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Filosofia do Direito

Professor: Dr. Igor Beltrão


Objeto da ciência do direito e definição do direito
• Uma vez que a ciência do direito deve descrever seu objeto, que é o
direito, é importante útil começar pela definição;
• Trata-se tão-somente de determinar o que é possível estudar à luz de uma
ciência específica;
• Não existe no mundo empírico nenhuma realidade diretamente observável
à qual poderíamos justapor a palavra “direito”. Existem apenas
comportamentos humanos, os quais podemos compreender tanto do
ponto de vista jurídico quanto de outros pontos de vista;
• É o direito que define um comportamento humano como criador de
direito, e seu produto, a lei, como sendo do direito;
• A ciência do direito tem necessidade de definir seu objeto, bastando
reproduzir as definições do próprio direito?
• A ciência do direito não pode descrever as normas antes de poder
identifica-las como normas e não pode se fiar ou se basear, para isso,
numa definição interna, que se encontra no próprio direito;
• Não podemos abrir mão de uma definição externa do objeto do
direito, do direito considerado globalmente, de forma independente
da definição desta ou daquela categoria de normas, e essa definição
não pode ser fornecida pela ciência do direito, mas apenas pela
metaciência – em outras palavras, pela filosofia ou pela teoria geral
do direito;
• Kelsen, a norma fundamental e a eficácia;
• É impossível definir de forma isolada uma norma jurídica; é
impossível defini-la pela ameaça de uma sanção e distingui-la pela via
da ordem do ladrão;
• Da mesma maneira, é impossível defini-la por seu conteúdo e
distingui-la de outros tipos de normas, porque normas que não são
jurídicas podem ter conteúdo idêntico;
• Uma norma, seja ela jurídica, moral, religiosa, é aquela que pertence a um
sistema de normas ou sistema normativo, igualmente denominado “ordem
normativa”;
• A definição do direito como sistema jurídico suscita dois tipos de dificuldade: a
primeira diz respeito à maneira de definir qual é a norma mais alta – a solução de
Hans Kelsen é supor uma norma fundamental. A norma fundamental não é uma
norma verdadeira, mas uma decisão epistemológica: a decisão de tratar
determinado conjunto de normas, do qual a constituição é a mais elevada, como
sistema jurídico;
• Nova pergunta: qual é o conjunto de normas que é conveniente tratar
como sistema jurídico?
• Uma vez que o direito é uma espécie do gênero “sistemas
normativos”, é importante distinguir outras espécies do mesmo
gênero, como a moral ou a religião. Kelsen utiliza para isso um critério
simples: o direito prescreve a título de sanção atos de coerção, em
especial física; o direito dispõe do monopólio da coerção;
• Deparamos, então, com duas dificuldades: a hipótese dos textos redigidos
pelos internos de um hospital psiquiátrico. Será preciso, pressupondo para
esse conjunto uma norma fundamental, dizer que a “constituição” é uma
norma válida e que estamos na presença de uma ordem jurídica?
• A teoria da norma fundamental como decisão e sua utilidade;
• A tese de Kelsen é que não se deve chamar direito - pressupondo-lhe uma
norma fundamental – senão aquilo que aparece como ordem de
constrangimento eficaz, “grosso modo e de maneira geral”;
• A segunda dificuldade é: hipóteses dos cobradores de impostos e dos
salteadores: não lhes falta eficácia;
• Para ultrapassar a dificuldade, é preciso considerar que a ordem
jurídica dispõe do monopólio da coerção: qual dos sistemas é o mais
eficaz? Ordem jurídica criminosa e dois sistemas jurídicos eficazes,
com uma norma fundamental para cada um deles;
• Herbert Hart e a regra do reconhecimento;
• Direito como um sistema formado por regras de base e regras secundárias, mas como identificar
as regras que fazem parte do sistema?
• De forma diversa da norma fundamental, a regra de reconhecimento não é pressuposta; é uma
prática social verificada pela ciência do direito;
• Como no caso da norma fundamental, o fato de que a regra de reconhecimento seja constatada e
não pressuposta permite manter a distinção entre o direito e a ciência do direito. Essa
constatação é, efetivamente, operada de um ponto de vista externo ao sistema, tendo em vista
que não implica nenhum compromisso quanto à validade dessa prática;
• Definição formal: a estrutura do sistema;
• Nem a norma fundamental nem a regra de reconhecimento permitem responder por
completo à questão inicial: quais são os limites do objeto da ciência do direito?
• A teoria da norma fundamental é insuficiente, porque, se pressupomos uma norma tal
para sistemas jurídicos eficazes, “grosso modo e de maneira geral”, o sistema jurídico não
foi definido senão pela garantia da coerção física;
• Além disso, o objeto deveria ser definido de forma que fosse suscetível de ser estudado
pela ciência do direito, de acordo com um método homogêneo (direito primitivo);
• A regra de reconhecimento vai de encontro a uma dificuldade de outra
ordem: se essa regra corresponde à prática dos tribunais e de outras
autoridades públicas, como identificar os tribunais e as autoridades
públicas?
• Podemos encontrar uma solução para essas dificuldades ao empregar uma
definição estipuladora do direito: a questão não diz respeito realmente à
natureza do direito, mas apenas ao objeto que convém atribuir à ciência do
direito. Na dupla objeto-método, a prioridade pertence ao método;
• Uma norma pertence ao sistema se foi produzida em conformidade com uma norma superior
(ponto de vista dinâmico) e se seu conteúdo não é contrário a uma norma superior (ponto de
vista estático). Uma prescrição é uma norma jurídica se ela se insere em um sistema jurídico
assim hierarquizado. O direito pode ser caracterizado como um sistema ao mesmo tempo
estático e dinâmico;
• Uma definição semelhante permite compreender o modo de operação dos produtores do direito,
como os juízes, bem como o da dogmática jurídica;
• Também pela mesma via constituímos uma definição do objeto da ciência do direito, uma vez
que, se as normas assim produzidas são normas jurídicas, podem ser descritas pela ciência;
• Outra vantagem dessa definição é que ela não se baseia em nenhum
pressuposto ontológico, tendo em vista que as normas jurídicas podem ser
enunciados ou a significação destes, e que essa significação pode ser tanto
uma vontade humana quanto um dever-ser objetivo. Qualquer que seja o
caso, podem se descritas;
• A terceira vantagem é que o direito assim definido é o direito do Estado
moderno, de forma que pode ser compreendido como técnica de exercício
de poder;

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