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9 de Março de 2020

Posso penhorar a aposentadoria ou salário do devedor? -


parceria Pâmela Francine Ribeiro

Saiba como funciona essa modalidade de penhora

Por Pâmela Francine Ribeiro e Alice Aquino - Não em sua


integralidade. Em regra, o artigo 833 do CPC dispõe que são
impenhoráveis os salários, pensões e proventos de aposentadoria
destinadas ao sustento do devedor e de sua família. Mas há exceções e é
admitido que determinado percentual seja penhorado.

Assim, não adianta o devedor ter em mente que tudo o que está em sua
conta bancária é impenhorável. Com o passar dos anos a
jurisprudência se atualizou e criou novos entendimentos sobre o
assunto.

Também é importante ressaltar que qualquer processo que se pretenda


o recebimento de valores em dinheiro, a fase executória pode trazer
algumas “dores de cabeça” ao credor.

/
É que em alguns casos (se não for a maioria deles) o devedor se recusa
a cumprir voluntariamente a obrigação, forçando o credor a tomar
medidas coercitivas para pagamento do débito. É aquela famosa
história do “enrolão” que só promete e não cumpre...

Certa vez, (Eu Pâmela rsrs) atuando para uma empresa de consórcios
de veículos, cujo devedor residia em Rondônia, não foi possível
localizar valores ou outros bens para serem penhorados. O que
achamos? Gado! Exatamente, vaquinhas leiteiras! E isso é o que foi
penhorado. Sim, uma região pecuária, facilmente se acha nos órgãos
específicos gado registrado em nome do devedor.

Vê-se, portanto, que existem várias medidas que podem ser realizadas
para satisfação do débito e uma delas é a penhora de percentual do
salário, pensão ou aposentadoria, desde que se atentem a alguns
requisitos (forma mais fácil do que um leilão de gado. Isso é fato!)

O senso comum diz que apenas 30% da rentabilidade do devedor


poderia ser penhorado. Interpretação esta que se tem em razão do
limite para empréstimos consignados e, verdadeiramente, há inúmeras
decisões jurisprudenciais neste sentido.

O Art. 833 diz que são impenhoráveis:

(...)

IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as


remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os
pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por
liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de
sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de
profissional liberal, ressalvado o § 2º.

Entretanto, tal disposição possui exceções, como veremos a seguir:

1) Penhora para pagamento de prestação alimentícia


/
Nesse caso, estamos falando de caráter alimentar, independentemente
de sua origem, por exemplo, crédito trabalhista e pensão alimentícia.

O crédito trabalhista possui caráter alimentar e superprivilegiado,


estando à frente de créditos tributários, conforme previsão nos artigos
186 do CTN e possuindo preferência nos casos de falência,
concordata/recuperação judicial ou dissolução da empresa, nos termos
do art. 449 da CLT.

Com isso, podemos concluir que em caso de execução de valores, o


credor trabalhista está muito a frente de outros credores.

Essa interpretação é a que melhor se adequa ao Texto Constitucional, a


teor do que preceitua o artigo 100, § 1º da Constituição, além de
privilegiar o direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva (CRFB,
art. 5º, XXXV).

Em recente decisão do TRT2 deferiu-se não só a penhora dos proventos


de aposentadoria, mas também de percentual sobre o salário dos
sócios/reclamados que mantinham vínculo empregatício. Somando-se
ambos e ultrapassando 40% do teto previdenciário, estaria deferido a
penhora de 20% de cada (TRT-2 02222001719945020076 SP, Relator:
PATRICIA THEREZINHA DE TOLEDO, 3ª Turma - Cadeira 4, Data de
Publicação: 29/01/2020)

No caso de devedor de pensão alimentícia, além da possibilidade do


desconto diretamente em folha de pagamento, também poderá incidir
penhora sobre o percentual do salário/soldo/pensão/aposentadoria:

/
“1. O caráter absoluto da impenhorabilidade dos vencimentos,
soldos e salários é excepcionado pelo § 2º do art. 649 do CPC
quando se tratar de penhora para pagamento de prestações
alimentícias. 2. A natureza do crédito alimentar, que constitui
verba destinada à satisfação das necessidades de quem não pode
com elas arcar pode ser descontada em salário cumulada à pensão.
3. Recurso conhecido e parcialmente provido para determinar a
penhora dos alimentos em atraso na monta de 10% (dez por cento)
sobre o soldo do agravante e manter os alimentos fixados em 15%
(quinze por cento) sobre o valor da remuneração tirando os
descontos obrigatórios.” (TJ-PA - AI: 00089088220038140301
BELÉM, Relator: DIRACY NUNES ALVES, Data de Julgamento:
19/05/2016, 5ª CÂMARA CIVEL ISOLADA, Data de Publicação:
01/06/2016).

2) Penhora de valor excedente a 50 salário mínimos mensais

Uma leitura rápida do artigo pode trazer uma interpretação equivocada


da redação do artigo. Afinal, quando se fala em aposentadoria, logo se
pensa em INSS e em teto previdenciário (pouco mais de R$ 5.000,00).
Então, nunca teríamos uma aposentadoria de R$ 52.250,00 (50
salários mínimos em 2020).

Entretanto, o artigo não diz apenas aposentadoria. Este diz


vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as
remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões,
os pecúlios e os montepios.

Só para exemplificar:

Se você entrar no Portal Transparência do Governo de São Paulo


(http://www.transparencia.sp.gov.br/ ) verá que existe uma forma de
pesquisar servidores aposentados e respectivos vencimentos.
(Acreditem.... Facilmente chegam aos R$ 50.000,00 e ultrapassam os
R$ 100.000,00 líquidos mensais). Este pode ser um devedor em
potencial e este um meio de saber seus rendimentos.
/
3) Penhora de crédito comum

Discute-se na jurisprudência a possibilidade de penhora de outros


créditos que não sejam alimentares.

Na prática, o pedido ao juiz deve ser realizado. Aguardando-se a


impugnação do devedor para que este apresente a documentação que
comprove seus gastos.

Eu sei...ninguém quer ficar “ao deus dará” nas mãos do juiz, mas a lei
ainda não tem uma previsão expressa nesse caso. Assim, fica a cargo do
juiz analisar a situação.

Além disso, observando-se que o rendimento do devedor pode fazer


frente ao pagamento de suas despesas básicas e ainda suportar
pagamento, ainda que parcial, de sua dívida para com o credor, deve-se
buscar o prevalecimento do princípio da efetividade (TJ-SP - AI:
20478401120198260000 SP 2047840-11.2019.8.26.0000, Relator:
Marcondes D'Angelo, Data de Julgamento: 22/05/2019, 25ª Câmara
de Direito Privado, Data de Publicação: 22/05/2019).

Mas como posso solicitar a penhora


ao juiz?

Primeiro você deve ter em mente dados básicos do devedor como idade
e profissão (sem esses dados será mais complicado). Com os dados em
mãos, será possível buscar o órgão específico para oficiar.

Se o executado é servidor público, você pode procurar informações


sobre sua remuneração no Portal Transparência do respectivo ente
(municipal, estadual ou federal).

/
Se ele é empregado celetista, você precisará de informações do
Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) ou do
INSS, neste caso, como se tratam de informações pessoais protegidas
por sigilo, somente mediante determinação judicial poderá ter acesso.

Vale salientar que oficiar o INSS serve tanto para saber se o devedor é
aposentado, como para saber se existe vínculo empregatício, além
de saber se ele aufere algum outro benefício da Previdência Social ou se
faz recolhimentos como microempreendedor/contribuinte individual
(neste caso, significa que ele aufere outros rendimentos que não do
vínculo empregatício).

No caso dele ser microempreendedor/contribuinte individual você


também pode fazer uma pesquisa na respectiva Junta Comercial ou
pedir para que o juiz a oficie.

Portanto, primeiro você precisa saber o vínculo que seu devedor possui
(se é servidor público, empregado celetista ou empreendedor), para
então solicitar ao juiz a penhora sobre o rendimento do devedor.

Afinal, já houve penhora de


aposentaria no Brasil?
Senhoras e senhores, a resposta é SIM!

/
Apesar de parecer errado para muitas pessoas, esse é um procedimento
que pode ser utilizado pelo credor e os tribunais vem aceitando a
questão de forma positiva.

Um caso tramitou perante o TJ/DF e após muita discussão chegou ao


STJ e foi decretada a penhora de 10% da aposentadoria do devedor
(que é servidor público aposentado) para o pagamento de honorários
advocatícios.

Esse caso se encaixa na questão de verbas alimentares, inclusive o


ministro Raul Araújo que participou do julgamento, deixou seu
entendimento de maneira muito didática: “Toda 'prestação alimentícia'
tem, por óbvio, natureza alimentar. Mas, nem todo crédito ou dívida de
natureza alimentar corresponde a ‘prestação alimentícia’”.

Outro caso que trata do tema chegou ao TST e foi decretada a penhora
de 5% de aposentadoria de sócio de uma empresa para pagamento de
dívida trabalhista.

O sócio da massa falida da Gazeta de Sergipe S/A alegou a


impenhorabilidade dos valores, em razão de terem caráter alimentar e
serem imprescindíveis para sua subsistência. A alegação até “colou”,
mas apenas para reduzir o percentual de 15% para 5%.

/
Incrível como devedor tem a mania de achar que tudo é impenhorável,
mas como demonstrado acima, decisões recentes dos tribunais têm
mudado essa questão.

Conclusão
Não restam dúvidas que se tratando de prestação alimentar a penhora
sobre o salário, soldo, pensão ou aposentadoria é aceita sem muita
discussão em razão da própria exceção trazida pela legislação. Então
não vai adiantar o devedor chorar pelo leite derramado depois de ter
boa parte do seu dinheiro mensal penhorado.

A discussão ainda se restringe na esfera do crédito comum, por


exemplo, aquele cheque que o devedor deu em pagamento de
mercadorias da sua lojinha de roupas. Esperamos que o legislador se
preocupe com esse ponto futuramente.

Para essa forma de penhora é preciso buscar e fundamentar seu


pedido, ficando a critério do juiz deferir ou não. Porém, como
demonstrado acima, há um número considerável de juízes que têm sido
favoráveis aos credores, assim a dívida é saldada e o devedor não terá
sua subsistência afetada.

Comente sobre o tema ou deixe sua dúvida. Vamos tratar


sobre direito de forma simples!

Referências

https://www.migalhas.com.br/quentes/307206/stj-afasta-penhora-
de-30-de-aposentadoria-para-pagamento-de-honorarios-advocaticios

/
http://boletimjuridico.publicacoesonline.com.br/tst-mantem-
penhora-de-5-de-aposentadoria-de-socio-de-empresa/

https://www.conjur.com.br/2019-jul-01/stj-autoriza-penhora-parcial-
salário-obrigacao-nao-alimentar

https://www.migalhas.com.br/coluna/cpc-na-
pratica/289048/penhora-de-salário-na-atual-visao-do-superior-
tribunal-de-justiça

https://tj-rj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/787513761/apelacao-apl-
151348720138190202?ref=serp

https://tj-pa.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/345929665/agravo-de-
instrumento-ai-89088220038140301-b...

Nota: essa parceria estava programada há quase um ano e só agora saiu


kkkk

A Pâmela é uma querida e foi uma das primeiras pessoas a me receber


de braços abertos aqui na comunidade. Me incentivou com as
publicações e ganhei uma amiga rs. A comunidade proporciona esse
tipo de coisa.

Se precisa de alguém para cálculos previdenciários, ela é a pessoa


certa: https://www.spcalculosprevidenciarios.com.br/.

Disponível em: https://aliceaquino.jusbrasil.com.br/artigos/817471982/posso-penhorar-a-


aposentadoria-ou-salario-do-devedor-parceria-pamela-francine-ribeiro

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