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LIGA ACADÊMICA MARABAENSE DE CARDIOLOGIA

LAMAC

ELETROCARDIOGRAMA

1. Observações:
Faça exercícios sempre que possível;
Esse estudo apesar de não obrigatório, servirá de apoio para os próximos temas.
I. Conceitos Básicos

Para interpretar o ECG é preciso conhecer como se processa a formação e a condução da atividade elétrica
cardíaca.

A. Formação da Atividade Elétrica Cardíaca.

Existem 03 grupos de células marcapasso no coração que podem comandar naturalmente o ritmo cardíaco (Figura1):

1. Nó sinusal (NSA): geralmente é o grupo de células marcapasso que comanda o ritmo cardíaco pois impõe a
maior frequência (60 a 100 bpm).
2. Nó Atrioventricular (NAV): é capaz de formar impulsos com frequência em torno de 50 bpm.
3. His-Purkinje: é capaz de formar impulsos com frequência em torno de 35 bpm.

Figura 1 - Os três grupos de células marcapasso do coração e suas frequências de disparo.

B. Condução da Atividade Elétrica Cardíaca.

Os impulsos gerados pelo marcapasso dominante, em geral o NSA, caminham pelo coração por vias de condução
preferencial, permitindo uma rápida ativação elétrica de todo o miocárdio.

A sequência de ativação do coração pode ser didaticamente dividida em duas partes (Figura 2):

1. Ativação Atrial: Corresponde à onda P do ECG.


2. Ativação Ventricular: Corresponde ao complexo QRS do ECG.

Figura 2 - Ciclo elétrico do coração, ilustrando as sequências de ativação dos átrios e dos ventrículos.
1. A Ativação Atrial

O NSA fica localizado na junção da V. Cava Superior com o átrio direito. Como é ele o marcapasso que gera
impulsos com a maior frequência, geralmente temos como ritmo predominante o ritmo sinusal.

Os impulsos gerados pelo NSA ativam os átrios por vias preferenciais (feixes internodais) até atingirem o NAV.
Como o NSA fica localizado à direita, a sequência de ativação atrial fica assim configurada:

1º) Ativação atrial direita: corresponde à primeira porção da onda P.


2º) Ativação atrial esquerda: corresponde à segunda porção da onda P.

Após atingir o NAV, o impulso elétrico sofre um retardo fisiológico na condução, denominado condução
decremental, e só então alcança o feixe de His.

2. A Ativação Ventricular

A onda de ativação elétrica passa pelo feixe de His, localizado no septo interventricular, e se espalha pelos seus
dois ramos principais (direito e esquerdo). O ramo esquerdo ainda se divide em 03 divisões (divisão ântero-superior,
divisão ântero-medial e divisão póstero-inferior); que também participam do sistema preferencial de condução. A
ativação ventricular pelo sistema de condução produz um QRS estreito (< 0,12s). A sequência de ativação ventricular
pode ser didaticamente dividida em 03 partes:

1ª) Ativação do septo interventricular: corresponde à onda Q do complexo QRS.


2ª) Ativação das paredes livres dos ventrículos: corresponde à onda R do complexo QRS.
3ª) Ativação das porções basais dos ventrículos: corresponde à onda S do complexo QRS.

ECG é, portanto, o registro da sequência de ativação elétrica do coração. Esquematicamente temos:

Sequência de Ativação do Coração Correspondência Eletrocardiográfica


1. Ativação Atrial Direita Onda P (1ª Porção)
ATIVAÇÃO ATRIAL
2.Ativação Atrial Esquerda Onda P (2ª Porção)

NAV - HIS Intervalo PR

1.Ativação Septal Onda Q


ATIVAÇÃO
2.Ativação das Paredes Livres Onda R
VENTRICULAR
3.Ativação das Porções Basais Onda S

Se você quiser saber mais...

O potencial de ação (PA): O PA caracteriza a sístole elétrica do coração, e é classificado em dois tipos:

Tipo resposta rápida: possui 05 fases e é característico das fibras de Purkinje.

FASE 0: é a fase de ascensão do PA; ocorre devido a um grande influxo de Na por abertura de canais voltagem-
dependentes.
FASE 1: é a fase inicial da repolarização rápida; resulta em uma espícula devido ao término brusco da fase 0; há um
efluxo transitório de K.
FASE 2: é a fase de platô; momento onde o efluxo de K contrabalança o influxo de Na e Ca.
FASE 3: é a fase terminal da repolarização rápida; é promovida por efluxo de K tempo-dependente.
FASE 4: é a fase de repouso (diástole elétrica), onde as células permanecem com o potencial de repouso estável até serem
ativadas por um impulso propagado.

Tipo resposta lenta: característico das células marcapasso do coração. Exemplo: NSA.

FASE 0: fase de ascensão mediada por um influxo lento de Ca e Na.


FASE 4: em tipos celulares tais como no NSA, NAV e His-Purkinje, o potencial de repouso não se mantém estável. Há
uma despolarização gradual, fenômeno denominado despolarização diastólica da fase 4, o que confere a propriedade de
automatismo.

Teste seus conhecimentos

1) Quais as células que mantêm a frequência cardíaca entre 60-100 bpm?


2) Onde se dá o retardo fisiológico da condução elétrica dentro do sistema de condução?
3) O que corresponde no ECG ao fenômeno da ativação ventricular?
4) Embora a onda P seja monofásica, qual região anatômica correspondem a sua 1ª e 2ª posição?
5) A presença da onda T representa que momento da ativação elétrica do coração?

II. Registro do ECG

1) As derivações do ECG

Entendam as derivações do ECG como pontos de vista diferentes. Chama-se derivação à linha que une dois
eletrodos; na prática, uma derivação corresponde ao registro obtido por um eletrodo posicionado em qualquer ponto do
corpo.

Normalmente os eletrodos são colocados na superfície do tórax e dos membros, no entanto, existem situações
onde se usam eletrodos no interior do esôfago (derivação esofágica), no interior do coração (derivação endocárdica) ou
na superfície do coração (derivação epicárdica).

Derivações unipolares e bipolares: uma derivação é dita unipolar quando um eletrodo explorador faz o registro
da atividade elétrica cardíaca (ex: V1 a V6 e aVR, aVL, aVF). As derivações aVR, aVL e aVF são denominadas
derivações unipolares aumentadas dos membros. Derivação bipolar é aquela onde o registro se faz através de dois
eletrodos situados à mesma distância do coração (ex: DI, DII e DIII).

Plano Frontal e Plano Horizontal: para o registro do ECG padrão usamos 12 derivações; seis derivações
cobrem o plano frontal ou vertical (aVR, aVL, aVF, DI, DII e DIII) e seis cobrem o plano horizontal ou precordial (V1
a V6), numa tentativa de registrar a atividade elétrica cardíaca por vários ângulos diferentes. Eventualmente, são
utilizadas derivações precordiais adicionais para uma melhor visualização da parede posterior do coração (V7 e V8) e
do ventrículo direito (V3R e V4R).
Figura 3. As derivações do plano frontal e horizontal.

Representação da derivações eletrocardiográficas periféricas e sua relação com os vetores de desporalização.


Posicionamento das derivações precordiais

Posicionamento dos eletrodos: para a obtenção do ECG os eletrodos devem ser posicionados segundo convenção
universal:

Derivação Posicionamento do (s) eletrodo (s)


DI MSD e MSE
DII MSD e MIE
DIII MSE e MIE
aVR MSD
aVL MSE
aVF MIE
V1 4º EIC com a borda esternal direita
V2 4º EIC com a borda esternal esquerda
V3 5º EICE, entre V2 e V4 (V3R: 5º EICD)
5º EICE na linha hemiclavicular esquerda (V4R: 5º
V4
EICD/LHCD)
V5 5º EICE na linha axilar anterior
V6 5º EICE na linha axilar média
V7 5º EICE na linha axilar posterior
V8 5º EICE na linha hemiclavicular posterior

Localização topográfica das expressões eletrocardiográficas. Todas as paredes do coração têm as suas derivações
correspondentes:

Derivações Parede Correspondente


V1 a V4 ANTERIOR
DII, DIII e aVF INFERIOR ou DIAFRAGMÁTICA
V5,V6 e DI, aVL LATERAL
V7,V8 ou imagem em espelho em V1-V2 DORSAL OU POSTERIOR
V3R, V4R VENTRÍCULO DIREITO

Outras variações são ainda descritas:

V1 a V3 PAREDE ÂNTERO-SEPTAL
V4 a V6 PAREDE ÂNTERO-LATERAL
V1 a V6 PAREDE ANTERIOR EXTENSA
D1 e aVL PAREDE LATERAL

2) A Padronização do registro Eletrocardiográfico (Figura 4).

Figura 4. O registro da calibração.

A calibração é padronizada para 1mV = 10mm (Calibração N). A velocidade do papel também é padrão: 25mm/s.
Com esta padronização, a menor unidade de área (menor quadrado) vale 1mm de lado vertical e 0,04s de lado horizontal
(Figura 5).

Figura 5. Os valores das unidades. Calibração N.

Confira seus conhecimentos:

1) O que você entendeu por derivação? Dê exemplo.


2) O que são derivações uniformes e bipolares?
3) Quais as derivações que enxergam a parede inferior e a parede lateral?
4) Qual a duração do menor quadrado do papel do ECG?
5) Qual a voltagem correspondente a 5 quadrados pequenos no ECG?

Dicas importantes

Deflexões positivas indicam que o vetor de ativação caminha no sentido do eletrodo.


Deflexões negativas indicam que o vetor se afasta do eletrodo.
III. A Análise do ECG Critérios de Normalidade
Conselho: seja sistemático na análise do ECG para não esquecer qualquer detalhe. Sugestão para a sequência de
análise:

1. RITMO e FREQUÊNCIA.
2. ONDA P.
3. INTERVALO PR.
4. COMPLEXO QRS.
5. SEGMENTO ST.
6. ONDA T.
7. INTERVALO QT.
8. CONCLUSÃO.

1. Ritmo e Frequência

O ritmo normal é o sinusal, caracterizado por onda P arredondada e monofásica, sendo positiva em DI, DII e
aVF e negativa em aVR. A frequência normal varia de 60 a 100 bpm (temos ritmo sinusal bradicárdico quando a
frequência está abaixo dos 60 bpm e ritmo sinusal taquicardíaco quando a frequência ultrapassa os 100 bpm). Existem
duas regras práticas para obtenção da frequência:

REGRA DOS 300: para obter a frequência através da regra dos 300, basta dividir 300 pelo número de quadrados
maiores (5mm), que perfazem 0,20s entre os complexos QRS.

Figura 7. A Regra dos 300.


REGRA DOS 1500 para obter a frequência através da regra dos 1500, basta dividir 1500 pelo número de
quadrados MENORES (unidade menor) que corresponde a 01 milímetros .entre complexos QRS

2. Onda P

A onda P deve ser analisada quanto às seguintes características:

Eixo (orientação): no plano frontal o eixo de P fica entre 0º e 90º (onda P positiva em DI, DII e aVF e negativa
em aVR), considerado o vetor normal dirigido para baixo e para a esquerda. No plano horizontal, o vetor se dirige para
frente (onda P positiva em V1). Em V1, a onda P pode ser difásica tipo plus-minus. Quando isso ocorre a fase positiva
deve ser maior do que a negativa.
Amplitude: a maior amplitude não deve exceder 2,5 mm (0,25 mV).
Morfologia: arredondada e monofásica, podendo ser difásica em V1.
Duração: duração máxima é de 0,10s.

3. Intervalo PR

É medido do início da onda P até o início do QRS. Varia de 0,12s a 0,20s. Representa o tempo que o impulso
gerado pelo NSA levou para atingir as fibras de Purkinje.

4. Complexo QRS

O complexo QRS deve ser analisado quanto às seguintes características:

Eixo (orientação): a faixa de variação do eixo do QRS no plano frontal é de -30º a +120º. No plano horizontal,
o vetor médio do QRS é orientado para trás.

Figura 8. Determinação do eixo do complexo QRS.

Amplitude: diz-se que existe baixa voltagem quando não se registra qualquer deflexão maior do que 5mm em
derivação bipolar ou se a maior deflexão no plano horizontal não ultrapassa 8mm. Alta voltagem é definida quando se
registra ondas R ou S > 20mm nas derivações frontais ou, no plano horizontal, ondas S (V1/V2) ou ondas R (V5/V6) >
30 mm.
Morfologia: varia de acordo com a derivação e a posição elétrica do coração. Onda Q. É a primeira deflexão
negativa do QRS e representa a ativação septal. Onda Q patológica é definida quando exceder 25% do tamanho de R e
duração > 0,04s. Em algumas derivações, estes limites podem ser ultrapassados (aVR, aVL e D3). A presença de onda
Q em V1, V2 e V3 deve ser sempre considerada anormal. A ausência de onda Q em V5 e V6 também é anormal.

Figura 9. A onda Q.

Onda R. É a primeira deflexão positiva do QRS e representa fundamentalmente a ativação das paredes livres.
Normalmente deve progredir de amplitude de V1 para V6. Onda S. É a segunda deflexão negativa do complexo QRS e
representa a ativação das porções basais dos ventrículos. Normalmente deve diminuir de amplitude de V1 para V6.

Duração: o complexo QRS deve ter duração máxima de 0,12s. Deflexão intrinsecóide é o tempo de ativação
ventricular. Medido do início do QRS até o vértice da onda R, deve ser no máximo de 0,045s. O aumento da deflexão
intrinsecóide pode ocorrer por: hipertrofia ventricular, bloqueio de ramo, bloqueio divisional ou infarto agudo do
miocárdio.

Figura 10. O traçado do QRS nas derivações precordiais.


5. Segmento ST

Começa no ponto J (término do QRS) e termina na porção ascendente da onda T. Normalmente a primeira porção
do segmento ST é isoelétrica. Desníveis do segmento ST podem ocorrer por múltiplas causas, sejam elas primárias
(corrente de lesão do IAM) ou secundárias (hipertrofias, bloqueios de ramo, etc).

6. Onda T

Sua orientação segue o vetor médio do QRS. Tem morfologia tipicamente assimétrica, com a porção inicial mais
lenta. Não deve exceder 5mm nas derivações frontais ou 10 mm nas precordiais. Sua polaridade pode ser muito variável,
sendo obrigatoriamente positiva em V5 e V6 e obrigatoriamente negativa em aVR.

7. Intervalo QT

É medido do início do QRS até o final da onda T e representa o tempo de ativação e recuperação do miocárdio
ventricular. O QT varia com a idade, sexo e muito com a frequência cardíaca; portanto, deve ser corrigido através da
fórmula de Bazzet (O limite superior para homens fica em torno de 0,425s e para mulheres em torno de 0,440s).

Dica: o QT é melhor medido em aVL, pois a onda U é perpendicular a esta derivação.

Obs: a onda U é um deflexão pequena após a onda T e segue a sua polaridade. Parece corresponder a
repolarização dos músculos papilares. Onda U oposta à onda T é sempre sinal de patologia. Ocorre em presença de
hipertrofia ventricular, bloqueio de ramo, insuficiência coronária e distúrbios metabólicos ou hidroeletrolíticos.

IV. Sobrecargas

Onda P bífida; duração > 0,12s.


Sobrecarga Atrial Esquerda (SAE) Índice de Morris; onda P difásica em V1 com componente negativo > positivo
(> 0,04 mm.s).
Sobrecarga Atrial Direita (SAD) Onda P ponteaguda. Amplitude > 2,5 mm.
Romhilt-Estes; escore > 5 pontos.
Sobrecarga Ventricular Esquerda
Cornell; Homem > 28 mm, Mulher > 20 mm.
(SVE)
Sokolow-Lyon > 35 mm.
Desvio do eixo para direita qR em V1.
Relação R/S > 1 em V1.
Sobrecarga Ventricular Direita (SVD)
Relação R/S < 1 em V5.
Sokolow-Lyon > 11 mm.

Os critérios para o diagnóstico de sobrecarga ventricular seguem na sequência:

A) Para Diagnóstico de SVE

Escore de Romhilt-Estes para SVE


1. R ou S no plano frontal > 20 mm
03 pontos
S (V1 ou V2) ou R (V5/V6) > 30 mm
2. Padrão Strain (V5 / V6): infra ST com inversão da onda T 03 pontos (Se usa digital: 01 ponto)
3. SAE 03 pontos
4. Desvio do eixo > -30º 02 pontos
5. Duração do QRS > 0,09s 01 ponto
6. Deflexão intrinsecóide > 0,05s 01 ponto

SVE = 05 pontos. Possível SVE = 04 pontos.


Critério de SOKOLOW-LYON para SVE
S (V1) + R (V6) > 35 mm
Critério de CORNELL para SVE
R (aVL) + S (V3) > 28 mm (Homem) ou > 20 mm (Mulher)

B) Para Diagnóstico de SVD

Critério de SOKOLOW-LYON para SVD


R (V1) + S (V6) > 11 mm

C) Para Diagnóstico de Sobrecarga Biventricular

SVE com desvio do eixo para direita.


SVE com R amplas em V1 e V2.
Onda S em V1 com S em V2.
SAE com critérios de SVD.
Complexos RS em V2/V3/V4 (Sinal de Katz-Wachtel).
V. Distúrbios da Condução Intraventricular

A) Bloqueios Completos de Ramo

Bloqueio de ramo ocorre quando o estímulo elétrico sofre um retardo ou é impedido de prosseguir através de um
dos ramos do feixe de His. A ativação ventricular fica retardada em consequência da ativação lenta (célula a célula) do
ventrículo com o ramo bloqueado. A manifestação eletrocardiográfica desse retardo da ativação é o alargamento do QRS.

Existem várias causas para os bloqueios de ramo: fibrose degenerativa senil, insuficiência coronária, cardiopatia
chagásica, cardiopatia hipertensiva, cardiopatia valvar (principalmente aórtica), malformação cardíaca congênita, sífilis,
embolia pulmonar, trauma cirúrgico, uremia, hipercalemia, intoxicações (digital, quinidina, procainamida), entre outras.

Dica: o diagnóstico de bloqueio completo de ramo é feito nas derivações precordiais (V1 a V6).
Duas condições caracterizam o diagnóstico de bloqueio completo de ramo (direito ou esquerdo):
QRS alargado (> 0,12s)
Onda T oposta ao retardo do QRS

Distúrbio da Condução IV Resumo Eletrocardiográfico


Acentuação do ECG Normal (V1 a V6)
BRE Bloqueio do Ramo Esquerdo QRS alargado na porção média
QRS predominantemente negativo em V1
Inversão do ECG Normal (V1 a V6)
BRD Bloqueio do Ramo Direito
QRS alargado na porção final QRS predominantemente positivo em V1

B) Bloqueios Divisionais

O ramo esquerdo se subdivide em 3 divisões (ântero-superior, ântero-medial e póstero-inferior); já o ramo direito


apresenta 3 subdivisões nascidas em torno do músculo papilar anterior direito, onde a rede de Purkinje é muito abundante,
o que impossibilita a individualização eletrocardiográfica do bloqueio de uma destas três subdivisões direitas.

Bloqueios Divisionais do Ramo Esquerdo Fundamentos do Diagnóstico


BDAS Bloqueio Divisional Ântero-Superior Eixo do QRS além de -30º (S cresce de D2 para D3)
BDAM Bloqueio Divisional Ântero-Medial Eixo do QRS anteriorizado (R amplos em V1/V2)
BDPI Bloqueio Divisional Póstero-Inferior Eixo do QRS além de +120º (R cresce de D2 para D3)
Dicas: Para o diagnóstico de BDAS e BDPI olhe para o plano frontal.
Para o diagnóstico de BDAM olhe para V1 e V2.

BDAS. Este forte desvio do eixo para a esquerda comporta vários diagnósticos diferenciais: SVE, BRE, desvio posicional
do coração (brevilíneos, enfisema, gravidez, ascite), infarto inferior, síndrome de Wolff-Parkinson-White,
hiperpotassemia e estimulação cardíaca artificial. São sinais acessórios do BDAS:

Ausência de onda Q e presença de onda S em V5 e V6 (precordiais esquerdas).


QRS em aVR e aVL deve terminar em uma onda R. Padrão RSR.
O pico da onda R em aVR retardado em relação ao pico da onda R de aVL.
Significado clínico do BDAS: tal distúrbio da condução pode estar presente em corações normais anatômicos e em uma
série de patologias: insuficiência coronária, cardiopatia hipertensiva, cardiopatia chagásica, cardiopatias valvares
(principalmente aórtica), malformações cardíacas congênitas (coartação aórtica, estenose aórtica, atresia tricúspide,
defeitos septais).

BDAM. Para diagnosticar esta entidade é obrigatório afastar as outras condições que produzem o mesmo aspecto
eletrocardiográfico (R amplas em V1 e V2):
Sobrecarga Ventricular Direita (SVD): o desvio do eixo para direita e os critérios de SVD excluem o diagnóstico de
BDAM.
Infarto Dorsal: infarto dorsal isolado é muito raro; geralmente, é acompanhado de infarto inferior. Se houver área
eletricamente inativa na parede inferior (D2, D3 e aVF), não se pode fechar o diagnóstico de BDAM.
Wolff-Parkinson-White: presença de PR curto e onda delta indicando via anômala localizada à esquerda.
Hipertrofia Septal Seletiva (Hipertrofia Septal Assimétrica): presença de ondas Q amplas na presença de SVE.
Dicas: BDAM isolado é muito raro e frequentemente se associa ao BDAS e/ou ao BRD.
A onda R obrigatoriamente cresce de V1 para V2.
BDAM é um diagnóstico de exclusão.

BDPI. Seu diagnóstico é baseado no grande desvio do eixo para direita. Pode ser presumido se podemos excluir SVD.
Enquanto a divisão ântero-superior tem irrigação única da descendente anterior, a divisão póstero-inferior tem irrigação
dupla da descendente anterior e da coronária direita. Portanto, é preciso uma isquemia muito extensa para causar um
BDPI.

Exemplos - Distúrbios da Condução Intraventricular


Paciente P. A. M. X., do sexo masculino, com 61 anos de idade. Traçado eletrocardiográfico mostrando bloqueio
de ramo direito associado a bloqueio divisional ântero-superior do ramo esquerdo e área eletricamente inativa em região
septal e anterior. ST característico de corrente de lesão.

Paciente L. R., do sexo masculino, com 58 anos de idade, portador de doença de Chagas. Traçado
eletrocardiográfico mostrando associação de bloqueio de ramo direito e divisão antero-medial do ramo esquerdo (notar
a grande amplitude das ondas R de V1 a V3 - 30mm em V2 - precedidas por ondas "q" patológicas). Observar a baixa
amplitude dos complexos QRS, no plano frontal, devido à perpendicularidade do fenômeno elétrico ao mesmo.

A análise do traçado revela complexos QRS de pequena amplitude nas derivações do PF, ressaltando-se a
morfologia qRS em D2, D3 e aVF. Nas derivações do PH tem-se a presença de onda Q empastada em 40 ms de V1 a
V3, acompanhada de grandes ondas R de aspecto pontiagudo associadas à ondas T negativas. No VCG, o eixo do QRS
orienta-se a zero grau no PF em alça afiliada de início anti-horário; no PH, alça com rotação horária, morfologia
arredondada e início para trás, porção medial à esquerda e predominante. Diagnóstico: - Bloqueio Divisional Ântero
Medial.
VI. O ECG e Ritmos de parada

A parda cardiorrespiratória (PCR) ocorre nas seguintes modalidades:

 Assistolia;
 Atividade elétrica sem pulso (AESP);
 Fibrilação Ventricular (FV);
 Taquicardia Ventricular sem pulso (TVSP).

A. Quais são os ritmos chocáveis?

Fibrilação Ventricular- é a contração incoordenada do miocárdio em consequência da atividade caótica de diferentes


grupos de fibras miocárdicas, resultando na ineficiência total do coração em manter um rendimento de volume sanguíneo
adequado. No ECG, ocorre a ausência de complexos ventriculares individualizados que são substituídos por ondas
irregulares em ziguezague, com amplitude e duração variáveis.

Taquicardia Ventricular Sem Pulso- é a sucessão rápida de batimentos ectópicos ventriculares que podem levar
à acentuada deterioração hemodinâmica, chegando mesmo a ausência de pulso arterial palpável, quando, então, é
considerada uma modalidade de parada cardíaca, devendo ser tratada com o mesmo vigor da FV. O ECG
caracteriza-se pela repetição de complexos QRS alargados não precedidos de ondas P e, se estas estiverem
presentes, não guardam relação com os complexos ventriculares.

B. Quais são os ritmos não chocáveis?

Atividade elétrica sem pulso- é caracterizada pela ausência de pulso detectável na presença de algum tipo de
atividade elétrica, com exclusão de taquicardia ou FV. A ECG, caracteriza-se pela presença de alguma atividade
elétrica organizada que não produz resposta de contratação miocárdica eficiente e detectável.
Assistolia- é a cessação de qualquer atividade elétrica ou mecânica dos ventrículos. No ECG caracteriza-se pela
ausência de qualquer atividade elétrica ventricular observada em, pelo menos, duas derivações.
Casos clínicos para praticar:

Caso 01:

Um homem de 70 anos é portador de hipertensão arterial há muito tempo, mas sob controle, com 140/85 mmHg.
Assintomático, não há alterações detectadas no exame físico. Este ECG foi obtido durante seu seguimento.
O que o ECG mostra? E qual a interpretação clínica e manejo desse paciente?
Caso 02:

Uma mulher de 75 anos reclamou de desconforto retroesternal ao escalar montanhas, associado a tontura; em uma
ocasião, ela “desmaiou” enquanto subia escadas. Que anormalidade este ECG mostra? E qual a interpretação
clinica?
Caso 03:

Este ECG foi obtido de um estudante de medicina durante uma aula prática. O que ele mostra? E a interpretação
clínica para esse ritmo?
Caso 04:

Um homem de 60 anos queixou-se de forte dor retroesternal e alguns minutos depois ficou extremamente sem ar
e desmaiou. Ele foi levado para o pronto-socorro e verificou-se que sua frequência cardíaca estava em 165 bpm.
Não era possível avaliar sua pressão sanguínea e ele apresentava sinais de insuficiência cardíaca esquerda. Este é
seu ECG. O que ele mostra? Qual a interpretação clínica e o que poderíamos fazer?
Caso 05:

Um homem de 85 anos que sofria de hipertensão arterial por muitos anos foi atendido em ambulatório com angina
típica e vertigem ocasional ao caminhar em subidas. Estes são seu ECG e radiografia de tórax. O que o ECG e a
radiografia mostra e qual é a interpretação clínica?
Respostas:

Caso 01:

O ECG mostra:
 Ritmo sinusal de 73 bpm
 Intervalo PR normal
 Extremo desvio do eixo elétrico do QRS para a esquerda: bloqueio divisional
 anterossuperior esquerdo (BDASE)
 Complexo QRS normal
 Onda T invertida em DI e aVL

Interpretação clínica:
O desvio do SAQRS para a esquerda indica um defeito de condução da divisão anterior do ramo esquerdo bloqueio
divisional anterossuperior esquerdo. O distúrbio dromótropo é causado por fibrose resultante de hipertensão
arterial de longa data. A inversão da onda T nas derivações laterais (I e VL) provavelmente indica sobrecarga
ventricular esquerda, embora o complexo QRS na derivação V6 não seja anormalmente alto e o “critério de
voltagem” para a sobrecarga ventricular esquerda não seja definido. A pequena voltagem da onda R em V6 pode
ocorrer por causa do BDASE, que diminui a voltagem, ocultando a sobrecarga ventricular esquerda.

Manejo:
Esse homem claramente apresenta lesão de “órgão-alvo” (coração) como resultado de sua hipertensão arterial de
longa data. Um ecocardiograma deveria ser solicitado com o intuito de avaliar a espessura septal e da parede livre,
assim como a função ventricular, uma vez que o prognóstico piora se houver hipertrofia ou comprometimento da
função ventricular. É preciso conferir se há outros fatores de risco, como dislipidemia e diabetes, e, se necessário,
tratá-los. Caso exista qualquer suspeita de angina, um teste de esforço deveria ser indicado, mas, como o paciente
é a assintomático, esse recurso não é essencial. O controle cuidadoso da pressão arterial é a chave para o manejo,
e, como há evidência de dano cardíaco, um inibidor da enzima conversora da angiotensina deve ser a base do
tratamento.

Resumo: Bloqueio divisional anterossuperior associado a sobrecarga ventricular esquerda ou isquemia


miocárdica.

Caso 02:

O ECG mostra:
 Ritmo sinusal de 79 bpm
 Desvio do eixo do QRS para a esquerda
 Complexos QRS alargados (192 ms)
 Padrão “M” na derivação V6
 Ondas T invertidas nas derivações DI, aVL e V6

Interpretação clínica:
Este é um padrão característico do bloqueio do ramo esquerdo (BRE). Uma paciente que apresenta dor torácica
pode ter angina, e a associação com vertigem e síncope de esforço provavelmente indica estenose aórtica grave.
Este foi o caso dessa mulher.

Resumo: Ritmo sinusal com BRE


Caso 03:

O ECG mostra:
 Ritmo sinusal de 70 bpm
 Arritmia sinusal
 Eixo do QRS normal
 Complexo QRS normal
 Segmento ST e ondas T normais

Interpretação clínica:
Este é um ECG perfeitamente normal. Existe uma variação de frequência cardíaca batimento a batimento entre os
complexos QRS, com frequência cardíaca aumentando e diminuindo sucessivamente. A comparação do batimento
registrado na derivação aVF com o registrado na derivação V3 pode dar a falsa impressão de uma mudança de
ritmo, mas a fita de ritmo (derivação DII) mostra claramente a alteração progressiva do intervalo RR. Essa variação
da frequência cardíaca está relacionada com os tempos respiratórios, sendo denominada arritmia sinusal
respiratória, que é um fenômeno normal em jovens. A arritmia sinusal é diferente das extrassístoles atriais, pois a
morfologia da onda P não muda.

Resumo: ECG normal com arritmia sinusal.

Caso 04:

O ECG mostra:
 Taquicardia de complexos QRS largos e frequência de 165 bpm
 Ondas P não visíveis
 Duração do complexo QRS de aproximadamente 200 ms
 Complexos QRS concordantes nas derivações precordiais

Interpretação clínica:
Uma taquicardia de complexos QRS largos pode ser de origem ventricular ou pode ser supraventricular com
condução aberrante (i.e., bloqueio de ramo). Aqui os complexos QRS estão muito alargados e sua concordância
nas precordiais sugere origem ventricular. Em um paciente que sofreu infarto, é sempre seguro assumir que tal
ritmo é ventricular. Da história, supomos que este paciente teve um infarto do miocárdio e, então, desenvolveu
taquicardia ventricular, mas é possível que a dor torácica seja devida à arritmia.

O que fazer:
Esse paciente tem comprometimento hemodinâmico – queda de pressão arterial (sem pulso periférico) e
insuficiência cardíaca – e necessita de cardioversão imediata.

Resumo: Taquicardia ventricular sem pulso.


Caso 05:

O ECG mostra:
 Ritmo sinusal de 71 bpm
 Eixo normal do QRS
 Ondas R altas e ondas S profundas nas precordiais
 Depressão do segmento ST nas derivações V4–V6
 Ondas T invertidas nas derivações DI, DII, aVL e V3–V6
A radiografia de tórax mostra aumento do coração por sobrecarga ventricular esquerda.

Interpretação clínica:
Trata-se de uma sobrecarga ventricular esquerda importante. Pode ser difícil distinguir entre inversão da onda T
em razão de isquemia e inversão da onda T de sobrecarga ventricular e, quando a onda T é invertida nas derivações
septais (V3–V4), isquemia deve ser considerada. Contudo, aqui as alterações são maiores nas derivações laterais
e associam-se a critérios de voltagem para sobrecarga ventricular esquerda. Angina, tonturas e hipertrofia
ventricular em um indivíduo de 85 anos podem decorrer de estenose aórtica crítica, embora a hipertensão seja uma
possibilidade.

Escore de Romhilt-Estes para SVE para este caso:


 Infra ST em V4-V6 com inversão da onda P em V6 = 3pontos
 Onda R > 30mm em V5-V6 = 3 pontos
Total: 6 pontos = SVE

Resumo: Sobrecarga ventricular esquerda

REFERÈNCIAS:
Comissão de Eletrocardiografia da SBC. Curso básico de ECG
Suporte básico de vida e suporte avançado de vida. Editora Brasileiro e Passos.

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