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Aconselhamento

e Orientação em
Psicologia
PROF. MARCELO VINICIUS MIRANDA BARROS
marceloviniciusmb@gmail.com
Compreensão da queixa
1. A diferença entre a queixa e a demanda
A queixa, em termos gerais, representa o primeiro momento de contato com o profissional, no qual
o usuário do serviço expressa verbalmente e através de sinais não verbais os conteúdos ligados a
um problema. Independentemente de esses conteúdos serem conscientes ou inconscientes, é por
meio da queixa que a pessoa busca a ajuda de um profissional para ser acolhida, ouvida,
compreendida e tratada.
Ao longo do processo terapêutico, ocorre uma transformação da queixa em demanda. Isso se dá à
medida que o paciente deixa de perceber o objeto de sua queixa como algo externo e
independente, passando a vivenciá-lo e comunicá-lo como algo que também faz parte de sua
experiência, implicando em uma compreensão mais profunda dos elementos pessoais
relacionados ao seu sofrimento.
Compreensão da queixa
2. Compreendendo a queixa

A primeira entrevista com o psicólogo/a revela mais sobre as distorções no discurso do cliente do que
sobre o conteúdo em si. Esse conteúdo pode variar de uma sessão para outra e de um psicólogo/a
para outro. Isso ocorre porque a verdade desse discurso se constitui no encontro com o Outro e muitas
vezes envolve uma certa ambiguidade.

O que importa não é apenas o conteúdo da fala apresentada pelo cliente, mas também a maneira
como ele a narra, como ele posiciona a si mesmo em relação ao que está sendo compartilhado.

O papel do psicólogo/a é auxiliar o cliente a explorar as diversas interpretações em torno de um


mesmo acontecimento. O profissional instiga a curiosidade no cliente, incentivando-o a questionar
suas próprias percepções sobre sua história.
Compreensão da queixa
Escuta Ativa: A escuta ativa é a base para a compreensão da queixa. Envolve prestar atenção
total ao que o cliente está dizendo, tanto verbal quanto não verbalmente.

Exemplo: Se um cliente relata “Estou me sentindo muito estressado ultimamente”, preste


atenção ao tom de voz, expressão facial e linguagem corporal para captar nuances emocionais.

Questionamento Exploratório: Faça perguntas abertas para encorajar o cliente a expandir sobre a
queixa e fornecer mais detalhes.

Exemplo: “Você pode me contar mais sobre o que tem causado esse estresse? Existem situações
específicas que você identifica como gatilhos?”
Compreensão da queixa
Contextualização Histórica: Entenda o contexto mais amplo da vida do cliente, incluindo
experiências passadas que possam estar relacionadas à queixa.

Exemplo: Se um cliente menciona dificuldades no trabalho, pergunte sobre a história profissional


dele e se houve episódios similares no passado.

Validação das Emoções: Reconheça e valide as emoções que o cliente está experienciando em
relação à queixa.

Exemplo: “É completamente compreensível que você se sinta assim diante dessa situação. Suas
emoções são legítimas”.
Compreensão da queixa
Exploração de Padrões: Ajude o cliente a identificar padrões de pensamento ou comportamento
que possam estar contribuindo para a queixa.

Exemplo: “Você percebe algum padrão em como reage a situações estressantes? Pode ser útil
entender como isso influencia suas emoções”.

Construção de Significado: Colabore com o cliente para criar significado em torno da queixa,
ajudando-o a encontrar sentido e compreensão.

Exemplo: “À medida que exploramos isso mais a fundo, como você enxerga o significado dessa
experiência em sua vida?”
Compreensão da queixa
Respeito à Autonomia: Lembre-se de que a compreensão da queixa é um processo colaborativo.
Respeite a perspectiva e autonomia do cliente em relação à sua própria experiência.

Exemplo: “Estamos aqui para trabalhar juntos. Sua visão e decisões são fundamentais neste
processo”.

Empatia e Sensibilidade Cultural: É importante considerar a diversidade cultural e a singularidade


do cliente ao interpretar a queixa. O que pode ser uma preocupação para um indivíduo pode ter
significados diferentes em diferentes culturas.
Compreensão da queixa
Feedback Reflexivo: Durante a conversa, reflita de volta para o cliente o que você está
entendendo. Isso valida a experiência do cliente e ajuda a esclarecer possíveis mal-entendidos.

Por exemplo, você pode dizer: “Parece que você está se sentindo muito sobrecarregado com as
expectativas acadêmicas. Estou certo?”.
Compreensão da queixa na
Psicanálise
Exploração da Queixa Consciente: O terapeuta começa examinando a queixa apresentada pelo
cliente. Por exemplo, se o cliente relata sentimentos de tristeza e desânimo, o terapeuta irá
explorar esses sentimentos em detalhes, buscando compreender as situações específicas em
que ocorrem.

Exemplo: Cliente: “Tenho me sentido muito triste ultimamente, sem motivação para fazer nada”.

Terapeuta: “Vamos falar mais sobre quando você percebeu essa tristeza pela primeira vez e se há
situações em que ela é mais intensa”.
Compreensão da queixa na
Psicanálise
Investigação dos Elementos Inconscientes: A psicanálise considera que muitos dos motivos para
o sofrimento estão no nível do inconsciente. Portanto, o terapeuta busca identificar possíveis
conteúdos reprimidos ou não plenamente conscientes que possam estar contribuindo para a
queixa.

Exemplo: Cliente: “Às vezes tenho pesadelos, mas não entendo por que”.

Terapeuta: “Os pesadelos têm algum tema específico? Podem estar relacionados a memórias ou
experiências do passado?”.
Compreensão da queixa na
Psicanálise
Análise das Associações Livres: Durante as sessões, o terapeuta encoraja o cliente a falar
livremente sobre seus pensamentos e sentimentos, sem censura. Isso pode levar a insights
valiosos sobre os significados subjacentes à queixa.

Exemplo: Cliente: “Lembro-me de um sonho que tive com meu pai, e isso me deixou muito
desconfortável”.

Terapeuta: “Vamos explorar mais esse sonho. O que você associa ao seu pai?”.
Compreensão da queixa na
Psicanálise
Consideração da Transferência: A dinâmica entre o cliente e o terapeuta, conhecida como
transferência, é fundamental na psicanálise. O modo como o cliente se relaciona com o terapeuta
muitas vezes reflete padrões de relacionamento de sua vida.

Exemplo: Cliente: “Às vezes sinto que você é como um pai para mim, e isso me faz sentir seguro”.

Terapeuta: “Vamos falar sobre essa sensação de segurança e como ela se relaciona com outras
relações em sua vida”.
Compreensão da queixa na
Psicanálise
Integração da Compreensão: Conforme a terapia avança, o terapeuta busca integrar a
compreensão da queixa em uma visão mais ampla da dinâmica psicológica do cliente. Isso
envolve considerar não apenas a queixa em si, mas também os fatores que a influenciam.

Exemplo: Terapeuta: “À medida que exploramos sua tristeza, parece que ela está ligada a
experiências de perda na infância. Podemos investigar mais isso?”.
Compreensão da queixa na Psicologia
Existencial Humanista e Fenomenológica
Ênfase na Experiência Subjetiva: Na abordagem humanista e existencial, valoriza-se a experiência
única e individual de cada pessoa. O terapeuta busca compreender a queixa a partir da
perspectiva do cliente, sem impor interpretações pré-concebidas.

Exemplo: Cliente: “Estou me sentindo preso em meu trabalho e não sei o que fazer”.

Terapeuta: “Posso imaginar que isso está gerando um grande desconforto. O que exatamente
você sente quando se vê nessa situação?”.
Compreensão da queixa na Psicologia
Existencial Humanista e Fenomenológica
Exploração dos Significados e Valores: A terapia humanista e existencial explora os significados e
valores que a pessoa atribui às suas experiências. O terapeuta ajuda o cliente a refletir sobre o
que é importante para ele e como isso se relaciona com a queixa apresentada.

Exemplo: Cliente: “Sinto que não estou sendo verdadeiro comigo mesmo no trabalho”.

Terapeuta: “O que é a autenticidade para você? Como você acha que isso se relaciona com sua
atual situação profissional?”.
Compreensão da queixa na Psicologia
Existencial Humanista e Fenomenológica
Foco no Momento Presente: Essa abordagem valoriza o momento presente como um ponto de
partida para a compreensão e transformação. O terapeuta incentiva o cliente a explorar o que
está acontecendo agora e como isso se relaciona com sua queixa.

Exemplo: Cliente: “Estou constantemente preocupado com o futuro e com as decisões que devo
tomar”.

Terapeuta: “Vamos explorar o que está acontecendo no presente que está gerando essa
preocupação. O que você está sentindo neste momento?”.
Compreensão da queixa na Psicologia
Existencial Humanista e Fenomenológica
Consideração da Liberdade e Responsabilidade: Na perspectiva existencial, enfatiza-se a
liberdade e a responsabilidade pessoal na criação da própria vida. O terapeuta ajuda o cliente a
explorar as escolhas disponíveis e as possíveis ações a serem tomadas.

Exemplo: Cliente: “Sinto que estou em uma encruzilhada na minha carreira”.

Terapeuta: “Vamos explorar as opções disponíveis e como cada uma delas se alinha com seus
valores e aspirações”.
Compreensão da queixa na Psicologia
Existencial Humanista e Fenomenológica
Busca de Sentido e Propósito: A terapia humanista e existencial muitas vezes envolve a busca de
sentido e propósito na vida do cliente. O terapeuta auxilia o cliente a refletir sobre o que dá
significado à sua existência e como isso pode influenciar a queixa apresentada.

Exemplo: Cliente: “Tenho a sensação de viver sem um propósito claro”.

Terapeuta: “Vamos explorar o que poderia dar mais sentido à sua vida e como isso pode impactar
sua sensação de propósito”.
Compreensão da queixa na Terapia
Cognitiva-Comportamental
Identificação de Pensamentos Automáticos: Nesta abordagem, é fundamental entender os
pensamentos automáticos que surgem na mente do cliente em determinadas situações. Por
exemplo, se um cliente relata ansiedade em situações sociais, pode ser que ele tenha
pensamentos automáticos negativos como “As pessoas vão me julgar” ou “Eu vou fazer algo
embaraçoso”.

Avaliação de Crenças e Esquemas: Examina-se crenças profundamente arraigadas que


influenciam a forma como o cliente percebe a si mesmo e o mundo ao seu redor. Por exemplo, se
um cliente tem uma crença negativa sobre sua própria competência social, isso pode contribuir
para a ansiedade em situações sociais.
Compreensão da queixa na Terapia
Cognitiva-Comportamental
Análise Funcional do Comportamento: Busca-se compreender como os comportamentos do
cliente estão relacionados à queixa. Por exemplo, se o cliente evita situações sociais devido à
ansiedade, isso pode reforçar a crença de que ele não é capaz de lidar com essas situações.

Técnicas de Reestruturação Cognitiva: O foco aqui é ajudar o cliente a identificar e modificar


padrões de pensamento disfuncionais. Por exemplo, se o cliente está propenso a interpretar mal
os sinais sociais, o terapeuta pode ensiná-lo a reavaliar esses pensamentos de uma maneira
mais equilibrada.
Compreensão da queixa na Terapia
Cognitiva-Comportamental
Treino de Habilidades de Enfrentamento: O cliente é ensinado a desenvolver habilidades práticas
para lidar com a queixa. Isso pode incluir técnicas de relaxamento, assertividade ou estratégias
de resolução de problemas.

Exemplo:

Suponhamos que um cliente relate ansiedade de desempenho no trabalho, especialmente


durante apresentações. Ao explorar seus pensamentos automáticos, o cliente revela que costuma
pensar: “Vão achar que estou nervoso e incompetente”. Através da reestruturação cognitiva, o
terapeuta ajuda o cliente a substituir esse pensamento por algo mais equilibrado, como: “É
normal sentir um pouco de nervosismo antes de uma apresentação e eu tenho as habilidades
necessárias para fazer um bom trabalho”.
Aconselhamento psicológico –
método não-diretivo
Iniciado por Carl Rogers - Abordagem Centrada na Pessoa.

A maior responsabilidade da direção da entrevista cabe ao cliente.

"Essa nova orientação se diferencia das outras principalmente em relação à sua finalidade. No
aconselhamento não-dirigido o indivíduo, e não o problema, é focalizado. A finalidade não é
resolver um determinado problema, mas ajudar o indivíduo a obter integração, independência e
amadurecimento, que lhe permitam resolver outros problemas que apareçam no futuro" (Carl
Rogers).
Aconselhamento psicológico –
método não-diretivo
Há três aspectos importantes na atitude do orientador: compreensão, aceitação e capacidade de
comunicação:

A capacidade de aceitar os outros não é um traço que se adquira em cursos ou mesmo na prática
do aconselhamento. É sobretudo uma atitude básica com relação aos seres humanos, que se
desenvolve através da experiências vitais.

Aceitação envolve duas coisas:

1) Reconhecimento das diferenças individuais.

2) Rejeição de termos de comparação entre seres humanos, reconhecendo cada um como um


todo único.
Aconselhamento psicológico –
método não-diretivo
Compreensão: trata-se simplesmente de compreender com clareza o que o cliente está tentando
expressar.
Provavelmente, nenhum ser humano compreende totalmente o outro. Não é necessário que o
psicólogo/a compreenda o cliente melhor que ele próprio.
Para compreender o cliente, não é suficiente que se conheça apenas os fatos de sua vida. O mais
importante é saber como reagiu a esses fatos e experiências, bem como as atitudes que daí resultaram,
conforme ele as sente e as percebe.
Exemplo: quando uma criança nos conta que os pais a punem severamente, nossa primeira tentativa é
verificar se isso acontece realmente. Mas a função do terapeuta é ver o mundo familiar da criança como
ela mesma o vê, e compreendê-lo como ela realmente o percebe.
É pensar com o cliente, em vez de pensar a respeito do cliente.
Aconselhamento psicológico –
método não-diretivo
Como comunicar a compreensão: fazendo a reflexão do conteúdo emocional em vez do fatual. As
respostas do terapeuta refletem o conteúdo emocional do cliente.

Por exemplo, uma cliente declara: "estou muito preocupada com a Química. Tenho que me sair
bem nesse curso já que desejo fazer Medicina. No entanto, não tenho conseguido. Estudo mais e
mais durante o dia e quanto mais leio mais confusa fico".

A reflexão do conteúdo emocional consiste em trazer à tona a preocupação, não a deficiência na


matéria de Química: "Isto a perturba, saber que todo o seu futuro depende de uma coisa que
você não consegue fazer". Em vez de: "Química é a matéria em que você tem mais dificuldade".
Aconselhamento psicológico –
método não-diretivo
Cliente: Estou me sentindo muito perdido ultimamente. Não sei o que fazer com minha carreira.
Psicólogo: Parece que você está passando por um momento de incerteza em relação ao seu futuro
profissional. Posso imaginar que isso esteja causando bastante desconforto. Gostaria de falar mais
sobre isso?
Cliente: Sim, é exatamente isso. Eu tenho algumas opções em mente, mas não consigo decidir qual
caminho seguir.
Psicólogo: Compreendo. É normal sentir-se assim diante de escolhas importantes. O que posso fazer
para ajudá-lo a explorar essas opções e encontrar uma direção que pareça certa para você?
Cliente: Eu acho que preciso de mais clareza sobre meus interesses e habilidades.
Psicólogo: Entendi. Vamos trabalhar juntos para identificar seus interesses e pontos fortes. Estou aqui
para apoiá-lo nesse processo.
Aconselhamento psicológico –
método não-diretivo
A clarificação do conteúdo emocional vem com a reflexão. Com isso, o cliente percebe suas
emoções, sentimentos e conflitos e isto o ajuda a se compreender melhor.

Resumindo:

Aconselhamento não é mero fornecimento de conselho. Progresso e amadurecimento só são


conseguidos através do trabalho psicológico realizado pelo cliente e não pelas sugestões do
psicólogo/a.

Aconselhamento não visa apenas a solução de um problema imediato, mas operar modificações
no indivíduo que o habilitem a tomar decisões no futuro, bem como resolver o problema atual.

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