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PODER JUDICIÁRIO
SÃO PAULO
Saneado o feito, foram afastadas as preliminares deduzidas pelo réu, deferida a produção
de prova oral e designada data para audiência de instrução e julgamento (fl.89/90).
Não havendo outras questões preliminares a serem apreciadas, posto que as alegadas na
contestação foram afastadas no saneador de fls. 89/90, reconheço presentes os pressupostos
processuais de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo. Concorrem ao
caso as condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o
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interesse processual, entendidas como de direito abstrato. Também não vislumbro qualquer
vício processual, estando ausentes as hipóteses dos artigos 267 e 295 do Código de Processo
Civil.
Assim, para análise do direito reclamado, deve-se levar em conta a situação fática de
ambas as partes, relacionadas ao efetivo exercício dos poderes dominiais, em detrimento da
titularidade do imóvel (art. 1196 do Código Civil, cuja redação foi influenciada pela doutrina
objetiva de Ihering).
Para que seja concedida a almejada reintegração da posse da área em litígio, incumbe ao
autor demonstrar atendimento dos requisitos constantes do art. 927 do Código de Processo
Civil, quais sejam: a) a prova de sua posse; b) o esbulho praticado pelos réus; c) e a data do
esbulho e da perda da posse.
O autor, em seu depoimento pessoal de fl. 103 afirmou residir e possuir um imóvel
lindeiro ao terreno de um alqueire, ora disputado, este último adquirido de Vitória Gomes
dos Santos e Desidério Ribeiro dos Santos, cujo comprovante de propriedade se encontra
encartado à fl. 05. Registrou, na oportunidade, passar a ocupar o imóvel somente depois de
sua aquisição, em meados de 2007 e que, em dezembro de 2008, o réu cercou o terreno, no
intuito de impedir sua posse. Ademais, enfatizou estar o imóvel de um alqueire esbulhado
inserido em uma terra maior, de 16 alqueires e que, antes de passar ocupá-la, a gleba era
somente mato.
Vitória Gomes, alienante do terreno, à fl. 45 reconheceu ser a área vendida, de sua
propriedade, vazia antes da posse exercida pelo autor. Disse, outrossim, que “após o autor
medir a área e antes de fazer a cerca o réu lá apareceu e a cercou.”
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Geraldo Ferreira e Lazaro Lopes, por seu turno, às fls. 44 e 46, respectivamente,
afirmaram que ao lado do terreno do autor há uma gleba de terra de aproximadamente 16
alqueires pertencente a alguns herdeiros, dentre eles o demandado. Disseram que o réu ocupa
uma outra parte da gleba. E mais, esquadrinharam que o autor adquiriu um terreno, no caso o
disputado um alqueire, sendo, então, sua utilização impedida pelo réu, o qual o cercou. Ainda
em uníssono, esclareceram se tratar a área de um terreno baldio e que, antes do autor a
ocupá-la, ninguém a possuía.
A testemunha Boanerges Delgado, à fl. 105, disse que o “um alqueire objeto da
discussão judicial faz divisa com a terra pertencente ao autor; (...) que na área em questão
Eurico plantava de todo tipo de lavoura, feijão, milho, arroz e mandioca; que faz muito
tempo que Eurico usou a terra para o plantio; que atualmente Eurico ainda usa a gleba
para plantar; que há seis meses atrás foi na área disputada, onde foi erguida uma cerca,
sendo que de um lado havia a residência de José e do outro lado da cerca havia plantação de
feijão, arroz, milho e batata; que a plantação em questão fica localizada bem ‘pertão’ da
casa do autor; que é o réu quem cuida da plantação em questão; que reafirma seu
depoimento, mesmo ciente de que em dezembro de 2008 foi concedida liminar em favor do
autor; (...) que não sabe se nos últimos dez anos Eurico plantou no um alqueire.”
Por intermédio de uma rápida leitura do depoimento em testilha, salta aos olhos as
gritantes contradições lançadas pela testemunha Boanerges. E isso porque ora afirmou não
ocupar o demandado a área há mais de dez anos e ora referiu estar o mesmo a possuindo até a
audiência, mesmo após ser cientificado da existência de uma liminar outorgando a posse da
gleba ao autor, vigente desde dezembro de 2008.
José Domingues, genro do réu, ouvido à fl. 106, registrou jamais haver o autor ocupado
a área em litígio. Ocorre que o laço de parentesco, ainda que por afinidade, torna evidente seu
interesse em prestigiar o demandado, de modo a ser necessário o recebimento de seu
depoimento com reservas. Não por outras razões é que foi ouvido como informante.
A testemunha Ildalecio Conceição, à fl. 107, enfatizou haver o réu, há muito tempo
atrás, limpado a área, utilizando-se dela, desde então, para o plantio. Todavia, da mesma
forma que o testigo anterior, seu depoimento deve ser recebido com ressalvas. Exibida a
fotografia juntada à fl. 06, o depoente disse se tratar do um alqueire discutido e que, na sua
opinião, a área em questão é de pasto, o que facilmente se apercebe ser um absurdo.
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Articulados estes fundamentos, outra não pode ser a conclusão senão aquela esboçada
quando do deferimento da liminar de fl. 24, onde se fundamentou que: “Embora não se saiba
quem cedeu a posse da área mencionada na inicial ao autor, já que a alienante, nesta
audiência, disse que nunca morou no imóvel, não resta dúvidas, ao menos nesta fase de
cognição sumária, que o réu também, em nenhum momento, possuiu tal pedaço de terra. Ao
menos duas testemunhas disseram que antes do autor passar a ocupar o imóvel, ele era vazio,
sem nenhuma plantação. Portanto, o autor, no presente caso deve ser considerado o
verdadeiro posseiro.”
Vale dizer, se por um lado não se fez prova a respeito do exercício da posse pelos
alienantes Desidério e Vitória, a justificar sua transmissão ao autor, por outro, tampouco
logrou o demandado comprovar que dela fazia uso. Assim, efetivamente emerge dos autos
que, após adquirir a propriedade em meados de junho de 2007, passou o autor a ocupar a
gleba disputada até o momento em que o exercício de sua posse foi obstaculizado pelo ato
esbulhatório praticado pelo réu, consistente em cercá-la.
Em suma, entendo que o conjunto probatório amealhado evidencia com clareza a posse
pretérita do autor na área em litígio e o esbulho praticado pelo réu, sendo a procedência do
pedido reintegratório medida forçosa a ser trilhada.
Esta sentença, por confirmar os efeitos da liminar deferida à fl. 24, não se submete
ao duplo efeito previsto no art. 520 do Código de Processo Civil.
Sucumbente, a parte perdedora arcará com o pagamento das custas, das despesas
processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados estes, por equidade, em R$ 400,00,
sobre os quais incidirão correção e juros legais. Tudo em vista do grau de zelo, do lugar de
prestação do serviço, da natureza e importância da causa, do trabalho realizado pelo(s)
procurador(es) da parte vencedora e do tempo exigido, ex vi do § 4º do art. 20 do Código de
Processo Civil.