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DIREITO

PROCESSUAL
CIVIL III

Maytê Ribeiro Tamura Meleto Barboza


Execução em geral
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

 Explicar o sincretismo processual.


 Relacionar os princípios gerais da execução.
 Conceituar execução fiscal.

Introdução
A execução tem como principal objetivo a satisfação do direito do cre-
dor, que, munido de um título executivo que assegura a existência de
uma obrigação, deseja vê-lo concretizado. Para que possa ocorrer a
execução, aquele que se afirma credor deve possuir um título executivo,
e a obrigação constante nesse título deve ser certa, líquida e exigível.
O processo de conhecimento é aquele que visa conhecer o direito para
então constatar se ele, de fato, existe ou não. Já o processo executivo é
aquele que materializa o que já foi verificado no processo de cognição.
O sincretismo processual é a unificação desses dois tipos de processo,
objetivando maior celeridade e eficiência na jurisdição.
Neste capítulo, você vai ler sobre a execução em geral, o sincretismo
processual, os princípios gerais relacionados à execução e o conceito
de execução fiscal.

Sincretismo processual
A tutela jurisdicional executiva é o objetivo do processo executivo. Busca-se,
por meio dela, a satisfação de um direito do credor, garantido por um título
executivo, que pode ser de duas espécies: judicial e extrajudicial. Com o
inadimplemento do devedor, o credor torna-se legitimado a cobrar tal prestação
por meio de um processo executivo.
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A autotutela, em regra, não é permitida no ordenamento jurídico brasileiro. Por esse


motivo, para satisfazer um direito, é preciso que a parte recorra à jurisdição. Uma vez
instaurada uma ação judicial e analisadas todas as provas existentes, o juiz dirá qual
das partes é a verdadeira detentora do direito.

Segundo Didier Júnior et al. (2017, p. 42):

O direito a uma prestação precisa ser concretizado no mundo físico; a sua


efetivação/satisfação é a realização da prestação devida. Quando o sujeito
passivo não cumpre a prestação, fala-se em inadimplemento ou lesão. Como
a autotutela é, em regra, proibida, o titular desse direito, embora tenha a
pretensão, não tem como, por si, agir para efetivar o seu direito. Tem, assim,
de recorrer ao Poder Judiciário, buscando essa efetivação, que, como visto,
ocorrerá com a concretização da prestação devida. Busca, portanto, a tutela
jurisdicional executiva.

O processo executivo, portanto, é aquele que objetiva a satisfação de um


direito já conhecido. Para tanto, às vezes, é necessário um outro tipo de pro-
cesso, anteriormente, para saber se o direito, de fato, é pertinente. Esse processo
é chamado de processo de conhecimento ou de cognição (ROSA, 2014).

Em suma, o processo cognitivo se destina ao reconhecimento do direito, enquanto o


executivo se destina à sua satisfação.

Nesse contexto, temos as palavras de Rosa (2014, documento on-line):

O processo de conhecimento, ou de cognição, é aquele que objetiva a tutela


jurisdicional cognitiva, ou seja, que reconhece ou não a existência de um direito
pleiteado pela parte autora. Faz-se por meio da sentença de mérito passível
de recurso e, caso haja recurso, o acórdão substitui a sentença. No processo
executivo também se desenvolve uma tutela jurisdicional, esta chamada de
executiva. É a tutela para a efetivação, materialização, do direito reconhecido
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na sentença do processo cognitivo, e sua realização prática. O CPC apresentava


estes dois tipos de processo em apartado, de forma que após ter sua pretensão
reconhecida, a parte vencedora deveria dar início a um outro processo, em
regra, num outro juízo. Esta dinâmica já vinha sendo muito criticada, tendo
em vista a quantidade de ações em constante crescimento, bem como da
eficácia da fase de cumprimento de sentença.

Havia muitas críticas a respeito da separação entre o processo cognitivo e


o executivo, de modo que os legisladores decidiram que era melhor unificar
esses dois tipos processuais, fazendo serem apenas fases diferentes do mesmo
processo. Isso trouxe maior celeridade ao processo, fazendo-o ser realizado
de modo rápido, afinal, possibilita que um mesmo juiz acompanhe a ação
desde a fase de conhecimento até a fase de execução. Segundo Rosa (2014,
documento on-line):

O termo “processo sincrético” vem como sinônimo de celeridade, de clareza


e automatização da execução nos procedimentos de natureza mandamental e
condenatória. Tanto a fase de cognição quanto a fase de execução se realizam
no mesmo processo, permitindo que a execução da sentença seja acompanhada
pelo mesmo juiz, conhecedor da causa e que esta se dê com mais garantia,
tendo em vista sua rápida realização.

Podemos perceber a intenção do legislador de tornar o processo civil


ainda mais simples, evitando o início de inúmeras ações. Segundo Cruzes
(2011), o processo civil pátrio caminhou e tem caminhado rumo à formação
de um novo sistema processual, não mais estruturado na rígida autonomia
processual, mas na ideia do processo único e, sempre que necessário,
sincrético.

O maior objetivo do sincretismo processual é unificar as diferentes fases de um processo,


de modo a torná-lo mais simples e garantir maior celeridade à sua resolução. Já não é
mais necessária a instauração de duas ações diferentes para tratar de um só assunto.
Como o processo executivo, muitas vezes, decorre do processo de cognição, houve
a fusão desses dois tipos de processo em um único; assim, o que antes era dois tipos
de processos diferentes passou a ser diferentes fases de um único processo: a fase de
conhecimento e a fase de execução.
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Princípios gerais da execução


Existem os princípios processuais, aplicáveis a todos os tipos de pro-
cessos, e também princípios específicos da execução, os quais serão
abordados aqui.
O princípio da autonomia ou do autorregramento da vontade na execu-
ção, de acordo com Didier Júnior et al. (2017, p. 85), “[...] é o direito do sujeito
processual de regular seus próprios interesses e fazer suas escolhas jurídicas”.
Tal princípio visa garantir o direito fundamental de autonomia, sem restri-
ções exageradas ou descabidas. O objetivo é preservar um espaço processual,
possibilitando a liberdade e o exercício da vontade para que as partes e o juiz
possam negociar.
Já o princípio da patrimonialidade significa que a execução será sempre
real e jamais pessoal, como acontecia na época da Lei das XII Tábuas, em que
era possível dividir o corpo do devedor em quantas partes representassem os
credores (NEVES, 2017). Não é possível que uma pessoa pague a obrigação
com seu próprio corpo, por exemplo, assim, as prestações deverão recair
única e exclusivamente sobre o patrimônio do devedor ou dos responsáveis.
Outro fato bastante comum no Direito Romano era que o executado poderia
virar escravo do credor para, desse modo, pagar suas dívidas. Hoje em dia,
isso é inadmissível, o que é decorrência da humanização do Direito (DIDIER
JÚNIOR et al., 2017).
O princípio do exato adimplemento, por sua vez, traduz a ideia de
que o resultado da execução deve ser o mesmo caso o devedor cumprisse
a obrigação de maneira espontânea. De acordo com Mattos (2011, docu-
mento on-line):

Deste princípio extrai-se a ideia de que a execução deverá trazer ao credor


o mesmo resultado que traria, caso a obrigação adimplida espontaneamente
pelo devedor. Desta forma, a execução atingirá o patrimônio do executado
somente naquilo que for necessário à satisfação do credor.

O princípio da disponibilidade do processo pelo credor permite ao exe-


quente desistir, a qualquer momento, do processo executivo. A concordância
do executado, nesse caso, não é necessária.
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Desistência não é o mesmo que renúncia. A desistência significa apenas que o credor
não deseja mais cobrar o direito naquele instante, naquele processo, mas futuramente
poderá ingressar com uma nova ação, idêntica, apenas comprovando o pagamento
das custas referentes à primeira ação (NEVES, 2017). Ou seja, o exequente poderá
desistir da ação específica, independentemente da concordância do executado, e
ainda poderá ingressar com processo idêntico no futuro caso deseje.

O princípio da utilidade refere-se basicamente ao fato de que o processo


deve ser útil, isto é, servir para que o credor tenha a satisfação de seu direito.
O art. 836, caput, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC de 2015), é um
exemplo disso. Diz o referido artigo que: “Art. 836 Não se levará a efeito a
penhora quando ficar evidente que o produto da execução dos bens encontrados
será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução” (BRASIL,
2015, documento on-line).
Assim, se for constatado que o produto da execução dos bens será totalmente
absorvido pelo pagamento das custas da execução, a penhora não deve ser
feita. Neves (2017, p. 1.068) afirma que:

[...] nunca é demais lembrar que atualmente a execução não é forma de vingança
privada, como já foi dito em remotas épocas. Trata-se de mecanismo judicial
para a satisfação do direito do credor, e sempre que se entender que esse direito
não pode ser satisfeito não haverá razão plausível para a admissão da execução.

O princípio da menor onerosidade, por seu turno, reafirma isso. A execu-


ção não deve ser uma forma de vingança privada, mas sim deve servir apenas
para a satisfação do direito do credor. Portanto, o executado não pode sofrer
uma agressão ao seu patrimônio maior do que o necessário para o pagamento
da obrigação (NEVES, 2017). De acordo com o art. 805 do CPC de 2015:

Art. 805 Quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o
juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.
Parágrafo único. Ao executado que alegar ser a medida executiva mais gra-
vosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob
pena de manutenção dos atos executivos já determinados (BRASIL, 2015,
documento on-line).
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Entre os princípios da execução, há também o princípio do contraditório,


que é um princípio constitucional, previsto no art. 5º, LV, da Constituição Federal:
“Art. 5º [...] LV — aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e
aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes” (BRASIL, 1988, documento on-line).
Assim, podemos ter uma ideia da dimensão de tal princípio, extremamente
importante, tanto que é garantido inclusive pela Carta Magna. Nas palavras
de Didier Júnior et al. (2017, p. 78):

O contraditório no procedimento executivo, no aspecto do direito de defesa


assegurado à parte demandada, é eventual, porquanto depende da provocação
do executado, que não é chamado a juízo para defender-se, mas sim para
cumprir a obrigação. O procedimento executivo adota a técnica monitória,
que consiste, basicamente, na inversão do ônus de provocar o contraditório:
o réu, em vez de citado para manifestar-se sobre a pretensão do autor, é
convocado para cumprir uma determinada obrigação. Não é correto dizer,
então, que não há contraditório no procedimento executivo: ele é previsto,
até mesmo como consequência da garantia constitucional, mas é eventual na
parte concernente à defesa do executado.

O princípio do contraditório, garantido constitucionalmente, também está previsto


na execução. Nesse tipo de processo, o executado não é citado para manifestar-se
contra aquilo que alega o exequente, mas para cumprir a obrigação presente no
título executivo.

Execução fiscal
A execução fiscal é o processo judicial por meio do qual a Fazenda Pública
cobra os débitos dos devedores inscritos em dívida ativa. A lei que dispõe sobre
a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública é a Lei nº. 6.830, de
22 de setembro de 1980, conhecida como Lei de Execução Fiscal. De acordo
com o art. 2º da referida lei:

Art. 2º Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como


tributária ou não tributária na Lei nº. 4.320, de 17 de março de 1964, com
as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito finan-
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ceiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União,


dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal (BRASIL, 1980,
documento on-line).

Portanto, se a dívida for com o governo, o processo judicial para cobrança


do devedor é chamado de execução fiscal. O art. 4º da Lei de Execução Fiscal
diz contra quem a execução pode ser promovida:

Art. 4º [...]
I — o devedor;
II — o fiador;
III — o espólio;
IV — a massa;
V — o responsável, nos termos da lei, por dívidas, tributárias ou não, de
pessoas físicas ou pessoas jurídicas de direito privado; e
VI — os sucessores a qualquer título.
§ 1º — Ressalvado o disposto no artigo 31, o síndico, o comissário, o liqui-
dante, o inventariante e o administrador, nos casos de falência, concordata,
liquidação, inventário, insolvência ou concurso de credores, se, antes de
garantidos os créditos da Fazenda Pública, alienarem ou derem em garantia
quaisquer dos bens administrados, respondem, solidariamente, pelo valor
desses bens (BRASIL, 1980, documento on-line).

A execução fiscal pode ser definida, portanto, como “[...] o procedimento


pelo qual a Fazenda Pública aciona o Poder Judiciário para requerer de contri-
buintes inadimplentes o crédito devido. O processo é consequência da inscrição
do devedor na dívida ativa, após frustradas tentativas de recuperação na via
administrativa” (STJ, 2019, documento on-line).
O art. 11 da Lei de Execução Fiscal mostra que a penhora dos bens do
devedor segue uma ordem preestabelecida na legislação:

Art. 11 A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:


I — dinheiro;
II — título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação
em bolsa;
III — pedras e metais preciosos;
IV — imóveis;
V — navios e aeronaves;
VI — veículos;
VII — móveis ou semoventes; e
VIII — direitos e ações.
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§ 1º — Excepcionalmente, a penhora poderá recair sobre estabelecimento


comercial, industrial ou agrícola, bem como em plantações ou edifícios
em construção.
§ 2º — A penhora efetuada em dinheiro será convertida no depósito de que
trata o inciso I do artigo 9º (BRASIL, 1980, documento on-line).

Isso significa, por exemplo, que, mesmo que haja uma dívida de Imposto
Predial e Territorial Urbano (IPTU), não necessariamente será penhorado o
imóvel a que se refere a dívida, mas primeiro o dinheiro e os outros bens que
antecedem o imóvel na lista no art. 4º da Lei de Execução Fiscal (BRASIL, 1980).

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União,


1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.
htm. Acesso em: 19 nov. 2019.
BRASIL. Lei no. 6.830, de 22 de setembro de 1980. Dispõe sobre a cobrança judicial
da Dívida Ativa da Fazenda Pública, e dá outras providências. Diário Oficial da União,
1980. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6830.htm. Acesso
em: 19 nov. 2019.
BRASIL. Lei no. 13.105, de 16 de março de 2015. Código de processo civil. Diário Oficial da
União, 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/
lei/l13105.htm. Acesso em: 19 nov. 2019.
CRUZES, M. S. S. O sincretismo do processo civil brasileiro: análise da viabilidade de um
processo único e multifuncional sob a perspectiva do direito fundamental à tutela
jurisdicional efetiva. 2011. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Federal
da Bahia, Salvador, 2011. Disponível em: http://repositorio.ufba.br/ri/handle/ri/10757.
Acesso em: 19 nov. 2019.
DIDIER JÚNIOR, F. et al. Curso de direito processual civil: execução. 7. ed. Salvador: Editora
JusPODIVM, 2017.
MATTOS, M. M. Bens impenhoráveis e melhor interesse do credor. 2010. Trabalho de
Conclusão de Curso (Graduação em Direito) - Centro Universitário Jorge Amado,
Salvador, 2010.
NEVES, D. A. A. Manual de direito processual civil: volume único. 9. ed. Salvador: Editora
JusPODIVM, 2017.
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ROSA, V. S. Do sincretismo processual. Migalhas, 2014. Disponível em: https://www.


migalhas.com.br/dePeso/16,MI193415,31047-Do+sincretismo+processual Acesso em:
19 nov. 2019.
STJ. A interpretação da Lei de Execução Fiscal na jurisprudência do STJ. 2019. Dispo-
nível em: http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/A-
-interpretacao-da-Lei-de-Execucao-Fiscal-na-jurisprudencia-do-STJ.aspx Acesso
em: 19 nov. 2019.

Leitura recomendada
CÂMARA, A. F. O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Editora Atlas, 2015.

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