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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PARANÁ – UNESPAR

Campus de Apucarana
Centro de Ciências Humanas e da Educação Curso: Serviço Social 1º ano
Disciplina: Ciências Politica
Docente: Elson Lima

Atividade: FICHAMENTO Data:

Texto base: RODRIGUES, Cleide Aparecida Faria, “Estado, Política e Sociedade”. IN


OLIVEIRA, Rita de Cassia da Silva. Sociologia: Conflitos do Consenso.
Ponta Grossa- PR: UEPG, 2001, p. 111-148

Acadêmico (a): FILIPE REIS ALMEIDA

Na atual conjuntura brasileira, o papel do Estado é frequentemente encarado


com reservas. O país possui uma tradição arraigada de autoritarismo e centralização
das decisões no setor governamental, resultando em ações estatais que muitas
vezes desmobilizam as organizações populares. Por outro lado, diversos segmentos
da sociedade civil carecem de organização, coesão e poder de mobilização, levando
o povo a aguardar passivamente soluções vindas de instâncias superiores.
Adicionalmente, o serviço público no Brasil é percebido de maneira negativa,
marcado por morosidade, clientelismo e ineficácia. Esses fatores têm contribuído
para o descrédito da população em relação às políticas públicas, abrindo espaço
para a aceitação de teorias que advogam pelo Estado mínimo, sem a devida
avaliação das possíveis perdas associadas.
Demo (1996) destaca que, em comparação com outros países, o Estado
brasileiro, à primeira vista, não parece particularmente grande. No entanto,
considerando o contexto histórico específico, observa-se um papel intervencionista e
controlador, caracterizado por gastos superiores às receitas, sobreposição aos
movimentos de base, estratégias de apadrinhamento e protecionismo, invasões
desnecessárias em espaços produtivos e, sobretudo, uma marcada ineficiência.
Segundo o autor, o Estado brasileiro representa uma combinação do que há
de pior no capitalismo liberal e no socialismo real. A tradição de intensas e
crescentes desigualdades econômicas, refletida em indicadores como desemprego,
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subemprego, subnutrição e analfabetismo, assim como na presença constante de


menores carentes e abandonados, favelização urbana, miséria social no campo,
violência urbana e marginalidade, caracteriza a faceta capitalista do país. A faceta
socialista é representada pelo Estado autoritário, ineficiente, parasitário,
corporativista e burocratizado, habilidoso em desmobilizar a sociedade civil.
A predominância atual do Estado na economia brasileira não resulta de um
planejamento cuidadoso, mas sim de diversas circunstâncias que obrigaram o
governo a intervir cada vez mais no sistema econômico. Essas circunstâncias não
se limitam à conjuntura interna do país, incluindo também crises internacionais e o
avanço do capital estrangeiro. O Estado brasileiro, em diferentes momentos
históricos, se divide em várias arenas, associando-se a blocos de interesses
diversos e até incongruentes entre si, comprometendo a homogeneidade das
políticas, a coerência das decisões e a capacidade de planejar e decidir sobre
questões de longo prazo. (ABRANCHES, citado por IANNI, 1988).
Ao longo do século XX, o Estado brasileiro, influenciado por confrontos entre
diversas forças sociais, adotou políticas redistributivas semelhantes aos países
capitalistas avançados. Essas políticas visavam mitigar conflitos e atender a
interesses específicos de grupos, classes ou frações de classe. No entanto, essas
ações são frequentemente implementadas de maneira precária, favorecendo
predominantemente as classes mais influentes e negligenciando as camadas
populares. As políticas sociais do Estado brasileiro não alcançaram as mesmas
proporções que as dos países capitalistas avançados, e as estratégias de Estado de
Bem-Estar Social foram implementadas de maneira muito limitada.
As políticas do Estado brasileiro têm sido caracterizadas pela exclusão dos
menos favorecidos, pelo clientelismo, autoritarismo e centralização de decisões. As
ações sociais muitas vezes são contraditórias e ineficazes, moldadas pelas
circunstâncias e pelos interesses políticos, priorizando áreas como habitação, saúde
e educação de maneira superficial, uma vez que não representam uma ameaça
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concreta à estabilidade do sistema. Paralelamente, o aumento do capitalismo


monopolista e transnacional tem contribuído para o crescimento significativo da
população miserável e excluída na sociedade contemporânea, com o Brasil não
sendo uma exceção a essa tendência.
Infelizmente, a sociedade brasileira é uma das mais excludentes do mundo,
marcada por extremos de atraso e progresso, enormes disparidades entre grandes
fortunas e imensa miséria, e o desperdício de recursos públicos em meio à
escassez. O Brasil é atualmente líder mundial na concentração de renda, com os
20% mais ricos possuindo 38 vezes mais riqueza do que os 20% mais pobres,
conforme o Relatório do Desenvolvimento Humano de 1999. Às vésperas do século
XXI, o país continua gerando uma massa de não-cidadãos, cujo processo de
exclusão se inicia no ensino fundamental e se solidifica no subemprego,
desemprego e marginalidade social. Diante da complexidade da realidade brasileira,
torna-se crucial repensar criticamente a função do Estado e das políticas públicas.
Essa reflexão é condição necessária e indispensável para avançar em direção à
democratização da sociedade.
Tradicionalmente, as políticas públicas em nossa sociedade têm sido
percebidas como práticas neutras e desvinculadas dos interesses políticos de
grupos ou classes. Essa concepção, alinhada ao liberalismo, reflete nos programas
governamentais do Estado brasileiro em diversos momentos históricos,
consolidando a ideia de um Estado que se posiciona acima dos conflitos sociais para
melhor regulamentá-los.
Portanto, uma análise crítica das funções do Estado requer superar
interpretações ingênuas que o veem como agente neutro em prol do bem comum,
desvinculando-o do jogo de poder presente em todas as sociedades. É necessário
explicitar os propósitos do Estado nas sociedades contemporâneas, desvendando
suas reais intenções em um determinado momento histórico e contexto social
específico. Aprofundar essas questões envolve o estudo de aspectos relacionados à
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teoria política e à concepção de Estado, bem como a análise das interações entre
Estado, política e poder.
Carnoy (1990) identifica duas concepções antagônicas do Estado ao longo
dos séculos. A primeira, fundamentada no pensamento liberal, enxerga um Estado
neutro, independente do poder econômico, autônomo em relação à sociedade civil, e
expressando a vontade geral. Essa visão o considera como promotor do bem
comum, transcendentando conflitos de classe e realidade sócio-histórica. A segunda
concepção, de inspiração marxista, analisa o Estado capitalista em sociedades
marcadas por desigualdades e conflitos inerentes à sua natureza de classes.
Autores como Marx, Gramsci, Poulantzas e Offe oferecem uma visão crítica do
Estado capitalista, compreendendo suas contradições e buscando alternativas para
superá-las.
O período da Idade Moderna, do século XV ao XVIII, caracteriza-se por
transformações sociais, políticas e econômicas, resultando no surgimento do Estado
Moderno. Durante esse período, o sistema capitalista substituiu o feudalismo, a
burguesia ganhou relevância política e econômica, as relações servis
desmoronaram, o trabalho assalariado emergiu, e o poder concentrou-se nas mãos
dos reis, com alianças entre monarcas e burguesia. No campo cultural, destacam-se
o Renascimento, e no espiritual, a Reforma Protestante (COTRIN, 1997b).
A primeira forma de Estado Moderno foi o absolutista, originado do apoio
dado pela ascensão da burguesia à monarquia. Esse apoio visava enfraquecer o
poder da aristocracia feudal, que se opunha aos interesses burgueses. O Estado
absolutista centralizou todas as decisões políticas e ampliou sua autoridade sobre
vastos territórios anteriormente controlados pelos senhores feudais. Dessa forma, a
realeza assumiu diretamente a administração econômica, a justiça e o poder militar.
Thomas Hobbes (1588-1679) foi um dos principais defensores teóricos do
modelo de Estado absolutista, caracterizado pelo poder absoluto dos reis e pelos
privilégios da nobreza. Contudo, esse tipo de Estado, após atingir seu auge,
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enfrentou oposição devido à sua expansão e à forte interferência na vida econômica


das nações, o que desagradou à burguesia. A nobreza, uma classe privilegiada e
em grande parte ociosa, também descontentava os burgueses, que enriqueciam por
meio do trabalho. A burguesia buscava maior liberdade para o comércio,
ultrapassando as fronteiras do Velho Mundo, e as políticas mercantilistas e o pacto
colonial se tornaram obstáculos para essa expansão. Além disso, o sistema
escravista prejudicava os interesses burgueses, que aspiravam a uma sociedade
com homens livres e proprietários participando ativamente das operações
comerciais.
Consequentemente, a burguesia começou a se opor ao poder real e ao
Estado absolutista, desenvolvendo e disseminando um conjunto de ideias que
visavam favorecer suas atividades econômicas e consolidar seu poder político,
conhecido como liberalismo. No entanto, é importante destacar que foi o próprio
Estado absolutista, por meio do mercantilismo e do colonialismo, que possibilitou a
acumulação primitiva de capital. Essa acumulação foi crucial para que a burguesia
efetuasse a gradual transição do feudalismo para o capitalismo.
Para os liberais, o propósito do Estado é organizar o poder político e criar
condições para o livre desenvolvimento das atividades dos cidadãos, seja
individualmente ou organizados de acordo com interesses comuns. A perspectiva
liberal clássica estabelece uma separação entre o Estado e a sociedade civil,
considerando o Estado como a esfera exclusiva da política, enquanto a sociedade
civil é vista como o espaço das atividades econômicas e sociais. Nesse contexto, a
sociedade civil não deve intervir nos mecanismos administrativos do Estado, e,
reciprocamente, o Estado não deve interferir nas atividades socioeconômicas, que
são restritas à esfera privada (KRUPPA, 1993).
O Estado liberal consolidou-se após a Revolução Francesa (1789), quando a
burguesia, ao tomar o poder político dos monarcas, descentralizou o Estado em três
poderes: executivo, legislativo e judiciário. Nesse modelo, a autoridade principal
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concentrou-se no poder legislativo, estabelecendo assim o Estado de direito, no qual


o poder dos governantes é limitado por um conjunto de leis que definem os direitos e
deveres dos cidadãos (FERREIRA, 1993). A sociedade burguesa, que emergiu sob
a bandeira do livre mercado, promoveu uma distinção mais clara entre o público e o
privado. O Estado liberal, como um novo modelo decorrente dessas mudanças,
posicionou-se simultaneamente como representante do público e guardião do
privado. As revoluções burguesas europeias, notadamente na Inglaterra no século
XVII e na França no século XVIII, marcaram a expansão do capitalismo na Europa e
resultaram na adoção de princípios liberais na organização econômica e política das
nações.
O liberalismo foi a expressão do pensamento ascendente da burguesia
europeia e o instrumento utilizado por ela para construir o emergente sistema
capitalista. Os valores fundamentais da doutrina liberal, incluindo a igualdade
jurídica, a propriedade privada, a tolerância religiosa e filosófica, bem como a
liberdade pessoal e social, tornaram-se bandeiras na luta da burguesia para
alcançar a dominação política e a hegemonia nos aspectos econômicos e culturais.
O pensamento liberal, exemplificado por John Locke (1632-1704), concebe o
homem como naturalmente livre e advoga pela propriedade da terra para todos os
cidadãos. Locke argumenta que o homem é proprietário de si mesmo, apropriando-
se de outras coisas pelo trabalho, excluindo privilégios de nascimento e defendendo
a igualdade entre todos os homens.
O liberalismo, com seu forte componente de individualismo, propõe que o
Estado organize os indivíduos livres, institucionalizando direitos e deveres civis.
Adam Smith (1723-1790), principal expoente do liberalismo econômico, destaca que
uma das principais funções do Estado é garantir ao cidadão o exercício de seus
direitos naturais, assegurando-lhe liberdade para buscar seu bem-estar pessoal e
social por meio do mercado, onde impera o livre jogo da oferta e da procura
(COTRIN, 1997).
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O Estado liberal adotou a "teoria da mão invisível", originada da obra de


Adam Smith, "A riqueza das nações". Essa teoria fundamenta-se nos princípios do
trabalho como principal fonte de riqueza e na autorregulação do mercado. Nesse
contexto, a intervenção do poder público seria dispensável, pois a sociedade
capitalista seguiria uma lógica interna, um ordenamento natural que tornaria
desnecessária a intervenção estatal na economia (FERREIRA, 1993). O lema
associado a essa perspectiva era "Laissez-faire, laissez-passer, le monde va de lui-
même". Esse Estado liberal caracteriza-se pela mínima intervenção na economia e
pela falta de preocupação em estabelecer políticas sociais para reduzir
desigualdades e beneficiar as camadas mais necessitadas da população. Segundo o
liberalismo, as leis de mercado regulam a distribuição de riquezas, sendo o esforço e
o talento individuais determinantes para o sucesso ou fracasso na sociedade. Com
base nesses princípios, o Estado liberal consolidou-se, implementou a economia de
livre concorrência, derrubou as monarquias e estabeleceu-se como um modelo que
perdurou até o presente século.
No entanto, a auto-regulação do mercado, tão enfatizada pelos liberais, não
se concretizou conforme suas expectativas. O capitalismo transformou-se em um
sistema econômico selvagem, onde predominou a lei do mais forte, desrespeitando
continuamente os direitos inalienáveis do homem preconizados pela Revolução
burguesa, como os direitos à igualdade, à liberdade, à vida e à propriedade.
Os princípios de igualdade jurídica e liberdade individual, inerentes ao
liberalismo e aparentemente presentes nas relações de produção capitalista,
encobriram uma profunda desigualdade social decorrente da extração da mais-valia
do trabalho assalariado. Na prática, a igualdade jurídica não se traduziu em
igualdade social, a liberdade concreta e o direito à propriedade ficaram restritos aos
detentores de bens materiais, e a defesa da abolição da escravidão e a tolerância
religiosa e filosófica ocorreram, em grande parte, em função de interesses
comerciais.
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Apesar das críticas, é importante reconhecer que a aplicação do liberalismo


à organização do Estado e à esfera econômica, com ênfase no trabalho livre,
garantiu aos trabalhadores europeus a conquista de direitos significativos,
destacando-se a cidadania política. Esse conceito inclui o direito de participar da
vida política e buscar interferir nos assuntos e na orientação do Estado.
De acordo com Weffort, citado por Vita (1989), no processo de formação das
sociedades capitalistas europeias, houve uma certa coerência entre o modelo
político adotado (um Estado de homens livres) e as relações econômicas
estabelecidas (livre mercado). Isso significa que os princípios que regem a
participação nos assuntos do Estado estavam em sintonia com aqueles vigentes na
produção. Na Europa, o processo de industrialização foi acompanhado pela
conquista da cidadania política, à medida que as massas trabalhadoras se
incorporaram à produção como homens livres e começaram a participar do processo
político. Contrariamente ao que aconteceu na França e na Inglaterra, no Brasil, a
expansão do capitalismo não resultou na conquista da cidadania para a população
em geral. A modernização econômica não conseguiu incorporar o elemento
moderno na política, ou seja, a participação irrestrita das massas populares na vida
política e sua possível influência nos rumos do Estado.
Os pensadores marxistas rejeitam a ideia de que o Estado se orienta
idealmente para o bem comum, o interesse geral ou a justiça igual para todos,
argumentando que ele é sempre um defensor dos interesses de determinados
grupos ou classes. Gruppi (1986) destaca que é com a concepção marxista que
surge uma visão crítica do Estado, e, consequentemente, da democracia burguesa e
do liberalismo. Para esse autor, os pensadores liberais não foram capazes de
construir uma teoria científica do Estado capaz de explicar sua origem, natureza e
finalidade. Eles apenas produziram uma justificação ideológica do Estado existente
ou do que pretendiam construir, caracterizando-se assim pela ausência de
criticidade.
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Analisando a sociedade capitalista de sua época, Max (1818-1883) e Engels


(1820-1895) romperam com as bases do pensamento liberal, que concebia o Estado
como uma entidade em si mesma, abstrata e geral, situada acima dos conflitos da
sociedade concreta. Segundo esses autores, o Estado capitalista tem origem e
fundamento nas desigualdades produzidas nas relações de trabalho, que são
responsáveis pela divisão da sociedade em classes. Para Marx, a estrutura social e
o Estado surgem do processo vital dos indivíduos, ou seja, de sua existência real, da
maneira como trabalham e produzem materialmente (MARX & ENGELS, 1989). De
acordo com o marxismo, tanto a consciência do capitalista quanto a do trabalhador
são moldadas pelas relações de produção, que condicionam o desenvolvimento
social e os modos de vida dos homens e da sociedade. Carnoy (1984, p. 20-23)
resume os fundamentos da teoria do Estado de Marx e Engels da seguinte maneira:
a) Eles consideravam as condições materiais de uma sociedade como a base de
sua estrutura social e da consciência humana. Nesse sentido, a forma do Estado
emerge das relações de produção e não do desenvolvimento da mente humana ou
do conjunto das vontades dos homens. A base real da sociedade é a estrutura
econômica, sobre a qual se levanta uma superestrutura jurídica e política; b) Para
esses autores, o Estado não representa o bem comum, mas é a expressão política
da classe dominante. O Estado capitalista atua como mediador do conflito de
classes, procurando manter a ordem e assegurar o domínio da burguesia; c) Marx e
Engels enfatizaram o papel repressivo do Estado, enquanto aparelho da burguesia,
para legitimar seu poder, reprimir e forçar a reprodução da estrutura e das relações
de classe. O Estado nas sociedades capitalistas é controlado pela burguesia, e sua
função primária é a coerção.
Segundo o marxismo, a igualdade e a liberdade na sociedade burguesa são
destinadas apenas à parcela dominante da sociedade, sendo que a igualdade
jurídica, defendida como bandeira da Revolução burguesa, é considerada um
engodo, sem correspondência na igualdade econômico-social.
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Marx e Engels desenvolveram um conceito de Estado como um Estado de


classes, no qual as relações sociais são antagônicas, contraditórias e desiguais. Sob
a aparência de promover o bem comum e em nome de um suposto interesse geral e
universal exercido sobre um território delimitado, o Estado é percebido como
defensor da propriedade e dos interesses de uma classe particular.
Consequentemente, para esses autores, o Estado determina que a política seja uma
esfera restrita à classe dominante, enquanto a sociedade civil é despolitizada, uma
vez que o poder político é organizado em benefício de uma classe e em detrimento
de outra. Na visão marxista, o Estado é considerado apenas um comitê da
burguesia, responsável por administrar seus negócios, sem fazer concessões à
classe operária. Daí a convicção marxista de que o caminho para a democratização
da sociedade é a revolução permanente, até que o proletariado derrube a burguesia,
conquiste o poder do Estado e estabeleça uma sociedade sem classes.
O pensamento marxista sobre o Estado encontra em Antônio Gramsci
(1891-1937) um de seus principais expoentes. Gramsci apresenta uma concepção
ampliada do Estado, reinterpretando e expandindo o pensamento de Marx.
Uma das principais contribuições de Gramsci é destacar a função social das
ideias e dos intelectuais, fatores pouco enfatizados pelo marxismo clássico como
agentes de mudança social. Ele percebe que a infraestrutura econômica não é
suficiente para explicar os fenômenos históricos, argumentando que a estrutura
econômica necessita da mediação de elementos culturais, valorativos e ideológicos
para se afirmar. Dessa forma, ele ultrapassa a concepção restrita de Estado do
marxismo clássico, estabelecendo uma relação dialética entre estrutura e
superestrutura (GRAMSCI, 1991).
Para Gramsci, o Estado não representa apenas um poder coercitivo. Ele
compreende coerção e hegemonia, englobando a sociedade política e a sociedade
civil. A sociedade política ou Estado, em sentido estrito, refere-se aos aparelhos
pelos quais a classe dominante assegura seu domínio e exerce o monopólio legal da
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violência. Representa o momento da força e da coerção (polícia, forças armadas,


aplicação da lei). Já a sociedade civil corresponde a uma complexa rede de funções
educativas, culturais e ideológicas responsáveis pela elaboração e difusão de
valores simbólicos (sistema escolar, igrejas, sindicatos, associações, partidos
políticos), abrangendo um conjunto de relações que regulam a vida intelectual,
espiritual e política da sociedade.
O Estado Moderno desempenha duas funções distintas: a função coercitiva
e a função hegemônica. Além de representar a violência e a coerção, o Estado
também busca convencer, obter consenso e adesão no plano superestrutural. Ele
não é apenas um aparato de comando repressivo; abrange um conjunto complexo
de relações que envolvem mediação e compromisso entre grupos dominantes,
aliados e subordinados. Essa dinâmica determina a unidade de objetivos políticos e
econômicos, e até mesmo uma certa unidade de consciência. Assim, o Estado, além
de impor-se pela força, exerce um papel adaptador e educador.
Na concepção de Gramsci, a conquista da hegemonia na sociedade civil
pode representar a conquista do poder político no âmbito do Estado (sociedade
política). Em outras palavras, as ideias, valores, cultura, educação e ação dos
intelectuais desempenham um papel fundamental na manutenção ou mudança da
classe dirigente em uma sociedade.
Entretanto, Gramsci alerta que a distinção entre Estado (sociedade política)
e sociedade civil é puramente metodológica, pois na realidade esses dois elementos
estão fundidos. Sociedade civil e Estado não existem separadamente, conforme
destacado nos Cadernos do Cárcere (GRUPPI, 1986).
As sociedades, em sua evolução, atravessam estágios mais coercitivos ou
mais consensuais, deslocando assim a luta de classes. No primeiro caso, essa luta
ocorre predominantemente nos aparelhos coercitivos do Estado; no segundo, ela se
desenrola principalmente nos aparelhos privados da hegemonia na sociedade civil.
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Nas sociedades ocidentais ricas e pluralistas, a luta de classes é


predominantemente travada nos aparelhos privados da hegemonia, destacando-se
órgãos formadores de consciência como escola, partidos políticos, meios de
comunicação de massa e sindicatos. Nas sociedades mais avançadas, a conquista
da hegemonia ocorre pelo caminho da democracia, do voto universal ou
representativo, em vez do movimento revolucionário.
Na sociedade capitalista contemporânea, a hegemonia da burguesia envolve
tanto a predominância do poder econômico sobre as classes subordinadas quanto a
supremacia dos valores e normas burgueses. Essa dominação se manifesta em dois
planos: econômico, pela subordinação do trabalho ao capital, e ideológico, pela
produção de um consenso social que faz com que os diversos segmentos aceitem a
direção da classe dominante.
Gramsci aponta dois fatores básicos para a possibilidade de dominação: a
interiorização, pelas classes subalternas, da ideologia dominante, e a falta de uma
visão de mundo coerente e homogênea nessas classes, impedindo-lhes a
autonomia. As classes dominadas muitas vezes permanecem ligadas ao senso
comum, à religião e ao folclore, sem desenvolver uma concepção de mundo
articulada. Para Gramsci, a educação desempenha um papel crucial no
desenvolvimento da consciência de classe e na emancipação das massas. Ele
destaca a importância da educação ministrada na escola, nos diversos órgãos da
sociedade e no interior do "príncipe moderno" (o partido político), considerado por
Gramsci como o educador por excelência.
O interesse pelo pensamento de Poulantzas surge da necessidade de
compreender o Estado contemporâneo no contexto do capitalismo monopolista.
Nesse cenário, o Estado exerce um poder abrangente sobre todos os aspectos da
vida humana, onde as funções econômicas assumem um papel central, superando
até mesmo as funções repressivas e ideológicas. Poulantzas destaca as relações de
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produção, a luta de classes e a estrutura de poder como elementos fundamentais


para entender uma formação social.
Segundo Poulantzas (1990), atualmente, ninguém escapa da influência do
Estado e do poder, tornando-se cada vez mais evidente que a ação estatal se
estende a todos os domínios da vida cotidiana. O Estado, em seu papel
contemporâneo de acumulação e reprodução do capital, não se restringe a funções
negativas, como proibir, excluir ou impedir, mas também desempenha funções
positivas, como criar, organizar, realizar e transformar. Ao longo do século XX, o
Estado tem exercido uma presença marcante em todas as esferas sociais,
especialmente na área econômica, intervindo diretamente na reprodução e
organização do capital social global, chegando até mesmo a assumir o papel de
produtor econômico. Segundo Poulantzas, o Estado é o epicentro do exercício do
poder, e a luta de classes ocorre no âmago do próprio Estado, pois diversas
camadas sociais estão representadas ali. Ele concebe o Estado como uma "relação,
mais especificamente, como a condensação material de uma relação de forças entre
classes e frações de classes" (POULANTZAS, 1990, p. 147).
Poulantzas argumenta que o funcionamento real do Estado e a formulação
de suas políticas não dependem exclusivamente da classe dominante; também
dependem do papel do Estado em relação às classes subordinadas. Para esse
autor, o Estado não é totalmente moldado pelas classes dominantes, nem é
monopolizado por elas, já que a manutenção da hegemonia requer o
estabelecimento de compromissos temporários entre o bloco no poder e certas
classes.
Dessa maneira, o Estado torna-se o palco do conflito de classes, onde
ocasionalmente é possível observar alianças entre setores hegemônicos e a
pequena burguesia, assim como adesões da burocracia estatal às reivindicações
das camadas populares. Contudo, a máquina estatal só incorpora as classes
subalternas para tornar-se mais permeável aos interesses predominantes da
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sociedade, nunca para promover sua transformação radical (BARRETTO, 1994). Os


aparelhos do Estado buscam organizar e unificar o bloco no poder, ao mesmo tempo
em que desorganizam e dividem continuamente as classes dominadas
(POULANTZAS, 1990).
Para garantir a hegemonia do bloco no poder, o Estado precisa assegurar os
interesses do capital e obter a adesão das massas. Portanto, impõe, quando
necessário, certos compromissos materiais que são indispensáveis à manutenção
da hegemonia. Assim, o Estado não hesita em tomar medidas efetivas em relação
às massas populares, como educação, emprego, habitação e saúde.
A hegemonia do bloco no poder não é imposta apenas pela violência nem
exclusivamente pela ideologia. Ela se consolida por meio das relações materiais
entre o Estado e as massas populares. A presença constante da ideologia não
elimina as ações do Estado, que visam produzir uma base material para garantir o
consenso das massas em relação ao poder. Segundo Poulantzas, isso não exclui a
dominação; pelo contrário, favorece o aumento da exploração das massas, através
da mais-valia relativa.
De acordo com o autor, o Estado capitalista tem difundido a ideia de
democracia na esfera política, apresentando-a como condição suficiente para a
sociedade democrática de massa (ideologia capitalista). Ele argumenta que a luta de
classes foi deslocada da esfera econômica para a esfera do voto. Na arena política,
todos os cidadãos (ricos e pobres, homens e mulheres, brancos e negros, jovens e
velhos) têm o mesmo poder, expresso pelo voto, para modificar ou manter a
situação social. Essa abordagem contribui para minimizar a gravidade da
desigualdade econômica na sociedade capitalista, favorecendo a igualdade na
esfera política, e obscurece o conflito na esfera econômica. Essa representação
parcial desvia a atenção das massas da marginalização econômica e social
continuamente produzida pelo Estado burguês (CARNOY, 1984).
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Segundo Offe (1984), sua análise do Estado capitalista se concentra no seu


eixo político-econômico, abordando a distribuição de recursos, o recrutamento de
pessoal, empregos e salários. Ele busca elucidar como o Estado contemporâneo
tornou-se o principal regulador do mercado de trabalho e o principal agente na
implementação de políticas sociais. Offe destaca também o papel dos burocratas,
que são os agentes político-administrativos do Estado e frequentemente exercem
influência significativa sobre o direcionamento das políticas públicas. O Estado, de
acordo com Offe, é composto por aparelhos institucionais, organizações
burocráticas, normas e códigos, desempenhando papéis de agente e regulador nas
esferas pública e privada.
Offe argumenta que o Estado capitalista enfrenta crises periódicas
decorrentes das contradições entre seus papéis de acumulação e legitimação. Para
garantir a continuidade do sistema, o Estado precisa promover a acumulação
ampliada do capital. Ao mesmo tempo, deve aparentar ser receptivo a todas as
classes sociais, legitimando seu poder por meio de medidas positivas em relação às
massas. Assim, o Estado capitalista age negando e ocultando sua verdadeira
natureza para assegurar sua perpetuação. Offe argumenta que os burocratas do
Estado desempenham um papel crucial na mediação da luta de classes, agindo em
defesa dos interesses do capital para garantir a manutenção do sistema e, ao
mesmo tempo, proteger seus próprios interesses pessoais, como emprego, status e
salário. Embora se apresentem como elementos neutros, os burocratas servem ao
grupo dominante, buscando sustentar o sistema, filtrar demandas sociais e priorizar
áreas que não ameacem a estabilidade econômica.
De acordo com Offe, áreas em crise, mas que não representam uma
ameaça à estabilidade do sistema capitalista, são relegadas à periferia do setor
governamental e recebem atenção mínima, apenas para evitar tensões. Setores
como educação, saúde e habitação, por exemplo, são atendidos apenas o suficiente
para manter parcialmente satisfeita a população, mitigando potenciais conflitos, mas
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Disciplina: Ciências Politica
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sem abordar efetivamente os problemas subjacentes. Essa intervenção política


resulta em disparidades entre o nível possível de progresso e o nível
institucionalizado, privilegiando áreas essenciais para o funcionamento do sistema
econômico e causando atraso em setores que não representam ameaças diretas.
Segundo Poulantzas, o sistema político exerce controle sobre praticamente
todas as esferas da vida civil, e o Estado é descrito como "um ator maquiavélico
infiltrado em todos os nichos da sociedade". Nesse contexto, as políticas públicas
são fortemente determinadas a partir do interior do Estado, através dos agentes do
aparato político-administrativo. Os interesses da maioria da população dificilmente
são completamente atendidos, uma vez que não são considerados prioritários em
relação à manutenção do sistema.
O século XX teve início com o capitalismo como a força dominante no
cenário mundial, apesar das crises enfrentadas desde as últimas décadas do século
XIX. Essas crises resultaram da competição desenfreada, sem normas ou restrições,
que enfraquecia as pequenas empresas, levando ao desaparecimento das mais
fracas ou forçando sua fusão para uma melhor competição no mercado. Além disso,
as transformações nas relações de trabalho decorrentes da Revolução Industrial
provocaram o desmantelamento da sociedade rural, a desestruturação da família
patriarcal e a migração do campo para a cidade, facilitando a exploração abusiva da
mão de obra fabril, o desemprego e a falta de infraestrutura básica nas cidades.
No início do século XX, na Europa, a livre concorrência foi substituída pelo
capitalismo de monopólios, intensificando ainda mais as desigualdades sociais e a
concentração de renda características desse modelo econômico. Diante das
condições desumanas de trabalho impostas pelo sistema capitalista, os
trabalhadores começaram a se organizar em sindicatos, associações e partidos
políticos no final do século XIX, buscando garantir melhores condições de trabalho.
Paralelamente, os empregadores passaram a investir mais em maquinaria para
substituir os trabalhadores e aumentar a produção em massa. Esses constantes
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conflitos entre trabalhadores e empregadores marcaram o século XX, tumultuando


as relações de produção. A situação foi agravada pelas duas guerras mundiais, que
resultaram em desemprego e miséria, e pela Revolução Russa de 1917, que
representou a primeira vitória da classe operária e uma ameaça real aos interesses
da burguesia capitalista mundial.
O século XX foi marcado por eventos que evidenciaram a fragilidade do
sistema capitalista e a necessidade de sua recomposição para evitar uma crise que
abalasse as bases do modelo liberal. A ascensão de regimes totalitários de
esquerda, como o comunismo, e de direita, como o nazismo e o fascismo,
juntamente com a quebra da bolsa de Nova Iorque em 1929, resultando em
falências, retração do mercado e desemprego em massa, além da violenta
depressão econômica na década de 30, contribuíram para esse cenário. Diante
desses desafios, surge o Estado de Bem-Estar Social (Welfare State), que busca
conciliar os princípios do liberalismo econômico com políticas voltadas para o bem-
estar e os interesses da classe trabalhadora. Essa abordagem visava mitigar os
males do capitalismo e conter o avanço do socialismo, proporcionando uma resposta
mais equitativa e humanitária aos problemas socioeconômicos.
O modelo de Estado de Bem-Estar Social, desenvolvido nas primeiras
décadas do século XX na Europa, teve em John Maynard Keynes um dos teóricos
proeminentes. Keynes, defensor da intervenção estatal na economia e de políticas
de pleno emprego, criticou o liberalismo em seu artigo "The end of laissez-faire" de
1926. Diante da crise mundial de 1929, ele argumentou a necessidade de reformar o
Estado capitalista para evitar sua completa destruição. Sua obra "Teoria geral do
emprego, juros e dinheiro" (1936) propôs a harmonização da economia de mercado
com políticas regulatórias para garantir estabilidade ao sistema.
O Estado de Bem-Estar Social busca combater o individualismo excessivo
do sistema capitalista liberal, procurando atenuar as desigualdades sociais por meio
de medidas de controle econômico, estímulos à produção e melhor distribuição de
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bens e serviços. Em contraste com os princípios do liberalismo, os defensores desse


modelo preconizam a intervenção estatal na economia para assegurar o emprego,
seja por meio de incentivos à empresa privada ou pela absorção de trabalhadores
desempregados por empresas estatais. Se essas medidas não forem suficientes
para garantir o pleno emprego, propõe-se o salário-desemprego, juntamente com
outras políticas de proteção ao trabalhador, como redução da jornada de trabalho,
férias remuneradas, auxílio funeral, aposentadoria e pensões.
Para atender às novas necessidades, o Estado expandiu seus órgãos
públicos e aumentou o número de funcionários. Para financiar as despesas dessas
políticas, passou a taxar a grande burguesia e segmentos de alto poder aquisitivo,
acumulando um fundo público que se tornou alvo de disputas internas entre setores
da burguesia. Quando excluídos dessa partilha de recursos, esses setores
incentivavam protestos contra os gastos excessivos do Estado, que passou a ser
visto como um agente redistribuidor de riquezas.
O Welfare State surgiu como uma proposta intermediária entre o capitalismo
liberal, extremamente individualista, e o socialismo real, mais restritivo à liberdade
individual. Segundo Couvre (1991), o Estado benfeitor foi uma estratégia capitalista
para conter o avanço da classe operária e do socialismo no Leste Europeu,
desmobilizando os trabalhadores e conformando-os ao sistema. O capitalismo, ao
enfrentar a crise, modificou certas regras do liberalismo, implementando dispositivos
de consumo coletivo e leis de proteção ao trabalhador, mas sem alterar sua
essência, centrada na acumulação ampliada do capital e na propriedade privada dos
meios de produção.
O modelo de Bem-Estar Social foi amplamente aceito no contexto histórico
após duas guerras mundiais, quando a humanidade enfrentava a necessidade de
criar mecanismos para estabilizar a economia e promover a cooperação entre os
cidadãos na reconstrução de países devastados. Esse modelo representou uma
alternativa ao individualismo do liberalismo. No cenário econômico, notava-se o
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fortalecimento do mercado mundial e a expansão dos Estados capitalistas para além


de suas fronteiras. Esses fatores, juntamente com o rápido desenvolvimento
capitalista após as guerras, contribuíram para a expansão do Estado de Bem-Estar
Social nas décadas de 1940, 1950 e 1960.
Na década de 1970, o paradigma do desenvolvimento sustentado pelo
Estado, caracterizado pelo Estado de Bem-Estar Social, apresenta sinais de
esgotamento nos países capitalistas avançados. O crescimento econômico
desacelera, a inflação aumenta, e o longo período recessivo se instala. A crise é
agravada pelos elevados custos dos gastos sociais, como desemprego e
aposentadorias, para o Estado benfeitor. Ao mesmo tempo, o capitalismo torna-se
mais oligopolista e transnacional em nível mundial.
O Estado de Bem-Estar Social, que atingiu seu apogeu nos anos 1960, entra
em crise, incapaz de continuar implementando políticas públicas e promovendo a
acumulação ampliada do capital. A crise é atribuída também aos avanços nas
conquistas dos trabalhadores e à incapacidade do Estado de aumentar sua
arrecadação, resultando em encargos excessivos e conflitos. A crise reflete-se
principalmente nas políticas sociais, levando os governos a cortar benefícios e
privatizar serviços públicos, gerando atritos com a classe trabalhadora.
A crise nos países capitalistas avançados afeta também os países
periféricos, como o Brasil. O Estado perde sua capacidade de implementar políticas
públicas devido à escassez de recursos e às altas taxas de juros internacionais.
Essa conjuntura contribui para a crise durante a transição democrática na década de
1980, marcada pelo rótulo de "a década perdida". O neoliberalismo surge como uma
resposta a esses desafios, marcando uma mudança significativa no papel do
Estado.
A crise nos países capitalistas avançados e no Estado de Bem-Estar Social
cria um ambiente propício para o surgimento do neoliberalismo, uma revisão dos
princípios liberais adaptada à nova conjuntura mundial. As estratégias propostas
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pelos defensores do neoliberalismo incluem a manutenção de um Estado forte no


controle do dinheiro, programas extensivos de privatização, cortes nos gastos
sociais, enfraquecimento dos sindicatos, altas taxas de juros, reforma fiscal com
cortes nas faixas de maior renda e a manutenção de índices elevados de
desemprego para criar uma "reserva de mão de obra".
O discurso neoliberal começa a se delinear nos anos 40, com pouca
repercussão inicial. Frederico Hayek, em sua obra "O Caminho da Servidão" (1944),
argumenta que a intervenção estatal representa uma ameaça à liberdade
econômica, política e à própria democracia. Para combater o keynesianismo e
preparar o terreno para um novo tipo de capitalismo, Hayek, Milton Friedman, Karl
Popper e outros teóricos fundam, em 1947, na Suíça, a Sociedade de Mont Pélerin.
Os membros dessa associação consideram a ordem social-democrática um
obstáculo à liberdade dos cidadãos, defendem a desigualdade como necessária
para recompensar os mais aptos e veem a livre concorrência como condição
fundamental para a prosperidade geral.
Para os neoliberais, o livre mercado é a forma mais sólida e eficaz de operar
o sistema econômico. Eles argumentam que o indivíduo realiza seu potencial por
meio do uso de sua liberdade, e a pobreza individual decorre do mau uso dessa
liberdade. Nesse sentido, os neoliberais advogam pela evitação da caridade pública,
alegando que ela pode desmotivar as pessoas a se sustentarem por meio de seus
próprios esforços.
Os neoliberais consideram o setor público altamente ineficiente e o
responsabilizam pela crise econômica, enquanto enaltecem o setor privado como
um modelo de equidade, qualidade e eficiência. A tese do Estado mínimo surge
dessa perspectiva, preconizando a redução dos gastos estatais ao liberalizar o
comércio internacional e transferir para o setor privado serviços como educação,
transporte, saúde e outros, que passam a ser regulados pela lógica de mercado.
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O modelo econômico neoliberal, segundo Brandão (1991, p. 94), se


caracteriza pelos seguintes postulados: O Estado deve intervir na ordem econômica
e social apenas em situações de defesa contra ameaças externas, administração da
justiça, reorganização do mercado e produção de bens públicos, mas apenas se os
mecanismos de autorregulação falharem; A participação do Estado na economia
deve ser mínima; É crucial estabelecer uma clara distinção entre os sistemas político
e econômico, garantindo autonomia institucional e uma separação nítida entre o
público e o privado.
O neoliberalismo é mais do que uma abordagem econômica; é um conjunto
de ideias e práticas que orientam as políticas governamentais e a reforma do
Estado. Para Cunha (1994, p. 8), é uma forma de "tecnocracia associada aos
conceitos de modernidade, eficiência e flexibilidade". No entanto, como uma
ideologia abrangente, vai além da economia e se manifesta na sociedade como um
estilo de vida que prioriza o individualismo sobre o coletivo, promovendo uma
espécie de "darwinismo social" onde apenas os mais fortes prosperam. Em termos
gerais, o neoliberalismo político e econômico pode ser visto como uma resposta
crítica ao Estado de Bem-Estar Social, buscando enfrentar a crise mais recente do
capitalismo com estratégias que permitam sua reestruturação.
Na década de 1980, governos neoliberais, notavelmente liderados por
Margaret Thatcher na Inglaterra e Ronald Reagan nos Estados Unidos, ganharam
destaque. O impulso neoliberal foi reforçado pelo colapso do socialismo real na
URSS e no Leste Europeu entre 1989 e 1991, marcando o triunfo do modelo
capitalista em oposição ao Estado de Bem-Estar Social e à economia mista. Embora
tenha enriquecido algumas nações, esse modelo teve efeitos desastrosos para
muitos países pobres, agravando a desigualdade e a pobreza, beneficiando
principalmente as elites econômicas.
A América Latina, que anteriormente havia sido dominada por regimes
autoritários burocráticos associados à burguesia nacional e transnacionais, não
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escapou da onda neoliberal. Países importantes como Chile, Brasil, Bolívia, Peru e
México adotaram o neoliberalismo como uma resposta à hiperinflação. Lopes (1995)
destaca que esses países, após anos de governos autoritários, passaram por uma
abertura política durante os anos 80, mas essa transição foi superficial, pois as
condições essenciais para o exercício da cidadania, incluindo direitos fundamentais
e acesso à informação crítica, ainda não estavam plenamente desenvolvidas. A
democratização dos regimes coincide com o fortalecimento do capitalismo
selvagem, enfraquecendo os direitos do cidadão. A versão latino-americana do
neoliberalismo exige sacrifícios maiores e impõe ajustes mais drásticos do que nos
países capitalistas avançados. No Brasil, a tendência de redução do tamanho do
Estado, abertura da economia para o mercado externo, restrição da atuação estatal
e ampla privatização dos serviços públicos se intensifica na década de 1980,
ganhando força nos anos 90.
Nesse período, a elite dirigente, políticos e empresários brasileiros se
articulam em torno de propostas de desmonte do Estado. O Estado, anteriormente
visto como o principal agente do desenvolvimento, passa a ser "demonizado". A
narrativa adotada é maniqueísta, polarizando o campo do capitalismo, livre iniciativa
e empresariado como bom, enquanto coloca a intervenção estatal, o funcionalismo
público e os políticos no campo mau. A ofensiva neoliberal não é apenas uma luta
pela redefinição econômica; é também uma disputa entre visões alternativas de
sociedade e um esforço para criar categorias próprias de interpretação do mundo e
da vida social, conforme Silva (1994) destaca.
Na década de 1990, as esquerdas brasileiras enfrentam um recuo devido à
conjuntura internacional favorável ao neoliberalismo. A sociedade civil, impactada
pelo desemprego e instabilidade econômica, torna-se receptiva às teorias do Estado
mínimo, facilitando a disseminação da ideia de redução do tamanho do Estado.
Mesmo entre os cidadãos mal informados, a proposta de desmonte do Estado ganha
apelo, sem que se percebam os possíveis prejuízos. Curiosamente, aqueles que
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veem o Estado como um mal muitas vezes anseiam por uma boa escola pública
para seus filhos ou por serviços de saúde que garantam tranquilidade às famílias
trabalhadoras.
No atual cenário, observa-se uma contradição na sociedade brasileira, onde
diferentes setores, inclusive grupos dominantes, unem-se para defender um Estado
mínimo. Ao mesmo tempo, esses setores demandam do Estado a garantia dos
direitos de cidadania, como saúde, segurança e educação. O neoliberalismo tornou-
se a política predominante para os grupos dominantes, levando a estratégias
privatizantes consideradas como solução universal para os problemas sociais. Esse
fenômeno não é exclusivo do Brasil, mas reflete as transformações globais que
alteraram a concepção e as funções do Estado nas sociedades contemporâneas,
impulsionadas pela evolução capitalista. A nova ordem mundial destaca-se pela
internacionalização do capital, a predominância do capital financeiro, o domínio dos
oligopólios transnacionais e a influência da informação, permitindo interpretar os
esforços brasileiros de reajuste do papel do Estado como parte de uma tendência
global que se iniciou nas décadas de 1970 e envolve a expansão do capitalismo
além das fronteiras nacionais.
O fenômeno da globalização, iniciado após a Segunda Guerra Mundial, é um
processo contínuo que se estende por todas as esferas da vida coletiva, abrangendo
o mundo todo. Apesar de não ser um acontecimento conclusivo, está em constante
evolução e apresenta resultados imprevisíveis. A globalização penetra não apenas
entre os países de destaque, mas também nas nações de escalões secundários,
como América Latina e África.
Esse processo é caracterizado pela crescente interdependência das
economias globais, gerando mudanças significativas nos âmbitos político, social e
cultural. Ianni (1988) destaca o enfraquecimento do estado-nação diante da
dinâmica da economia internacional, onde a supremacia financeira, política e militar
dos grandes centros de poder atua como uma transmissão entre a economia global
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e a economia nacional. Segundo o autor, o globo é agora o território no qual todos


estão interligados, diferenciados e antagônicos, representando uma ruptura drástica
nos modos de ser, pensar e conceber o mundo.
A globalização atual, conforme descrita por Ianni, apresenta diversas
características distintivas: 1. Energia Nuclear: A tecnologia nuclear, outrora exclusiva
das grandes potências, tornou-se acessível a países de segundo e terceiro escalão,
conferindo a eles uma potente ferramenta militar; Revolução da Informática: A
revolução da informática proporciona tanto aos detentores de poder quanto a países
secundários uma excepcional capacidade de formação, informação, sedução e
indução, colocando nas mãos desses atores um poder significativo; Sistema
Financeiro Internacional: O sistema financeiro está organizado globalmente,
alinhado com a economia capitalista mundial e seguindo as determinações dos
países dominantes. Nele, instituições como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o
Banco Mundial e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD)
desempenham papéis proeminentes. Além disso, acordos como o Convênio Geral
de Tarifas do Comércio (GATT) e a Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) desempenham um papel crucial.
A globalização, marcada pela predominância do dólar e do inglês como
moeda e língua universal, respectivamente, tem vantagens financeiras, científicas e
tecnológicas, derrubando fronteiras e aproximando povos. No entanto, ela também
gera conflitos étnicos, culturais e religiosos, além de acentuar desigualdades entre
pessoas e nações. Além do aspecto econômico, a globalização implica o poder e a
informação em escala mundial, com órgãos financeiros internacionais concentrando
poder político e as grandes redes de comunicação global transformando o mundo
em uma aldeia global. A globalização tem aspectos contraditórios, promovendo
inclusão e exclusão simultaneamente, aumentando a distância entre instruídos e não
escolarizados. Diante disso, destaca-se a necessidade de educação de qualidade
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para formar cidadãos capazes de compreender as transformações em curso e lutar


por direitos e interesses coletivos.

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