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Introdução ao Estudo do Direito I

Regente: Prof. José Alberto Vieira

OBRAS:
Introdução ao estudo do Direito, Miguel Teixeira de Sousa;
Direito: introdução e teoria geral, José de Oliveira Ascensão;
Tratado do Direito Civil Português (volume I), António Menezes Cordeiro;
15-10-2020

Parte introdutória:

A ordem jurídica portuguesa tem uma tradição histórica que remonta ao Direito
Romano e aos povos germânicos -> Portugal integra a família romano-germânica
do Direito;
O sistema romano-germânico é diferente do Sistema Common law (EUA)

O Direito pode ser analisado de diferentes formas: análise dinâmica vs análise


estática
Análise dinâmica
Análise com base em três conceitos interligados: facto jurídico (todo o facto que
é relevante para o direito, pois desencadeia efeitos jurídicos; dentro do facto
jurídico, temos o ato jurídico e o facto jurídico stricto sensu), regra jurídica (as
regras jurídicas determinam a relevância jurídica dos factos) e efeito jurídico
(resultante da aplicação de uma regra jurídica a um facto jurídico)
Analise estática
Análise do direito em si mesmo, sem considerar os efeitos jurídicos decorrentes
da aplicação de regras jurídicas a factos relevantes do ponto de vista do direito.

A palavra “Direito” tem várias acessões. Podemos desde logo distinguir entre
Direito objetivo e Direito subjetivo.

Direito objetivo - law


-> Sistema/ordenamento jurídico (direito português, direito francês, direito
europeu…);
-> Regulação com carácter normativo: conjunto de regras que, organizadas de
acordo com o seu âmbito, regulam a conduta dos cidadãos;
-> Ramo do Direito/conjunto de normas e de príncipios jurídicos que se reporta a
um setor automatizado e particular da ordem jurídica - Direito das Obrigações, o
Direito das Sucessões, Direito Processual Civil…
Direito subjetivo - right
Deixamos o plano normativo para nos referirmos a uma situação de titularidade
de alguém -> direito enquanto poder que é reconhecido/atribuído ao indivíduo
pela ordem jurídica

Há direito subjetivo porque há direito objetivo (isto é, tenho direito subjetivo


porque existe uma norma jurídica que me confere a titularidade de determinado
poder) -> um indivíduo tem direito de suceder (d. subjetivo) porque o Direito das
Sucessões (d. objetivo), formado por regras que regulam o fenómeno sucessório,
existe;

No Direito Romano, há uma grande distinção entre Direito Público e Direito


Privado. Esta distinção essencial é visível nos países que integram a família
romano-germânica do Direito, e é feita através de vários critérios -> natureza
dos interesses, natureza dos sujeitos e posição dos sujeitos na relação jurídica (o
mais aceite)

Direito Público:
Um sujeito - Estado ou pessoa coletiva pública - está em posição de
superioridade em relação ao outro —> O Estado ou as pessoas coletivas públicas
intervém na sua posição de supremacia, enquanto titulares de poderes de
autoridade
Princípio da competência: o sujeito em posição de superioridade não tem
completa liberdade de ação, estando condicionado pelas competências que lhe
são atribuídas pela lei;

Direito Privado: rege, maioritariamente, relações estabelecidas entre privados;


vigora o princípio da igualdade e da liberdade, e não o princípio da competência;

- Não há uma delimitação objetiva entre Direito Público e Direito Privado, sendo,
muitas vezes, bastante difícil dizer em que dimensão é que uma norma se insere.

Dentro do Direito Privado:


Direito Civil (a base de qualquer ordem jurídica de tradição romano-germânica)
Automatizações (Direito Comercial, Direito do Trabalho)
As ordens jurídicas organizam-se a partir da distinção estrutural entre o Direito
Público e o Direito Privado. Tanto o Direito Público como o Direito Privado têm
ramos, cada um com princípios próprios.

A Constituição está no topo da hierarquia jurídica. Assim, todos os ramos do


Direito estão subordinados à Constituição (respeito pelos princípios e valores
constitucionais)
Contudo, temos o primado do Direito Europeu comunitário: o Direito europeu
tende a igualar ou a colocar-se acima da Constituição de cada estado-membro;

O Direito não é objeto de estudo exclusivo dos juristas: está relacionado com
outras disciplinas, disciplinas que estudam o Direito de vários pontos de vista
(Sociologia do Direito - a relação existente entre o Direito e a sociedade; o Direito
inerente à vida em sociedade e sofre alterações com as transformações desta;
História do Direito - estudo do Direito enquanto produto cultural, que sofre
alterações ao longo do tempo; assim, de modo geral, o Direito é diferente em
épocas históricas diferentes; Filosofia do Direito - estudo dos fundamentos e dos
valores inerentes ao Direito, e não da ordem jurídico vigente).

O Direito enquanto Ciência virada para a prática


—> O Direito tem uma essência prática, e não descritiva, essencialmente porque
trata da resolução de casos concretos; assim, não basta dominar a Teoria do
Direito, apesar de esta ser necessária na vida de um jurista prático;
O Direito enquanto Ciência que segue um método diferente do experimental,
método que é utilizado pelas ciências da natureza. O método jurídico, método
que permite a resolução de casos concretos através da aplicação de regras
jurídicas, procura fundamentar os resultados a que se chega.

Direito positivo diferente de Direito vigente (aquele que está em vigor, em


aplicação)
Direito vigente é diferente do Direito morto - o Direito que deixou de vigorar (leis
que foram revogadas) - e do Direito a constituir.
22-10-2020

Funções da Ciência do Direito:

1. Função heurística/produtiva: resolução de casos concretos através do


enunciado de proposições jurídicas e da formulação de teorias;
2. Função de sistematização: sistematização de matérias (organizar as regras
jurídicas debaixo de princípios, conceitos e generalidades, isto é, debaixo de
elementos sistematizadores)
3. Função estabilizadora: as proposições e as teorias formuladas pela Ciência do
Direito fornecem modelos de decisão para a resolução de casos concretos,
evitando constante discussão sobre a resolução de novos casos;
4. Função crítica/de desenvolvimento do método jurídico: a Ciência do Direito
chama a atenção para as incoerências, insuficiências e lacunas do ordenamento
jurídico, com a finalidade de o desenvolver/aperfeiçoar

SER / “DEVER SER” (dicotomia que ajuda a compreender a essência do Direito)

- O “ser” ocupa-se da descrição da realidade, estando presente em afirmações


como “Ontem, choveu o dia todo” e “Estou a estudar Introdução ao Direito”, e
ocupa-se das leis naturais (leis descritivas, baseadas na observação da
realidade); por oposição, o “ser” não descreve a realidade, mas prescreve certas
condutas, estando em afirmações como “Não converses nas aulas” e “Os
acordos devem ser cumpridos”
- Com uma dimensão descritiva, o “ser” pertence ao domínio da razão teórica,
razão ligada ao conhecimento; por oposição, o “dever ser”, voltado para a
prescrição de condutas, pertence ao domínio da razão prática;
- O “ser” tem uma correspondência com os valores de verdade e falsidade
(através da observação da realidade, consigo dizer se as afirmações “Está sol” e
“A professora disse aos alunos que ia chegar atrasada” são verdadeiras ou
falsas); por oposição, o “dever ser” não tem correspondência com os valores de
verdade e falsidade, mas sim com as noções de validade e invalidade (“O
sargento ordenou ao coronel que fosse dormir”: a proposição é verdadeira, se,
realmente, o sargento deu a ordem ao coronel; contudo, a ordem em si (e não a
descrição da conduta do sargento) não é verdadeira, mas inválida, pois o
sargento não tem competência para dar ordens a um coronel).
- O “ser” não pressupõe a observância ou violação (não faz sentido dizer que vou
respeitar ou não cumprir a afirmação “Está a chover”); por oposição, o “dever
ser” pode ser violado ou respeitado pelos seus destinatários (posso cumprir ou
não uma ordem que me é imposta, sem que isso afete a sua vigência);
- O direito interessa-se principalmente pelo “dever ser”, na medida em que é
uma ordem normativa (ordem composta por normas que orientam a conduta
humana). De facto, o Direito não tem a função de descrever a realidade, mas a
de prescrever condutas através de normas.

Os membros da sociedade orientam as suas condutas por:


-> hábitos ou usos sociais: os hábitos e os usos sociais (tipo de alimentação e
modas, por exemplo) decorrem do comportamento da maioria dos indivíduos da
sociedade, e não possuem a dimensão do “dever ser”;
-> regras de “dever ser”: como o nome indica, são regras que traduzem um
dever, isto é, determinam, independentemente da adesão dos destinatários, o que
deve e não deve ser feito;
-> As regras de “dever ser” normativas!

A ordem social é inerente à vida em sociedade e não deve ser confundida com a
ordem natural.
ORDEM NATURAL: não se dirige ao homem e visa explicar fenómenos naturais,
exprimindo-se através de leis da física/geografia/biologia; a ordem natural é
universal (válida em qualquer tempo e qualquer espaço) e não pode ser violada;
ORDEM SOCIAL: tem a finalidade de regular as relações entre os indivíduos que
vivem em sociedade, interagindo uns com os outros; é essencial para a sociedade,
pois uma sociedade sem ordens não pode subsistir;

Na ordem social, essencial à vida em sociedade, coexistem várias ordens


normativas.
Importante:
-> apesar de traduzirem um “dever ser”, as regras que constituem as ordens
normativas atribuem sempre ao agente a escolha entre respeitar ou violar os seus
comandos (“estar obrigado a” é diferente de “ter a obrigação de”, sendo a última
expressão própria de uma ordem normativa)
-> normatividade é diferente de técnica: uma ordem normativa traduz um dever
ser, sendo impostas sanções aqueles cujas condutas violam determinada formava,
enquanto que a técnica determina a forma como o indivíduo deve agir para
alcançar determinado fim.

Ordens normativas dentro da ordem social:


->ordem moral
-> ordem religiosa
-> ordem jurídica
-> ordem moral

Ordem moral:
- É constituída por regras que se dirigem à consciência humana e que visam o
aperfeiçoamento da pessoa, quer perante si própria, quer perante outras
pessoas;
- A violação de uma norma moral pode ter como sanção o peso na consciência ou
os remorsos

Ordem religiosa:
- É uma ordem transcendente, uma vez que é constituída por regras que definem
as relações entre o homem e a divindade, fixando os deveres do crente para
com Deus;
- A violação desta ordem pode implicar sanções divinas (ideia de céu e inferno);

Ordem do trato social:


- Ordem que resulta dos convencionalismos sociais, integrando regras de
cortesia e de boa educação, assim como outras práticas do comportamento
social (o luto por morte de um familiar, as noivas vestirem-se de branco no dia
do casamento…).
- As regras que compõem esta ordem procuram uma convivência harmoniosa
entre os indivíduos, não sendo necessárias para garantir o bom funcionamento
da sociedade.
- Esta ordem pode ter como sanções a exclusão e a reprovação social (ex: se não
cumprir uma regra básica de educação, posso ser julgado e excluído por
indivíduos da sociedade, nomeadamente por parte de pessoas que valorizam
essa regra).
Ordem jurídica (a ordem do Direito)
- É a ordem normativa mais relevante, pelo que regula os aspetos mais
importantes da convivência social (aqueles que são necessários ao bom
funcionamento da sociedade);
- É a única ordem dotada de coercibilidade, (as outras normas também implicam
sanções, mas a ordem jurídica é a única cuja violação determina a aplicação de
sensações que podem ser impostas pela força).
- Para além de normas que estabelecem o que é permitido e o que é obrigatório,
encontramos no Direito normas permissivas —> apesar de tudo o que não é
obrigatório ou permitido ser considerado permitido, estas normas existem para
legitimar a restrição imposta à liberdade de outrem;

Como vemos, a dimensão normativa não se esgotada no Direito (ordem jurídica)


-> a normatividade está também presente na ordem moral, religiosa e de trato
social.

Ordem moral/religiosa/do trato social: espaço da ordem social que é livre de


Direito
Nem todas as relações sociais são reguladas pelo Direito, submetido a um
princípio de subsidiariedade -> deve intervir apenas quando tal se revelar
necessário, quando não for possível regular relações a partir das outras ordens
normativas (“o direito se justifica apenas na medida em que as suas funções não
sejam realizáveis por nenhuma outra ordem”)

Ordem jurídica: espaço da ordem social que o Direito regula (apesar de existir o
princípio de subsidiariedade, este espaço é cada vez maior, pois o Direito tem
vindo a incidir sobre cada vez mais domínios)

“Ubi ius ibi societas; ibi societas ibi us” (“onde há Direito, há sociedade; onde
há sociedade, há Direito”)

O brocado em latim aponta para uma relação intrínseca entre o Direito e a


Sociedade, isto é, para o facto de estas duas realidades não existirem
separadamente, uma sem a outra.
- De forma simples, o Direito pode ser entendido como o conjunto de normas e
de regras que, dotadas de coercibilidade, orientam e regem condutas humanas.
Por sua vez, a sociedade consiste num aglomerado de indivíduos que vivem em
comunidade com a finalidade de alcançarem fins coletivos.
- Na perspetiva de Aristóteles, o homem é um animal político: vive em sociedade,
em permanente relação com outros indivíduos, pois só assim consegue
satisfazer as suas necessidades e desenvolver as suas capacidades. Na
sociedade, onde os indivíduos se relacionam nas várias vertentes, surgem
conflitos. Estes conflitos são inevitáveis e até inerentes à própria sociedade,
pois os indivíduos agem muito pelo interesse próprio, e porque a satisfação de
necessidades é feita através de bens escassos.
- Para resolver os problemas que decorrem da relação entre indivíduos, e assim
garantir um clima de cooperação e de respeito pelos interesses entre membros
da mesma sociedade, é necessário o Direito, um conjunto de regras que
orientem o comportamento dos indivíduos e cuja violação implique sanções que
possam ser impostas com recurso à força.
- Assim, vemos que os brocados latinos são verdadeiros: onde há sociedade, há
Direito (pois a organização e o bom funcionamento da sociedade é impossível
sem regras que limitem o comportamento das pessoas e cuja violação implique
sanções efetivas) e, onde há Direito, há sociedade (o Direito pressupõe a
existência de uma sociedade, na medida em que tem como destinatários os
seres humanos e regula grande parte das relações que se estabelecem dentro
desta).

Características do Direito:
O Direito é
… uma realidade humana (o direito regula somente condutas humanas, pois os
destinatários das normas jurídicas são apenas os seres humanos);
… uma realidade social (há uma relação estreita entre Direito e sociedade - o
direito é inerente à vida em sociedade - e a evolução social provoca
transformações jurídicas)
… uma realidade cultural (o direito pode ser visto como um sistema de valores e
de convicções que pode ser apreendido e transmitido às gerações seguintes)

Funções do Direito

-> Função constitutiva: o Direito constitui uma realidade, uma realidade que sem
ele não existe; os conceitos jurídicos não se referem a coisas do mundo, pois a
sua existência é fruto do Direito: o crime é uma realidade construída pelas leis
penais, e sem determinadas leis não haveria o contrato de compra e venda;
-> Função política: o Direito organiza o poder político, impondo limites ao seu
exercício (forma de impedir totalitarismos).
-> Função pacificadora: o Direito disciplina situações de violência, procura
resolver os conflitos inerentes à convivência entre os membros da sociedade e
estabelece sanções em caso de violação das suas regras (sanções que podem ser
impostas com o uso da força).
-> Função social: o Direito regula as relações que se estabelecem entre os
indivíduos (neste plano, define o que é proibido e obrigatório, e, portanto, o que é
permitido), e entre os indivíduos e a sociedade (estabelece as obrigações do
Estado para com os indivíduos, e, inversamente, os deveres que os indivíduos têm
para com o Estado).
___
DIREITO VS MORAL (o que distingue a ordem jurídica da ordem moral?)

A principal diferença:
- “para o Direito, nada há de relevante antes de ser exteriorizada uma intenção” (a
intenção de ter uma comportamento antijurídico, enquanto não for exteriorizada,
não é juridicamente relevante -> ex: a intenção de matar alguém só é relevante
para o Direito se, efetivamente, levar um indivíduo a cometer o ato de matar)
- por oposição, “para a moral, a intenção do agente é sempre relevante” (ex: a
moral reprova sempre a intenção de matar, ainda que esta não leve ao ato
propriamente dito).
PARA ALÉM DO CRITÉRIO DA EXTERIORIDADE (acima referido), temos: critério do
mínimo ético, critério teleológico, critério da autonomia…

Relações entre ordem jurídica e ordem moral são de coincidência e não


coincidência

Relações de coincidência: incorporação de normas morais no direito (o Direito


Constitucional proíbe a pena de morte, o Direito Penal condena vários
comportamentos imorais, sendo o homicídio um crime, assim como o furto a
difamação…); Vários princípios e conceitos jurídicos têm uma base moral;
Relações de não coincidência: existem normas jurídicas que são irrelevantes para
a moral (ex: para a ordem moral são indiferentes normas sobre o transito
automóvel e normas que regulam o funcionamento da Assembleia da República);
há normas jurídicas que contrariam regras morais (ex: as regras morais que
proíbem a interrupção voluntária da gravidez e a eutanásia são contrariadas por
vários ordenamentos jurídicos).

DIREITO E JUSTIÇA

O Direito tem como fim a justiça, sendo esta o valor primário do ordenamento
jurídico. Para além do valor da justiça, o direito salvaguarda valores como a
segurança e a confiança
Modalidades da justiça:
Justiça distributiva
Justiça comutativa
Justiça legal

Caracterização da ordem jurídica

- Os planos da ordem jurídica:


-> ordem jurídica internacional (Direito com vigência supra-estadual)
Ex: direito que regula a União Europeia
-> ordem jurídica interna (ordem jurídica que se constrói debaixo de um Estado)

- As características fundamentais:

Imperatividade (“dever ser”):


-> Enquanto ordem normativa, a ordem jurídica impõe normas/regras/comandos
de conduta a serem seguidos pelos indivíduos da sociedade;
-> A imperatividade das normas jurídicas não implica que estas não possam ser
violadas (imperatividade não equivale a inviolabilidade: apesar da norma jurídica
exprimir um “dever ser”, o sujeito tem a liberdade de a cumprir ou não);
-> o facto de dizermos que a ordem jurídica é imperativa, não significa que todas
as suas normas o sejam (há várias normas que postulam liberdade para a decisão
do comportamento - normas permissivas -, em vez da imposição de um dado
comportamento);
Coação e coercibilidade

Uma das consequências da violação de uma regra jurídica é a prescrição de uma


sanção (a quem a violar).
Não basta a prescrição de uma sanção -> é necessário que a sanção seja
efetivamente aplicada ao infrator, é necessária que aquele a quem foi prescrita
uma sanção a cumpra!
COAÇÃO DIFERENTE DE COERCIBILIDADE
Coercibilidade: suscetibilidade de impor uma sanção por meio da força
(susceptibilidade de um aparelho organizado usar a força para impor uma sanção
jurídica àquele que violou uma norma jurídica)
Coação: efetivo uso da força para impor a sanção

A ordem jurídica é imperativa, pelo que, quando o “dever ser” de uma norma
jurídica não for observado, existem consequências:

- Atribuição de um desvalor ao ato jurídico -> ilicitude


-> ilegalidade
- Aplicação de uma sanção ao indivíduo que violou o direito (independentemente
da atribuição de um desvalor ao ato jurídico, comina-se uma sanção a quem
violou um “dever ser”; com a prescrição de uma sanção, a ordem visa atingir o
indivíduo que desrespeitou a norma jurídica e não apenas o ato em si)

DESVALORES DE ATOS

- Ilicitude: desconformidade de uma conduta com uma regra jurídica quando o


agente atua de forma voluntária
—> o desvalor reside na conduta do indivíduo, que viola claramente um “dever
ser”.
A ilicitude, um dos elementos da responsabilidade jurídica, tem várias dimensões,
consoante a natureza da norma jurídica que foi violada. Assim, podemos falar em:
-> Ilícito penal (é praticada uma conduta que viola uma norma do Direito penal;
ilícito penal conduz à responsabilidade penal)
-> Ilícito civil (é praticada uma conduta que viola uma norma do Direito civil;
ilícito civil conduz à responsabilidade civil)

- Ilegalidade
3 modalidades de ilegalidade:

— Inexistência jurídica -> a inexistência jurídica verifica-se quando o vício que


afeta o ato é considerado pelo direito tão grave que para este “nada
há” (juridicamente, considera-se que o ato nunca ocorreu)
Exemplos: o Direito considera que o ato normativo em que falte a promulgação
ou assinatura do PR é inexistente
A INEXISTÊNCIA É A FORMA DE ILEGALIDADE MAIS GRAVE

— Invalidade jurídica: dentro da invalidade, que leva o ato a não produzir efeitos
jurídicos, temos a nulidade e a anulabilidade.
NULIDADE-> a forma mais grave de invalidade
- Há uma destruição de todos os efeitos do ato desde o seu início - o ato é nulo
desde a altura em que é praticado, pelo que se considera que nunca chegou
sequer a produzir efeitos;
- A nulidade pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal, e pode-o ser a todo
o tempo - não há um prazo para invocar a nulidade.
ANULABILIDADE -> forma menos grave de invalidade
- Só são destruídos os efeitos do ato desde que a anulabilidade é requerida
(assim, o ato começa inicialmente por produzir efeitos);
- A anulação de um ato está dependente do pedido das pessoas com especial
interesse na anulação (o tribunal não pode declarar oficiosamente), que a
podem requerer num prazo definido pela lei;
-
- Ineficácia jurídica -> o ato existe e é valido, mas não é capaz produzir efeitos
jurídicos perante certas pessoas (inoponibilidade de um ato, existente e válido,
a certas pessoas).

SANÇÕES

- Enquanto o desvalor jurídico incide sobre condutas (ilicitude) ou sobre atos


jurídicos (ilegalidade), a sanção atinge aquele que violou o direito, um “dever
ser”. Desvalores jurídicos e sanções são “coisas” diferentes -> contudo, a
atribuição de um desvalor ao ato jurídico pode ser conjugada com a cominação
de uma sanção.
- Podemos definir sanção como “a consequência desfavorável da ordem jurídica
ao incumprimento de uma norma jurídica” (consequência desfavorável que recai
sobre aquele que viola o Direito).
- Contudo, certos autores defendem que a sanção pode também consistir na
atribuição de uma recompensa, de um prémio, aos indivíduos que cumprem
determinada regra jurídica (ex: prémios fiscais) -> o entendimento de sanção
como consequência desfavorável é o mais aceite pela Doutrina!!!

As modalidades de sanção:

SANÇÃO PUNITIVA é a sanção que consiste na imposição de uma pena, que pode
ser equiparada a um “castigo”, ao indivíduo que violou uma regra jurídica.

Existem penas:
criminais -> pena de prisão, pena de multa…
civis -> ver art. 1649.º cc
disciplinares -> suspensão, demissão de um cargo…// Ex: um funcionário de
uma escola tem um comportamento inadequado para com os alunos e a direção
da escola aplica-lhe uma sanção
contra-ordenacionais -> coima, interdição do exercício de uma atividade..

SANÇÃO PREVENTIVA é a sanção que visa ser um obstáculo à violação de uma


regra jurídica (por outras palavras, através desta sanção, pretende-se afastar uma
possível violação do Direito);
Exemplos:
Art. 781.º do CC
Art. 40.º CP -> para além de ser uma sanção punitiva, uma pena tem uma
finalidade preventiva (pode “desincentivar” a violação de uma norma jurídica).

SANÇÃO RECONSTITUTIVA é a sanção que visa a reconstituição da situação que


existiria se a norma jurídica não tivesse sido violada (por outras palavras, é a
sanção que visa a construção de uma realidade idêntica à que haveria se tivesse
havido a observância da norma jurídica)

Dentro das sanções reconstitutivas:


-> Reconstituição natural - artigo 562.º do CC
A parte o telemóvel a B; reconstituição natural: A entrega a B, sujeito a quem
provocou um dano patrimonial, um telemóvel idêntico ao que partiu.
C está a conduzir e colide com o muro da propriedade de D; reconstituição
natural: C manda alguém reparar o muro da propriedade que foi destruído.

-> Execução específica


- Entrega judicial da coisa (art. 827.º) -> ex: A, devedor, tem a obrigação de
entregar um documento a B, credor. A obrigação não é cumprida, pelo que A
recorre ao tribunal -> depois de aberto um processo, a mando do tribunal, o
documento é retirado a A e entregue a B.
- Prestação de facto fungível (arts. 828.º e 829.º CC)
- Prestação facto positivo - art. 828.º -> A, devedor, tem a obrigação de
pintar a fachada da casa de B, credor, mas não a cumpre. B pode pedir ao
tribunal que um terceiro, o sujeito C, pinte a fachada de casa às custas de
A. NUM BEM INFUNGÍVEL TAL JÁ NÃO OCORRERIA
- Prestação de facto negativo -> O sujeito A tinha a obrigação de não construir
na propriedade do vizinho B. Contudo, certo dia, quando B viaja para fora do
país durante uns meses, A constrói uma piscina na sua propriedade. B pode
pedir ao tribunal a demolição da piscina que A construiu na sua propriedade.

SANÇÃO COMPENSATÓRIA visa - não a reconstituição da situação (tal é


impossível), mas, ao invés, destina-se a colocar o lesado numa situação
sucedânea à que existiria se não tivesse ocorrido a violação da regra jurídica.
ART. 566.º CC

Sanção reconstitutiva tem primazia sobre sanção compensatória -> só optamos


pela compensação do dano causado quando a reconstituição da situação não é
possível (ex: morte de uma pessoa ou destruição de um bem que é uma edição
limitada), não repara integralmente os danos causados ou é demasiado onerosa
para aquele que provocou o dano.

Há indemnização em dinheiro, uma sanção compensatória, tanto para reparar


danos patrimoniais (divididos em danos emergentes e lucros cessantes) como não
patrimoniais.
DANOS EMERGENTES e LUCROS CESSANTES (art. 564.º/1)
Exemplo:
A está a conduzir e colide com o uber X, provocando elevados danos materiais no
veículo do uber. Na impossibilidade de reconstituir a situação (a reconstituição
não cobre todos os danos ou é excessivamente onerosa para A), opta-se por uma
sanção compensatória. A indemnização, que funciona como uma compensação
dos danos que foram causados (não se coloca o lesado na situação igual à que
existiria se não tivesse havido a violação, mas numa situação sucedânea), engloba
não só danos emergentes, como os lucros cessantes, conforme estabelecido no
artigo 564.º.
Os danos emergentes são os “prejuízos causados” e, no caso apresentado,
correspondem aos elevados danos materiais no veículo. Os lucros cessantes são
“os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão” (o
motorista do uber necessita do seu carro para exercer a sua atividade; o carro
ficou inutilizável pelos danos materiais que lhe foram causados, pelo que a
indemnização tem de considerar os ganhos que A teria enquanto o carro está
inutilizável).

SANÇÃO COMPULSÓRIA é a sanção que tem como objetivo levar o infrator a


adotar, depois de a infração já ter sido cometida, a conduta devida (para que a
violação da norma não se prolongue por mais tempo!!!)

Ex: sanção pecuniária compulsória - art. 829.º


Acordei com X que fazia o pagamento de uma prestação até ao dia 30 de
novembro; não cumpri com aquilo que acordei, pois é dia 1 e ainda não paguei a
prestação; X recorre ao tribunal e este impõe-me o pagamento de uma quantia
pecuniária por cada dia de atraso no pagamento da obrigação -> sanção
pecuniária compulsória (a sanção tem como objetivo fazer-me adotar o
comportamento devido - pagar a obrigação - e dura até que eu adote esse
comportamento - quando pagar a prestação, deixo de pagar uma quantia
pecuniária diária)

30-10-2020

A tutela pode ser entendida como “o conjunto de mecanismos que visam


assegurar o cumprimento ou a realização do Direito”.

MEIOS DE TUTELA JURÍDICA: meios de autotutela ou meios de heterotutela


Autotutela: realização do Direito pelo próprio indivíduo (ideia de “justiça pelas
próprias mãos”; o indivíduo não recorre a um orgão imparcial e independente
para assegurar a realização do Direito)
Heterotutela: tutela realizada pela ordem jurídica -> resolução de conflitos de
interesses através de orgãos imparciais e independentes - os tribunais; aquele
cujo Direito está ameaçado deve recorrer aos tribunais para a tutela do seu
direito, não podendo realizar, pela sua própria força, a tutela desse próprio
Direito.

“A ninguém é lícito o recurso à força com o fim de realizar ou assegurar o próprio


direito” (art. 1º do Código do Processo Civil)
-> No artigo 1.º do CPC vemos o princípio da prevalência da heterotutela
sobre a autotutela
A heterotutela é a regra na ordem jurídica portuguesa, tendo a autotela uma
carácter residual e subsidiário perante a heterotutela!

Em certos casos porém, ainda que com carácter residual e extremamente


limitado, continuam a ser admitidas formas de tutela, isto é, formas de defesa do
Direito e das situações jurídicas individuais pelos próprios sujeitos.

A autotutela encontra algumas manifestações na ordem jurídica portuguesa.


Os casos em que a autotela é permitida são: ação direta, legítima defesa, estado
de necessidade e direito de resistência.

- Ação direta (art. 336.º)

O art. 336.º refere-se à ação direta, que torna lícito o recurso à força própria com
o fim de realizar ou assegurar um direito próprio. No entanto, para falarmos em
“ação direta”, é necessária a verificação de três requisitos:
-> Agressão já consumada
-> Impossibilidade de recorrer em tempo útil aos meios coercivos normais
-> Tem de estar em causa a deterioração ou a inutilização do objeto do direito
(aquele que reage em ação direta tem de atuar num cenário em que se arrisca a
que o seu direito fique “esvaziado”, pois o objeto desse direito foi destruído ou
deteriorado);
—> Proporcionalidade da ação do agente perante as consequências da sua
atuação: os direitos a acautelar pela ação direta têm de ter um valor superior às
situações jurídicas sacrificadas pelo exercício da ação direta (o sacrifício imposto
pela ação direta tem de ser manifestamente inferior aos direitos que se visam
acautelar pela ação direta);

- Legitima defesa (art. 337.º)

“Considera-se justificado o ato destinado a afastar qualquer agressão atual e


contrária à lei contra a pessoa ou património do agente ou de terceiro, desde que
seja possível fazê-lo pelos meios normais e o prejuízo causado pelo ato não seja
manifestamente superior ao que pode resultar da agressão”.

REQUISITOS:
-> A existência de uma agressão atual (por atual entende-se a agressão que
esteja em curso ou a agressão eminente, prestes a ocorre) e ilícita

Assim, a agressão daquele que age em legítima defesa ou ação direta, por
exemplo, não é passível de legítima defesa (não posso agir em legítima defesa
contra uma pessoa que já age em legítima defesa, pois aqui a agressão é lícita)

A agressão tem de ser uma conduta humana -> grande parte da Doutrina afirma
que a agressão de um animal exclui a possibilidade de legítima defesa // aplica-
se aos animas o regime das “coisas”
A MENOS QUE o animal seja um instrumento da atuação humana (O sujeito A
ordena ao seu cão para atacar B; é o cão que vai atacar B, pondo em causa a sua
pessoa e o património, mas a agressão tem origem numa ordem humana, pelo
que B pode agir em legítima defesa)
-> Há uma impossibilidade de recurso aos meios de tutela da ordem jurídica para
evitar a consumação da agressão (Y está a ser atacado por X numa rua deserta;
não tem o telemóvel para contactar as autoridades e não consegue pedir auxílio a
ninguém)
OU HAVENDO A POSSIBILIDADE DE RECORRER AOS MEIOS DE HETEROTUTELA, tal
aumenta substancialmente o perigo da lesão, isto é, o recurso aos meios de
heterotutela causaria grandes sacrifícios ao ofendido-> X aponta uma arma à
cabeça de Y; Y tem o telemóvel e pode contactar as autoridades, mas se o fizer, o
mais provável é que X dispare contra si, pelo que “mais vale” agir em legítima
defesa

-> Proporcionalidade: tem que haver proporcionalidade entre a ação em legítima


defesa e a agressão em curso ou eminente - ex: X repara que Y lhe está a a tirar a
carteira do bolso do casaco; X não pode espancar brutalmente Y (tal não é
necessário para fazer parar o furto e os prejuízos do espancamento, que pode
inclusivamente pôr em causa a vida, são muito superiores aos prejuízos do furto
da carteira).

Legítima defesa putativa -> erro sobre os pressupostos/requisitos (art. 338.º do


CC)
Grande parte da Doutrina (EXCEÇÃO: Menezes Cordeiro) considera que o erro
sobre os pressupostos determina que o ato é ilícito (sempre que há erro sobre os
pressupostos da legítima defesa , o ato reveste-se de ilicitude)

A legítima defesa putativa - erro sobre os pressupostos da LD - é ilícita, mas


pode ser desculpável e, se for desculpável (a desculpabilidade do erro afere-se
pelo artigo 487.º/2), não há dever de indemnização!!!

Considera-se que a ação em legítima defesa é excessiva, quando excede o


necessário para fazer parar a agressão e provoca prejuízos muito superiores aos
que queriam provocados pelo agente que praticou a agressão

Não se verifica o requisito da proporcionalidade -> há excesso de legítima defesa


e a reação do defendente torna-se ilícita

O excesso de legítima defesa pode ou não ser justificada - se o excesso de


legítima defesa for devido a perturbação ou medo não culposo (como determinar
se a perturbação/medo é culposo? Art. 487.º/2), o ato é desculpável (a
desculpabilidade não exclui a ilicitude, mas exclui a culpa)

- Estado de necessidade (art. 339.º)

Os requisitos:
-> Existência de um perigo de dano iminente ou em curso
NÃO HÁ UMA AGRESSÃO (como há na legítima defesa), MAS SIM UM PERIGO DE
DANO (o estado de necessidade visa evitar a consumação ou o aumento de um
dano).
-> Destruição ou danificação de coisa alheia com o fim de remover o dano
Ex: num dia muito quente de verão, um homem vê um bebé a chorar dentro de
um carro, carro que está ao sol e que tem as janelas todas fechadas; o homem
parte o vidro do carro e retira de lá o bebé para o proteger de um perigo (morte
por insolação).
-> Proporcionalidade: ato praticado em estado de necessidade só é justificado
quando possa remover um dano manifestamente superior àquele que vai ser
causado pelo agente que atua com base nele ——> no exemplo anterior, há
proporcionalidade pois o dano que o agente causa (partiu o vidro de uma janela
do carro) não é manifestamente superior ao eventual dano que o agente visa
remover (a morte do bebé).

Se o dano/perigo que desencadeou a intervenção do agente tiver sido da culpa


exclusiva deste -> o agente fica obrigado a indemnizar o lesado
Ex: o indivíduo adormeceu poucos minutos depois de colocar sopa a ferver ao
lume; o facto de ter deixado a sopa ao lume sem vigilância levou a incêndio;
horas depois, o indivíduo acorda e percebe que tem parte da casa a arder, tendo
como única saída possível a porta do vizinho ——> é justificável que destrua a
porta do vizinho para afastar os eventuais danos do incidência (há estado de
necessidade) mas como o incêndio foi causado pela sua ação negligente, o
indivíduo fica obrigado ao pagamento de uma indemnização;

As Fontes de Direito

Fonte de Direito como o “modo de formação e de revelação de regras jurídicas”.


Qualquer ordem jurídica tem o seu sistema próprio de fontes de Direito.
Há uma distinção entre:
sistemas de fontes tradicionais
sistemas de fontes modernas.

Sistemas de fontes tradicionais:


- Ordens jurídicas que assentam o seu sistema de fontes na sua própria tradição
(de matriz religiosa ou filosófica)
Exemplos: Direito muçulmano, direito hindu e direito hebraico;

Sistemas de fontes modernos:


- Há uma divisão: sistema comunista e sistema ocidental, mas que atualmente é
pouco importante, pois o comunismo tem hoje pouca expressão.

Hoje temos fundamentalmente o sistema ocidental, sistema em que há uma


grande divisão:

Sistema de fontes anglo-americano (Common Law)

- Neste sistema, há a primazia da jurisprudência como fonte de direito, pois


neste sistema a regra do precedente assume um papel determinante.
Regra do precedente:
A decisão judicial que, de forma pioneira, decide o direito de um caso concreto,
definindo justamente esse direito, ganha o valor de precedente -> a decisão
judicial passa a figurar como norma jurídica, vinculando outros tribunais e os
restantes membros da comunidade.
“O precedente fixado pelos tribunais superiores na decisão de casos concretos é
vinculativo para os tribunais inferiores quando estes apreciem casos análogos”,
isto é, os tribunais estão vinculados ao precedente, pelo que casos idênticos ou
extremamente parecidos, são tratados da mesma forma.
- As leis existem, mas estão abaixo da jurisprudência e da regra do precedente.
Há uma menor preocupação com a sistematização do direito e com o carácter
abstrato e geral das normas jurídicas.

Sistema romano-germânico

- Sistema que tem por base o Direito Romano, o pensamento político-filosófico


grego e o pensamento cristão.
- Neste sistema, a lei é a principal fonte do direito. Embora possam também ser
fontes de direito, o costume e a jurisprudência têm um papel secundário.
A supremacia da lei:
- A supremacia da lei dá a cada tribunal a autonomia para fazer ele próprio a
interpretação do direito, sem estar “preso” a um precedente, a uma decisão que
já foi tomada por um tribunal superior; em países com este sistema, em que a
lei é o principal e não vigora a regra do precedente, uma decisão judicial não
tem eficácia para além da resolução de um caso concreto.

Sentença é a expressão usual para a decisão judicial tomada por um tribunal de


primeira instância.
—> em regra, as decisões são suscetíveis de recurso. O recurso possibilita que
um tribunal superior, independente do tribunal outro, se pronuncie sobre a
decisão que consta na sentença.
Organização administrativa:
Tribunais administrativos/fiscais
Tribunais centrais administrativos
Supremo tribunal administrativo
Organização civil:
- Tribunais de primeira instância
- Tribunais de segunda instancia/da relação (existem em Évora, Lisboa,
Coimbra, Porto e Guimarães)
- Supremo tribunal de justiça

Um tribunal de primeira instância não tem de decidir da mesma forma um caso


idêntico ou parecido a um caso que já foi julgado pelo Supremo Tribunal de
Justiça.

- A lei, a fonte primordial no sistema romano-germânico, tem uma grande


dimensão: lei constitucional; lei em sentido formal; lei em sentido material
- Nos países onde vigora o sistema romano-germânico, verifica-se uma grande
distinção entre Direito Público e Direito Privado e uma crescente codificação
(técnica metodológica que permite a síntese de normas em corpos unitários e
sistematizados de regras que funcionam para cada ramo do Direito)

Uma divisão tradicional de fontes de Direito:


Fontes imediatas
São fontes por si próprias, pelo que não necessitam de nenhuma outra fonte que
as qualifique como tal —-> têm juridicidade própria! LEIS E NORMAS
CORPORATIVAS
Fontes mediatas
Não são fontes por si próprias, pelo que necessitam que uma fonte imediata que
as qualifique como tal —-> não têm juridicidade própria (retiram a sua
juridicidade de uma fonte imediata)

Não há uma relação hierárquica entre estas fontes -> por terem juricidade
própria, as fontes de direito imediatas não são superiores às mediatas.

08-11-2020

Distinção entre fontes internas e fontes


internacionais/externas assenta na origem das
fontes:
Em determinado ordenamento jurídico, as fontes
internas são as fontes que têm origem nesse
mesmo ordenamento. Por oposição, as fontes
externas (de determinado ordenamento jurídico)
são as fontes que provêm de outra ordem
jurídica e que, por meio de regras de receção,
incorporam esse ordenamento jurídico

Fontes de Direito
Fontes INTERNAS vs fontes INTERNACIONAIS

Dentro das fontes internas, o Prof. Oliveira Ascensão faz uma grande distinção
entre fontes intencionais e fontes não intencionais.
Fontes intencionais - formas voluntárias de criação de direito; a LEI é a principal
fonte voluntária (lei resulta de um processo voluntário e previamente definido).
VS
Fontes não intencionais - formas espontâneas, não organizadas, de criação do
direito (o direito vai-se criando a partir dos hábitos e das tradições dos povos,
não sendo resultado de um processo organizado e definido); dentro das fontes
não intencionais, temos o costume.

Podemos definir “lei” como um “enunciado linguístico cujo conteúdo seja


composto por uma ou mais normas jurídicas”

O termo “enunciado linguistico” abrange tanto as situações em que a lei tem uma
proveniência oral (atualmente, as situações em que a lei tem proveniência oral
praticamente não existem; era algo típico das sociedades medievais e muito
pouco desenvolvidas) tanto as situações em que a lei tem uma configuração
escrita.

Atualmente, a lei é, no seu enunciado linguístico, escrita.


Há uma distinção entre lei em sentido formal e em sentido material.

Lei em sentido formal


“Lei como o produto da atividade de um orgão com competência legislativa”

Para falarmos de lei em sentido formal, temos de ter em atenção três aspetos
importantes:

- A lei é um instrumento escrito que provém de um órgão que exerce, segundo a


Constituição, função legislativa.
- A competência legislativa é realizada através do processo constitucional
regulado para o efeito.
- A lei tem como conteúdo uma ou mais regras jurídicas;
ASSIM, PARA QUALIFICAR UMA LEI COMO LEI EM SENTIDO FORMAL TEMOS DE
OLHAR NÃO APENAS PARA O CONTEÚDO DA LEI, MAS TAMBÉM PARA O ORGÃO
QUE A EMANA!

Atualmente, em Portugal, temos vários instrumentos que representam o exercício


da função legislativa: - exercício da função legislativa do Estado português (cabe
à Assembleia da República e ao governo) - exercício da função legislativa das
assembleias legislativas regionais

Artigo 112.º da CRP: Atos normativos (atos provenientes do exercício da função


legislativa do Estado - lei em sentido formal)

- Lei: ato legislativo da autoria da Assembleia da República (o Parlamento


português).
ART. 161.º alínea c) e ART. 166.º nº3

- Decreto-lei: diploma legislativo da autoria do Governo (expressão do exercício


da função legislativa do Governo, constitucionalmente definida)
- Ver na CRP art. 198.º nº1
- Decreto legislativo regional: ato proveniente do exercício da função legislativa
das Regiões Autónomas (assembleias legislativas regionais)
Ver na CRP art. 227.º nº1

A lei e o decreto-lei têm o mesmo valor hierárquico: em matérias que a


Constituição permita que quer a AR, quer o governo legislem, tanto um como o
outro orgão podem-no fazer —> assim, um decreto-lei pode revogar uma lei da
AR (e vice-versa).

Em termos hierárquicos, o decreto legislativo regional está abaixo da lei e do


decreto-lei, a não ser nos casos em que a Constituição concede às regiões
autónomas competência legislativa exclusiva em determinadas matérias.

Leis da Assembleia da República


- Lei constitucional
A Lei constitucional/Constituição, é aprovada nos termos de um processo de
aprovação ou revisão constitucional, e tem um valor hierarquicamente superior.
De facto, a Constituição exprime a competência legislativa suprema do Estado,
colocando-se no topo da hierarquia de fontes.
- Leis ordinárias (resultam do exercício da função legislativa corrente);
- Leis de valor reforçado
- Leis orgânicas;

Lei em sentido material

Atendemos ao conteúdo normativo e não ao exercício de uma competência


legislativa ——> contrariamente ao que acontece para dizermos que uma lei é lei
em sentido formal, não é necessário que a lei provenha de um orgão que tenha
função legislativa para ser uma lei em sentido formal

Em Portugal há varias entidades, de cariz administrativo ou não, que têm


competência para criar normas e, portanto, leis em sentido material.

LEI EM SENTIDO FORMAL


ATOS REGULAMENTARES - provenientes do governo
- não provenientes do governo
Atos regulamentares do governo:
- Decretos regulamentares
- Resoluções genéricas de conselho de ministros
- Portarias
- Despachos normativos

IMPORTANTE: ao contrário do que sucede com o decreto-lei, que provém do


exercício da função legislativa do Estado, os regulamentos do Governo exprimem
o exercício da função executiva/administrativa do Estado.

A escolha do regulamento utilizado na regulação de dada matéria cabe ao


Governo, sendo que cada um dos regulamentos tem regras próprias e uma força
hierárquica diferente.

- A previsão do decreto regulamentar na Constituição (ao contrário do que


acontece com os outros atos regulamentares do governo) e a necessidade de
este ser promulgado pelo Presidente da República conferem-lhe um valor
hierárquico superior —> decreto regulamentar está no topo da hierarquia dos
atos regulamentares do governo!

- As portarias são normalmente utilizadas pelo governo para o desenvolvimento


de aspetos de concretização e execução de diplomas que contêm regimes
jurídicos que carecem de medidas concretas para serem implementados (isto é,
a portaria está normalmente associada a uma lei ou decreto-lei que necessita
de um maior desenvolvimento para poder ser aplicado aos cidadãos)
Muitas vezes, no próprio diploma há uma referência para a portaria, que cria as
condições para aplicar o diploma.

A portaria provêm normalmente da competência de um ministro ou de dois ou


mais ministérios, pelo que mais do que ser um instrumento do governo, é um
instrumento de um ministro ou de alguns ministérios —> a portaria está abaixo
da resolução genérica de conselho de ministros, uma vez que a resolução resulta
da decisão de todo o governo e não de um grupo limitado de pessoas dentro
deste.
O despacho normativo é um texto proveniente de um ou mais ministros, que
enuncia um conteúdo relativamente reduzido de normas jurídicas que visam
implementar a aplicação de um outro diploma legislativo!
É usado em matérias em que não é necessário um grande formalismo jurídico e,
relativamente às demais formas de exercício do poder regulamentar do governo,
tem o valor hierárquico inferior.

Atos regulamentares - Não tem carácter inovador; têm carácter concretizado,


visando a concretização de leis e de decretos-lei.

Atos normativos não provenientes do governo:

A maior parte do Direito que nos rege tem a sua origem no exercício da função
legislativa ou regulamentar do Estado (atos legislativos, e atos regulamentares do
governo, respetivamente). Contudo, isso não significa que não existam outras
entidades, públicas ou até não públicas, com competência normativa!

Apesar de serem entidades públicas, as autarquias locais não são Estado, e dentro
do poder local temos as câmaras municipais e as juntas de freguesia.
- Regulamentos de administração autónoma
Os municípios, cujo orgão executivo é a câmara municipal, têm competência
normativa para aprovar posturas e regulamentos municipais. Assim, podemos
encontrar em diferentes municípios do país diferentes regulamentos, dirigidos às
pessoas que vivem no município.
As juntas de freguesia têm também competência normativa, aprovando as
posturas e os regulamentos das juntas de freguesia.

Para além das autarquias locais, existem outras entidades com competência
regulamentar.
-> Regulamentos da administração indireta, produzidos por… (exemplos)
- Banco de Portugal
- Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões
-> Decretos regulamentares regionais
-> Estatutos (regulamentos produzidos por pessoas coletivas de direito público,
que visam definir o seu funcionamento e a sua organização interna - Estatuto da
Universidade de Lisboa, por ex)
-> Regimentos (Regimento da Assembleia da República, por ex)
Para além da lei em sentido formal e da lei em sentido material…
Atos normativos atípicos (atípicos pois não são tidos como “lei”, porque não
provêm nem do exercício da função legislativa do Estado, nem do exercício da
função regulamentar do mesmo)
- Decretos do Presidente da República
- Resoluções genéricas da Assembleia da República

Uma lei em sentido formal é normalmente também uma lei em sentido material
-> Uma lei que contém uma ou mais regras jurídicas e que simultaneamente
provém de um orgão com competência legislativa é, simultaneamente, uma lei em
sentido formal (orgão com competência legislativa) e em sentido material.

Contudo: medidas administrativas, individuais e concretas, podem assumir, por


força de disposição constitucional ou legal, a forma de um diploma legislativo (lei
que é formal, mas não material - é usada a forma legal para tomar uma decisão
que é, no seu conteúdo, administrativa e que se dirige a uma ou várias pessoas
determinadas)

Para além da lei (em sentido formal e material), temos nas fontes internas
imediatas as normas corporativas (art. 1º e 2º CC)
IMPORTANTE: normas corporativas subordinam-se à lei, hierarquicamente
superior

Normas corporativas são as “normas ditadas pelos organismos representativos


das diferentes categorias morais, culturais, económicas ou profissionais, no
domínio das suas atribuições, bem como os respetivos estatutos e regulamentos
internos”
Exemplos: regulamentos da Ordem dos Advogados e da Federação Portuguesa de
Futebol (duas organizações corporativas)

Características da lei
—> Normalmente, a lei é abstrata e geral.

Generalidade
Dirige-se a uma pluralidade indeterminada de destinatários, e não a um conjunto
específico de indivíduos (ainda que seja possível configurar o destinatário ou
destinatários principais -> a lei é abstrata mesmo quando se dirige apenas a
pessoas com mais de 65 anos, pois dirige-se a qualquer pessoa que tenha mais
que 65 anos e não a uma pessoa ou um grupo específico):

Abstração:
Dizer que lei é abstrata é dizer que a sua previsão se refere não a uma situação
concreta, mas a uma categoria de situações —> lei vale para uma pluralidade
indeterminada de casos e não para casos específicos!

A generalidade e a abstração da lei visam assegurar a igualdade das pessoas


perante o Estado.

O Prof. José Alberto Vieira defende que a generalidade e a abstração são


características da norma jurídica, e não da lei —> o instrumento legislativo pode
dirigir-se a situações concretas e destinatários determinados sem perder a forma
de lei (simplesmente, nessas situações, o seu conteúdo não será normativo pois
falta a generalidade e a abstração da regra jurídica)

O costume

Dois modos típicos de formação de uma vontade social:


Modo inconsciente e voluntário: modo que assenta na tradição e que corresponde
ao COSTUME
Modo consciente e voluntário: modo que assenta na vontade e que corresponde à
legislação

COSTUME - fonte consuetudinária


2 elementos essenciais para a formação do costume:
- Elemento fáctico: uso (o uso, fonte de direito mediata, consiste numa prática
social reiterada)
Elemento normativo: convicção de obrigatoriedade (convicção de que a prática
social reiterada é obrigatória).

O costume apenas se forma quando à prática que é repetida durante determinado


período numa sociedade se associa uma convicção de obrigatoriedade -> senão
há só um uso!!!
Relação entre costume e lei:
Relação de coincidência - costume coincide com a lei
Relação de complementaridade - costume complementa a lei
Relação de oposição - costume contrário à lei —-> costume contra legem

COSTUME CONTRA LEGEM É DIFERENTE DE DESUSO


- formação de um costume contra legem -> formação de uma regra
consuetudinária contrária à lei; como há criação de uma regra, podemos dizer
que o costume contra legem cria algo de positivo;
- quando há desuso há a mera não aplicação de uma regra legal, sem que se
forme outra regra em alternativa à regra que se deixou de aplicar

Fontes internas imediatas:

USOS: “Os usos são uma fonte mediata do direito, porque os usos que não forem
contrários aos princípios da boa fé são juridicamente atendíeis quando a lei o
determine”
Juricidade é imanente ao costume // Juricidade não é imanente ao uso (pelo que
este só pode ser fonte de direito quando uma fonte imediata lhe atribuir essa
qualidade
___

JURISPRUDÊNCIA - resultado da atividade decisória dos tribunais na resolução dos


casos concretos
Na ordem jurídica portuguesa (e nos países de sistema romano-germânico) —>
jurisprudência não é fonte de direito, uma vez que a decisão de um tribunal
esgota-se na resolução de um caso concreto, isto é, não é vinculativa para a
resolução de outros casos!
Exceção: Acórdãos com força obrigatória geral do TC e do STJ são fonte de
direito
PROCESSO LEGISLATIVO

- Publicação de ato normativo


A publicação é feita no jornal oficial - o Diário da República
A lei (em sentido formal e material) - ver art. 119.º da CRP - só se torna
obrigatória depois de publicada no jornal oficial.
- Disponibilização da lei: a data da publicação do Diário da República pode não
coincidir com a data de disponibilização na Internet!
- Pode haver retificação da lei (a declaração de retificação tem eficácia
retroativa
- Entrada em vigor da lei - noção “vacatio legis” e prazos de vacatio - prazo ad
hoc (fixado pela própria lei) ou prazo supletivo (fixado na Lei formulária)
- Vicissitudes da vigência da lei
Impedimento à vigência
Suspensão da vigência: suspensão temporária; suspensão indefinida
Cessação da vigência: caducidade; revogação; declaração de
inconstitucionalidade!

Dentro da cessação de vigência:

Caducidade - lei destina-se a ter vigência temporária ou desaparecem os


pressupostos da sua aplicação

Revogação - cessação da lei é determinada por outra lei (há uma lei revogada e
uma lei revogatória) - lei revogatória tem de ser de hierarquia igual ou superior à
lei revogada / Lei geral não revoga lei geral!!!

CLASSIFICAÇÕES DENTRO DA “REVOGAÇÃO"


FORMA COMO A REVOGAÇÃO É REALIZADA: revogação expressa ou tácita
EFEITOS DA REVOGAÇÃO: revogação substitutiva ou simples
Revogação tácita é sempre substitutiva -> é a incompatibilidade de um regime
posterior com um regime anterior que provoca a revogação tácita do regime mais
antigo
Revogação expressa pode ser revogação simples ou substitutiva
OBJETO DA REVOGAÇÃO: revogação individualizada (lei ou algumas regras
jurídicas de uma lei) ou global (ramo do direito ou instituto jurídico)
ÂMBITO DA REVOGAÇÃO: revogação total ou parcial

Hierarquia das fontes

1 fonte no topo -> tem valor hierarquicamente superior em relação a outras


1 fonte (ou mais do que uma) na base -> valor hierarquicamente inferior

Uma hierarquia de fontes de direito postula, implicitamente, uma hierarquia de


regras jurídicas, conteúdo das fontes de direito.
A circunstância de uma portaria do governo ser de valor hierárquico a uma lei da
AR não implica que a portaria tenha menor eficácia vinculativa -> há fontes de
diferente hierarquia, mas não há regras mais vinculativas e menos vinculativas

O primado da Constituição na hierarquia de fontes é posto em causa pelo


primado do direito europeu comunitário sobre a Constituição (JAV DEFENDE)

Com exceção do direito europeu, a Constituição aparece acima de todas as fontes


de direito.

HIERARQUIA DE FONTES DE DIREITO (IMEDIATAS) - JAV

Este não é considerado o primeiro patamar uma vez que o 1º é a


organização da separação dos poderes
Direito da União Europeia
Constituição Porque que as leis convencionais estão a cima das ordinárias?

Direito internacional convencional


Leis ordinárias de valor reforçado da AR
Lei, decreto-lei e decreto legislativo regional
Decreto regulamentar
Resolução genérica de conselho de ministros
Portaria
Despacho normativo
Leis em sentido material que não provêm do governo
- posturas municipais e das juntas de freguesia
Leis em sentido material que provêm da administração indireta
- Banco de Portugal, AFS…
Normas corporativas

- O costume não tem um lugar estático na hierarquia de fontes. A questão do


valor hierárquico do costume tem haver com a admissibilidade que este tenha -

Inexistência jurídica - forma mais grave que pode afetar uma fonte de direito cujo
conteúdo que seja contrário a outra fonte de direito de grau superior
Invalidade
-> Nulidade
-> Anulabilidade
Ineficácia em sentido restrito

Quando dizemos que uma norma é inconstitucional estamos a fazer um juízo de


desconformidade -> a norma não pode valer porque está viciada com nulidade

Norma jurídica e regra jurídica como sinónimos


As normas jurídicas são o conteúdo das fontes de direito -> quando falamos em
norma legal estamos com isso a significar uma norma que consta de uma lei;
quando falamos de uma norma consuetudinária referimo-nos a uma norma que
advém do costume;

A prática social subjacente ao costume revela normalmente apenas uma norma


Já uma lei contém normalmente, múltiplas normas jurídicas
-> FONTE DE DIREITO PODE TER UMA ÚNICA NORMA OU MÚLTIPLAS NORMAS (é
portadora de um único significado ou de múltiplos significados normativos)

Interpretação jurídica: operação intelectual de compreensão do sentido que as


fontes revelam -> compreender o significado normativo que a fonte encerra
(retirar norma jurídicas de uma fonte)

NEM TODO O CONTEÚDO DE UMA FONTE DA LEI É NORMATIVO.


Na formulação linguística da lei não encontramos apenas regras jurídicas -
encontramos nela proposições (enunciados linguísticos que não têm a natureza
de norma jurídica - definições legais, presunções, classificações…)
Um artigo do CC/da CRP…
-> pode conter uma ou mais regras jurídicas!
-> pode não conter regras jurídicas ——- pode ter uma mera proposição!
Ex: nº1, art 202.º do CC: não é norma jurídica -> não é uma norma jurídica, mas
uma mera proposição (neste caso uma definição legal)
Art. 203.º CC: não é uma norma jurídica, mas uma proposição (neste caso uma
classificação)

O Professor José Oliveira Ascensão define norma jurídica como o “critério material
de solução de casos concretos”
Norma jurídica existe para regular casos concretos, o que demonstra que o
Direito é mesmo uma Ciência prática

Podemos olhar a norma jurídica de dois prismas


1) Prisma do destinatário
- norma como referencial de conduta: imposição de uma conduta, proibição de
uma conduta (normas imperativas) ou permissão de uma conduta (normas
permissivas)
- norma como referencial de efeitos jurídicos (art. 879.º CC)
- norma como reguladora do conteúdo de situações jurídicas (art. 1305.º CC)
- norma como reguladora do exercício de posições jurídicas (art. 334.º)
2) Prisma do intérprete aplicador
“Norma como critério de decisão do caso”

ELEMENTOS DA NORMA JURÍDICA

Previsão: delimitação do campo de aplicação da norma (cada norma jurídica tem


um campo de aplicação própria, não se aplica a todas as situações juridicamente
relevantes):
Dentro da previsão:
elemento subjetivo -> destinatário ou destinatários da norma
elemento objetivo -> facto ou situação que constitui o pressuposto de
aplicação da norma
É nulo o negócio jurídico cujo objeto sei física ou legalmente impossível, contrário
à lei ou indeterminável // “o negócio jurídico cujo objeto seja física ou legalmente
impossível, contrário à lei ou indeterminável” é a previsão
Estatuição: parte da norma que fixa a consequência jurídica no caso de os factos
descritos na previsão se verificarem;
Estatuição não corresponde à sanção -> há consequências jurídicas que têm a
natureza de sanção e outras que não - há muitos outros efeitos jurídicos para
além da sanção

A previsão e a estatuição de uma mesma norma podem estar em artigos


diferentes

CARACTERÍSTICAS DA NORMA JURÍDICA

Gerais - uma norma é geral, uma vez que é concebida para uma pluralidade de
destinatários não determinados, independentemente de o número de
destinatários ser menor ou maior;

Abstratas - a norma jurídica quando entra em vigor dirige-se a regular situações


e factos que não se verificaram ainda, dirige-se à regulação de um conjunto de
casos ainda não concretizados

Hipotéticas - a norma jurídica é hipotética, uma vez que a aplicação da


estatuição pressupõe a verificação histórica da sua previsão:

NORMAS
Gerais
Especiais
-> a especialidade pode ser subjetiva (destinatários), espacial ou material
Excecionais
-> definem um regime jurídico contrário àquele que consta da regra legal

A classificação de uma norma como geral/especial/excecional supõe a sua relação


com outra norma!

Regras jurídica quanto ao seu comando:

Regras imperativas - “DEVER SER"


- prescritivas (prescrevem determinada conduta)
- proibitivas (proíbem determinada conduta)
Regras dispositivas
- permissivas (conferem um espaço de liberdade ao seu destinatário, que tem a
liberdade de escolher como se comportar; não há “dever ser”; ex: art. 1305.º)
- supletivas (são regras que apenas são aplicadas na falta de regulação da
matéria pelos interessados; partes são forjadas a determinar os seus próprios
comportamentos)

26-11-2020

Regras de remissão
-> Regras que não contêm em si critérios para a resolução de casos concretos -
apontam para outras regras, sendo essas outras regras que têm a função de
resolução de casos concretos
- Art. 499.º e 251.º

Regras de conflito
-> Regras que visam resolver conflitos no espaço ou no tempo; as regras que
resolvem conflitos no espaço/tempo determinam qual a regra que, entre as regras
de vários ordenamentos jurídicos, é competente para regular uma situação
plurilocalizada - DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO

Proposições não normativas:


Definições/noções legais
-> arts. 1439.º, 874.º, 202.º/1 do CC
Classificações legais
-> art. 203.º CC

Presunções legais
-> noção de presunção legal - art. 349.º
Art. 350/1: “Quem tem a seu favor a presunção legal escusa de provar o facto a
que ela conduz” - quem tem a seu favor a presunção legal, tem o ónus da prova,
fica liberto do facto provatório

Presunções ilidíveis (iuris tantum)


-> Presunções que podem ser ilididas mediante a prova do facto legal
Art. 1268.º CC
Presunções não ilidíveis (iures et de iure)
-> Presunções que não admitem prova em contrário, pelo que não é permitido
provar que o facto presumido não é verdadeiro

Ficções legais
O legislador equipara uma realidade a outra realidade para permitir a aplicação a
ambas da regra que regula uma dessas realidades

Sistema é o “conjunto de elementos que constituem um todo organizado e


consistente” -> cada ordem jurídica não é um caos desordenado de fontes e de
regras
Sistema jurídico não é uma realidade caótica - é uma realidade organizada
debaixo de um sistema de fontes hierarquizado

Princípios jurídicos
Princípios formais -> princípio da justiça, princípio da confiança, princípio da
certeza (nestes princípios há uma abstração elevada de conteúdo, o que permite
múltiplas concretizações - nem todos concebem a justiça da mesma forma)
Princípios materiais -> princípio que concretiza um conteúdo (princípio da
retroatividade da lei - art. 12.º CC - é um princípio material, concretiza o
princípio da segurança)

PRINCÍPIO DIFERENTE DE NORMA JURÍDICA

Princípios materiais aparecem também corporizados em regras jurídicas.


Contudo, o seu significado estende-se.
Arts. 227.º, 334.º e 762.º do CC -> todas as regras jurídicas apelam ao princípio
da boa fé - contudo, o princípio tem um significado maior que estas regras
jurídicas!

A regra que tem um princípio está sujeita na sua compreensão ao sentido do


princípio

Sistema jurídico
- Autónomo (o sistema jurídico português é autónomo em relação ao sistema
jurídico alemão ou francês, por exemplo; dentro do sistema jurídico português, os
subsistemas que correspondem aos ramos do direito têm autonomia)
- Aberto (dizemos que o sistema é aberto porque ele é um “sistema
estruturalmente orientado para o seu meio ambiente e não pode substituir sem
meio ambiente”);
- Móveis (o sentido de uma regulação, mesmo quando a sua redação permanece
a mesma, pode variar ao longo do tempo)

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