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A Mensagem.

romântica do norte e olhar filosófico característico


dos gregos.
- Primeira parte BRASÃO 2º estrofe
“bellum sine bello”- A guerra sem guerra. “o cotovelo esquerdo é recuado/ o direito é em ângulo
disposto”- aqui os cotovelos encontram-se
A epígrafe que inicia esta parte sugere que a guerra
estrategicamente colocados em Itália e em Inglaterra,
que mensagem apela não se faz com armas.
o que constitui uma nova referência às raízes culturais
I. Os campos (espaço de ação de vida e europeias, o norte e o sul, uma dicotomia entre cultura
fertilidade) romântica e clássica, a Inglaterra é referida pela sua
ligação ao romantismo, corrente artística que
O dos castelos. valorizava de uma forma exacerbada o passado,
enquanto que Itália e a Grécia são evocadas por terem
sido fulcrais para a constituição da civilização e
cultura europeias, sendo Itália a fundadora da base da
língua portuguesa –o latim.

3º estrofe

“fita, com olhar esfíngico e fatal/ o ocidente, o futuro do


passado” - O sujeito poético ao apresentar Portugal
como o rosto da europa, confere-lhe um estatuto
superior relativamente às outras nações europeias,
que possuindo um olhar enigmático e misterioso,
contempla o ocidente que outrora fora desvendado.
Consiste no primeiro poema de mensagem, ao qual Por outro lado, o adjetivo “fatal” aponta para uma
pessoa antepões “os castelos”, às quinas que missão predestinada que cabe a Portugal, fazer com
lendariamente foram concedidas por Cristo ao que a europa renasça das suas próprias cinzas.
primeiro rei de Portugal.
Não há dúvida de que Portugal foi tocado pelo
O seu número definitivo (7), refere-se aos sete castelos destino, reunindo todas as características
que foram conquistados aos mouros aquando da fundamentais (posição geográfica e vocação
reconquista cristã, que permitiu a delimitação do marítimas, já com provas dadas) para “comandar” a
território nacional. Europa numa reconquista mundial de um passado
perdido” futuro do passado”, o sujeito poético acredita
O título: constitui uma perífrase de Portugal, “o dos
que a função de Portugal é ligar o oriente ao ocidente,
castelos” é de facto Portugal.
quer de forma geográfica, quer de forma espiritual,
1º estrofe salvando a velha e apática europa da sua
incomensurável apatia.
“A europa jaz, posta nos cotovelos/ De oriente para ocidente
jaz fitando” A europa aparece-nos personificada pelo Ulisses
sujeito poético como uma figura feminina; esta
Trata-se de um poema da primeira parte- o brasão,
encontra-se deitada (“jaz”) e apoiada nos cotovelos
integrando-se na parte dos castelos, que enaltece
sustentando o rosto na mão direita, com “cabelos
aqueles que fundaram e defenderam a nação
românticos” a toldar o rosto e “olhos gregos”, sendo o
portuguesa.
rosto correspondente a Portugal.

De facto, nesta primeira estrofe, é evidenciada uma


europa inativa e decadente, esta “jaz”, como o próprio
verbo indica esta encontra-se deitada, como morta,
num estado letárgico e imóvel. Além disso, encontra-
se “fitando”, ou seja, com um olhar contemplativo e
estático, provavelmente perdido nas glórias do
passado, simplesmente adormecida para o presente, e
incapaz de se levantar para o futuro.

Esta possui “românticos cabelos” e “olhos gregos”, o que


pode remeter para a identidade europeia, a estética Ulisses simboliza então a fundação mítica da
nacionalidade, pois segundo a lenda, na viajem de
regresso à Ítaca, Ulisses, o herói da Odisseia, obra Esta figura lendária foi suficiente para que o povo
épica escrita por Homero, terá fundado a cidade de português se sentisse projetado para a grandeza do
Lisboa (Olissipo), futura capital do reino do império. seu império, e para grande parte das suas viagens
marítimas (“sem existir nos bastou.”) (“e nos criou”). O
Análise interna. mito funciona como um impulso, para um povo
1º estrofe. edificar a sua glória, grandeza e impérios.

O primeiro verso acaba por encerrar em si um 3º estrofe


paradoxo/oximoro “o mito é o nada que é tudo”, este é o
Assim a lenda se escorre
nada uma vez que, dada a sua natureza, este não
A entrar na realidade,
possui consistência, nem fundamento uma vez que
E a fecundá-la decorre.
não existe numa realidade material, no entanto, é
simultaneamente “tudo” por ser a base de explicações Em baixo, a vida, metade
que entram na realidade, na ausência do conhecimento De nada, morre.
das causas e/ou das origens. Apesar do mito ocultar a Aqui é evidenciado o estatuto criador do mito. O
verdade, ele contribui para a sua revelação. conector “assim”, apresenta um valor conclusivo,
introduzindo desta forma a conclusão do poema. É a
“O mesmo sol que abre os céus/ É um mito brilhante e lenda que “fecunda” a realidade, e as suas
mudo/ – O corpo morto de Deus, / Vivo e desnudo” estas possibilidades criadoras que dão sentido ao real. Desta
duas metáforas corroboram a ideia elaborada na forma, o que verdadeiramente importa não é a
primeira estrofe. O mito é como um sol brilhante que existência de Ulisses, mas sim aquilo que ele
é capaz de abrir os céus, isto é, move as massas de representou e representa, e a energia impulsionadora
uma maneira brilhante, embora que “mudo”. Além que ele liberta. É por esta razão que grande parte dos
disso é definido como o corpo morto de Deus, que ás heróis de mensagem aparecem mitificados.
vezes se revela vivo aos homens. Aqui manifestam-se
as duas características intrínsecas do mito- a sua Concluindo, o mito sendo uma força oculta, vinda dos
irrealidade (mudo, corpo morto), e o seu dinamismo confins do tempo, penetra a realidade presente,
(vivo, desnudo, brilhante). Evidentemente que mantendo-se vivo através da sua passagem de
também acarretam um elevado pendor simbólico, o geração em geração, infiltra-se como sinal divino na
sol renasce todos os dias, e cristo crucificado vida. Sem a força impulsionadora e as possibilidades
ressuscita, tanto um como outro são mitos ligados ao criativas que o mito encerra em si, a vida fica reduzida
poder do renascimento e da redenção, que o sujeito a menos que nada “metade de nada”, condenada
poético pretende transmitir aos portugueses. fatalmente à morte.

2º estrofe. D. Sebastião, rei de Portugal.

O deítico pessoal “este”, remete para o mito, mais D. Sebastião, morreu na batalha de Alcácer Quibir em
particularmente de Ulisses, o espacial “aqui” remete 1578 ao serviço do alargamento do império, mas o seu
para lisboa/Portugal, e o pessoal “nos” para os mito permanece até aos dias de hoje.
portugueses.

Este, que aqui aportou,


Foi por não ser existindo.
Sem existir nos bastou.
Por não ter vindo foi vindo
E nos criou.

Nesta parte da obra alude-se à criação lendária de


Lisboa, a Olissipo, por Ulisses. O sujeito poético tenta
mostrar que a definição de um povo e a sua respetiva
cultura revela-se mais através dos seus mitos, do que
através dos seus factos históricos. Embora Ulisses D. Sebastião surge como a última chaga de cristo, a
nunca tenha existido, foi elevado á condição de mito e última quina do brasão, por ser o último herói-mártir;
foi através dele que se explicou não só a origem de pereceu na luta pelo alargamento do império, que
Lisboa, como também a vocação marítima dos conduziu á queda do mesmo com a perda da
portugueses, devido à heroicidade e bravura que independência em 1580.
marcam o trajeto marítimo de Ulisses no trajeto de
retorno à Ítaca.
1º estrofe A loucura poderá ser canalizada para a reconstrução
nacional, evitando que Portugal caia naquele que é o
Louco, sim, louco, porque quis grandeza abismo do esquecimento.
Qual a Sorte a não dá.
Não coube em mim minha certeza; O infante
Por isso onde o areal está Neste primeiro poema da segunda parte da
Ficou meu ser que houve, não o que há. mensagem, intitulada de mar português, o poeta
recupera a figura do infante D. Henrique, o grande
Num discurso de 1º pessoa, d. Sebastião impulsionador do empreendimento que foi os
autocaracteriza-se como louco, assumindo descobrimentos.
orgulhosamente essa loucura (“porque quis grandeza”).

O vocábulo louco aqui é sinónimo de ambição, sonho.


A causa dessa loucura é o desejo extravasado e
insensato de grandeza- o ideal, a utopia. Esse sonho
ultrapassou os limites impostos pelo destino (“qual a
sorte a não dá”), A sua certeza e convicção de alcançar o
sonho almejado foi superior a ele mesmo (“não coube
em mim minha certeza”). Esse desejo de glória
incomensurável teve um preço, a morte do monarca e
a perda da independência de Portugal.

No areal da batalha de Alcácer Quibir, ficou apenas o Este foi o quinto filho de D. João I e de D. Filipa de
que dele havia de mortal, de físico o corpo (“ficou meu Lencastre e é considerado o homem que mais
ser que houve”), e sobreviveu o “ser que há” , que decisivamente contribuiu para a expansão
permaneceu imortal, ou seja, a sua alma e o seu mito, ultramarina portuguesa. Por isto ele simboliza o
o seu sonho a sua loucura de querer grandeza, de primeiro passo dado para a construção do império
devolver glória á pátria, que continua viva e por português.
concretizar.
1º estrofe
2º estrofe.
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Minha loucura, outros que me a tomem Deus quis que a terra fosse toda uma,
Com o que nela ia. Que o mar unisse, já não separasse.
Sem a loucura que é o homem Sagrou-te, e foste desvendando a espuma.
Mais que a besta sadia, Cadáver adiado que
procria? O primeiro verso acaba por encerrar em si mesmo um
No primeiro verso, o sujeito poético faz um apelo para valor de verdade universal, em primeiro lugar, tal
que outros tomem a sua loucura, ou seja, que os facto é evidenciado pela sua estrutura tripartida em 3
portugueses ambicionem um Portugal maior e orações assindéticas, surgindo nas duas primeiras
melhor, quer em termos materiais como espirituais, e partes os elementos essenciais para que se dê a criação
assim se deixem contagiar pela força criadora que a da obra; a vontade de Deus, o sonho do homem. É
loucura provoca e imbui nos homens. estabelecida uma certa relação de causa efeito, sem a
vontade de deus o homem não sonharia e a obra nunca
A loucura é sinal de racionalidade, é preciso pensar e poderia nascer. Além disso, as formas verbais
ambicionar muito para ser-se apelidado de louco. Está aparecem no presente do indicativo- valor aspetual
inscrito na genética humana essa qualidade, e é esta genérico, contribuindo para realçar a intemporalidade
que distingue o homem da “besta sadia, cadáver adiado e permanência da afirmação.
que procria”, ou seja, dos animais, sem o sonho o
homem é um ser completamente irracional que está Deus quis que a terra fosse toda uma- desejo de deus, que
destinado a nascer, procriar e morrer, sendo assim é o agente da vontade, este quis que a terra se
condenado à morte e ao esquecimento. unificasse através do mar, de forma a permitir
É a loucura que leva o homem a partir em grandes comunicação entre os continentes e os povos, este
realizações, como fez vasco da gama e todos os que tornou o mar navegável e concedeu ao infante d.
tiveram implicados na empresa dos descobrimentos. Henrique que desvendasse os mares, estando
implícita a ideia de predestinação natural dos
portugueses para o empreendimento dos
Descobrimentos. (“sagrou-te e foste desvendando a
espuma”), decorreu da vontade divina que os O Mar Português
portugueses navegassem o mar e descobrissem todos
os seus mistérios, não derivou apenas de um capricho O mar português simboliza o esforço e o sofrimento
do infante. necessários para a realização do sonho das
Descobertas, e da “posse do mar”, constituindo uma
2º estrofe reflexão acerca do espírito de sacrifício essencial para
E a orla branca foi de ilha em continente, atingir a glória.
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo

É evidente uma certa gradação crescente nesta estrofe,


esta descreve o modo progressivo como as
descobertas foram realizadas, primeira descobriram-
se as ilhas, depois os continentes e, finalmente, deu-se
a ligação por mar dos vários pontos da Terra.

Na escuridão fez-se luz, (“clareou”), ou seja, a


ignorância transformou-se em conhecimento, e a 1º estrofe
civilização ocidental encontrou-se com a oriental. E Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de
assim, “correndo, até ao fim do mundo” se eliminaram as
Portugal!
barreiras e os limites da condição humana. Viu-se a
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Terra inteira a surgir com forma redonda-
desmitificação de que a terra era plana. Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
3º estrofe. Para que fosses nosso, ó mar!
Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal. A primeira estrofe inicia-se com a interpelação do
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez. sujeito poético ao mar, a que relembra os preços pagos
pelos portugueses para conquistarem o mar.
Senhor, falta cumprir-se Portugal
A apóstrofe “ó mar salgado”, invoca o responsável pelo
Deus sagrou o infante e criou-o português, significa
sofrimento do povo, seguidos da metáfora e
que o não só o infante foi o escolhido para guiar a
hiperbolizada (”quanto do teu sal são lágrimas de
desvenda dos mares, como também a nação foi
Portugal”) o mar adquire a propriedade salgada das
selecionada para cumprir essa missão.
lágrimas dos portugueses, o sal surge assim como
símbolo de sofrimento, das inúmeras tragédias que
(“cumpriu-se o mar e o império se desfez”), apesar do
aconteceram no mar.
sonho se ter cumprido, unificou-se o mundo através
dos mares e criou-se o império, que atualmente se
A construção em anáfora dos versos 3, 4 e 5 e o uso de
desfez. O que leva á reflexão de que Portugal ficou
quantificadores (“quantas mães”) (“quantos filhos”)
sem qualquer tipo de desígnio e rumo.
(“quantas noivas”), enfatizam o aspeto trágico da
façanha dos descobrimentos e conferem dramatismo
O sujeito poético dirige-se a deus, lembrando-lhe de
às situações evocadas, realçando o número de vidas
que falta cumprir-se Portugal. O império material era
perdidas.
uma obra efémera, perecível como tudo o que é
material e humano, como seres limitados, não pode
2º estrofe
haver continuidade para esse império, que
Valeu a pena? Tudo vale a pena
eventualmente se desfez, daí que o sujeito poético
aponte para a necessidade de Portugal se cumprir Se a alma não é pequena.
integralmente, de completar-se com a dimensão Quem quer passar além do Bojador
espiritual, realizando isso novamente com Tem que passar além da dor.
predestinação divina. Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
A segunda estrofe é iniciada pela expressão “valeu a
pena?”, ou seja, justificou-se tanto sacrifício? Aqui o sujeito poético reflete sobre a apatia do
homem, lamentando a vida daqueles que levam uma
Ao qual ele responde “tudo vale a pena/ se a alma não é existência medíocre e conformista, sem quaisquer
pequena, todos os objetivos são justificáveis se o ambições.
objetivo que estiver na sua base for nobre e se agir Os versos 1 e 2 acabam por ser de certa forma
com ousadia, coragem, determinação e abnegação, paradoxais, uma vez que evidenciam ideias contrárias
tudo vale a pena para atingir o ideal/sonho. “triste” de quem é “contente, porém, aqueles que o eu
lírico alude são efetivamente felizes, ele é que os
“Quem quer passar além do Bojador/ tem de passar além da considera triste pela simples razão de se sentirem
dor”, quem quer alcançar o objetivo desejado tem de demasiado confortáveis no seu “lar”, pelo facto de
superar os obstáculos que se lhe depararem e a não ambicionarem e arriscarem na vida, contentando-
própria dor, indo além dela. O bojador é metáfora dos se com a mediocridade, com a banalidade e a
objetivos a alcançar e simboliza o ultrapassar do monotonia.
medo, do desconhecido, o primeiro passo para o O eu lírico sente pena daqueles que não arriscam ser
conhecimento. É necessário superar os limites da frágil ousados, nem buscam a concretização de sonhos, e de
condição humana. forma implícita mostra que essa é a principal razão da
sociedade se encontrar estagnada.
“Deus ao mar o perigo e abismo deu/ mas nele é que
espelhou o céu” - quem superar, sofrendo, os perigos do A referência à lareira onde arde a “mais rubra brasa”,
mar, alcançará a glória suprema, que é mesmo que relaciona-se com a importância dos sonhos e da
dizer que tudo o que é verdadeiramente custoso tem imaginação na vida humana. Os ideias conjuntamente
o seu preço e a sua compensação. O “mar” é símbolo com a ambição têm o poder de intensificar a vida, de
de sofrimento e morte (” perigo”) (“abismo”), mas lhe dar energia, da mesma forma que a chama do fogo
também símbolo da realização do sonho, da glória e torna a brasa mais avermelhada.
imortalidade, já que foi nele que deus fez “espelhar” o
céu. Quem conquistar o mar ascenderá ao plano 2º estrofe.
divino.
Triste de quem é feliz!
Quinto império Vive porque a vida dura.
Nada na alma lhe diz
Para Fernando Pessoa, o quinto império corresponde a Mais que a lição da raiz –
um domínio universal e espiritual de harmonia e Ter por vida a sepultura
prosperidade entre povos, que Portugal fundaria e
dirigiria.
A segunda estrofe é então iniciada por um oximoro,
retomando a ideia inicial do poema. (“triste de quem é
feliz!”) esta frase exclamativa expressa um certo
desdém que o sujeito poético nutre face à aceitação
da monotonia da vida. Assim o eu lírico pretende
desmistificar o conceito de felicidade, que o senso
comum aceita e afirma ser a valorização da vida ao
nível mais rudimentar.

Quem vive por apenas viver, sem qualquer tipo de


sonhos ou ideais (“porque a vida dura”), é semelhante a
uma raiz, vivendo como se já estivesse sepultado. Os
nomes “raiz” e “sepultura”, associam-se ao
imobilismo, à inércia e ausência de dinamismo.

1º estrofe
Assim quem vive apena porque “a vida dura”, não a
aproveita, limita-se apenas a sobreviver todos os dias.
Triste de quem vive em casa, Esta aceitação da vida conduz à morte espiritual e
Contente com o seu lar, intelectual do indivíduo, porque a vida digna de ser
Sem que um sonho, no erguer de asa, vivida é orientada pelos mitos, pelo sonho e
Faça até mais rubra a brasa sobretudo pela loucura, que está inscrita na genética
Da lareira a abandonar! humana.
3º e 4º estrofe. O nevoeiro

Eras sobre eras se somem


No tempo que em eras vem.
Ser descontente é ser homem.
Que as forças cegas se domem
Pela visão que a alma tem!

E assim, passados os quatro


Tempos do ser que sonhou,
A terra será teatro 1º estrofe
Do dia claro, que no atro Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Da erma noite começou. Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
(“ser descontente é ser homem”)- defende que a Que é Portugal a entristecer
insatisfação é o motor de todas as obras de carácter Brilho sem luz e sem arder,
grandioso, a evolução apenas acontece quando o ser Como o que o fogo-fátuo encerra
humano se encontra insatisfeito com algo do presente. O sujeito poético aponta para a crise generalizada da
Desta forma, o mundo avança apenas com os infelizes, nação que se encontra num estado de indefinição total,
os descontentes, e não com aqueles que se sentem sem ninguém que a governe, e sem leis porque se
confortáveis no seu tempo. governe, sem tempos de paz, mas também sem
Que as forças cegas se domem /Pela visão que a alma tem- o conflitos graves (“nem rei, nem lei, nem paz nem guerra”)
sujeito poético deseja que as forças da natureza,
divinas sejam suplantas pela visão da alma, de modo Portugal transformou-se num país completamente
a que o homem se liberte da prisão que é a sua carecido de identidade (“fulgor baço da terra”), que se
condição frágil e impotente e assim consiga alcançar a degrada e que decai, ficando permanente a espera
dimensão transcendente, a plenitude existencial. envolvidos na intermitente inércia, sem mudar
absolutamente nada.
(“quatro tempos do ser que sonhou”) - alude aos 4
impérios que mais tiveram impacto na Humanidade, 2º estrofe.
(Grécia, Roma, cristandade e Europa), assim, a Ninguém sabe que coisa quer.
humanidade um dia renascerá das cinzas, para um
Ninguém conhece que alma tem,
tempo de plenitude, pureza e imortalidade que a
Nem o que é mal nem o que é bem.
chegada do Quinto império vai proporcionar como
uma luz. (“a terra será teatro/ do dia claro”) contrastando (Que ânsia distante perto chora?)
com a escuridão do presente “erma noite”, a missão da Tudo é incerto e derradeiro.
construção deste império de harmonia e paz cabe Tudo é disperso, nada é inteiro.
então aos portugueses. Ó Portugal, hoje és nevoeiro... É a Hora!

5º estrofe Existe um ambiente marcado pela crise de valores,


Grécia, Roma, Cristandade, Europa — os quatro se para a ausência daquilo que define o ser humano. Os
vão portugueses, no seu sentido coletivo, apresentam um
Para onde vai toda idade. espírito amorfo, não sabem o que são, o que querem
Quem vem viver a verdade nem para onde vão.
Que morreu D. Sebastião?
A expressão parentética acentua o contraste entre o
desânimo nacional do presente e uma esperança ténue
A interrogação tem o sentido de apelo, um apelo à
num futuro melhor. No desalento, o eu lírico mostra a
construção do Quinto Império que se distinguirá dos
esperança que ainda reside na alma de cada um – “a
anteriores por ser civilizacional e espiritual, um
ânsia distante”, que ainda se encontra longe, talvez
Império da «verdade» e da paz universal. Este novo
perdida no passado, mas que “chora perto”, mostrando
tempo dependerá do regresso de D. Sebastião,
a proximidade da regeneração da alma Lusitânia, da
enquanto mito, pois «O mito é o nada que é tudo»
reconstrução de um Portugal glorioso.
(poema «Ulisses»).

Os versos 11 e 12 assinalam a indefinição que envolve


Portugal, através da anáfora do pronome indefinido
«Tudo», associado ao verbo ser («é»), e dos adjetivos
«incerto», «disperso»; «nada é inteiro» a exprimir a
fragmentação da imagem nacional, para a qual parece
não haver esperança («derradeiro»). O desalento é
geral e a dispersão, típica do nevoeiro, estende- -se a
todo o país: «Ó Portugal, hoje és nevoeiro…». O
«nevoeiro» surge como metáfora de Portugal, algo
indeterminado, indistinto, mas para o qual existe
esperança, uma vez que este «nevoeiro», símbolo
igualmente do mito sebastianista, representa apenas
uma fase, antecedendo uma revelação importante: o
Quinto Império.

. Os destinatários são os portugueses do presente do


enunciação. «É a Hora!» afigura-se um grito, um apelo:
está na hora de se sair desta tristeza nacional, é a hora
da mudança, do desvendar do «Encoberto», da
ressurreição de Portugal, da edificação do Quinto
Império. Despedindo-se, com a expressão latina
«Valete, Fratres», o sujeito acrescenta- -lhe um novo
sentido: uma exortação aos portugueses, tal como no
monóstico, para se reerguerem e lutarem por um Novo
Portugal, pela construção de um império de
fraternidade humana

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