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Prof. Regente: Prof.

Paulo Otero

❖ Pressupostos terminológicos
O objeto da cadeira de Direito Administrativo I consiste no estudo da
Administração Pública e na sua relação com os particulares, isto é, com os cidadãos
em geral. É, pois, o estudo da função administrativa.
Neste sentido, uma vez que trata da concretização ou não concretização dos
parâmetros constitucionais, a Administração Pública surge ligada com o Direito
Constitucional. Por exemplo, na situação atual de pandemia, passa pelo Governo e
pelo poder executivo uma resposta imediata, onde, esta pode ou não estar de acordo
com os parâmetros constitucionais.
Primeiramente, o objeto da cadeira de Direito Administrativo incide sobre três
grandes partes:
● Fundamentos/bases jurídicas e identidade da Administração Pública;
● Organização administrativa, especialmente como se configura a
Administração Pública no caso português;
● Ordenamento regulador da Administração Pública, isto é, as fontes de direito
administrativo.

Nas fontes de direito administrativo, teremos que identificar a normatividade que


regula a administração e saber como esta aplica essas normas.

❖ Noção de administrar
Na ideia do que consiste administrar, esta é uma atividade humana que se
caracteriza por se desenvolver no âmbito de uma organização, envolvendo a gestão
de recursos e visando a satisfação de interesses.
Por outro lado, na ótica das funções do Estado, podemos dizer que administrar é
um agir sujeito a responsabilidade, isto é, agir em termos delegados do poder pelo
titular dos interesses – vínculo de prevalência funcional.
Assim sendo, de acordo com o professor Paulo Otero, a palavra “administrar”
consiste essencialmente num agir direcionado a um fim ou propósito, isto é,
administrar pressupõe um planeamento e racionalização da afetação de meios a
determinados objetivos.
Com isto, tendo em vista um propósito, não existe autonomia primária na definição
dos meios a alcançar, uma vez que se servem interesses alheios. Há, pois, uma
subordinação a algo, daí a necessidade de se prestar contas, uma vez que existe o
titular dos interesses cuja gestão se encontra em causa.
Ação Rumo Subordinação
Assim sendo, surge o conceito de administração num sentido subjetivo ou
orgânico, onde, na ótica de quem o faz, administrar tem que ver com o sujeito e a
administração. Há, pois, uma administração enquanto estrutura orgânica.
Em suma, uma vez que administrar é uma atividade humana, comportam-se três
elementos estruturantes, nomeadamente:
● Numa administração em sentido objetivo ou material, esta consiste em gerir
os recursos tendo em vista a satisfação de necessidades em função da pessoa
humana;
● Envolvendo a gestão de recursos, administrar compreende cinco tarefas,
nomeadamente planear, obedecendo a um plano, organizar, dispondo de meios
à prossecução dos propósitos definidos, conformar, com uma intervenção sobre
a realidade existente, controlar, fiscalizando o que foi feito ou deveria ter sido
feito, e informar, onde a informação tem de ser condição de eficácia das
decisões tomadas;
● Satisfação de interesses que pertencem a uma pessoa diferente daquele que os
administra.

Nisto, essencialmente no setor público, a administração é vista como um poder e


autoridade do Estado de definir uma situação jurídica unilateralmente.

❖ Administração Pública ≠ Administração Privada


Verificando o critério da autoridade, a Administração Pública envolve o
exercício de uma autoridade, mas, por vezes, esta também age como um particular
sem poderes de autoridade, ou como privados que podem exercer critérios de
autoridade.
O critério da autoridade é, pois, tendencial, mas não permite, de forma exaustiva,
diferenciar a administração pública da administração privada.
No critério do interesse, tendo em conta a origem destes cuja gestão se encontra em
causa, podem comportar-se duas realidades distintas:
● Na administração de interesses privados, falamos em administração privada,
onde estes interesses identificam-se com a satisfação de fins que não encontram
a sua origem imediata num título jurídico do poder público;
● Na administração de interesses públicos, falamos em Administração Pública,
onde esses interesses encontram a sua fonte num título jurídico do poder
público.

Neste sentido, na Administração Pública procuram-se satisfazer necessidades


coletivas que se reconduzem ao bem comum da coletividade – bem comum.
Assim, precisamos de saber quando é que há um interesse privado ou um interesse
público.
Todavia, como vimos, existem interesses públicos que podem ser prosseguidos
por entidades privadas, exercendo poderes administrativos – exercício privado de
interesses e de poderes públicos –, como por exemplo as concessionárias das
autoestradas.
Com isto, nem todas as necessidades coletivas públicas são objeto de prossecução
direta por entidades pública.
Por outro lado, também podem existir interesses privados que, apesar de serem
prosseguidos por entidades privadas ou cooperativas, têm especial relevância e
repercussão social ou política e, por isso, a ordem jurídica reconhece-lhes interesse
público, como por exemplo as misericórdias.

❖ Efeitos jurídicos da distinção entre Administração


Pública e administração privada
Face à distinção entre a Administração Pública e administração privada, acarretam-se
efeitos jurídico significativos, seguindo cinco critérios:
● Critério teleológico de atuação, onde, se o fim é o interesse privado, estamos
perante a administração privada. Se, por outro lado, o fim for um critério baseado no
interesse público, estamos no âmbito da Administração Pública.
Se a Administração Pública agir visando prosseguir interesses privados, a atuação é
ilegal, podendo consubstanciar a prática de crime de corrupção, enquanto a violação de
interesses privados não assume repercussão pública;
● Existência tendencial de dois ordenamentos jurídicos distintos, onde a
administração privada é regulada pelo Direito Privado, e a Administração Pública é
regulada pelo Direito Administrativo/direito público, sendo este um direito regra.

Neste sentido, embora não sendo regra, também pode haver atuação administrativa
pública regulada no direito privado;
● Existência de dois princípios estruturantes distintos, onde, na administração
privada, é lícito tudo aquilo que não é proibido (regra da liberdade) enquanto na
Administração Pública só é lícito aquilo que a lei permite (regra da legalidade ou
de competência);
● Tribunal competente para resolver litígios, onde, em regra, os litígios que
sucedem no âmbito do setor privado, são regulados pelos tribunais comuns,
enquanto que as resoluções dos litígios no âmbito do setor público são reguladas nos
tribunais administrativos e fiscais, embora havendo exceções. Há, pois, uma
distinção de jurisdições;
● Desvalor regra da atuação, onde, em direito privado, um ato contrário à lei, em
regra, é um ato nulo, onde, em direito administrativo, um ato da administração
pública contrário à lei é anulável.

Nesta distinção, há uma ideia da flexibilidade das fronteiras, uma vez que há
movimentos migratórios de necessidades coletivas, ou seja, há necessidades coletivas
que num certo momento podem ser objeto de satisfação pelo setor privado, mas também
pode ocorrer que sejam apenas satisfeitas no âmbito do setor público.
Na flexibilidade das fronteiras, o legislador tem, assim, a liberdade para ir definindo
tais fronteiras, onde esta liberdade é dada pela Constituição da República
Portuguesa.
Há, pois, uma liberdade conformadora do legislador que passa por três elementos
centrais, nomeadamente:
● As opções constitucionais no âmbito da organização económica, onde o Estado
deve ser mais interventivo, limitando o setor privado e a iniciativa económica,
ou ter uma função supletiva, deixando o essencial para o setor privado, de
acordo com o princípio da subsidiariedade;
● As opções políticas, que dependem da luta política-ideológica, o que permite
justificar que um Governo resolva recorrer à nacionalização ou coletivização,
transferindo do setor privado para o setor público – reforço do setor público –,
ou à privatização ou reprivatização– reforço do setor privado;
● Existência de zonas de miscigenação entre necessidades coletivas objeto de
satisfação pública de satisfação privada, como por exemplo no âmbito da
educação social.

Neste sentido, há zonas de concorrência entre a Administração Pública e


administração privada, como por exemplo a área da saúde, onde a existência da saúde
pública não impede o funcionamento da saúde privada.

❖ Administração Pública
Primeiramente, o direito regulador da Administração Pública é o direito
administrativo, que tem que ver com a organização do poder.
Com a Revolução Francesa, no século XIX, surge a igualdade dos cidadãos
perante a lei, dando-se a introdução do princípio da separação de poderes, onde o
executivo surge nas mãos dos revolucionários, mas os tribunais permaneciam fiéis ao
regime absolutista.
Assim sendo, os litígios entre o executivo e os particulares não poderiam ser
julgados pelos tribunais, pois estes iriam colocar termo à vontade do executivo.
Nisto, com a separação de poderes, uma vez que julgar a administração ainda é
julgar, os tribunais não o poderiam fazer, pois iriam violar este princípio da separação
de poderes.
Contudo, houve uma diminuição das garantias dos particulares, mas, por outro
lado, deu-se o fenómeno do conceito de Estado Francês.
Com este órgão da administração, à luz do direito comum, criou-se um conjunto de
especificidades próprias para justificar a atuação da administração. Surge, pois, o
direito administração como direito especialmente regulador do agir da administração.
Assim sendo, o direito administrativo surge historicamente não para garantir a
igualdade dos particulares e da administração, mas para justificar os privilégios da
administração perante os particulares.
Com isto, mesmo quando a Administração Pública age ao abrigo do direito privado,
não o aplica de forma igual ao direito privado que é aplicado pelos particulares. Há,
pois, um direito privado admnistrativizado ou publicizado aplicado pela
Administração Pública.
Neste sentido, a publicização deste direito privado vinculava ao respeito pelos
princípios fundamentais da Constituição, de acordo com o art. 256º da CRP, e às
normas dos direitos fundamentais, de acordo com o art. 18º da CRP.
Assim sendo, o direito privado publicizado não é igual ao direito privado que os
particulares aplicam nas suas relações, onde há quem diga que estamos perante um
terceiro género de direito.
Independentemente do grau de administração de direito privado aplicável pela
Administração Pública, o direito administrativo não é o único direito regulador
desta, mas um dos seus ordenamentos reguladores.
Contudo, apesar do direito administrativo não ter o exclusivo de regulação da
Administração Pública, é, pois, o direito típico e comum desta, sendo aplicável na
ausência de norma.
Assim sendo, não é possível colocar toda a Administração Pública a ser regulada
pelo direito privado, pois existe uma reserva constitucional de direito administrativo.
No século XVI, os traços identitários do direito administrativo português
resumem-se pelo facto de:
● Atribuição de poderes de autoridade da Administração Pública, quando a
prossecução de interesses públicos o exija;
● Reconhecimento de uma posição jurídica de supremacia da Administração
Pública face aos destinatários das suas decisões, sem prejuízo afirmação de
posições jurídicas de vantagem dos cidadãos perante a Administração;
● Sujeição do exercício dos poderes de autoridade da Administração Pública ao
princípio da legalidade, onde só pode agir nos termos em que a lei o permite, e
ao controlo judicial, onde os tribunais podem controlar a legalidade do agir da
administração;
● O estatuto reforçado do poder executivo como órgão superior da
Administração, onde este possui um papel primordial;
● Inserção das instituições administrativas no âmbito do sistema administração
de modelo francês no desenvolvimento do direito administrativo português, sem
prejuízo da influência alemã e da UE.
Assim sendo, uma mudança da matriz identitária do sistema administrativo
poderá encontrar-se ferida de inconstitucionalidade, limitando, pois, a margem de
liberdade conformadora do legislador.

❖ Pressupostos terminológicos
Nos pressupostos terminológicos, temos o vocabulário da Administração Pública
e o vocabulário dos administrados.
No vocabulário funcional da Administração Pública, encontramos três conceitos
centrais:
● Interesse público;
● Vinculação;
● Responsabilidade.

o Interesse público

O interesse público funciona como dimensão teleológica do agir administrativo, que


tem que ver com as necessidades coletivas, isto é, a prossecução do interesse público –
bem comum.
No entanto, este interesse público não será justificável se se colocar em causa a
dignidade humana de pessoas inocentes.
Nisto, este interesse público é o fundamento e o limite do agir da administração,
onde surge o dever de boa administração – princípio da eficiência.
Assim sendo, a prossecução do bem comum, sendo passível de suscitar problemas de
legalidade, nunca deixa de alicerçar uma dimensão ética, de acordo com o art.
266º/1 da CRP, postulando a exigência de uma ética no exercício da atividade
administrativa.
Contudo, pode existir uma pluralidade de interesses públicos antagónicos, isto é,
diversas perspetivas, o que pode gerar conflitualidade entre as diversas entidades.
Assim sendo, com esta conflitualidade, a administração deve ter uma metodologia
decisória na ponderação de interesses, sendo este um critério importante na decisão
administrativa, nomeadamente através de interesse público primário e interesses
públicos secundários.
Com isto, o bem comum exige o respeito e a garantia dos direitos fundamentais
da pessoa humana.
Por isso, configuram-se quatro diferentes interesses públicos, nomeadamente:
▪ Base territorial, como por exemplo a Administração do Estado;
▪ Base associativa, como por exemplo a Ordem dos Advogados;
▪ Institucional, como por exemplo a Universidade de Lisboa;
▪ Transnacional.

o Vinculação

A vinculação encontra o limite normativo da sua organização e agir, onde. neste


critério, a administração está subordinada aos parâmetros normativos de conduta
que definem a competência, nomeadamente:
▪ Fixação da competência das suas estruturas;
▪ O que pode decidir;
▪ Conteúdo material da decisão tomada, isto é, se o objeto da decisão é conforme
à legalidade;
▪ Se o motivo pelo qual se age é conforme àquilo que a lei define para uma dada
situação – critério teleológico de atuação.

Tem, pois, um conjunto de regras e princípios a que deve obedecer, onde podemos
dizer que a vinculação tem diversas matrizes.
Assim sendo, a vinculação pode ser:
● Absoluta ou rígida, caso estejamos diante de normas jurídicas;
● Relativa ou flexível, se tiver como parâmetro subordinante princípios jurídicos.

No entanto, toda a vinculação possui uma margem de liberdade concebida pela lei,
que se traduz na discricionariedade administrativa – margem de autonomia decisória
dentro dos parâmetros da lei –, possibilitando a escolha de uma solução dentro dos
parâmetros da normatividade.
Neste sentido, o agir vinculado pode conduzir a uma dualidade de juízos,
nomeadamente:
● Juízo de legalidade, onde se emite uma apreciação sobre a conformidade
jurídica da conduta administrativa com a juridicidade vinculativa;
● Juízo de mérito, onde o juízo que se faz é sobre a conveniência da respetiva
decisão, pois caso contrário a decisão sofre um juízo de ausência de mérito.

Nisto, o juízo de mérito envolve a violação de normas não jurídicas, apelando à


juridicidade vinculativa do princípio da boa administração.
No caso de mau uso das normas não jurídicas, reconduzível a falta de mérito, poderá
suscitar-se uma ilegalidade indireta, uma vez que se desrespeitou o princípio da boa
administração.
Assim sendo, no desrespeito da vinculação, este pode conduzir a uma situação de
irregularidade ou a uma situação de invalidade da conduta da Administração
Pública, onde esta última pode ser a inconstitucionalidade, ilegalidade ou a ilicitude.
Na inconstitucionalidade, há uma violação direta e imediata de normas da
Constituição formal, enquanto que na ilegalidade há um agir administrativo
desconforme à juridicidade ordinária, que poderá ser uma violação direta da
normativa ou uma violação indireta – fraude à lei.
Já na ilicitude, há uma conduta administrativa intencionalmente negligente e
contrária à juridicidade.
Nisto, apenas a inconstitucionalidade ou ilegalidade podem não reconduzir a uma
situação de ilicitude, ao passo que esta envolve sempre a violação da juridicidade.
Por isso, sendo a invalidade uma conduta antijurídica, esta pode encontrar várias
formas de desvalor jurídico, nomeadamente anulabilidade, com atos violadores de
normas de Direito Administrativo, nulidade, com atos contrários a normas de Direito
privado, e inexistência.
Assim, a principal garantia da vinculação da administração ao direito está no
controlo pelos tribunais, nomeadamente através da possibilidade de a Administração
Pública ser demandada judicialmente, limitando o seu agir e traduzindo uma
manifestação de interdependência entre i poder judicial e o poder administrativo.
Nisto, podemos dizer que:
▪ A juridicidade vinculativa da Administração Pública conhece uma pluralidade
de fontes normativas;
▪ A Administração Pública não se encontra exclusivamente vinculada a normas
jurídicas;
▪ Existem normas extrajurídicas, nomeadamente normas morais, éticas, etc.
o Responsabilidade

A responsabilidade tem que ver com o controlo dos efeitos da conduta


administrativa, isto é, com a obrigação de prestar contas das suas ações, onde, por isso,
é a subordinação da administração ao direito.
Por isso, a responsabilidade liga-se ainda com uma exigência da cidadania, uma
vez que se gerem interesses alheios, onde se deve exigir a quem age em nome da
coletividade, com a decorrência do princípio republicano e democrático.
Há, pois, um mecanismo limitativo da própria autoridade.
Na responsabilidade, a Administração Pública é responsável por aquilo que faz,
traduzindo-se numa responsabilidade por ação, e pelo que deveria ter feito, traduzindo
numa responsabilidade por omissão.
Assim sendo, a responsabilidade administrativa implica:
▪ Controlar a conformidade do agir administrativo face à juridicidade,
aferindo se a Administração Pública adotou uma conduta inválida (ilegalidade,
inconstitucionalidade ou ilicitude);
▪ Controlar o mérito da atuação administrativa em termos de conveniência e
eficiência, averiguando se o princípio da boa administração foi respeitado;
▪ Controlar a legalidade e o mérito do agir administrativo.

Quanto ao objeto da sua incidência, a responsabilidade poderá ser:


▪ Política, envolvendo a apreciação por parte de um órgão representativo ou pela
opinião pública;
▪ Contenciosa, onde certas condutas administrativas podem ser submetidas a
resolução pelos tribunais;
▪ Civil, onde algumas condutas poderão gerar danos e daí determinar a obrigação
de indemnizar;
▪ Criminal, se a sua conduta for tipificada como crime, incorrendo o seu autor
numa pena determinada pelo tribunal;
▪ Disciplinar, onde todo aquele que viola os deveres inerentes ao exercício de
funções públicas pode ser objeto de sanções;
▪ Financeira, dirigindo-se a todos aqueles que gerem património público;
▪ Internacional e/ou europeia, se envolver a violação de compromissos
internacionais ou europeus.
Nisto, a responsabilidade civil da Administração Pública pode visar diferentes
destinatários, nomeadamente ser uma responsabilidade de natureza pessoal, se o
destinatário da responsabilidade é o titular das estruturas da Administração Pública, e
uma responsabilidade de natureza institucional, se o destinatário da responsabilidade
é a entidade coletiva.
Assim sendo, a responsabilidade administrativa pode efetivar-se em diferentes
cenários:
▪ Intra administrativa, se for entre estruturas da administração;
▪ Judicial, perante os tribunais;
▪ Política concentrada, perante órgãos políticos, como por exemplo a
responsabilidade do executivo perante o Parlamento;
▪ Política difusa, perante o eleitorado ou a opinião pública, através do controlo
social, como por exemplo a realização de eleições autárquicas.

Com a efetivação da responsabilidade da Administração Pública, com ações ou


omissões praticadas, visa-se assumir a culpabilidade dos seus autores, tendo diversos
efeitos:
▪ Atos sancionatórios, introduzindo alterações na ordem jurídica, como por
exemplo o pagamento de uma indemnização;
▪ Atos absolutórios, não alterando a ordem jurídica, como por exemplo o
arquivamento de processo disciplinar;
▪ Recomendações, expressando um sentido preferencial de decisão futura, como
por exemplo a Assembleia da República recomendar que o Governo baixe o
valor das taxas hospitalares;
▪ Atos informais, que podem ou não ter conteúdo sancionatório, como por
exemplo a censura ou o aplauso da opinião pública.

Em suma, o direito da Administração Pública:


● É o ordenamento jurídico regulador de interesse público;
● Integra as normas definidoras da vinculação administrativa;
● Comporta a normatividade definidora dos mecanismos de responsabilização do
agir administrativo.

❖ Vocabulário dos particulares como administrados


Apesar de integrados no vocabulário da Administração Pública, os conceitos
anteriores também projetam efeitos juntos dos administrados, uma vez que:
● O interesse público visa as necessidades dos particulares;
● A vinculação limita a conduta da Administração;
● A responsabilidade deve prestar contas da sua conduta junto dos
administrados.

No vocabulário dos particulares/administrados, encontramos três conceitos:

● Relação administrativa, que tem que ver com o vínculo que se estabelece
entre os particulares e a Administração, assumindo relevância administrativa
sempre que envolva a intervenção da Administração Pública – conexão entre
a Administração Pública e o particular;
● Pretensão, que tem que ver com o conteúdo do pedido formulado pelo
particular à Administração ou contra esta, como por exemplo o pedido de
reapreciação do exame;
● Garantias, que são posições jurídicas de vantagem dos particulares face à
Administração, perante ações ou omissões, colocando-a numa posição
jurídica passiva.

Nesta base, no âmbito do funcionamento administrativo, podemos extrair posições


jurídicas subjetivas das normas administrativas, por exemplo, se uma norma disser
que um exame de uma disciplina tem de ter duração máxima de 120 minutos, cada
aluno tem o direito de exigir que nenhum exame ultrapasse esta extensão. Há, pois, uma
subjetivação das normas administrativas.
Nisto, estas posições jurídicas de vantagem dos particulares junto da Administração
Pública, podem ser:
● Posições jurídicas de defesa, que são ações negativas por parte da
Administração;
● Posições jurídicas de proteção, que são ações positivas por parte da
Administração, como por exemplo a atribuição de subsídios aos alunos
carenciados.
o Relação administrativa
No contacto dos particulares com a Administração, podem ocorrer cenários
distintos, nomeadamente:
● Relações gerais de poder, tendo sempre o seu fundamento numa norma,
traduzem a situação em que se encontram todas as pessoas situadas num
determinado território do estado sujeitas à ordem jurídica do mesmo.

Assim, as relações gerais de poder envolvem a titularidade de direitos e o


cumprimento de deveres face à Administração Pública, sendo possível encontrar as
relações gerais de poder alicerçadas na Constituição, baseadas em ato legislativo,
oriundas de regulamento administrativo ou provenientes de contrato, onde estas
duas últimas hipóteses são dotadas de eficácia erga omnes – oponível a uma
pluralidade de sujeitos;
● Relações especiais de poder, onde certos particulares se situam num conjunto
acrescido de vinculações e num posicionamento diferente face aos restantes
cidadãos perante a Administração, como por um exemplo um cidadão que entra
para um serviço militar. Têm, pois, um estatuto especial;
● Relações jurídico-administrativas, que são um vínculo jurídico concreto entre
a Administração e uma determinada pluralidade de particulares, pressupondo a
determinação destes, por via unilateral ou bilateral, sendo estas relações as mais
importantes.

De acordo com o professor Paulo Otero, não é possível reconduzir a análise de todo
o direito administrativo apenas à relação jurídico-administrativa, uma vez que nem
sempre a realidade administrativa se pode reconduzir a uma relação jurídica.
Contudo, alguma doutrina portuguesa tende a responder em sentido afirmativo, como
por exemplo o professor Guilherme Fonseca.
Apesar disto, todas as relações jurídicas são comportas por situações jurídicas.

❖ Tipologia das relações jurídico-administrativas

No que respeita à sua estrutura, as relações jurídico-administrativas podem ser:


● Simples, sendo compostas por um único elemento;
● Complexas, sendo integradas por uma pluralidade de elementos.

Com isto, podem ainda:


● Envolver uma pluralidade de partes, visando a prossecução de interesses
diferenciados;
● Envolver uma pluralidade autónoma de partes integrantes de uma parte,
onde todas se encontram unificadas por um interesse comum;
● Envolver uma contitularidade de posições jurídicas entre várias pessoas
integrantes de uma parte.

Uma vez que nem todas as relações jurídicas envolvem o exercício de poderes de
autoridade por parte da Administração Pública junto dos particulares, podem
verificar-se três diferentes situações:
● Envolver poderes de autoridade por parte da Administração face aos
particulares;
● Envolver situações de paridade ou de igualdade entre a Administração e os
particulares;
● Envolver uma posição de supremacia do particular face à Administração.

Desta forma, as relações jurídicas que envolvem a Administração e os particulares


podem ainda basear-se:
● Num título jurídico válido, onde as relações jurídicas são tituladas validamente,
como um ato unilateral ou um ato bilateral;
● Num título jurídico inválido, que podem consubstanciar um caso de
anulabilidade, de nulidade ou inexistência jurídica;
● Sem título, como por exemplo relações jurídicas baseadas num ato nulo, isto é,
relações resultantes da atribuição de efeitos jurídicos a situações decorrentes de
nulidade ou de inexistência jurídica, relações contratuais de facto, relações
pré-contratuais ou relações resultantes da pós-eficácia.

Na sua projeção temporal, as relações jurídico-administrativas entre a Administração


Pública e os particulares podem ainda assumir a configuração de:
● Relações jurídico-administrativas de execução instantânea, onde estas são
aquelas que esgotam a produção de efeitos num só momento, como por exemplo
uma ordem de expulsão;
● Relações jurídico-administrativas de execução continuada, onde estas são
aquelas que e perdurando no tempo, envolvem um trato sucessivo, como por
exemplo o pagamento de uma reforma.
o Pretensão

Como vimos, a pretensão é um ato de vontade pelo qual se solicita ou se exige


algo à Administração, onde, tanto pode ser dirigida pelo particular à administração,
como pode ser dirigida pelo particular a um tribunal. Envolve, pois, uma conduta ativa
ou omissiva da Administração Pública.
Nisto, traduzindo um poder jurídico de realizar um interesse relevante, pode
haver diferentes tipos prestacionais:
● Prestações de facere, que envolvem a prática de uma ação – prestação de facto
positivo – ou de uma omissão – prestação de facto negativo, reconduzindo à
prestação de atos jurídicos ou materiais;
● Prestações de dare, que se consubstanciam na entrega de uma coisa,
colocando alguém no controlo material de uma coisa corpórea;
● Prestações de pati, que envolvem o suportar de uma conduta do particular.

Assim sendo, a pretensão poderá ser:


● Primária, se for um pedido para uma primeira decisão de um caso, como por
exemplo pedir um subsídio de desemprego;
● Secundária, se incidir sobre uma anterior decisão administrativa, onde se pede a
reapreciação de algo, como por exemplo uma revisão de uma prova escrita.

Contudo, o formular de uma pretensão não significa o direito a uma decisão


favorável por parte do seu destinatário, mas apenas ter uma possibilidade de a obter –
chance de obtenção da pretensão.
Todavia, quem formula um pedido nos termos da lei tem sempre o direito a obter
uma resposta sobre o pedido formulado, ainda que esta não seja conceder aquilo que se
pediu.
❖ Dimensões da pretensão

Uma vez que a pretensão surge como situação jurídica autónoma, esta pode ser:

● Processual ou objetiva, que é o pedido de obter uma decisão, onde esta pode
ser meramente formal ou incidir sobre o mérito da pretensão formulada –
princípio da decisão;
● Material ou substantiva, que se alicerça numa norma impositiva onde se
expressa o dever de a administração decidir favoravelmente, o que significa que
o particular é titular de um direito subjetivo, como por exemplo ter direito a
um subsídio.

No entanto, na pretensão material, também pode acontecer que a norma seja


proibitiva e, neste caso, o decisor está vinculado a decidir desfavoravelmente, onde o
pedido formulado assumirá uma natureza ilegal ou ilícita.
Para além disto, a norma poderá ser ainda permissiva, isto é, concede o poder
discricionário que lhe confere a faculdade de decidir favorável ou desfavoravelmente,
ponderando-a à luz do interesse público e de outros interesses.
Nos seus destinatários, a pretensão formulada pelo particular pode ser dirigida à
Administração ou contra os tribunais, onde nesta última hipótese tem como destinatário
um tribunal. Há, pois, pretensões dirigidas à Administração e aos tribunais contra a
mesma.
Nisto, as pretensões contra a Administração Pública requeridas junto de um tribunal
são garantias dos particulares.
No princípio da separação de poderes, este delimita as esferas de intervenção, uma
vez que a Administração é a destinatária precedente e preferencial das pretensões
concretizadoras na satisfação do bem social. Por exemplo, se eu quiser fazer um pedido
de revisão do meu exame, devo, preferencialmente, formular o pedido à Administração.
Assim sendo, só me poderei dirigir ao tribunal se a Administração negar o direito a
obter uma decisão favorável.
Com isto, podemos dizer que há um princípio de decisão prévia a cargo da
Administração Pública, uma vez os particulares não podem formular pretensões
perante os tribunais sem antes as terem dirigido à Administração Pública.
Nisto, a intervenção judicial é de natureza secundária, controlando a atuação
administrativa por ação ou omissão inválida e, por isso, retira a possibilidade de esta
intervir a partir de um determinado momento.
Por isso, a Constituição limita-se a conferir aos tribunais o poder de dirimir litígios
emergentes de relações jurídico-administrativas.
No princípio do dispositivo, os tribunais só podem agir por impulso do interessado,
isto é, não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que foi
pedido, enquanto no princípio do inquisitório a Administração age por iniciativa
própria, isto é, a decisão final pode ter por objeto coisa diferente do que aquela que
havia sido pedida.
Na formulação de pretensões junto da Administração Pública, os particulares
podem solicitar:
● Posições jurídicas substantivas;
● Posições jurídicas procedimentais.

Na diferença de regime entre as decisões favoráveis a pretensões formuladas


pelos particulares, se o ato for praticado por um tribunal, com o decurso do tempo, a
sua decisão substancia-se em caso julgado – trânsito em julgado –, onde se torna
irrevogável. Pelo contrário, se for um ato da Administração, regra geral, temos a
revogabilidade da decisão, sem prejuízo da responsabilidade civil administrativa pelos
danos daí resultantes.
Contudo, esta revogabilidade possui alguns limites, designadamente quando a
decisão atribui direitos aos particulares.
❖ Natureza jurídica das pretensões administrativas

Como vimos, mesmo que o formular de uma pretensão não implique


necessariamente a uma decisão favorável, o simples formular de uma pretensão pelo
particular é sempre o exercício de um direito subjetivo, onde, por isso, existem
pretensões administrativas:
● Junto dos tribunais, que expressam o direito de acesso aos tribunais e uma
tutela jurisdicional efetiva. São, pois, um direito fundamental;
● Junto da Administração, que são uma manifestação do direito de petição,
como por exemplo o direito de participação na vida pública.

o Garantias

Como vimos, as garantias são formas de os particulares controlarem e


sancionarem a atuação da administração, seja por ação ou omissão, isto é, a ordem
jurídica confere aos particulares meios de reação. São, pois, garantias dos particulares.
Assim sendo, as garantias reforçam o protagonismo dos particulares.
Contudo, nem sempre as garantias dos particulares incidem sobre decisões
desfavoráveis a anteriores pretensões por si formuladas junto da Administração Pública.
Na natureza das garantias, estas podem ter um propósito de defesa de posições
jurídicas dos particulares, isto é, dos seus interesses, mas também uma defesa da
legalidade face a ações ou omissões ilegais da Administração Pública. Há, pois, uma
posição subjetivista e uma posição objetivista, respetivamente.
Assim sendo, as garantias não se limitam a fazer valer os direitos e interesses
protegidos dos particulares.
Para além disto, as garantias podem visar impedir ou evitar a adoção de uma conduta
administrativa ilegal, assumindo uma postura preventiva, ou, tendo-se já consumado a
conduta, as garantias procurarão remover os seus efeitos, desempenhando um papel
repressivo com a aplicação de sanções.
Todavia, os particulares não têm o dever de denunciar as ilegalidades, pois
ninguém pode ser acusado de não denunciar isto mesmo, salvo se a lei impuser esse
dever.
Por outro lado, há um direito à não autodenúncia, o que significa que não se pode
ser obrigado a denunciar uma conduta feita por mim própria. Há, pois, um direito à
inocência.

❖ Tipologia das garantias


● Políticas, onde, partindo do estatuto do particular como cidadão, estas emergem
do texto constitucional e expressam uma dimensão política do controlo
administrativo, como por exemplo o direito de sufrágio, participação política e
na vida política, iniciativa popular, etc.;
● Administrativas ou graciosas, que são meios ao dispor dos particulares para
junto da Administração Pública acionar o controlo da sua conduta, onde se dá a
chance de esta corrigir o seu agir, através de:
✔ Garantias petitórias, que visam dirigir um pedido à Administração para
formular um pedido para uma primeira decisão ou reapreciação de uma
anterior decisão – pretensão primária;
✔ Garantias impugnatórias, quando se visa impugnar a legalidade ou o
mérito de uma anterior conduta administrativa perante o próprio autor ou
perante um órgão diferente daquele que o praticou.
Nas garantias impugnatórias, quando se impugna perante o próprio autor, estamos
perante uma reclamação, ao invés, quando se impugna perante um órgão diferente,
estamos perante um recurso administrativo ou gracioso.
No recurso administrativo ou gracioso, este pode assumir três configurações,
nomeadamente ser interposto de uma decisão perante o superior hierárquico do
respetivo autor – recurso hierárquico –, impugnar a decisão perante o órgão titular
relativamente ao seu autor – recurso tutelar –, ou um recurso hierárquico impróprio
para as situações que não há hierárquica nem tutela.
Assim sendo, em regra, no direito português, há reclamação de todos os atos,
enquanto só há recurso quando existe hierarquia;
✔ Queixa ao Provedor de Justiça, onde apenas se dirigem recomendações às
autoridades administrativas competentes. Esta é, pois, uma garantia dos
particulares com fundamento na Constituição.

No formular da queixa ao Provedor de Justiça, há um direito contra uma atuação


ou omissão de uma autoridade administrativa, onde este Provedor aprecia esta
queixa e, se der razão ao particular, apenas formula uma recomendação ao órgão da
administração. Assim sendo, o Provedor de Justiça não tem poder decisório;
● Judiciais, que os particulares desencadeiam junto dos tribunais contra ações ou
omissões da administração, onde compete aos tribunais administrativos e
judiciais a resolução definitiva dos litígios.

Contudo, os tribunais podem ainda decretar a adoção de providências cautelares e


a execução da sentença, onde, apesar disto, os tribunais não se podem substituir ao
mérito da atuação da administração, sob pena de se violar o princípio da separação de
poderes.
Na execução da sentença, se a administração não cumprir a legalidade, o particular
pode ir a tribunal questionar a Administração, podendo anular-se a decisão
administrativa se a sua conduta for ilegal.
Contudo, a Administração pode não executar licitamente quando há grave prejuízo
para o interesse público ou impossibilidade jurídica – casos de inexecução lícita das
sentenças dos tribunais;
● Internacionais e europeias, onde, tendo a Administração Pública a seu cargo a
prossecução de interesses transnacionais, estas são garantias que os
particulares têm internacionalmente ou no âmbito da União Europeia, como por
exemplo a Convenção Europeia dos Direitos Humanos e a Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia.

Desta forma, as garantias internacionais e europeias podem assumir a natureza:


▪ Substantiva, revelando direitos materiais dos cidadãos, que servem de pautas
limitativas da conduta da Administração Pública;
▪ Procedimental, de onde emerge o direito a uma boa administração e a um
fenómeno de administrativização do direito;
▪ Contenciosa, como por exemplo permitindo aos particulares o acesso ao
Tribunal Europeu dos Direitos do Homem;
▪ Administrativa, com o reconhecimento de um direito de petição;
▪ Política, como por exemplo o direito de eleger e de ser eleito.

❖ Pressupostos metodológicos do Direito Administrativo


no século XXI
Nos pressupostos metodológicos, estes são pensados para situações de exceção, com
uma revolução administrativa, que é a crise do Estado administrativo, colocando em
causa as grandes certezas dos últimos 20 anos, onde a crise provocada pela Covid-19
veio agravar os traços desta revolução.
Há, pois, a necessidade de fundamentos para a revolução administrativa,
nomeadamente:
● Emergência administrativa;
● Mais poderes ao poder executivo;
● Diminuição dos direitos dos cidadãos em nome da necessidade.

Assim sendo, os traços da revolução administrativa resumem-se em quatro ideias,


nomeadamente:
● Desequilíbrio da relação de autoridade e liberdade, onde nos últimos 20 anos
se regista uma prevalência da autoridade em vários domínios, como por
exemplo a crise decorrente do ataque às torres gémeas em 2001, que colocou o
tema da segurança coletiva como um entrave à liberdade. Há, pois, uma
intervenção da Administração no sentido de limitar a liberdade.
Nisto, surge a necessidade de haver um equilíbrio entre a liberdade e a
autoridade, como forma de limitar a liberdade individual pela autoridade ao serviço do
bem comum, garantindo a liberdade de todos;
● Conflituosidade dentro da Administração Pública, provocada pelo pluralismo
de interesses, o que faz com que as decisões administrativas não sejam
consensuais.

Nisto, num segundo momento, esta conflituosidade administrativa para uma


conflituosidade judicial, onde os tribunais são chamados a controlar litígios que
decorrem no âmbito de decisões administrativas;
● Crise nas fontes do Direito Administrativo e em geral, onde existe um direito
cada vez mais de princípios do que de regras, isto é, um direito de incertezas do
que de certezas. Tem, pois, vários conceitos indeterminados, suscitando
dúvidas sobre o seu sentido.

Em última instância, também neste caso os tribunais poderão intervir para


definir o sentido das normas e ajuizar a validade da atuação administrativa;
● Crise da representação política parlamentar, onde, apesar do modelo
constitucional estar centrado no Parlamento, a vida administrativa dá o
protagonismo ao executivo e ao Governo, ganhando legitimidade
democrática, como por exemplo o que acontece com a crise da pandemia,
nomeadamente pelo facto de as medidas de combate à pandemia são tomadas
pelo Governo.

❖ O processo de revolução administrativa em curso


No século XXI, a limitação do agir administrativo torna-se uma questão
recorrente, onde, com a rutura do modelo administrativo tradicional, os momentos
históricos cruciais são:
● Ataque às torres gémeas em Nova Iorque a 11 de setembro de 2001, onde a
relevância do valor da segurança vai sacrificar direitos e liberdades a favor do
Estado e, consequentemente, surge uma antecipada legitimação da
intervenção administrativa;
● Crise financeira de setembro de 2008, que originou uma crise económica, vem
demonstrar as limitações financeiras dos Estados, impondo maior rigor
orçamental e a demonstrar existência de uma Administração Pública “inimiga”
dos direitos sociais, isto é, estes direitos têm limites financeiros.

Nisto, obriga-se a repensar as áreas materiais de atuação administrativa;


● Progressiva limitação da soberania do Estado, tendo como objetivo
globalizar, internacionalizar e europeizar, mas, por exemplo, a crise da
pandemia veio reforçar o movimento em sentido contrário desta limitação, uma
vez que o Estado é o melhor garante do interesse público nacional e dos
direitos fundamentais dos cidadãos. Há, pois, uma revalorização do papel do
Estado e da sua administração.

Assim sendo, sem Estado não garantida efetiva da liberdade na medida em que,
sem liberdade, nenhuma autoridade do Estado se mostra legítima.
Com isto, assiste-se ao surgimento de um novo modelo de Administração
Pública.
Nos efeitos da revolução administrativa, por outro lado, continua a existir uma
crise financeira, nomeadamente na sustentabilidade das prestações sociais e na crise de
receitas de todos os Estados, devido à crise da Covid-19.
Assim sendo, a curso prazo, crise económica gera uma crise financeira e, por isso
mesmo, por exemplo, a crise de 2008 pode verificar-se numa dimensão muito maior, se
acompanhar uma crise sanitária, económica e social.
Nisto, a progressiva internacionalização e europeização das matérias leva a que
se tenha assistido a uma expropriação dos Estados e das administrações estaduais,
onde cada vez mais existem Estados com políticas protecionistas e nacionalistas, e,
assim, mais uma vez, a crise da Covid-19 vem acentuar estas tendências.
Nesta base, assistem-se ainda a Constituições de natureza compromissória, que
refletem um pluralismo de interesses e contra interesses e, por isso mesmo, a
consequência é a de uma Administração constantemente questionada devido à
constitucionalidade do seu agir.
Assim sendo, em termos constitucionais, a Administração é frequentemente
questionada.

❖ Sustentabilidade: condicionante ou pressuposto da


revolução?
Esta sustentabilidade tem que ver com a questão de se atualmente podemos usar
os recursos naturais e económicos de forma ilimitada, comprometendo as gerações
futuras.
Nisto, podemos encontrar três tipos de administração, a que correspondem outros
modelos de intervenção administrativa:
● Conservadora, em que o presente surge condicionado pelo passado;
● Predadora, em que o presente consome o futuro e, por conseguinte, a
Administração não tem em consideração as gerações futuras;
● Sustentável, em que o presente é ditado pelo futuro, ponderando-se os
efeitos e as repercussões das decisões nas gerações futuras, sendo este o
modelo que a Constituição impõe.

Assim sendo, surge o princípio do desenvolvimento sustentável, que tem projeção


em termos ambientais ecológicos, sociais e económico-financeiros. A sustentabilidade
é, pois, uma condicionante da ação administrativa, numa perspetiva de
internacionalização desta sustentabilidade.
Com isto, a sustentabilidade consubstancia um desenvolvimento que satisfaz as
necessidades da geração atual, como por exemplo com o aproveitamento racional dos
recursos naturais.
Nisto, esta sustentabilidade tem ainda uma projeção
político-constitucionalidade, onde as gerações presentes não podem alienar o futuro
das próximas gerações. Por exemplo, no sistema de segurança social, as reformas não
podem ser de tal forma elevadas que conduzam à rutura do sistema de financiamento da
segurança social.
Nisto, é necessária uma gestão racional dos recursos tendo em conta o futuro.
Nos défices orçamentais excessivos, estes envolvem o recurso ao crédito, o que
significa que o Estado se vai endividar nos dias de hoje, mas, no entanto, vai ter de
pagar amanhã e, por isso, serão as gerações futuras a pagar.
Com isto, as gerações do presente hipotecarão o futuro das próximas gerações,
em benefício da satisfação dos direitos sociais que criaram.
Contudo, há que notar que este modelo também possui resistências
constitucionais, que têm que ver com a ideia da solidariedade e da sustentabilidade,
onde é necessário encontrar um ponto de equilíbrio entre estas. Por outro lado, a
sustentabilidade tem que ver com o princípio democrático, no sentido em que há
limites às opções democráticas em sede de sustentabilidade.
Assim sendo, a sustentabilidade exige um reajustamento do papel do Estado e a
satisfação das necessidades coletivas a cargo da Administração Pública.

❖ Revolução administrativa em estado de emergência


financeira permanente?
Esta ideia de revolução administrativa em estado de emergência financeira
permanente surge com a crise financeira de 2008 decorrente da dívida dos Estados, com
o risco de bancarrota e com a ideia de que o Estado não pode conduzir a uma
situação de colapso financeiro do mesmo.
Nisto, surge a ideia de um estado de necessidade económico-financeiro, onde este
tem que ver com a factualidade dos factos a condicionarem a operabilidade das normas
da Constituição onde, mais uma vez, o Covid-19 veio demonstrar que atualmente há um
princípio de necessidade não escrito, que justifica aquilo que normalmente seria
inconstitucionalidade, acentuando a crise financeira com o estado de emergência
financeira.
Assim sendo, de acordo com o professor Paulo Otero, isto permite suscitar à ideia
de uma Constituição flexível que se adapte às circunstâncias, pelo facto de:
● Prevê que em estado de sítio ou de emergência, a Constituição se adapte e, por
isso, podemos falar numa legalidade alternativa incorporada na
Constituição;
● É possível uma legalidade alternativa não incorporada expressamente na
Constituição escrita, que é o apelo ao princípio da necessidade como fonte
autónoma justificativa da atuação do poder.

Nisto, podemos concluir que, da mesma forma que o Direito Constitucional muda,
também o mesmo pode acontecer com o Direito Administrativo.
Nesta base, com o estado de necessidade económico-financeiro, torna-se necessário
adotar algumas medidas, nomeadamente:
● Ponderar a redução de remunerações resultantes da prestação de trabalho
público;
● Repensar os montantes a pagar pelo Estado no âmbito das indemnizações
contratuais.

❖ Imperialismo administrativo
No imperialismo administrativo, há uma vocação imperialista evidente do Direito
Administrativo, nomeadamente através do número de atos jurídicos publicados no
Diário da República, onde, muito do Direito da União Europeia, é, materialmente,
Direito Administrativo.
Com isto, verifica-se que o sucesso ou insucesso do modelo constitucional de
bem-estar está nas mãos da Administração Pública, pois se houver uma garantia do
direito à saúde, se não existirem hospitais públicos, de nada servirá existirem estes
direitos.
Nesta base, que tem a responsabilidade de decisão sobre o equipamento e construção
dos hospitais, etc. é a Administração Pública e, por isso, a Constituição encontra-se
“refém” à Administração Pública.
Por outro lado, também se verifica uma projeção do Direito Administrativo ao nível
da terminologia jurídica, onde, apesar do Direito Civil ser o direito comum, há
conceitos legais e pré-constitucionais com projeção no Direito Administrativo, o
que significa que são próprios deste tipo de direito e que, por isso, não são transponíveis
ao Direito Civil e vice-versa. Há, pois, conceitos que têm fundamento na lei e outros
na Constituição.
Assim sendo, tem-se verificado uma intervenção legislativa na definição de
conceitos administrativos.
Na qualificação de conceitos administrativos, pode acontecer que haja realidades
que têm um sentido em Portugal, mas, que, no entanto, podem ter uma terminologia
idêntica noutros Estados, correspondendo a conceitos diferentes em Portugal.
Nesta base, na questão terminológica, num contexto administrativo globalizado,
internacionalizado e europeizado, leva a que o direito estrangeiro e o direito da
União Europeia utilizem certos conceitos e, por isso, torna-se necessário verificar se
esses conceitos correspondem aos conceitos idênticos no direito português.
Nisto, dentro do Direito Administrativo existem elementos que permitem verificar
que por este direito passa uma identidade cultural de um Estado, ou seja, uma
identidade cultural administrativa, onde o sistema administrativo é parte do
património cultural e imaterial de um povo, com três particularidades:
● A Constituição portuguesa é elemento que permite identificar os traços
caracterizadores desta identidade imaterial que o Direito Administrativo
consubstancia em termos culturais;
● O respeito e defesa da língua e dos traços identificativos do sistema
administrativo português é algo que passa pela Constituição;
● Existência de limites que excluem uma colonização científica externa, isto é,
se da Constituição resultam traços identitários do Direito administrativo como
elemento integrante da identidade cultural nacional, significa que existem
limites à entrada científica de ideias estrangeiras para serem integradas no
sistema administrativo português.

❖ Repercussão dos pressupostos no ensino do Direito


Administrativo
Em termos de pressupostos metodológicos e terminológicos, estes repercutem-se no
ensino do Direito Administrativo pelo facto de este ser um dos ramos de direito mais
importantes, uma vez que exerce uma função orientadora.

❖ Fundamentos da Administração Pública


Dentro dos fundamentos da Administração Pública, englobam-se as bases jurídica
da mesma e os instrumentos conceptuais.
Como vimos, existem três acessões diferentes de Administração Pública,
nomeadamente e, por isso, existe uma polissemia da Administração Pública:
● Ser uma atividade humana, isto é, a Administração Pública pode aparecer
como atuação em que o agir está subordinado às opções constitucionais,
legislativas e ao controlo judicial.

Nisto, existe uma subordinação administrativa à vontade geral;


● Ser uma organização, que tem a ver com o sujeito da atividade administrativa e
como este decide onde, por isso, pode haver estruturas decisórias normalmente
de matriz pública, mas que são Administração Pública sob forma jurídica
privada.

Nisto, as estruturas orgânicas encarregam-se de gerir os recursos tendentes à


satisfação dos interesses – Administração em sentido subjetivo ou orgânico;
● Ser uma autoridade, tendo fundamentalmente duas prerrogativas:
✔ Autotutela declarativa, que é o poder que a Administração tem de definir
unilateralmente o direito no caso concreto, não precisando do consentimento
do destinatário para definir a sua posição jurídica. Têm, pois, meios legais
que lhes permitem definir o direito aplicável às situações concretas, tal
como os tribunais têm;
✔ Autotutela executiva, em que, caso o particular não obedeça à determinação
unilateral do direito no seu caso, a Administração pode recorrer à força
para impor a sua vontade, independentemente da intervenção judicial –
privilégio de execução prévia.

❖ Plasticidade das necessidades a cargo da Administração


Nas necessidades coletivas a cargo da Administração, pode haver um balanço
pendular de migrações de necessidades coletivas determinado por determinações
políticas, o que traduz uma dependência política da Administração Pública.
Nisto, a Constituição limita tudo aquilo não pode ser nacionalizado ou
privatizado e, por isso, possui um papel de reserva da própria Administração.
Nesta base, a satisfação das necessidades coletivas não é apenas um poder
político ou constitucional, podendo, pois, ser um poder de natureza financeira, onde,
em regra, o Estado tem procurado reduzir as despesas para controlar os défices
excessivos.
Nisto, por efeito da crise financeiro, o Estado encontra-se em transição para um
modelo de Estado regulador.

❖ Tarefas da Administração
Nas tarefas da Administração, visando a satisfação de necessidades coletivas, estas
expressam a atualidade de uma Administração ampla no exercício das suas funções,
nomeadamente:
● Gerir informação, com meios humanos e técnicos especializados, a
Administração recolhe e trata a informação, sendo esta um elemento nuclear da
decisão. Quem tem a informação, tem, pois, o poder efeito de decisão.

Nisto, a multiplicidade de fontes de informação fez aumentar o protagonismo das


estruturas administrativas;
● Previsão e antecipação de riscos, que é visível sobretudo no caso dos atentados
terroristas, onde a Administração não pode aguardar que se efetive um atentado
sem nada fazer.

Por isso, a Administração Pública tem de prever e antecipar riscos das gerações
presentes e futuras, influenciando condutas dos cidadãos;
● Regulação ordenadora, que pode ser unilateral ou bilateral, concreta ou
normativa, onde a Administração prepara medidas de natureza exta
administrativas, fornecendo o material técnico que permite a melhor decisão no
âmbito político/legislativo;
● Execução de decisões anteriores, onde, sendo a Administração uma expressão
executiva da vontade do legislador, executa a Constituição, a lei, sentenças
judiciais, etc., tendo, pois, um papel metodologicamente ativo;
● Controlo da atuação, onde se a Administração desenvolve uma tarefa de
fiscalização da sua própria conduta e dos privados que exercem ou não
funções públicas, como por exemplo se os restaurantes estão a respeitar as
regras impostas pela DGS.

❖ Função administrativa e Administração Pública


Nesta matéria, existe uma reserva de função administrativa, o que significa que
esta não pode ser consumida pela função legislativa ou judicial, pois as funções do
Estado compreendem a existência de uma função administrativa.
Neste sentido, a função administrativa tem de respeitar a lei e a Constituição e as
decisões dos tribunais prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades.
Nisto, esta função administrativa traduz uma função constituída do Estado e,
por isso, é garantida pela Constituição ao abrigo do princípio da separação de
poderes, havendo uma reserva desta função enquanto espaço exclusivo de atuação do
poder administrativo. Há, pois, uma reserva perante o legislador e os tribunais, pois caso
contrário, haverá violação do princípio da separação de poderes.
Por isso mesmo, a função administrava não fica limitada à prática de atos
administrativos, podendo ter uma componente não jurídica expressa numa atuação
técnica ou política, como por exemplo a definição de regras a que deve obedecer a
construção de uma barragem.
Por outro lado, há uma flexibilidade na definição do espaço material da função
administrativa, onde há zonas que podem ser mais ou menos amplas dependendo da
intervenção da lei.

❖ Conceito de função administrativa


No conceito de função administrativa, há vários critérios possíveis para a definir,
onde, de acordo com o professor Paulo Otero, aquele que melhor traduz a realidade é o
critério residual, o que significa que a função administrativa é toda a atividade
pública que não seja a função legislativa, política e judicial.
Por outro lado, com o fundamento da Constituição, lei e sentença, esta função visa a
prossecução do bem comum identificada com o bem-estar da coletividade, que se
traduz nas ideias de justiça, segurança e liberdade.
Assim sendo, a função administrativa define-se em cinco traços:
● Ordenar e disciplinar a vida social, nomeadamente em termos económicos e
financeiros;
● Garantir a ordem e a segurança pública, nomeadamente com a polícia e a
defesa nacional;
● Realizar as prestações sociais, nomeadamente o subsídio de desemprego;
● Obter recursos financeiros, nomeadamente a cobrança de impostos;
● Gerir os meios humanos e materiais, que permitam a realização das anteriores
tarefas, nomeadamente a função pública.

Tendo a prática de atos jurídicos e de operações materiais, toda a função


administrativa tem na sua base o princípio da continuidade dos serviços públicos, o
que significa que a Administração Pública nunca pode parar, pois a lei e a Constituição
assim o impõem.
Por exemplo, mesmo com o exercício legítimo do direito à greve pelos
trabalhadores, tem de ser sempre garantida a realização do mínimo para as necessidades
coletivas, uma vez que os estabelecimentos não podem ficar paralisados.
❖ Função administrativa e poder administrativo:
interações

Na autonomia do poder administrativo, este possui, como vimos, uma parcela da


soberania do Estado, apesar de subordinado à lei e à Constituição.
Nisto, o poder administrativo goza de uma legitimidade constitucional
semelhante aos restantes poderes do Estado.
Contudo, poderá ser ainda uma função praeter legem, onde pode ir para além da
lei escrita dentro dos limites definidos pela Constituição.
Por outro lado, as opções políticas da lei e que não passam pela lei condicionam a
decisão administrativa, como por exemplo o programa do Governo, o que significa que
podem existir condicionantes não legislativas à função administrativa.
Nisto, em caso de conflito entre uma decisão administrativa e uma decisão judicial,
esta última irá prevalecer, nos termos do art. 205º/2 da CRP, com o princípio
constitucional da prevalência das decisões dos tribunais face a outras decisões.
Nesta base, uma decisão administrativa que contrarie uma decisão judicial é, pois,
uma decisão nula, uma vez que viola o princípio da separação de poderes – usurpação
de poderes.
Contudo, a autonomia do poder administrativo é ainda visível no facto de os atos
produzidos por si produzem efeitos sem dependência de outros sujeitos.

❖ Suavização dos poderes administrativos de autoridade


Como vimos, aquilo que caracteriza a função administrativa são as prerrogativas da
autoridade, mas, no entanto, tem-se assistido a uma suavização dos poderes
administrativos, nomeadamente através da:
● Instituição progressiva de mecanismos de colaboração entre diversas
entidades públicas e privadas, onde há uma relevância do contrato
administrativo relativamente à imposição unilateral de uma decisão.

❖ Normas de competência e organização interna do poder


administrativo
Em Direito Administrativo, as normas de competência possuem um grande valor,
uma vez que o que caracteriza a atuação da administração privada é o princípio da
liberdade, onde, na Administração Pública a regra é inversa, como vimos.
Assim, há uma importância da lei sobre aquilo que se pode ou não fazer, onde,
por isso, as normas de competência definem os termos em que a Administração
prossegue o interesse público e as bases da validade da sua atuação.
Nisto, existe uma tipologia de normas de competência, nomeadamente:
● Normas que conferem competência ou normas de ação, que possuem quatro
configurações diferentes, atribuem poderes de intervenção decisória à
Administração Pública;
● Normas que disciplinam o exercício da competência, que regulam os termos
como os poderes conferidos à Administração Pública se expressam através da
prática de atos jurídicos e materiais;
● Normas que regulam as normas de competência, que são normas sobre
normas, que têm por objeto disciplinar as próprias normas de competência. Por
exemplo, normas sobre como é que se integram as lacunas das normas de
competência. São, pois, normas em segundo grau.

o Normas que conferem competência


● Normas que definem tarefas ou incumbências públicas, traçando a fronteira
entre o que é a atuação pública e a atuação privada, pois se a atuação
administrativa invadir o hemisfério que não se compete, segundo o princípio da
subsidiariedade, estamos perante a violação de direitos fundamentais.

Assim sendo, a Administração não pode sair do seu hemisfério sem uma norma
legal que o habilite;
● Normas de divisão ou separação de funções, onde, no domínio público,
procede-se à distribuição da satisfação das necessidades pelos vários poderes
e, por isso, existem decisões que são da competência do poder legislativo, do
poder judicial e do poder administrativo, onde há, pois, o princípio da
separação de poderes.
Também aqui, se a Administração Pública agir sobre a esfera do poder legislativo ou
do poder judicial, a atuação administração viola esta separação de poderes, onde os atos
estão aferidos de usurpação de poderes e, por isso, são nulos;
● Normas de atribuições, onde, dentro do poder administrativo, são normas que
definem os fins e os interesses que estão a cargo da entidade pública, onde cada
uma destas possui fins próprios.

Neste tipo de normas, se a pessoa coletiva A decidir sobre os fins da pessoa coletiva
B, o ato está aferido de incompetência absoluta e nulidade, que onde uma entidade
pública administrativa invade a esfera de atribuições de uma outra entidade.
● Normas de competência, onde se definem os poderes que cada órgão dentro da
pessoa coletiva tem para a prossecução dos fins próprios, por exemplo, no
município de Lisboa definem-se os poderes da câmara municipal.

Contudo, se um órgão x praticar um ato da competência do órgão y da mesma


entidade pública, o ato está aferido de incompetência relativa, que é vício que se
traduz na atuação de um órgão sobre a esfera de competência outro órgão da mesma
pessoa coletiva, com a particularidade de o ato ser anulável.
Apesar disto, estas normas poderão ser potestativas, conferindo poderes para a
Administração Pública fazer alterações na ordem jurídica, ou não potestativas, onde se
outorgam poderes cujas alterações não dependem apenas da Administração Pública,
mas também da cooperação de outros sujeitos.
o Normas que disciplinam o exercício da competência
● Normas que fixam os princípios gerais a que obedece o exercício da
competência, que se liga com o respeito pela legalidade, irrenunciabilidade,
inconsumibilidade e delimitação da competência;
● Normas que fixam os pressupostos do exercício da competência, onde se
estabelecem requisitos para que a competência possa ser exercida, como por
exemplo, o órgão x pode tomar providência em casa de estado de necessidade
administrativa, pois caso contrário não o poderá fazer.

Assim, a ilegalidade de agir sem que se verifiquem os pressupostos do exercício da


competência pode ter como causa o erro, se alguém pensar que se está num caso de
emergência para agir. Age-se, pois, em erro sobre os pressupostos da competência;
● Normas que determinam os fins da competência, onde a motivação das
decisões tem de corresponder ao fim que levou a conferir essa competência, por
exemplo, se alguém tem competência para aplicar uma multa a um carro
mal-estacionado, essa competência tem como fim cumprir as regras do Código
de estrada.

Contudo, se em vez de se passar uma multa para sancionar o desrespeito pelas regras
de trânsito, se se multar para obter mais receitas para a Administração, este é um fim
que nada tem que ver com a competência que a lei atribuiu. Há, pois, desvio de
poder.
● Normas que estabelecem limites materiais ao exercício da competência,
impondo requisitos ao objeto de decisão a adotar, por exemplo, alguém pode
conceder um subsídio a um grupo teatral até um montante de 1000€ nos termos
da lei, mas, se em vez disso conceder 2000€, ultrapassa-se o limite material que
a lei impõe. Há, pois, uma violação de lei, onde esta determina a nulidade ou
anulabilidade;
● Normas que prescrevem o procedimento e a forma de exercício da
competência, onde se tem de saber qual a forma exterior da decisão e, por isso,
estas são regras de natureza formal.

Neste caso, a sua violação determina o vício de forma.

o Normas que regulam as normas de competência


● Normas que regulam a produção de normas de competência, isto é, quem as
produz;
● Normas que disciplinam as relações entre as diversas fontes reveladoras de
normas de competência;
● Normas que resolvem conflitos de normas de competência;
● Normas que definem critérios de interpretação de normas de competência;
● Normas que incidem sobre a integração de lacunas de normas de
competência.

❖ Formas e meios da atividade administrativa


Nesta base, existem várias formas de agir da Administração, nomeadamente:
● Agir sob formas jurídicas ou não jurídicas de atividade, por exemplo, dar
uma aula é uma forma não jurídica de agir;
● Agir sob a definição das situações jurídicas, utilizando o Direito Público ou
o Direito Privado, onde, quando utiliza o primeiro Direito, fala-se num direito
admnistrativizado ou publicizado;
● Agir sob forma unilateral ou bilateral, através dos atos administrativos ou
regulamentos administrativos, respetivamente;
● Nas formas não jurídicas, a Administração pode pretender transformar a
realidade material, como por exemplo construir uma barragem;
● Atuação de definição de linhas políticas do agir administrativo, como por
exemplo os atos políticos da Administração;
● Desenvolver condutas informais, que, não a contrariando, vai para além da lei
– agir praeter legem;
● Não tem em vista o respeito pelas regras rígidas, optando por regras flexíveis
em termos procedimentais.

❖ Revolução dos meios do agir administrativo


Na revolução dos meios do agir administrativo, o exercício da atividade
administrativa, assuma ou não forma jurídica, salientam-se quatro mobilizações de
meios, nomeadamente:
● Meios humanos, uma vez que a instituição não pode prescindir das pessoas que
a fazem funcionar, onde se verifica um regime de função pública rígido aberto
ao contrato individual de trabalho na atuação administrativa;
● Meios materiais, onde, numa Administração com um forte suporte patrimonial
e financeiro, pode verificar-se uma alienação deste património, verificando-se
mais receitas para o orçamento para fazer face a despesas acrescidas, e uma
visão neoliberal, onde o Estado não deve ter um peso excessivo no âmbito da
atuação económica;
● Meios organizativos, onde alguns serviços administrativos têm sido
privatizados e nacionalizados, verificando-se a substituição de uma
Administração presencial por uma Administração por via eletrónica, como
por exemplo a transição de aulas presenciais para aulas através de mecanismos
online;
● Meios privados, onde a Administração recorre a entidades privadas para
obter a prestação de serviços e produção de meios.

Assim sendo, esta revolução dos meios do agir administração tem-se verificado
devido a alguns fatores, nomeadamente o fator financeiro, que faz reequacionar as
atividades que o Estado deve prestar, com recurso a meios privados, como forma de
reduzir custos e aumentar as receitas.

❖ Tipologia da Administração Pública


Na tipologia da Administração Pública, como sabemos, existem várias
Administrações Públicas, onde esta pluralidade se pode confirmar em várias acessões
diferentes, nomeadamente:
● Direito regulador da Administração Pública, que traduz o grau de adesão ou
conformação administrativa ao ordenamento jurídico que visa disciplinar;
● Substrato organizativo da Administração Pública, que é reconduzido aos
elementos que se encontram subjacentes ao seu modelo de organização;
● Atividade desenvolvida, que se identifica com as áreas a cargo de prossecução
pelas estruturas administrativas;
● Procedimento adotado, que se identifica com o modelo de formas e
formalidades conducentes ao exercício da atividade administrativa;
● Efeitos produzidos, que revela os resultados do agir administrativo.

Contudo, esta tipologia não é exaustiva, onde, por isso, pode haver uma
complementaridade e sobreposição entre as várias classificações.

o Direito regulador da Administração Pública


● Administração que age ao abrigo do Direito Privado, onde, sem a
prerrogativa de exercer poderes de autoridade, tem a sua atividade disciplinada
pelo Direito Comum e Direito comum, e ao abrigo do Direito Público, onde
pauta o seu agir pela aplicação de normas de Direito Administrativo,
podendo, pois, exercer poderes de autoridade;
● Administração de natureza vinculada, onde tem todos os passos da sua
atuação definidos exaustivamente pela lei tendo, pois, um espaço reduzido de
integração autónoma, ou, pelo contrário, podemos ter ainda uma Administração
discricionária, em que há margem de autonomia e de decisão, em que o
decisor administrativo preenche os espaços em brancos deixados pela lei;
● Administração fundada na Constituição, se a Administração encontrar a
regulação da sua conduta em normas da Constituição, de acordo com o art.
18º/1 da CRP, ou uma Administração fundada na legalidade externa ou
interna, onde encontra o fundamento do seu agir no ordenamento jurídico
infraconstitucional;
● Administração de exceção, como por exemplo a Administração que
desenvolve a sua atividade em estado de emergência, onde esta decide certas
coisas que seriam ilegais na normalidade, ou uma Administração de
normalidade, que é aquela que aplica as regras e, por isso, age em tempos de
gestão normal em que não exista excecionalidade;
● Administração formal e Administração informal, que tem que ver com o
cumprimento mais ou menos intenso das normas onde se prevê formalidades e
determinadas exigências procedimentais – conduta secundum legem e praeter
legem, respetivamente;
● Administração oficial, cujos elementos vêm identificados e são alvo de
publicação no jornal oficial, onde, por outro lado, pode existir também uma
Administração não oficial, como por exemplo os serviços secretos, em que não
existe uma lista publicada dos agentes secretos.
o Substrato organizativo da Administração Pública
● Numa primeira dicotomia, temos a hipótese em que o Governo é o órgão
administrativo principal, o que permite distinguir entre a Administração
Pública que tem o Governo como órgão superior e toda a restante
Administração.

Nisto, o Governo assume uma responsabilidade política junto do Parlamento e


da opinião pública;
● Numa segunda dicotomia, temos a restante Administração, nomeadamente
aquela que separa a Administração com base territorial, que visa dar
expressão aos interesses de um agregado populacional nacional, regional ou
local, como o caso do Estado, da Administração associativa, que, não tendo
uma posição soberana, é aquela que tem por base uma associação de entidades
públicas, privadas ou mistas, condicionada nos termos da Constituição e leis,
como por exemplo a ordem dos advogados.

No entanto, podemos ainda ter uma Administração institucional, que tem na base
uma instituição que não tem um substrato territorial nem associativo, onde se
prosseguem interesses públicos específicos, como por exemplo as Universidades
Públicas;
● Numa terceira dicotomia, podemos distinguir a Administração central, que é
aquela cuja atuação se estende a todo o território nacional, da Administração
periférica, que é aquela em que o substrato da sua atuação se limita a uma
determinada localidade, onde esta pode ser interna ou externa.

Por exemplo o comando distrital da PSP do Porto tem a sua atuação restrita ao
distrito do Porto;
● Numa quarta dicotomia, podemos diferenciar a Administração geral, onde se
visa a prossecução de interesses comuns, da Administração corporativa, onde
estão em causa interesses públicos relativos a um grupo específico de pessoas;
● Numa quinta dicotomia, podemos diferenciar a Administração dependente,
onde as estruturas administrativas estão submetidas a poderes de intervenção
conformadora sobre a sua esfera decisória, da Administração independente,
onde as estruturas administrativas exercem os seus poderes sem qualquer
sujeição;
● Numa sexta dicotomia, podemos diferenciar a Administração do Estado, que
visa a prossecução de interesses gerais de coletividade, da Administração infra
estadual, que prossegue interesses públicos de âmbito circunscrito, como por
exemplo as regiões autónomas, da Administração supraestadual, que
prossegue interesses comuns a vários Estados, como por exemplo a
Administração da União Europeia;
● Numa sétima dicotomia, podemos diferenciar a Administração sob forma
pública, onde a prossecução dos interesses é feita por estruturas de Direito
Público, da Administração sob forma privada, se a prossecução de interesses
é feita por estruturas de Direito Privado.
o Atividade desenvolvida
● Administração neutra, como por exemplo a Administração Liberal, ou
Administração intervencionista, como por exemplo a Administração do
Estado Social;
● Administração produtora de bens, onde presta serviços, ou Administração
reguladora, que se limita a elaborar normas jurídicas que definem as regras do
jogo no mercado.

Nisto, a Administração produtora é uma administração interventiva no sentido


de procurar transformar a realidade prestando serviços, enquanto que a Administração
reguladora é mais distante, intervindo apenas sob forma jurídica;
● Administração burocrática, que é alheia a uma ótica económica de gestão da
sua atividade, ou Administração empresarial que é aquela que age através de
empresas, como por exemplo as empresas de transportes públicos que visam o
lucro, não significando, pois, que o tenham;
● Administração de sacrifícios, como por exemplo a Administração tributária,
que impõe aos particulares o pagamento de impostos, ou Administração de
prestação, que visa satisfazer necessidades coletivas.

No entanto, pode haver cruzamentos entre a Administração de sacrifícios e a


Administração de prestação, como por exemplo as propinas a pagar numa
universidade, que é o custo em termos de sacrifício pela obtenção de uma prestação, que
é o ensino;
● Administração visível ou Administração invisível, onde esta última tem que
ver com a atividade de inteligência ou de contrainteligência, como por exemplo
o filme Missão Impossível;
● Administração Civil ou Administração militar, onde, na revisão
constitucional de 1982, com a extinção do Conselho da Revolução, o Governo
tem o poder de direção sobre toda a Administração civil e militar, sendo,
assim, o órgão principal.
o Procedimento adotado
● Administração unilateral, quando apenas uma vontade é suficiente para a
produção dos respetivos efeitos dos atos, ou Administração bilateral, quando
se conjuga duas ou mais vontades numa determinada atuação, visando a
satisfação de interesses antagónicos, mas que se complementam;
● Administração executiva, que é aquela que define o direito, não estando
dependente dos tribunais e, por isso, pode utilizar a própria força para
obrigar os destinatários a cumprirem as ordens – privilégio de execução
prévia –, ou Administração judiciária, que também define o direito, mas só
pode utilizar a força se for ao tribunal previamente e este lhe der um título
executivo.

Neste sentido, nos últimos anos, de acordo com o professor Paulo Otero, a
tendência em Portugal é a de um reforço da Administração judiciária e diminuição
da Administração executiva;
● Administração eletrónica e Administração tradicional, onde, devido à
pandemia, verifica-se o reforço da Administração eletrónica, reduzindo, pois,
a força da Administração tradicional.
o Efeitos produzidos
● Administração de assistência, como a Administração de sacrifício, ou
Administração agressiva, como a Administração de assistência;
● Administração constitutiva, que é aquela que introduz alterações na ordem
jurídica, ou Administração declarativa, que é aquela que se limita a verificar
factos.

Por exemplo, quando alguém pede um certificado de cadeiras feitas, esta ação é
meramente declarativa;
● Administração decisória, que é aquela que introduz uma inovação na ordem
jurídica, uma vez que decide favorável ou desfavoravelmente um determinado
caso, ou Administração consultiva, que é aquela que se limita a emitir um
parecer, sem que a opinião se consubstancie numa decisão;
● Administração preventiva, que visa evitar o dano, procurando acautelar o
risco, como por exemplo as medidas preventivas de combate ao Covid-19, ou
Administração repressiva, que vem atuar depois dos factos terem ocorrido,
visando, pois, esclarecer, sancionar e evitar a continuação;
● Administração nacional, que esgota os seus efeitos no território nacional, ou
Administração transnacional, que é aquela em que as suas decisões são
atravessadas por fronteiras.
❖ Posições jurídicas dos particulares face à Administração
Nesse sentido, procura-se entender se aquilo que se pode pedir à Administração,
sabendo que esta, consoante a força do meu pedido, tem mais ou menos margem para
decidir aquilo que lhe é pedido.

Assim sendo, as posições jurídicas dos particulares subjetivas perante a


Administração são:
● Posições jurídicas imediatamente concedidas pela lei;
● Posições jurídicas em que a lei exige a mediação da Administração, onde,
esta tem o poder de conceder ou não essas mesmas posições ao particular;
● Posições jurídicas passivas privadas e públicas, onde alguém está vinculado a
um determinado dever;
● Posições jurídicas ativas, que podem ter três configurações:
✔ Direitos subjetivos, que são uma permissão de aproveitamento de um bem, que
confere ao seu titular o poder de exigir da Administração uma decisão
favorável.

Por exemplo, se obtiver 8 valores no exame escrito, posso exigir à Administração da


faculdade a marcação de uma prova oral – posição de vantagem.
Nisto, os direitos subjetivos podem ser absolutos ou relativos, potestativos ou não
potestativos, patrimoniais ou não patrimoniais, privados, se regulados pelo direito
privado, ou públicos, se regulados pelo direito público;
✔ Interesses legalmente protegidos, que são todas as posições jurídicas
subjetivas de vantagem que não são direitos subjetivos.

Por exemplo, se eu sou titular de um interesse legalmente protegido, não posso


exigir necessariamente uma decisão favorável, mas posso exigir que a Administração,
ao apreciar a minha situação, respeite a lei.
Nisto, existem interesses individuais e interesses difusos, concedidos a uma
pluralidade de pessoas sem individualização de um titular, interesses criados por novo
e interesses que podem ser convertidos em interesses legalmente protegidos –
expetativas jurídicas.
No âmbito dos interesses legalmente protegidos, importa distinguir os interesses
opositivos, que são aqueles que têm o interesse de gerar oposição, e os interesses
pretensivos, em que não se age contra uma atuação, mas há uma pretensão que não está
formulada pela negativa, querendo apenas que se adotem determinadas medidas;
✔ Poderes ou faculdades, que são meios face a determinados fins e um conjunto
de poderes, respetivamente.

Assim sendo, pode haver um cruzamento entre o direito subjetivo e o interesse


legalmente protegido, pois por exemplo, se obtiver 5 valores na prova escrita, tenho o
direito a pedir revisão de nota – direito subjetivo.
No entanto, não tenho um direito subjetivo em melhorar de nota, mas sim um
interesse legalmente protegido a que o professor faça uma análise dentro dos parâmetros
legais e técnicos das minhas respostas.
Com isto, podemos dizer que a Administração pode ser titular de posições
jurídicas ativas, podendo, pois, ter direitos fundamentais como por exemplo o art.
76/2 da CRP.

❖ Memória histórica da Administração


Como sabemos, a Administração Pública não se inicia com a Revolução
Francesa, uma vez que antes desta a Administração já existia.
Nisto, encontramos uma Administração pré-liberal no âmbito da ordem
jurídica portuguesa, onde há um grande contributo do Direito Romano na distinção
entre direito público e direito privado.
Assim sendo, existem três grandes tipos de Administração pública pré-liberal em
Portugal:
● Administração medieval ou corporativa, que se situa entre o século XII e XIV,
que evidencia a importância de D. Afonso II na criação do Estado e na
edificação de uma Administração régia, e a existência de uma pluralidade de
Administrações, como a régia, concelhia, senhorial eclesiástica, etc.

Por outro lado, existem formas de intervenção económica do Estado, onde surge a
dúvida de saber se o rei está subordinado à lei por ele criada;
● Administração renascentista ou barroca, que vai do século XV ao XVII,
caracterizando-se por ser uma Administração da expansão ultramarina, onde
surge a ideia de que a Administração é projetada para além de Portugal Continental.

Com isto, levanta-se a ideia de que o rei é a suprema jurisdição e a razão do


Estado, onde este tem razões que se podem sobrepor à vontade e aos direitos dos
cidadãos;
● Administração iluminista ou absolutista, que surge no século XVIII até aos
primeiros anos do século XIX, onde o rei, como figura absoluta, atua sem lei.

Para além disto, surge ainda a ideia da intervenção económica, social, cultural –
ideia do estado de polícia –, a ausência da ideia de separação de poderes e a
aplicação das regras de processo dos tribunais na atuação da Administração.
Assim sendo, com a Revolução Liberal de 1820, a Administração Liberal é
caracterizada por vários aspetos com inovações revolucionárias, que se ligam com o
novo paradigma desta Administração, nomeadamente:
● Separação de poderes, onde, contrariamente, existe uma concentração de
poderes;
● Supremacia da lei, que, afinal, é a vontade do chefe do executivo;
● Igualdade de todos perante a lei, onde, apesar disto, existem privilégios da
Administração;
● Tutela dos direitos fundamentais dos cidadãos, onde há uma ilusão de direitos
dos administrados;
● Abstencionismo do Estado, que, muitas vezes, é apagado por um paternalismo
de intervenção do Estado.

Todavia, existem continuidades pré-revolucionárias, isto é, o que ficou do Antigo


Regime no modelo da Administração Liberal.
Nesta base, na ótica da Administração Pública portuguesa existiram, com a
influência de França, implementou-se:
● Centralização administrativa, onde a Revolução Francesa não é
descentralizadora, uma vez que é preferível o centro do executivo legitimado
revolucionariamente implementar as suas medidas pelo território, ao invés
de cada comunidade local as implementar.
Com isto, há uma substituição do papel do rei pelos novos titulares do poder
executivo;
● Ideia de que julgar a Administração ainda é administrar, mas, no entanto,
esta ideia é contrária ao princípio da separação de poderes.

Contudo, os litígios envolvendo decisões administrativas deviam ser resolvidos


pela própria Administração, e não pelos tribunais;
● Ideia do privilégio de execução prévia, onde, se alguém não acatar uma ordem
da Administração, existe uma autotutela declarativa, independentemente da
intervenção dos tribunais;
● O executivo define a legalidade diretamente, onde, apesar de o princípio da
separação de poderes devesse determinar que a Administração se subordinasse à
lei, o próprio executivo foi criando o Direito Administrativo, violando, pois,
o princípio da separação de poderes.

❖ Contraditória génese do Direito Administrativo


revolucionário
Neste sentido, o conceito de Estado francês é uma contradição face à separação
de poderes, e o Direito Administrativo não surge para dar direitos aos cidadãos, mas
sim para afirmar prerrogativas de autoridade da Administração, que a mesma na
tinha à luz do direito comum aplicado antes da Revolução Francesa.
Por isso mesmo, há um mito revolucionário no âmbito do liberalismo.
Com isto, existe uma transição de uma legitimação administrativa tradicional
para uma legitimação legal-constitucional no âmbito do aparelho administrativo,
onde se verifica o predomínio do poder executivo.

❖ Administração pós-liberal
o Administração do Estado intervencionista

Na Administração do Estado intervencionista, é o Estado que intervém e que


presta serviço e, por isso, transforma a Constituição “refém” da Administração Pública.
Nisto, o poder administrativo transforma-se no Estado administrativo, onde o
protagonismo do executivo leva à supremacia do Governo perante as restantes
estruturas administrativas, à existência de uma reserva de administração, isto é,
espaços de decisão que só a Administração pode ter e ao aumento dos custos
financeiros.
Com isto, o gasto financeiro tem de ter fonte de receitas, colocando-se o problema
da sobrevivência do modelo do Estado interventor.

No entanto, existem dois paradigmas de Estado intervencionista no direito


português, nomeadamente:
● Administração do Estado Novo, isto é, que está na base da Constituição de
1933, onde está patente o modelo antiparlamentar, antidemocrata,
antiliberal, autoritário e intervencionista. Surgem, pois, as preocupações de
bem social.

Nesta base, de acordo com o professor Marcelo Caetano, coloca-se a questão de se


saber se existia um verdadeiro Estado de Direito;
● Administração do Estado de Direito democrático, que é o modelo da
Constituição vigente, caracterizado pelo Estado social, Estado de Direito
material e Estado democrático.

Nisto, o que caracteriza o cerne da Administração pós-liberal vigente em Portugal


resume-se em seis traços, onde não é tudo criação a partir de 1976, nomeadamente:
● Administração ligada à Constituição, onde há um esforço pelo cumprimento
desta;
● Administração com preocupações sociais;
● Administração vinculada ao direito;
● Administração baseada na vontade popular, uma vez que os órgãos principais
da Administração Pública são designados direta ou indiretamente pelo
eleitorado;
● Modelo organizativo plural, onde o Governo, sendo o órgão superior, garante a
unidade da Administração;
● Estatuto reforçado do executivo do Governo, onde esta não é uma
característica originária, mas sim da Constituição de 1933.

❖ Administração neoliberal
Com isto, poder-se-á perguntar se estamos perante uma Administração Pública em
transição para um Estado neoliberal, onde houve uma redução do peso da
Administração, nomeadamente:
● Crise do hiperintervencionismo do Estado;
● Privatização de tarefas e serviços públicos;
● Redução da função pública e do aparelho administrativo;
● Substituição dos instrumentos de coação e de comando;
● Introdução da boa governação administrativa;
● Compulsão pela modificação e pela invocação.

Contudo, importa realçar a opção política dos últimos dois governos no sentido de
reforço da intervenção do Estado, onde o Covid-19 e a sua crise sanitária,
determinaram o reforço desta intervenção, com a sua Administração no combate à
pandemia.
Assim sendo, o Estado é o melhor instrumento para a garantia dos direitos das
pessoas.
Com isto, à semelhança dos tempos anteriores, à emergência financeira decorrente
da crise financeira de 2008, podemos, atualmente, ter uma emergência sanitária,
agravando os seus efeitos, o que poderá levar a uma relativização da força normativa
da Constituição.

❖ Conceções político-filosóficas sobre a Administração


Pública
Na politicidade Administração Pública, importa saber como a Administração se
relaciona com a política e que vínculos se estabelecem entre si, onde existem duas
conceções, nomeadamente a conceção tradicional e a conceção alternativa.
o Conceção tradicional

Nesta conceção, a Administração é vista como um papel executivo da vontade


política do legislador, isto é, o legislador define e a Administração acata. Executar a lei
é, pois, aplicar a vontade do legislador, onde a Administração está subordinada.
o Conceção alternativa
Nesta conceção, de acordo com o professor Paulo Otero, a Administração é
independente do legislativo, uma vez que o órgão de topo da Administração é dotado
de um espaço próprio e autónomo de decisão política relativamente ao poder legislativo.
Assim sendo, na autonomia da Administração Pública, encontramos três exemplos
constitucionais históricos:
● Princípio monárquico como alicerce da Constituição alemã durante o século
XIX, onde a Alemanha foi definindo que havia um poder não subordinado à lei
no âmbito da Administração;
● Constituição francesa atual de 1958, onde o espaço de decisão do Parlamento
obedece a um princípio de tipicidade, onde o Parlamento só pode fazer leis em
determinadas matérias, pois caso contrário temos uma reserva de regulamento,
que é competência do Governo;
● Constituição portuguesa de 1976, onde o art. 199º/alínea g da CRP consagra a
possibilidade de o Governo desenvolver uma atuação legislativa praeter
legem – decretos regulamentares.

❖ Administração e participação no exercício da função


legislativa
No exercício da função legislativa, há em que a Administração é a própria autora
da lei, nomeadamente através de decretos-lei feitos pelo Governo.
Por outro lado, historicamente, com a figura do rei, o poder de veto e as maiorias
qualificadas também traduzem uma participação do executivo na função legislativa.
Nisto, a natureza técnica das leis faz apelo a que muitas destas tenham sido
feitas pelo Governo, mesmo as de reserva absoluta do Parlamento, como por exemplo
o orçamento de Estado.
Com isto, podemos ainda dizer que a efetividade da Constituição está nas mãos da
Administração, daí a expressão da “Constituição refém da Administração”.
Assim sendo, a Administração tem nas mãos a satisfação efetiva do bem-estar, o
que significa que há um ativismo constitucional desta.
Contudo, verifica-se ainda uma legitimação política e uma colonização partidária,
onde, quem está na Administração aplica a lei, onde os partidos políticos tendem a
dominar.
Já na politicidade da decisão administrativa, esta vem suscitar o mito da
neutralidade Administração, uma vez que há uma direção política da Administração e
um espaço operativo da intervenção política.
Contudo, existem limites a esta politicidade da atuação administrativa,
nomeadamente:
● Vinculação ao interesse público, onde este é o limite desta atuação;
● Respeito pela separação de poderes, onde não é possível que a politização leve
à flexibilidade deste princípio;
● Proibição da lesão ou privilegiar individual de pessoas, onde não é possível
que a politização atinja individualmente destinatários da decisão.

❖ Personalismo e Administração Pública


Na forma de prossecução do interesse público, a Administração pode ter três
condutas distintas:
● Conceção totalitária, onde prevalece o interesse público, justificando-se, pois, a
violação de posições jurídicas particulares e desprezo pela dignidade humana.

De acordo com o professor Paulo Otero, esta conceção é excluída pela Constituição
República Portuguesa, uma vez que não é possível recorrer à tortura em função dos fins,
por exemplo;
● Conceção compromissória, onde, de acordo com o professor Diogo Freitas do
Amaral, em que o art. 266º da CRP procura conciliar a prossecução do
interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos
dos particulares.

Contudo, de acordo com o professor Paulo Otero, o art. 266º da CRP não pode
deixar de ser interpretado fora do art. 1º da CRP, pois este impõe a dignidade da
pessoa humana e o respeito pela vontade popular;
● Conceção personalista, onde o interesse público não pode prevalecer sobre o
núcleo indisponível da dignidade humana, isto é, há casos em que não é
possível conciliar o interesse público e os direitos das pessoas.
Assim sendo, o ser humano nunca pode ser tratado com indignidade pela
Administração Pública, uma vez que a dignidade humana é um elemento integrante do
personalismo da administrativo.
Por exemplo, com o Covid-19, há uma defesa mais acrescida perante as pessoas
mais vulneráveis.
Por isso, a violação da dignidade humana nunca poderá assumir relevância
positiva, onde, de acordo com o professor Paulo Otero, a responsabilidade civil de
atos contrários à dignidade humana é imprescritível.
Todavia, na reserva de lei, a dignidade é fonte de deveres e de direitos.
Assim, numa outra ótica, discute-se a relação entre a legalidade e igualdade, onde,
da Constituição, não resulta uma prevalência absoluta da legalidade face à igualdade, o
que levanta o problema de saber se haverá um direito à igualdade na legalidade.
Por exemplo, imaginemos que A foi tratado em sentido contrário à lei numa situação
concreta de vantagem, onde a sua atuação se consolidou na ordem jurídica.
Nisto, pergunta-se se B poderá exigir que a Administração tenha uma conduta igual à
que teve em relação a A, apesar de contrária à lei, ou se a Administração agiu
ilegalmente, não sendo invocável.
Assim sendo, quanto a esta questão, existem divergências doutrinárias, onde na
conceção tradicional, não há direito à igualdade na legalidade, mas, onde, de acordo
com o professor Paulo Otero, haverá igualdade na legalidade.

❖ Cidadania administrativa
Na cidadania administrativa, entende-se que a conceção personalista é
incompatível com o entendimento de que o particular é um súbdito, mas, pelo
contrário, o particular é um cidadão com liberdade, igualdade e participação, de acordo
com o art. 266º/1 da CRP.
Assim sendo, os cidadãos administrativos são todas as pessoas singulares e
coletivas.

❖ Constituição e Administração Pública


A Constituição administrativa é vista como um conjunto de normas e de princípios
que resultam do texto constitucional.
Por isso, há um direito administrativo constitucional, onde a Constituição
administrativa diz respeito às normas da Administração Pública e às suas relações com
os cidadãos.
Para além disto, existe ainda uma Constituição administrativa formal, uma
Constituição administrativa material e Constituição administrativa transnacional,
onde esta última tem uma vocação para subalternizar a Constituição dos estados
membros.

❖ Constituição administrativa e Constituição política


Neste sentido, há normas da Constituição política que são normas da
Constituição administrativa, mas, contudo, nem todas as normas desta se esgotam em
da Constituição política.
Todavia, existem quatro regras condicionantes políticas relativamente ao modelo
de Administração Pública, nomeadamente:
● Modelo político-constitucional de Estado, onde o modelo pluralista envolve
sempre uma Administração pluralista, enquanto que um modelo não pluralista
envolve uma Administração de reduzida menção plural;
● Forma de Estado, onde um Estado ser simples ou unitário, por outro lado, ou
ser composto ou complexo, por outro lado, reconduz-se a um reforço da
pluralidade das Administrações;
● Sistema económico, onde a existência de um sistema de mercado ou um sistema
de direção central condiciona a existência de diferentes tipos de
Administração, onde no primeiro tipo de sistema existe uma Administração
menos presente relativamente ao segundo tipo;
● Sistema político-governativo, onde, no sistema de matriz presidencial permite
falar da Administração do Presidente, mas, pelo contrário, o sistema de matriz
parlamento permite falar de uma Administração do Governo.

Para além destas condicionantes, a Constituição administrativa tem ainda presente


uma conflituosidade administrativa constitucional, o que significa que a Constituição
é fundamento para a garantia de bens e interesses, mas, no entanto, é possível que os
diferentes intérpretes encontrem fundamento constitucional para as suas
pretensões.
Assim, há, pois, uma concorrência de fundamentos constitucionais para defender
posições e pretensões antagónicas, o que leva a que se gere conflituosidade na
Administração, uma vez que cada um dos intervenientes invoca normas da Constituição
a seu favor, o que leva a que se tenha que dirimir estes conflitos de pretensões.
Nisto, dá-se a intervenção do tribunal, onde este irá analisar a conflituosidade
constitucional.

❖ Ordem axiológica constitucional e Administração


Pública
Neste sentido, existem princípios fundamentais que são conformadores do
ordenamento jurídico do sistema político, nomeadamente ideia do Estado de
direitos humanos, o que significa:
● Existência de uma democracia humana, com a exigência da liberdade, justiça e
solidariedade – apelo ao personalismo administrativo;
● Estado de direito democrático, que envolve separação de poderes, pluralismo,
juridicidade e bem-estar.
● Soberania internacionalizada e europeizada, que significa a força do direito
internacional público e da União Europeia;
● Unidade descentralizada, que significa o protagonismo dos interesses do
Estado, nomeadamente o princípio da subsidiariedade.

❖ Princípios gerais da Administração Pública

Os princípios gerais da Administração Pública, que se podem dividir em dois


grupos, nomeadamente:
● Organização, isto é, a Administração enquanto entidade;
● Atividade administrativa, isto é, os princípios que a regulam.

o Princípios gerais da organização administrativa

Estes princípios que disciplinam a organização da Administração Pública têm


consagração constitucional, nomeadamente:
● Subsidiariedade;
● Descentralização;
● Desconcentração;
● Unidade;
● Participação dos interessados na gestão da Administração;
● Aproximação dos serviços às populações;
● Desburocratização.

Nisto, com a organização administrativa, dá-se o modo de estruturação concreta.


Primeiramente, de acordo com ao art. 6º da CRP, encontramos o princípio da
subsidiariedade, sendo um elemento estruturante da organização administrativa.
Aplicado à Administração Pública, de acordo com o princípio da subsidiariedade, o
Estado só deve chamar para si o campo de atuação que não possa ser desenvolvida pelas
entidades privadas ou entidades privadas menores.
Assim sendo, a subsidiariedade que a atuação de uma entidade público de âmbito
mais alargado só se justifica se as entidades públicas inferiores não agir com
eficiência necessária para a satisfação das necessidades coletivas.
Neste sentido, o princípio da subsidiariedade possui uma dupla orientação e, por
isso, há um movimento centrípeto e centrífugo, apelando às entidades menos e
entidades públicas de âmbito mais amplo, respetivamente.
Para além disto, podemos dizer ainda que o princípio da subsidiariedade é uma
regra de repartição de poderes entre a União Europeia e os Estados membros, onde
só pertence à União Europeia aquilo que não possa ser desenvolvimento com igual grau
de eficácia de cada um dos Estados membros.
No entanto, o princípio da subsidiariedade também é visto como um princípio de
flexibilização das atribuições de competência, onde esta pode pertencer a uma
entidade pública inferior ou superior, perante as circunstâncias.
No princípio da descentralização, de acordo com o art. 6 e art. 267º da CRP, este
surge confundido com a desconcentração, mas, no entanto, esta diferença prende-se
com o facto de a descentralização ser um fenómeno de repartição de atribuições
entre duas ou mais entidades públicas, por exemplo quando o Estado transfere
poderes para as regiões autónomas – realidade intersubjetiva.
Por outro lado, a desconcentração é o fenómeno de órgãos de entidades públicas,
como por exemplo se a Assembleia Municipal de Lisboa delegar poderes na Câmara
Municipal – realidade intrasubjetiva. Envolve, pois, a competência em sentido estrito
e não os fins da entidade público.
Nisto, a desconcentração pode ser feita por via imediata da lei, como por
exemplo a lei resolver distribuir a competência do órgão x pelo órgão y da mesma
entidade pública, mas, no entanto, pode ocorrer que seja feita através da mediação
de um ato por parte de um órgão administrativo, como por exemplo a lei permitir
que a competência da Câmara Municipal seja delegada no seu Presidente – ato de
delegação de poderes.
No princípio da unidade, este intervém em sentido oposto aos anteriores princípios,
uma vez que, apesar de os compreender, a Administração Pública deve funcionar
com uma ideia de todos agirem em benefício de um propósito comum, que se liga
com a satisfação do interesse público.
Assim sendo, a unidade é expressão da natureza unitária do Estado e da
soberania e, por isso, por via da Constituição, encontra-se um órgão a quem
competente a condução da atuação administrativa, que é o Governo.
Nisto, o princípio da unidade confere poderes de intervenção intra
administrativa ao Governo, isto é, poderes de intervenção no interior da
Administração, que podem ser mais ou menos intensos. Há, pois, um pluralismo na
unidade, dando coerência ao agir administrativo.
Por isso, o Governo é responsável politicamente perante Parlamento pelo modo
como age sobre toda a Administração Pública, onde só pode ser responsável pelos
poderes que tem.
Assim sendo, podemos dizer que o modelo de organização administrativa está
ligado ao sistema de Governo.
No princípio da participação dos interessados na gestão da Administração, a
ideia base é a de que gerir a Administração não pode ser apenas uma esfera da
competência das autoridades públicas, uma vez que se age em benefício da coletividade.
Desta forma, os próprios interessados deverão participar na gestão da
Administração Pública, como por exemplo a participação dos alunos nos órgãos de
gestão da Faculdade.
No princípio da aproximação dos serviços às populações, este princípio centra-se
na ideia de que quem deve decidir é quem está mais próximo da realidade, onde isto
não deve ser feito por estruturas administrativas mais distantes.
No entanto, a transformação progressiva de uma Administração numa Administração
eletrónica, veio afastar e colocar em causa este princípio, onde, atualmente, quem
decide, é um centro distante.
No princípio da desburocratização, este significa simplificar o agir administrativo,
isto é, privilegiar as exigências de substância em detrimento das exigências formais,
onde, em parte, isto é garantido pela administração informatizada, mas nem sempre
completa.
Assim, estes princípios vinculam o legislador, uma vez que quando este elabora
leis que definem o modelo da organização administrativa, as leis devem respeitar estes
mesmos princípios, sob pena dos tribunais poderem controlar a sua
constitucionalidade.
o Princípios gerais da atividade administrativa

Nos princípios que pautam a atividade administrativa, também estes possuem


consagração constitucional, de acordo com o art. 266º da CRP:
● Juridicidade;
● Prossecução do interesse público;
● Respeito pelas posições jurídicas através dos cidadãos;
● Igualdade;
● Proporcionalidade;
● Justiça;
● Imparcialidade;
● Boa fé.

No princípio da juridicidade, a Administração está subordinada ao direito numa


dupla perspetiva, isto é, o direito que a Administração cria – autovinculação –, mas
também ao direito que vem de fora da Administração – heterovinculação. Há, pois, um
apelo às fontes de direito.
Assim sendo, independentemente da sua vontade, todo o direito vincula o agir da
Administração, onde esta subordinação se vincula pelo princípio da precedência de
lei, onde a Administração só deve agir quando há uma norma que a habilite.
Numa segunda ideia, temos a reserva de lei, onde há matérias que a Constituição
impõe que só possam ser tratadas pelo poder legislativo, isto é, matérias excluídas do
âmbito da atuação administrativa. Há, pois, uma separação de poderes.
Numa terceira ideia, temos o princípio da juridicidade, onde há patente a primazia
da lei, em que esta é a fonte de direito mais importante relativamente a todas as fontes
que se encontram abaixo da lei.
Ainda a propósito do princípio da juridicidade, se a Administração agir em sentido
contrário à juridicidade, a sua atuação é inválida e, por isso, esta invalidade pode ser
controlada por parte dos tribunais. Estes, são, pois, os garantes da vinculação da
Administração à juridicidade.
No princípio da prossecução do interesse público, a Administração só pode agir
tendo em vista o interesse público, onde, por isso, não pode agir para prosseguir
interesses que não sejam interesses da coletividade. O interesse público é, pois, o
critério do agir administrativo.
Nisto, a prossecução do interesse público articula-se com os direitos fundamentais na
medida em que não se pode colocar em causa o núcleo essencial da dignidade
humana, mas, no entanto, pode haver uma pluralidade de visões sobre o interesse
público.
Assim sendo, o interesse público não é expressão única, onde podem existir
diversas perspetivas no contexto de uma Administração pluralista e democrática.
Por exemplo, a melhor solução para prosseguir o interesse público da saúde pública
num cenário de pandemia através do ensino à distância, o ensino presencial com
medidas de segurança ou num sistema misto. Há, pois, diversas soluções possíveis.
No princípio do respeito pelas posições jurídicas dos cidadãos, há a necessidade
de se respeitarem os direitos subjetivos e os interesses legalmente protegidos, onde
temos de saber como se articula este respeito que é imposto pela Constituição com a
prossecução do interesse público.
Nisto, fora das áreas do núcleo essencial da integridade humana, de acordo com o
art. 266º da CRP, o interesse público deve ser prosseguido articulando-se com os
cidadãos, o que não significa que não seja possível prosseguir o interesse sacrificando
direitos dos cidadãos, como por exemplo a expropriação por utilidade pública.
No princípio da igualdade, todos são iguais perante a lei, mas, no entanto, o Estado
de direito social não se limita à igualdade formal, mas numa igualdade realidade, que se
liga com a ideia de que não se pode tratar por igual aquilo que é desigual. Há, pois,
uma justiça material.
Nisto, de acordo com o art. 13º e art. 276º da CRP, a igualdade reflete-se na
repartição dos encargos públicos ou a questão de como a igualdade se articula com
a legalidade, onde, por isso, questiona-se o facto de haver um direito à igualdade na
ilegalidade.
Por exemplo, imaginemos que um aluno apresenta um pedido de revisão da prova
escrita fora do prazo que o regulamento da faculdade fixa. Nisto, apesar de saber da
situação, o professor da cadeira analisa o respetivo pedido.
Com isto, o aluno B, na mesma cadeira, formulando o pedido também fora do prazo,
o professor não analisa o pedido.
De acordo com o professor Paulo Otero, esta decisão não é válida, uma vez que
viola o princípio da igualdade, onde há um direito à igualdade na ilegalidade por
parte do aluno B.
No princípio da proporcionalidade, este é um princípio nuclear no agir
administrativo, onde nos leva à ideia da proibição do excesso ou de necessidades, em
que a Administração só deve causar os prejuízos aos particulares que se mostrem
idóneos.
Por exemplo, se para construir uma autoestrada basta expropriar dez, não é possível
expropriar onze.
Nisto, surge ainda a adequação, onde o meio usado deve mostrar-se apto e
adequado ao fim que se tem em vista, onde, por exemplo, se para combater uma
epidemia no âmbito do gado se mostre idóneo um determinado tipo de vacina, proibir a
relação de feiras de gado não é adequado para combater esta epidemia.
No entanto, na proporcionalidade em sentido estrito, em que se apela para a ideia
da utilização de um determinado meio tem de levar a que se pese as vantagens e
desvantagens em relação aos custos da respetiva decisão.
Assim, surge ainda a proteção insuficiente, por exemplo, se se sabe que apenas o
abate dos animais é a única forma de resolver o problema da epidemia do gado, utilizar
a vacina não só se mostra inadequado, como também uma medida de proteção
insuficiente do risco de propagação.
Contudo, de acordo com alguns autores, a proteção insuficiente enquadra-se no
princípio da adequação.
No princípio da justiça, a Administração encontra-se vinculada à lei, onde deve
encontrar soluções que são materialmente justos, pois caso contrário estamos perante
uma inconstitucionalidade.
No princípio da imparcialidade, este possui uma vertente negativa, que impõe a
distância entre quem decide e os destinatários da decisão, justificando as situações
de suspeição, mas, no entanto, na vertente positiva, deve haver racionalidade e
transparência decisória, o que significa que se deve tomar em consideração todos os
interesses.
No princípio da boa fé, nomeadamente dos decisores administrativos em relação
aos cidadãos e dos cidadãos em relação ao agir da Administração, desdobrando-se, pois,
pelas promessas feitas e na proibição de abuso de direito.

❖ Princípios garantísticos face à Administração Pública

Os princípios garantísticos têm três vertentes, nomeadamente:


● Vinculam a Administração no seu agir;
● Podem ser controlados pelos tribunais no âmbito da sua função fiscalizadora do
agir administrativo;
● Os particulares podem invocar junto da Administração e dos tribunais contra a
conduta da Administração.

Nisto, podem ainda agrupar-se em cinco tipos, nomeadamente:


● Princípios operativos da unidade do sistema jurídico;
● Princípios de acesso à Administração Pública;
● Princípios do procedimento administrativo;
● Princípios de controlo da Administração Pública;
● Princípios de incidência Intra administrativa.

❖ Princípios operativos da unidade do sistema jurídico


o Princípio da supremacia da Constituição

Como sabemos, a Constituição é o ato jurídico fundamental, tendo uma


superioridade normativa face às demais fontes do direito.
No entanto, a supremacia da Constituição não é apenas da Constituição nacional,
mas também de princípios jurídicos fundamentais e do Direito da União Europeia de
matriz constitucional.
Quanto à Constituição formal portuguesa, temos o princípio da vinculação das
entidades publicas à aplicação das normas sobre direitos, liberdades, e garantias
dotadas da aplicabilidade direta numa conjugação entre o art. 17º e art. 18º/1 da CRP.
o Princípio da reserva de lei

Na reserva de lei, esta diz respeito a matérias sobre as quais apenas a função
legislativa pode operar e, por isso, há uma área de exclusão de intervenção decisória
dos tribunais e da Administração.
De acordo com o acordo com o professor Paulo Otero, defende-se que a reserva de
lei obedece a uma regra de tipicidade constitucional, onde só é reserva de lei o que
direta ou indiretamente é identificado como tal pela Constituição.
o Princípio da preferência de lei

Na preferência de lei, a lei tem um primado em relação aos demais atos jurídicos,
mas com exceções, que se prendem com as decisões judiciais, pois nos termos do art.
205º da CRP, prevalecem sobre as decisões de quaisquer outras autoridades e, por
isso, estas estão acima da lei.
Há, pois, situações em que a violação da lei não gera invalidade, mas sim uma
mera irregularidade.

o Princípio da precedência de lei

No princípio da precedência de lei, o agir da Administração deve estar pautado


por uma norma jurídica, isto é, uma norma de valor de lei.
Contudo, há casos em que não é necessária a existência de uma lei formal, uma
vez que podem existir princípios jurídicos que habilitam com igual validade o agir da
Administração, a própria Constituição pode ser fundamento do próprio agir da
Administração ou até mesmo uma norma de natureza consuetudinária.
o Princípio da reserva de juiz

No princípio da reserva de juiz, há matérias que são apenas da esfera decisória de


um tribunal, o que significa que o legislativo não pode invadir e a Administração não
pode usurpar a área de decisão de um tribunal.
Nisto, a Administração não pode usurpar decidindo matéria que é da esfera
exclusiva do juiz nem contrariar as sentenças judiciais, sob pena de nulidade dos
respetivos atos da Administração por violação do princípio da separação de poderes –
vício da usurpação de poderes.
o Princípio da prevalência das decisões judiciais
No princípio da prevalência das decisões judiciais, num conflito entre uma decisão
judicial e uma decisão administrativa, como vimos, a decisão judicial tem sempre
prevalência, de acordo com o art. 205º da CRP.

❖ Princípios de acesso à Administração Pública


o Princípio de universalidade de acesso prestacional aos serviços
administrativos

Neste princípio, em condições de igualdade, todos podem ter acesso às


prestações, onde, há, pois, uma satisfação das necessidades por parte da Administração
e, por isso, esta pode criar descriminações.
o Princípio da liberdade de acesso à função pública e cargos públicos
administrativos

No âmbito dos requisitos da Constituição e da lei, qualquer pessoa pode ter acesso
à função pública, podendo candidatar-se.
Nesta base, a regra de acesso à função pública e a cargos públicos é o concurso
público, que garante maior transparência e satisfação do interesse público, pois pode
haver a hipótese de a Administração escolher os melhores para os respetivos cargos.
o Princípio da liberdade de petição

No princípio da liberdade de petição, qualquer um de nós se pode dirigir à


Administração, como por exemplo apresentando uma queixa, onde esta petição pode
ser feita individualmente ou coletivamente.
o Princípio do arquivo aberto

Este princípio significa que estamos perante uma Administração que não tem
segredos, isto é, há uma regra de transparência de acesso a essa mesma Administração,
onde esta faculta aos particulares o conhecimento das decisões e do processo que leva a
essas decisões.

❖ Princípios do procedimento administrativo


o Princípio da decisão

Este princípio diz-nos que qualquer cidadão que se dirija à Administração, deve
ter uma resposta, onde esta resposta corresponde a uma decisão.
Nisto, o cidadão tem o direito a obter uma resposta, mas não tem o direito a obter
uma resposta favorável à sua pretensão.
Assim sendo, temos a diferença entre direito subjetivo – que é o direito a obter
uma resposta –, e interesse legalmente protegido – que é o direito de obter uma
resposta em sentido favorável.
o Princípio da informação

No princípio da informação, um cidadão tem o direito a conhecer aquilo que está


a ser suscitado pela Administração relativamente a si. É, pois, um corolário de uma
Administração aberta e que demostra a transparência administrativa.
Nisto, este princípio relaciona-se com o princípio da igualdade, onde tenho o
direito a ter acesso à informação da decisão relativamente a outra pessoa que estava em
igualdade circunstâncias em relação às minhas.
Por isso, o direito à informação, tal como o direito ao arquivo aberto têm limites,
como por exemplo o segredo de Estado, reserva da vida privada, etc.

o Princípio da fundamentação

O princípio da fundamentação diz-nos que se um cidadão for objeto de uma decisão


contrário áquilo que pretendia, ou uma decisão que é lesiva das suas posições jurídicas,
tenho o direito a obter as razões de direito e de facto que levaram a Administração
a decidir naquele sentido.
o Princípio da notificação

No princípio da notificação, sempre que a Administração decide desfavoravelmente


ou em sentido lesivo, o particular tem o direito de tomar conhecimento através de
um ato específico, que é o ato de notificação, onde este leva ao seu conhecimento a
decisão administrativa.
No entanto, importa distinguir entre o ato que leva ao conhecimento é a
notificação e o conteúdo da notificação, onde não basta a mera publicação.
Por isso, o princípio da fundamentação deve diferenciar-se entre o ato de
notificação e o ato notificado.
Nesta base, não existindo notificação, a decisão não tem eficácia nem é oponível
ao respetivo destinatário.
o Princípio da participação
Neste princípio, temos, mais uma vez um corolário de uma Administração plural,
mas participação não é uma participação na gestão em termos organizativos.
Nisto, cada um de nós tem o direito a ser ouvido antes de ser tomada uma
decisão lesiva sobre nós – direito de defesa.
Assim, consubstancia-se um direito de audiência prévia dos administrados, ou
seja, antes de ser tomada uma decisão contra alguém, esse alguém deve previamente ser
ouvido.
Perante o exercício deste direito, a Administração tem o dever de, no caso de achar
que o particular não tem razão, fundamentar as razões pelas quais não acolhe as
observações críticas dos particulares.
Por outro lado, se a Administração considerar que as razões dos particulares são
procedentes as razões do particular, deve reformular a sua decisão.
O princípio da participação do particular é, pois, um elemento nuclear na
respetiva decisão administrativa, que se liga com a manifestação da importância da
intervenção dos particulares nas decisões administrativas
Há, assim, uma valorização das decisões de natureza contratual em relação às
decisões de natureza individual e unilateral.

❖ Princípios de controlo da Administração Pública


o Princípio da tutela jurisdicional efetiva

De acordo com o art. 269º da CRP, no princípio da tutela jurisdicional efetiva,


perante uma ação ou omissão administrativa, os particulares têm de ter aberta a
possibilidade de acesso aos tribunais, onde estes são os últimos garantes do respeito
pela juridicidade.
Nisto, a tutela jurisdicional efetiva diz-nos que, para cada atuação administrativa,
devem sempre existir meios que permitam ir a tribunal questionar a validade do agir
da Administração.
o Princípio da responsabilidade civil da administração

Neste princípio, traduz-se na ideia de que quem causa um dano, deve reparar esse
dano, onde, se não for possível a reconstituição natural, temos a indemnização
pecuniária.
Assim, esta responsabilidade civil da Administração tanto pode ocorrer por
condutas de ação como por condutas por omissão perante os particulares.
Neste sentido, a responsabilidade civil pode ter por base um facto ilícito ou um
facto lícito, uma responsabilidade por efeito de risco – responsabilidade
extracontratual – ou uma responsabilidade de incumprimento contratual.
o Princípio da intervenção moderadora do provedor de justiça

O provedor de justiça não decide, pois perante uma queixa que o particular lhe
dirige, limita-se a analisar essa mesma queixa, verificando que se há uma razão ou
não que justifica e que permita dar acolhimento à queixa que foi formulada pelo
particular.
Se o provedor de justiça verifica que não há acolhimento, informa o particular,
pondo termo ao procedimento.
Por outro lado, se o provedor de justiça achar que o particular tem razão, deve
ouvir, formulando uma recomendação.
No entanto, a recomendação não é uma decisão, mas sim um alertar da entidade
competente que deve tomar as providências necessárias relativamente à queixa
apresentada.
Assim sendo, o provedor de justiça possui uma função moderadora, onde um
particular pode tomar providências junto deste.
o Princípio da responsabilidade política da Administração Pública

De acordo com este princípio, toda a Administração pública é responsável


politicamente, onde, neste sentido, os principais órgãos de decisão são responsáveis,
onde têm de prestar contas da respetiva atuação. Por exemplo, o Governo é responsável
politicamente perante a Assembleia da República e o eleitorado.
o Princípio do controlo administrativo

Segundo este princípio, a Administração também se controla a ela própria, onde


o autor do ato tem o dever funcional de controlar a legalidade e o mérito da sua atuação.
No entanto, pode ocorrer que existam estruturas dentro da Administração que
possam controlar a atuação daquele que foi o decisor.
Esse controlo no fundo é, pois, uma garantia de que no fundo a Administração está
na primeira linha do controlo da sua própria atividade – autocontrolo.
Numa razão de racionalidade, se os tribunais podem controlar a Administração, é
preferível que esta possa verificar se a sua atuação é legal.
o Princípio do respeito por mecanismos internacionais e europeus
de garantia

Neste princípio, a Administração Pública portuguesa não é apenas controlada


por instituições internas portuguesas.
Nisto, é possível que haja um controlo internacional e no âmbito das instâncias
europeias, seja esse um controlo judicial feito por tribunais exteriores ao Estado
português ou autoridades administrativas exteriores ao Estado português.
Por exemplo, a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais ou o tribunal de justiça da
União Europeia são mecanismos de controlo do agir administrativo, cuja fonte
instituidora não têm que ver com o direito português, mas sim com o direito da União
Europeia.

❖ Princípios de incidência intra administrativa


o Diferença entre direitos subjetivos e garantias institucionais

Neste sentido, na diferença entre estes conceitos, enquanto os direitos subjetivos


são posições jurídicas ativas pensadas nos particulares, onde tanto podem ser
direitos subjetivos públicos criados por Direito Público ou direitos subjetivos privados
criados por Direito Privado.
Nesta base, as garantias institucionais são posições jurídicas de reforço, isto é, de
prevalência tituladas em função de uma instituição, onde, por isso, não são direitos
subjetivos, mas sim posições jurídicas ativas de entidades públicas, como por
exemplo, a autonomia das regiões autónomas.
Num outro exemplo, de acordo com o art. 76º da CRP, reconhece-se a título de
direito fundamental das Universidades a respetiva autonomia, onde esta autonomia é um
direito fundamental e não uma mera garantia institucional.
Portanto, há certos poderes administrativos que a Constituição leva ao ponto de
configurar como verdadeiros direitos fundamentais, como por exemplo a autonomia
estatutária, pedagógica, científica, etc.
No entanto, a lei pode condicionar o exercício desta autonomia ou deste direito
fundamental, uma vez que não é na sua totalidade operativo diretamente pela
Constituição, já que a lei definirá os termos de exercício dessa mesma autonomia.
Por outro lado, isto significa que, é possível a existência de direitos fundamentais
titulados por entidades públicas, ou seja, os direitos fundamentais não são um
exclusivo das entidades privadas.
Contudo, não é possível a existência de direitos fundamentais de entidades públicas
que sejam oponíveis face a entidades privadas.
Para além disto, podemos dizer que as garantias institucionais de natureza
administrativa condicionam a atuação dos poderes públicos, sendo possível entre
entidades públicas uma destas reivindicar que tem uma garantia da autonomia que
limita a atuação do Estado.

❖ Análise da identidade estruturante da Administração


Pública
Nos traços materiais caracterizadores da Administração Pública, temos a
personalização da Administração.
Na personalização da Administração, dentro desta pública há entidades, isto é, há
pessoas jurídicas, onde o reforço da personalidade pública ocorre durante o XX em
Portugal.
O contributo de Coimbra e de Lisboa, liga-se a personalidade do Estado com a
ideia de subordinação ao direito, onde a pessoa jurídica é uma realidade do direito e,
por isso, está subordinada ao direito.
Nesta base, a subordinação ao direito poderá ser a subordinação ao direito público
– regra -, ou a subordinação ao direito privado – exceção. É, pois, possível, entidades
privadas serem criadas por entidades públicas.
Assim sendo, o direito permite que haja uma Administração Pública sob forma
privada, onde temos pessoas coletivas privadas criadas e controlas por entidades
públicas, onde estas podem criar entidades privadas para prosseguirem fins de natureza
pública.
Por outro lado, é possível a existência de uma personalidade internacional ou
europeia, que não esteja vinculada ao direito português, mas que possa agir no âmbito
da Administração pública Portuguesa, o que significa que podem existir interesses
públicos transnacionais que produzam efeitos em Portugal.
Contudo, a personalidade jurídica liga-se ainda com um pluralismo intra
administrativo, onde há múltiplas entidades públicas, como por exemplo o Estado,
duas regiões autónomas, centenas de municípios, etc.
Para além disto, existem ainda entidades públicas que têm interesses públicos
próprios, mas também existem entidades que fazem parte da Administração e que
não têm interesses próprios, seguindo, pois, o interesse da entidade que as criou.
Com isto, surge uma dificuldade em definir o que seja uma entidade pública,
onde esta possui efeitos quanto ao direito regra que lhe é aplicado, quanto à jurisdição
que vai controlar a sua atuação e efeitos em matéria de responsabilidade civil.
Por isso mesmo, não é possível criar entidades públicas ou privadas como forma
de fuga à responsabilidade civil, pois se assim for, haverá casos de fraude à lei.
Na pluralidade de entidades dentro da Administração, esta tem uma consequência,
que é a conflitualidade administrativa, onde nem sempre existe uma situação de
bilateralidade administrativa, isto é, um relacionamento da Administração com um ou
mais sujeitos determinados e com decisões com eficácia inter partes.
Nisto, a Administração decide para uma pluralidade indeterminada de sujeitos,
onde as suas decisões têm uma eficácia erga omnes.
Assim, quando há uma pluralidade destinatários públicos ou privados, a
consequência é que a regra é a existência de potenciais conflitos de interesse, onde
uma mesma decisão não vai agradar de igual a todos os destinatários.
Como tal, isto gera uma multilateralidade decisória, o que faz com que a
administração seja cada vez mais uma Administração que gera conflitos de interesses
antagónicos públicos e privados.
Assim sendo, há uma complexificação do funcionamento interno da
Administração e das respetivas decisões, o que leva à existência de relações
controvertidas no interior da Administração e a conflito de interesses entre entidades,
pois existem decisões com efeitos multipolares.

❖ Complexificação da atuação administrativa


Nisto, esta complexidade situa-se ao nível das relações intersubjetivas, isto é,
entre sujeitos na própria Administração, o que permite configurar uma pluralidade de
entidades públicas reivindicadoras de espaços próprios de decisão, onde se procura
privilegiar a satisfação dos seus próprios interesses.
Por outro lado, podem ainda existir conflitos negativos ou positivos de
atribuições, quando duas ou mais entidades públicas acham que não são competentes
sobre determinada matéria, ou quando duas ou mais entidades públicas se acham
competentes sobre uma mesma matéria.
Por isso, quando se trata de uma matéria agradável de decisão, há mais do que uma
entidade competente para decidir sobre a mesma, o que não acontece noutro tipo de
matéria que não seja agradável de decisão.
Contudo, para além destes conflitos poderem ser protagonizados no interior do
território nacional entre entidades públicas internas, podem ainda existir conflitos com
públicos transnacionais, sejam pela União Europeia ou por outros Estados
estrangeiros.
Já na complexidade das relações intrasubjetivas, estas inserem-se no interior do
mesmo sujeito jurídico, que podem ser interorgânicas, isto é, entre órgãos da mesma
entidade pública, como por exemplo um conflito entre a Assembleia Municipal de um
município e a Câmara municipal, onde este conflito pode ter que ver com o tipo de
competência, ou interorgânicas, isto é, no interior de um mesmo órgão, onde esta
conflitualidade pode ter que ver com vicissitudes ao nível dos respetivos titulares.
Por outro lado, ainda nas relações intrasubjetivas, podemos ainda verificar a
existência de conflitualidade no âmbito de relações laborais, isto, entre trabalhadores
vinculados no âmbito da função pública, como por exemplo entre titulares profissionais
no direito à greve.
Ao nível da conflitualidade jurídico-privada, esta conflitualidade de interesses
reflete-se no âmbito da atuação administração pelo facto de poderem existir conflitos
entre o interesse público e interesses privados, onde estes, num primeiro momento,
são conciliáveis.
Por exemplo, imaginemos que o interesse público determina o encerramento de
centros saúdes. Esta decisão pode entrar numa situação de conflito se, do outro lado,
encontrarmos interesses privados conciliados, uma vez que querem que os centros de
saúde não sejam encerrados.
Há, pois, um conflito entre um interesse público que dita uma solução e
interesses privados conciliados na mesma posição.
Contudo, pode ocorrer que a decisão programada ou tomada seja ditada por um
interesse público que tem do outro lado interesses privados inconciliáveis e
autónomos, em vez de estarem convergentes numa única solução.
Por exemplo, no licenciamento de uma fábrica, o interesse público dita que existam
mais postos de trabalhos, enquanto nos interesses privados surgem grupos
ambientalistas, que argumentam que a fábrica vai produzir poluição e, por isso,
opõem-se àquela medida.
No entanto, podemos encontrar movimentos de pessoas desempregadas que
querem que a fábrica seja instalada, onde, por isso, temos privados que defendem
situações opostas.
Nisto, a mesma situação pode ter uma pluralidade de efeitos e de destinatários,
gerando uma conflitualidade entre os interesses privados inconciliáveis, o que significa
que podem existir interesses privados heterógenos em colisão ou interesses privados
homogéneos em colisão, como por exemplo quando há um concurso público para uma
determinada vaga de um cargo.
Desta forma, a Administração depara-se com uma pluralidade de interesses e
contra interesses, onde se gera uma complexidade decisória e, por isso, a
Administração vê-se obrigada a mediar e a ponderar este mesmo conflito. Visa-se,
pois, determinar que espaço deve ter cada um dos interesses em conflitos.
Assim sendo, a Administração toma uma decisão, onde esta, igualmente, gera
descontentamento, pois nem todos os interesses podem ser satisfeitos.
Nesta base, cada um dos intervenientes pode ir para Tribunal para defender os
seus interesses, procurando encontrar uma base constitucional para reivindicar uma
dada posição privilegiada.
Por isso, as declarações de direitos servem de argumentos reforçados para a
defesa das respetivas posições jurídicas, onde, por isso, a conflitualidade
administrativa termina em conflitualidade judicial, pois os tribunais são chamados a
resolver estas questões.

❖ Ponderação da Administração Pública


Nesta ponderação, determina-se que a Administração do século XXI se insere
numa visão de que o direito é uma ponderação, onde podemos encontrar uma
ponderação judicial, administrativa e legislativa.
Com isto, podemos dizer que a ponderação se liga com o balanceamento entre o
interesse A e o interesse B, harmonizando-os.
Assim sendo, a ponderação conta com três momentos, nomeadamente:
● Ponderação da situação em abstrato, onde, antes de fazer uma lei, o legislador
toma em consideração os interesses;
● Interpretação das normas, onde, quando se interpreta, o sentido da norma é
tido em conta relativamente às circunstâncias existentes, onde estas podem
apelar ao momento histórico, sistemático ou ao critério teleológico –
ponderação tendo em conta os fatores;
● Aplicação da norma, onde, na ponderação aplicativa, tendo uma situação
factual, temos que ver como a norma se aplica nessa mesma situação.

Com isto, atualmente, podemos verificar que há uma ampliação da margem de


livre apreciação administrativa, onde o direito possui conceitos indeterminados, o que
significa que a Administração assume o protagonismo da decisão ponderativa.
No entanto, a ponderação só se inicia quando as antinomias normativas não
podem ser resolvidas por critérios normais, nomeadamente o critério cronológico,
onde uma norma posterior revoga uma norma anterior, ou o critério da especialidade,
onde lei especial afasta lei geral.
Assim, o objeto da ponderação são os bens, interesses e valores.
Nisto, ao nível dos bens, a primeira ponderação como critério fundamental é saber se
o bem em causa tem ou não proteção constitucional, onde os bens que são objeto de
proteção constitucional têm um valor reforçado, independentemente de esta ser
interna, internacional ou europeia.
Quanto aos interesses, temos de saber se os interesses em causa são verdadeiros
direitos subjetivos ou meros interesses legalmente protegidos, onde, se são direitos
subjetivos, a proteção é reforçada.
Contudo, dentro dos direitos subjetivos, precisamos de saber se têm proteção
constitucional – direito fundamental –, ou se é um mero direito subjetivo
alicerçado no direito ordinário.
Nesta base, quanto aos valores, existem uma ordenação hierárquica ditada pela
Constituição, como por exemplo a dignidade humana que tem um reforço de primazia
face ao interesse público.
Portanto, nos cenários de ponderação existentes, de acordo com o princípio da
separação de poderes entre a proteção abstrata e a proteção do caso concreto, onde
a última decisão em matéria de ponderação compete aos tribunais.
Assim, de acordo com o princípio da proporcionalidade, os tribunais podem fazer
um controlo que tem que ver com o caminho que é seguido pela ponderação – controlo
do procedimento de ponderação –, ou um controlo do resultado da ponderação –
controlo da decisão que é expressão da ponderação.
Portanto, nas fases procedimentais da ponderação, há que identificar as
realidades em colisão, onde se tem que ter presente quais os conflitos, e o peso que
cada uma destas realidades têm.
Por outro lado, numa terceira fase, temos que ver a prevalência das realidades em
colisão, onde, por isso, há uma ponderação efetiva no momento da decisão.
Contudo, apesar disto, existem efeitos da ponderação administrativa,
nomeadamente a insegurança da decisão, a substituição do modelo da lei, que é
substituído por um modelo de protagonismo da Administração e dos tribunais, e
aumento da conflitualidade jurídica, social e judicial.

❖ Especialização: Administração Pública técnico-científica


Na especialização da Administração Pública técnico-científica, verifica-se cada
vez mais o peso da decisão administrativa nas estruturas burocráticas e técnicas, isto é,
decidir no âmbito da função administrativa exige uma Administração Pública
especializada.
Por exemplo, no âmbito das medidas de combate à pandemia, a DGS e os técnicos
possuem um grande protagonismo, uma vez que determinam as decisões políticas, onde,
por isso, assiste-se a uma realidade técnico-científica.
Assim, atualmente num Estado social, cada vez mais as decisões políticas,
administrativas e legislativas são condicionadas na sua preparação e execução por
intervenção de especialistas.
Nesta base, isto leva a que se exista a uma Administração técnico burocrática
oposta a uma Administração politicamente legitimada, havendo, pois, uma
conflitualidade.
Na Administração técnico burocrática, o Estado procura minimizar ou neutralizar
risco, uma vez que estas decisões técnico-científicas excluem a democracia, o que
leva a uma limitação técnico-científica da legitimidade político-democrática.
Com isto, existe um poder de especialista dentro da Administração, que prepara
as decisões, como por exemplo o orçamento de Estado, onde, apesar de ser de iniciativa
do Governo e ser aprovada pela Assembleia da República, quem prepara o orçamento
são os técnicos.
Portanto, com este poder pericial, tendo uma função preparatória de decisões,
gera-se uma limitação de fiscalização judicial, uma vez que existe um espaço de
reserva de Administração.
Contudo, este poder pericial nem sempre é um poder que tenha soluções uniformes,
isto é, é possível a existência de discussão sobre qual a solução, como por exemplo
soluções diferentes de economistas para uma determinada realidade.
Assim sendo, o poder técnico-científico nem sempre dá respostas uniformes,
onde, por outro lado, a resposta que se obtém hoje, pode ser diferente da resposta de
amanhã sobre casos idênticos.
Por exemplo, a solução adotada em março e abril relativamente à situação de
pandemia foi a melhor solução em termos técnicos, mas, no entanto, atualmente não
será, uma vez que o país não pode estagnar economicamente.
Nesta base, a solução técnica pode variar consoante a evolução do tempo, onde se
verifica uma permeabilidade destas soluções.
Portanto, o poder técnico-científico não é imutável, pois sofre alterações.
No âmbito deste poder, os instrumentos técnico-científicos do poder podem ter
três áreas diferentes de incidência, nomeadamente:
● Reserva de formulação das normas;
● Monopólio interpretativo e aplicativo da normatividade, como por exemplo
a avaliação dos alunos;
● Exclusivo de decisão concreta avaliativa, onde a avaliação de cada um deve
ser feita por quem tenha uma habilitação técnico-científica no âmbito da
respetiva matéria.
❖ Privatização: Administração Pública privatizada

Como sabemos, a privatização está ligada ao Neoliberalismo, com a influência


dos privados na atuação administrativa, onde surge o conceito de privatizar, tornando
privado aquilo que é público, e reprivatizar, tornando privado aquilo que, tendo sido
público, antes já havia sido privado.
Por exemplo, um bem que foi nacionalizado e que depois é privatizado, diz-se há
reprivatização.
Nisto, existem vários tipos de privatizações, nomeadamente:
● Regulação administrativa da sociedade, onde o Estado deixa de regular, uma
vez que este, deixando de elaborar as normas, remete para as entidades privadas
a respetiva autorregulação – desregulação;
● Direito regulador da Administração, onde a Administração deixa de aplicar
Direito Administrativo para passar a aplicar direito privado;
● Formas organizativas da Administração, onde, através de entidades públicas,
se criam entidades privadas que exercem funções administrativas, o que permite
que exista uma Administração Pública sob forma privada controlada por
entidades públicas;
● Gestão ou exploração de tarefas administrativas, onde o Estado atribui a
titulares a gestão do funcionamento de determinados serviços, como por
exemplo a privatização da gestão dos hospitais, o que acarreta riscos;
● Acesso a uma atividade económica, onde a Constituição permite que certos
setores da economia estejam reservados a entidades públicas, como por exemplo
a nacionalização da banca, em que se permitiu que os privados pudessem ter
bancos;
● Capital social de empresas públicas, como por exemplo a TAP, que, sendo
nacionalizada, veio a ser objeto de um fenómeno de privatização, onde se
permitiu que o seu capital social não fosse apenas detido por entidades públicas,
mas também por entidades privadas, sendo titulares de ações;
● Critérios substantivos de decisão administrativa, onde as decisões
administrativas são ditadas por razões de interesse público, mas também
por uma lógica de mercado, como por exemplo saber se se deve ou não
continuar a explorar uma determinada empresa de transportes, apesar de esta dar
prejuízos;
● Mecanismos de controlo da Administração, onde, por vezes, a Administração
é controlada por entidades privadas, como por exemplo quando vamos a uma
entidade pública, quem faz a sua segurança podem não ser os polícias, mas
empresas de segurança privada.

❖ Caracterização da Administração Pública em termos


materiais
o Administração Pública eletrónica

A Administração Pública eletrónica é uma consequência da mudança do paradigma


da sociedade, onde, atualmente, a informação é desmaterializada.
Nas últimas décadas, ocorreu uma democratização do computador, onde este é
acessível a tudo e a todos, uma vez que a ligação permanente à internet e a existência de
redes sociais globais tornam a sociedade mundial numa sociedade global.
Por outro lado, a informática e a Administração Pública, permitem criar a noção de
uma Administração Pública eletrónica.
Inicialmente, o computador era um modelo de arquivo de informação, que,
atualmente, se tornou num computador funcionário, onde parte dos atos
administrativos são atos informáticos, isto é, comunicado por vias informáticas.
Assim, há áreas onde a Administração é praticamente informática, como por
exemplo no âmbito tributário, segurança social, educação, etc.
Nesta base, temos ainda o acesso dos cidadãos por via da internet e a criação de
uma Administração online permanente, que está aberta 24h sob 24h.
Contudo, há a existência de riscos e perigos, desde logo uma desumanização, onde
há uma falta de contacto direto, desconfiança e insegurança sobre a privacidade e
acesso às fontes e documentos.
Por outro lado, coloca-se em causa o princípio constitucional da aproximação dos
serviços às populações, onde a Administração eletrónica não tem a preocupação de
aproximação dos serviços às populações.
Com isto, podemos ainda verificar que existe uma profunda desigualdade entre
os cidadãos, pois há um número significativo de cidadãos excluídos desta nova
Administração, como por exemplo o caso das aulas online, que excluem os alunos que
não têm acesso ao computador.
Além disto, esta Administração eletrónica envolve investimentos avultados, que
estão sujeitos a um grau de desatualização, onde, por outro lado, há uma supressão de
postos de trabalhos, ou seja, o computador pode fazer aquilo que vários funcionários
poderiam fazer.
Nisto, há importância da formação sucessiva dos funcionários, uma vez que a
tecnologia evolui, onde esta sucessiva formação profissional evolve investimentos
reforçados, uma vez que o equipamento começa a estar desatualizado.
Nesta base, existem também problemas de compatibilidade e inoperatividade de
equipamentos e programas, como por exemplo uma incompatibilidade do programa
usado na reitoria relativamente ao programa da Faculdade.
Assim, de acordo com o art. 35º/1 da CRP, a Administração eletrónica deve
respeitar o direito à autodeterminação informacional.

❖ Linhas de vinculação da Administração eletrónica


● A Administração eletrónica deve subordinar-se às normas constituições, pois
esta Administração não está fora do direito e, portanto, está subordinada à
Constituição e à lei;
● Com o princípio da paridade garantística, quer o exercício tradicional da
atividade administrativa, quer as novas formas de agir eletrónico estão sujeitas
às mesmas garantias por parte dos cidadãos.

Nisto, os cidadãos não podem ter diminuído o seu grau de proteção o seu grau
de garantia contra a Administração pelo facto de esta usar novas vias e novos
processos eletrónicos;
● Reserva de lei, onde todas as exigências de utilização de meios informáticos ou
eletrónicos deve ser com fundamento na lei.

Nisto, há um princípio de utilização de meios alternativo relativamente aos


meios eletrónicos, onde não é possível que o meio eletrónico seja o único veículo de
comunicação do particular com a Administração
Dado isto, tem de haver meios alternativos para permitir que os cidadãos que
não têm acesso possam contactar com a Administração;
● Princípio de acessibilidade à informação, onde todos temos que ter
conhecimento dos procedimentos relativamente aos quais somos visados;
● A ideia da neutralidade tecnológica, onde a tecnologia não pode beneficiar
uma determinada conceção;
● Princípio da equivalência entre o suporte digital e o suporte físico;
● Princípio da segurança no relacionamento eletrónico;
● Princípio de uma equilibrada ponderação entre a confidencialidade e a
garantia da transparência;
● Princípio da cooperação entre as diferentes Administrações Públicas no
âmbito eletrónico.

Nisto, questiona-se se existe um direito fundamental dos cidadãos ao


relacionamento por meios eletrónicos com a Administração Pública.
De acordo com o professor Paulo Otero, este direito coloca a questão de saber se,
existindo, qual a sua relevância constitucional.
Dado isto, este direito ou entra pela cláusula aberta do art. 16º da CRP ou será um
direito implícito no art. 35º da CRP.

❖ Desterritorialização da Administração Pública


Até ao século XXI, a Administração Pública era baseada na ideia de território,
onde assentava na ideia de Estado.
Nisto, nas últimas décadas assiste-se a um progressivo descentrar da
Administração do Estado, ou seja, é possível a existência de uma Administração
Pública sem Estado.
Com isto, ocorre uma certa crise da lógica tradicional de um território e da
soberania ligada ao Estado.

Nisto, esta crise dá-se pela abertura de fronteiras, espaços económicos, pela
circulação de pessoas, pelo desenvolvimento do comércio internacional, etc.
Neste sentido, a mundialização, enquanto fenómeno sociológico e económico,
também tem projeção no mundo administrativo.
Por isso, atualmente, há uma pluralidade de situações jurídico-administrativas
atravessadas por fronteiras que têm ligações com vários Estados, o que justifica
crise do princípio da territorialidade e do princípio da soberania, onde a crise da
pandemia veio demonstrar a importância destas mesmas fronteiras.
Nesta base, nos últimos tempos, tem havido uma valorização do território, do
Estado e da consequente administração do mesmo, onde este é um fenómeno
meramente circunstancial.
Normalmente, a regra é a da abertura das relações jurídico-administrativas a
fenómenos transnacionais atravessados por fronteiras, o que significa há interesses
públicos transnacionais e uma internacionalização dos problemas nacionais.
Esta internacionalização dos problemas nacionais manifesta-se através da tutela e
garantia dos direitos humanos, onde deixou de ser um problema da fronteira dentro
cada Estado para passar a ser um problema de toda a comunidade internacional.
Nisto, verifica-se a insuficiência do Estado para fazer face aos vários fenómenos
que ocorrem.
Por outro lado, tráfico de pessoas e de mercadorias levam no fundo ao
reconhecimento de que tem de existir atos administrativos transnacionais em matéria
de transportes, de correios, telecomunicações, títulos académicos, etc.
Nisto, o acesso tecnológico a novas riquezas exige regulamentação internacional,
onde se verificam tentativas de regulação de realidades que são informais, como por
exemplo as agências de rating.
Portanto, atualmente, há uma sociedade global em rede e, por isso mesmo, um
espaço jurídico global, onde cada Estado partilha poderes decisórios com outros
Estados, com organizações internacionais, com entidades privadas, etc.
Nessa partilha de poderes decisórios, também está presente a partilha de poderes no
âmbito administrativo e, por isso mesmo, a criação de formas de Administração
Pública sem Estado.
Há, pois, a emergência de um direito administrativo sem Estado, o que significa
existe espaços administrativos comuns, onde há três tipos de espaços administrativos,
nomeadamente:
● Zonas de Administração exclusiva do Estado, onde o Estado continua a ser titular
dos poderes decisórios;
● Zonas de exercício comum da função administrativa, onde não é apenas o Estado
português, mas com outras entidades;
● Zonas de Administração exclusiva de estruturas supraestaduais, como por
exemplo o caso típico da União Europeia, que tem matérias que só ela decide.
Temos, pois, uma zona de decisão exclusiva de uma entidade supranacional.

Com isto, podemos dizer que há um esvaziar da administração do Estado por


força da sua internacionalização, onde, com a intervencionalização da Administração
pública, explica-se a perda de poderes do Estado.
De acordo com o professor Paulo Otero, não existe uma “morte do Estado”, pois
por exemplo, na sequência da pandemia, tem-se reforçado a importância do Estado,
uma vez que este é o melhor garante da liberdade de cada um de nós.
Contudo, há uma mudança da Administração Pública, pois passamos a ter uma
Administração sem Estado, como por exemplo a Administração Pública das
organizações internacionais.

❖ Formas de Administração Pública sem Estado


o Administração Pública das uniões internacionais

Na Administração das uniões internacionais, esta surge no século XIX, com a génese
de um direito administrativo internacional.
Assim, os Estados eram os protagonistas não isolados, mas em conjunto no
âmbito destas uniões internacionais. Por exemplo, no âmbito da exploração de rios na
Europa central.
Nesta base, este exemplo foi um dos embriões das organizações internacionais.
Assim, verifica-se a existência de interesses transnacionais, com organizações
internacionais de vocação universal e vocação regional, que têm estruturas
administrativas e funcionários próprios.
Contudo, apesar de existirem problemas financeiros, têm uma projeção da sua
atividade junto dos Estados, onde a ONU é o exemplo de uma organização
internacional à escala mundial, que tem uma estrutura administrativa própria, o significa
que existe uma Administração Pública da ONU.

o Administração Pública da União Europeia

No âmbito da União Europeia, é possível a existência de uma Administração


Pública da União Europeia, onde esta é uma associação de Estados atípica com uma
realidade Administrativa própria.
Esta realidade Administrativa própria significa que há matérias sobre as quais a
União Europeia pode decidir, isto é, há um interesse público da União Europeia e, por
isso, têm estruturas orgânicas próprias, onde existe uma Administração europeia
em sentido orgânico.
Por outro lado, há ainda uma função pública europeia.
Além disto, existe um espaço administrativo europeu, que sublinha a
interdependência ou influência recíproca cruzada entre as Administrações Públicas dos
estados membros que influenciam a Administração da União Europeia e vice-versa.
Nisto, as Administrações dos Estado membros influenciam-se entre si
reciprocamente, onde se verifica o fenómeno da europeização das Administrações
Públicas nacionais.
Assim, há formas de coadministração, isto é, formas em que duas ou mais
administrações decidem matérias, como por exemplo a execução administrativa do
direito da União Europeia é feita por via de regra pelas administrações de cada Estado
membro.
Quando as administrações dos estados membros executem o Direito da União
Europeia, estas são delegadas da Administração da União Europeia.
Por outro lado, existem mecanismos horizontais de relacionamento administrativo
entre os diversos estados e entre a União Europeia e as administrações dos Estados
membros. Há, pois, uma projeção interna ou nacional das decisões da União
Europeia no âmbito da Administrações Públicas nacionais.
Nesta base, há uma tentativa harmonizar e aproximar das legislações entre os
Estados membros, como forma de facilitar a livre concorrência, a liberdade de
circulação de pessoas e de bens ou de prestação de serviços.
Atualmente, existe uma Federação Administrativa Europeia, onde esta federação
tem duas particularidades:
● Há uma Administração pública direta da União Europeia, onde esta tem
entidades e órgãos próprios funcionando como uma verdadeira Administração
federal;
● As Administrações Públicas dos Estados membros, uma vez que têm de executar
o direito proveniente da União Europeia, funcionam como administrações
Públicas federadas.
o Administração Pública por organizações não governamentais

Na Administração Pública por organizações governamentais, significa que há áreas


de atuação no plano internacional de organizações que não são controladas pelos
governos, como por exemplo a UEFA.
Nisto, estas organizações não governamentais podem ter missões de interesse
público reconhecidas pelas Administrações dos Estados e, por isso, podem exercer o
exercício privado de funções públicas de natureza administrativa no plano
internacional.
Naturalmente, pode haver o risco de uma governação administrativa privada
global, sobretudo quando algumas das entidades privadas têm um poder de decisão à
escala internacional. Por exemplo, a entidade que tem competência para o registo das
siglas de acesso à internet.
Em suma, como vimos, esta Administração sem Estado tem três grandes formas
de intervenção.
Por isso, estas três áreas permitem concluir que a Administração Pública nacional
é, atualmente, um enclave, ou seja, há um interesse público nacional que é o que resta
do interesse público geral.
Por outras palavras, a Administração Pública Nacional é uma Administração
apenas com o que resta de tudo o que não é nem Administração Pública das
organizações internacionais, nem Administração Pública da União Europeia, nem
Administração Pública das organizações não governamentais.
Há, pois, uma debilitação de relevância da Administração Pública nacional.
Contudo, podemos ainda reter que:
● A Administração Pública nacional também pode prosseguir interesses
públicos transnacionais, isto é, não prossegue apenas o interesse público
nacional;
● A Administração Pública dos Estados pode ser subordinada a atos de
organizações internacionais e a atos da União Europeia.

Nisto, a Administração Pública nacional pode ter que dar cumprimento a atos
provenientes de organizações internacionais e da União Europeia.
Assim, levanta-se o problema da responsabilidade política dos órgãos
administrativos portugueses, não apenas perante o Parlamento nacional, mas também
perante estruturas extranacionais;
● A Administração Pública nacional está condicionada por interesses
transnacionais, que têm de ser ponderados nas decisões administrativas
nacionais;
● Pode ocorrer cenários em que a Administração Pública nacional aparece em
situação de protetorado internacional, isto é, como uma Administração
Pública subordinada na sua globalidade, como por exemplo o que aconteceu
com a Troika;
● Atualmente, a Administração Pública nacional é um enclave de reduzida
dimensão territorial e de liberdade decisória por força deste descentrar
do centro da Administração Pública nacional para estruturas internacionais e
supranacionais.

❖ Efeitos no tempo do agir da Administração Pública


Na realidade, a Administração Pública tem no seu agir uma projeção no tempo
da sua atividade, onde se colocam problemas sobre a liberdade conformadora da
Administração.
Nisto, há uma mutabilidade intencional no legislador e na Administração, onde, no
entanto, esta característica tem limites, como por exemplo o princípio da segurança
jurídica ou o princípio da tutela da confiança.
Assim, a mutabilidade intencional pode ter dois propósitos, nomeadamente:
● Configurar em termos diferentes o futuro, mas enquanto a norma aplicável
atualmente visa regular a situação futura, neste caso, obedece-se às ideias de
previsibilidade e de calculabilidade. Há, pois, a importância da proteção
da confiança;
● Reconfigurar o passado, ou seja, dar a situações uma nova característica
jurídica.

Nisto, podem acontecer a situações jurídicas pretéritas que ainda estão em vigor
– retro conexão – ou o direito pode pretender reconfigurar o passado face a situações
jurídicas que já não estão em vigor – retroatividade extrema.
Contudo, estas situações de reconfiguração do passado levantam problemas de
ponderação com outros princípios jurídicos, designadamente o princípio da
segurança jurídica.
Nisto, o fundamento que leva à mutação intencional do direito tem dois
alicerces, nomeadamente:
● Prossecução do interesse público, isto é, a ideia de que há novas visões que
justificam mudança;
● O princípio democrático, ou seja, uma nova linha política pode ter uma
visão diferente da solução normativa.
Contudo, esta nova visão levanta questões de saber se apenas pode produzir
efeitos para o futuro, onde, por isso, surge o limite fundamental, que é o princípio da
segurança jurídica e o princípio da tutela da confiança, que se prende com a
configuração do futuro e o a atendibilidade do passado.

❖ Configuração do futuro
Com a configuração do futuro, ninguém tem o direito à manutenção de uma lei,
pois o princípio é o da mutabilidade intencional.
Nisto, os limites são o princípio da segurança jurídica e o princípio da tutela da
confiança, o que significa que a liberdade de configurar o futuro deve ser sempre feita
dentro do espírito do sistema.
Contudo, em situações jurídicas continuadas, pode ocorrer uma alteração anormal
dos pressupostos de factos que estavam subjacentes, isto é, quando as situações
foram constituídas, havia um cenário de facto que se alterou com o decurso do tempo.
Nisto, a alteração das circunstâncias é uma cláusula implícita em todos os atos
jurídicos, pois é uma exigência de justiça material com uma relevância bilateral, tanto
de justiça material para a Administração, como de justiça material para os cidadãos.
Através desta cláusula, a alteração das circunstâncias torna presente o passado
para se reconfigurar o futuro.
Assim sendo, a questão de justiça material não é possível manter a solução hoje
vigente, o que justifica a configuração do futuro.

❖ Conformação da Administração e atendibilidade do


passado
Nisto, pergunta-se como é que o passado tem relevância atualmente e no futuro, onde
existem dicotomias estruturais a tomar em consideração, nomeadamente a
retroatividade, face a situações já extintas, e retro conexão, com factos iniciados no
passado que mantêm a produção de efeitos hoje no presente.
Nisto, a retro conexão pode ser em sentido próprio, envolvendo uma nova
regulamentação apenas para o futuro, ou pode ter um efeito retroativo, atingindo
efeitos em curso de produção.
Assim sendo, nos limites à atendibilidade do passado, podemos salientar:
● Intangibilidade do caso julgado, onde não é possível a nova regulamentação lesar
as decisões judiciais transitadas em julgado, salvo os casos art. 288º/3 da CRP;
● Proibição da retroatividade sempre que esta envolva sacrifícios pessoais ou
patrimoniais, pois atenta-se sobre o princípio da segurança e sobre o estado de
direito e por isso é inconstitucional;
● Existência de cláusulas de equidade ou normas de direito transitório que visem
regular situações permitindo a segurança e a tutela da confiança.

Por outro lado, há casos de obrigatoriedade de retroatividade, onde não é possível


aplicar sanções desfavoráveis retroativamente, mas, de acordo com o professor Paulo
Otero, é possível serem aplicadas retroativamente decisões sancionatórias favoráveis ao
arguido, de acordo com o art. 282º/3 da CRP.
Há, assim, obrigatoriedade de retroatividade quando está em causa a execução
de uma norma retroativa ou de uma decisão judicial, ou seja, é a lei ou a sentença
judicial que obriga a Administração a praticar atos retroativos.
Para além disto, quando está em causa a interpretação de decisões anteriores, há
obrigatoriedade de retroatividade, uma vez que a decisão interpretativa se integra na
decisão interpretada, retroagindo à data da decisão interpretada.
Face a isto, podemos ainda mencionar a obrigatoriedade de retroatividade na
declaração de invalidade de ato anterior, sobretudo quando a declaração de
invalidade incide sobre um ato desfavorável ao particular.
Contudo, temos ainda o problema da retroatividade das situações inválidas
concretas, onde o princípio geral é a distinção entre nulidade e anulabilidade.
existindo, pois, limites à revogabilidade.
Nestes limites, admite-se as situações anuláveis que se consolidem na ordem
jurídica, situações de nulidade em que se pode admitir o reconhecimento de efeitos de
facto.
Por outro lado, encontramos ainda limites quando esteja em causa a violação da
Constituição ou do direito da União Europeia, de acordo com o professor Paulo Otero,
as situações de invalidade têm elas um regime especial.

❖ Administração Pública e projeção temporal da


conformação inválida
No princípio geral, temos a destruição retroativa dos atos inválidos, como por b a
declaração de invalidade de normas pelo Tribunal Constitucional.
Nisto, perante uma decisão que é inválida, a destruição dessa decisão é
retroativa, tendo um efeito apagador sobre todos os efeitos inerentes a essa decisão
inválida.
Contudo, existem casos em que a retroatividade da decisão de invalidade de
normas não pode ser retroativa, como por exemplo quando envolva decisões judiciais
transitadas em julgado ou decisões administrativas inválidas consolidadas na ordem
jurídica.
De algum modo, aquilo que resulta do art. 282º/3 e o art. 282º/4 da CRP, permite
ao Tribunal Constitucional modelar os efeitos por razões de segurança ou equidade
de normas que declarou inconstitucional.
Nestes casos, é possível que o Tribunal Constitucional permita a modelação de
efeitos de normas inconstitucionais.
Nisto, por razões de equidade, de segurança jurídica ou de interesse público de
excecional relevo, o Tribunal Constitucional pode restringir os efeitos da declaração
da inconstitucionalidade, que pode operar em dois sentidos:
● Perante um caso de inconstitucionalidade, a declaração de
inconstitucionalidade é retroativa, o que significa que são erradicados todos os
efeitos da ordem jurídica que aquela norma produziu.

Face a isto, num primeiro momento o Tribunal Constitucional, pode dizer que a
declaração de inconstitucional só ocorre, por exemplo, a partir de hoje, o que significa
que todos os efeitos produzidos desde que entrou em vigor até ao momento presente,
mantêm-se na ordem jurídica;
● O Tribunal Constitucional tem a jurisprudência que permite que a norma
continue a produzir efeitos, mesmo após a declaração de inconstitucionalidade
com força obrigatória geral – projeção para o futuro.

Por exemplo, em setembro, o Tribunal Constitucional diz que uma norma do


orçamento é inconstitucional, onde apesar disto, a norma deve continuar a ser aplicada
até ao final do presente ano.
A partir do momento em que é do conhecimento público que o Tribunal
Constitucional entendeu que aquela norma é inconstitucional e declarou com força
obrigatória geral, o Tribunal Constitucional permite que a norma continue a ser
aplicada pela Administração até ao final do ano embora seja inconstitucional.
Nesta última hipótese, de acordo com o professor Paulo Otero, há várias dúvidas
sobre a constitucionalidade desta solução.
Nesta base, entre o momento em que é declarada a inconstitucionalidade da norma
com força obrigatória geral e a modelação dos efeitos que o Tribunal faz para projetar
apenas no futuro a produção desses efeitos, durante certos meses, a Administração
aplica uma norma que é contrária à Constituição.
Nisto, quando se permite que a norma continue a produzir efeitos para o futuro, há
uma conformação inválida da atuação da Administração.
De acordo com o art. 282º/4 da CRP, coloca-se a questão de saber se este artigo se
trata de uma norma excecional ou se é um afloramento de um princípio geral, onde, por
isso, é necessário fazer uma reflexão dos seguintes aspetos:
● O que é determinado para as situações de inconstitucionalidade, também é
aplicável à luz da Constituição para os casos de ilegalidade equiparada à
inconstitucionalidade, como por exemplo as situações de violação de uma lei
de valor reforçado.

Nestes casos de ilegalidade, a Constituição trata-os como situações equiparadas a


inconstitucionalidade, onde também aqui se coloca o problema da projeção da
modelação em relação ao passado e em relação ao futuro desses mesmos efeitos;
● De acordo com o art. 282º/4 da CRP, este está pensado para a fiscalização
sucessiva abstrata, onde se pergunta, se o Tribunal, em sede de fiscalização
difusa, verificando que a norma que é chamado a aplicar é inconstitucional,
entende que deve continuar a aplicar a norma por razões de interesse público,
segurança pública ou equidade que o justifiquem.

Se há quem entenda que isto pode acontecer, isto significa que há uma extensão da
ideia do art. 282º/4 da CRP e do poder de modelação de efeitos em sede de
fiscalização difusa;
● Se nas situações de inconstitucionalidade, que são as mais gravosas do
ordenamento jurídico, se permite modelar efeitos, coloca-se a questão do porquê
de não se permitir o mesmo em situações de nulidade administrativa;
● Nas situações de mera anulabilidade, que são é a forma menos gravosa de
violação de legalidade, pergunta-se se não se deve permitir modelação dos
efeitos.

Nisto, temos uma afloração da ideia do art. 163º/5 do CPA, onde se exclui o efeito
anulatório, onde isto tem que ver com o passado, mas também pode ter que ver com o
futuro;
● Por outro lado, coloca-se a questão de saber se a justiça do caso concreto não
permitirá ao Tribunal afastar a solução da Administração mesmo em
situações de validade.

Com isto, se em casos de inconstitucionalidade e ilegalidade, o Tribunal poderá


modelar efeitos, pergunta-se se não poderá também fazê-lo perante situações de
validade, mas ainda que a solução possa ser uma solução que se revele injusta, ou
se o princípio da separação de poderes obsta a isso;
● Coloca-se ainda a questão de saber se a Constituição habilita uma modelação
de efeitos quando não há invalidade.

❖ Administração Pública
De acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, quando se fala em
Administração Pública, tem-se presente todo um conjunto de necessidades coletivas
cuja satisfação é assumida como tarefa fundamental pela coletividade, através de
serviços por esta organizados e mantidos.
Assim, para a sua correta utilização, os serviços têm de funcionar com
regularidade e eficiência.
Por isso, onde quer que exista e se manifeste uma necessidade coletiva, aí surgirá
um serviço público destinado a satisfazê-la em nome e no interesse da coletividade.
No entanto, nem todos estes serviços têm a mesma origem ou a mesma natureza,
pois uns são criados e geridos pelo Estado, enquanto outros são entregues a
organismos autónomos, mas, no entanto, todos funcionam para a satisfação das
necessidades coletivas.
Contudo, apesar de a Administração Pública ser o conjunto de atividades e
organismos, esta possui mais do que um significado, nomeadamente a Administração
em sentido orgânico ou subjetivo e Administração em sentido material ou objetivo.
No entanto, poderemos ainda encontrar um terceiro sentido, que prende com a
Administração Pública em sentido formal, que tem que ver com o modo próprio de
agir que caracteriza a Administração Pública em determinado tipo de sistemas de
administração.
o Administração em sentido orgânico

Neste sentido de Administração, este é um sistema de serviços e entidades,


nomeadamente dos serviços centrais do Estado, como por exemplo o Governo e os
ministérios.
Contudo, de acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, apesar da sua
importância, trata-se apenas de uma parte da Administração Pública no seu conjunto e,
por isso, o âmbito destas figuras não se esgotam.
Assim, apesar ocupar o primeiro lugar face às demais formas de administração, a
Administração Pública não se limita ao Estado, pois comporta outras entidades e
organismo, uma vez que nem toda a atividade administrativa é uma atividade estadual.
Por isso, ao lado do Estado surgem outras instituições administrativas,
nomeadamente os municípios, as freguesias, as Regiões Autónomas, etc.
Assim sendo, em sentido orgânico, a Administração Pública é o sistema de órgãos,
serviços e agentes do Estado, bem como das demais pessoas coletivas públicas, que
asseguram a satisfação das necessidades coletivas.
Por isso, a noção orgânica compreende duas realidades, nomeadamente as
pessoas coletivas públicas e os serviços públicos, e os funcionários e agentes
administrativos.
o Administração em sentido material

Neste sentido de Administração, uma vez que a Administração Pública é uma


atividade, atua-se por forma regular e contínua para a satisfação das necessidades
coletivas.
Assim, a Administração Pública em sentido material é uma atividade atípica dos
serviços públicos e agentes administrativos desenvolvida no interesse geral da
coletividade.
Por isso, os fins do Estado realizam-se através da Administração Pública.
Nesta base, a noção em sentido material não se confunde com as demais atividades.

❖ Organização Administrativa Portuguesa


A organização e o modo como a Administração se encontra estruturada não é
irrelevante para a prossecução dos seus fins e para o entendimento das metas que a
Constituição impõe.
Nisto, a organização administrativa condiciona e é condiciona pelo modelo do
Estado, e pelas linhas de objeto e de fim da atuação da função administrativa, o que
significa que uma organização administrativa ineficiente causará dano à satisfação
do interesse público.
Por exemplo, se não existirem serviços hospitalares aptos a responderem à crise da
pandemia, significa que o Estado vai falhar no combate e no minorar dos efeitos da
mesma.
Nisto, o modelo de resposta da Administração à satisfação da necessidade da
saúde pública passa pela organização dos serviços hospitalares.
Assim sendo, a organização dos serviços hospitalares significa o funcionamento
desses estabelecimentos hospitalares, mas também estes que tenham pessoas e meios
para poder responder à situação da pandemia.
A estrutura organizativa é, pois, determinante para satisfação do fim público.
Historicamente, no século XIX, toma-se consciência de que a organização da
administração é um problema que deve estar à margem da lei, ou seja, significa que há
um espaço em que a lei não deve intervir e é um espaço reservado ao monarca.
Nisto, a organização administrativa sempre foi um modelo presente nas linhas
do Direito Administrativo.
Por isso, surgem três contributos importantes no tema da organização
administrativa, nomeadamente:
● Existência e uma relação entre a reserva do rei típica de um modelo oitocentista
e a reserva de lei, onde na monarquia limitada, a organização administrativa
era uma área fora da reserva de lei, sendo reservada do executivo. Pelo contrário,
nas Constituições de matriz parlamentar, a lei pode intervir e, nesse sentido,
amplia-se a reserva de lei;
● Tensão entre a legitimidade monárquica, protagonizada na reserva do rei e a
legitimidade democrática, protagonizada na reserva de lei.
● A lei como elemento de racionalidade, igualdade e previsibilidade por parte dos
cidadãos, o que leva a que se crie um direito da organização administrativa dentro
do Direito Administrativo.
Nesta base, o direito da organização administrativa é o conjunto de regras e
princípios que disciplinam a estrutura e o funcionamento da Administração
Pública.
Assim, a evolução histórica conduz-nos de um modelo pluralista de organização
administrativa da Idade Média, com a Administração régia, para uma centralidade
da administração régia identificada com a Administração do Estado.
Atualmente, no século XXI, há cada vez mais a consciência de que não há uma
Administração, mas sim várias Administrações, como por exemplo a administração
do Estado, administração das regiões autónomas. etc.
Assim, há uma relação entre organização administrativa e o Estado social, uma
relação entre organização administrativa e participação dos cidadãos e uma
relação entre organização administrativa e privatização, onde há uma tensão entre
saber se certas tarefas devem ser dinamizadas pela própria Administração Pública, ou se
esta própria deve convidar particulares a desenvolver essas mesmas atividades.
Nisto, a Administração Pública pode convidar os particulares em dois cenários
diferentes, nomeadamente:
● Gerir serviços que são públicos, isto é, serviços administrativos, como por
exemplo a privatização de hospitais, onde, apesar de estes continuarem a ser
públicos, a gestão é concedida a um grupo privado;
● Gerir a própria tarefa, onde o Estado se retira das áreas, concedendo aos
privados o desenvolvimento da respetiva atividade, como por exemplo os
transportes coletivos nas grandes cidades e o caso da TAP.

Nisto, esta é uma questão de organização administrativa, mas que possui uma
opção de natureza política.
Assim sendo, as vertentes do poder de organização administrativa são:
● Vertente exterior à Administração Pública, de acordo com o art. 267º da
CRP, onde se possuem normas sobre a estrutura da Administração;

Nisto, também a lei define a estrutura de cada entidade pública, onde, por outro
lado, também se destaca a convenção internacional, onde existem atos de Direito
Internacional e de Direito da União Europeia que têm fortes repercussões em sede de
organização administrativa;
● Vertente interna à Administração Pública, onde há um poder de
auto-organização administrativa, em que a própria Administração estabelece
regras sobre a sua organização e funcionamento, que podem ser regras entre
entidades públicas – auto-organização intersubjetiva –, regras no interior de
cada entidade pública – auto-organização intrasubjetiva –, regras dentro de
cada sujeito – relações entre órgãos –, ou regras de organização interna dos
próprios órgãos, como por exemplo os órgãos colegiais.

De acordo com art. 198º/2 da CRP, temos um exemplo de organização


administrativa, onde se define a organização e funcionamento do Governo.
Nisto, atualmente, existe uma abertura externa da organização administrativa
nacional, pois existem pessoas coletivas externas que podem colaborar com a
Administração Pública portuguesa.
Por outro lado, existem ainda privatizações do setor empresarial público
português que dão a Estados estrageiros poderes sobre entidades que, até há pouco
tempo, eram parte do setor público português, como por exemplo a EDP.
Nisto, apesar de a EDP ter sido privatizada, quem cobrou as ações foram empresas
que são controladas pela República da China, onde, por isso, através das empresas por si
criadas, tem uma presença no âmbito deste setor estratégico da economia
portuguesa.
Contudo, a organização administrativa permite ainda que se fale numa
reconfiguração dos grandes princípios da organização administrativa, onde o
princípio da unidade da Administração limita a descentralização e a
desconcentração.
Assim sendo, não é possível falar no princípio da descentralização e da
descontração sem ter em vista a ideia unidade, ou seja, os poderes que o Governo
tem sob as entidades e órgãos.
Nesta base, com o direito da União Europeia, criaram-se conexões a certas
estruturas da Administração Pública portuguesa, que estão mais próximas deste
direito do que da própria configuração do Governo.
Por exemplo, o governador do Banco de Portugal tem uma ligação mais estreita com
a União Europeia do que com a realidade da Administração Pública portuguesa.
Por outro lado, a partidarização da Administração Pública leva a que os partidos
políticos a tenham colonizado, o que significa que a organização administrativa se
transforma em correias de transmissão dos principais partidos políticos.
Neste sentido, a Administração Pública é permeável a uma influência política,
deixando-se “capturar” por interesses de natureza partidária.

❖ Estruturas subjetivas públicas da Administração Pública


Nas estruturas subjetivas da Administração Pública, coloca-se o problema da
personalidade jurídica pública, de acordo com o professor Paulo Otero, uma pessoa
coletiva pública é aquela que reúne os seguintes requisitos, nomeadamente:
● Prosseguem fins primariamente de natureza pública, o que significa que são
fins que não são exclusivamente de natureza pública, onde por isso, uma
entidade pública pode prosseguir fins privados, não podendo prosseguir fins
exclusivamente privados;

Nisto, o fim público é aferido pela ideia de bem comum da coletividade, onde é
esta que densifica a natureza pública dos fins;
● Têm um título jurídico do poder político, onde é essencial que o fim da
entidade pública tenha um título jurídico na base, que se liga com a fonte
pública que define o fim da entidade coletiva em causa.

Na fonte pública que pode estar na base na definição dos fins de uma entidade
pública, temos a Constituição, lei ordinária, convenção internacional, ato de Direito
da União Europeia, regulamento, contrato, ato da Administração ou uma sentença
judicial.
Assim, estas são fontes que permitem criar títulos do poder público, definido a
prossecução de fins públicos.
No entanto, de acordo com o professor Paulo Otero, existem três espécies de
pessoas coletivas públicas:
● De base territorial, onde há um território e uma população que estão no
substrato da pessoa coletiva pública, como por exemplo o Estado;
● De base associativa, onde existem associações públicas de entidades públicas,
como por exemplo associações de municípios, de entidades privadas, como
por exemplo a Ordem dos Advogados, ou entidades mistas;
● De base institucional, onde está em causa uma instituição que se distingue de
todas as demais, como os institutos públicos, nomeadamente aqueles que têm
natureza empresarial, como por exemplo as entidades públicas empresariais
das Regiões Autónomas, ou de natureza não empresarial, como por exemplo
as Universidades Públicas.

Com isto, os princípios gerais que estão na base de todas as entidades públicas
obedecem a várias ideias, nomeadamente à titularidade de fins próprios, onde cada
pessoa coletiva pública tem sempre fins próprios, o que significa que tem atribuições.
Nisto, a entidade pública A não pode invadir a esfera das atribuições da
entidade pública B, pois caso contrário, haverá incompetência absoluta, onde os atos
são nulos.
Por outro lado, cada entidade pública tem sempre uma capacidade jurídica de
direito público, mas também de direito privado, uma vez que tem de ser conferida
por um título jurídico do poder público.
Assim sendo, todas as entidades públicas podem agir ao abrigo do Direito
Administrativo, mas também podem agir ao abrigo do Direito Privado se para tal
estiverem habilitadas.
Todavia, todas as entidades públicas têm património próprio, onde, por outro
lado, possuem ainda uma autonomia administrativa, o que significa que cada entidade
publica pode emanar normas e atos administrativos e ser acompanhada de autonomia
financeira.
No poder da auto-organização interna, cada entidade pública tem sempre a
faculdade de, dentro dos limites da lei, definir as melhores regras para a própria
organização e funcionamento.
Na submissão a normas da contratação pública, a entidade pública sujeita-se à
intervenção do tribunal de contas, onde, no entanto, todas as entidades públicas têm
personalidade judiciária, isto é, pode ser sujeita num tribunal, desencadeando uma
ação, tendo, pois, legitimidade processual para utilizar os meios aptos à defesa das
suas posições jurídicas.
Nesta medida, há uma sujeição de todas as entidades públicas a mecanismos de
responsabilidade civil, financeira e política e a um controlo por parte dos tribunais
administrativos.
Contudo, surge o problema da desconsideração ou levantamento da personalidade
jurídica pública, onde a ordem jurídica pode fazer “apagar” esta mesma personalidade,
dando relevância a outras realidades.
Nisto, pode existir a hipótese de litígios de conflitos judiciais entre órgãos da
mesma entidade pública.
Contudo, poderão ainda ocorrer litígios que envolvam a responsabilidade civil
pessoal dos titulares dos funcionários e agentes da Administração por condutas
dolosas, atingindo, pois, a pessoa do titular e não a pessoa coletiva.
Por outro lado, há a possibilidade da personalização funcional de estruturas de
orgânicas públicas, isto é, órgãos que são tratados como se fossem pessoas coletivas,
que surge em sentido oposto ao levantamento da pessoa coletiva, como por exemplo o
Presidente da República.

❖ Pessoas coletivas privadas criadas por entidades


públicas
O problema de as pessoas públicas poderem criar entidades privadas, coloca desde
logo o tema da influência do Direito da União Europeia.
Nesta matéria, a influência do Direito da União Europeia prende-se com o conceito
do que seja um organismo de Direito Público.
Nisto, para a União Europeia, o organismo de direito público não tem que ver
com a personalidade jurídica da entidade, ou seja, podem existir organismos de
direito público que sejam pessoas coletivas com uma personalidade jurídica de direito
privado.
Nesta base, para saber se estamos perante um organismo de direito público, o que é
relevante não é o critério formal da personalidade jurídica ser de Direito Público ou de
Direito Privado, mas saber se há ou não uma influência pública dominante ou um
controlo público por parte da entidade em causa.
Assim, é possível que uma entidade privada com uma personalidade jurídica de
Direito Privado, seja qualificada pelo direito da União Europeia como um organismo
de direito público.
Nisto, existem critérios substantivos que levam a considerar que estamos perante um
organismo de Direito Público, nomeadamente:
1. Sempre que nos encontremos perante entidades maioritariamente
financiadas por entidades públicas, onde, mesmo que essas entidades sejam
privadas, desde que sejam maioritariamente financiadas por entidades privadas,
são um organismo de direito público;
2. As entidades em causa estejam sujeitas a um controlo ou a uma gestão por
parte de uma entidade pública;
3. Tenham um órgão de Administração, de Direção ou de fiscalização cuja
maioria dos seus titulares seja direta ou indiretamente designada por uma
entidade pública.

Assim, isto significa que, apesar de muitas entidades terem uma personalidade
jurídica de Direito Privado, desde que se verifique um destes três critérios
mencionados, estas devem ser tratadas como organismos de Direito Público.
Nisto, estes três critérios provenientes do Direito da União Europeia têm receção
no direito português, quer no código dos contratos públicos, quer no regime do setor
público empresarial.
No âmbito das entidades privadas criadas e controladas por entidades públicas, as
principais manifestações são a existência de associações privadas de entidades
públicas, desde logo sociedades que integram o setor empresarial público sob forma
privada.
Por outro lado, ainda dentro das associações privadas de entidades públicas, podem
ainda existir associações não lucrativas, isto é, que não são sociedades.
Todavia, também existem fundações privadas criadas por entidades públicas,
onde, se estas não tiverem influência dominante de entidades públicas, estão excluídas
da Administração Pública.
Contudo, se forem fundações privadas sujeitas em influência pública dominante,
fazem parte da Administração.
Nesta base, estamos perante um risco, onde há a existência de uma
Administração Pública sob forma privada, ou seja, esta é pública porque é controlada
e está sujeita a uma influência pública dominante, mas tem uma forma jurídica
privada porque é composta por pessoas coletivas de Direito Privado.
Por exemplo, a entidade pública A cria entidade privada B e, esta, por sua vez, cria a
entidade privada C, onde esta cria ou participa no capital social da entidade privada D,
verificando-se que o capital D é detido pela entidade privada C.
No entanto, a montante de tudo está uma entidade pública que é a entidade
pública A – “cascata” –, onde esta entidade A cria várias entidades privadas, mas
que estão sujeitas a influencia pública dominante.
Assim, isto pode levar a uma debilitação do setor privado dos meios de produção,
uma vez que este setor tem entidades privadas, mas nem todas o são
verdadeiramente, pois muitas delas esta sujeitas a influência dominante pública.
Na criação de entidades privadas por entidades públicas, anteriormente, estas
estavam sujeitas ao regime da total ausência de normas, o que levava ao uso e ao abuso
de criação de entidades privadas por entidades públicas.
Por isso, a lei procurou limitar a criação de entidades privadas por entidades
públicas, exigindo sempre uma lei habilitante, ou seja, a precedência de uma lei
habilitante, o que significa que as entidades públicas só podem criar entidades
privadas se existir norma habilitante para o efeito.
Nisto, o princípio geral é o da proibição das entidades publicas criarem ou
participarem em novas fundações ou associações de Direito Privado.

De acordo com o art. 13ºda LQIP, a criação e a participação de institutos públicos


em entidades de direito privado está sujeita a três condições cumulativas,
nomeadamente:
● Previsão legal ou estatutária, que permita essa criação ou participação;
● Tem de ser imprescindível para a persecução das atribuições da entidade
publica a criação da entidade privada, pois se não foi imprescindível não se
justifica a sua criação;
● Tem de existir uma autorização prévia por parte do Ministro das Finanças,
uma vez que envolve os dinheiros públicos, e por parte do Ministro que tutela a
respetiva área onde está em causa a criação da entidade pública.

Nesta base, isto significa que ao lado das entidades públicas, a Administração
Pública também pode ter entidades privadas, onde estas criam uma Administração
Pública sob forma jurídica privada. Esta é, pois, uma nova configuração no âmbito da
Administração.
Assim, temos uma Administração Pública sob forma pública, como por exemplo
a Administração tradicional, e uma Administração Pública sob forma jurídica
privada.
Nisto, a forma jurídica privada significa que são juridicamente pessoas
coletivas de Direito Privado, mas que fazem parte da Administração Pública porque
fazem parte da influência pública dominante.
❖ Capacidade jurídica das entidades públicas
Na capacidade jurídica, esta é a medida de posições jurídicas ativas e passivas
de cada entidade, onde, ao invés, a personalidade jurídica é a suscetibilidade de ser
titular de direitos e estar vinculado a obrigações.
Nisto, os princípios operativos em matéria da capacidade jurídica das entidades
públicas são, desde logo, o princípio da especialidade, onde as entidades públicas
existem para prosseguir determinados fins – atribuições da entidade pública.
Por outro lado, os fins estão sujeitos à reserva de lei, onde é a lei que define em
cada caso concreto quais são os fins da entidade pública, mas pode, todavia, existir
poderes implícitos.
Assim, sempre que a lei define os fins ou atribuições de uma entidade pública,
presume-se que dá os meios para se desenvolverem esses fins, onde esta presunção
tem que ver com a teoria dos poderes implícitos, isto é, de poderes expressamente
atribuído onde se podem extrair os meios auxiliares necessários para a concretização
das normas de competência expressamente atribuídas.
Nesta base, cada pessoa coletiva pública tem, por isso, uma capacidade jurídica de
Direito Público e, na medida em que a lei o permita, uma capacidade jurídica de
Direito Privado.
Nisto, tem ainda uma capacidade jurídica de direito substantivo e uma
capacidade processual judiciária.
Além disto, é possível a representação de entidades públicas, onde, no âmbito de
uma pessoa jurídica pública, a ordem jurídica atribui a faculdade de usar o instituto da
representação.
Os exemplos de representação são, por um lado, a competência dos titulares de
certos órgãos no âmbito de relações entre entidades públicas, como por exemplo a
Faculdade de Direito de Lisboa, que é representada no seu relacionamento com a
Faculdade de Direito de Coimbra através do respetivo diretor.
Por outro lado, a representação em juízo em tribunal, o Presidente da câmara
representa o município em tribunal, onde também podem existir situações de
empréstimo legal de órgãos, onde um órgão é emprestado a uma outra entidade.
Por exemplo, a cobrança de determinado tipo de imposto municipal pode ser feita
pelas repartições de finanças do Estado.
Pode existir ainda a representação por terceiros alheios à organização
administrativa, como por exemplo uma entidade pública quer mover um processo
judicial, podendo constituir como seu representante o advogado A.
No limite, é possível a gestão de negócios no âmbito da atuação administrativa,
desde que seja ao abrigo do Direito Privado.

❖ Tipo de relações entre sujeitos de Direito Público


As relações intrasubjetivas no âmbito da administração pública colocam uma série
de questões, desde logo as normas que definem as atribuições, que são normas
estanque que não permitem comunicabilidade entre as atribuições da entidade
pública A e as atribuições da entidade pública B, onde, por regra, não há espaços
partilhados, mas haverá uma separação rígida de atribuições entre as entidades
públicas.
Durante muito tempo, em Portugal, designadamente sobre a égide de pensamento do
professor Diogo Freitas do Amaral, a tese perfilhada foi a tese da
incomunicabilidade, ou seja, há atribuições que são da entidade A e somente desta
entidade.
No entanto, de acordo com o professor Paulo Otero, esta solução da
incomunicabilidade não é a mais correta, uma vez que algumas das atribuições são
definidas através de critérios vagos e que fazem apelos a conceitos indeterminados.
Por exemplo, interesses das respetivas populações e território no caso das autarquias
locais.
Por outro lado, a Constituição consagra no art. 6º o princípio da subsidiariedade,
onde, por via de regra, afirma que a matéria pertence à entidade pública menor, mas
podem existir circunstâncias que levem a que uma entidade pública de âmbito mais
amplo possa decidir sobre essa mesma matéria.
Nisto, sobre a mesma matéria, não há incomunicabilidade, mas há uma situação
de comunicação de atribuições.
Além disto, de acordo com o professor Paulo Otero, há uma regra de elasticidade
nas normas definidores de atribuições, onde há certas circunstâncias em que as
atribuições pertencem à entidade pública X, mas podem existir outras circunstâncias em
que essas atribuições pertencem à entidade pública Y.
Deste modo, existe uma repartição vertical de atribuições e, por isso, a
subsidiariedade diz-nos que, em certos casos, a competência pertence à entidade
pública menor.
Assim sendo, por razões de ineficiência, a entidade pública superior pode ser
chamada a intervir sobre a matéria.
Contudo, existe ainda a supletividade do direito do Estado, onde, em situações de
inércia de uma entidade pública menor a emanar norma reguladora de determinada
matéria, a entidade pública superior pode substituir-se e agir em vez da entidade
pública menor.
Há, pois, uma prevalência do direito do Estado, onde se prosseguem interesses
gerais da coletividade, onde, no âmbito do princípio da soberania do Estado, este pode
intervir através de um direito que tem primazia.
Contudo, existem poderes de intervenção entre entidades, que surgem no âmbito
da Administração Pública, diferenciam entre poderes de intervenção face a entidades
públicas sob forma pública e entre poderes de intervenção face a entidades públicas
sob forma jurídica privada.
Nisto, surge a ideia de que estamos num núcleo essencial do princípio da
unidade da Administração, mas também da responsabilidade política do Governo
pela Administração Pública junto do Parlamento.
Nisto, a intervenção que permite a uma entidade pública intervir sobre a atuação de
uma outra entidade pública, visa garantir ao Estado uma posição de unidade de reforço
da sua posição e da prevalência dos interesses da sua atuação sobre a conduta da
entidade pública menor.
Assim, como órgão superior da Administração Pública, o Governo tem de ter
poderes de intervenção sobre as outras entidades públicas e, nessa medida, tem de
prestar contas junto da Assembleia da República pelo modo como age ou como não age.
Nesta base, para garantir a unidade da Administração junto de outras entidades
públicas, os poderes do Governo são quatro, nomeadamente:
● Superintendência;
● Tutela;
● Coordenação;
● Cooperação.
o Superintendência

De acordo com o art. 199º/alínea d da CRP, esta traduz-se no poder e na


faculdade que uma entidade pública tem de orientar a atividade de outras
entidades públicas menores, emanando diretivas ou recomendações face aos objetivos
que a entidade menor deva alcançar e as linhas de atuação a empreender tendo em vista
a prossecução dos seus fins.
Nisto, numa diretiva, fixam-se os fins e determinam-se as metas, dando-se
liberdade de meios para se poder alcançar estas mesmas metas.
Há, pois, como destinatária, toda a Administração indireta do Estado, onde esta
é a Administração satélite do Estado.
Com isto, através do poder da superintendência, há uma orientação da conduta a
adotar por parte da entidade pública menor, envolvendo o implícito poder de
controlar o modo como está a ser cumprido ou não esta mesmo orientação que foi
definida.
Contudo, discute-se se o art. 198º da CRP permite ou não a utilização direta
deste poder excecional, sem pendência de lei.
Nisto, de acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, faz-se a distribuição
das competências pelos diferentes órgãos centrais e locais, fazendo-se a separação
entre o Estado e as demais pessoas coletivas públicas.

o Tutela

Na tutela, esta é menos intensiva que a superintendência, onde aqui se fiscaliza, pois
a tutela é o poder de uma entidade pública controlar e fiscalizar a atividade
desenvolvida por outras entidades públicas menores, emitindo juízos de legalidade
ou de mérito sobre a gestão da entidade pública tutelada.
Nisto, a tutela pode ter vários fins, nomeadamente:
✔ Tutela de legalidade, onde se controla se a lei está a ser cumprida;
✔ Tutela de mérito, onde se controla a oportunidade da decisão administrativa;
✔ Tutela financeira, onde se pergunta se esta é de acordo com a lei;
✔ Tutela integrativa, no sentido de acrescentar eficácia ao ato sujeito à
aprovação;
✔ Tutela inspetiva se indicar a conduta e os atos da entidade tutelada;
✔ Tutela sancionatória, se o seu papel for aplicar sanções pelo incumprimento
das orientações ou das leis;
✔ Tutela revogatória ou anulatória, onde o propósito é destruir os efeitos dos
atos praticados;
✔ Tutela substitutiva, em caso de omissão, onde a entidade tutelada devia ter
agido e não o fez, onde a entidade de tutela poderá agir no lugar da entidade
tutelada.

Para além disto, discute-se ainda se é possível uma tutela contratual, como por
exemplo emprestar dinheiro a uma entidade pública, onde o Estado estabelece
cláusulas que lhe permita controlar o modo como está a ser gerido esse mesmo
dinheiro, criando uma figura autónoma de tutela.
De acordo com o professor Paulo Otero, esta tutela só será admissível se a
Constituição não criar obstáculos e da existência de uma lei que permita um contrato
com esse conteúdo.
Nisto, a tutela administrativa está sujeita a um regime que se estabelece nas
seguintes ideias:
● Só há tutela quando a lei o permite nas modalidades permitidas, não
havendo, pois, tutela sem lei.

No entanto, de acordo com o professor Paulo Otero, existe uma exceção, que se
prende com o art. 52º/1 da CRP, onde se permite o exercício do direito de petição dos
cidadãos de um ato praticado por uma entidade pública tutelada menor perante a
entidade pública tutelar.
Assim, este recurso administrativo tem o propósito de revogar ou anular o ato
praticado pela entidade tutelada, onde esta tutela não careca de expressa consagração
legal, pois o art. 52º/1 da CRP tem aplicabilidade direta, concebendo um direito aos
cidadãos, que resulta do art. 18º/1 da CRP.
Por outro lado, a tutela ainda diferentes áreas de incidência, nomeadamente na
Administração indireta ou na Administração autónoma, onde não há poder de
superintendência, mas pode existir tutela.
o Coordenação administrativa
Na coordenação administrativa, esta é um poder que tem o propósito de
harmonizar interesses que estão eme feita em potencial conflito, definindo soluções
de coerência ou de compatibilidade de atuação entre duas ou mais entidades.
Nisto, por via da coordenação, evitam-se disfunções e contradições decorrentes da
sobreposição de ação entre as entidades.
Contudo, a coordenação administrativa pressupõe uma diferença entre a
entidade coordenadora e a entidade coordenada, limitando o exercício dos poderes
da entidade coordenada por ação por entidade coordenadora.
Por isso, não há uma paridade, mas uma diferenciação de níveis, onde a entidade
coordenadora tem supremacia sobre a entidade coordenada.
Nisto, regra geral, estão sujeitas à coordenação do Governo todas entidades públicas,
salvo aquelas que se encontram vinculadas a um mecanismo de cooperação ou as
que a cooperação pertence ao Governo das Regiões Autónomas.
o Cooperação administrativa

Enquanto na coordenação não há paridade, na cooperação há paridade entre as


entidades envolvidas, havendo, pois, a colaboração de duas ou mais entidades públicas,
visando a concertação de interesses comuns.
Assim sendo, o princípio geral é o de dever da cooperação entre as entidades
administrativas, de onde resultam os deveres acessórios recíprocos de auxílio, de
informação, lealdade, etc.
Por exemplo, pode haver uma cooperação entre o Estado e as Regiões Autónomas,
de acordo com o art. 229º/1 e 4 da CRP.
Todavia, também é possível um relacionamento que envolva entidades públicas sob
forma privada.
Nas entidades públicas sob forma privada, temos a função acionista destas
entidades, onde, quando participa no capital social de uma entidade privada, a entidade
pública participa através de ações.
Há, pois, a importação para o Direito Administrativo do mecanismo do Direito
Comercial, onde, quando o Estado é titular, exerce sobre as entidades privadas os
poderes que qualquer acionista tem.

❖ Estruturas orgânicas da Administração


Como sabemos, um órgão é um centro institucionalizado que forma e expressa
uma vontade, que é imputável à pessoa coletiva na qual se integra o respetivo órgão.
Nisto, a competência está para o órgão como a capacidade está para a pessoa
jurídica.
Assim, existem vários órgãos, nomeadamente:
● Singulares ou colegiais, que tem que ver com o número de titulares;
● Centrais ou locais, onde os primeiros são aqueles cuja atuação se repercute
sobre todo o território nacional, ao passo que os segundos é aquele que cuja
ação se circunscreve a uma parcela do território;
● Primários, secundários e vicários, de acordo com o professor Diogo Freitas
do Amaral, onde os primeiros são aqueles que dispõem de uma competência
própria para decidir as matérias, enquanto os segundos são aquelas que apenas
dispõem de uma competência delegada. Já os vicários, estes são aqueles que só
exercem competência por substituição de outros órgãos;
● Representantes ou não representantes, de acordo com o professor Diogo
Freitas do Amaral, onde os primeiros são aqueles cujos titulares são livremente
designados por eleição, enquanto os segundos são órgãos não representativos;
● Decisórios ou executivos, onde os primeiros são aqueles que tomam uma
determinada decisão ou não tomam a decisão que tem o poder deliberativo,
ao passo que os segundos são aqueles que dão execução àquilo que os órgãos
deliberativos haviam tomado.
● Órgãos consultivos, ativos e de controlo, de acordo com o professor Diogo
Freitas do Amaral, onde os primeiros emitem pareceres, não havendo,
contudo, uma atuação decisória no sentido de tomar uma decisão passiva de ser
executada imediatamente.

Nos órgãos ativos, estes são aqueles a quem compete tomar decisões ou
executá-las, ao passo que os órgãos de controlo são aqueles que têm a missão de
fiscalizar a regularidade do funcionamento de outros órgãos;
● Simples ou complexos, onde os primeiros são aqueles que são compostos por
vários órgãos, como por exemplo o Governo;
● Temporários ou permanentes, onde, por exemplo, um júri de exames é um
órgão temporário;
● Representativos ou não representativos, consoante os respetivos titulares
sejam a expressão de uma representação política.

Nisto, os órgãos estão sujeitos a um regime que permite diferenciar duas


categorias, nomeadamente:
● Órgãos singulares;
● Órgãos colegiais, onde estes têm regras próprias quanto ao seu
funcionamento, de acordo com o art. 21º a 35º do CPA.

Nos órgãos colegiais, para poder dizer validamente que está constituído e deliberar,
necessita do mínimo legal de titulares presentes, que é o quórum.
Para além disto, na deliberação, esta só pode ocorrer se existir quórum, podendo, no
entanto, ser aprovada por maioria simples, maioria absoluta ou por maioria reforçada.
Contudo, em regra, nos órgãos consultivos, não poderá haver lugar a abstenções.
Nos processos de decisão, estas não poderão acontecer por escrutínio secreto, exceto
nas deliberações que envolvam apreciações sobre qualidades das respetivas pessoas.
Na importância do debate e da fundamentação, estes devem ser elementos
essenciais da deliberação de qualquer órgão colegial, e também a importância da ata,
onde esta é o momento em que se regista o quando, o como e o que foi deliberado.
Nisto, na atua estão também incluídos os votos de quem não acompanha as
respetivas deliberações, designadamente para efeitos de exclusão de responsabilidade
civil.
Assim, por exemplo, se se votou contra, não se poderá ser responsabilizado pelos
prejuízos que decorram do efeito da respetiva deliberação.
Todavia, existem ainda regras sobre a convocatória e os termos em que é possível
decidir em cada reunião.
Por isso, para poderem expressar e manifestar a sua vontade, as pessoas coletivas
necessitam de órgãos, que são suportados por pessoas físicas. Tem, pois,
particularidades.
Com isto, as pessoas coletivas existem para prosseguir determinados fins, onde
as suas atribuições são os fins ou interesses que a lei incumbe às mesmas, sendo, pois,
dotada de poderes funcionais.

❖ Titulares dos órgãos


Nos titulares dos órgãos, estes podem-se configurar em dois cenários distintos,
nomeadamente:
● Titulares normais;
● Titulares que exercem em situações de legalidade titulada;
● Titulares anómalos, em situações em que há alguma vicissitude que coloca em
causa aquele titular.
o Titulares normais

Nos titulares normais dos órgãos, estes podem terem dois estatutos diferentes,
nomeadamente:
● Titulares que exerçam as funções a título profissional, como por exemplo ser
professor de um estabelecimento público;
● Titulares que exerçam funções como sendo titulares do órgão, tendo um
título legítimo para o exercício dessas mesmas funções, mas que não é
profissional, como por exemplo ser Presidente de uma Câmara.

No entanto, poderão existir situações especiais que correspondem a casos de


acumulação de funções, em que alguém exerce simultaneamente duas ou mais funções
como sendo titular de dois órgãos, como por exemplo o Ministro das Finanças poder ser
simultaneamente Ministro da Economia.
Por outro lado, temos ainda a situação que se designa de prorrogatio, que tem que
ver com o princípio de continuidade do exercício das funções, onde, por exemplo, ainda
que um mandato termine hoje, o titular mantém-se em funções até ser destituído por
um novo titular.
Há, pois, um alargamento do exercício das funções para além do mandato que
estava legalmente estabelecido, evitando uma rutura do exercício das funções
públicas.
o Titulares anómalos

Nos titulares anómalos, quem exerce as funções como titular de um órgão, não tem

um título legítimo para tal, onde existem duas situações:


● Funcionários de facto, que são aqueles que aparentam ser funcionários, mas
não têm título para tal ou o título que têm é inválido.
Nisto, esta situação pode ocorrer em dois cenários diferentes, nomeadamente em
casos de rutura do funcionamento das instituições, onde não há quem possa decidir e
é necessário que alguém tome as medidas urgentes.
Por isso, nestes casos, é legítimo o exercício das funções públicas por quem não é
um titular com uma legitimação de título.
Por outro lado, num outro cenário de funcionário de facto, são os casos em que
aquele que exercia funções sob um aparente título válido, afinal, um tribunal veio
declarar que esse título era inválido.
Nesta base, o tribunal declara o título inválido pelo facto de anular ou declarar
nulo o título que o habilitava a exercer funções ou o titular exercia funções com base
numa lei que foi declarada inconstitucional com força obrigatória geral.
Por isso, os funcionários de facto aparecem em situações extraordinárias e
anómalas, mas, no direito português, a regra, é a de que, se se verificarem os
pressupostos de indispensabilidade e de boa fé do exercício dessas funções, os seus atos
podem ser considerados válidos.
Assim, mesmo sem título, quem exerce as respetivas funções durante um longo
período de tempo e de boa fé, a ordem jurídica tutela esse mesmo exercício ao abrigo
do princípio de prescrição aquisitiva do exercício das funções.
Contrariamente, temos os casos de usurpadores de funções públicas, que são
aqueles que exercem estas funções sabendo que não tem título, agindo dolosamente e
conscientemente.
Nisto, uma vez que a usurpação de poderes é crime, quem exerce essas funções é
passível de responsabilidade penal, onde os seus atos são considerados inválidos,
ainda que se possa discutir se existem terceiros de boa fé que desconheciam que estas
funções eram exercidas a título de usurpador de funções públicas.
Por exemplo, um professor durante 20 anos exerceu funções como professor de um
liceu, onde se veio a descobrir que não tinha licenciatura que o habilitasse para tal e, por
isso, durante estes 20 anos, avaliou vários alunos.
Com isto, seria injusto para os alunos se não viessem a completar o ensino por
causa do professor.
Nisto, de acordo com o princípio da boa fé, exige-se que os alunos fossem tratados
no sentido de não invalidar as respetivas avaliações.

❖ Como se deve exercer funções públicas


De acordo com o art. 47º/2 da CRP, estabelecem-se os princípios de acesso à
função pública, onde a regra é a de que este é aberto a todos, havendo, no entanto,
regras para os estrangeiros, de acordo com o art. 15º da CRP.
Com isto, há ainda uma importância do concurso público de acesso profissional
ao exercício das funções públicas.
Nisto, nos vínculos de emprego público, a regra é a do contrato de trabalho em
funções públicas, sem prejuízo da existência de situações de nomeação e de
comissões de serviço.
Paralelamente, é possível ainda a existência de contratos de prestação de serviço.

❖Princípios gerais do regime jurídico dos órgãos da


Administração
Nos princípios gerais do regime jurídico a que estão vinculados os órgãos da
Administração, temos cinco ideias, nomeadamente:
● Vinculação teleológica à prossecução do interesse público, onde os titulares
dos órgãos administrativos existem para servir o interesse público, que é o
fundamento da atuação da Administração;
● Imparcialidade na distinção entre quem decide e da matéria objeto de decisão e
no sentido de ponderar todos os elementos relevantes para a essa mesma
decisão;
● Proibição de acumulação de cargos públicos, onde, só a título excecional é
possível isto mesmo;
● Existência de incompatibilidades, que é uma afirmação do princípio da
imparcialidade e pelo facto de alguém que já tenha exercido ou estar a exercer
determinado tipo de funções, não poder ser chamado a ser titular de outro
órgão da Administração;
● Responsabilidade, onde, quem age, tem de prestar contas, nomeadamente civil,
financeira, disciplinar e criminal, que são comuns a todos os titulares,
podendo ainda haver a política, para os que não exercem a título profissional.

Contudo, os órgãos não se limitam a necessitar de titulares, pois também precisam


dos serviços públicos, que engloba quatro ideias, nomeadamente:
● Organização de pessoas singulares, onde se traduzem numa pluralidade de
pessoas;
● Existem no âmbito das pessoas coletivas, onde não são uma realidade
dispersa;
● Os interesses públicos visam implementar os fins das pessoas coletivas, onde
a atuação dos serviços públicos é dirigida para prosseguir os fins da respetiva
entidade;
● Têm vários tipos de tarefas, nomeadamente de apoio, colaboração, execução
e prestação sob a iniciativa e comando dos órgãos, onde, por isso, os serviços
existem numa posição de dependência dos órgãos.

Nisto, existem serviços principais, serviços de natureza burocrática e serviços de


natureza auxiliar, que ajudam a tomada de decisão.
Assim, em termos territoriais, os serviços podem ainda ser centrais, se a sua
atuação for sobre todo o território nacional, ou podem ser natureza periférica, onde a
sua atuação é circunscrita a uma determinada área do território nacional.
Por ouro lado, em termos de estruturação, os serviços podem ser hierarquizados,
se houver alguém no topo que comanda, onde as restantes estruturas devem obediência,
ou podem ser não hierarquizados, se as estruturas desses mesmos serviços estiverem
no mesmo plano.
Assim sendo, na forma como se gerem os serviços públicos, existem duas regras,
nomeadamente o poderem estar sujeitos a uma gestão pública se aplicarem o Direito
Público, que podem ser uma gestão pública direta, quando é feita pela própria
entidade pública, ou uma gestão pública indireta, se é atribuída a uma entidade
diferente, como por exemplo um hospital público que esteja sujeito a uma gestão
privada.
Há, pois, fenómenos de privatização da gestão dos serviços públicos.
No entanto, podem ainda estar sujeitos a uma gestão privada, se aplicarem o
Direito Privado.

❖ Regimes dos serviços públicos

Nos regimes dos serviços públicos, estes são titulares de um poder de organização
administrativa, onde, para além da regulação fixada pela lei, cada serviço público tem
o poder de auto-organização interna, isto é, de definir regras sobre a melhor forma de
funcionarem os respetivos serviços.
Nisto, de acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, os serviços públicos
são as organizações humanas criadas no seio de cada pessoa coletiva com o fim de
desempenhar as atribuições desta.
Por outro lado, pauta-se a regra de continuidade dos serviços, onde a
Administração Pública não pode “encerrar para férias”, onde, por isso, quando existem
greves, têm de ser garantidos determinados serviços mínimos, nomeadamente na
área da saúde.
Assim sendo, como vimos, verificando-se o termo do mandado do exercício de
funções do titular, este continuará a exercê-las até ser substituído por um novo titular.
No entanto, os serviços públicos também se caracterizam pela igualdade na
utilização desses serviços, onde não podem ser criadas discriminações infundadas para
aqueles que têm acesso ao serviço público.
Por isso, a regra é a da onerosidade da utilização dos serviços públicos, que, em
contrapartida, se traduz no pagamento de taxas pela prestação dos mesmos.
Na existência de relações especiais de poder, estas ligam-se com os particulares,
que estão sujeitos a um conjunto de vinculações por exercerem essas funções, e com os
utentes, que utilizam os serviços.
Assim sendo, quem presta no sentido de fornecer utilidades e quem beneficia das
mesmas, está sujeito a um estatuto que lhe atribui direitos e obrigações.

❖ Competência dos órgãos


Na competência, esta é o conjunto de poderes funcionais atribuídos aos órgãos,
que têm uma função instrumental relativamente às atribuições da respetiva pessoa
coletiva.
Assim, a competência é o conjunto de poderes funcionais que a lei confere para
a prossecução das atribuições das pessoas coletivas públicas.
Nisto, existem vários tipos de competência, nomeadamente:
● Explícita, quando decorre direta e imediatamente de uma norma jurídica,
ou implícita, quando a competência de extrai por via interpretativa de normas
que fixam fins;
● Dispositiva, se for uma competência que visa regular e disciplinar
determinada situação jurídica, ou revogatória, que se limita a cessar os
efeitos de atos anteriores;
● Firme, onde é aquela que resulta da própria lei sem necessidade da
intervenção de qualquer outro órgão, ou precária, cujo exercício dos poderes
pode estar dependente da intervenção de um outro órgão da Administração,
como por exemplo uma competência delegada;
● Individual, que é atribuída a um único órgão, ou comum, que é atribuída a dois
ou mais órgãos.

Nisto, a competência comum pode ter duas configurações distintas,


nomeadamente ser conjunta, quando os dois ou mais órgãos que são competentes têm
de intervir para que o ato seja perfeito, ou alternativa, onde a lei investe dois ou mais
órgãos com os mesmos poderes, onde o ato fica perfeito com a intervenção apenas de
um destes;
● Independente, onde esta é aquela que não está sujeita a ordens e instruções
de um outro órgão, ou hierarquizada, onde está é aquela que está sujeita a
uma intervenção de um superior hierárquico que determine o conteúdo da
decisão;
● Exercício normal ou exercício extraordinário, que este último são situações
típicas de estado de necessidade administrativa, onde, um órgão que
normalmente não seja competente, pode vir a tomar medidas em nome dessa
urgência.

Nesta base, a competência pode ser delimitada em função da matéria, como por
exemplo o Ministro da Agricultura exercer funções de uma determinada área diferente
do Ministro dos negócios estrangeiros, em função da hierarquia, onde aquilo que
compete ao Ministro decidir, não é o que compete ao Direito Geral, pois há uma
repartição hierárquica da competência.
No entanto, a competência pode ainda ser delimitada em função do território, onde,
aquilo que compete à Direção distrital de Lisboa da PSP não competente à Direção
distrital de Porto da PSP.
Num quarto critério, existe ainda a delimitação em função do tempo, onde a
competência é para ser exercida no presente, não podendo ser exercida em função do
futuro. Por exemplo, não é possível nomear o futuro Ministro dos negócios estrangeiros
quando o atual cessar as suas funções.
Nisto, apenas a título excecional pode ser exercida em função ao passado, se
existir uma lei que permita a prática de decisões administrativas com retroatividade.
❖ Princípios gerais em matéria de competência
Nos princípios gerais em matéria de competência, estes resultam do art. 36º e art.
37º do CPA, onde a competência não é renunciável pelo próprio, pois esta fixa-se no
momento em que se inicia o procedimento.
De acordo com o art. 38º, art. 39º e art. 51º e art. 52º do CPA, os conflitos de
competência podem ser positivos, quando dois ou mais órgãos consideram que são
competentes para decidir uma matéria, ou negativos, quando dois ou mais órgãos
não se consideram competentes para decidir uma matéria.
Nisto, a regra é a de que sempre que um órgão exerce poderes que pertence a um
outro órgão da pessoa coletiva, há uma situação de incompetência relativa, onde se
gera a anulabilidade dos respetivos atos praticados, exceto no âmbito da atuação do
Governo.
Assim, sendo um órgão da pessoa coletiva Estado, cada Ministério tem fins próprios
e, por isso, significa que tem atribuições próprias.
Por isso, se um órgão do Ministério A praticar um ato que se integra nas atribuições
do Ministério B, o ato não é anulável, mas nulo, pois há uma invasão de atribuições,
de acordo com o art. 161º/2 alínea b do CPA.

❖ Competência delegada

Na competência delegada, a lei pode atribuir a um órgão o poder de decidir


sobre determinada matéria e, simultaneamente, dentro da competência deste mesmo
órgão, atribuir-lhe a faculdade de permitir que outro órgão possa exercer esses mesmos
poderes.
Assim sendo, o primeiro órgão é o órgão delegante, ao passo que o segundo órgão é
o órgão delegado, ondem o ato através do qual o órgão delegante permite que o órgão
delegado exerça alguns dos seus poderes, chama-se ato de delegação de poderes, onde
se adquire o exercício de poderes que a lei inicialmente atribuiu exclusivamente a um
órgão.
Por isso, a lei tem duas funções, nomeadamente:
● Atribuir uma competência perfeita a um órgão;
● Atribuir um poder discricionário de escolher entre ser o órgão a exercer os
poderes ou a permitir que estes possam ser exercidos por um outro órgão, onde
há, pois, uma dupla competência.

Contudo, ao permitir que um órgão delegue poderes a um outro órgão, a lei também
atribui a este a possibilidade de exercer esses mesmos poderes.
Por isso, se toda a competência resulta da lei, a competência do segundo órgão
resulta da conjugação de dois atos, onde, este se subordina ao primeiro órgão.
No entanto, o primeiro órgão tem ainda em relação ao segundo órgão outros
poderes, nomeadamente o de conceder ou não os poderes, revogar a delegação dos
poderes ou os atos e orientar o modo como devem ser exercidos os poderes.
Para além disto, durante a delegação de poderes, o primeiro órgão mantém ainda
a faculdade de exercer esses poderes.
Todavia, na questão de poder existir uma confusão no exercício dos poderes, esta
não será possível, uma vez que estamos perante uma forma de competência de
alterativa, em que os poderes delegados podem ser exercidos por A ou B.
No entanto, se primeiramente forem exercidos pelo órgão delegante, o poder
delegado já não os poderá exercer, pois se ainda assim o fizer, o ato praticado será
inválido, pois deixou de ter competência para o efeito.
Pelo contrário, se os atos forem primeiramente praticados pelo órgão delegante,
o órgão delegado pode revogar esses mesmos atos.
Assim sendo, de acordo com o art. 44º a 50º do CPA, temos a figura da delegação
de poderes.
Nesta base, a delegação de poderes tem de ser publicada, pois caso contrário, esta
será ineficaz.
Por isso, o delegado que esteja a agir ao abrigo de uma delegação de poderes não
publicada, é incompetente, onde, por isso, os seus atos estão aferidos de
incompetência.
Para além disto, é ainda possível uma delegação entre órgãos de pessoas coletivas
distintas, onde, por exemplo, as Câmaras Municipais podem delegar poderes nas Juntas
de Freguesia.
Neste caso, se dentro dos poderes delegáveis a Junta de Freguesia praticar um ato no
âmbito dos poderes delegáveis, mas relativamente aos quais não houve publicação, de
acordo com o professor Paulo Otero, o ato já não será nulo.
Assim, os poderes que inicialmente apenas estavam no exercício do delegante,
são ampliados ao delegante, onde este pode exercer estes poderes sem que o delegante
perca esse mesmo exercício.
No entanto, poderá ainda existir uma subdelegação de poderes, em que o órgão A
delega B e B subdelega em C, onde, a relação de B com C é a de uma subdelegação,
aplicando-se os mesmos princípios que pautam a relação entre A e B.
Há, pois, dois tipos de delegação de poderes, nomeadamente uma delegação
intrasubjetiva, que é dentro da mesma pessoa coletiva, ou uma delegação
intersubjetiva, entre sujeitos diferentes.
Numa outra ideia, de acordo com o art. 50º do CPA, a delegação de poderes
extingue-se por revogação, onde o delegante pode fazer cessar a delegação de poderes,
por caducidade, extinguindo-se o objeto da respetiva delegação.
Por outro lado, uma vez que a delegação assenta numa relação de confiança entre o
titular do órgão delegante e o titular do órgão delegado, basta que um destes mude
para a delegação caduque, de acordo com o art. 50º/alínea b do CPA.
Assim sendo, a delegação é conferida tendo em conta as pessoas dos titulares.
Na natureza jurídica, há quem entenda a delegação de poderes é uma alineação, uma
forma de autorização ou uma forma de transferência do exercício.
No entanto, de acordo com o professor Paulo Otero, como vimos, há um
alargamento dos poderes do delegante em relação ao delegado.

Com isto, coloca-se a questão de saber se, no Direito Português, numa matéria
concreta, a ordem jurídica atribui poderes de decisão apenas a um determinado órgão,
ou se a regra é flexibilidade do exercício da competência.
De acordo com o professor Paulo Otero, predomina a flexibilidade no exercício da
competência, o que significa que a ordem jurídica só a título excecional confere o
exercício de uma determinada competência em exclusivo a um órgão.
Assim, em regra, em momento diferentes, a ordem jurídica atribui a vários órgãos
o exercício da mesma competência decisória sobre a mesma matéria.
Nesta base, o ordenamento jurídico português conhece cláusulas gerais que
habilitam a delegação de poderes, onde existe um órgão típico, que permite que este
possa habilitar um outro órgão a exercer esse poder através de delegação de poderes.
Nisto, estas cláusulas gerais de delegação de poderes encontram-se no art. 44º/3
e 4 e art. 46º/2 do CPA e na Lei orgânica do Governo.
Para além disto, a ordem jurídica portuguesa permite ainda que um órgão que seja
competente a título excecional, possa substituir-se ao exercício da competência que
normalmente pertence a outro órgão.
Com isto, há substituição sempre que um órgão age no lugar ou em vez de outro
órgão, onde, por isso, o Direito português consagra pelo menos três cláusulas gerais
em matéria de substituição, nomeadamente:
● Art. 19º da CRP, onde, em situação de estado de emergência ou estado de sítio,
é possível a titularidade de poderes de substituição no âmbito das autoridades
administrativas;
● Art. 3º/2 do CPA, em sede de necessidade administrativa;
● Art. 199º/ alínea g da CRP, onde se permite ao Governo o exercício de poderes
substitutivos e, por isso, enquanto entidade administrativa, o Estado não é
soberano, pois está subordinado à Constituição e às leis.

Com isto, podemos concluir que o princípio geral no direito português é o da


flexibilidade do exercício da competência.

❖ Relações interorgânicas
Nas relações interorgânicas, temos cinco tipos de relações entre órgãos da
Administração, nomeadamente:
● Relações de competência comum, onde a mesma competência é atribuída a dois
ou mais órgãos da Administração;

Nisto, pode ainda existir uma competência alternativa entre órgãos, como por
exemplo A ou B, ou competência comum conjunta, onde é preciso a intervenção de A
e B;
● Relações de substituição, onde temos uma relação entre o órgão substituto, que é
aquele que age no lugar, onde o outro órgão é o órgão substituído.

Com isto, temos situações de substituição vicarial, isto é, nos casos em que há
ausência do titular do órgão por impedimento temporário, situações de morte ou por
ausência do próprio território, onde possa validamente deliberar sobre a matéria.
No entanto, pode ainda existir substituição quando está em causa uma nova
regulação na matéria, onde, por exemplo, se o delegante pode agir perante atos
praticados pelo delegado em que este decidiu x, não concordando, o delegante pode
revogar o ato ou substituir a disciplina jurídica da matéria.
Assim, há uma substituição dispositiva no sentido em que a regulação jurídica
daquela situação passa a ter um conteúdo diferente, incidindo sobre a própria
decisão em causa.
Todavia, a substituição poderá ainda ser integrativa dos casos de omissão ou dos
casos de inércia da decisão por parte do órgão normalmente competente.
Na substituição de caráter sancionatório, onde se substitui porque foi aplicada
uma sanção que impede o titular normal do órgão decisório agir sobre aquela matéria,
ou se o órgão normal estiver dissolvido.
Por outro lado, pode haver uma substituição extraordinária, em situações de estado
de exceção constitucional ou estado de necessidade administrativa, ou uma substituição
prejudicial, de acordo com o art. 38º do CPA;

● Relações de complementaridade entre órgãos, onde um órgão age no sentido de


auxiliar outro órgão.

A primeira hipótese centra-se na distinção entre órgão propulsores, que é aquele


que tem a iniciativa ou órgãos decisórios, que é aquele que toma a decisão final.
A segunda hipótese centra-se na distinção entre órgãos principais e órgãos
auxiliares, que são aqueles que ajudam o órgão principal a decidir ou executar.
A terceira hipótese centra-se na distinção entre órgãos consultivos, que são aqueles
que emitem pareceres e opinam sobre determinada situação, e órgãos deliberativos,
que são aqueles que decidem consoante o parecer emitido.
A quarta hipótese centra-se na distinção entre órgãos deliberativos, que são
aqueles que decidem e órgãos que têm uma competência integrativa da eficácia, que
são aqueles que aprovam, ratificam e acrescentam algo relativamente àqueles que se
limitam a decidir.
A última hipótese centra-se na distinção entre órgãos deliberativos, que são os que
decidem e órgãos executivos, que são aqueles que realizam aquilo que os anteriores
definiram como linha orientadora da respetiva decisão;

● Relações de cooperação, onde se pressupõem uma igualdade, onde, entre as


estruturas orgânicas, há UM modo de agir para uma boa Administração como
forma de alcançar uma melhor solução.
Nisto, poderão existir relações de cooperação entre órgãos da Administração
Pública nacional, como por exemplo as autoridades administrativas cooperam com o
Ministério Público no âmbito de uma investigação.
Poderão ainda existir relações de cooperação entre órgãos da Administração
Pública nacional e entre e órgãos da administração pública da União Europeia ou
de outras organizações internacionais, como por exemplo no combate ao terrorismo.
No entanto, temos ainda relações de cooperação entre órgãos da Administração
Pública nacional e órgãos da Administração Pública estrangeira, como por exemplo
se um português criminoso se refugiar no Brasil;

● Relações de subordinação, que assentam numa supremacia de um órgão


relativamente a outro.

Nisto, podem existem relações de subordinação entre o órgão que têm o poder
sancionatório e o órgão que está sujeito a sanções, como por exemplo o controlo
sobre a conduta e os titulares.
Por outro lado, a relação de subordinação pode ocorrer entre órgãos que têm poder
de supervisão, que é o poder de anular atos práticos por outros órgãos e órgãos que
estão sujeitos a esse poder de supervisão.
Além disto, a relação de subordinação pode acontecer entre órgãos que têm a
faculdade de permitir o exercício de poderes a outros órgãos e entre órgãos cujo
exercício dos poderes estão sujeitos à intervenção de outros órgãos, como por
exemplo a relação entre delegante e delegado.
A quarta hipótese centra-se na relação de subordinação entre os órgãos que têm
poderes de orientação e vinculação genérica e órgãos que estão sujeitos a esses
poderes.
Por último, centra-se na relação de subordinação entre os órgãos que têm poder de
direção, onde têm o poder de emanar ordens e instruções, e os órgãos que estão
sujeitos ao poder de obediência.
Nisto, uma ordem é um comando para uma situação concreta, ao passo que a
instrução é um comando para um conjunto de situações que não estão
determinadas ou que os respetivos destinatários não determináveis.
Assim, através das instruções, há o exercício de um poder regulamentar interno.
Contudo, o poder de direção pode ser:
● Contratual, onde a entidade pública que é parte de um contrato tem poderes de
direção do modo como quer que o cocontratante exerça a respetiva prestação;
● Direção, onde se pode reconduzir à figura da hierarquia administrativa e à
relação hierárquica.

❖ Hierarquia administrativa
De acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, a organização dos serviços
públicos dá origem a uma hierarquia.
Na hierarquia administrativa, esta é um modelo de organização vertical da
Administração, em que os órgãos e as estruturas da administração estão em pirâmide.
Através desta organização vertical, estabelece-se um vínculo jurídico que envolve
uma pluralidade de órgãos dentro da mesma pessoa coletiva.
De acordo com o professor Marcelo Caetano, a hierarquia dos serviços consiste no
seu ordenamento em unidades que compreendem subunidades.
Por isso, a hierarquia é um fenómeno intersubjetivo, ocorrendo no interior de uma
mesma entidade pública onde, por isso, este vínculo jurídico traduz-se no conferir a um
desses órgãos uma competência.
Assim sendo, o órgão do topo tem o poder de dispor da vontade decisória de
todos os restantes órgãos subalternos, que estão vinculados a um dever de obediência
às ordens e instruções do superior hierárquico.

❖ Poderes do superior hierárquico


Nos poderes do superior hierárquico, estes podem ser agrupados em três grandes
categorias:
● Poderes de direção;
● Poderes de controlo;
● Poderes dispositivos da competência.

o Poderes de direção
Nos poderes de direção, estes traduzem-se na faculdade de emitir ordens e
instruções, onde a ordem é um comando individual e concreto, ao passo que a
instrução, ao passo de vinculativo, é um comando geral e abstrato.
Contudo, em ambos os casos, há dever de obediência.
Por exemplo, um subalterno pode querer decidir x e o superior diz para decidir y,
onde, estando obrigado a cumprir a ordem o superior hierárquico, terá de dar ao
conteúdo do seu ato, a solução y, pois esta foi ditada pelo superior hierárquico.
Com isto, através do poder de direção e do inerente poder de obediência, a ordem
jurídica prescinde da convergência entre a vontade real e a vontade declarada do
subalterno, onde a vontade deste tem de vontade real do superior.
Assim sendo, esta faculdade que o superior tem, “esvazia” o poder
discricionário do subalterno, onde este deixa de ter poder de escolha, onde, no limite,
o superior hierárquico pode ditar o conteúdo do ato a praticar pelo subalterno.
Nesta base, verificamos que esta é a forma mais intensa de relacionamento entre dois
órgãos da Administração Pública, onde o superior hierárquico é o responsável pela
unidade do respetivo serviço, respondendo politicamente.
Portanto, não só o superior hierárquico tem um poder de direção relativamente
ao qual há dever de obediência do subalterno, como, por outro lado, o superior
hierárquico que emita uma ordem ou uma instrução ilegal, a regra é a que o subalterno
está obrigado a acatar a ordem ou instrução ilegal, salvo se esta for nula, pois os
atos nulos não produzem efeitos e, por isso, não geram dever de obediência.
De acordo com o art. 271º/3 da CRP, cessa o dever de obediência sempre que a
ordem ou instrução envolva a prática de um crime.
Nesta base, de acordo com o professor Paulo Otero, a coerência do sistema jurídico
só pode excluir que, para além dos atos que envolvam crime, também todos os outros
que se consubstanciem na prática de atos nulos, não exista dever de obediência.
Com isto, se o desvalor regra da invalidade é a anulabilidade, sempre que a
ordem e instrução são inválidas, o subalterno está vinculado a obedecer.
Por outro lado, perante uma ordem que é ilegal, mas que não se reconduz a um ato
nulo, questiona-se o que deve fazer o órgão subalterno.
Primeiramente, o subalterno deve alertar de que a ordem ou instrução são
inválidas.
Posteriormente, deve pedir que lhe seja transmitido por escrito que deve
obedecer àquela ordem ou instrução com aquele conteúdo, uma vez que isto o
exonera da responsabilidade civil que decorra dos prejuízos emergentes da prática do
ato que era inválido.
Assim, a responsabilidade civil não é de quem obedece, mas sim de quem
manda, que é o superior hierárquico.
Nisto, através do poder de direção, podemos encontrar um desfasamento entre o
autor material, que é o subalterno, e o autor real do ato, que é o superior
hierárquico.
De acordo com o art. 112º/5 da CRP, em relação à interpretação e aplicação dos
preceitos, atribui-se a faculdade de uma lei poder conferir a atos de natureza
diferente com eficácia interna esse poder de modificar e de alterar.
Por isso, a Administração Pública pode ter no seu interior uma legalidade que é
inversa da legalidade externa, onde os subalternos devem-lhe obediência.

o Poderes de controlo

Nos poderes de controlo sobre a atuação do subalterno, encontramos três tipos,


nomeadamente:
● Poder de inspecionar, que é o poder se aquilo que foi determinado está a ser
cumprido;
● Poder de supervisão, que é a faculdade que o superior hierárquico tem de
revogar os atos praticados pelo subalterno, incidindo, pois, sobre a conduta
deste;
● Poder disciplinar, que é o poder de aplicar sanções sobre a conduta do
respetivo subalterno.

Assim sendo, o superior hierárquico pode aplicar sanções não apenas quando o
subalterno não cumpre ordens legais, mas também quando não obedece a ordens ilegais
que, quando eram anuláveis, tinham dever de obediência.
o Poderes dispositivos da competência

No poder hierárquico, uma vez que este é o dispor da competência, existem três
tipos, nomeadamente:
● Poder de resolver conflitos de competência, por exemplo, o superior
hierárquico A tem como subalternos B e C, onde estes estão em “guerra” e, por
isso, o superior decide qual o órgão competente;
● Poder de delegação, que é o poder de delegar ou não delegar ou de revogar os
poderes delegados em relação ao subalterno;
● Poder de substituição, em que o superior hierárquico tem um poder de
substituição de se antecipar e de exercer poderes do subalterno.
❖ Deveres do subalterno
Nos deveres do subalterno, temos uma pluralidade de deveres do subalterno,
nomeadamente o dever de zelo, dever de respeito pela legalidade e do dever de
obediência.
De acordo com a hierarquia administrativa, estamos perante um caso de
prevalência da vontade do superior hierárquico, onde há uma prevalência sobre o
poder discricionário do subalterno e sobre a própria lei.
Assim, leva-se a uma disponibilidade da vontade decisória do subalterno pelo
superior hierárquico, o que significa que a hierarquia administrativa encerra uma
forma de substituição imediata do superior ao subalterno.
Nisto, o superior impõe a sua vontade à vontade do subalterno e, neste sentido,
substituindo a vontade do mesmo pela sua própria vontade superior.

❖ Delimitação da hierarquia
Através da hierarquia, existe uma pluralidade de órgãos da Administração, onde
cada órgão tem poderes de decisão onde, no entanto, apesar da hierarquia pressupor a
desconcentração de poderes, mas, no entanto, esta é ilusória.
Nisto, há uma descontração formal, mas, na realidade, há uma concentração da
vontade decisória no superior hierárquico.
Além disso, não há hierarquia entre órgãos constitucionais, entre órgãos
colegiais, uma vez que a sua vontade se apura pelo princípio maioritário e entre órgãos
administrativos singulares, pois são órgãos independentes.
Assim sendo, existem matérias que estão afastadas da hierarquia administrativa,
como por exemplo competência delegada, pois a lei afirma que o delegante pode emitir
diretivas ou recomendações, que estão num patamar abaixo face a ordens e instruções.
Nisto, também estão afastadas da hierarquia a atividade contratual onde pode
haver poder de direção, mas não há hierarquia administrativa.
Por outro lado, também está excluída a atividade técnica e material, que
pressupõe a especialização da respetiva atividade.
No entanto, a hierarquia é compatível com a Constituição, onde se pressupõe o
sistema de Governo de responsabilidade parlamentar, envolvendo uma identidade de
competência material interna entre o superior e o subalterno.
Por isso, a hierarquia administrativa é, pois, um princípio geral de direito não
escrito de natureza consuetudinária, onde, se a lei nada disser em contrário, a
estrutura interna da entidade pública em causa obedece a um princípio hierárquico.

❖ Entidades privadas
Como vimos, as entidades privadas podem ser chamadas a exercer funções
administrativas, correspondendo ao exercício privado da Administração Pública.
Nisto, existem duas categorias deste exercício, nomeadamente:
● Aqueças que exercem poder de autoridade;
● Aqueles que não têm poderes de autoridade, exercendo funções de natureza
administrativa, mas sem envolver o exercício de poderes de autoridade.

Assim sendo, existem quatro vias perante as quais as entidades privadas podem
ser chamadas a exercer funções administrativas, nomeadamente:
● Funções transferidas por concessão, que é um vínculo através do qual as
entidades privadas passam a exercer as funções públicas, como por exemplo as
concessórias das autoestradas;
● Funções que são o objeto normal e exclusiva de uma determinada atividade
desenvolvida por entidades privadas, como por exemplo o caso de notariado
que exerce funções públicas de autenticação;
● Funções que são acessoriamente confiadas a entidades privadas, onde estas
não têm como propósito nuclear exercer funções de natureza pública, mas, no
entanto, a título acessório lhes ser confiado esse exercício, como por exemplo
no caso dos médicos quando fazem atestados de óbitos;
● Funções ocasionalmente atribuídas a entidades privadas, onde, por exemplo,
qualquer um de nós pode deter alguém que pratique um crime, para chamar de
imediato a autoridade pública.

Contudo, existem limites a este exercício dos poderes da autoridade por parte
das entidades privadas, pois deve-se entender que as funções nucleares do Estado não
podem estar confiadas a entidades privadas a título normal, como por exemplo o
exercício da atividade no âmbito das Forças Armadas.
Há, pois, limites que têm que ver com o exercício de funções de soberania, não
podendo ser delegadas.
No entanto, coloca-se o problema do título jurídico do exercício dos poderes
públicos, onde, apesar de estamos perante um caso de delegação de poderes, a raiz dos
poderes pertence às entidades públicas e, por isso, a qualquer momento, podem
chamar a si o exercício direito e imediato desses poderes que haviam confiado às
entidades privadas.
Por outro lado, a título delegado, os poderes exercidos pelas entidades privadas
estão sujeitos a um poder genérico de supremacia das entidades públicas, que
devem conduzir os termos pelos quais querem ver os poderes exercidos pelas entidades
privadas.
Neste sentido, temos de saber estas entidades privadas que exercem funções públicas
integram organicamente a Administração Pública, havendo uma dicotomia de posições,
nomeadamente:
● Integracionistas, que são aqueles que consideram que as entidades privadas são
transferidas e integradas na Administração Pública;
● Não integracionistas, que são aqueles que consideram que as funções privadas
estão fora da Administração Pública.

De acordo com o art. 267º/6 da CRP, temos a referência às entidades privadas


que exercem funções públicas, onde isto significa que estas integram a estrutura
Administração Pública numa posição integracionista.
Nisto, as entidades privadas devem ser tratadas estruturas da Administração Pública
no âmbito da atividade de exercício de funções públicas, mas, em tudo aquilo que não
lhe diga respeito, não poderão integrar a Administração Pública.
Todavia, há formas de colaboração dos privados com a Administração que não
passam pelas figuras de exercício privado de funções públicas, onde estas são
formas através das quais os particulares, colaboram com fins da Administração Pública,
como por exemplo as pessoas coletivas de utilidade pública.

❖ Organização da Administração Pública portuguesa


Na Administração Pública portuguesa, existe uma estrutura complexa, que
corresponde ao facto de aparecer como Administração da União Europeia.
Na estrutura da Administração Pública portuguesa, surge a importância dos fins
dos Estado, que são um elemento central para a compreensão da sua organização, uma
vez que os fins do Estado correspondem às tarefas fundamentais, de acordo com o
art. 9º da CRP, sendo o Estado a principal entidade pública.
Por outro lado, são os fins do Estado que permitem compreender a estrutura da
Administração Pública portuguesa, onde esta parte de três capítulos, onde há uma
Administração que prossegue os fins do Estado, uma Administração autónoma
relativamente aos fins do Estado e uma Administração independentemente dos fins do
Estado.
Com isto, existem várias aceções do Estado, nomeadamente:
● Aceção internacional;
● Aceção constitucional;
● Aceção administrativa.

Na aceção internacional, trata-se do Estado soberano, que é titular de direitos e


obrigações na esfera internacional, enquanto na aceção constitucional o Estado surge
como comunidade de cidadãos.
Por outro lado, na aceção administrativa, o Estado é a pessoa coletiva pública que,
sob a direção do Governo, desempenha a atividade administrativa.

❖ O Estado como pessoa coletiva

De acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, a figura do


Estado-administração é uma pessoa coletiva pública autónoma, de acordo com o
art. 3º/3 da CRP, que não se confunde com as demais entidades que integram a
Administração, pois cada entidade tem a sua personalidade jurídica.
o Administração que prossegue os fins do Estado

Na Administração que prossegue os fins do Estado, esta pode comportar variadas


espécies.
Assim, estes fins podem ser prosseguidos pela própria pessoa coletiva Estado,
sendo esta uma Administração direta do Estado, como por exemplo o art.
199º/alínea d da CRP.
No entanto, pode acontecer que o Estado crie outras entidades que ainda prosseguem
os fins do Estado, mas já não são a própria pessoa coletiva, sendo esta uma
Administração indireta.
Nisto, a Administração indireta do Estado é aquela que, prosseguindo os fins do
Estado, fá-lo através de outras pessoas coletivas criadas e instrumentalizadas, de
acordo com o art. 199º/alínea d da CRP.
Dentro desta Administração indireta, existem duas categorias de entidades
integrantes, nomeadamente uma Administração indireta sob forma pública,
integrando pessoas coletivas de direito público, e uma Administração indireta sob
forma privada, onde são criadas entidades privadas para prosseguir os fins do Estado.
Assim sendo, quer em relação à Administração direta, quer em relação à
Administração indireta, o Governo tem uma função primordial pelo facto de ter
poderes de supremacia relativamente a estas estruturas.
Portanto, a dimensão dos poderes de intervenção do Governo em relação a estas
estruturas compreende o grau de responsabilidade que o Governo tem perante o
Parlamento.
Nesta base, o Governo é mais responsável na Administração direta do que pela
Administração indireta, onde nesta última apenas tem poder de superintendência e de
tutela.

❖ Administração direta do Estado


Na Administração direta, de acordo com o professor Paulo Otero, temos de
diferenciar a Administração central e a Administração periférica, uma vez que nem
todos os órgãos e serviços do Estado exercer competência extensiva a todo o território
nacional
Assim, na Administração central, a sua atuação cobre todo o território nacional,
como por exemplo os serviços nacionais no âmbito do Ministério das Finanças, ao
passo que na Administração periférica, a atuação do Estado circunscreve-se a
determinadas áreas territoriais, como por exemplo o comandado distrital de Lisboa
da PSP.
Na Administração central, esta poderá ser sujeita ao poder de direção do
Governo, onde, contrariamente, também pode ocorrer que exista uma
Administração que não está sujeita a ordens e instruções do Governo, mas que age
sobre todo o território nacional.
Há, pois, serviços autónomos que não estão sujeitos à intervenção hierárquica do
Governo e autoridade independentes que não têm personalidade jurídica, como por
exemplo o Provedor de Justiça.
Por outro lado, na Administração periférica, se a sua atuação for no interior do
território nacional, será interna, onde, por outro lado, se a sua atuação for no
exterior do território nacional, será externa, como por exemplo no caso dos
consulados portugueses no estrangeiro.
Contudo, há outras formas de Administração local que não pertencem ao
Estado, como por exemplo a Administração regional e a Administração autárquica.
Por exemplo, os governadores civis são órgãos locais do Estado, mas os presidentes
das camaradas nada têm que ver, pois são órgãos locais dos municípios.
Assim, reflete-se a distinção entre o Estado e as demais pessoas coletivas públicas
que compõem a Administração.
Nesta base, podemos dizer que a Administração direta do Estado é a atividade
exercida pelos serviços integrados na pessoa coletiva Estado.
Com isto, surgem vários sentidos que definem a Administração direta do
Estado, nomeadamente:
● Unicidade, onde o Estado é a única espécie deste género;
● Carácter originário, onde a pessoa coletiva Estado não é criada pelo poder
constituído;
● Territorialidade, onde o Estado faz parte do território nacional;
● Estrutura hierárquica, onde a Administração direta do Estado se faz de acordo
com um modelo de organização administrativa.

Nas atribuições do Estado, isto é, nos fins ou objetivos que se propõe a atingir,
estas têm de resultar sempre expressamente da lei, pois o Estado só pode fazer aquilo
que a lei que permita.
Assim, de acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, existem quatro
grupos de atribuições principais, nomeadamente:
● Atribuições de soberania, como por exemplo a defesa nacional;
● Atribuições económicas, como por exemplo o crédito e o imposto;
● Atribuições sociais, como por exemplo a saúde e a habitação;
● Atribuições educativas e culturais, como por exemplo o ensino.

Com isto, podemos dizer que o Governo é o principal órgão permanente e direto
da Administração central do Estado, com carácter administrativo.
Neste sentido, identificam-se várias funções do Governo, nomeadamente:
● Garantir a execução das leis, de acordo com o art. 199º/alínea c e f da CRP;
● Assegurar o funcionamento da Administração Pública, de acordo com o art.
199º/alínea a, b e d da CRP;
● Promoção da satisfação das necessidades coletivas, de acordo com o art.
199º/alínea g da CRP.

Para além disto, o Governo não só dirige a Administração direta do Estado, como
superintende na Administração indireta e tutela a mesma e a Administração autónoma.
Assim, o Governo dirige a Administração do Estado e superintende ou tutela a
Administração não estadual.

o Administração periférica

Como vimos, a periferia designa as áreas territoriais situadas fora da capital do


país, onde se encontram os órgãos e serviços locais, como por exemplo as freguesias.
Contudo, de acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, não podemos
confundir com a administração local autárquica, pois esta é constituída por autarquias
locais, onde, por isso, é uma forma de Administração distinta.
Nisto, a Administração periférica é o conjunto de órgãos e serviços de pessoas
coletivas públicas que dispõem de competência limitada a uma área territorial
restrita, funcionamento sob a direção dos correspondentes órgãos centrais.
Por isso, o Estado também é titular da Administração periférica.

❖ Administração estadual indireta sob forma pública


Na Administração indireta sob forma pública, a sua criação obedece ao princípio
da legalidade, onde só se podem criar entidades públicas nos termos da própria lei.
Por isso, esta é atividade que, embora prossiga os fins do Estado, estes são exercidos
por pessoas coletivas públicas distintas do Estado.
Contudo, todas estas entidades possuem personalidade jurídica própria, o que
significa que têm capacidade jurídica, património próprio, tendo autonomia para o gerir
e no âmbito da decisão administrativa.
Nisto, este tipo de Administração existe em resultado do constante alargamento e
da crescente complexificação das funções do Estado e da vida administrativa.
Assim, desenvolve-se uma atividade que o Estado transfere, por decisão sua, para
outras entidades distintivas dele.
Nesta base, o Estado dispõe do poder de lhes dar instruções e diretivas acerca do
modo de exercer a sua atividade.
Por outro lado, surge ainda o princípio da responsabilidade patrimonial, em que,
pelos atos que praticam ou pela omissão dos mesmos, responde o património das
entidades, onde, por vezes, este é o motivo da criação das entidades públicas.
Assim sendo, surge o problema de saber se, através da criação de entidades
públicas, não há uma forma de desresponsabilização patrimonial do Estado.
De acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, a Administração estadual
indireta é exercida no interesse do Estado, mas, todavia, pelos atos das entidades,
respondem estas juridicamente.
Além disso, estas entidades públicas estão ainda sujeitas a uma intervenção
orientadora e de controlo por parte do Governo, que corresponde à superintendência
e à tutela de acordo com o art. 199º/alínea d da CRP e, portanto, não têm autonomia.
Por outro lado, surge ainda a dualidade dos modos de gestão da respetiva
atividade, onde é possível que esta seja regida pelo Direito Administrativo e pelo
Direito Privado.
Há, pois, uma dualidade de regime de gestão.
No entanto, surgem ainda entidades públicas que integram esta Administração
indireta sob forma pública, que são os institutos públicos e que se podem dividir em
três grupos, nomeadamente:
● Serviços personalizados, de acordo com o art. 3º/1 e 2 da LQIP, que são serviços
que podiam funcionar na independência hierárquica, mas a ordem jurídica
atribuiu-lhes personalidade jurídica, autonomizando-os da entidade pública
Estado.

Nisto, estes serviços podem ter natureza burocrática ou natureza prestadora,


como por exemplo um hospital;
● Fundações públicas, onde, através destas, há um património a que ordem jurídica
resolve atribuir personalidade jurídica e, por isso, existem fundações públicas de
Direito Público ou fundações públicas de Direito Privado.

Enquanto que as Fundações Públicas de Direito Público têm uma gestão pública, as
Fundações Públicas de Direito têm uma gestão privada.
No entanto, há regras específicas a propósito das Fundações públicas que resulta
da Lei Quadro das Fundações;
● Entidades públicas empresariais, que são as antigas empresas públicas (EP), que
se ligam com as pessoas coletivas de Direito Público que têm o propósito de
desenvolver uma atividade de natureza económica e que têm personalidade
jurídica de Direito Público.

Desde modo, têm a ideia de prosseguir os fins dos Estado e, por isso, são
Administração Indireta.
No entanto, as EPE regem-se por uma gestão privada, pois normalmente atuam
em mercado concorrencial.
Nisto, os institutos públicos são uma pessoa coletiva pública de tipo
institucional, que assegura o desempenho de determinadas funções administrativas de
carácter empresarial, de acordo com o art. 3º/4 e art. 4º/1 da LQIP.

❖ Administração indireta sob forma privada


Na Administração indireta sob forma privada, estas entidades prosseguem os fins
do Estado através de pessoas coletivas de Direito Privado, nomeadamente:
● Entidades privadas de tipo empresarial, que são empresas públicas, o que
significa que o setor empresarial do Estado é composto por entidades empresarias
com personalidade jurídica de Direito Público, mas também por entidades
privadas sujeitas à influência do Estado.

Nesta base, estas entidades empresariais de tipo privado que integram a


Administração Indireta sob forma privada podem ter três configurações,
nomeadamente:
✔ Sociedades de capitais integralmente públicos, que são pessoas coletivas de
Direito Privado que praticam atos de comércio e cujo capital social é 100%
detido por entidades públicas.

Nisto, as sociedades de capitais integralmente públicos podem sê-lo nas mãos de


uma única entidade, como por exemplo o Estado, sendo uma sociedade unipessoal,
em que só há um sócio que é o Estado, que detém 100% do respetivo capital.
Além disto, podem ser sociedades integralmente públicos onde os 100% do capital
social são detidos por várias entidades públicas, como por exemplo o Estado e a
Caixa Geral de Depósitos;
✔ Sociedades de capitais maioritariamente públicos, que são sociedades ou
empresas mistas que conjugam o capital público e o capital privado, onde
importa saber quem tem a maioria, que é 50%+1 ação.

Nisto, por serem maioritariamente públicas, a parte pública do capital faz com que
estas sociedades se insiram no âmbito da Administração Indireta sob forma privada.
Com isto, quer nas sociedades de capitais integralmente públicos quer as sociedades
de capitais maioritariamente públicos, estas são formas de privatização desta atuação
empresarial.
No primeiro caso, o Estado privatiza a forma porque são sociedades anónimas,
enquanto no segundo, a privatização vai mais para além da forma, uma vez que é de
parte do capital social;
✔ Sociedades sujeitas a outras formas de influência dominante, o Estado pode
ser minoritário, mas, uma vez que capital das outras entidades privadas é
disperso, com apenas 40%, o Estado pode controlar a respetiva entidade, por
exemplo – sociedades controladas pelo Estado –, onde participação do capital
do Estado é minoritária, mas é concentrada;
● Entidades privadas de tipo não empresarial

Nas entidades privadas de tipo não empresarial, embora sejam criadas no âmbito da
prossecução dos fins do Estado, podem existir associações que não tenham
propósitos comerciais.

❖ Administração Autónoma do Estado


Nas últimas décadas, têm-se acentuado uma perda da centralidade organizativa do
Estado, uma vez que os fins do Estado têm sido prosseguidos através de entidades
autónomas ou criados fins prosseguidos por entidades independentes.
Nisto, embora sejam fins públicos, a Administração Autónoma prossegue fins que
já não são os fins do Estado, onde existem dois tipos de Administração Autónoma
do Estado, nomeadamente:
● Administração Autónoma típica, uma vez que é prosseguida por entidades
públicas com uma personalidade de Direito Público ou sujeitas a uma
influência pública dominante;
● Administração Autónoma atípica, uma vez que são formas de exercício
privado de funções públicas sujeito a fiscalização administrativa.

Assim, prosseguem-se interesses públicos próprios das pessoas que constituem a


Administração autónoma, definindo com independência a orientação das suas
atividades, sem sujeição ou superintendência do Governo.
Nisto, na Administração Autónoma existe um substrato humano, enquanto na
Administração indireta o mesmo não acontece, pois aqui os substratos são materiais.

o Administração Autónoma típica

As entidades que fazem parte da Administração Autónoma do Estado dividem-se


fundamentalmente em três categorias, nomeadamente:
● Autarquias locais, de acordo com o art. 235º da CRP, onde, nesta categoria,
podemos sublinhar que existem três tipos constitucionais de autarquias locais,
nomeadamente:
✔ Regiões administrativas, que ainda não foram instituídas;
✔ Municípios, que é a principal autarquia local, pois é o único tipo de autarquia
que tem existência universal;
✔ Freguesias.

Com isto, de acordo com o professor Diogo Freitas do Amaral, em sentido


subjetivo ou orgânico, a administração local autárquica é o conjunto das autarquias
locais, ao passo no sentido objetivo ou material é a atividade administrativa
desenvolvida pelas autarquias locais.
Assim sendo, as autárquicas locais são pessoas coletivas públicas de população e
território, correspondentes aos agregados residentes em diversas circunscrições do
território nacional.
Nisto, cada município e cada freguesia são uma pessoa coletiva pública.
Por outro lado, há elementos comuns em todas as autarquias, nomeadamente a
personalidade jurídica, território, população, interesses próprios definidos em função da
população e do território e os órgãos representativos, onde há a eleição da câmara
municipal, eleição da Assembleia municipal e a eleição da Assembleia de freguesia.
Há, pois, uma representatividade direta, onde a Assembleia de freguesia elegerá a
junta de freguesia.
No âmbito do município, existe uma administração municipal direta, onde um
setor não autónomo que são os serviços que estão sob direção da câmara municipal,
como por exemplo o Presidente, e uma Administração municipal direta autónoma,
que exerce as suas funções sujeita a recomendações e a diretivas, mas não sujeita a
hierarquia, como por exemplo os serviços municipalizados.
Todavia, é possível encontrar uma administração municipal indireta, o que
significa que são entidades coletivas criadas pelo município para prosseguir os fins do
mesmo, mas que são dotadas de personalidade jurídica própria sujeitas a
superintendência e a tutela por parte do respetivo município.
Neste tipo de administração municipal, podemos encontrar uma Administração
municipal indireta sob forma pública e uma Administração municipal indireta sob
forma privada;
● Instituições públicas de ensino superior, onde existem quatro categorias:
✔ Universidades, tendo autonomia reconhecida, de acordo com o art. 76º/2 da
CRP, podendo ser uma Administração direta ou uma Administração indireta.

Por exemplo, a Universidade pode criar uma empresa se dedique à publicação de


livros, onde esta estrutura empresarial universitária não é a pessoa coletiva
Universidade, mas prossegue os fins da administração os fins da pessoa coletiva
Universidade e, por isso, faz parte da Administração indireta universitária.
Nisto, cada universidade tem personalidade jurídica própria, onde, dentro destas
universidades, as faculdades têm personalidade jurídica.
Assim sendo, as Universidades podem funcionar como uma verdadeira
federação de faculdades;
✔ Institutos politécnicos, que também têm personalidade jurídica de Direito
Público, podendo ter uma Administração direta e uma Administração indireta
seja ela sob forma pública, seja ela sob forma privada;
✔ Fundações Públicas de Direito Privado, como por exemplo a Universidade
Nova de Lisboa, que é uma fundação pública de Direito Privado no âmbito do
ensino.
✔ Consórcios personificado, que são contratos onde duas ou mais entidades
colaboram na prossecução de uma determinada tarefa no âmbito do ensino
superior;
● Associações públicas, onde existe um conjunto de pessoas a quem a ordem
jurídica atribui a personalidade jurídica e a prossecução de fins de natureza
pública. e, por isso, são de tipo associativo.

Nisto, existem três categorias de associações públicas, nomeadamente:


✔ Associações públicas de entidades públicas, onde podemos encontrar formas
de Administração direta e formas de Administração indireta, como por exemplo
as empresas metropolitanas;
✔ Associações públicas de entidades privadas, como por exemplo a ordem dos
advogados, que são regidas pela Lei nº6/2008 de 13 de fevereiro;
✔ Associações públicas de natureza mista, que conjugam as associações públicas
de entidades públicas e as associações públicas de entidades privadas.

Assim, as associações públicas destinam-se a assegurar autonomamente a


prossecução de determinados interesses públicos pertencentes a um grupo de pessoas
que se organizam com esse fim.
o Administração independente do Estado

Na Administração independente do Estado, esta visa satisfazer determinados


setores da Administração que, de acordo com a Constituição, não podem estar
numa dependência.
Nisto, surgem três grupos que integram a Administração independente do
Estado, nomeadamente:
● Regiões Autónomas, de acordo com o art. 225º da CRP;
● Entidades administrativas independentes;
● Exercício privado de funções públicas sem fiscalização administrativa.

Nas Regiões Autónomas, estas obedecem a um princípio de tipicidade como


cláusulas fechadas, onde só podem existir os Açores e a Madeira, que se diferenciam
das futuras regiões administrativas.
Nisto, as Regiões Autónomas são titulares de autonomia político-legislativa,
enquanto as regiões administrativas não a têm.
Nesta base, de acordo com o art. 199º/alínea d da CRP, podemos encontrar
quatro tipos de Administração regional, nomeadamente:
● Administração regional direta;
● Administração regional indireta;
● Administração regional autónoma;
● Administração regional independente.

o Administração regional direta

Na Administração direta da Região Autónoma, esta tem como órgão de topo o


Governo regional, prosseguindo os seus fins pela própria pessoa coletiva, onde pode
haver uma Administração direta central, na medida em que exerce a atividade
administrativa sobre toda a Região Autónoma, e uma Administração direta local, na
medida em que exerce o seu poder numa determinada área da Região Autónoma.

o Administração regional indireta

Na Administração regional indireta, esta pode ser sob forma pública ou sob forma
privada, onde a Região Autónoma pode criar entidades públicas ou privadas que já não
integradas em si, mas instrumentalizadas para prosseguirem fins da própria Região
Autónoma.
Nisto, na Administração regional indireta sob forma privada, podem existir
estruturas sem natureza empresarial ou com natureza empresarial, onde no último
caso é possível sociedades anónimas controladas pela respetiva Região Autónoma.
No entanto, na Administração regional indireta sob forma pública também se
encontram fundações públicas regionais e empresas públicas regionais.
o Administração regional autónoma

Na Administração regional autónoma, estas integram as autarquias locais, onde


não estão sujeitas a poder de tutela do Governo da República, mas estão sujeitas a uma
intervenção de controlo por parte do respetivo Governo regional.
Assim sendo, nas Regiões Autónomas, as autarquias locais fazem parte da
Administração regional autónoma.
Paralelamente às autarquias locais, é ainda possível a existência de outras
entidades autónomas que se integrem dentro do setor da Administração regional.
Nisto, as regiões autónomas dos Açores e da Madeira são pessoas coletivas de direito
público que dispõem de um estatuto político-administrativos para a prossecução
dos seus fins específicos.
o Administração regional independente

De acordo com o art. 129º do Estatuto político da Região Autónoma dos Açores,
prevê-se a existência de entidades administrativas independentes regionais.
Quanto às entidades administrativas independente em geral que fazem parte da
Administração independente do Estado, estas não estão sujeitas a poder por parte do
Governo.
Por outro lado, estas entidades administrativas independentes têm personalidade
jurídica própria, como por exemplo o Banco de Portugal, onde foram criadas para
estarem livres de uma intervenção intra administrativa por parte do Governo, que
pudesse ter uma supremacia sobre a atuação destas entidades.
Nesta base, surgem ainda as funções no âmbito do mercado, de natureza
regulador ou de natureza técnica e, por isso, é importante para o exercício da
respetiva atividade que fossem pautadas por critérios que a fundamentassem.

De acordo com a lei-quadro das entidades administrativas independentes,


importa sublinhar a existência de entidades que têm uma maior conexão à União
Europeia relativamente a outras que têm uma menor ligação.
Nisto, aquelas que têm uma maior conexão à União Europeia são entidades
administrativas independentes que se integra na Administração Pública portuguesa e
na Administração Pública da União Europeia.
Como sabemos, a Administração Pública nacional funciona como Administração da
União Europeia, onde, atualmente, as estruturas da Administração pública
portuguesa não se limitam a aplicar o direito português.
Assim sendo, também se aplica atos jurídicos provenientes da União Europeia,
onde, neste sentido, a Administração Pública portuguesa funciona como instrumento
dos fins da própria União Europeia.
Funciona, pois, como Administração Pública da União Europeia, onde, por isso,
estamos perante uma Administração partilhada entre a União Europeia e os Estados
membros.
Por outro lado, temos uma coadministração, onde assuntos cuja decisão
administrativa envolve uma partilha de poderes de decisão entre as Administrações
Públicas de cada estado membro e a Administração Pública da União Europeia.
Contudo, temos ainda uma federação administrativa europeia, em que a União
Europeia funciona como uma estrutura federal e as estruturas dos estados membros
como estruturas administrativas federais.
Nisto, normalmente, a decisão é feita na estrutura federal, mas a sua concretização e
aplicação é feita por cada uma das Administrativas Públicas dos estados membros.
Há, pois, uma Administração Pública partilhada entre a União Europeia e os Estados
membros no sentido em que obedece ao princípio da subsidiariedade e a uma
intervenção mínima da união europeia.
Assim sendo, a União Europeia só age quando os estados membros não o possam
fazer.
Por outro lado, na sequência disto, surge a ideia de que a execução das decisões da
União Europeia não é feita diretamente por esta, mas atribuída a cada um dos
estados membros.
Nesta base, o Direito da União Europeia é executado pelas administrações
nacionais, havendo, pois, inexecução indireta deste direito.
Com isto, coloca-se a questão de saber como qualificar a Administração Pública
dos Estados membros, sempre que esta executar o Direito da União Europeia.
Neste sentido, existem três configurações, nomeadamente:
● A Administração Pública dos Estados membros como indireta da União
Europeia, onde visa prosseguir os fins desta e, por isso, no âmbito da execução
das decisões, transforma as Administrações Públicas dos Estados em
Administrações satélites da União Europeia – Administração indireta da
União Europeia;
● A Administração Pública dos Estados membros como delegada da União
Europeia, uma vez que exerce o pode de execução Direito da União Europeia,
que foi delegado pela própria, estando, pois, sujeito a um poder de controlo;
● A Administração Pública dos Estados membros como federada, onde
executa a legislação produzida pela federação.

No entanto, estas configurações têm argumentos a favor e argumentos contra.


❖ Princípios gerais da aplicação do Direito da União
Europeia pela Administração Pública portuguesa
Neste caso, quando a Administração Pública é chamada a executar atos da União
Europeia, temos quatro princípios que devem pautar a sua atuação, nomeadamente:
● Princípio do primado do Direito da União Europeia, onde, em caso de
conflito entre uma decisão da União Europeia e uma decisão do Direito
nacional, deve prevalecer o primeiro.

Esta é, pois, uma forma de garantir o princípio da efetividade do Direito da


União Europeia;
● Princípio da cooperação leal, onde os Estados membros devem executar o
Direito da União Europeia diligenciando, fazendo tudo que estiver ao seu
alcance para garantir essa mesma execução, não criando obstáculos direitos ou
indiretos;
● Princípio da autonomia, onde compete aos estados a execução, mas devem
executá-lo com autonomia, pois não é possível um poder de direção da União
Europeia sobre os estados-membros.

Além disto, ao nível da execução, a intervenção da União Europeia também se


deve pautar pelo princípio da subsidiariedade;
● Princípio pelo respeito pelas vinculações da União Europeia, onde, se os
Estados gozam de autonomia na execução e a União Europeia não pode limitar
essa mesma autonomia, por outro lado, executem o Direito da União Europeia,
os Estados devem respeitar as vinculações que resultam do próprio Direito.

Nisto, também aqui existe uma manifestação de cooperação leal bilateral, ou


seja, dos Estados-membros em relação à União Europeia e desta em relação aos estados
membros.

❖ Transformações ao nível da organização administrativa


que resultaram da União Europeia
Nas transformações organizativas que resultam dos estados membros executarem o
Direito da União Europeia, temos quatro tipos, nomeadamente:
● Transformações materiais, onde aumentaram as tarefas e as áreas de
intervenção dos estados membros e das suas Administrações e, até ao momento
da adesão, os estados membros apenas executavam as suas próprias leis e as
suas próprias normas.

Nisto, com a entrada para a União Europeia, além de terem de dar execução ao seu
direito, passaram a ter de dar execução ao direito da União Europeia, o que levou a
uma reconfiguração interna da repartição de poderes;
● Transformações de natureza organizativa, onde a execução do Direito da
União Europeia pelos estados membros veio dar origem à criação de novas
estruturas organizativas, novas entidades e novos órgãos com competência
para executarem o Direito da União Europeia.

Nisto, surge a questão de saber se a execução do Direito da União Europeia deve


pertencer a um Ministério Autónomo ou se deve ser feita em função da matéria
pelos respetivos Ministérios.
Por exemplo, temos de saber se uma execução no âmbito da justiça deve ser o
Ministério da Justiça.
Posteriormente, surge a sujeição de certas estruturas internas dos estados
membros à intervenção da União Europeia, onde isto é patente nas entidades
administrativas independentes;
● Complexificação do procedimento administrativo, onde há decisões que são
tomadas em Portugal, mas que carecem de intervenção da União Europeia ou
de uma intervenção à priori, autorizando, ou de uma autorização à
posteriori, aprovando, como por exemplo o orçamento de Estado.
● Duplicação dos mecanismos de controlo do Direito da União Europeia, onde
compete aos estados membros executar o Direito da União Europeia, estando
sujeitos a um controlo por partes das instituições de controlo internas,
nomeadamente pelo Parlamento, mas também a um controlo por parte das
instituições da União Europeia.

Por isso, há, pois, uma sujeição a mecanismos de controlo por parte das autoridades
nacionais, mecanismos de controlo dentro da própria Administração – autocontrolo –,
mecanismos de controlo judicial por parte dos tribunais e mecanismos de controlo
parlamentar.
Além disso, passam a estar sujeitas a um controlo por parte das autoridades das
União Europeia, nomeadamente Comissão Europeia.
Assim, surge um risco de conflitos positivos de controlo, isto é, de duas estruturas
sobre a mesma matéria opinarem em sentido diferente.
Por outro lado, coloca-se a questão de saber se o Governo ainda é o órgão superior
de toda a Administração Pública ou se é apenas o órgão superior da Administração
Pública portuguesa quando esta executa o Direito Nacional.
Nisto, de acordo com a Constituição, o Governo não tem poderes completos de
intervenção sobre as autarquias locais, tendo apenas poderes de controlo de
verificação da legalidade, sem poder emitir juízos sobre o mérito de atuação.
Nessa medida, o Governo não pode revogar um ato da autarquia local, onde, se o
fizer, o ato está ferido de incompetência absoluta, uma vez que há uma invasão por
parte da pessoa coletiva Estado.

❖Ordenamento regulador da Administração Pública

O ordenamento da Administração Pública permite duas óticas diferentes de ser


analisado, onde podemos identificar quais são as normas que regulam a atuação da
Administração Pública.
Por outro lado, permite-nos saber como é que a Administração Pública se
comporta perante a normatividade que a regula, ou seja, que modelo de regulação
da Administração Pública resulta das normas que disciplinam a sua conduta.
Há, pois, um pluralismo de fontes reguladoras da Administração, onde esta gera
uma complexidade de relacionamento entre essas mesmas fontes.
Nisto, importa ainda perceber a metodologia específica que a aplicação das
normas pela Administração Pública, isto é, como esta deve selecionar e aplicar a
norma para decidir o caso concreto.
o Identificação da normatividade reguladora da Administração

Nas normas de regulam a Administração, surge a ideia do pluralismo normativo,


onde a Administração encontra várias normas que regulam a sua atuação.
Por isso, falamos num estado administrativo, em que este está vocacionado para o
exercício da função administrativa, mas também produz normas administrativas
reguladoras da Administração.
Com isto, surgem problemas para quem decide determinar a norma que se deve
aplicar e para os destinatários da decisão, que não sabem qual a norma que se irá
aplicar, colocando em causa a previsibilidade e a segurança dos cidadãos.
Não obstante, surgem dois fenómenos que traduzem a ideia de “menor Estado”,
isto é, a ideia de um neoliberalismo aplicado no âmbito da Administração Públicas,
nomeadamente:
● Desregulação pública, onde o Estado e as entidades públicas deixam de regular;
● Autorregulação, onde os próprios interessados elaboram as normas que
regulam os respetivos interesses, como por exemplo a matéria do domínio ético,
onde as regras deontológicas do exercício da atividade médica, coloca-se a
questão de saber se a definição destas regras competirá aos médicos ou ao
Estado.

Nisto, precisamos de saber se existirá uma autorregulação ou se deve haver uma


intervenção do Estado, ou ainda um modelo misto, onde, daqui decorre a pluralidade
de regulações aplicáveis à situação concreta.
Por exemplo, as regras de avaliação no âmbito do setor educativo podem ser
definidas pelo Estado, pelo Ministério da Educação ou pela Universidade, havendo,
pois, uma pluralidade de estruturas decisões a disciplinarem a mesma matéria.
Por vezes, não só há uma pluralidade de normas de normas jurídicas, como também
pode ocorrer uma pluralidade de soluções incompatíveis.
Contudo, para além da concorrência de regulação jurídica, também encontramos
uma concorrência de regulações extrajurídicas, onde existem outras ordens
normativas que têm soluções disciplinadoras de natureza administrativa, como por
exemplo as regras deontológicas, como vimos.
Apesar de estas não serem normas jurídicas, a sua violação envolve problemas de
natureza jurídico-administrativa, como por exemplo se for preciso adotar uma
sanção disciplina a um médico que não adotou as regras de conduta deontológica.
Por outro lado, existem ainda normas de natureza técnico-científica, como por
exemplo saber como construir uma barragem ou se a máscara deve ou não ser usada em
pública.
Nas normas de trato social, temos, por exemplo, o modo como um aluno se deve
dirigir a um professor, pois se estas regras não forem adotadas, poderá haver
responsabilidade disciplinar ao infrator.
Nisto, apesar de serem normas de trato social, têm repercussões jurídicas.
Contudo, a conduta factual também é passível de gerar uma normatividade,
onde, por exemplo, se alguém adotar uma prática em sentido contrário a uma norma
jurídica, sendo esta reiterada com a convicção de obrigatoriedade, tem-se uma
factualidade que o direito valora, sendo uma norma jurídica de base costumeira.
Com a norma jurídica de base costumeira, o costume é um facto que passa ser uma
norma jurídica, onde, por isso, a factualidade assume repercussão jurídico-normativa.
Todavia, num outro exemplo, se alguém decidir uma situação concreta de A e B e,
mais tarde, em igual de circunstâncias, C pedir a mesma, em nome da igualdade e da
tutela da confiança, terá de se decidir de modo idêntico, uma vez que se criou um
precedente.
Com isto, o precedente permitir passar da solução de um caso concreto para um
critério de decisão de casos futuros e idênticos em circunstâncias semelhantes.
Apesar de a lei permitir que se possa afastar da prática habitualmente decidida, para
o poder fazer, terá de se encontrar fundamentos válidos para isso mesmo,
demonstrando que as situações em causa são diferentes ou que o quadro jurídico se
alterou.
Por exemplo, quando se decidiu relativamente a A, vigorava a lei x, mas, no caso de
C, vigora a lei y, onde, por isso, existem soluções diferentes.
Nesta base, pela superveniência de uma nova norma jurídica, temos a cessação
do precedente.
Assim, podemos dizer que, com o pluralismo normativo regulado da Administração,
existem normas jurídicas e normas extrajurídicas, havendo factualidades que poderão
servir de critério de pauta reguladora de futuras condutas administrativas.
Há, pois, três fenómenos, que se prende com o pluralismo, a concorrência de
normas sobre a mesma matéria e soluções convergentes.
Com isto, a Administração depara-se com o problema de saber qual a norma
aplicável e se esta não é contrariada por outras normas.
Contudo, nas normas jurídicas, teremos de saber como estas regulam a
Administração, onde esta não é apenas regulada pelo Direito Administrativo, pois
também existem outros ramos de Direito.
Nisto, quando atua no âmbito do Direito Administrativo, a Administração fá-lo
tendo em conta a gestão pública, onde, por outro lado, quando Administração Pública
aplica Direito Privado, age ao abrigo da gestão privada, onde este não é igual ao
Direito Privado que os particulares aplicam nas relações entre si.
Neste sentido, quando a Administração aplica o Direito Privado, está vinculada a
respeitar as normas sobre direitos fundamentais e normas que traduzem princípios
gerais de Direito Administrativo, de acordo com o art. 266º da CRP. Este é, pois, um
Direito Privado publicizado ou admnistrativizado.
Contudo, podemos perguntar se toda a atuação administrativa pode ser regulada pelo
Direito Privado, onde, de acordo com o professor Paulo Otero, a Constituição cria
uma reserva de Direito Administrativo, o que significa que há matérias da função
administrativa em relação às quais se exclui a regulação do Direito Privado.
Por outro lado, existem matérias que só podem ser objeto de disciplina pelo
Direito Administrativo, de acordo com o art. 212º/3 da CRP, onde, admitir que tudo
pudesse ser regulado pelo Direito Administrativo, seria liquidar a competência material
dos tribunais administrativos e fiscais.
Num segundo fundamento, de acordo com o art. 268º/4 e 5 da CRP, nas garantias
dos cidadãos, pressupõem-se uma atuação da Administração ao abrigo do Direito
Administrativo.
Num terceiro fundamento, existem interesses constitucionalmente tutelados de
fatores ligados ao interesse público que não podiam ser regulados pelo Direito
Privado, pelo facto de este pressupor a igualdade entre os intervenientes.
Contrariamente, o Direito Administrativo pressupõe que um dos intervenientes
tenha poderes de autoridade, que são ditados pelo interesse público.
Assim sendo, o Direito Administrativo é uma decorrência natural do exercício
de poderes de autoridade na prossecução do interesse público.
Por isso, na reserva constitucional de Direito Administrativo, temos as atividades
administrativas que são objeto de reserva absoluta, onde, sempre que esteja em
causa o exercício de poderes de autoridade, só poderá ser disciplinado por este direito.
Por outro lado, há um conjunto de atividade que a Administração desenvolve, que
podem ser objeto de disciplina através de Direito Administrativo ou do Direito Privado,
nomeadamente as matérias que não envolvem o exercício de poderes de
autoridade.
Contudo, a Administração só pode escolher aplicar Direito Privado se existir uma
norma de Direito Público que lhe permita aplicar Direito Privado, onde temos o
princípio da legalidade e da precedência de lei.
Numa segunda especificidade, temos o silêncio da lei, isto é, se estivermos perante
uma atividade administrativa que não envolve poderes de autoridade, no silêncio, a
Administração deve regular essa atuação ao abrigo do Direito Administrativo.
É Direito Administrativo é, pois, o direito típico do exercício da função
administrativa, onde o fundamento é constitucional.
Todavia, há uma exceção, que se prende com o facto de haver atividades que a
Administração desenvolve que não são de autoridade, mas sim atividades
empresariais que a Administração desenvolve de natureza comercial ou industrial,
que também são prosseguidas pelo setor privado.
Com isto, estamos perante áreas de atuação económica concorrencial entre a
Administração pública e entidades privadas, como por exemplo os transportes
públicos, que podem ser explorados por entidades privadas, mas também explorados por
entidades públicas.
Em suma, sempre que a Administração desenvolve uma atividade empresarial de
natureza comercial ou industrial em mercado concorrencial, não pode ter
prerrogativas de autoridade, nem se pode reger por regras próprias,
marginalizando os privados que exercem estas funções.
Caso isso acontecesse, teríamos a violação princípio da igualdade e as regras do
Direito da União Europeia, que proíbem discriminações em função da natureza
pública ou privada do agente económico.
Assim, uma vez que não é possível o exercício de poderes de autoridade e dar
prerrogativas excecionais às entidades empresariais públicas, há reserva de Direito
Privado.
Havendo uma reserva de Direito Privado na Administração Pública, significa que as
entidades públicas que exerçam esta atividade empresarial em mercado
concorrencial, devem pautar a sua atuação pelo Direito Privado, que garante a
igualdade e a concorrência entre os agentes económicos.
Por isso, esta reserva de Direito Privado funciona como exceção, tendo
fundamento na Constituição e no Direito da União Europeia.
Todavia, é possível ainda aplicar Direito Privado na atuação administrativa que
não envolve poderes de autoridade e não tem natureza empresarial, onde estamos
perante uma Administração que pode aplicar Direito Administrativo ou Direito Privado,
sendo que, para aplicar este último, a Administração carece de uma lei expressa que
a habilite para o efeito.
Como vimos, há um Direito Privado por parte da Administração, que é o Direito
privado publicizado, o que significa que o Direito Privado aqui aplicado pela
Administração é um direito que possui algumas particularidades, nomeadamente:
● Tem uma componente pública, nomeadamente direitos fundamentais e
princípios gerais que pautam a atividade administrativa;
● Pressupõe ausência de poderes de autoridade;
● É um Direito Privado obrigatório quando está em causa uma atividade
empresarial pública em mercado concorrencial;
● É um Direito Privado distinto do Direito Privado que regula os particulares, uma
vez que possui mais vinculações para a Administração;
● Há setores deste Direito Privado administrativo, sendo possível encontrar um
direito comercial administrativo ou um direito societário administrativo.

Por outro lado, dentro das normas jurídicas, como sabemos, há dois tipos de
normas jurídicas que regulam a atuação administrativa, nomeadamente o Direito
Administrativo e o Direito Privado.
No entanto, existem outros ramos do direito que regulam a atuação
administrativa, nomeadamente:
● Direito Penal, que regula substantivamente parte do direito sancionatório
administrativo;
● Direito Processual Penal, designadamente em matéria de contraordenações ou
inquéritos policiais.

No processo penal, dão-se mais garantias do que o Direito Administrativo, onde


se deve utilizar a máxima proteção, que é dada em termos garantísticos pelo mesmo;
● Direito Processual Civil, onde o Código de Processo Civil é a legislação
subsidiariamente aplicável ao processo penal.

Contudo, ara além da normatividade jurídica a Administração Pública também é


regulada por uma normatividade extrajurídica, nomeadamente:
● Por uma normatividade técnico-científica, onde várias áreas de atuação
administrativa têm como parâmetros de atuação regras de outros domínios do saber
fora do direito.

Por exemplo, em matéria de biologia, quando se pretende saber quando morre uma
pessoa, não cabe ao direito averiguar isso, mas sim aos médicos.
Assim sendo, as normas extrajurídicas também têm uma função reguladora do
agir administrativo e a normatividade moral, ética ou deontológica.
Nesta base, quem se sentir lesado pela conduta deontológica, pode apresentar uma
queixa aos órgãos disciplinares da respetiva ordem, onde estes abrirão um processo
disciplinar de natureza administrativa, averiguando se aquela pessoa violou ou não as
regras de natureza deontológica.
Nisto, se se considerar que houve violação, a pessoa pode ser sancionada e
impedida de continuar a exercer a respetiva função, como por exemplo ser expulso
do exercício da atividade, podendo gerar responsabilidade civil;
● Por uma normatividade de trato social, que apela a regras de cortesia, delicadeza,
urbanidade, etc., pautando a conduta no âmbito da atuação administrativa.

Em matéria disciplinar, por exemplo, se um funcionário público violar regras de


trato social, pode dar origem a responsabilidade disciplinar, o que significa que estas
regras também vinculam e pautam a conduta administrativa;
● Aptidão reguladora da administração pela factualidade, onde os factos podem
ter potência para regular a Administração, através da jurisdificação de factos
emergentes da atuação administrativa.

Assim, a conduta factual da Administração pode gerar a falta de efetividade de


uma norma escrita.
Por exemplo, se a norma escrita diz X, mas, na realidade, ninguém respeita X, o que
faz gerar normatividade não oficial no âmbito da atuação administrativa.

Todavia, há a figura do precedente administrativo, o que significa que a decisão


de um caso concreto pode pré-determinar futuras soluções idênticas para casos
semelhantes, de acordo com o art. 152º/1 alínea d do CPA.
Além disto, há situações de jurisdificação de factos emergentes da atuação
administrativa, mas pode existir a jurisdificação de factos alheios ao agir da
Administração, onde, embora estejamos fora da Administração, esses factos podem
definir regras de conduta da mesma.
Por exemplo, em necessidade constitucional não incorporada, temos as situações de
emergência fora do estado de emergência.
De outro modo, há ainda a factualidade não juridificada que projeta efeitos
sobre a Administração.
Por exemplo, as normas da FIFA e da UEFA determinam a aplicação de sanções pela
Federação Portuguesa de Futebol, que são organizações internacionais não
governamentais.

❖ Direito Administrativo e as matérias que abrange


Atualmente, o Direito Administrativo está em crise tradicional da dicotomia
entre Direito Público e Direito Privado.
Nisto, dá-se ainda uma insuficiência do critério institucional que diria que o
Direito Administrativo é o direito regulador da Administração Pública, mas, no
entanto, existem outros ramos do direito que a regulam.
Atendendo a isto, em sentido amplo, podemos dizer que o Direito Administrativo
é o conjunto de normas regula a atividade de gestão pública e a atividade de gestão
privada publicizada da Administração Pública.
Assim sendo, o Direito Administrativo, abrange duas realidades, nomeadamente:
● Abrange Direito Administrativo puro, que corresponde ao exercício da gestão
pública, onde, dentro deste, podemos diferenciar duas hipóteses, nomeadamente:
✔ A atividade administrativa que traduz o exercício de poderes de autoridade,
onde o Direito Administrativo está dentro de uma reserva constitucional, não
sendo possível no âmbito do exercício da atividade que envolve poderes de
autoridade aplicar outro direito
✔ A atividade pública que não envolve poderes de autoridade, onde é passível
de ser objeto de regulação pelo Direito Privado se existir uma norma habilitante
para o efeito;
✔ Direito Administrativo Privatizado, onde a atividade que a Administração
desenvolve é pautada pelo Direito Privado, tendo que respeitar os direitos
fundamentais e os princípios que regulam a atividade administrativa, de acordo
com o art. 2º/5 do CPA.

Em suma, em sentido amplo, o Direito Administrativo traduz conjunto de normas


ou princípios pelos quais as estruturas decisórias da Administração Pública
implementam a prossecução do interesse público no exercício de uma atividade de
gestão pública ou de gestão privada publicizada, satisfazendo de forma contínua as
necessidades coletivas da segurança e do bem-estar da comunidade.
o Fronteiras do Direito Administrativo

Nas fronteiras do Direito Administrativo, este tem fronteiras com quase todos os
outros ramos de direito, nomeadamente:
● Direito Constitucional, onde o Direito Administrativo é o momento da verdade do
Direito Constitucional.

Por exemplo, na situação pandémica atual, a Constituição consagra princípios e


direitos fundamentais, mas, numa situação de emergência, através de medidas de
natureza administrativa, o Governo condicionar, suspender direitos e liberdades.
Assim, a propósito deste fenómeno pandémico, há um poder técnico-científico que
fornece os pressupostos das decisões administrativas que condicionam e suspendem
preceitos constitucionais em matéria de direitos fundamentais.
Por isso, podemos dizer que o Direito Administrativo é Direito Constitucional
concretizado, ou seja, é no âmbito da atuação da Administração em concreto que se vê
a efetividade das normas constitucionais;

● Direito da União Europeia, onde esta ligação é dupla, uma vez que ninguém
compreender Direito Administrativo se não souber Direito da União Europeia e
vice-versa.

Nisto, normalmente, União Europeia não tem por si mecanismos que executem as
decisões tomadas pela própria União Europeia, pois são as Administrações Públicas
dos Estados-membros a quem compete executar o Direito da União Europeia.
Assim, cada administração pública de um estado-membro é uma estrutura ao serviço
da execução do Direito da União Europeia.
Por isso, cada estrutura da Administração Pública nacional aplica Direito da
União Europeia.

● Direito sancionatório, onde esta fronteira é uma fronteira entre o Direito


Administrativo e o Direito Penal, uma vez que os critérios materiais de decisão
são pautados pelas regras do Direito Penal.

Ainda assim, é ainda uma fronteira entre o Direito Administrativo e o Direito


Processual penal, uma vez que, muitas vezes, no âmbito contraordenacional, é o
processo penal o direito que regula o procedimento da decisão ou no âmbito da
investigação criminal.
Nisto, a investigação criminal é uma atuação administrativa, sendo a polícia de
investigação criminal uma estrutura dentro da Administração e, por isso, a sua atuação é
uma atividade material e organicamente administrativa;

● Direito processual, quer em relação ao processo penal, quer em relação ao processo


civil.

● Direito Privado, como por exemplo o Direito Administrativo, Direito Civil, Direito
Comercial, etc.

❖ Ramos de Direito Administrativo


Para além de existir um Direito Administrativo geral, existem ainda Direitos
Administrativos especiais, como por exemplo, o Direito Administrativo dos
transportes.
A par disto, temos vários tipos, nomeadamente:
● Direito Administrativo nacional;
● Direito Administrativo transnacional;
● Direito Administrativo externo;
● Direito Administrativo interno;
● Direito Administrativo comum a diversos estados;
● Direito Administrativo multinível, que tem níveis de incidência distinta,
podendo, pois, haver normas de Direito Administrativo português, normas de
Direito Administrativo internacional e normas de Direito Administrativo no âmbito da
União Europeia.

Por vezes, uma mesma matéria pode ser objeto destas três diferentes fontes
reguladoras desta matéria, verificando-se um pluralismo e a potencial conflitualidade
entre as soluções normativas.

❖ Evolução histórica do Direito Administrativo


Na evolução histórica do Direito Administrativo, há um equívoco histórico na
origem do Direito Administrativo, onde este surge em França com base na ideia de
que “julgar a administração ainda é administrar” e, com isto, os tribunais não podem
julgar a Administração.
Assim, a França criou um órgão especial para julgar a Administração –
Conselho de Estado controlado pelo executivo –, onde, perante os casos concretos,
verificou-se que há razões de interesse público que justificam que não se aplique o
Direito Privado, na atuação da administração com os particulares.
Nisto, o Conselho de Estado começou a criar soluções ad hoc para os litígios que
julgava.
Assim sendo, são os membros do Conselho de Estado Francês que vão gerar as
soluções, integrando um novo ramo de direito autónomo – o Direito Administrativo.
Contudo, coloca-se a questão de saber se isto não é compatível com o princípio
da separação de poderes, onde, de acordo com o professor Paulo Otero, temos uma
resposta em sentido negativo, uma vez que a ideia de julgar a administração ainda é
administrar, é uma falsa questão em sede de separação de poderes, pois os
revolucionários apenas pretendiam fugir ao controlo dos tribunais.
Contudo, há um segundo desvio à separação de poderes, onde, em vez de ser o
Parlamento a ditar normas para reger a atuação administrativa, é o Conselho de Estado
que vem emanar soluções novas criando o Direito Administrativo.
Por isso, o Direito Administrativo não se tornou um direito de garantias, mas sim um
direito de prerrogativas de autoridade da Administração, tal como no Estado
Absoluto.
Nisto, surge o desenvolvimento contraditório do Direito Administrativo, onde se
assiste a uma luta pelo aumento das garantias dos particulares e uma permanente fuga
da Administração às vinculações.
Nisto, embora haja um alargamento do controlo dos tribunais pela Administração, a
decisão raramente vem em tempo oportuno, onde esta é uma decisão injusta.
Com isto, as decisões administrativas no contencioso administrativo podem
arrastar-se por vários anos.
Por outro lado, embora haja uma maior densidade da legalidade vinculativa da
Administração com base nas ideias de reservas e precedência de lei, no entanto, as leis
são imperfeitas no seu conteúdo, uma vez que se substituem por princípios, que era o
que dava flexibilidade.
Para além disto, as normas jurídicas passaram a utilizar conceitos
indeterminados, remetendo para a Administração cláusulas gerais do seu agir.
Com isto, apesar de haver mais lei, esta é considerada mais vaga, conferindo
menos previsibilidade no agir da Administração.
No século XXI, há, pois, um reforço da legitimidade democrática, onde a figura de
topo da Administração é o Governo, nos sistemas parlamentares, ou um Presidente nos
sistemas presidencialistas.
Nisto, a par desta legitimação político-democrática, assiste-se a um peso
técnico-democrático, onde, num Estado que procura neutralizar as ameaças ao
bem-estar, como por exemplo no caso da Covid-19 com a DGS, a maioria parte da
decisão administrativa é uma decisão ditada pelos técnicos.
Num quinto fenómeno, havendo uma liberalização e desregulação da atuação no
âmbito da Administração e na sociedade civil, o Estado deixa de regular certas áreas,
havendo, pois, uma fonte de insegurança.
Num sexto fenómeno, embora nos últimos anos se assista a uma tentativa de
diminuição de poderes de autoridade da Administração, procurando o consenso e a
contratualização das decisões em vez da imposição unilateral, onde o contrato é um
veículo preferencial ato administrativo.
Contudo, nos tempos mais recentes, pela crise financeira de 2008 e pela crise
pandémica de 2020, a Administração tem recorrido a mecanismos de autoridade
para impor as suas soluções, nomeadamente mecanismos de intervenção
administrativa positiva ou policial.
No entanto, poderão suscitar-se problemas que se prendem ao nível da temática
dos direitos fundamentais em função do controlo da pandemia, nomeadamente no que
respeita ao direito de deslocação.
Numa possibilidade de a vacina ser ou não obrigatória, pergunta-se se esta se
deve pautar pela autonomia de cada um ou, por outro lado, se o Estado, em nome da
coletividade, pode impor a obrigatoriedade da vacina.
Contudo, com a descoberta da vacina, na sequência de um programa de vacina
obrigatória, se eventualmente se descobrir que há efeitos secundários negativos,
coloca-se a questão de saber se há um dever de indemnizar os lesados.
Com isto, podemos dizer que o Direito Administrativo se insere em todos os
domínios da atividade pública e da atividade privada.
Numa última ideia, temos a encruzilhada presente do Direito Administrativo, que
devem às transformações radicais do Estado, nomeadamente o facto de este aparecer
num contexto de fenómeno de integração supranacional, o facto de estar colonizado
pela União Europeia e o facto de haver uma tensão entre privatizar por razoes
financeiras ou intervir publicamente por razões sociais.
Nisto, a crise pandémica veio acentuar esta mesma intervenção do Estado,
sobretudo no que respeita a políticas de subsídios às empresas ou aos trabalhadores,
havendo, pois, cada vez mais despesas.
Nesta base, havendo mais despesas, significa que se necessita de mais receitas,
que são conseguidas através dos impostos ou das dívidas públicas.
Por outro lado, existe ainda a tensão de Estado de bem-estar e menos Estado por
razões financeiras ditadas pela União Europeia, onde, nos próximos anos, iremos
assistir a uma flexibilização das exigências financeiras e orçamentais como resposta da
crise pandémica.
Na estrutura orgânica da Administração Pública, cada vez se assiste mais a
entidades administrativas independentes, onde há uma desvalorização do vínculo
hierárquico e da responsabilidade política governamental junto do Parlamento.
Nisto, o Governo não tem meios para intervir sobre estas entidades, o que
significa que, não sendo este responsável politicamente perante o Parlamento, onde há
uma tensão entre a legitimidade e responsabilidade parlamentar ou mais independência
das entidades.
Contudo, assistimos ainda a uma complexificação do interesse público ou geral,
uma vez que existe uma pluralidade de centros definidores interesse público, onde cada
entidade pública entende que tem poderes.
Há, pois, uma concorrência na definição do interesse público.
Todavia, convergente o interesse público, também existem interesses privados, que
são complexos, gerando maior dificuldade na decisão administrativa.
Nisto, na revolução que existe nos meios de agir da Administração, há uma
distinção entre a Administração autoritária e uma Administração consensual,
onde, por exemplo, a crise pandémica tem sublinhado os traços da primeira.
Por outro lado, temos ainda uma distinção entre a Administração tradicional e
uma Administração eletrónica, onde a crise pandémica tem sublinhado a importância
da segunda, como por exemplo com as aulas online.
Até agora, falamos no Direito Administrativo no âmbito da Administração Pública,
mas importa perceber se ao abrigo da autonomia privada os privados podem regular
entre si as suas relações pelo Direito Administrativo.
Nisto, temos de saber se o Direito Administrativo é exclusivo da Administração
Pública ou não.
Por exemplo, o regime de avaliação dos alunos da uma Universidade Privada poderá
ser o que consta do regulamento de avaliação da Faculdade de Direito de Lisboa?
Nisto, temos normas de Direito Administrativo a regular atuações entre
privados, onde, de acordo com o professor Paulo Otero, de acordo com o princípio da
igualdade, limita-se a autonomia da vontade.
Por isso, não é possível utilizar o Direito Administrativo para atribuir
prerrogativas exorbitantes de autoridade a um privado relativamente a outro
privado, uma vez que se colocaria em causa a igualdade das relações jurídico-privadas.
Haveria, pois, uma forma de discriminação acentuada e um suprimir de direitos
indisponíveis de natureza privada.
Caso contrário, violar-se-ia o princípio da igualdade, que é tendencialmente
garantido pelo Direito Privado.
Contudo, ao abrigo da autonomia privada, fora das normas injuntivas, é possível
que os particulares apliquem Direito Administrativo entre si, podendo definir o
regime jurídico fora da Administração Pública.

❖ Normas administrativas
Nas normas administrativas, observa-se que há dois sentidos diferentes na
juridicidade que vinculam a Administração, nomeadamente:
● Normas que vinculam a Administração não sendo produzidas por esta, isto
é, que vêm de fora – fontes da normatividade administrativa em termos de
juridicidade hetero vinculativa;
● Normas produzidas pela própria Administração, onde estamos perante uma
auto vinculação, onde a Administração pode elaborar normas que vinculem a
sua conduta futura.

o Normas que hetero vinculam a Administração

Neste tipo de normas não escritas, encontramos ainda dois grupos, nomeadamente:
● Normas não escritas hero vinculativas, onde encontramos os princípios
jurídicos fundamentais que têm que ver com as bases constituintes do
ordenamento jurídico, como por exemplo a dignidade da pessoa humana.

Nisto, estes princípios impõem-se a todos os Estados, independentemente da sua


vontade;
Por outro lado, temos ainda os princípios gerais de direito, que são comuns ao
Direito Público e ao Direito Privado. Há, pois, um Direito Comum.
Assim, estes princípios têm um valor constitucional ou um valor meramente
legal, ao invés dos princípios jurídicos fundamentais, que têm um valor
supraconstitucional, onde a sua violação pode declarar a sua inconstitucionalidade.
Nesta base, temos ainda os princípios jurídicos gerais de Direito Internacional
Público, onde estão o ius cogens e princípios jurídicos gerais da União Europeia,
que podem ter natureza constitucional ou não.
Temos ainda princípios jurídicos gerais de Direito Administrativo, podendo ter
valor constitucional ou supralegal, e princípios gerais de valor regulamentar não
escritos.
Por exemplo, nestes últimos princípios, sempre que há empate numa votação de um
órgão universitário respeitante à aprovação ou não aprovação de um candidato,
entende-se que o reitor tenha um voto de desempate num sentido favorável ao candidato
– voto de minerva.
Todavia, de acordo com o professor Paulo Otero, é ainda possível a existência de
costumes que não são provenientes da Administração, mas do exterior da mesma,
tendo, pois, um valor que paute da conduta da atuação administrativa.
Nisto, o costume é, por excelência, a fonte de Direito.
Contudo, dependendo da posição positivista ou não positivista, pode haver quem
entenda que o costume não tem esta função.
Por outro lado, dentro da normatividade não escrita hetero vinculativa, existem
ainda precedentes judiciais, que podem vincular a atividade administrativa,
nomeadamente do Tribunal Constitucional e dos restantes tribunais;
● Normas escritas hetero vinculativas, onde as principais fontes se prendem com
a Constituição formal, onde esta é o programado do agir administrativo, o
limite e como ato normativo, regulando a atividade administrativa.

Contudo, para além da Constituição, temos ainda o Direito da União Europeia,


onde este também é fonte de vinculação, independentemente da sua hierarquia no
contexto do Direito Interno.
Por outro lado, temos o Direito Internacional Público e os atos legislativos
internos, onde esta é a forma de manifestação da vontade político-legislativa do Estado
e das Regiões Autónomas no caso português.
Nisto, também é possível que o direito estrangeiro seja aplicado pela Administração,
sempre que nos encontremos perante relações jurídico-administrativas atravessadas por
fronteiras.
Nesta medida, também é possível que a doutrina tenha um papel importante no
âmbito da integração de lacunas no contexto da Administração como fonte mediata,
apontando critérios e soluções nas quais se pode basear a conduta administrativa e a
contestação argumentativa dos particulares a decisões administrativas.
Por exemplo, se a Administração decidir num sentido A, insatisfeitos, os particulares
podem dizer que a doutrina dominante defende a solução B como preferencial da
interpretação das normas jurídicas que foram aplicadas.
Portanto, existem dois cenários, onde, por um lado, a Administração dará razão ao
particular e à doutrina, ou a Administração não concorda e, neste sentido, serão os
tribunais a decidir qual a solução a aplicar sobre uma determinada questão.
o Normas produzidas pela própria Administração

Neste tipo de normas, é a própria Administração que elabora as normas que vão
pautar a sua conduta futura.
Assim, encontramos duas situações diferentes, nomeadamente:
● Casos de auto vinculação unilateral da Administração, em que esta se
vincula independentemente da vontade dos destinatários;
● Casos de auto vinculação bilateral Administração, onde esta conjuga a sua
vontade com a vontade de vários parceiros, onde esta conciliação de vontades
faz emergir um novo parâmetro auto vinculativa da sua conduta futura.

Nos casos auto vinculação bilateral, existem quatro situações em que a


Administração se pode auto vincular, nomeadamente:
● Regulamento, onde este é um ato normativo emanado por órgãos da
Administração no exercício da função administrativa, tendo como
característica típica a generalidade e a abstração.

Neste sentido, o regulamento está próximo da lei, onde, normalmente, esta possui a
mesma característica.
Por isso, o regulamento é aplicado a uma pluralidade indeterminada de pessoas
face a situações abstratamente configuras na previsão da norma.
Contudo, o regulamento diferencia-se da lei, na medida em que, enquanto o
primeiro é a expressão do exercício da função administrativa, ao passo que a lei é a
expressão do exercício da função legislativa.
Portanto, pelo regulamento, tendencialmente, passam opções subordinadas,
onde, pela lei, passam as opções jurídicas fundamentais dentro do quadro
constitucional.
Neste sentido, diz-se tendencial na medida em, que, o Governo, sendo órgão
legislativo e regulamentar, tem dois tipos de competência regulamentar,
nomeadamente a de regulamentar a execução das leis e a de emanar regulamentos
independente diretamente fundados na Constituição, de acordo com o art. 199º/ alínea
g da CRP.
Nisto, estes diferenciam-se do decreto-lei pela sua forma, onde este é um ato
legislativo, de acordo com o art. 112º/1 da CRP, ao passo que o decreto regulamentar é
praticado no exercício da função administrativa.
Contudo, este ato só pode operar em dois cenários, nomeadamente quando não há
ato legislativo sobre aquela matéria anterior ou quando estamos fora da reserva de lei.
Numa outra diferença, enquanto o decreto regulamentar não necessita de ir a
Conselho de Ministros, o mesmo não acontece com o decreto lei, que tem de ser
aprovado.
Assim, para o decreto regulamentar, basta a assinatura do Primeiro-Ministro e
dos Ministros responsáveis da respetiva matéria, enquanto o decreto lei tem de ter a
concordância de todos os membros.
Por isso, conclui-se que é mais fácil aprovar um decreto regulamentar do que um
decreto lei.
Por outro lado, os regulamentos podem ter duas naturezas distintas,
nomeadamente serem regulamentos de execução de leis ou regulamentos independentes,
não necessitando de uma lei intermediária.
No fundamento do poder regulamentar, historicamente, o princípio da separação de
poderes não conseguiu atribuir toda a competência normativa ao poder legislativo,
onde, por isso, o executivo sempre foi chamado a exercer uma função complementar
das leis por via regulamentar.
Contudo, surge ainda uma segunda razão, que se prende com a lei, onde o
fundamento do poder regulamentar é a lei.
Todavia, este poder regulamentar também encontra limites, que se prendem com
os limites do agir da Administração, nomeadamente a Constituição, a lei, os princípios
gerais, etc.
Por outro lado, na reserva de lei, não é possível a intervenção regulamentar
primária, uma vez não pode ser um regulamento a emanar as primeiras normas sobre
uma data matéria.
Contrariamente, se estivermos perante a reserva parlamentar e da Assembleia da
República, podem existir regulamentos, apenas não podem deixar regulamentos de
execução de leis emanadas pela Assembleia da República ao abrigo da competência
legislativa de reserva absoluta.
Assim, a reserva de lei é um limite à intervenção primária do poder regulamentar,
mas não se exclui que possam existir uma densificação por esta via.
Nisto, há um princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos, onde um
regulamento não pode ser afastado num caso concreto, por via do princípio da igualdade
e do princípio da imparcialidade.
Por isso, um regulamento geral e abstrato não pode ser afastado, pois se tal
acontecesse seria violar aqueles princípios.
● Costume proveniente da Administração, onde, no âmbito do seu
relacionamento com a lei, este é um costume praeter legem, costume secundum
legem e costume contra legem.

De acordo com o professor Paulo Otero, é admissível o costume praeter legem e o


costume contra legem, se for contrário a regulamentos da própria Administração.
● Precedente administrativo, onde este precedente é uma decisão de um caso
concreto, que passa a servir de parâmetro decisórios de futuros casos idênticos.

Nisto, enquanto o costume é uma prática reiterada, onde são necessários vários casos
para existir a convicção de obrigatoriedade, no precedente basta uma decisão de um
caso concreto, sendo baseados no princípio da igualdade e da imparcialidade e na tutela
da confiança.
Por exemplo, se no passado um caso semelhante foi decidido num sentido, se o caso
de alguém foi idêntico, sem haver alteração do quadro normativo e legal, este deve ser
decidido de forma idêntica.
Contudo, a Administração possui o ónus da prova para justificar a diferenciação
pela qual num novo caso não se aplique a solução que anteriormente se aplicou.
Há, pois, um dever de fundamentar que a Administração tem de dizer as razões
de facto e de direito, de acordo com o art. 152º/1 alínea d do CPA.
Todavia, há argumentos que justificam a derrogação do precedente,
nomeadamente o dever da boa administração, onde o critério de decisão pode ser
alterado, se existirem razões para tal.
Por outro lado, pode ainda ser invocada a alteração das circunstâncias, onde se
justifica uma solução diferente.
Nisto, existe uma ideia de ponderação entre argumentos que levam a que o
precedente se mantenha e, por isso, não possa ser derrogado, e argumentos que
justificam que o precedente possa ser derrogado, decidindo um novo caso em sentido
diferente.
Assim, é este equilíbrio que o dever de fundamentação vem colocar do lado da
Administração a argumentação justificativa da modificação do precedente com
base na ideia de que o precedente vincula, salvo se existirem razões para se decidir de
maneira diferente.
No entanto, coloca-se a questão de saber se o precedente inválido vincula.
Por exemplo, imaginemos que a lei só permite que os subsídios sejam dados entre 10
e 15, e a Administração deu um subsídio de 20 que favorece o particular A.
Nisto, o ato consolidou-se na ordem jurídica, onde ninguém o impugnou.
No dia seguinte, aparece B, que faz exatamente o mesmo que A, pedindo um
subsídio de 20. A
Nisto, a Administração deve aplicar a lei e dizer que B só tem direito a 15, ou dar 20.
Nesta base, é este o problema da vinculatividade ao precedente inválido, onde
este é um problema de ponderação de dois princípios constitucionais,
nomeadamente:
● Princípio da legalidade, onde a lei deve ser aplicada a lei, não estando
vinculado relativamente ao precedente ilegal.
● Princípio da igualdade e tutela da confiança, onde, se anteriormente foi
praticado um ato com conteúdo favorável que não foi impugnado, a igualdade
determina que B seja tratado nos mesmos termos de A.

Portanto, há que refletir sobre a questão de saber se há tutela de confiança


quando esta se baseia num comportamento ilegal, ou, por outro lado, se há tutela de
confiança quando esta se baseia num comportamento ilegal que se consolidou na ordem
jurídica.
Por outro lado, se admitirmos que o precedente ilegal é vinculativo, a partir daí, a
Administração modifica a lei, pois passa a estar vinculada a um precedente inválido.
Além disto, se ambos são princípios constitucionais, coloca-se ainda a questão de
saber se o princípio da legalidade tem mais força do que o princípio da igualdade;
● Diretivas da Administração, onde a Administração fixa fins para o respetivo
destinatário, dando-lhe liberdade de escolha de meios para alcançar esses
mesmos fins.

Nisto, de acordo com o professor Paulo Otero, na diretiva, existe uma vinculação
no interior da Administração, que é a vinculação bifrontal, uma vez que a diretiva é a
expressão de uma auto vinculação da entidade emitente.
Por exemplo, se é dito que tem de se atingir X, se X for atingido pelo destinatário
desta diretiva, não se poderá censurar o destinatário por atingir X.
Contudo, se a diretiva auto vincula o emitente, esta também hetero vincula a
entidade destinatária da mesma e, assim, o destinatário está hetero vinculado pelo
exercício do poder de orientação.
Por isso, o carácter bifrontal, sendo auto vinculativa para o emitente, também é
hetero vinculativa para o destinatário dessa diretiva;
● Promessa unilateral da Administração, onde a Administração formula uma
promessa de conduta ou de abstenção unilateral.

Com isto, surge a questão de saber se a Administração pode revogar uma


promessa sua e em que termos o pode fazer.

❖ Auto vinculação bilateral


Ao lado da auto vinculação unilateral, também existem fenómenos de auto
vinculação bilateral, onde há um fenómeno de contratualização da vinculação
administrativa, onde a Administração está vinculada numa conjugação com a
vontade do destinatário dessa vinculação.
Assim, através dos contratos públicos, estes vinculam a Administração em termos
bilaterais junto do particular, onde também este se vincula perante a administração.
Por outro lado, temos os acordos de concertação social, entre o Estado representado
pelo Governo.
Nisto, temos ainda os acordos dentro do procedimento de decisão da administração
designados acordos endo procedimentais, que são acordos dentro do procedimento de
decisão da Administração.
Além destes, podem ainda existir acordos substitutivos da decisão do
procedimento, onde, se o procedimento ia concluir com um ato administrativo, este é
substituído por um contrato.
Para além disto, podem existir convenções jurídicas intra administrativas, ou seja,
convenções jurídicas entre estruturas da Administração, ou convenções jurídicas inter
administrativas externas. Por exemplo, no primeiro caso, temos uma convecção
administrativa entre o Estado e a Região Autónoma, e no segundo caso, uma convecção
entre a Faculdade de Direito da Brasília com a Faculdade de Direito da Universidade de
Lisboa.
Todavia, podem existir outras formas de auto vinculação bilateral, como por
exemplo um acordo de transação no âmbito de um processo de contencioso
administrativo, onde este acordo põe termo ao processo judicial.
Contudo, podem existir ainda convenções de arbitragem, que fixam regras para
situações de arbitragem administrativa entre uma entidade pública e uma entidade
privada.
Nisto, podem surgir contratos de organização ao nível da delegação de poderes,
como por exemplo contratos entre o município x e a freguesia y.
Assim, ainda podem existir contratos de cooperação entre o Estado e à
Administração de outros estados membros da União Europeia.
Portanto, importa sublinhar a importância que o Governo tem na formação da
normatividade, onde esta importância é visível por várias manifestações.
Neste sentido, temos o modelo de repartição da competência legislativa entre a
Assembleia da República e o Governo, onde a regra é a da competência ser
concorrencial podendo os dois órgãos legislar sobre essa matéria.
Na prática, o Governo legisla mais do que o Parlamento, com a particularidade de
que decreto-lei posterior revoga lei anterior.
Assim, na área concorrencial, o Governo é verdadeiramente o definidor por
excelência da competência legislativa, onde, as normas sobre a forma de decreto-lei,
são formas de auto vinculação legislativa do Governo.
Para além disso, o Governo tem uma intervenção fundamental em todo o
processo legislativo parlamentar, tendo uma iniciativa legislativa em quase todas as
matérias, havendo, no entanto, algumas exceções.
Todavia, mesmo na matéria de reserva da Assembleia, o Governo tem iniciativa
legislativa, quer na reserva absoluta quer na reserva relativa.
Por outro lado, o Governo tem intervenção sobre as leis aprovadas pelo
Parlamento na reserva absoluta, pois a promulgação do Presidente está sujeita a
referenda ministerial.
Além disto, o Governo tem ainda poder no âmbito da apreciação parlamentar
de decretos-leis, intervindo através de decretos-leis de bases, e um poder para a
regulamentação das leis.
Já no plano internacional, o Governo também tem intervenção no âmbito das
convenções internacionais, uma vez tem o monopólio quando à negociação das
convenções, tendo uma ampla margem de poderes para aprovar convenções
internacionais.
Assim, podemos concluir que o Governo não é destinatário passivo da
normatividade administrativa, sendo, por isso, o protagonista na elaboração dessa
normativa.
Por isso, por via legislativa, por via de convecção internacional ou por via de Direito
da União Europeia, a normatividade tem de ter em conta o peso da intervenção do
Governo.
Neste sentido, na produção das normas administrativas, esta intervenção faz com
que a normatividade que vincule a Administração para o Governo seja auto
vinculativa, pois o Governo elabora a norma que depois vai aplicar como
Governo/Administração sobre a forma de decreto-lei.
Por isso, na área concorrencial, o Governo só pratica atos da Administração
ilegais se quiser, pois antes do Governo praticar um ato ao abrigo da função
administrativa, tem sempre a hipótese de elaborar primeiramente um decreto-lei
que defina a solução normativa que resolva aquele caso concreto.
O Governo tem, pois, um protagonismo único na definição da legalidade que vai
aplicar no exercício da função administrativa.
Nas normas de Direito Administrativo, estas conhecem duas configurações, onde
há normas que são regras e são princípios, onde a sua distinção se reflete na natureza
dos poderes da Administração, onde, quando estamos perante regras, a
Administração tem menor margem de liberdade.
Por sua vez, quando estamos perante princípios, há uma maior margem de
autonomia decisória por parte da Administração.
Além disto, há normas administrativas injuntivas e normas administrativas
permissivas, ou normas administrativas dispositivas.
Nas normas administrativas injuntivas, a Administração não tem liberdade de
deixar de aplicar estas normas, ao passo que nas dispositivas a Administração pode
construir novas soluções para o caso concreto.
Com a análise da identificação da normativa reguladora da Administração Pública,
podemos evidenciar a pluralidade de fontes reveladores de normas.
Por outro lado, dentro desta normatividade, enquanto órgão superior da
Administração e com competência legislativa, o Governo é o autor do número
substancial de regulação de matérias no âmbito da Administração.
Assim, o Governo desempenha uma dupla função, onde é simultaneamente o
produtor das normas que definem a legalidade e o aplicador dessas mesmas normas.
Portanto, na área concorrencial, o Governo tem um forte poder legislativo,
transformando os seus decretos lei em fonte de auto vinculação legislativa.
Por exemplo, se amanhã a solução que é hoje vigente não for aplicável a novos
casos, o Governo poderá modificar a solução legislativa, alterando o respetivo decreto
lei.

❖ Modelo de regulação da Administração Pública pela


normatividade

Neste modelo, coloca-se a questão da determinação da normatividade reguladora,


onde, dentro da pluralidade de normas passíveis de regular uma matéria, importa saber
como a Administração vai determinar a norma aplicável numa dada situação.
Nisto, surge o problema da interpretação e da integração, com a determinação do
sentido da norma e o passo entre a previsão geral e abstrata relativamente à situação
concreta.
Por isso, recorre-se ao elemento literal, ao elemento histórico e ao elemento
sistemático da respetiva interpretação e, por isso, interpretar não é apenas ler os
preceitos jurídicos, pois há que inseri-los num determinado contexto dentro da unidade
do sistema jurídico.
Por outro lado, há que ter em conta os tipos de interpretação, nomeadamente a
interpretação vocacionada à descoberta do elemento subjetivo da sua génese e do
contexto histórico em que a norma surge, e uma interpretação objetivista e
atualidade, onde se olha para o presente e para a inserção social da norma.
Contudo, é necessário ainda verificar se da interpretação resulta uma lacuna,
isto é, a ausência de uma disciplina jurídica da situação que se está a tratar, onde
importa saber se esta é intencional ou não, como forma de conferir uma margem de não
intervenção.
Assim, pergunta-se se o sentido da ausência de norma reguladora da matéria é o
de conferir um espaço de autonomia decisória ou se isto é algo que o legislador não foi
capaz de prever.
Por isso, pergunta-se ainda como é que uma lacuna poderá ser integrada, onde,
em Direito Administrativo, surgem problemas.
Nisto, em matéria de integração de lacunas, o Direito Administrativo tem
especialidades, onde se coloca a questão de saber se as normas de competência
admitem lacunas.
Por outro lado, quando há uma lacuna numa lei da área da reserva da Assembleia da
República, coloca-se a questão de saber como é que pode ser integrada essa mesma
lacuna.
Todavia, surge um outro problema, que tem ver com o conteúdo das normas que a
Administração é chamada a aplicar, onde este conteúdo é caracterizado pela
imperfeição e pela incompletude.
Por isso, no século XXI, há a ideia de desmitificar a ideia da perfeição das
normas, onde, com o Iluminismo, acreditava-se que, com a razão iluminada do autor,
este era capaz de fazer leis perfeitamente, nomeadamente o rei e o Parlamento.
Assim sendo, podemos dizer que, atualmente, a lei é imperfeita na sua redação
literal, não prevendo todas as situações em que é chamada a decidir, onde, algumas, são
até desatualizadas.
Há, pois, ausência de regulamentação da lei face a determinado tipo de matérias,
onde, por exemplo, a situação da pandemia não era previsível para o legislador há
algum tempo atrás.
Nisto, para além desta desmitificação da perfeição da lei, há ainda uma
transfiguração material da lei, onde a lei do século XXI é diferente da lei do século
XIX, uma vez que passou a existir uma neofeudalização normativa.
Neste sentido, anteriormente a lei era produto da vontade do Estado, onde,
atualmente, os atos normativos vêm de todo o lado, uma vez que cada entidade
pública tem competência normativa.
Por isso, esta neofeudalização normativa flexibiliza a identificação de qual a
norma que regula cada situação.
Por outro lado, enquanto anteriormente tínhamos uma normatividade tradicional de
regras, atualmente, temos uma normatividade principialista, onde os princípios são
fundamentais no agir da Administração.
Nisto, também a própria intensidade das normas vinculativas da lei sobre a
Administração está relativizada, uma vez que há normas que não são profundamente
direito vinculativo, onde o seu conteúdo dá ausência de certezas sobre aquilo que é o
parâmetro vinculativo do agir administrativo.
Há, pois, uma erosão da legalidade que pauta o agir da Administração, onde esta
ocorre por quatro fatores, nomeadamente:
● Existência de normas legais em branco, cuja indeterminação de conteúdo
gera uma abertura densificadora da própria normatividade, não sendo, pois,
completa;
● Fenómenos de deslegalização e de legalização, onde, no primeiro caso, as
normas têm formalmente a natureza de lei, mas que, materialmente, são
regulamentos, uma vez que houve uma lei que desqualificou aquelas
normas para passarem a valer como regulamento.

Contudo, no segundo caso, existem normas de natureza regulamentar a quem o


legislador pode atribuir força de lei, o que demonstra a flexibilidade da natureza das
normas;
● Possibilidade que se atribuir à Administração de dispor da estatuição de
uma norma, onde, se se verificar esta situação, a solução é x ou a solução
que a Administração entende atribuir.

Por isso, a Administração é investida do poder de derrogar a solução x, podendo


afastar a regra que resulta da lei, onde, por isso, a Administração poderá dar um destino
diferente à solução regra;
● Conceitos jurídicos indeterminados, onde o legislador os utiliza,
competindo a sua concretização à Administração Pública.

Nisto, a Administração ganha um protagonismo inesperado na aplicação destas


leis e normas, e por isso, deixam de ter um conteúdo regulativo minimamente
operativo, pois num segundo momento, a atuação da Administração pode ser
regulada pelos tribunais;
● Fenómeno do enfraquecimento vinculativo da legalidade, pois há cada
vez mais há normas de soft law, que permitem à Administração a afastar a
solução.

Por outro lado, assiste-se cada vez a uma informalidade no agir da Administração,
onde esta atuação informal é marginal à lei.
Além disto, temos os casos de direito à objeção de consciência ou de resistência,
onde há situações em que a lei deixa de ser vinculativa para determinado tipos de
pessoas por razões de convicções, filosóficas, religiosas ou de violação de direitos
fundamentais.
Em ambos os casos, quer na objeção de consciência ou no direito de resistência,
temos situações de incumprimento lícito da normatividade, o que vem demonstrar o
enfraquecimento da própria vinculação dessas mesmas normas.
Por outro lado, existe uma inversão do sentido vinculativo da lei, onde sabemos
que esta é parâmetro de vinculação dos atos administrativos, dos regulamentos e dos
contratos.
Contudo, há casos em que acontece o inverso, sendo o ato administrativo ou o
contrato que vincula a própria lei, havendo aqui o princípio da contracorrente.
Por isso, surge ainda a complexidade da estrutura hierárquica da normatividade,
onde, no entendimento tradicional, temos a visão da pirâmide, onde, no topo, está a
Constituição, a lei e os regulamentos.
No entanto, esta visão está fortemente colocada em causa por quatro fatores.
Primeiramente, existe uma fragmentação da força normativa da Constituição
formal, onde além disto, existe uma concorrência de normas fundamentais, onde se
questiona quem produz as normas fundamentais.
Nisto, existem ainda normas constitucionais provenientes da consciência
jurídica universal, onde também o Direito Internacional acha que produz normas
fundamentais.
Há, por isso mesmo, várias fontes produtoras de normas para regular fenómenos
de natureza constitucional, onde podemos dizer que o constitucionalismo é multinível
ou transnacional.
Assim sendo, a força hierárquica normativa tradicional da Constituição está
posta em causa, nomeadamente pelo primado constitucional.
Contudo, também existem dúvidas sobre a localização hierárquica do Direito
Internacional e do Direito da União Europeia.
Por outro lado, existem ainda dúvidas relativamente à hierarquia dos atos
legislativos, nomeadamente na diferença entre as leis ordinárias com valor reforçado e
as leis ordinárias sem valor reforçado.
O último fator prede-se com a verdadeira encruzilhada que existe na hierarquia
da galáxia regulamentar, o que significa que, uma vez que cada entidade pública pode
emanar regulamentos, há uma pluralidade indeterminada de entidades que os
produzem.
Assim, cada entidade que produz regulamentos tem internamente uma estrutura
hierárquica dos seus próprios regulamentos.
Nisto, surge um problema que se prende com a hierarquia dentro das normas, onde
se assiste a uma conflitualidade normativa, onde várias normas são chamadas em
planos diferentes a regular a mesma matéria.
Por isso mesmo, perante a pluralidade de normas e perante o conflito entre as
normas, coloca-se a questão de saber como é que a Administração pode prevenir ou
resolver estas antinomias.
Nisto, uma solução possível é a ideia da vinculação pelo critério hierárquico de
resolução das antinomias, onde, se há uma antinomia entre um regulamento e uma lei,
o tribunal aplica esta última.
Por outro lado, se houver uma contradição entre a lei e a Constituição, o tribunal
aplica esta última.
Nesta medida, o critério hierárquico é o critério de resolução das antinomias por
parte dos tribunais, mas, perante a Administração Pública, esse não é o critério de
solução, uma vez que esta não tem a competência dos tribunais quando se trata de
aplicar uma norma jurídica.
Assim, por via de regra, a Administração não pode desaplicar uma lei com o
fundamento de que é inconstitucional-
Por isso, para evitar o caos dentro da Administração, optou-se pela excecionalidade
da vinculação da Administração ao critério hierárquico.
Nesta base, se a solução normativa violar normas sobre direitos, liberdades e
garantias da Constituição dotados de aplicabilidade direta, a Administração está
vinculada ao critério hierárquico, de acordo com o art. 18º/1 da CRP.
Além disto, está vinculada se as soluções normativas violam a consciência
jurídica universal, ou está vinculada sempre que se trate de leis que não foram
objeto de promulgação ou se promulgação não foi referendada.
Por isso, perante os conflitos normativos, a Administração deve aplicar o critério
temporal, onde aplica uma norma posterior.
Em suma, a Administração tem um papel nuclear na aplicação do Direito, mas
este papel não lhe permite utilizar o critério hierárquico.
Assim sendo, a Administração deve resolver as antinomias através do critério
temporal, onde, apesar de não ter competência para desaplicar uma lei com fundamento
na sua invalidade, tem uma competência genérica para fiscalizar, mas não poderá
deixar de a aplicar.
Portanto, por via de regra, perante situações de antinomia, a Administração está
obrigada a aplicar normas inconstitucionais e ilegais.
Neste sentido, a Administração sabe que está a aplicar atos ilegais, devolvendo
aos particulares o ónus de contestar a sua solução ilegal junto de um tribunal. Há, pois,
um mecanismo de controlo.

❖ A aplicação administrativa da normatividade reguladora


Na aplicação administrativa da normatividade, temos de procurar saber como é
que a Administração se comporta perante as normas que tem de aplicar.
Nisto, há duas condutas possíveis por parte da Administração, nomeadamente:
● Conduta vinculada, que aponta para a vinculação;
● Conduta autónoma, em que se confere uma certa margem de autonomia
decisória.
o Conduta vinculada

Na conduta vinculada, podemos dizer que nos espaços de vinculação, verifica-se


uma aplicação “sub solutiva” da normatividade regulador, onde, de acordo com o
professor Paulo Otero, não há uma aplicação mecânica da normatividade pela
Administração.
Neste sentido, mesmo nos casos em que há vinculação, a Administração goza
sempre de um maior ou menor grau de margem de autonomia, nomeadamente na
escolha da norma que vai aplicar no âmbito de normas passíveis de regular
determinadas situações, e na interpretação da própria norma que escolheu relativamente
à situação presente.
Neste sentido, apesar de haver uma vinculação, onde a Administração deve respeitar
a norma, esta ideia não pode fazer esquecer a sua margem decisória. Há, pois, um
espaço de vinculação que contém diferentes graus de intensidade, entrecruzando-se
com áreas de autonomia.
Todavia, a autonomia da Administração não é identificada com a autonomia das
entidades privadas, uma vez que a autonomia desta é a expressão de uma autoridade, ao
passo que a autonomia das entidades públicas é sempre a expressão de uma
competência que lhe permitem fazer valer a sua própria vontade.
Assim, o sentido da aplicação sub solutiva da normatividade pela Administração
espaço reduz o espaço de autonomia decisória do aplicador.
Há, pois, um duplo fenómeno, em que há uma parametrização da vontade da
Administração pela norma e pela vontade do legislador, e uma diferença que se prende
entre aplicar uma normatividade de regras ou uma normatividade de princípios,
onde, na primeira, o espaço de autonomia da Administração é mais reduzido, ao passo
que na segunda há uma margem superior de autonomia decisória.
Na vinculação das entidades públicas, esta prende-se com a ideia do princípio da
juridicidade, o que significa que a Administração está subordinada a princípios e a
valores que transcendem a vontade do legislador e dos órgãos formais.
Nesta base, um Estado de direito material é um Estado em que a Administração está
subordinada a estes princípios fundamentais, que encontram o seu limite na dignidade
da pessoa humana.
Numa segunda vertente da vinculação das entidades públicas, temos a vinculação da
legalidade democrática, que resulta da vontade de órgãos democraticamente
legitimados, como por exemplo a Assembleia de escola de uma Faculdade.
Todavia, é ainda possível uma subordinação direta e imediata da Administração
à Constituição, permitindo a atuação administrativa sem mediação da lei, onde se
pressupõe um entendimento sobre a reserva de lei.
Na doutrina portuguesa, o entendimento maioritário da reserva de lei prende-se
com o facto de haver uma reserva total vertical de lei, que se liga com a ideia de
precedência de lei, onde um órgão da Administração só pode agir se existir uma lei que
permita que se adote determinada conduta.
Nisto, na ausência de lei, o órgão da Administração não pode agir, onde, por isso,
essa lei pode ser a própria Constituição, que pode servir de fundamento direto e
imediato do agir administrativo.
Assim, de acordo com o professor Paulo Otero, a Constituição consagra uma ideia
de tipicidade da reserva de lei, o que significa que a atuação administrativa só carece
de uma lei prévia habilitante nos casos em que a Constituição identifica como impondo
essa precedência ou reserva vertical de lei.
Neste sentido, estas matérias são aquelas em que a Administração só pode
decidir se existir uma lei que a habilite a agir, onde a Constituição não pode servir de
fundamento direto do agir administrativo.

Na precedência de lei imposta pela Constituição ao agir administrativo, temos três


situações, nomeadamente:
● Todas as formas que retirem, restringem ou lesem posições jurídicas ativas dos
particulares, onde a Administração só o pode fazer se existir uma lei que a
habilite para o efeito – Administração agressiva;
● Áreas expressamente indicadas no âmbito da Administração prestadora e
áreas que são sensíveis ao princípio da igualdade, onde se impõe a reserva de
lei, uma vez que é o legislador que tem legitimidade para definir o critério pelo
qual é admissível a conceder a um outro e não conceder a outro;
● Restantes matérias em que a Constituição remete para um ato legislativo, onde
as integra na área de reserva de lei.

Neste sentido, de acordo com o princípio da constitucionalidade, a Constituição


pode servir de norma habilitadora do agir administrativo, onde se coloca a questão
de esta ser uma atuação praeter legem, que vai para além da lei com fundamento na
Constituição.
Todavia, é necessária a verificação de três requisitos cumulativos,
nomeadamente:
● A Constituição tem de definir a competência subjetiva e objetiva do órgão
administrativo, dizendo quem e sobre que matéria é que o órgão em causa pode
exercer essa competência;
● A Constituição tem de fornecer os critérios teleológicos da função em concreto
da Administração, fixando os fins dessa mesma atuação, com subordinação aos
princípios da igualdade, imparcialidade, justiça, proporcionalidade e boa fé;
● Só se pode incidir sobre matérias que estão excluídas da reserva da lei ou que
não tenha existido um anterior ato legislativo, pelo facto de a Administração
não puder contrariar esse mesmo ato, exercendo uma atuação com fundamento
na lei existente das matérias.

Com isto, importa realçar que, à luz da Constituição, na Administração pública


portuguesa, só há um órgão que tem uma competência administrativa diretamente
fundada, que é o Governo, de acordo com o art. 199º/alínea g da CRP, que lhe
permite praticar todos os atos ao desenvolvimento económico-social e a satisfação das
necessidades coletivas.
Há, pois, uma cláusula habilitadora diretamente fundada na Constituição, onde,
a propósito da pandemia, isto verifica-se cada vez mais.
Por outro lado, podemos ainda dizer que há uma vinculação administrativa a uma
legalidade interna, onde esta poderá ser contrária à legalidade externa, que, no interior
da Administração, pode habilitar a mesma a agir em sentido contra legem, onde, por
exemplo, quando um superior hierárquico emana uma instrução contrária à legalidade,
o subalterno está obrigado ao dever de obediência a esse comando hierárquico
ilegal, desde que não seja nulo.
Neste sentido, se o subalterno não obedecer, poderá ser responsabilizado
disciplinarmente pela sua conduta desobediente.
Há, pois, uma legalidade interna contra legem.

❖ Erro sobre a vinculação

No erro sobre a vinculação, este é uma falda representação da realidade, em que


pode ser uma falsa representação sobre a própria vinculação.
Assim, o erro sobre a vinculação é um erro de direito, que poderá ser um erro na
determinação da norma aplicável, como por exemplo se alguém pensar que a norma
aplicável era a norma x mas ser a norma y, ou um erro interpretativo da norma
aplicável, como por exemplo se alguém interpretar a norma num sentido A mas ter o
sentido B.
Nisto, no âmbito do erro interpretativo, pode existir um erro sobre a existência da
vinculação ou um erro sobre os termos da mesma, onde, neste último caso, pode ser a
competência, o conteúdo da decisão, o fim da decisão ou as formalidades do ato.
Todavia, o erro exclui a ilicitude, onde, se uma pessoa está em erro, não tem
consciência de que está intencionalmente a infringir uma norma.
Por outro lado, quando há audiência prévia dos destinatários dos interessados,
alertando a Administração de que vai decidir em sentido contrário à vinculação, aqui, se
persistir no erro, estar-se-á a atuar de forma consciência, estando numa situação de
licitude, uma vez que se atua de forma consciente.
Contudo, independentemente da existência de erro, se alguém lesar posições
jurídicas de terceiro, esse alguém constitui o dever de indemnizar, onde, por isso, o
erro pode gerar responsabilidade civil.
o Conduta autónoma

Na conduta autónoma da Administração, temos a aplicação integrativa da


normatividade reguladora, onde há espaço para uma margem de autonomia pública,
em que a vontade do órgão administrativo complementa o espaço deixado em branco
pela lei.
Assim, a norma não tem uma disciplina exaustiva, onde, neste caso, ao abrigo da
precedência de lei e dentro da juridicidade, dá-se espaço para que os órgãos
administrativos possam integrar esse mesmo espaço que as normas criaram.
Há, pois, uma margem da vontade da Administração complementada com a
vontade do legislador.
Nisto, existem três zonas de autonomia pública, nomeadamente:
● Concretização de conceitos indeterminados;
● Discricionariedade administrativa;
● Derrogação administrativa.

No entanto, mesmo quando a Administração age ao abrigo da gestão privada, a


autonomia que exerce nunca é verdadeiramente uma autonomia privada, uma vez
que esta só existe porque uma prévia norma de Direito Público esta mesma competência
à Administração.
o Concretização de conceitos indeterminados
Na concretização de conceitos indeterminados, cada vez mais o Direito é
imperfeito, uma vez que a lei recorre a conceitos indeterminados, nomeadamente a boa
fé, imparcialidade, bons costumes, ideia da prossecução do interesse público, etc.
Perante a aplicação destes conceitos indeterminados, a Administração goza de uma
margem de autonomia.
Todavia, existem três tipos de conceitos indeterminados, nomeadamente:
● Conceitos indeterminados que envolvem um juízo jurídico-discricionário,
onde este por parte da Administração é consubstanciado numa operação
intelectual de natureza subjetiva-valorativa.

Nisto, a Administração vai valorar uma terminada realidade através de uma


decisão cujo juízo avaliativo não é passível de controlo judicial no seu núcleo e, por
isso, os tribunais não se podem substituir à Administração.
Dentro deste tipo, existem duas situações distintas, nomeadamente:
✔ A valoração pode incidir sobre uma realidade presente ou passada, onde há
um conceito dotado de grande indeterminabilidade, mas este conceito é uma
forma de atribuir um poder discricionário na fixação dos pressupostos de
facto, do conteúdo ou dos efeitos das decisões, como por exemplo, o interesse
público;
✔ A valoração pode incidir sobre uma situação futura, onde é um juízo naquilo
que é a estimativa provável de evolução – juízo prognose.

Por exemplo, na prevenção da pandemia, só sabemos se o confinamento foi eficaz


ou não daqui a umas semanas, onde, por isso, este juízo está projetado para o futuro;
● Conceitos indeterminados que exigem um juízo jurídico-interpretativo, onde
este juízo pode ser passível de controlo judicial, onde os tribunais podem dizer
que a Administração estava em erro no juízo interpretativo que fez, como por
exemplo em situações de perigo grave;
● Conceitos indeterminados que apelam a juízos técnico-científicos, onde,
muitas vezes, o Direito Administrativo recorre a condutas de natureza
técnico-científica.

Nisto, este recurso é fonte de conceitos indeterminados, que envolvem o apelo a


critérios de natureza extrajurídica, sendo objeto de receção pelo direito e que a
Administração tem de aplicar, recorrendo a conceitos indeterminados que fazem
apelo a estes conceitos que envolvem conceitos que envolvem juízos
técnico-científicos.
Por exemplo, se uma lei disser que a Administração pode conceder subsídios quando
a situação económico-financeira o justificar, esta situação é o apelo a regras de gestão e
de contabilidade que não são jurídicas.

o Discricionariedade administrativa

Na segunda manifestação, a discricionariedade administrativa traduz-se na


faculdade que a Administração tem de escolher duas ou mais condutas legalmente
possíveis.
No fundo, perante situações de discricionariedade, a Administração escolhe duas
condutas ou mais possíveis, onde temos três ideias nucleares, nomeadamente:
● A discricionariedade envolve escolha;
● A escolha só existe uma vez que a lei permite, o que significa que a
discricionariedade só existe na sequência de uma habilitação legal;
● A escolha é permitida pela lei, mas tem de respeitar os limites impostos pela
mesma.

Nisto, a discricionariedade permite encontrar dois cenários diferentes,


nomeadamente ser discricionariedade optativa, onde a norma indica que se pode
escolher entre a solução A e a solução B, havendo, pois, uma liberdade de escolha do
órgão administrativo
Por outro lado, a discricionariedade pode ainda ser criativa, onde, para uma
determinada previsão, o legislador não identifica uma estatuição, remetendo para a
Administração a autonomia de ser esta a criar a solução para a situação prevista da
norma.
Assim sendo, nas áreas onde pode atuar a discricionariedade, temos o nível do
conteúdo ou objeto da decisão e ao exercido da competência.
Por exemplo, o delegante tanto pode ser ele a exercer os poderes, como pode delegar
no respetivo delegado.
Contudo, no âmbito dos limites da discricionariedade, existem limites externos à
Administração, onde toda a normatividade hetero vinculativa da mesma limita a
discricionariedade.
Além disto, existem limites internos à Administração, onde há situações de
autovinculação do decisor, como por exemplo um regulamento.

o Situações de derrogação administrativa

Nas situações de derrogação administrativa, várias normas podem consagrar uma


estatuição normal para uma determinada previsão concreta, mas, no entanto, a
estatuição fixada pode ser afastada por decisão administrativa.
Assim, temos uma previsão legal sujeita a duas estatuições alternativas,
nomeadamente a estatuição regra, que é identificada pela própria regra e, por outro lado,
a estatuição que a norma remete para o juízo de autonomia da Administração,
permitindo-a afastar a estatuição regra no caso concreto, criando uma solução
alternativa.
Nos pressupostos da derrogação administrativa, estes são três, nomeadamente:
● A derrogação só existe com base numa expressa disposição normativa,
onde esta pode ser aquela que cria a própria estatuição regra, ou pode ser uma
estatuição normativa posterior que permite à Administração afastar a
estatuição regra anteriormente definida, tendo que ter valor igual ou superior;
● A Administração está vinculada ao princípio da igualdade;
● A Administração tem a obrigação de fundamentar as razões de direito e
de facto que a levam a afastar a estatuição regra definida na norma.

Neste sentido, a derrogação administrativa é o exercício de um espaço de


liberdade ou de autonomia decisória que a lei confere à Administração perante
normas cujas estatuição assume natureza dispositiva ou supletiva para a Administração.
Por isso, quando a norma diz que a Administração pode criar uma solução diferente,
indica-se que a estatuição regra por ela definida tem natureza supletiva, onde só se
aplica se a Administração não entender adotar uma solução diferente.
De acordo com o professor Paulo Otero, não é admissível no ordenamento jurídico
derrogações administrativas de natureza normativa, isto é, para casos futuros, não é
possível que uma lei permita que Administração possa afastar a solução regra
definida pela própria lei.
Assim sendo, não é possível uma derrogação administrativa de natureza
normativa a uma lei, de acordo com o art. 112º/5 da CRP, onde a Administração não
pode, por via regulamentar, criar uma solução geral e abstrata que afaste a estatuição
regra definida pela lei.

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