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Aula 01 – 18.08.2020
INTODUÇÃO
“Ao nos dar a memória, a natureza revelou-nos uma verdade amarga e de outro modo
inimaginável: a verdade sobre a imortalidade e a morte” - George Santayana.
Luiz Paulo Vieira de Carvalho (Direito das Sucessões, São Paulo, Editora Atlas,
2014, p. 18): “Direito das Sucessões é o ramo do Direito Civil, obviamente permeado por
valores e princípios constitucionais, que tem por objetivo principal estudar e regulamentar
a destinação do patrimônio da pessoa física ou natural em decorrência de sua morte,
momento em que se indaga qual o patrimônio transferível e quem são as pessoas que o
recolherão”.
Principais pressupostos:
Ordem de vocação hereditária: é uma relação preferencial, estabelecida pela lei, das
pessoas que são chamadas a suceder ao finado.
A lei faz a escolha dos chamados a herdar, colocando-os na ordem preferencial que
imagina ser a querida pelo falecido.
Flávio Tartuce (Direito Civil: Direito das Sucessões: 9ª edição, Rio de Janeiro,
Forense: 2016, p.4): “a sucessão mortis causa tem esteio na valorização constante da
dignidade da pessoa humana, seja do ponto de vista individual ou coletivo, conforme os
arts. 1º, III, e 3º, I, da Constituição Federal de 1988, tratando o último preceito da
solidariedade social, com marcante incidência nas relações privadas”. O direito à herança
é garantido como um direito fundamental pelo art. 5º, XXX, da Constituição Federal.
SUCESSÃO EM GERAL
• Art. 8º CC.
• O preceito não exige que a morte tenha ocorrido no mesmo lugar, mas sim que
tenha se dado ao mesmo tempo.
• Interessa quando os comorientes são sucessores entre si, apenas, porque entre
comorientes não se dá a transmissão sucessória.
• “Não podendo afirmar com absoluta certeza, em face da prova dos autos, a
premoriência de uma das vítimas de acidente em que veículo é abalroado e vem a
explodir em seguida, deve ser mantida a presunção de comoriência” – TJMG,
Acórdão 1.0137.06.900006-5/001, 5ª Câmara Cível, Carlos Chagas, Rel. Des.
Cláudio Renato dos Santos Costa, j. 09.11.2006, DJMG 1º.12.2006.
Anotações da aula
Introdução
A morte é o primeiro pressuposto do direito das sucessões. Do que cuida esse direito?
Deve-se vir à mente o verbo transmitir e o substantivo transmissão. O direito das
sucessões cuida da transmissão da titularidade de direitos e obrigações que compunham
o acervo de quem falece. O que é acervo? A herança, o acervo, na maior parte das vezes,
patrimonial e, em determinadas situações, extrapatrimonial. Pode-se chamar essa pessoa
que deixa a herança de falecido, morto ou pelo termo técnico jurídico autor da herança.
Apesar de ser comum chamar o autor da herança de de cujus, Giselda não gosta muito do
termo.
Luiz Paulo Vieira de Carvalho (Direito das Sucessões, São Paulo, Editora Atlas,
2014, p. 18): “Direito das Sucessões é o ramo do Direito Civil, obviamente permeado por
valores e princípios constitucionais, que tem por objetivo principal estudar e regulamentar
a destinação do patrimônio da pessoa física ou natural em decorrência de sua morte,
momento em que se indaga qual o patrimônio transferível e quem são as pessoas que o
recolherão”.
Abertura da sucessão
Não pode ser confundida com abertura do inventário. Na linguagem jurídica, a abertura
da sucessão significa exatamente o momento em que a pessoa morreu. Trata-se, então, de
uma ficção jurídica chamada de droit de saisine. É justamente por meio de essa ficção
que posso dizer que a sucessão se abre no exato momento em que o autor da herança
faleceu.
Morte é fato jurídico em sentido estrito – fato social que recebeu importância suficiente
para se transmudar em fato jurídico. Outros exemplos de fato jurídico em sentido estrito:
maioridade decorrente de faixa etária, nascimento, dentre outros. A vontade humana não
tem domínio sobre esses fatos em sentido estrito. A morte faz com que o ser humano,
nesse sentido, deixe de ser pessoa, o que leva à extinção de suas titularidades.
Na medicina, só se fala em morte real, mas, para o direito, realizamos essa distinção.
Comoriência
Significa morrer ao mesmo tempo. Exemplo: duas pessoas que morrem em um acidente
de avião, dado não ser possível saber quem morreu primeiro, o direito reconhece que
ambas morreram simultaneamente.
A ligação disso com o direito das sucessões é que, entre os comorientes, não pode se dar
transmissão sucessória. Exemplo: acidente do avião da TAM em São Paulo. Dentre as
pessoas falecidas, havia pai e filha solteira – eram herdeiros simultaneamente entre si. Se
o pai falecesse antes, a filha herdaria – daí a importância de ser solteira. Porém, se a filha
falecesse antes, os pais seriam os herdeiros. Entre eles, portanto, não se deu o repasse do
patrimônio de um e de outro mortis causa. Isso porque a regra, como dito, é que, entre os
comorientes, não há transmissão em razão da morte.
Esse preceito do art. 8º, porém, não significa que a morte tem de ter ocorrido no mesmo
lugar – não é uma exigência legal. Então, é possível que duas pessoas morram ao mesmo
tempo, não sendo no mesmo lugar. Isso, porém, implica em uma certa dificuldade em se
provar que as pessoas morreram exatamente ao mesmo tempo. No mais das vezes, se dá
a comoriência em decorrência de eventos ocorridos no mesmo lugar, tais como acidentes
em automóveis, aviões, dentre outros. Interessa, porém, apenas quando os comorientes
são sucessores entre si. Isso porque entre esses não se dá a transmissão sucessória.
“Não podendo afirmar com absoluta certeza, em face da prova dos autos, a
premoriência de uma das vítimas de acidente em que veículo é abalroado e
vem a explodir em seguida, deve ser mantida a presunção de comoriência” –
TJMG, Acórdão 1.0137.06.900006-5/001, 5ª Câmara Cível, Carlos Chagas,
Rel. Des. Cláudio Renato dos Santos Costa, j. 09.11.2006, DJMG 1º.12.2006.
A jurisprudência é interessante ainda que seja antiga. Assim, não podendo saber quem
morreu primeiro, presume-se a comoriência.
Principais pressupostos:
Ordem de vocação hereditária: é uma relação preferencial, estabelecida pela lei, das
pessoas que são chamadas a suceder ao finado. A lei faz a escolha dos chamados a herdar,
colocando-os na ordem preferencial que imagina ser a querida pelo falecido – o objetivo
do legislador foi imaginar a ordem desejada pelo falecido.
Sucessão em geral
Herdeiros necessários
Herdeiros que não podem ser afastados pela mera vontade do falecido.
Herdar por cabeça significa direito próprio, era a vez de herdar e a pessoa efetivamente
herdou. Exemplo: pais com sete filhos, se o pai falece, os sete filhos herdam ao seu
patrimônio e dívidas, se existirem. Ou seja, o patrimônio será dividido em sete, sendo que
os herdeiros se encontram no inciso I do art. 1.829. No entanto, se, nesse mesmo exemplo,
o filho mais velho tiver falecido antes de seu pai, quando esse último falecer, o filho pré-
morto deixou dois filhos. Esses, então, podem ocupar o lugar de seu pré-morto pai na
sucessão de seu avô, herdando o que o pai pré-morto teria herdado, ou seja, um sétimo
dividido por dois. Esses filhos que herdam no lugar do pai pré-morto, portanto, herdam
por estirpe, sendo o direito de representação.
Os descendentes chamados a herdar podem ser de graus diversos (1º grau e 2º grau,
por exemplo). Nessa hipótese, como visto, a sucessão se dará por cabeça e por estirpe.
• Por cabeça (ou por direito próprio): aqueles que herdam pela sua própria vez
de chamamento (exemplo: os filhos - 1º grau – chamados a herdar)
• Por estirpe (ou por direito de representação): aqueles que são chamados a
herdar em lugar de descendente do autor da herança que antes deste tenha falecido
(exemplo: os netos, 2º grau, filhos do filho pré-morto). Assim, pelo direito de
representação um herdeiro substitui outro (pré-morto), por força de convocação
realizada pela lei. Essa categoria gera a chamada sucessão por estirpe.
É uma confusão que ocorre em diversas situações. Exemplo: falecido era viúvo, mas vivia
em união estável. Os bens seriam divididos e partilhados em vida. Ou seja, quando um
dos companheiros falece, uma metade se torna herança e a outra meação a ser deixada ao
companheiro que permanece vivo por força do direito de propriedade, e não por
transmissão sucessória em razão da morte. Inclusive, não incidem impostos em relação à
meação. Fora isso, ocorre também a possibilidade de herança, diferente da meação, que
será tratada na disciplina posteriormente.
Meação é o direito de cada sócio da sociedade conjugal, consistente na metade dos bens
que integram o patrimônio comum do casal. Esta metade ideal já pertencia a cada um
deles, mesmo antes do falecimento do autor da herança. A metade que pertencia ao
sobrevivente continua lhe pertencendo (mas não por força do deferimento sucessório).
Herança é o patrimônio deixado pelo falecido. Pode consistir na meação que lhe
pertencia em vida, somada a outros bens (particulares) que não integravam o patrimônio
comum – ou seja, os obtidos antes do casamento ou união estável.
Aula 02 – 25.08.2020
A esta ficção jurídica se dá o nome de droit de saisine, expressão que vem da máxima le
mort saisit le vif, sans ministère de justice, cuja tradução livre poderia ser o morto agarra
ao vivo, sem interferência da justiça. Como se disse, o droit de saisine traduz a própria
essência ou fundamento do direito das sucessões, no sentido de que nem mesmo a morte
do titular pode interromper ou nulificar o direito de propriedade, pois o domínio e a posse
dos bens de alguém imediatamente transmitem-se aos herdeiros, ainda que estes
desconheçam esta sua qualidade ou o fato da morte, eis que tal fato ocorre em razão de
singela ficção jurídica. Vale dizer, a transmissão do acervo hereditário que se dá,
imediatamente, a favor dos herdeiros, legítimos ou instituídos, do falecido, assim se
processa por definição do direito, o qual determina uma situação que pode mesmo ser
diametralmente distinta da ordem natural das coisas, mas que reflete a chance de uma
solução lógica, atendendo às demandas jurídicas e sociais a respeito da ocorrência. E
assim se passa porque, para o direito, apresenta-se uma insuportabilidade diante da ideia
de que bens possam ficar sem um correspondente titular; então, a titularidade –
aparentemente vazia – se transmite de pronto, ipso iure, para os sucessores do morto. Não
há formalidade alguma para que tal fato se dê, bem como não importa o desconhecimento
da transmissibilidade por quem quer que seja; o fato da morte e a transmissão legal do
acervo são coincidentes cronologicamente, por força de presunção legal, isto é, o droit de
saisine.
O princípio da saisine teve sua origem em uma situação peculiar da história francesa,
referente à necessidade de se subtrair a propriedade do vassalo morto das exigências dos
senhores feudais, em uma época em que estes eram “donos” de todas as terras submetidas
à sua autoridade. Parte dessas propriedades, contudo, eram exploradas pelos vassalos e,
quando eles morriam, elas eram “devolvidas” ao senhor feudal. Mediante uma
contribuição que os herdeiros pagassem àquele, poderiam, então, recebê-las de volta. Essa
regra era assim prevista no direito francês: le vassal mort saisit le vif son seigneur. Em
outras palavras: com a morte do vassalo, além de a sua família ficar sem ter sequer onde
morar (pois a propriedade era devolvida ao seigneur), os seus herdeiros ainda deveriam
indenizá-lo, para que pudessem recebê-la de volta.
Diante dessa injustiça, foi criada a ficção jurídica da saisine, que admitia pressupor, então,
que o vassalo, no momento mesmo de sua morte, teria imitido os seus herdeiros na posse
de todos os seus bens.
Nem todas as relações das quais ele participava, em vida, são transmissíveis aos seus
sucessores, por exemplo, seus direitos de personalidade, suas obrigações personalíssimas,
e mesmo os direitos reais extinguíveis com a morte, entre outras hipóteses.
Indivisibilidade da herança
A herança, por expressa disposição legal (CC, art. 80, II), é tida como imóvel,
independente dos bens que a compõe, e ainda como uma universalidade iuris. Além desta
característica, o conjunto de bens e direitos arrecadados também é tido como indivisível,
se existirem dois ou mais herdeiros, até a adição do respectivo quinhão em favor de cada
um, através da partilha, por expressa disposição contida no art. 1.791, caput e parágrafo
único, do Código Civil.
A indivisibilidade da herança faz com que ela permaneça como uma universalidade iuris
impartível, criando entre os herdeiros um regime de condomínio forçado, cada qual sendo
titular de uma parte ideal do todo.
Decorre da indivisibilidade imposta por lei a prerrogativa para cada herdeiro, de reclamar
qualquer dos bens que compõe a herança de quem injustamente os possua, sem que este
possa alegar o caráter parcial do direito do reivindicante (CC, art. 1.791, parágrafo único).
E assim agindo, mesmo sendo titular apenas de parte ideal do acervo, o herdeiro que teve
a iniciativa beneficiará a todos os demais, não lhe sendo exclusivo o resultado.
E, como bem salienta Silvio Rodrigues, “tal solução legal, além de conveniente, se estriba
em boa razão lógica. O herdeiro, dada sua condição de condômino, é titular apenas de
uma parte ideal do espólio, pois seu quinhão só se individuará por ocasião da partilha.
Entretanto, como não é possível deferir-lhe a defesa de um quinhão ainda não
individuado, a lei define como indivisível seu direito e lhe concede a prerrogativa de
reclamar a universalidade da herança”.
Lembra-se apenas que este direito do coerdeiro não exclui, mas convive, com a
legitimidade do próprio espólio, representada pelo inventariante, para propor qualquer
ação na defesa dos interesses do acervo hereditário, inclusive, e, especialmente, de
preservação do acervo patrimonial, em face de quem indevidamente aventure-se a lesá-
lo.
A indivisibilidade da herança refere-se não só ao domínio, como à própria posse dos bens.
Como já visto, é transmitida a posse aos herdeiros, entretanto, a eles, na fase provisória
do processo de inventário, é transferida a posse indireta, reservada ao inventariante a
posse direta. Neste contexto, se algum herdeiro exercer a posse direta exclusiva de um
determinado bem, o inventariante pode reclamá-la em favor da massa, no exercício de
sua administração do espólio, ou ainda, como a qualquer herdeiro preterido, tem sido
admitida ação para cobrança de aluguéis, através de arbitramento judicial, a ser revertido
em favor da massa.
Por fim, como efeito da indivisibilidade verifica-se que a cada coerdeiro só será permitida
cessão de sua quota-parte (fração ideal e abstrata) da herança, impossibilitando a
negociação isolada por um, da integralidade de um bem ou direito.
A sucessão é aberta no local do último domicílio do falecido (art. 1785 CC), ainda que
outro tenha sido o local de sua morte e ainda que outros sejam os locais da situação dos
bens. A regra deriva da necessidade de se fixar o foro competente para o processamento
do inventário e da partilha, mas liga-se ainda ao problema da determinação da jurisdição
internacional competente. É regra, portanto, que se relaciona ao direito processual e ao
direito internacional privado.
A norma que vinha estatuída no Código Civil de 1916 veio repetida no Código atual,
determinando a abertura da sucessão no lugar do último domicílio do finado. Se este,
todavia não possuía domicílio ou possuía mais de um, o problema de sua determinação
para fins de estabelecer o local da abertura da sucessão desloca-se para as regras da Parte
Geral atinentes ao domicílio da pessoa física.
Entendeu o legislador processual que não bastava indicar o local da abertura da sucessão
pelo último domicílio do falecido, porque este poderia apresentar-se de forma incerta,
poderia o falecido não possuir domicílio algum, ou ainda possuir mais de um domicílio,
e por estes motivos, especificou a regra no que concerne ao local da abertura do
inventário, fazendo-o incidir no local da situação dos bens sempre que o domicílio fosse
incerto (art. 96, I, CPC). Mas outro problema seria criado quando os bens que
compusessem a herança se situassem em locais diversos. Entendendo o legislador não ser
possível a multiplicidade de inventários referentes a uma mesma herança, bem imóvel
indivisível por determinação legal, deslocou a competência jurisdicional para o local do
óbito do de cujus (art. 96, II, CPC). Por fim, para a hipótese de pluralidade domiciliar,
permitiu a abertura do inventário em qualquer foro correspondente a um dos domicílios
do finado (art. 94, parágrafo 1º).
Diversos são os problemas relativos à jurisdição competente e à determinação da lei
material aplicável à sucessão quando esta apresenta algum elemento estrangeiro. Essa
temática é referente ao direito internacional privado, ramo do direito que estabelece regras
para a solução dos conflitos de lei no espaço.
Sucessão no espaço – Morto o de cujus, o primeiro passo que se deve seguir é o referente
à determinação do foro competente para o processamento do inventário. Quando,
entretanto, existe na relação sucessória qualquer elemento estrangeiro, a problemática
desloca-se para a determinação da jurisdição competente para conhecer do inventário e
proceder à partilha dos bens. E isso se dá porque esse elemento estrangeiro revela uma
conexão da relação jurídica sucessória com mais de um ordenamento jurídico. Assim, a
nacionalidade do de cujus e dos herdeiros potenciais, o domicílio de um ou dos outros, a
situação de bens no estrangeiro, ou mesmo ter o falecimento ocorrido em outro Estado
são elementos que devem despertar a atenção do profissional do Direito no sentido de
verificar qual o foro e qual a lei competente para dirimir a questão.
Assim, sempre que domiciliado o autor da herança no Brasil no momento de sua morte,
a lei aplicável será, a princípio, a brasileira. Disse-se a princípio por ser factível a hipótese
de o sucessor, determinado pela lei brasileira como tal, uma vez que é a nossa ordem de
vocação hereditária a aplicável, ser domiciliado no exterior. Nessa hipótese, dever-se-á
verificar da aptidão, da legitimidade para suceder, segundo o disposto na lei pessoal do
presumível sucessor, já que se trata de hipótese de capacidade e que, como tal, requer a
aplicação da lei do domicílio do indivíduo para sua determinação (LINDB, art. 7º).
Percebe-se, portanto, que o direito de participar da sucessão será determinado pela lei do
domicílio do de cujus, mas o direito a suceder determinar-se-á segundo a lei pessoal do
sucessível, contra quem pode pesar, segundo a lei vigente no Estado em que é
domiciliado, um qualquer impedimento, uma causa de indignidade ou deserdação, ainda
que não verificada ou desconhecida pela lei brasileira, salvo se ofender nossa ordem
pública, como a hipótese de a lei pessoal determinar o afastamento do filho adotivo da
sucessão.
Anotações da aula
Momento exato da morte de quem chamamos de autor da herança. Trata-se de uma ficção
jurídica (droit de saisine ou princípio de saisine) que convém ao Direito, eis que não há
possibilidade, juridicamente falando, de um bem ficar sem titular, nem que seja por um
único minuto. Não é possível que ocorra um “vazio” na titularidade de qualquer bem que
componha agora, por força da morte, o acervo hereditário a ser distribuído. Assim, a
transmissão se dá por força de lei, ainda que os herdeiros não tenham conhecimento desta
sua situação – ou seja, do falecimento da pessoa.
Essa transmissão, contudo, jamais ocorrerá antes do falecimento do autor da herança, uma
vez que disposição de herança de pessoa viva é vedada no nosso sistema jurídico (art. 426
CC), até porque, enquanto não se operar o evento morte, os potenciais herdeiros possuem
mera expectativa de direito. Por conseguinte, não é possível fazer contratos ou
negociações quanto a heranças de pessoas vivas. O tempo da morte do autor da herança
se denomina abertura da sucessão e não se confunde com o momento posterior em que
ocorrerá a abertura do inventário (procedimento judicial ou extrajudicial, a depender do
preenchimento de certos requisitos).
Indivisibilidade da herança
Por expressa disposição legal é tida como imóvel, independentemente dos bens que a
compõe e com universalidade juris dessa – natureza de ser uma coisa só até que seja
distribuída eventualmente.
Em relação aos cônjuges ou aos companheiros, é possível que esses concorram com
descendentes ou ascendentes na posição de herdeiros. Não vai haver concorrência, porém,
quando o regime de bens não for compatível com essa. São esses: comunhão universal,
separação obrigatória de bens ou se, no regime de separação parcial de bens, o falecido
não tiver deixado bens particulares – os quais não se comunicam com cônjuge ou
companheiro. A grande dificuldade está em entender o que está dito no inciso I do art.
1.829. Quais regimes, então, são compatíveis com a concorrência? Os que sobraram são
a separação convencional de bens e o regime da comunhão parcial, no caso em que o
autor da herança deixou bens particulares sobre os quais incide a concorrência sucessória
do cônjuge ou companheiro. Ademais, por fim, há também como compatível o regime de
participação final dos aquestos.
Parentalidade consanguínea
• 2º grau: irmãos.
• 3º grau: tios e sobrinhos.
• 4º grau: primos, sobrinhos-netos e tios-avós (grau máximo de chamamento à
herança).
Aceitação da herança
O patrimônio e dívidas do falecido, logo que ocorre a morte, vira herança e se destina aos
herdeiros por conta do droit de saisine.
A aceitação tem por efeito a confirmação da transmissão legal (droit de saisine) – art.
1.804 CC – a qual tem efeito meramente declaratório de confirmação da transmissão das
titularidades, que já havia se operado desde a abertura da sucessão. Isso porque a herança
já havia sido transmitida anteriormente em razão do droit de saisine. Aceitação tem por
efeito a confirmação da transmissão legal.
O Código Civil, porém, não exige manifestação expressa da aceitação. Então, reputa-se
existente a aceitação se o herdeiro não manifestar expressamente a renúncia.
• Adir (aceitar).
• Adição (aceitação).
A lei não determina prazo para que ocorra a aceitação. Mas, como isso não pode ficar
indefinidamente em aberto, o juiz estabelecerá prazo razoável, se e quando necessário,
em razão do procedimento de inventário. Vencido o prazo estabelecido pelo juiz, tem-se
como aceita a herança, de modo irrevogável.
Aceitação nula: viola lei expressa. Por exemplo, aceitação feita por curador ou tutor,
quando não expressamente autorizados pelo juiz.
Aceitação anulável: feita diretamente por relativamente incapaz, sem assistência. Pode
ser ratificado por esse mesmo assistente legal que não estava presente na aceitação. Se
for ratificado, portanto, passa a ser válido.
Modalidades de aceitação
• Expressa: utilização rara – se for expressa, deve ser por documento escrito. A
aceitação, assim, não precisa ser expressamente declarada.
• Tácita: decorre de atitudes ou comportamentos (quando não renuncia; quando
realiza atos próprios de herdeiro; quando assume a posse imediata de bens e os
administra; quando paga dívidas do espólio; quando cobra créditos do falecido;
quando toma providências para a abertura do inventário, dentre outros). Todas as
situações são exemplos de atitudes ou comportamento a indicar que houve uma
aceitação tácita.
Renúncia à herança
Declaração unilateral do beneficiado, subjetiva e não sindicável por quem quer que seja,
incluindo o próprio Poder Judiciário. Declaração que incumbe apenas ao herdeiro. Só se
renuncia a direito já nascido (droit de saisine), ou seja, direito de suceder, e incorporado
ao patrimônio do renunciante.
A renúncia, ademais, tem efeito retroativo e deve ser interpretada restritivamente. A
forma é indispensável (expressa por escrito), diferentemente da aceitação, para que se
torne conhecida e indiscutível. Essa forma, inclusive, expressa por escrito deve ser feita
por:
• Herdeiro que renunciou por serem excessivos os gravames impostos pelo testador
(exemplo: muitas condições). Mas, depois, caso decisão judicial considere nulos
tais gravames, o herdeiro que havia renunciado pode propor ação de anulação da
renúncia.
• A renúncia pode ser feita por procurador, mas desde que esse tenha poderes
específicos e bem definidos para tanto.
Mas, o CC inovou (art. 1.805, parágrafo único), atendendo a práticas comuns e costumes
repetidos: “não importa igualmente aceitação a cessão gratuita, pura e simples da herança,
aos demais coerdeiros”. Ou seja, se um herdeiro terminar por encaminhar aos demais sua
quota hereditária não se trata de renúncia, mas sim de cessão. Nesse caso, há impostos a
pagar, o que não ocorreria se se tratasse de simples renúncia. A rigor, não é cessão, nem
renúncia – apenas se cede o que está incorporado ao patrimônio jurídico do cedente.
Art. 1.813. Quando o herdeiro prejudicar os seus credores, renunciando à
herança, poderão eles, com autorização do juiz, aceitá-la em nome do
renunciante.
§ 1º A habilitação dos credores se fará no prazo de trinta dias seguintes ao
conhecimento do fato.
§ 2º Pagas as dívidas do renunciante, prevalece a renúncia quanto ao
remanescente, que será devolvido aos demais herdeiros.
Ou seja, se se tem credores que teriam sido beneficiados caso eu aceitasse uma certa
herança, esses podem a aceitar em nome do renunciante. Assim, se a herança é de 100
reais e a dívida existente é de 70 reais, sobram 30 reais com status de herança renunciada
que retornam ao espólio repartidos entre os demais herdeiros.
Cessão da herança
O herdeiro pode transferir a outrem sua parte na herança, lembrando que isso não pode
ser feito enquanto o autor da herança estiver vivo.
Direito de preferência, ademais, é assegurado aos coerdeiros. Aplicável apenas nos casos
de cessão onerosa, sendo que não há preferência na cessão gratuita – art. 1.794 CC.
Aula 03 – 01.09.2020
Legitimação
Importante saber quem está legitimado a suceder no direito brasileiro. Ou seja, trata-se
daqueles que já estiverem nascidos ou concebidos no momento de abertura da sucessão
(momento da morte). Porém, isso é diferente na sucessão testamentária, na qual estão
legitimados a suceder os filhos ainda não concebidos, desde que os pais estejam vivos.
Ademais, estão também legitimadas pessoas jurídicas e pessoas jurídicas que tenham sua
organização determinada pelo testador sob forma de fundação. Quando o testador, então,
deixa parte ou o seu patrimônio em totalidade, caso não tenha herdeiros necessários,1
pode-se criar uma fundação a partir disso.
1
Os herdeiros necessários são os descendentes, ascendentes, cônjuge e companheiro. Há quem diga, porém,
na doutrina, que o companheiro não foi adequadamente equiparado ao cônjuge na sucessão, não podendo
concorrer com os outros. No sentido de defender que esse não foi elevado a categoria de herdeiro necessário,
sugere-se o voto do Ministro Edson Fachin, que reconhece que, por testamento, pode ser afastado o
companheiro.
Ademais, no caso de herdeiros que sejam filhos ainda não concebidos, nomeia-se um
curador. Esse, a priori, será quem teve o filho que foi nomeado herdeiro pelo testador.
Porém, caso não ocorra essa nomeação, valer-se-á da previsão contida no Código Civil
quanto à curatela, sendo os curadores também nomeados assim para cuidar do patrimônio
a ser recebido por filho ainda não concebido contemplado em testamento.
O Código Civil, inclusive, também prevê a pessoa que não pode ser nomeado
herdeiro ou delegatário, ou seja, aquela pessoa que a rogo escreveu (redigir de próprio
punho) o testamento para o testador, nem o cônjuge ou companheiro dessa mesma pessoa
ou seus ascendentes ou irmãos. Além disso, as testemunhas do testamento também não
podem ser nomeadas herdeiras ou delegatárias ou o concubino2 de testador casado, salvo
se, sem culpa desse mesmo, ele esteja separado de factum de seu cônjuge há mais de cinco
anos.
2
Concubinato são as relações não eventuais entre pessoas impedidas de se casar. Serve basicamente para
amantes, dado que os que são casados podem manter união estável desde que estejam separados de fato, ou
para relações incestuosas.
§ 4 Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido
o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrário do
testador, caberão aos herdeiros legítimos
Continuando, também não podem ser nomeados herdeiros ou delegatários o tabelião, seja
ele civil ou militar, ou o comandante ou escrivão – pessoas perante as quais se faz o
testamento ou se aprova esse. Se forem assim classificados em testamentos, ou seja, todas
as pessoas descritas acima, tem-se que essas cláusulas serão nulas. Não adianta, ademais,
tentar burlar essa regra por meio de fraude ou simulação de contrato oneroso. Por fim,
também não adianta dispor de interposta pessoa, as quais são definidas no Código Civil
como ascendentes, descendentes, irmãos, cônjuges ou companheiros de quem não está
legitimado a suceder.
Entretanto, se for ser deixado patrimônio em prol do filho do testador que também seja
filho de seu concubino, essa deixa testamentária é lícita. Ou seja, não posso beneficiar o
concubino, mas se essa deixa testamentária beneficiar filho do concubino que seja
também filho do testador, passa-se a ser lícita.
Essas questões todas são relevantes na medida em que, nos dias de hoje, estão disponíveis
métodos como a inseminação artificial, o que permite que o embrião leve um tempo para
ser implantado na mulher. Estima-se, inclusive, pela corrente doutrinária majoritária, que
esse mesmo embrião só pode ser considerado quando já está implantado. Isso é uma
alternativa no caso de uma pessoa que, correndo risco de morte, deseje reconhecer sua
vontade de que seu material genético seja posteriormente utilizado pelo cônjuge ou pela
companheira – beneficiando o seu herdeiro caso esse nasça com vida.
Trata-se de pessoas que, ainda que estejam adequadamente legitimadas, estão excluídas
por motivo de indignidade.
O art. 1.815, então, ensina-nos que a exclusão por indignidade será permitida apenas após
sentença transitada em julgado. Há, ademais, um prazo decadencial de quatro anos para
que seja ajuizada ação de reconhecimento de prática de indignidade. Quando estivermos
diante da questão relacionada no inciso I, do art. 1.814, temos previsto também no Código
Civil que o Ministério Público possui legitimidade para ajuizar a ação.
Art. 1.816. São pessoais os efeitos da exclusão; os descendentes do herdeiro
excluído sucedem, como se ele morto fosse antes da abertura da sucessão.
Parágrafo único. O excluído da sucessão não terá direito ao usufruto ou à
administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança, nem à
sucessão eventual desses bens.
A exclusão, ademais, tem efeitos pessoais. O excluído não herda, mas o seu descendente
em representação pode herdar. Talvez por isso tenhamos poucas ações que buscam
reconhecer a exclusão por indignidade, dado que o patrimônio objeto de herança não
retorna. Não havendo descendentes, parte-se para irmãos e, posteriormente, para uma
linha sucessória. O excluído da sucessão não tem direito ao usufruto ou à administração
do patrimônio objeto da herança ou legado. Assim, se estivermos diante de filhos menores
que receberam patrimônio no lugar de seus pais excluídos da herança, esses não podem
ter usufruto ou administração (ainda que essa seja a situação legal mais comum). Da
mesma forma, o que foi excluído da sucessão por indignidade não fará jus à sucessão
desse mesmo patrimônio. Exemplo: assim, um filho em representação do pai, que foi
excluído, recebe a herança. Se esse filho morrer, sem deixar descendente, filhos, cônjuge
ou companheiro, a rigor, essa herança iria toda para seus pais. O que foi excluído por
indignidade, porém, não participa da sucessão desse patrimônio que fez parte daquela
herança da qual foi excluído.
Ademais, pode haver reabilitação do indigno, nos termos do art. 1.818 do CC. A prática
de atos de indignidade é comum, porém, a existência de ações para reconhecimento dessa
não é tão observada.
Aula 04 – 08.09.2020
Sucessão legítima
• Não há testamento;
• O testamento é inválido;
• Testamento não abrange todos os bens do sucedido;
• Testamento extrapola limites da legítima;
• Testamento é caduco.
Sucessão legitima se refere ao conjunto de regras previstas quando não há uma deixa
testamentária. Então, o legislador presumindo as pessoas com as quais o falecido teria
maior vínculo afetivo estabeleceu uma ordem sobre como se dá a sucessão após a morte.
A sucessão legítima também ocorre nos casos em que o testamento foi invalidado, não
abarcou todos os bens ou foi caduco. Prevalece a sucessão legítima na hipótese de não se
ter uma última vontade ou, se por qualquer motivo, essa não puder prevalecer.
Essa é composta por filhos, netos, bisnetos e assim infinitamente. Exemplo: senhor que
tem três filhos, sendo esses parentes de primeiro grau. Os parentes da mesma classe e que
estiverem no mesmo grau herdam em equivalência de condições, ou seja, o mesmo
montante. No caso do senhor, cada um dos filhos herdaria um terço do patrimônio, se esse
vier a falecer. Os filhos herdam por cabeça, isso significa, por direito próprio em herdar.
Porém, imaginemos que, nessa mesma situação, um dos filhos do senhor tem também
seus próprios filhos – sendo os netos parentes de segundo grau. Se todos os filhos do
senhor estiverem vivos no momento de seu falecimento, os netos vão herdar? Não, porque
os parentes mais próximos excluem os mais remotos – ou seja, apenas os filhos do senhor
herdam. Contudo, se um dos filhos do senhor tenha deixado três filhos e falecido antes
de seu próprio pai, ocorre o primeiro caso de sucessão por representação – os três filhos
vão herdar representando o pai pré-morto, assumindo sua posição hereditária em direitos
e deveres. Vai ser como se representassem mesmo seu ascendente, recebendo o que o
filho pré-morto receberia dividido igualmente entre os três. A representação é um
instituto, portanto, que permite que, dentro da mesma classe, parentes de graus diferentes
herdem concomitantemente – caso haja permissão por lei. Concorrem para a sucessão
pessoas de diferentes parentescos. Assim, conforme estabelecido pelo art. 1.833 do CC,
os parentes mais próximos excluem os mais remotos salvo quando há representação.
O que ocorreria, porém, se todos os filhos do senhor fossem pré-mortos restando apenas
os netos? Nesse caso, não falamos de representação, dado que todos têm o mesmo grau e
a mesma classe. Assim, eles deixam de representar o ascendente, recebendo por cabeça e
por direito próprio, sendo a herança dividida entre todos eles.
Até onde vai a representação? No caso do senhor, antes desse falecer, tem um filho
falecido. Como vimos, os três filhos receberiam representando o pai pré-morto, recebendo
um nono da herança cada um. Contudo, e se um dos netos tivesse falecido deixando dois
bisnetos? Esses receberiam por representação do neto que receberia em representação do
pai – ou seja, um dezoito avos para cada um. O direito de representação, em tese, se torna
ilimitado na linha descendente.
Contudo, se houver a avó materna viva e os avós paternos, a avó materna receberá metade
e os avós paternos dividirão igualmente a outra metade, recebendo um quarto cada.
Situação em que um pai tem três filhos, ou seja, há parentesco de primeiro grau entre pai
e filhos e de segundo grau entre os irmãos – não existe parente de primeiro grau na linha
colateral. O pai falece antes dos filhos e, depois, um filho falece também. Caso esse filho
não tenha ascendente, descendente ou cônjuge, quem herda são as irmãs em igualdade de
condições, recebendo metade. Supondo agora que uma das irmãs tenha duas filhas.
Assim, quando o moço faleceu, já havia falecido seu pai e uma de suas irmãs. Nesse caso,
existe representação na linha colateral na única hipótese prevista em lei: filhos de irmãos
(sobrinhos). Nesse caso, uma irmã ficaria com metade da herança e as filhas herdariam
por representação, recebendo um quarto cada uma. No entanto, se, quando da morte do
moço, já tivessem falecido seu pai e suas duas irmãs, sendo que uma deixou duas filhas e
a outra um filho, estamos falando de parentes do mesmo grau (parentes colaterais de
terceiro grau, ou seja, sobrinhos). Por conseguinte, eles herdam por direito próprio, ou
seja, por cabeça, e não por representação.
Em outra situação, baseada nesses mesmos fatos, se tiver sobrado apenas uma irmã e uma
sobrinha-neta (filha da sobrinha), a irmã termina por herdar tudo. Isso porque, na linha
colateral, a única representação que existe é em relação a filhos de irmãos, não tendo a
sobrinha-neta direito de representação. A parente de grau mais próximo, assim, exclui a
de grau mais remoto.
Vamos supor, porém, que, quando morreu, apenas as sobrinhas estavam vivas (parentes
colaterais de terceiro grau). Além delas, os tios também são parentes colaterais de terceiro
grau, sendo os primos parentes colaterais de quarto grau. Pela regra, todos são parentes
de mesmo grau e teriam que herdar em igualdade de condições. Porém, nesse caso
específico existe uma regra diferente que afirma que os sobrinhos preterem aos tios.
Assim, se houver tios e sobrinhos, mesmo sendo parentes colaterais de mesmo grau,
herdam apenas os sobrinhos – herdando por cabeça porque todos os irmãos faleceram.
Desta vez, imaginaremos outra situação. Um mesmo senhor foi casado duas vezes, tendo
três filhos com a primeira esposa e dois filhos com a segunda. São irmãos unilaterais, ou
seja, filhos do mesmo pai e de mãe diferentes, todos entre si, e bilaterais quando forem
filhos dos mesmos pai e mãe. Caso todos os pais estejam mortos e sobrarem apenas os
filhos, se um desses morrer, os irmãos bilaterais herdam o dobro dos irmãos unilaterais –
como afirmado acima no art. 1.843.
Caso todos tenham morrido, menos duas sobrinhas, uma de irmão bilateral e outra de irmã
unilateral, nesse caso, a lei diz que se aplica a mesma regra – a sobrinha de irmão bilateral
herda o dobro da sobrinha de irmã unilateral.
Quando o cônjuge é herdeiro? Art. 1.830, CC: Somente é reconhecido direito sucessório
ao cônjuge sobrevivente se, ao tempo da morte do outro, não estavam separados
judicialmente, nem separados de fato há mais de dois anos, salvo prova, neste caso, de
que essa convivência se tornara impossível sem culpa do sobrevivente.
Há, no entanto, hipótese em que o cônjuge continua como herdeiro quando a separação
de fato ocorreu há mais de dois anos e o sobrevivente não teve culpa. Porém, discute-se
esse dispositivo na medida em que esse é relativamente absurdo e em que haveria muita
dificuldade em discutir culpa mortuária – além do fato de que o morto não está lá para se
defender (prova diabólica). Por isso, tem sido comum o afastamento dessa disposição.
Agora, imaginemos uma família que tem três filhos. O Código Civil condicionou as regras
de sucessão e de concorrência ao regime de bens do casamento vigente ao tempo do óbito.
Assim, se houver, por exemplo, cônjuge e descendentes, dá-se a concorrência sucessória.
No caso dos ascendentes, também existe concorrência sucessória, mas sem que a regra se
condicione a regime de bens. Assim, vamos falar primeiro da concorrência sucessória
entre o cônjuge e os descentes. Vamos supor que o pai faleceu, sendo casado em regime
de comunhão universal de bens, em que todos os bens são de ambos os cônjuges. Isso
quer dizer que, como o cônjuge sobrevivente já ficaria com metade de todo o patrimônio,
o legislador entendeu que não faria muito sentido que esse continuasse como herdeiro
concorrente. Nesse caso, então, de regime de comunhão universal de bens, o cônjuge não
é herdeiro, mas sim meeiro. Os herdeiros, portanto, seriam apenas os filhos.
No regime de comunhão parcial de bens, há duas hipóteses: (i) se não há bens particulares,
o cônjuge sobrevivente também fica com metade de tudo pela meação, não tendo sentido
ser herdeiro pelos mesmos motivos; e (ii) há bens particulares, assim, há concorrência
sucessória em relação a esses, excluindo-se os bens comuns da concorrência. Nesse caso,
o cônjuge ficaria com um quarto dessa parte da herança dividida com os três filhos.
No regime, por fim, de participação final nos aquestos, há posições divergentes. Giselda
acredita ser semelhante à separação parcial de bens, mas Simão entende não haver bens
comuns e, portanto, sempre se dar a concorrência.
Art. 1.831. Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será
assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito
real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família,
desde que seja o único daquela natureza a inventariar.
Porém, esse direito é contestado hoje em dia em decorrência de uma realidade familiar
mais complexa. Um exemplo seria pessoas extremamente jovens que casam e se separam
muito rapidamente ou uma pessoa muito jovem casada com um cônjuge bem mais velho.
Surgiu, por fim, uma grande divergência a respeito da aplicação do dispositivo legal. Isso
porque ele disse que há direito de habitação sobre o bem de residência desde que esse seja
o único dessa natureza inventariado. O que seria essa natureza? Poderia ser tido como o
imóvel ou o imóvel de residência do casal. Hoje, o entendimento que prevalece é se tratar
do único imóvel de residência do casal. Assim, pouco importa se há dez imóveis a serem
inventariados, se o casal só tinha domicílio em um imóvel, haverá direito de habitação
quanto a esse.