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1. Introdução
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2. As normas internacionais
As normas internacionais - regras de conduta nas relações in-
ternacionais - surgem sôbre três formas: a cortesia, a moral e a
norma jurídica internacionais.
A cortesia internacional (comitas gentium) são aquêles
usos surgidos na sociedade internacional por simples conveniência,
como é o caso do cerimonial marítimo. Esta norma, se violada, não
configura um ato ilícito internacional. Tal fato significa que a vio-
lação é considerada um ato inamistoso, que possui sanções próprias
(ex.: opinião pública), que são diferentes das sanções aplicáveis
na violação de normas jurídicas (ex.: indenização). :E:stes usos so-
ciais muitas vêzes são simples etapas na evolução ou "degenera-
ção" de uma norma jurídica internacional; ou são usos em vias de
se transformarem em costume (norma jurídica internacional) ou
são costumes que se transformaram em simples usos.
É preciso salientar que a cortesia internacional tem obrigato-
riedade e sanção como vimos anteriormente e que neste ponto ela
não se distingue do direito, como bem demonstra Gustav Adolf
Walz:
"Não é exato que os usos sociais ou normas de cortesia. .. somen-
te dirigem a seus destinatários um convite; também elas aspiram,
na sua esfera, a uma validade incondicional,... e igualmente as
normas jurídicas ameaçam o descumprimento com uma sanção".:!
O que distingue a cortesia internacional do DIP é o aspecto
formal da norma violada. Por outro lado, nem sempre a distinção
é possível tendo em vista a sanção em caso de violação, porque em
certos casos a sanção é semelhante. Por exemplo, no DIP existe a
retorsão que é uma lei do talião quando não há violação da norma
jurídica internacional na sua aplicação. Ora, existe também nos
usos internacionais a reciprocidade.
Na verdade, a diferença entre norma jurídica internacional e
cortesia internacional é meramente formal. O direito surge por
modos predeterminados. Tem suas fontes próprias e determinadas.
Em outras palavras, só são DIP as normas que surgirem por cer-
tos modos de produção jurídica, preestabelecidos. As normas de
cortesia internacional nascem da convivência social sem que haja
qualquer modo de produção predeterminado.
É de se repetir a frase do internacionalista alemão Gustav
Adolf Walz:
"o direito aparece como a conditio sine qua non da comunidade,
como a constituição da comunidade, graças a qual esta existe; os
2 Ver DeTecho internacional. 1943. p. 356.
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USOS SOCIaiS aparecem como um complexo de normas que susten-
tam e complementam o direito e, com sua fôrça predominante in-
consciente e instintiva, facilitam sua realização".
A existência de norma de moral internacional nem sempre foi
admitida no campo das relações internacionais. Ora declarando-se
que o estado não possuía uma natureza moral (concepção antimo-
ralista de Nietzche), ora afirmando-se que êle encontrava-se à
margem da moral (concepção amoralista de Maquiavel). Entre-
tanto, a maior parte da doutrina afirma, nos dias de hoje, a exis-
tência da moral internacional. É como bem assinala Mariano
Aguilar Navarro:
"O homem não se pode limitar a registrar a existência de uma
norma jurídica como se se tratasse de um puro fato, ou de um
ato ao qual se lhe imputa - por um órgão competente - uma de-
terminada sanção; o homem ajuíza o direito no seu conteúdo e o
faz de acôrdo a uns juízos de valor moral. Todo direito positivo
reduz-se a nada sem alguns fortes apoios morais".3
Um dos maiores estudiosos da moral internacional Herbert
Kraus define-a como sendo "o conjunto de normas morais que
se aplicam nas relações dos diferentes estados ou de outros sujeitos
assimilados aos estados entre êles, assim como as relações mútuas
dos sujeitos independentes, estrangeiros por suas respectivas nacio-
nalidades, e as relações entre o Estado com os estrangeiros". 4
As normas da moral internacional são sempre dirigidas ao
homem, seja como membro de uma coletividade estatal, seja como
"gestor" desta coletividade e atuando na vida internacional.
Nicolas Politis (La morale internationale. 1944) considerou
como principais regras da moral internacional: a lealdade, a mo-
deração, o auxílio e o respeito mútuos, o espírito de justiça e a so-
lidariedade.
A moral internacional influencia a criação e a elaboração do
DIP e da cortesia internacional. No caso de sua violação, à seme-
lhança da cortesia internacional, ela não acarreta a responsabili-
dade internacional (procedimento jurídico) do autor da violação.
A violação de uma norma moral pode trazer sanções porque, de
certo modo, os estados já as consideram incorporadas à cortesia in-
ternacional, ou influenciando o DIP, por exemplo, a não-prestação
de auxílio conduz a procedimento idêntico. Tudo isto dentro do
princípio da reciprocidade que domina a vida internacional e que
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pertence, a nosso ver, mais ao campo da política do que do direito
(é óbvio que excluímos aquêles casos em que êle está consagrado
juridicamente, por exemplo, em um tratado).
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Piero Ziccardi aponta as seguintes particularidades para a or-
dem jurídica internacional: a) "a ausência de tôda estrutura au-
toritária ou hierárquica" em nome da "igualdade dos estados";
b) a liberdade ampla de que gozam os estados. 7
Mariano Aguilar Navarro 8 em observações semelhantes for-
nece estas características da comunidade internacional em relação
à ordem jurídica internacional: a) a comunidade internacional é
ampla e com poucos membros, "todos êles poderosos". "A comu-
nidade internacional, uma comunidade de comunidades, provoca
fatalmente um distanciamento dos problemas concretos" e, com
êle, uma marcante nota de abstração; b) o aspecto "individualista
que preside a atividade da comunidade internacional"; c) a co-
munidade internacional não interfere na criação de seus membros.
Ela "limita-se a registrar uns fatos consumados". "Esta será a tô-
Illca do direito internacional clássico: deixar-se guiar e presidir
pelo princípio da efetividade".
Como verdadeiras conseqüências das apontadas antes pode-
mos apresentar as características da norma jurídica internacional
que são dadas por Mariano Aguilar Navarro: 9 a) "são muito pou-
cas em número"; b) "são extremamente abstratas, quase que se re-
duzem a mero invólucro, aparato técnico a que falta tôda referên-
cia de conteúdo". Em conseqüência, estão "distanciadas dos proble-
mas reais" e "exercem muito pouca influência na constituição das
situações políticas"; c) são "atributivas", sua "missão consiste em
outorgar uma competência sem assinalar a materialidade da ação
a cumprir".
No tocante à ordem jurídica internacional, uma grande dis-
cussão tem ocorrido no campo doutrinário, isto é, a questão de se
saber se tôdas as normas que a compõem são dispositivos ou se
ela comporta também normas imperativas.
Os autores voluntaristas, como Dionisio Anzilotti, 10 afirmam
ser o DIP o produto de um acôrdo de vontade dos estados e negam
a existência de normas imperativas:
"a primeira observação que se oferece é que os estados são ao mes-
mo tempo criadores de normas e sujeitos das obrigações impostas
por ditas normas: os estados que fixarem uma determinada nor-
j Ver Les caracteres de l'ordre juridique international. In: Recuei! des cours
de l'Académie de Droit International de la Haye. 1958. v. 3, t. 95, p. 374 e
sego
8 Cf. Derecho internacional público. 1952. V. 1, t. 1, p. 244-5.
9 Derecho internacional público. cito p. 245-6.
10 Corso di diritto internazionale. 1955. V. 1, p. 90 e sego
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ma podem sempre concordar em não observá-la ou em substituí-la
por outra. Neste sentido poder-se-ia dizer que tôdas as normas
internacionais são dispositivas".
Na verdade, não há no campo internacional razão para se dis-
cutir a existência ou não de norma imperativa. Esta consideração
prende-se ao fato de que tôda e qualquer norma jurídica impera-
tiva ou dispositiva é revogável. A única diferença que existe entre
os dois tipos de norma é que as imperativas só podem ser revoga-
das pelo mesmo processo que as criou, ou previsto quando elabo-
radas, ou seja, por um procedimento especial, enquanto as normas
dispositivas podem ser revogadas pelos particulares. Um caso de
norma imperativa na ordem jurídica internacional é a Carta da
ONU. Entretanto, ela mesma prevê um processo para a sua revi-
são. A distinção entre norma imperativa e dispositiva não tem, no
fundo, maior valor: tôdas elas são revogáveis. Dentro da diferença
clássica dos dois tipos de normas podemos salientar que ambas
existem dentro da ordem jurídica internacional. Por outro lado,
podemos lembrar que certas normas são na prática irrevogáveis
devido ao fato de elas serem universais; por exemplo, a liberdade
dos mares ou a inviolabilidade dos mares. A revogação aqui é me-
ramente hipotética, porque é quase impossível que todos os esta-
dos (sem exceção) reúnam-se para fazerem convenção revogando
tais normas. Entretanto, nada impede juridicamente que assim
procedam.
A grande questão, a nosso ver, dentro da ordem jurídica in-
ternacional consiste em saber se ela tem normas cogentes, isto é,
irrevogáveis. Fazemos aqui uma distinção entre normas de jus
cogens e normas imperativas. As de jus cogens são poucas no
DIP, tendo em vista a própria estrutura da sociedade internacio-
nal, ou melhor, os estados elaborando as normas e tentando man-
ter a possibilidade de revogá-las quando assim lhes fôr interessan-
te. A "liberdade contratual" do estado é restringida pelo jus co-
gens, bem como "poderia ser considerado um ataque à soberania
dos estados". 11 As normas de jus cogens seriam muito poucas e
universais devido a sua importância. A sua derrogação por um
tratado acarretaria a nulidade do próprio tratado. Por exemplo,
derrogar a norma pacta sunt servanda é impossível, porque seria
o caso de se fazer a derrogação por um tratado dizendo que as
obrigações livremente assumidas não são obrigatórias, entretanto,
estar-se-ia assumindo uma nova obrigação que para ser respeitada
faria apêlo à norma pacta sunt servanda.
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Em conclusão, sustentamos no DIP, como em todo e qual-
quer sistema jurídico, a existência de normas de jus cogens, sob
pena de a sociedade internacional cair em verdadeiro estado anár-
quico. É preciso salientar que mesmo se admitindo o jus cogens
como norma imperativa, nem tôda norma imperativa é de jus co-
gens. A fim de se evitar maiores confusões é que preferimos estu-
dar o jus cogens em separado das normas imperativas. Não pode-
mos deixar de reconhecer que estas surgem cogentes para os es-
tados, por exemplo, a Carta da ONU, uma vez que êles podem
revogá-las. Contudo, na sua essência não são de jus cogens, vez
que são passíveis de revogação por um procedimento especial.
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jurídica internacional. Neste sentido têm-se manifestado vários
autores:
"Teoricamente, as regras só podem ser estabelecidas ou emenda-
das por acôrdo formal ou por consentimento tácito baseado nas
práticas passadas. Quando as regras não tenham sido formalizadas
por tratados, são criadas pelo processo mais fluído de exigências
e concessões, ou seja, pela ação unilateral justificada ou justificá-
vel pelo Estado, pela referência aos interêsses da comunidade in-
ternacional, pela concessão a outros estados do direito de agir e
obrigação de abster-se de agir da mesma maneira em outras cir-
cunstâncias" .
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Até a escola de New Haven (McDougal, Lassueell, etc.) que
reduz o DIP a uma policy,15 o que faz B. Rosenthal 16 salientar
que a "identificação entre direito e policy, ou se se quer entre as
noções de regra do jôgo e de estratégia dos jogadores, constitui
uma das funções mais importantes do direito, a saber, a função
que consiste em manter a ordem".
Não adotamos a concepção da escola de New Haven, contudo
não podemos deixar de reconhecer que a política tem um papel
relevante no campo internacional, fazendo com que muitas vêzes,
não consigamos distinguir o direito da política.
Na verdade, a norma internacional é elaborada por uma série
de atos unilaterais seja para dar origem a um tratado ou a um
costume. Se a sociedade internacional fôsse materialmente demo-
crática, no processo de formação das normas internacionais pre-
dominariam os atos unilaterais do maior número de estados inte-
ressados.
O maior número prevalece no tocante à elaboração das nor-
mas convencionais, que ainda são minoritárias dentro do sistema
jurídico internacional. Por outro lado, estas normas apenas codi-
ficam os princípios gerais de cada matéria. Enfim, um largo cam-
po, o mais amplo, é deixado para o D. costumeiro com tôda a sua
incerteza. Ora, predominam as interpretações que podem ser tor-
nadas efetivas, isto é, das grandes potências que podem impô-las.
É verdade que, em certos casos, pequenos estados podem tornar
efetivos os seus atos unilaterais, o que tem ocorrido em inúmeros
casos de nacionalização de emprêsas. Entretanto, são exceção no
plano internacional.
É preciso lembrar que no campo internacional a igualdade é
meramente formal e que mesmo naqueles casos em que os esta-
dos negociam em pé de igualdade um tratado, na realidade, esta
não existe por dois motivos: a) a política de blocos - nas ques-
tões mais importantes os estados acompanham o voto da potência-
líder do seu bloco; b) a assistência externa - a maior parte dos
estados sobrevive graças aos auxílios dados pela grande potência
econômica do seu bloco. São poucas as vêzes em que os estados
em vias de desenvolvimento rompem com esta liderança e afir-
mam os seus interêsses. Para que tal fato ocorra, com sucesso, é
necessário uma rigorosa interpretação do momento político inter-
15 " ... la policy science consiste dans une action conduite avec les moyens
de la science et visant à la réalisation d' un certain état de choses souhaité."
In: Rosenthal, Bent. Étude de l'oeuvre de Myres Smith McDougal en ma-
tiere de droit international publico 1970. p. 37.
16 Rosenthal, B. op. cito p. 131.
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nacional, por exemplo, que seja mais conveniente a grande po-
tência de suportar a insubordinação do seu liderado do que per-
dê-lo. Entretanto, mesmo que isto se dê, a grande potência tudo
fará para que não se transforme em precedente para a formação
de uma norma jurídica internacional e figure apenas como uma
manifestação tolerada, mas não legal.
Finalmente, é de se recordar a frase de Louis Henkin que
talvez explique o inexplicável no campo internacional:
"Sometimes foreign policy is not made; it happens, and can only
later be sorted out of the confusion of many actions and inac-
tions" .1i
Assim sendo, a revisão do DIP é extremamente difícil e lenta
e só vem sendo conseguida parcialmente graças à atuação do de-
nominado terceiro mundo dentro de organizações internacionais
em que êle atua como um verdadeiro grupo de pressão.
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Richard Falk 20 observa com razão acêrca das violações dQ
DIP:
"International law is a weak legal system not because it is often
or easily flouted by powerful states, but beca use, certain vio-
lations, however infrequent, are highly destructive and far-reaching
in their implications".
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c) quando o autor da violação pode colocar a sociedade interna-
cional diante de um "fato consumado" que não seja suficiente-
mente relevante para conduzir a uma guerra, porque as sanções
de natureza moral não o atingirão de modo efetivo;
d) as próprias instituições políticas internas levam o estado a
cometer a violação.
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6. Conclusão
REEMBõLSO POSTAL
OBSERVAÇÃO IMPORTANTE:
SERVIÇO DE PUBLICAÇÕES
PRAIA DE BOTAFOGO, 188 CAIXA POSTAL, 21.120, ZC-05,
RIO DE JANEIRO - GB.
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