explorar a inoponibilidade a Autor da matéria invocada pela Ré Tecnoazienda no que
concerne aos montantes de que era credora da Ré Pardal, Lda., e resultantes das relações
comerciais entre ambas;
- Referir que, perante a Ré Tecnoazienda, a única causa da transferência efetuada
pelo Banco Autor consistia na ordem recebida do seu cliente, a Ré Pardal, Lda., no sentido
de transferir um determinado montante, no caso de 5.000 €, não havendo, pois, neste
sentido e nas relações Autor/Ré Tecnoazienda, qualquer causa para a transferência também
efetuada do montante de 9.639,00 €;
- Referir que, face a desembolso pelo Banco Autor do valor, sua propriedade,
correspondente à quantia erradamente transferida, o enriquecimento se tem como
efetuado à custa do Banco Autor, outro elemento do enriquecimento sem causa a
preencher;
- Concluir pela inexistência de qualquer enriquecimento, no sentido pressuposto pelo
instituto, por parte da Ré Pardal, Lda., pois que, por um lado, a quantia de 9.639,00 € em
causa nos autos foi inteiramente retida pela Ré Tecnoazienda, e por outro, a situação de
eventual diminuição da sua situação debitória perante a Ré Tecnoazienda não é invocável
nesta sede e perante o Autor;
- Definir à luz do artigo 479.º do Código Civil a obrigação de restituir como
correspondente aos termos peticionados pelo Autor;
- Considerar justificado o pedido de condenação em juros, à luz do disposto nos
artigos 805.º, n.º 1, 806.º, n.ºs 1 e 2, 559.º, n.º 1 do Código Civil e na Portaria n.º 291/2003,
de 8 de abril;
- Quanto à responsabilidade tributária, referir que como a ação procede apenas
quanto à Ré Tecnoazienda, sendo a Ré Pardal, Lda. absolvida do pedido e a Ré
Agrimacchine absolvida da instância, as custas devem ficar a cargo do Autor e da Ré
Tecnoazienda, na proporção de 2/3 para o Autor e da 1/3 para a Ré Tecnoazienda - artigo
527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

IV - Dispositivo
Julgar a ação parcialmente procedente e, em consequência
a) Condenar a Ré Tecnoazienda no pagamento a Autor da quantia de 9.639,00 € (nove
mil seiscentos e trinta e nove euros), acrescida dos juros legais vencidos, à taxa de 4%, desde
a citação até à presente data, e dos juros vincendos até integral pagamento, à taxa legal em
vigor;
b) Absolver a Ré Pardal, Lda. do pedido contra si formulado pelo Autor.
Condenar o Autor e a Ré Tecnoazienda a pagarem as custas devidas, na proporção de
2/3 para o Autor e de 1/3 para a Ré Tecnoazienda.
Ordenar o registo e notificação da decisão.

Data
Assinatura
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Via Profissional

34.º CURSO DE FORMAÇÃO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

AVISO DE ABERTURA: AVISO N .º 15620/2017 , PUBLICADO EM D.R.


2.ª SÉRIE, N.º 249, DE 29 DE DEZEMBRO DE 2017

DATA: 24 DE FEVEREIRO DE 2018

1.ª CHAMADA

HORA: 14H15M (DE A C OR D O C O M O D I SP O ST O N O A R T . º 1 2. º D O


R E GU L A ME NT O IN TER N O D O C E NTR O D E E ST UD O S J U D IC IÁ R I O S, O T E M PO D E
D UR A Ç Ã O D A PR OV A I N IC IA - SE D EC OR R ID OS 1 5 M I NU T OS A P Ó S A H OR A
D ES I G NA D A )

DURAÇÃO DA PROVA: 4 HORAS

1
PROVA ESCRITA DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Via Profissional – 1.ª Chamada – 24 de fevereiro de 2018

1 – Para a presente prova disponibiliza-se as partes relevantes do seguinte conjunto de


peças processuais:
I - Promoção do Ministério Público para a Autorização de Interceções Telefónicas
II - Despacho de Autorização proferido pelo Juiz de Instrução Criminal
III - Transcrições de Interceções
IV - Auto de Declarações de Assistente
V - Auto de Transcrição de Gravação
VI - Auto de Inquirição de Testemunha
VII - Acusação do Ministério Público
VIII - Acusação pela Assistente
IX - Requerimento de Abertura da Instrução
X - Ata de Debate Instrutório

2 - A presente prova consiste na elaboração de uma Decisão Instrutória a ser proferida


nos Autos de Instrução com o NUIPC 222/17.0PSLSB, devendo ser apreciadas todas as
questões suscitadas no Requerimento de Abertura da Instrução ou que sejam de
conhecimento oficioso.

3 - Apesar de a prova consistir na elaboração de uma Decisão Instrutória, não poderá


conter qualquer assinatura, ainda que fictícia, pelo que, no final da peça, as/os candidatas/os
só deverão escrever as palavras seguintes:
“Data”
“Assinatura”.

4 - Cotação: 20 valores
I - A Cotação reporta-se às questões suscitadas no Requerimento de Abertura da
Instrução que deverão ser objeto de decisão:
1.
1.1 – 2, 5 valores
1.2 – 2,5 valores
1.3 – 2 valores

2 – 3 valores

3 – 1,5 valores

4 – 3 valores

5 – 3 valores

II – Componentes estruturais da decisão – 2,5 valores.

2
5 - A atribuição da cotação máxima nesta prova pressupõe um tratamento completo das
várias questões suscitadas ou de conhecimento oficioso, que deverá ser coerente e
corretamente fundamentado e com indicação dos preceitos legais aplicáveis.

6 - Na apreciação da prova relevarão, nomeadamente, a pertinência do conteúdo, a


qualidade da informação transmitida em relação à questão colocada, a organização da
exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o domínio da língua portuguesa.

7 - Os erros ortográficos serão considerados negativamente: 0,25 por cada um, até um
máximo de 3 valores.

8 - As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a grafia do


"Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa" (aprovado pela Resolução da Assembleia da
República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 43/91, ambos de 23
de agosto), deverão declará-lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que
lhes será entregue, escrevendo "Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução
da Assembleia da República n.º 26/91, não está em vigor com carácter de obrigatoriedade",
sendo a prova corrigida nesse pressuposto.

9 - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento


identificativo da/o candidata/o (a identificação constará apenas do destacável da folha de
rosto), sob pena de anulação da prova.

3
Elementos relevantes para a Decisão Instrutória

Considere os seguintes elementos com relevo para a elaboração da Decisão Instrutória:

I- A 1 de setembro de 2017, o Magistrado do Ministério Público titular do Inquérito com o NUIPC


111/17.0PSLSB, após a competente autorização judicial, ordenou a extração de certidão das
seguintes peças processuais desse Inquérito:
i) promoção do Ministério Público para autorização de escutas telefónicas ao
telemóvel com o número 992233445, utilizado pelo suspeito Albino Abreu;
ii) respetivo despacho de autorização proferido pelo Juiz de Instrução Criminal;
iii) transcrições dessas interceções, relativas às sessões 21 a 29;
iv) e despacho judicial que as validou,
e remeteu-os ao DIAP, conjuntamente com as cópias dos suportes técnicos, para
instauração do competente procedimento criminal, o qual veio a dar origem ao Inquérito com
o NUIPC 222/17.0PSLSB (fls. 1 a 13).

II- Dessa certidão do NUIPC 111/17.0PSLSB, na folha respeitante à promoção do Ministério


Público para a autorização de interceções telefónicas ao telemóvel com o número 992233445,
utilizado por Albino Abreu, encontra-se exarado, para o que ora releva:

4
Promoção do Ministério Público

“Dos autos resultam indícios bastantes de que o suspeito Albino Abreu integra um grupo de
indivíduos, devidamente organizados numa estrutura definida e com funções previamente
distribuídas, que se dedicam à prática de crimes. Foram já efetuadas diligências de
observação presencial à distância, com recolha de imagens (vejam-se autos de fls. 44, 55,
66, 77 e 88), que comprovam a existência de reuniões frequentes do grupo em questão, em
casa do suspeito Albino Abreu, bem como num armazém sito na zona comercial de São João
da Talha, na Estrada Municipal 22, ao Km 1, para onde se presume sejam transportados os
produtos dos crimes cometidos, no todo ou em parte. Neste momento, a fim de prosseguir a
investigação e com vista à descoberta da verdade, torna-se absolutamente imprescindível
levar a cabo interceções telefónicas ao telemóvel do suspeito, acima identificado, uma vez
que não se vislumbra que de outra forma menos intrusiva se consiga alcançar a identidade
de todos os membros da associação, bem como as respetivas atuações e funções
criminosas, sendo certo que qualquer outro meio de obtenção de prova, como v.g. uma busca
ao local, deitaria por terra o sucesso da presente investigação. Em face do exposto, promove-
se que seja autorizada a interceção telefónica ao telemóvel utilizado por Albino Abreu, com o
número 992233445, pelo período de 90 dias.
Remeta os autos ao Juízo Central de Instrução Criminal para apreciação pelo Juiz de
Instrução Criminal”.

III- Dessa certidão do NUIPC 111/17.0PSLSB, e na sequência da aludida promoção, consta a folha
respeitante ao despacho de autorização de interceções telefónicas ao telemóvel do suspeito
Albino Abreu, proferido em 2 de maio de 2017, pelo Juiz de Instrução Criminal, com o seguinte
teor:

5
Despacho de Autorização de Interceções

“Compulsados os autos, apura-se deles resultar que se investiga a prática pelo suspeito
Albino Abreu do crime de associação criminosa, previsto e punido pelo art. 299º, nº 1, do C.P.
O Ministério Público veio requerer a autorização judicial para que se proceda à interceção
telefónica do telemóvel com o número 992233445, o qual é habitualmente utilizado pelo
mencionado suspeito no aparelho com o IMEI 0099887766554433.
Nesta fase, mostra-se absolutamente imprescindível o recurso a este meio de obtenção de
prova para a descoberta da verdade material, conforme se exarou na promoção que
antecede.
Face ao exposto, autorizo a requerida interceção telefónica ao número e IMEI acima
identificados, pelo prazo de 90 dias.
Comunique por confidencial à operadora telefónica.
Devolva os autos ao MP.”

IV- Na mesma certidão, seguem-se as folhas atinentes às referidas interceções ao identificado alvo,
delas constando as transcrições das sessões 21 a 29, respeitantes ao dia 20 de julho de 2017,
compostas por sms enviados do telemóvel do suspeito para o telemóvel com o cartão nº
229988776, pertencente a Belmira Botão, com o seguinte teor:

6
Auto de Transcrição de Interceções

Sessão 21
- 1h 23m - já te liguei 2 vezes e não atendes, sua cabra sebenta, não te chegou?
queres levar outra?
Sessão 22
- 1h 45m - atende, que é melhor para ti
sessão 23
- 2h 10m - não vale a pena fugires, se não és minha também não és de ninguém
sessão 24
- 2h 25m - estou a ficar farto, ninguém goza comigo, bem me conheces, sabes bem
do que sou capaz
sessão 25
- 2h 29m - ou vives comigo ou tens a vida arruinada
sessão 26
- 2h 35m - não és a primeira a levar até estrebuchar
sessão 27
- 2h 48m - atende, cabra, já te mandei atender, olha que te mato
sessão 28
- 3h 01m - amanhã ajusto contas contigo de uma vez por todas, não penses que isto
fica assim
sessão 29
- 3h 10m - vou descobrir mais cedo do que julgas onde tens escondido esse coiro
e vais ganir a pedir perdão

V- Ainda na referida certidão do aludido Proc. 111/17.0PSLSB, encontra-se a folha cujo teor
consiste no despacho proferido em 28 de julho, pelo Juiz de Instrução Criminal, no qual
procedeu à validação das interceções compreendidas no período de 15 a 27 de julho.

VI- No Processo 222/17.0PSLSB, e a requerimento do Ministério Público, o Juiz de Instrução


Criminal determinou a junção aos autos da descrita certidão, composta pelos elementos
referidos nos pontos antecedentes, por os considerar indispensáveis para a descoberta da
verdade.

VII- A 11 de setembro de 2017 foi junto ao Processo 222/17.0PSLSB o Assento de Casamento de


Albino Abreu e Belmira Botão, no qual se encontra exarado que contraíram casamento civil em
21 de dezembro de 2016 (fls. 17).

7
VIII- A 18 de setembro de 2017, na sequência de notificação recebida para prestar depoimento no dia
25 de setembro, Belmira Botão apresentou nos autos 222/17.0PSLSB um requerimento para a
sua constituição como assistente.

IX- Por despacho do Juiz de Instrução Criminal, datado de 22 de setembro de 2017, foi deferida a
sua pretensão e Belmira Botão foi constituída assistente no Processo de Inquérito com o NUIPC
nº 222/17.0PSLSB, verificados que estavam os respetivos pressupostos e formalidades legais.

X- No dia 25 de setembro de 2017 foram tomadas declarações à assistente, as quais constam a fls.
31 dos autos, ínsitas no competente Auto de declarações (que se transcreve na íntegra),
devidamente datado e assinado nos termos legais, com o seguinte teor, para o que ora releva:

Auto de Declarações de Assistente

(fls. 31)
Auto de Declarações
Identificação: Belmira Branco Botão
Filiação: Zacarias Botão e Zaida Branco
Naturalidade – Lisboa Data de Nascimento: 7-2-1985
Estado civil: casada Nacionalidade: Portuguesa
Profissão: empregada de comércio BI - 54555455
Residência – Rua da Má-Hora, 13, 3º, Olivais Norte, Lisboa
___________________________________________________________________________
Perguntada sobre as suas relações de parentesco com e de interesse com o arguido, assistente,
partes civis e outras testemunhas disse: ser casada com o arguido.
___________________________________________________________________________
Foi advertida, nos termos do art. 145º, nº 5 e 6 do Código de Processo Penal, de que, para efeito
de receber as notificações referentes a estes autos, deverá indicar, neste momento, um domicílio
à sua escolha e de que a mudança da morada indicada deve ser comunicada através da entrega
de requerimento, ou remessa por via postal registada, à secretaria onde os autos se
encontrarem a correr no momento.
_______________________________________________________________________
À matéria dos autos, a assistente declarou que:

8
“Conheceu o arguido Albino Abreu no Verão de 2015, por intermédio de uma amiga, começou a
viver com ele em janeiro de 2016 e casaram em 21 de dezembro desse ano. No início estava
tudo bem, mas depois de uns três ou quatro meses de casados ele arranjou outra e começou a
insultá-la quase todos os dias, a dizer “já vais ver, um dia destes ainda te chego a roupa ao
pelo”; “se andas por aí no engate, temos o caldo entornado”; “já vais ver, olha que eu não sou
para brincadeiras, tu sabes bem da minha vida, quem se mete comigo tem os dias contados...”.
Mais disse que começava discussões com ela quase todos os dias por causa da comida que ela
fazia, que nunca lhe agradava, dizendo-lhe “não fazes nada de jeito, só porcaria, és uma cabra
sebenta”. Acrescentou que, então, após algum tempo, e já saturada, ela resolveu gravar uma
dessas discussões no seu telemóvel, porque tinha medo de não conseguir ver-se livre dele se
ninguém acreditasse nela em Tribunal, ou porque lhe poderia acontecer alguma coisa de mal. E
no dia 19 de julho, quando ele chegou a casa, pelas 13h, colocou de imediato o seu telemóvel
no bolso do avental, em posição de gravar - gravação que nesta diligência colocou em audição e
cujo teor se transcreve em Auto de Transcrição de Gravação, a seguir ao presente Auto de
tomada de declarações. Relatou que começaram a almoçar e de imediato o arguido atirou o
prato contendo a refeição contra a parede, dizendo que a comida estava uma merda salgada e
que ela só andava no engate, que não sabia fazer mais nada, que era uma cabra sebenta. O
arguido deu-lhe uma bofetada na face direita, com muita força, e puxou-lhe os cabelos, tendo ela
começado a gritar. De seguida abandonou a cozinha. Mais disse que logo que ele saiu de casa,
guardou os seus pertences numa mala de viagem e num saco, chamou um táxi e abandonou a
casa porque tinha medo dele e não queria mais viver assim. Ficou com a face vermelha, mas
não foi nem à Polícia, nem ao médico, nem contou a ninguém, com vergonha. E desde então
tem esta gravação no seu telemóvel. Nunca mais o viu e mudou de número de telemóvel no dia
seguinte, porque ele nessa noite ligou-lhe várias vezes e, como ela não atendia, ele enviou-lhe
sms com ameaças e ela sentia-se amedrontada. Acha que ele não sabe onde ela vive e
trabalha. Arranjou trabalho no shopping dos Olivais, como vendedora numa loja, e vive sozinha,
perto do trabalho, num estúdio que arrendou. Ele não costumava ir para esses lados da cidade,
por isso está mais ou menos tranquila. E mais não disse.

9
Auto de Transcrição de Gravação

(fls. 32)
Segue Auto de Transcrição de Gravação, consignando-se que a assistente entregou o seu
telemóvel com a gravação para ficar à ordem dos autos:
“voz masculina – A comida já está na mesa?
voz feminina – Sim. Anda, vamos comer.
Ouvem-se ruídos de arrastar de cadeiras e manuseamento de talheres e cerca de 45
segundos depois um estrondo de um estilhaço seguido de sons de objetos a cair no
chão. Ouve-se a
voz masculina exaltada - a comida está uma merda salgada; não sabes fazer nada,
senão andar por aí no engate, cabra sebenta!
De imediato, ouve-se o som de uma bofetada e um forte grito feminino e diz a
voz feminina - Larga-me!
E ouve-se um choro de mulher.
Ouve-se momentos depois o som de uma porta a bater ruidosamente.”

XI- A 9 de outubro de 2017 Albino Abreu foi constituído arguido no Proc. 222/17.0PSLSB e foi
interrogado para lhe ser aplicada uma medida de coação, tendo o mesmo feito uso do seu direito
ao silêncio. Nessa diligência, o Juiz de Instrução Criminal aplicou-lhe a medida de coação de
proibição de contactos com a assistente, prevista pelo art. 31.º, n.º 1, al. d) da Lei 112/2009 de
16/9, por verificação dos perigos constantes das al. b) e c) do art. 204.º do CPP.

XII- A 20 de outubro de 2017 foi inquirida a testemunha Cremilde Castro (fls. 65), residente na Rua
do Já-vais-ver, nº 7, 2ª A, em Lisboa, tendo a mesma dito, para o que ora releva, que:

10
Auto de Inquirição de Testemunha

(fls. 65)
“Desde março de 2017 vive por cima do apartamento onde moravam o arguido e a
assistente, mantendo com eles relações de vizinhança normais, cumprimentando-se, mas
sem nunca terem tido quaisquer conversas. Às vezes ouvia a voz dele, havia discussões em
voz alta e gritos, mas nunca percebeu exatamente o que diziam ou o que se passava. Mais
disse não saber os dias ou as noites em que ouvia essas discussões, mas uns tempos antes
de deixar de ver a assistente no prédio, elas eram bastante frequentes, todas as semanas as
ouvia. De resto, disse nunca ter visto nada, nem saber de nada sobre o casal”.

XIII- Em 2 de novembro de 2017 o MP proferiu Despacho de Acusação nos Processo com o NUIPC
222/17.0PSLSB, com o seguinte teor:

Acusação do Ministério Público

Proc. 222/17.0PSLSB

O Ministério Público vem, nos termos do disposto no art. 283º do C.P.P, deduzir
acusação, para Julgamento em Processo Comum, com intervenção do Tribunal Singular,
contra:

ALBINO AIRES ABREU, nascido em 13 de


janeiro de 1985, na freguesia Santo André,
concelho de Vila Nova de Poiares, distrito de
Coimbra, filho de Alcino Abreu e Aldina Aires,
casado, residente na Rua do Já-vais-ver, nº 7,
1º-A, em Lisboa

11
Porquanto indiciam suficientemente os autos que:

1- Albino Abreu e Belmira Botão partilharam casa, mesa e habitação desde janeiro de
2016, fixando residência na Rua do Já-vais-ver, nº 7, 1º-A, em Lisboa, tendo contraído
matrimónio em 21 de dezembro desse ano.
2- Em 19 de julho de 2017, Belmira Botão viu-se obrigada a deixar de viver na residência
comum do casal, porquanto:
3- Desde data não concretamente apurada do ano de 2017, mas que se situa a partir de
março ou abril, e até ao dia 19 de julho do mesmo ano, Albino Abreu disse-lhe, por
várias vezes, na residência comum do casal,
4- “já vais ver, um dia destes, ainda te chego a roupa ao pelo”; “se andas por aí no
engate, temos o caldo entornado”; “já vais ver, olha que eu não sou para brincadeiras,
tu sabes bem da minha vida, quem se mete comigo tem os dias contados...”
5- encetando com ela discussões sobre a falta de qualidade da comida que ela
confecionava, dizendo-lhe “não fazes nada de jeito, só porcaria, és uma cabra
sebenta”.
6- No dia 19 de julho de 2017, pelas 13h, após ter iniciado a toma da refeição do almoço,
Albino Abreu arremessou subitamente o prato com a comida contra a parede da
cozinha,
7- gritando: “a comida está uma merda salgada; não sabes fazer nada, senão andar por aí
no engate, cabra sebenta!”.
8- De seguida, desferiu uma bofetada na face direita de Belmira Botão e puxou-lhe os
cabelos com força.
9- Como consequência direta e necessária da conduta do arguido, Belmira Botão sofreu
dor na zona facial atingida,
10- o que a levou a emitir um forte grito, manifestando essa dor, e a chorar.
11- Momento em que o arguido saiu da cozinha e fechou a porta ruidosamente, e
ausentou-se da habitação comum.
12- Nesse mesmo dia, Belmira Botão abandonou a residência comum do casal e não mais
ali regressou.
13- Na madrugada do dia seguinte, dia 20 de julho de 2017, o arguido, através do seu
telemóvel com o nº 992233445, enviou para o telemóvel com o nº 229988776, de
Belmira Botão, os seguintes sms:
1h 23m:

12
já te liguei 2 vezes e não atendes, sua cabra sebenta
não te chegou? queres levar outra?
1h 45m
atende, que é melhor para ti
2h 10m
não vale a pena fugires
se não és minha também não és de outro qualquer
2h 25m
estou a ficar farto, ninguém goza comigo, bem me conheces, sabes bem do que
sou capaz
2h 29m
ou vives comigo ou tens a vida arruinada
2h 35m
não és a primeira a levar até estrebuchar
2h 48m
atende, cabra, já te mandei atender, olha que te mato
3h 01m
amanhã ajusto contas contigo de uma vez por todas, não penses que isto fica
assim
3h 10m
vou descobrir mais cedo do que julgas onde tens escondido esse coiro
e vais ganir a pedir perdão.

14- O arguido agiu nos moldes descritos querendo atingir a integridade física de Belmira
Botão, como conseguiu, bem sabendo que ela era seu cônjuge;
15- O arguido previu e quis proferir as expressões intimidatórias supra descritas dirigidas a
Belmira Botão, sabendo que as mesmas eram aptas a provocar-lhe medo, como
sucedeu;
16- O arguido previu e quis proferir as expressões ofensivas da honra e consideração de
Belmira Botão supra descritas, sabendo que as mesmas eram aptas a humilhá-la e
menorizá-la, como sucedeu;
17- Bem sabia o arguido que com a sua conduta, que concretizou de modo reiterado,
molestava psiquicamente Belmira Botão, seu cônjuge, menosprezando-a, humilhando-a
e ofendendo-a na sua honra e dignidade pessoais, no seio daquela que foi residência
comum do casal, sabendo que tal conduta era apta a ofender a saúde física e
psicológica dela.
18- O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, e sabia que a sua conduta era
proibida e punida por lei.

13
Em face do exposto, cometeu o arguido, como autor material e na forma consumada, um
crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152.º, n.º 1, al. a) e 2 do CP, requerendo-se a
aplicação da pena acessória de proibição de contactos com a vítima consagrados nos nº 4 e 5
do mesmo diploma legal.

Prova:

Requer-se que sejam tomadas declarações à assistente Belmira Botão

Documental:

1 - Certidão de fls. 1 a 13 (promoção do Ministério Público para autorização de interceções


telefónicas, despacho de autorização de interceções telefónicas, transcrições das sessões 21 a
29 e despacho de validação das mencionadas interceções datado de 28 de julho)

2 - Assento de casamento de fls. 17

3 - Auto de transcrição de gravação de fls. 32

Testemunhal:

- Cremilde Castro, residente na Rua do Já-vais-ver, nº 7, 2ª A, Lisboa

Lisboa, 2 de novembro de 2017

A Procuradora-Adjunta
FFF GGG

14
XIV- O mencionado despacho de acusação foi notificado ao arguido, à assistente e respetivos
advogados em 8 de novembro de 2017.

XV- Em 16 de novembro de 2017 foi apresentada acusação pela assistente nos seguintes
termos:

Acusação pela Assistente

Proc. NUIPC 222/17.0PSLSB

Senhor Doutor Juiz


do Tribunal da Instância Central Criminal de Lisboa

Belmira Botão, assistente nos autos à margem identificados, vem, ao abrigo do disposto
no art. 284.º do CPP, deduzir acusação contra o arguido

ALBINO AIRES ABREU, nascido em 13 de


janeiro de 1985, na freguesia Santo André,
concelho de Vila Nova de Poiares, distrito de
Coimbra, filho de Alcino Abreu e Aldina Aires,
casado, residente na Rua do Já-vais-ver, nº 7,
1º-A, em Lisboa
com os seguintes fundamentos:

A assistente acompanha a acusação pública quanto aos factos nela vertidos.

E, além deles, acrescenta os seguintes:


1 – No dia 10 de novembro de 2017, pelas 19h 30m, o arguido dirigiu-se a casa da assistente,
sita na Rua da Má-hora, nº 13, 3º, em Olivais Norte, Lisboa, esperando o regresso desta a esse
local, após o dia de trabalho;
2- E, no momento em que esta se preparava para entrar em casa, o arguido, inesperadamente,
surgiu das escadas que dão acesso ao hall que antecede a porta do apartamento e, tapando-

15
lhe a boca, disse-lhe “se vais falar contra mim, tens a vida arruinada. Vais dizer que não queres
falar! Mulher nenhuma goza comigo, muito menos uma cabra sebenta como tu”.
3- Ao agir desta forma, quis o arguido atemorizar a assistente para assim impedir que ela
prestasse depoimento contra ele no presente processo, compelindo-a a usar do seu direito de
se recusar a depor.
4- O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, e sabia que a sua conduta era proibida e
punida por lei.

Praticou o arguido o crime de ameaças previsto e punido pelo art. 153.º, n.º 1, do CP.

Prova: a indicada pelo Ministério Público.

XVI- Em 20 de novembro, o arguido e o seu advogado foram notificados da acusação pela


Assistente.

XVII- Em 24 de novembro de 2017, o arguido requereu a abertura da Instrução junto do Juízo


Central de Instrução Criminal de Lisboa, nos seguintes termos:

Requerimento de Abertura da Instrução

Processo 222/17.0PSLSB

Senhor Juiz de Instrução Criminal


do Juízo Central de Instrução Criminal de Lisboa

Albino Abreu, arguido nos autos à margem identificados, vem requerer, ao abrigo do
disposto nos art. 286.º e 287.º, n.º 1, al. a) do CPP, a abertura da Instrução nos termos e pelos
fundamentos seguintes:

16
1. Da nulidade da interceção telefónica cuja transcrição compõe a certidão que deu
origem ao presente processo:

1.1
- no âmbito do Proc. 111/17.0PSLSB, em que se investigou a prática do crime de
associação criminosa, p. e p. pelo art. 299.º, n.º 1, do CP, o telemóvel com o nº 992233445 do
ali e ora aqui arguido Albino Abreu foi sujeito a interceções telefónicas, por despacho de
autorização proferido em 2 de maio de 2017, o qual se transcreve:

“Compulsados os autos, apura-se deles resultar que se investiga a prática pelo suspeito
Albino Abreu do crime de associação criminosa, previsto e punido pelo art. 299.º, n.º 1, do C.P.
O Ministério Público veio requerer a autorização judicial para que se proceda à interceção
telefónica do telemóvel com o número 992233445, o qual é habitualmente utilizado pelo
mencionado suspeito no aparelho com o IMEI 0099887766554433.
Nesta fase, mostra-se absolutamente imprescindível o recurso a este meio de obtenção
de prova para a descoberta da verdade material, conforme se exarou na promoção que
antecede.
Face ao exposto, autorizo a requerida interceção telefónica ao número e IMEI acima
identificados, pelo prazo de 90 dias.
Comunique por confidencial à operadora telefónica.
Devolva os autos ao MP.”

- como se constata à evidência, o despacho de autorização padece de manifesta falta de


fundamentação quanto à imprescindibilidade do recurso a este meio de prova, um dos mais
intrusivos previsto no nosso ordenamento processual penal, fundamentação essa que é exigida
pelo disposto no art. 187.º do CPP e cuja omissão é cominada no art. 190.º, também do CPP,
com o vício de nulidade, reconduzível, no caso, à proibição de prova constante do art. 126.º, n.º
3 do mesmo diploma legal;
- encontrando-se ferido de nulidade o despacho de autorização, por constituir prova
proibida, ficam também inquinadas as interceções telefónicas que compõem as sessões 21 a
29, respetivas transcrições, bem como o despacho que as validou, documentos que estiveram
na origem dos presentes autos.
- ora, sendo nulo o despacho (e certidão do despacho) que despoletou os presentes

17
autos, é nulo todo o processado subsequente no presente processo, porque todo ele é
dependente daquele primeiro despacho.

1.2
E sem conceder, mais se acrescentará:
- como acima se referiu, no Proc. 111/17.0PSLSB investigou-se um crime do catálogo
elencado no art. 187.º, nº 1, do CPP, o de associação criminosa; ali era arguido o aqui arguido;
- nesse Processo, e por um mero acaso, a investigação deparou-se com os sms que
integram as sessões 21 a 29;
- tais sms, com o seguinte teor:

já te liguei 2 vezes e não atendes, sua cabra sebenta, não te chegou? queres levar
outra?

atende, que é melhor para ti

não vale a pena fugires, se não és minha também não és de outro qualquer

estou a ficar farto, ninguém goza comigo, bem me conheces, sabes bem do que sou
capaz

ou vives comigo ou tens a vida arruinada

não és a primeira a levar até estrebuchar

atende, cabra, já te mandei atender, olha que te mato

amanhã ajusto contas contigo de uma vez por todas, não penses que isto fica assim

vou descobrir mais cedo do que julgas onde tens escondido esse coiro
e vais ganir a pedir perdão

consubstanciam, no limite, um crime de ameaça, p. e p. pelo art. 153.º, n.º 1 do CP, não
o crime de violência doméstica, como adiante se demonstrará, o que desde já se invoca para
todos os legais efeitos;
- o crime de ameaça depende de queixa, nos termos do art. 153.º, n.º 2 do CP; ora, o
presente processo não foi despoletado por queixa apresentada por Belmira Botão, mas pela
certidão das interceções que serviram como notícia de crime para instauração de novo

18
inquérito, sendo ainda certo que das declarações tomadas à assistente não se extrai que a
mesma tenha dito que deseja procedimento criminal contra o arguido;
- não podendo o auto de interceção inicial servir de auto de notícia, nem de auto de
denúncia com formulação de queixa, carece o Ministério Público de legitimidade para a
prossecução da ação penal, devendo os autos ser arquivados, o que se requer.

1.3
Ademais,
- a ofendida e assistente contraiu matrimónio com o arguido em 21 de dezembro de
2016, matrimónio esse que ainda se mantém;
- a Belmira Botão foi tomado depoimento, em 25 de setembro de 2017, não tendo a
mesma sido advertida nos termos e para os efeitos do disposto no art. 134.º, n.º 2, do CPP,
conforme se extrai do respetivo auto, ou seja, de que tenha sido advertida de que se poderia
recusar a depor;
- pelo que o seu depoimento encontra-se ferido de nulidade, o que se invoca e se requer
seja declarado.

2. Da proibição de prova da gravação da conversa entre a assistente e o


ofendido junta aos autos por aquela para prova dos factos relativos ao dia 19 de julho de
2017
- no dia 19 de julho de 2017, a assistente procedeu à gravação de uma conversa havida
entre ela e o arguido,
- sem que este tivesse dado o seu consentimento para a realização de tal gravação.
- É a própria assistente que, nas suas declarações de fls. 31, confirma que procedeu à
referida gravação, levando o seu telemóvel ligado no bolso do avental para captar o som da
conversa, sem que o arguido tivesse disso conhecimento;
- a prova assim obtida viola o disposto no art. 126.º, n.º 3 do CPP, é nula e não pode ser
utilizada, o que se argui e se requer seja declarado;
- e com essa conduta, a assistente cometeu o crime previsto e punido nos art. 192.º, n.º
1, al. a) e 199.º, n.º 1, al. a), ambos do CP, o que levou o arguido a apresentar já no DIAP a
competente queixa judicial.

19
3. Da falta de indícios que sustentem a acusação quanto aos factos
ocorridos no dia 19 de julho de 2017

- note-se que os factos alegadamente ocorridos no dia 19 de julho sustentam-se


exclusivamente no depoimento da alegada ofendida e assistente e na gravação ilícita atrás
referida;
- de facto, a testemunha Cremilde Castro declarou não ter observado quaisquer factos;
- o depoimento da ofendida e assistente encontra-se ferido de nulidade por violação do
disposto no art. 134.º, n.º 1 e 2 do CPP;
- a gravação ilícita constitui prova proibida, nos termos do disposto no art. 126.º, n.º 3 do
CPP e 192.º, n.º 1, al. a) e 199.º, n.º 1 al. a) do CP;
- falece assim a prova que sustenta a imputação dos referidos factos,
- inexistindo, em consequência, indícios suficientes que sustentem a acusação, impondo-
se a não pronúncia do arguido por falta de indícios.

4. Da alteração da qualificação jurídica do crime de violência doméstica para o de


ameaça
sem conceder quanto às nulidades invocadas e falta de legitimidade do MP para o
procedimento criminal, e meramente por cautela de patrocínio, para o caso de tais vícios não
serem julgados procedentes, o que não se vislumbra possa vir a suceder, dir-se-á:
- os factos imputados ao arguido nas acusações reconduzem-se, sem qualquer margem
para dúvida, não ao crime de violência doméstica, mas ao crime de ameaça p. e p. pelo art.
153.º, n.º 1, do CP, ou porventura, e no limite, ao crime de perseguição, p. e p. pelo art. 154.º-
A, em concurso com o crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143.º, n.º 1,
CP.

5. Da nulidade da acusação pela Assistente


- a acusação pela Assistente acompanha os factos descritos na acusação pública;
- pelos motivos de direito acima referidos que ferem de nulidade a acusação pública, também
esta acusação enferma, nessa parte, do mesmo vício;
- além desses factos, a acusação pela Assistente imputa ao arguido outros, alegadamente
ocorridos no dia 10 de novembro de 2017, junto à porta da casa onde reside a assistente;

20
- ora, sobre estes factos não foi o arguido ouvido, devendo sê-lo, verificando-se, em
consequência, a nulidade a que se reporta o disposto no art. 120.º, n.º 2, al. d);
- desta feita, nesta parte, também a acusação pela Assistente se encontra ferida com o vício da
nulidade, o que deverá ser declarado na Decisão Instrutória a proferir;

Face a todo o exposto,

a) Deverão ser declaradas procedentes as invocadas nulidades e ser


proferido Despacho de Não Pronúncia, o que se requer;
b) sem conceder, e caso assim se não entenda, deve ser o arguido
pronunciado apenas pelo crime de ameaça, p. e p. pelo art. 153.º, n.º 1 ou, no limite, pelo
crime de perseguição, p. e p. pelo art. 154.º-A, em concurso com o de ofensas à
integridade física, p. e p. pelo art. 143.º, todos do CP.

Junta:

XVIII- Certidão do Proc. 111/17.0PSLSB que contém a folha relativa à promoção do Ministério
Público, datada de 16 de agosto, para validação das interceções compreendidas no período de
28 de julho a 11 de agosto, seguida do despacho proferido em 18 de agosto pelo Juiz de
Instrução Criminal, no qual procedeu à respetiva validação.

XVIII - Após a competente distribuição dos autos 222/17.0PSLSB, e uma vez aberta conclusão,
foi proferido despacho pelo Juiz de Instrução Criminal, datado de 4 de janeiro de 2018, no qual
declarou aberta a instrução, por se encontrarem verificados os pressupostos legais para o efeito,
nos termos do art. 287.º do CPP. No mesmo despacho se exarou que, por não ter sido requerida
produção de prova e se entender inexistir necessidade da prática de qualquer outro ato de
instrução, se designava o dia 19 de janeiro para a realização do Debate Instrutório, o qual se
realizou na data prevista e cuja ata se transcreve:

21
Ata de Debate Instrutório

Processo: 222/17.0PSLSB
Instrução

ATA DE DEBATE INSTRUTÓRIO

Data: 19 de janeiro de 2018


Hora: 14h 30m
Juíza de Direito: AAA BBB
Procuradora–Adjunta: CCC DDD
Escrivã Auxiliar: EEE LLL

Sendo a hora marcada, publicamente e de viva voz, identifiquei os presentes


autos de instrução, e de imediato procedi à chamada de todas as pessoas que nele
devem intervir, após o que comuniquei verbalmente à Mma. Juíza de Direito o rol dos
presentes e dos faltosos, a saber:
Presentes:
Assistente: Belmira Botão
Mandatário da assistente: HHH IIII
Arguido: Albino Abreu
Defensor do arguido: JJJ KKK

Pela Mma. Juíza de Direito, AAA BBB, foi declarada aberta a presente diligência de
debate instrutório, tendo de seguida feito uma exposição sumária sobre os atos de
instrução a que se procedeu e sobre as questões de prova relevantes para a decisão
instrutória que apresentem, em sua opinião, caráter controverso – art. 302.º, n.º 1 do
CPP.
A Digna Procuradora-Adjunta e os Ilustres Advogados declararam não ter qualquer
prova suplementar a apresentar.

De seguida, a Mma. Juíza concedeu a palavra de novo à Digna Magistrada do Ministério


Público e pela mesma foi dito que o arguido, face à evidência probatória constante dos
autos e correta subsunção fáctico-jurídica, entendeu invocar uma panóplia de nulidades

22
que carecem de completa sustentação legal, pelo que se impõe à Meritíssima Juíza
julgá-las, in totum, improcedentes.

Dada a palavra ao Ilustre Mandatário da Assistente pelo mesmo foi dito subscrever na
íntegra e dar por reproduzidas as doutas alegações do Ministério Público.

Dada a palavra ao Ilustre Mandatário do arguido, pelo mesmo foi dito reiterar o conteúdo
do Requerimento de Abertura de Instrução, pedindo a Não Pronúncia do arguido.
*
Em seguida, a Mma. Juíza declarou encerrado o debate instrutório e proferiu o seguinte:

DESPACHO
Para a leitura da decisão instrutória designo o próximo dia 26 de janeiro de 2018, pelas
14h 30m, neste Tribunal.
*
Todos os presentes foram devidamente notificados, tendo a audiência sido declarada
encerrada quando eram 11h 50m.

-A presente ata foi integralmente revista e por mim, EEE LLL, elaborada.

AAA BBB
EEE LLL

23
PROVA PROFISSIONAL – 1ª CHAMADA – 24/2/2018

GRELHA DE CORRECÇÃO

cotação
- Breve relatório
I - Componentes - Saneamento – com o tratamento das nulidades suscitadas
estruturais da DI - Breve enquadramento legal da instrução
- Análise crítica da factualidade indiciária
- Subsunção da factualidade indiciária ao Direito
- Parte decisória

- declaração da nulidade da acusação pela assistente na parte


em que imputa os factos relativos ao dia 10/11/17
- decisão de pronúncia, podendo ser feita a remissão para os
factos constantes da acusação do MP, nos termos legais
- indicação da prova, podendo ser feita por remissão para a
prova constante da acusação do MP, nos termos legais
- condenação em custas, com fixação de taxa de justiça
- estatuto coactivo
- remessa dos autos à Instância Central Criminal de Lisboa
2,5
II- resolução das Tópicos de resposta
questões sobre
nulidades suscitadas no
RAI
1. Nulidade da
intercepção telefónica
1.1 nulidade do - distingue o regime constitucional e processual da proibição de
despacho de prova dos art. 32º/8 CRP e 126º CPP do regime das nulidades
autorização das processuais – art. 119º a 123º CPP;
escutas? - reconduz a autorização fora dos casos admitidos no art. 187º a
uma proibição de prova, por violação dos art. 32º/8 e 32º/4 da
CRP e 126º/3CPP e 187º/1 CPP;
- e reconduz o vício da falta de fundamentação e o da
fundamentação deficiente ao regime das nulidades processuais
dos art. 120º/1 e 2 CPP ex vi art. 190º CPP (na senda do AUJ
1/2018);
- analisa o teor do despacho de autorização à luz do art. 187º/1,
relevando a remissão para a fundamentação constante da
promoção que antecede, que considera suficiente, admitindo-se
a formulação de remissão, desde que a fundamentação conste
do texto para o qual se remete
- afasta o vício da nulidade processual, declarando-a
improcedente
ou
- considera o despacho nulo por falta de fundamentação, que
considera genérica, carecendo de concretização ao caso; não
obstante, considera válida a prova obtida através das
declarações da assistente, porque autónoma das interceções,
aproveitando-se todos os actos processuais subsequentes à
certidão;
ou
- considera que o despacho de autorização se encontra
deficientemente fundamentado, o que é distinto da falta de
fundamentação, declarando a existência de uma irregularidade.

1
Tal invocação é extemporânea – art. 123º CPP - porquanto o
arguido teve contacto com os factos/ termos do Proc. no
momento da tomada de declarações e aplicação de MC. 2,5
1.2 falta de - constata que os sms consubstanciam um conhecimento
legitimidade do MP fortuito, distinguindo esta figura da dos conhecimentos de
para a prossecução da investigação, caracterizando uns e outros;
acção penal? - verifica que se encontram observados os requisitos legais
previstos no art. 187º/7, referindo a identidade do suspeito e do
crime de catálogo - violência doméstica – art. 187º/1/a;
- refere que a verificação dos requisitos quanto ao crime do
catálogo se afere pela qualificação que é feita no momento da
autorização;
- refere que no momento da aquisição da notícia do crime se
afere a sua natureza;
- analisa os sms, efetuando a sua subsunção ao tipo de crime de
violência doméstica, afastando o mero crime de ameaças – pode
remeter o cotejo analítico dos tipos para o momento infra em
que se explana a qualificação jurídica dos factos ou efectuá-lo
neste momento;
- conclui pela desnecessidade de apresentação de queixa e pela
legitimidade do MP para a prossecução da ação penal; 2,5
1.3 nulidade por - equaciona se se trata de uma proibição de prova e conclui -
inobservância do art. admite-se a solução do Ac. STJ de 11/2/2015 (Proc.
134º CPP? 182/13.1PAVFX), mas também que se entenda tratar-se não de
uma proibição de prova, mas de uma nulidade que deve ser
arguida;
- expõe a problemática da extensão ao assistente da prerrogativa
contida no art. 134º/1 e conclui – vem-se entendendo que é
extensível – cfr. art. 145º/3
- coloca a questão da legitimidade do arguido para invocar a
nulidade, tomando posição, que deverá ser negativa, uma vez
que o interesse protegido é o do cônjuge / assistente, não o da
defesa;
- conclui pela improcedência da nulidade por:
falta de legitimidade do arguido para a arguir;
e ademais porque, quer se entenda que consubstancia uma
proibição de prova do art. 126º/3, quer uma nulidade do art.
120º/1, na acusação pela assistente na parte em que remete
para o requerimento de prova constante da acusação do MP,
consta o relativo às suas próprias declarações, o que configura o
seu consentimento expresso ex post, na linha do aludido Ac., ou
presumido (ainda que se tenha por não escrito o rol por
inobservância do disposto no art. 284º/2/b, nada obsta a que,
para este efeito, releve a vontade aí expressa pela assistente em 2
ter sido e vir a ser ouvida)
2. a gravação é prova - situa a captação de som sem o consentimento do visado no
proibida? âmbito do conteúdo do art. 126º/3 CPP;
- constata a existência de duas perspetivas possíveis e opta
fundamentadamente por uma delas ou explana uma perspetiva
à qual adere, fundamentando-a de forma consistente:
i) a gravação constitui prova válida, entendendo-se, para tanto,
que a assistente, ao violar a reserva à vida privada do arguido,
agiu ao abrigo de uma causa de justificação (v.g. Ac. TRL, Proc.
10210/2008-9, de 28-05-2009; Ac. TRE, Proc. nº
2499/08.8TAPTM.E1, de 28/06/2011; Ac. TRE, Proc. nº
932/10.8PAOLH.E1, de 24/04/2012”;
ii) equaciona os valores em questão, ou seja, se é de aceitar uma

2
recolha de prova para processo criminal por particulares, ao
arrepio das normas processuais, em violação da tutela da reserva
da vida privada prevista no CP (a assistente, quando decidiu
gravar a conversa, não tinha lançado mão da tutela penal para
fazer valer o seu direito à proteção do bem jurídico
compreendido na norma da VD, não obstante os factos estarem
a suceder há cerca de quatro meses, nem a gravação afasta
qualquer perigo atual incidente sobre a sua integridade física ou
liberdade pessoal, atinente a esse momento da gravação),
concluindo que a violação da reserva da vida privada do arguido
pela assistente não estava a coberto de uma causa de
justificação. Ademais, admite-se que se considere que a causa de
justificação existente no momento da gravação deixou de
subsistir porque a situação de facto se alterou ou que a causa de
justificação outorga apenas um direito de defesa contra um
ataque pontual e atual e não um direito geral de garantia de
prova (Cfr. Costa Andrade, As Proibições de Prova em Processo
Penal, Reimp., p. 260-261).
- admite-se qualquer solução desde que devidamente
fundamentada. 3
3. insuficiência de Considera, de acordo com o atrás explanado
indícios – factos 19/7? - declarações da assistente (válidas)
(admite-se que seja feito - gravação som (válida? Inválida?)
neste momento ou infra, - depoimento da testemunha (corrobora os factos, ainda que de
aquando da análise crítica forma difusa)
da factualidade indiciária)
e conclui, em conformidade, pela existência de indícios 1,5
4. qualificação jurídica De forma sucinta
dos factos? - define os bens jurídicos tutelados pelos crimes de violência
(admite-se que seja feito doméstica (saúde, na sua vertente física, psíquica e mental),
neste momento ou infra, ameaças (liberdade de decisão e de acção) e perseguição
aquando da subsunção (liberdade de decisão e acção)
fáctico-jurídica)
- identifica os elementos objectivos e subjectivos que os
diferenciam, admitindo-se que identifique apenas os elementos
essenciais diferenciadores, como segue
- VD: o agente, que se encontra numa determinada relação
para com o sujeito passivo, exerce violência física e psicológica,
verbal e sexual sobre a vítima – humilhações, provocações,
molestações - com dolo em qualquer uma das suas modalidades;
- ameaça: o agente anuncia um mal futuro, cuja ocorrência
depende da sua vontade, actuando com dolo em qualquer uma
das suas modalidades;
- perseguição: o agente actua por qualquer meio que seja
apto a provocar medo ou inquietação ou a prejudicar a liberdade
de determinação do destinatário, com qualquer uma das formas
de dolo

- analisa o concurso aparente (no caso o crime de VD concorre


com o de ofensas à integridade física simples, ameaça e
perseguição) e real (inexiste) entre estes tipos de ilícito,
concluindo que o crime de violência doméstica consome os
demais
- e conclui pela existência do crime de violência doméstica,
solução que se afigura a mais correcta em face da factualidade
indiciária in totum 3
5. ex officio – acusação - constata ex officio que os factos constantes da acusação pela
pela assistente – assistente não foram objecto da investigação por não ter havido
vícios? notícia deles (factos posteriores ao encerramento do inquérito)

3
- não o tendo sido, há quanto a eles os vícios da nulidade
insanável da falta de inquérito e da falta de promoção, do art.
119º, al. b) e d), sendo certo que, além do mais, o crime de
coação reveste natureza semipública (art. 154º/1 e 4), pelo que
sempre seria o MP que teria legitimidade para deduzir a
competente acusação;
- refere que a nulidade de falta de inquérito “consome” a
alegada nulidade relativa de falta de audição do arguido, que
assim perde relevância;
- conclui pela existência das referidas nulidades, de
conhecimento oficioso, e declara que a acusação pela assistente
se encontra ferida de nulidade, na parte em que alega os novos
factos do dia 10/11/17, admitindo-se apenas na parte em que
acompanha a do MP (admite-se o entendimento da sua
inexistência, nesta parte viciada). 3
20

4
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Via Profissional

34.º CURSO DE FORMAÇÃO PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

AVISO DE ABERTURA: AVISO N .º 15620/2017, PUBLICADO EM D.R. 2.ª


SÉRIE, N.º 249, DE 29 DE DEZEMB RO DE 2017

DATA: 1 DE MARÇO DE 2018

2.ª CHAMADA

HORA: 14H15M (DE ACORDO COM O D I S PO ST O NO ART.º 12.º DO


R E GU L A ME NT O IN TER N O D O C E NTR O D E E ST UD O S J U D IC IÁ R I O S, O T E M PO D E
D UR A Ç Ã O DA PR OV A I N IC IA - SE D EC OR R ID OS 15 M I NU T OS APÓS A H OR A
D ES I G NA D A )
PROVA ESCRITA DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL

DURAÇÃO DA PROVA: 4 HORAS


PROVA ESCRITA DE
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL
Via Profissional – 2.ª Chamada – 01 de março de 2018

1 – Para a presente prova disponibiliza-se as partes relevantes do seguinte


conjunto de peças processuais:

I - Acusação
II - Requerimento de Abertura de Instrução
III - Elementos recolhidos no Inquérito
1. Auto de Notícia
2. Auto de Inquirição de Testemunha
3. Auto de Inquirição de Testemunha
4. Auto de Inquirição de Testemunha
5. Auto de Inquirição de Testemunha
6. Auto de Interrogatório de Arguido e Auto de Constituição de
Arguido
7. Relatório da Perícia de Avaliação do Dano Corporal em
Direito Penal
8. Auto de Busca Domiciliária e Apreensão
9. Termo de Autorização de Busca
10. Auto de Visionamento de Imagens
11. Auto de Denúncia
12. Documento
13. Documento – Informação Clínica
14. Certificado de Registo Criminal
15. Documento - Certidão do teor
16. Documentos - Contratos de Trabalho
IV - Elementos Resultantes das Diligências Instrutórias
A. Auto de Inquirição de Testemunha
B. Auto de Inquirição de Testemunha

2 - Deve considerar-se:
I - que não houve oposição dos sujeitos processuais nem foi
solicitado prazo suplementar (no caso de entender que, da instrução, resulta
alteração da qualificação jurídica dos factos ou alteração não substancial destes);
II - na Instrução e por decisão do Juiz de Instrução Criminal,
foi oficiosamente determinada a audição de Berto Brito e Carla Costa.

3 - A presente prova consiste na elaboração de uma Decisão Instrutória a


ser proferida nos Autos de Instrução com o NUIPC 1234/17.4PAFAR, devendo ser
apreciadas todas as questões suscitadas no Requerimento de Abertura de
Instrução ou que sejam de conhecimento oficioso.

4 - Apesar de a prova consistir na elaboração de uma Decisão Instrutória,


não poderá conter qualquer assinatura, ainda que fictícia, pelo que, no final da
peça, os/as candidatos/as só deverão escrever as palavras seguintes:
“Data”
“Assinatura”.
5 - Cotação: 20 valores
I - A Cotação reporta-se às questões suscitadas no
Requerimento de Abertura de Instrução que deverão ser objeto de decisão:
A.
1.) e 2.) – 2 valores
3) e 4) – 3 valores
5) e 6) – 3 valores

B.
7) e 8) – 5 valores

C.
9) a 12) – 3,5 valores

II – Componentes estruturais da decisão – 3,5 valores.

6 - A atribuição da cotação máxima nesta prova pressupõe um tratamento


completo das várias questões suscitadas ou de conhecimento oficioso, que deverá
ser coerente e corretamente fundamentado e com indicação dos preceitos legais
aplicáveis.

7 - A peça processual elaborada pelo/a candidato/a que padeça dos vícios


de nulidade ou inexistência é susceptível de ser penalizada até um máximo de 3
valores.

8 - Na apreciação da prova relevarão, nomeadamente, a pertinência do


conteúdo, a qualidade da informação transmitida em relação à questão colocada, a
organização da exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o
domínio da língua portuguesa.
9 - Os erros ortográficos serão considerados negativamente: 0,25 por cada
um, até um máximo de 3 valores.

10 - Os/as candidatos/as que na realização da prova não pretendam utilizar


a grafia do "Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa" (aprovado pela Resolução
da Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da
República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-
lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que lhes será
entregue, escrevendo "Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela
Resolução da Assembleia da República n.º 26/91, não está em vigor com carácter
de obrigatoriedade", sendo a prova corrigida nesse pressuposto.

11 - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer


elemento identificativo do/a candidato/a (a identificação constará apenas do
destacável da folha de rosto), sob pena de anulação da prova.
ACUSAÇÃO

O Ministério Público deduz acusação para julgamento em processo comum e


perante Tribunal Colectivo contra:

Ana Andrade Anes, solteira, enfermeira auxiliar, filha de


Adeodato Anes e de Alzira Andrade, nascida a 25 de
Maio de 1975 na freguesia da Sé, Faro, titular do CC n.º
12345678, emitido pelo Arquivo de Identificação de
Faro, residente na Rua Francisco José, Lote 4 – 5º Esq.,
Urbanização dos Plátanos, Faro

1.) A arguida Ana Anes viveu em comunhão de cama, habitação e mesa com Berto Brito, desde
meados de 2005 até 4 de Setembro de 2017.

2.) Residiram na Rua Francisco José, Lote 4 – 5º Esq., Urbanização dos Plátanos, Faro,
correspondente a fracção adquirida com recurso a crédito bancário e em que são mutuários a
arguida e o indicado Berto, outorgantes na escritura pública de compra e venda do imóvel.

3.) Entre 2010 e 2015, durante a vivência em comum com a arguida, o ofendido Berto sempre
explorou um estabelecimento de venda de jornais, revistas e tabaco e, nesse período, quando
chegava a casa, a arguida exigia-lhe todo o dinheiro proveniente desse trabalho.

4.) Quando Berto se recusava a entregar todas essas quantias à arguida, esta desferia-lhe
bofetadas na cara e discutia com o mesmo para o pressionar a entregar-lhe tais montantes,
apelidando-o de “frouxo”, “imprestável” e dizendo que andava “metido com todas”.

5.) A arguida sabia que, ao actuar na residência comum com o ofendido, ampliava o
sentimento de receio deste, visto que violava o espaço reservado da vida privada do casal.

6.) Berto Brito, apesar de sofrer continuadamente estes comportamentos desde data não
concretamente apurada mas pelo menos entre 2010 e 2015, por medo, nunca apresentou
queixa, tendo mesmo declarado neste processo que não desejava procedimento criminal.

7.) A arguida praticou estes actos de forma consciente e livre, querendo provocar no
companheiro mau estar psicológico, lesões físicas, bem como atormentá-lo e diminuí-lo
enquanto homem e então companheiro, o que conseguiu, bem sabendo que o seu
comportamento era proibido e punido pela lei penal.

8.) No dia 4 de Setembro de 2017, cerca das 20.00h, Berto chegou a casa após um dia de
trabalho na loja de venda de jornais, revistas e tabaco que explorava no centro da cidade de
Faro.

9.) Sabendo a arguida que Berto traria algum dinheiro referente ao apuro de caixa desse dia,
exigiu ao mesmo a entrega de todo esse dinheiro como o fizera pelo menos no período de
2010 a 2015.

10.) Ao que Berto entregou € 100,00 à arguida, afirmando-lhe que ficaria com € 25,00 para os
seus gastos pessoais.

11.) A arguida, não satisfeita com a resposta e por pretender a quantia total de € 125,00,
munida de objecto não apurado mas com características cortantes, dirigiu-se a Berto - que se
encontrava apenas vestido com cuecas e que se deslocava para a casa de banho com o
objectivo de tomar banho - e, sem que nada o fizesse prever, agarrou-o na zona dos testículos
e desferiu, com o dito objecto, um golpe na região genital de Berto, cortando-o no pénis e
escroto numa extensão de 6 cm.

12.) Berto vestiu-se e saiu de casa, a fim de procurar ajuda e, por sangrar profusamente,
deslocou-se ao café “Amparo”, existente em frente ao prédio do casal, ali referindo, por
vergonha, que se tinha ferido acidentalmente na zona genital ao cair da bicicleta em que
habitualmente se deslocava de e para o trabalho.

13.) Por manifestar necessidade urgente de receber tratamento hospitalar foi accionado o
número de emergência 112 e enviada uma ambulância do INEM que transportou o ofendido
para o Centro Hospitalar do Algarve – Hospital de Faro, onde recebeu pronta assistência
médica.

14.) Como consequência directa e necessária desta conduta da arguida, o ofendido Berto
sofreu as seguintes lesões:

No períneo: ferida linear regular na base do pénis com 6 cm suturada com 8 pontos de seda.

No pénis: edema e equimose arroxeada de todo o órgão.

Testículo esquerdo: várias escoriações, duas das quais com pontos de sutura de seda e edema
testicular.
15.) Tais lesões determinaram ao ofendido 25 (vinte cinco) dias de doença, com afectação da
capacidade de trabalho geral e profissional assim como, por seccionamento do epidídimo, de
forma permanente e irreversível, a perda da função de procriação.

16.) Ao actuar como actuou no dia 4 de Setembro de 2017 a arguida fê-lo de forma livre,
deliberada e consciente, com o propósito concretizado de molestar o corpo e a saúde do
ofendido, pretendendo com tal actuação atingir um órgão importante e causar-lhe os
ferimentos verificados;

17.) Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

18.) Após alta hospitalar concedida no dia 6 de Setembro de 2017, Berto passou a viver junto
da sua mãe, na cidade de Faro, por temer futuras reacções da arguida, deslocando-se à fracção
onde aquela continuou a residir, no dia 11 de Setembro de 2017, a fim de daí retirar os seus
pertences pessoais.

19.) A arguida, desde 2000, desempenha as funções de enfermeira auxiliar no serviço de


urologia e transplantação renal do Centro Hospitalar do Algarve – Hospital de Faro, por
contrato de trabalho público, ali trabalhando também, como enfermeira, Carla Costa.

20.) Por via dos contactos proporcionados pelo trabalho a arguida e Carla Costa
desenvolveram uma relação de amizade e, pelo menos desde 2010, esta passou a ser visita
regular na casa da arguida e de Berto Brito.

21.) Berto Brito e Carla Costa, na sequência da convivência e dos contactos que foram
mantendo, também desenvolveram uma forte relação de amizade e, a partir de meados de
2011, passaram a nutrir sentimentos de amor um pelo outro e, pelo menos em duas ocasiões,
envolveram-se sexualmente.

22.) A arguida, por desconfiar que a relação entre Berto e Carla ia para além da amizade e
entendendo que esta era uma má influência para aquele, movida pelo ciúme, pensou em
prejudicá-la no serviço onde ambas trabalhavam.

23.) Na concretização desse desiderato, naquele mesmo dia 4 de Setembro de 2017, cerca das
15.00h a arguida notou que estava ao cuidado e sob custódia do serviço um rim humano,
proveniente de recolha autorizada em cadáver efectuada no hospital, órgão viável para
ulterior transplante em beneficiário compatível de acordo com os critérios de preferência.
24.) O órgão encontrava-se acondicionado em arca refrigerada, depositado em sala de acesso
condicionado nas instalações do Centro Hospitalar do Algarve – Hospital de Faro.

25.) A abertura da porta da sala era feita através de leitor de cartões com banda magnética na
qual estava inserida informação referente ao respectivo titular e permissões de acesso.

26.) Apenas por força das suas funções e para o exercício delas, a arguida e a Carla Costa eram
titulares de cartões com permissões de acesso.

27.) Aproveitando-se da ausência da Carla Costa, naquele momento em período de descanso,


a arguida, sabendo que aquela mantinha o seu cartão de acesso no seu cacifo pessoal do
vestiário do serviço, ali se dirigiu e, do indicado cacifo, retirou uma carteira contendo
documentos de identificação pessoal de Carla Costa (cartão de cidadão e carta de condução), o
cartão de serviço que permitia o acesso à sala de depósito de material para transplante e oito
notas de € 20,00 (vinte euros), emitidas pelo Banco Central Europeu, apoderando-se da dita
carteira e do seu conteúdo.

28.) Na posse do cartão de acesso emitido em nome de Carla Costa, pelas 15h 17m e 13s desse
mesmo dia 4 de Setembro de 2017, a arguida passou pelo leitor existente o cartão contendo as
informações pessoais e permissões reportadas à titular, desta forma, como se de Carla Costa
se tratasse, desbloqueando o acesso à sala onde se encontrava depositado o órgão humano,
apoderando-se do mesmo e abandonando as instalações do hospital.

29.) Em virtude da actuação da arguida foi comprometida a cadeia de custódia e a refrigeração


do órgão, tornando-o imprestável para transplante.

30.) A arguida agiu voluntária, livre e conscientemente, querendo fazer sua a carteira e
respectivo conteúdo, assim como o órgão humano destinado a transplante, sabendo que o
fazia sem autorização e contra a vontade, respectivamente, da respectiva proprietária e da
administração do hospital, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei
penal.
Com as descritas condutas cometeu a arguida, em autoria material e em concurso
efectivo:

- 1 (um) crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152º n.º 1 al. b) e 2 do Cód.
Penal;

- 1 (um) crime de ofensa à integridade física grave, p. e p. pelo art.º 144º al. b) do Cód.
Penal;

- 2 (dois) crimes de furto, p. e p. pelo art.º 203º n.º 1 do Cód. Penal.

PROVA:

Testemunhal

- José Firmino de Sousa, casado, agente da PSP (…) [1]

- Berto Brito, solteiro (…) [2]

- Belmira Borges, casada, (…) [3]

- Delmina Darques, viúva, (…) [4]

- Carla Costa, divorciada, (…)[5]

Pericial

- Relatório médico-legal de fls. (…) [7]

Documental

- Informação clínica de fls. (…) [13]

- Auto de Busca e Apreensão de fls. (…) [8]

- Auto de Visionamento de Imagens de fls. (…) [10]

- Informação e listagem de fls. (…) [12]


- Certidão de fls. (…) [15]

- Contratos de fls. (…) [16]

- Certificado de Registo Criminal de fls. (…) [14]

Estatuto coactivo: Promovo que a arguida aguarde os ulteriores termos do processo


sujeita às obrigações decorrentes do termo de identidade e residência, já prestado, medida de
coacção que se nos afigura adequada, suficiente e proporcional por não se verificarem, nos
autos, os requisitos gerais previstos no art.º 204º do Cód. Proc. Penal.

(…)

Faro, 10 de Novembro de 2017

O Procurador-Adjunto

JJ
REQUERIMENTO DE ABERTURA DE INSTRUÇÃO

Proc. n.º 1234/17.4PAFAR

Exmo. Sr. Juiz de Instrução Criminal de Faro

Ana Andrade Anes, arguida nos autos supra identificados, notificada da


acusação, vem requerer a abertura da instrução nos termos e com os
seguintes fundamentos:

A) Das nulidades/proibições de prova

1.) O pretenso juízo indiciário que sustenta a acusação e no que tange


aos crimes de violência doméstica e ofensa à integridade física grave decorre
das declarações prestadas por Berto Brito.

2.) Berto Brito era, à época, companheiro da ora arguida e aqui


requerente pelo que, previamente à prestação de depoimento, teria que ser
advertido nos termos e para os efeitos previstos no art.º 134º n.º 2 do Cód. Proc.
Penal, o que não sucedeu, o que implica a proibição de valoração do seu
depoimento, nos termos do art.º 126º n.º 2 al. a) do mesmo diploma legal, o
que se pretende ver declarado.

3.) Também no que concerne à pretensa subtracção do rim humano –


conduta que, como se afirmará, se considera atípica – os indícios recolhidos
fundam-se nas imagens obtidas por câmara de vigilância existente na sala de
depósito do material para transplante e no resultado da busca domiciliária
realizada no dia 11 de Setembro.

4.) Ora a captação de imagens não se encontrava, como devia,


anunciada, sendo ilegítima e insusceptível de valoração;

5.) A busca domiciliária é nula, porquanto efectuada sem autorização


judicial (art.º 177º n.º 1 do Cód. Proc. Penal), sendo que o consentimento então
prestado por Berto Brito para a sua realização é inidóneo já que aquele havia
cessado a coabitação.

6.) Sendo consequentemente nulas as apreensões ocorridas no decurso


da mesma.

B) Da ausência de indícios

7.) Considerando o atrás exposto e não podendo ser considerados os


seguintes meios de prova/de obtenção de prova:

- Declarações de Berto Brito

- Imagens de CCTV

- Busca domiciliária e apreensão

Não há, por conseguinte, quaisquer indícios que sustentem a imputação dos
crimes constantes da acusação pública.

8.) A acusação funda-se, tão-somente, em meros elementos


circunstanciais, especulativos, em clara dissonância com o imperativo da
presunção de inocência e dos deveres de legalidade e objectividade que
devem nortear a actuação do MP: - nada do que se refere ter ocorrido no
domicílio do casal pode ser atestado por meios válidos e atendíveis, as lesões
verificadas em Berto Brito terão resultado (como o próprio terá afirmado
perante terceiros e em espaço público) de um acidente com o velocípede e
o desaparecimento de um órgão em meio hospitalar ou a pretensa
subtracção de uma carteira também não são assacáveis à arguida, quando o
registo da entrada na sala de depósito convoca, antes, a participação de
Carla Costa.

Sem conceder,

C) Da qualificação jurídica dos factos:

9.) Ainda que, por mera hipótese, se considerasse existirem indícios,


imputa o MP à requerente, entre outros, a prática de um crime de violência
doméstica, p. e p. pelo art.º 152º n.º 1 al. b) e 2 do Cód. Penal, punível com
pena de prisão de 2 a 5 anos e um crime de ofensa à integridade física grave,
p. e p. pelo art.º 144º al. b) do Cód. Penal, punível com pena de prisão de 2 a
10 anos;

10.) Mesmo que a arguida tivesse praticado os factos que lhe são
imputados - o que não se concede - no limite teria praticado apenas um
crime de violência doméstica, p. e p. pelo art.º 152º n.ºs 1 al. b), 2 e 3 al. a) do
Cód. Penal, punível com pena de prisão de 2 a 8 anos, não havendo qualquer
fundamento que justifique a dupla relevância atribuída às condutas
assacadas à arguida e dirigidas ao seu ex-companheiro, quando a invocada
prática do crime de violência doméstica pressupõe a reiteração das condutas
ao longo da vivência comum;

11.) Se assim não se entendesse as condutas reportadas ao período


entre 2010 e 2015 não integrariam a prática de um crime de violência
doméstica. Pela sua pouca gravidade, ainda que a arguida as tivesse
perpetrado, tratar-se-ia, no limite, de crimes de ofensa à integridade física
simples e injúria, não tendo o pretenso ofendido apresentado
tempestivamente queixa (estando já extinto o respectivo direito) nem
deduzido acusação particular, carecendo o MP de legitimidade.

12.) Quanto aos factos referentes ao dia 4 de Setembro e


alegadamente ocorridos no Hospital de Faro, a conduta assacada à arguida
e referente à subtracção de um rim não integra a imputada prática de um
crime de furto. O órgão humano não é “coisa móvel” susceptível de
apropriação, sendo a subsunção jurídica proposta pelo MP claramente
violadora dos princípios da legalidade e da tipicidade, recorrendo
ilegitimamente à analogia num exercício claramente inconstitucional.

Por todo o exposto e na procedência dos argumentos de facto e de


direito esgrimidos, face à completa ausência de indícios, deverá, a final, ser
proferido despacho de não pronúncia, como é de elementar JUSTIÇA

ASSINATURA – Dr. TT (advogado)


ELEMENTOS CONSTANTES DO INQUÉRITO

1. Auto de Notícia

Data: 2017.09.04

Local: Café “Amparo”, sito na Rua Francisco José, Lote 5 – Loja B, Urbanização
dos Plátanos, Faro.

Autuante: José Firmino de Sousa – agente principal da PSP

Extrato: “Aos 4 dias do mês de Setembro de 2017, pelas 21.00h, quando me


encontrava de serviço (…) fui contactado via rádio no sentido de acorrer ao café “Amparo”, sito
na morada supra referida, porquanto ali se encontraria um indivíduo ferido, tendo sido
mobilizados, via número de emergência, meios de socorro (ambulância medicalizada e viatura
VMER) (…). Chegado ao local, pelas 21.15h, ainda ali se encontrava Berto Brito, que
apresentava sinais de ferimentos na zona do baixo-ventre, sangrando profusamente e
alegando que havia sofrido uma queda quando tripulava um velocípede sem motor. Não foi
possível recolher outros elementos junto do identificado indivíduo dado que, à minha chegada,
foi transportado para o hospital de Faro a fim de receber tratamento emergente. Fui abordado
por Belmira Borges, acima melhor identificada e gerente do estabelecimento que me referiu ter
convocado os meios de socorro via 112 e telefonado para esta polícia dado que, cerca de 20m
antes, o referido Berto ali havia comparecido a pedir ajuda, com sinais evidentes de se
encontrar ferido (sangue na zona dos genitais), afirmando ter sofrido uma queda de bicicleta, o
que lhe pareceu suspeito dado que não havia qualquer bicicleta na rua nem o mencionado
Berto apresentava outros ferimentos visíveis, como escoriações nos membros, que fossem
compatíveis com uma queda (…)”.

2. Auto de Inquirição de testemunha

Data: 2017.09.20

Testemunha: Berto Brito


Foi informado que, caso declare ou ateste falsamente à autoridade pública ou a
funcionário no exercício das suas funções identidade, estado ou outra qualidade a que a lei
atribui efeitos jurídicos, próprios ou alheios, o poderá fazer incorrer em responsabilidade penal

Verificam-se as condições do art.º 134º n.º 1 do Cód. Proc. Penal? - Não

Extrato: “Em Maio de 2005, depois de terem namorado cerca de 6 meses,


passou a viver com Ana Anes, na morada acima referida em fracção por ambos adquirida com
recurso a crédito bancário (…). Durante os primeiros cinco anos mantiveram sempre um bom
relacionamento, sem grandes divergências a reportar, apenas com algumas pequenas
discussões, como será comum entre os casais. A partir de 2010, quando o depoente começou a
explorar um estabelecimento de venda de jornais, revistas e tabacos, sito na cidade de Faro,
talvez por ter conseguido alguma autonomia económica e deixado de depender do vencimento
da então companheira como enfermeira auxiliar, aquela começou a interpelá-lo quase
diariamente, exigindo-lhe o dinheiro do apuro de caixa, dizendo que até então o depoente
vivera “à sua conta”. Foi-se tornando cada vez mais agressiva e constante nas exigências quase
diárias de dinheiro, dirigindo-se ao depoente num tom de voz ríspido e elevado, o que fazia
com que geralmente lhe entregasse parte ou mesmo a totalidade do dinheiro que conseguia
com a sua actividade comercial, dinheiro esse que a companheira administrava como entendia.
Quando o depoente colocava alguma objecção Ana Anes reagia com violência, geralmente
começando aos gritos, apelidando o depoente de frouxo, imprestável, entre outros insultos,
afirmando que lhe era infiel, que andava “metido com todas” e, não raras vezes, partia para a
violência física, geralmente esbofeteando o depoente no rosto. Com o tempo as discussões
passaram a ser quase diárias e o depoente, com medo, deixou de lhe fazer frente ou colocar
qualquer objecção às pretensões de Ana Anes, receando ser agredido e sentindo-lhe
envergonhado e humilhado com os nomes que aquela lhe dirigia e que seriam ouvidos pelos
vizinhos.

Não raras vezes apresentava equimoses no rosto, fruto das bofetadas que Ana Anes lhe
desferia mas, por vergonha e porque gostava da sua companheira, nunca apresentou queixa.
Quando os clientes do estabelecimento o interpelavam, procurando saber o porquê das marcas
no rosto, o depoente referia que tinha caído ou que acidentalmente embatera com a cara
nalgum objecto.

Dada a actuação de Ana Anes o depoente passou a chegar a casa o mais tarde
possível, arranjando sempre algo para fazer na tabacaria pois sabia que, ao chegar, iria ser
confrontado, haveria discussão, gritos, insultos e, não raras vezes, agressões nos sobreditos
termos, passando a andar angustiado e receoso, evitando cruzar-se com os vizinhos e sentindo-
se observado pelos clientes do seu estabelecimento dadas as marcas físicas que por vezes
apresentava.

Naquele período e porque se sentia deprimido, começou a sentir-se próximo de Carla


Costa, colega de trabalho da sua companheira e visita da casa, com quem acabou por se
envolver emocionalmente e, pelo menos por duas vezes, também sexualmente. Era uma pessoa
que oferecia carinho ao depoente e a quem acabou por confidenciar tudo o que se passava em
casa.

Nos últimos dois anos Ana Anes passou a tratar o depoente com mais urbanidade,
sendo menos frequentes as discussões. O depoente deixou de questionar as exigências de
dinheiro e a companheira passou a trabalhar por turnos, tornando mais reduzido o período em
que tinham que conviver na fracção. Embora ainda temeroso estes últimos dois anos foram,
para si, anos de alguma tranquilidade, sem agressões físicas de que se recorde.

No pretérito dia 4 do corrente mês de Setembro, cerca das 20.00h, o depoente chegou
a casa depois de mais um dia de trabalho. Aí for abordado pela companheira Ana Anes, que se
lhe dirigiu de uma forma mais ríspida, como o fazia no passado, exigindo-lhe dinheiro,
deixando o depoente intranquilo. Por receio entregou-lhe € 100,00, reservando para si € 25,00
dado que, depois de tomar banho e jantar ainda pretendia ir ao centro comercial adquirir um
DVD para visionar ao serão. A companheira não terá gostado do facto do depoente não lhe ter
entregado a totalidade do apuro do dia pelo que foi ter consigo à casa de banho, onde o
declarante se encontrava apenas em cuecas e, sem que nada o fizesse prever, munida de algo
que trazia escondido atrás das costas, com esse objecto atingiu-o na zona genital, cortando-o e
provocando imediatamente abundante sangramento. Perante isto vestiu-se e saiu
rapidamente a fim de pedir ajuda, dirigindo-se ao café existente em frente à sua casa onde
pediu que chamassem o 112. Por vergonha disse que tinha caído da bicicleta onde
habitualmente se desloca (…).

Saiu de casa definitivamente no passado dia 11, data em que foi ao apartamento
recolher os seus pertences, passando a residir junto da sua mãe. Desde então não tem tido
contactos com a companheira, com quem não pretende voltar a viver. No entanto e em
homenagem à longa vivência comum, não pretende procedimento criminal (…)”
3. Auto de Inquirição de testemunha

Data: 2017.09.27

Testemunha: Belmira Borges

Foi informada que, caso declare ou ateste falsamente à autoridade pública ou a


funcionário no exercício das suas funções identidade, estado ou outra qualidade a que a lei
atribui efeitos jurídicos, próprios ou alheios, o poderá fazer incorrer em responsabilidade penal

Verificam-se as condições do art.º 134º n.º 1 do Cód. Proc. Penal? - Não

Extrato: “É gerente da sociedade “Comer Bem, Lda.”, que explora o


estabelecimento de bebidas “Pastelaria – Café – Amparo”, sito na Rua Francisco José, Lote 5 –
Loja B, Urbanização dos Plátanos, Faro. No dia 2017.09.04, à hora do jantar, cerca das
20.00/20.30h, entrou no seu estabelecimento o Sr. Berto Brito, pessoa que conhece há cerca de
10 anos por ser cliente habitual e residir no prédio em frente. O referido Berto apresentava
muito sangue na zona dos órgãos genitais, aparentando estar em sofrimento e muito agitado.
Pediu ajuda, referindo que tinha acabado de cair quando circulava de bicicleta, o que a
depoente estranhou dado o tipo de lesão que apresentava e o ar comprometido e acabrunhado
que aparentava. De imediato ligou para a PSP, dando conta do sucedido, tendo sido
reencaminhada para o INEM, tendo solicitado a presença de uma ambulância que
efectivamente chegou cerca de 15m ou 20m após esta chamada. Enquanto aguardavam pelo
socorro procurou confortar o seu vizinho e tentar perceber o que efectivamente sucedera,
mantendo aquele que havia caído mas não se encontrando nas imediações qualquer bicicleta
nem apresentando aquele lesões equivalentes como escoriações ou “esfoladelas” por abrasão.
(…)”.

4. Auto de Inquirição de testemunha

Data: 2017.09.30

Testemunha: Delmina Darques

Foi informada que, caso declare ou ateste falsamente à autoridade pública ou a


funcionário no exercício das suas funções identidade, estado ou outra qualidade a que a lei
atribui efeitos jurídicos, próprios ou alheios, o poderá fazer incorrer em responsabilidade penal
Verificam-se as condições do art.º 134º n.º 1 do Cód. Proc. Penal? - Não

Extrato: “É vizinha de Berto Brito e da companheira deste, Ana Anes, residindo


no 4º Esq. do mesmo prédio. Conhece o casal desde o dia em que foram para ali residir, ou
seja, há cerca de 12 anos. É reformada e passa grande parte do dia em casa. Nunca teve
qualquer desentendimento com os seus vizinhos de cima mas, pelo menos numa ocasião,
acabou por ir bater à porta do 5º Esq. dados os gritos que dali provinham e que impediam a
depoente de descansar. Este episódio ocorreu há cerca de 7 anos, numa época em que o
falecido marido da depoente se encontrava doente e necessitado de repouso. Ainda assim os
gritos e as discussões não cessaram e frequentemente ouvia a sua vizinha Ana Anes a gritar
com o companheiro, assim como sons que pareciam objectos a cair. Embora não conseguisse
perceber tudo o que a vizinha dizia lembra-se de escutar muitas vezes a expressão “frouxo”,
sendo frequente cruzar-se com o vizinho no elevador e vê-lo de óculos escuros em dias com
pouco sol ou com marcas no rosto. Em sua opinião o Sr. Berto Brito era agredido mas nunca
conversou com ele sobre isso até porque é um homem e quando os casais se dão mal é
geralmente a mulher que sai prejudicada. No último par de anos tudo lhe pareceu mais
tranquilo no andar de cima, cessando quase por completo aqueles barulhos que até aí eram
quase diários. No entanto no passado dia 4, por volta da hora do jantar, ouviu novamente a
vizinha a gritar, o que a fez recordar do passado. Passado cerca de 15m sentiu o seu vizinho a
sair. Foi espreitar à janela e viu-se a dirigir-se ao café em frente, a cambalear (…)”.

5. Auto de Inquirição de testemunha

Data: 2017.09.27

Testemunha: Carla Costa

Foi informada que, caso declare ou ateste falsamente à autoridade pública ou a


funcionário no exercício das suas funções identidade, estado ou outra qualidade a que a lei
atribui efeitos jurídicos, próprios ou alheios, o poderá fazer incorrer em responsabilidade penal

Verificam-se as condições do art.º 134º n.º 1 do Cód. Proc. Penal? - Não

Extrato: “É colega de trabalho de Ana Anes e amiga de Berto Brito, com quem
manteve um relacionamento amoroso. Conhece Ana Anes em virtude de serem ambas
enfermeiras no hospital de Faro. Por força do relacionamento profissional mantido com Ana
Anes ficaram amigas, começando a frequentar a casa desta, local onde conheceu o Berto Brito.
Pelo menos desde 2010 que é visita da casa do casal, sendo frequentemente convidada para
jantares que retribuía também na sua própria casa. Por força deste contacto ficou bastante
próxima de Berto Brito, parecendo-lhe que aquele não era feliz no seu relacionamento com a
Ana Anes. Notava-lhe uma tristeza da qual procurou saber a origem vindo o mesmo a
confidenciar-lhe que não era feliz na relação, sendo maltratado, querendo com isto dizer que
não raras vezes o Berto lhe confidenciava que era insultado pela Ana, que o apelidava de
“frouxo” e “imprestável”, lhe imputava relacionamentos extraconjugais, lhe exigia a entrega do
dinheiro que ganhava, chegando a agredi-lo, geralmente à bofetada.

Com o tempo os sentimentos que nutria por Berto Brito e ele por si foram evoluindo e
chegaram a relacionar-se sexualmente. Os sentimentos românticos ter-se-ão iniciado em
meados de 2011.

Nos últimos dois anos notou que o Berto se reaproximou de Ana, andando
aparentemente mais tranquilo e mais distante de si. No entanto sabe que a Ana, por
mensagens que detectou no telemóvel do Berto, passou a desconfiar da depoente e,
recentemente, no mês passado, disse que “já sabia de tudo”, ameaçando que iria “fazer a vida
negra” à depoente.

No dia 4 do corrente mês de Setembro, após o almoço, a depoente teve a tarde livre
pelo que se ausentou do serviço de urologia e transplantes onde é enfermeira e a Ana Anes
enfermeira auxiliar. Soube que, na sua ausência, alguém entrou na posse do seu cartão de
acesso à sala refrigerada onde são colocados os órgãos para transplante. O cartão encontrava-
se na carteira da depoente e fora por si deixada no seu cacifo pessoal. Com o dito cartão e
através de passagem no leitor de banda magnética, foi franqueado o acesso à referida sala e
dali retirado um rim que acabara de ser depositado para ulterior transplante. Embora fazendo
uso do seu cartão – ficando a entrada registada em seu nome no sistema – não foi a depoente
a utilizá-lo, vindo posteriormente a saber que fora a Ana Anes a fazê-lo, possivelmente para
prejudicar a depoente, como prometera, já que o rim veio a ser encontrado em casa daquela e
já sem condições para o fim a que se destinava (transplante).

Para além do cartão de acesso, a carteira continha ainda o cartão de cidadão, a carta
de condução e € 160,00 em notas de € 20,00, dinheiro que levantara para, ao fim da tarde,
pagar a explicadora da sua filha.
A carteira e os documentos de identificação foram recuperados, em casa da Ana Anes,
mas continua prejudicada em € 160,00. Por estes factos deseja procedimento criminal contra
a referida Ana Anes. (…)”

6. Auto de interrogatório de arguido e Auto de constituição de arguido

Data: 2017.09.20

Arguida: Ana Andrade Anes

Extrato: “Não desejou prestar declarações”

7. Relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito penal

Data: 2017.10.30

Entidade emissora: Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses

Extrato: “Exame objectivo: No períneo - ferida linear regular na base do pénis


com 6 cm suturada com 8 pontos de seda. No pénis - edema e equimose arroxeada de todo o
órgão. Testículo esquerdo - várias escoriações, duas das quais com pontos de sutura de seda e
edema testicular. (…) Conclusões: As lesões atrás descritas terão resultado da acção de objecto
cortante ou actuando como tal e determinaram um período de doença fixável em 25 (vinte
cinco) dias para a cura, com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional assim
como, por seccionamento do epidídimo, de forma permanente e irreversível, a perda da função
de procriação. (…)”

8. Auto de busca domiciliária e apreensão

Data: 2017.09.11

Entidade que preside: Polícia de Segurança Pública

Local da diligência: Rua Rua Francisco José, Lote 4 – 5º Esq., Urbanização dos
Plátanos, Faro
Extrato: “Aos onze dias de mês de Setembro (…) na sequência do Termo de
Autorização de Busca Domiciliária de Berto Brito (…) procedi à busca domiciliária à residência
sita (…). Assim, pelas 17.00h, na companhia das testemunhas policiais identificadas no
presente Auto, entrámos na referida residência, tendo a porta de entrada sido aberta
livremente pelo visado (…). Refira-se que no interior da residência apenas se encontrava Berto
Brito, tendo sido elucidado da possibilidade de assistir à busca, fazer-se acompanhar ou
substituir por pessoa da sua confiança, conforme o preceituado no art.º 176º do Cód. Proc.
Penal, tendo este optado por assistir à diligência. Foi então dado início à busca propriamente
dita, sendo percorridas todas as dependências do imóvel a buscar, nada tendo sido encontrado.
Todavia, ainda no interior da referida habitação, Berto Brito entregou-nos uma caixa em
material tipo esferovite, de cor laranja, contendo no seu interior um órgão aparentemente
humano, assim como uma carteira de cor azul contendo um cartão plástico com banda
magnética, emitido pelo Hospital de Faro, um cartão de cidadão e carta de condução, tudo em
nome de Carla Costa (…), objectos por si encontrados no quarto de dormir e que foram
apreendidos por esta polícia (…)”

9. Termo de autorização de busca

Extrato: “Para os efeitos constantes na al. b) do n.º 5 do art.º 174º do Cód.


Proc. Penal eu Berto Brito (…) declaro que autorizo os agentes da PSP da Esquadra de
Investigação Criminal da (…) de Faro, a passar busca em: Rua Francisco José, Lote 4 – 5º Esq.,
Urbanização dos Plátanos, Faro, com observância das formalidades legais. Mais declaro que
dei esta autorização voluntária e conscientemente, pelo que vou assinar o presente Termo de
Autorização de Busca. Faro, 11 de Setembro de 2017. O Autorizante: Berto Brito (assinatura)”

10. Auto de visionamento de imagens

Data: 2017.09.10

Entidade: Polícia de Segurança Pública – Divisão de Investigação Criminal

Extrato: “Nesta data foi efectuado o visionamento do suporte de CDR,


proveniente do sistema de videovigilância instalado no Centro Hospitalar do Algarve – Hospital
de Faro e referentes aos movimentos referentes ao dia 04 de Setembro de 2017. No decorrer
do visionamento pode verificar-se, através das imagens captadas pela câmara n.º 1, a acção
da suspeita Ana Andrade Anes, ao passar um cartão no leitor de banda magnética existente na
porta de acesso à sala de depósito de material para transplante e, por via das imagens
captadas pela câmara n.º 2, existente no interior da referida sala, a mesma suspeita a pegar
numa arca própria para acondicionamento de material biológico e a dirigir-se à porta, sendo
visível, agora pela câmara n.º 1, que aquela abandonou o local transportando a referida arca.
Junto se envia folha de suporte com os fotogramas da suspeita e o respectivo CDR (…)”

11. Auto de denúncia

Data: 2017.09.05

Denunciante: Fernando Freitas – Presidente do Conselho de Administração do


Centro Hospitalar do Algarve – Hospital de Faro

Extrato: “No dia de ontem – 4 de Setembro – cerca das 15.00h, das instalações
do Hospital de Faro, foi retirado um rim humano que se encontrava acondicionado em arca
refrigerada depositada na sala de material para transplantes do Serviço de Urologia e que
havia sido nesse dia retirado de cadáver para ulterior transplante. (…) Deseja procedimento
criminal contra a autora da subtracção sendo perceptível, do visionamento das imagens, a
entrada no espaço da Sra. Enfermeira Auxiliar Ana Andrade Anes cuja cópia da fotografia
existente no serviço de recursos humanos se junta”.

12. Documento

Extrato: “Exmos. Senhores:

Na sequência do pedido que nos foi dirigido a coberto do Ofício n.º (…) dessa polícia,
enviamos por esta via cópia em CDR das imagens recolhidas pelo nosso sistema de
videovigilância (CCTV) e referentes ao dia 4 de Setembro de 2017. Mais remeto a listagem
extraída dos registos informáticos de acesso à sala de depósito de material para transplante,
alcançando-se a existência de um acesso no dia 4 de Setembro de 2017, pelas 13h 30m 25s
com o cartão de utilizador atribuído ao Dr. Gualter Guedes, Director de Serviço e que se reporta
à entrada para depósito de um rim humano recolhido na sequência de decesso recente e
destinado a ulterior transplante em beneficiário compatível e, pelas 15h 17m e 13s do mesmo
dia o registo subsequente através da utilização do cartão atribuído à Sra. Enfermeira Carla
Costa, inexistindo qualquer outro acesso registado por esta via até às 16h 40m e 18s, agora
novamente através do cartão atribuído ao Dr. Gualter Guedes que, em sequência, comunicou o
desaparecimento do dito órgão humano (…)

Com os melhores cumprimentos, Faro, 6 de Setembro de 2017, Fernando Freitas,


Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Algarve – EPE”.

13. Documento – Informação Clínica

Entidade emissora: Centro Hospitalar do Algarve EPE – Hospital de Faro

Extrato: “Relatório resumo de episódio de urgência (…)

Nome do paciente: Berto Brito (…)

Data de admissão: 21:35h 04-Set.-2017

Queixa: Refere queda de bicicleta

Tipo de triagem: Entrou via urgência – INEM

(…)

Alta para domicílio em 13.00h - 2017.09.06 (…)”.

14. Certificado de Registo Criminal

Data: 2017.11.04

Entidade emissora: Ministério da Justiça – Direção-Geral da Administração da


Justiça – Sistema de Informação de Identificação Criminal

Extrato: “Ana Andrade Anes (…) Nada consta acerca da pessoa acima
identificada”
15. Documento - Certidão do teor

Registo da fração com aquisição a favor de Berto Brito e Ana Andrade Anes e hipoteca
a favor de instituição bancária.

16. Contratos de trabalho

Cópia dos contratos de trabalho de Ana Andrade Anes e Carla Costa, com as respetivas
categorias profissionais
ELEMENTOS RESULTANTES DAS DILIGÊNCIAS INSTRUTÓRIAS

A. Auto de inquirição de testemunha

Data: 2017.12.05

Testemunha: Carla Costa

Foi informada que, caso declare ou ateste falsamente à autoridade pública ou a


funcionário no exercício das suas funções identidade, estado ou outra qualidade a que a lei
atribui efeitos jurídicos, próprios ou alheios, o poderá fazer incorrer em responsabilidade penal

Verificam-se as condições do art.º 134º n.º 1 do Cód. Proc. Penal? - Não

Extrato: “Mantém as declarações por si prestadas. Quer esclarecer que a


carteira que lhe foi subtraída se encontrava no seu cacifo pessoal, estando o acesso àquele
receptáculo protegido por fechadura. Embora não seja uma fechadura muito segura a verdade
é que foi utilizado um objecto para arrombar a porta já que a madeira desta estava fendida
como se alguém tivesse utilizado um objecto para fazer de alavanca e quebrar o fecho.
Continua a desejar procedimento criminal (…)”

B. Auto de Inquirição de testemunha

Data: 2017.12.05

Testemunha: Berto Brito

Foi informado que, caso declare ou ateste falsamente à autoridade pública ou a


funcionário no exercício das suas funções identidade, estado ou outra qualidade a que a lei
atribui efeitos jurídicos, próprios ou alheios, o poderá fazer incorrer em responsabilidade penal

Verificam-se as condições do art.º 134º n.º 1 do Cód. Proc. Penal? – Sim,


tendo declarado que viveu em condições análogas às dos cônjuges com a arguida.

Foi advertido da possibilidade de recusar prestar depoimento tendo


declarado que pretende depôr.

Extrato: “Como já referiu anteriormente, em Maio de 2005, passou a viver com


Ana Anes. Durante os primeiros cinco anos mantiveram sempre um bom relacionamento, sem
grandes divergências. A partir de 2010, quando o depoente começou a explorar um
estabelecimento de venda de jornais, revistas e tabacos, sito na cidade de Faro, a arguida
começou a interpelá-lo quase diariamente, exigindo-lhe o dinheiro do apuro de caixa,
tornando-se cada vez mais agressiva e constante nas exigências quase diárias de dinheiro. A
arguida falava com o depoente num tom de voz ríspido e elevado, com uma postura muito
agressiva e enervada, o que fazia com que o depoente geralmente cedesse e lhe entregasse
parte ou mesmo a totalidade do dinheiro que conseguia com a sua actividade até porque, se
recusasse a então companheira reagia com muita violência, aos gritos que se ouviam no prédio
todo, apelidando o depoente de frouxo e imprestável, afirmando que lhe era infiel, que andava
“metido com todas” e, não raras vezes, partia para a violência física, geralmente esbofeteando
o depoente no rosto. Com o tempo as discussões passaram a ser quase diárias e o depoente
deixou simplesmente de lhe fazer frente ou colocar qualquer objecção, receando ser agredido.
Tinha a clara percepção que os vizinhos ouviam, sentindo-se vexado, humilhado, tendo que
esconder as marcas que às vezes a arguida lhe deixava no rosto.

Naquele período e porque se sentia triste, começou a ficar cada vez mais próximo de
Carla Costa, colega de trabalho da sua companheira e visita da casa, com quem acabou por se
envolver emocionalmente, passando a confidenciar-lhe tudo o que se passava.

Nos últimos dois anos Ana Anes passou a tratar o depoente com mais urbanidade,
sendo menos frequentes as discussões, achando o depoente que a relação ainda poderia voltar
a funcionar, tendo esperança de voltar a ser feliz.

No pretérito dia 4 do corrente mês de Setembro, cerca das 20.00h, o depoente chegou
a casa depois de mais um dia de trabalho. Aí for abordado pela companheira Ana Anes, que se
lhe dirigiu de uma forma mais ríspida, recordando-lhe o passado. Exigiu ao depoente a entrega
do apuro de caixa. Por receio, e porque já sabia do que a arguida era capaz, entregou-lhe €
100,00, reservando para si € 25,00 dado que, depois de tomar banho e jantar ainda pretendia
ir ao centro comercial adquirir um DVD. A companheira não terá gostado do facto do depoente
não lhe ter dispensado todo o dinheiro pelo que foi ter consigo à casa de banho, onde o
declarante se encontrava apenas em cuecas e, sem que nada o fizesse prever, munida de algo
que trazia escondido atrás das costas (suspeitando que seria uma tesoura) com esse objecto
atingiu-o na zona genital, cortando-o e provocando imediatamente abundante sangramento.
Perante isto vestiu-se e saiu rapidamente a fim de pedir ajuda, dirigindo-se ao café existente
em frente à sua casa onde pediu que chamassem o 112. Por vergonha disse que tinha caído da
bicicleta onde habitualmente se desloca (…).
Saiu de casa definitivamente no passado dia 11, data em que foi ao apartamento
recolher os seus pertences, passando a residir junto da sua mãe. Desde então não tem tido
contactos com a companheira, com quem não pretende voltar a viver. Nesse dia 11, quando se
encontrava no apartamento a recolher as suas coisas, apareceram uns agentes da PSP que
pretendiam fazer uma busca. O depoente franqueou-lhes a entrada, dado que o apartamento
também é seu. Quando estava a recolher as suas roupas no quarto encontrou a carteira da
Carla Costa e uma pequena arca refrigerada, objectos que entregou aos agentes e que lhe
referiram que era precisamente o que procuravam.

Mantém que - em homenagem à longa vivência comum e porque pretende refazer a


sua vida de forma tranquila - não pretende procedimento criminal (…)”
Cotação
I. Componentes - Breve relatório 3,5
estruturais da decisão - Saneamento – com o tratamento das
instrutória nulidades suscitadas
- Breve enquadramento legal da
instrução
- Análise crítica da factualidade indiciária
- Subsunção da factualidade indiciária
ao Direito com referência, ainda que
breve, aos elementos dos tipos legais
relevantes

Parte decisória
- declaração de nulidade (se aplicável)
- decisão de pronúncia, podendo ser
feita a remissão para os factos constantes
da acusação do MP, nos termos legais
- indicação da prova, podendo ser feita
por remissão para a prova constante da
acusação do MP, nos termos legais
- condenação da arguida em custas,
com fixação de taxa de justiça
- estatuto coactivo
- remessa dos autos à Instância Central
Criminal de Faro

II. Identificação e Tópicos de resposta


resolução das questões
suscitadas no RAI
2.1 – Nulidade por - Equaciona se se trata de uma proibição 2
inobservância do art.º de prova e conclusão – admite-se a
134º n.º 2 do Cód. Proc. solução do Ac. STJ de 2015.02.11, mas
Penal - A. 1) e 2) também que se entenda tratar-se não de
uma proibição de prova, mas de uma
nulidade que deve ser arguida
- Coloca a questão da legitimidade da
arguida para invocar a nulidade,
tomando posição, que deverá ser
negativa, uma vez que o interesse
protegido é o do
companheiro/testemunha, não o da
defesa
- Conclui pela improcedência da
nulidade por falta de legitimidade da
arguida para a sua arguição (se
considerar tratar-se de uma proibição de
prova a procedência, que se admite,
será irrelevante para a questão da
suficiência dos indícios dado que, em
instrução, o companheiro foi ouvido
como testemunha e prestou “novo”
depoimento, agora após ter sido
advertido nos termos do art.º 134º do
CPP)
2.2 – Nulidade por falta Regra geral – artigo 167/1 CPP: - As 3
de advertência da reproduções fotográficas,
existência de captação cinematográficas, fonográficas ou por
de imagens – A. 3) e 4) meio de processo electrónico e, de um
modo geral, quaisquer reproduções
mecânicas só valem como prova dos
factos ou coisas reproduzidas se não
forem ilícitas, nos termos da lei penal. Só
haverá proibição de prova no caso de a
ilicitude resultar de violação da lei penal
(incluindo a extravagante).
Gravação de imagem por sistema de
videovigilância é tratamento de dados
pessoais e no caso não é efectuada por
pessoa singular no exercício de
actividades exclusivamente pessoais ou
domésticas.
A instalação de sistemas de
videovigilância nos locais de trabalho
deve ser comunicada à CNPD pois pode
envolver restrições ao direito à reserva da
vida privada e apenas poderá mostrar-se
justificada quando for necessária à
prossecução de interesses legítimos e nos
limites definidos pelo princípio da
proporcionalidade.
Podem ser neste caso utilizados meios de
vigilância à distância sempre que tenha
por finalidade a protecção e segurança
de pessoas e bens ou outro interesse
legítimo e justificado, como no caso
relatado.
A falta de afixação de “aviso” de
captação de imagens seria relevante
apenas em termos contra-ordenacionais.
A utilização de CCTV deverá traduzir-se
numa forma de vigilância genérica,
destinada a detectar factos, situações ou
acontecimentos relevantes para os
indicados fins – como o controlo dos
acessos à sala de depósito de material
para transplante – e não como uma
forma directa de controlo dos
trabalhadores e respectiva
produtividade, o que no caso terá sido
respeitado, inexistindo uma compressão
do “núcleo duro” do direito à reserva da
vida privada.
Por esta via a não sendo fornecido ao
candidato a existência de comunicação
(ou ausência desta) à CNPD será
defensável a validade da captação
como meio de prova. Só haverá crime de
omissão de notificação – e
correspondente ilicitude penal - se a
mesma fosse intencional. A questão teria
que ser problematizada pelo candidato,
admitindo-se ambas as vias mas,
defendida a (in)validade mantém-se,
ainda assim, os indícios quanto à autoria
dos crimes de furto tendo em conta o
depoimento de Berto Brito prestado em
sede de instrução.
2.3 – Nulidade da busca O art. 174.º do CPP regulamenta os 3
domiciliária e das pressupostos gerais das buscas, as quais
subsequentes devem, em princípio, ser autorizadas ou
apreensões – A. 5) e 6) ordenadas pela autoridade judiciária
competente. Na ausência de mandado
pode a busca efectuar-se desde que
exista prévio e esclarecido consentimento
do visado. No caso o ofendido Berto, que
autorizou a busca, este não era o visado
para os sobreditos efeitos, pelo que a
autorização é ineficaz e a busca
realizada pelo órgão de policial criminal
ilegal e, consequentemente, um meio
proibido de prova, não podendo ser
utilizada a obtida através dela, nos
termos do disposto nos arts. 125.º e 126.º,
n.º 3, ambos do CPP, o que deve ser
declarado. Porém e quanto à apreensão,
a mesma resulta da entrega dos objectos
efectuada por Berto e por si encontrados
no seu quarto e em fracção de que é
comproprietário, sendo por esta via
válida. Mesmo caso se defenda a
solução contrária, entendendo-se a
apreensão como “fruto da árvore
proibida”, ainda assim existiriam indícios
para os crimes de furto da carteira e do
rim dado o teor do depoimento prestado
por Berto, em sede de instrução, que
refere ter encontrado estes objectos em
casa da arguida (que também é sua)
quando ali se deslocou para recolher os
seus pertences.
III. Apreciação dos - Ainda que desconsiderando a diligência 5
indícios – B. 7) e 8) de busca existem indícios que resultam:
- Depoimento de José Firmino
- Depoimento de Berto Brito
- Depoimento de Belmira Borges
- Depoimento de Delmina Darques
- Depoimento de Carla Costa
- Relatório médico-legal e informação
clínica
- Apreensão (se aplicável)
- Visionamento de imagens (se aplicável)
- Informação e listagem
- Certidões e contratos
Que permitem concluir, fazendo a
necessária análise crítica, ser mais
provável uma condenação do que uma
absolvição e relativamente a todos os
crimes imputados na acusação.
IV. Qualificação jurídica Por força do disposto no n.º 1 do art.º 3,5
dos factos indiciados – 152.º do Código Penal, em que se
C. 9) a 12) prescreve que quem, de modo reiterado
ou não, infligir maus tratos físicos ou
psíquicos, incluindo castigos corporais,
privações da liberdade e ofensas sexuais
(…) é punido com pena de prisão de um
a cinco anos, se pena mais grave lhe não
couber por força de outra disposição
legal. Os factos caracterizadores do
crime de ofensa à integridade física
grave que tenha ocorrido no contexto
espácio-temporal em que decorreu a
violência doméstica separam-se e dão
origem à verificação do crime de ofensa
à integridade física grave, com uma
moldura abstracta mais severa. Se após
esta separação ainda restarem mais
factos relativos à violência doméstica,
eles continuarão a integrar e a dar corpo
a esse crime (de violência doméstica) e à
sua respectiva punição, em concurso real
com a da ofensa à integridade física
grave, mantendo-se a qualificação
jurídica proposta na acusação.
Tendo em conta a posição defendida
pela arguida deve também a questão ser
apreciada sob a perspectiva da
existência de crimes de ofensa à
integridade física simples e injúria (em
detrimento do crime de violência
doméstica), afastando esta qualificação.

O furto do rim humano deve ser


apreciado sob a perspectiva do crime de
furto simples, ao contrário do defendido
pela arguida (neste sentido, v.g. Paulo
Saragoça da Matta, Subtracção de coisa
móvel alheia, Liber Discipulorum, pp. 993-
1032).
Em sentido contrário pode ser defendido
que o juízo incriminatório subjacente ao
tipo legal em causa fundamenta-se em
condutas atentatórias do interesse-
propriedade. Neste enfoque a
subtracção de órgão não preencheria o
tipo legal de furto por se tratar de coisa
fora do comércio jurídico e por esta via
insusceptível de ser objecto de uma
relação económica e de afectar o bem
jurídico protegido. Embora a estrutura da
acção típica seja equivalente à do furto
seria atípica, como defendido pela
arguida, sob pena de, ao invés de mera
interpretação, se entrar no campo da
aplicação analógica para a criação de
tipo legal, não consentida.

O furto da carteira não pode vir a ser


qualificado pelo arrombamento que
decorre das declarações prestadas pela
ofendida em instrução por implicar
alteração substancial dos factos não
permitida e não sendo aqueles factos
(novos) autonomizáveis (sob pena de
penalização do candidato)
Página 1 de 8

PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL

33.º CURSO DE FORMAÇÃO INICIAL PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

Via Académica

AVISO DE ABERTURA: AVISO N .º 320-A/2017, PUBLICADO EM D.R.


2.ª SÉRIE, N.º 05, DE 06 DE JANEIRO DE 2017

DATA: 25 DE FEVEREIRO DE 2017

1.ª CHAMADA

HORA: 14H15M ( D E A C OR D O C O M O D I SP O ST O N O A R T . º 1 2. º D O
R E GU L A ME NT O I N TER N O D O C E NT R O D E E S TU D O S J U D IC IÁ R I O S, O T E M PO D E
D UR A Ç Ã O D A PR O V A I N IC IA - SE D E C OR R ID O S 1 5 M IN U TO S A P ÓS A HO R A
D ES I G NA D A )

DURAÇÃO DA PROVA: 3 HORAS


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PROVA ESCRITA DE

DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Via Académica

1 - A presente prova é composta por três casos, todos de resposta obrigatória.

2 – Cotações
Caso I – 8 valores
a) 1,5 valores
b) 3 valores
c) 1,5 valores
d) 2 valores

Caso II – 5 valores

Caso III – 7 valores


a) 1 valor
b) 2 valores
c) 4 valores

3 - A atribuição da cotação máxima à resposta a cada questão pressupõe um tratamento completo das
várias questões suscitadas, que deverá ser coerente e corretamente fundamentado, com indicação dos
preceitos legais aplicáveis.

4 - Na cotação atribuída serão tidos em consideração a pertinência do conteúdo, a qualidade da


informação transmitida em relação à questão colocada, a organização da exposição, a capacidade de
argumentação e de síntese e o domínio da língua portuguesa.

5 - As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a grafia do "Acordo Ortográfico
da Língua Portuguesa" (aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo
Decreto do Presidente da República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-
lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que lhes será entregue, escrevendo
"Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91,
não está em vigor com carácter de obrigatoriedade", sendo a prova corrigida nesse pressuposto.

6 - Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até um máximo de 3 valores,
para o total da prova.

7 - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento identificativo da/o
candidata/o (a identificação constará apenas do destacável da folha de rosto), sob pena de anulação da
prova.
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CASO I

(8 valores)

Em julho de 1984, a sociedade Diving Internacional, S.A., contratou Alberto


Antunes para desempenhar as funções de administrador na sua sede, em Ponta
Delgada, comprometendo-se, como parte da remuneração devida, a financiar a
aquisição por este de um apartamento para habitação.
Para o efeito, em 31 de agosto de 1984, Alberto Antunes e a sociedade Estrela do
Mar, Lda., celebraram um contrato pelo qual esta prometeu vender e aquele
prometeu comprar o apartamento correspondente ao 5.º andar do prédio designado
por lote 3, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o n.º
23.456, a fls. 20v do Livro B-23 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 234,
pelo preço de seis milhões de escudos, para cujo pagamento o promitente-comprador
entregou, nessa data, doze cheques, pré-datados para o dia 1 dos doze meses
subsequentes (setembro de 1984 a agosto de 1985), no valor de quinhentos mil
escudos cada um, emitidos pela Diving Internacional, S.A., a seu favor e por si
endossados à promitente-vendedora, declarando esta que os recebeu e irá proceder
ao seu depósito nas datas neles indicadas, acordando as partes que a escritura pública
seria realizada após boa cobrança da totalidade dos cheques.
Desde 31 de agosto de 1984, Alberto Antunes passou a residir com a sua mulher
e dois filhos no apartamento, tendo aí efetuado algumas obras de remodelação,
contratado o fornecimento de água e energia elétrica logo nesse dia e, em setembro
de 1984, a instalação do telefone, pagando as «despesas de condomínio», recebendo
amigos e correspondência.
Após a boa cobrança do último cheque, Alberto Antunes insistiu várias vezes
junto do gerente da sociedade Estrela do Mar, Lda., no sentido de ser celebrada
escritura pública, mas sem êxito, pois este respondia-lhe sempre que “não se
preocupasse, pois só estava à espera da licença de utilização do prédio”.
Em 1 de outubro de 1990, o prédio foi objeto de penhora em processo de
execução fiscal que correu termos contra a sociedade Estrela do Mar, Lda., tendo sido,
após publicação dos editais e anúncios, vendido, por proposta em carta fechada, à
sociedade Crista da Onda, Lda., no dia 5 de julho de 1991.
Mediante apresentação de 12 de outubro de 1991, foi inscrita na Conservatória
do Registo Predial de Ponta Delgada, a favor do Banco BIT, a aquisição do referido
prédio, efetuada em venda judicial. O Banco BIT intentou ação declarativa contra a
sociedade Crista da Onda, Lda., com vista à restituição do aludido prédio, ação que
veio a ser julgada procedente.
Em 8 de junho de 1993, Alberto Antunes tomou conhecimento que o prédio
tinha sido vendido ao Banco BIT. Preocupado, enviou ao Banco uma carta indagando
das “condições exigidas para resolver o problema da celebração da escritura relativa
ao meu apartamento, pois não tenciono abrir mão do mesmo e até já fui informado
que tenho direito de retenção”.
O Banco BIT intentou, em 2014, ação executiva contra a sociedade Crista da
Onda, Lda., para entrega do prédio.
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Considerando a situação descrita, responda justificadamente


às seguintes questões:
Considerando a situação descrita, responda justificadamente às seguintes
questões:
a) Considera que Alberto Antunes dispõe de meio processual
adequado para obstar à pretensão do Banco BIT? Na
afirmativa,
a) Considera indique
que Alberto Antunesqual, enunciando
dispõe de meio processual o adequado
pedido para
que
deveria formular. (1,5 valores)
obstar à pretensão do Banco BIT? Na afirmativa, indique qual, enunciando
o pedido que deveria formular. (1,5 valores)
b)b) Admitindo
Admitindoqueque Alberto
Alberto Antunes
Antunes reagiureagiu judicialmente
judicialmente para obstarpara
à
obstar à pretensão do Banco BIT, arrogando-se
pretensão do Banco BIT, arrogando-se proprietário do apartamento,
proprietário
pronuncie-se sobre ado apartamento,
viabilidade pronuncie-se
da sua pretensão. (3 valores) sobre a
viabilidade da sua pretensão. (3 valores)
c) Supondo que Alberto Antunes se arroga unicamente titular do direito de
retenção sobre o apartamento, aprecie do ponto vista jurídico-substantivo
c) a Supondo que (1,5
sua pretensão. Alberto
valores)Antunes se arroga unicamente titular
do direito
d) Supondo que nãodefoi retenção sobre
intentada ação o apartamento,
executiva aprecie
contra a sociedade do
Crista da
ponto vista jurídico-substantivo a sua pretensão.
Onda, Lda., aprecie se Alberto Antunes poderá fazer valer e de que forma (1,5
osvalores)
direitos emergentes do contrato-promessa. (2 valores)

d) Supondo que não foi intentada ação executiva contra a


sociedade Crista da Onda, Lda., aprecie se Alberto
Antunes poderá fazer valer - e de que forma - os
direitos emergentes do contrato-promessa. (2 valores)
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CASO II
Caso 2
(5 valores)

Ana Batista é proprietária do prédio rústico composto de cultura arvense,


amendoeiras, figueiras e sobreiros, sito no Pinhel, inscrito na matriz predial rústica sob
o art.º n.º 11, da Secção AO, da freguesia da Boavista e descrito na Conservatória do
Registo Predial de Évora, sob o n.º 111, da referida freguesia.
O referido prédio rústico não tem qualquer comunicação com a via pública e
confina com o prédio de Bernardina Cunha.
Bernardina Cunha é proprietária do prédio misto que confina a Sul com o prédio
de Ana Batista, sito no Pinhel, inscrito na matriz predial rústica sob o n.º 12, da Secção
AO, e na matriz predial urbana sob o artigo 122, da freguesia da Boavista e descrito na
Conservatória do Registo Predial de Évora, sob o n.º 1222, da referida freguesia.
Em virtude do encrave do prédio de Ana Batista, quando este foi adquirido, os
vendedores indicaram os únicos acessos possíveis à via pública:
Acesso A (a sul) - um caminho de terra batida, com cerca de 200 metros de
extensão e 3,80 metros de largura, transitável por veículos ligeiros, através do prédio
de Bernardina Cunha;
Acesso B (a norte) - um acesso através de dois prédios:
(1) um carreiro com cerca de 300 metros de extensão e 1,5 metros de
largura, que atravessa um prédio rústico, cultivado com produtos hortícolas, o qual
confina a norte e nascente com o prédio de Ana Batista, inscrito na matriz predial
rústica sob o n.º 13, da Secção AO e descrito na Conservatória do Registo Predial
de Évora sob o n.º 133, da freguesia da Boavista;
(2) e um caminho agrícola com cerca da 200 metros de extensão e 4
metros de largura, onde habitualmente transitam alfaias agrícolas, situado no prédio
misto inscrito na matriz predial rústica sob o n.º 14, da Secção AG e descrito na
Conservatória do Registo Predial de Évora sob o n.º 144, da freguesia da Boavista, o
qual confina a Norte com o prédio ora descrito, esse sim com comunicação à via
pública, já onerado com uma servidão de passagem a favor do prédio descrito sob o nº
888/9999999, da freguesia da Boavista.

O proprietário do prédio rústico inscrito na matriz sob o n.º 13, da Secção AO,
não permite a passagem de Ana Batista pelo Acesso B, ameaçando-a com tiros de
caçadeira.
Por essa razão, nas poucas vezes que vai ao seu terreno, Ana Batista tem
utilizado o Acesso A através do prédio de Bernardina Cunha.
Esta situação tem impedido Ana Batista de utilizar com regularidade o seu
terreno, impossibilitando-a de o rentabilizar.
Em frente da casa implantada no seu terreno, Bernardina Cunha tem um terreiro
que aplanou e que serve de logradouro à casa.
A frente da habitação da Bernardina Cunha e o terreiro deitam diretamente para
o caminho que lhes dá acesso.
Bernardina Cunha é pintora e mudou-se para o Alentejo para usufruir do bom
tempo, do silêncio e das paisagens a perder de vista, neles colhendo a sua inspiração.
Página 6 de 8

Tem os seus cavaletes, uma mesa e uma cadeira do lado Sul, em frente da porta
da sala de estar, onde passa o tempo a pintar e toma refeições quando faz sol,
necessitando do isolamento e do sossego para pintar, o que ficará comprometido com
a passagem de veículos.
Com a limpeza e manutenção do caminho pelo prédio da Bernardina Cunha, Ana
Batista terá de despender 3.000 €.

Ana Batista intentou uma ação contra Bernardina Cunha, pedindo a sua
condenação a reconhecer o direito de servidão de passagem a favor do seu prédio, a
pé e por veículos, e onerando o prédio da Ré.
A Ré opõe-se invocando a existência do acesso B, com potencialidade de servir a
passagem pretendida. Deduziu reconvenção para a hipótese da improcedência da
ação, peticionando a quantia de 13.000 €, a título de indemnização pelos danos
patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da constituição de servidão.

Aprecie, do ponto de vista jurídico-substantivo, a


viabilidade das pretensões de Ana Batista e de Bernardina
Cunha, fundamentando a sua decisão. (5 valores)
Página 7 de 8

CASO III
Caso 2
(7 valores)

Manuel da Silva, rico empresário da indústria automóvel, residente em Cascais,


decidiu, na data em que completou 85 anos de idade, recompensar generosamente a
sua governanta, Rosa Sousa, que há mais de 30 anos trabalhava para ele,
atribuindo-lhe uma compensação pelos longos anos de serviço prestado de forma tão
leal e zelosa.
Para tanto encarregou a amiga de longa data, sua vizinha e assistente pessoal,
Rita Trigo, de, após a sua morte, entregar à governanta a quantia de 30.000 €.
Além disso, entregou pessoalmente à sua governanta um cheque não datado e
por si assinado, no valor de 5.000 €, para que esta se sustentasse nos primeiros
tempos após a sua morte.
Manuel da Silva veio a falecer no dia 15 de maio de 2015, no estado de viúvo,
sem deixar ascendentes nem descendentes vivos, deixando como único herdeiro o seu
sobrinho, Alberto da Silva, residente em Madrid.
Rita Trigo organizou o funeral, pagando do seu próprio bolso as respectivas
despesas, no valor de 20.000 €.
Também no cumprimento das instruções do seu amigo, Rita Trigo, co-titular das
contas bancárias do falecido, no dia em que aquele faleceu, dirigiu-se ao Balcão da Av.
da Liberdade, em Lisboa, e transferiu 31.500 € para a conta da referida empregada,
correspondentes ao valor da compensação prometida e aos salários desta em falta
(1.500 €).
Alberto Silva, descontente com o sucedido, recorreu a tribunal, relatando os
factos acima descritos e exigindo a devolução dos montantes transferidos (no total de
31.500 €), bem como do valor do cheque de 5.000 €, apresentado a pagamento por
Rosa Sousa no dia 18 de maio de 2015 (por esta preenchido com a data de 15 de maio
de 2015).
Rita Trigo e Rosa Sousa insurgiram-se contra tal pretensão, alegando que nada
deviam, por se terem limitado a cumprir a vontade do falecido.
Ainda em sede de contestação, Rita Trigo exige o pagamento do valor de 20.000
€, a título de despesas de funeral que suportara, bem como o montante de 2.500 €, a
título do seu salário mensal como assistente pessoal do falecido.

Considerando a situação descrita, responda justificadamente às


seguintes questões:

a) Identifique o mecanismo processual de que Alberto Silva


terá lançado mão para fazer valer os seus intentos e qual
o tribunal competente. (1 valor)

b) Qualifique processualmente as defesas de Rita Trigo e de


Rosa Sousa e avalie as suas implicações no processado
subsequente. (2 valores)
(continua na página seguinte)
Página 8 de 8

(continuação do Caso III)

c) Aprecie, do ponto de vista jurídico-substantivo, a


viabilidade da pretensão de Alberto Silva e das defesas de
Rita Trigo e de Rosa Sousa. (4 valores)
CASO I

Considerando a situação descrita, responda justificadamente às seguintes


questões:

a) Considera que Alberto Antunes dispõe de meio processual adequado para


obstar à pretensão do Banco BIT? Na afirmativa, indique qual, enunciando o pedido
que deveria formular. (1,5 valores)

a) Identificação dos embargos de terceiro, a título preventivo - artigo 1285.º do


Código Civil (doravante CC) e artigos 342.º e 350.º do Código de Processo Civil
(doravante CPC), como meio processual indicado para a reação de Alberto Antunes à
execução instaurada pelo Banco BIT contra a sociedade Crista da Onda, Lda..
Referência ao pedido de manutenção da posse e reconhecimento do direito de
propriedade sobre o bem por usucapião, não se efetuando, consequentemente, a
entrega do bem ao Exequente - artigos 1287.º e 1316.º do CC.

b) Admitindo que Alberto Antunes reagiu judicialmente para obstar à


pretensão do Banco BIT, arrogando-se proprietário do apartamento, pronuncie-se
sobre a viabilidade da sua pretensão. (3 valores)

b) Enquadramento da hipótese na figura da usucapião prevista no artigo 1287.º


do CC, cuja ocorrência depende de dois elementos essenciais: a posse, por um lado, e
o decurso de certo lapso de tempo.
Relativamente à situação possessória, atentar na definição de posse prevista no
artigo 1251.º do CC e enunciar os atos que integram o corpus possessório,
designadamente que Alberto Antunes, na sequência do contrato-promessa de 31 de
agosto de 1984 e, logo nessa data, instalou o seu lar na fração correspondente ao 5.º
andar do prédio imóvel em apreço e passou a nele habitar com a mulher e os filhos,
efetuando obras de remodelação, recebendo familiares e amigos e pagando as
«despesas de condomínio».

1
Afirmação do animus possidendi de Alberto Antunes, pelo menos a partir do
momento em que se concretizou o pagamento integral do preço acordado, em 1 de
agosto de 1985, revelando-se uma intenção de agir como se fosse proprietário do bem
(cf. ainda o artigo 1252.º, n.º 2, do Código Civil).
Referir que Alberto Antunes exerceu a sua posse de modo público e pacífico -
artigos 1261.º e 1262.º do CC e que a posse não é titulada - artigo 1259.º, n.º 1, do CC.
Menção de que a posse se presume de má-fé, nos termos do artigo 1260.º, n.º
2, do CC, mas que esta presunção legal se mostra ilidida, uma vez que o possuidor agiu
na convicção de que não lesava o direito de outrem, pelo que deverá considerar-se de
boa-fé - n.º 1 do artigo 1260.º do CC.
Conclusão no sentido de que o prazo para a aquisição por usucapião do direito
de propriedade sobre a fração em apreço se completou, pelo menos, em agosto de
2000, ou seja, decorridos 15 anos sobre a data em que procedeu ao pagamento
integral do preço - artigo 1296.º do CC.
Reconhecimento de que os efeitos da aquisição do direito de propriedade por
usucapião retrotraem à data do início da posse - artigo 1288.º do CC.
Afirmar que esta forma originária de aquisição do direito de propriedade ilide a
presunção de aquisição decorrente do registo predial a favor do Banco BIT e prevalece
sobre todas as transmissões operadas após 1 de agosto de 1985 (artigo 7.º do Código
do Registo Predial e artigo 1268.º, n.º 1, do CC).

c) Supondo que Alberto Antunes se arroga unicamente titular do direito de


retenção sobre o apartamento, aprecie do ponto vista jurídico-substantivo a sua
pretensão. (1,5 valores)

c) Referir que a pretensão de Alberto Antunes, em sede de embargos de


terceiro, não é viável, pois o direito de retenção conferido ao promitente-comprador
não visa mantê-lo na fruição de qualquer direito de gozo, mas antes garantir o
pagamento do crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos
termos dos artigos 442.º e 755.º, n.º 1, al. f), do CC.

2
d) Supondo que não foi intentada ação executiva contra a sociedade Crista da
Onda, Lda., aprecie se Alberto Antunes poderá fazer valer - e de que forma - os
direitos emergentes do contrato-promessa. (2 valores)

d) Análise dos factos de forma a concluir que a venda judicial do prédio impedia
o recurso à execução específica do contrato-promessa com fundamento no
incumprimento (mora) da promitente-vendedora, uma vez que a fração
correspondente ao 5.º andar do prédio já não se encontrava na titularidade desta,
sendo a prestação definitivamente impossível – cf. artigos 804.º, n.º 2, a contrario, e
879.º, alínea a), do CC.
Equacionar que ao promitente-comprador resta apenas a possibilidade de
resolver o contrato-promessa e de obter a correspondente indemnização - artigo
442.º, n.º 2, do CC - com base no incumprimento definitivo verificado no momento em
que ocorreu a venda judicial do imóvel, a qual se equipara a uma recusa ou
impossibilidade definitiva de cumprir imputável ao promitente-vendedor - artigo 432.º
do CC.

CASO II

Aprecie, do ponto de vista jurídico-substantivo, a viabilidade das pretensões


de Ana Batista e de Bernardina Cunha, fundamentando a sua decisão. (5 valores)

Enquadramento da hipótese na figura da servidão legal de passagem


constituída por sentença judicial - artigos 1543.º, 1547.º, n.º 2, e 1550.º do CC.
Constatação de que o prédio da Autora é um prédio encravado e que o prédio
vizinho da Ré tem acesso à via pública, pelo que estão preenchidos os requisitos do
artigo 1550.º do CC.
Análise do preceituado no artigo 1553.º do CC, segundo o qual “A passagem
deve ser concedida através do prédio ou prédios que sofram menor prejuízo, e pelo
modo e lugar menos inconvenientes para os prédios onerados” e conclusão de que o
menor prejuízo se configura como uma condição de concretização do direito a

3
constituir a servidão sobre certo prédio e não aleatoriamente sobre qualquer um à
escolha do titular do prédio dominante.
Comparação entre os dois acessos possíveis à via pública do prédio de Ana
Batista: o acesso A, que atravessa o prédio de Bernardina Cunha; o acesso B, que
passa por dois prédios.
Afastamento da relevância do facto de o proprietário do prédio rústico inscrito
na matriz sob o n.º 13 da Secção AO não permitir a passagem de Ana Batista pelo
Acesso B, ameaçando-a com tiros de caçadeira, pois o que importa indagar é do menor
prejuízo do prédio.
Constatação de que o prédio rústico descrito na matriz predial rústica sob o n.º
13 (carreiro cultivado com produtos hortícolas), com apenas 1,5 metros de largura,
não permite a passagem de veículos e pode implicar que se realizem obras de
alteração do carreiro, em toda a sua largura e na extensão de 300 metros, deixando
também de servir nessa parte para o cultivo de produtos hortícolas.
Verificação de que, para além de atravessar este prédio, o acesso B contempla
a passagem por um segundo prédio para aceder à via pública, o que, tudo somado,
pode significar uma servidão com 500 metros de extensão (300 metros do prédio 13 e
200 metros do prédio 14), sendo que o caminho que atravessa o prédio de Bernardina
Cunha tem apenas 200 metros de extensão.
Tudo ponderado, concluir que dos dois acessos em apreço, o acesso A, que
atravessa o prédio de Bernardina Cunha, com 3,80 metros de largura e transitável por
veículos ligeiros, é o que sofrerá menor prejuízo com a servidão de passagem.
Rebater a eventual relevância neste particular da circunstância de Bernardina
Cunha ser pintora e ter mudado para o Alentejo para usufruir do bom tempo, do
silêncio e das paisagens a perder de vista, pois o que o artigo 1553.º do CC prevê é o
prejuízo do prédio e não o prejuízo do dono do prédio.
Análise da pretensão indemnizatória de Bernardina Cunha, deduzida em
reconvenção (artigo 266.º, n.º 1, e n.º 2, alínea a), do CPC), pela constituição da
servidão legal de passagem, à luz do disposto no artigo 1554.º do CC, segundo o qual
“Pela constituição da servidão de passagem é devida a indemnização correspondente
ao prejuízo sofrido”.

4
Relativamente aos danos patrimoniais, constatar que Bernardina Cunha tem
direito a ser indemnizada na medida em que o prédio serviente tiver ficado
desvalorizado, nos termos das regras gerais aplicáveis à obrigação de indemnizar -
artigos 562.º e seguintes do CC.
No que concerne aos danos não patrimoniais invocados por Bernardina Cunha,
concluir, da análise conjugada do artigo 1554.º do CC com o disposto no artigo 1553.º
do referido diploma, segundo o qual “A passagem deve ser concedida através dos
prédios que sofram menor prejuízo, e pelo modo e lugar menos inconvenientes para os
prédios onerados”, que na servidão predial é aos prédios que a lei se reporta, o que
afasta a indemnização do proprietário do prédio onerado por danos não patrimoniais.
Ainda que se considere admissível a solução da indemnização por danos não
patrimoniais nesta sede, afastá-la in casu, pois os factos descritos não permitem
concluir por tal indemnização, ao abrigo dos artigos 496.º e 564.º, n.º 2, do CC, nada
permitindo antever que a passagem de veículos na comunicação entre o prédio de Ana
Batista e a via pública constitua previsivelmente uma afetação do direito ao sossego
daquela de tal modo grave que justifique a sua indemnização.

CASO III

Considerando a situação descrita, responda justificadamente às seguintes


questões:

a) Identifique o mecanismo processual de que Alberto Silva terá lançado mão


para fazer valer os seus intentos e qual o tribunal competente. (1 valor)

Identificação do mecanismo processual como uma ação declarativa de


condenação, sob a forma de processo comum, intentado por Alberto Silva, na
qualidade de único herdeiro de Manuel da Silva, contra Rosa Sousa e Rita Trigo, na
qual é formulado o pedido de condenação de Rosa Sousa a entregar a quantia de
5.000 € à herança aberta por óbito de Manuel da Silva, bem como a condenação de

5
ambas, solidariamente, a restituírem a quantia de 31.500 € - artigos 546.º, 32.º e 36.º
do CPC.
Conclusão de que, atento o valor da causa, a forma de processo e o domicílio
conhecido da Ré Rita Trigo, o Tribunal competente é o Juízo Local Cível de Cascais do
Tribunal da Comarca de Lisboa Oeste - artigos 41.º, 81.º e 130.º da Lei n.º 62/2013, de
26.8 (doravante LOSJ), artigo 88.º, n.º 2, do DL n.º 49/2014, de 27.3, e artigos 80.º e
82.º do CPC.

b) Qualifique processualmente as defesas de Rita Trigo e de Rosa Sousa e


avalie as suas implicações no processado subsequente. (2 valores)

Qualificação da defesa de Rita Trigo e de Rosa Sousa como contestação com


matéria de exceção e, no caso de Rita Trigo, como reconvenção - artigos 266.º, 569.º,
571.º, 572.º e 583.º do CPC.
Identificação da faculdade de o Autor apresentar articulado de réplica (artigo
584.º do CPC), da alteração do valor da causa de 36.500 € para 59.000 € (artigos 297.º
e 299.º do CPC) e da consequente remissão dos autos para o Juízo Central Cível de
Cascais - artigo 93.º, n.º 2, do CPC, artigo 117.º da LOSJ e artigo 88.º do DL n.º
49/2014, de 27.3.
Consideração da admissibilidade da pretensão de obter a compensação, não
obstante Rita Trigo pretender o reconhecimento de crédito de montante inferior ao
peticionado por Alberto Silva, ao abrigo do artigo 266.º, n.º 2, alínea c), do CPC.
Equacionar se o Juízo Central Cível de Cascais será ou não competente, em
razão da matéria, para conhecer da reconvenção na parte relativa à quantia de 2.500
€, respeitante ao salário mensal da Ré-Reconvinte, Rita Trigo - artigos 93.º, n.º 1, 96.º,
al. a), do CPC e artigo 126.º da LOSJ.

c) Aprecie, do ponto de vista jurídico-substantivo, a viabilidade da pretensão


de Alberto Silva e das defesas de Rita Trigo e de Rosa Sousa. (4 valores)

6
Identificação do cheque que titula a quantia de 5.000 €, entregue por Manuel
da Silva a Rosa Sousa, como uma ordem de pagamento feita pelo seu titular ao banco
onde o seu dinheiro estava depositado, a favor da portadora do cheque (Lei Uniforme
Relativa aos Cheques).
Enquadramento da entrega do cheque em causa feita com espírito de
liberalidade, para que Rosa Sousa levantasse da sua conta o dinheiro correspondente,
como um contrato de doação, regulado nos artigos 940.º e seguintes do CC.
No que concerne ao montante de 31.500 € transferido por Rita Trigo da conta
bancária de que era co-titular, atentar em que tal importância pertencia ao falecido
Manuel da Silva, tendo Rita Trigo agido, no que respeita ao montante de 30.000 €, de
forma a cumprir o propósito liberatório deste último.
Conclusão no sentido de que Rita Trigo atuou como mandatária (artigos 1170.º
e 1175.º do CC), não propriamente em resultado de vinculação jurídica justificativa do
mandato, mas sim por razões de ordem moral e social, ou seja, no cumprimento de
uma obrigação natural.
Constatação de que a doação assim efetuada subverte normas imperativas
atinentes ao direito das sucessões, mormente o artigo 946.º, n.º 1 e n.º 2, do CC.
Referência a que, contrariamente ao que sucedeu com o cheque, não ocorreu a
efetiva tradição da quantia de 30.000 €, porquanto esse valor nunca deixou de estar na
disponibilidade do falecido doador para passar a estar na disponibilidade da donatária,
em vida daquele.
Ainda assim, ponderar que a doação por morte poderá ser havida como
disposição testamentária se tiverem sido observadas as formalidades dos testamentos
(artigo 946.º, n.º 2, do CC), com a conversão do negócio nulo num negócio de tipo
diferente (artigo 293.º do CC).
Verificação de que, na hipótese, as formalidades atinentes ao testamento não
foram observadas (artigos 2204.º e ss. do CC), já que a disposição monetária de 30.000
€ a favor de Rosa Sousa foi meramente verbal, não podendo deixar de ser considerada
nula (artigo 281.º do CC), com a consequente obrigação de restituição (artigo 289.º do
CC).
No tocante à quantia de 1.500 € transferida para pagamento dos salários de
Rosa Sousa, reconhecer que se trata de dívida do falecido, pela qual a herança sempre

7
responderia (artigo 2068.º do CC), pois Rita Trigo agiu no cumprimento de instruções
do falecido Manuel da Silva, no cumprimento de mandato que não caducou com a
morte do mandante, atendendo ao interesse no negócio de Rosa Sousa, empregada
doméstica (artigo 1175.º do CC).
Atentar em que, pese a administração da herança pertença ao cabeça-de-casal
(artigo 2079.º do CC), não resulta da factualidade descrita se o único herdeiro Alberto
Silva (artigos 2132.º, 2133.º, n.º 1, alínea c), do CC) foi designado e tomou posse de
tal cargo, sendo descabido exigir a devolução do que é efetivamente devido.
Conclusão pela procedência parcial da pretensão de Alberto Silva, com a
condenação solidária de Rita Trigo e Rosa Sousa a restituírem a quantia de 30.000 €.
Relativamente ao direito de crédito no montante de 20.000 € a que se arroga
Rita Trigo, relativo às despesas do funeral que pagou do seu próprio bolso, concluir
que, como decorre do artigo 2068.º do CC, a herança de Manuel da Silva responde
pelas despesas com o funeral deste, pelo que Rita Trigo deve ser reembolsada.

8
Página 1 de 7

PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL

33.º CURSO DE FORMAÇÃO INICIAL PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

Via Académica

AVISO DE ABERTURA: AVISO N .º 320-A/2017, PUBLICADO EM D.R.


2.ª SÉRIE, N.º 05, DE 06 DE JANEIRO DE 2017

DATA: 02 DE MARÇO DE 2017

2.ª CHAMADA

HORA: 14H15M ( D E A C OR D O C O M O D I SP O ST O N O A R T . º 1 2. º D O
R E GU L A ME NT O I N TER N O D O C E NT R O D E E S TU D O S J U D IC IÁ R I O S, O T E M PO D E
D UR A Ç Ã O D A PR O V A I N IC IA - SE D E C OR R ID O S 1 5 M IN U TO S A P ÓS A HO R A
D ES I G NA D A )

DURAÇÃO DA PROVA: 3 HORAS


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PROVA ESCRITA DE

DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Via Académica

1 - A presente prova é composta por três casos, todos de resposta obrigatória.

2 – Cotações
Caso I – 8 valores
A – 1) 1 valor
2) 2 valores
3) 3 valores

B – 2 valores

Caso II – 6 valores
1) 1 valor
2) 1 valor
3) 4 valores

Caso III – 6 valores


a) 1 valor
b) 2 valores
c) 4 valores

3 - A atribuição da cotação máxima à resposta a cada questão pressupõe um tratamento completo das
várias questões suscitadas, que deverá ser coerente e corretamente fundamentado, com indicação dos
preceitos legais aplicáveis.

4 - Na cotação atribuída serão tidos em consideração a pertinência do conteúdo, a qualidade da


informação transmitida em relação à questão colocada, a organização da exposição, a capacidade de
argumentação e de síntese e o domínio da língua portuguesa.

5 - As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a grafia do "Acordo Ortográfico
da Língua Portuguesa" (aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo
Decreto do Presidente da República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-
lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que lhes será entregue, escrevendo
"Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91,
não está em vigor com carácter de obrigatoriedade", sendo a prova corrigida nesse pressuposto.

6 - Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até um máximo de 3 valores,
para o total da prova.

7 - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento identificativo da/o
candidata/o (a identificação constará apenas do destacável da folha de rosto), sob pena de anulação da
prova.
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CASO I

(8 valores)

A - A sociedade Crédito Leve, S.A. celebrou com João Silva, por documento
escrito, um acordo denominado “Contrato de Mútuo n.º 23219”, datado de 28 de
fevereiro de 2014, com vista à aquisição do veículo automóvel da marca Mercedes-
Benz, modelo CLA, matrícula 00-00-OO, mediante o qual concedeu crédito no
montante de 50.000 €, com juros à taxa de 15,95%, tendo João Silva assumido o
compromisso de pagar o valor financiado em 60 prestações, mensais e sucessivas.
O contrato foi celebrado por intermédio do fornecedor do veículo automóvel,
Stand Manuel Afonso & Filhos, Lda., sociedade que vendeu a João Silva o aludido
veículo e que atua habitualmente e de forma planificada em colaboração com a
Crédito Leve, S.A..
No âmbito dessa colaboração e dos contratos celebrados, a sociedade Crédito
Leve, S.A. entregou à sociedade Stand Manuel Afonso & Filhos, Lda. o preço do veículo
e este entregou a João Silva o veículo automóvel.
Até à data da assinatura por João Silva do “Contrato de Mútuo n.º 23219” não
houve qualquer contacto entre a Crédito Leve, S.A. e João Silva.
João Silva tem 50 anos e, desde há pelo menos 15 anos, que sofre de uma
doença do foro psiquiátrico, conhecida por doença bipolar ou doença
maníaco-depressiva, caracterizada por variações muito acentuadas do humor, com
crises repetidas de depressão e mania, sendo a grandiosidade, no sentido de um
aumento exagerado de auto-confiança, amor próprio e otimismo, um dos sintomas
típicos desta última.
Quando se encontra numa fase maníaca da doença (crise maníaca), João Silva,
por causa de uma confiança excessiva no futuro e nas suas capacidades, torna-se de
uma prodigalidade extrema e assume obrigações que não pode cumprir.
Aquando das negociações para a venda do veículo, Mariana Silva, mulher de
João Silva, advertiu por duas vezes Manuel Afonso, gerente do Stand, de que aquele
não se encontrava em condições económicas e de saúde para adquirir o veículo,
estando numa fase maníaca da sua doença.
Este facto não foi transmitido por Manuel Afonso à Crédito Leve, S.A..
João Silva deixou de pagar a 10.ª prestação e as seguintes, mantendo-se na
posse do veículo automóvel.
Consta das condições gerais do “Contrato de Mútuo n.º 23219” que:
“8. Mora e Cláusula Penal
(…) b) A falta de pagamento de uma prestação na data do respectivo
vencimento, implica o vencimento de todas as restantes.
c) Em caso de mora e sem prejuízo do disposto no número anterior, incidirá
sobre o montante em débito, e durante o tempo da mora, a título de cláusula penal,
uma indemnização correspondente à taxa de juro contratual ajustada, acrescida de
quatro pontos percentuais, bem como outras despesas decorrentes do incumprimento,
nomeadamente uma comissão de gestão por cada prestação em mora”.
A sociedade Crédito Leve, S.A. intentou uma ação contra João Silva e Mariana
Silva, pedindo a condenação de ambos a pagarem-lhe, solidariamente, a quantia de
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47.550 €, a qual inclui capital em dívida, juros remuneratórios e cláusula penal,


acrescida de juros vencidos e vincendos até integral pagamento.
Alegou, em suma, os factos relativos à celebração e incumprimento do
“Contrato de mútuo n.º 23219”, bem como que os Réus são casados um com o outro e
que o empréstimo reverteu em proveito comum do casal.
Os Réus pediram, em reconvenção, a anulação tanto do contrato de mútuo
celebrado com o Autor como do contrato de compra e venda celebrado com sociedade
fornecedora Stand Manuel Afonso & Filhos, Lda., com fundamento na doença bipolar
de João Silva.
Requereram a intervenção principal da sociedade Stand Manuel Afonso &
Filhos, Lda..

A - Considerando a situação descrita responda,


justificadamente, às seguintes questões:

1) Indique se é admissível a intervenção principal da


sociedade Stand Manuel Afonso & Filhos, Lda.. (1 valor)
2) No pressuposto de não ter sido invocada a anulabilidade
dos contratos em sede de reconvenção, aprecie do ponto
de vista jurídico-substantivo a viabilidade da
pretensão da Crédito Leve, S.A.. (2 valores)
3) Aprecie do ponto de vista jurídico-substantivo a
viabilidade da reconvenção dos Réus e sua consequência
na decisão da causa. (3 valores)

B - João Silva e Mariana Silva casaram no dia 5 de julho de 1998, sem


convenção antenupcial. Em janeiro de 2000, constituíram uma sociedade comercial
por quotas, com o capital social de 10.000 €, que dividiram em duas quotas de igual
valor, ficando uma para cada um deles.
Em março de 2014, numa fase em que a sociedade tinha prejuízos, o casal
assinou um documento intitulado “contrato de cessão de quotas”, pelo qual o marido,
para além de renunciar à gerência, declarou ceder à mulher a sua quota, mediante o
preço de 5.000 €, montante que acordaram que nunca seria pago. Tal cessão foi objeto
de registo.
Em fevereiro de 2015, João Silva intentou uma ação contra a mulher, pedindo a
declaração de nulidade ou a anulabilidade do contrato de cessão de quotas, com
fundamento no facto de ser proibido por lei e de se tratar de um negócio simulado.

B - Aprecie, do ponto de vista jurídico-substantivo, a


viabilidade da pretensão de João Silva. (2 valores)
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CASO II
Caso 2
(6 valores)

No dia 1 de julho de 2015, António Antunes e mulher, Alda Antunes, celebraram


com a sociedade Brita - Construção Civil, Lda. um contrato pelo qual esta última lhes
prometeu vender, e aqueles prometeram comprar, o prédio sito na Rua da Boavista,
n.º 1, em Coimbra, inscrito na matriz predial urbana com o n.º 1234 e descrito na
Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o n.º 5678, pelo preço de 100.000 €.

O preço foi integralmente pago aquando da assinatura do contrato.

Nessa data, foi entregue a António Antunes e mulher a chave da moradia,


ficando estipulado no referido contrato que a escritura pública de compra e venda
seria celebrada quando Brita - Construção Civil, Lda. tivesse obtido a licença de
utilização do prédio, o qual havia sido edificado conforme licença de construção n.º
910 emitida pela Câmara Municipal de Coimbra.

Não obstante Brita - Construção Civil, Lda. lograsse obter a referida licença de
utilização e fosse instada por António Antunes e mulher no sentido de celebrarem a
escritura pública de compra e venda do prédio, tal não sucedeu, não tendo aquela
comparecido no Cartório Notarial de Coimbra na data agendada para o efeito, dia 22
de dezembro de 2015.

António Antunes e mulher instauraram, em 10 de janeiro de 2016, uma ação


contra Brita - Construção Civil, Lda., pedindo:
a) que a Ré seja condenada a ver declarado que o contrato-promessa
celebrado com os autores foi por estes integralmente cumprido,
encontrando-se paga a totalidade do respetivo preço;
b) que seja decretada a transmissão para os autores da propriedade do
prédio sito na Rua da Boavista, n.º 1, em Coimbra, inscrito na matriz
predial urbana com o n.º 1234 e descrito na Conservatória do
Registo Predial de Coimbra sob o n.º 5678;
c) que a Ré seja condenada a proceder ao levantamento de quaisquer
eventuais ónus ou encargos que incidam sobre o prédio prometido.

A Ré não contestou a ação.

Ao analisar a certidão comprovativa do registo da ação, o juiz verificou a


existência de hipoteca (registada em 2 de dezembro de 2014) e de duas penhoras que
recaem sobre o prédio (registadas em 1 de setembro de 2015 e 7 de outubro de 2015).
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Considerando a situação descrita, responda justificadamente


às seguintes questões:

1) Indique qual o mecanismo processual de que António


Antunes e Alda Antunes podem lançar mão para fazerem valer os
seus intentos e qual o tribunal competente. (1 valor)
2) Qualifique processualmente a posição da Brita Construção
Civil, Lda. e as implicações processuais dessa posição. (1
valor)
3) Aprecie, do ponto de vista jurídico-substantivo, a
viabilidade das pretensões de António e Alda Antunes, tendo
ainda em atenção que a Ré requereu, na pendência da ação, a
extinção da instância por inutilidade superveniente da lide,
invocando a existência das referidas penhoras. (4 valores)
Página 7 de 7

CASO III
Caso 2
(6 valores)

Adérito Silva, de nove anos de idade, frequenta o 4.º ano de escolaridade no


Externato "O Panda", explorado pela sociedade Sol Nascente, Lda. É uma criança
irrequieta e desobediente, com problemas comportamentais que levaram os pais a
optar pelo ensino naquela escola, apesar do esforço financeiro acrescido.
A turma de Adérito Silva é composta por vinte alunos.
No dia 4 de abril de 2016, durante o período de aulas da manhã, a professora
da turma de Adérito Silva, Maria Campos, recebeu no telemóvel uma mensagem de
uma colega cujo cacifo estava bloqueado, pedindo-lhe a sua máquina calculadora
emprestada para utilizar durante uma aula que começava dentro de poucos minutos.
A professora Maria Campos pediu então à aluna Angélica Ferreira que ficasse
por breves instantes a tomar conta dos seus colegas de turma, enquanto se dirigia à
sala dos professores, situada no mesmo corredor.
Angélica Ferreira é considerada pelos professores, diretor do estabelecimento e
mesmo pelos colegas uma menina muito responsável e com grande maturidade para a
sua idade.
Enquanto a professora esteve ausente, Adérito Silva tirou da sua mochila uma
navalha que o seu pai lhe tinha mostrado na véspera, explicando-lhe como se abria e
fechava e dizendo-lhe que um rapaz da sua idade tinha que começar a saber utilizar
navalhas, já estando até um pouco atrasado nessa aprendizagem.
Com a navalha em punho, Adérito Silva desferiu vários golpes nas almofadas,
tapetes, livros e candeeiros que compunham o "canto de leitura" da sala de aula, os
quais ficaram totalmente destruídos.
De seguida, e sempre empunhando a navalha, dirigiu-se ao seu colega Roberto
Pires, que, aterrorizado, saltou pela janela da sala de aula para o pátio, fraturando
ambas as pernas.

Analise juridicamente a situação descrita, identificando de


forma fundamentada os lesados, os danos passíveis de
indemnização e os responsáveis por estes. (6 valores)
Caso I
(8 Valores)

A - Considerando a situação descrita responda, justificadamente, às seguintes


questões:

1) Indique se é admissível a intervenção principal da sociedade Stand Manuel


Afonso & Filhos, Lda.. (1 valor)

Considerar a admissibilidade da intervenção principal da sociedade Stand


Manuel Afonso & Filhos, Lda., como associada da Autora-Reconvinda, ao abrigo dos
artigos 316.º, n.º 1, e 318.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (doravante CPC), ex vi
do artigo 266.º, n.º 4, do mesmo diploma, tendo em consideração que os pedidos
reconvencionais de anulação do contrato de mútuo e do contrato de compra e venda
estão interligados, sendo que a invalidade de qualquer um dos contratos se repercute
na invalidade do outro contrato, como resulta dos artigos 4.º, alínea o), e 18.º do
Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho.
Constatar que estamos perante um litisconsórcio necessário, conforme resulta
do disposto no artigo 33.º do CPC, quer seja considerado que o negócio assim o exige
ou atendendo à própria natureza da relação jurídica, que exige a intervenção de todos
os interessados para que a decisão produza o seu efeito jurídico normal necessário
(n.ºs 1 e 2 do preceito).

2) No pressuposto de não ter sido invocada a anulabilidade dos contratos em


sede de reconvenção, aprecie do ponto de vista jurídico-substantivo a viabilidade da
pretensão da Crédito Leve, S.A.. (2 valores)

Qualificação do contrato que a Crédito Leve, S.A. celebrou com João Silva,
mediante o qual aquela, no exercício da sua atividade, concedeu a João Silva um
“empréstimo” de 50.000 €, com a finalidade de aquisição de uma viatura automóvel,
como um contrato de mútuo oneroso (artigos 1142.º e 1145.º do Código Civil -
doravante CC), bancário (já que realizado por uma instituição de crédito ou
parabancária, artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 58/2013, de 8 de maio) e de crédito ao
consumo (artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 133/99, de 2 de junho).
Referir que João Silva, ao deixar de pagar a 10.ª prestação e as seguintes,
constituiu-se em mora, tendo a obrigação de ressarcir o credor pelos prejuízos
causados - artigo 804.º do CC, desde a data da primeira prestação não paga (artigos
406.º e 805.º, n.º 2, alínea a), do referido diploma).
Indagar da validade da cláusula penal que consta do n.º 8 das “Condições
Gerais” do contrato, ao abrigo do disposto no artigo 811.º, n.º 1, do CC e à luz do
artigo 781.º do mesmo diploma.
Relativamente à alínea b) do n.º 8 das “Condições Gerais” do contrato,
constatar que, vencida a obrigação de capital, deixa de haver lugar a remuneração pela
indisponibilidade do mesmo capital, como resulta do acórdão uniformizador de
jurisprudência do STJ de 25 de março de 2009, segundo o qual “No contrato de mútuo
oneroso liquidável em prestações, o vencimento imediato destas ao abrigo de cláusula
de redacção conforme ao art.º 781º do Código Civil não implica a obrigação de
pagamento dos juros remuneratórios nelas incorporados”.
Concluir que a sociedade Crédito Leve, S.A. só tem direito a que lhe sejam
pagas as prestações em dívida, acrescidas da cláusula penal de 19,95% ao ano e o valor
do capital remanescente em dívida.
Relativamente à mulher do Réu, Mariana Silva, evidenciar os requisitos da
comunicabilidade das dívidas de um dos cônjuges ao outro, previstos no artigo 1691.º,
n.º 1, alínea c), do CC, de verificação cumulativa:
- Que a dívida tenha sido contraída na constância do casamento;
- Pelo cônjuge administrador dentro dos seus poderes de administração; e
- Em proveito comum do casal.
Atentar no disposto no n.º 3 do mesmo artigo 1691.º, que expressamente
refere que, em regra, o proveito comum não se presume.
Concluir que, tratando-se o proveito comum de um conceito jurídico, cuja
integração e verificação depende da prova de factos demonstrativos de que o destino
do dinheiro ou dos bens com este adquiridos foi a satisfação de interesses comuns do
casal (cf. acórdão do STJ de 22 de outubro de 2009, in www.dgsi.pt), a ação não
poderia proceder contra a Ré Mariana Silva sem a concretização de tais factos.

3) Aprecie do ponto de vista jurídico-substantivo a viabilidade da


reconvenção dos Réus e sua consequência na decisão da causa. (3 valores)

Apreciar o pedido reconvencional de decretamento da anulação do contrato de


crédito que João Silva celebrou com a Crédito Leve, S.A., bem como do contrato de
compra e venda que celebrou com a sociedade Stand Manuel Afonso & Filhos, Lda., à
luz do disposto no artigo 257.º do CC.
Indagar primeiramente da anulabilidade do contrato de compra e venda
celebrado entre João Silva e a sociedade Stand Manuel Afonso & Filhos, Lda. – cf.
artigos 874.º e 879.º do CC.
Concluir que estamos perante o vício da anulabilidade do contrato de compra e
venda do veículo automóvel em apreço pois, aquando da celebração deste contrato,
João Silva estava incapacitado pela doença bipolar de que padece de exercer
livremente a sua vontade, sendo que a vendedora (através do seu representante) foi
alertada para tal facto, tendo, pois, conhecimento do estado em que se encontrava o
comprador.
Já no que concerne ao contrato de crédito, atentar em que, como resulta da
hipótese, até à data da sua assinatura por João Silva, não houve qualquer contacto
entre a Crédito Leve, S.A. e João Silva.
Sem embargo, verificar que todo o negócio foi ajustado com o fornecedor do
veículo e considerar a definição de contrato de crédito coligado prevista no artigo 4.º,
alínea o), do Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho (Contrato de Crédito a
Consumidores).
Retirar da hipótese que o facto de a sociedade Crédito Leve, S.A. ter celebrado
com João Silva um contrato de mútuo com vista à aquisição do veículo automóvel
Mercedes CLA aponta para a exclusividade prevista no ponto i) da citada alínea e que
emerge com clareza dos factos a unidade económica dos contratos, pois o contrato de
crédito foi celebrado por intermédio da fornecedora do veículo automóvel, sociedade
que vendeu a João Silva o aludido veículo e que atua habitualmente e de forma
planificada em colaboração com a Crédito Leve, S.A., o que preenche o ponto ii) da
mesma alínea.
Concluir que estamos perante um contrato de crédito coligado.
Equacionar a repercussão jurídica das vicissitudes da compra e venda no
contrato de crédito, ao abrigo do disposto no artigo 18.º, n.º 2, do referido Decreto-
Lei n.º 133/2009, segundo o qual “A invalidade ou a revogação do contrato de compra
e venda repercute-se, na mesma medida, no contrato de crédito coligado” e concluir
pelo vício da anulabilidade do contrato de crédito coligado.
Nos termos do disposto nos artigos 289.º, n.º 1, e 290.º do CC, tendo presente
a ratio decidendi do Assento 4/95 do STJ de 28 de março de 1995, constatar que, se o
montante do mútuo foi diretamente entregue pelo financiador à vendedora, nem
sequer tendo passado por qualquer conta do Réu, não faz sentido que, relativamente à
destruição dos efeitos jurídicos do contrato de crédito ao consumo, seja este Réu a
entregar esse montante à ora Autora.
Tudo ponderado, concluir que a vendedora (Interveniente-Reconvinda) deverá
entregar diretamente a importância do mútuo à Autora (Reconvinda), sendo esta a
solução mais adequada ao caso concreto e à natureza do contrato de compra e venda
vinculado ao contrato de crédito.
Concluir também que a Autora (Reconvinda) deverá restituir ao Réu todas as
prestações que dele recebeu e que este deverá restituir o veículo automóvel à
vendedora (Interveniente-Reconvinda).

B - Aprecie, do ponto de vista jurídico-substantivo, a viabilidade da pretensão


de João Silva. (2 valores)

No que concerne ao fundamento de o contrato de cessão de quotas ser


proibido por lei, atentar no disposto no artigo 1714.º do CC, relativo à “Imutabilidade
das convenções antenupciais e do regime de bens resultantes da lei” e no artigo 228.º,
n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais.
Analisar o disposto no n.º 1 do artigo 1174.º do CC à luz de duas aceções:
- Uma aceção mais ampla do princípio da imutabilidade das convenções
antenupciais e do regime de bens, que implica não só a proibição de alterar as
cláusulas da convenção antenupcial, ou as regras do regime supletivo, em termos que
tenham como consequência uma alteração da qualificação de bens e da sua integração
no património comum ou no património de um dos cônjuges, mas também a proibição
de alterar por via indireta, através da celebração de negócios jurídicos entre cônjuges
sobre bens concretos, a qualificação de um qualquer bem determinado como bem
próprio ou comum - cf. doutrina citada no acórdão do TRP de 4 de fevereiro de 2016,
in www.dgsi.pt. Verificar que, do princípio de imutabilidade de regime de bens e de
convenções antenupciais, entendido nos termos amplos supra referidos, decorreria
por sua vez a inadmissibilidade da cessão de quotas entre cônjuges.
- Uma aceção mais restrita do referido princípio, segunda a qual se considera
que dele decorre apenas a proibição de alterar nos termos supra referidos o regime de
bens fixado por lei ou resultante de convenção de bens, mas não os negócios entre
cônjuges que incidam sobre bens concretos, a não ser quando essa proibição conste de
normas especiais, como sejam o n.º 2 do referido artigo 1714.º do CC. Verificar que, à
luz deste entendimento mais restrito, o disposto no n.º 2 do artigo 228.º do CSC não
implicaria por isso qualquer derrogação do princípio de imutabilidade ou do disposto
no n.º 2 do artigo 1714.º do CC que não abrangeriam na sua previsão a cessão de
quotas entre cônjuges, a qual seria por isso válida - cf. doutrina citada no acórdão do
TRP de 4 de fevereiro de 2016, in www.dgsi.pt.
Propugnar pela primeira tese, concluindo que, de outra forma, facilmente
poderiam os cônjuges, mediante celebração de contratos entre si, alterar as massas
patrimoniais que integram o património comum ou o património próprio de cada um
deles, frustrando por essa via a finalidade subjacente à opção do legislador em manter
a consagração entre nós daquele princípio - neste sentido, vide o citado acórdão do
TRP, de 4.2.2016.
Concluir que a previsão do n.º 2 do artigo 228.º do CC deverá ser interpretada
em harmonia e conjugação com aquele princípio e com esta proibição, considerando
que se reporta apenas àquelas situações em que a cessão de quotas entre cônjuges
deva ter-se como válida em face do disposto na lei civil, seja porque os cônjuges se
encontram casados em regime de separação geral de bens - parte final do n.º 2 do
artigo 1714.º do CC - seja porque a cessão de quotas foi concretizada através de um
contrato não proibido entre cônjuges, como é o caso da doação.
Analisando a situação dos autos, verificar que estamos perante a cessão de
uma quota social que, porque adquirida por ambos os cônjuges na constância do
casamento, era, por força do regime de bens aplicável, um bem comum.
Constatar que, não estando João Silva e Mariana Silva, à data, separados
judicialmente de pessoas e bens, terá de concluir-se que a cessão de quotas entre João
Silva e Mariana Silva é nula por violação do disposto no n.º 1 do artigo 1714.º do CC,
pelo que merece acolhimento a pretensão de João Silva.
No que concerne à invocada simulação do contrato de cessão de quotas,
verificar que João Silva alega efetivamente o acordo simulatório e a ausência de
vontade correspondente à declarada cessão de quotas, mas nada refere quanto ao
intuito de defraudar terceiros.
Verificar que o intuito de enganar terceiros é, juntamente com a divergência
entre a vontade e a declaração resultante de acordo entre declarante e o declaratário,
o que caracteriza a simulação, nos termos do disposto no artigo 240.º do CC.
Concluir que se trata de um elemento constitutivo do efeito pretendido por
João Silva - artigo 581.º, n.º 1, do CPC - e como tal teria que ser por ele alegado -
artigo 5.º, n.º 1, e 552.º, n.º 1, do CPC, pelo que não colhe o fundamento da simulação
do negócio.

Caso II
(6 valores)

1) Indique qual o mecanismo processual de que António Antunes e Alda


Antunes podem lançar mão para fazerem valer os seus intentos e qual o tribunal
competente. (1 valor)

Referir que António e Alda Antunes podem, como o fizeram, considerando o


pedido formulado na alínea b), lançar mão da ação de execução específica, intentando
uma ação declarativa que segue a forma de processo comum - cf. artigo 830.º do CC e
artigos 10.º, n.ºs 1 a 3, 301.º e 546.º do CPC.
Atento o valor da causa, a forma do processo e o local da situação do prédio,
concluir que o Tribunal competente é o Juízo Central Cível de Coimbra - artigos 41.º,
81.º e 117.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (doravante LOSJ), artigo 75.º, n.º 1,
do DL n.º 49/2014, de 27 de março, e artigo 70.º, n.º 1, do CPC.

2) Qualifique processualmente a posição da Brita Construção Civil, Lda. e as


implicações processuais dessa posição. (1 valor)

Constatar que a Brita Construção Civil, Lda. não apresentou contestação, pelo
que ficou numa situação de revelia, a qual, caso não tenha constituído mandatário
nem tido qualquer intervenção no processo, é absoluta. Se, pelo contrário, não
obstante a falta de contestação, tiver constituído mandatário judicial ou praticado
outro ato processual, concluir que a revelia é relativa - artigo 566.º do CPC.
Verificar que, se tivesse sido citada editalmente e permanecesse na situação de
revelia absoluta, esta seria inoperante - artigo 568.º, alínea b), do CPC.
Atentar em que, considerando a forma como é efetuada a citação de pessoas
coletivas (artigo 246.º do CPC), a citação deverá ter-se por efetuada regular e
pessoalmente, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 567.º do CPC, o que
implica que se considerem confessados os factos articulados pelos Autores, sendo, de
seguida, o processo facultado para exame, pelo prazo de 10 dias, ao mandatário dos
Autores (e também da Ré, sendo caso disso), para alegar por escrito, após o que será,
em princípio, proferida sentença, julgando a causa conforme for de direito.

3) Aprecie, do ponto de vista jurídico-substantivo, a viabilidade das pretensões


de António e Alda Antunes, tendo ainda em atenção que a Ré requereu, na
pendência da ação, a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide,
invocando a existência das referidas penhoras. (4 valores)

Atentar nos pedidos formulados por António Antunes e mulher:


a) Que a Ré seja condenada a ver declarado que o contrato-promessa celebrado
com os autores foi por estes integralmente cumprido, encontrando-se paga a
totalidade do respetivo preço;
b) Que seja decretada a transmissão para os autores da propriedade do prédio
sito na Rua da Boavista, n.º 1, em Coimbra, inscrito na matriz predial urbana com o n.º
1234 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o n.º 5678;
c) Que a Ré seja condenada a proceder ao levantamento de quaisquer eventuais
ónus ou encargos que incidam sobre o prédio prometido.
Constatar que a ação foi registada, após a sua propositura (em 10 de janeiro de
2016), tendo o juiz verificado a existência de hipoteca, registada em 2 de dezembro de
2014, e duas penhoras que recaem sobre o prédio, registadas em 1 de setembro e 7 de
outubro de 2015, e concluir que os factos alegados pelos Autores devem ser
considerados provados.
Enquadramento jurídico do contrato celerado entre Autores e Ré como um
contrato-promessa de compra e venda de prédio, contrato que, face aos elementos
disponíveis, se deve considerar válido, estando as partes vinculadas ao seu
cumprimento - artigos 406.º e 410.º do CC.
Constatar que a Ré, promitente-vendedora, incorreu em mora, uma vez que,
verificada a condição estipulada para a celebração do contrato definitivo (a obtenção
da licença de utilização do prédio) e instada pelos Autores a comparecer no Cartório
Notarial para esse efeito, não o fez - cf. artigo 805.º do CC.
Concluir que, atento o pagamento integral do preço pelos Autores, deve
proceder a ação de execução específica do contrato-promessa (artigo 830.º do CC), no
tocante aos pedidos referidos em a) e b).
Já no que respeita ao pedido referido em c), ter presente o disposto no n.º 4 do
referido artigo 830.º do CC.
Assim, concluir que os Autores apenas podiam ter pedido, para efeito da
expurgação da hipoteca registada em 2 de dezembro de 2014, a condenação da Ré a
pagar-lhes o montante do capital garantido e respetivos juros.
Relativamente às penhoras registadas antes da propositura da ação, referir que
continuarão a onerar o prédio, sendo inoponível ao(s) exequente(s) a decisão judicial
de procedência da ação de execução específica, já que o seu direito de crédito será
pago pelo produto da venda do prédio com preferência a credor que não tenha
garantia real anterior (no caso, após o credor hipotecário), sendo o prédio transmitido
livre do direito de garantia (hipoteca) que o onera, bem como dos demais direitos reais
que não tenham registo anterior ao de qualquer arresto, penhora ou garantia, com
exceção dos que, constituídos em data anterior, produzam efeitos em relação a
terceiros independentemente de registo - artigos 822.º e 824.º do CC.
Com a procedência do pedido referido b), mencionar que se dá a transferência
do direito de propriedade a favor dos Autores, por efeito da sentença, mas tal não
implica o cancelamento de eventuais ónus anteriormente registados sobre o imóvel,
não sendo tal aquisição do direito de propriedade oponível aos credores que gozem da
garantia conferida pela hipoteca ou pela penhora, verificando-se, quanto a estes, uma
ineficácia relativa da transmissão do direito de propriedade - neste sentido, vide o
acórdão do STJ de 18 de junho de 2015, in www.dgsi.pt.
Sem embargo, concluir que não poderá ser atendida a sua pretensão deduzida c)
e que tão pouco tem cabimento a pretensão da Ré de extinção da instância por
inutilidade superveniente da lide, considerando que as penhoras foram efetuadas e
registadas em data anterior à da propositura da ação - cf. artigo 277.º, alínea e), do
CPC.

Caso III
(6 valores)

Analise juridicamente a situação descrita, identificando de forma


fundamentada os lesados, os danos passíveis de indemnização e os responsáveis por
estes. (6 valores)

Enquadramento jurídico-substantivo da questão no âmbito do dever de


vigilância de pessoa que, em razão da idade, é naturalmente incapaz (artigo 491.º do
CC). Adérito Silva não beneficia da presunção de falta de imputabilidade estabelecida
pelo n.º 2 do artigo 488.º do CC, pelo que poderia ser considerado imputável e, assim,
responsável pelos danos decorrentes da sua conduta (n.º 1 do artigo 488.º do CC).
Contudo, em face da sua idade e da influência paterna exercida pelo seu
progenitor, na véspera dos acontecimentos, concluir que Adérito Silva não tinha ainda
o discernimento bastante para apreciar convenientemente o ato praticado, não
devendo concluir-se pela sua responsabilização.
Apreciar que os elementos do enunciado indiciam um dever de vigilância
contratualmente estabelecido, no âmbito da relação entre os pais de Adérito Silva e a
sociedade que explora o Externato. Tendo esta relação como prestação fundamental,
da parte da sociedade, a de ensino e educação, na mesma incluem-se também deveres
de vigilância do menor, designadamente em função da idade deste, e comportando os
necessários para a boa prossecução do fim principal, bem como para a segurança de
terceiros.
Referir que, no momento dos factos relevantes, o dever de vigilância é exercido
através de uma colaboradora da sociedade, a professora, encontrando-se Adérito Silva
na sala de aula, portanto em horário letivo. Atentar em que o facto de a professora se
ausentar da sala não pode, automática e acriticamente, fazer concluir pela sua
responsabilidade, devendo ponderar-se os elementos de facto implicados na sua
decisão.
No caso vertente, valorando-se a estrutura argumentativa utilizada, entende-se
como solução mais adequada concluir não ser justificado o comportamento da
professora, atendendo sobretudo a dois elementos: o motivo pelo qual se dá a
ausência (não dotado de urgência ou gravidade); as características comportamentais
conhecidas da turma, designadamente de Adérito Silva.
Não pode concluir-se que, na presença da professora, os danos teriam
igualmente ocorrido e da forma pela qual ocorreram, pelo que não se afasta a
presunção legal de culpa da sociedade Sol Nascente, Lda. (artigo 491.º, parte final, do
CC).
Apreciar que o facto de Adérito Silva ter consigo uma navalha, bem como os
dados relativos à conversa com o pai, na véspera, apontam para a existência de uma
hipótese de culpa na formação da personalidade, ou na educação, imputável ao pai de
Adérito Silva, concluindo pela desadequação do discurso e apresentação da navalha
pelo pai. Devem aqui ser referidas a qualidade de adulto responsável pela educação,
no âmbito das responsabilidades parentais (dever de educação, nos termos do artigo
1878.º, n.º 1, do CC).
Concluir que será, pois, de exigir ao progenitor a reparação dos danos, segundo
o previsto no artigo 491.º do CC, não sendo de equacionar a condenação do menor
Adérito nos termos do disposto no artigo 489.º do mesmo diploma.
Pelas razões apresentadas, concluir que:
a) É lesado Roberto Pires, cuja falta de capacidade judiciária (em razão da
idade) seria suprida pelos legais representantes, existindo elementos para concluir não
só por danos patrimoniais (tratamentos médicos, necessidade de assistência), como de
danos não patrimoniais (as dores físicas e o medo, o choque e o susto importantes que
terá sentido na situação e posteriormente, em consequência desta).
b) É também lesada a Sociedade Sol Nascente, Lda., havendo que ponderar
enquanto danos os estragos no material existente na sala de aula.
c) Pelos danos sofridos por Roberto Pires e perante este, e sem prejuízo da
responsabilidade de seguradora, seria responsável a sociedade Sol Nascente, Lda.
(artigo 800.º do CC).
d) Pelos estragos de material, equacionar a possibilidade de a sociedade
demandar o pai do menor Adérito, mas sem olvidar, na fixação do montante da
indemnização devida, a culpa da sociedade lesada (artigo 570.º do CC), por duas vias:
ausência de vigilância adequada, possibilitando a entrada, no estabelecimento, da
navalha; quebra do dever de vigilância consubstanciado na ausência da professora da
sala de aula.
e) Finalmente, apreciar a possibilidade de a sociedade Sol Nascente, Lda.
exercer, pelo valor da indemnização que suportar para ressarcimento dos danos
sofridos por Roberto Pires, direito de regresso perante a professora Maria Campos e o
pai do menor Adérito (artigo 497.º, n.º 2, do CC).
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PROVA ESCRITA
DE
DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL

33.º CURSO DE FORMAÇÃO INICIAL PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

Via Académica

AVISO DE ABERTURA: AVISO N .º 320-A/2017, PUBLICADO NO D.R.


2.ª SÉRIE, N.º 05, DE 06 DE JANEIRO DE 2017

DATA: 04 DE MARÇO DE 2017

1.ª CHAMADA

HORA: 14H15M ( D E A C OR D O C O M O D I SP O ST O N O A R T . º 1 2. º D O
R E GU L A ME NT O I N TER N O D O C E NT R O D E E S TU D O S J U D IC IÁ R I O S, O T E M PO D E
D UR A Ç Ã O D A PR O V A I N IC IA - SE D E C OR R ID O S 1 5 M IN U TO S A P ÓS A HO R A
D ES I G NA D A )

DURAÇÃO DA PROVA: 3 HORAS


Página 2 de 6

PROVA ESCRITA DE

DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL


Via Académica – 04 de março

1 - A presente prova é composta por DOIS grupos, ambos de resposta obrigatória.

2 - Cotações:
Grupo I - 14 valores.
Grupo ll - 6 valores (2 valores para cada questão).

3 - A atribuição da cotação máxima à resposta a cada questão pressupõe um tratamento


completo das várias questões suscitadas, que deverá ser coerente e corretamente
fundamentado, com indicação dos preceitos legais aplicáveis.

4 - Na cotação atribuída serão tidos em consideração a pertinência do conteúdo, a qualidade da


informação transmitida em relação à questão colocada, a organização da exposição, a
capacidade de argumentação e de síntese e o domínio da língua portuguesa.

5 - As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a grafia do "Acordo
Ortográfico da Língua Portuguesa" (aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º
26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto),
deverão declará-lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que lhes será
entregue, escrevendo "Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da
Assembleia da República n.º 26/91, não está em vigor com carácter de obrigatoriedade", sendo a
prova corrigida nesse pressuposto.

6 - Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até um máximo de
3 valores, para o total da prova.

7 - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento identificativo
da(o) candidata(o). A identificação constará apenas do destacável da folha de rosto, sob pena
de anulação da prova.
Página 3 de 6

GRUPO I
(14 valores)

ARTE DE MARTE, Lda. (doravante apenas ARTE DE MARTE) é uma sociedade por quotas que
tem por objeto a compra e venda de obras de arte, tendo como gerentes ANTÓNIO e BEATRIZ.
No dia 14 de fevereiro de 2016, PETER deslocou-se às instalações da ARTE DE MARTE, em
Lisboa, onde manteve uma longa conversa com o ANTÓNIO sobre arte sacra.
No decurso de tal conversa, PETER disse a ANTÓNIO que tinha conhecimento que no Museu
de Arte Sacra da AASA - ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DE SANTO ANTÓNIO, INSTITUIÇÃO
PARTICULAR DE SOLIDARIEDADE SOCIAL, pessoa coletiva de utilidade pública (doravante
apenas AASA), em Lisboa, estavam expostas três estátuas de Santo António, do século XVIII,
propriedade dessa associação, cada uma com o valor de 100.000 €, estando ele disposto a dar,
a quem lhe entregasse as três, discretamente, como sublinhou, 50.000 €.
Nesse mesmo dia (14), ANTÓNIO encontrou casualmente CARLOS, seu colega de escola
primária, ficando a saber que este era funcionário da AASA, como contabilista. Durante a
conversa, ANTÓNIO, que pretendia fazer com que a ARTE DE MARTE saísse da difícil situação
económica em que se encontrava, propôs a CARLOS um plano para retirarem do museu as três
referidas estátuas, que depois ANTÓNIO venderia, entregando - nessa altura - 5.000 € em
notas a CARLOS. Para isso, CARLOS teria de, no dia seguinte (15), ser o último a abandonar as
instalações da AASA, deixar as três estátuas junto à porta, o sistema de alarme e
videovigilância do museu desligado e a porta apenas encostada, sendo que, depois, ANTÓNIO
arranjaria forma de, às 03h00, as dali retirar. CARLOS, que se considerava mal pago pela AASA,
disse que o faria.
No dia 15, e conforme combinado com ANTÓNIO, CARLOS foi o último a abandonar as
instalações da AASA, tendo - antes de sair - deixado as três estátuas junto à porta e o sistema
de alarme e videovigilância do museu desligado. CARLOS deixou ainda a porta encostada.
Ainda no dia 14, ANTÓNIO ordenou a DANIEL, motorista da ARTE DE MARTE, que se
deslocasse às 03h00 (do dia 15), às instalações do Museu de Arte Sacra, que entrasse pela
porta (que não estaria fechada) e que delas retirasse as três estátuas que estariam logo à
entrada, levando-as depois para a sede da ARTE DE MARTE.
DANIEL, de imediato, retorquiu dizendo que aquilo “não lhe cheirava bem e que o patrão
queria pô-lo a fazer serviço sujo”. ANTÓNIO disse-lhe – assertivamente - que aquilo era uma
ordem e que, ou cumpria, ou seria despedido.
Ao final da tarde (do dia 14), não encontrando DANIEL, ANTÓNIO manuscreveu e deixou sobre
a secretária daquele um bilhete com o seguinte teor: “NÃO TE ESQUEÇAS: 3 DA MANHÃ!”.
Cerca das 02h00 (do dia 15), DANIEL, não obstante saber que aquelas estátuas eram da AASA,
temendo ser despedido, decidiu fazer o que ANTÓNIO lhe dissera e, na sua carrinha, deslocou-
se ao Museu de Arte Sacra. Encontrou a porta encostada e, pelas 03h00, por aí entrou, vendo
três estátuas junto à entrada. De imediato transportou uma delas para a carrinha. Tal estátua,
porém, era apenas uma réplica da original (que havia sido mandada fazer na China para
permanecer em exposição enquanto a original estava em restauro) e que, por isso, valia
apenas 100 €, facto que não era conhecido de ANTÓNIO, PETER, CARLOS ou DANIEL.
Entretanto, CARLOS, que não conseguia dormir com remorsos pelo que fizera, ativou
remotamente o sistema de alarme e videovigilância do museu e adormeceu tranquilo.
Página 4 de 6

Quando DANIEL voltou a entrar no museu, o alarme de imediato soou. Não o conseguindo
silenciar, DANIEL correu para fora do museu sem levar as duas estátuas restantes, dirigindo-se
às instalações da ARTE DE MARTE, onde deixou a estátua.
Na manhã seguinte, BEATRIZ viu a estátua no armazém, observou-a atentamente,
reconheceu-a como uma das peças do Museu de Arte Sacra e, de imediato, pediu explicações
ao seu irmão ANTÓNIO.
Este acabou por contar toda a verdade sobre tal peça a BEATRIZ e sobre a sua intenção de a
vender a PETER. Surpreendentemente para ANTÓNIO, BEATRIZ disse-lhe que ele “fizera muito
bem, pois a sociedade estava bem necessitada de dinheiro”, e que “fosse em frente com o
plano”.
Depois de contactado telefonicamente por ANTÓNIO, PETER deslocou-se de imediato às
instalações da ARTE DE MARTE, onde BEATRIZ, porque ANTÓNIO se ausentara
temporariamente, lhe exibiu a estátua e lhe disse que por ela queria 20.000 €.

Maravilhado ao observar a obra de arte, PETER disse a BEATRIZ que, porque há muito sonhava
com a estátua, ficaria com ela, de imediato lhe entregando 20.000 € em notas, sendo que, no
meio de alguns dos maços, ele havia previamente inserido cem notas de 100 € e cem de 50 €,
semelhantes às notas desses valores emitidas pelo Banco Central Europeu, mas, na realidade,
resultantes de reprodução daquelas por meio de impressão policromática a laser, que o seu
filho JOHN, de 16 anos de idade, havia feito com computador e impressora para brincar no
carnaval e ele encontrara casualmente em casa nessa manhã. Nada de errado encontrando
nas notas, BEATRIZ recebeu-as e entregou a estátua a PETER.

PETER levou a estátua consigo para casa. Quando a limpava, antes de a colocar exposta, viu na
base da mesma uma gravação com os dizeres “Made in China”.

De imediato, furioso, PETER deslocou-se à Esquadra da Polícia de Segurança Pública mais


próxima da sua residência e relatou ao agente EURICO, que o atendeu, que fora enganado por
ANTÓNIO e BEATRIZ, da sociedade ARTE DE MARTE, na compra de uma estátua, que afinal era
contrafeita.

Entretanto, ANTÓNIO descobriu que verdadeiramente só recebera 5.000 € de PETER e foi


depositá-los na conta bancária da ARTE DE MARTE, deixando as demais notas sobre a sua
secretária, num envelope fechado. Não entregou qualquer quantia a CARLOS, desistindo de o
fazer.

Ao final da tarde, EURICO dirigiu-se às instalações da ARTE DE MARTE, onde encontrou apenas
PAULA, que disse ser técnica de restauro da ARTE DE MARTE. EURICO identificou-se e
perguntou-lhe se poderia “dar uma vista de olhos pelas instalações”, ao que PAULA respondeu
“então a Polícia não há-de poder entrar?!”.

Sem mais, EURICO entrou no armazém e no escritório e encontrou, dentro de um envelope, as


cem notas de 100 € e as cem de 50 € que ANTÓNIO deixara, bem como o bilhete que na
véspera este escrevera a DANIEL (“NÃO TE ESQUEÇAS: 3 DA MANHÃ!”). Considerando-os
prova relevante, levou as notas e o bilhete consigo.

Na Esquadra, não se apercebendo que as notas não eram do Banco Central Europeu,
guardou-as consigo, decidido a utilizá-las para comprar um automóvel que pretendia. Elaborou
um “Auto de Apreensão” (nele mencionando a apreensão apenas do bilhete) e um “Relatório”
(onde descreveu o que PETER lhe contara, a sua deslocação às instalações da ARTE DE MARTE
e a apreensão de um bilhete manuscrito). Depois, enviou esse relatório e o auto de apreensão
ao seu superior hierárquico, o qual, por sua vez, os enviou ao Ministério Público.
Página 5 de 6

Aprecie a responsabilidade dos diversos sujeitos identificados no


texto à luz do Código Penal.
(14 valores)
Página 6 de 6

GRUPO
Caso 2II
Considere a situação factual descrita no Grupo I com os desenvolvimentos agora indicados.
(6 valores)

Responda às questões colocadas.

1 - Durante o inquérito, CARLOS foi detido e sujeito a primeiro interrogatório judicial.

No decurso desse ato, declarou que a sua namorada, TERESA, podia testemunhar no sentido
de que ele estivera toda a noite em casa com ela e que, por isso, não podia ter cometido os
factos que naquele momento lhe imputavam.

O advogado de CARLOS, invocando o disposto nos artigos 61.º, n.º 1, alínea g), e 340.º, n.º 1,
do Código de Processo Penal, requereu a imediata inquirição de TERESA naquela diligência,
informando que ela estava nas instalações do tribunal.

Qual deveria ser a decisão do juiz de instrução?


(2 valores)

2. No julgamento, JOSÉ, mecânico de automóveis, uma das testemunhas inquiridas, referiu


que, em finais de fevereiro de 2016, o arguido ANTÓNIO lhe pedira um orçamento para
reparação da carrinha da empresa, dizendo que fora o seu empregado DANIEL que com ela
batera, dias antes, quando ia fazer um serviço noturno a seu pedido.

ANTÓNIO, que no processo sempre recusara prestar declarações, recusou também responder
às perguntas do tribunal sobre essa alegação.

Pode o tribunal valorar estas declarações de JOSÉ?


(2 valores)

3. Durante o inquérito, por autorização do juiz de instrução, foi realizada interceção e gravação
das comunicações feitas pelo telefone de ANTÓNIO.

A única conversa que foi entendida por relevante e assim transcrita foi uma em que a mãe de
ANTÓNIO, MARTA, lhe dizia: “Por que foste tu roubar a estátua, ANTÓNIO?!”.

No julgamento, MARTA recusou prestar depoimento invocando o disposto no artigo 134.º do


Código de Processo Penal.

Pode o tribunal valorar a referida transcrição de conversa


telefónica?
(2 valores)
33.º Curso

Via Académica – 1.ª Chamada

GRELHA DE VALORAÇÃO E CORREÇÃO

GRUPO I

Aprecie a responsabilidade dos diversos sujeitos identificados no texto à luz do Código Penal.

(14 valores)

FACTOS NOTAS DE APRECIAÇÃO VALOR


I - ARTE DE MARTE
ANTÓNIO corrompe Carlos no interesse ANTÓNIO agiu em nome e no interesse da
da ARTE DE MARTE. sociedade. O crime de corrupção ativa está
no catálogo do artigo 11.º, n.º 2, do Código
Penal. A ARTE DE MARTE é responsável por
1 1,1
um crime de corrupção ativa, previsto e
punido pelas disposições conjugadas dos
artigos 11.º, n.º 2, alínea a), 374.º, n.º 1, e
386.º, n.º 1, alínea d), do Código Penal.
ANTÓNIO subtrai a estátua no interesse O crime de furto não está no catálogo do
da ARTE DE MARTE. artigo 11.º, n.º 2, do Código Penal. A ARTE
2 0,3
DE MARTE não pode ser responsabilizada
por tal crime.
BEATRIZ comete crime de recetação no O crime de recetação não está no catálogo
interesse da ARTE DE MARTE. do artigo 11.º, n.º 2, do Código Penal. A
3 0,3
ARTE DE MARTE não pode ser responsabili-
zada por tal crime.
II – ANTÓNIO
ANTÓNIO propôs a CARLOS um plano As IPSS têm também natureza de pessoa
para retirarem do museu as três está- coletiva de utilidade pública – artigo 8.º do
tuas, que depois ANTÓNIO venderia, Estatuto das Instituições Particulares de
entregando nessa altura a CARLOS Solidariedade Social, aprovado em anexo
5.000€ (cinco mil euros) em notas ao Decreto-Lei n.º 119/83, de 25.II. Os
seus funcionários enquadram-se no artigo
386.º, n.º 1, alínea d), do Código Penal.
Com a mera promessa de dar 5.000€ a
CARLOS se ele deixasse as três estátuas
4 0,9
junto à porta, o sistema de alarme e vide-
ovigilância do museu desligado e a porta
apenas encostada (que são contrários aos
seus deveres enquanto funcionário da
AASA, v.g., de lealdade e zelo), ANTÓNIO
cometeu, como autor material e na forma
consumada, um crime de corrupção ativa,
previsto e punido pelo artigo 374.º, n.º 1,
do Código Penal. É irrelevante que, mais
1
FACTOS NOTAS DE APRECIAÇÃO VALOR
tarde, tenha decidido não entregar qual-
quer quantia a CARLOS.
ANTÓNIO diz a DANIEL, assertivamente, Tal facto constitui ameaça com mal impor-
que ou cumpria a ordem ou seria despe- tante (o despedimento) e, por isso, AN-
dido TÓNIO cometeu, como autor material e
5 0,5
na forma consumada, um crime de coa-
ção, previsto e punido pelo artigo 154.º,
n.º 1, do Código Penal.
Subtração de uma estátua por DANIEL ANTÓNIO é responsável como instigador
pelo crime de furto cometido por DANIEL.
ANTÓNIO domina a vontade do seu funci-
onário DANIEL e, através deste, tem o
domínio do facto.
6 Cometeu assim, em (co)autoria material, 0,9
um crime de furto qualificado, na forma
tentada, previsto e punido pelas disposi-
ções conjugadas dos artigos 203.º, n.º 1, e
204.º, n.º 1, alínea f), e n.º 2, alíneas a) e
d).
III – BEATRIZ
BEATRIZ diz a ANTÓNIO que ele “fizera Este apoio moral aos atos de ANTÓNIO já
muito bem, pois a sociedade estava bem praticados não é merecedor de qualquer
7 0,3
necessitada de dinheiro” censura penal, pois é posterior aos mes-
mos.
BEATRIZ vê a estátua no armazém, manu- Com tais condutas, BEATRIZ cometeu,
seia-a, observa-a atentamente, reconhe- como autora material e na forma consu-
ce-a como uma das peças do Museu de mada, um crime de recetação, previsto e
Arte Sacra, sabe que foi furtada, diz ao punido pelo artigo 231.º, n.º 1, do Código
8 0,9
irmão para a vender. É ela que acaba por Penal. Ela, com intenção de obter, para a
a vender a PETER. ARTE DE MARTE, vantagem patrimonial,
fica na posse da estátua.

IV - CARLOS
CARLOS, funcionário da AASA – IPSS, Com a mera aceitação da promessa AN-
aceita a promessa de ANTÓNIO (receber TÓNIO de lhe dar 5.000€ para a prática de
5.000€) para deixar as três estátuas jun-actos contrários aos seus deveres enquan-
to à porta, o sistema de alarme e video- to funcionário da AASA, v.g., de lealdade e
vigilância do museu desligado e a porta zelo, CARLOS cometeu, como autor mate-
9 0,9
apenas encostada rial e na forma consumada, um crime de
corrupção passiva, previsto e punido pelo
artigo 373.º, n.º 1, do Código Penal. É
irrelevante que não tenha chegado a re-
ceber qualquer quantia.
CARLOS, em conformidade com o plano Com estas condutas, CARLOS cometeu, em
acordado com ANTÓNIO, deixa as três (co)autoria material, um crime de furto
estátuas junto à porta e o sistema de qualificado, na forma tentada, previsto e
10 alarme e videovigilância do museu desli- punido pelas disposições conjugadas dos 0,9
gado; deixou a porta encostada (uma das artigos 203.º, n.º 1, 204.º, n.º 1, alínea f), e
estátuas é retirada por DANIEL em cum- n.º 2, alíneas a) e d), 22.º, 23.º e 73.º do
primento da ordem de ANTÓNIO) Código Penal.
2
FACTOS NOTAS DE APRECIAÇÃO VALOR
CARLOS, com remorsos pelo que fizera, Esta conduta não é suficiente para se con-
ativou remotamente o sistema de alar- siderar relevante a desistência – artigo
me e videovigilância do museu. 24.º, n.º 1, do Código Penal. CARLOS já
executara todos os atos do plano do furto
que lhe cabiam. O mero ligar do alarme
11 0,5
não era suficiente para impedir a consu-
mação, pois a porta continuava aberta e
qualquer pessoa, ainda que com o alarme
a tocar, poderia facilmente entrar e retirar
qualquer peça do museu.
V - DANIEL
DANIEL, em cumprimento da ordem de Com estas condutas, DANIEL comete, em
ANTÓNIO, temendo ser despedido, e nos (co)autoria material, um crime de furto
termos acordados entre este e CARLOS, qualificado, na forma tentada, previsto e
12 retira uma das estátuas do museu (que punido pelas disposições conjugadas dos 0,9
não sabe ser mera réplica), não conse- artigos 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, alínea
guindo retirar as demais porque o alarme f), e n.º 2, alíneas a), d) e g), 22.º, 23.º e
toca e não o consegue silenciar. 73.º do Código Penal.
VI - PETER
PETER conversa com ANTÓNIO e diz-lhe Esta conduta de PETER não é suficiente
estar disposto a dar 50.000€ a quem lhe para lhe imputar responsabilidade, como
entregasse as três estátuas “discreta- instigador, dos crimes que ANTÓNIO vem
mente”. depois a cometer. Ele não determina AN-
TÓNIO à prática de qualquer facto ilícito,
assunto que nem é objeto da conversa. É
ANTÓNIO que, mais tarde, em conversa
com CARLOS, elabora um plano. Não se
pode dizer que PETER criou em ANTÓNIO a
13 decisão de cometer o crime. PETER não 0,5
tinha qualquer domínio sobre a vontade
de ANTÓNIO.
Tão pouco se pode considerar que há
cumplicidade, por auxílio moral. A prática
de crime não é objeto da conversa, não
sabendo PETER se ANTÓNIO vai ou não
cometer crime (que poderia ser de furto,
roubo, corrupção ou até outros), quando e
de que forma.
PETER entrega a ANTÓNIO 100 notas de Com essa conduta, PETER comete, em
100€ e 100 de 50€, semelhantes às notas autoria material e na forma consumada,
do mesmo valor emitidas pelo Banco um crime de passagem de moda falsa,
Central Europeu, mas, na realidade, re- previsto e punido pelo artigo 265.º, n.º 1,
sultantes de reprodução daquelas por alínea a), do Código Penal.
meio de impressão policromática a laser, É irrelevante o facto de as notas servirem
14 0,7
que o seu filho JOHN, de 16 anos de ida- para pagar um objeto furtado. O bem jurí-
de, havia feito com computador e im- dico protegido não é a confiança da pessoa
pressora para brincar no carnaval e ele concreta que recebe as notas, mas sim a
encontrara casualmente em casa nessa integridade do sistema monetário legal.
manhã. É de afastar qualquer burla sobre ANTÓ-
NIO, pois está a enganar PETER, vendendo-
3
FACTOS NOTAS DE APRECIAÇÃO VALOR
lhe uma réplica como se fosse a obra origi-
nal. A situação de ANTÓNIO não merece
tutela jurídica, pelos fundamentos expos-
tos.
PETER recebe a estátua de ANTÓNIO e Embora desconheça a forma concreta co-
dela se apropria. mo ANTÓNIO entrou na posse da estátua,
PETER sabe que foi mediante crime contra
o património, pois sabe que a estátua é
propriedade da AASA e é por essa razão
15 0,9
que paga por ela um valor muito inferior
ao seu valor real. Comete assim, em auto-
ria material e na forma consumada, um
crime de recetação, previsto e punido
pelo artigo 231.º, n.º 1, do Código Penal.
VII – JOHN
JOHN, com computador e impressora, Tal conduta não integra o crime de con-
fabricou 100 notas de 100€ e 100 de 50€, trafação de moeda, previsto e punido pelo
semelhantes às notas do mesmo valor artigo 262.º, n.º 1, do Código Penal, pois
16 0,5
emitidas pelo Banco Central Europeu, JOHN praticou contrafação de moeda, mas
para brincar no carnaval. não tinha intenção de a pôr em circulação
como legítima.
VIII - EURICO
EURICO entrou nas instalações da ARTE Ainda que se afigure que essa funcionária
DE MARTE com autorização apenas de não tinha legitimidade para autorizar a
uma funcionária. busca (para efeitos do disposto no artigo
174.º do CPP), tal autorização é suficiente
17 0,3
para excluir a tipicidade da conduta face
ao crime de introdução em lugar vedado
ao público, previsto e punido pelo artigo
191.º do Código Penal.
EURICO guarda as 100 notas de 100€ e EURICO cometeu, como autor material e
as 100 de 50€, fazendo-as coisa sua na forma tentada, um crime de peculato,
1
18 previsto e punido pelas disposições conju-
gadas dos artigos 375.º, n.º 1, 22.º, n.ºs 1
e 2, alínea a), 23.º, e 73.º do Código Penal.
EURICO fica na posse de notas falsas Com essa conduta, EURICO poderia come-
com intenção de as utilizar para comprar ter o crime de aquisição de moeda falsa
um automóvel para ser posta em circulação, previsto e
punido pelo artigo 266.º, n.º 1, alínea a)
(que pune todas as formas de detenção de
0,7
19 moeda falsa com vista à colocação em cir-
culação). Porém, EURICO está em erro so-
bre um elemento típico, o que exclui o
dolo. Como este crime não é punível a títu-
lo de negligência, a sua conduta não é
punível.
EURICO elaborou auto de apreensão e Era dever legal de EURICO fazer constar
relatório, neles omitindo que apreendeu desses documentos que tinha apreendido
20 1
também 15.000€ em notas de 50 e de também tais notas – artigos 99.º, 178.º, n.º
100. 2, 252.º, n.º 3, e 275.º do CPP.
4
FACTOS NOTAS DE APRECIAÇÃO VALOR
Ao omitir tal facto, incorreu na prática,
como autor material e na forma consu-
mada, de dois crimes de falsificação de
documento, previsto e punido pelo artigo
256.º, n.º 1, alínea d), n.º 3 e n.º 4, do
Código Penal.

GRUPO II

Considere a situação factual descrita no Grupo I com os desenvolvimentos agora indicados.

Responda às questões colocadas.

(6 valores)

Questão 1 – 2 valores
[Qual deveria ser a decisão do juiz de instrução? (sobre o requerimento de inquirição de Teresa)]
O juiz de instrução deveria declarar-se incompetente para decidir sobre a inquirição de testemunha
durante o inquérito.
A questão respeita à estrutura acusatória do nosso processo penal, à direção do inquérito pelo Minis-
tério Público, à natureza das funções do juiz de instrução durante essa fase e, consequentemente, às
suas competências. A direção do inquérito cabe ao Ministério Público, assistido pelos órgãos de polícia
criminal – artigo 263.º, n.º 1, do CPP. A competência do juiz de instrução durante a fase de inquérito
está prevista no artigo 268.º, que não prevê a possibilidade de o juiz de instrução realizar oficiosamente
quaisquer diligências de recolha de prova durante essa fase do processo. O n.º 4 é expresso ao dizer
que “o juiz decide (…) com base na informação que, conjuntamente com o requerimento, lhe for
prestada (…)”.
O CPP permite apenas ao juiz de instrução, em matéria de medidas de coação, que “a fim de funda-
mentar as decisões sobre a manutenção, substituição ou revogação da prisão preventiva ou da obriga-
ção de permanência na habitação, o juiz, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público ou do
arguido, pode solicitar a elaboração de perícia sobre a personalidade e de relatório social ou de infor-
mação dos serviços de reinserção social, desde que o arguido consinta na sua realização.” – artigo
213.º, n.º 4, do CPP. Não prevê, pois, a possibilidade de inquirição de testemunhas como forma de
afastar os indícios existentes, antes da decisão sobre a aplicação. Tal possibilidade permitiria, em ver-
dade, a existência de dois inquéritos paralelos: um realizado pelo Ministério Público, outro pelo juiz de
instrução (a que Paulo Pinto de Albuquerque, no seu “Comentário ao Código de Processo Penal” chama
até de “para-inquérito” ou de “contra-inquérito”), o que se afigura incompatível com a estrutura acusa-
tória do nosso processo penal, consagrada no artigo 32.º, n.º 5, da CRP. Nessas vestes de “juiz-
investigador”, o juiz ficaria seriamente condicionado na sua imparcialidade e não poderia verdadeira-
mente ser o “juiz das liberdades” (não esquecer que, naturalmente, essas diligências de prova realiza-
das pelo juiz de instrução poderiam permitir a recolha de prova adicional contra o arguido).
As alterações introduzidas ao regime de aplicação de medidas de coação em 2007 (quer no artigo
141.º, quer no 194.º), reforçaram a posição de que a decisão do juiz de instrução terá de basear-se
apenas nos meios de prova indicados pelo Ministério Público, a quem compete fazer a sua seleção (ar-
tigo 141.º, n.º 1, e n.º 4, alínea e); artigo 194.º, n.º 6, alínea b), e n.º 7). Valendo em todas as fases do
processo o princípio de presunção de inocência do arguido, o juiz de instrução deverá resolver todas as
dúvidas razoáveis que tenha em favor do arguido.

5
Questão 2 – 2 valores
[Pode o tribunal valorar as declarações de JOSÉ?]
A resposta deve ser afirmativa. Não existe óbice legal à admissibilidade de tal meio de prova.
Esta questão está relacionada com o direito do arguido à não auto-incriminação, de que o disposto no
artigo 61.º, n.º 1, alínea d), do CPP, é manifestação, e à dimensão de tal direito.
O direito à não auto-incriminação não é absoluto, nomeadamente não permite ao arguido opor-se à
sua inclusão num reconhecimento presencial ou à comparação do seu perfil de ADN com o perfil de
ADN encontrado no local do crime, ou até à admissão de documentos por si produzidos ou escutas
telefónicas que gravem as suas declarações.
Não se trata de um depoimento indireto, a submeter ao regime do artigo 129.º do CPP. Este artigo
destina-se apenas aos depoimentos de testemunhas que ouviram dizer a outras testemunhas. O argui-
do presta declarações quando quer e numa manifestação do seu direito de defesa, não como meio de
prova de que o tribunal se socorre para tornar “valorável” outro meio de prova. O arguido não pode ser
simultaneamente testemunha. Logo, o tribunal não poderia nunca chamar o arguido a depor, como
determina o n.º 1 deste artigo. Nestes termos, não merece acolhimento uma interpretação deste artigo
no sentido de colocar o arguido como “garante” (quer preste declarações, quer se remeta ao silêncio)
da apreciação pelo tribunal da razão de ciência e credibilidade da testemunha de lhe ouvir-dizer, nem
que, com a sua chamada a “depor”, se estabeleça entre ele e o tribunal uma imediação efetiva da pro-
va.
Apesar de ficar fora do âmbito de aplicação do artigo 129.º do CPP, o depoimento sobre o que se ouviu
dizer ao arguido é, ainda que com exceções, legalmente admissível e valorável pelo julgador. O princí-
pio a aplicar será o do artigo 125.º do CPP: são admissíveis todas as provas que não forem proibidas por
lei. No caso, o depoimento é admissível, ficando sujeito à livre apreciação do tribunal, nos termos pre-
vistos nos artigos 125.º e 127.º do Código de Processo Penal, pois não se verifica qualquer das circuns-
tâncias previstas o artigo 126.º do Código de Processo Penal.
A disciplina do artigo 357.º do CPP não se aplica a outros meios de obtenção de prova, como documen-
tos com declarações extraprocessuais do arguido.

Questão 3 – 2 valores
[Pode o tribunal valorar a transcrição de conversa telefónica de MARTA?]
A resposta deve ser afirmativa.
A prova testemunhal e a prova obtida através das interceções telefónicas têm diferentes naturezas. O
regime das interceções telefónicas não se reconduz, pois, ao primeiro. O artigo 187.º do CPP não retira
do catálogo das pessoas “escutáveis”, nomeadamente quando se enquadrem na categoria dos inter-
mediários (n.º 4, alínea b)), aquelas pessoas previstas no n.º 1 do artigo 134.º.
O fundamento da possibilidade de recusa de depoimento (artigo 134.º, n.º 1, do CPP) é evitar que al-
guém, sendo obrigado à verdade, seja colocado na situação/dilema de, para não cometer um crime, ter
de contribuir para a condenação de um familiar; ora, tal não sucede na escuta telefónica, pois aí, como
se desconhece a sua existência, não há “dilema”. Se não pudessem ser utilizadas essas, por maioria de
razão, também não poderiam ser utilizadas as do próprio arguido quando ele se remete ao silêncio e
documentos ou correspondência desse familiar. E podem.

6
Página 1 de 9

PROVA ESCRITA
DE
DEIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL

33.º CURSO DE FORMAÇÃO INICIAL PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

Via Académica

AVISO DE ABERTURA: AVISO N .º 320-A/2017, PUBLICADO EM D.R.


2.ª SÉRIE, N.º 05, DE 06 DE JANEIRO DE 2017

DATA: 09 DE MARÇO DE 2017

2.ª CHAMADA

HORA: 14H15M ( D E A C OR D O C O M O D I SP O ST O N O A R T . º 1 2. º D O
R E GU L A ME NT O I N TER N O D O C E NT R O D E E S TU D O S J U D IC IÁ R I O S, O T E M PO D E
D UR A Ç Ã O D A PR O V A I N IC IA - SE D E C OR R ID O S 1 5 M IN U TO S A P ÓS A HO R A
D ES I G NA D A )

DURAÇÃO DA ESCRITA
PROVA PROVA: DE 3 HORAS
Página 2 de 9

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL


Via Académica – 2ª Chamada

1 - A presente prova é composta por três grupos de resposta obrigatória.

2 - Cotações
Grupo I
a) 6 valores
b) 2 valores

Grupo II
a) 2,5 valores
b) 2 valores
c) 2 valores

Grupo III
a) 2 valores
b) 3,5 valores

3 - A atribuição da cotação máxima à resposta a cada questão pressupõe um tratamento completo das
diversas questões suscitadas, que deverá ser coerente, corretamente fundamentado e com remissão
para os preceitos legais aplicáveis.
4 - A cotação a atribuir terá em consideração a pertinência do conteúdo, a qualidade da informação
transmitida em relação à questão colocada, a organização da exposição, a capacidade de argumentação
e de síntese e o domínio da língua portuguesa.

5 - As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a grafia do "Acordo Ortográfico
da Língua Portuguesa" (aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo
Decreto do Presidente da República n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-
lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que lhes será entregue, escrevendo
"Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91,
não está em vigor com carácter de obrigatoriedade", sendo a prova corrigida nesse pressuposto.

6 - Os erros ortográficos serão valorados negativamente: 0,25 por cada um, até um máximo de 3 valores,
para o total da prova

7 - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento identificativo da/o
candidata/o (a identificação constará apenas do destacável da folha de rosto), sob pena de anulação da
prova.
Página 3 de 9

GRUPO I

(8 valores)

Ananias é funcionário dos “CTT-Correios de Portugal, S.A.” (concessionária de serviço


público relativamente à prestação do serviço postal universal), com a categoria
profissional de carteiro e exerce as suas funções no Centro de Distribuição Postal 3020
Coimbra.
No dia 10 de dezembro de 2015, Ananias comentou com o seu amigo Zacarias que, no
exercício das suas funções de carteiro, distribuía correspondência contendo objetos de
ourivesaria e joalharia, de valor pecuniário significativo.
Zacarias, que é comerciante e se dedica à compra e venda de ouro e outros metais e
pedras preciosas, logo vislumbrou uma oportunidade de ganhar bastante dinheiro e
propôs a Ananias que retirasse dos circuitos postais tal correspondência e lhe
entregasse os objetos nela contidos, comprometendo-se a pagar-lhe em dinheiro
metade do seu valor comercial.
Ananias aceitou imediatamente.
No dia 16 de dezembro de 2015, Ananias, que tinha para distribuir um pacote postal
procedente da “Ourivesaria Leitão de Ouro” e destinado a “Ventura e Valente,
Reparações de Ourivesaria e Joalharia, Lda.", abriu-o e, depois de verificar que
continha um colar em ouro, com o valor de € 1.200 (mil e duzentos euros), guardou-o
consigo, assim o fazendo seu. Nesse mesmo dia, Ananias entregou a Zacarias o colar, o
qual, por sua vez, lhe entregou a quantia de € 600 (seiscentos euros), a título de
pagamento.
No dia 22 de dezembro de 2015, Ananias, que tinha para distribuir um pacote postal
procedente da “Ourivesaria Aliança” e destinado a “Ventura e Valente, Reparações de
Ourivesaria e Joalharia, Lda.”, abriu-o e, depois de verificar que continha um par de
botões de punho em ouro e diamantes, com o valor de € 2.100 (dois mil e cem euros),
guardou-o consigo, assim o fazendo seu. Nesse mesmo dia, Ananias entregou a
Zacarias os botões de punho, o qual, por sua vez, entregou a Ananias a quantia de
1.050€ (mil e cinquenta euros), a título de pagamento.
Página 4 de 9

Na sequência de reclamações dos seus clientes, Ventura, sócio-gerente da “Ventura e


Valente, Reparações de Ourivesaria e Joalharia, Lda.”, desconfiou que alguém estaria a
desviar correspondência remetida à sua empresa.
Ventura, que já tinha desempenhado as funções de carteiro, decidiu investigar o que
se passava.
Assim, pelas 01:30 horas, de 12 de janeiro de 2016 (sabendo que na véspera tinha sido
despachado um pacote postal contendo um par de brincos em ouro e diamantes, com
o valor de € 1.500, procedente da “Joalharia Aníbal Barca” e destinada à sua empresa),
Ventura deslocou-se ao Centro de Distribuição Postal 3020 Coimbra, fazendo-se
transportar no seu veículo.
Constatando que a porta de acesso estava aberta e aproveitando a distração dos
trabalhadores, Ventura entrou no edifício e dirigiu-se à sala de expedição de correio.
Depois de confirmar que o aludido pacote postal aí se encontrava, instalou uma
câmara de vídeo acionada por controlo remoto e que permitia aceder às gravações em
tempo real.
De seguida, abandonou o local e entrou no seu veículo (que tinha deixado estacionado
nas proximidades), onde ficou a assistir às imagens captadas pela câmara de vídeo.
Cerca das 09:10 horas, de 12 de janeiro de 2016, Ananias entrou na sala de expedição
de correio e retirou toda a correspondência do seu giro, incluindo o referido pacote
que colocou numa mala. Seguidamente, dirigiu-se ao seu motociclo de serviço onde
acondicionou a mala e abandonou o local para proceder à distribuição da
correspondência.
Ventura, que tinha seguido estas movimentações de Ananias através das filmagens da
câmara de vídeo, seguiu no encalço de Ananias, conduzindo o seu veículo.
Ao longo de toda a manhã, Ventura manteve-se sempre no encalço de Ananias até
que, pelas 13:15 horas, este parou o seu motociclo junto do veículo de Zacarias.
Com efeito, sem que Ventura tivesse conhecimento, Ananias tinha entretanto
marcado um novo encontro com Zacarias.
Vendo Ananias entrar para o veículo de Zacarias, para o lugar ao lado do condutor,
levando consigo um pacote, Ventura, calculando que Ananias se preparava para
entregar os brincos a Zacarias, saiu imediatamente do seu veículo e correu na direção
do veículo deste último (Zacarias).
Página 5 de 9

Ato contínuo, Ventura abriu a porta do lado do condutor e tentou tirar o pacote com
os brincos das mãos de Zacarias. Como Zacarias não o largasse, Ventura desferiu-lhe
diversos murros na cara, logrando apoderar-se dele e afastar-se do local. Dirigiu-se de
imediato à esquadra policial mais próxima onde procedeu à entrega do pacote e
relatou o sucedido.

a) Aprecie a responsabilidade penal de Ananias, Ventura e


Zacarias. (6 valores)
b) Poderá o Tribunal valorar o registo vídeo realizado com a
câmara de Ventura? (2 valores)
Página 6 de 9

GRUPO II

(6,5 valores)

No âmbito de um inquérito, na sequência de competência que lhes foi delegada pelo


Ministério Público (MP) ao abrigo do disposto no art.º 144.º, n.º 2, do Código de Processo
Penal (CPP), Nuno e Joaquim, dois órgãos de polícia criminal (OPC), procedem ao
interrogatório de Aníbal, suspeito de ser responsável pelo desaparecimento de uma criança
com 10 anos de idade, a cujos pais está a ser pedido um resgate de um milhão de euros. Tal
suspeita resultava do relato da testemunha Beatriz que havia visto o Aníbal, nos dias
anteriores, a rondar a escola de onde desapareceu a criança.

Tendo o arguido Aníbal comparecido voluntariamente ao interrogatório e renunciado à


presença de Defensor, encontrando-se sozinho, os OPC’s resolveram obter a verdade a
qualquer preço com vista a tentar encontrar a criança.

Neste contexto, os referidos OPC’s, numa sala de interrogatórios devidamente fechada,


despiram integralmente o arguido, amarrando-o de seguida a uma cadeira com o uso de fortes
cordas e, sob a promessa veemente, proferida por diversas vezes, de lhe baterem com uma
barra de ferro, lograram que este admitisse que tinha já morto a criança um dia antes e
escondido, logo de seguida, o respetivo corpo num contentor de lixo cuja localização indicou
em pormenor.

Nesta sequência, deixando o arguido nas instalações da polícia, os ditos OPC’s dirigiram-se
logo ao referido contentor de lixo onde encontram o corpo da criança sem vida. Mais
descobriram, nesse mesmo local, uma luva com vestígios biológicos que, submetidos a análise
na entidade competente, corresponderam ao perfil de ADN do dito arguido constante da base
de dados existente para efeitos de identificação civil e criminal. Aproveitando uma ausência
dos OPC’s, o arguido logrou fugir e encontra-se, presentemente, em parte incerta.

Com vista a não deixar rastro da respetiva atuação, o conteúdo confessório do dito
interrogatório apenas foi reduzido a auto assinado pelo arguido, tendo os OPC’s consignado a
indisponibilidade técnica de quaisquer meios para a gravação áudio do ato, o que sabiam não
corresponder à verdade.
Página 7 de 9

Com vista à aplicação de uma medida de coação ao dito arguido, e ao abrigo dos artigos 254.º,
n.º 1, al. a) e 257.º, al. a), do CPP, foram emitidos pelo MP, mandados de detenção que se
encontram pendentes e por cumprir.

Após, o MP, desconhecendo o modo como os OPC’s obtiveram a confissão do arguido, deduziu
acusação contra este, imputando-lhe a prática de um crime de extorsão, previsto e punido
pelos artigos 223.º, n.º 1 e 3, al. a), 204.º, n.º 2, al. a) e 22.º, n.º 1 e 2, al. a), do Código Penal,
em concurso efetivo com a prática de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido
pelo art.º 132.º, n.º 2, als. c) e e), do mesmo código, indicando como prova as testemunhas
Beatriz, Nuno e Joaquim, as declarações do arguido perante os OPC’s, o relatório da autópsia
elaborado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, o auto de apreensão
da luva e o relatório pericial que conclui que esta contém vestígios biológicos correspondentes
ao perfil de ADN do arguido.

Aprecie:

a) A responsabilidade penal de Nuno e Joaquim; (2,5 valores)

b) A validade da prova indicada pelo MP na acusação;


(2 valores)

c) A validade dos mandados de detenção emitidos. (2 valores)


Página 8 de 9

GRUPO III

(5,5 valores)

O arguido Francisco foi acusado pelo MP da prática, em 2016, de um crime de peculato,


previsto e punido pelo artigo 375.º, n.º 1, do Código Penal, tendo por base, em suma, o facto
daquele, enquanto funcionário do Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Vila
Nova de Gaia, ter feito coisa sua, o montante de vinte e seis mil euros (€ 26.000,00), que lhe
tinha sido entregue pela empresa “Sisterne, Lda.”, para pagamento de uma licença de
construção emitida pela dita Câmara.

Com aqueles vinte e seis mil euros o arguido Francisco Santana dirigiu-se ao casino da Póvoa
do Varzim, tendo gasto o dinheiro no jogo.

Face à notificação da acusação do MP, o arguido, perante o tribunal competente, apresentou


validamente um requerimento de abertura de instrução, onde alega, em síntese, que
inexistem indícios suficientes recolhidos no inquérito que sustentem que recebeu o dinheiro
conforme lhe é imputado, tendo pedido a inquirição de duas testemunhas para sustentar tais
alegações. Concluiu que deve ser proferido despacho de não pronúncia.

Na fase de instrução, face a informação bancária já constante do inquérito que sustentava que
um cheque emitido pela empresa “Sisterne, Lda.”, no valor de vinte e seis mil euros (€
26.000,00) tinha sido depositado em conta pessoal do arguido, e a um auto de inquirição,
também elaborado no inquérito, relativo a uma testemunha trabalhador da mesma empresa
que declarou que tinha entregue aquele mesmo cheque ao arguido, por pensar que este era
funcionário da Câmara, já que se tinha apresentado como tal nas instalações da empresa, as
diligências de prova requeridas pelo arguido foram indeferidas pelo Juiz de Instrução Criminal
(JIC) ao abrigo do disposto no art.º 291.º, n.º 1, do CPP, por os ter considerado meramente
dilatórias.

Contudo, no âmbito de diligências junto da Câmara, oficiosamente determinadas pelo JIC ao


abrigo do mesmo normativo, apurou-se que o arguido – afinal -, quando recebeu a dita
quantia monetária, já tinha sido demitido pouco tempo antes, mas de forma definitiva, das
suas funções na Câmara.

Recebida tal informação o JIC designou de imediato data para a realização de debate
instrutório, o qual se realizou sem a produção de quaisquer provas.
Página 9 de 9

No debate, o MP pugnou - em suma - pela existência de indícios suficientes para a submissão


do arguido a julgamento, tendo o Defensor sustentado posição oposta.

a) Em harmonia com a factualidade indiciariamente apurada em


sede de Instrução, retire as devidas consequências à luz
da lei penal. (2 valores)
b) Em harmonia com a mesma factualidade indique qual deveria
ser o sentido da decisão instrutória. (3,5 valores)
33.º Curso
Via Académica – 2.ª Chamada
GRELHA DE VALORAÇÃO E CORREÇÃO

em fundamentos consistentes.

GRUPO I

a) Aprecie a responsabilidade penal de Ananias, Ventura e Zacarias

Ananias:
- 1 (um) Crime de Corrupção passiva, previsto e punido pelo artigo 373.º, n.º1, do CP, como
autor. (0,5 valores)
- 3 (três) Crimes de Peculato, previsto e punido pelos artigos 26.º e 375.º, n.º1, do CP, como co-
autor (0,75 valores)
- 3 (três) Crimes de Violação de segredo de correspondência ou de telecomunicações, previsto e
punido pelos artigos 26.º e 384.º, alíneas a) e b), do CP, como co-autor. (0,75 valores)

Zacarias:
- 1 (um) Crime de Corrupção ativa, previsto e punido pelo artigo 374.º, n.º1, do CP, como autor.
(0,5 valores)
- 3 (três) Crimes de Peculato, previsto e punido pelos artigos 26.º, 28.º, n.º1 e 375.º, n.º1, do CP,
como co-autor (1 valor)
- 3 (três) crimes de Violação de segredo de correspondência ou de telecomunicações, previsto e
punido pelos artigos 26.º, 28.º, n.º1 e 384.º, alíneas a) e b), do CP, como co-autor. (1 valor)

Ventura:
- 1 (um) crime de Introdução em lugar vedado ao público, previsto e punido pelo artigo 191.º,
do CP, como autor. (0,5 valores)
- 1 (um) crime de Gravações e fotografias ilícitas, previsto e punido pelo artigo 199.º, n.º2,
alínea a), do CP, como autor. (0,5 valores)
1
- 1 (um) crime de Ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º, n.º1,
do CP, como autor. (0,5 valor)

b) Poderá o Tribunal valorar o registo vídeo realizado com a câmara de Ventura

de registo de vídeo com recurso a

- por particulares atrav obtidas sem


consentimento, a
de
prova (artigos 26.º, n.º 1 e 32.º, n.º 8, da CRP, artigo 126.º, n.º 3 e 4, do CPP, artigo 199.º, n.º 2,
al. a), 21.º e 35.º, do CP). (2 valores)

GRUPO II

Questão 1

[Aprecie a responsabilidade penal de Nuno e Joaquim]

a) “… os referidos OPC’s, numa sala de interrogatórios devidamente fechada, despiram


integralmente o arguido, amarrando-o de seguida a uma cadeira com o uso de fortes
cordas e, sob a promessa veemente, proferida por diversas vezes, de lhe baterem com
uma barra de ferro, lograram que este admitisse que tinha já morto a criança um dia
antes e escondido, logo de seguida, o respetivo corpo num contentor de lixo cuja
localização indicou em pormenor.”

Ambos os OP ’ (Nuno e Joaquim) cometeram, em co-autoria material (art. 26.º do CP), um


crime de tortura e outros tratamentos cruéis, degradantes ou desumanos, previsto e punido
pelo artigo 243.º, n.º 1, al. a) e n.º 3, do CP. (1,25 valores)

b) “Com vista a não deixar rastro da respetiva atuação, o conteúdo confessório do dito
interrogatório apenas foi reduzido a auto assinado pelo arguido, tendo os OPC’s
consignado a indisponibilidade técnica de quaisquer meios para a gravação áudio do
ato, o que sabiam não corresponder à verdade.”.

2
Ambos os OP ’ (Nuno e Joaquim) cometeram, em co-autoria material (art.º 26.º do CP), um
crime de falsificação ou contrafação de documento autêntico por funcionário, previsto e
punido pelas disposições conjugadas dos artigos 255.º al. a), 256.º, n.º 1, al. d), 3 e 4), 386.º, n.º
1 al. b), do CP. (1,25 valores)

Questão 2

[Aprecie a validade da prova indicada pelo MP na acusação]

São indicados na acusação os seguintes meios de prova:


a) testemunhas Beatriz, Nuno e Joaquim;
b) as declarações do arguido perante os OPC’ ;
c) o relatório da autópsia elaborado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal;
d) o auto de apreensão da luva;
e) o relatório pericial que conclui que a luva contém vestígios biológicos
correspondentes ao perfil de ADN do arguido.

Os meios de prova supra indicados em b), d) e e), não podem ser valorados, o primeiro por
constituir prova proibida ao abrigo do art. 126.º, n.º 1 e 2, al. a), do CPP, os demais por estarem
contaminados por aquela (efeito-à-distância ou doutrina dos frutos da árvore envenenada). (2
valores)

Questão 3:

[Aprecie a validade dos mandados de detenção emitidos]

Em virtude da já analisada existência de uma prova proibida e efeito-à-distância da mesma,


coloca-se a questão de saber se o ato processual ora em causa (a emissão de mandados de
detenção relativos ao arguido, com vista a ser presente para 1.º interrogatório judicial/aplicação
de uma medida de coação - artigos 254.º, n.º 1 al. a) e 257.º, al. a), do CPP) também é
contaminado por aquela. Contudo, a validade destes mandados não é afetada pela prova proibida,
porquanto sempre seria legítima a respetiva emissão com base na suspeita resultante do
depoimento da testemunha Beatriz (prova de “ ”) que havia visto o arguido

3
Aníbal a rondar a escola de onde desapareceu a criança, nos dias anteriores, sendo certo que o
arguido, atualmente, se encontra em parte incerta. (2 valores)

GRUPO III

Questão 1

[Em harmonia com a factualidade indiciariamente apurada em sede de Instrução, retire


as devidas consequências à luz da lei penal]

Na fase de instrução, resulta que o arguido, em vez de praticar o crime pelo qual tinha sido
acusado pelo MP (crime de peculato, previsto e punido pelo artigo 375.º, n.º 1, do Cód. Penal),
praticou um crime de burla, qualificada atento o valor consideravelmente elevado em causa,
previsto e punido pelos artigos 202.º, al. b), 217.º, n.º 1, 218.º, n.º 1 e 2 al. a), do CP. Com
efeito, em tal fase apurou-se que o arguido, quando recebeu a quantia monetária em causa, já
tinha sido demitido pouco tempo antes mas de forma definitiva, das suas funções na Câmara.
Mais resultou que uma testemunha trabalhador da empresa ofendida declarou que tinha entregue
um cheque, que titulava a quantia monetária em causa, ao arguido, por pensar que este era
funcionário da Câmara, já que este se tinha apresentado como tal nas instalações da empresa
(conduta astuciosa). (2 valores)

Questão 2

[Em harmonia com a mesma factualidade indique qual deveria ser o sentido da decisão
instrutória]

Em harmonia com a resposta à questão anterior, a nova factualidade apurada em sede de


instrução, subsume-se a um crime de burla qualificada, sendo certo que os elementos
constitutivos deste crime são diversos dos elementos constitutivos do crime de peculato
originalmente imputado ao arguido na acusação, em particular quanto à supra referida conduta
astuciosa.
Tal crime deve, assim, considerar-se “ ” no sentido dado pelo art. 1.º, al. f), do
CPP.

4
Nestes termos, ao abrigo do art. 303.º, n.º 3, do CPP, aquela alteração substancial dos factos,
não poderá ser considerada e restará proferir despacho de não pronúncia. (3,5 valores)

***

5
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL

33.º CURSO DE FORMAÇÃO INICIAL PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

Via Profissional

AVISO DE ABERTURA: AVISO N .º 320-A/2017, PUBLICADO EM D.R.


2.ª SÉRIE, N.º 05, DE 06 DE JANEIRO DE 2017

DATA: 25 DE FEVEREIRO DE 2017

1.ª CHAMADA

HORA: 14H15M ( D E A C OR D O C O M O D I SP O ST O N O A R T . º 1 2. º D O
R E GU L A ME NT O I N TER N O D O C E NT R O D E E S TU D O S J U D IC IÁ R I O S, O T E M PO D E
D UR A Ç Ã O D A PR O V A I N IC IA - SE D E C OR R ID O S 1 5 M IN U TO S A P ÓS A HO R A
D ES I G NA D A )

DURAÇÃO DA PROVA: 4 HORAS


PROVA ESCRITA DE

DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL


Via Profissional

1.ª Chamada - 25 de fevereiro de 2017

I - A presente prova disponibiliza o seguinte conjunto de peças, contidas em autos de um processo judicial (nomes, moradas,
carimbos, números de processos e restantes elementos de facto totalmente fictícios):
1. Petição inicial apresentada pelo Autor em 15 de maio de 2013;

2. Os seguintes documentos juntos com a petição inicial, a saber:


- doc. 1 - certidão de escritura pública;
- doc. 2 - certidão de teor matricial;
- doc. 3 - cópia certificada de procuração (o respetivo original foi posteriormente junto aos autos para efeitos de
realização de perícia);
- doc. 4 - certidão de escritura pública;
- doc. 7 - extrato de acórdão do Plenário do Conselho de Deontologia da Ordem dos Advogados;
- e ainda um documento junto posteriormente aos autos - certidão da Conservatória do Registo Predial referida no
art. 10.º da petição inicial;

3. Contestação apresentada pelo Réu Daniel Costa;

4. Contestação apresentada pela Ré CASA DE SONHO – Compra e Venda de Imóveis, Lda.;

5. Contestação apresentada pelo Réu Marcelino da Silva Gomes;

6. Ata da Audiência Prévia.

II - Tenha ainda em consideração que:


1 – Com os articulados foram juntos os documentos comprovativos do pagamento da taxa de justiça nos termos
referidos nessas peças processuais.
2 – Com a petição inicial foram juntos os documentos n.ºs 5 e 6 referidos nesse articulado.
3 – Com a contestação apresentada pela Ré Casa de Sonho, Lda. foram juntas as cópias dos cheques referidos no
art. 6.º desse articulado.
4 – A Ré Josefa Antonieta Varela não apresentou contestação, tendo comparecido na audiência final, com
mandatário constituído, que arguiu, nessa altura, a incompetência absoluta do Tribunal, alegando (no que à referida Ré
concerne) ser a causa da competência do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa. Esta questão foi relegada para
apreciação em sede de sentença.
5 – Da factualidade relevante para a decisão da causa, apenas não se provou:
- o que consta do artigo 67.º da petição inicial; e
- que o Réu Marcelino Gomes e o legal representante da Casa de Sonho, Lda., à data de 25-05-2012,
tinham conhecimento que a assinatura manuscrita constante da procuração onde se lê “António João Almeida” não havia sido
aposta pelo punho do Autor.
6 – No que concerne à factualidade controvertida relevante para a decisão da causa (matéria dos Temas da Prova)
que foi considerada provada, pressuponha a seguinte fundamentação:
“a convicção do Tribunal estribou-se na apreciação crítica e conjugada, à luz de regras de experiência, da prova:
A) Testemunhal, designadamente nos depoimentos das testemunhas (…)
B) Prova pericial, conforme relatório de fls. (…)

A respeito da matéria dos Temas da Prova que foi considerada não provada, a decisão do Tribunal resultou da falta de prova.
Efetivamente, o depoimento de parte do Réu Marcelino Gomes foi inconclusivo, negando a prática consciente de ato ilícito.
Por outro lado, nenhuma testemunha presenciou a intervenção deste Réu. No que tange à sociedade Ré, a circunstância de o
preço da fração ser relativamente baixo e de a compra ter sido realizada pouco tempo após a visita inicial, bem como o facto
de a Ré não ter ocupado a casa nem tentar vendê-la não se afiguram suficientes para extrair qualquer conclusão sobre o
conhecimento por parte do seu legal representante relativo à forma como a procuração foi obtida.”

III - Pretende-se que, mediante o conjunto das peças e elementos disponibilizados e com base nos elementos de facto
conhecidos, redija a Sentença.

IV - A referência aos factos provados, caso não tenham qualquer alteração de redação, poderá ser efetuada por remissão
para o artigo da peça processual a que respeite. Se a/o candidata/o não pretender utilizar exatamente a redação dos artigos das
peças processuais, deverá redigir a que considere mais adequada.

V - Apesar de a prova consistir na elaboração de uma Sentença, não poderá conter qualquer assinatura, ainda que fictícia,
pelo que, no final da peça, as/os candidatas/os só deverão escrever as palavras seguintes:
“Data”
“Assinatura”.

VI - Cotação: 20 valores

Fundamentação de Direito - 11,5 valores


Demais componentes estruturais da sentença – 8,5 valores

VII - A atribuição da cotação máxima nesta prova pressupõe um tratamento completo das várias questões suscitadas, que
deverá ser coerente e corretamente fundamentado, com indicação dos preceitos legais aplicáveis.

VIII - Na apreciação da prova relevarão, nomeadamente, a pertinência do conteúdo, a qualidade da informação transmitida em
relação à questão colocada, a organização da exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o domínio da língua
portuguesa.

IX - Os erros ortográficos serão considerados negativamente: 0,25 por cada um, até um máximo de 3 valores.

X - As/os candidatas/os que na realização da prova não pretendam utilizar a grafia do "Acordo Ortográfico da Língua
Portuguesa" (aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91 e ratificado pelo Decreto do Presidente da República
n.º 43/91, ambos de 23 de agosto), deverão declará-lo expressamente no quadro "Observações" da folha de rosto que lhes será
entregue, escrevendo "Considero que o Acordo Ortográfico aprovado pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/91, não
está em vigor com carácter de obrigatoriedade", sendo a prova corrigida nesse pressuposto.

XI - As folhas em que a prova é redigida não podem conter qualquer elemento identificativo da/o candidata/o (a
identificação constará apenas do destacável da folha de rosto), sob pena de anulação da prova.
PETIÇÃO INICIAL

Ex.mo Senhor
Doutor Juiz de Direito das Varas Cíveis de Lisboa

ANTÓNIO JOÃO ALMEIDA, solteiro, maior, NIF (…), residente em 66 Boulevard des Fleurs, 75000,
Paris, França e com domicílio em Lisboa, na Rua do Sol, n.º 10, 1.º andar esquerdo, vem instaurar ACÇÃO
DECLARATIVA DE CONDENAÇÃO COM A FORMA DE PROCESSO ORDINÁRIO contra:

1. DANIEL COSTA, solteiro, maior, residente na Rua Dr. Joaquim Fernandes, n.º 2, r/c esq., 2640-
000 Mafra

2. CASA DE SONHO – COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS, Lda., NIPC (…), com sede na Avenida do
Espírito Santo, n.º 13, 2040-594 Almada

3. MARCELINO DA SILVA GOMES, que também usa o nome profissional de MARCELINO GOMES,
residente na Rua da Praia Grande, n.º 32, 2.º esquerdo, 2155-130 Estoril

4. JOSEFA ANTONIETA VARELA, que também usa o nome profissional de JOSEFA VARELA,
residente na Rua do Sal Preto, n-º 12, 2550-120 Amadora

Nos termos e com os fundamentos seguintes:

1.º
Por escritura pública outorgada em 29 de Janeiro de 2010, exarada de fls. 23 a 24 verso do Livro
de notas para escrituras diversas n.º 22-A, o Autor adquiriu, pelo preço de 215 000,00 € (duzentos e quinze
mil euros) a fracção autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do
prédio urbano sito na Rua Almeida Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa,
descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 444 e inscrito na matriz sob o artigo 888 –
Documento n.º 1.
2.º
A aquisição foi registada a favor do Autor na Conservatória do Registo Predial de Lisboa pela
apresentação 5555, de 29/01/2010.
3.º
A fracção destina-se a residência em Lisboa do Autor que, há largos anos, está emigrado em
França, residindo habitualmente em Paris.
4.º
Logo após a aquisição, o Autor realizou obras de melhoramento na fracção, mobilou-a e decorou-a,
fazendo dela a sua residência sempre que se desloca a Portugal, o que sucede com regularidade, no
mínimo quatro a cinco vezes por ano.
5.º
No passado dia 10 de Maio, durante a sua estadia em Lisboa, o Autor, estranhando não ter sido
notificado da nota de liquidação e do pagamento do Imposto Municipal sobre Imóveis referente ao ano de
2012, cuja primeira prestação deveria ter sido paga no decurso do mês de Abril, dirigiu-se ao Serviço de
Finanças de Lisboa 3 com a finalidade de solicitar a nota de liquidação e proceder ao respectivo
pagamento.
6.º
Ao solicitar a guia de pagamento, foi confrontado com a informação de que nada devia, porquanto
a fracção já não se encontrava na sua titularidade.
7.º
Requerida certidão de teor matricial da fracção, o Autor constatou, para seu espanto, que esta se
encontrava inscrita em nome da sociedade Ré, CASA DE SONHO – Compra e Venda de Imóveis, Lda., que a
adquirira em 2012 – Documento n.º 2.
8.º
Julgando tratar-se de um lapso dos serviços de Finanças, e tendo apurado que a escritura de venda
fora outorgada no Cartório Notarial de Lisboa, sito na Rua do Carrossel, n.º 7, em Lisboa, a
cargo da Licenciada Josefa Antonieta Varela, o Autor de imediato aí se dirigiu.
9.º
No Cartório Notarial foi informado que, por escritura realizada em 29 de Maio de 2012, lavrada de
fls. 28 e 29 do Livro 210-A, a fracção de que é proprietário fora “vendida” à sociedade Ré, CASA DE SONHO
– Compra e Venda de Imóveis, Lda., mediante exibição de procuração a favor do Réu, Daniel Costa, tendo
conseguido obter cópia certificada que ora se junta como documento n.º 3.
10.º
Contudo, só após deslocação à Conservatória do Registo Predial lhe foi possível obter cópia da
escritura, que ora se junta como documento n.º 4, tendo igualmente verificado que a aquisição foi registada
a favor da Ré CASA DE SONHO, Lda., mais requerendo a emissão de certidão permanente da fracção a que
foi atribuído o Código de acesso PP-33-333-4444-55555, disponível em www.predialonline.mj.pt.
11.º
Na posse da escritura, o Autor apurou que, entre outros documentos, esta fora instruída com uma
caderneta predial da fracção, emitida pelo Serviço de Finanças, em 18-05-2012.
12.º
A referida caderneta predial corresponde a um documento que, durante uma estadia em
Lisboa, entre 13 e 21 de Maio de 2012, fora obtida por um colaborador da imobiliária PAINEL, de nome
Pedro José Ribeiro e cujo original o Autor tem ainda na sua posse.
13.º
Com efeito, no decurso da sua estadia, o Autor foi contactado por Pedro José Ribeiro, que era do
seu conhecimento por ter sido um dos colaboradores da PAINEL que teve intervenção na aquisição da
fracção em 2010, e que lhe facultara os contactos do empreiteiro que executou as obras realizadas na
fracção após a sua aquisição.
14.º
Na altura, Pedro José Ribeiro questionou o Autor sobre o eventual interesse no arrendamento
da fracção, uma vez que apenas se deslocava a Portugal por períodos curtos de tempo, informando-o que
tinha já um potencial interessado no arrendamento.
15.º
Uma vez que dispõe de um outro imóvel em A v e i ro , de onde é natural, o Autor ponderou a
hipótese do arrendamento, tendo-lhe sido solicitado por Pedro José Ribeiro que lhe facultasse cópia da
caderneta da fracção.
16.º
Contudo, como a caderneta que o Autor tinha nos seus arquivos havia sido obtida antes da
aquisição do imóvel, tendo sido emitida há já mais de um ano e dela constando ainda o nome do anterior
proprietário, Pedro José Ribeiro disponibilizou-se para obter o documento actualizado, o que veio a fazer
em 18 de Maio, no Serviço de Finanças.
17.º
Cerca de dois dias depois, mais precisamente no dia anterior ao do regresso a Paris do Autor, Pedro
Jo sé Rib e ir o entregou-lhe a caderneta predial, solicitando-lhe as chaves da fracção, uma vez que o
casal interessado no arrendamento pretendida efectuar uma visita ao local.
18.º
Uma vez que iria ausentar-se no dia seguinte, o Autor informou Pedro José Ribeiro que tinha uma
cópia da chave com uma sua vizinha, Gertrudes de Sousa, residente no 2.º andar esquerdo, autorizando-
o a recolher a chave por forma a possibilitar a visita ao imóvel.
19.º
Alguns dias depois, Pedro José Ribeiro deslocou-se a casa de Gertrudes de Sousa a fim de
recolher a chave do apartamento, tendo-lha devolvido dois dias depois.
20.º
Após estes factos, P edro J o s é R i b e i r o contactou o Autor via telefónica, informando-o que
o casal não estava já interessado no arrendamento, porquanto entendia que o apartamento estava
localizado numa zona demasiado movimentada à noite e mal frequentada.
21.º
Desde então, o Autor apenas contactou ocasionalmente com Pedro José Ribeiro, quase sempre
através da internet, não mais se tendo colocado a questão do arrendamento, sendo do seu
conhecimento que aquele se ausentou do País, para o Brasil e, mais recentemente, para a Suíça.
22.º
Entre a data em que foi celebrada a falsa venda (Maio de 2012) e a presente data, o Autor
deslocou-se a Lisboa em Julho (durante três semanas), na última semana de Dezembro e primeira de
Janeiro e em finais de Fevereiro, aqui permanecendo por mais 8 dias desde 9 do corrente mês até ao
próximo dia 16.
23.º
Em nenhuma destas ocasiões foi contactado pela pretensa adquirente da fracção, a sociedade ora
Ré, nem esta visitou o apartamento o que, tendo em conta que a escritura foi celebrada em Maio de
2012 é, no mínimo, de espantar.
24.º
A “procuração” que instruiu a escritura de venda da fracção em causa foi “outorgada” em 25 de
Maio de 2012 e “autenticada” pelo 3.º Réu, Dr. Marcelino da Silva Gomes , à data ainda advogado,
com a Cédula Profissional n.º (…), com escritório no Estoril.
25.º
Do referido “instrumento” consta uma assinatura que em nada corresponde nem apresenta
qualquer semelhança à do Autor, mais não sendo do que uma rude, tosca e facilmente perceptível
falsificação.
26.º
O Autor na data que consta da procuração não se encontrava em Portugal.
27.º
Nunca pretendeu vender a fracção, nem encarregou alguém de o fazer, muito menos o Réu
Daniel Costa, que não conhece e com quem nunca contactou.
28.º
O Autor nunca entregou o seu Bilhete de Identidade (que se encontra inutilizado há mais de 2
anos por ter sido substituído pelo Cartão de Cidadão), nem qualquer documento referente ao imóvel.
29.º
O Autor nunca recebeu qualquer quantia proveniente da venda da fracção, sendo certo que o
preço que consta da escritura é muito inferior ao valor patrimonial fiscal, representando quase metade
do preço pela qual a adquiriu em Janeiro de 2010!
30.º
O Autor não conhece, nunca viu, nem nunca contactou, por qualquer forma, o Réu D an ie l
Co st a , o gerente da sociedade Ré, Mário Trigo, nem a sociedade que este representa, e muito menos o
Dr. Marcelino da Silva Gomes.
31.º
No entanto, no registo online de actos de advogados, efectuado pelo Dr. Marcelino da Silva
Gomes, este declara ter verificado “a identidade do signatário, no documento anexo, que é uma
procuração, por exibição do bilhete de identidade”, ter-lhe sido “explicado o seu teor”, que “disse que
a mesma está conforme com a sua vontade”.
32.º
Ora, tal declaração é absolutamente falsa, porquanto não só o Autor nunca compareceu perante o
aludido advogado, como não outorgou a procuração, cuja assinatura nela aposta em nada se assemelha à
sua, sendo certo que à data o seu documento de identificação não era já o Bilhete de Identidade, que no
início de 2010, e após a escritura de aquisição da fracção, o Autor substituíra pelo Cartão de Cidadão,
tendo sido inutilizado – Documentos n.ºs 5 e 6.
33.º
Acresce que o bilhete de identidade é mencionado na “procuração” como sendo datado de 17 de
Julho de 2009 e emitido pelos Serviços de Identificação de Lisboa, quando o anterior Bilhete de
Identidade do Autor foi emitido em 13 de Julho de 2004 pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros, em
Paris, como se constata pelo documento n.º 5.
34.º
O Autor não conhece o Réu, Dr. Marcelino da Silva Gomes, nunca esteve na sua presença, não lhe
entregou ou exibiu qualquer documento de identificação e muito menos lhe solicitou a autenticação de
qualquer documento, designadamente da “procuração” ora em apreço.
35.º
A assinatura que consta da “procuração” que confere poderes ao Réu Daniel Costa não foi
feita pelo punho do Autor, nem sequer apresenta qualquer semelhança com a sua assinatura, como se
constata quer pelo documento n.º 1, quer pelas cópias do Cartão de Cidadão e do anterior Bilhete de
Identidade do Autor ora juntas.
36.º
Aliás, mesmo a pessoa mais desatenta, confrontado com a fotografia do Autor e a sua assinatura
constantes do Bilhete de Identidade, facilmente perceberia que quem se apresentou em nome do A. era
outra pessoa e que a assinatura mais não era do que uma falsificação manifestamente grosseira.
37.º
Pelo que tendo em consideração os factos supra descritos, o Dr. Marcelino da Silva Gomes tinha
necessariamente conhecimento da situação, que a mesma o fazia incorrer na prática de crimes e que dela
resultariam avultados prejuízos para o Autor.
38.º
O Dr. Marcelino da Silva Gomes que, embora à data de Maio de 2012 fosse ainda advogado
com inscrição na Ordem dos Advogados, foi “considerado inidóneo para o exercício da advocacia e,
consequentemente cancelada a sua inscrição, por acórdão proferido em Plenário do Conselho de
Deontologia de Lisboa de (…), confirmado por acórdão do conselho superior de (…), no processo de
averiguação de Inidoneidade Moral n.º (…)” – Documento n.º 7.
39.º
E das averiguações levadas a cabo pelo Autor foi possível apurar que o Dr. M a r c e l i n o d a
S i l v a G o m e s , bem como a sociedade Ré, CASA DE SONHO, LDA. e o Réu Daniel Costa, entre outros, se
encontram envolvidos noutras vendas fictícias de imóveis, instruídas por falsas procurações
“autenticadas” pelo referido advogado.
40.º
Apurou ainda o Autor que se encontram já instauradas acções judiciais contra a CASA DE SONHO,
com fundamento em factos em tudo iguais aos da presente acção, designadamente a acção que corre
termos na 1.ª Vara Cível Central de Lisboa, com o processo n.º 1111/12.4TVLSB, em que é Ré a aludida
sociedade.
41.º
Na venda fictícia que está na origem desse processo o modus operandi é em tudo igual ao ora em
apreço: procuração com recurso a falsificação manifestamente grosseira de assinaturas a favor de
procurador desconhecido dos lesados, errada menção dos documentos de identificação dos mandantes,
autenticação da procuração pelo Dr. Marcelino da Silva Gomes e posterior venda de imóvel à
sociedade C ASA DE SONHO mediante recurso à procuração forjada de que os legítimos proprietários
só tomaram conhecimento ao pretenderem obter caderneta predial do imóvel!
42.º
Por estas razões o Autor apresentou queixa no passado dia 13 do corrente mês no Piquete da
Polícia Judiciária, contra Daniel Costa, Mário Trigo, legal representante da sociedade Casa de Sonho, Dr.
Marcelino da Silva Gomes, bem como contra quaisquer outros sujeitos que se venha a apurar terem
comparticipado na prática dos crimes, sendo do seu conhecimento que estão já em curso outros
processos envolvendo os mesmos sujeitos.
43.º
No pouco tempo que mediou entre a tomada de conhecimento dos factos e a apresentação da
queixa na Polícia Judiciária, o A. tentou contactar a sociedade Ré, compradora da fracção, sem qualquer
sucesso.
44.º
Deslocou-se ainda o A. às moradas dos RR Daniel Costa e Marcelino da Silva Gomes, em Mafra e
no Estoril, respectivamente, não tendo logrado contactá-los.
45.º
Contudo, na morada do Dr. M a r ce l in o d a S i l v a G o m e s foi informado por vizinhos que
aquele ainda ali residia e que, frequentemente, era procurado pela Polícia e por indivíduos de etnia
cigana.
46.º
Acresce que, para além ausência do Autor no acto, da falsificação grosseira da sua assinatura e da
errada descrição do documento de identificação, a procuração não cumpre as formalidades legalmente
impostas.
47.º
Nos termos do disposto no artigo 38.º do DL 76-A/2006, de 29 de Junho o conteúdo dos
documentos pode ser confirmado perante advogado, que deverá lavrar termo de autenticação segundo
os requisitos da lei notarial.
48.º
Dependendo a validade da autenticação do registo informático exigida na Portaria 657-B/2006, de
29/06.
49.º
Ora, da cópia junta como documento n.º 4 constata-se que embora tenha sido efectuado o
registo da pretensa procuração no registo online de actos de Advogados, pelo Dr. Marcelino da Silva
Gomes, não foi elaborado o correspondente termo de autenticação, impondo-se ao Cartório Notarial
onde a escritura foi outorgada que tivesse recusado a aceitação de tal documento.
50.º
A omissão destas formalidades essenciais da procuração não devia e muito menos podia ter sido
ignorada pela Notária, Dra. Josefa Antonieta Varela.
51.º
Pelo que a referida Notária agiu com negligência grave ao aceitar outorgar a escritura de
venda com base na “procuração” que tinha por obrigação saber não cumprir minimamente os requisitos
formais legalmente exigidos.
52.º
O preço da venda da fracção referido na escritura (120 000,00 €) é inferior ao seu valor
patrimonial fiscal, correspondendo a quase metade do preço pago mais de um ano antes pelo Autor.
53.º
Tal preço também em nada corresponde ao valor de mercado da fracção, mesmo considerando o
actual estado do mercado imobiliário.
54.º
Acresce que, decorrido quase um ano desde a data da celebração da escritura, nunca a Ré Casa de
Sonho, Lda. fez deslocar um seu representante à fracção, tomou posse dela, comunicou a aquisição ou
procedeu ao pagamento do condomínio e de despesas inerentes à fracção, ou participou na
Assembleia de condóminos.
55.º
Igualmente não procedeu à alteração dos contratos de fornecimento de água, electricidade, gás
ou seguros, que sempre se mantiveram em nome do Autor e são por ele suportados.
56.º
Ao invés, o Autor, desde que em Janeiro de 2010 adquiriu a fracção, que a mantém na sua
posse, fazendo dela a sua residência em Lisboa, sempre que aqui se desloca tendo efectuado avultadas
obras de melhoramento e conservação, suportando todas as despesas que lhe são inerentes e sendo
reconhecido como o único e legítimo proprietário pelos restantes condóminos, tendo sempre sido
convocado e participado em todas as reuniões de condomínio até aqui realizadas – Documentos n.ºs 8 e
9.
57.º
Em finais de Dezembro do ano passado, o A. procedeu à substituição das janelas da fracção e de
equipamentos e, sempre que lhe é permitido, tem enviado de Paris móveis, quadros e objectos de
decoração e pessoais, uma vez que sempre foi e continua a ser sua intenção vir, num futuro próximo, a
fixar residência permanente na fracção – Documentos n.ºs 10 a 13.
58.º
A total ausência de interesse pela fracção da suposta adquirente é também ela indiciadora de que
teria pleno conhecimento da situação.
59.º
A falsificação da assinatura do Autor, a sua não comparência perante o Réu Marcelino da Silva
Gomes e a total inexistência de qualquer declaração de vontade manifestada pelo A. põem em causa a
autenticidade, genuinidade e força probatória do documento.
60.º
Sendo geradores da sua falsidade, que desde já expressamente se invoca.
61.º
O que, necessariamente, atinge também a escritura de compra e venda outorgada em 29 de
Maio de 2012, tendo ficado demonstrado que o Autor nunca manifestou qualquer vontade de vender a
fracção, não recebeu qualquer preço, nem transferiu a posse ou a propriedade da mesma.
62.º
Do mesmo modo, afectando o registo de aquisição da fracção pela sociedade Ré, CASA DE
SONHO, Lda..
63.º
Desde que, no passado dia 10 de Maio, foi confrontado com toda a situação descrita que o
Autor não mais teve um momento de descanso, vivendo permanentemente angustiado, deprimido e
receoso.
64.º
Os poucos dias que destinara estar em Lisboa, gozando da sua casa e da companhia dos seus
familiares e amigos, acabaram por ter de ser perdidos com um contra-relógio de deslocações às
Finanças, ao Notário, à residência dos RR, à Polícia Judiciária, de forma a tentar encontrar uma explicação
para o problema que o atingiu.
65.º
Para além da angústia, ansiedade e sofrimento que a situação lhe tem trazido, o Autor receia ver
a todo o momento a sua casa invadida por estranhos, arrogando-se de direitos que sabe não terem.
66.º
A possibilidade de se ver desapossado da casa, onde tem vindo a guardar bens pessoais de
elevado valor estimativo e económico, é agravada pelo facto de as obrigações profissionais o obrigarem a
regressar ao seu trabalho em Paris, afastando-o de Lisboa, o que lhe aumenta seriamente o sofrimento e
angústia que tem vindo a sentir.
67.º
Muito dificilmente poderá o Autor no regresso a Paris, a milhares de quilómetros de distância,
concentrar-se sobre o seu trabalho.

68.º
Seguramente será Autor forçado a deslocar-se com mais frequência a Lisboa, para apurar o
estado da fracção e acompanhar os processos judiciais.
69.º
O que o fará incorrer em despesas acrescidas, a que haverá que somar as despesas em que já
incorreu e em que terá de incorrer com deslocações a Cartórios, Conservatórias e Polícia Judiciária,
obtenção de certidões, despesas judiciais e extrajudiciais, designadamente honorários de advogado, cujo
montante não é ainda possível determinar.
70.º
Com a sua actuação os RR causaram ao A. sérios danos patrimoniais e de natureza moral que
estão obrigados a indemnizar – arts. 483.º, 490.º, 496.º e 497.º do Código Civil.
71.º
Indemnização que dada a gravidade dos factos descritos e as suas consequências se entende
razoável fixar em montante nunca inferior a 10 000,00 € (dez mil euros) para os danos morais e de
2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros) para os danos patrimoniais.

Nestes termos e nos melhores de Direito que V.Exa. doutamente suprirá, deve a presente ser
acção julgada procedente e provada e, em consequência:
a) Ser declarada falsa e de nenhum efeito a procuração datada de 25 de Maio de 2012
pretensamente outorgada pelo A. a favor do Réu Daniel Costa e autenticada pelo Réu Marcelino da Silva
Gomes, ordenando-se o cancelamento do registo da autenticação no site de Registo de Actos dos
Advogados da Ordem dos Advogados;
b) Ser declarada nula a escritura de venda da fracção autónoma designada pela letra “E”,
correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua Almeida Garrett, n.º 20,
freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa
sob o n.º 444 e inscrito na matriz sob o artigo 888, outorgada em 29 de Maio de 2012, no Cartório
Notarial de Lisboa, sito na Rua do Carrossel, n.º 7, em Lisboa, a cargo da Licenciada Josefa Antonieta
Varela, lavrada de fls. 28 a 29 do Livro 210-A;
c) Ser reconhecido o direito de propriedade do Autor sobre a fracção autónoma designada pela
letra “E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua Almeida Garrett, n.º
20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de
Lisboa sob o n.º 444 e inscrito na matriz sob o artigo 888;
d) Serem os RR condenados a pagar ao A. indemnização pelos danos morais e patrimoniais,
em v a lo r nunca inferior a 10 000,00 € (dez mil euros) e 2 500,00 € (dois mil e quinhentos euros),
respectivamente, acrescida dos juros a contar desde a data da citação;
e) Serem os RR condenados no pagamento de custas e condigna procuradoria.

Para tanto requer a V.Exa se digne ordenar a citação dos RR para, querendo, contestarem, no
prazo e sob a cominação legal, seguindo-se os demais termos até final.

PROVA PERICIAL:
Requer-se a V. Exa. se digne ordenar a realização de exame pericial à assinatura e letra constante
da procuração supostamente atribuída ao Autor, dada a arguição da sua falsidade, oficiando-se o
Cartório Notarial da Dra. Josefa Antonieta Varela no sentido de juntar os autos o documento original aí
arquivado.

TESTEMUNHAL
1. MANUELA F R A N C I S C O D E SOUSA, residente na Rua A l m e i d a G a r r e t t , n.º 20, 6.º
esquerdo, Lisboa;
2. GONÇALO NUNES, residente na Rua A l m e i d a G a r r e t t , n.º 20, 6.º esquerdo, Lisboa;
3. ANTÓNIO JOSÉ CRISPIM, a apresentar
4. EUCLIDES AMORIM, a apresentar

Declara que, por excederem o limite de 3 Mb estabelecido na Portaria 114/2008, de 06/02, os


documentos identificados com os n.ºs 5 a 13 serão remetidos logo que distribuída a acção.

Valor da acção: 147.640,00 € (cento e quarenta e sete mil seiscentos e quarenta euros).

Junta: 13 documentos, procuração DUC e comprovativo do pagamento 1.ª prestação da taxa de


Justiça

A Advogada
(assinatura)
PROCURAÇÃO

ANTÓNIO JOÃO ALMEIDA, solteiro, maior, NIF (…), residente em 66 Boulevard des Fleurs, 75000,

Paris, França e com domicílio em Portugal, na Rua do Sol, n.º 10, 1.º andar esquerdo, em Lisboa,

portador do Cartão de Cidadão n.º 1234567,constitui seu bastante procurador o Ex.mo Senhor Dr.º

(…), Advogado, com escritório na Av. da Literatura, 1 - 1.º esquerdo, em Lisboa, a quem confere os

mais amplos poderes em direito permitidos, incluindo os de substabelecer.

Lisboa, 2 de Maio de 2013

(assinatura do Autor)
Cartório Notarial

Catarina Moreira
Notária

CERTIFICA

Um - Que a fotocópia apensa a esta certidão está conforme o original;

Dois - Que foi extraída neste Cartório da escritura exarada de folhas vinte e três a

folhas vinte e quatro verso do livro de notas para escrituras diversas número vinte e

dois-A;

Três - Que ocupa duas folhas impressas, frente e verso, as quais têm aposto o selo

branco deste Cartório e estão numerada (s) e por mim rubricadas.

Lisboa, vinte e nove de Janeiro de dois mil e dez.

O Funcionário com delegação de poderes,


, (art. 8.º do Dec. Lei n.º 26/2004, de 04 de
Fevereiro)
ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA

No dia vinte e nove de Janeiro de dois mil e dez, no Cartório Notarial de Lisboa, sito na
Rua dos Anjos, n.º 44, 1.º, em Lisboa, perante mim, Catarina Moreira, Notária,
compareceram como outorgantes

PRIMEIRO: Augusto Paz, solteiro, maior, (…) Intervêm na qualidade de Presidente do


Conselho Executivo, com os necessários poderes para o acto, em representação da
Fundação VIDA SAUDÁVEL, NIPC (…), com sede na Quinta dos Malmequeres, Loures.
SEGUNDO: António João Almeida, NIF (…), solteiro, maior, residente em 66 Boulevard
des Fleurs, 75000 Paris, França.
Verifiquei a identidade dos outorgantes por exibição (…)

DISSE O PRIMEIRO OUTORGANTE, NA SUA INVOCADA QUALIDADE:


Que, em nome da Fundação sua representada, vende ao segundo outorgante, pelo
preço já recebido de duzentos e quinze mil euros, livre de ónus ou encargos, a fracção
autónoma identificada pela letra E, destinada exclusivamente a habitação, a que
corresponde o SEGUNDO ANDAR ESQUERDO, do prédio sito urbano sito na Rua Almeida
Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na
Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob o número QUATROCENTOS E QUARENTA
E QUATRO da dita freguesia, registado a favor do seu representado, pela apresentação
trinta e cinco, de nove de Setembro de mil novecentos e noventa e sete, afecto ao
regime de propriedade horizontal pela apresentação doze, de quinze de Março de mil
novecentos e noventa e seis, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 888, com o valor
patrimonial, correspondente à fracção de 120.340,00€.
DISSE O SEGUNDO OUTORGANTE: Que, aceita a venda nos termos exarados, destinando
a fracção adquirida a sua habitação própria e permanente.
DISSERAM OS OUTORGANTES:

Que, conforme afirmam, sob sua inteira responsabilidade, o presente contrato foi
objecto de intervenção da mediadora imobiliária Oceano-Sociedade Mediação
Imobiliária, Lda, NIPC (…), com sede no Centro Comercial Atlântida, loja 41, em Lisboa,
com o número de licença (…)- AMI, válida até dezasseis de Janeiro de dois mil e onze.

ASSIM O OUTORGARAM.

Adverti o outorgante das consequências penais previstas no n.º 2 do artigo 50.º do


Decreto-Lei n.º 211/2004, de 20 de Agosto, quanto às declarações que antecedem,
sobre a intervenção de mediador imobiliário neste contrato.
Verifiquei as menções registais por certidão permanente on line consultada hoje, com o
código PP-0193-53391-110614-000449.
Arquivo, no maço de documentos deste livro:
a) A mencionada impressão da certidão permanente, conjugada com a fotocópia da acta
n.º 35 da reunião do Conselho Geral de vinte e um de Abril de 2009, comprovativas da
qualidade e suficiência de poderes de que se arroga o primeiro outorgante;
b) O documento comprovativo do pagamento do IMT com o n.º (…), efectuado em 29 de
Janeiro de 2010;
d) O respectivo documento comprovativo da cobrança e liquidação do imposto do selo
previsto nas verbas 1.1 com o n.º (…) no valor de 1.720,00€.
Exibiram os seguintes documentos:
a) Caderneta predial urbana obtida via internet através do Serviço de Finanças de Lisboa
2 Bairro, em 28 de Janeiro de 201O;
b) Fotocópia extraída no então 5.° Cartório Notarial de Lisboa, em 30 de Julho de 1997,
da escritura ali lavrada no mesmo dia, mês c ano, a folhas I verso do livro 202-L, donde
consta, que na mesma foi exibida a licença de utilização n.º (…), passada em 8 de
Novembro de 1996, pela Câmara Municipal de Lisboa, respeitante ao identificado
prédio;
c) Certidão emitida pelo IGESPAR, IP, em 19 de Janeiro de 2010, donde consta, que o
mencionado Instituto autorizou a presente alienação;
d) Oficio n.º 159/DPI/10, de 21 de Janeiro de 2010, da Câmara Municipal de Lisboa,
donde consta, que o Município de Lisboa decidiu não exercer o direito de preferência na
presente alienação;
c) Certificado de Desempenho Energético e da Qualidade do Ar Interior, CER CE
25865935, passado pelo perito qualificado (…), n.º PQ00979, em 29 de Janeiro de 2010,
válido até 29 de Janeiro de 2020.
O imposto de selo devido, cobrado e liquidado neste acto, é de 25,00 €, correspondente
ao selo fixo, previsto na verba 15.1, da T.G.I.S..
Fiz aos outorgantes, em voz alta e na presença simultânea de todos, a leitura e a
explicação do conteúdo desta escritura.

(Assinaturas manuscritas dos outorgantes)

A Notária
(assinatura manuscrita)
. AT CERTIDÃO DE TEOR
autoridade
tributária e aduaneira PRÉDIO URBANO
WMCOOE

IDENTIFICAÇÃO DO PRÉDIO

DISTRITO:11- LISBOA CONCELHO:06 - LIIS BOA FREGUESIA: 14 -CORAÇÃO DE JESUS


ARTIGO MATRICIAL: 888 NIP:

TEVE ORIGEM NOS ARTIGOS

DISTRITO:11 - LISBOA CONCELHO: 06 - LISBOA FREGUESIA: 14- CORAÇÃO OE JESUS Tipo:URBANO


Artigo: 811

LOCALlZAÇÃO DO PRÉDIO

Av/Rua/Praça: RUA ALMEIDA GARRETT, N.º 20 Lugar: CORAÇÃO DE JESUS Código Postal: 1050-
002 LISBOA

DESCRIÇÃO DO PRÉOIO

Tipo de Prédio: Prédio om Regime de Prop,Hom.


Descrição:PREDIO URB.DESTINADO A HABITAÇÃO E COMERCIO, COMPOSTO DE 2 CV DESTINADAS A
ESTACIONAMENTO,RC E 6 ANDARES; SAO PARTES COMUNS DO PRÉDIO OS ATRIOS DA ENTRADA,
II O LOCALIZADA NO PISO DE COBERTURA E CASA DA PORTEIRA DE 2
ESCADAS,SALA DE CONDOMN
ASS. COZ.CB. E TERRAÇO.
Nº de pisos do artigo:10

Área total do terreno:288,6600 m:t Área de implantação do edifício:286,6600 m' Área bruta privativa total:
95,0000 m2 Área de terreno Integrante das fracções:0.0000 m2

FRACÇÃO AUTÓNOMA: E

LOCALIZAÇÃO DA FRACÇÃO

Av./Rua/Praça:RUA ALMEIDA GARRETT n.º 20 Lugar: LISBOA Código Postal:1150-211 LISBOA


Andar/Divisão:2 Esq.

ELEMENTOS DA FRACÇÃO

Afectação: Habitação Tipologia/Divisões; 4 Permilagem:85,0000 Nº de pisos da fracção: 1

ÁREAS (em m2)

Área do terreno integrante: 0,0000 m2 Área bruta privativa: 95,0000 m 2 Área bruta dependente:18,0000 m2

'DADOS DE AVALIAÇÃO

Ano de inscrição na matriz:1996 Valor p a t r i m o n i a l a c t u a l (CIMI): €135.140,00 Determinado no ano: 2010


Tipo de coeficiente de localização: Habitação Coordenada X: 112.182,00 Coordenada Y: 195.594,00
Mod 1 do IMI n.º (…) Entregue em: 2010/05/07 Ficha de avaliação n.º (…) Avaliada em: 2010/05/24
CERTIDÃO DE TEOR
PRÉDIO URBANO

, AT
autoridade
tributária e aduaneira

TITULARES

Identificação fiscal (…) Nome: CASA DE SONHO COMPRA E VENDA DE IMOVEIS,LDA.


Morada: AVENIDA DO ESPÍRITO SANTO N.º 13, ALMADA, 2040-594 ALMADA

Tipo de titular: Propriedade plena Parte:1/1 Documento: ESCRITURA PUBLICA Entidade: MODELO 11
MANUAL

ISENÇÕES

Identificação fiscal: (…)

Motivo:SUSPENSÃO DO INÍCIO DE TRIBUTAÇÃO (Prédio P/Revenda) Início: 2012 Fim:2014 Nº de anos:


3 Valor isento: €135.140.00 Processo: (…)

Impresso no Serviço de Finanças de Lisboa•2 BAIRRO em 2013-05 1O

O Chefe de Finanças

(assinatura)
O Colaborador devidamente autorizado pela Notária, nos termos dispostos no artigo 8.º do estatuto

CERTIFICA

UM-Que a(s) fotocópias apensa(s) a esta certidão está(ão) conforme o original.

DOIS-Que foi extraída neste Cartório de um documento arquivado a instruir uma escritura
lavrada a folhas 28 a folhas 29 do livro de notas para escrituras diversas 210-A.

TRÊS-Ocupa duas folhas, todas elas numeradas e por mim rubricadas.

Lisboa, 10 de maio de 2013

O Colaborador, devidamente autorizado

(assinatura)
PROCURAÇÃO

Eu, abaixo assinado António João Almeida, solteiro, maior, portador do Bilhete de

Identidade N.º 1234567, emitido em 17 de Julho de 2009 pelos Serviços de


Identificação de Lisboa, NIF (…), residente em 66 Boulevard des Fleurs, 75000 Paris,
França, declaro que constituo meu bastante procurador o Exmo. Senhor Daniel
Costa portador do Cartão de Cidadão N°. (…), válido até 06 de Agosto de 2016, residente
na Rua D r . J o a q u i m Fernandes, 2, R/Chão Esquerdo, em Mafra, a quem confiro
poderes para e, pelos preços e condições que tiver por conveniente,
vender/vender, hipotecar/hipotecar o 2.° (segundo) Andar Esquerdo, do prédio
urbano sito na Rua Almeida Garrett, n.º 20, freguesia do Coração de Jesus,
concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o
número QUATROCENTOS E QUARENTA E QUATRO, da dita freguesia, e inscrito na
matriz sob o artigo 888, recebendo o preço e dando quitação, elaborar e assinar
contratos promessa de compra e venda, outorgar e assinar as competentes
escrituras, podendo requerer quaisquer actos de registo predial, provisórios e
definitivos, c requerer em qualquer Repartição Pública tudo o que for conveniente
tendo em vista o fim acima referido.

António João Almeida


(assinatura manuscrita)

Em Lisboa, aos 25 de Maio de 2012

Marcelino Gomes
(assinatura manuscrita)
Marcelino da Silva Gomes
Advogado
Rua da Praia Grande, n.º 32, 2.º Esq.
2155-130 ESTORIL
Tel . (…) - Fax: (…)

-
EMAIL: marcelinodasilvagomes1 234@adv.oa.pt
Página Comprovativo de Acto de Advogados
---
REGISTO ONLINE DOS ACTOS DOS ADVOGADOS

Artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006,de


29-03
Portaria n.º 657-B/2006, de
29-06

Dr.(a) Marcelino Gomes


CÉDULA PROFISSIONAL: 1234L

IDENTIFICAÇÃO DA NATUREZA E ESPÉCIE DO ACTO

Autenticação de documentos particulares

IDENTIFICAÇÃO DOS INTERESSADOS

António João Almeida


BI n.º 1234567

OBSERVAÇÕES

Verifiquei a identidade do signatário, no documento anexo, que é


uma procuração, por exibição do Bilhete de Identidade.
Foi-lhe explicado o seu conteúdo: conferir poderes a Daniel Costa,
portador do Cartão do Cidadão n.º (…), para pelo preço condições
que entender, vender ou hipotecar o prédio urbano constituído por
um segundo andar esquerdo do número 20 da Rua Almeida Garrett,
Lisboa, descrito na conservatória sob o número 444, da freguesia do
Coração de Jesus e inscrito na matriz sob o artigo 888.

EXECUTADO A: 2012-05-25 17:08 / _;.. /'. João Almeida


António
1

(assinatura manuscrita)

REGISTADO A: 2012-05-25 17:15


COM O N.º: 1234L/399

Poderá consultar este registo em https://oa.pt/validar (...)

Marcelino da Silva Gomes


Advogado
Rua da Praia Grande, n.º 32, 2.º Esq.
2155-130 ESTORIL
Tel . (…) - Fax: (…)

-
EMAIL: marcelinodasilvagomes1234@adv.oa.pt
Marcelino Gomes
(assinatura manuscrita)
CERTIDÃO

Certifico que:

As três fotocópias apensas a esta Certidão, de folhas um a três, estão conforme com os originais da

escritura lavrada em vinte e um de Maio de Dois Mil e Doze, exarada de folhas vinte e oito a folhas vinte e nove

do Livro 210-A- que se encontra arquivada neste cartório e que foram elas por mim numeradas e rubricadas,

levando aposto o selo branco em uso neste Cartório.

Almada, 29 de Maio de 2012

O Colaborador, devidamente autorizado

(assinatura manuscrita)
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ESCRITURA DE COMPRA E VENDA

No dia vinte e nove de Maio de dois mil e doze, no Cartório Notarial de Lisboa,
sito na Rua do Carrossel, n.º 7, em Lisboa, perante mim, Josefa Antonieta
Varela, respectiva Notária, compareceram como outorgantes:
PRIMEIRO
Daniel Costa, solteiro, maior, residente na Rua Dr. Joaquim Fernandes, n.º 2,
r/c esq., em Mafra, portador do cartão de cidadão (…), válido até 30.09.2017, emitido
pelos Serviços da República Portuguesa, o qual outorga na qualidade de procurador
em representação de António João Almeida, contribuinte fiscal número (…), natural de
Lisboa, solteiro, maior, residente em 66 Boulevard des Fleurs, Paris, em França,
qualidade e suficiência de poderes que verifiquei por uma Procuração, documento que
arquivo.
SEGUNDO
Mário Trigo, casado, residente na Avenida do Espírito Santo, n.º 13, 2040-594
Almada, portador do cartão do cidadão (…), válido até 30.11.2017, emitido pelos
Serviços da República Portuguesa, o qual outorga na qualidade de único sócio e
gerente em representação da sociedade comercial unipessoal por quotas com a firma
“CASA DE SONHO - COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS, Lda.”, NIPC (…), com sede na
referida morada, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Almada sob o
referido número, com capital social de quinhentos mil euros, qualidade e suficiência de
poderes que verifiquei por uma certidão pertinente que consultei nesta data e cuja
cópia arquivo.
Verifiquei a identidade dos outorgantes pela exibição neste acto dos seus
cartões de cidadão.
PELO PRIMEIRO OUTORGANTE, NA INVOCADA QUALIDADE, FOI DITO:
Que, pela presente escritura, e pelo preço já recebido de CENTO E VINTE MIL
EUROS, vende, em nome do seu representado, à representada do segundo outorgante,
livre de quaisquer ónus ou encargos, a fracção autónoma designada pela letra pela
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letra “E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua
Almeida Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na
Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 444, com a aquisição registada a
favor do seu representado, pela apresentação cinco mil quinhentos e cinquenta e
cinco, de 29/01/2010, afecto ao regime da propriedade horizontal pela apresentação
catorze de quinze de Março de mil novecentos e noventa e seis, inscrito na matriz da
respectiva freguesia sob o artigo 888, com o valor patrimonial de 135.140,00 euros.
PELO SEGUNDO OUTORGANTE, NA INVOCADA QUALIDADE, FOI DITO:
Que aceita para a sua representada a presente venda nos termos exactos e que
destina a referida fracção a revenda.
MAIS DISSERAM:
Que não houve intervenção neste acto de qualquer mediadora imobiliária, pelo
que adverti os outorgantes de que incorrem no crime de falsas declarações, se
dolosamente tiverem prestado declarações falsas.
ASSIM OUTORGARAM.
Arquivo:
a) Declaração número 36954061313071, emitida em 28/05/2012, comprovativa
da isenção do Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (artigo 7.º
do CIMT).
b) Declaração número 208932000216361, emitida em 28/05/2012,
comprovativa da liquidação e pagamento da verba 1.1. da Tabela Geral do Imposto de
Selo no valor de 1081,12 euros.
c) Comunicação para o exercício do direito legal de preferência emitida em
24/05/2012, comprovativa de que a Câmara Municipal de Lisboa e o Igespar não
pretendem exercer o direito legal de preferência na presente aquisição.
Exibiram:
a) Certidão permanente com o código de acesso PP-44-555-6666-77777, por
onde verifiquei os elementos prediais referidos, e por onde verifiquei que para o
prédio de que faz parte a fracção ora transmitida foi emitida a autorização de
utilização n.º 89, de 08/11/1996, pela competente Câmara Municipal;
b) Caderneta Predial Urbana, obtida via Internet, em 18/05/2012, por onde
verifiquei os referidos elementos matriciais.
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Adverti a parte vendedora da obrigatoriedade da entrega do certificado


energético ao comprador, bem como das coimas previstas no Decreto-lei 78/2006, de 4
de Abril.
Esta escritura foi lida e explicada quanto ao seu conteúdo em voz alta e na
presença de todos os outorgantes.

(Assinaturas manuscritas dos outorgantes)


A Notária
(assinatura manuscrita)
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Doc. 7

Edital (…)/2013

(…), Presidente do Conselho de Deontologia de Lisboa da Ordem dos Advogados.

Faz saber que por acórdão proferido em Plenário do Conselho de Deontologia de


Lisboa de (…), confirmado por acórdão da 3.ª secção do Conselho Superior de (…),
no processo de Averiguação de Inidoneidade Moral n.º (…), com trânsito em
julgado, foi considerado, o Sr. Dr. Marcelino da Silva Gomes, com o nome
profissional de Marcelino Gomes, com a cédula profissional n.º 1234L e, com última
morada conhecida na Rua da Praia Grande, n.º 32, 2.º Esq., 2155-130, Estoril,
inidóneo para o exercício da advocacia e, consequentemente, cancelada a sua
inscrição na ordem dos advogados, por violação dos deveres consignados nos
artigos 91.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (Lei 80/2001 de 20 de julho) ou
do artigo 110.º do Estatuto da Ordem dos Advogados (Lei 15/2005 de 26/01).

Em virtude do disposto no artigo 168.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, na


sua atual redação, tem de considerar-se que o cumprimento da presente pena teve
o seu início em (…) de dezembro de 2012, que foi o dia seguinte àquele em que a
decisão se tornou definitiva.

(…) de 2013. - O Presidente do Conselho de Deontologia de Lisboa da Ordem dos


Advogados, (…).
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Freguesia Coração de Jesus


444/19960315 – E
________________________________________________________________________
registo predial
online
Certidão Permanente
Código de acesso: (…)

DESCRIÇÃO FRACÇÃO AUTÓNOMA


COMPOSIÇÃO:
SEGUNDO ANDAR ESQUERDO – Habitação – Quatro divisões assoalhadas, cozinha, duas casas
de banho e uma despensa; arrecadação “E” e estacionamento n.º (…), ambos na 2.ª cave.
O Conservador
(…)
INSCRIÇÕES – AVERBAMENTO – ANOTAÇÕES
Conservatória do Registo Predial de Lisboa
Ap. 35, de 1997/09/09 12:59:44 UTC – Aquisição
Registado no sistema em: 1997/09/09
CAUSA: Compra
SUJEITO(S) ATIVO(S):
FUNDAÇÃO VIDA SAUDÁVEL
NIPC (…)
Sede: Quinta dos Malmequeres, Loures
SUJEITO(S) PASSIVO (S):
(…)
NIF (…)
Morada: (…)
O Conservador
(…)
_____________________________________________________________________________
Conservatória do Registo Predial de Lisboa
Ap. 5555, de 2010/01/29 12:59:44 UTC – Aquisição
Registado no sistema em: 2010/01/29 12:59:44 UTC
CAUSA: Compra
SUJEITO(S) ATIVO(S):
ANTÓNIO JOÃO ALMEIDA
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NIF: (…)
Morada: Boulevard des Fleurs, 66, 75000 Paris, França
SUJEITO(S) PASSIVO (S):
FUNDAÇÃO VIDA SAUDÁVEL
NIPC (…)
Morada: Quinta dos Malmequeres, Loures

O Conservador
(…)
_____________________________________________________________________________
Conservatória do Registo Predial de Lisboa
Ap. 11, de 2012/06/02 12:59:44 UTC – Aquisição
Registado no sistema em: 2012/06/02 12:59:44 UTC
CAUSA: Compra
SUJEITO(S) ATIVO(S):
CASA DE SONHO COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS, LDA.
NIPC: (…)
Sede: Avenida do Espírito Santo, n.º 13, Almada
SUJEITO(S) PASSIVO (S):
ANTÓNIO JOÃO ALMEIDA
NIF (…)
Morada: Boulevard des Fleurs, 66, 75000 Paris, França

O(A) Conservador(a)
_____________________________________________________________________________
Conservatória do Registo Predial de Lisboa
Ap. (…), de 2013/05/16 12:59:44 UTC – Acção
Registado no sistema em: 2013/05/16 12:59:44 UTC
PROVISÓRIO POR NATUREZA – Artigo 92º nº 1 al. a)
SUJEITO(S) ATIVO(S):
ANTÓNIO JOÃO ALMEIDA
NIF (…)
Morada: Boulevard des Fleurs, 66, 75000 Paris, França
SUJEITO(S) PASSIVO (S):
CASA DE SONHO COMPRA E VENDA DE IMÓVEIS, LDA.
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NIF: (…)
Sede: Quinta dos Malmequeres, Loures
Pedido: a) Ser declarada nula a escritura de venda da fracção autónoma designada pela letra
“E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua Almeida
Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória
do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 444 e inscrito na matriz sob o artigo 888, outorgada em
29 de Maio de 2012, no Cartório Notarial de Lisboa, sito na Rua do Carrossel, n.º 7, em Lisboa,
a cargo da Licenciada Josefa Antonieta Varela, lavrada de fls. 28 a 29 do Livro 210-A; b) Ser
reconhecido o direito de propriedade do Autor sobre a fracção autónoma designada pela letra
“E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua Almeida
Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória
do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 444 e inscrito na matriz sob o artigo 888.
O(A) Conservador(a)
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
REGISTOS PENDENTES
Não existem registos pendentes.
------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------
Certidão disponibilizada em (…) e válida até 28-05-2017
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CONTESTAÇÃO

Exmo. Senhor
Dr. Juiz de Direito das Varas Cíveis de Lisboa

DANIEL COSTA, identificado nos autos acima referenciado, residente na Rua Dr.
Joaquim Fernandes, n.º 2, r/c esq., 2640-000 Mafra, com Apoio Judiciário, para fins de
custas e despesas com o processo, na Acção de Processo Ordinário, que lhe é movida
por António João Almeida, identificado nos autos, já referenciado, por sua Mandatária,
que esta subscreve, vem, respeitosamente, à presença de V.Exa., apresentar a
seguinte:

CONTESTAÇÃO

1.º
A Presente Acção, nos termos e forma interposta, não poderá proceder.
2.º
Na qualidade de procurador, nos termos da p.i., o Réu acima indicado, Daniel
Costa, participou nessa qualidade da venda da fracção autónoma sito na Rua Almeida
Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, pertencente a
António João Almeida.
3.º
Ocorre que o Réu, na qualidade de Angariador de Imóveis, foi procurado pelo
Sr. Manuel Silva, para que fosse procurador do Sr. António João Almeida, que
pretendia vender o imóvel acima indicado.
4.º
O referido imóvel, estava para arrendamento na empresa Casa de Sonho, Lda.,
que estava a funcionar sob a Gerência do Sr. Mário Trigo, que é o seu representante
legal.
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5.º
Como colaborador da Casa de Sonho, o Sr. Pedro José Ribeiro tinha acesso ao
Autor e nessa condição obteve a caderneta predial do imóvel, fazendo a actualização
da mesma nos Serviços de Finanças em 18 de Maio.
6.º
Posteriormente, fez a entrega da mesma ao Autor que se encontrava em
Lisboa. Na ocasião, solicitou as chaves da fracção, tendo o Autor informado que tinha
uma cópia da chave com sua vizinha Sra. Gertrudes de Sousa, residente no 2.º andar
esquerdo, já indicada como testemunha nestes autos.
7.º
Assim o Autor, autorizou a recolha da chave da fracção junto a Sra. Gertrudes
de Sousa, para possibilitar a visita ao imóvel.
8.º
Posteriormente, o Sr. Pedro José Ribeiro deslocou-se ao local de trabalho da
Sra. Gertrudes de Sousa, e com ela obteve a Chave do Apartamento, tendo-a devolvido
dois dias depois.

Afigura-se estranho que, pelo lapso de tempo de doze meses, a Ré Casa de
Sonho, na pessoa de seus representantes, não tivesse feito qualquer visita na fracção,
bem como não tomado posse da mesma de alguma forma.
10.º
Não houve, portanto, tomada de posse bem como nunca foram alterados os
contratos de fornecimento de água, electricidade, gás ou seguros referente a fracção.
11.º
O Réu, não conhece o Autor, não conhece e nem teve quaisquer contactos com
a Casa de Sonho ou seus representantes, não conhece nem nunca viu o Sr. Pedro José
Ribeiro, nem conhece e nem nunca viu o Sr. Mário Trigo, Gerente da Casa de Sonho.
12.º
Com efeito, o Réu teve intervenção como procurador na compra e venda da
referida fracção.
13.º
Para tal, foi procurado pelo Sr. Manuel Silva, que o procurara pelo facto do
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mesmo ter uma pequena Empresa, do ramo de Imobiliária, esclarecendo que a sua
imobiliária, estava aberta, mas não chegou a ser activada.
14.º
Que realmente não conhece o Autor, nem tão pouco os demais intervenientes,
participantes da referida transacção.
15.º
Que o referido Senhor Manuel Silva trouxe a procuração, já devidamente
elaborada, não sabendo quem a elaborou, e devidamente autenticada pelo advogado,
sem mesmo estar presente neste acto de autenticação.
16.º
Na verdade, os documentos que lhe foram apresentados pareciam ser
verdadeiros, pelo que jamais poderia o Réu imaginar que se tratava de uma fraude ou
de um acto fraudulento.
17.º
Portanto, o mesmo não tinha conhecimento da real situação, pelo que agiu
com mera culpa no acto, que aceitou ser procurador, sem mesmo conhecer o
proprietário, somente confiando mediante os documentos, que lhe foi apresentado,
pois confiou, pensando se tratar de uma transacção lícita.
18.º
Não sabia, nem poderia imaginar, que a situação em causa poderia ser
fraudulenta, nunca pensou nesta hipótese, agindo portanto por mera culpa, ao aceitar
ser procurador do autor, confiando inteiramente em toda a documentação que lhe foi
apresentada.
19.º
No que concerne ao valor da venda do imóvel, nem imaginava se o valor era ou
não irrisório; aliás, em nenhum momento ficou a saber o valor da venda do imóvel no
mercado, não chegou a ir visitar o imóvel, por isso não tinha noção do preço real do
imóvel, pois o preço foi tratado entre a Casa de Sonho e o comprador, que também
não conhece.
20.º
Agiu por mero erro, não se dando conta que estava sendo envolvido num
negócio ilícito, só vindo a perceber o que acontecera, depois da notificação da Policia
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Judiciária.
21.º
Referente ao valor da venda, esclarece o Réu que não recebeu qualquer valor,
tendo o total da venda, sido pago à Casa de Sonho, não sabendo informar quem ficou
com o dinheiro da venda.
22.º
Em conclusão, não obstante a factualidade descrita, o pedido formulado pelo
Autor, deverá ser julgado totalmente Improcedente.

Termos em que requer a V.Exa. seja a presente acção julgada Improcedente,


por não provada, e o Réu absolvido do pedido formulado, nesta e na melhor forma de
Justiça.

Sem mais assunto, subscrevo com elevada estima e consideração.


Com os melhores cumprimentos

A Advogada
(assinatura)

Junta: Procuração, Apoio Judiciário e duplicados.

Lisboa, 24 de Junho de 2013


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CONTESTAÇÃO

Exmo. Senhor
Dr. Juiz de Direito das Varas Cíveis de Lisboa

Contestando na acção com processo comum à margem indicada, em que é


Autor António João Almeida, diz a Ré, CASA DE SONHO, LDA.

1.º
A Ré tem fortes indícios de que, no negócio referido em 9° da P.I., foi
vítima de factos que constituem ilícitos criminais, nomeadamente de burla e
falsificação de documentos, estando este e outros negócios a ser investigados
pela Polícia Judiciária de Lisboa, correndo diversos processos de inquérito,
designadamente pelo MP de Almada, contra incertos, e em que as pessoas
envolvidas são comuns.
2.º
Por esse motivo, a Ré, que comprou de boa-fé, a confirmarem-se esses
factos, repudia o negócio, e confere ao A. a posse jurídica e de facto sobre o
imóvel em causa nesta acção.
Com efeito,
3.º
Por escritura de 29 de Maio de 2012, lavrada no Cartório Notarial da Dra.
Josefa Antonieta Varela, pelo preço de 120.000,00 €, a Ré, representada pelo
então gerente Mário Trigo, adquiriu a António João Almeida, solteiro, maior,
residente em 66 Boulevard des Fleurs, Paris, a fracção autónoma, destinada a
habitação, designada pela letra "E", correspondente ao 2° esq. do prédio urbano
em regime de propriedade horizontal sito na Rua Almeida Garrett, n.º 20, descrito
na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 444 e inscrito na matriz sob o artigo 888
(cfr. doc. n° 4 da P.l.).
4.º
Na escritura compareceu como procurador do vendedor, Daniel Costa,
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solteiro, maior, residente na Rua Dr. J o a q u i m Fernandes, n.º 2, r/c esq., 2640-
000 Mafra.
5.º
A procuração apresentada no acto e arquivada em anexo à escritura foi
outorgada no dia 25 de Maio de 2012, tendo sido reconhecida, autenticada e
registada no site da Ordem dos Advogados pelo advogado Dr. Marcelino da Silva
Gomes, portador da cédula profissional n.° 1234L (cfr. doc. n° 3 da P.l.).
6.º
A Ré pagou o referido preço, de 120.000,00 €, através de três cheques,
todos sacados, em 29-05-2012, a favor do procurador Daniel Costa, que foram
descontados (doc. n° 1).
7.º
Em face da actual crise do mercado imobiliário e da tendência de queda
que se vem acentuando desde há mais de três anos, o preço foi o adequado para
uma empresa que se dedica à compra e venda de imóveis para revenda dos
adquiridos para esse fim, já que foi assim que foi adquirido, e é o objecto social da
Ré, impugnando-se o artigo 54° da P.l.
8.º
Tal como em outros dois negócios, celebrados em 11-04-2012 e 17-07-
2012, o negócio foi apresentado ao então gerente da empresa, Mário Trigo, por
José Luisão, pessoa que era conhecida no ramo do sector da intermediação
imobiliária, por estar ligado à imobiliária PORTAS DO SOL.
9.º
No acto da escritura esteve igualmente presente o Senhor Miguel Mendonça,
segundo José Luisão, fora quem angariara o negócio, e estava ligado à PAINEL.
10.º
Para além de ter verificado toda a documentação inerente, Mário Trigo
deslocou-se várias vezes ao imóvel, acompanhado de José Luisão, que entrou nele
mediante a chave própria, tendo constatado que o mesmo estava mobilado.

11.º
No acto da escritura foram-lhe entregues pelo procurador e agentes
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imobiliários as chaves do andar.


Porém,
12.º
Foi pelo procurador, José Luisão e Miguel Mendonça dito que o vendedor era
emigrante em França e que estava a vender o andar por estar a passar
dificuldades financeiras, que escondia da família, e por isso pedia que o vendedor e
família pudessem ainda passar as férias de Verão de 2012 no andar, e que só
depois de Agosto retirariam o recheio respectivo, ao que o gerente da Ré acedeu.
13.°
Munido das chaves que recebeu, Mário Trigo voltou uns dias depois ao
andar, tendo verificado que tudo estava na mesma, não tendo entretanto mudado
a fechadura, pelas razões referidas no artigo anterior.
14.°
Sendo verdade que não conhece o A., nunca o procurou e jamais foi por ele
procurada, a Ré não sabe nem tem obrigação de saber se são verdadeiros ou
falsos os factos alegados pelo A. em 3° a 8°, 12° a 22°, 25° a 30°, 34° a 36° da
P.l., pelos que os mesmos vão impugnados.
O que sabe é que:
15.°
No dia 8 de Agosto de 2012, Mário Trigo suspeitou que havia algo de
estranho num outro andar que havia adquirido, em 11-04-2012, na Rua de São
Silvestre, n° 13, em Lisboa, com a intervenção dos mesmos Marcelino da Silva
Gomes, José Luisão e Miguel Mendonça .
16.°
Por isso mesmo, não voltou depois ao andar dos autos e não mudou a
fechadura.
17.°
A Ré tem agora a forte suspeita, ou mesmo, até, a certeza de que foi
vítima de dois crimes de burla, praticados através da falsificação de documentos,
por pessoas cuja verdadeira identificação ignora.
18.°
A Ré celebrou o presente negócio de boa-fé, através de escritura pública,
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pagou o preço, tendo ficado com a convicção de que fizera um negócio normal.
19.°
Porque em todos os negócios, agiu sempre de boa-fé, a Ré apresentou
queixa- crime contra incertos relativamente a d o i s negócios, sendo um deles o
que vem relatado nestes autos.
20.°
Toda a descrita situação causou à empresa, sócio e gerente graves
prejuízos de ordem patrimonial, pelo que já declarou na queixa-crime a sua
intenção de se constituir assistente e de deduzir pedido de indemnização cível.

Quanto ao pedido de indemnização formulado pelo Autor:


21.°
O A. não alega factos concretos capazes de fundamentar o pedido,
nomeadamente de como chega ao montante de 10.000,00 € a título de danos
morais e de 2.500,00 € a título de danos patrimoniais.
22.°
A R. também não sabe nem tem obrigação de saber, por serem factos
pessoais do A., se são verdadeiros ou falsos os factos alegados de 63° a 69º da
P.l., pelo que vão impugnados.
23.°
De qualquer modo, tendo a Ré agido de boa-fé e demonstrando-se ser ela
própria também lesada no negócio, não lhe pode ser imputada qualquer
responsabilidade por danos morais e patrimoniais que o A. possa ter ou venha a
ter como decorrência do negócio relatado na P.l.
24°
Vão assim impugnados os factos alegados de 3° a 8°, 12° a 22°, 25° a 30°,
34° a 36° e 63° a 71° da P.l., e tudo o mais que estiver em oposição com a
contestação.

TERMOS EM QUE SE REQUER:


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Julgue a acção como for de direito, declarando desde já a Ré que repudia o


negócio, e confere a posse jurídica e de facto do imóvel em causa nos autos, caso
se demonstre que o negócio foi celebrado com recurso a ilícitos criminais,
devendo a Ré ser absolvida do pedido de indemnização cível, não só por não ter
dado causa aos factos que o fundamentam, mas também por ser igualmente
lesada com o negócio.

TESTEMUNHAS:

- M ário Trigo, casado, residente na Avenida do Espírito Santo, n.º 13,


2040-594 Almada;
- Miguel Mendonça, casado, residente na Rua Vieira da Silva, n° 21, 1.º dto.,
Almada.

JUNTA: Um documento (cópias de três cheques), procuração forense, taxa de


justiça e DUC (1.ª prestação).

VALOR: 147 640,00 €(cento e quarenta sete mil seiscentos e quarenta euros).

Pede deferimento

O Advogado,

(assinatura)
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CONTESTAÇÃO

Exmo. Senhor
Juiz de Direito das Varas Cíveis de Lisboa

Contestando a acção com processo ordinário, que, e a outros, lhe move


António João Almeida,
Diz MARCELINO DA SILVA GOMES, o seguinte:

1.º
Não sabe o R., nem tem obrigação de saber, se são verdadeiros, ou não, os
factos constantes da P.I., para além dos que se referem expressamente ao
contestante, os quais serão, caso a caso, impugnados, pelo que se consideram
impugnados para todos os efeitos legais.
2.º
O R. contestante nunca viu ninguém ligado à Casa de Sonho, nem nunca ouviu
falar em tal empresa, até ler o seu nome na P. I. que ora se contesta.
3.º
Tão pouco conhecia o procurador que lhe apareceu acompanhado por outra
pessoa que se identificou com um Bilhete de Identidade, datado de 17 de Julho de
2009, e no qual está colada a sua fotografia e aposta uma assinatura em tudo
semelhante à que foi, depois firmada na procuração e no documento de autenticação.
4.º
Donde, a serem verdadeiros os factos alegados pelo A., estaria o R. contestante
perante uma falsificação capaz de enganar um perito, ou quase.
5.º
O que não é o caso do R., ora contestante.
6.º
O R. não conhece ninguém ligado à sociedade Casa de Sonho e nunca tinha
visto o R. Daniel Costa, repete-se, e, se porventura o encontrar não se lembrará dele, e
não tem conhecimento de quaisquer processos similares.
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7.º
O R. mora no Estoril, não percebendo como o A. não logrou contactá-lo, pois
ninguém lhe deu qualquer recado.
8.º
Que necessariamente teria sido dado se alguém o procurasse.
9.º
Tendo o R. sérias dúvidas de que tal tivesse acontecido.
10.º
Sendo insultuoso, e completamente falso o que se alega no número 46º da P. I.
11.º
Desafiando-se, desde já, o A. a identificar os vizinhos que fazem tal afirmação,
sob pena de procedimento criminal por difamação.
12.º
O R. agiu de boa-fé, convencido de que, face ao Bilhete de Identidade que lhe
foi exibido, à fotografia nele inserta, que correspondia ao homem que se encontrava
na sua frente, e à assinatura constante no mesmo, igual à que foi firmada perante si,
tinha diante de si o A. da presente acção.

Nestes termos,
E demais de Direito,

Deve o R. ser absolvido dos pedidos, com todas as suas legais consequências.

Junta-se: procuração e documento comprovativo do pagamento da Taxa de


Justiça.

O Advogado
(peça assinada digitalmente)
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ATA DE AUDIÊNCIA PRÉVIA

Data: 19 de setembro de 2016, pelas 14.30 horas


Juiz de Direito: Pedro João Fernandes
Oficial de Justiça: Lídia Mendes
Autor: António João Almeida
Réu: Daniel Costa
Réu: Casa de Sonho, Lda.
Réu: Marcelino da Silva Gomes
Ré: Josefa Antonieta Varela
Mandatário da Autora: --------
Mandatário do Réu Daniel Costa: -----------
Mandatário da Ré Casa de Sonho, Lda.: -----------
Mandatário do Réu Marcelino da Silva Gomes: -----------

Presentes: Todas as pessoas para o ato convocadas, com exceção da Ré Josefa


Antonieta Varela.
*
A presente audiência ficou gravada no sistema integrado de gravação digital disponível
na aplicação informática em uso neste tribunal (artigo 591.º, n.º 4, do CPC).
*
Aberta a audiência, pelo Mm.º Juiz foi, nos termos do disposto nos artigos 591.º, n.º 1
al. a) e 594.º do CPC, tentada a conciliação entre as partes, o que não foi possível
obter, por as partes terem mantido as posições expressas nos articulados.
*
Após, nos termos do art.º 591.º, n.º 1, als. b) e c), do CPC, foi facultada às partes a
discussão sobre a matéria de facto e de direito e sobre as suas posições, com vista à
delimitação dos termos do litígio.
*
De seguida, pelo Mm.º Juiz foi proferido o seguinte:
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DESPACHO
Por força do disposto nos art.º 306º, do Cód. Proc. Civil, e considerando o disposto nos
art.ºs 296º e 297º, do Cód. Proc. Civil, fixa-se o valor da ação no indicado pelo autor.
*
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
Não existem nulidades que afetem todo o processado.
As partes gozam de personalidade e de capacidade judiciárias e são legítimas.
Não há outras nulidades, exceções dilatórias ou questões prévias de que cumpra
conhecer e que obstem ao conhecimento do mérito da causa.
*
Objeto do litígio:
Na presente ação pretende-se indagar da (in)validade da procuração datada de
25.05.2012 e da venda da fração autónoma designada pela letra “E”, correspondente
ao 2º andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua Almeida Garrett, n,º 20, em Lisboa,
celebrada por escritura pública de 29.05.2012.
*
Enunciação dos Temas de Prova:

1) Saber se as assinaturas manuscritas na procuração junta aos autos a fls. (…), onde se
lê “António João Almeida”, foram ou não apostas pelo punho do Autor;
2) Saber se, em 25 de maio de 2012, os 1.º e 3.º Réus e o legal representante da
sociedade Ré tinham conhecimento de que as assinaturas manuscritas onde se lê
“António João Almeida” referidas na procuração de fls. (…) não haviam sido apostas
pelo punho do autor;
3) Saber se, apenas em 10 de maio de 2013, António João Almeida teve conhecimento
do teor da procuração de fls. (…), de 25 de maio de 2012, e da escritura pública de
compra e venda de fls. (…), celebrada a 29 de maio de 2012;
4) Saber se, os dias de maio de 2013 que o Autor destinara a gozar a sua casa em
Lisboa e da companhia dos seus familiares e amigos, foram despendidos em
deslocações ao serviço de Finanças, ao notário em Lisboa, à residência dos Réus e à
Polícia Judiciária;
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5) Saber se, em consequência do sucedido com a procuração e a escritura de compra


e venda da casa de Lisboa do Autor, este sofre de ansiedade e receio de ver a sua casa
invadida por estranhos e tem dificuldade em concentrar-se no seu trabalho que exerce
em Paris;
6) Saber se, em consequência do sucedido com a procuração e a escritura de compra e
venda da casa de Lisboa do Autor, este tem tido despesas na obtenção de certidões,
judiciais, honorários de advogados e deslocações a Portugal, em montante nunca
inferior a 2.500,00 €.
*
Prova:
Admito os róis de testemunhas constantes a fls. (…) e formulário apresentado e fls.
(…), sendo que as testemunhas serão a apresentar pela parte, caso não tenha sido
requerida a sua notificação tal como exige o art.º 507º, nº 2, do Cód. Proc. Civil.
*
Nos termos do disposto no art.º 155º, nº 1, do Cód. Proc. Civil, as audiências finais
serão sempre gravadas.
*
Requerimento de fls. (…):
Admitem-se os requeridos depoimentos dos Réus Daniel Costa e Marcelino da Silva
Gomes aos factos alegados no sentido de as assinaturas manuscritas na procuração
junta aos autos a fls. (…), onde se lê “António João Almeida”, não terem sido apostas
pelo punho do Autor e de, em 25 de maio de 2012, aqueles Réus terem conhecimento
de tal facto.
Notifique.
*
Prova Pericial (Req. de fls. …):
Admite-se a requerida prova pericial a elaborar pelo LPC, tendo por objeto saber se as
assinaturas manuscritas na procuração junta aos autos a fls. (…), onde se lê “António
João Almeida”, foram ou não apostas pelo pelo punho do Autor.
Notifique.
*
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Notifique o autor para, em 10 (dez) dias, informar o Tribunal se se encontra em


Portugal ou a data provável de uma sua estada neste país a fim de ser possível a sua
recolha de autógrafos.
*
Oficie ao LPC, solicitando a realização da perícia ordenada, informando que,
oportunamente, serão enviados o documento original onde se encontram apostas
as assinaturas a analisar, bem como a recolha de autógrafos a realizar ao autor.
*
Sempre se consigna que não se designa neste momento data para a realização da
audiência final por não ser previsível a data de realização da perícia ordenada.
*
Deste despacho foram devidamente notificados os presentes.
De seguida, pelo Mm.º Juiz foi declarada encerrada a presente audiência.
Para constar se lavrou a presente ata que, lida e revista, vai ser devidamente assinada.

O Juiz de Direito
(assinatura)

A Funcionária Judicial
(assinatura)
PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL

(artigo 16.º, n.º 3, da Lei n.º 2/2008, de 14/1)

Via profissional

1.ª Chamada - 25 de fevereiro de 2017

Grelha de Correção

Nota:
A decisão judicial que a grelha disponibiliza reflete o que se afigura ser uma
abordagem correta, quer do ponto de vista de forma, quer do ponto de vista de
substância, em função das peças facultadas e dos dados do processo.
Outros tipos de abordagem, seja de forma, seja de substância, que se mostrem
razoáveis e plausíveis, e desde que se revelem suportados em fundamentos
consistentes, serão igualmente valorizados na precisa medida do respetivo mérito.

COTAÇÃO TOTAL DA PROVA 20 valores


Cotações parciais
Relatório 1 valor
Saneamento 1,5 valores
Fundamentação de facto 4,5 valores
Fundamentação de Direito 11,5 valores
Dispositivo 1,5 valores
I - RELATÓRIO

António João Almeida, residente em 66 Boulevard des Fleurs, 75000, Paris,


França e com domicílio em Lisboa, na Rua do Sol, n.º 10, 1.º andar esquerdo, intentou
ação declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra Daniel
Costa, residente na Rua Dr. Joaquim Fernandes, n.º 2, r/c esq., 2640-000 Mafra, CASA
DE SONHO – Compra e Venda de Imóveis, Lda., com sede na Avenida do Espírito
Santo, n.º 13, 2040-594 Almada, Marcelino da Silva Gomes, residente na Rua da Praia
Grande, n.º 32, 2.º esquerdo, 2155-130 Estoril, e Josefa Antonieta Varela, residente na
Rua do Sal Preto, n.º 12, 2550-120 Amadora.
Formulou os seguintes pedidos:
a) Ser declarada falsa e de nenhum efeito a procuração datada de 25 de maio
de 2012, pretensamente outorgada pelo Autor a favor do Réu Daniel Costa e
autenticada pelo Réu Marcelino da Silva Gomes, ordenando-se o cancelamento do
registo da autenticação no site de Registo de Atos dos Advogados da Ordem dos
Advogados;
b) Ser declarada nula a escritura de venda da fração autónoma designada pela
letra “E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua
Almeida Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na
Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 444 e inscrito na matriz sob o
artigo 888, outorgada em 29 de maio de 2012, no Cartório Notarial de Lisboa, sito na
Rua do Carrossel, n.º 7, em Lisboa , a cargo da Licenciada Josefa Antonieta Varela,
lavrada de fls. 28 a 29 do Livro 210-A;
c) Ser reconhecido o direito de propriedade do Autor sobre a fração
autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do
prédio urbano sito na Rua Almeida Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus,
concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º
444 e inscrito na matriz sob o artigo 888;
d) Serem os Réus condenados a pagar ao Autor indemnização pelos danos
morais e patrimoniais, em v a l o r nunca inferior a 10.000,00 € e 2.500,00 € ,
respetivamente, acrescida dos juros a contar desde a data da citação.
Alega, em suma, que:
- A falsificação da sua assinatura numa procuração em que figura o seu nome, a
sua não comparência perante o Réu Marcelino da Silva Gomes, que “certificou” a
procuração, e a total inexistência de qualquer declaração de vontade por si
manifestada põem em causa a autenticidade, genuinidade e força probatória da
procuração datada de 25.5.2012, outorgada a favor de Daniel Costa, sendo geradora
da sua falsidade;
- Em consequência, é nula a escritura de compra e venda de imóvel outorgada
em 29 de maio de 2012 e fica afetado o registo da aquisição da fração pela sociedade
Ré, Casa de Sonho, Lda.;
- A procuração não cumpre as formalidades legalmente impostas, pois embora
tenha sido efetuado a sua autenticação no registo online de Atos de Advogados pelo
Réu Marcelino da Silva Gomes, não foi elaborado o correspondente termo de
autenticação, o que determinava que o Ré Josefa Antonieta Varela, como notária,
tivesse recusado a aceitação de tal documento;
- Devido à situação descrita, o Autor vive permanentemente angustiado,
deprimido e receoso, devendo ser indemnizado por danos morais num valor não
inferior a 10.000 €;
- Terá de incorrer em despesas acrescidas, a que haverá que somar as despesas
em que já incorreu e em que terá de incorrer com deslocações a Cartórios,
Conservatórias e Polícia Judiciária, obtenção de certidões, despesas judiciais e
extrajudiciais, designadamente honorários de advogado, cujo montante não será
inferior a 2.500 €.
Os Réus Daniel Costa, Casa de Sonho, Lda. e Marcelino da Silva Gomes
apresentaram as suas contestações, impugnando os factos alegados.
A Ré Josefa Antonieta Varela não apresentou contestação, tendo comparecido
na audiência final, com mandatário constituído, que arguiu, nessa altura, a
incompetência absoluta do Tribunal, alegando ser a causa (no que à referida Ré
concerne) da competência do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.
Esta questão foi relegada para apreciação em sede de sentença.
*
SÃO AS SEGUINTES AS QUESTÕES A DECIDIR

a) Apreciar a exceção da incompetência absoluta do tribunal invocada pela Ré


Josefa Antonieta Varela;
b) Apurar se ocorreu a falsificação da assinatura do Autor aposta na procuração
de 25.5.2012;
c) Na afirmativa, determinar as consequências dessa falsidade no negócio de
compra e venda celebrado em 29.5.2012;
d) Saber se se verificam os pressupostos da responsabilidade civil dos Réus e,
em caso afirmativo, determinar a medida da indemnização devida.
*

II - SANEAMENTO

A Ré Josefa Antonieta Varela arguiu a exceção da incompetência absoluta do


Tribunal, alegando ser a causa (no que a si concerne) da competência do Tribunal
Administrativo de Círculo de Lisboa.
Cumpre apreciar esta exceção, cujo conhecimento foi relegado para a sentença.
A competência traduz-se na medida de jurisdição atribuída a cada tribunal.
O artigo 211.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa estabelece que
os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem
jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais.
Segundo o disposto no artigo 80.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto
(Lei da Organização do Sistema Judiciário), compete aos tribunais de comarca preparar
e julgar os processos relativos a causas não abrangidas pela competência de outros
tribunais (cf. artigo 64.º do CPC).
Nos termos do n.º 3 do artigo 212.º da Constituição da República Portuguesa,
compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das ações e recursos
contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes das relações
jurídicas administrativas e fiscais.
Preceitua o artigo 4.º do ETAF do Estatuto dos Tribunais Administrativos e
Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, que compete aos
tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por
objeto questões relativas a:
“(…) f) Responsabilidade civil extracontratual das pessoas coletivas de direito
público, incluindo por danos resultantes do exercício das funções política, legislativa e
jurisdicional, sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 4 do presente artigo;
g) Responsabilidade civil extracontratual dos titulares de órgãos, funcionários,
agentes, trabalhadores e demais servidores públicos, incluindo ações de regresso;
h) Responsabilidade civil extracontratual dos demais sujeitos aos quais seja
aplicável o regime específico da responsabilidade do Estado e demais pessoas coletivas
de direito público;
(…) o) Relações jurídicas administrativas e fiscais que não digam respeito às
matérias previstas nas alíneas anteriores (…)”.
Ora, a situação em apreço não é suscetível de se enquadrar em qualquer uma
das alíneas do artigo 4.º do ETAF.
O artigo 1.º do Estatuto do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 26/2004,
de 4 de fevereiro, define a natureza do notário e da atividade notarial.
Assim, preceitua o artigo o seguinte:
“- O notário é o jurista a cujos documentos escritos, elaborados no exercício da
sua função, é conferida fé pública.
2 - O notário é, simultaneamente, um oficial público que confere autenticidade
aos documentos e assegura o seu arquivamento e um profissional liberal que atua de
forma independente, imparcial e por livre escolha dos interessados.
3 - A natureza pública e privada da função notarial é incindível.”.
Decorre da análise deste preceito que o notário é um profissional liberal,
embora exerça, por delegação do Estado, a fé pública notarial.
Entre o notário e o particular que recorre aos seus serviços para celebrar uma
escritura pública estabelece-se uma relação de direito privado.
A circunstância de o notário ser também um oficial público que confere
autenticidade aos documentos não altera a natureza da relação estabelecida entre ele
e os particulares que recorrem aos seus serviços.
Urge, pois, concluir que o tribunal judicial é competente para apreciar a
presente causa, a qual não é enquadrável em nenhuma das alíneas do artigo 4.º do
ETAF que delimitam a competência dos tribunais administrativos.
*
Mantêm-se os restantes pressupostos de regularidade e de validade da
instância verificados no despacho saneador.
*

III - FUNDAMENTAÇÃO

Factos provados

De relevante para a decisão da causa, estão provados os seguintes factos:

1 - Com data de 29.01.2010, foi outorgada escritura pública de compra e venda,


em que Augusto Paz, na qualidade de presidente do conselho executivo, em
representação da Fundação Vida Saudável, declarou “Que, em nome da Fundação sua
representada, vende ao segundo outorgante, pelo preço já recebido de duzentos e
quinze mil euros, livre de ónus ou encargos, a fração autónoma designada pela letra
“E”, destinada exclusivamente a habitação, a que corresponde o segundo andar
esquerdo, do prédio urbano sito na Rua Almeida Garrett, n.º 20, freguesia de Coração
de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa,
sob o número QUATROCENTOS E QUARENTA E QUATRO da dita freguesia, registado a
favor do seu representado, pela apresentação trinta e cinco, de nove de Setembro de
mil novecentos e noventa e sete, afecto ao regime de propriedade horizontal pela
apresentação doze, de quinze de Março de mil novecentos e noventa e seis, inscrito na
respectiva matriz sob o artigo 888 (…) ” e em que o segundo outorgante, António João
Almeida, declarou “Que, aceita a venda nos termos exarados, destinando a fração
adquirida a sua habitação própria e permanente. (…) ”, conforme documento de fls.…
dos autos.
2 - A aquisição referida em 1 foi registada a favor do Autor na Conservatória do
Registo Predial de Lisboa pela apresentação n.º 5555 de 29.01.2010.
3 - Encontra-se aposta a assinatura manuscrita onde se lê “António João
Almeida” no instrumento datado de 25.05.2012, constante de fls…. dos autos,
denominado “Procuração” e onde consta, para além do mais, “Eu, abaixo assinado
António João Almeida, solteiro, maior, portador do Bilhete de Identidade N.º 1234567,
emitido em 17 de Julho de 2009 pelos Serviços de Identificação de Lisboa, NIF (…),
residente em 66 Boulevard des Fleurs, 75000 Paris, França, declaro que constituo meu
bastante procurador o Exmo. Senhor Daniel Costa portador do Cartão de Cidadão n°.
(…), válido até 06 de Agosto de 2016, residente na Rua Dr. Joaquim Fernandes, 2,
R/Chão Esquerdo, em Mafra, a quem confiro poderes para e, pelos preços e condições
que tiver por conveniente, vender, hipotecar o 2º andar esquerdo, do prédio urbano
sito na Rua Almeida Garrett, n.º 20, freguesia do Coração de Jesus, concelho de lisboa,
descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número QUATROCENTOS E
QUARENTA E QUATRO, da dita freguesia, e inscrito na matriz sob o artigo 888,
recebendo o preço e dando quitação, elaborar e assinar contratos promessa de compra
e venda, outorgar e assinar as competentes escrituras, podendo requerer quaisquer
atos de registo predial, provisórios e definitivos, e requerer em qualquer Repartição
Pública tudo o que for conveniente, tendo em vista o fim acima referido (…)”.
4 - No documento descrito em 3 encontra-se aposto um carimbo com os
dizeres “Marcelino da Silva Gomes, Advogado, Rua da Praia Grande, 32, 2º esq, 2155-
130 Estoril. Tel: (…) – Fax: (…) E.mail: marcelinodasilvagomes1234@adv.oa.pt”,
seguido da assinatura manuscrita de Marcelino Gomes, e acompanhado do “Registo
Online dos Atos dos Advogados”, constante de fls…. dos autos, cujo teor se dá por
reproduzido, onde consta, para além do mais, “Verifiquei a identidade do signatário,
no documento anexo, que é uma procuração, por exibição do Bilhete de Identidade.
Foi-lhe explicado o seu conteúdo: conferir poderes a Daniel Costa, portador do Cartão
de Cidadão n.º (…), para pelo preço e condições que entender, vender ou hipotecar o
prédio urbano constituído por um segundo andar esquerdo do número 20 da Rua
Almeida Garrett, Lisboa, descrito na conservatória sob o número 444, da freguesia do
Coração de Jesus e inscrito na matriz sob o artigo 888. Disse que a mesma está
conforme a sua vontade” seguido de uma assinatura manuscrita onde se lê “António
João Almeida”.
5 - No dia 29.05.2012, no Cartório Notarial de Lisboa, sito na Rua do Carrossel,
n.º 7, em Lisboa, perante a Notária Josefa Antonieta Varela, foi celebrada escritura
pública de compra e venda, cuja cópia de certidão consta a fls…. dos autos, onde
consta, para além do mais, que:
“Daniel Costa, (…), o qual outorga na qualidade de procurador em
representação de António João Almeida, (…), qualidade e suficiência de poderes que
verifiquei por uma Procuração, documento que arquivo, e o segundo outorgante Mário
Trigo, (…), o qual outorga na qualidade de único sócio e gerente em representação da
sociedade comercial unipessoal por quotas com a firma “CASA DE SONHO – COMPRA E
VENDA DE IMÓVEIS, Lda.”, NIPC (…), com sede na referida morada, matriculada na
Conservatória do Registo Comercial de Almada sob o referido número, (…), qualidade e
suficiência de poderes que verifiquei por uma certidão permanente que consultei nesta
data e cuja cópia arquivo. (…).
Pelo Primeiro Outorgante, na invocada qualidade, foi dito:
Que, pela presente escritura, e pelo preço já recebido de cento e vinte mil euros,
vende, em nome do seu representado, à representada do segundo outorgante, livre de
quaisquer ónus ou encargos, a fração autónoma designada pela letra “E”,
correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua Almeida
Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na
Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 444, com a aquisição registada a
favor do seu representado, pela apresentação cinco mil quinhentos e cinquenta e cinco,
de 29/01/2010, afecto ao regime de propriedade horizontal pela apresentação catorze
de quinze de Março de mil novecentos e noventa e seis, inscrito na matriz da respetiva
freguesia sob o art.º 888, com o valor patrimonial de 135.140,00 euros.
Pelo Segundo Outorgante, na invocada qualidade, foi dito:
Que aceita para a sua representada a presente venda nos termos exarados e
que destina a referida fração a revenda.
Mais disseram: Que não houve intervenção neste ato de qualquer mediadora
imobiliária, pelo que adverti os outorgantes de que incorrem no crime de falsas
declarações, se dolosamente tiverem prestado declarações falsas. (…)”.
6 - A aquisição referida em 5 foi registada a favor da “Casa de Sonho, Lda.” na
Conservatória do Registo Predial de Lisboa, pela apresentação n.º 11 de 02.06.2012.
7 - À data de maio de 2012, o Réu Marcelino da Silva Gomes exercia a profissão
de advogado com inscrição na Ordem dos Advogados.
8 - Por acórdão proferido em Plenário do Conselho de Deontologia de Lisboa de
(…), confirmado por acórdão do Conselho Superior de (…), no processo de averiguação
de inidoneidade moral nº (…), o Réu Marcelino da Silva Gomes foi “considerado
inidóneo para o exercício da advocacia e, consequentemente cancelada a sua inscrição
na Ordem dos Advogados (…)”.
9 - As assinaturas manuscritas onde se lê “António João Almeida” referidas em
3 e 4 não foram apostas pelo punho do Autor.
10 - Às datas referidas em 3 e 4, o Réu Daniel Costa tinha conhecimento que as
assinaturas manuscritas onde se lê “António João Almeida” referidas em 3 e 4 não
foram apostas pelo punho do Autor.
11 - O Autor teve conhecimento do teor do referido nos pontos 3 a 6 no dia 10
de maio de 2013.
12 - No mês de maio de 2013, que o Autor destinara a gozar a sua casa em
Lisboa e referida em 1 e da companhia dos seus familiares e amigos, este despendeu
dias em deslocações ao serviço de Finanças, ao notário, à residência do 1º Réu, à
Polícia Judiciária.
13 - Em consequência do referido em 3 a 6 e 9, o Autor sofre de ansiedade e
receio de ver a sua casa invadida por estranhos.
14 - Em consequência do referido em 3 a 6 e 9, o Autor tem tido despesas na
obtenção de certidões judiciais, honorários de advogados e deslocações a Portugal, em
montante concretamente não apurado.
Em alternativa:
14 - Em consequência do referido em 3 a 6 e 9, o Autor tem tido despesas na
obtenção de certidões judiciais, honorários de advogados e deslocações a Portugal,
num valor não inferior a 2.500 €.
*
Factos não provados

De relevante para a decisão da causa, não se provou que:


1 - O Réu Marcelino Gomes e o legal representante da Casa de Sonho, Lda., à
data de 25 de maio de 2012, tinham conhecimento que a assinatura manuscrita
constante da procuração onde se lê “António João Almeida” não havia sido aposta pelo
punho do Autor.
2 - Muito dificilmente poderá o Autor, no regresso a Paris, a milhares de
quilómetros de distância, concentrar-se sobre o seu trabalho.
*

Fundamentação da decisão sobre a matéria de facto

Os factos provados sob os pontos 1 a 8 decorrem do acordo das partes e da


prova documental junta - cf. artigo 607.º, n.º 4, segunda parte, do CPC.
No que concerne à factualidade controvertida relevante para a decisão da
causa (matéria dos temas da prova) que foi considerada provada, a convicção do
Tribunal estribou-se na apreciação crítica e conjugada, à luz de regras de experiência,
da prova:
A) Testemunhal, designadamente nos depoimentos das testemunhas (…)
B) Prova pericial, conforme relatório de fls. (…)
*

O DIREITO

Dos vícios da procuração e do contrato de compra e venda


Referir que a escritura pública de “Compra e venda” de 29.5.2012, nos termos
da qual - com recurso a procuração falsa do Autor na medida em que a assinatura da
procuração não foi aposta pelo seu punho (facto 9) -, o Réu Daniel Costa, arrogando-se
falsamente a qualidade de procurador do Autor, declarou vender à Ré Casa de Sonho,
Lda. o imóvel em causa, não integra a venda de bem alheio a que alude o artigo 892.º
do Código Civil, tendo em consideração o artigo 904.º do mesmo diploma, o qual
prevê que as normas relativas à venda de coisa alheia, contidas nos artigos 892.º a
903.º, "apenas se aplicam à venda de coisa alheia como própria".
Explicar o regime jurídico da representação sem poderes, designadamente que,
se se vende coisa alheia a coberto de uma representação sem poderes terá o
comprador a possibilidade de rejeitar o negócio, enquanto o verdadeiro dono o não
ratificar, exceto se conhecia a falta de poderes no momento da celebração do contrato
(artigo 268.º, n.º 4, do Código Civil), o que não é manifestamente o caso.
Concluir que o valor negativo ínsito à procuração utilizada pelo 1.º Réu é o da
inexistência e não o da nulidade, pois estamos perante uma falsidade, ainda que
suportada por uma aparência que possa induzir a ilusão, e referir que a inexistência
pode ser invocada por qualquer pessoa a todo o tempo.
Identificar o vício do negócio celebrado sem poderes de representação em
nome de outrem como a ineficácia (artigo 268.º, n.º 1, do Código Civil) por ausência
de título que legitime a produção de efeitos jurídicos na pessoa do pretenso
representado.

Da indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais


Sumariar os requisitos da responsabilidade civil extracontratual contemplados
no artigo 483.º do Código Civil.
Afastar a responsabilidade dos Réus Marcelino da Silva Gomes e Casa de Sonho,
Lda. por falta de prova da prática de um ato ilícito e culposo, atendendo a que não se
apurou que, à data de 25.5.2012, tivessem conhecimento que a assinatura manuscrita
constante da procuração onde se lê “António João Almeida” não havia sido aposta pelo
punho do Autor.
Atentar na responsabilidade do 1.º Réu, o qual sabia que estava a agir
ilicitamente, ao realizar uma venda com base numa procuração falsa.
Concluir que atuou de forma voluntária, com dolo direto, sabendo que estava a
violar o direito de propriedade do Autor, sendo que, em consequência da sua conduta,
o Autor teve despesas e sofreu danos não patrimoniais.
Analisar a responsabilidade da notária Josefa Antonieta Varela, começando por
indagar da ilicitude da sua conduta, tendo em consideração que decorre dos factos 3 e
4 e do documento que lhes subjaz que a procuração apresentada pelo Réu Daniel
Costa no dia da outorga da escritura de compra e venda do imóvel, em 29 de maio de
2012, não estava autenticada, verificando-se apenas o registo informático exigido na
Portaria 657-B/2006, de 29/6 - cf. artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 76-A/2006, de 29 de
junho.
Verificar que, atendendo à qualidade de notária e aos conhecimentos de legis
artis que lhe são próprios e exigíveis, deveria ter constatado que a procuração
outorgada a favor do Réu Daniel Costa não estava autenticada pelo Réu Marcelino da
Silva Gomes e recusado a celebração da escritura por falta de procuração válida.
Concluir que, ao não ter procedido desse modo e praticando o ato para o qual
era necessária a procuração, a Ré Josefa Antonieta Varela não agiu com o cuidado que
lhe era exigível, violando por mera culpa disposição destinada a proteger interesses
alheios - cf. artigos 11.º e 23.º do Estatuto do Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 26/2004, de 4 de fevereiro.
Indagar da intercedência de um nexo de causalidade entre o ato negligente da
4.ª Ré e os danos sofridos pelo Autor, procurando-o à luz da teoria da causalidade
adequada, a qual põe o acento tónico num comportamento concreto que aparece a
um observador objetivo como perigoso em relação à verificação de um determinado
dano, ou sob o enfoque da teoria do fim da norma, que coloca antes a questão de
saber quais os danos que o legislador terá razoavelmente querido impedir através da
estatuição de uma determinada norma de proteção.
Concluir que os danos sofridos pelo Autor não ocorreram no círculo de
interesses protegido pelas normas constantes dos citados artigos 11.º e 23.º do
Estatuto do Notariado, mas no círculo de interesses protegidos com a tipificação do
ilícito perpetrado pelo 1.º Réu, Daniel Costa, pelo que a 4.ª Ré não incorreu em
responsabilidade civil.
Ou, como solução alternativa, relativamente à notária:
Concluir pela responsabilidade da 4.ª Ré, considerando que se verifica um nexo
de causalidade entre a violação de disposições legais destinadas a proteger interesses
alheios (artigo 483.º, n.º 1, do Código Civil) e os danos sofridos pelo Autor,
encontrando-se apoio, por exemplo, em autores como Sinde Monteiro, para quem,
quando estão em causa normas de proteção, haverá como que uma secundarização do
critério da adequação, “sendo em geral indiscutível que o fim de proteção da norma
pode abranger a reparação de danos inadequados” (in Responsabilidade por
conselhos, recomendações ou informações, págs. 276 e seguintes, maxime fls. 280,
apud acórdão do TRP de 5.12.2016, Miguel Baldaia de Morais, in www.dgsi.pt.).
Analisar os restantes pressupostos da responsabilidade civil relativamente ao
1.º Réu e também quanto à 4.ª Ré, caso se tenha enveredado pela solução que a
considera também responsável.
No âmbito dos danos patrimoniais, referir que a parte vencedora de uma ação
não tem direito a uma indemnização autónoma pelos honorários de advogado,
cabendo essa função à procuradoria, a que correspondem, atualmente, as custas de
parte (artigo 26.º, n.º 3, alínea c), do Regulamento das Custas Processuais).
No restante, concluir que, não se tendo apurado o valor das deslocações e das
certidões nem constando dos autos quaisquer elementos que permitam fixar
equitativamente a indemnização, nos termos do artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil, é
de relegar a sua liquidação para momento ulterior, ao abrigo do disposto no artigo
609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
Como solução alternativa, tendo em consideração o facto 14 – “Em
consequência do referido em 3 a 6 e 9, o Autor tem tido despesas na obtenção de
certidões judiciais, honorários de advogados e deslocações a Portugal, num valor não
inferior a 2.500 €” -, atribuir ao Autor, a título de danos patrimoniais, o valor de 2.500
€.
No tocante aos danos não patrimoniais, atendendo ao ato gerador do dano e
suas efetivas consequências e ao grau de culpa do 1.º Réu (ou do 1.º e da 4.ª Réus, na
solução alternativa) atribuir ao Autor uma indemnização não inferior a 5.000 €, já
devidamente atualizada, ao abrigo do disposto no artigo 496.º, n.ºs 1 e 4, e 494.º do
Código Civil.
Na solução alternativa de condenação da 4.ª Ré, referir que a
responsabilidade do Réu Daniel Silva e da Ré Josefa Antonieta Varela é solidária, nos
termos do artigo 497.º do Código Civil, independentemente de eventuais diferenças
de graus de culpa em sede de direito de regresso, segundo o disposto no n.º 2 do
citado preceito.

Dos pedidos
Relativamente aos pedidos formulados no sentido da declaração da falsidade
da procuração e da nulidade da escritura de compra e venda, concluir que devem ser
acolhidos na totalidade quanto ao 1.º Réu Daniel Costa e à 2.ª Ré Casa de Sonho, Lda.,
mas com a retificação do erro na qualificação jurídica do efeito pretendido pelo Autor
(e que decorre da fundamentação supra expendida relativamente aos vícios em
causa), declarando-se antes a inexistência da procuração e a ineficácia do contrato de
compra e venda da fração “E” - cf. acórdão do STJ Uniformizador de Jurisprudência de
23.1.2001.
Referir o disposto no artigo 8.º do Código do Registo Predial, “A impugnação
judicial de factos registados faz presumir o pedido de cancelamento do respetivo
registo” e concluir que está implicitamente peticionado in casu o cancelamento do
registo, o que deve ser determinado.

Dos juros
Fazer uma referência à mora, que constitui o devedor na obrigação de reparar
os danos causados ao credor, correspondendo a indemnização, na obrigação
pecuniária, aos juros legais desde a constituição em mora (artigo 804º, nº 3, do Código
Civil), distinguindo os danos não patrimoniais, cuja contagem se processa desde a data
da sentença, tendo em consideração o acórdão do STJ Uniformizador de
Jurisprudência de 9 de maio de 2002, e os danos patrimoniais, cuja contagem dos juros
de mora deve correr desde a data da citação, ao abrigo do artigo 805.º, n.ºs 1 e 3, do
Código Civil.
Considerar aplicável ao cálculo dos juros a taxa legal em vigor até à data de 4%
ao ano, segundo o disposto no artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil e na Portaria n.º
291/2003, de 8 de Abril.

Da responsabilidade tributária
No que concerne aos pedidos relacionados com os vícios da procuração e da
compra e venda de 29.5.2012 e o registo da aquisição do direito de propriedade a
favor da Casa de Sonho, Lda., referir que as custas são da responsabilidade do Réu
Daniel Costa e da Ré Casa de Sonho, Lda., por ambos terem ficado vencidos na causa,
em partes iguais (artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 e 528.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
Relativamente ao pedido de indemnização civil por danos não patrimoniais,
mencionar que as custas ficam a cargo do Autor e do 1.º Réu, na proporção do
decaimento (artigo 527.º do Código de Processo Civil).
Em alternativa, no caso da condenação da notária:
Relativamente ao pedido de indemnização civil por danos não patrimoniais,
mencionar que as custas ficam a cargo do Autor, do 1.º Réu e da 4.ª Ré, na proporção
do decaimento (artigo 527.º do Código de Processo Civil), sendo a condenação em
custas dos Réus no regime da solidariedade (n.º 3 do citado artigo 527.º).
Quanto aos danos patrimoniais, tendo sido relegada para momento ulterior a
sua liquidação, referir que as custas ficam provisoriamente a cargo do Autor e do 1.º
Réu, na proporção de metade para cada um (artigo 527.º do Código de Processo Civil).
Em alternativa, tendo em consideração o facto 14, atribuir as custas
relativamente a todos os danos (patrimoniais e não patrimoniais) ao Autor e ao 1.º
Réu, na proporção do decaimento, ou no caso da condenação da notária, ao Autor, ao
1.º Réu e à 4.ª Ré, estes no regime da solidariedade (n.º 3 do citado artigo 527.º).
*

IV - DECISÃO

Em face do exposto, o Tribunal julga a ação parcialmente procedente e, em


consequência, decide
a) Declarar inexistente e de nenhum efeito a procuração datada de 25 de maio
de 2012, pretensamente outorgada pelo Autor António João Almeida a favor do Réu
Daniel Costa e autenticada pelo Réu Marcelino da Silva Gomes, ordenando o
cancelamento do registo da autenticação no site de Registo de Atos dos Advogados da
Ordem dos Advogados;
b) Declarar ineficaz em relação ao Autor a compra e venda da fração autónoma
designada pela letra “E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio
urbano sito na Rua Almeida Garrett, n.º 20, freguesia de Coração de Jesus, concelho de
Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 444 e inscrito
na matriz sob o artigo 888, celebrada por escritura pública outorgada em 29 de maio
de 2012, no Cartório Notarial de Josefa Antunes Varela;
c) Determinar o cancelamento do registo de aquisição a favor da Ré Casa de
Sonho - Compra e Venda de Imóveis, Lda. da aludida fração a que se refere a
apresentação n.º 11, de 2 de junho de 2012;
d) Declarar que o Autor é o proprietário da fração autónoma designada pela
letra “E”, correspondente ao segundo andar esquerdo do prédio urbano sito na Rua
Almeida Garrett, freguesia de Coração de Jesus, concelho de Lisboa, descrito na
Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 444 e inscrito na matriz sob o
artigo 888;
e) Condenar o Réu Daniel Costa a pagar ao Autor a quantia de 5.000 € (cinco
mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal,
a contar desde a presente data até integral pagamento;
Em alternativa:
e) Condenar solidariamente os Réus Daniel Costa e Josefa Antonieta Varela a
pagarem ao Autor a quantia de 5.000 € (cinco mil escudos), a título de danos não
patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar desde a presente data
até integral pagamento;
f) Condenar o Réu Daniel Costa a pagar ao Autor a quantia que se vier a apurar
em ulterior liquidação, relativamente às despesas na obtenção de certidões judiciais e
deslocações a Portugal;
Em alternativa, tendo em conta o facto 14:
f) Condenar solidariamente os Réu Daniel Costa e Josefa Varela Antonieta a
pagarem ao Autor a quantia de 2.500 €, a título de danos patrimoniais, acrescida de
juros a contar desde a data da citação até à presente data, à taxa de 4% ao ano, e
desde agora até integral pagamento, à taxa legal em vigor;
Em alternativa, se condenada a notária:
f) Condenar solidariamente os Réus Daniel Costa e Josefa Antonieta Varela a
pagarem ao Autor a quantia que se vier a apurar em ulterior liquidação, relativamente
às despesas na obtenção de certidões judiciais e deslocações a Portugal;
E tendo em conta o facto 14:
f) Condenar solidariamente os Réus Daniel Costa e Josefa Antonieta Varela a
pagarem ao Autor a quantia de 2.500 €, a título de danos patrimoniais, acrescida de
juros a contar desde a data da citação até à presente data, à taxa de 4% ao ano, e
desde agora até integral pagamento, à taxa legal em vigor;
g) Absolver os Réus do restante pedido;
h) Condenar o Autor, o Réu Daniel Costa e a Ré Casa de Sonho – Compra e
Venda de Imóveis, Lda. a pagarem custas, na proporção do decaimento, sendo os Réus
em partes iguais;
Em alternativa, se condenada a notária:
h) Condenar o Autor, o Réu Daniel Costa, a Ré Casa de Sonho – Compra e
Venda de Imóveis, Lda. e a Ré Josefa Antonieta Varela a pagarem custas, na proporção
do decaimento, sendo os Réus Daniel Costa e Josefa Antonieta Varela no regime da
solidariedade quanto ao pedido de indemnização civil;
i) Condenar provisoriamente o Autor e o 1.º Réu a pagarem as custas
relativamente ao pedido de indemnização por danos patrimoniais, na proporção de
metade para cada um. - Esta solução apenas para o caso de se relegar a liquidação
destes danos para final.
Em alternativa, se condenada a notária:
i) Condenar provisoriamente o Autor e os Réus Daniel Costa e Josefa Antonieta
Varela a pagarem as custas relativamente ao pedido de indemnização por danos
patrimoniais, na proporção de 50% para aquele e de 50% para estes, sendo a metade
dos Réus no regime da solidariedade. - Esta solução apenas para o caso de se relegar
a liquidação destes danos para final.

Registe e notifique.
*
Lisboa, (…)
Página 1 de 38

PROVA ESCRITA
DE
DIREITO CIVIL E COMERCIAL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL

33.º CURSO DE FORMAÇÃO INICIAL PARA OS TRIBUNAIS JUDICIAIS

Via Profissional

AVISO DE ABERTURA: AVISO N .º 320-A/2017, PUBLICADO EM D.R.


2.ª SÉRIE, N.º 05, DE 06 DE JANEIRO DE 2017

DATA: 02 DE MARÇO DE 2017

2.ª CHAMADA

HORA: 14H15M ( D E A C OR D O C O M O D I SP O ST O N O A R T . º 1 2. º D O
R E GU L A ME NT O I N TER N O D O C E NT R O D E E S TU D O S J U D IC IÁ R I O S, O T E M PO D E
D UR A Ç Ã O D A PR O V A I N IC IA - SE D E C OR R ID O S 1 5 M IN U TO S A P ÓS A HO R A
D ES I G NA D A )

DURAÇÃO DA PROVA: 4 HORAS


Página 2 de 38

PROVA ESCRITA DE DIREITO CIVIL E COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL


(Via Profissional)
2.ª Chamada – 2 de março de 2017

I – A presente prova disponibiliza o seguinte conjunto de peças, contidas em autos de


processo judicial (nomes, moradas, carimbos, números de processos e restantes elementos
de facto totalmente fictícios):

1. Petição Inicial apresentada pelos Autores em 2 de novembro de 2016;


2. Os seguintes documentos juntos com a petição inicial, a saber:
doc. 1 – certidão do assento de casamento de António de Jesus Mateus e
Beatriz Silva Mateus;
doc. 2 – certidão do assento de óbito de António de Jesus Mateus;
doc. 3 – certidão da escritura de habilitação dos herdeiros de António de
Jesus Mateus;
doc. 4 – certidão do assento de nascimento de Dália Silva Mateus;
doc. 5 – certidão do assento de nascimento de Carla Silva Mateus;
doc. 6 – certidão da escritura de repúdio da herança por Carla Silva Mateus;
doc. 7 – certidão da escritura de repúdio da herança por Dália Silva Mateus;
doc. 8 – certidão do assento de nascimento de Afonso Silva Mateus;
doc. 9 – certidão do assento de nascimento de Catarina Mateus de Almeida;
doc. 10 – certidão do assento de nascimento de Bernardo Mateus Gonçalves;
doc. 11 – certidão do teor da descrição e de todas as inscrições em vigor do
imóvel sito na Rua Sousa Miranda, n.º 45, freguesia de Leça da Palmeira,
concelho de Matosinhos;
doc. 12 – certidão do teor matricial do imóvel sito na Rua Sousa Miranda, n.º
45, freguesia de Leça da Palmeira, concelho de Matosinhos;
doc. 13 – cópia certificada do requerimento apresentado por Beatriz Silva
Mateus na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos no dia
15/10/2014;
doc. 14 – cópia certificada da escritura de compra e venda realizada no dia
08/09/2016, no Cartório Notarial de Maria Alice Ribeiro Teixeira;
doc. 15 – original do documento intitulado “promessa unilateral de venda”
datado de 05/10/2016, outorgado por COMPRAIMÓVEIS - Compra e Revenda
de Imóveis, S.A., e por Beatriz Silva Mateus;
doc. 16 – original do documento intitulado “contrato de comodato” datado
de 08/09/2016, outorgado por COMPRAIMÓVEIS - Compra e Revenda de
Imóveis, S.A., e por Beatriz Silva Mateus;
e ainda um documento junto posteriormente aos autos - certidão da
Conservatória do Registo Predial de Matosinhos;
3. Contestação apresentada pela Ré COMPRAIMÓVEIS - Compra e Revenda de
Imóveis, S.A.;
Página 3 de 38

4. Despacho proferido nos autos em 19 de dezembro de 2016.

II – Tenha ainda em consideração que:


1 – Com os articulados foram juntos os documentos comprovativos do
pagamento da taxa de justiça nos termos referidos nessas peças processuais.
2 – Com a Petição Inicial foram juntos os documentos n.ºs 1 a 16 referidos
nesse articulado.
3 – As demais Rés foram pessoalmente citadas e não apresentaram
contestação;
4 – Da factualidade relevante para a decisão da causa (matéria dos temas da
prova), apenas se provou que:
- A primeira e a segunda Rés, ao fazerem constar nas escrituras
de repúdio de herança que não tinham descendentes, sabiam que estavam a produzir
falsas declarações.
- A primeira Ré sabia que o Autor Bernardo Mateus Gonçalves
era seu filho.
- A segunda Ré sabia que os Autores Afonso Silva Mateus e
Catarina Mateus de Almeida eram seus filhos.
- Os Autores vivem com a terceira Ré no imóvel sito na Rua
Sousa Miranda, n.º 45, freguesia de Leça da Palmeira, concelho de Matosinhos.
5 – No que concerne à factualidade controvertida relevante para a decisão
da causa (matéria dos temas da prova) que foi considerada provada, tenha como
pressuposto a seguinte fundamentação:
“A convicção do Tribunal estribou-se na apreciação crítica e conjugada, à luz de
regras de experiência, da prova testemunhal, designadamente nos depoimentos das
testemunhas (…)”

III – Pretende-se que, mediante o conjunto das peças e elementos disponibilizados e


com base nos elementos de facto conhecidos, redija a Sentença.

IV – Para além dos mencionados em II-4, a referência aos factos provados, assim como
aos factos não provados, poderá ser efetuada por remissão para o(s) artigo(s) da(s) peça(s)
processual(is) a que respeite(m), caso não haja qualquer alteração de redação. Se o
candidato não pretender utilizar exatamente a redação dos artigos das peças processuais,
deverá redigir a que considere mais adequada.
Página 4 de 38

V – Apesar de a prova consistir na elaboração de uma Sentença, não poderá conter


qualquer assinatura, ainda que fictícia, pelo que, no final da peça, os candidatos só deverão
escrever as palavras seguintes:
“Data”
“Assinatura”.

VI - Cotação: 20 valores
Fundamentação de Direito - 11,5 valores
Demais componentes estruturais da sentença – 8,5 valores

VII - A atribuição da cotação máxima nesta prova pressupõe um tratamento completo


das várias questões suscitadas, que deverá ser coerente e corretamente fundamentado, com
indicação dos preceitos legais aplicáveis.

VIII - Na apreciação da prova relevarão, nomeadamente, a pertinência do conteúdo, a


qualidade da informação transmitida em relação à questão colocada, a organização da
exposição, a capacidade de argumentação e de síntese e o domínio da língua portuguesa.

IX - Os erros ortográficos serão considerados negativamente: 0,25 por cada um, até
um máximo de 3 valores.
Página 5 de 38

Ex.mo Senhor
Juiz de Direito da
Instância Central – 2.ª Secção Cível de
PÓVOA DE VARZIM

Bernardo Mateus Gonçalves, Afonso Silva Mateus e Catarina Mateus de Almeida,


solteiros, maiores, residentes Rua Sousa Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos, vêm
intentar AÇÃO DECLARATIVA DE CONDENAÇÃO, sob a forma de PROCESSO COMUM,
contra:
1. Carla Silva Mateus, solteira, nascida a 31/05/1974, filha de António
de Jesus Mateus e de Beatriz Silva Mateus, natural de São Sebastião da
Pedreira-Lisboa, residente na Rua Francisco Silva, n.º 3, 4.ºEsq., na Maia;
2. Dália Silva Mateus, divorciada, nascida a 21/11/1972, filha de
António de Jesus Mateus e de Beatriz Silva Mateus, natural de São Sebastião
da Pedreira-Lisboa, residente no Largo Santo Estêvão, n.º 46, 3ºDto., Santo
Tirso;
3. Beatriz Silva Mateus, viúva, nascida a 06/01/1955, filha de António
Luís Silva e de Maria Trindade, natural de Coimbra (Sé)-Coimbra, residente
na Rua Sousa Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos; e
4. COMPRAIMÓVEIS – Compra e Revenda de Imóveis, S.A., NIF
000 000 000, com sede na Rua Soares dos Reis, n.º 15, 3.º, sala 5.2,
Mafamude, Vila Nova de Gaia,

nos termos e com os fundamentos seguintes:


1.º
A 3ª Ré Beatriz Silva Mateus foi casada com António de Jesus Mateus (vide doc. 1).
2.º
Casamento que se dissolveu pela morte de António de Jesus Mateus, ocorrida em 29 de
Dezembro de 2012 (vide doc. 2).
3.º
Como herdeiras legitimárias de António de Jesus Mateus, sucederam-lhe:
- Beatriz Silva Mateus, viúva do de cujus;
- Dália Silva Mateus, e
- Carla Silva Mateus, filhas do de cujus - Vide docs. 3, 4 e 5.
4.º
Por escritura de 28 de Setembro de 2014, lavrada no Terceiro Cartório Notarial do Porto, a
filha Carla Silva Mateus, aqui 1ª Ré, veio repudiar a herança de seu pai (vide doc. 6).
Página 6 de 38

5.º
E, no dia 14 de Outubro de 2014, a outra filha, Dália Silva Mateus, aqui 2ª Ré, repudiou a
herança de seu pai (vide doc. 7).
6.º
Acontece que em ambas as escrituras acima mencionadas se refere que as declarantes não têm
descendentes, o que não corresponde à verdade.
7.º
A declarante Dália Silva Mateus, 2ª Ré, tem dois filhos:
1º - Afonso Silva Mateus, nascido a 18 de Novembro de 1995 - vide doc. 8.
2ª - Catarina Mateus de Almeida, nascida a 29 de Setembro de 1998 – vide doc. 9.
8.º
E, a 1.ª Ré Carla Silva Mateus, tem um filho – Bernardo Mateus Gonçalves, nascido 27 de
Novembro de 1994 - vide doc. 10.
9.º
Pelo que todos os três netos acima indicados já eram nascidos nas datas dos repúdios das
heranças.
10.º
As Rés sabiam que os Autores Afonso Silva Mateus e Catarina Mateus de Almeida eram
filhos da 2.ª Ré, e que o Autor Bernardo Mateus Gonçalves era filho da 1ª Ré.
11.º
Por força do repúdio das respectivas heranças de suas mães, os netos, ora Autores, tornaram-
se, automaticamente, herdeiros do de cujus.

DA REIVINDICAÇÃO:
12.º
Na constância do casamento, a 3ª Ré e marido, António Mateus, adquiriram um imóvel -
moradia unifamiliar - sito na Rua Sousa Miranda, n.º 45, freguesia de Leça da Palmeira, concelho de
Matosinhos, com a descrição nº 3535 da freguesia de Leça da Palmeira e artigo matricial 0202 (vide
doc. 11 e 12).
13.º
Falecido o António Mateus, a partir desta data o imóvel em questão passou a integrar a
herança e a meação do cônjuge-sobrevivo, porque o prédio foi adquirido na constância do casamento,
celebrado sem convenção antenupcial.
14.º
A partir da data do óbito já não estava em causa o direito de propriedade sobre o prédio
urbano.
15.º
Página 7 de 38

Mas o direito à meação e à herança ilíquida, titulada pelo meeiro e herdeiros.


16.º
Assim sendo, quando, em 15/10/2014, é rectificado, por iniciativa da 3ª Ré, o registo predial,
passando a constar: "sujeito activo é, apenas, Beatriz Silva Mateus" tal inscrição registral não
correspondia à realidade jurídica. Pois, está inscrito um prédio urbano em nome apenas de uma das
herdeiras, quando na realidade a herança ilíquida tem quatro herdeiros (vide doc. 13).
17.º
Da mesma sorte, quando em 8 de Setembro de 2016, a 3ª Ré "vendeu" à 4ª Ré o supra
mencionado imóvel carecia de legitimidade para vender a totalidade da coisa que em parte ilíquida lhe
pertencia - vide doc. 14.
18.º
Na verdade, tal contrato simulou o verdadeiro negócio pretendido pelas partes - contrato de
mútuo pelo valor de 85.000,00 € (Oitenta e cinco mil euros).
19.º
Tanto que no dia 8/9/2016, as mesmas partes celebraram uma Promessa Unilateral de Venda e
um Contrato de Comodato, nos termos constantes dos doc. 15 e 16, onde a 3ª Ré se compromete a
recomprar o imóvel, "emprestado" por 127.500,00 € (Cento e vinte e sete mil e quinhentos euros),
apondo-lhe a data de celebração de 5/10/2016.
20.º
A 3ª Ré, meeira e herdeira, não podia dispor do imóvel em causa, porque já não era
proprietária do mesmo.
21.º
Em relação aos verdadeiros titulares da coisa, a venda efectuada pelo non dominus constitui
res inter alios e é, como tal, um acto ineficaz. O acto nulo é um acto inválido que não produz efeitos ab
initio, operando tal invalidade e ineficácia também ipso jure.
22.º
Pelo que desde já se requer o reconhecimento da verdadeira contitularidade do imóvel por
parte do cônjuge meeiro e da herança aberta por óbito de António de Jesus Mateus, na presente acção.
23.º
Mais, estando a posse do bem na titularidade da 3ª Ré e dos três netos, ora Autores, que com
esta vivem: Bernardo Mateus Gonçalves, Afonso Silva Mateus e Catarina Mateus de Almeida, gozam
da presunção legal estabelecida no art. 1268º do C.C. Posse que se traduz no corpus e animus (art.
1251º do C.C.), consistindo o imóvel a casa de morada de família.
24.º
A 4ª Ré não é um terceiro de boa fé.
25.º
Na verdade, a 3ª Ré pretendia contrair um empréstimo para efectuar algumas obras no imóvel.
Página 8 de 38

26.º
Socorreu-se para isso de um indivíduo de nome Manuel Vilão, que se dizia advogado.
27.º
Que por se dizer bem relacionado com a banca, já havia sido intermediário em anterior crédito
hipotecário contraído pela 3ª Ré, a favor do Banco Amigo do Crédito, SA, em 15/10/2010.
28.º
Pretendendo, em 2016, contrair novo empréstimo nos mesmos moldes, foi confrontada no dia
da escritura, com um contrato de compra e venda do imóvel, sendo compradora a 4ª R.,
COMPRAIMÓVEIS - Compra e Revenda de Imóveis, SA., entidade com quem nunca havia
contactado.
29.º
Logo no acto da escritura a 3ª Ré se opôs aos moldes como o contrato estava redigido, uma
vez que a sua pretensão não era nunca a da venda do imóvel.
30.º
Interrompida a celebração do acto, foi afiançado pela representante da COMPRAIMÓVEIS,
SA e pelo intermediário Manuel Vilão, que se tratava apenas de uma venda aparente, uma vez que em
simultâneo iriam celebrar uma Promessa Unilateral de Venda, para que passado um ano o imóvel
voltasse para o nome da 3ª Ré, sendo o acréscimo de valor o correspondente aos juros a pagar pelo
empréstimo.
31.º
Nesse acto a Beatriz Mateus realçou que o imóvel era a casa de morada de família da própria e
dos seus três netos acima identificados, e que a mesma a todos pertencia, não podendo de forma
nenhuma pôr em causa essa habitação.
32.º
Aliás, se pretendesse vender o imóvel, nunca o faria por um valor tão baixo e irrisório, uma
vez que a vivenda vale bastante mais.
33.º
Sob forte pressão, foi-lhe novamente garantido, pela representante da 4ª Ré, que não havia
qualquer possibilidade de perder a casa, razão por que acabou por assinar os dois contratos que lhe
apresentaram.
34.º
Apesar de bem saber que Beatriz Mateus não pretendia, de todo, vender a casa, a 4ª Ré
registou a pretensa aquisição a seu favor, em 1/09/2016, antes ainda da celebração do negócio!
35.º
Contudo, atente-se que a fé pública do registo não determina a boa fé do adquirente que
regista. Não actua de boa fé quem sabe que os bens não pertencem ao vendedor, como também quem
age com desconhecimento assente em culpa grosseira dessa alienidade (v.g., face ao preço da venda
Página 9 de 38

dos bens, quando irrisório no confronto com o seu valor real) - Vide Ac. de 26 de Janeiro 2006 –
Tribunal da Relação do Porto.
36.º
Por outro lado, a presunção do art.º 7º do Cód. Registo Predial é uma presunção ilidível (art.º
350º, n.º 2 do Cód. Civil).
37.º
Ao ser nula a compra e venda, estamos perante a situação prevista no artigo 291º, nº2 do C.C.:
"Os direitos de terceiro não são, todavia, reconhecidos, se a acção for proposta e registada dentro dos
três anos posteriores à conclusão do negócio".
38.º
Ou seja, antes de decorrido esse prazo, não se reconhecem os direitos de terceiro constituídos
sobre as coisas a restituir, mesmo que haja registo da aquisição anterior ao registo da acção de
nulidade ou anulação [Pires de Lima e Antunes Varela, em C.C. Anotado, I, 3ª ED/265].
39.º
Ora, desde já se pretende e requer registar a presente acção, onde se pede que seja:
a) Reconhecida a sua propriedade;
b) Declarada a nulidade da venda;
c) Seja restituído o bem à esfera jurídica dos Autores e da outra interessada, a Ré Beatriz;
d) Que seja ordenado o cancelamento do registo da venda nula, bem como dos posteriores
registos efectuados pelo adquirente, ou outros.
40.º
Estando perfeitamente em tempo para o fazer nos termos do disposto no artigo 291º, nº 2 do
C.C: registada pela 4ª Ré em 1/09/2016, a presente acção deverá ser registada até 31/08/2019.

DO DIREITO:
41.º
O Código Civil comina a nulidade da venda sempre que o vendedor careça de legitimidade
para a realizar.
42.º
Vide, ainda, sobre o mesmo objecto dos autos, os Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de
26 de Outubro de 2005; Tribunal de Relação de Porto, Acórdão 10 Novembro 2005: "Sendo assim, o
verdadeiro titular do bem, como principal interessado, também poderá invocar a nulidade da venda
feita sem legitimidade. [Neste sentido, Tribunal da Relação do Porto, Acórdão 26 Janeiro 2006]:
"Como principal interessado está o verdadeiro titular da coisa ilegitimamente vendida, que pode e tem
interesse em invocar a nulidade do negócio jurídico [Cfr. P. Romano Martinez, Contratos em Especial,
1996, pág 106/107, P. Lima/A. Varela, CC Anotado, II, 2a Ed., 168 - "ressalvados os desvios
apontados, o regime aplicável é o da nulidade ... pode, por conseguinte, ser invocada a todo tempo e
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por qualquer interessado ..."; GaIvão Telles, BMJ 83/127; Ac. STJ, de 1870272003, CJ/STJ/VI06. Em
sentido contrário, ver Menezes Leitão, ob. cit., 97, exceptuando "naturalmente no caso de ocorrer uma
aquisição tabular", como sucederia na situação do processo, como os recorrentes pretendem, ou
quando ali considere a alienação eficaz perante o verdadeiro proprietário].
Mas é inafastável que se trata do titular do direito vendido e, portanto, o primeiro interessado em ver
declarada nula a venda, até para afastar dúvidas ou aparências enganadoras quanto ao direito. "Para
além das acções de reivindicação e de restituição, pode ainda o titular do direito real invocar a
nulidade do contrato" [P. Romano Martinez, ob. cit., 107].
43.º
O art. 291º, nº 2 do C.C. é aplicável na presente acção, uma vez que os Autores vão proceder
ao seu registo antes de se passarem três anos sob a conclusão do negócio. Vide Ac. STJ, de
27/05/2005, na CJ/STJ/II/74: "Os recorrentes, mesmo que tenham actuado de boa fé, viam o direito
adquirido afectado pela nulidade, não podendo opor a aquisição e registo aos interessado na nulidade."
44.º
Os Autores são legítimos proprietários de parte indivisível do imóvel objecto dos presentes
autos (art. 1316º do C.C.), gozando, ainda, da presunção legal de titularidade do direito de
propriedade, detendo a posse, constituída pelo corpus e pelo animus (artigo 1251º e 1268º do Código
Civil) - Vide Ac. 17 de Junho de 2004, Tribunal da Relação de Lisboa, Proc. 3022/2004-8 (JusN t
3532/2004).
45.º
Pelo que têm legitimidade e cobertura jurídica para na presente acção pedirem, e verem
reconhecido, o seu direito de propriedade e subsequentemente a restituição do bem, com o
cancelamento de todos os registos que afectem e prejudiquem os seus legítimos interesses.
46.º
Conclui-se que o jus reivindicandi é a manifestação da supremacia universal do direito do
proprietário que, impondo-se erga omnes, determina a passividade dos restantes sujeitos jurídicos e a
reposição intrínseca da plenitude do gozo do objecto. Reconhecimento que aqui se apela e requer.

Nestes termos, nos melhores de Direito, e com o Mui douto suprimento de


V. Exa., deve a presente acção ter provimento e, em consequência, ser
reconhecido o direito de propriedade da herança por óbito de António de Jesus
Mateus sobre o imóvel sito na Rua Sousa Miranda, n.º 45, freguesia de Leça da
Palmeira, concelho de Matosinhos, livre de quaisquer ónus ou encargos, em
compropriedade com Beatriz Silva Mateus e sem determinação de parte ou
direito, com a consequente restituição do imóvel à esfera jurídica dos seus
legítimos proprietários.
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Mais se requer a nulidade do contrato de compra e venda, em face da


falsidade parcial das escrituras de repúdio que lhe subjaz e cuja declaração
igualmente se requer, e a consequente nulidade de todos os contratos celebrados
após aquele, com todas as consequências legais.
Mais requer seja passada certidão da presente acção, a fim de proceder
ao necessário registo.

Espera Deferimento,

Valor: 81.020,00 € (Oitenta e um mil e vinte euros).


Juntam: Procuração forense, 16 documentos, duplicados e documento comprovativo do pagamento
da taxa devida.
TESTEMUNHAS:
1- Maria Natividade Pinto Esteves, casada, reformada, residente na Rua Óscar da Silva, n.º 25, 2ºEsq.,
em Leça da Palmeira, Matosinhos;
2- Gabriel Antunes Pinto, solteiro, carpinteiro, residente na Rua Humberto Cruz, n.º 65, 1.ºDto., em
Leça da Palmeira, Matosinhos.

O Advogado,

Tobago Trinidad
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Assento n.º 356 Assento de casamento n.º 356


António de Jesus Mateus
e O nubente António de Jesus Mateus, de vinte e
Beatriz Silva dois anos, no estado de solteiro, natural da
Documento n.º 568 Maço n.º 4 freguesia de São Pedro, concelho de Bragança
e residente na Rua Tomás Silva, n.º 3, 1.ºDto.,
AVERBAMENTOS : deste concelho
1 – Dissolvido por óbito do cônjuge marido falecido a 29 filho de José Manuel Silva Mateus e Angelina
de Dezembro de 2012. Assento 75/2012 da 9.ª Ferreira de Jesus Mateus
Conservatória do Registo Civil do Porto. Bol. n.º 31 – A nubente Beatriz Silva, de dezasseis anos, no
Maço n.º 5. Em 5 de Fevereiro de 2013. estado de solteira, natural da freguesia de
Antonieta Gaspar Coimbra (Sé), concelho de Coimbra
______________________________________ e residente na Rua Tomás Silva, n.º 3, 1.ºDto.,
______________________________________ deste concelho
______________________________________ filha de António Luís Silva e Maria Trindade
______________________________________
Hora e data do casamento: às quinze horas e 30
______________________________________
minutos do dia catorze de Janeiro de mil
______________________________________ novecentos setenta e um
______________________________________
______________________________________ Lugar da celebração: Igreja de Benfica, da
freguesia de Benfica, deste concelho
______________________________________
______________________________________ Casamento: católico sem convenção antenupcial
______________________________________ Os nubentes declararam celebrar de livre
______________________________________ vontade o seu casamento, perante o Padre
______________________________________ Avelino do Coração de Jesus Soares, com licença
______________________________________ de pároco respectivo.
______________________________________ Apelidos adoptados pela mulher: Mateus
______________________________________
______________________________________ Menções especiais: Duplicado paroquial
______________________________________ entregue ontem pelo dito pároco.
______________________________________ Certificado passado por esta Conservatória a
______________________________________ dezoito de Dezembro.
______________________________________ A nubente foi previamente autorizada por sua
______________________________________ mãe em auto lavrado nesta Conservatória a
______________________________________ contrair casamento.
______________________________________
Assento: subscrito pelo Conservador, Gervásio
______________________________________ Luso de Sousa Martins.
______________________________________
______________________________________ Testemunhas: João Manuel Reis, casado,
residente em Lisboa e Francisco Ribeiro, casado,
______________________________________
residente em Lisboa
______________________________________
______________________________________ Conservatória do Registo Civil de Lisboa,
______________________________________ no dia dezoito de Janeiro de mil novecentos
______________________________________ setenta e um
______________________________________
______________________________________
Gervásio Luso de Sousa Martins
Registado no «Diário» sob o n.º 56892
______________________________________
______________________________________ CERTIFICO
Que o presente documento está conforme o original e vai ser assinado e
______________________________________ autenticado com o selo branco.
Substitui a certidão de cópia integraI Assento de Casamento para fins
______________________________________ judiciais.
Conservatória do Registo Civil de Lisboa
______________________________________ Escriturário, Cláudia Fernandes
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9.ª CONSERVATÓRIA DO REGISTO CIVIL DO PORTO

Assento de Óbito n.º 75/2012


Nome: António de Jesus Mateus
Sexo: Masculino Idade: sessenta e três anos
Estado: casado com Beatriz Silva Mateus
Naturalidade: freguesia de São Pedro, concelho de Bragança
Última residência habitual: Rua Sousa Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos
Pai: José Manuel Silva Mateus
Mãe: Angelina Ferreira de Jesus Mateus
__________________________________________________________________________________
Hora e data do falecimento: 00:45, do dia 29 de Dezembro de 2012
Lugar: Hospital de São João, no Porto
Sepultado no cemitério de: Bragança
Declarante: Justino Vicente, casado, residente na Rua Padre Gonçalves, n.º 15, 2.º Esq., no
Porto

Data do assento: 03 de Janeiro de 2013

O Conservador, Eduardo Filipe Costa Graça


__________________________________________________________________________________
Documento n.º 4578/12 Maço n.º 48 Lançado na receita sob o n.º 56005903

CERTIFICO
Que o presente documento está conforme o original e vai ser assinado
e autenticado com o selo branco.
Substitui a certidão de cópia integraI Assento de Óbito para fins
judiciais.

Conservatória do Registo Civil do Porto,


Escriturário, Edite Condeço
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Oitavo Cartório Notarial


do Porto
Notária: Maria do Céu Fernandes Rocha

HABILITAÇÃO DE HERDEIROS
No dia quinze de Janeiro do ano dois mil e treze, no Oitavo Cartório Notarial do Porto, perante
mim, Maria Afonsina Esteves Graciosa, ajudante principal em exercício de funções, em vitude de a
respectiva notária Maria do Céu Fernandes Rocha se encontrar de licença por doença, compareceu
como outorgante:
Beatriz Silva Mateus, natural de Coimbra (Sé), Coimbra, viúva, residente na Rua Sousa
Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos, portadora do b.i. n.º 000000 de 11/2/2003, emitido
pela D.G.R.N.- Serviços de Identificação Civil de Lisboa.
Verifiquei a identidade da outorgante pela exibição do respectivo bilhete de identidade.
E por ela foi declarado sob sua inteira responsabilidade:
Que intervém nesta escritura na qualidade de cabeça de casal da herança aberta por óbito de
seu marido, adiante referido, por lhe haver sido deferida nos termos o n.º 1, alínea a), do art. 2080.º do
Código Civil, cujo cargo foi por ela aceite.
Que no dia vinte e nove de Dezembro do ano dois mil e doze, no Porto, faleceu António de
Jesus Mateus, natural de São Pedro, Bragança, com a sua última residência habitual na Rua Sousa
Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos, no estado de casado, em primeiras núpcias de
ambos (casamento a 14/01/1971) e sem convenção antenupcial, com ela outorgante Beatriz Silva
Mateus.
Que o falecido não outorgou testamento nem qualquer outra disposição de última vontade
tendo deixado como únicos herdeiros legitimários:
o cônjuge sobrevivo – Beatriz Silva Mateus, já identificado;
e suas filhas – Dália Silva Mateus, natural de São Sebastião da Pedreira, Lisboa, divorciada,
residente no Largo Santo Estêvão, n.º 46, 3ºDto., Santo Tirso; e
Carla Silva Mateus, natural de São Sebastião da Pedreira, Lisboa, solteira, maior, residente
na Rua Francisco Silva, n.º 3, 4.ºEsq., Maia.
Que não há outras pessoas que, segundo a lei, prefiram às indicadas herdeiras ou quem com
elas possa concorrer na sucessão da herança do falecido.
Adverti a outorgante de que incorre nas penas aplicáveis ao crime de falsas declarações
perante oficial público se, dolosamente e em prejuízo de outrém, tiver prestado nesta escritura falsas
declarações.
Arquivo:
certidões de óbito e casamento do autor da herança;
certidões de nascimento das filhas herdeiras.
Foi esta escritura lida à outorgante e o seu conteúdo explicado, em voz alta.

Beatriz Silva Mateus


A ajudante
Maria Afonsina Esteves Graciosa

Certifico que a presente certidão foi extraída da escritura exarada de folhas vinte e quatro
do livro de notas para escrituras diversas número Duzentos e Dois L, deste Cartório, sem
documento complementar.
Contém um folha, por mim rubricada.
Porto, quinze de Janeiro do ano dois mil e treze.
A ajudante,
Maria Afonsina Esteves Graciosa
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Assento n.º 358 Assento de nascimento n.º 358


Dália Silva Mateus
Cédula n.º 23456
Nome Dália, apelidos Silva Mateus
AVERBAMENTOS : Sexo feminino
1 – Casou civilmente com Mário Jorge Silvino, em 03 de Dezembro Hora do nascimento: doze e quinze
de 1991, na Conservatória de Vila Franca de Xira. minutos
Assento n.º 35 de 1991, da Conservatória de Vila Franca de Xira dia vinte e um, mês Novembro
e mudou o nome para Dália Silva Mateus Silvino. Bol. n.º 49 – e ano de mil novecentos setenta e dois
Maço n.º 6. Em 16 de Dezembro de 1991. Lugar: freguesia de São Sebastião da
Francisco Silva Pedreira
2 – Mudou o nome para Dália Silva Mateus, por
concelho de Lisboa
efeito de renúncia do apelido do marido. Bol. n.º 27 –
Maço n.º 8 de 1993. Em 17 de Fevereiro de 1993. Filiação
José Coelho Pai: António de Jesus Mateus
3 – O casamento averbado sob o n.º 1 foi dissolvido estado, casado
por divórcio decretado por sentença de 27 de Abril de naturalidade: São Pedro
1993, transitada em 10 de Maio de 1993, concelho de: Bragança
proferida pelo Tribunal de Vila Franca de Xira, residência habitual: Rua Tomás Silva, n.º 3,
2.º Juízo. Boletim n.º 235, maço 6 de 1999. Em 1.ºDto., deste concelho
28 de Julho de 1999. Mãe: Beatriz Silva Mateus
Ana Peres estado, casada
______________________________________ naturalidade: Coimbra (Sé)
______________________________________ concelho de: Coimbra
______________________________________
______________________________________ residência habitual: a do marido
______________________________________ Avós paternos: José Manuel Silva Mateus e
______________________________________ Angelina Ferreira de Jesus Mateus
______________________________________ Avós maternos: António Luís Silva e Maria
______________________________________ Trindade
______________________________________ Declarante: o pai
______________________________________
______________________________________ Menções especiais:
______________________________________
______________________________________ Assento: lavrado perante o Conservador,
______________________________________ Gervásio Luso de Sousa Martins.
______________________________________
______________________________________ Conservatória do Registo Civil de Lisboa,
______________________________________ às quinze horas e dez minutos do dia vinte
______________________________________ e quatro de Novembro de mil novecentos
______________________________________ setenta e dois
______________________________________
______________________________________ António de Jesus Mateus
______________________________________ Gervásio Luso de Sousa Martins
______________________________________ Registado no «Diário» sob o n.º 178962
______________________________________ CERTIFICO
Que o presente documento está conforme o original e vai ser assinado e
______________________________________ autenticado com o selo branco.
______________________________________ Substitui a certidão de cópia integraI Assento de Nascimento para fins
judiciais.
______________________________________ Conservatória do Registo Civil de Lisboa
Escriturário, Cláudia Fernandes
______________________________________
Página 16 de 38

Assento n.º 518 Assento de nascimento n.º 518


Carla Silva Mateus
Cédula n.º 87889-B
Nome Carla, apelidos Silva Mateus
AVERBAMENTOS : Sexo feminino
______________________________________ Hora do nascimento: vinte
______________________________________ dia trinta e um, mês Maio
______________________________________ e ano de mil novecentos setenta e quatro
______________________________________
Lugar: freguesia de São Sebastião da
______________________________________
Pedreira
______________________________________
______________________________________ concelho de Lisboa
______________________________________ Filiação
______________________________________ Pai: António de Jesus Mateus
______________________________________
estado, casado
______________________________________
______________________________________ naturalidade: São Pedro
______________________________________ concelho de: Bragança
______________________________________ residência habitual: Rua Tomás Silva, n.º 3,
______________________________________ 1.ºDto., deste concelho
______________________________________ Mãe: Beatriz Silva Mateus
______________________________________
estado, casada
______________________________________
______________________________________ naturalidade: Coimbra (Sé)
______________________________________ concelho de: Coimbra
______________________________________ residência habitual: a do marido
______________________________________
Avós paternos: José Manuel Silva Mateus e
______________________________________
Angelina Ferreira de Jesus Mateus
______________________________________
______________________________________ Avós maternos: António Luís Silva e Maria
______________________________________ Trindade
______________________________________ Declarante: o pai
______________________________________
______________________________________ Menções especiais:
______________________________________
______________________________________ Assento: lavrado perante o Conservador,
______________________________________ Gervásio Luso de Sousa Martins.
______________________________________
______________________________________ Conservatória do Registo Civil de Lisboa,
______________________________________ às dez horas e dez minutos do dia treze de
______________________________________ Setembro de mil novecentos setenta e
______________________________________ quatro
______________________________________ António de Jesus Mateus
______________________________________
______________________________________
Gervásio Luso de Sousa Martins
______________________________________ Registado no «Diário» sob o n.º 25789
______________________________________
______________________________________
CERTIFICO
______________________________________ Que o presente documento está conforme o original e vai ser assinado e
autenticado com o selo branco.
______________________________________ Substitui a certidão de cópia integraI Assento de Nascimento para fins
judiciais.
______________________________________ Conservatória do Registo Civil de Lisboa
Escriturário, Cláudia Fernandes
______________________________________
Página 17 de 38

Terceiro Cartório Notarial


do Porto
A cargo do Notário: (vago)

REPÚDIO DE HERANÇA
No dia vinte e oito de Setembro de dois mil e catorze, no TERCEIRO CARTÓRIO
NOTARIAL DO PORTO, perante mim, Maria de Lurdes Domingues Gonçalves, Primeira
Ajudante em exercício de funções, em virtude de o respectivo lugar de Notário se encontrar
vago, compareceu como outorgante:
CARLA SILVA MATEUS, solteira, maior, natural da freguesia de São Sebastião da
Pedreira, concelho de Lisboa, residente na Rua Francisco Silva, n.º 3, 4.ºEsq., na Maia, NIF
000000000.
Verifiquei a identidade da outorgante pela exibição do seu cartão do cidadão n.º 0000000 de
23/01/2013, emitido pelos Serviços de Identificação Civil de Lisboa.
PELA OUTORGANTE FOI DITO:
Que, pela presente escritura repudia a herança deixada por óbito de seu pai, ANTÓNIO DE
JESUS MATEUS, falecido em vinte e nove de Dezembro de 2012, no Porto, com última
residência habitual na Rua Sousa Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos.
Que não tem descendentes.
ASSIM O OUTORGOU.
O imposto de selo cobrado é de trinta e cinco euros.
Esta escritura foi lida à outorgante e à mesma explicado o seu conteúdo, em voz alta.

Carla Silva Mateus

A 1.ª Ajudante
Maria de Lurdes Domingues Gonçalves

Que a presente fotocópia, contendo uma folha, foi extraída da escritura exarada de folhas
quinze do livro de notas para escrituras diversas número Cento e Quatro M, deste Cartório,
e está conforme o original.
Porto, vinte e oito de Setembro de dois mil e catorze.
A 1.ª Ajudante,
Maria de Lurdes Domingues Gonçalves
Página 18 de 38

Sétimo Cartório Notarial


do Porto
A cargo da Notária Sofia Isabel Martins

REPÚDIO DE HERANÇA

No dia catorze de Outubro de dois mil e catorze, no Sétimo Cartório Notarial do


Porto, perante mim, Sofia Isabel Martins, notária do mesmo, compareceu como
OUTORGANTE:
Dália Silva Mateus, NIF 000000000, divorciada, natural de São Sebastião da Pedreira,
Lisboa, residente no Largo Santo Estêvão, n.º 46, 3ºDto., Santo Tirso.
Verifiquei a identidade da outorgante pela exibição do seu bilhete de identidade.
PELA OUTORGANTE FOI DITO:
Que, pela presente escritura repudia a herança deixada por óbito de seu pai, ANTÓNIO DE
JESUS MATEUS, falecido em vinte e nove de Dezembro de 2012, no Porto, com última
residência habitual na Rua Sousa Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos.
Que não tem descendentes.
ASSIM O OUTORGOU.
O imposto de selo cobrado é de trinta e cinco euros.
Esta escritura foi lida à outorgante e à mesma explicado o seu conteúdo, em voz alta.

Dália Silva Mateus


A Notária, Sofia Isabel Martins

Que a presente fotocópia, contendo uma folha, foi extraída da escritura exarada de folhas
vinte do livro de notas para escrituras diversas número oitenta e dois J, deste Cartório, e
está conforme o original.
Porto, catorze de Outubro de dois mil e catorze.
O Ajudante,
Domnigos Gaspar
Página 19 de 38

3.ª CONSERVATÓRIA DO REGISTO CIVIL DO PORTO


Assento de Nascimento n.º 865
NOME PRÓPRIO: AFONSO
APELIDOS: SILVA MATEUS
SEXO: Masculino
Hora e data do nascimento: 18 horas e 25 minutos de 18 de Novembro de 1995
Naturalidade: freguesia de Paranhos
concelho de Porto
__________________________________________________________________________________________
Pai: ***
Idade: ***
Estado: ***
Naturalidade: freguesia de ***
concelho de ***
Residência habitual: ***
__________________________________________________________________________________________
Mãe: Dália Silva Mateus
Idade: 22 anos
Estado: divorciada
Naturalidade: freguesia de São Sebastião da Pedreira
concelho de Lisboa
Residência habitual: Avenida de Brasília, n.º 44, 7.ºEsq., Gondomar
__________________________________________________________________________________________
Avós paternos: ***
Avós maternos: António de Jesus Mateus e Beatriz Silva Mateus
__________________________________________________________________________________________
Declarante: A mãe
Data do assento: 12 de Dezembro de 1995
Dália Silva Mateus
O 1.º Ajudante em substituição legal do Conservador,
Maria Arlete Gomes Figueiredo
__________________________________________________________________________________
Averbamentos
1 – Remetida certidão ao Tribunal de Família e Menores do Porto em 12/12/1995
2 – O pai é Luís Pedro Simões Ferreira, 24 anos, natural da freguesia de Seia, concelho de Seia; filho de Manuel Pereira e de Isilda de Almeida
Pereira, com residência habitual em Aldeia da Serra. Documento n.º 568, maço 8, ano de 1997. Em 13 de Novembro de 1997.
Emília Costa Sampaio

CERTIFICO
Que o presente documento está conforme o original e vai ser assinado e autenticado com o selo branco.
Substitui a certidão de cópia integraI Assento de Nascimento para fins judiciais.
Conservatória do Registo Civil do Porto,
Escriturário, Edite Condeço
Página 20 de 38

8.ª CONSERVATÓRIA DO REGISTO CIVIL DE LISBOA


Assento de Nascimento n.º 968
NOME PRÓPRIO: CATARINA
APELIDOS: MATEUS DE ALMEIDA
SEXO: Feminino
Hora e data do nascimento: 17 horas e 20 minutos de 29 de Setembro de 1998
Naturalidade: freguesia de São Sebastião da Pedreira
concelho de Lisboa
__________________________________________________________________________________________
Pai: Carlos Manuel Antunes de Almeida
Idade: 35 anos
Estado: divorciado
Naturalidade: freguesia de Campo Grande
concelho de Lisboa
Residência habitual: Rua da Saudade, n.º 7, 2.ºDto., em Lisboa
__________________________________________________________________________________________
Mãe: Dália Silva Mateus
Idade: 25 anos
Estado: divorciada
Naturalidade: freguesia de São Sebastião da Pedreira
concelho de Lisboa
Residência habitual: Rua da Saudade, n.º 7, 2.ºDto., em Lisboa
__________________________________________________________________________________________
Avós paternos: Manuel de Almeida e Leonor Antunes de Almeida
Avós maternos: António de Jesus Mateus e Beatriz Silva Mateus
__________________________________________________________________________________________
Declarantes: Os pais
Data do assento: 04 de Outubro de 1998
Carlos Manuel Antunes de Almeida
Dália Silva Mateus
O Ajudante Principal em substituição legal do Conservador, Lourenço Carvalho

CERTIFICO
Que o presente documento está conforme o original e vai ser assinado e autenticado com o selo branco.
Substitui a certidão de cópia integraI Assento de Nascimento para fins judiciais.
Conservatória do Registo Civil de Lisboa,
Escriturário, Celestina Antunes
Página 21 de 38

6.ª CONSERVATÓRIA DO REGISTO CIVIL DO PORTO


Assento de Nascimento n.º 745
NOME PRÓPRIO: BERNARDO
APELIDOS: MATEUS GONÇALVES
SEXO: Masculino
Hora e data do nascimento: 9 horas e 28 minutos de 27 de Novembro de 1994
Naturalidade: freguesia de Paranhos
concelho de Porto
__________________________________________________________________________________________
Pai: Miguel Gonçalves
Idade: 41 anos
Estado: casado
Naturalidade: freguesia de Imaculado Coração de Maria
concelho de Funchal
Residência habitual: Rua Manuel Constantino, lote 67, r/c, na Póvoa do Varzim
__________________________________________________________________________________________
Mãe: Carla Silva Mateus
Idade: 20 anos
Estado: solteira
Naturalidade: freguesia de São Sebastião da Pedreira
concelho de Lisboa
Residência habitual: Rua Manuel Constantino, lote 67, r/c, na Póvoa do Varzim
__________________________________________________________________________________________
Avós paternos: Manuel Faustino Gonçalves e Maria da Conceição de Sousa Gonçalves
Avós maternos: António de Jesus Mateus e Beatriz Silva Mateus
__________________________________________________________________________________________
Declarantes: Os pais
Data do assento: 04 de Dezembro de 1994
Miguel Gonçalves
Carla Silva Mateus
O Conservador, Maria Georgete Ferreira Simões

CERTIFICO
Que o presente documento está conforme o original e vai ser assinado e autenticado com o selo branco.
Substitui a certidão de cópia integraI Assento de Nascimento para fins judiciais.
Conservatória do Registo Civil do Porto,
Escriturário, Edite Condeço
Página 22 de 38

Conservatória do Registo Predial de Freguesia Leça da Palmeira


Matosinhos 3535/19991206
______________________________________________________________________________________________
DESCRIÇÕES - AVERBAMENTOS - ANOTAÇÕES
URBANO
DENOMINAÇÃO: Bairro de Santa Clara
SITUADO EM: Leça da Palmeira

ÁREA TOTAL: 123 M2


ÁREA COBERTA: 63,95 M2
ÁREA DESCOBERTA: 59,05 M2

VALOR TRIBUTÁVEL: 81.020,00 Euros


MATRIZ nº: 0202
COMPOSIÇÃO E CONFRONTAÇÕES:
- Moradia 418, Classe B, Tipo III, composta de 2 pavimentos e quintal. (
Desanexado do nº 13 756, fls. 51 do B-40 )
O (A) Conservador(a)
Sofia Ribeiro
---------------------------------------------------------------------------
Conservatória do Registo Predial de Matosinhos
OFICIOSO
AP. 4249 de 2009/03/26 2009/04/08 16:15:54 - ANOTAÇÃO
A desanexar uma parcela de terreno com a área de 19 m2, que vai constituir
o prédio n.º 4701/Leça da Palmeira.
O (A) Conservador(a)
Sofia Ribeiro
---------------------------------------------------------------------------
AP. 32 de 1999/12/06 – Aquisição
CAUSA : Atribuição de Moradia Económica HISTÓRICO
---------------------------------------------------------------------------
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** ANTÓNIO RAPOSO COELHO
Casado/a com MARIA PIRES COELHO no regime de Comunhão geral
Morada: Rua Sousa Miranda, n.º 45, Matosinhos
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
** ESTADO
O Conservador
José Rodrigues
---------------------------------------------------------------------------
AP. 42 de 2000/02/22 – Aquisição HISTÓRICO
CAUSA : Sucessão
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** MANUELA PIRES DE COELHO DE MATOS
Casado/a com CARLOS ALBERTO LOUREIRO DE MATOS no regime de Comunhão de
adquiridos
Morada: Praceta de São João, nº6, 1º Esq. Carcavelos Localidade: Oeiras
** ANTÓNIO VICTOR PIRES DE COELHO
Casado/a com MARIA VITÓRIA DA COSTA DE COELHO no regime de Comunhão de
adquiridos
Morada: Rua D. João de Castro, nº44, 2º dto. Trofa
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
* ANTÓNIO RAPOSO COELHO E MULHER MARIA PIRES COELHO, CASADOS NA COMUNHÃO
GERAL
Morada: Rua Sousa Miranda, n.º 45
Localidade: Matosinhos
SEM DETERMINAÇÃO DE PARTE OU DIREITO.
O Conservador
José Rodrigues
___________________________________________________________________________
C. R. P. Matosinhos Informação em vigor Página – 1 -
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Matosinhos 3535/19991206
______________________________________________________________________________________________
INSCRIÇÕES - AVERBAMENTOS - ANOTAÇÕES
AP. 34 de 2001/05/31 – Aquisição
PROVISÓRIO POR NATUREZA - alínea g) do n° 1
CAUSA : Compra
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** ANTÓNIO DE JESUS MATEUS
Casado/a com BEATRIZ SILVA MATEUS sem convenção antenupcial (casamento a
14/01/1971)
Morada: Rua João da Silva, 4, 2º B, Vila Nova de Gaia
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
** MANUELA PIRES DE COELHO DE MATOS
Casado/a com CARLOS ALBERTO LOUREIRO DE MATOS no regime de Comunhão de
adquiridos
Morada: Praceta de São João, nº6, 1º Esq. Carcavelos Localidade: Oeiras
** ANTÓNIO VICTOR PIRES DE COELHO
Casado/a com MARIA VITÓRIA DA COSTA DE COELHO no regime de Comunhão de
adquiridos
Morada: Rua D. João de Castro, nº44, 2º dto, Trofa
INSCRIÇÃO G-2.
A Conservadora
Maria Sobral
---------------------------------------------------------------------------
AP. 35 de 2001/05/31 - Hipoteca Voluntária
PROVISÓRIO POR NATUREZA - alínea i) do n° 1 e b) do n° 2 HISTÓRICO
CAPITAL: 20.000.000,00 Escudos
MONTANTE MÁXIMO ASSEGURADO: 26.757.400,00 Escudos
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** "BANCO BAC, S.A." Sede: Rua Augusto, 2, Porto
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
** ANTÓNIO DE JESUS MATEUS e mulher BEATRIZ SILVA MATEUS, CASADOS SEM
CONVENÇÃO ANTENUPCIAL (casamento a 14/01/1971)
Morada: Rua João da Silva, 4, 2° B, Vila Nova de Gaia
FUNDAMENTO: garantia de empréstimo JURO ANUAL: 5,929%, acrescido de 4% na
mora, a titulo de cláusula penal DESPESAS: 800 000$00 INSCRIÇÃO C-1.
A Conservadora
Maria Sobral
---------------------------------------------------------------------------
AP. 39 de 2001/07/11 - Hipoteca Voluntária
PROVISÓRIO POR NATUREZA - alínea i) do n° 1 e b) do n° 2
HISTÓRICO
CAPITAL: 20.000.000,00 Escudos
MONTANTE MÁXIMO ASSEGURADO: 26.757.400,00 Escudos
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** "BANCO BAC, S.A." Sede: Rua Augusto, 2, Porto
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
** ANTÓNIO DE JESUS MATEUS e mulher BEATRIZ SILVA MATEUS, CASADOS SEM
CONVENÇÃO ANTENUPCIAL (casamento a 14/01/1971) Morada: Rua João da Silva, 4,
2° B, Vila Nova de Gaia
FUNDAMENTO: Abertura de crédito JURO ANUAL: 5,929%, acrescido de 4% na
mora, a titulo de cláusula penal DESPESAS: 800 000$00 INSCRIÇÃO C-2.
A Conservadora
Maria Sobral
---------------------------------------------------------------------------
AVERB. - AP. 67 de 2001/10/24 - Conversão em Definitiva
DA APRESENT. 34 de 2001/05/31 – Aquisição HISTÓRICO
A Conservadora
Maria Sobral
______________________________________________________________________________________________
C. R. P. Matosinhos Informação em vigor Página – 2 -
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Matosinhos 3535/19991206
______________________________________________________________________________________________
INSCRIÇÕES - AVERBAMENTOS - ANOTAÇÕES
AVERB. - AP. 68 de 2001/10/24 - Conversão em Definitiva
DA APRESENT. 35 de 2001/05/31 - Hipoteca Voluntária HISTÓRICO
A Conservadora
Maria Sobral
---------------------------------------------------------------------------
AVERB. - AP. 69 de 2001/10/24 - Conversão em Definitiva
DA APRESENT. 39 de 2001/07/11 - Hipoteca Voluntária HISTÓRICO
A Conservadora
Maria Sobral
---------------------------------------------------------------------------
AP. 21 de 2012/05/21 – Penhora HISTÓRICO
DATA DA PENHORA: 2012/05/14
QUANTIA EXEQUENDA: 5.156,99 Euros
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** "FAZENDA NACIONAL"
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
** ANTÓNIO DE JESUS MATEUS Casado/a com BEATRIZ SILVA MATEUS
Morada: Rua Sousa Miranda, nº 45
Localidade: Matosinhos
O Conservador
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
Anotação- AP. 40 de 2002/08/02 – Recusa HISTÓRICO
O cancelamento
O Conservador
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
AP. 1 de 2014/01/27 - Aquisição
CAUSA : Dissolução da Comunhão Conjugal e Sucessão Hereditária
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** BEATRIZ SILVA MATEUS
Viúvo (a)
Morada: Rua Sousa Miranda, n.º 45
Localidade: Matosinhos
** DÁLIA SILVA MATEUS
Divorciado (a)
Morada: Largo Santo Estêvão, n.º 46, 3ºDto.
Localidade: Santo Tirso
** CARLA SILVA MATEUS
Solteiro(a) , Maior
Morada: Rua Francisco Silva, n.º 3, 4.ºEsq.
Localidade: Maia
SUJEITO(S) PASSIVO(S)
** ANTÓNIO DE JESUS MATEUS QUE FOI C.C. BEATRIZ SILVA MATEUS, SEM CONVENÇÃO
ANTENUPCIAL (casamento a 14/01/1971)
Morada: Rua Sousa Miranda, n.º 45
Localidade: Matosinhos
SEM DETERMINAÇÃO DE PARTE OU DIREITO.
O Conservador
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
AVERB. - AP. 12 de 2014/10/15 - Rectificação
DA APRESENT. 1 de 2014/01/27 - Aquisição
Sujeito activo é, apenas, Beatriz Silva Mateus
O Conservador
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Matosinhos 3535/19991206
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INSCRIÇÕES - AVERBAMENTOS - ANOTAÇÕES
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
AP. 13 de 2014/10/15 - Hipoteca Voluntária
PROVISÓRIO POR NATUREZA - al. i) do nº 1 HISTÓRICO
CAPITAL: 50.000,00 Euros
MONTANTE MÁXIMO ASSEGURADO: 65.275,00 Euros
SUJEITO{S) ACTIVO(S):
** "BANCO BAC, S.A."
Sede: Rua Augusto, 2 Localidade: Porto
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
** BEATRIZ SILVA MATEUS Viúvo (a)
Morada: Rua Sousa Miranda, 45, Matosinhos
Localidade: Matosinhos
FUNDAMENTO: Garantia de empréstimo JURO ANUAL: 4,85% acrescido de 4% em
caso de mora, a título de cláusula penal DESPESAS: 2000,00 EUR
O Conservador
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
AVERB. - AP. 8 de 2014/10/20 – Cancelamento
DA APRESENT. 21 de 2012/05/21 – Penhora HISTÓRICO
O Conservador
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
AVERB. - AP. 60 de 2015/04/05 - Conversão em Definitiva
DA APRESENT. 13 de 2014/10/15 - Hipoteca Voluntária
O Conservador Artur
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
AVERB. - AP. 61 de 2015/04/05 – Cancelamento
DA APRESENT. 35 de 2011/05/31 - Hipoteca Voluntária HISTÓRICO
O Conservador
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
AVERB. - AP. 62 de 2015/04/05 – Cancelamento
DA APRESENT. 39 de 2011/07/11 - Hipoteca Voluntária HISTÓRICO
O Conservador
Alexandre Martins
---------------------------------------------------------------------------
AP. 11 de 2016/09/01 - Aquisição
PROVISÓRIO POR NATUREZA - Artigo 92° n° 1 al. g)
SUJEITO(S) ACTIVO (S):
** COMPRAIMÓVEIS-COMPRA E REVENDA DE IMOVEIS, SA
Morada: Rua Soares dos Reis, n.º 15, 3.º, sala 5.2
Localidade: Mafamude - Vila Nova de Gaia
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
** BEATRIZ SILVA MATEUS
Viúvo (a)
Morada: Rua Sousa Miranda, n.º 45
Localidade: Matosinhos
O(A) Ajudante, em substituição
Nuno Gonçalves
---------------------------------------------------------------------------
AVERB. - AP. 35 de 2016/09/18 – Conversão em Definitiva
DA APRESENT. 11 de 2016/09/01 - Aquisição
O(A) Ajudante, em substituição
Nuno Gonçalves
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Matosinhos 3535/19991206
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INSCRIÇÕES - AVERBAMENTOS - ANOTAÇÕES
REGISTOS PENDENTES
Não existem registos pendentes.
---------------------------------------------------------------------------

Certifico que sobre o prédio nº 3535 da freguesia de Leça da Palmeira, concelho de


Matosinhos, e de harmonia com o requerido na requisição nº 30045, as presentes
fotocópias estão de acordo com o original e constam de 5 folhas.
Por ser verdade se passou a presente certidão que conferi e assino com a rubrica que uso
e autentico com o selo branco desta Conservatória.
CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DE MATOSINHOS, 17 de outubro de
2016
O Oficial,
Nuno Gaspar

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CERTIDÃO DE TEOR
PRÉDIO URBANO

SERVIÇO DE FINANÇAS: 5678 - MATOSINHOS

IDENTIFICAÇÃO DO PRÉDIO

DISTRITO: 21 - PORTO CONCELHO: 06 - MATOSINHOS FREGUESIA: 08 - LEÇA DA PALMEIRA

ARTIGO MATRICIAL: 0202 NIP:

Descrito na C.R.P. de: MATOSINHOS sob o registo n.º: 3535

LOCALIZAÇÃO DO PRÉDIO

Av./Rua/Praça: Rua Sousa Miranda N.º: 45 LUGAR: Leça da Palmeira CÓDIGO POSTAL: 4450-656
MATOSINHOS

DESCRIÇÃO DO PRÉDIO

Tipo de Prédio: prédio em Prop. Total sem Andares nem Div. Susc. de utiliz. Independente

Afetação: Habitação N.º de pisos: 2 Tipologia/Divisões: 3


2
ÁREAS (em m )
2 2
Área total do terreno: 123,0000 m Área de Implantação do edifício: 59.8000 m Área bruta de construção:
2 2 2
106,8000 m Área bruta dependente: 0,0000 m Área bruta privativa: 106,8000 m

DADOS DE AVALIAÇÃO

Ano de Inscrição na matriz: 2001 Valor patrimonial atual (CIMI): €84.058,25 Determinado no ano: 2009

Tipo de coeficiente de localização: Habitação Coordenada X: 106.563,00 Coordenada Y: 198.185,00

Mod 1 do IMI nº: 1186206 Entregue em: 2015/10/30 Ficha de avaliação nº: 1391700 Avaliada em: 2016/03/25

TITULARES

Identificação fiscal: 000 000 00 Nome: COMPRAIMÓVEIS - COMPRA E REVENDA DE IMOVEIS SA

Morada: RUA SOARES DOS REIS, N 15, 3.º, SALA 5.2, MAFAMUDE, VILA NOVA DE GAIA.

Tipo de titular: Propriedade plena Parte: 1/1 Documento: ESCRITURA PUBLICA DE 2016/09/08
Entidade: CN MARIA ALICE RIBEIRO TEIXEIRA

Impresso no Serviço de Finanças de MATOSINHOS em 2016-10-13

O Chefe de Finanças

Rogério António Pires


(Rogério António Pires)
Página 28 de 38

Ex.mo Senhor
Conservador da
Conservatória do Registo Predial de
Matosinhos

Beatriz Silva Mateus vem requerer a V.Ex.ª a rectificação do registo pedido pela AP 1

de 2014/01/27, no sentido de ficar a constar como única titular, pelo facto de os restantes

sujeitos activos não terem aceite a Herança por morte de António de Jesus Mateus, como se prova

pelas escrituras de repúdio juntas, e os mesmos não terem qualquer intervenção no pedido de

registo referido.

Beatriz Silva Mateus

CERTIFICO
Que o presente documento está conforme o requerimento original apresentado
nesta Conservatória e vai ser assinado e autenticado com o selo branco.
Conservatória do Registo Predial de Matosinhos,
Escriturário, Elisa Henriques
Página 29 de 38

Cartório Notarial de Maria Alice Ribeiro Teixeira


Notária
COMPRA E VENDA
No dia oito de Setembro de dois mil e dezasseis, perante mim, Notária Maria Alice Ribeiro Teixeira,
com Cartório na Rua Maestro Catarino Freitas, n.º 15, no Porto, compareceram:
PRIMEIRO
BEATRIZ SILVA MATEUS, viúva, natural de Coimbra (Sé), Coimbra, residente na Rua Sousa
Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos.
NIF: 000 000 000.
SEGUNDO
DRA. SÓNIA MARIA FELICIDADE DOS SANTOS, solteira, maior, natural da freguesia de Rio de
Galinhas, concelho de Marco de Canavezes, residente na Rua Marechal Saldanha, n.º 147, Porto:
Que outorga na qualidade de Procuradora “COMPRAIMÓVEIS – COMPRA E REVENDA DE
IMÓVEIS, S.A.”, NIF 000 000 000, com sede na Rua Soares dos Reis, n.º 15, 3.º, sala 5.2, freguesia
de Mafamude, concelho de Vila Nova de Gaia, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de
Vila Nova de Gaia sob o número 0000000; com o capital social de cinco milhões de euros; qualidade e
poderes que verifiquei por procuração arquivada a instruir a escritura lavrada a folhas 132 do livro de
notas número 152-A do extinto 14.º Cartório Notarial do Porto.
Verifiquei a identidade da segunda pelo meu conhecimento pessoal e a da primeira pela exibição do
seu bilhete de identidade número: 0000000 de 11/2/2003, emitido pelo S.I.C. de Lisboa.
DECLARARAM:
A primeira Outorgante declara vender à sociedade “COMPRAIMÓVEIS – COMPRA E REVENDA
DE IMÓVEIS, S.A.” o prédio urbano constituído pela moradia, classe B, tipo III, composta de 2
pavimentos e quintal, sito na Rua Sousa Miranda, n.º 45, freguesia de Leça da Palmeira, concelho de
Matosinhos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o n.º 3535 (três mil
quinhentos e trinta e cinco) e inscrito na matriz predial respetiva sob o n.º 0202 (duzentos e dois), pelo
preço de € 85.000,00 (oitenta e cinco mil euros).
A segunda Outorgante, na qualidade de Procuradora de “COMPRAIMÓVEIS – COMPRA E
REVENDA DE IMÓVEIS, S.A.” declara comprar o referido imóvel, destinando o imóvel adquirido a
revenda.
EXIBIRAM:
Certidão emitida pela dita Conservatória do Registo Predial aos 29 de Agosto de 2016;
Caderneta Predial Urbana impressa no Serviço de Finanças do Porto – 13 Bairro em 19.06.2016;
Certidão emitida pela Câmara Municipal do Porto em 9 de Agosto de 2016, por onde verifiquei
correspondência toponímica.
Fotocópia Certificada pela Advogada Flamínia Medusa, com cédula profissional n.º 0000, da certidão
emitida em 10 de Janeiro deste ano, pelo Serviço de Finanças de Vila Nova de Gaia 4, comprovativa
de que a referida sociedade se encontra colectada pela actividade de compra e venda de bens
imobiliários - revenda dos adquiridos para esse fim, tendo no ano transacto exercido normal e
habitualmente aquela actividade, pelo que se encontra isenta do pagamento do IMT nos termos do
artigo 7.º do respectivo Código.
Foi esta escritura lida e o seu conteúdo explicado em voz alta aos outorgantes.
Imposto de selo liquidado: 1.1. - 1080,00 €; 15.1. - 25,00 €
Beatriz Silva Mateus
Sónia Maria Felicidade dos Santos
A Notária, Maria Alice Ribeiro Teixeira
Que a presente fotocópia, contendo uma folha, foi extraída da escritura exarada de folhas
cento e quarenta do livro de notas para escrituras diversas número vinte, deste Cartório, e
está conforme o original.
Porto, oito de Setembro de dois mil e dezasseis.
A Ajudante,
Sandra Quaresma
Página 30 de 38

PROMESSA UNILATERAL DE VENDA


PRIMEIRA: COMPRAIMÓVEIS - Compra e Revenda de Imóveis, S.A, NIPC: 000 000 000, com sede na
Rua Soares dos Reis, n.º 15, 3.º, sala 5.2, freguesia de Mafamude, concelho de Vila Nova de Gaia, matriculada
na Conservatória do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia sob o número 0000000, representada pelo
presidente do conselho de administração António Pedro Teixeira Valente, adiante designado por Primeira
Outorgante;
SEGUNDA: Beatriz Silva Mateus, viúva, natural de Coimbra (Sé), Coimbra, residente na Rua Sousa Miranda,
n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos, NIF: 000 000 000, BI n.º 000000 de 11/2/2003, emitido pelo SIC de
Lisboa, adiante designada por Segunda Outorgante.

ARTIGO 1.º
Declarou a Primeira Outorgante é dona e legítima proprietária do prédio urbano destinado a habitação, com tudo
o que o compõe, sito na Rua Sousa Miranda, n.º 45, freguesia de Leça da Palmeira, concelho de Matosinhos,
descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o n.º 3535 e inscrito na matriz predial respetiva
sob o n.º 0202.
ARTIGO 2.º
Pelo presente contrato a Primeira Outorgante promete vender à Segunda Outorgante, ou a quem esta indicar, o
prédio identificado no artigo anterior, pelo preço de 127.500,00€.
ARTIGO 3.º
A presente promessa é válida até ao dia sete de Setembro de dois mil e dezassete.
ARTIGO 4.º
I - A marcação do dia, hora, Cartório Notarial e local em que deverá concretizar-se a respectiva escritura pública
de compra e venda compete à Segunda Outorgante, devendo a referida escritura realizar-se até ao último dia
previsto no Artigo 3º.
II - A Segunda Outorgante deverá notificar a Primeira Outorgante do dia, hora e local em que se deverá
concretizar a competente escritura pública de compra e venda, por carta registada com aviso de recepção, com a
antecedência, mínima de quarenta e cinco dias, não podendo em qualquer caso a outorga da dita escritura
pública de compra e venda efectivar-se após a data do terminus da presente promessa, ou seja, até ao dia sete de
Setembro de dois mil e dezassete.
ARTIGO 5.º
1- Caso a Segunda Outorgante não proceda à marcação da escritura de compra e venda supra mencionada, nos
exactos termos previstos no artigo anterior, e nessa medida, não intervenha, nos termos e prazos acima descritos,
na outorga da mesma, os efeitos da presente promessa cessarão imediatamente, sem necessidade de qualquer
interpelação por parte da Primeira Outorgante.
2 - Na hipótese prevista no número anterior, a Segunda Outorgante não tem direito, seja a que título for, a
qualquer tipo de compensação por parte da Primeira Outorgante, a cuja reclamação judicial ou extra judicial,
desde já, renuncia.
ARTIGO 6.º
Sempre que existir qualquer alteração de domicílio, os outorgantes comprometem-se a avisar, reciprocamente,
por carta registada com aviso de recepção.
ARTIGO 7.º
O prédio urbano aqui prometido vender será transmitido livre de quaisquer ónus ou encargos.
ARTIGO 8.º
1- As despesas inerentes à transmissão da propriedade do prédio urbano identificado no artigo primeiro,
nomeadamente IMT, registos e escritura, serão por conta da Segunda Outorgante.
2 - O IMI devido durante a vigência do presente contrato, referente ao prédio urbano identificado no artigo
primeiro, será pago pela segunda outorgante à primeira outorgante no acto da escritura de compra e venda.
ARTIGO 9.º
Ambos os outorgantes declaram prescindir do reconhecimento presencial das assinaturas deste contrato e, bem
assim, renunciar ao direito de invocar a sua nulidade por omissão deste requisito.

A presente promessa unilateral de venda foi feita no Porto, aos 05 dias do mês de Outubro de 2016, foi elaborada
em dois exemplares de igual valor e depois de lido será assinado por todos os intervenientes, que declaram achá-
la conforme a sua vontade, ficando um exemplar na posse de cada um dos outorgantes.
A Primeira Outorgante:
António Pedro Teixeira Valente
A Segunda Outorgante:
Beatriz Silva Mateus
Página 31 de 38

CONTRATO DE COMODATO
PRIMEIRA: COMPRAIMÓVEIS - Compra e Revenda de Imóveis, S.A, NIPC: 000 000 000, com
sede na Rua Soares dos Reis, n.º 15, 3.º, sala 5.2, freguesia de Mafamude, concelho de Vila Nova de
Gaia, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia sob o número
0000000, representada pelo presidente do conselho de administração António Pedro Teixeira Valente,
adiante designado por Primeira Outorgante;

SEGUNDA: Beatriz Silva Mateus, viúva, natural de Coimbra (Sé), Coimbra, residente na Rua Sousa
Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos, NIF: 000 000 000, BI n.º 000000 de 11/2/2003,
emitido pelo SIC de Lisboa, adiante designada por Segunda Outorgante.

ARTIGO 1.º
Declarou a Primeira Outorgante é dona e legítima proprietária do prédio urbano destinado a habitação,
com tudo o que o compõe, sito na Rua Sousa Miranda, n.º 45, freguesia de Leça da Palmeira, concelho
de Matosinhos, descrito na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos sob o n.º 3535 e inscrito
na matriz predial respetiva sob o n.º 0202.

ARTIGO 2.º
A Comodante empresta à comodatária, até ao dia sete de Setembro de dois mil e dezassete, o prédio
urbano identificado no artigo anterior.

ARTIGO 3.º
A Comodatária obriga-se a restituir à Comodante o prédio urbano emprestado, assim que decorra o
prazo mencionado na cláusula anterior.

ARTIGO 4.º
A Comodatária fica expressamente proibida de permitir a utilização (total ou parcial) emprestar ou por
qualquer outra forma ceder a terceiros o prédio urbano objecto do presente contrato.

ARTIGO 5.º
Fica expressamente estipulado que a Comodatária não pode, em circunstância alguma, estabelecer
quaisquer ónus e/ou encargos sobre o prédio urbano supra identificado, obrigando-se, ainda, avisar
imediatamente a Comodante, por carta registada com aviso de recepção, sempre que tenha
conhecimento que qualquer terceiro se arroga dos direitos sobre o aludido prédio urbano.

ARTIGO 6.º
Dada a natureza temporária deste contrato e a faculdade que a Comodante tem de exigir a restituição
do aludido prédio urbano, fixa-se desde já a cláusula penal de 100,00 € (cem euros), por cada dia de
atraso na referida entrega.

ARTIGO 7.º
A cláusula penal fixada no artigo anterior não obsta que a Comodante exija uma indemnização pelo
dano excedente.
Declaram as Primeira e Segunda outorgantes que aceitam o presente contrato de comodato, nos termos
acima exarados.
Lisboa, 08 de Setembro de 2016

A Primeira Outorgante:
António Pedro Teixeira Valente

A Segunda Outorgante:
Beatriz Silva Mateus
Página 32 de 38

Processo: (…)
Instância Central Cível – Juiz 2

Exmo. Senhor
Juiz de Direito

Os Autores Bernardo Mateus Gonçalves, Afonso Silva Mateus e Catarina Mateus de


Almeida, melhor identificados nos presentes autos, vêm requerer junção aos autos de documento
comprovativo do Registo da presente acção.

Espera Deferimento,

Juntam: 1 documento e duplicados legais.

O Advogado,

Tobago Trinidad
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Conservatória do Registo Predial de Freguesia Leça da Palmeira


Matosinhos 3535/19991206
______________________________________________________________________________________________
DESCRIÇÕES - AVERBAMENTOS - ANOTAÇÕES
URBANO
DENOMINAÇÃO: Bairro de Santa Clara
SITUADO EM: Leça da Palmeira

ÁREA TOTAL: 123 M2


ÁREA COBERTA: 63,95 M2
ÁREA DESCOBERTA: 59,05 M2

VALOR TRIBUTÁVEL: 81.020,00 Euros


MATRIZ nº: 0202
COMPOSIÇÃO E CONFRONTAÇÕES:
- Moradia 418, Classe B, Tipo III, composta de 2 pavimentos e quintal. (
Desanexado do nº 13 756, fls. 51 do B-40 )
O (A) Conservador(a)
Sofia Ribeiro
---------------------------------------------------------------------------
Conservatória do Registo Predial de Matosinhos
OFICIOSO
AP. 4249 de 2009/03/26 2009/04/08 16:15:54 - ANOTAÇÃO
A desanexar uma parcela de terreno com a área de 19 m2, que vai constituir
o prédio n.º 4701/Leça da Palmeira.
O (A) Conservador(a)
Sofia Ribeiro
---------------------------------------------------------------------------
AP. 1 de 2014/01/27 - Aquisição
CAUSA : Dissolução da Comunhão Conjugal e Sucessão Hereditária
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** BEATRIZ SILVA MATEUS
Viúvo (a)
Morada: Rua Sousa Miranda, n.º 45
Localidade: Matosinhos
** DÁLIA SILVA MATEUS
Divorciado (a)
Morada: Largo Santo Estêvão, n.º 46, 3ºDto.
Localidade: Massamá – Sintra
** CARLA SILVA MATEUS
Solteiro(a) , Maior
Morada: Rua Francisco Silva, n.º 3, 4.ºEsq.
Localidade: Aveiro
SUJEITO(S) PASSIVO(S)
** ANTÓNIO DE JESUS MATEUS QUE FOI C.C. BEATRIZ SILVA MATEUS, NA COMUNHÃO DE
ADQUIRIDOS
Morada: Rua Sousa Miranda, n.º 45
Localidade: Matosinhos
SEM DETERMINAÇÃO DE PARTE OU DIREITO.
O Conservador
Alexandre Martins
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AVERB. - AP. 12 de 2014/10/15 - Rectificação
DA APRESENT. 1 de 2014/01/27 - Aquisição
Sujeito activo é, apenas, Beatriz Silva Mateus
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C. R. P. Matosinhos Informação em vigor Página – 1 -
www.predialonline.mj.pt 2016/11/15 11:02:15 UTC www.casapronta.mj.pt
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Conservatória do Registo Predial de Freguesia Leça da Palmeira


Matosinhos 3535/19991206
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INSCRIÇÕES - AVERBAMENTOS - ANOTAÇÕES
O Conservador
Alexandre Martins
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AP. 11 de 2016/09/01 - Aquisição
PROVISÓRIO POR NATUREZA - Artigo 92° n° 1 al. g)
SUJEITO(S) ACTIVO (S):
** COMPRAIMÓVEIS-COMPRA E REVENDA DE IMOVEIS, SA
Morada: Rua Soares dos Reis, n.º 15, 3.º, sala 5.2
Localidade: Mafamude - Vila Nova de Gaia
SUJEITO(S) PASSIVO(S):
** BEATRIZ SILVA MATEUS
Viúvo (a)
Morada: Rua Sousa Miranda, n.º 45
Localidade: Matosinhos
O(A) Ajudante, em substituição
Nuno Gonçalves
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AVERB. - AP. 35 de 2016/09/18 – Conversão em Definitiva
DA APRESENT. 11 de 2016/09/01 - Aquisição
O(A) Ajudante, em substituição
Nuno Gonçalves
---------------------------------------------------------------------------
AP. 2 de 2016/11/11 – Acção
PROVISÓRIO POR NATUREZA - Artigo 92º nº1 al. a)
SUJEITO(S) ACTIVO(S):
** BERNARDO MATEUS GONÇALVES, AFONSO SILVA MATEUS E CATARINA MATEUS DE
ALMEIDA Sede: Rua Sousa Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira, em Matosinhos
SUJEITO(S) PASSIVO{«(S):
** CARLA SILVA MATEUS sede: Rua Francisco Silva, n.º 3, 4.ºEsq., Maia
DÁLIA SILVA MATEUS sede: Largo Santo Estêvão, n.º 46, 3ºDto., Santo Tirso
BEATRIZ SILVA MATEUS sede: Rua Sousa Miranda, n.º 45, Leça da Palmeira,
Matosinhos
COMPRAIMÓVEIS – COMPRA E REVENDA DE IMÓVEIS, S.A. sede: Rua Soares dos
Reis, n.º 15, 3.º, sala 5.2, Mafamude, Vila Nova de Gaia,
PEDIDO: Sentença que reconheça o direito de propriedade da herança por
óbito de António de Jesus Mateus sobre o imóvel, livre de quaisquer ónus ou
encargos, em compropriedade com Beatriz Silva Mateus e sem determinação de
parte ou direito, com a consequente restituição do imóvel à esfera jurídica
dos seus legítimos proprietários, e que declare a nulidade da compra e
venda efectuada entre a quarta e a terceira Ré, registada sob a
Ap.11/20160901, com todas as consequências legais.
O(A) Conservador (a)
Maria Ribeiro
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REGISTOS PENDENTES
Não existem registos pendentes.
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Certifico que sobre o prédio nº 3535 da freguesia de Leça da Palmeira, concelho de Matosinhos, e de
harmonia com o requerido na requisição nº 30145, as presentes fotocópias estão de acordo com o original
e constam de 2 folhas.
Por ser verdade se passou a presente certidão que conferi e assino com a rubrica que uso e autentico com
o selo branco desta Conservatória.
CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DE MATOSINHOS, 15 de novembro de 2016
O Oficial,
Nuno Gaspar

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C. R. P. Matosinhos Informação em vigor Página – 2 -
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Ex.mo Senhor
Juiz de Direito da
Instância Central – 2.ª Secção Cível de
PÓVOA DE VARZIM

Processo: (…)
Instância Central Cível – Juiz 2

COMPRAIMÓVEIS - COMPRA E REVENDA DE IMÓVEIS, S.A., R., nos autos à


margem referenciados, vem apresentar a sua contestação, com os seguintes
FUNDAMENTOS:
1 - Há já alguns anos que o aqui subscritor percorre as lides jurídicas e nunca tinha
presenciado tamanho descaramento;
2 - Com efeito, nunca o aqui subscritor tinha encontrado uma petição inicial em que os AA.
fundassem a sua pretensão num tão descarado e inominado rol de vigarices (perdoe-se-nos o
plebeísmo, mas se os bois têm nome ...);
3 - Vigarices essas, reconhecidas, assumidas, difundidas - parece até que com orgulho – e
invocadas vibrantemente como razões éticas que (pela visão distorcida de quem as propala) não
podem deixar de levar à condenação da R.;
4 - Enfim, tristes sinais dos tempos…

TERMINADO O DESABAFO, AÍ VÃO AS RAZÕES DA RÉ:


5 - São falsos os factos e as asserções jurídicas - ou pelo menos o sentido que de ambos se
pretende retirar - constantes dos arts. 18º, 19º, 20º, 22º, 24º, 25º, 28º, 29º, 30º, 31º, 32º, 33º, 34º, 35º,
36º, 37º e 38º, todos da P.I., pelo que vão os mesmos individual e especificadamente impugnados;
6 - A R. desconhece e não tem obrigação de conhecer os factos constantes dos arts. 1º a 17º,
21º, 22º, 26º, 28º, todos da P.I., pelo que vão os mesmos individual e especificadamente impugnados;
7 - De facto, a R. desconhece - como não é difícil de acreditar - a extraordinária história
familiar vertida na P.I.;
8 - Todavia, quase por diletantismo, não evita alguns comentários acerca do comportamento
dos intervenientes que revelam à saciedade a sua índole e demonstram quão credíveis são as aleivosias
que na P.I. se dirigem à R.;
9 - Com efeito, é espantosa a desonestidade que o comportamento dos ditos intervenientes
revela;
10 - Mas, mais surpreendente, é a ligeireza e a leviandade com que a dita história é contada ao
tribunal;
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11 - Na verdade, o que a este propósito é contado na P.I. evidencia uma prática pensada e
orquestrada entre todos os lá referenciados, com contornos evidentemente criminais, destinada a
enganar algum incauto.
12 - E enganaram, pelo menos, os netos do Sr. António de Jesus Mateus, pois foi claramente
intenção da Sra. D. Beatriz e das suas filhas preterir os Autores relativamente à herança do falecido;
13 - De qualquer forma, apesar do esforço, e, reconheça-se, do talento evidenciado, a
estratégia desenvolvida não pode produzir os frutos pretendidos;
14 - É que o vendedor não pode opor a nulidade decorrente da venda ao comprador de boa fé;
15 - Ora, só por graça, podem os AA. dizer que a R. não foi um comprador de boa fé;
16 - Pois que, para que isso fosse verdade, era necessário que a R. tivesse tido conhecimento
da novela mexicana (de pendor trágico-cómico) que se descreve na P.I.;
17 - Ora, certamente ninguém acredita que uma sociedade cujo objecto é a compra e venda de
imóveis, sediada em Vila Nova de Gaia, e que adquire todos os anos centenas de imóveis estivesse a
par dos dislates familiares ali descritos;
18 - Na verdade, a R. limitou-se - como sempre - a verificar o descrito na certidão comercial
do prédio;
19 - Tendo constatado que a Sra. D. Beatriz Silva Mateus figurava como única proprietária do
prédio em apreço;
20 - Sendo certo que, na altura, nada indiciou aos legais representantes da R. que a vendedora
fosse mentirosa, desonesta ou tivesse qualquer outro defeito de carácter que a P.I. agora evidencia;
21 - Mas, pelo menos na óptica da R., mais grave que a epopeia familiar são as falsidades
vertidas na P.I. e que lhe dizem directamente respeito;
22 - A R. é uma sociedade conceituada e respeitada no mundo imobiliário;
23 - A R. tem por actividade exclusiva a compra e revenda de imóveis;
24 - A R. nunca emprestou nem empresta dinheiro a quem quer que seja;
25 - A R. não conhece, nem nunca ouviu falar em nenhum Manuel Vilão;
26 - Nem a R., nem qualquer colaborador da R. alguma vez pressionou a Sra. D. Beatriz
Mateus a vender o quer que fosse;
27 - Como facilmente se percebe, o que mais há por aí são bons imóveis para comprar;
28 - Mas faltaria que a R., para desenvolver o seu negócio, precisasse de pressionar quem quer
que fosse;
29 - A infâmia não tem limites;
30 - Foi a Sra. D. Beatriz Mateus que solicitou à R. que lhe permitisse readquirir o imóvel,
uma vez que estava ligada sentimentalmente ao mesmo, pelo menos assim - certamente mentindo,
alegou;
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31 - Ora, perante o dito pedido, a R. limitou-se a prever uma margem de rentabilização que
cobrisse a imobilização a que o imóvel iria ser sujeito, e continuar a nele habitar conforme o acordado,
permitindo que a Sra. D. Beatriz Mateus pudesse readquirir o imóvel durante o ano subsequente;
32 - É pois absolutamente falso tudo quanto se diz a esse propósito na P.I.

Termos em que:
Deve a presente acção ser julgada improcedente, por não provada
e, em consequência, absolver-se a R. do pedido.

Valor: o da acção
Junta: duplicados legais, procuração e documento comprovativo do pagamento da taxa devida.

Prova Testemunhal:
1ª- Ana Rita Costa Garcia, solteira, administrativa, com domicílio profissional na Rua Soares dos Reis,
n.º 15, 3.º, sala 5.2, Mafamude, Vila Nova de Gaia;
2ª- Sónia Maria Felicidade dos Santos, casada, jurista, residente na Rua Marechal Saldanha, n.º 147,
Porto.

O Advogado

Adamastor do Bojador
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DESPACHO
*
Dispensa de audiência prévia:
Ao abrigo do disposto no artigo 593.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, e uma vez que a audiência
prévia se destinaria apenas às finalidades previstas nas alíneas d), e) e f) do n.º 1 do artigo
591.º, do mesmo diploma legal, dispensa-se a sua realização.
*
Saneamento:
O tribunal é competente em razão da matéria, da hierarquia e da nacionalidade.
Não existem nulidades que invalidem todo o processo.
As partes têm personalidade e capacidade judiciárias, são legítimas e encontram-se
devidamente patrocinadas por advogado.
Não existem quaisquer outras exceções ou questões prévias de que cumpra decidir e obstem
ao conhecimento do mérito da causa.
*
Objeto do litígio:
Na presente ação pretende-se indagar se deve ser reconhecido o direito de propriedade da
herança por óbito de António de Jesus Mateus sobre o imóvel sito na Rua Sousa Miranda, n.º
45, freguesia de Leça da Palmeira, concelho de Matosinhos, livre de quaisquer ónus ou
encargos, em compropriedade com Beatriz Silva Mateus e sem determinação de parte ou
direito, com a consequente restituição do imóvel à esfera jurídica dos seus legítimos
proprietários.
*
Enunciação dos Temas de Prova:
1) Falsidade das declarações constantes das escrituras de repúdio e intenção das 1ª e 2ª Rés ao
produzir tais declarações;
2) O conhecimento das 1ª e 2ª Rés da qualidade de herdeiros dos Autores;
3) Intenção das 3ª e 4ª Rés ao celebrar a escritura de compra e venda do imóvel sito na Rua
Sousa Miranda, n.º 45, freguesia de Leça da Palmeira, concelho de Matosinhos.
*
Prova:
Admito os róis de testemunhas constantes a fls. (…) e o documento junto a fls. (…), sendo
que as testemunhas serão a apresentar pela parte, caso não tenha sido requerida a sua
notificação tal como exige o artigo 507º, nº 2, do Cód. Proc. Civil.
*
Nos termos do disposto no artigo 155º, nº 1, do Cód. Proc. Civil, as audiências finais serão
sempre gravadas.
*
Designa-se o dia 20 de janeiro de 2017, pelas 9h30, para a realização da audiência final, sem
prejuízo do disposto no artigo 151.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil.
*
Póvoa de Varzim, 19 de dezembro de 2016
O Juiz de Direito
(assinatura)

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