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Cristiane Okanobo

RESPONSABILIDADE CIVIL NA UNIÃO ESTÁVEL

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP


2005
2

Cristiane Okanobo

RESPONSABILIDADE CIVIL NA UNIÃO ESTÁVEL

Dissertação apresentada à Banca


Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de
MESTRE em Direito Civil, sob a
orientação do Professor Doutor José
Manoel de Arruda Alvim Netto.

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP


São Paulo
2005
3

Banca Examinadora

_____________________________________

_____________________________________

_____________________________________
4

AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador, por toda a atenção


dedicada, sempre.
À CAPES, pela contribuição para o
desenvolvimento desta dissertação.
5

RESUMO

Este trabalho procura demonstrar o alcance das regras da


responsabilidade civil na ruptura da união estável. Para tanto, demonstram-se outras
situações no âmbito do direito de família, que também viabilizam a aplicação das regras
de responsabilidade civil, trata-se da ruptura do noivado e da separação litigiosa com
grave violação dos deveres matrimoniais.
O estudo da responsabilidade civil abrange seu conceito, pressupostos e
as espécies contratual e extracontratual, pois se quer demonstrar que se trata de um
instituto dinâmico e visa, através da reparação de danos, recompor o equilíbrio abalado
pelo ato ilícito.
Demonstra-se a mudança na estrutura familiar, constatando que o
casamento, hodiernamente, não é mais o único meio de se constituir família. Nota-se
também, que o alicerce da família é o afeto. Desta forma, o objetivo deste trabalho
possibilita que a família cumpra seu papel constitucional de base da sociedade, à medida
que fortalece suas raízes.
A análise histórica da união estável facilita a compreensão de suas
características, efeitos e a razão da terminologia adotada, companheiros ou conviventes.
Destaca-se o estudo dos direitos e deveres atribuídos a esta forma de entidade familiar, a
fim de demonstrar que o direito de família não estabelece regras para a reparação de
danos oriundos do descumprimento grave e culposo destes deveres, por parte de um dos
companheiros.
Privilegiando estudos teóricos, buscam-se subsídios na doutrina e na
jurisprudência para fundamentar a reparação de danos, materiais ou morais, ocasionados
através do rompimento culposo da união estável.
Constata-se, por fim, a possibilidade de extensão das regras de
responsabilidade civil no direito de família, especialmente na união estável. Desde que
presentes os pressupostos caracterizadores da responsabilidade civil, funda-se a
reparação dos danos no artigo 186 do Código Civil. Objetiva-se com a reparação das
ofensas, fortalecer a família valorizando os laços de afeto e o respeito entre seus
membros.

Palavras-chaves: responsabilidade civil – direito de família – união estável.


6

ABSTRACT

This essay tries to convey the reach for the rules of the civil
responsibility in the rupture of the stable union. For that, other situations in the ambit of
the family right are shown, and these also make the application of the civil
responsibility rules viable – they are the rupture of engagement and the litigious
separation with severe violation of the marital obligations.
The study of the civil responsibility comprehends its concept,
presuppositions and the contractual and extra-contractual types, once it refers to a
dynamic institution and aims at restating the balance threatened by the illicit act,
through damage repairing.
The change in the family structure is conveyed, affirming that the
marriage, these days, is not the only way to build a family anymore. It can also be
observed that the basis of the family is affection. Thus, the purpose of this essay makes
it possible for the family to play its constitutional role as the society foundation, as it
strengthens its roots.
The historical analysis of the stable union makes it easier to understand
its characteristics, effects and the reason for the adopted terminology, partners or people
living together. The study of the rights and duties addressed to this kind of family entity
is pointed out, in order to show that the family right does not state rules for repairing
damage caused by the severe and guilty act of not accomplishing these duties by one of
the partners.
Enhancing the theoretical studies, we search for subsidies in the doctrine
and in the jurisprudence to found the repairing of damage, either material or moral,
which occurred through the guilty rupture of the stable union.
Finally, we can confirm the possibility to extend the civil responsibility
rules in the family right, especially in the stable union. Since the presupposed characters
of the civil responsibility are present, the repairing of damage is based on the article
no.186 of the Civil Code. The repairing of the offenses aims at strengthening the family,
valuing the affection bonds and the respect among its members.

Key words: civil responsibility - family right - stable union


7

SUMÁRIO

RESUMO.........................................................................................................................V

ABSTRACT...................................................................................................................VI

INTRODUÇÃO.............................................................................................................09

CAPÍTULO I – Responsabilidade civil.......................................................................11

1. Noções gerais.......................................................................................................11
2. Conceito...............................................................................................................18
3. Pressupostos da responsabilidade civil................................................................23
3.1.Ação ou omissão..................................................................................................23
3.2.Dolo ou culpa do agente......................................................................................25
3.3.Relação de causalidade........................................................................................28
3.4.Dano.....................................................................................................................29
3.4.1.Dano moral.......................................................................................................32
4. Responsabilidade civil contratual e extracontratual............................................37

CAPÍTULO II – Responsabilidade civil no direito de família..................................41

CAPÍTULO III – União estável....................................................................................60

1. Breve histórico.....................................................................................................60
2. Terminologia adotada..........................................................................................67
3. Conceito...............................................................................................................71
4. Natureza jurídica..................................................................................................76
5. Requisitos necessários para a configuração da união estável..............................79
6. Deveres de ambos os companheiros....................................................................91
7. Efeitos..................................................................................................................97
8

CAPÍTULO IV – Reparação de danos na união estável..........................................109

1. Principais causas que reclamam reparação........................................................116


2. Possibilidade de reparação de danos entre conviventes....................................121

CONCLUSÃO..............................................................................................................124

BIBLIOGRAFIA.........................................................................................................128
9

INTRODUÇÃO

No presente trabalho, dentro da temática da responsabilidade civil,


procura-se vincular as relações familiares, especificamente, no que se refere à aplicação
das regras de responsabilidade civil na união estável.
A figura da união estável, que por muito tempo ficou às margens da lei,
ganhou reconhecimento jurídico com a Constituição Federal de 1988, no artigo 226,
parágrafo terceiro. Posteriormente, este artigo foi regulamentado pelas Leis nº 8.971 de
1994 e Lei nº 9.278 de 1996 e, hoje, está disciplinada no Código Civil, do artigo 1.723
ao 1.729.
Diante da possibilidade de conviventes praticarem atos que possam
resultar em lesões suscetíveis de reparação, este trabalho pretende demonstrar a
possibilidade de reparação de danos patrimoniais e morais no âmbito da união estável.
A fim de atingir o tema proposto, é necessário traçar os aspectos gerais
sobre a responsabilidade civil, desta forma, o primeiro capítulo, será dedicado ao
conceito, aos pressupostos e às espécies de responsabilidade civil, contratual e
extracontratual. No primeiro capítulo, também, destaca-se o Projeto 6960 que pretende
incluir parágrafo ao artigo 927, propondo especificamente a aplicação dos princípios da
responsabilidade civil no direito de família.
Dentro dos pressupostos imprescindíveis para a caracterização da
responsabilidade civil, será enfatizado o dano moral, por ser de grande repercussão no
âmbito das relações familiares.
O capítulo segundo, mesmo que em linhas gerais, cuida da
responsabilidade civil no direito de família. A fim de explicitar as regras de
responsabilidade civil no âmbito familiar, foram elencadas as situações mais comuns,
pois não seria viável discorrer sobre todas as hipóteses possíveis. Assim, será analisado
o rompimento imotivado da promessa de casamento ou a quebra dos esponsais, a
reparação de danos na separação judicial culposa, em virtude de ato ilícito, a
transmissão de aids entre cônjuges e companheiros e o abandono moral dos pais em
relação aos filhos.
O terceiro capítulo destina-se à união estável, estabelecendo o conceito, o
delineamento histórico, os requisitos e efeitos, bem como os direitos e deveres oriundos
dessa união.
10

No quarto capítulo procura-se estabelecer a reparação de danos na união


estável, analisando a possibilidade de responsabilidade civil com base no artigo 186 do
Código Civil. Para tanto, são analisadas algumas situações, como a transmissão culposa
da aids de um convivente ao outro, o abandono injusto e imotivado e o adultério.
Colacionando decisões de Tribunais, nota-se que estes não são totalmente insensíveis à
matéria.
Verifica-se a importância do instituto da responsabilidade civil no campo
das relações familiares, pois, o que se busca, é valorar os laços de afeto e solidariedade
que unem os membros de uma família, mantendo o respeito e a dignidade,
indispensáveis para a estrutura familiar. De fato, o mal causado entre familiares causa
sofrimento maior do que o causado por terceiro estranho ao ambiente familiar.
Por fim, os parâmetros metodológicos a serem utilizados serão o
fenomenológico – hermenêutico e o bibliográfico. O primeiro privilegia estudos
teóricos e a análise de documentos e textos, buscando-se, assim, um processo lógico de
interpretação e reflexão a respeito da aplicação das regras de responsabilidade civil no
direito de família. O segundo trata-se do estudo para conhecer as contribuições
científicas sobre o assunto. Tem como objetivo recolher, selecionar, analisar e
interpretar as contribuições teóricas já existentes sobre a matéria em questão.
11

CAPÍTULO I – RESPONSABILIDADE CIVIL

1. NOÇÕES GERAIS

Topograficamente, verifica-se que a responsabilidade civil está em


artigos espalhados pelo Código Civil. O atual Código trata da responsabilidade civil do
artigo 927 ao 954. Situada na parte especial, livro das obrigações, sob título IX, a
responsabilidade civil vem disciplinada com a mesma estrutura do diploma anterior1.
Mas nem todos os artigos que dizem respeito à matéria estão neste título IX.
Na parte geral, livro III, títulos II e III, encontram-se respectivamente
disciplinados os atos lícitos e os atos ilícitos. Aqui se nota que o novel Código cuida
com maior profundidade da responsabilidade civil, pois foi acrescentada a possibilidade
de indenização por dano exclusivamente moral, no artigo 1862. Possibilidade esta que já
era prevista pela Constituição Federal, artigo 5º, V e X. 3
No artigo 186 do Código Civil, estabeleceu o legislador a
responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana, ou seja, neste artigo encontra-se a
base da responsabilidade civil subjetiva ou clássica, baseada na culpa. Esta forma de
responsabilidade civil será estudada adiante. Observa-se que o Código Civil manteve a
culpa como fundamento da responsabilidade subjetiva.
Dispõe o artigo 186: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência, violar direito e causar dano4 a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

1
De acordo com Regis Fichtner Pereira, A responsabilidade civil pré-contratual, Rio de Janeiro:
Renovar, 2001, p. 14: “o legislador brasileiro optou pelo modelo francês de responsabilidade civil. O
Código Civil brasileiro, conquanto sistematizado segundo o modelo do BGB – o modelo alemão consiste
em dividir as disposições do Código em uma parte geral e uma parte especial - , contém uma regra geral
de responsabilidade civil, expressa no seu art. 159 (atual 186), claramente inspirada no art. 1.382 do
Código civil francês.”
2
Corresponde ao artigo 159 do Código Civil 1916.
3
Dispõe o artigo 5º, V: “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização
por dano material, moral ou à imagem.” e no inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente
de sua violação.”
4
O novo Código trouxe uma modificação na redação do artigo 186, comparando-o ao artigo 156 do
Código Civil de 1916, este dispositivo usava a alternativa “ou” (“...violar direito ou causar prejuízo a
outrem”) e o atual artigo 186 usa a aditiva “e”, (“...violar direito e causar dano a outrem”). Explica Rui
Stoco, Tratado de responsabilidade civil, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 6.ed., p. 124 que “a
violação do direito já caracteriza o ato ilícito, independentemente de ter ocorrido dano. Ou seja, o ato
ilícito é aquele praticado com infração de um dever legal ou contratual. Violar direito é cometer ato
ilícito. A ilicitude está na só transgressão da norma.” Consultar também, Sílvio de Salvo Venosa, Direito
Civil, São Paulo: Atlas, v.4, 4.ed., 2004, p.12.
12

A noção de ato ilícito está diretamente ligada ao tema, pois é uma das
fontes da obrigação de reparar o dano, como veremos, a idéia de responsabilidade civil
que interessa a este trabalho, é a reparação do prejuízo sofrido pela vítima. Desta forma,
ainda que de maneira sucinta, importante situar o ato ilícito no ordenamento jurídico.
Encontram-se na doutrina várias classificações. A maioria parte do
gênero fato jurídico que é a adequação de um fato à lei, produzindo conseqüências
jurídicas, tem-se: fatos jurídicos naturais e voluntários. Os primeiros decorrem de
acontecimentos da natureza, como por exemplo, raios e tempestades e, os segundos,
originam-se de condutas humanas e, dividem-se em lícitos e ilícitos. Os atos lícitos, por
sua vez, subdividem-se em ato jurídico e negócio jurídico. O ato jurídico depende da
vontade humana para que ocorra e seus efeitos já estão previamente definidos em lei,
por exemplo, a adoção. O negócio jurídico também depende da vontade humana, mas
seus efeitos serão definidos por quem pratica o negócio, por exemplo, o testamento.5
Por fim, o ato ilícito que é aquele praticado contra a lei. Dentre as
definições encontradas, há discussão em saber se a culpa integra o conceito de ato
ilícito. Sérgio Cavalieri Filho levanta a questão: “com efeito, se a culpa é elemento
integrante do ato ilícito, então, onde não houver culpa também não haverá ilícito. Nesse
caso, qual seria o fato gerador da responsabilidade objetiva?”6 Adiante, o autor
apresenta a solução baseado-se no duplo aspecto da ilicitude, ou seja, o ato ilícito deve
ser analisado em sentido estrito e amplo. Em sentido estrito, ato ilícito é o conjunto de
pressupostos da responsabilidade civil e, em sentido amplo, indica apenas a ilicitude do
ato, o comportamento humano contrário à lei. Os pressupostos da responsabilidade civil
serão analisados em item próprio, mas adianta-se que a culpa é um dos elementos
caracterizadores da responsabilidade subjetiva, porém, não o é da responsabilidade
objetiva que é fundada no risco e prescinde da culpa.
Conclui Sérgio Cavalieri Filho: “o conceito estrito de ato ilícito, tendo a
culpa como um dos seus elementos, tornou-se insatisfatório até mesmo na
responsabilidade subjetiva. Em sede de responsabilidade civil objetiva, cujo campo de
incidência é hoje vastíssimo, só tem guarida o ato ilícito latu sensu, assim entendido

5
Consultar Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil – Parte geral, São Paulo: Atlas, v. 1, 4.ed., 2004, págs.
377/378; Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro – Teoria geral do Direito Civil, São
Paulo: Saraiva, v. 1, 22.ed., 2005, págs. 360/361; Zeno Veloso, Invalidade do negócio jurídico – nulidade
e anulabilidade, Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p.20; Silvio Rodrigues, Direito Civil – Parte geral, São
Paulo: Saraiva, v.2, 25.ed., 1995, págs. 159/162.
6
Sérgio Cavalieri Filho, Programa de responsabilidade civil, São Paulo: Malheiros Editores, 4.ed., 2003,
p. 30.
13

como a mera contrariedade entre a conduta e a ordem jurídica, decorrente de violação


de dever jurídico preexistente. Temos como certo que o novo Código Civil assumiu em
relação ao ato ilícito esta postura dicotômica.”7
Rui Stoco entende que “os atos ilícitos, ou seja, praticados com desvio de
conduta – em que o agente se afasta do comportamento médio do bonus pater familiae –
devem submeter o lesante à satisfação do dano causado a outrem (...) assim sendo, para
que haja ato ilícito, necessária se faz a conjugação dos seguintes fatores: a existência de
uma ação; a violação da ordem jurídica; a imputabilidade; a penetração na esfera de
outrem.”8
Para Orlando Gomes “ato ilícito é lesão de um direito absoluto, vale
dizer, de um direito que todos devem respeitar. Trata-se de invasão da esfera jurídica
alheia que atenta contra interesses e valores fundamentais da personalidade humana,
como, dentre outros, a vida, a liberdade, a saúde, a honra. Toda lesão culposa de um
desses direitos subjetivos obriga aquele que a praticou a indenizar suas conseqüências
patrimoniais, configurando ato ilícito stricto sensu.”9
Desta forma, a prática do ato ilícito deve gerar dano e, segundo Clayton
Reis, “o sentido de eqüidade da justiça conduz-nos à premissa de que todo ato ilícito
que resultar em dano deve ser suscetível de reparação.”10
Como novidade, o Código Civil traz o artigo 186 seguido pelo artigo
187, que trata do abuso de direito, definindo-o como sendo aquele que excede
manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou
pelos bons costumes, norma esta, que não era prevista no Código de 1916. Rogério
Marrone de Castro Sampaio considera abuso de direito “conduta ilícita, não só aquele
comportamento que objetivamente extrapola os limites do direito individual
reconhecido, como também aquele que, embora se mantenha dentro desses limites
objetivos, é praticado de maneira desvirtuada de sua função social ou econômica, vindo
a prejudicar terceiros.”11

7
Sérgio Cavalieri Filho, Programa, cit., p. 33.
8
Rui Stoco, Tratado, cit., p. 129. Consultar também, Humberto Theodoro Júnior, Comentários ao novo
Código Civil – Dos defeitos do negócio jurídico ao final do livro III, coord. Sálvio de Figueiredo
Teixeira. Rio de Janeiro: Forense, v.III (arts. 185 a 232), 2003, p. 18.
9
Orlando Gomes, Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, 15.ed., 2000, p. 256.
10
Clayton Reis, Dano moral, Rio de Janeiro: Forense, 4.ed., 1997, p. 44.
11
Rogério Marrone de Castro Sampaio, Responsabilidade civil, São Paulo: Atlas, 3.ed., 2003 (Série
fundamentos jurídicos), p. 42.
14

Ainda na parte geral, sobre o tema, encontra-se o artigo 188 que


considera como atos lícitos os praticados em legítima defesa, estado de necessidade e
exercício regular de um direito reconhecido. A ocorrência destas situações exclui a
responsabilidade, observados os limites indispensáveis para a remoção do perigo.
Na parte especial do Código Civil, sob o título IV, do inadimplemento
das obrigações, o artigo 389 traz a regra da responsabilidade civil contratual. Esta
modalidade de responsabilidade civil também será objeto de estudo oportunamente.
Justifica-se a não concentração do tema em um único título, em virtude
do vasto campo da responsabilidade civil, ou seja, a responsabilidade civil está presente
em várias áreas do direito, público ou privado e, por isso, normas sobre
responsabilidade civil encontram-se espalhadas por todo o Código.
José de Aguiar Dias ensina que antes da responsabilidade civil estar
presente na vida jurídica, ela se faz presente na vida social12 e, conseqüentemente, é um
instituto dinâmico, ensina que “o instituto é essencialmente dinâmico, tem de adaptar-
se, transformar-se na mesma proporção em que envolve a civilização, há de ser dotado
de flexibilidade suficiente para oferecer, em qualquer época, o meio ou processo pelo
qual, em face de nova técnica, de novas conquistas, de novos gêneros de atividade,
assegure a finalidade de restabelecer o equilíbrio desfeito por ocasião do dano,
considerado, em cada tempo, em função das condições sociais então vigentes.”13
De fato, justifica-se o dinamismo na responsabilidade civil, pois é um
instituto que precisa adequar-se à realidade que se apresenta, já que o ser humano está
em constante evolução, novas fases e situações surgem em decorrência dessa evolução
e, o direito, acima de tudo, deve acompanhar as modificações da vida social. Afinal,
tudo o que procede do homem está sujeito a mudanças.
Nesse sentido, explica Washington de Barros Monteiro: “já que não
existe e não pode existir teoria permanente sobre a responsabilidade civil, por ser um
instituto dinâmico, que se adapta e se transforma conforme evolui a civilização, é
preciso conferir-lhe flexibilidade suficiente para, que em qualquer época,
independentemente de novas técnicas, de novas atividades, ser assegurada a sua
finalidade de restabelecer o equilíbrio afetado pelo dano.”14

12
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade civil, Rio de Janeiro: Forense, 8.ed., v. I, 1987, p. 02.
13
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade civil, cit., p.19.
14
Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil: direito das obrigações, São Paulo: Saraiva, v.
5, 2ª parte, 34. ed., 2003, p. 449.
15

Assim sendo, a responsabilidade civil, evolui para tentar acompanhar o


progresso humano, os avanços tecnológicos e científicos. Nesse sentido, Carlos Alberto
Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho anotam que: “pode dizer-se, sem medo de
errar, que os domínios da responsabilidade civil foram ampliados na mesma proporção
em que se multiplicaram os inventos e outras conquistas da atividade humana, com o
enorme manancial das descobertas científicas e tecnológicas, a começar pelo código
genético.”15
Constatado que a responsabilidade civil não ocorre exclusivamente na
vida jurídica, pois também se relaciona com a psicologia e a sociologia e, é nesta última
noção que a responsabilidade é vista como aspecto da realidade social. O objetivo deste
estudo cuidará apenas da responsabilidade jurídica.
Especificamente, normas sobre responsabilidade civil no direito de
família, não foram disciplinadas pelo legislador no atual Código Civil, em razão dessa
omissão, o Projeto 6960/2002, de autoria do deputado Ricardo Fiúza, prevê inclusão de
parágrafo no artigo 927, dispondo que: “§ 2º - Os princípios da responsabilidade civil
aplicam-se também às relações de família.”
O artigo 927, caput, do Código Civil refere-se à responsabilidade civil
subjetiva com culpa,16 o futuro parágrafo segundo co-existiria com o atual parágrafo
único que estabelece regra para responsabilidade civil objetiva em duas hipóteses: nos
casos especificados em lei e, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor
do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
O futuro parágrafo segundo que se pretende acrescentar ao artigo 927 do
Código Civil é sugestão da professora Regina Beatriz Tavares da Silva que, para tanto,
apresenta os seguintes argumentos:
“Já que a responsabilidade civil avança conforme progride a
civilização, há necessidade de constante adaptação desse instituto às novas
necessidades sociais. Bem por isso, as leis sobre essa matéria devem ter caráter
genérico, como a regra a seguir sugerida, e aos tribunais cabe delas extrair os
preceitos para aplicá-los ao caso concreto. Em suma, não se pode negar a importância
da responsabilidade civil, que invade todos os domínios da ciência jurídica, sendo o

15
Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho, Comentários ao novo Código Civil. Da
responsabilidade civil. Das preferências e privilégios creditórios, Rio de Janeiro: Forense, v. XIII, 2004,
p. 01.
16
Dispõe o artigo 927: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado
a repará-lo.”
16

centro do direito civil e de todos os demais ramos do direito, tanto de natureza pública
quanto privada, por constituir-se em proteção à pessoa em suas mais variadas
relações. Dentre as relações de caráter privado destacam-se as familiares, em que
também devem ser aplicados os princípios da responsabilidade civil, como já
reconhecem a doutrina brasileira (...) Embora as relações familiares sejam repletas de
aspectos, especialmente pessoais, afetivos, sentimentais e religiosos, envolvendo as
pessoas num projeto grandioso, preordenado a durar para sempre, por vezes o sonho
acaba, o amor termina, o rompimento é inevitável. Nestas rupturas, são inúmeras as
situações em que os deveres de família são violados, com desrespeito especialmente aos
direitos da personalidade dos envolvidos nessas relações, a acarretar graves danos aos
membros de uma família. As sevícias, ofensivas à integridade física, e injúrias graves,
violadoras da honra, praticadas por um dos cônjuges contra o outro (v. Regina Beatriz
Tavares da Silva Papa dos Santos, Reparação Civil na Separação e no Divórcio, São
Paulo, Saraiva, 1999, p. 76- 79, 153 e 163-165); o atentado à vida do convivente,
configurado em contaminação de doença grave e letal ou em abandono moral e
material da companheira (v. Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos,
Responsabilidade Civil dos Conviventes, Revista Brasileira de Direito de Família,
Porto Alegre, Síntese e IBDFAM, v. 1, nº 3, outubro/dezembro de 1999, p. 36-39); o
abandono moral e material pelo filho do pai idoso e enfermo; a recusa quanto ao
reconhecimento da paternidade, com conseqüente negação à prestação de alimentos,
embora haja a certeza desse vínculo de parentesco (v. Regina Beatriz Tavares da Silva
Papa dos Santos, Reflexões sobre o reconhecimento da filiação extramatrimonial,
Revista de Direito Privado, coord. Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery,
São Paulo, Revista dos Tribunais, nº 1, janeiro/março de 2000, p. 83 e 84); estes são
alguns exemplos de desrespeito aos direitos da personalidade no seio familiar. Os
lesados nessas circunstâncias, dentre tantas outras, em obediência ao princípio da
proteção à dignidade da pessoa humana, merecem a devida reparação pelos danos
sofridos (...) Por fim, salientamos que a aplicabilidade dos princípios da
responsabilidade civil ao Direito de Família tem amplo respaldo constitucional,
precisamente na cláusula geral de proteção à dignidade humana, constante do art. 1º,
inciso III da Lei Maior. E outro relevante dispositivo da Constituição Federal que
fundamenta a tese reparatória no Direito de Família é o art. 226, § 8º, ao estabelecer
que ‘O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas
17

relações.’Remissão deve ser feita ao artigo 186 do novo Código Civil, que estabelece:
‘Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar
direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito’,
sendo, evidentemente, ato ilícito aquele praticado em violação a um dever de família.
(...) Em suma a responsabilidade civil é verdadeira tutela privada à dignidade da
pessoa humana e a seus direitos da personalidade, inclusive na família, que é centro de
preservação do ser humano, antes mesmo de ser havida como núcleo essencial da
nação. Conclui-se que a teoria da responsabilidade civil visa ao restabelecimento da
ordem ou equilíbrio pessoal e social, inclusive em relações familiares, por meio da
reparação dos danos morais e materiais oriundos da ação lesiva a interesse alheio,
único meio de cumprir-se a própria finalidade do Direito, que é viabilizar a vida em
sociedade, dentro do conhecido ditame de neminem laedere.”17

Assim sendo, caberá ao Projeto 6960, se aprovado, explicitar a aplicação


dos princípios da responsabilidade civil no âmbito das relações familiares, pois “o
Direito de Família, que regula as relações dos cônjuges, não está num pedestal
inalcançável pelos princípios da responsabilidade civil.”18
A respeito da responsabilidade civil nas relações familiares, Rolf
Madaleno anota que “a responsabilidade civil expande-se por todos os ramos do Direito
Civil, e também transita pelo Direito de Família, tanto em seus aspectos pessoais de
vínculo familiar, como na esfera patrimonial das relações oriundas do estado
familiar.”19

17
Projeto de lei nº 6960, de 2002, de autoria do deputado Ricardo Fiúza, disponível em
www.camara.gov.br. Segundo Carlos Alberto Bittar, Responsabilidade civil – teoria e prática. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 5.ed., 2005, p.03, o princípio neminem laedere significa “um dos
princípios gerais de direito – consoante o qual a ninguém se deve lesar.”
18
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade civil dos conviventes. A família na
travessia do milênio – anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família, coord. Rodrigo da Cunha
Pereira, Belo Horizonte: IBDFAM, 2000, p. 123.
19
Rolf Madaleno, Direito de família – Aspectos polêmicos, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p.
136.
18

2. CONCEITO

O termo responsabilidade vem do latim respondere, que significa


responsabilizar-se, “revelando o dever jurídico, em que se coloca a pessoa, seja em
virtude de contrato, seja em face de fato ou omissão, que lhe seja imputado, para
satisfazer a prestação convencionada ou para suportar as sanções legais, que lhe serão
impostas.”20
De acordo com Álvaro Villaça Azevedo, “a palavra responsabilidade
descende do verbo latino respondere, de spondeo, primitiva obrigação de natureza
contratual do direito quiritário, romano, pela qual o devedor se vinculava ao credor nos
contratos verbais, por intermédio de pergunta e resposta (spondesne mihi dare Centum?
Spondeo, ou seja, prometes-me dar um cento? Prometo).”21
A expressão responsabilidade civil pode ser definida como aquela que
“designa a obrigação de reparar o dano ou de ressarcir o dano, quando injustamente
causado a outrem.”22 Trata-se de conceito amplo, identificando a responsabilidade civil
com a obrigação de indenizar.
Conceituar responsabilidade civil não é tarefa fácil.
A propósito, José de Aguiar Dias inicia sua obra alertando que “toda
manifestação da atividade humana traz em si o problema da responsabilidade. Isso
talvez dificulte o problema de fixar o seu conceito, que varia tanto como os aspectos que
pode abranger, conforme as teorias filosófico-jurídicas.”23 Prossegue o autor dizendo
que “mais aproximada de uma definição de responsabilidade é a idéia de obrigação. (...)
A responsabilidade é, portanto, resultado da ação pela qual o homem expressa o seu
comportamento, em face desse dever ou obrigação.”24
Ressalta-se que responsabilidade e obrigação não se confundem. Aponta
José de Aguiar Dias que “a obrigação preexistente é a verdadeira fonte da

20
De Plácido e Silva, Vocabulário jurídico, Rio de Janeiro: Forense, 12.ed.,v. IV, 1996, págs. 124/125.
Segundo Miguel Maria de Serpa Lopes, Curso de Direito Civil, Rio de Janeiro: Freitas Bastos, v. 5, 4.ed.,
1995, p. 159, o termo responsabilidade “é de origem latina, do verbo – respondere, querendo dizer
aproximadamente o ter alguém se constituído garantidor de algo. Acrescente-se a isto o fato do Direito
Romano, ao compor a fórmula sacramental da stipulatio, ter prescrito o pronunciamento das seguintes
palavras: dare mihi spondes? Spondeo, o que bastava para criar uma obrigação a cargo do que assim
respondia, obrigação de caráter abstrato, afastado qualquer liame com a causa debendi.”
21
Álvaro Villaça Azevedo, Curso de Direito Civil. Teoria geral das obrigações, São Paulo: Revista dos
Tribunais, 5.ed., 1994, p.253. Ver também Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil Brasileiro, São
Paulo: Saraiva, v. 7, 18.ed., 2004, p.39.
22
De Plácido e Silva, Vocabulário cit., v. IV, p. 125.
23
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade civil, cit., p.01.
24
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade civil, cit., p.02.
19

responsabilidade, e deriva, por sua vez, de qualquer fator social capaz de criar normas
de conduta.”25
No mesmo sentido é a lição de Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio
Cavalieri Filho ao esclarecerem que “responsabilidade civil pode ser definida como a
obrigação sucessiva que surge para recompor o dano decorrente do descumprimento de
uma obrigação originária. Designa o dever que alguém tem de reparar o prejuízo
causado pela violação de um anterior dever jurídico. Em síntese, só se cogita de
responsabilidade civil onde há violação de um dever jurídico preexistente e dano.”26
No mesmo sentido é a lição de Carlos Roberto Gonçalves: “a
responsabilidade civil tem, pois, como um de seus pressupostos, a violação do dever
jurídico e o dano. Há um dever jurídico originário, cuja violação gera um dever jurídico
sucessivo ou secundário, que é o de indenizar o prejuízo.”27
Entretanto, há autores que sustentam a possibilidade de existir obrigação
sem responsabilidade e responsabilidade sem obrigação. Na primeira situação, Álvaro
Villaça Azevedo cita como exemplo o caso de dívidas de jogo e dos débitos prescritos e,
na segunda hipótese, o caso do fiador.28
A doutrina apresenta vários conceitos de responsabilidade civil, sendo
que alguns autores, informa Caio Mário da Silva Pereira29, preferem até mesmo não
definir o instituto, como Pontes de Miranda, que ao conceituar responsabilidade diz que
“o conceito de responsabilidade é aspecto da realidade social” deixando sem resposta a
pergunta que ele mesmo formula: “Como, então, caracteriza-se a responsabilidade?” 30
Dentre as definições encontradas na doutrina, cita-se.
Miguel Maria de Serpa Lopes leciona que “responsabilidade significa a
obrigação de reparar um prejuízo, seja por decorrer de uma culpa ou de uma outra

25
José de Aguiar Dias Da responsabilidade civil, cit., p.112.
26
Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho, Comentários, cit., p. 50. Acrescentam os
autores que mesmo a responsabilidade pelo fato de outrem, não contradiz com esse entendimento, pois o
responsável responderá pelo descumprimento da obrigação de outrem, ou seja, corresponde ao
descumprimento de uma obrigação anterior.
27
Carlos Roberto Gonçalves, Comentários ao Código Civil, coord. Antônio Junqueira de Azevedo, São
Paulo: Saraiva, v. 11 (arts. 927 a 965), 2003, p. 06.
28
Álvaro Villaça Azevedo, Curso, cit., p.38. Explica o autor que “os direitos prescrevem após o decurso
de um determinado prazo fixado por lei. Depois de escoado esse prazo, perdura a obrigação, sem,
contudo, perdurar a responsabilidade.” E no caso do fiador, diz que o fiador “é responsável, mas não é
obrigado.”
29
Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade civil, Rio de Janeiro: Forense, 8.ed., 1998, p.08.
30
Pontes de Miranda, Tratado de direito privado, Rio de Janeiro: Borsoi, v. 53, 1966, págs. 6/13.
20

circunstância legal que a justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstância
meramente objetiva.”31
Maria Helena Diniz defini responsabilidade civil “como a aplicação de
medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros
em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de
coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples
imposição legal (responsabilidade objetiva).”32
Caio Mário da Silva Pereira conceitua responsabilidade independente
desta fundar-se ou não na culpa, pois para este autor, “a responsabilidade civil consiste
na efetivação da reparabilidade abstrata do dano em relação a um sujeito passivo da
relação jurídica que se forma. Reparação e sujeito passivo compõem o binômio da
responsabilidade civil, que então se enuncia como o princípio que subordina a
reparação à sua incidência na pessoa do causador do dano.”33
Silvio Rodrigues citando Savatier defini responsabilidade civil como “a
obrigação que pode incumbir uma pessoa a reparar o prejuízo causado a outra, por fato
próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que dela dependam.”34
Sílvio de Salvo Venosa enfatiza que “o que interessa saber é identificar
aquela conduta que reflete na obrigação de indenizar. Nesse âmbito, uma pessoa é
responsável quando suscetível de ser sancionada, independentemente de ter cometido
pessoalmente um ato antijurídico.”35
Washington de Barros Monteiro conclui que a teoria da responsabilidade
civil visa “ao restabelecimento da ordem ou equilíbrio pessoal e social, por meio da
reparação dos danos morais e materiais oriundos da ação lesiva a interesse alheio, único
meio de cumprir-se a própria finalidade do direito, que é viabilizar a vida em sociedade,
dentro do conhecimento ditame de neminem laedere.”36
Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge defini responsabilidade civil
“como a situação em que se encontra alguém que, tendo praticado um ato ilícito, é
obrigado a indenizar o lesado dos prejuízos que lhe causou.”37

31
Miguel Maria de Serpa Lopes, Curso, cit., p. 160.
32
Maria Helena Diniz, Curso, cit.,v. 7, p.40.
33
Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade, cit., p.11.
34
Silvio Rodrigues, Direito Civil, São Paulo: Saraiva, v.4, 20.ed., 2003, p. 06.
35
Sílvio de Salvo Venosa, Direito, cit., v. 4, p.13.
36
Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., v. 5, 2. parte, p. 448.
37
Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge, Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil,
Coimbra: Livraria Almedina, 1999, p. 36.
21

Entende Álvaro Villaça Azevedo que responsabilidade civil “é a situação


de indenizar o dano moral ou patrimonial, decorrente de inadimplemento culposo, de
obrigação legal ou contratual, ou imposta por lei.”38
Nicolau Eládio Bassalo Crispino afirma que “a responsabilidade civil
corresponde ao dever de determinado sujeito de reparar o prejuízo sofrido por outrem,
em razão de um acordo anteriormente firmado, ou por imposição de lei.”39
Verifica-se que os autores procuram relacionar a definição de
responsabilidade com o dever de reparação pelo prejuízo causado, ou seja, com a
obrigação que resulta do dano suportado por outrem, seja de ordem moral ou
patrimonial. Portanto, interessa a este trabalho o termo responsabilidade com o
significado de reparar o dano.
Neste contexto, Atilio Aníbal Alterini menciona os sentidos amplo e
restrito da responsabilidade civil. O sentido amplo seria a adequação da conduta
humana de modo a não causar dano injustamente a outrem, bem como, a sanção caso
haja transgressão a esse dever de conduta. Já no sentido restrito, a responsabilidade
consistiria na reparação como sanção, pelo descumprimento do dever de não causar
danos ao direito alheio.40
Nesse sentido, José de Aguiar Dias anota que é inútil “dissimular esse
desencontro entre a denominação e o conteúdo da responsabilidade civil” reconhecendo
que “a idéia do ressarcimento prima sobre a da responsabilidade.”41 Explica o autor que
esse desencontro entre denominação e conteúdo da responsabilidade civil é devido às
mudanças da vida social, e assim, “a idéia da responsabilidade não podia fugir a essa
contigência. Sua transformação é resultado das mudanças sociais, notadamente do
grande desenvolvimento da indústria. Da responsabilidade assente na culpa se passa
rapidamente às presunções júris tantum, e daí à responsabilidade legal.”42
A transformação da responsabilidade civil, então, funda-se nas mudanças
sociais e na evolução do fundamento da culpa, que deixa de ser individualista e passa
para o sistema solidarista da reparação do dano. Quando o antigo sistema da culpa deixa

38
Álvaro Villaça Azevedo, Curso, cit., p. 254.
39
Nicolau Eládio Bassalo Crispino, Responsabilidade civil dos conviventes, A família na travessia do
milênio – Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família, coord. Rodrigo da Cunha Pereira, Belo
Horizonte: IBDFAM, 2000, p. 107.
40
Atilio Aníbal Alterini, Responsabilidad civil – limites de la reparacion civil, Buenos Aires: Abeledo –
Perrot, 2. ed., 2. reimpr., s.d., págs. 26/27.
41
José de Aguiar Dias Da responsabilidade civil, cit., p.17.
42
José de Aguiar Dias Da responsabilidade civil, cit., p.18.
22

de ser satisfatório, é que surgem as noções de assistência, previdência e de garantia para


supri-lo.43
Miguel Maria de Serpa Lopes aduz que “as definições dadas à
responsabilidade civil têm partido sobretudo entre os clássicos, de um critério restrito,
ou seja, uma ligação íntima entre o seu conceito e o de culpa. Atualmente, porém, certos
juristas, tendo JOSSERAND como um dos iniciadores da idéia, dão à responsabilidade
civil um caráter amplo, isto é, concebem-na desligada da noção de culpa.”44
Pode-se, então, conceituar responsabilidade civil como sendo a situação
de quem, ao infringir norma jurídica preexistente, legal ou contratual, gerando dano,
material ou moral, fica responsável pela reparação deste, levando ao stato quo ante.

43
Ver José de Aguiar Dias Da responsabilidade civil, cit., p.19.
44
Miguel Maria de Serpa Lopes, Curso, cit., p. 160.
23

3. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Visto que o artigo 186 é a base da responsabilidade civil subjetiva, é de


sua redação que se pode retirar os quatro requisitos necessários para que se configure a
responsabilidade civil: a ação ou omissão, a culpa ou dolo do agente, o dano sofrido
pela vítima e a relação de causalidade entre o dano e a conduta do agente.

3.1 Ação ou omissão

O comportamento humano relevante pode ser tanto positivo (fazer)


quanto negativo (não fazer). Desta forma, tem-se um comportamento comissivo quando
o sujeito age, pratica uma ação e, um comportamento omissivo, quando houver o dever
de agir que pode surgir da lei, do contrato ou de fato social.
Silvio Rodrigues ensina que “o ato do agente causador do dano impõe-
lhe o dever de reparar não só quando há, de sua parte, infringência a um dever legal,
portanto ato praticado contra direito, como também quando seu ato, embora sem
infringir a lei, foge da finalidade social a que ela se destina.”45
De acordo com o Código Civil e, considerando o comportamento do
agente, podem ocorrer três situações: a responsabilidade civil por ato próprio do agente,
por ato de terceiro que esteja sob sua responsabilidade e, por fato da coisa ou do animal
que estejam sob sua guarda.
A responsabilidade civil ato próprio está regulada nos artigos 942 e 186
do Código Civil, nesta forma de responsabilidade a obrigação de indenizar é imposta ao
agente que praticou a conduta e causou o resultado danoso e, se a conduta for praticada
por mais de um agente, todos responderão solidariamente pela reparação.46

45
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, p. 15. O autor refere-se à teoria do abuso de direito ao mencionar o
desatendimento da finalidade social, pois prossegue o autor: “se o comportamento abusivo do agente
causa dano a outrem, a obrigação de reparar, imposta àquele, apresenta-se inescondível.”
46
Artigo 942 do Código Civil, caput, – “Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de
outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos
responderão solidariamente pela reparação.”
24

A imputabilidade para que o agente responda por ato próprio é analisada


de acordo com a capacidade civil de fato ou de gozo47.
Responde por ato próprio o agente que se omite diante de um dever de
agir, situação comumente encontrada na responsabilidade contratual ou quando o agente
pratica ação infringindo um dever jurídico. Este dever jurídico consiste em cumprir o
que foi contratado em caso de responsabilidade contratual ou, em se tratando de
responsabilidade extracontratual, em cumprir norma legal e, caso não haja previsão
contratual ou legal, deve-se observar o dever geral de não causar dano a ninguém.
Silvio Rodrigues ensina que “a indenização pode derivar de uma ação ou
omissão individual do agente, sempre que, agindo ou se omitindo, infringe um dever
contratual, legal ou social. A responsabilidade resulta de fato próprio, comissivo, ou
uma abstenção do agente, que deixa de tomar um atitude que devia tomar.”48
A responsabilidade por ato próprio também pode ser chamada direta. É
esta modalidade de responsabilidade que se verifica na ruptura da união estável, afinal,
decorre de atos praticados pelos próprios conviventes. Mas, como veremos
oportunamente, não se trata de qualquer ruptura, esta deve se dar em razão de ato ilícito,
ou seja, não é o fato de pura e simplesmente romper a união estável, que gera a
obrigação de indenizar. Deve-se observar a circunstância em que se deu o rompimento
para que se possa amoldá-lo nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil.
O legislador destacou algumas situações que ensejam a responsabilidade
civil por ato próprio49, como, por exemplo, a do artigo 953 do Código Civil em que “a
indenização por injúria, difamação ou calúnia consistirá na reparação do dano que delas
resulte ao ofendido.”50 Trata-se de situação especial porque dificilmente se provaria o
dano material, este seria presumido e, a vítima não precisaria prová-lo, dispõe o
parágrafo único do artigo 953: “se o ofendido não puder provar prejuízo material,
caberá ao juiz fixar, eqüitativamente, o valor da indenização, na conformidade das
circunstâncias do caso.”

47
A respeito da capacidade de fato ou de exercício e da capacidade de gozo ou de direito, consultar:
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 1, p.147: “Capacidade de fato ou de exercício é a aptidão de exercer
por si os atos da vida civil dependendo, portanto, do discernimento que é critério, prudência, juízo, tino,
inteligência, e, sob o prisma jurídico, a aptidão que tem a pessoa de distinguir o lícito do ilícito, o
conveniente do prejudicial.”Consultar também: Sílvio de Salvo Venosa, Direito civil, cit., v. 1, 5.ed. p.
150.
48
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, p. 19.
49
O Código Civil de 1916 referia-se também ao artigo 1.548 que tratava da ofensa da mulher, artigo sem
correspondência no Código Civil de 2002. Ver também artigo 954 do Código Civil de 2002.
50
Verifica-se a calúnia quando o agente imputa fato criminoso a outrem, a difamação ocorre quando se
imputa fato ofensivo, mas não tipificado como crime e a injúria quando se ofende a dignidade e o decoro.
25

Atualmente, embora não provado o dano material, mas analisadas as


circunstâncias do caso concreto, o dano moral poderia ser fixado.
A responsabilidade por fato de terceiro está disciplinada nos artigos 932,
933 e 942 do Código Civil. O artigo 932 traz as hipóteses legais em que se verifica o
fato de terceiro, o artigo 933 diz que as pessoas elencadas no artigo 932, ainda que não
haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos e,
o artigo 942 diz a que título estas pessoas respondem. Responderão solidariamente pela
reparação, de modo que a responsabilidade civil por ato de terceiro, não exclui a por ato
próprio.
As duas hipóteses que revelam maior interesse a este trabalho, estão
presentes nos incisos I e II do artigo 932 e serão citadas oportunamente.
Por fim, a responsabilidade por fato da coisa ou do animal, nesta
modalidade de responsabilidade interessa a relação de poder entre a coisa e o agente.
Em razão do poder é que nasce o dever de guardar, de custodiar, trata-se da culpa in
custodiano, que é a falta de cautela, de cuidado em relação a um animal ou objeto. Tem-
se as seguintes situações: artigo 936, “o dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano
por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.” Artigo 937, “o dono de
edifício ou construção responde pelos danos que resultarem de sua ruína, se esta provier
de falta de reparos, cuja necessidade fosse manifesta.” E a do artigo 938, “ aquele que
habitar prédio, ou parte dele, responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem
ou forem lançadas em lugar indevido.”
Pode-se chamar responsabilidade indireta a que resulta de fato de terceiro
bem como a proveniente de fato da coisa ou do animal.

3.2. Culpa ou dolo do agente

Sendo subjetiva a responsabilidade civil, é preciso provar que o indivíduo


agiu mal, analisando dolo ou culpa. Caio Mário da Silva Pereira ensina que “a teoria da
responsabilidade subjetiva erige em pressuposto da obrigação de indenizar, ou de
reparar o dano, o comportamento culposo do agente, ou simplesmente a sua culpa,
abrangendo no seu contexto a culpa propriamente dita e o dolo do agente.”51

51
Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade, cit., p.30.
26

O dolo verifica-se no comportamento, na ação ou omissão voluntária (art.


186), isto é, o agente intencionalmente pretendeu o prejuízo, segundo Silvio Rodrigues,
“o dolo ou resultado danoso, afinal alcançado, foi deliberadamente procurado pelo
agente. Ele desejava causar dano e seu comportamento realmente o causou.”52
A culpa, por sua vez, é a violação de um dever de cautela, a doutrina
distingue a imprudência, a negligência e a imperícia. Observa Carlos Roberto
Gonçalves que “em qualquer de suas modalidades, entretanto, a culpa implica a
violação de um dever de diligência, ou, em outras palavras, a violação do dever de
previsão de certos fatos ilícitos e de adoção das medidas capazes de evitá-los.”53
O artigo 186 traz a culpa em sentido estrito e a culpa em sentido amplo.
Em sentido estrito, a culpa é caracterizada pela imprudência que se dá por uma ação, um
ato comissivo; pela negligência, verificada por um ato omissivo e a imperícia que é a
falta de capacitação técnica. Em sentido amplo, verifica-se o dolo que é a culpa grave,
com intenção de causar prejuízo.54
Culpa é definida por Alvino Lima como “um erro de conduta,
moralmente imputável ao agente e que não seria cometido por uma pessoa avisada, em
iguais circunstâncias de fato.”55
É utilizado o critério do homem médio56 para verificar se no
comportamento daquele que causou o dano houve culpa, ou seja, o homem médio seria
capaz de prever o resultado danoso e, se o agente não o previu, foi porque agiu com
imprudência, negligência ou imperícia.
A culpa pode ser classificada em três graus: grave, leve e levíssima. É
grave a culpa quando se verifica que, baseado no critério do homem médio, este teria
evitado o dano, isto é, é aquela que se configura de extrema e grosseira negligência e
imprudência. A culpa grave pode ser equiparada ao dolo. A culpa leve é a tradicional,
na qual o homem médio incorreria e, a culpa levíssima, é aquela que não pode ser
prevista pelo mais prudente e cauteloso dos homens.57

52
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, págs. 16 e 147.
53
Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade civil, São Paulo: Saraiva, 6.ed., 1995, págs. 344/345.
54
Ver Álvaro Villaça Azevedo, Curso, cit., p. 258, Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., p. 449 e
Maria Helena Diniz, Curso, cit., p. 46.
55
Alvino Lima, Culpa e risco, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1960, p. 76.
56
Informa Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade, cit., p. 345 que “o critério para aferição da
diligência exigível do agente, e, portanto, para caracterização da culpa, é o da comparação de seu
comportamento com o do homo medius, do homem ideal., que diligentemente prevê o mal e
precavidamente evita o perigo.” Consultar também Rui Stoco, Tratado, cit., p. 132.
57
Consultar Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, p. 148 e Rui Stoco, Tratado, cit., p.127.
27

Ocorre que independente do grau de culpa ou de ter o agente agido com


dolo, se a vítima sofreu algum prejuízo, deverá ser indenizada, mas conforme dispõe o
caput do artigo 944 do Código Civil, “indenização se mede pela extensão do dano” e
seu parágrafo único que, “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa
e o dano, poderá o juiz reduzir eqüitativamente a indenização.”58
A culpa também pode ser classificada quanto ao seu conteúdo, como já
visto, tem-se: culpa in custodiendo que é a falta de cautela e cuidado em relação a
animal ou objeto, há também a culpa in committendo ou in faciendo que é a prática de
um ato positivo, caracterizado pela imprudência, a culpa in omittendo que é a omissão
(negligência), a culpa in eligendo é a que resulta da má escolha pelo agente e a culpa in
vigilando é a que decorre da falta de atenção e fiscalização com relação a outrem.59
Diante do fato de que nem sempre é possível se verificar culpa, temos no
parágrafo único do artigo 927 a responsabilidade civil baseada no risco, trata-se da
responsabilidade civil objetiva, onde não se discute culpa. Referido parágrafo único,
como já mencionado, estabelece regra para responsabilidade civil objetiva em duas
hipóteses: nos casos especificados em lei60 e quando a atividade normalmente
desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de
outrem.
Aponta Rui Stoco que o Código Civil de 2002 “embora tenha adotado e
mantido a culpa como pressuposto da responsabilidade civil, ou seja, exigindo que a
conduta tenha um qualificativo ligado ao elemento subjetivo ou interno da pessoa, de
modo que há de projetar-se em direção a um resultado querido ou assumido,
excepcionou esse princípio para, como exceção, admitir a responsabilidade
independentemente de culpa (objetiva) quando a atividade desenvolvida pelo autor do
dano implicar risco para os direitos de outrem (art. 927, parágrafo único).”61
No âmbito deste trabalho, importa a verificação da culpa para a
configuração do dano moral, pois, verificar-se-á, que o simples rompimento da união

58
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, p. 150, aplaude a inovação do Código Civil de 2002, pois reputava
injusta a solução tradicional de impor ao causador do dano a total indenização pelo prejuízo causado, não
levando em consideração de o agente agiu com dolo ou culpa levíssima.
59
Consular Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, p. 49/50.
60
Verifica-se a responsabilidade civil objetiva nos artigos 37, §6º, da Constituição Federal de 1988; 43 do
Código Civil; 13, 14 e 18 do Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990 e
Lei nº 6.543/1977 sobre a responsabilidade civil e criminal por danos nucleares.
61
Rui Stoco, Tratado, cit., p. 130.
28

estável, como conseqüência do fim do amor, da afinidade, não é capaz de gerar dano
indenizável.
Cabem aqui as palavras de Vitor Ugo Oltramari: “...na própria ruptura da
união estável pelo fim do afeto, existem sofrimentos, mágoas e dissabores que não têm
como serem compensados por fazerem parte do próprio contexto da quebra da relação.
Fundamental é a ocorrência de conduta culposa e a verificação da sua intensidade para
configuração do dano moral.”62

3.4. Relação de causalidade

Deve haver um nexo de causalidade entre a causa, isto é, a ação ou


omissão praticada pelo agente e a conseqüência, ou seja, o dano causado à vítima.
Sérgio Cavalieri Filho lembra que o “conceito de nexo causal não é
jurídico; decorre das leis naturais. É o vínculo, a ligação ou relação de causa e efeito
entre a conduta e o resultado.”63
A doutrina aponta duas teorias: a da equivalência dos antecedentes e a da
causalidade específica. Brevemente, a primeira teoria consiste em eliminar um
comportamento, desaparecendo o dano, significa que aquele comportamento foi a causa
do dano, gera, portanto, responsabilidade ilimitada. A segunda teoria considera como
causa do prejuízo apenas o comportamento que por si só causou o dano, diferentemente
da teoria da equivalência, a teoria da causalidade específica, gera responsabilidade
limitada.64
Neste item cabe a análise das excludentes de responsabilidade civil.
Trata-se de toda circunstância, comportamento que de alguma forma venha atingir o
nexo de causalidade, quebrando-o.
São excludentes de responsabilidade civil: a culpa exclusiva da vítima,
deve ser verificado se esta agiu com falta de cuidado; o fato de terceiro e, o caso fortuito
e de força maior.
Se o dano decorre de comportamento exclusivo da vítima, a relação de
causalidade é quebrada, não sendo possível propositura de ação. Segundo Maria Helena
Diniz, “a vítima deverá arcar com todos os prejuízos, pois o agente que causou o dano é

62
Vitor Ugo Oltramari, O dano moral na ruptura da sociedade conjugal, Rio de Janeiro: Forense, 2005,
p. 119.
63
Sérgio Cavalieri Filho, Programa, cit., p. 67.
64
Consultar Rui Stoco, Tratado, cit., págs. 146/147 e Sérgio Cavalieri Filho, Programa, cit., págs. 67/71.
29

apenas um instrumento do acidente, não se podendo falar em nexo de causalidade entre


a sua ação e a lesão.”65Ao lado da culpa exclusiva da vítima também pode haver a culpa
concorrente, esta forma de culpa não quebra a relação de causalidade, mas atenua a
responsabilidade.
O fato de terceiro também é excludente de responsabilidade. O fato deve
ser exclusivo, caso contrário, será concorrente e, neste caso, haverá responsabilidade. É
o que se verifica no artigo 942 do Código Civil: “...se a ofensa tiver mais de um autor,
todos responderão solidariamente pela reparação.”
Outra excludente de responsabilidade são as hipóteses de caso fortuito e
força maior. Nesta verificam-se os casos da natureza, imprevisíveis, inevitáveis e
estranhos a vontade das partes. No caso fortuito, ocorrem acontecimentos imprevisíveis
e inevitáveis que guardam relação com o agente ou com a atividade desenvolvida por
ele.
Todas essas excludentes interferem na responsabilidade civil pois atacam
a relação de causalidade. Deixará de existir a responsabilidade se a conduta do agente
não for a causa do dano e, incidirá de forma atenuada a responsabilidade civil, se a
conduta do agente não foi causa única.
Atenta Maria Helena Diniz que todas essas causas excludentes “deverão
ser devidamente comprovadas e examinadas com cuidado pelo órgão judicante por
importarem em exoneração do ofensor, deixando o lesado sem a composição do dano
sofrido.”66
Além das excludentes examinadas acima, há as previstas no já referido
artigo 188 do Código Civil: atos praticados em legítima defesa ou no exercício regular
de um direito reconhecido e a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a
pessoa, a fim de remover perigo iminente.
Ademais, além dessas excludentes de responsabilidade, encontra-se na
esfera da responsabilidade contratual, a cláusula de não indenizar que é um pacto
estabelecido, em contrato, que isenta de responsabilidade uma das partes contraentes.
Está cláusula de não indenizar aplicá-se somente nos contatos.67

3.4. Dano

65
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, p. 110.
66
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, p. 114.
67
Consultar Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, p. 179 e Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, págs.
114/115.
30

O dano68 é um dos pressupostos caracterizadores da responsabilidade


civil tanto a contratual quanto a extracontratual69. Visto que o sentido de
responsabilidade civil que interessa a este trabalho é o de reparar o dano causado,
caberá neste item a análise do dano e, em particular, do dano moral. Entretanto, esta
análise restringir-se-á aos limites do presente trabalho.
Alcino de Paula Salazar conceitua dano, em sentido amplo, como “toda e
qualquer subtração ou diminuição imposta ao complexo de nossos bens, das utilidades
que formam ou propiciam o nosso bem estar; tudo o que, em suma, nos suprime uma
utilidade, um motivo de prazer ou nos impõe um sofrimento é dano, tomada a palavra
na sua significação genérica.”70
Como um dos requisitos necessários para que se configure a
responsabilidade civil, não havendo dano não há o que se indenizar. Cabe aqui a
doutrina de José de Aguiar Dias: “com efeito, a unanimidade dos autores convém em
que não pode haver responsabilidade sem a existência de um dano, e é verdadeiro
truísmo sustentar esse princípio, porque resultando a responsabilidade civil em
obrigação de ressarcir, logicamente não pode concretizar-se onde nada há que
reparar.”71
Maria Helena Diniz defini dano “como a lesão (diminuição ou
destruição) que, devido a um certo evento, sofre uma pessoa, contra sua vontade, em
qualquer bem ou interesse jurídico, patrimonial ou moral.”72
Caio Mário da Silva Pereira opta pela definição de dano como “toda
ofensa a um bem jurídico (grifo do autor)”73
Para Clayton Reis, “o dano deve ser considerado como uma lesão a um
direito, que produza imediato reflexo no patrimônio material ou imaterial do ofendido,
de forma a acarretar-lhe a sensação de perda.”74
Dano é lesão a um bem jurídico, que pode ser de ordem patrimonial ou
de natureza não patrimonial, ou seja, dano moral. O dano material abrange tudo aquilo
que o sujeito perdeu ou que efetivamente deixou de ganhar, abrangendo o dano

68
Em sentido comum, dano significa “todo mal ou ofensa que tenha uma pessoa causado a outrem, da
qual possa resultar uma deterioração ou destruição à coisa dele ou um prejuízo a seu patrimônio.” De
Plácido e Silva, Vocabulário, cit., p. 02.
69
Esta distinção, responsabilidade contratual e extracontratual, será vista em item seguinte.
70
Alcino de Paula Salazar, Reparação do dano moral, Rio de Janeiro: s.n., 1943, p. 125.
71
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade, cit., p. 832.
72
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, p. 66.
73
Caio Mário da Silva Pereira, Responsabilidade, cit., p.53.
74
Clayton Reis, Avaliação do dano moral, Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 04.
31

emergente (aquilo que efetivamente se perdeu, a diminuição do patrimônio), os lucros


cessantes (aquilo que razoavelmente se deixou de ganhar, a privação do patrimônio) e as
perdas e danos, que, em se tratando de responsabilidade contratual, podem ser
estipuladas previamente.75
Devem ser observados os seguintes requisitos para que o dano seja
indenizável: a diminuição de um bem jurídico, seja patrimonial ou moral; a certeza do
dano, não se indeniza o dano hipotético ou a perda uma chance; a causalidade entre a
conduta do agente e o dano experimentado pela vítima; a subsistência do dano, deve
haver prejuízo a ser reparado, de modo que se o agente causador do dano, já o reparou,
não há mais prejuízo a ser cobrado; legitimidade, só pode reclamar indenização o
verdadeiro titular do direito atingido ou seus beneficiários e, finalmente, deve haver
ausência de causas excludentes de responsabilidade.76
A respeito do requisito certeza, esclarece Antonio Jeová Santos que: “a
simples possibilidade de dano, a situação meramente hipotética, não chegará a ser dano
moral. A certeza do dano está vinculada à conseqüência que esse dano originou no
espírito da vítima. Se causou angústia, vergonha, humilhação etc., o dano é atual e certo
na sua existência. O reverso do dano certo e atual é o futuro, considerado como perda de
chance. Para certos doutrinadores, o dano moral é sempre atual e transitório. Ele não
permanece na pessoa de forma duradoura, nem se perpetua.” 77
Para que se configure a responsabilidade civil é imprescindível a
existência de um dano, seja em virtude de ação ou omissão do agente causador, de
modo que não havendo o dano, não se fala em responsabilidade, nem em obrigação de
indenizar. Havendo dano, sempre que possível, deverá o agente causador restabelecer a
situação anterior ao evento danoso.78
Ensina Silvio Rodrigues que “princípio geral de direito, informador de
toda a teoria da responsabilidade, encontradiço no ordenamento jurídico de todos os

75
Consultar artigos 402 e 403 do Código Civil e, também, Maria Helena Diniz, Curso, cit., págs. 71/72;
João Casillo, Dano à pessoa e sua indenização, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1987, p. 28 :
“...o conceito de dano deve vir acoplado ao de diminuição, empobrecimento, perda mensurável.”
76
De acordo com Maria Helena Diniz, Curso, cit., v.7, págs. 67/69.
77
Antonio Jeová Santos, Dano moral indenizável, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 4.ed., 2003,
p. 105.
78
Consultar Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, p. 17: “procurar-se-á sempre que possível conduzir a
vítima ou seus herdeiros à situação anterior à lesão sofrida, mediante a restauração ou reconstituição
natural (que nem sempre é possível – morte, calúnia, injúria, e mesmo quando possível é insuficiente para
reparar integralmente o dano) e, o recurso à situação material correspondente ou indenização por
equivalente. Neste último caso operar-se-á uma conversão da obrigação em dívida de valor (CC, art. 947),
garantindo-se sempre o restabelecimento total do equilíbrio violado pelo evento danoso.”
32

povos civilizados e sem o qual a vida social é quase inconcebível, é aquele que impõe a
quem causa dano a outrem o dever de o reparar.”79

3.4.1. Dano moral

Por muitos anos, doutrina e jurisprudência não reconheciam os danos


morais. A uma, porque não havia legislação específica e a duas, em vista da dificuldade
em se quantificar a dor, a tristeza, o sofrimento, sentimentos que não se vêem, apenas se
sentem. Assim, questiona Georges Ripert: “se é certo que a lei civil sanciona o dever
moral de não prejudicar outrem, como poderia ela, que defende o corpo e os bens, ficar
indiferente em presença do ato prejudicial que atinge a alma?”80
Com o passar dos anos, a maioria da doutrina manifestou-se
favoravelmente à possibilidade de indenização por danos morais. Lentamente, a
jurisprudência também demonstrou aceitação pela indenização por danos morais. Silvio
Rodrigues anota que: “no que concerne à posição de jurisprudência brasileira em
relação à ressarcibilidade do dano moral, poder-se-ia afirmar que até há uns 25 anos
atrás, eram escassíssimas, se é que existentes, as decisões de tribunais superiores
admitindo a indenização do dano moral.”81
O dano moral é a lesão a um direito personalíssimo, esclarece Carlos
Alberto Bittar que os direitos personalíssimos são aqueles que “voltam-se, pois, para
aspectos íntimos da pessoa, ou seja, tomada esta em si, como ente individualizado na
sociedade. A pessoa é protegida em seus mais íntimos valores e em suas projeções na
sociedade. Abrangem, portanto, o complexo valorativo intrínseco (intelectual e moral) e
extrínseco (físico) do ente, alcançando a pessoa em si, ou integrada à sociedade (...)”82.
Atingindo bens personalíssimos, o dano moral revela-se na dor,
aborrecimento, sofrimento, tristeza. Sentimentos anormalmente vividos pela pessoa em
razão da prática de ato ilícito, incomuns do dia-a-dia. Carlos Alberto Menezes Direito e
Sérgio Cavalieri Filho, anotam que “mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou
sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de

79
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, p.13.
80
Georges Ripert citado por Artur Oscar de Oliveira Deda, A proteção dos direitos da personalidade,
Grandes temas da atualidade – dano moral – aspectos constitucionais, civis, penais e trabalhistas, coord.
Eduardo de Oliveira Leite, Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 43.
81
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, p. 192.
82
Carlos Alberto Bittar, Os direitos da personalidade, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 6.ed., 2003,
p.30.
33

fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os


amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto
de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos
por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos
mais triviais aborrecimentos.”83
Observa Sílvio de Salvo Venosa que “é importante o critério objetivo do
homem médio, o bonus pater famílias: não se levará em conta o psiquismo do homem
excessivamente sensível, que se aborrece com fatos diuturnos da vida, nem o homem de
pouca ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre às rudezas do destino.”84
O dano moral foi reconhecido expressamente pela Constituição Federal
de 1988, no artigo 5º, incisos V e X, pois, antes do Código Civil de 1916, em princípio,
não se cogitava o dano moral, tanto que o antigo Código não trazia disposição
expressa85 como a Carta Magna.
O atual Código Civil, por sua vez, faz referência ao dano moral no artigo
186, e, novamente, se faz referência ao Projeto 6960, que propõe o acréscimo do
parágrafo segundo ao artigo 944, referindo-se também ao dano moral. Este artigo
determina no caput que a indenização se mede pela extensão do dano, todavia, se
houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz
reduzir eqüitativamente a indenização (parágrafo único). A proposta do referido Projeto
traz a seguinte redação: “§2º. A reparação do dano moral deve constituir-se em
compensação ao lesado e adequado desestímulo ao lesante.”
A fim de conceituar dano moral, destacam-se duas correntes doutrinárias:
a que se baseia na natureza do direito subjetivo violado e a que se fundamenta nos
efeitos da ofensa.86
Roberto Brebbia é adepto da primeira corrente, afirma que “de todas las
clasificaciones que se formulan de los daños reconocidos por el Derecho, es, sin dejar
lugar a la menor duda, la más importante, la distinción que se efectúa teniendo en

83
Carlos Alberto Menezes Direito e Sérgio Cavalieri Filho, Comentários, cit., p 103.
84
Sílvio de Salvo Venosa, Direito, cit., v. 4, p. 39.
85
Isso não significa que o dano moral não era indenizado, era intuído, por exemplo, nos antigos artigos
76 (artigo sem correspondência), 159 (atual 186), 1.537 (atual 948) e 1.538, §2º (atual 949), 1.543 (atual
952, parágrafo único), 1.547 (atual 953), 1.550 (atual 954), 1.548, 1.553 (atual 946), também se cogitava
o dano moral nas leis nº 4.417/62, art. 84 e na lei de imprensa, lei nº 5.250/67, artigo 53. Consultar Paulo
Esteves et al, Dano moral, São Paulo: Editora Fisco e Contribuinte Ltda, 1.ed., 1999, págs. 37/42.
86
Consultar: Artur Oscar de Oliveira Deda, A proteção, cit., págs. 43/44; Antonio Jeová Santos, Dano,
cit., págs. 92/94 e José Antonio Remédio et al, Dano moral – doutrina, jurisprudência e legislação, São
Paulo: Saraiva, 2000, p. 18/19.
34

cuenta la naturaleza del derecho subjetivo violado, o, lo que es lo mismo, del bien
jurídico menoscabado.”87
José Aguiar Dias, contrariamente, é defensor da segunda corrente,
entende que “o dano moral é o efeito não-patrimonial da lesão de direito e não a própria
lesão abstratamente considerada.”88 No mesmo sentido Artur Oscar de Oliveira Deda
que também é defensor da corrente que se fundamenta nos efeitos da ofensa: “não sendo
caracterizador do dano moral a natureza do direito afetado, mas a conseqüência da
lesão, não é exclusivamente extrapatrimonial o efeito da violação de direito da
personalidade.” Argumenta que: “do ataque a um bem jurídico de valor econômico pode
resultar uma perda inestimável pecuniariamente, da mesma sorte que, por outro lado, da
ofensa a um direito subjetivo extrapatrimonial podem resultar prejuízos materiais.”89
Observa Yussef Said Cahali que a doutrina estabelece dois critérios para
caracterizar o dano moral, um, insuficiente segundo o próprio autor, pois se baseia na
exclusão, contrapondo-se ao dano patrimonial, ou seja, se o dano não for patrimonial
será moral90 e, o segundo critério, que para o autor parece ser o mais razoável,
caracteriza o dano moral pelos seus próprios elementos.91 Nesse sentido, referido autor
aponta que: “na realidade, multifacetário o ser anímico, tudo aquilo que molesta
gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à
sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se,
em linha de princípio, como dano moral; não há como enumerá-los exaustivamente,
evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente
querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação,
na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da

87
Roberto Brebbia, El dano moral – doctrina - legislación – jurisprudência, precedida de uma teoria
jurídica del dano, Buenos Aires: Orbir, 2.ed., 1967, p. 57. Tradução: “de todas as classificações que
foram formuladas sobre os danos e que o Direito reconheceu, sem dúvida, a mais importante é a que leva
em consideração a natureza do direito subjetivo violado, ou seja, do bem jurídico menosprezado.”
88
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade, cit., p. 861.
89
Artur Oscar de Oliveira Deda, A proteção, cit., p. 43. Consultar também: Artur Oscar de Oliveira Deda,
A reparação dos danos morais, São Paulo: Saraiva, 2000, p.08.
90
Neste critério, como visto, é adepto, José de Aguiar Dias, Da Responsabilidade, cit., p. 861 e, também,
Orlando Gomes, Obrigações, cit., p. 271, afirma que : “Ocorrem as duas hipóteses. Assim, o atentado ao
direito à honra e à boa fama de alguém pode determinar prejuízos na órbita patrimonial do ofendido ou
causar apenas sofrimento moral. A expressão dano moral deve ser reservada exclusivamente para
designar o agravo que não produz qualquer efeito patrimonial. Se há conseqüências de ordem patrimonial,
ainda que mediante repercussão, o dano deixa de ser extrapatrimonial.”
91
Yussef Said Cahali, Dano moral, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2.ed., 2000, págs. 19/20.
35

normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste


psicológico, nas situações de constrangimento moral.”92
Na doutrina destacam-se os seguintes conceitos entre outros93:
Carlos Alberto Bittar qualifica os danos morais “em razão da esfera da
subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato
violador, havendo-se, portanto, como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos
da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria
valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração
social).”94
Eduardo A. Zannoni apresenta a seguinte definição: “denomínase daño
moral – o agravio moral – al menoscabo o lesión a intereses no patrimoniales provocado
por el evento dañoso, es decir, por el hecho o acto antijurídico.”95
Wilson Melo Silva defini danos morais como “lesões sofridas pelo
sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por
patrimônio ideal, em contraposição a patrimônio material, tudo aquilo que não seja
susceptível de valor econômico.”96
De acordo com Maria Helena Diniz: “o dano moral vem a ser lesão de
interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica, provocada pelo fato lesivo.”97
Humberto Theodoro Júnior afirma que: “são danos morais os ocorridos
na esfera da subjetividade, ou no plano valorativo da pessoa na sociedade, alcançando
os aspectos mais íntimos da personalidade humana (“o da intimidade e da consideração

92
Yussef Said Cahali, Dano, cit., p. 20/21.
93
Consultar: Antonio Jeová Santos, Dano, cit., págs. 94/95; Augusto Zenun, Dano moral e sua
reparação, Rio de Janeiro: Forense, 5.ed., 1997, p. 84; Marcius Geraldo Porto de Oliveira, Dano moral –
proteção jurídica da consciência. Leme: LED – Editora de Direito, 3.ed., 2003, p. 41; Renato
Scognamiglio, El daño moral – contribución a la Teoría del Daño Extracontractual, Bogotá: Publicacion
de la Universidad Externado de Colômbia, 1962, p. 36; Ramón Daniel Pizarro, Daño moral - prevención.
reparación punición – el dano moral en las diversas ramas del Derecho, Buenos Aires: Hammurabi,
2000 p. 36; João Casillo, Dano, cit., p. 41; Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4, p. 189; Caio Mário da
Silva Pereira, Responsabilidade, cit., p. 53; Sílvio de Salvo Venosa, Direito, cit., v. 4, p. 39; Américo
Luís Martins da Silva, O dano moral e a sua reparação civil, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2.ed., 2002, págs. 36/38; Mário Moacyr Porto, Temas de responsabilidade civil, São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 1989, p. 33; Cesare Baldi, Responsabilità civile – manuale pratico, Torino: Fratelli
Bocca, Editori, 1908, págs. 207/208; Edgard de Moura Bittencourt, Dano moral, RT 268/837; Clayton
Reis, dano, cit., págs. 05/07; Arnoldo Wald, Direito, cit., p. 577.
94
Carlos Alberto Bittar, Reparação, cit., p. 41.
95
Eduardo A. Zannoni, El daño moral en la responsabilidad civil, Buenos Aires: Editorial Astrea, 2.ed.,
1993, p. 287. Tradução: “denomina-se dano moral – o agravo moral – o menoscabo ou lesão a interesses
não-patrimoniais provocados pelo evento danoso, é dizer, pelo fato ou ato antijurídico.”
96
Wilson Melo Silva, O dano moral e sua reparação, Belo Horizonte: s.n., 1949, p.07.
97
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, p. 90.
36

pessoal”), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (“o da


reputação ou da consideração social”)”98
Conclui-se que dano moral é a lesão decorrente de ato ilícito que fere os
direitos da personalidade99 de pessoa física ou jurídica.
Referindo-se ao dano moral na união sem casamento, Carlos Alberto
Bittar afirma que: “em relação concubinária, ou seja, união sem casamento, é comum a
ocorrência desses danos, pois, desaparecido o interesse, podem aflorar os sentimentos
negativos, provocando-se então fissuras na moralidade da vítima, por força de
investidas indevidas do agente.”100
Também defende a possibilidade de indenização por dano moral no
rompimento culposo da união estável, Vitor Ugo Oltramari: “todos os prejuízos
causados pelas contrariedades, desequilíbrios, tensões e outros distúrbios na área do
psiquismo do companheiro ofendido pelo comportamento culposo do seu par
constituem dano moral, que, evidentemente, precisa ser ressarcido. Mesmo não havendo
previsão específica na regulamentação legal da união estável, a regra geral da
responsabilização civil do ato ilícito (arts. 186 e 927) garante a possibilidade do seu
ressarcimento.”101
No mesmo sentido, Belmiro Pedro Welter: “é perfeitamente possível a
concessão de indenização decorrente de dano moral em caso de união estável. A palavra
moral, que vem sofrendo deturpações ao longo dos tempos, deve ser entendida como o
complexo dos bens decorrentes de sua dignidade de pessoa, de seus sentimentos de
estima e de luta por sua realização existencial. Não existe no mundo valor pecuniário
que pague a perda da auto-estima ou a sensação de frustração e de derrota em face da
vida. Ora, esses danos podem e devem ser reduzidos, quando obtiverem a devida
reparação, mesmo que seja em moeda corrente.”102

98
Humberto Theodoro Júnior, Dano moral, São Paulo: Juarez de Oliveira, 4.ed., 2001, p. 02.
99
Carlos Alberto Bittar, Os direitos, cit., p. 10, defini direitos da personalidade como: “a) os próprios da
pessoa em si (ou originários), existentes por sua natureza, como ente humano, com o nascimento; b) e os
referentes às suas projeções para o mundo exterior (a pessoa como ente moral e social, ou seja, em seu
relacionamento com a sociedade)”.
100
Carlos Alberto Bittar, Reparação, cit., p.181.
101
Vitor Ugo Oltramari, O dano moral, cit., p. 133.
102
Belmiro Pedro Welter, Dano moral na separação, divórcio e união estável, Revista dos Tribunais, v.
775, p. 130, maio de 2000.
37

4. RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL E


EXTRACONTRATUAL

Levando em consideração o fato gerador103, a responsabilidade civil pode


ser contratual ou extracontratual, no entanto, ambas as formas são reguladas pelos
mesmos princípios, por serem espécies de um mesmo gênero, que é a responsabilidade
civil e, segundo José de Aguiar Dias, “a idéia de responsabilidade é una.”104
Os princípios que informam estas duas modalidades de responsabilidade
civil são: a conduta humana que pode se dar através de ação ou omissão, o dano que
tanto pode ser moral como patrimonial, o nexo causal entre o dano e a conduta humana
e a culpa.105
Na responsabilidade civil contratual, também chamada por Sérgio
Cavalieri Filho de ilícito contratual ou relativo106, há um vínculo que estabelece uma
relação pré-determinada entre as partes, ou seja, há um contrato entre as partes, cuja
inexecução, gera responsabilidade. Já na responsabilidade extracontratual, também
chamada aquiliana ou de ilícito aquiliano ou absoluto107, não existe um contrato entre as
partes, a responsabilidade advém do ilícito.108
Segundo Sílvio de Salvo Venosa, “o ato ilícito, portanto, tanto pode
decorrer de contrato como de relação extracontratual.”109E acrescenta Georgette

103
A responsabilidade civil pode ser classificada considerando: 1) seu fato gerador – hipótese onde se tem
a responsabilidade civil contratual e a extracontratual; 2) seu fundamento – neste caso há que se analisar a
culpa, pois será subjetiva a responsabilidade fundada na culpa e objetiva a que se fundar no risco e, 3)
considerando seu agente – nesta hipótese a responsabilidade será direta quando o agente responde por ato
próprio e indireta se resultar de ato de terceira pessoa, de fato de animal ou coisa inaminada sob a guarda
do agente. Ver Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7, págs. 126/128.
104
José de Aguiar Dias Da responsabilidade civil, cit., p.149.
105
Ver Antonio Lindbergh C. Montenegro, Ressarcimento de danos pessoais e materiais, Rio de Janeiro:
Editora Lúmen Júris, 6.ed., 1999, p. 4 , que citando Savatier doutrina que “a responsabilidade contratual
vem sempre amparada na culpa, ao passo que a extracontratual ora se funda na culpa, ora no risco.”
Também esclarece Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil, cit., p. 25, que: “ a doutrina moderna, sob certos
aspectos, aproxima as duas modalidades, pois a culpa vista de forma unitária é fundamento genérico da
responsabilidade. Uma e outra fundam-se na culpa. Na culpa contratual, porém, examinamos o
inadimplemento como seu fundamento e os termos e limites da obrigação. Na culpa aquiliana ou
extranegocial, levamos em conta a conduta do agente e a culpa em sentido lato.” Ver também, Silvio
Rodrigues, Direito Civil, cit., v. 4, p. 09.
106
Sergio Cavalieri Filho, Programa, cit., p. 38.
107
Sergio Cavalieri Filho, Programa, cit., p. 38.
108
Ver Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge, Ensaio, cit., p. 38; Sergio Cavalieri Filho, Programa, cit.,
p. 38; Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade, cit., p. 21; Rogério Marrone de Castro Sampaio,
Direito, cit., p. 24; Silvio Rodrigues, Direito civil, cit., v. 4, p. 09; Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 7,
págs. 127/128; Orlando Gomes, Obrigações, Rio de Janeiro: Forense, 15.ed., 2000, p. 278 e Atilio Aníbal
Alterini, Responsabilidad civil, Buenos Aires: Abeledo - _Perrot, 2.ed., 2. reimpr., s.d., p. 28.
109
Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil, São Paulo: Atlas, v. 1, 4.ed., 2004, p. 609.
38

Nacarato Nazo que “quem pratica ato ilícito deve reparar o dano, porque incorre em
responsabilidade.”110
No artigo 389 do Código Civil e seguintes, sob o título do
inadimplemento das obrigações, está disciplinada a responsabilidade contratual que
consiste na responsabilidade resultante do inadimplemento de uma obrigação
preexistente. Segundo José de Aguiar Dias, a responsabilidade civil contratual
“pressupõe um contrato válido, concluído entre o responsável e a vítima” e, deste
conceito, o autor retira três elementos: “a existência do contrato; a sua validade,
envolvendo, naturalmente, a questão da responsabilidade no caso de contrato nulo;
estipulação do contrato entre o responsável e a vítima.”111
A responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana112, por sua vez, está
disciplinada no artigo 186 do Código Civil, sob o título dos atos ilícitos. No capítulo
primeiro, item noções gerais, foi visto que no artigo 186 encontra-se a base da
responsabilidade civil subjetiva ou clássica, baseada na culpa. Tal artigo prevê que
aquele que causar dano a outrem, por ação ou omissão, de forma culposa ou dolosa, fica
obrigado a repará-lo, mesmo que este dano seja exclusivamente moral. Verifica-se aqui
a forma dolosa porque, como já visto no item 3.2 do capítulo I, o Código refere-se à
culpa em sentido amplo, abrangendo a culpa em sentido estrito (negligência, imperícia e
imprudência) e também, o dolo que é a culpa grave, com intenção de causar prejuízo.
Visto que na responsabilidade civil extracontratual, nenhum vínculo
preexistente há entre as partes, de modo que são mais numerosas as situações que
podem advir do ato ilícito, observa Washington de Barros Monteiro, “nas mais diversas
relações podem surgir danos, diante da prática de ato ilícito, desde as relações de família
– núcleo essencial da nação – até as relações entre o Estado e os membros de uma
nação.”113

110
Georgette Nacarato Nazo, Da responsabilidade civil no pré-contrato de casamento, São Paulo: José
Bushatsky Editor, 1976, p. 104.
111
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade civil, cit., p. 157.
112
Explica Álvaro Villaça Azevedo, Curso, cit., p. 254, que: “a responsabilidade extracontratual é
também conhecida por responsabilidade aquiliana, tendo em vista a Lex Aquilia de damno (do Século III
a. C.) cuidou de estabelecer, no Direito Romano, as bases jurídicas dessa espécie de responsabilidade
civil, criando uma forma pecuniária de indenização do dano, assentada no estabelecimento de seu valor.”
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade civil, cit., p. 21, ensina que: “É na lei Aquília que se esboça,
afinal, um princípio geral regulador da reparação do dano. Embora se reconheça que não contivesse ainda
“uma regra de conjunto, nos moldes do direito moderno”, era, sem nenhuma dúvida, o germe da
jurisprudência clássica com relação à injúria, e “fonte direita da moderna concepção da culpa aquiliana
que tomou da lei Aquília o seu nome característico.”
113
Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., p. 447.
39

De acordo com Álvaro Villaça Azevedo “da responsabilidade


extracontratual, então, surgem duas sub-espécies: a responsabilidade delitual ou por ato
ilícito, que resulta da existência deste fora do contrato, baseada na idéia de culpa, e a
responsabilidade sem culpa, fundada no risco.”114
Em razão de ambas as formas de responsabilidade civil serem regidas
pelos mesmos princípios e terem a mesma conseqüência, reparar o dano, alguns autores,
os adeptos da teoria unitária ou monista, entendem que não é necessária distinção entre
responsabilidade civil contratual e extracontratual.115 Outros, porém, adeptos da teoria
dualista ou clássica, entendem que a distinção deve prevalecer, principalmente no que
diz respeito ao ônus da prova. 116
Nesse sentido, aponta Washington de Barros Monteiro, “na
responsabilidade contratual o inadimplemento de dever pré-assumido gera, por si só, o
dever de reparar o dano, enquanto na responsabilidade extracontratual a vítima deverá
demonstrar que a ação lesiva foi culposa ou dolosa, ou seja, que o agente agiu com
negligência, imperícia ou imprudência, ou com vontade deliberada de causar o dano.”117
Outro ponto distintivo entre a responsabilidade contratual e
extracontratual leva em consideração sua origem, a contratual se origina de um contrato,
sendo que a extracontratual surge de um comportamento humano reprovável, ou seja,
surge do neminem laedere, do dever de não lesar, de não causar dano a ninguém.118
Mais uma diferenciação entre as duas espécies de responsabilidade civil
diz respeito à idade do agente causador do dano119. Na responsabilidade contratual a

114
Álvaro Villaça Azevedo, Curso, cit., p. 256.
115
Ver Silvio Rodrigues, Direito civil, cit., v. 4, p. 10.
116
Explica Sérgio Cavalieri Filho, Programa, cit., p. 39, que “os adeptos da teoria unitária, ou monista,
criticam essa dicotomia, por entenderem que pouco importam os aspectos sobre os quais se apresente a
responsabilidade civil no cenário jurídico, já que os seus efeitos são uniformes. Contudo, nos códigos dos
países em geral, inclusive no Brasil, tem sido acolhida a tese dualista ou clássica.” Ver Carlos Roberto
Gonçalves, Responsabilidade, cit., p. 22 e Silvio Rodrigues, Direito Civil, cit., p. 10, diz que: “dentro do
sistema do Código brasileiro a distinção deve ser mantida, pois, enquanto os seus arts. 389 e s. cuidam da
responsabilidade contratual, seu art. 186, conjugado com o art. 927, trata da responsabilidade aquiliana.”
A respeito ver Antonio Lindbergh C. Montenegro, Ressarcimento, cit., p. 5.
117
Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., p. 451. Atenta o autor que esta inversão do ônus da prova
na responsabilidade civil contratual ocorre apenas nas obrigações de resultado, pois nas obrigações de
meio, em que a parte obriga-se a se utilizar de todos os meios ao seu alcance para atingir um determinado
fim, faz-se necessária a prova de que o inadimplente não agiu com a diligência indispensável à
consecução do fim desejado pelo outro contratante. Ver também Arnoldo Wald, Direito das obrigações –
Teoria geral das obrigações e contratos civis e comerciais, São Paulo: Malheiros Editores, 15.ed., 2001,
p. 570 e Dilvanir José da Costa, Sistema de Direito Civil à luz do novo Código, Rio de Janeiro: Forense,
2003, p. 358.
118
Ver Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade, cit., p. 23 e Antonio Lindbergh C. Montenegro,
Ressarcimento, cit., p. 3.
119
Ver Rogério Marrone de Castro Sampaio, Direito Civil, cit., p. 25/26 e Carlos Roberto Gonçalves,
Responsabilidade, cit., p. 24.
40

capacidade do agente é limitada, ou seja, para que se tenha uma convenção válida é
necessária a capacidade das partes ao tempo da celebração sob pena de nulidade, desta
forma, o menor somente será responsabilizado se celebrar o contrato devidamente
assistido, exceto se dolosamente declarar-se maior à outra parte120, ao passo que na
responsabilidade extracontratual, o ato ilícito pode ser praticado por qualquer pessoa,
capaz ou não, ademais, o ato praticado por um incapaz pode estender a responsabilidade
àquele encarregado de sua guarda, é o que dispõe o artigo 928 do Código Civil: “O
incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não
tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes.”
Regis Fichtner Pereira aponta vantagens e desvantagens dada a “ausência
de uma maior concretização das regras jurídicas que tratam da responsabilidade civil
extracontratual”, segundo o autor, “a principal vantagem consiste no dinamismo que se
imprime ao tema, graças ao caráter aberto das normas incidentes, que possibilita à
jurisprudência maior liberdade para adaptar as soluções às novas necessidades surgidas
do desenvolvimento das relações sociais. A principal desvantagem decorre da ausência
de parâmetros claros e seguros, dentro dos quais se pode, com boa probabilidade de
acerto, afirmar, diante de determinado caso concreto, se existe ou não o dever de
indenizar.”121
No âmbito da aplicação da responsabilidade civil no direito de família,
justifica-se a responsabilidade civil extracontratual que pode surgir, como já visto, do
cometimento de um ato ilícito, ainda que o dano causado seja exclusivamente moral.

120
De acordo com o artigo 180 do Código Civil: “o menor, entre 16 (dezesseis) e 18 (dezoito) anos, não
pode, para eximir-se de uma obrigação, invocar a sua idade se dolosamente a ocultou quando inquirido
pela outra parte, ou se, no ato de obrigar-se, declarou-se maior.”
121
Regis Fichtner Pereira, A responsabilidade, cit., p. 16.
41

CAPÍTULO II – RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO DE FAMÍLIA

A família considerada como a base da sociedade concentra poderes


econômicos, religiosos, sociais e morais. Afirma Silvio Rodrigues que “dentro dos
quadros de nossa civilização, a família constitui a base de toda a estrutura da sociedade.
Nela se assentam não só as colunas econômicas, como se esteiam as raízes morais da
organização social.”122
A qualificação da família como a base da sociedade123 consiste no fato de
que as relações que se desenvolvem do convívio entre o homem e a mulher, como
alimentos, casamento, sucessão e, que são de interesse imediato do indivíduo, também
são de interesse da sociedade porque visam preservar a harmonia social ao mesmo
tempo em que garantem a estabilidade familiar.
Para Carlos Alberto Bittar, justifica-se a família como base da sociedade,
porque “ é na família que se geram, se formam e se educam pessoas para a perpetuação
da espécie e, em consequência, se contribui para a manutenção e o desenvolvimento do
Estado, mediante a introdução na sociedade de pessoas aptas a nela integrar-se e a
responder por sua missão.”124
Conforme doutrina Sérgio Gischkow Pereira “uma família que
experimente do afeto, da liberdade, da veracidade, da responsabilidade mútua, haverá de
gerar um grupo familiar não fechado egoisticamente em si mesmo, mas sim, voltado
para as angústias e problemas de toda a coletividade, passo relevante à correção das
injustiças sociais.”125
Família, anota Carmem Lucia Silveira Ramos, “é palavra que traduz,
simultaneamente a um fenômeno eminentemente histórico, uma história de vida,
envolvendo laços fortes, selando destinos e interesses diversos, assim como modelos de
hierarquia, relações de poder e processos de negociação interna, sendo interpretada
usualmente com um sentido de participação, de comunidade de vida, tanto no plano da
realização pessoal, quanto no âmbito material.”126

122
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 6, p. 05.
123
De acordo com o artigo 226, caput, da Constituição Federal de 1988, que dispõe: “A família, base da
sociedade, tem especial proteção do Estado.”
124
Carlos Alberto Bittar, Direito de família, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2.ed., 1993, p. 52.
125
Sérgio Gischkow Pereira, Concubinato – união estável, Repensando o Direito de Família – Anais do I
Congresso Brasileiro de Direito de Família, coord. Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizonte: IBDFAM,
1999, p. 36.
126
Carmem Lucia Silveira Ramos, Família sem casamento: de relação existencial de fato a realidade
jurídica, Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p.39.
42

José Cretella Júnior ao comentar o artigo 226 da Constituição Federal de


1988, aduz que com “a nova regra jurídica constitucional, não pode mais a doutrina
aceitar o conceito de família como o conjunto de pessoas ligadas pelo vínculo da
consangüinidade.” (grifos do autor) Acrescenta que “no direito brasileiro atual, o
legislador constituinte, auscultando a vontade da maioria do povo que representa, teve a
coragem necessária para libertar-se dos preconceitos passados, colocando, no texto, o
que observou na realidade diária.”127
De fato, as leis humanas modificam-se segundo os tempos, os lugares e o
desenvolvimento intelectual.
Assim, o conceito de família, atualmente, não está ligado a casamento,
temos a família que decorre deste, mas também a que surge de fato natural como a
união estável, além daquela formada por pais e mães solteiras, bem como a família
substitutiva.
Desta forma, incorporando a realidade, a Constituição Federal de 1988,
reconhece que o casamento não é o único meio de se constituir família, consagrando a
união estável, como entidade familiar, no artigo 226, §3º e admitindo a família
monoparental, também como entidade familiar, no artigo 226, §4º.128 Conforme José
Carlos Barbosa Moreira, “a partir daí, deixou de gozar o casamento da aptidão exclusiva
para servir de fundamento à família.”129
Segundo Rui Geraldo Camargo Viana, atualmente, encontra-se a família
com uma pluralidade de tipos, referindo-se à família nuclear, que abrange o casal e seus
filhos e à família monoparental.130

127
José Cretella Júnior, Comentários à Constituição de 1988, Rio de Janeiro: Forense, v. 8, arts, 170 a
232, 1994, p. 4526.
128
À união estável será dedicado o capítulo quarto deste trabalho. Em relação à família monoparental,
dispõe o artigo 226, §4º: “Entende-se, também, como entidade familiar a comunhão formada por qualquer
dos pais e seus descendentes”. Eduardo de Oliveira Leite, Famílias monoparentais, São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2.ed., 2003, p.22, defini família monoparental como aquela em que “a pessoa
considerada (homem ou mulher) encontra-se sem cônjuge, ou companheiro, e vive com uma ou várias
crianças.”
129
José Carlos Barbosa Moreira, O novo Código Civil e a união estável, Revista de Direito Privado, n.13,
ano 4, janeiro –março 2003, p.53
130
Rui Geraldo Camargo Viana, A família, Temas atuais de Direito Civil na Constituição Federal, org.
Rui Geraldo Camargo Viana e Rosa Maria de Andrade Nery, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2000, págs. 38/39.
43

Anota Rodrigo da Cunha Pereira que “a partir do momento em que a


família deixou de ser o núcleo econômico e de reprodução para ser o espaço do afeto e
do amor, surgiram novas e várias representações sociais para ela.”131
Verifica-se que houve modificação na estrutura familiar, o próprio
conceito de família foi se modificando com o tempo, procurando se amoldar com a
realidade social com que se deparava, em razão do desenvolvimento social e econômico
sofrido pela sociedade, bem como em razão da influência exercida pela religião.132
É nesse sentido a lição de José Lamartine Corrêa de Oliveira e Francisco
José Ferreira Muniz: “A família transforma-se no sentido de que se acentuam as
relações de sentimentos entre os membros do grupo: valorizam-se as funções afetivas da
família que se torna o refúgio privilegiado das pessoas contra a agitação da vida nas
grandes cidades e das pressões econômicas e sociais.”133
Antigamente, em Roma, a figura do pater-famílias era o núcleo da
família, ele detinha todo o poder sobre a vida dos membros de sua família, inclusive
mulher e filhos. O pater-famílias detinha todo o patrimônio familiar, a família girava
em torno dele.134
Ensina José Carlos Moreira Alves que “são absolutos os poderes do pater
famílias sobre as pessoas e coisas a ele submetidas. É ele o chefe militar da família, seu
sacerdote e juiz; tem poder de vida e de morte sobre todos os membros da família –
pode, até, expor os filhos, ao nascerem; ou, depois, vendê-los, no estrangeiro, como
escravos. Todo o patrimônio da família lhe pertence; daí, tudo o que as pessoas, que lhe
são submetidas, adquirem passa a pertencer a ele. Somente ingressa na família quem o
pater famílias quiser; até os filhos de sua esposa ele deverá reconhecê-lo como seus. E

131
Rodrigo da Cunha Pereira, Da união estável, Direito de família e o novo Código Civil, coords. Maria
Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizonte: Del Rey, 3.ed., 2003, págs. 258/259.
132
Rosana Fachin, Do parentesco e da filiação, Direito de Família e o novo Código Civil, coords. Maria
Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizonte: Del Rey, 3.ed., 2003, págs. 134/135 cita em
nota de rodapé: “Assinala Gustavo Tepedino: “O quadro de intensas modificações ocorridas nas últimas
décadas no âmbito do direito de família revela, do ponto de vista fenomenológico, inegável transformação
da estrutura familiar, identificada amplamente pela doutrina e, especialmente, pelos cientistas sociais. (A
disciplina civil-constitucional das relações familiares. In: BARRETO, Vicente (org.). A nova família:
problemas e perspectivas. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 48.).”
133
José Lamartine Corrêa de Oliveira e Francisco José Ferreira Muniz, Curso de direito de família,
Curitiba: Juruá, 4.ed., 3ª tir., 2003, p. 13.
134
Thomas Marky, Curso elementar de Direito Romano, São Paulo: Saraiva, 1995, p. 153 e Sílvio de
Salvo Venosa, Direito Civil – Direito de Família, São Paulo: Atlas, 4.ed., v. 6, 2004, p. 16. Ensina José
Cretella Júnior, Curso de Direito Romano, Rio de Janeiro: Forense, 20.ed., 1997, p. 107, que “na família
romana, tudo converge para o paterfamilias do qual irradiam poderes em várias direções: sobre os
membros da família (patria potestas), sobre a mulher (manus), sobre as pessoas ‘in mancípio”
(mancipium), sobre os escravos (dominica potesas), sobre os bens (res) que lhe pertencem (dominium).”
44

para que uma pessoa alieni iuris saia de sua família é necessário que o pater famílias o
consinta, pela emancipação ou pela extinção da manus maritalis.”135
A família fundava-se no poder do pater e os membros de uma família
eram unidos pela religião e pelo culto que dedicavam aos seus antepassados136. Assim
sendo, os membros da família não eram ligados pelo afeto, este sentimento não tinha a
menor importância, segundo Fustel de Coulanges, “o arcabouço da família não era
tampouco o afeto natural, visto que os direitos grego e romano não tomavam na menor
conta esse sentimento. Poderia ele existir no íntimo dos corações, mas para o direito não
repousava nada (...) Os historiadores do direito romano, observando com acerto que
nem o nascimento nem o afeto foram alicerces da família romana, julgaram que tal
fundamento deveria residir no poder paterno ou no marido. Fazem desse poder uma
espécie de instituição primordial, mas não explicam como se constituiu, a não ser pela
superioridade da força do marido sobre a mulher e do pai sobre os filhos.”137
Observa-se a evolução do direito de família brasileiro, resultando na
modificação de seu conceito e, pode-se dizer, que essa evolução teve início com o
reconhecimento do importante papel que a mulher representa no seio de uma família.
Ensina Orlando Gomes que “outro é hoje o padrão do comportamento dos membros de
uma família nuclear. Não mais marido tirano, mulher submissa e filhos aterrados. O
ambiente familiar descontrai-se e as relações entre marido e mulher e entre pais e filhos
travam-se numa atmosfera bem diferente, cada qual desses membros do grupo
movendo-se com liberdade, ou ao menos compreensão dos outros, na esfera própria
(...)”138
O Código Civil de 1916 não demonstrou muitos avanços, ainda tratava a
mulher numa posição inferior ao homem, considerando-a relativamente incapaz e, o
homem era considerado o chefe da família.139 Com o advento do Estatuto da mulher
casada, Lei nº 4.121 de 1962 e, posteriormente, com a Lei do divórcio, Lei nº 6.515 de
1977, a mulher conquistou uma posição de respeito e libertou-se do tratamento injusto
que lhe era dispensado.

135
José Carlos Moreira Alves, Direito Romano, Rio de Janeiro: Forense, v.II, 4.ed., 1986, p. 294.
136
Ver Fustel de Coulanges, A cidade antiga, São Paulo: Editora Martin Claret, 2002, págs., 44/46.
137
Fustel de Coulanges, A cidade antiga, cit., p.45.
138
Orlando Gomes, Direito de família, Rio de Janeiro: Forense, 9.ed., 1997, págs.17/18.
139
O artigo 6º do CC/1916 que considerava a mulher relativamente incapaz foi alterado pelo Estatuto da
mulher casada, Lei n. 4.121/62 e o artigo 233 CC/1916 que considerava chefe da família o homem,
corresponde hoje ao artigo 1.567 CC/2002.
45

A principal mudança veio com a promulgação da Constituição Federal de


1988 que equiparou homem e mulher em direitos e obrigações (artigo 5º, I ) e conferiu o
exercício de direitos e deveres referentes à sociedade conjugal de forma igualitária entre
o homem e a mulher (artigo 226, §5º ).140
Euclides de Oliveira e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka
asseveram que: “a evolução se deu em etapas, com leis diversas, especialmente a partir
da década de 60 do século passado, alterando para melhor a figura e a posição da
mulher casada (Lei n.4.121/62) e instituindo o divórcio (Emenda Constitucional n. 9/77
e Lei n. 6.515/77) como instrumento para regularização da situação jurídica dos
descasados, que viessem a contrair novas uniões, então consideradas à margem da lei.
Mas a principal mudança, que se pode dizer revolucionária, veio com a Constituição
Federal de 1988, alargando o conceito de família e passando a proteger de forma
igualitária todos os seus membros, sejam os partícipes dessa união como também os
seus descendentes.”141
O novo Código Civil manteve as diretrizes constitucionais vigentes e
incorporou significativas modificações legislativas acerca do direito de família e
demonstrou poucas modificações em relação ao Código de 1916.142
Atualmente observa-se a valorização do afeto nas relações familiares, a
confiança e benevolência destacam-se no convívio entre cônjuges e conviventes e entre
pais e filhos, pois, “na idéia de família, o que mais importa – a cada um de seus
membros, e a todos a um só tempo – é exatamente pertencer ao seu âmago, é estar
naquele idealizado lugar onde é possível integrar sentimentos, esperanças e valores,
permitindo, a cada um, se sentir a caminho da realização de seu projeto pessoal de
felicidade.”143
Nesse sentido, anota Sérgio Gischkow Pereira que “o direito de família
evolui para um estágio em que as relações familiares se impregnam de autenticidade,
sinceridade, amor, compreensão, diálogo, paridade, realidade. Trata-se de afastar a

140
Dispõem os artigos 5º, I: “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos ermos desta
Constituição.” E o artigo 226, §5º: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos
igualmente pelo homem e pela mulher.”
141
Euclides de Oliveira e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Do Direito de Família, Direito de
família e o novo Código Civil, coords. Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizonte:
Del Rey, 3.ed., 2003, págs. 3/4.
142
Ver a respeito Euclides de Oliveira e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Do Direito de
Família, cit., págs. 3/6 e Silvio Rodrigues, Direito Civil – Direito de família, São Paulo: Saraiva, v. 6,
28.ed., 2004, p. 15.
143
Euclides de Oliveira e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Do Direito de Família, cit., p. 7.
46

hipocrisia, a falsidade institucionalizada, o fingimento, o obscurecer dos fatos sociais,


fazendo emergir as verdadeiras valorações que orientam as convivências grupais. O
regramento jurídico da família não pode insistir, em perniciosa teimosia, no obsessivo
ignorar das profundas modificações consuetudinárias, culturais e científicas; petrificado,
mumificado e cristalizado em um mundo irreal, sofrerá do mal da ineficácia.”144
Neste instante, cabem as palavras de Euclides Benedito de Oliveira:
“imortaliza-se a família, como um ponto de convergência natural dos seres humanos.
Por ela se reúnem o homem e a mulher, movidos por atração física e laços de
afetividade. Frutifica-se o amor com o nascimento dos filhos. Não importam as
mudanças na ciência, no comércio ou na indústria humana, a família continua sendo o
refúgio certo para onde acorrem as pessoas na busca de proteção, o lugar seguro para
realização de seus projetos de felicidade pessoal (a casa, o lar, a prosperidade e a
imortalidade na descendência).”145
Considerando os laços de afeto que ligam os membros de uma família e a
solidariedade que os une, se porventura, um membro desta família causar a outro, algum
dano, proveniente de comportamento reprovável, é certo que o sofrimento causado será
maior do que o provocado por terceiro estranho à relação familiar. Aqui se justifica a
responsabilidade civil, buscando valorizar o respeito e afeto que estruturam a relação
familiar.
Acrescenta Carlos Alberto Bittar: “como componente de uma família, ou
de entidade familiar, pode sofrer lesões provocadas por qualquer de seus integrantes,
como o cônjuge; filho e parentes outros, tanto naturais, como civis, concubino ou
concubina, observando-se que, nessas hipóteses, há sempre prévia vinculação entre as
partes, legal ou contratualmente estabelecida.”146
Rolf Madaleno observa que “na área do Direito de Família, com certeza,
se ajustam os fatos na busca de uma base sólida, para assento de uma variedade de
edificações, todas oriundas da responsabilidade civil de indenizar pelo dano material ou
moral, provocado cada qual deles, no decorrer das relações de família.”147

144
Sérigo Gischkow Pereira, Tendências Modernas do Direito de Família, Revista dos Tribunais, n. 628,
fevereiro de 1988, p. 19.
145
Euclides Benedito de Oliveira, A Constituição Federal de as inovações no Direito de Família, O
Direito de Família após a Constituição Federal de 1988, org. Antônio Carlos Mathias Coltro. São Paulo:
C. Bastos: Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2000, p. 26.
146
Carlos Alberto Bittar, Reparação civil por danos morais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2.ed., 1994, p.177.
147
Rolf Madaleno, Direito, cit., p. 136.
47

A fim de explicitar a aplicação da responsabilidade civil no direito de


família, mas com a devida cautela para não nos desviarmos do tema proposto, serão
verificadas algumas situações, em termos gerais, que ensejam a aplicação da teoria geral
da responsabilidade civil.
A princípio, verifica-se a responsabilidade civil no direito de família, na
responsabilidade civil por fato de outrem, principalmente, em relação à responsabilidade
civil dos pais em razão dos atos ilícitos praticados por seus filhos menores ou maiores
alienados mentais. Também se pode falar na responsabilidade civil decorrente do
exercício da tutela e da curatela.
A responsabilidade civil por fato de outrem está disposta no artigo 932
do Código Civil148. Considerando os incisos I e II que cuidam respectivamente, da
responsabilidade civil dos pais em relação aos filhos menores que estiverem sob seu
poder e em sua companhia e, da responsabilidade do tutor e curador, pelos pupilos e
curatelados, que se acharem nas mesmas condições, cabe a lição de José de Aguiar
Dias: “Há contra o pai e, conseqüentemente, contra a pessoa que lhe faz as vezes, uma
presunção juris tantum de responsabilidade. Quando se alude a pais ou curadores,
implicitamente se abrange aquele que, não sendo uma coisa nem outra, é, entretanto,
encarregado da vigilância, como o avô, que muitas vezes é a pessoa a quem incumbe
esse dever.”149
Funda-se a responsabilidade dos pais em relação aos filhos, no poder
familiar e no dever de cuidado e de vigilância. Com relação ao dever de vigilância,
também se responsabilizam as pessoas que estiverem encarregadas de cuidar do menor.
A responsabilidade civil no direito de família também pode se dar na
ruptura de noivado ou quebra dos esponsais; no rompimento imotivado da união estável
e que cause dano a um dos conviventes150; na transmissão de doenças graves e letais de
um cônjuge ou convivente ao outro151; em separação judicial litigiosa com imputação

148
O atual Código Civil traz uma mudança neste ponto, pois no artigo 933 estabelece que as pessoas
indicadas nos incisos I a V do artigo 932, respondem independente de culpa, observa-se aqui uma
extensão da responsabilidade civil objetiva. Artigo 932, caput: “Também são responsáveis pela reparação
civil: I – os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia; II – o tutor
e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições (...)”
149
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade, cit., v. II, págs. 595/596.
150
Hipótese que será analisada em capítulo próprio.
151
Consultar Lydia Neves Bastos Telles Nunes, Do dano moral e a transmissão da AIDS entre cônjuges e
entre companheiros, Direito e responsabilidade, coord. Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Belo
Horizonte: Del Rey, 2002, págs. 125/135 e Aparecida I. Amarante, Responsabilidade, cit., p. 268. Matéria
que será analisada no capítulo IV deste trabalho.
48

caluniosa de adultério; em caso de injúrias entre cônjuges ou conviventes, causando


prejuízo à imagem do ofendido; no abandono moral dos filhos152.
Destarte, considerando que a família deva ser preservada e protegida,
para tanto, necessária é a reparação dos danos, materiais e morais, causados por um
membro ao outro, de modo que a não reparação, poderia estimular o desequilíbrio e a
desintegração dessa família, conforme Álvaro Villaça Azevedo, “a família, por mais que
livre seja, e que tenha existência natural, reclama o regramento do complexo de direitos
e de deveres, que dela nasce, para que, ao lado dos sentimentos próprios da união fática,
exista um clima de responsabilidade, indispensável à segurança dos conviventes e de
sua prole.”153
Nesse sentido, corrobora o Desembargador Jones Figueiredo Alves, “a
ligação da responsabilidade civil com o Direito de Família, além de atender à dignidade
da família, vai de encontro à estabilidade institucional do núcleo familiar, destacando-se
dentre outros exemplos, o da violência doméstica, que revela a necessidade de
acolhimento da tese reparatória.”154
Por essa razão, dada a importância da família e, considerando a
promoção da dignidade humana que ela propicia, Gustavo Tepedino aduz que “à
família, no direito positivo brasileiro, é atribuída proteção especial na medida em que a
Constituição entrevê o seu importantíssimo papel na promoção da dignidade humana.
Sua tutela privilegiada, entretanto, é condicionada ao atendimento desta mesma
função.”155
Dentre as situações que ensejam a aplicação das regras de
responsabilidade civil no direito de família, serão analisadas, ainda que

152
Atualmente destacam-se três decisões concedendo indenização por dano moral pelo abandono afetivo
dos filhos por parte dos pais. Em São Paulo, o juiz da 31ª Vara Cível, Dr. Luis Fernando Cirillo, no
processo nº 000.01.036747-0, julgado em 05.06.2004, condenou um pai a indenizar a filha em R$ 50 mil
reais a título de reparação de dano moral causado pelo abandono afetivo. Em Belo Horizonte, a 7ª Câmara
Cível do TAMG, no julgamento da Apelação Cível nº 0408550-5, em 01.04.2004, cujo relator foi Unias
Silva, concedeu indenização de R$ 52 mil reais ao filho por ter sido abandonado pelo pai e, em Capão da
Canoa/RS, o juiz Mario Romano Maggioni, concedeu em primeira instância, indenização de R$ 60 mil
reais, à filha abandonada afetivamente pelo pai. Consultar: Álvaro Villaça Azevedo, Abandono moral,
Jornal do Advogado, 289: 14-15, 2004 e Revista ISTOÉ, 1840: 20-21, 2005.
153
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato ao casamento de fato, Belém: CEJUP, 1986, p. 13.
154
Apud Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, A culpa nas relações de família, Questões
controvertidas no direito de família e das sucessões, coord. Mário Luiz Delgado e Jones Figueiredo
Alves, São Paulo: Editora Método, v. 3, 2005, págs. 77/78.
155
Gustavo Tepedino, Novas formas de entidades familiares: efeitos do casamento e da família não
fundada no matrimônio, Temas de Direito Civil, Rio de Janeiro: Renovar, 2. ed., 2001, p. 328.
49

superficialmente, o rompimento do noivado ou a quebra dos esponsais e a dissolução do


casamento por separação culposa.
Com relação ao rompimento da promessa de casamento ou quebra dos
esponsais, verifica-se que não há regulamentação no ordenamento jurídico brasileiro; no
entanto, essa omissão não afasta a aplicação da teoria geral da responsabilidade civil,
visando a reparação de danos.
Esponsais segundo Maria Helena Diniz, “consistem num compromisso de
casamento entre duas pessoas desimpedidas, de sexo diferente, com o escopo de
possibilitar que se conheçam melhor, que aquilatem suas afinidades e gostos.”156
José Carlos Moreira Alves conceitua os esponsais (sponsalias) como: “a convenção pela
qual duas pessoas de sexo diverso (ou seus patres familias, por eles) se comprometem a
contrair, no futuro, casamento.” 157
No direito romano, os esponsais eram solenemente firmados entre as
famílias, e obrigavam o casamento de seus filhos, segundo Carlos Roberto Gonçalves:
“essa promessa era conhecida dos romanos pelo nome de sponsalia (esponsais), e, além
de solene, gerava efeitos. Havia uma espécie de sinal ou arras esponsalícias, que o noivo
pedia, ou até as pagava em triplo ou em quádruplo, se desmanchasse o noivado
injustificadamente.”158
No entanto, o instituto dos esponsais como ensina Georgette Nacarato
Nazo: “desenvolveu-se em sentido oposto, permitindo a liberdade das partes em
firmarem compromisso e também se desligarem do mesmo, apesar das ‘arras
poenitenciais’ – autêntica cláusula penal – que visavam a satisfação das perdas e danos
por inadimplemento.”159
O noivado é o compromisso sério, espontâneo e voluntário que antecede
o casamento, possibilitando que os futuros cônjuges se conheçam melhor e possam
reunir esforços, providenciando o necessário para a realização do futuro casamento. O
noivado em si, não obriga o casamento, não tem previsão legal que imponha
indenização em caso de arrependimento de um dos noivos, visto que é uma fase
justamente para que os noivos se conheçam melhor, pode acontecer de não revelarem
afinidade um com o outro. Desta forma, o simples rompimento, de forma civilizada, não
gera indenização. Também não há que se falar em reparação de danos se o compromisso

156
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 5, p. 47.
157
José Carlos Moreira Alves, Direito, cit., p. 341.
158
Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade, cit., p. 54.
159
Georgette Nacarato Nazo, Da responsabilidade, cit., p. 27.
50

não for sério, com o objetivo de casamento, pois o rompimento de mero namoro não
gera direito à indenização. Nesse sentido a seguinte decisão:

“INDENIZAÇÃO - Dano moral - Alegação de


descumprimento de promessa de casamento –
Descabimento - Inexistência de prova quanto a
inexperiência da menor e a falta de demonstração
da ocorrência de namoro sério que se traduzisse
em compromisso - Verba indevida - Declaração de
votos vencedores e vencido.” (TJSP - 4ª Câm. -
Ap. 195.591-1/9 – Rel. Alves Braga – j.
21.10.1993 – RT 704/104).

Marcelo Truzzi Otero leciona que “na quebra dos esponsais, é evidente
ser passível o ressarcimento pela dor infligida ao noivo abandonado, entretanto, mister a
presença de todos os pressupostos relativos a ação de indenização, além da
potencialidade do dano. O simples rompimento do noivado não acarreta, por si só, o
dever de indenizar.”160
Desta forma, ensina Yussef Said Cahali: “a simples ruptura do noivado
não legitima só por isso a pretensão indenizatória, se não vislumbrada ilicitude no
rompimento. Mas também para a configuração dos pressupostos necessários à
responsabilidade civil, reclama-se que a promessa não cumprida de casamento tenha se
revestido de seriedade, firmeza e certeza de convicção quanto à sua viabilidade.”161
Maria Helena Diniz aponta os seguintes requisitos para que se configure
a responsabilidade: “que a promessa de casamento tenha sido feita, livremente, pelos
noivos e não por seus pais; que tenha havido recusa de cumprir a promessa esponsalícia
por parte do noivo arrependido e não de seus genitores; que haja ausência de motivo
justo e que exista dano.”162
O que se verifica, a fim de indenização, além dos requisitos mencionados
acima, são as circunstâncias em que se deu o rompimento, por exemplo, o noivo que na
certeza de que iria se casar, abandonou emprego, mudou de cidade, comprou imóvel e

160
Marcelo Truzzi Otero, A quebra dos esponsais e o dever de indenizar dano material e dano moral,
Revista dos Tribunais, n. 766, p. 103, agosto de 1999.
161
Yussef Said Cahali, Dano, cit., págs. 649-650.
162
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 5, págs. 50/51.
51

móveis, ou seja, experimentou um prejuízo patrimonial que certamente deverá ser


ressarcido em vista do rompimento injustificado, pois verifica-se a responsabilidade
extracontratual possibilitando indenização pelos prejuízos sofridos. Inacio de Carvalho
Neto aponta que “o descumprimento injusto da promessa de casamento que causa dano
é perfeitamente enquadrável na regra geral do art. 159163 do Código Civil, dispensando-
se tratamento específico.”164
Em se tratando de lucros cessantes, a situação deve ser analisada com
cautela, alerta Sílvio de Salvo Venosa que “a possibilidade de esse inadimplemento
gerar indenização por ‘lucros’ cessantes deve ser vista com restrições, pois qualquer
conotação de ganho ou vantagem deve ser afastada da noção e compreensão de
casamento, o qual assenta suas bases na afetividade.”165 Inacio de Carvalho Neto
também anota: “não ser indenizável a mera expectativa de enriquecimento com o
casamento (os lucros cessantes).”166
Nesse sentido, observa Carlos Roberto Gonçalves: “é princípio de ordem
pública que qualquer dos noivos tem a liberdade de se casar ou de se arrepender. O
consentimento deve ser manifestado livremente e ninguém pode ser obrigado a se casar.
O arrependimento, portanto, pode ser manifestado até o instante da celebração (...)
Tendo em vista as futuras e próximas núpcias, os noivos realizam despesas de diversas
ordens: adquirem peças de enxoval, alugam ou compram imóveis, adiantam pagamentos
de bufês, de enfeites da igreja e do salão de festas, pedem demissão de emprego etc. O
arrependimento do outro acarretará, então, prejuízos ao que tomou tais providências. Se
não houve justo motivo para a mudança de atitude, o prejudicado terá o direito de obter
judicialmente a reparação do dano (cf. RJTJSP, 69:150).”167
Ensina Maria Helena Diniz que: “a atitude imprudente, tola ou malvada,
de estabelecer esponsais, despertando a confiança de um próximo matrimônio a tal
ponto que uma pessoa realize despesas com vistas a esse fim, e de retirar-se depois sem
motivo plausível, caracteriza um atitude culposa e causadora de prejuízos; daí a
obrigação da reparação.”168

163
Corresponde ao atual artigo 186 do Código Civil.
164
Inacio de Carvalho Neto, Responsabilidade civil no direito de família, Curitiba: Juruá Editora, 2002 p.
473.
165
Sílvio de Salvo Venosa, Direito, cit., v. 6, p. 46.
166
Inacio de Carvalho Neto, Responsabilidade, cit., p. 489.
167
Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade, cit., v. 5, págs. 54-55.
168
Maria Helena Diniz, Curso, cit., págs. 48/49.
52

Por outro lado, o rompimento do noivado pode ofender a honra de uma


das partes, humilhando e envergonhando, através da prática de ato ilícito, possibilitando
também, a indenização por danos morais. Desta forma, quando o rompimento ocorrer
sem justa causa, causando grande abalo e sofrimento ao noivo abandonado, às vésperas
do casamento ou até mesmo no altar. Certo será o dano moral, não apenas ferindo os
sentimentos próprios do noivo, mas também afetando sua posição perante a sociedade e
terceiros.
Assinala José de Aguiar Dias que: “é positivamente aceita na doutrina a
solução que manda indenizar tanto o prejuízo patrimonial, como o prejuízo moral
sofrido, a título de interesse negativo, em conseqüência do rompimento do noivado.”169
No mesmo raciocínio, Aparecida I. Amarante diz que poderá ocorrer hipótese de
reparação do dano moral “se o rompimento se der em condições deprimentes ou
vexatórias para um dos nubentes.”170
Silvio Rodrigues afirma que “desde que haja rompimento injusto do
noivado – e esse é o requisito básico para que a demanda possa prosperar -, pode o
prejudicado, a despeito do silêncio da lei, reclamar a indenização do prejuízo
experimentado. Entendo ademais que, em face do rompimento injustificado do noivado,
poderá o juiz, igualmente, fixar uma indenização moderada para a reparação do dano
moral.”171
Mário Antônio Lobato de Paiva, cita o seguinte caso concreto: “Esteve
em nosso escritório um rapaz (playboy, filho de uma família abastada) que apostou com
os amigos que iria noivar com determinada jovem. Ele a namorou, noivou, marcou a
data do casamento, o pai da noiva despendeu com o vestido, convites, buffet, etc., e a
menos de um dia do casamento nosso cliente terminou o noivado, alegando que tudo,
simplesmente, fora uma aposta com os amigos.”172 Em situações como esta, que tratam
com descaso e desrespeito, um compromisso sério, são merecedoras de reparo tanto do
prejuízo material quanto moral, sofrido pela parte enganada e humilhada.
Observa Yussef Said Cahali: “Desse modo, desde que identificada (no
exame do caso concreto) a existência de um procedimento gravemente injurioso

169
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade, cit., p. 166.
170
Aparecida I. Amarante, Responsabilidade civil por dano à honra, Belo Horizonte: Del Rey, 5.ed.,
2001, p.221.
171
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 4 p. 40.
172
Mário Antônio Lobato de Paiva, Responsabilidade civil pelo rompimento do noivado, Revista Prática
Jurídica, 5 : 18-21, 2002.
53

envolvendo o ato de arrependimento, com injusta agressão à dignidade, à estima e ao


respeito que o ofendido faz por merecer, evidencia-se a ocorrência de um dano moral
passível de reparação.”173

Destacam-se as seguintes decisões174:

“Responsabilidade civil – rompimento de noivado


com casamento já agendado, com aquisição de
móveis, utensílios, expedição de convites,
habilitação, realização de curso de noivos, ‘chá de
cozinha’, etc. – ruptura sem motivo justificável –
dever de indenizar do noivo não só os danos
materiais como também os morais. Apelo do réu
improvido e provido o da autora em parte.” ( TJSP
– 6ª Câm. – Ap. 90.262.4/3 – Rel. Testa Marchi –
j. 03.02.2000).

“INDENIZAÇÃO – Dano moral – Promessa de


casamento – Circunstâncias gravemente injuriosas
a envolver a ruptura do relacionamento amoroso,
agravando a honra da mulher – Verba devida.”
(TJPR – 1ª Câm. – Ap. 141.321-2 – Rel. Lauro
Augusto Fabrício de Melo – j. 05.10.1999 – RT
779/376).

“INDENIZAÇÃO – Dano moral – Rompimento


de noivado – Admissibilidade. A ruptura de
noivado, quando este ocorre após sinais de sua
exteriorização, alcançando familiares e amigos,

173
Yussef Said Cahali, Dano, cit., págs. 653-654.
174
Também são decisões favoráveis à indenização por danos materiais e morais: RT 639/58; RJTJESP
117/175; RT 461/214; RT 542/56; TJSP – Ap. 81.499-4/3-00 – 6ª Câm – Rel.Octavio Helene – j.
24.09.1998; TJRS – Ap. 593080112 – 5ª Câm. – Rel. Décio Antônio Erpen –j. 25.11.1993; TJSP – Ap.
79.307.4/9 – 8ª Câm. – Rel. Egas Galbiatti – j. 02.06.1999. Contrariamente: LEX 221/102; RT 473/213;
RT 704/104; LEX 180/113 e TJRS – Ap. 70002665149 – 9ª Câm. – Rel. Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira
– j. 29.10.2003.
54

gera a indenização por dano moral, uma vez


abalados os sentimentos da pessoa atingida, não só
em relação a si própria como também perante os
grupos sociais com os quais se relaciona.” (TJSP –
2ª Câm. – AgIn 036.868-4/3 – Rel Osvaldo Caron
– j. 25.02.1997 – RT 741/255).

Sílvio de Salvo Venosa esclarece que “caberá ao caso concreto definir se


houve proposta séria de casamento e não simples namoro ou relacionamento
inconseqüente, no qual o casamento fora uma possibilidade distante ou nunca ventilada.
O forte conteúdo emocional dessas situações, que pode desencadear um espírito de
retaliação por parte do partícipe frustrado, recomenda a máxima cautela do juiz e dos
advogados que assistem as partes.”175
Em se tratando da dissolução do casamento, também não há no
ordenamento jurídico brasileiro, legislação específica que cuide da reparação por danos
morais em virtude de separação judicial culposa, como também não há motivo que
impeça tal reparação. Assim, questiona Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos
Santos: “Se um acidente de trânsito, mesmo que provoque um pequeno prejuízo, gera ao
culpado o dever de repará-lo, se a propaganda enganosa fomenta a reparabilidade de
danos acarretados aos consumidores, se o extravio de bagagem em transporte aéreo
enseja a indenização pelos prejuízos ocasionados ao passageiro, se até mesmo a pessoa
jurídica é alvo de resguardo da honra objetiva, com direito à reparação dos danos a esse
direito da personalidade, qual seria a razão para a inadmissibilidade do direito do
cônjuge à indenização pelos danos oriundos de violação por seu consorte de dever
conjugal?”176
Lembra Yussef Said Cahali que “consagrando a Constituição de 1988
(art. 5º, V e X) o princípio da reparabilidade do dano moral, a extensão que o tema vem
assumindo mais recentemente não permite dúvida quanto à indenizabilidade dos danos
morais resultantes da ‘infração dos deveres conjugais’”177.

175
Sílvio de Salvo Venosa, Direito, cit., v. 6, págs., 47/48.
176
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade. cit., p. 123.
177
Yussef Said Cahali, Divórcio de separação, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 9.ed., 2000, p.
854.
55

No artigo 1.566178, o Código Civil estabelece deveres aos cônjuges, da


quebra destes deveres ocasionando dano, surge a obrigação de reparação com base no
artigo 186 do Código Civil que prevê a responsabilidade civil extracontratual por ato
ilícito. No entanto, a obrigação de indenizar também pode resultar não apenas da quebra
de deveres que tornem insuportável a vida em comum, mas também, durante a ação de
separação judicial litigiosa, no caso de um dos cônjuges imputar ao outro, graves
injúrias que mais do que ofensa à honra, abalam a imagem do ofendido perante terceiros
com quem se relaciona ou até mesmo no campo profissional.
Sustenta Carlos Roberto Gonçalves que “provado, no entanto, que a
separação, provocada por ato injusto do outro cônjuge, acarretou danos, sejam materiais
ou morais, além daqueles já cobertos pela pensão alimentícia (sustento, cura, vestuário e
casa), a indenização pode ser pleiteada, porque legem habemus: o art. 159179 do Código
Civil.”180
Melhor esclarecendo a questão, Mário Moacyr Porto apresenta os
seguintes exemplos: “o marido (e excepcionalmente a mulher) sevicia ou pratica uma
lesão corporal no parceiro, ofensa que ocasionou uma redução da sua capacidade de
trabalho. O delito não justifica, apenas, a dissolução contenciosa da sociedade conjugal
e a conseqüente fixação de uma ‘pensão’ de alimentos (Lei do Divórcio, arts. 5º, caput,
e 19181). O cônjuge responsável responde, ainda, cumulativamente, pelo prejuízo à
saúde do cônjuge agredido, nos termos do disposto nos arts. 159 e 1.539182 do Código
Civil, sem prejuízo das sanções penais. Admitamos, ainda, o caso do cônjuge que
difama o outro e a difamação se reflita, desastrosamente, na reputação do parceiro, em
sua atividade profissional ou vida em sociedade. O ultraje justifica não apenas a
separação judicial contenciosa e, se for o caso, a pensão de alimentos, como, ainda, uma

178
Dispõe o artigo 1.566: “São deveres de ambos os cônjuges: I – fidelidade recíproca; II – vida em
comum, no domicílio conjugal; III – mútua assistência; IV – sustento, guarda e educação dos filhos; V –
respeito e consideração mútuos.”
179
Corresponde ao atual artigo 186 do Código Civil.
180
Carlos Roberto Gonçalves, Responsabilidade, cit., p. 71.
181
Dispõe a Lei do divórcio, artigo 5º, caput: “A separação judicial pode ser pedida por um só dos
cônjuges quando imputar ao outro conduta desonrosa ou qualquer ato que importe em grave violação dos
deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum.” Artigo 19: “O cônjuge responsável pela
separação judicial prestará ao outro, se dela necessitar, a pensão que o juiz fixar.”
182
Corresponde ao atual artigo 950 do Código Civil: “Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido
não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização,
além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão
correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.”
56

indenização do dano resultante da injúria (CC, art. 1.547183). A ação fundamenta-se no


art. 159 do Código civil e é independente da ação que visa à dissolução litigiosa da
sociedade conjugal e ao chamado “divórcio-sanção”. As indenizações são, assim,
cumuláveis. Os dois pedidos podem ser formulados em uma mesma demanda (CPC, art.
292184).”185
Comprova-se que se um dos cônjuges causa dano ao outro, independente
de ser ou não, o motivo da separação, será responsabilizado com base no artigo 186 do
Código Civil. Este dano pode ser material ou moral basta que resulte de ato ilícito,
como agressões físicas, imputação caluniosa de adultério, injúrias que provoquem
humilhação, vexame, depreciando a imagem e a honra do cônjuge inocente.
Na doutrina, entre outros186, sustentam a possibilidade de reparação por
danos morais na separação judicial litigiosa:
Yussef Said Cahali: “parece não haver a mínima dúvida de que o mesmo
ato ilícito que configurou infração grave dos deveres conjugais posto como fundamento
para a separação judicial contenciosa com causa culposa, resta-se igualmente para
legitimar uma ação de indenização de direito comum por eventuais prejuízos que
tenham resultado diretamente do ato ilícito para o cônjuge afrontado. O ato ilícito
preserva a sua autonomia, ainda que projetados duplamente os seus efeitos: como
representativo de infração dos deveres conjugais, posto como causa da dissolução do
casamento e como causa de responsabilidade civil da regra geral do art. 159187 do

183
Corresponde ao atual artigo 953 do Código Civil: “A indenização por injúria, difamação ou calúnia
consistirá na reparação do dano que delas resulte ao ofendido.”
184
Dispõe o artigo 292 do Código de Processo Civil: “É permitida a cumulação, num único processo,
contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão.”
185
Mário Moacyr Porto, Temas de responsabilidade civil, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
1989, p.71.
186
Sílvio de Salvo Venosa, Direito, cit., v. 4, p. 239: “provando-se infringência aos deveres do
casamento, surge o dever de indenizar, mormente por danos morais.” Belmiro Pedro Welter, Dano moral
na separação, divórcio e união estável, cit., Revista dos Tribunais, v. 775, p.132: “concordamos com a
corrente minoritária que admite a indenização do dano moral na ação de separação judicial ou união
estável litigiosa e com culpa (art. 5º , caput, da Lei 6.515/77, por grave infração dos deveres do
casamento ou conduta desonrosa), podendo o pedido ser cumulado, ou não (...)”; Inacio de Carvalho
Neto, Responsabilidade, cit., págs. 315/316; Aparecida I. Amarante, Responsabilidade, cit., págs.
270/271; Carlos Alberto Bittar, Reparação, cit., págs. 177/178; Mário Moacyr Porto, Temas, cit., p.70,
aduz que “entre nós, uma ação de responsabilidade civil entre cônjuges desavindos ainda soa como algo
estranho ou inusitado. Mas não há, ao que parece, nada que se oponha ao procedimento, sendo de
acrescentar-se que o art. 5º, caput, c/c o art. 19 da Lei do Divórcio são, a rigor, desdobramentos do art.
159 do Código Civil.” Dispõe o artigo 5º caput da Lei do Divórcio: “A separação judicial pode ser pedida
por um só dos cônjuges quando imputar ao outro conduta desonrosa ou qualquer ato que importe em
grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum” e o artigo 19: “O
cônjuge responsável pela separação judicial prestará ao outro, se dela necessitar, a pensão que o juiz
fixar.”
187
Corresponde ao artigo 186 do atual Código Civil.
57

Código. Mas, nos termos em que a questão vem sendo assim colocada, não há dúvida de
que o cônjuge agredido em sua integridade física ou moral pelo outro tem contra este
ação de indenização, com fundamento no art. 159 do CC, sem embargo de representar
aquela ofensa uma causa que legitima uma separação judicial contenciosa em que os
alimentos lhe seriam concedidos.”188
José de Aguiar Dias afirma que “a violação das obrigações derivadas do
casamento é, indubitavelmente, falta contra a honestidade. É o que se verifica por parte
de quem dá, por seu procedimento, causa à separação de corpos, desquite ou divórcio,
acarretando prejuízo moral ou material ao outro cônjuge.”189
Assevera Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos que “é indene
de dúvida a reparabilidade dos danos decorrentes diretamente da infração a dever
matrimonial, por força da notória presença dos requisitos da responsabilidade civil
(...).”190 Em obra mais recente, a autora conclui que “preenchidos os pressupostos da
responsabilidade civil: ação que descumpre um dever e viola um direito, ligada pelo
nexo causal ao dano, seja moral ou material, assim como verificado o seu fundamento
culposo, surge o direito do ofendido à reparação, inclusive sendo de família a relação
que o liga ao ofensor.”191
Segundo José de Castro Bigi: “a dissolução da sociedade conjugal, em si
mesma, gera conseqüências para o cônjuge culpado, como transformá-lo em devedor de
alimentos ao cônjuge. Se o cônjuge culpado praticou um ato antijurídico, se infligiu um
dano injusto ao outro cônjuge, tudo isso, se apaga com a separação e a pensão?
Evidentemente que não.”192 Acrescenta o autor que o direito brasileiro segue a
orientação moderna, de indenizar com dinheiro, o dano moral.
Aponta Eduardo Zannoni que: “es obvio que toda causal de separación o
divorcio culpables (art. 202, Cód. Civil) implica un acto o un hecho ilícito civil, como

188
Yussef Said Cahali, Dano, cit., págs.669/670.
189
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade, cit., v. II, p. 441.
190
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Reparação civil na separação e no divórcio, São
Paulo: Saraiva, 1999, p. 170.
191
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, A culpa nas relações de família, cit., págs., 78/79.
192
José de Castro Bigi, Indenização por rompimento de casamento, Repertório de jurisprudência e
doutrina sobre Direito de Família – Aspectos constitucionais, civis e processuais, coord. Teresa Arruda
Alvim, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, v. 2, 1995, págs. 165/166.
58

tal antijurídico que, conforme al art. 1077, “hace nacer la obligación de reparar el
perjuízo que por él resultare a otra persona”, es decir, al otro cónyuge.”193
Observa-se a possibilidade de indenização por danos morais decorrentes
da dissolução do casamento, independente da concessão de alimentos, nesse sentido a
lição de Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos “convém, ainda, ressaltar que
o reconhecimento da indenizabilidade de danos na dissolução matrimonial, em conjunto
com a existência da pensão alimentícia em favor do cônjuge inocente ou mentalmente
doente, não importa cumulação de reparações por um mesmo fato, visto que se trata de
conseqüências distintas, com fundamentos diferentes: o direito a alimentos tem uma
finalidade preponderantemente assistencial, e a reparação de danos visa ao
ressarcimento (danos materiais) ou à compensação (danos morais) dos efeitos de um ato
ilícito.”194
O mesmo entendimento tem Caio Mário da Silva Pereira: “Afora os
alimentos, que suprem a perda de assistência direta, poderá ainda ocorrer a indenização
por perdas e danos (dano patrimonial e dano moral), em face do prejuízo sofrido pelo
cônjuge inocente.”195
É escassa a matéria na jurisprudência, dentre as decisões encontradas
cita-se196:
“Separação judicial – Cumulação com
indenização por dano moral, oriundo de
adultério – Admissibilidade – Observância do
disposto no artigo 292 do Código de Processo
Civil – Recurso provido.” (TJSP – 2ª Câm. - AI
146.186-4 – Rel.Cezar Peluso – j. 13.02.2001).

“Indenização. Dano moral. Separação Judicial.


Injúrias praticadas pelo cônjuge. Aplicação do

193
Eduardo A. Zannoni, El daño cit., págs. 382/383. Tradução: “É obvio que toda causa de separação ou
divórcio culpáveis (art. 202, Cód. Civil) implica um ato ou um fato ilícito civil, como tal antijurídico que,
conforme o art. 1077, “faz nascer a obrigação de reparar o prejuízo que por ele resultou a outra pessoa”, é
dizer, ao outro cônjuge.”
194
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Reparação, cit., págs. 174/175.
195
Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de direito civil – Direito de família, Rio de Janeiro: Forense,
2004, v. V, 14.ed., p.271.
196
Também são decisões favoráveis à reparabilidade de danos morais: TJRJ – 7ª Câm.- AI
2002.002.15637 – Rel. Paulo Gustavo Horta – j. 25.02.2003; JTJSP 240/211. Contrariamente: TJRJ – 14ª
Câm. - Ap. 1998.001.14156 – Rel. Marlan Marinho – j. 13.05.1989; TJRS – 7ª Câm. – Ap. 70005834916
– Rel. José Carlos Teixeira Giorgis – j. 02.04.2003; Lex 239/290.
59

art. 1.547 e seu parágrafo único do Código Civil.


O dano moral, decorrente dos motivos que
ocasionaram a separação judicial, é indenizável.
Embargos acolhidos em parte votos vencidos.”
(TJRS – 1º Grupo de Câmaras Cíveis -
Embargos infringentes 500360169 – Rel. Elias
Elmyr Manssour – j. 05.05.1989).

Verifica-se que o simples rompimento do matrimônio ou da união


estável, não enseja a reparação de danos morais, devem estar presentes os pressupostos
caracterizadores da responsabilidade civil, desta forma, haverá a possibilidade de impor
a reparação por danos materiais e morais ao cônjuge ou ao convivente que pratique ato
ilícito ao outro, ainda que este ato ilícito seja o motivo da separação judicial litigiosa,
por exemplo, em caso de agressão física, provocando lesões corporais ou em caso de
injúrias, causando prejuízo à imagem do ofendido.
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos conclui pela aplicação
dos princípios da responsabilidade civil às relações entre companheiros, segundo a
autora: “tal aplicabilidade tem em vista a proteção dos conviventes, possibilitando-lhes
a reparação de danos em face da violação de dever oriundo da união estável, cuja
reparação impõe-se, como ocorre diante da prática de ato ilícito nas demais relações
jurídicas.”197
A respeito da cumulação das ações de separação ou divórcio e reparação
de danos, será possível, considerando o disposto nos incisos do parágrafo primeiro do
artigo 292 do Código de Processo Civil, a saber: a compatibilidade dos pedidos, que o
mesmo juízo seja competente para conhecer ambos os pedidos e que haja a adequação
do mesmo tipo de procedimento, no caso, o ordinário.

197
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade civil dos conviventes, Revista
Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Síntese, IBDFAM, v. 1, n. 3, out./dez., 1999, p. 39.
60

CAPÍTULO III – UNIÃO ESTÁVEL

1. BREVE HISTÓRICO

Importante a notícia histórica sobre a união estável, para esclarecer


porque, a maior parte da doutrina, apresenta diferentes terminologias como,
concubinato, união informal, família sem casamento, casamento de fato,
companheirato198, concubinato puro e impuro. Posteriormente, será estabelecida a
distinção entre união estável e concubinato.
Necessário também se faz o apontamento histórico, para que se possa
compreender amplamente as questões relativas à união estável, ademais, este breve
histórico parece possibilitar a compreensão do instituto, bem como toda a repercussão
que esta figura jurídica projeta nos dias de hoje.
De acordo com Guilherme Calmon Nogueira da Gama, “entre os persas,
hindus, chineses, em todas as áreas submetidas às suas influências, o concubinato era
admitido.”199
Na Grécia antiga há notícia de concubinatos permeando a cultura grega,
segundo Adahyl Lourenço Dias, “destacam-se, em a voz da história, célebres
concubinas, que tiveram nobre atuação na cultura dos gregos, notadamente Aspásia, que
ensinou retórica, em aulas próprias, a grande número de alunos, inclusive velhos gregos.
Natural de Mileto, uma das cidades do Mar Egeu, considerada estrangeira, não podia
casar-se com Péricles. Viveram juntos e felizes, em concubinato público e histórico.
Antes de viver com Péricles, Aspásia se tornara concubina de Sócrates, e, depois da
morte deste, de Alcebíades.”200
O direito romano também conheceu o concubinato como uma das formas
de união, paralela ao casamento regulado pelo ius civili.
Foram os romanos que trouxeram a idéia de casamento, tratava-se de um
casamento com conotação religiosa, as iustae nuptiae cum ou sine manu, modo pelo
qual os romanos constituíam famílias legítimas. Ao lado das iustae nuptiae cum, o
direito romano conheceu outras formas de uniões que se caracterizavam dependendo da
solenidade e das pessoas que a celebrariam, assim, denominava-se sine connubio ou

198
Expressão utilizada por Hélio Borghi, União estável e casamento, São Paulo: Editora Juarez de
Oliveira, 1.ed., 2000, p. 01.
199
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p. 97.
200
Adahyl Lourenço Dias, A concubina e o direito brasileiro, São Paulo: Saraiva, 4.ed., 1988, p. 19.
61

matrimonium iuris gentium o casamento realizado entre peregrinos; o contubernium era


a união entre escravos ou entre estes e pessoas livres e, o concubinatus representava a
união de pessoas livres e desimpedidas.201
Apesar de constante o concubinato no Império Romano, não era
reconhecido como instituto jurídico, conforme Álvaro Villaça Azevedo, “o instituto do
concubinatus, que se apresentava, em Roma, pela convivência estável de homem e
mulher, livres e solteiros, como se fossem casados, mas sem a affectio maritalis e a
honor matrimonii. Não era proibido, nem considerado atentatório à moral.”202
Ebert Chamoun corrobora: “é certo que no primeiro século do Império o
concubinato era freqüentíssimo, inclusive entre homens de grande moralidade, e não
produzia quaisquer efeitos jurídicos.”203
Pode-se dizer, de acordo com Álvaro Villaça Azevedo, que tendo o
Imperador Augusto aditado a Lex Iulia et Papia Poppaea de maritandis ordinibus
estabelecendo impedimentos às uniões com mulher de classe social inferior e a Lex Iulia
de Adulteriis, sancionando relações extraconjugais com mulheres ingênuas e de posição
social honrada, essas leis teriam, indiretamente, regulado o concubinato, contribuindo
para sua difusão no período pós-clássico.204
Ensina José Carlos Moreira Alves que “esse panorama se modifica no
direito pós-clássico, sob os imperadores cristãos, que transformam o concubinato em
instituto jurídico, e que, para combatê-lo em favor da família legítima, inferiorizam a
condição da concubina e de seus filhos, procurando, de outra parte, estimular os
concubinos a contraírem matrimônios legítimos.”205
Ebert Chamoun assevera que “no Baixo Império torna-se o concubinato
um casamento inferior, embora lícito. Com os imperadores cristãos começa a receber
reconhecimento jurídico. Distinguem eles os filhos nascidos de concubinato (liberi
naturales), que se podem legitimar per subsequens matrimonium, dos vulgo quaesti ou
spurii oriundos de uniões sexuais passageiras. Favorece-se, assim, a transformação do
concubinato em matrimônio através da legitimação dos filhos.”206

201
Consultar Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 19; Ebert Chamoun, Instituições de Direito
Romano, Rio de Janeiro: Forense, 5.ed., 1968, p. 166; Adahyl Lourenço Dias, A concubina, cit., p.23.
202
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 19.
203
Ebert Chamoun, Instituições, cit., p. 166.
204
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 20.
205
José Carlos Moreira Alves, Direito, cit., p. 377.
206
Ebert Chamoun, Instituições, cit., p. 167.
62

Foi com o Imperador Constantino que o concubinato passou a ser


considerado ilegal, pois ele revogou a legislação do Imperador Augusto, incentivando o
casamento aos concubinos.
Na época do Imperador Justiniano, foram traçadas algumas normas,
favoráveis ao concubinato. Forçado a resolver o problema dos filhos advindos das
relações concubinárias, o Imperador Justiniano, indiretamente estabeleceu certos
requisitos ao concubinato, nomeando-o de concubinatus legitimus. Dentre os requisitos
exigidos, os concubinos deveriam ser livres; a relação deveria ser única, o que implica
em fidelidade e exigia-se a co-habitação, aos olhos de todos deveriam ser vistos como
uma família.207
Conclui Álvaro Villaça Azevedo: “com o ensinamento de Pietro
Bonfante, segundo o qual pode entender-se o concubinato, no direito justinianeu como
uma relação estável de um homem com uma mulher de qualquer condição e de qualquer
posição social, ingênua ou liberta, sem a affectio maritalis e a honor matrimonii. Este
motivo espiritual é, na verdade, a única distinção que, a essa época, existia entre o
concubinato e o casamento.”208
Com a invasão dos bárbaros e a queda do Império Romano, verificou-se
o concubinato em algumas tribos, como a dos povos gauleses, onde a concubina do
chefe era respeitada pelos demais, na tribo celta, a concubina era equiparada à mulher
casada, entre os germanos e francos, por sua vez, o concubinato não era aceito.209
De acordo com Álvaro Villaça Azevedo, “o concubinato foi admitido
pelas leis sálicas (dos francos sálios) e bárbaras, tendo sido tolerado pela Igreja Católica
nos primeiros séculos. Acontece que ocorreu uma degeneração de uniões concubinárias,
com costumes os mais variados, chegando ao interior dos conventos, em ameaça de
quebra dos alicerces clericais.”210
O concubinato, a princípio foi tolerado pela igreja Católica, o que se
verifica nos Concílios de Toledo (ano 400 d. C.) que admitiu o concubinato desde que o
homem não fosse casado, no mesmo sentido os Concílios de Mayença (ano 815) e
Tribur. Em outra fase, o Cristianismo combateu o concubinato, culminando essa

207
Consultar: Adahyl Lourenço Dias, A concubina, cit., p. 29; José Carlos Moreira Alves, Direito, cit., p.
377; Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p. 97.
208
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 23.
209
Adahyl Lourenço Dias, A concubina, cit., págs., 34/36.
210
Adahyl Lourenço Dias, A concubina e o direito brasileiro, São Paulo: Saraiva, 3.ed., 1984, p. 15, Apud
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 25.
63

reprovação com o Concílio de Trento que em 1963 estabeleceu as seguintes medidas:


“a) proibição do matrimônio presumido; b) estabelecimento da obrigatoriedade do
matrimônio somente poder ser contraído perante um pároco, em cerimônia pública com
duas testemunhas; c) criação dos registros paroquiais, que passaram a conter os assentos
dos matrimônios, controlados pelas autoridades eclesiásticas da paróquia; d) proibição
do concubinato, cominando penas severas contra os concubinos, tais como a
excomunhão e a qualificação de hereges.”211
“Por toda a Idade Média até a Moderna, apesar da campanha
empreendida pela Igreja, nunca foi evitado, nunca deixou de existir. E, se os canonistas
o repudiavam de iure divino, os juristas sempre o aceitaram de iure civile.”212
Na Idade Moderna, “a união não-matrimonial só desponta como
elemento de negociação jurídica a partir da instituição do casamento civil, no século
XVI e nos séculos posteriores acentuou-se a tendência de legislar-se sobre essa
matéria.”213
Na Idade Contemporânea, começam a surgir mudanças, através da
jurisprudência francesa, começam a solucionar os problemas resultantes do
concubinato. Segundo Rodrigo da Cunha Pereira, “começam a operar mudanças a partir
da primeira metade do século XIX, quando os tribunais franceses apreciam e
consideram as pretensões das concubinas. Esta relação passa a ser vista sob dois
aspectos: sociedade com caráter nitidamente econômico e como obrigação natural
quando, rompida a relação, havia promessa de certas vantagens à ex-companheira.”214
O Brasil, influenciado pelas Ordenações Filipinas215, não regulava o
concubinato, mas também não o proibia. As proibições que se verificam são as doações
feitas pelo homem casado à concubina. 216
Como anota Edgard de Moura Bittencourt: “no Brasil, anteriormente ao
Código Civil, as leis referiam-se ao concubinato para aplicar sanções a atos que dele

211
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., págs. 100/101. Consultar ainda:
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 27.
212
Caio Mário da Silva Pereira, Concubinato – sua moderna conceituação, Revista Forense, v. 190, p. 14.
213
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p.102.
214
Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato, cit., p. 17.
215
Segundo Everaldo Augusto Cambler, Comentários ao Código Civil Brasileiro – Parte geral, coords.
Arruda Alvim e Thereza Alvim, Rio de Janeiro: Forense, v.1 (arts. 1º a 103), 2005, p. 05: “As ordenações
constituem os corpos de leis que os reis de Portugal, no período entre a metade do Século XV e o início
do XVII, mandaram cumprir, principiando pelas Afonsinas, de D. Afonso V, a partir de 1446/1447,
passando pelas Manuelinas, de D. Manuel I, editadas de maneira definitiva em 1521, e terminando com as
Filipinas (Ordenações do Reino), de D. Felipe II de Espanha (Felipe I, em Portugal) – Cf. Ignácio M.
Poveda Velasco, Ordenações do Reino de Portugal, pp. 57-75.”
216
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 69.
64

decorressem, conforme as normas reproduzidas nas Consolidações de Teixeira de


Freitas e Carlos Carvalho.”217 Álvaro Villaça Azevedo reproduz o artigo 147 da
Consolidação das Leis Civis de Teixeira de Freitas, que “possibilita à mulher casada,
independentemente de autorização do marido, reivindicar bens móveis ou imóveis, que
tenham sido doados ou transferidos por este à sua concubina.” Assim como o artigo
1.483, parágrafo 2º, letra e, inciso 3, da Consolidação das leis Civis de Carlos Augusto
de Carvalho, do qual se extrai que “em princípio, a mulher casada não pode estar em
juízo sem autoridade e procuração de seu marido, prescindindo, entretanto, dessa
autorização para a prática dos atos nesse dispositivo enumerados, dentre os quais a
reivindicação dos bens doados ou alienados por seu cônjuge à sua concubina ou a
qualquer outra mulher com quem tenha praticado relação sexual.”218
Com a proclamação da República, em 1890, surgiu o Decreto 181 de
24.01.1890 que de acordo com Álvaro Villaça Azevedo, “secularizou o casamento. A
partir dele, o formalismo tomou conta da legislação brasileira, em matéria de
casamento, reeditando-se o sistema no Código Civil. Com isso, deixou o Estado
brasileiro não só de considerar o casamento de fato (por mera convivência duradoura
dos cônjuges), bem como o casamento religioso, que hoje, por si só, sem o posterior
registro civil, é considerado concubinato.”219
Regulado ou não, o concubinato, entendido como a relação informal e
livre, entre homem e mulher sempre existiu em nosso país. E quando os concubinos se
encontravam prejudicados ao término desta relação, ou melhor, a concubina era a mais
prejudicada, pois em muitas situações, se os concubinos adquiriam bens, estes ficavam
geralmente, registrados apenas em nome do concubino. Nesse panorama, os Tribunais
resolviam os casos concretos no âmbito do Direito das Obrigações, tratando as relações
concubinárias como sociedade de fato ou reconhecendo indenização por serviços
domésticos prestados pela concubina ao concubino, visando coibir o enriquecimento
ilícito.
Nesse panorama as palavras de Edgard de Moura Bittencourt: “o
fundamento exato de toda a construção jurisprudencial não é, na rigidez dos conceitos, a
sociedade de fato ou a prestação de serviços. O fulcro da decisão, confessada ou omitida

217
Edgard de Moura Bittencourt, O concubinato no direito, Rio de Janeiro: Editora jurídica e
universitária, v. 1, 2.ed., 1969, p.46.
218
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 69.
219
Álvaro Villaça Azevedo, União estável antiga forma do casamento de fato, Revista dos Tribunais, n.
701, março de 1994, p. 08.
65

a verdadeira razão, assenta-se na inadmissibilidade do enriquecimento ilícito, pois o


homem, que se aproveita do trabalho e da dedicação da mulher, não pode abandoná-la
sem indenização, nem seus herdeiros podem receber a herança sem desconto do que
corresponderia ao ressarcimento. O equilíbrio econômico, que impede o enriquecimento
ilícito, é a principal razão da sentença; a construção da partilha pela sociedade de fato
ou da remuneração de serviços constituem, em última análise, simples técnica de
julgamento.”220
Lentamente, por força da jurisprudência, os concubinos foram
conquistando direitos, até que a Constituição Federal de 1988, no artigo 226, §3º,
reconheceu, com o nome de união estável, a entidade familiar formada pelo homem e
pela mulher desimpedidos de casar. A Constituição Federal nada mais fez do que
reconhecer e explicitar uma situação que era imanente e inegável em nossa sociedade.
Nota-se que antes da regulamentação do artigo 226, §3º da Constituição
Federal, algumas leis avulsas foram conferindo direitos aos conviventes, como a Lei nº
6.015/73, art. 57, §2º que reconhece o direito da mulher em usar o nome de seu
companheiro; Lei 8.069/90, art. 42 que prevê a possibilidade de adoção por concubinos;
Lei 8.009/90, art. 1º que estipula bem de família imóvel residencial de entidade familiar;
Lei 8.213/91, art. 16, I que dispõe ser o companheiro dependente; Lei 8.245/91, arts. 11
e 12 que sub-roga o companheiro nos direitos do locatário; Lei 8.560/92, art. 2º que
dispõe sobre o reconhecimento de filhos.
Em relação à jurisprudência, destacam-se os seguintes avanços:
indenização acidentária (Súmula 35 STF)221; meação dos bens (Súmula 380 STF)222;
dispensabilidade da convivência more uxorio (Súmula 382 STF)223; testamento para
filho adulterino (Súmula 447 STF)224, além, da já mencionada indenização por serviços
domésticos prestados225.

220
Edgard de Moura Bittencourt, O concubinato, cit., p. 61.
221
Dispõe a Súmula 35 STF: “Em caso de acidente do trabalho ou de transporte, a concubina tem direito
de ser indenizada pela morte do amásio, se entre eles não havia impedimento para o matrimônio.”
222
Súmula 380 STF: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua
dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.”
223
Súmula 382 STF: “A vida em comum sob o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à
caracterização do concubinato.”
224
O artigo 1.803 do Código Civil de 2002, consagra esta Súmula. Dispõe que: “É lícita a deixa ao filho
do concubino, quando também o for do testador.”
225
Sobre indenização por serviços domésticos prestados, alguns julgados: TJRS - quarto grupo de
câmaras cíveis - embargos infringentes nº 596160853 – Rel. Eliseu Gomes Torres – j. 08.11.1996; TJRS –
7ª Câm. – Apelação cível nº 597206499 – Rel. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves - j. 17.12.1997;
TJSP – Apelação cível nº 4.062-4 – Rel. Ruy Camilo – j. 18.11.1997.
66

Posteriormente, surgiram as Leis nº 8.971 de 29 de dezembro de 1994


regulando o direito a alimentos e sucessão entre os companheiros e a Lei nº 9.278 de 13
de maio de 1996 que trouxe direitos e deveres. Por fim, com o advento do Código Civil
de 2002, Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002, a união estável se consolida no Direito
de Família.
Gustavo Tepedino sintetiza em três fases a evolução doutrinária,
jurisprudencial e legislativa referente à união estável: “a) a primeira tem início com a
rejeição pura e simples do concubinato, estigmatizado pelo Código Civil de 1916 como
relação adulterina, culminando com a sua assimilação pela jurisprudência no âmbito do
direito obrigacional (...); b) em seguida, delineia-se nitidamente a relevância atribuída
pelo legislador especial ao concubinato (desde que não adulterino), não mais como mera
relação de direito obrigacional mas como vida lícita em comum (...); c) a terceira fase,
finalmente, compreende a tutela constitucional das entidades familiares não fundadas no
matrimônio (...)”226

226
Gustavo Tepedino, Novas formas de entidades familiares, cit., p. 329.
67

2. TERMINOLOGIA ADOTADA

Primeiramente, é preciso esclarecer a diferença entre união estável e


concubinato. A união livre entre homens e mulheres foi por muito tempo denominada
concubinato e, em certos momentos históricos, foi combatido, sendo considerado ilegal
e imoral.
Conforme noticia Eduardo de Oliveira Leite, o termo concubinato
“sempre foi encarado com reserva e indisfarçável mal-estar, porque em país
predominantemente católico, as uniões de homens e mulheres fora do círculo restrito da
união formal, do casamento, são encaradas como espúrias, criticáveis e passíveis de
sanção.”227
A importância de tal distinção relaciona-se com o tratamento jurídico
dispensado aos direitos e deveres decorrentes destas formas de união. Assim, em se
tratando de união estável, os direitos e deveres serão disciplinados no direito de família.
Se se tratar de concubinato, será no âmbito do direito obrigacional228. No mesmo
sentido Washington de Barros Monteiro, ao ponderar que o concubinato não terá a
proteção do direito de família, “podendo, apenas, se comprovada a existência de
sociedade de fato, gerar efeitos de ordem obrigacional, para evitar o enriquecimento
ilícito.”229
De Plácido e Silva definem concubinato como sendo a “união ilegítima
do homem e da mulher. É, segundo o sentido de concubinatus, o estado de mancebia,
ou seja, a companhia de cama sem aprovação legal.”230
Álvaro Villaça Azevedo estabelecendo a etimologia da palavra
concubinato, ensina que “em sentido etimológico, concubinatus, do verbo concumbere
ou concubare (derivado do grego), significava, então, mancebia, abarregamento,
amasiamento.”231

227
Eduardo de Oliveira Leite, Direito civil aplicado – Direito de família, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, vol. 5, 2005, p. 417.
228
Segundo Rodrigo da Cunha Pereira, Da união estável, cit., p. 265. Contudo, autores como José
Lamartine Corrêa de Oliveira e Francisco José Ferreira Muniz, Curso, cit., p. 79, entendem que a questão
da terminologia é mais semântica do que jurídica.
229
Washington de Barros Monteiro, Curso de direito civil – direito de família, São Paulo: Saraiva, v. 2,
37.ed., 2004, págs. 35/36.
230
De Plácido e Silva, Vocabulário, cit., v. I (a-c), p. 490.
231
Álvaro Villaça Azevedo, União estável, cit., RT 701/08.
68

O vocábulo concubinato carregava um sentido pejorativo, negativo, de


união ilícita, irregular. A palavra concubina qualificava e ainda qualifica, a mulher que
se relaciona com o homem casado. Guilherme Calmon Nogueira da Gama anota que “na
verdade, o sentido pejorativo, preconceituoso, atribuído ao “concubinato” tinha como
fonte a predominância do apego a valores tradicionais, rígidos, que somente
reconheciam o casamento como instituto gerador da família.”232
Assim, leciona Edgard de Moura Bittencourt: “concubinato exprime a
idéia geral de união mais ou menos prolongada, fora do casamento. Pode revestir-se de
aspectos morais ou imorais. Companheira é a designação elevada que se dá à mulher
unida por longo tempo a um homem, como se fosse sua esposa; mas, como não existem
os laços do casamento civil, é concubina.”(grifos do autor)233
Ensina Rodrigo da Cunha Pereira que “antes de ter sentido técnico-
jurídico, esse termo é a indicação de um modo de vida ou um estado, a marca de um
(pré)conceito que vem se formando ao longo do tempo. Nomear uma mulher de
concubina é socialmente uma ofensa. É como se se referisse à sua conduta moral e
sexual de forma negativa.”234
Pode-se classificar o concubinato em puro e impuro. É puro o que
qualifica a união entre homem e mulher desimpedidos de casar e, o concubinato impuro,
é a união entre homem e mulher impedidos de casar, qualificando as relações
incestuosas e adulterinas235.
Álvaro Villaça Azevedo entende puro o concubinato “quando ele se
apresenta com os aludidos elementos do conceito expendido, ou seja, como uma união
duradoura, sem casamento, entre homem e mulher, constituindo-se a família de fato,
sem qualquer detrimento da família legítima. (...) Tenha-se, por outro lado, que o
concubinato será impuro, se for adulterino, incestuoso ou desleal (relativamente a outra
união de fato), como o de homem casado ou concubinado, que mantenha, paralelamente
ao seu lar, outro de fato.”236

232
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo – uma espécie de família, São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2.ed., 2001, p. 126.
233
Edgard de Moura Bittencourt, O concubinato, cit., p.113.
234
Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato e união estável, Belo Horizonte: Del Rey, 6.ed., 2001, p.02.
235
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v.5, págs. 330/332, traz a diferença entre concubinato puro e impuro e
apresenta como concubinato impuro adulterino aquele que: “se fundar no estado de cônjuge de um ou
ambos os concubinos, p. ex., se homem casado, não separado de fato, mantém, ao lado da família
matrimonial, uma outra; e incestuoso, se houver parentesco entre os amantes.”
236
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 66.
69

Afora o sentido negativo que pode enunciar o termo concubinato, por


qualificar relações ilícitas e imorais, com a consagração constitucional da união estável
ao patamar de entidade familiar, a tendência é o abandono da expressão concubinato
para designar a entidade familiar constituída pela união estável, em vista da
inadequação do termo para expressar a união consagrada pela Carta Magna.
Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião Luiz Amorim ao
estabelecerem a diferença entre os termos concubina e companheira anotam que
concubina “seria a mulher dos encontros velados freqüentada ao mesmo tempo pelo
homem casado, na constância do convívio com sua esposa legítima, situação imoral,
que nem a sociedade admite e a lei nenhum amparo poderia dar. A ‘companheira’, ao
invés, é a que vive com homem solteiro, viúvo, ou separado da esposa, cujo lar já está
desfeito, como se casados fossem, legitimamente, por isso gozando de certos direitos,
como reconhecem as leis fiscais e previdenciárias.” 237
Nesse sentido, Marilene Silveira Guimarães observa que “após a
Constituição Federal de 1988, não se deveria mais usar a expressão concubinato, e sim
união estável, como consta do art. 226, §3º. Os pares deveriam ser denominados de
companheiros e não mais concubinos, utilizando-se esta denominação apenas para os
que vivem em concubinato adulterino ou união clandestina, para evitar confusões.”238
Assim, denominam-se companheiros ou conviventes aqueles que
constituem união estável e, concubinos, os que vivem o concubinato impuro. Aliás, o
novo Código Civil, ao referir-se à união estável, usa a palavra companheiros e, quando
quer fazer referência ao concubinato impuro, fala em concubinos239.
Rui Stoco aponta a distinção entre união estável e concubinato, para o
autor, união estável “pressupõe convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida
com o objetivo de constituição de família, sem que haja qualquer impedimento entre os
conviventes para essa união ou para o casamento. Constitui verdadeiro ‘concubinato

237
Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião Luiz Amorim, Concubinato, companheiros: novos rumos,
Direito de Família – Aspectos, constitucionais, civis e processuais, coord. Teresa Arruda Alvim, São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, v. 2, 1995, págs. 74/75. Consultar também obra de Euclides
Benedito de Oliveira, União estável – Do concubinato ao casamento – Antes de depois do novo Código
Civil, São Paulo: Método, 6.ed., 2. tir., 2003, págs., 31/32, onde o autor também ratifica a distinção entre
dos termos companheiro ou convivente e concubino.
238
Marilene Silveira Guimarães, Reflexões acerca de questões patrimoniais nas uniões formalizadas,
informais e marginais, Repertório de jurisprudência e doutrina sobre direito de família: aspectos
constitucionais, civis e processuais, coord. Teresa Arruda Alvim, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, v. 2, 1995, p. 199.
239
Consultar artigos 1.694; 1.724 a 1.726; 1.775; 1.790; 1.797, I; 1.801, I e III; 1.814, I e II; 1.844 todos
do Código Civil de 2002.
70

puro’ (Código Civil, art. 1723). O concubinato propriamente dito, ou “concubinato


impuro”, também previsto no artigo 1.727 da Lei Civil, é aquele no qual homem e
mulher mantêm relações não eventuais e, portanto, more uxório, mas encontram-se
impedidos de se casar, nos termos do art. 1.521 desse Código.”240
A doutrina nem sempre fez essa distinção241, usando os termos
concubinos e companheiros indistintamente242. Neste trabalho, far-se-á a distinção,
usando a palavra companheiro ou convivente para designar união estável e, concubino,
para concubinato impuro.

240
Rui Stoco, Tratado, cit., p.787.
241
São autores que tratam os termos concubinato e união estável como sinônimos, Paulo Dourado de
Gusmão, Dicionário de direito de família, Rio de Janeiro: Forense, 2.ed., 1987, p.355 e José Lamartine
Correa de Oliveira e Francisco José Ferreira Muniz, Direito de família: direito matrimonial,Porto Alegre:
S.A Fabris, 1990, p.75, Apud Carmem Lucia Silveira Ramos, Família, cit., págs. 33/34.
242
Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Efeitos patrimoniais do concubinato, São Paulo: Saraiva, 1997, p. 33,
manifesta as seguintes considerações em relação ao uso das expressões concubinos, companheiros e
conviventes: “a expressão concubino não guarda mais conteúdo pejorativo, inclusive em função da
própria evolução sociojurídica na aceitação do instituto, nada obstando portanto a sua utilização, de
maneira ampla, para todas as espécies de concubinato (puro ou impuro), com a ressalva de que, em se
tratando de concubinato puro, é imperioso reconhecer como tecnicamente mais correto o emprego da
terminologia companheiro ou convivente, nos moldes queridos pelo legislador (e, aliás, consoante tem-se
manifestado a maior parcela da doutrina e da jurisprudência).”
71

3. CONCEITO

Feitas essas considerações iniciais, temos que a união entre homem e


mulher é um fato natural.
Sem regulamentação normativa, por muito tempo a união estável ficou às
margens da lei. Com a Constituição Federal de 1988 houve a consagração da união
estável ao patamar de entidade familiar. Dispõe o artigo 226, §3º: “para efeito da
proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como
entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”243
Percebe-se que a Constituição Federal denomina entidade familiar e não
família, a união estável entre homem e mulher, bem como a chamada família
monoparental que é a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes
(artigo 226, §4º da Constituição Federal de 1988).244
Observa-se que a família não é uma criação legislativa. Desde os
primórdios da civilização, muitos antes do casamento, já existia a família, o casamento
foi uma conseqüência, no decorrer da história, desse fato natural. Nota-se que a família
nem sempre tem ligação com o casamento, haja vista a família monoparental, assim
como a família substitutiva adotiva.245
Outra observação que se faz do parágrafo terceiro do artigo 226 da
Constituição Federal é que não pretendeu o constituinte, a equiparação da união estável
com o casamento. A uma, porque segundo o texto constitucional, o casamento gera
família e a união estável gera entidade familiar. A duas, porque a parte final do
parágrafo, pede que lei facilite a conversão da união estável em casamento. Só se
converte o que é desigual, se a Constituição quisesse equiparar união estável com o
casamento, não pediria lei para facilitar tal conversão. Também é possível destacar que
não houve a equiparação, considerando as formas de extinção da união estável. O

243
Comentando o artigo 226, §3º, da Constituição Federal de 1988, ensina José Cretella Jr., Comentários,
cit., p. 4530: “Alarga esta regra jurídica constitucional o conceito de família, de entidade familiar,
compreendida, latu sensu, não somente a união estável entre o homem e a mulher, como também entre o
homem e seus descendentes e entre a mulher e seus descendentes.”
244
Segundo Eduardo de Oliveira Leite, Famílias, cit., p.27: “a verdade é que o constituinte de 1988
acabou reconhecendo a existência de outras formas de família, ou novas formas de família, consagrando –
a gosto ou contragosto – a noção de família monoparental, no que revelou uma tendência constatável na
maioria dos países ocidentais: a referência à família biparental (até então considerada “legítima” e
elevada à categoria de juridicamente válida) como modelo das outras formas de família(...)”
245
Consultar Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 5, p. 337.
72

casamento de ambos os companheiros extingue a união estável, da mesma maneira, o


rompimento convivencial, a morte e o abandono.
Doutrina nesta linha de raciocínio, José Carlos Moreira Alves, ensinando
que “não ocorreu, porém, equiparação entre os dois institutos, ao contrário do que se
apressaram a sustentar alguns: a família resultante da união estável coexiste com a
fundada no casamento, mas aquela não se identifica com este. Tanto assim, que,
segundo o texto constitucional, a lei deve facilitar a conversão da união estável em
casamento – o que não teria sentido se um e outro já estivessem igualados.”246
Nesse sentido, a lição de Guilherme Calmon Nogueira da Gama, “a não
equiparação da denominada “união estável” ao casamento é clara diante da
interpretação teleológica da norma constitucional. A doutrina, em sua esmagadora
maioria, vem interpretando a Constituição Federal, nesse particular, de forma a concluir
pela inexistência de equiparação do companheirismo ao casamento. E, diga-se, em
passant, de forma acertada. Caso houvesse equiparação ao casamento, qual seria o
sentido da norma que prevê que a lei deve facilitar a conversão da “união estável” em
casamento?”247
Tem a mesma posição Silvio Rodrigues: “sendo a união estável instituto
de natureza diversa do casamento, o fato de a Constituição tê-la declarado entidade
familiar não implica que se apliquem a ela todos os efeitos daquele.”248
Posicionamento diverso tem Gustavo Tepedino, procurando resolver a
questão analisando a ratio das normas que se pretende interpretar, distingue as normas
informadas por princípios relativos à solenidade do casamento e, neste ponto, não as
estende à união estável, por outro lado, quanto às normas “informadas por princípios

246
José Carlos Barbosa Moreira, O novo Código, cit., p. 53; Também se manifestam pela não equiparação
da união estável com o casamento: Sérgio Gilberto Porto, União estável: natureza jurídica e
conseqüências, AJURIS, v. 20, n 59, p. 270, “a união estável está sendo tratada como se casamento fosse,
quando, na verdade, se constitui em instituto jurídico apenas assemelhado ao casamento nas
conseqüências e não idêntico a este.”; Teresa Arruda Alvim Pinto, Entidade familiar e casamento formal:
aspectos patrimoniais, Direito de Família – Aspectos constitucionais, civis e processuais, coord. Teresa
Arruda Alvim Pinto, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, v 01, 1993, p.90: “união estável entre
homem e mulher não é casamento. Trata-se entretanto de uma realidade a que o direito não pode fechar
os olhos.”; Caio Mário da Silva Pereira, Instituições, cit., v. V, p. 534: “De primeiro, afasta-se a sua
equiparação ao casamento. Uma vez que “a lei facilitará sua conversão em casamento” deixou bem claro
que não igualou a entidade familiar ao casamento. Não se cogita de conversão, se se tratasse do mesmo
conceito.”; Arnoldo Wald, O novo direito de família, São Paulo: Saraiva, 13.ed., 2000, p.227: “Foi
concedida, portanto, proteção constitucional às famílias de fato, ou naturais, sem que tal signifique a sua
equiparação às famílias legítimas ou constituídas pelo matrimônio.”Consultar também: Sílvio de Salvo
Venosa, Direito, cit., v. 6, p. 59.
247
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p.146
248
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 6, p. 272. Seguem a mesma orientação: Maria Helena Diniz, Curso,
cit., v. 5, p.337; Lourival Silva Cavalcanti, União estável, São Paulo: Saraiva, 2003, p.04.
73

próprios da convivência familiar, vinculada à solidariedade dos seus componentes, aí,


sim, indubitavelmente, a não aplicação de tais regras contrariaria o ditame
constitucional”, esclarece o autor que “à união estável, como entidade familiar, aplicam-
se, em contraponto, todos os efeitos jurídicos próprios da família, não diferenciando o
constituinte, para efeito de proteção do Estado (...) a entidade familiar constituída pelo
casamento daquela constituída pela conduta espontânea e continuada dos companheiros,
não fundada no matrimônio.”249
A união estável encontra garantia constitucional no artigo 226, §3º da
Constituição Federal de 1988, mas este artigo não protege qualquer união livre. A
proteção constitucional abrange apenas a entidade familiar formada entre homem e
mulher, preenchendo todos os requisitos constitucionais, que serão examinados em item
próprio. Assim, não se enquadram no artigo 226, §3º as uniões transitórias, incestuosas
e adulterinas. Cabe aqui a lição de Francisco José Cahali ao apontar a diferença entre
namoro e união estável, segundo o autor, o namoro “(...) diferencia-se da união estável
no tópico relativo à finalidade. Enquanto a união estável traz em seu bojo a idéia de
constituição de núcleo familiar, o namoro, não.”250
A união estável é conceituada por Carlos Alberto Menezes Direito como
a “entidade familiar formada por um homem e uma mulher, é a vida em comum, more
uxório, por período que revele estabilidade e vocação de permanência, com sinais
claros, induvidosos da vida familiar, e com o uso em comum do patrimônio.”251
Para Francisco José Cahali, união estável “é o vínculo afetivo entre o
homem e a mulher, como se casados fossem, com as características inerentes ao
casamento, e a intenção de permanência da vida em comum.”252
Maria Helena Diniz aduz que “a Constituição Federal, ao conservar a
família, fundada no casamento, reconhece como entidade familiar, a união estável,
notória e prolongada de um homem com uma mulher, vivendo ou não sob o mesmo
teto, sem vínculo matrimonial, desde que tenha condições de ser convertida em
casamento, por não haver impedimento legal para sua convolação.” (grifos da autora)253

249
Gustavo Tepedino, Novas formas, cit., p. 341.
250
Francisco José Cahali, Família e sucessões no Código Civil de 2002: acórdãos, sentenças, pareceres e
normas administrativas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004 (coletânea orientações
pioneiras; v. 1), p. 268.
251
Carlos Alberto Menezes Direito, Da união estável como entidade familiar, Revista dos Tribunais, São
Paulo, n. 667, p. 22, maio de 1991.
252
Francisco José Cahali, União estável e alimentos entre companheiros, São Paulo: Saraiva, 1996, p. 87.
253
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 5, págs. 321/322.
74

Entende Marco Aurélio Souza Viana que para conceituar união estável é
preciso levar em consideração o elemento vontade, assim, para o autor, união estável “é
a convivência entre homem e mulher, alicerçada na vontade dos conviventes, de caráter
notório e estável, visando a constituição de família.”254
Rodrigo da Cunha Pereira defini união estável como “a relação afetivo-
amorosa entre um homem e uma mulher, não-adulterina e não-incestuosa, com
estabilidade e durabilidade, vivendo sob o mesmo teto ou não, constituindo família sem
o vínculo do casamento civil.”255
Gustavo A. Bossert e Eduardo A. Zannoni conceituam união estável
como “la unión permanente de un hombre y una mujer, que sin estar unidos por
matrimonio, mantienen una comunidade de habitación y de vida, de modo similar a la
que existe entre los cónyuges.” 257
Pode-se conceituar união estável como a união notória e prolongada entre
homem e mulher sem vínculo matrimonial e que possa ser convertida em casamento.
O atual Código Civil disciplina a união estável em cinco artigos, do
artigo 1.723 ao 1.727, ressaltando no artigo 1.727 a disciplina do concubinato, pois

254
Marco Aurélio Souza Viana, Da união estável, São Paulo: Saraiva, 1999, p. 29.
255
Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato, cit., p.29.
257
Gustavo A. Bossert e Eduardo A. Zannoni, Manual de derecho de familia, Buenos Aires: Editorial
Astrea, 5.ed., 3.reimpr., 2001, p. 423. Tradução: “é a união permanente de um homem e uma mulher, que
sem estarem unidos pelo casamento, mantêm uma comunhão de habitação e de vida, de modo similar à
que existe entre os cônjuges.” Gustavo A. Bossert, em obra anterior, Régimen jurídico del concubinato,
Buenos Aires: Editorial Astrea, 1982, p. 36, já expôs definição de união estável, porém, sem pretender
uma definição precisa, conceituou o autor: “Coincidiendo con lo esencial de esa definición, y teniendo en
cuenta las características que presenta frente al derecho la figura, y sin pretender dar una definición
precisa, entendemos que puede considerarse que el concubinato es la unión permanente de un hombre y
una mujer, que sin estar unidos por matrimonio, mantienen una comunidad de habtación y de vida, de
modo similar a la que existe entre los cónyuges.” Tradução: “Concordando com o essencial desta
definição, e levando em conta as características que a figura apresenta frente ao direito, e sem pretender
dar uma definição precisa, entendemos que pode considerar-se que o concubinato é a união permanente
de um homem e uma mulher, que sem estarem unidos pelo casamento, mantêm uma comunhão de
habitação e de vida, de modo similar à que existe entre os cônjuges.”
75

cuida das relações não eventuais entre homem e mulher, impedidos de casar. Além dos
artigos que compõem o título “da união estável”, outros também se referem à matéria,
os mais importantes são: o artigo 1.694 que fixa a possibilidade de companheiros
exigirem uns dos outros alimentos de que necessitem para viver de modo compatível
com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
Outro dispositivo que se destaca e o artigo 1.790, sob o título da sucessão geral, capítulo
das disposições gerais, estabeleceu o Código a sucessão da companheira ou
companheiro. Estes dois direitos serão objeto de estudo adiante.
A fim de ressaltar que união estável e casamento são institutos diferentes,
observa Sérgio Gilberto Porto que o casamento é “a maneira formal de se constituir
família, através de ajustes prévios, proclamas e todos os demais ritos de passagem. Já
aquela (união estável) representa a maneira informal de constituir legitimamente esta
mesma família, uma vez que para a sua existência não se impõem todos os ritos de
passagem prévios e indeclináveis à caracterização do casamento, eis que esta é fato.”258
Desta forma, basicamente, o que diferencia união estável e casamento é
a informalidade daquele instituto que não tem dia e hora para começar ou terminar, ao
contrário do casamento, nesse sentido as palavras de Fernando Malheiros Filho: “a
união estável, ordinariamente, não se erige por um fato, um momento, um átimo, mas
pela sucessão ininterrupta e duradoura de fatos, cuja sedimentação permite divisar com
clareza a figura da família. E mais, a união estável, por significar a consolidação de um
relacionamento de trato sucessivo ao longo dos anos, não produz efeitos no dia seguinte
ao seu início, mas somente após a referida sedimentação de acontecimentos, por vários
anos, quando, uma vez consolidada, aí sim, faz retroagir seus efeitos, em peculiaríssima
situação jurídica.”259

258
Sérgio Gilberto Porto, União, cit., p. 271.
259
Fernando Malheiros Filho, União estável, Porto Alegre: Síntese, 2.ed., 1998, p. 23.
76

4. NATUREZA JURÍDICA

De fundamental importância é estabelecer a natureza jurídica da união


estável no âmbito deste trabalho.
A aplicação da responsabilidade civil para reparar eventuais danos no
rompimento culposo da união estável está intimamente relacionada com a natureza
jurídica que se atribui à união estável.
Já se afirmou (no capítulo I, item 4) que justifica-se a responsabilidade
civil extracontratual na união estável pelo cometimento de ato ilícito.
Cabe agora esclarecer a natureza jurídica da união estável.
Há autores que defendem a natureza contratual, como Regina Beatriz
Tavares da Silva Papa dos Santos que leva em consideração o elemento vontade para
atribuir à união estável a natureza jurídica de contrato. Segundo a autora: “é a vontade
dos conviventes que impera em todas as fases da união estável, razão pela qual, assim
como o casamento, essa relação é um contrato, embora especial porque regulado pelo
Direito de Família.”260
Outros autores, porém, entendem tratar-se de fato jurídico em sentido
estrito. Nesse sentido, Sérgio Gilberto Porto: “a união estável, de sua parte, não é um
contrato, na medida em que para sua ocorrência não se exige a formalização de qualquer
ajuste prévio; ela, em verdade, apenas acontece na roda viva da existência. E por
acontecer é um fato, tal qual a posse, daí ter sua natureza jurídica definida como um
fato. E é um fato capaz de produzir conseqüências jurídicas, pois faz nascer entre seus
integrantes um vínculo definido pelo jurista como relação jurídica de Direito Material,
projetando para além do imediato conseqüências, e são estas e apenas estas que devem
ser regulamentadas.”261 Na mesma linha de pensamento, Edgar de Moura Bittencourt:
“(...) basta qualquer efeito para que se tenha por jurídico o fato que se analisa. É
indiscutível que o concubinato está nessas condições.”262 E Sílvio de Salvo Venosa:
“Destarte, acentuemos que a natureza jurídica de ambos os fenômenos é diversa:
enquanto o casamento é negócio jurídico, a união estável é fato jurídico.”263
Claudia Grieco Tabosa Pessoa antes de estabelecer a natureza jurídica da
união estável, esclarece a natureza do casamento a fim de dissociar a natureza jurídica

260
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade civil dos conviventes, cit., p. 26.
261
Sérgio Gilberto Porto, União estável: natureza jurídica e conseqüências, cit., págs., 270/271.
262
Edgar de Moura Bittencourt, O concubinato, cit., p. 107.
263
Sílvio de Salvo Venosa, Direito civil, cit., v. 6, p. 59.
77

deste último com a da união estável. E conclui: “quanto ao concubinato puro, o


legislador expressamente dispôs acerca da proteção legal equiparada, quanto a
determinados efeitos jurídicos, à entidade familiar, criando na verdade uma nova
espécie de entidade familiar, a formada pela união estável; não regulamentou um ato
jurídico, mas dispôs acerca dos efeitos de um fato jurídico estrito. Essa a natureza
jurídica do instituto.”264
Francisco José Cahali, também se refere à união estável como fato
jurídico, citam-se algumas passagens: “(...) mesmo sendo juridicamente impossível a
instituição da união por cláusula contratual, os efeitos previstos para a projetada relação
ficam momentaneamente suspensos até que o fato jurídico se realize.” Adiante, ao
analisar a natureza e essência do contrato de convivência, afirma o autor que este
contrato é subordinado à união estável, é acessório desta, “pois o acessório tem forma
prescrita em lei (contrato escrito), mas o principal prescinde de qualquer formalismo ou
solenidade; ao contrário, afasta a formalidade ao representar um fato, não um ato
jurídico.”265(grifos nossos)
No capitulo I, item noções gerais, já se falou em fato jurídico para situar
o ato ilícito, agora, de sobejo, cabe a análise do fato jurídico. Pode-se dizer que fato
jurídico é “todo fato capaz de gerar direitos, transformá-los ou modificá-los e extingui-
los.”266 Para Savigny, “fatos jurídicos são os acontecimentos em virtude dos quais
relações de direito nascem e se extinguem.”267 Arruda Alvim defini fato jurídico como
“todo acontecimento da vida relevante para o Direito, mesmo que seja fato ilícito.”268
(grifos do autor).
Antonio Junqueira Azevedo leciona que “determinados fatos que, na
realidade, são atos voluntários poderão entrar no mundo jurídico como fatos em sentido
estrito, por a norma jurídica não levar em conta, na sua composição, nem o elemento
‘declaração de vontade,’ nem sequer a simples manifestação de vontade; por exemplo, a
morte, para efeitos sucessórios, é fato involuntário (fato jurídico em sentido estrito),
quer se esteja diante de morte natural, quer de morte provocada por terceiros, quer

264
Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Efeitos patrimoniais do concubinato, cit., p., 40.
265
Francisco José Cahali, Contrato de convivência na união estável, São Paulo: Saraiva, 2002, págs., 65 e
67.
266
De Plácido e Silva, Vocabulário jurídico, cit., v. II – D- I, p. 273.
267
Apud Antonio Junqueira Azevedo, Negócio jurídico: existência e eficácia, São Paulo: Saraiva, 4.ed.,
2002, p. 23.
268
Arruda Alvim, Manual de direito processual civil – parte geral, São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, v. 1, 9.ed., 2005, p. 393.
78

finalmente, se trate de suicídio e, portanto, neste último caso, ela tenha sido, na
realidade, ato de vontade.”269 (grifo do autor)
Claudia Grieco Tabosa Pessoa esclarece a questão: “ (...) quer se trate de
união concubinária passageira, na qual não se vislumbra a intenção das partes quanto à
eventual vida em comum, quer se trate de verdadeira união estável, onde prevalece o
elemento volitivo quanto à comunhão de vida e interesses, o concubinato é fato jurídico
em sentido estrito, porquanto, para o ordenamento, a manifestação de vontade é
irrelevante e o critério adotado para a classificação entre fatos jurídicos e atos jurídicos
deve levar em conta o que ‘o ordenamento jurídico considera e dê valor ao que na
realidade se passa.’”270
Assim, conseqüência de se estipular natureza contratual à união estável
seria enquadrá-la na responsabilidade contratual onde a culpa é presumida. Por outro
lado, entendida como fato jurídico em sentido estrito, poder-se-ia enquadrá-la na
responsabilidade civil extracontratual baseada na culpa.
Entende-se a união estável como fato jurídico em sentido estrito, pois sua
formação verifica-se com o tempo, presentes elementos particulares, tais como a
notoriedade, a unicidade do vínculo, a fidelidade, a intenção de viver como se casados
fossem, ou seja, a estabilidade da relação solidifica-se com o passar dos anos.
Verifica-se que a união estável é fato gerador de efeitos, razão pela qual
o direito deixou de ignorá-la há muito tempo.
Desta forma, verificados os pressupostos caracterizadores da
responsabilidade civil no rompimento culposo da união estável, funda-se a reparação de
danos na responsabilidade extracontratual.
Contudo, em havendo contrato escrito, a união estável não deixa de ser
fato jurídico em sentido estrito, pois o contrato não é formador desta união, ele vem
apenas regular direitos e deveres, de modo que tanto pode ser celebrado no início da
união ou a qualquer momento.271

269
Antonio Junqueira Azevedo, Negócio jurídico, cit., p. 17.
270
Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Efeitos patrimoniais do concubinato, cit., p., 40.
271
Consultar Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Efeitos patrimoniais do concubinato, cit., págs., 40/42.
79

5. REQUISITOS PARA CONFIGURAÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL

Do conceito de união estável são retirados os elementos essenciais para a


sua configuração, como a diversidade de sexo, ausência de matrimônio válido ou de
impedimento matrimonial, coabitação, notoriedade e fidelidade, como elementos
objetivos e, a convivência more uxorio e affectio maritalis, como elementos subjetivos.
Assim, na doutrina verificam-se outras características que também
qualificam a união, mas não são imprescindíveis para sua caracterização.272 Entre os
doutrinadores, Guilherme Calmon Nogueira da Gama, sem desconsiderar a estreita
relação que existe entre as qualidades e os requisitos que configuram a união estável,
estabelece as seguintes características e requisitos: “as características do
companheirismo são as seguintes: a) finalidade de constituição de família; b)
estabilidade; c) unicidade de vínculo; d) notoriedade; e) continuidade; f) informalismo
ou ausência de formalidades. Ao lado destas, apresentam-se como requisitos da união
supramencionada: 1) requisitos objetivos: a) diversidades de sexos; b) ausência de
impedimentos matrimoniais; c) comunhão de vida; d) lapso temporal de convivência; 2)
requisitos subjetivos: a) convivência more uxório; b) affectio maritalis: ânimo de
constituir família.”273
Maria Helena Diniz apresenta como elementos essenciais para a
configuração da união estável: a diversidade de sexo; ausência de matrimônio válido e
de impedimento matrimonial; notoriedade; honorabilidade; fidelidade ou lealdade;
coabitação e a colaboração da mulher no sustento do lar. E como elementos
secundários: a dependência econômica da mulher; a compenetração das famílias;
criação e educação pela convivente dos filhos de seu companheiro; casamento no
estrangeiro de pessoa separada judicialmente; gravidez e filhos da convivente com o
homem com quem vive; situação da companheira como empregada doméstica do outro;
maior ou menor diferença de idade entre os conviventes e existência de contrato.”274
E Francisco José Cahali apresenta como requisitos objetivos: a
diversidade de sexos; inexistência de impedimento matrimonial; vida em comum sob o

272
Consultar Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 6. págs. 258/259; Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato,
cit., p. 29; José Carlos Barbosa Moreira , O novo Código, cit., págs. 56/57; Caio Mário da Silva Pereira,
Instituições, cit., v. V, págs. 45/46.
273
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p. 149.
274
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 5, págs., 322/329.
80

mesmo teto; período transcorrido na convivência; notoriedade e fidelidade e como


requisitos subjetivos: convivência more uxorio e affectio maritalis.275
A partir das características e requisitos encontrados na doutrina, será
dada relevância aos requisitos que são necessariamente imprescindíveis para a
configuração da união estável, pois como observa Rodrigo da Cunha Pereira: “os
elementos caracterizadores da união estável são aqueles que vão delineando o conceito
de família. Não é a falta de um desses elementos aqui apresentados que descaracteriza
ou desvirtua a noção de união estável.”276
Antes, porém, cumpre esclarecer a importância dos requisitos a serem
analisados, pois a existência ou não da união estável, se verifica presentes os requisitos
indispensáveis, haja vista que o fator tempo, antes exigido pelo artigo 1º da lei nº
8.971/94, não mais se faz presente. Assim, não é qualquer forma de união livre que fará
jus à proteção constitucional, mais ainda pelas normas do direito de família.
Preferiu o legislador dispensar o fator temporal para configurar união
estável e valorar outros requisitos como a publicidade, continuidade, durabilidade e a
constituição da família. Neste contexto, Eduardo de Oliveira Leite, apresenta decisão do
Tribunal de Justiça de Santa Catarina: “Uma união entre homem e mulher pode durar
dez ou mais anos e não ser, necessariamente estável (texto constitucional), como pode
durar menos de cinco e atender a esse requisito. Qualquer prazo mínimo não deve ser
imposto em termos absolutos (...) Fixar um prazo cronológico mínimo para aferir a
existência de uma união estável é correr o risco de detectá-lo onde não existe ou, o que é
pior, negá-la onde de fato se afigura.”277
Desta forma, em relação ao prazo de cinco anos antes exigido, objeto de
muitas críticas, tanto que foi retirado da lei subseqüente, lei nº 9.278/96 e o Código
Civil de 2002, também não estabeleceu prazo, pois era difícil precisarem os fatos, o
exato momento em que a relação deixou de ser furtiva, para constituir família e, a
injustiça de se negar efeitos a um relacionamento que findou poucos dias antes de
completar cinco anos.278
Desta feita, pondera Rodrigo da Cunha Pereira: “é em adição a outros
elementos, como affectio societatis, estabilidade, projetos de vida em comum, relação

275
Francisco José Cahali, União estável, cit., págs., 58/74.
276
Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato, cit., p. 34.
277
Eduardo de Oliveira Leite, Direito civil aplicado, cit., p. 425. TJSC, AI 9.812.159-0, 2ª CC, rel. Des.
Vanderlei Romer, DJSC 28.12.1999, p. 09.
278
Fernando Malheiros, União estável, cit., p. 30.
81

de dependência econômica, e a elementos que cada caso apresenta, que se caracterizará


a união estável, a entidade familiar.”279
No entanto, há o Projeto de lei nº 2.686 de 1996, denominado “estatuto
da união estável”, que prevê no artigo 1º prazo de cinco anos para o reconhecimento da
união estável e, em havendo filhos comuns, este prazo cairá para dois anos.280
Sérgio Gischkow Pereira posiciona-se a favor do prazo de cinco anos,
podendo este ser reduzido em hipótese de existência de prole ou ocorrência de vida sob
o mesmo teto, desde que presentes elementos comprobatórios que demonstrem o ânimo
de união estável. Justifica o autor: “os seres humanos se aproximarão uns dos outros em
busca de vantagens financeiras e econômicas, vendo no seu semelhante apenas um
cifrão. Mais se reforçará a nociva e violenta monetarização das relações sociais, hoje
assistida dramaticamente.”281
Enquanto não se aprova o Projeto nº 2.686/96, anota Yussef Said Cahali:
“já não mais se cogita de um prazo mínimo de duração da vida comum dos
companheiros ou da eventual existência de prole, como substitutiva de eventual dilação
temporal, reclamando a lei apenas que essa convivência seja ‘duradoura’, requisito que,
como Standard jurídico, por certo será apreciado segundo o prudente arbítrio do
julgador, atento à ostensividade e continuidade da relação, e ao objetivo primário da
mesma de ‘constituição da família’”.282
Como um dos requisitos indispensáveis, tem-se a diversidade de sexos. É
expressa a norma constitucional ao estabelecer a diversidade de sexos, reconhecendo a
união estável entre homem e mulher. Desta forma, o constituinte exclui a união entre

279
Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato, cit., p. 33. Também aplaude o fim do prazo de 05 anos,
Euclides Benedito de Oliveira, A Constituição Federal de as inovações no Direito de Família, cit., p.35;
Antônio Carlos Mathias Coltro, A Constituição Federal e a união estável entre homem e mulher, Direito
de Família –Aspectos constitucionais, civis e processuais, coord. Teresa Arruda Alvim Pinto, São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 1993, págs. 50/51.
280
Projeto de lei nº 2.686/1996, art. 1º: “é reconhecida como união estável a convivência, por período
superior a cinco anos, sob o mesmo teto, como se casados fossem, entre um homem e uma mulher, não
impedidos de realizar matrimônio ou separados de direito ou de fato dos respectivos cônjuges. Parágrafo
único: o prazo previsto no caput deste artigo poderá ser reduzido a dois anos quando houver filho
comum.” Referido projeto pretende revogar as leis 8.971/94 e 9.278/96, conforme Yussef Said Cahali: “o
Projeto, em seu contexto integral, aproveita algumas disposições extraídas dos dois diplomas legais que
se pretende revogar, ao mesmo tempo que acrescenta muitas outras disposições novas, com que se
objetiva regulamentar mais ampla e completamente a figura constitucional da entidade familiar ou união
estável. Em realidade, o Projeto consubstancia uma nova lei, a terceira, para vigorar com exclusividade,
revogadas que serão as anteriores.”
281
Sérgio Gischkow Pereira, Concubinato – união estável, cit., p. 38.
282
Yussef Said Cahali, Dos alimentos, cit., p. 239.
82

pessoas do mesmo sexo, pois se trata de situação que não se amolda aos ditames
constitucionais e, portanto, não merecedora da proteção no âmbito do direito de família.
Além da Carta Magna, o Código Civil de 2002, no artigo 1.723, também
é expresso a respeito da diversidade de sexos na união estável ao dispor: “É reconhecida
como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na
convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição
de família”.
Contudo, as relações homossexuais são realidade que reclamam por
direitos e proteção. Num primeiro momento, muitos tendem a tratá-las na esteira do
direito das obrigações, assim como o era a união estável.
A união mantida entre pessoas do mesmo sexo, no nosso ordenamento
jurídico, jamais poderia se configurar em companheirismo, ainda que duradoura,
contínua, única e informal, pois falta o requisito essencial da diversidade de sexos283.
Isso não significa, entretanto, que a parceria homossexual esteja
completamente à margem do ordenamento pátrio, o que poderia configurar uma
situação injusta, uma vez que durante a convivência desses casais homossexuais há
muitas vezes auxílio mútuo, prestação de serviços domésticos e aquisição de bens.
Desta forma, o ordenamento jurídico brasileiro, em decorrência da
proibição do enriquecimento sem causa, reconhece a parceria homossexual como
sociedade de fato, com natureza jurídica de sociedade de fato, podendo gerar efeitos no
campo dos direitos das obrigações e dos direitos das sucessões, em situação similar à
que se encontravam os companheiros antes da Constituição de 1988284.
Nesse sentido tem decidido os Tribunais:

“Sociedade de fato – Relação homossexual –


Meação – Pretensão à extensão a todos os bens do
falecido convivente – Simples sociedade de afeto
mantida entre parceiros do mesmo sexo que não

283
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., págs. 544/545.
284
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p. 555. Em relação à partilha de bens,
vale por analogia aos parceiros homossexuais a Súmula 380 do Supremo Tribunal Federal, segundo a
qual “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução
judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”. Nesses casos, cada parte deve
comprovar com que porcentagem contribuiu para a aquisição dos bens. E em relação aos direitos
sucessórios, o parceiro homossexual não é herdeiro legítimo, pois não possui condição de cônjuge nem de
convivente. Mas nada impede que seja herdeiro testamentário ou legatário.
83

induz efeitos patrimoniais, à falta de normatização


específica – Inexistência de respaldo a legitimar a
aplicação analógica da Constituição da República
de 1988 ou legislação ordinária que regulamente a
união estável, de modo a conferir direito de
herança ao apelante – Ruptura do liame informa
que gera conseqüências meramente no âmbito do
Direito das Obrigações – Presença dos
pressupostos do artigo 1.363 do Código Civil –
Necessidade da aferição da contribuição de cada
um dos sócios para se proceder à partilha na
proporção de seus esforços – Recurso
parcialmente provido.” (TJSP – 10ª Câm. - Ap.
179.953-4 – Rel.Paulo Dimas Mascaretti – j.
26.02.02).285

No entanto, pode-se encontrar doutrinadores que defendam a equiparação


entre as parcerias homossexuais e a união estável, ou seja, são defensores das uniões
homossexuais como formadoras de entidade familiar. Dentre eles, Maria Berenice Dias,
que por interpretação analógica, afirma que “como o Direito de Família se justifica pela
afetividade, fazer analogia com esse ramo do direito significa reconhecer a semelhança
entre as relações familiares e as homossexuais.”286
Na jurisprudência também se encontram decisões reconhecendo as
relações homossexuais como entidade familiar. Cita-se:

285
No mesmo sentido: STJ – 4ª Turma – Resp 148897 – Rel. Ruy Rosado Aguiar, j. 10.02.1998.
286
Maria Berenice Dias, Homoafetividade – o que diz a justiça!. Porto Alegre: Livraria do Advogado,
2003, p. 43. No mesmo sentido: Glauber Moreno Talavera, União civil entre pessoas do mesmo sexo, Rio
de Janeiro: Forense, 2004 p. 34: “a união homossexual é tema dos mais aflitivos e tormentosos da
atualidade devido à sua condição sui generis de entidade familiar, em que pese, num primeiro momento,
muitos ainda tentem tratar deste instituto, tal qual outrora ocorria com o concubinato, na esteira do Direito
das obrigações, sem atentar para os seus naturais desdobramentos e patente perfil paradigmático de
entidade familiar não fundada no matrimônio.”; Karina Schuch Brunet, A união entre homossexuais como
entidade familiar: uma questão de cidadania, Revista jurídica, n. 281, v. 78, março de 2001, p. 82: “a
realidade das uniões homossexuais é esta: existem enquanto entidade familiar, mas são excluídas de uma
participação ativa no processo político- social em que se inserem.”
84

“Apelação. União homossexual. Reconhecimento


de União estável. Partilha.
Embora reconhecida na parte dispositiva da
sentença a existência de sociedade de fato, os
elementos probatórios dos autos indicam a
existência de união estável. Partilha. A união
homossexual merece proteção jurídica, porquanto
traz em sua essência o afeto entre dois seres
humanos com o intuito relacional. Caracterizada a
união estável, impõe-se a partilha igualitária dos
bens adquiridos na constância da união,
prescindindo da demonstração de colaboração
efetiva de um dos conviventes, somente exigidos
nas hipóteses de sociedade de fato.” (TJRS – 8ª
Câm. – Ap. 70005542377 – Rel. Rui Portanova –
j. 10.06.2003).287

Contrariamente, Guilherme Calmon Nogueira da Gama anota que: “O


afeto, existente na maior parte das uniões homossexuais, é idêntico ao elemento
psíquico e volitivo das uniões conjugais e companheiris, não há dúvida. Mas
juridicamente, não há uma família constituída entre as pessoas do mesmo sexo que
vivam em situação similar àquela das uniões heterossexuais, tal como a união sexual
entre concubinos, bem como entre parentes.”288 Tem a mesma posição José Carlos

287
No mesmo sentido: TJRS – 7ª Câm. - Ap. 70001388982 – Rel. José Carlos Teixeira Giorgis – j.
14.03.2001; 8ª Câm. - Ap. 598362655 – Rel. José Ataídes Siqueira Trindade – j. 01.03.2000.
288
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p. 546. No mesmo sentido: Débora
Vanessa Caús Brandão, Parcerias homossexuais – aspectos jurídicos. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002, p.83: “Inexiste dúvida que o Estado e a sociedade não podem adotar qualquer postura
discriminatória ou restritiva à liberdade que os homossexuais têm de se unirem, formando uma entidade
quase-familiar, mas há elemento de discriminação razoável para não conceber tal união no contexto do
Direito de Família.”; Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 5, p. 324, em nota de rodapé: “no Brasil a união
homossexual é um fato, que o direito não desconhecesse, pois já a tutela como sociedade de fato no plano
obrigacional, e nada obsta a que parceiros adquiram imóveis em condomínio, contemplem o outro com
legado ou herança, respeitando a legítima de herdeiro necessário. Seriam necessárias normas
regulamentadoras de alguns benefícios como alimentos, decisões voltadas às questões de saúde ou de
doações de órgãos, mas não a erigiria em entidade familiar.”; Sílvio de Salvo Venosa, Direito, cit., v. 6, p.
55: “afasta-se de plano qualquer idéia que permita considerar a união de pessoas do mesmo sexo como
união estável nos termos da lei. O relacionamento homossexual, modernamente denominado
homoafetivo, por mais estável e duradouro que seja, não receberá a proteção constitucional e,
conseqüentemente, não se amolda aos direitos de índole familiar criados pelo legislador ordinário.”
85

Barbosa Moreira: “Note-se que a Constituição exclui categoricamente a possibilidade de


constituir-se ‘união estável’, digna da proteção do Estado, entre pessoas do mesmo
sexo: alude, em termos expressos, ao homem e à mulher. Não há como invocar o
dispositivo em favor de ligações homossexuais, a que a jurisprudência chegou a aplicar
a tese da ‘sociedade de fato’, para reconhecer a um dos parceiros o direito a fração do
patrimônio comprovadamente constituído em virtude do esforço de ambos, a exemplo
do que se deu no caso notório do artista plástico Jorge Guinle Filho, e poderá voltar a
dar-se noutros análogos, mas com fundamento jurídico diferente daquele que ministra a
Carta da República.”289
Verifica-se que, atualmente, o direito brasileiro não admite o casamento
entre homossexuais, muito menos a união estável, para que a união homossexual seja
considerada união estável e, conseqüentemente, gere entidade familiar, a Constituição
Federal deveria ser emendada, aliás, esta é a posição do jurista Miguel Reale, sob o
título “críticas apressadas e oportunas” respondeu as críticas acerca da omissão da união
civil entre pessoas do mesmo sexo não ter sido regulada no novo Código Civil: “Essa
matéria não é de Direito Civil, mas sim de Direito Constitucional, porque a Constituição
criou a união estável entre um homem e uma mulher. De maneira que, para cunhar-se
aquilo que estão querendo,a união estável dos homossexuais, em primeiro lugar seria
preciso mudar a Constituição...Não era essa a nossa tarefa e muito menos a do
Senado.”290
Outro requisito essencial para a configuração da união estável é a
ausência de impedimento matrimonial. A Constituição Federal é clara ao pedir que lei
facilite a conversão da união estável em casamento. Visto que não houve a equiparação
da união estável com o casamento e, por isso, a Carta Magna pede a facilitação da
conversão, não pode haver impedimento matrimonial que inviabilize esta conversão,
muito menos o fato de um dos companheiros ser casado, nesta última hipótese,
estaríamos diante de um concubinato impuro, aliás, proibido em face do que dispõe o já
mencionado artigo 1.727 do Código Civil.

289
José Carlos Barbosa Moreira, O novo Código Civil e a união estável, cit., p. 54.
290
Apud Débora Vanessa Caús Brandão, Parcerias, cit., p. 87.
86

Conforme o artigo 1.723, §1º: “A união estável não se constituirá se


ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no
caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente.”291
Verifica-se a possibilidade do separado de fato ou judicialmente
constituírem união estável. Mas observa-se que o legislador não estipulou prazo,
embora no artigo 1.801, III, tenha exigido o prazo de cinco anos de separação de fato,
desde que o testador não tenha sido culpado pela separação, poderá nomear seu
concubino, herdeiro ou legatário.
Entre os autores que defendem esta possibilidade:
Francisco José Cahali: “não se pode negar o acerto da orientação
doutrinária e jurisprudencial admitindo a caracterização de união estável mesmo se um
ou ambos forem casado, desde que separados de fato. Efetivamente, a separação de fato
põe termo ao regime de bens e aos deveres do casamento, dentre eles coabitação e
fidelidade. Em assim sendo, tornam-se os cônjuges separados de fato desimpedidos para
constituírem nova família através da união estável.”292
Guilherme Calmon Nogueira da Gama aduz que: “eventualmente, os
partícipes da união sejam casados com outras pessoas, mas que já estejam separados de
fato pelo tempo mínimo para se desvincularem, formalmente, de seus ex-consorte e
possam requerer a conversão da “união estável” em casamento.”293
Caio Mário da Silva Pereira corrobora: “não há porque não reconhecer a
União estável entre pessoas definitivamente separadas, mesmo de fato, ou aquelas que,
separadas judicialmente, não promoveram o rompimento do vínculo matrimonial pelo
Divórcio.”294
Ainda, Teresa Arruda Alvim Wambier: “ainda que os companheiros
mantenham vínculo formal de casamento, tal não tem o condão de descaracterizar a
convivência more uxório. Nestes casos o casamento já não mais existe, senão como um

291
Dispõe o artigo 1.521 do Código Civil: “Não podem casar: I – os ascendentes com os descendentes,
seja o parentesco natural ou civil; II – os afins em linha reta; III – o adotante com quem foi cônjuge do
adotado e o adotado com quem o foi do adotante; IV – os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais
colaterais, até o terceiro grau inclusive; V – o adotado com o filho do adotante; VI – as pessoas casadas;
VII – o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu
consorte.”
292
Francisco José Cahali, União estável, cit., págs., 80/81.
293
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p.177.
294
Caio Mário da Silva Pereira, Instituições, cit., p. 46. No mesmo sentido: Rodrigo da Cunha Pereira,
Concubinato, cit., págs. 65/67; Teresa Arruda Alvim Pinto, Entidade, cit., v. 01, p. 83; Carlos Alberto
Menezes Direito, Da união estável como entidade familiar, Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 667, p.
23, maio de 1991; Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., v. 02, p.34; Em sentido contrário: Maria
Helena Diniz, Curso, cit., p. 331.
87

mero vínculo formal, uma reminiscência cartorial, que não impede que se reconheça
como união estável aquela nova relação afetiva.”295
O terceiro requisito que se apresenta é a coabitação, ou seja, a vida em
comum sob o mesmo teto. Nem sempre é possível que os companheiros convivam no
dia-a-dia sob o mesmo teto. Circunstâncias podem obrigá-los a viver em cidades
distintas, às vezes, a vida profissional gera esta circunstância, o mesmo também pode
ocorrer por questões financeiras.
Nesse sentido ensina Edgard de Moura Bittencourt que “tal convivência
não impõe necessariamente a coabitação, mas envolve a comunhão de vida, dentro da
reciprocidade de feição e de tratamento, tal como normalmente ocorre entre esposos.”296
Nota-se que a não convivência sob o mesmo teto, não descaracteriza a
união estável, nem afronta a citada Súmula 382 do Supremo Tribunal Federal: “a vida
em comum sobre o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à caracterização do
concubinato.”
Assim, as palavras de Francisco José Cahali: a coabitação “não é
requisito indispensável, sendo permitida a constatação do instituto mesmo sem a sua
verificação, desde que, e mais importante, existente o animus, a convivência more
uxorio, e não apenas um relacionamento informal entre duas pessoas. Ainda, deve-se
ressaltar que a Súmula reflete uma situação de exceção, permitida em toda e qualquer
regra jurídica, diante de cada caso, o mesmo podendo ocorrer com relação ao casamento
sem vida em comum sob o mesmo teto.”297
Washington de Barros Monteiro doutrina que “a coabitação, em regra, é
necessária para caracterizar a união estável, mesmo sem expressa previsão legal.
Normalmente, é certo, apresentam-se os companheiros more uxorio, aparecendo em
público como se casados fossem. A constituição de família, normalmente, dá-se com a
convivência num único domicílio. Pode acontecer, entretanto, que não convivam sob o
mesmo teto, desde que tenham justa causa para tanto, como necessidades profissionais,
pessoais ou familiares que impeçam a unicidade domiciliar.”298

295
Teresa Arruda Alvim Wambier, União estável, seguida de casamento com separação de bens e
patrimônio adquirido durante a convivência, O Direito de família após a Constituição Federal de 1988,
org. Antônio Carlos Mathias Coltro, São Paulo: C. Bastos: Instituto Brasileiro de Direito Constitucional,
2000, p.112.
296
Edgard de Moura Bittencourt, O concubinato, cit., p.185.
297
Francisco José Cahali, União estável, cit., p. 62.
298
Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., v. 2, p.31. Ainda: Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 5,
págs. 327/328.
88

O mesmo entender tem Rodrigo da Cunha Pereira: “No Direito brasileiro,


já não se toma o elemento da coabitação como requisito essencial para caracterizar ou
descaracteriza o instituto da união estável, mesmo porque, hoje em dia, já é comum
haver casamentos em que os cônjuges vivem em casas separadas, talvez como uma
fórmula para a durabilidade das relações. A proteção jurídica é da união em que ‘os
companheiros vivem em comum por tempo prolongado, sob o mesmo teto ou não, mas
com aparência de casamento’”.299
A notoriedade apresenta-se no tratamento como marido e mulher aos
olhos daqueles que convivem mais intimamente com o casal, como a própria família,
amigos e vizinhos. Assim como a coabitação, a notoriedade não é requisito
indispensável. Deve ser entendida no sentido contrário de clandestinidade. Explica
Rodrigo da Cunha Pereira que “a notoriedade era um elemento importante quando não
se fazia ainda a distinção entre concubinato e união estável. Com a evolução doutrinária
e jurisprudencial, esse elemento perde um pouco o sentido caracterizador para a união
estável, uma vez que o seu requisito básico é a monogamia e, sendo assim, não há por
que ser uma relação clandestina.”300
Para Francisco José Cahali, “embora desqualificada como requisito à
caracterização da união estável, não se pode negar que a notoriedade assume
relevantíssimo papel no campo da prova do relacionamento, ou seja, constitui um fato
cuja demonstração por si só indica a efetiva existência da relação concubinária apta a
produzir seus efeitos enquanto entidade familiar.”301
A notoriedade poderá significar publicidade, de acordo com Guilherme
Calmon Nogueira da Gama quando “na eventualidade de ambos os companheiros
declararem a união em Juízo ou perante tabelião, ou ainda, um deles reconhecer o
companheirismo em testamento cerrado, mais uma vez afigura-se reforçada a
característica da notoriedade, agora sim sob a denominação de publicidade, pois gerará
efeitos erga omnes. Desse modo, a notoriedade não perde sua razão de ser como
característica, não servindo apenas no campo da prova.”302
A lealdade ou a fidelidade, embora dever de ambos os companheiros,
também se apresenta como importante requisito para a configuração da união estável.

299
Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato, cit., p. 30.
300
Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato, cit., p. 31. Consular ainda Maria Helena Diniz, Curso, v. 5,
cit., págs. 325/326.
301
Francisco José Cahali, União estável, cit., p. 69.
302
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p. 166.
89

Anota Edgard de Moura Bittencourt que “na conceituação do


concubinato capaz de gerar direitos, o dever de fidelidade alia-se aos demais elementos
de respeitabilidade, como o elemento moral e a honorabilidade.”303
Francisco José Cahali anota que: “a fidelidade tem sido indicada como
elemento essencial à caracterização da união estável, em homenagem aos princípios
morais observados pela sociedade, acrescentando-se que a ela subordina-se o
casamento; se o concubinato se espelha no matrimônio, inafastável a verificação da
fidelidade.”304
A respeito do termo utilizado pelo Código, lealdade, para com os
conviventes e, fidelidade, para os cônjuges, José Carlos Barbosa Moreira comenta que:
“Não deixa de ser curioso que o novo Código Civil haja empregado neste contexto
palavra diferente da usada com relação ao casamento no art. 1.566: enquanto lá se fala
de ‘fidelidade recíproca’, expressão, aliás, tradicional em nosso direito, aqui se preferiu
falar de ‘lealdade’. Algum intérprete propenso a distinções rigorosas poderá ver-se
induzido a conferir relevância à diversidade terminológica: sustentará, por exemplo,
que, se um dos companheiros trava relações íntimas com terceiro ou terceira, mas delas
dá conhecimento ao outro convivente, terá sido infiel, porém não desleal...”305
Afora a terminologia utilizada, a fidelidade deve permear a relação entre
os companheiros, pois traduz o sentimento de confiança e solidifica a relação. O
relacionamento entre os conviventes deve ser único para que receba proteção do Estado
e do direito de família, caso contrário, se um dos companheiros for infiel ou desleal, se
sustentar outro relacionamento, não se verifica união estável.
Ressalta-se que é um dever recíproco, tanto o homem como a mulher
deve zelar pela união. Antigamente se exigia o dever de fidelidade apenas da mulher,
como se observa na definição trazida por Álvaro Villaça Azevedo ao colacionar o
conceito de Pinto Ferreira: “união estável e prolongada de homem com mulher, vivendo
ou não sob o mesmo teto, sem vínculo pelos laços do casamento, revestindo-se, porém,

303
Edgard de Moura Bittencourt, O concubinato, cit., p. 148.
304
Francisco José Cahali, União estável, cit., p. 62. Consultar: Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato,
cit., págs. 65/66; Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 6, p. 259; Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 5, págs.
327.
305
José Carlos Barbosa Moreira, O novo Código Civil e a união estável, Revista de Direito Privado – 13,
p. 58.
90

tal união, necessariamente, de algum requisito, como a notoriedade, fidelidade da


mulher e continuidade de relacionamento sexual.”306 (grifos nossos)
Nesse contexto, observa Francisco José Cahali que se um dos
conviventes não sabia que era traído, enganado, ou seja, estava de boa-fé no
relacionamento, a união estável “pode ser considerada uma união estável putativa, para
a qual um dos partícipes acreditava estar envolvido em uma relação como se casado
fosse, mas, em verdade, não preenchia os requisitos indispensáveis para elevá-la à
qualidade de entidade familiar. Também, se ambos os partícipes estiverem de boa-fé
(hipótese exclusiva do concubinato incestuoso), a eles admite-se a produção de efeitos
próprios da união estável, embora a relação assim não se caracterize.”307
Além dos requisitos objetivos, há dois elementos de ordem subjetiva que
são imprescindíveis para a configuração da união estável: a convivência more uxorio e a
affectio maritalis.
Embora algumas palavras já ditas a respeito da convivência more uxorio,
deve-se enfocá-la agora, como elemento subjetivo.
Desta forma, convivência more uxorio quer dizer conviver como marido
e mulher. Os companheiros devem realmente levar uma vida de pessoas casadas. Isso
importa no cumprimento dos deveres de lealdade, respeito e assistência, bem como a
educação, sustento e guarda dos filhos. E mais, a relação deve ser rodeada de afeto,
compreensão e solidariedade.
Ao lado da convivência more uxorio, também se verifica a affectio
maritalis, que se traduz no ânimo dos companheiros de desejarem a vida de casados,
revelando verdadeira intenção desse querer.
Com as palavras de Francisco José Cahali: “veja-se, pois, ser requisito
efetivo do concubinato a comunhão de vida, de corpo e alma, de carne e espírito, a mais
pura e desinteressada intenção de unir os respectivos destinos com respeito e
compreensão, e, juntos, projetar novos caminhos à vida.”308

306
Álvaro Villaça Azevedo, Do concubinato, cit., p. 65. Assevera o autor que: “ao invés de falarmos em
“fidelidade da mulher”, devemos mencionar o dever de lealdade recíproca, pois a lealdade é figura de
caráter moral e jurídico independentemente de cogitar-se da fidelidade (...)”
307
Francisco José Cahali, União estável, cit., p. 72.
308
Francisco José Cahali, União estável, cit., p. 76. Ainda: Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O
companheirismo, cit., págs. 204/208.
91

6. DEVERES DE AMBOS OS COMPANHEIROS

A Lei nº 9.278/1996 no artigo 2º enumerava direitos e deveres para os


companheiros, como: respeito e consideração mútuos; assistência moral e material
recíproca e guarda, sustento e educação dos filhos comuns. Ao contrário da Lei nº
8.971/94 que dispunha apenas sobre alimentos e direito sucessório, não elencava
direitos e deveres aos companheiros.
Ainda na Lei 9.278/96, o artigo 5º previa que o patrimônio adquirido
onerosamente, pelo esforço comum na constância da união estável, pertenceria a ambos
os companheiros em partes iguais, salvo estipulação contrária prevista em contrato
escrito. O parágrafo segundo deste artigo ainda mencionava outro direito dos
companheiros, a administração conjunta do patrimônio comum dos conviventes, salvo
estipulação contrária prevista em contrato escrito.
O projeto de lei nº 2.686 de 1996, também prevê direitos de deveres aos
companheiros, no artigo 2º que dispõe: “decorrem da união estável os seguintes direitos
e deveres para ambos os companheiros, um em relação ao outro: I – lealdade; II –
respeito e consideração; III – assistência moral e material.”
O Código Civil, ao inserir a união estável no Livro IV, “Do Direito de
Família”, também trouxe direitos e deveres para os companheiros, expressos no artigo
1.724 que dispõe: “as relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres
de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.”
Comparando com os deveres estabelecidos aos cônjuges que estão dispostos no artigo
1.566, a saber: fidelidade recíproca, vida em comum, no domicílio conjugal, mútua
assistência, sustento, guarda e educação dos filhos e respeito e consideração mútuos,
nota-se que procurou o legislador equiparar os deveres dos cônjuges aos companheiros,
com alterações terminológicas que na prática, não trazem conseqüências distintas.309
Com relação à administração do patrimônio comum, não há no Código,
no que se refere à união estável, dispositivo específico, mas dispõe o artigo 1.725: “na
união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações
patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.” Os efeitos que
possam surgir da administração comum do patrimônio, serão analisados posteriormente,
nos efeitos perante terceiros.

309
Consultar Lourival Silva Cavalcanti, união estável, cit., p. 146.
92

No tocante ao dever de lealdade, algumas considerações já foram


traçadas quando da análise dos requisitos para configuração da união estável. Verificou-
se que independente da terminologia utilizada, fidelidade ou lealdade, na prática não
representam conseqüências distintas, pois este dever deve fundar-se num dever maior
que é o respeito entre os conviventes.
Cabe ainda discorrer sobre uma questão que se encontra na doutrina, há
ou não adultério entre os companheiros? Adultério é tipificado como crime (artigo 240
do Código Penal) e recriminado civilmente. De acordo com Guilherme Calmon
Nogueira da Gama, “se refere à prática de relação sexual entre um dos cônjuges com
terceira pessoa, de sexo diverso, mas visa resguardar fundamentalmente a paz
matrimonial, portanto, o vínculo contraído pelo casamento. Contudo, deve ser alargada
tal noção para também abarcar a prática de relações sexuais entre um dos companheiros
com terceira pessoa do sexo oposto, sem que tal conduta, no entanto, seja considerada
passível de ser considerada criminosa (art. 1º, do Código Penal).”310
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos doutrina que a violação
do dever de fidelidade “pode ser de ordem material, caracterizado pelo adultério,
quando um dos consortes tem relação sexual fora do casamento, e imaterial configurado
pelo quase-adultério, se o cônjuge pratica atos com outra pessoa, que não chegam à
cópula carnal, mas denunciam esse propósito.” Esclarece ainda que o “quase-adultério,
consubstancia-se nas intimidades excessivas do consorte com outra pessoa, que
extrapolam os limites da pura amizade.”311
No mesmo sentido, Orlando Gomes, que difere a infidelidade em
material e moral. Aquela é o adultério propriamente dito e a infidelidade moral é aquela
que não se consuma com o adultério, mas caracteriza-se pelos fatos que denunciam esse
propósito.312

310
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p. 235. Dispõe o artigo 1º do Código
Penal: “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”
311
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Causas culposas da separação judicial, Direito de
família – aspectos constitucionais, civis e processuais, coord. Teresa Arruda Alvim, São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, v. 2, 1995, págs. 233/234. Ainda: Yussef Said Cahali, Divórcio, cit., págs.
338/339.
312
Orlando Gomes, Direito de família¸ cit., p.126. Acrescenta o autor: “a aceitação do conceito de
infidelidade moral se torna necessária justamente por ser estrita a noção de adultério, reduzido, como é
prática de copula carnalis com terceiro. Assim, não o é a simples comissão de atos libidinosos. Por ser
difícil a prova do adultério stricto sensu, o entendimento de que outros atos, além da cópula, importam
infração do dever de fidelidade, permitiria se impusesse a mesma sanção, conservando-se o espírito da
proibição.”
93

Para Inacio de Carvalho Neto, os atos que diferem da conjunção carnal,


são considerados injúrias graves “em face do estrito conceito de adultério (prática de
conjunção carnal), atos diversos da conjunção carnal, que nele não se enquadram,
também caracterizam infração ao dever de fidelidade. Estes atos entram na figura
genérica da injúria grave.”313
Já decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que é possível
adultério na união estável, mas em razão da não demonstração de nexo causal entre o
adultério e os danos sofridos, não concedeu indenização por dano moral. Veja:

“Dano moral. União estável. Adultério.


Desfeita a união em razão de fato de adultério, a
conseqüência jurídico-legal não passa da dissolução
da sociedade conjugal de fato, não gerando dano
moral indenizável.
Ausência de demonstração mínima de nexo causal
entre o fato do adultério e os demais fatos lesivos
sofridos pela autora, descabe indenizar.
Recurso desprovido. Unânime.”
(TJRS – 1ª T. – Recurso inominado 71000576363 –
Rel. João Pedro Cavalli Júnior – j. 21.10.2004.)

O dever de lealdade guarda estreita relação com o dever de respeito entre


os companheiros.
Respeito é a consideração, estima, é o querer bem, que se revela de uma
pessoa à outra. Respeitar alguém significa preservar os direitos e valores mais íntimos
da pessoa. Importa, em verdade, a observação dos direitos da personalidade, ou seja,
respeitar a vida, a integridade física e moral, a honra e o decoro, bem como a liberdade
de outrem com quem se relaciona.
Para a construção de um relacionamento sólido, imprescindível que seja
baseado na confiança e no respeito, que haja renúncias e concessões de ambas as partes.
Conforme Carlos Alberto Bittar: “constitui, pois, violação a esse direito a
atribuição genérica de qualificativos deprimentes ou constrangedores, reprovados pelo

313
Inacio de Carvalho Neto, Reparação civil na separação litigiosa culposa, cit., p. 100.
94

ordenamento jurídico, em prol da tranqüilidade social. Por outras palavras, profliga-se a


manifestação de opinião pessoal desairosa a outrem, por palavra, som ou gesto
ultrajante, bastando que o lesado, se não diretamente atingido, possa perceber a ação
ilícita (basta, pois, a percepção para a caracterização do desrespeito).314
Viola-se o direito ao respeito com a agressão física, maus tratos,
crueldade, injúrias graves que ofendam a honra ou a imagem do outro convivente,
independentemente se oriundas de palavras, gestos ou da deslealdade.
O dever de assistência pode ser visto sob o aspecto material e moral.315
Materialmente, implica no auxílio econômico, em elementos necessários316 para a
sobrevivência e mantença do lar, como vestuário, alimentação, transporte e lazer.
Guilherme Calmon Nogueira da Gama entende que “a assistência material é recíproca,
com a contribuição de ambos nas despesas do lar, proporcionalmente aos seus ganhos,
abrangendo não somente as despesas de alimentação, mas também aquelas referentes à
habitação, vestuário, remédios, lazer.”317
Moralmente, o dever de assistência se verifica nos cuidados pessoais
diários, no amparo em caso de doenças, no zelo pela saúde do respectivo companheiro,
propiciando conforto e colaboração nas diversas passagens da vida. Regina Beatriz
Tavares da Silva Papa dos Santos, conceitua o dever de assistência imaterial como o
“dever de proteger e respeitar os direitos da personalidade à vida, à integridade física e
psíquica, à honra, à liberdade, ao segredo, à imagem e ao nome do cônjuge.”318
Exemplifica a autora que haverá infração ao dever de mútua assistência
imaterial, caso um dos cônjuges, portador do vírus da Aids, contamine seu respectivo

314
Carlos Alberto Bittar, Direitos, cit., págs. 139/140.
315
Segundo Caio Mário da Silva Pereira, Instituições, cit., v. 5, págs. 173/174, o dever de mútua
assistência “não se concretiza no fornecimento apenas dos elementos materiais de alimentação e
vestuário, que são óbvios. Inscrevem-se aí ainda assistência moral, o amparo nas doenças, a solidariedade
nas adversidades, como ainda o desfrute dos prazeres da vida na conformidade das posses e da educação
de um e de outro.” Consultar ainda, Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., v. 2, págs. 45/47.
316
Cabe aqui a distinção apresentada por Yussef Said Cahali, Dos alimentos, São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 4.ed., 2002, p. 18: “quando se pretende identificar como alimentos aquilo que é
estritamente necessário para a mantença da vida de uma pessoa, compreendendo tão-somente a
alimentação, a cura, o vestuário, a habitação, nos limites assim do necessarium vitae, diz-se que são
alimentos naturais; todavia, se abrangentes de outras necessidades, intelectuais e morais, inclusive
recreação do beneficiário, compreendendo assim o necessarium personae e fixados segundo a qualidade
do alimentando e os deveres da pessoa obrigada, diz-se que são alimentos civis”.
317
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p.246.
318
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Causas culposas da separação judicial, cit., p.239.
95

consorte, “pode implicar a suspeita de violação do dever de fidelidade, porém acarretará


a certeza de que o dever de mútua assistência imaterial foi gravemente infringido.”319
Em suma, a assistência recíproca reflete-se na ajuda e nos cuidados que
um companheiro dispensa ao outro mutuamente. Compartilhando dores e alegrias,
confortando-se nas adversidades e amparando-se na enfermidade.320
Finalmente, os deveres de guarda, sustento e educação dos filhos.
Colaciona-se aqui o artigo 229 da Constituição Federal de 1988 que dispõe: “os pais
têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever
de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.” E o já mencionado,
parágrafo 5º do artigo 226, pede que os direitos e deveres referentes à sociedade
conjugal sejam exercidos igualmente pelo homem e pela mulher, o mesmo se aplica à
união estável.
Com precisão, Guilherme Calmon Nogueira da Gama, descreve os
deveres de guarda, sustento e educação dos filhos: “o dever de sustento envolve a
obrigação de prover a subsistência material dos filhos, fornecendo alimentação,
vestuário, habitação, medicamentos, enfim, o necessário à sobrevivência e manutenção
do menor. A guarda se refere ao dever dos pais de ter os filhos em sua companhia,
exercendo vigilância sobre os mesmos. E, a educação se vincula ao dever dos pais de
proporcionar a instrução dos filhos, pelo menos a básica, buscando também inseri-los
nos níveis subseqüentes.”321
Os deveres dos pais em relação aos filhos decorrem do exercício do
poder familiar. Os pais devem fornecer os meios possíveis para que seus filhos cresçam
em ambiente saudável, proporcionando-lhes o necessário para sobreviverem
dignamente, investindo em educação e cultura. Note-se que o dever dos pais em relação
aos filhos deve ser exercido igualmente, em consonância com o artigo 5º, inciso I da
Constituição Federal de 1988.
Ressalta-se a importância dos deveres de ambos os companheiros, pois,
sua violação, gerando danos, faz surgir o direito à reparação, o que implica na aplicação

319
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Dever de assistência imaterial entre cônjuges. Rio
de Janeiro: Forense Universitária, 1990, p. 128.
320
Orlando Gomes, Direito de família, cit., p. 128. Esclarece o autor que o dever de assistência não se
confunde com o dever de socorro, assim: “o dever de socorro consiste em ajuda econômica, ao contrário
do dever de assistência, que se traduz em obrigações de fazer. O dever de socorro, compreendendo
obrigações de dar, pertence ao domínio das relações patrimoniais entre os cônjuges, abrangendo sustento
e outras prestações econômicas.”
321
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p.247.
96

das regras de responsabilidade civil, estando presentes seus pressupostos. Desta forma,
o descumprimento de qualquer dever imposto aos companheiros, que torne insuportável
a vida em comum, pode ser causa do rompimento da união estável.
Neste contexto a doutrina de Clayton Reis: “ora, se há direitos e deveres
comuns aos conviventes, nos mesmos padrões daqueles conferidos pelo casamento
legítimo – guardadas as devidas proporções entre os institutos – não resta dúvida que
também os fatos e atos ilícitos deles decorrentes deságuam, de forma inexorável, na
esfera da responsabilidade civil.”322
Outra não poderia ser a lição de Regina Beatriz Tavares da Silva Papa
dos Santos, que após a análise dos deveres dos conviventes, assevera que: “uma vez
violados esses deveres – ação lesiva -, com a ocorrência de danos, surge o direito do
ofendido à reparação, em razão do preenchimento dos pressupostos da responsabilidade
civil, assim como ocorre diante da prática de ato ilícito em outras relações jurídicas.”323

322
Clayton Reis, Responsabilidade civil pelo rompimento da união estável, O Direito de Família após a
Constituição Federal de 1988, org. Antônio Carlos Mathias Coltro, São Paulo: C. Bastos: Instituto
Brasileiro de Direito Constitucional, 2000, p.194.
323
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade civil dos conviventes, cit., p. 36.
97

7. EFEITOS

Decorrem da união estável efeitos sociais, pessoais e patrimoniais. É


efeito social o fato de que a união estável constitui entidade familiar e, assim sendo, é
merecedora de proteção estatal, para que se observem os direitos e deveres oriundos
dessa forma de união.
Efeitos pessoais são aqueles extraídos do artigo 1.724 do Código Civil,
coincidem com os deveres dos companheiros. Nota-se que por vezes, confundem-se os
direitos com os deveres e efeitos da união estável, desta forma, sistematicamente,
procurou-se estabelecer a divisão, em que pese, ora mencionar um direito, quando se
trata também de um efeito e vice-versa. Nesse contexto, Claudia Grieco Tabosa Pessoa:
“inicialmente é forçoso ressaltar o caráter espinhoso de estabelecer uma precisa
delimitação do que se pode conceber por efeito pessoal ou patrimonial, principalmente
considerando-se que muitos elementos referentes à ordem estritamente pessoal da
relação concubinária podem transmudar-se em efeitos patrimoniais, a partir do
momento em que deles venham a emergir situações tendentes a gerar conseqüências de
cunho econômico.”324
Acrescenta-se além dos efeitos pessoais do artigo 1.724, a possibilidade
da companheira usar o nome do companheiro, o que já era regulado pela lei dos
registros públicos lei nº 6.015 de 31 de dezembro de 1973, artigo 57, §2º325.
Para Silvio Rodrigues, quando se trata de relações intrínsecas entre os
companheiros, relativas a direitos de um em face do outro, como alimentos e partilha,
necessária legislação própria a respeito, no entanto, se de acordo os conviventes na
utilização por um do patronímico do outro, a questão passa a ser efeito exterior da
relação e, assim sendo, são dispensados os requisitos exigidos pela lei nº 6.015/73.
Esclarece o autor: “assim, caracterizada a união estável, bastará que o pedido seja
formulado em conjunto pelos companheiros (pois um não tem esse direito a ser exigido

324
Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Efeitos, cit., p. 60.
325
Lei nº 6015/73, artigo 57, caput, (...), §2º: “a mulher solteira, desquitada ou viúva, que viva com
homem solteiro desquitado ou viúvo, excepcionalmente e havendo motivo ponderável poderá requerer ao
juiz competente que, no registro de nascimento, seja averbado o patronímico de seu companheiro, sem
prejuízo dos apelidos próprios, de família, desde que haja impedimento legal para o casamento,
decorrente do estado civil de qualquer das partes ou de ambas.”
98

do outro, pela ausência de legislação própria), para que, a exemplo do casamento,


admita-se o pedido autorizando a modificação pretendida.”326
Contrariamente, Flávio Augusto Monteiro de Barros: “em matéria de
registros públicos, a hipótese deve estar devidamente regulamentada na lei. Assim, a
companheira não poderá incluir o nome do companheiro nas seguintes hipóteses: a)
quando os dois são solteiros, divorciados ou viúvos; b) quando um é solteiro e o outro
divorciado ou viúvo. Nesses casos, o casamento torna-se possível. E quando é possível
o casamento é vedada a inclusão do patronímico.”327
Assim, são efeitos pessoais aqueles que dizem respeito com a formação e
estruturação da união estável, bem como a fixação de domicílio, a capacidade dos
companheiros, a representação do casal em relação à prole e a terceiros, o nome e sua
alteração e as relações com a sociedade.328
Com relação aos efeitos patrimoniais, são aqueles que têm repercussão
econômica, poderiam ser elencados inúmeros efeitos329, porém serão destacados apenas
aqueles que repercutem no âmbito do direito de família.
Dentre os efeitos patrimoniais, destaca-se o direito a alimentos. Este
direito está hoje previsto no artigo 1.694 do Código Civil330. Euclides Benedito de
Oliveira e Sebastião Amorim anotam que “a concessão de alimentos a companheiros, de
que trata a Lei 8.971, constituiu evolução natural do pagamento pecuniário que os
tribunais vinham reconhecendo, a título de indenização por serviços prestados.”331
O que se discute é o fundamento desta obrigação alimentar entre os
companheiros. Levanta-se duas posições na doutrina. A primeira, sustenta que a
obrigação alimentar deve ser fundamentada na culpa. Assim, o companheiro inocente
faria jus à obrigação alimentar. Sustentam tal entendimento: Guilherme Calmon
Nogueira da Gama, para quem o direito a alimentos não nasce do direito de assistência
mútua, segundo ele: “o certo é que o sistema jurídico brasileiro se baseia na culpa

326
Silvio Rodrigues, Direito, cit., v. 6, p. 271.
327
Flávio Augusto Monteiro de Barros, Manual de Direito Civil – direito de família, São Paulo: Método,
v. 4, 2004, p. 100.
328
Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Efeitos, cit., p. 62.
329
Claudia Grieco Tabosa Pessoa, Efeitos, cit., p. 67. A autora classifica os efeitos decorrentes do direito
de família; os relacionados ao direito obrigacional, dividindo estes em efeitos derivados de obrigações por
atos lícitos e ilícitos e, por fim, os efeitos relacionados ao direito das sucessões.
330
Artigo 1.694 do Código Civil: “Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros
os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para
atender às necessidades de sua educação.”
331
Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião Amorim, Concubinato, companheiros: novos rumos, cit., p.
79.
99

primordialmente, para estabelecer a obrigação alimentar contra um dos cônjuges em


favor do outro. O fundamento de tal obrigação alimentar, portanto, não é propriamente a
assistência material e, sim, outro.”332
Também defensor da primeira posição, Francisco José Cahali, segundo o
qual: “confirmou-se, sem dificuldades, que a imposição judicial de obrigação alimentar
tem como pressuposto a culpa do cônjuge na separação, e a contrario sensu, ao cônjuge
inocente impede-se a condenação de prestação alimentícia ao outro, a obrigação
alimentar entre os cônjuges encontra fundamento na imposição legal ao responsável
pela separação, configurada a culpa no rompimento antecipado da sociedade conjugal,
embora não se negue a característica substitutiva ao dever de mútua assistência cujo
benefício deixou de ter o cônjuge inocente.”333(grifos do autor). Embora o autor refira-
se aos cônjuges, o entendimento pode ser estendido aos companheiros.
No mesmo sentido é o entendimento de Flávio Luiz Yarshell que entende
ser “lícito e justo que o convivente demandado, se não for responsável pela ruptura da
vida conjugal, está desonerado da prestação alimentícia em favor do outro consorte,
podendo até mesmo exigi-la, se presentes os requisitos da necessidade e
possibilidade.”334
A segunda posição desprende-se da idéia de culpa. É defendida por
Rodrigo da Cunha Pereira: “se nos desprendêssemos da idéia de culpa nas separações
ou divórcio, a discussão de alimentos se deslocaria para o eixo da
necessidade/possibilidade, que é o critério, parece-nos, mais justo.”335
Como já mencionado, o direito a alimentos está disposto no artigo 1.694
do Código Civil do qual se verifica a equiparação dos companheiros com os cônjuges e
parentes. Conseqüência disto será a aplicação das regras da dissolução do casamento à

332
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p.246. Consultar no mesmo sentido:
Yussef Said Cahali, Divórcio, cit., p. 882: “Dissolvida a sociedade conjugal, porém, a obrigação de
prestar alimentos desaparece, salvo no tocante ao cônjuge responsável pela separação, conforme
estabelece o art. 19 da Lei 6.515/77. Responsável pela separação é o cônjuge culpado (na ação fundada no
caput do art. 5º), ou aquele que teve a iniciativas da separação sem culpa ( ação fundada no §1º ou no §2º
do art. 5º).”
333
Francisco José Cahali, União estável, cit., p. 99.
334
Flávio Luiz Yarshell, Tutela jurisdicional dos conviventes em matéria de alimentos. Direito de família
– Aspectos constitucionais, civis e processuais, coords. Teresa Arruda Alvim Wambier e Alexandre Alves
Lazzarini, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, v. 3, 1996, p.57.
335
Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato, cit., p. 84.
100

união estável. Ressalta-se que para a concessão de alimentos, deve ser observado o
binômio necessidade e possibilidade, presente no artigo 1.695336 do Código Civil.
Criticando a inovação do legislador, com relação ao artigo 1.694, Yussef
Said Cahali: “evidenciando que as disposições concernentes à obrigação alimentar
foram sendo encartadas ao deus-dará, sem qualquer sistematização, impende seja
tentada, não sem alguma dificuldade, extrair-se do Novo Código Civil algumas regras a
vigorar em matéria de alimentos.” Acrescenta o autor: “estatuída essa obrigação entre
companheiros no capítulo pertinente aos “alimentos”, colocados os companheiros junto
com os parentes e os cônjuges, aplica-se, via de conseqüência, com relação a eles, as
disposições constantes do art. 1.694 e seguintes do Novo Código.”337
Nesse contexto, apresenta Francisco José Cahali, características dessa
obrigação alimentar: “daí decorrem serem irrenunciáveis, insuscetíveis de cessão,
compensação ou penhora, com termo final até diante do comportamento indigno do
credor, permitida a sua revisão pela mudança da situação econômica das partes, e
transmissível a obrigação aos herdeiros do devedor, também os alimentos fixados entre
os conviventes na dissolução da união estável.”338
Quanto à possibilidade de renúncia dos alimentos, é expresso o artigo
1.707339 pela vedação, acrescente-se que nem mesmo por contrato de convivência
elaborado pelos conviventes, é possível renunciar alimentos.340
Cessa a obrigação alimentar para o credor que constituir casamento,
união estável ou concubinato com outrem, é o que dispõe o artigo 1.708341, também
cessa o direito a alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor

336
Artigo 1.695 CC: “São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem
pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los,
sem desfalque do necessário ao seu sustento.”
337
Yussef Said Cahali, Dos alimentos, cit., págs. 238/239.
338
Francisco José Cahali, Dos alimentos, Direito de família e o novo Código Civil, coord. Maria Berenice
Dias e Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizonte: Del Rey, 3.ed., 2003, págs. 236/237.
339
Dispõe o artigo 1.707 do Código Civil: “Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o
direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora.”
340
Francisco José Cahali, Contrato de convivência, cit., págs., 262/263: “o art. 1.707 é claro ao
estabelecer que “pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos”,
destinando este comando à obrigação decorrente do casamento, da união estável e do parentesco; se a
pensão passa a ser irrenunciável, até mesmo quando da separação judicial, divórcio ou dissolução da
união estável, por maior razão confirmar-se-á a impossibilidade de exclusão da obrigação por contrato de
convivência.”
341
Artigo 1.708, caput, do Código Civil: “Com o casamento, a união estável ou concubinato do credor,
cessa o dever de prestar alimentos.” Parágrafo único: “Com relação ao credor cessa, também, o direito a
alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor.”
101

(parágrafo único, art. 1.708). De acordo com o artigo 1.709342, o novo casamento do
devedor de alimentos não extingue a obrigação constante da sentença de divórcio, tendo
em vista que os companheiros foram equiparados ao cônjuge e parentes, pode-se
entender que a constituição de nova união estável também não cessar o dever de prestar
alimentos. De acordo com Francisco José Cahali: “também, merece interpretação o
artigo 1.702 como estabelecendo que “na separação judicial” ou “na dissolução da união
estável, um dos cônjuges inocente, ou um dos conviventes inocente” poderá pleitear
pensão.”343
Com relação a aplicação do disposto no artigo 1.704: “Se um dos
cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a
prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado
na ação de separação judicial.” Lourival Silva Cavalcanti, entende que por interpretação
analógica, tendo em vista a falta de sistematização em caso de extinção da união estável,
aplicam-se as disposições dos artigos 1.702 a 1.704 à união estável.344 Entendimento
contrário tem Francisco José Cahali, para quem a regra do art. 1.704 destina-se
exclusivamente aos separados judicialmente, justifica: “viável defender que sequer os
divorciados teriam direito, nesta qualidade, pretender alimentos do ex-cônjuge quando
até a decretação do divórcio não tiver sido estabelecida a pensão. Da mesma forma,
superada a fase da dissolução da união, momento em que surge e se discute eventual
obrigação alimentar, após a consumação do rompimento, outro instante será inadequado
à pretensão alimentar.”345
Cabe ressaltar que a concessão de alimentos não tem função
indenizatória, ou seja, não repara danos patrimoniais nem morais.
José de Aguiar Dias entende que a pensão alimentícia “deve ser tida
como simples indicação subsidiária” o que não impede a também reparação por danos
morais. Argumenta o autor que os alimentos são variáveis, podendo ser aumentados,

342
Artigo 1.709 do Código Civil: “O novo casamento do cônjuge devedor não extingue a obrigação
constante da sentença de divórcio.”
343
Francisco José Cahali, Dos alimentos, cit., p. 236.
344
Lourival Silva Cavalcanti, União estável, cit., p. 151.
345
Francisco José Cahali, Dos alimentos, cit., p. 237.
102

diminuídos ou até suspensão de acordo com o binômio necessidade e possibilidade. Por


outro lado, a indenização não tem variação.346
Assim sendo, lembra Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos
que “a prestação de alimentos, após a dissolução do casamento, tem caráter assistencial
e não indenizatório, condicionando-se aos pressupostos da necessidade do credor e da
possibilidade do devedor, podendo ser extinta a qualquer tempo, de modo que a
condenação do convivente ao pagamento de pensão alimentícia e de indenização pelos
danos acarretados pelo descumprimento de dever oriundo do casamento não se
constituem bis in idem.”347
Outro efeito que merece destaque é o que reflete no direito sucessório.
Observa-se que o Código Civil de 2002 dispensou tratamento injusto e desigual aos
companheiros em relação aos cônjuges. Os companheiros estão excluídos da ordem de
vocação hereditária (de acordo com o artigo 1.829348) e não são herdeiros necessários
(conforme o artigo 1.845349), de modo que poderão ser excluídos da herança por
testamento que contemple apenas os herdeiros necessários.
Anota Fabio Simões Abrão que “a posição sucessória do companheiro
sofreu um retrocesso com relação ao que dispunha a Lei Federal nº 8.974/94, a qual
previa, em seu artigo 2º, a participação do companheiro na sucessão, com direito ao
usufruto de quotas-partes de bens do de cujus, independentemente de sua origem, e na
qualidade de herdeiro, com direito à totalidade da herança, à falta de descendentes ou
ascendentes do companheiro falecido.”350

346
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade, cit., págs., 887/889. No mesmo sentido Regina Beatriz
Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade civil dos cônjuges, cit., p. 133: “o recebimento de
pensão alimentícia, por si só, não repara os danos sofridos pelo consorte lesado com o descumprimento de
dever conjugal pelo outro cônjuge, por não compensar o sofrimento ou dano moral do ofendido. Além
disso, a pensão alimentícia baseia-se em pressupostos que não estão presentes na responsabilidade civil:
necessidades do credor e possibilidades do devedor. Pode, ainda, ser revista a qualquer tempo, em razão
da ausência daqueles pressupostos, de casamento ou constituição de união estável pelo cônjuge credor.
Quando à perda do direito a alimentos pelo culpado, é evidente que somente tem a característica de
sanção, ínsita na responsabilidade civil, diante da necessidade de pensão alimentícia, pois, caso contrário,
essa punição é marcada pela inocuidade.”
347
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade civil dos cônjuges, cit., p. 138.
348
Artigo 1.829 do Código Civil: “A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte: I – aos descendentes
(...); II – aos ascendentes (...); III – ao cônjuge sobrevivente e IV – aos colaterais.”
349
Artigo 1.845 do Código Civil: “São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o
cônjuge.”
350
Fabio Simões Abrão, Considerações sobre o atual Código Civil – alguns aspectos patrimoniais e
sucessórios na união estável e no regime da separação total de bens, Revista do Advogado, 76 : 23.
103

O companheiro é herdeiro facultativo concorrendo com os demais


sucessores, inclusive com os colaterais até 4º grau351. Segundo Eduardo de Oliveira
Leite, “os herdeiros facultativos são aqueles que podem ser privados da herança,
bastando ao testador não os contemplar nas disposições de última vontade.”352
Funda-se esta exclusão nos artigos 1.845, 1.846353 e 1.857354 do Código
Civil. Ressalte-se que o companheiro apenas participará da sucessão do outro, quanto
aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável. Quer dizer,
independentemente do regime de bens na união estável, a herança é essa: patrimônio
adquirido onerosamente. Além disso, o artigo 1.790355 estipula as seguintes condições:
se companheira(o) concorrer com filhos comuns do autor da herança, terá direito a uma
quota equivalente à que for atribuída a cada um deles. Se concorrer com filhos
exclusivos do autor da herança, receberá a metade do que couber a cada um deles e, se
concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança. O
companheiro(a) apenas herdará a totalidade da herança, se não existirem parentes
sucessíveis.
Zeno Veloso manifesta-se nesse sentido: “o novo Código civil promoveu
um recuo notável. O panorama foi alterado, radicalmente. Deu-se um grande salto para
trás. Colocou-se o companheiro em posição infinitamente inferior com relação à que
ostenta o cônjuge. A sucessão do companheiro, para começar, limita-se aos bens
adquiridos onerosamente na vigência da união estável. Quanto a esses bens adquiridos
onerosamente, durante a convivência, o companheiro já é meeiro, conforme o artigo
1.725, inspirado no artigo 5º da Lei n. 9.278/96, e que diz: “Na união estável, salvo

351
Destaca-se a doutrina de Zeno Veloso, Do direito sucessório dos companheiros, Direito de Família e o
novo Código Civil, coord. Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira, Belo Horizonte: Del Rey,
3.ed., 2003, p. 293 que assevera: “na sociedade contemporânea, já estão muito esgarçadas, quando não
extintas, as relações de afetividade entre parentes colaterais de 4º grau (primos, tios-avós, sobrinhos-
netos). Em muitos casos, sobretudo nas grandes cidades, tais parentes mal se conhecem, raramente se
encontram. E o novo Código Civil brasileiro, que começou a vigorar no Terceiro Milênio, resolve que o
companheiro sobrevivente, que formou uma família, manteve uma comunidade de vida com o falecido, só
vai herdar, sozinho, se não existirem descendentes, ascendentes, nem colaterais até o 4º grau do de cujus.
Temos de convir: isto é demais!”
352
Eduardo de Oliveira Leite, Comentários ao Novo Código Civil – Do direito das sucessões, coord.
Sálvio de Figueiredo Teixeira, Rio de Janeiro: Forense, vol. XXI, arts. 1.784 a 2.027, 2004, p. 264.
353
Artigo 1.846 do Código Civil: “Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens
da herança, constituindo a legítima.”
354
Artigo 1.857, caput, do Código Civil: “Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade
dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte.”
355
Nota-se que o único artigo que trata da sucessão do companheiro é o artigo 1.790 e, está localizado nas
disposições gerais e não na legítima como deveria ser onde, aliás, está disciplinada a sucessão do cônjuge.
104

convenção válida entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que


couber, o regime da comunhão parcial de bens.”356
No mesmo sentido, Maria Helena Diniz ensina que “há desigualdade de
tratamento sucessório entre cônjuge e convivente sobrevivo, pois aquele é, em certos
casos, herdeiro necessário privilegiado, podendo concorrer, ou não, com descendente e
ascendente do falecido. O convivente, não sendo herdeiro necessário, pode ser excluído
da herança do outro, se ele dispuser isso em testamento (CC, arts. 1.845, 1.846 e 1.857),
pois só tem direito à sua meação quanto aos bens adquiridos onerosamente na
constância da união estável. A relação matrimonial na seara sucessória prevalece sobre
a estabelecida pela união estável, pois o convivente não se beneficiará dos mesmos
direitos sucessórios outorgados ao cônjuge supérstite.”357
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, antes de vigorar o novo Código
Civil, por isso o autor refere-se ao “Projeto”, já cogitava do tratamento desigual, assim:
“mesmo com a modificação realizada, constata-se que haverá um retrocesso no que
pertine ao direito sucessório de propriedade em favor do companheiro,
comparativamente ao sistema introduzido pela Lei 8.971/94, sendo que poder-se-á
cogitar da inconstitucionalidade da mudança, à luz da Constituição de 1988, pois o
Projeto não estaria protegendo especialmente o companheirismo, mas, ao contrário,
deixando de protegê-lo no campo sucessório, ao menos com a extensão da proteção
dada pela Lei n. 8.971/94. O ideal seria equiparar, como havia ocorrido, o
companheirismo e o casamento no segmento do direito à sucessão.” 358
Evandro Antonio Cimino também se manifesta contra o tratamento
sucessório dispensado aos conviventes, segundo o desembargador: “a união estável e o
casamento caminham juntos, no que concerne aos princípios básicos para a formação de
uma família. O mesmo não acontece relativamente a sucessão, onde se observa uma
desigualdade gritante e injusta.”359
Com relação ao direito real de habitação para os companheiros, o Código
Civil é silente. Tal direito era previsto no artigo 2º, incisos I e II, da Lei nº 8.971/94 e no

356
Zeno Veloso, Do direito sucessório dos companheiros, cit., p. 286.
357
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 6, p. 136. Ainda: Rodrigo da Cunha Pereira, Concubinato, cit., p.
118 : “a respeito da sucessão na união estável, foram duas as mais significativas modificações em relação
às duas leis anteriores. Primeiro, os bens sucessíveis serão apenas os adquiridos onerosamente na vigência
da união estável. Segundo, a herança será dividida, concorrendo com parentes do falecido.”
358
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., págs. 463/464.
359
Evandro Antonio Cimino, A sucessão na união estável, Jornal Tribuna do Direito, fevereiro de 2004,
p.30.
105

parágrafo único do artigo 7º da Lei nº 9.278/96. O artigo 1.831 prevê o direito real de
habitação apenas ao cônjuge sobrevivente. Para Rui Stoco, “havendo conflito de
normas, há de prevalecer a lei especial, atuando o Código Civil apenas
subsidiariamente, de sorte a também cobrir as omissões da lei especial.”360
Na doutrina, defendem a aplicação do direito real de habitação aos
companheiros: Maria Helena Diniz: “urge lembrar que o companheiro sobrevivente, por
força da Lei n. 9.278/96, art. 7º, parágrafo único, e, analogicamente, pelo disposto nos
arts. 1.831 do CC e 6º da CF, também terá direito real de habitação, enquanto viver ou
não constituir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência
da família.361
Guilherme Calmon Nogueira da Gama também é a favor do direito real
de habitação, ensina que: “tal dispositivo pode ser considerado em vigor, não havendo
se falar em revogação de tal regra da Lei de 1996, sob pena de descumprimento do
mandamento constitucional de especial proteção à família, incluindo aquela fundada no
companheirismo.”362
Ainda, Jorge Shiguemitsu Fujita: “como inexiste colidência desta norma
com o Código Civil, o qual, também, é silente quanto à revogação daquele diploma
legal, pode-se concluir pela vigência do referido artigo de lei. Todavia, para maior
clareza, recomenda-se, mediante alteração no Código Civil, o reconhecimento expresso
desse direito.” 363
Entendimento diverso pode ser encontrado com a justificativa de que
houve revogação do disposto na lei nº 9.278/96, porque o Código disciplinou todos os
assuntos desta lei, exceto o direito real de habitação. Lembra Flávio Augusto Monteiro
de Barros ao apontar o fundamento daqueles que entendem pela revogação que
“ademais, o art, 2.043 do CC, quanto às leis especiais, ressalvou apenas a vigência das
disposições de natureza processual, administrativa e penal, revogando implicitamente as
normas de direito civil.”364 É a posição de Zeno Veloso: “O problema se mostra mais
grave e delicado se considerarmos que o novo Código Civil nem fala no direito real de
habitação sobre o imóvel destinado à residência da família, ao regular a sucessão entre

360
Rui Stoco, Tratado, cit., p. 793.
361
Maria Helena Diniz, Curso, cit., v. 6, p. 137.
362
Guilherme Calmon Nogueira da Gama, O companheirismo, cit., p. 464.
363
Jorge Shiguemitsu Fujita, Curso de Direito Civil, São Paulo: Juarez de Oliveira, 2. ed., 2003, p. 84.
364
Flávio Augusto Monteiro de Barros, Manual, cit., p. 99.
106

companheiros, deixando de prever, em outro retrocesso, o benefício já estabelecido no


artigo 7º, parágrafo único, da Lei n. 9.278/96.”365
Observa-se que não tendo o atual Código Civil previsto o direito real de
habitação ao companheiro sobrevivente, pode-se dizer que continua em vigor o disposto
na lei nº 9.278/96, desta forma, não há que se falar em revogação total de tal dispositivo,
pois sendo o Código Civil lei geral e a lei 9.278/96, lei especial, não pode aquela
revogar esta, salvo se for expressamente prevista a revogação, o que no caso, não
ocorreu.366
Ademais, o Enunciado nº 117, aprovado na Jornada de Direito Civil
promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal no
período de 11 a 13 de setembro de 2002, sob a coordenação científica do Ministro Ruy
Rosado, do Superior Tribunal de Justiça propõe que o direito real de habitação
conferido aos cônjuges no artigo 1.831, também o seja aos companheiros. Nestes
termos: “Art. 1831: o direito real de habitação deve ser estendido ao companheiro, seja
por não ter sido revogada a previsão da Lei n. 9.278/96, seja em razão da interpretação
analógica do art. 1831, informado pelo art. 6º, caput, da CF/88.”
Outros efeitos ainda podem surgir na união estável, tais como: a
administração dos bens de filhos menores (CC, arts. 1.689 a 1.693); o bem de família
(CC, arts. 1.711 a 1722); além dos efeitos perante terceiros, como: em relação aos
filhos, o reconhecimento destes; na previdência social, verifica-se a possibilidade do
companheiro(a) ser dependente (art. 16, I, da Lei nº 8.213/91)367, bem como a reparação
por acidente de trabalho368; quanto à locação, o companheiro sub-roga os direitos do

365
Zeno Veloso, Do direito sucessório dos companheiros, cit., p. 287.
366
Veja-se o disposto na Lei de Introdução ao Código Civil: Art.2º - caput, §2º: “a lei nova, que
estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.”
367
Dispõe o art. 16, I, da Lei nº 8.213/91: Art. 16 – caput: “São beneficiários do Regime Geral de
Previdência Social, na condição de dependentes do segurado.” I – “o cônjuge, a companheira, o
companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou
inválido.”
368
Registre-se que a infortunística e o direito previdenciário foram os pioneiros no reconhecimento de
realidades fáticas para atribuir-lhes efeitos jurídicos. De acordo com Rodrigo da Cunha Pereira,
Concubinato, cit., p. 89, “um dos ramos do Direito que mais contribuiu e evoluiu para o estabelecimento
de normas sobre o direito concubinário foi o previdenciário.” O que importa é saber se é legítimo ou não
o direito daquele que sofreu prejuízo, não importando se a relação é casamento ou união estável. Assim,
se cônjuge ou companheiro sofreu prejuízo, poderá ser indenizado. Nesse contexto, a Súmula 35 STF:
“em caso de acidente do trabalho ou de transporte, a concubina tem direito de ser indenizada pela morte
do amásio, se entre eles não havia impedimento para o matrimônio.” A parte final deve ser interpretada
com abrandamento, no sentido de reconhecer união estável da pessoa casada porém separada de fato de
sua esposa. Nesse sentido: TJSP – 5ª Câm. - Ap. 81.775-5 – Rel. Ralpho Oliveira – j. 09.11.2000.
107

locatário (arts. 11, I e 12 da Lei nº 8.245/91)369; os companheiros também podem


adotar, de acordo com os artigos 1.618, parágrafo único e 1.622 do Código Civil e §2º,
artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Um dos efeitos perante terceiros que se destaca é o que diz respeito aos
credores. O artigo 1.725 do Código Civil estipula, salvo contrato escrito entre as partes,
o regime de comunhão parcial entre os companheiros370. Conseqüência da aplicação
deste regime é a necessidade de outorga do outro companheiro para a realização de
negócios jurídicos (artigo 1.647 do Código Civil).
Luís Paulo Cotrim Guimarães apresenta duas correntes a respeito do
tema: “a que rejeita a necessidade de outorga do convivente na união estável,
considerada como majoritária, e a que entende pela conveniência de tal autorização,
quando for respeitante a atos de disposição de bens imóveis.”371
Com o objetivo de sanar a falha do Código Civil, o Projeto 2686/96, no
artigo 5º pretende: “Nos instrumentos que vierem a firmar com terceiros, os
companheiros deverão mencionar a existência da união estável e a titularidade do bem
objeto de negociação. Não o fazendo, ou sendo falsas as declarações, serão preservados
os interesses dos terceiros de boa fé, resolvendo-se os eventuais prejuízos em perdas e
danos, entre os companheiros, e aplicadas as sanções penais cabíveis.” Nesses termos o
projeto impõe outorga do outro companheiro nos negócios realizados com terceiros,
visando a proteger a boa-fé dos mesmos.
O artigo 1.725 refere-se ainda a contrato escrito, sabe-se da
informalidade que reveste a união estável, assim, prescinde de contrato escrito para que
regulamente sua existência. Contudo, nada impede que companheiros estabeleçam
contrato para regular tanto a convivência quanto as relações patrimoniais.

369
Dispõem os artigos 11, I e 12 da Lei nº 8.245/91, art. 11 – caput : “Morrendo o locatário, ficarão sub-
rogados nos seus direitos e obrigações”, I – “nas locações com finalidade residencial, o cônjuge
sobrevivente ou companheiro e, sucessivamente, os herdeiros necessários e as pessoas que viviam na
dependência econômica do de cujus, desde que residentes no imóvel.” Art. 12 – “Em caso de separação
de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução da sociedade concubinária, a locação prosseguirá
automaticamente com o cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel.”
370
A respeito, dispõe o Enunciado nº 115 aprovado na Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de
Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal no período de 11 a 13 de setembro de 2002, sob a
coordenação científica do Ministro Ruy Rosado, do STJ: “Art. 1.725: há presunção de comunhão de
aqüestos na constância da união extramatrimonial mantida entre os companheiros, sendo desnecessária a
prova do esforço comum para se verificar a comunhão dos bens.”
371
Luís Paulo Cotrim Guimarães, Negócio jurídico sem outorga do cônjuge ou convivente, São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 2003, págs. 96/97.
108

O contrato de convivência pode ser celebrado a qualquer tempo, antes do


início da união estável ou já na sua constância.372
De acordo com Francisco José Cahali, “possuindo a relação concubinária
regime patrimonial próprio, diverso e mais restrito que o regime matrimonial de bens, o
contrato de convivência apresenta-se como um instrumento apropriado para a auto-
regulamentação dos reflexos patrimoniais decorrentes da união estável, reconhecendo,
criando, modificando ou extinguindo direitos entre os companheiros.”373
Ressalta-se que em contrato de convivência podem os conviventes
estipular indenização pelo rompimento da relação. Este rompimento tanto pode ser
imotivado quanto culposo. Assim, a indenização terá caráter compensatório se a
separação for espontânea e, caráter reparatório se o rompimento for culposo.374
Acrescenta Francisco José Cahali que: “já quando estipulada a recomposição econômica
em razão da dissolução culposa, além do conteúdo acima, também se verifica o caráter
indenizatório-punitivo, de tal sorte que a previsão pretende penalizar aquele
inadimplente com as obrigações decorrentes da união estável. Nessa hipótese pode-se
cogitar, inclusive, de sua fixação em substituição aos alimentos devidos, situação em
que a pensão deixa de ser devida por se criarem, através da indenização, meios próprios
à subsistência do favorecido.”375
Atenta-se para o cuidado de que estas indenizações devam ser razoáveis,
pois a união estável não pode ser vista como fonte de riquezas, é entidade familiar e seu
objetivo é outro: a constituição de família.

372
Francisco José Cahali, Contrato de convivência, cit., págs., 72/76.
373
Francisco José Cahali, Contrato de convivência, cit., p. 203.
374
Francisco José Cahali, Contrato de convivência, cit., p. 244.
375
Francisco José Cahali, Contrato de convivência, cit., p. 245.
109

CAPÍTULO IV – REPARAÇÃO DE DANOS NA UNIÃO ESTÁVEL

Considerando a evolução da união estável ao se analisar a história deste


instituto, nota-se que importantes avanços foram conquistados, através de leis esparsas,
em princípio, até a consagração constitucional em 1988.
No entanto, em nenhum momento, lei alguma disciplinou a reparação por
danos materiais ou morais entre os conviventes.
Para Belmiro Pedro Welter, é admissível a indenização por dano moral
tanto no casamento quanto na união estável desde que verificados os seguintes critérios:
“1) a ação de separação judicial ou dissolução de união estável e/ou indenização por
dano moral deve ser ajuizada logo após a ocorrência da conduta culposa, sob pena de
incidir o perdão do cônjuge ofendido; 2) o direito ao dano moral é exclusivo do cônjuge
inocente; 3) o pedido somente é possível na ação de separação judicial ou dissolução de
união estável litigiosa e com culpa; 4) a conduta do cônjuge culpado deve ser tipificada
como crime; 5) o comportamento delituoso deve ser ofensivo à integridade moral do
cônjuge ofendido, produzindo dor martirizante e profundo mal-estar e angústia.”376
Neste contexto, há que fundamentar a reparação de danos na união
estável no artigo 186 do Código Civil. Segundo Regina Beatriz Tavares da Silva Papa
dos Santos: “Se do descumprimento a dever da união estável e conseqüente violação a
direito do outro companheiro, ou seja, se de tal ato ilícito resulta dano, moral ou
material, preenchidos estarão os pressupostos da responsabilidade civil, com a aplicação
da regra geral reparatória, constante do art. 186 do CC.”377
Lembra Rui Stoco que “o pressuposto do direito à reparação é o ato
ilícito e o dano verificado que àquele se liga por nexo de causa e efeito e não a natureza
do ato praticado, sua origem ou qualificação jurídica.”378
Imperioso esclarecer que não se trata de reparação de danos oriundos da
simples ruptura da união estável, mas sim, de reparação de danos gerados por ato ilícito.

376
Belmiro Pedro Welter, Dano moral na separação, divórcio e união estável, cit., Revista dos Tribunais,
v. 775, março de 2000, p.133. Verifica-se que o autor aceita com ressalvas a possibilidade de dano moral
no rompimento da união estável e no casamento, pois segundo ele, a conduta do cônjuge ou convivente
culpado, deve configurar-se como crime. Em obra mais recente, Estatuto da união estável, Porto Alegre:
Síntese, 2.ed., 2003, p. 234, o autor ratifica esse entendimento: “(...) isso não significa que o dano moral
deve ser afastado do Direito de Família, porquanto, se os consortes, na constância do casamento e da
união estável, praticarem, entre si, ilícito penal, esse dano deve ser indenizado, não porque o fato ocorreu
durante a entidade familiar, e sim devido ao delito penal que, em tese deve ser indenizado.”
377
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, A culpa nas relações de família, cit., págs., 93/94.
378
Rui Stoco, Tratado, cit., p. 798.
110

Nesse sentido, anota Carlos Roberto Gonçalves: “em face da regulamentação da união
estável, reconhecida como entidade familiar, conferindo direito à meação e a alimentos
aos companheiros, não se justifica o pagamento de indenização em caso de ruptura da
convivência.”379
Desta forma, as seguintes decisões:

“A indenização pelo fim da união estável só é


cabível quando há conduta ilícita de um dos
envolvidos na relação concubinária, bem como
nexo de causa e efeito entre o enriquecimento
indevido de um e o prejuízo ou dano do outro.”
(grifo nosso)
(TJSP – 1ª Câm. – Ap. 27.334-7 – Rel. Ênio
Santarelli Zuliani – j. 27.01.1998 – LEX 203/142)

“A ruptura imotivada e unilateral do concubinato


não é em si, um ato culposo a gerar indenização por
danos morais e patrimoniais. A indenização, na
dissolução arbitrária, só é cabível quando e se a
ruptura causar prejuízos concretos ao concubino,
prejuízos esses que devem ser cumpridamente
comprovados pelo concubino prejudicado uma vez
que tais danos ressarcíveis não se presumem.”
(TJMG - 3ª Câm. – Ap. 97.423-8 – Rel. Tenisson
Fernandes – j. 18.06.1998 – RT 762/366).

Cabe lembrar que a prática do ato ilícito além de ensejar ação de


indenização, também pode ser a causa da ruptura da união. Aparecida I. Amarante anota
que: “no caso de companheiros/entidade familiar, igualmente pode ocorrer ofensa à
honra, nos mesmos moldes da sociedade familiar formada pelo casamento, porquanto há
também uma relação conjugal ou familiar e as injúrias graves, latu sensu, são motivo
para rompimento do laço, bem como para pleito de ressarcimento do dano.”380

379
Carlos Roberto Gonçalves, Comentários ao Código Civil, cit., p. 51.
380
Aparecida I. Amarante, Responsabilidade, cit., págs., 272/273.
111

José de Aguiar Dias ensina que “não pode o concubinato, de si mesmo,


fundamentar direito algum do amante abandonado. Mas sustentamos do mesmo passo
que o juiz diante de um pedido dessa natureza, deve examinar se as circunstâncias não
indicam a existência de um estado de fato caracterizador de culpa, malícia ou abuso, o
que é na realidade, muito mais freqüente do que se pensa.”381 De acordo com o autor,
deve haver valoração das circunstâncias que permeiam o caso concreto e, nesse sentido,
José de Aguiar Dias apresenta as seguintes observações: “É claro que a jovem da
cidade, melhor instruída, não pode ser equiparada à operária analfabeta, impressionada
com a riqueza do sedutor; que a união prolongada de que resulte prole não pode ser
considerada nos mesmos termos em que se aprecia o concubinato estéril; que a ruptura
da união livre, quando a mulher seja capaz de conseguir uma colocação, tenha as
mesmas conseqüências do rompimento em época em que a mulher, já velha, nada mais
possa conseguir e tenha de enfrentar a miséria (...)”382
Na mesma linha de raciocínio, Maria Helena Diniz: “desse modo o
concubinato puro, em si mesmo, não fundamenta nenhum direito do repudiado, mas
nada obsta que pleiteie uma indenização pelo rompimento que lhe tenha causado
prejuízo de ordem moral ou patrimonial.”383
Nicolau Eládio Bassalo Crispino corrobora: “sendo assim, cremos que o
simples fato da ruptura não enseja reparação de danos por parte de um dos
companheiros em favor do outro. No entanto, nada impede que, no momento da
dissolução, tenha um dos companheiros praticado um ato ilícito que venha a causar
prejuízo moral ou material ao outro, mesmo que este ato seja o motivo da ruptura da
união. Se assim ocorrer, deve este dano ser ressarcido.”384 Adiante o autor apresenta
dois exemplos para elucidar a questão. Supõe um caso de espancamento da mulher pelo
seu convivente, causando deformidade facial. Questiona se apesar deste fato por fim à
união, não poderia também dar causa a indenização por dano moral. Outro exemplo
cuida de injúrias que a mulher lança contra seu companheiro, considerando os anos de
convivência e cidade pequena onde a maioria dos habitantes de conhecem, as injúrias
tomam grandes proporções. Novamente o autor lança a questão, ou seja, o mesmo fato

381
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade, cit., p. 167.
382
José de Aguiar Dias, Da responsabilidade, cit., p. 168.
383
Maria Helena Diniz, Curso, cit., p. 173.
384
Nicolau Eládio Bassalo Crispino, Responsabilidade civil dos conviventes, cit., p. 116.
112

que põe fim à união, também pode ensejar ação de indenização por dano moral? E ele
responde que sim nas duas situações.385
Com certa divergência, os Tribunais brasileiros têm se manifestado sobre
a indenização por danos morais, no tocante à união estável, desta forma, anota Yussef
Said Cahali que “nossos tribunais não seriam insensíveis à reparabilidade de danos
morais conseqüentes da ruptura de um concubinato puro, prolongado no tempo, e
dependendo das circunstâncias especiais em que se teria verificado o rompimento da
relação amorosa.”386
O Tribunal de Justiça de São Paulo já se manifestou:

“Ação indenizatória – Concubinato – Pretensão


formulada pela mulher contra ex-companheiro que a
abandonou após engravidar, perder o emprego e em
conseqüência abortar involuntariamente – Rejeição
liminar da ação por ausência de sucedâneo jurídico –
Inadmissibilidade, pois existente adequação jurídica,
interesse e legitimidade.”
(TJSP – 2ª Câm. - Ap. 066.960-4/8 – Rel. Ênio
Santarelli Zuliani – j. 23.02.1999 – RT 765/191).

Nesta decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, questiona o relator


Desembargador Ênio Santarelli Zuliani: “ora, considerando que o extravio de bagagem
em transporte aéreo enseja indenização por dano moral (acórdão do Supremo Tribunal,
RT 740/205); que a propaganda enganosa que ilude interessados em adquirir imóveis
igualmente fomenta reparabilidade por ofensa moral (acórdão do TSRJ (sic), Bol.
AADP, 2086, p. 169-e); que a pessoa jurídica é alvo de resguardo da honra objetiva
(Acórdão do STJ, RT 727/123), cabe perguntar: qual o motivo determinante da
inadmissibilidade do pedido indenitário formulado por mulher que se entrega de corpo e
alma em uma sociedade concubinária e perde tudo, inclusive a auto-determinação e
confiança, pelo egocentrismo do companheiro?”387

385
Nicolau Eládio Bassalo Crispino, Responsabilidade civil dos conviventes, cit., p. 116.
386
Yussef Said Cahali, Dano moral, cit., págs. 660/661.
387
RT 765/193.
113

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro também já concedeu reparação


por danos morais em virtude de ofensas verbais que o companheiro lançou contra sua
ex-convivente:

“Apelação cível. Ação de indenização. Dano moral.


Ofensas verbais lançadas contra ex-companheira.
Ônus da impugnação específica não exercido.
Não tendo o Réu exercido o ônus da impugnação
específica (art. 302, CPC), tem-se por verdadeira as
alegações contidas na inicial, consubstanciada, no
caso, em ofensas verbais assacadas contra a ex-
companheira.
Valor indenizatório que, todavia, deve ser minorado,
considerando a união existente entre as partes e,
mormente, as suscetibilidades decorrentes da própria
natureza da lide.
Recurso parcialmente provido.”
(TJRJ – 11ª Câm. – Ap. 2003.001.35194 - Rel. José
Carlos de Figueiredo – j. 11.02.2004)

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no entanto, já decidiu que


não cabe reparação a quebra do dever de fidelidade:

“Ação indenizatória – Dano moral – União estável –


Infidelidade – Reparação pretendida em face do
convivente infiel e do terceiro, parte alheia no
contrato existente – Inadmissibilidade – Verba
indevida.
A quebra de um dos deveres inerentes à união
estável, a fidelidade, não gera o dever de indenizar,
nem a quem o quebra, um dos conviventes, e menos,
ainda, a um terceiro que não integra o contrato
existente e que é, em relação a este, parte alheia.”
114

(TJRS – 7ª Câm. – Ap. 597.155167 – Rel. Eliseu


Gomes Torres – j. 11.02.1998 – RT 752/344)388

O relator Desembargador Eliseu Gomes Torres argumenta seu voto com


as seguintes palavras: “quando o amor cessa, uma das conseqüências inevitáveis é a
separação. No casamento como na união estável, a separação é mais do que uma
possibilidade. Não fosse assim, não haveria na lei, a expressa previsão da separação
judicial e do divórcio. A separação está para o casamento (e para a união estável) como
a morte está para a vida.”389
Dada a diversidade de manifestações do comportamento humano, várias
são as situações que poderiam ser objeto de indenizações, como a imputação caluniosa
de adultério390; agressões físicas391 que causam humilhação e vexame; graves injúrias
que além de afetar a honra do ofendido também o prejudicam profissionalmente392.
Nesse contexto, observa Clayton Reis que “seria inconcebível admitir
que a responsabilidade civil que incide nas relações contratuais e extracontratuais não
fosse passível de aplicação no plano da sociedade não matrimonializada observados os
pressupostos para a sua admissibilidade. Isto porque é irrecusável que alguém fique

388
Outras decisões que rejeitam a indenização por dano moral: TJRS – 8ª Câm. – Ap. 70005183959 –
Rel. Alfredo Guilherme Englert – j. 27.02.2003; TJSP – 3ª Câm. – AP. 88.845-4/4 – Rel. Alfredo
Migliore – j. 28.01.2000; TJSP – 6ª Câm. – Ap. 072.936-4/8 – Rel. Mohamed Amaro – j. 11.02.1999;
TJRS – 1ª T. – Recurso inominado 71000576363 – Rel. João Pedro Cavalli Júnior – j. 21.10.2004; TJRS
– 8ª Câm. – Ap. 70001090901 – Rel. José Ataídes Siqueira Trindade – j. 29.06.2000; TJMS – 3ª T. – Ap.
1000.074540-6/0000-00 – Rel. Oswaldo Rodrigues de Melo – j. 19.04.2004; TJMG – 3ª Câm. – Ap.
97.423-8 – Rel. Tenisson Fernandes – j. 18.06.1998 – RT 762/366; TJRS – 7ª Câm. – Ap. 596076232 –
Rel. Carlos Alberto Alves Marques – j. 16.10.1996; TJMG – 4ª Câm. – Ap. 1002497070578-6/001 – Rel.
Almeida Melo – j. 24.06.2004; TJGO – Ap. 200001299900- Rel. Des. Ney Teles de Paula – j. 15.01.02.
389
RT 752/345
390
Noticia Inacio de Carvalho Neto, Reparação civil na separação litigiosa culposa, cit., págs. 111/112
que o Tribunal de Justiça de São Paulo já condenou um marido a indenizar por dano moral sua mulher,
acusando-a sem fundamento e sem provas, de prática de adultério. Trata-se de Apelação Cível nº
220.943-1/1, julgada pela 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, relator Olavo Siqueira.
Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 616, p.190, fev. 1987. No mesmo sentido Revista forense, v. 134, p.
114, mar./abr.1954.
391
De acordo com Inacio de Carvalho Neto, Reparação civil na separação litigiosa culposa, cit., p. 107:
“Toda injúria, como toda sevícia, acarretam, necessariamente, um dano moral e físico, que o pagamento
de uma pensão de alimentos não indeniza, mesmo porque tais práticas desdobram da esfera civil para se
constituírem ilícitos penais. A pensão não tem o poder de exonerar o cônjuge culpado ou delinqüente das
graves infrações cometidas, não apenas contra as obrigações resultantes do casamento, mas, e
principalmente, contra as que respeitam à honra e à integridade física da pessoa humana.”
392
Consultar Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade civil dos cônjuges, cit.,
p. 124. A autora elenca as seguintes hipóteses: “o abandono material e moral do marido que, em razão de
acidente, fica paraplégico; a acusação infundada em demanda judicial, com imputação injuriosa de prática
de adultério, que não restou provada; a simulação de gravidez pela mulher, que obtém, por meio desse
pretexto, ordem judicial para a saída forçada do marido do domicílio conjugal (...)”. E Inacio de Carvalho
Neto, Reparação civil na separação litigiosa culposa, cit., págs. 98/114.
115

indene, por ausência de dispositivo normativo expresso no sentido da reparação integral


de danos materiais e morais.”393
Humberto Theodoro Júnior ao analisar o dano moral na ruptura do
casamento e da união estável menciona sua atuação em duas causas. Uma perante o
Tribunal de Alçada de Minas Gerais, caso em que o marido tentou contra a vida de sua
mulher, deixando-a incapacidade nos membros inferiores e condenado-a à cadeira de
rodas pelo resto da vida. Outra, no Tribunal de Justiça de Pernambuco, caso em que a
mulher disparou vários tiros contra seu marido, sem feri-lo, foi condenada com a
revogação de doações que recebera do marido, na constância do casamento e, no
primeiro caso, o marido deve que indenizar civilmente sua mulher, além de reparar o
dano moral por ela sofrido.394
Nestes termos Humberto Theodoro Júnior conclui que: “em tal
conjuntura, o efeito civil do delito torna certo o direito do ofendido a indenização pelos
danos materiais e morais suportados, sem prejuízo do pensionamento e demais sanções
decorrentes do direito matrimonial.”395

393
Clayton Reis, Responsabilidade civil pelo rompimento da união estável, cit., p. 221.
394
Humberto Theodoro Júnior, Dano moral, cit., págs. 89/90.
395
Humberto Theodoro Júnior, Dano moral, cit., p.90.
116

1. PRINCIPAIS CAUSAS QUE RECLAMAM REPARAÇÃO

Dentre as possíveis causas que ensejariam reparação de danos, presentes


os pressupostos da responsabilidade civil, destacam-se: o adultério e as injúrias graves,
o abandono injusto e lesivo e a transmissão de doenças, como a Aids.
Admitindo o adultério entre os conviventes como violação ao dever de
lealdade, além de ser causa para a dissolução da união, também poderá ensejar
reparação moral ou material, desde que haja nexo entre a conduta adúltera e o dano
experimentado pelo ofendido.
Assim já decidiu o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em não
reparar danos morais, pois não ficou provado o nexo causal entre a conduta adúltera e os
danos sofridos pela convivente traída:

“Dano moral – União estável – Adultério.


Desfeita a união estável em razão de fato de
adultério, a conseqüência jurídico-legal não passa da
dissolução da sociedade conjugal de fato, não
gerando dano moral indenizável.
Ausência de demonstração mínima de nexo causal
entre o fato do adultério e os demais fatos lesivos
sofridos pela autora, descabe indenizar.
Recurso desprovido, Unânime.”
(TJRS – 1ª T. – Recurso inominado nº 71000576363
– Rel. João Pedro Cavalli Júnior – j. 21.10.2004).

Segundo doutrina José de Aguiar Dias: “sem cogitar do dano moral que
incontestavelmente acarreta, o adultério pode produzir dano material e, em presença
dele, a admissibilidade da ação reparatória não pode sofrer objeção, ainda por parte dos
que se negam a reconhecer a reparabilidade do dano moral.”396
Caso não se configure o adultério, pois restrito é o seu conceito (prática
de conjunção carnal com pessoa distinta de seu companheiro/cônjuge), haverá

396
José de Aguiar Dias Apud Inacio de Carvalho Neto, Reparação civil na separação litigiosa culposa,
cit., p. 99.
117

possibilidade de reparar o quase-adultério ou injúria grave, que são os atos diversos da


conjunção carnal e evidenciam tal propósito.397
O abandono, por sua vez, para gerar indenização, deve ser injusto e
lesivo. Se motivado, ou seja, se um dos conviventes contribuiu para que o outro
deixasse a vida em comum, saindo do lar ou se o abandono não trouxer prejuízo algum
pois, pode acontecer que, finda a união, o convivente esteja contemplado com melhores
recursos, que antes não dispunha. Nestes dois casos, não há que se falar em
indenização.398
Mais uma causa que pode resultar em reparação de danos entre
conviventes é a transmissão de Aids (Síndrome da Imuno Deficiência Humana
Adquirida) de um convivente ao outro.
Desta forma, gera indenização, a transmissão dolosa ou culposa da Aids,
de modo que se o portador da doença não tem consciência de seu mal, não há que ser
punido, assim, se na constância da união estável o convivente contrai HIV (Human
Immuno Deficiency Vírus) positivo através de transfusão de sangue, por exemplo, e
transmite-o ao seu convivente, sem culpa ou dolo, não tem nada a reparar.
Melhor esclarecendo, um dos conviventes pode adquirir o vírus da Aids
através de simples transfusão de sangue. Contaminado, por vários anos, poderá
permanecer assintomático. Se neste período ocorrer a contaminação ao respectivo
convivente, não há que se falar em culpa, vale dizer, o portador não sabe que o é.
Neste contexto, Marco Antonio Fanucchi, apresenta transcrição do Guia
Médico da Associação Paulista de Medicina: “(...) o contaminado com o HIV pode não
apresentar sintomas ou ter breves indisposições por uma ou duas semanas, com
sintomas similares aos de outras infecções viróticas. Passam-se meses, em geral anos,
sem que sintoma ou sinal de infecção se manifeste, mas o indivíduo pode contaminar
outras pessoas nesse período. Durante esse tempo o sistema imunológico vai sendo
prejudicado pela perda de um tipo particular de célula sanguínea branca, o linfócito T4.
Os sintomas acabam se desenvolvendo. Tipicamente, seguem-se uma sucessão de

397
Consultar Inacio de Carvalho Neto, Reparação civil na separação litigiosa culposa, cit., p. 98; Regina
Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Causas culposas da separação judicial, cit., págs. 233/234.
398
Edgard de Moura Bittencourt, O concubinato, v.1, cit., págs., 280/283 e Américo Luís Martins da
Silva, O dano moral, cit., p. 49.
118

infecções recorrentes e gradualmente mais graves, perda de peso profunda, diarréia


crônica e em geral um tipo de câncer.”399
Situação diversa é a do convivente que sabe ser soropositivo e omite este
fato, não prevenindo seu companheiro de uma possível contaminação.
José de Aguiar Dias embora se manifeste com relação aos cônjuges, nada
impede que sua posição seja estendida aos companheiros, assim, entende o autor que:
“no mesmo plano devem ser observadas outras infrações aos deveres conjugais, máxime
quando em si mesmas constituam violação de um dever geral para com outrem. Assim,
a responsabilidade do cônjuge que transmite ao outro moléstia contagiosa, hipótese em
que é indiferente, para aparecimento do dever de reparação, que a moléstia tenha ou não
sido comunicada intencionalmente, bastando para a caracterização da responsabilidade a
simples negligência ou imprudência.”400
Inacio de Carvalho Neto entende que “não se exige necessariamente
conhecimento da existência da doença pelo cônjuge que a transmite. É possível que a
conduta culposa tenha sido até mesmo anterior à aquisição da doença pelo cônjuge que
vem a transmiti-la.”401
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos ao elencar situações
extraídas de decisões de tribunais, também se refere à transmissão da Aids: “a
contaminação da convivente pelo vírus da AIDS de que era portador seu companheiro, o
qual tinha consciência da doença e matinha relação sexual com a consorte, sem tomar as
devidas cautelas de uso de preservativo” e, adiante, a autora justifica a possibilidade de
indenização por danos morais ou materiais: “merecem a devida indenização pela
reparação de danos morais e materiais, a compensar-lhes as angústias e perdas sofridas e
a servir de desestímulo à prática de outros atos semelhantes pelo lesante.”402
Para Lydia Neves Bastos Telles Nunes gera obrigação de indenizar, a
hipótese do cônjuge ou companheiro, que se relacionando fora do casamento ou da
união estável, portanto, violando o dever de fidelidade, contrai Aids e transmite-a ao seu
consorte ou convivente. Segundo a autora, “o desrespeito ao dever conjugal ou entre

399
Fanucchi, Marco Antonio. Aids e o direito de família. Revista da USP – Dossiê Aids, n. 33, mar/mai
de 1997 p. 82.
400
José de Aguiar Dias Apud Inacio de Carvalho Neto, Reparação civil na separação litigiosa culposa,
cit., p. 104.
401
Inacio de Carvalho Neto, Reparação civil na separação litigiosa culposa, cit., p. 104.
402
Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, Responsabilidade civil dos cônjuges, cit., p. 124.
119

companheiros vai gerar para o culpado a obrigação de indenizar, sem falar em separação
judicial ou dissolução da união estável.”403
Doença incurável que é a Aids, pode por fim à vida e causar grande abalo
psíquico além da discriminação social que sofre o portador desta doença. Assim,
comprovada a culpa ou o dolo e, verificados os pressupostos da responsabilidade civil,
pois imprescindível o nexo entre o dano sofrido pela vítima e a conduta do companheiro
que transmite a Aids, evidente que há dano moral pelo transtorno psicológico, bem
como o dano material que se verifica pela aquisição de medicamentos necessários para
o tratamento.
Cita-se novamente a posição de Lydia Neves Bastos Telles Nunes que
defende a indenização por dano moral em decorrência da transmissão da Aids: “o
direito à indenização pelo dano moral está ligado ao sofrimento causado pelo
comportamento culposo do cônjuge ou companheiros pela transmissão da Aids. Assim,
é de admitir-se até o dever reparatório na constância da sociedade conjugal ou da união
estável.”404
A décima Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo
já se manifestou pela possibilidade de indenização pela transmissão do vírus da Aids,
verificada a culpa do companheiro ao transmitir a doença à sua convivente. São termos
da ementa:

“Indenização – Responsabilidade civil – Contágio


pelo vírus da AIDS – Culpa de companheiro, em
relação concubinária – Exclusão de propalada culpa
concorrente da vítima – Cumulação de indenizações
por danos moral e material – Admissibilidade – Não
configuração de outorga indenizatória, pelo dano
moral, superior ao pedido – Acerto no deferimento
de indenização por serviços especiais prestados ao
paciente, até o advento de sua morte – Caso em que,
para tanto, precisou a autora deixar seu emprego

403
Lydia Neves Bastos Telles Nunes, Do dano moral e a transmissão da Aids entre cônjuges e entre
companheiros, Direito e responsabilidade, coord. Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Belo
Horizonte: Del Rey, 2002, p. 125.
404
Lydia Neves Bastos Telles Nunes, Do dano moral e a transmissão da Aids entre cônjuges e entre
companheiros, cit., p., 138.
120

fixo, dedicando-se exclusivamente ao companheiro


– Inexistência de excesso no arbitramento da verba
honorária – Recursos não providos.”
(TJSP – 10ª Câm. – Ap. 248.641-1/8 – Rel. Quaglia
Barbosa – j. 23.04.1996).

Há que se cogitar que pode haver excludente de responsabilidade civil,


como a culpa exclusiva da vítima, como anota Rogério Marrone de Castro Sampaio:
“não é difícil imaginar a presença de culpa concorrente – que será levada em
consideração na fixação do montante indenizatório – e mesmo exclusiva da vítima.
Basta imaginar a pessoa que, sabedora dos riscos de contrair a doença, mantém relações
sexuais com pessoas aidéticas.”405

405
Rogério Marrone de Castro Sampaio, Direito civil, cit., p. 48.
121

2. POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO DE DANOS ENTRE


CONVIVENTES

Evidencia-se que tendo um dos conviventes praticado ato ilícito,


causando lesão ao seu companheiro e, esta lesão tanto pode ser patrimonial quanto
moral, grande injustiça seria cometida em se negar a reparação deste ilícito, mormente
se presentes os pressupostos que configurem a responsabilidade civil, nos termos do
artigo 186 do Código Civil.
Não se pode mais usar do argumento de falta de disposição legal
expressa406. Grande injustiça seria cometida. Das decisões citadas observa-se que
quando um convivente através de seu comportamento ilícito prejudica seu companheiro,
quiçá de longos anos, a frustração é muito grande, a humilhação dói muito mais, pois
mais do que desilusão e sofrimento, quando ocorre ato ilícito muitas vezes a relação se
rompe, quebram os laços de afetividade e confiança e, a relação que antes era de amor,
passa a ser de ódio.
Vitor Ugo Oltramari, após analisar as Leis nº 8.971/94 e 9.278/96,
conclui que nenhuma delas prevê sanção para o rompimento culposo da união estável
que gere danos e, especialmente, refere-se o autor, o dano moral. Argumenta que: “o
compromisso amoroso, tanto no casamento como na união estável, é, por natureza,
cheio de riscos. Assim como o casamento é do risco da união estável a possibilidade do
seu rompimento; todavia, dando-se com culpa, causando sofrimento e dano ao consorte,
precisa ser responsabilizado, até como forma de garantir a ética e a moral familiar.”407
Anota Belmiro Pedro Welter que “não se está reclamando pecúnia do
amor, e sim pagamento contra aquele que se aproveitou da relação jurídica que envolvia
o amor para causar graves ofensas delituosas, morais e dor martirizante, justamente
contra aquele que jurou amar, mas, ao contrário, com a sua conduta tóxica, confiscou-

406
Este argumento perde a razão de ser haja vista a previsão constitucional de indenização por dano moral
(CF, art. 5º, X) bem como a regra geral da responsabilidade civil, prevista no Código Civil, artigos 186 e
927. Conforme Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos, A culpa nas relações de família, cit., p.,
79: “Reitere-se que o referido art. 186 consta da Parte Geral do Código Civil, de modo que sua aplicação
estende-se a todos os Livros ou Partes Especiais desse Código, dentre os quais está o Livro do Direito de
Família.”
407
Vitor Ugo Oltramari, O dano moral, cit., págs. 89/90. Defende posição em sentido contrário Maria
Celina Bodin Moraes, Danos morais e relações de família. Afeto, ética, família e o novo Código Civil
Brasileiro – Anais do IV Congresso Brasileiro de direito de família, coord. Rodrigo da Cunha Pereira.
Belo Horizonte: Del Rey – IBDFAM, 2004, págs. 412/414. Segundo a autora, o direito de família possui
remédios próprios que são capazes de solucionar o fim do afeto, do respeito mútuo, da vontade constante
dos conviventes em permanecerem juntos. Estes remédios, para a autora, seriam a separação e,
eventualmente, o divórcio.
122

lhe a honra e a própria dignidade humana, princípio elevado à categoria de fundamento


da República Federativa do Brasil (art. 1º, III, da CF).”408
Sérgio Gischkow Pereira defende tese contrária, referindo à
monetarização do direito de família, entende que há exageros nos pedidos de
indenização por dano moral. Sustenta que: “o sistema jurídico-positivo pátrio sanciona o
infrator com a penosíssima condenação como cônjuge culpado, que, além de bastante
afetar moralmente, implica nas conseqüências gravíssimas de perda do direito à guarda
dos filhos e perda do direito a alimentos! Pois bem, não há que acrescentar a isto, sem
lei explícita, mais uma sanção, qual seja a indenização por dano moral!”409
Na verdade, ressalta-se, não se indeniza a falta de afeto ou de amor, que
pode culminar com a dissolução natural da união estável, como lembra Humberto
Theodoro Júnior, “a tese que sempre logrou prevalecer foi a de que a vida comum do
casal se assenta sobre o amor e quando esse cessa o casamento fracassa e os deveres
conjugais deixam de ser observados. Por essas infrações, as sanções legais são as
previstas no direito de família e não as do direito das obrigações.”410
Nesse sentido, Washington de Barros Monteiro: “nota-se, ainda, que o
desamor, por si só, não gera o direito à indenização, sendo indispensável o
preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil: ato ilícito (violação a dever
conjugal) e dano (moral ou material), conforme o art. 186 do novo Código Civil.”411
Para Fábio Alves Ferreira, tendo um dos companheiros, através de ato
ilícito, provocado lesão patrimonial ou aos direitos da personalidade do seu
companheiro, a parte lesada tem direito à reparação do dano quando presentes os
pressupostos necessários à configuração da responsabilidade extracontratual, “não se
justificando o fato de viverem em união estável, para que tal direito lhes seja negado, o
que, diga-se de passagem, constituem uma afronta ao próprio sentimento de justiça.”412
Conclui-se que qualquer prejuízo experimentado pelos conviventes é
passível de reparação. Assim, presentes os pressupostos da responsabilidade civil, o

408
Belmiro Pedro Welter, Dano moral na separação, divórcio e união estável, cit., Revista dos Tribunais,
v. 775, p.135.
409
Sérgio Gischkow Pereira, O dano moral no direito de família: o perigo dos excessos capazes de
repatrimonializar as relações familiares. Grandes temas da atualidade - Dano moral, coord. Eduardo de
Oliveira Leite. Rio de Janeiro: Forense, 2002, págs. 417/418.
410
Humberto Theodoro Júnior, Dano moral, cit., p.87.
411
Washington de Barros Monteiro, Curso, cit., p. 54.
412
Fábio Alves Ferreira, O reconhecimento da união de fato como entidade familiar e a sua
transformação num casamento não solene, Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris, 2003, págs., 176/177.
123

dano, material ou moral, deverá ser indenizado, de modo que não se promova a injustiça
e a impunidade.
124

CONCLUSÃO

1. A responsabilidade civil como instituto dinâmico pode acompanhar as


mudanças e transformações sociais, flexibilizando seu alcance às necessidades de cada
época. Neste contexto, o direito de família não está imune a tal flexibilização.
Conceitua-se responsabilidade civil como a situação de quem, ao
infringir norma jurídica preexistente, legal ou contratual, gerando dano, material ou
moral, fica responsável pela reparação deste, levando ao stato quo ante.
Partindo do conceito estabelecido, foram analisados os pressupostos da
responsabilidade civil: a conduta do agente que pode ser comissiva ou omissiva, a culpa
ou dolo, o dano sofrido pela vítima e a relação de causalidade entre o dano e a conduta
do agente. Deu-se ênfase ao dano moral como lesão decorrente de ato ilícito que fere os
direitos da personalidade, não necessariamente reduzindo o patrimônio da vítima.
Atualmente o Código Civil prevê expressamente a possibilidade de indenização por
dano exclusivamente moral, no artigo 186. Entretanto, já previa a Constituição Federal
de 1988, artigo 5º, V e X tal possibilidade.
Considerando o fato gerador da responsabilidade civil, foram analisadas
as espécies contratual e extracontratual. A primeira origina-se de contrato estabelecido
entre as partes, está prevista no artigo 389 do Código Civil. A responsabilidade civil
extracontratual ou aquiliana, por sua vez, é baseada na culpa e surge a partir de um
comportamento humano reprovável, vem prevista no artigo 186 do Código Civil.
Verificou-se que a noção de responsabilidade civil está ligada à
reparação de danos, pois, o que se pretende, é sancionar o comportamento reprovável,
ensejador de ato ilícito. Desta forma, eventuais danos gerados pelo desrespeito ao dever
de não lesar direito alheio, serão reparados aplicando-se as regras da responsabilidade
civil.
2. Constatou-se que o conceito de família sofreu profunda modificação,
abandonando a estrutura familiar fundada no poder absoluto do pater famílias para a
formação da família baseada no afeto. A mudança na estrutura familiar permite afirmar
que o casamento não é o único meio de se constituir família, pois a Constituição Federal
admite as entidades familiares constituídas por união estável (artigo 226. §3º) e pela
família monoparental (artigo 226, §4º).
Observou-se que este ambiente de afeto e solidariedade não está imune a
sofrimento e constrangimentos causados por integrante da família em virtude de
125

conduta ilícita, pois desta conduta reprovável resultam danos que quando provocados
por membro da própria família causam dor, mágoa e ressentimentos com maior
intensidade do que se provocados por qualquer estranho à relação familiar.
A fim de explicitar a responsabilidade civil no direito de família, mas sem delongas, de
modo a não fugir do tema proposto, algumas situações foram analisadas. Em princípio,
cuidou-se da responsabilidade civil por fato de outrem, prevista no artigo 932 do Código
Civil, especificamente, incisos I e II que tratam respectivamente da responsabilidade
civil dos pais em relação aos filhos e da responsabilidade civil do tutor e curador pelos
pupilos e curatelados. Funda-se a responsabilidade dos pais em relação aos filhos, no
poder familiar e no dever de cuidado e de vigilância. Com relação ao dever de
vigilância, também se responsabilizam as pessoas que estiverem encarregadas de cuidar
do menor.
Outra situação é a ruptura do noivado ou quebra dos esponsais. Sabe-se
que o noivado embora não disciplinado pelo Código Civil Brasileiro, é compromisso
sério, espontâneo, voluntário que visa o casamento. É uma fase para que os futuros
cônjuges possam melhor se conhecer. Durante o noivado, pode se revelar a não
afinidade entre os noivos e o noivado termina naturalmente. Findo de forma civilizada,
não há que se falar em indenização pelos simples rompimento. Todavia, diante de
rompimento de noivado sério, de modo injusto e humilhante que ocasione danos,
materiais ou morais, há possibilidade de reparação dos prejuízos.
Na separação judicial litigiosa, verificado o ato ilícito e a ocorrência de
danos, também é possível aplicar as regras da responsabilidade civil para reparar o
prejuízo sofrido. O direito de reparação funda-se no artigo 186 do Código Civil.
Ressalta-se que o ato ilícito deverá ser reparado tenha ou não sido o motivo da
separação, vale dizer, o ato ilícito além de ser a causa da separação porque violador de
dever conjugal é ao mesmo tempo causa que enseja a aplicação da responsabilidade
civil.
3. A união estável, antes denominada genericamente de concubinato, há
muito tempo representa uma forma de convivência entre homem e mulher. Na Grécia
antiga há notícia de concubinatos permeando a cultura grega. Em Roma, ao lado do
casamento também se conheceu o concubinato como forma de união. O concubinato a
princípio, foi tolerado pela igreja católica, mas, posteriormente, combatido. No Brasil,
na época das Ordenações, o concubinato não tinha regulamentação, nem proibição. O
que se proibia eram as doações do homem casado à sua concubina.
126

Desta forma, de início, o concubinato visto como relação ilícita e imoral


foi rejeitado, recebendo alguma proteção no campo obrigacional. Lentamente e aos
poucos, com o surgimento de leis esparsas e o avanço jurisprudencial, foram sendo
reconhecidos direitos ao concubinato puro, não adulterino, chegando à consagração
constitucional em 1988. Foi reconhecida então, para efeitos da proteção do Estado, a
entidade familiar formada entre homem e mulher, no artigo 226, §3º. À entidade
familiar reconhecida constitucionalmente, deu-se o nome união estável, inclinando o
abandono, por inadequação, do termo concubinato para expressar a entidade familiar
consagrada pela Carta Magna. Destarte, o termo concubinato hoje, designa as relações
não eventuais entre homem e mulher, impedidos de casar, nos termos do artigo 1.727 do
Código Civil.
Observa-se que não pretendeu o constituinte a equiparação da união
estável com o casamento. Conferiu-se, ademais, à união estável, natureza jurídica de
fato jurídico em sentido restrito, pois sua formação verifica-se com o tempo, presentes
elementos particulares, tais como a notoriedade, a unicidade do vínculo, a fidelidade, a
intenção de viver como se casados fossem, ou seja, a estabilidade da relação solidifica-
se com o passar dos anos.
Para que se configure união estável, necessária a presença de requisitos
essenciais como a diversidade de sexos, a ausência de impedimento matrimonial, a
coabitação, a notoriedade da relação e a lealdade.
Aos companheiros são reconhecidos direitos e deveres, no artigo 1.724
do Código Civil. Tais direitos e deveres foram atribuídos nos mesmos padrões daqueles
conferidos ao casamento. Desta forma, assim como no casamento, na união estável,
haverá possibilidade de responsabilidade civil para reparar danos decorrentes de ilícitos
pela quebra dos deveres entre os conviventes. Da união estável também decorrem
efeitos sociais, pessoais e patrimoniais. É efeito social o fato da união estável constituir
entidade familiar e, assim sendo, merecedora de proteção estatal. São efeitos pessoais,
além dos extraídos do artigo 1.724 do Código Civil, a possibilidade da companheira
usar o nome do companheiro, o que já era regulado pela lei dos registros públicos lei nº
6.015 de 31 de dezembro de 1973, artigo 57, §2º. Dentre os efeitos patrimoniais, ainda
que superficialmente, destacou-se o direito a alimentos, o direito sucessório e o direito
real de habitação.
4. Constatou-se que o simples rompimento da união estável não reclama
reparação de danos, pois não se pretende indenizar a fim do amor ou do afeto. Na
127

verdade, o que se pretende, é a reparação de prejuízos de ordem moral ou patrimonial,


gerados pela prática de ato ilícito.
Salienta-se que o ato ilícito além de fundamentar a indenização, também
pode ser a causa da ruptura da união estável.
Em que pese a divergência com que os Tribunais cuidam da matéria, não
são totalmente insensíveis à matéria, como se verificou nas citadas decisões do Tribunal
de Justiça de São Paulo – 2ª Câm. - Ap. 066.960-4/8 – Rel. Ênio Santarelli Zuliani – j.
23.02.1999 – RT 765/191 e do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, - 11ª Câm. – Ap.
2003.001.35194 - Rel. José Carlos de Figueiredo – j. 11.02.2004.
Dentre as possíveis causas que ensejariam responsabilidade civil,
destacou-se o adultério entre conviventes, o abandono injusto e lesivo e a transmissão
culposa da aids de um convivente ao outro.
Por fim, anota-se que a inexistência de disposição legal expressa acerca
da reparação de danos materiais ou morais ocorridos na constância da união estável, não
deixará desamparado o/a companheiro/a que sofrer com a conduta ilícita do seu
respectivo convivente, pois, presentes os pressupostos caracterizadores da
responsabilidade civil, funda-se a reparação dos danos, materiais ou exclusivamente
morais, no artigo 186 do Código Civil.
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