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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EFN
Nº 70054196126 (N° CNJ: 0144239-39.2013.8.21.7000)
2013/CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PRIVADO NÃO


ESPECIFICADO. CERCEAMENTO DE DEFESA.
INOCORRÊNCIA. INEXIGIBILIDADE DE VALOR
COBRADO A TÍTULO DE DETENTION (TARIFA DE
SOBRESTADIA DE CONTÊINERES PARA
EXPORTAÇÃO).
1. Além de não ter ocorrido o cerceamento de
defesa alegado, não se declara nulidade quando o
mérito da ação possa ser decidido a favor da parte
a quem aproveitaria a anulação, tal como no caso.
2. Inexigível da autora os valores cobrados a título
de detention (tarifa de sobrestadia de contêineres
para exportação), pois ela cumpriu com suas
obrigações dentro do prazo de free time (período
de franquia concedido durante o qual referida
tarifa não é cobrada).
Apelação parcialmente provida.

APELAÇÃO CÍVEL DÉCIMA NONA CÂMARA CÍVEL

Nº 70054196126 (N° CNJ: 0144239- COMARCA DE PORTO ALEGRE


39.2013.8.21.7000)

MD MOVEIS LTDA APELANTE

REPRESENTACOES STEIMETZ APELADO


GROSS LTDA

BANCO BRADESCO S/A INTERESSADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Décima Nona
Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar
parcial provimento à apelação.
Custas na forma da lei.

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Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes


Senhores DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES (PRESIDENTE E
REVISOR) E DES. MARCO ANTONIO ANGELO.
Porto Alegre, 27 de agosto de 2013.

DES. EUGÊNIO FACCHINI NETO,


Relator.

RELATÓRIO
DES. EUGÊNIO FACCHINI NETO (RELATOR)

Por economia processual adoto o relatório elaborado às fls.


255/259 do processo n° 001/1.09.0357774-0:
Processos nº 001/1.12.0009001-5 e 001/1.12.009006-
6.
MD Móveis Ltda., devidamente qualificada na inicial
de fls. 02 a 05 dos autos, ajuizou Ação Ordinária de Inexigibilidade
do Valor Reclamado cumulada com Antecipação de Tutela
contra Representação Steimetz Gross Ltda. e Banco Bradesco S/A,
pessoas jurídicas de direito privado, também identificadas nos autos,
pelos motivos a seguir expostos.
Alegou, em síntese, que foi surpreendida com o aviso
do Tabelionato de Protestos de Títulos de Bom Princípio, informando
da existência de duplicata mercantil, de nº bancário 109/00004060-3,
emitida por Representação Steimetz Gross Ltda., e que teria sido
endossada ao Banco Itaú S/A, apontada para protesto. Que nada
devia a Steimetz Gross Ltda. Que não lhe cabia qualquer culpa pelo
atraso do navio que embarcaria a mercadoria. Que não podia ser
compelida a pagar o que não devia. Que a empresa demandada
havia autorizado o retardo, por trinta dias. Postulou, liminarmente, a
sustação do protesto do título referido de R$ 6.649,80 (seis mil,
seiscentos e quarenta e nove reais e oitenta centavos). Requereu a
procedência do feito. Acostou documento (fls. 06-15).
Deferida a liminar de sustação de protesto (fl. 17).
Citados, os réus ofertaram contestação.
A demandada Representação Steimetz Gross Ltda.
referiu que o título tinha como objetivo a cobrança de valor de
detention de contêineres pela autora, utilizados em transporte de

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seus produtos ao exterior. Que atuava no transporte internacional de


mercadorias, agindo como transportador nos diversos modais e por
vezes como NVOCC no transporte marítimo. Que no dia 11.08.09, a
empresa autora com o objetivo de transportar mercadorias de sua
produção solicitou à empresa contestante uma cotação de frete,
tendo como porto de partida Rio Grande (Brasil) e o destino Porto Of
Spain (Trinidad & Tobago). Que informou o preço do frete dos
contêineres de 40'HC no mesmo dia da solicitação. Que no dia
27.09.2009, houve troca de e-mail's entre os funcionários de ambas
as empresas no o intuito de realizar a reserva de praça para
embarque. Mencionou que devido ao princípio da informalidade
contratual vigente no comércio exterior, o simples aceite da cotação
veio com a ordem de carregamento que foi efetivada com a emissão
do contrato de transporte consubstanciado no Bill of Loading nº NH-
2-02407/2009, emitido em 27.09.2009 pela contestante. Que o
carregamento foi efetuado no Navio MSC Kyoto – VG 013 R e a
carga entregue em seu destino sem qualquer avaria, bem como o
frete marítimo foi efetivamente pago. Que o tempo de free-time para
entrega do contêiner era de 07 dias após a chegada do navio no
porto de destino. Entretanto, aduziu que a empresa demandante não
entregou os contêineres no prazo fixado, e com o objetivo de cobrar
a detention de 29 dias de um contêiner e 30 dias do outro, a
empresa ré emitiu o demonstrativo de despesas de nº 007485, em
23.10.2009, enviando cobrança bancária à empresa autora.
Salientou que os tribunais eram uníssonos em entender que a
demurrage ou detention eram devidas e deveriam ser suportadas por
quem deu causa. Invocou a aplicação do princípio da pacta sunt
servanda à espécie. Postulou a improcedência do feito. Juntou
documentos (fls. 40-57).
Em reconvenção, a reconvinte Representação
Steimetz Gross Ltda. relatou que atuava no transporte internacional
de mercadorias agindo como transportador nos diversos modais e
por vezes como NVOCC no transporte marítimo. Referiu que 11 de
agosto de 2009, a demandante com o objetivo de transportar
mercadorias de sua produção solicitou à reconvinte uma cotação de
frete tendo como porto de partida Rio Grande (Brasil) e o destino
Port of Spain (Trinidad & Tobago). Que de acordo com os e-mail's
trocados entre as partes, informou à reconvinda o preço do frete dos
contêineres de 40'HC, no mesmo dia da solicitação. Que em 27 de
setembro de 2009 houve troca de e-mail's entre os funcionários de
ambas as empresas, com o objetivo de realizar a reserva de praça
para o embarque. Que devido ao princípio da informalidade
contratual vigente no comércio exterior, o simples aceite da cotação
veio com a ordem de carregamento que foi efetivada com a emissão
do contrato de transporte consubstanciado no Bill of Loading nº
NHO-2-02407/2009 emitido em 27 de setembro de 2009 pela
reconvinte. Que o carregamento foi efetuado no Navio MSC Kyoto –
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VG 013 R e a carga entregue em seu destino sem qualquer avaria,


bem como o frete marítimo efetivamente pago. Que o tempo de free-
time para entrega do contêiner era de 7 dias após a chegada do
navio no porto de destino. Entretanto, não houve a entrega dos
contêineres no prazo e ficou com o cofre de carga retido pelo prazo
de 36 dias com um e 37 dias com outro, extrapolando o período de
devolução em 29 dias em um e 30 dias no outro. Que com o objetivo
de cobrar a detention de 29 dias de um contêiner e 30 dias do outro,
emitiu o demonstrativo de despesa nº007485, em 23.10.2009 e
enviou via cobrança bancária à parte demandante. Que a autora não
efetuou o pagamento dos valores devidos de detention. Invocou a
aplicação do princípio da Pacta Sunt Servanda à espécie. Requereu
a procedência do feito, com a declaração da existência de débito
relativo à detention, bem como a cobrança dos valores atualizados.
Juntou documentos (fls. 67-86).
Sobreveio réplica (fls. 96-101).
A reconvinda ofertou contestação à reconvenção (fls.
99-101), disse que os documentos aportados ao feito pela reconvinte
não provam o aceite da reconvinda dos valores e prazos passados
de free-time. Que não deu causa a qualquer evento que ocasionasse
a cobrança, já que cumpriu integralmente com suas obrigações
perante a reconvinte. Destacou que não podia a reconvinte querer
impor cobrança pelo risco do seu negócio a seus clientes. Pugnou
pela improcedência da reconvenção.
O demandado contestou o feito (fls. 109-115),
refutando o pleito indenizatório. Suscitou, em preliminar, a nulidade
da citação e a ilegitimidade passiva ad causam, por desconhecer a
relação subjacente ao título. Disse que agiu com mero mandatário
em contrato de cobrança simples de títulos de crédito. Colacionou
doutrina atinente à matéria. Ressaltou que nada mais fez do que
seguir as instruções do mandante, enviando o título não pago para
protesto, já que nenhum valor lhe foi repassado até a data do
apontamento. Requereu o acolhimento das preliminares ou a
improcedência do feito. Acostou documentos (fls. 116-121).
Questionadas as partes quanto às provas que
pretendiam produzir (fl. 174), nada postularam.

Processo nº 001/1.09.0357774-0.
Cuida-de de Ação Ordinária de Inexigibilidade do
Valor Reclamado cumulada com Pedido de Antecipação de
Tutela movida por MD Móveis Ltda. Contra Representação Steimetz
Gross Ltda. e Banco Bradesco S/A, todos qualificados nos autos,
pelos motivos a seguir expostos.
Alegou, em síntese, que nada devia à empresa ré.
Que contratou contêineres e os devolveu no prazo estipulado. Que
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foi surpreendida com o envio a protesto da duplicata mercantil, no


valor de R$ 6.725,52 (seis mil, setecentos e vinte e cinco reais e
cinquenta e dois centavos). Aduziu que não poderia ser compelida a
pagar o que não devia. Postulou, liminarmente, o cancelamento do
título levado a aponte. No mérito, rogou pela procedência da ação.
Juntou documentos (fls. 06-14).
O magistrado que conduzia o feito deferiu a sustação
do protesto (fl. 16).
Citado, o banco réu ofertou contestação (fls. 22-28).
Arguiu, em preliminar, a ilegitimidade passiva ad causam. Destacou
que em nenhum momento a parte autora fundamentou juridicamente
o envolvimento do Banco Bradesco no contexto fático motivador da
presente relação processual. Narrou que o 2º Tabelionato de
Protesto de Porto Alegre sempre utiliza o serviço de cobrança
escritural do Banco Bradesco. Pugnou pela extinção ou pela
improcedência da demanda. Anexou documento (fl. 29).
Na sequência, a ré Representação Steimetz Gross
Ltda. também ofertou defesa nos autos (fls. 31-37), falou que a
autora faltou com a verdade ao alegar que não reconhecia a origem
do título mercantil. Ressaltou que a demandante tinha conhecimento
da orgiem da dívida, mas se negava a pagá-lo. Que agiu como
agente embarcadora, após a fazer a reserva da praça, também
emitindo os conhecimentos internacionais de carga. Que para retirar
o contêiner do armazenador da Companhia de Navegação em Rio
Grande, a demandada assinou em favor da autora um termo de
compromisso de devolução dos contêineres, no prazo máximo de 7
dias (free-time). Que não lhe competia determinar e exigir que a
autora restringisse aos 7 dias, o prazo para fazer o enchimento dos
contêiner. Alegou que a autora faltou com a verdade e agiu com
irresponsabilidade, extrapolando em vários dias o prazo free-time
concedido pela Cia. de Navegação. Que o armador gerou cobrança
da taxa de detenção (aluguel) contra a emitente. Que não importava
ao armador se os contêineres já se encontravam no porto, o que
importava era o tempo de uso dos mesmos em nome da
exportadora-autora. Requereu a improcedência da demanda.
Acostou documentos (fls. 38-69).
Oportunizada a réplica, a demandante manifestou-se
(fls. 72-74).
Determinada a exclusão do banco demandado do pólo
passivo da lide (fl. 75). Da decisão, agravou de forma retida a
empresa demandante (fl. 78-80).
Questionadas as partes quanto às provas que
pretendiam produzir (fl. 94), a demandante requereu a produção de
prova testemunhal (fl. 97).

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Sobreveio sentença de improcedência dos pedidos formulados


pela autora nos autos das ações de inexigibilidade de débito ajuizadas e de
procedência do pedido formulado pela ré na reconvenção apresentada,
constando a parte dispositiva da decisão nos seguintes termos (fls. 268/269
do processo n° 001/1.09.0357774-0):

Isso posto, com fundamento no art. 269, inc. I, do


Código de Processo Civil, resolvo pela improcedência das Ações
de Inexigibilidade de Débito movida por MD Móveis Ltda.
Representação Steimetz Gross Ltda. e Banco Bradesco S/A.
Revogo a liminar outrora concedida.
Outrossim, resolvo pela procedência da
reconvenção, condenando a empresa reconvinda ao pagamento de
R$ 6.649,80 (seis mil, seiscentos e quarenta e nove reais e oitenta
centavos) à reconvinte, devidamente acrescido de correção
monetária e juros de mora a contar do ajuizamento da reconvenção.
Tendo em conta o Princípio da Sucumbência, condeno
a demandante/reconvinda ao pagamento das custas processuais e
honorários advocatícios do procurador da parte adversa, fixados,
observados os critérios do artigo 20, § 3º, do CPC, em R$ 1.000,00
(um mil reais) para cada um deles e em cada uma das ações,
corrigíveis pelo IGP-M (FGV) a contar do trânsito em julgado da
sentença.
Suspendo a exigibilidade de tal pagamento, no
entanto, em razão da demandante estar amparada pela benesse da
assistência judiciária gratuita.

Inconformada, apela a autora/reconvinda.


Nas razões, alega a recorrente, preliminarmente, que houve
cerceamento de defesa, pois o feito foi sentenciado sem que tenha sido
oportunizado a total produção de provas necessárias ao correto deslinde da
demanda. Afirma que, embora no processo n° 001/1.09.0357774-0 tenha
havido decisão sobre a fase de instrução, por conta do reconhecimento da
conexão dos litígios a audiência marcada foi suspensa, sendo ignorada a

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prova testemunhal indicada. Diz nos processos n° 001/1.12.0009001-5 e n°


001/1.12.009006-6 sequer houve oportunização para produção de provas.
Invoca o art. 5°, inciso LV, da Constituição Federal. Cita jurisprudência que
reputa favorável à sua tese. Aponta defeito na publicação de nota de
expediente do processo n° 001/1.12.0009001-5, consistente na falta de
intimação sobre a oportunização de produção de provas. Quanto ao mérito,
a agravante, em apertada síntese, reforça que não pode ser
responsabilizada pelo atraso do navio. Assevera ter cumprido os prazos
estabelecidos, que eram de dez dias para entrega dos contêineres, com
mais vinte dias de free detention para poder rolar a carga sem que houvesse
cobrança extra pelo uso. Menciona que as correspondência eletrônicas
trocadas entre sua funcionária CAROLINE e o JOÃO FRÓES, funcionário da
empresa MSC MEDITERRANEAN, esclarece a dinâmica de contagem dos
prazos. Aduz nada ter a ver com as obrigações acordadas entre a apelada e
a MSC MEDITERRANEAN, posição igualmente deixada clara nas
correspondências eletrônicas trocadas entre as empresas. Considera
indevido o repasse da dívida assumida pela recorrida com a MSC
MEDITERRANEA, levando em conta que foi esta quem descumpriu o
acertado sobre a logística de rolagem dos contêineres. Pugna pelo
provimento do recurso.
Transcorreu in albis o prazo para apresentação de
contrarrazões (fl. 295v.)
É o breve relatório.

VOTOS
DES. EUGÊNIO FACCHINI NETO (RELATOR)

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Colegas: inicialmente estou por rejeitar a preliminar de


cerceamento de defesa.
Primeiro, porque, ao contrário do afirmado pela insurgente, a
testemunha por ela arrolada no processo n° 001/1.09.0357774-0 não foi
“ignorada” pelo Juízo em face do cancelamento da audiência de instrução.
Prova disso que o Sr. DOACIR ANTÔNIO COPAT foi ouvido, conforme se
infere da carta precatória de fls. 118/132, constando inclusive nesta última
folha o CD com a gravação audiovisual da coleta do testemunho. E o
simples fato de o Magistrado não ter valorado referida prova da forma como
a apelante entende que deveria ter sido, não caracteriza cerceamento de
defesa, estando tal descontentamento atrelado à própria solução dada à
causa, ou seja, à irresignação com a conclusão do Juiz quanto ao mérito do
tema litigioso.
Segundo, porque da decisão que ordenou às partes, nos
processos n° 001/1.12.0009001-5 e n° 001/1.12.009006-6, a dizerem sobre
a pretensão de produção de prova, tanto a apelante quando a apelada foram
regularmente intimadas (fls. 174/179), em que pese a nota de expediente
publicada não tenha reproduzido na íntegra o ato judicial. No particular,
importa salientar que, para atendimento da NE n° 1345/2012 (fl. 175) e da
NE 1803/2012 (fl. 179), a recorrente fez uso do serviço de cópia da OAB/RS
(fl. 176), via requisição de acesso aos autos, e a recorrida levou os autos em
carga (fl. 179v.), suprindo, assim, eventual deficiência que se pudesse
cogitar pela referida não reprodução integral do ato judicial nas certidões de
intimação.
Terceiro, porque a apelante nem mesmo indica “as demais
provas” que teria para produzir nos feitos, limitando-se a elaborar
requerimento genérico a esse respeito, sem, contudo, declinar a finalidade

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ou mesmo a pertinência das demais elementares de prova que lhe teriam


sido sonegadas, sequer especificadas, como dito.
Nesse contexto, evidente que cerceamento de defesa não
houve.
Ademais, considerando que em relação ao mérito estou
propondo solução favorável à apelante, igualmente não seria caso de
declarar qualquer nulidade, por força do §2° do art. 249 do CPC.
Ultrapassada a prejudicial, avanço na questão de fundo.
Em suma, a matéria litigiosa passa pela definição da
responsabilidade da autora/reconvinda (exportadora) pelo pagamento de
valores cobrados a título de detention (tarifa de sobrestadia de contêineres
para exportação).
São incontroversas as datas da retirada dos contêineres e de
suas devoluções, bem como da partida das mercadorias do porto.
Na verdade, controvertem as partes, resumidamente – sendo
isso que determina o resultado da contenda -, sobre cumprimento, pela
recorrente, do prazo de free time (período de franquia concedido durante o
qual não há cobrança de detention). A recorrente entende que ele foi
observado, pois, num primeiro momento, dentro do prazo de dez dias,
entregou os contêineres “ovados” no porto e, depois, dentro do prazo de
trinta dias, foi feito o booking (provisionamento) do navio transportador da
carga. A recorrida, por sua vez, entende que ele não foi observado, pois o
término do prazo de trinta dias (de rolagem) só se dá com o embarque da
carga e partida do navio.
É diante dessas interpretações conflitantes e do fato de o navio
para o qual estava programado o transporte das cargas ter atrasado o
embarque e sua partida que nasce a lide.
Com efeito. Conforme já adiantado, razão assiste à insurgente.
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Nas tratativas estabelecidas entre a autora e a ré –


correspondências eletrônicas de fls. 55/69 do processo n°
001/1.09.0357774-0 (reproduzidas às fls. 52/55 dos processos
001/1.12.0009001-5 e n° 001/1.12.009006-6) -, não há nada que esclareça
que o prazo final do free time (cujo término dá margem à cobrança da
detention) se dê da forma como defendida pela apelada.
E a tese da recorrida levantada na contestação (fl. 33 do
processo n° 001/1.09.0357774-0) no sentido de que “não é a primeira vez que
a autora se viu obrigada a pagar e se responsabilizar por esse tipo de despesa ” -
que demonstraria um padrão de comportamento das partes, o qual agora
não poderia ser alterado pela demandante -, é totalmente órfã de prova.
Considero que essa comprovação seria de fácil confecção, bastando para
tanto a demandada ter juntado pretéritos comprovantes de pagamento ou
reembolso de valores, pela irresignada, a esse título.
Afora isso, os próprios termos do contrato firmado entre a ré e
a MSC MEDITERRANEAN (proprietária dos contêineres e armadora dos
navios responsáveis pelo transporte da carga) convergem com a posição
sustentada pela autora. Para compreensão do ora dito reproduzo o trecho do
instrumento contratual com relevância para o desate da problemática (grifos
e sublinhados meus):

F) TARIFA DE SOBRESTADIA DE CONTÊINERES (DETENTION) –


EXPORTAÇÃO
A sobrestadia de contêineres de exportação, doravante
simplesmente denominada “DETENTION”, será aplicada a todos os
contêineres retirados vazios junto aos locais indicados pela
MSC/GVA, MSC/BRA ou seus agentes locais, nos termos desta
Confirmação de Reserva, observadas as regras a seguir expostas.

F.1 – Fica concedido ao embarcador um período de franquia


(free time) durante o qual não haverá incidência de cobrança de
DETENTION, conforme cada tipo de tamanho de contêiner retirado,
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nos termos da tabela de valores e utilização que encontra-se


devidamente registrada no Cartório de Registro de Títulos e
Documentos na cidade de Santos/SP sob o n° 494.048 de 13 de
maio de 2008. os valores e prazos constantes na tabela acima
mencionada são reproduzidos no item F.4 abaixo.
O período de franquia visa conceder ao embarcador um prazo
razoável para que utilize as mercadorias, ou seja, armazene-as
nos contêineres retirados para realização do transporte
marítimo, e, ato contínuo, sejam entregues ao Operador
Portuário designado para posterior embarque.
Importante destacar que as mercadorias deverão estar devidamente
DESEMBARAÇADAS, ou seja, completamente aptas a serem
embarcadas, em conformidade com todas as exigências da Receita
Federal do Brasil e outros órgãos intervenientes.
A cobrança de sobrestadia de contêineres – DETENTION -,
ocorrerá nas seguintes hipóteses:

I. Contêineres entregues ao Operador Portuário após o


período de franquia;
II. Contêineres entregues ao Operador Portuário dentro do
período de franquia, mas sem que as mercadorias estejam
desembaraçadas. Nesta hipótese a contagem dos dias de
DETENTION cessará após o efetivo embarque do contêiner;
III. Havendo desistência do embarque. A contagem dos dias de
DETENTION cessará na data da efetiva devolução dos
contêineres, limpos, incólumes e em condições de imediata
utilização, em local designado pela MSC/GVA, MSC/BRA ou
seus agentes locais;
IV. Contêineres entregues ao Operador Portuário,
devidamente desembaraçadas, mas cujo embarque seja
postergado em razão de solicitação do embarcador.
Neste caso, a contagem dos dias de DETENTION cessará
somente na data de embarque dos contêineres no navio
disponível para a rota contratada;
(...)

Como se vê, havendo entrega dos contêineres ao operador


portuário dentro do prazo de free time, não há falar em cobrança de
detention.
Pois tal foi fielmente respeitado pela demandante.

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Por outro lado, nem mesmo seria caso de cogitar da aplicação


do item IV da cláusula F.1, porquanto a postergação do embarque, embora
ocorrida, se deu igualmente para data dentro do prazo de free time.
O não embarque da carga e sua demora na saída do porto,
consoante já visto até porque incontroverso -, ocorreu apenas em função de
o navio ter atrasado.
Nesse contexto, não vejo sustentáculo legal ou contratual para
impor à recorrente o pagamento de valores para os quais não deu causa à
cobrança. Tenho que aparentemente nem mesmo a apelada deveria tê-los
pago, mas se fez, foi por livre e espontânea vontade, não podendo tal
liberalidade servir de fundamento para o reconhecimento de obrigação que a
autora não tem.
Por fim, de ofício excluo do pólo passivo as instituições
bancárias, por se tratar de protesto decorrente de endosso-mandato, sem
que qualquer extrapolação de poderes que lhes foram conferidos possa ser
diagnosticada ou qualquer ato culposo próprio lhes possa ser imputado.
Sobre o assunto pacífica a jurisprudência do STJ (REsp 1063474/RS, 2ª
Seção, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 28/09/2011, DJe
17/11/2011).

Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação


para:
- julgar procedentes os pedidos formulados nos autos dos
processos n°s 001/1.09.0357774-0 e 001/1.12.0009001-5, a fim de declarar
inexigíveis os títulos de fls. 07 e 08 dos respectivos feitos, cujos protestos
devem ser cancelados;

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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA

EFN
Nº 70054196126 (N° CNJ: 0144239-39.2013.8.21.7000)
2013/CÍVEL

- declarar extintos de ofício os processos n°s


001/1.09.0357774-0 e 001/1.12.0009001-5 em relação ao BANCO
BRADESCO e ao BANCO ITAÚ S/A;
- julgar improcedente os pedidos formulados nos autos do
processo n° 001/1.12.009006-6 (reconvenção).

Em face do desenlace das ações fica a ré/reconvinte


REPRESENTAÇÕES STEIMETZ GROSS LTDA condenada ao pagamento
integral das custas dos processos n°s 001/1.09.0357774-0,
001/1.12.0009001-5 e 001/1.12.009006-6 e dos honorários do patrono da
autora MD MÓVEIS LTDA, os quais arbitro em R$ 10.000,00 (verba que
inclui as três demandas), forte nas balizadoras do art. 20 do CPC (lides de
relativa complexidade, com duração de menos de quatro anos e sem
instrução anormal).
Por outro lado, fica a demandante MD MÓVEIS LTDA
condenada ao pagamento dos honorários dos procuradores do BANCO
BRADESCO e ao BANCO ITAÚ S/A, fixados em R$ 1.000,00 para cada,
frente às mesmas diretrizes do art. 20 do CPC (trabalho se limitou à
apresentação das contestações).
É o voto.

DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES (PRESIDENTE E REVISOR) - De


acordo com o(a) Relator(a).
DES. MARCO ANTONIO ANGELO - De acordo com o(a) Relator(a).

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Nº 70054196126 (N° CNJ: 0144239-39.2013.8.21.7000)
2013/CÍVEL

DES. VOLTAIRE DE LIMA MORAES - Presidente - Apelação Cível nº


70054196126, Comarca de Porto Alegre: "NEGARAM PROVIMENTO.
UNÂNIME."

Julgador(a) de 1º Grau: DEBORA KLEEBANK

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