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Elzsa Alvarenga -- -------
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A conceprào bleuler iana repous a, de fato, sobre a p n1:1e1r a aplicação
d .i s idei,ts freudianas :t investigação clínica das gr�ndes psicoses. Bleuler
e lung. ent<"io st:'u assistente na Burgholzly de Zunque, trabalham corn a
,,;,c,p�tc 1ft1< 1 deis S<mlws de Freud e retêm a impo�tâ�cia da afetívída de na
_
rciruLl( .tO e 11., perturbação do curso da vida ps1quica e do pensamento
J;.,n·és d,1 .,çào dos 1necanismos fr eudianos da condensação, deslocament o,
s1mbolizaçào e recalcan1ento (BERCHERIE, 1988, p. 7-8).
Segundo Paul Bercherie, d esde 1906, Bleuler rebatiza d e esquizofre
ni.1 a den1ência precoce de Kraepelin, pois n ão se trata de uma verdadeira
demencia. ela nem s empre é juvenil, e o processo de deterioração, quando
há. é frequentemente tardio. Em sua monumental mon ografia de 1911,
Bleuler (1993) aplica aos sintomas esquizofrênicos as anális e s freudian as, que
lhes restituem um sentido na vida afetiva e na história do sujeito. Mas ele
de-staca, por contraste, que sua estrutura específica escapa a essa apreensão
pelo sentido, d esvelando a intervenção de um transtorno fundam ental e
global qu e Bleuler postula ser de origem orgânica e chama de dissociação,
o que l e va à escolha do neologismo "esquizofrenia" - mente dividida.
A dissociação psíquica s e manif e sta pelo desaparecimento do po
der regulador do eu e da consciência sobre o curs o
do pensam ento, em
um estado análogo à associação livre e ao so
nho. "Esse desligam e nt o da
realidad e combinado à predominância
relativa ou absoluta da vida inte
rior" (BLEULER, 1993, p. 112) é o qu
e Bleuler chama de autismo, tenn o
fo�ado no modelo do autoerotis
mo freudiano, am putado do sexual.
D� ferentemente das psicoses
orgânicas, estariam intactas as funções da
onentação ' da m e mo'ri·a , d
a consc1·e" nc1a .
e da mo tric id ade . U m suposto
défait s e situaria no níve1 h .
. 1erarqu1·camente superior da síntese p essoal' ond e
se ins erem os esforços te
. . rape" ut1c· os d e Bleuler, con trários ao pesst·rnisrno
kraepehniano · Os sin to
rnas fiundamentais, po r sua vez, escapam ' corn-
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e revelam a estrutur . S ª� a
� . a ão eles os distúrbios da associaçao d
afcet1v1dade e a ambival"en ,
cia,
· afcet1. va, da vontade
e intelectual.
140
.
PSI COPATOLOGLA C.ACANlANA: oso
L º CP'
N
A esquizofrenia e a linguagem
Poden1os dizer que os esquizofrênicos, ao contrário do que pensava
iniciahnente Bleulcr, são desahonados do inconsciente, 110 sent ido utili
zado por Lac:lll nos anos 1970, embora de uma forma diferente daquela
111anitcstad:l por Janlcs Joyce. Para essa ideia de um " desabonamento do
inconsciente"• Lacan se serve do tetmo francês abonnement, assinatura, tal
t'OlllO usado a o se dizer, por excmpJo, que se é assinante de uma evis
r ta.
Nesse sentido, para Lacm, os esquizofrê nicos seriam desabonados, não
..tssin:.tutes. do inconsciente. No ent;mto, à diferença do desabonamento
joyci,n10, sua d e111issão do Outro se n1anifesta, como postula Bleuler, pelos
distúrbios d.,s ..issociações. que tornam o pensamento incoerente. Eles se
e'.\.1wcssa1n cotno condensações, deslocamentos, defeitos na simbolização,
distr,libilid.,de. fi.1g., de ideias, tendência à generalização, desaparecimento
e inibiç.'io do pensa111ento ou, ao contrário, pensamentos impostos, sono
riz�çâo ou flu.,o contínuo de pensamentos e perseveração. O pensamento
.:mtístico é definido por esse tipo de operação, afastada da realidade, que
Freud denonuna de princípio primário de funcionamento psíquico. O au
tisrno de Bleuler consiste na perda de contato com a realidade, substituída
1nuitas vezes por uma "realidade" mais conforme aos desejos irrealizáveis
do paciente, que se manifestam no delírio e nas alucinações. Estes são
classificados por Bleuler como sintomas acessórios, juntamente com os
distúrbios de memória ( déjà vu, lacunas na memória), a perda dos limites e
da unidade do eu: alterações da linguagem e da escrita, alterações somáticas
e sintomas catatônicos, entre os quais Bleuler inclui: catalepsia, estupor,
hipercinesia, estereotipias, maneirismos, negativismo, automatismos de
comando, ecopraxia, ecolalia, automatismos compulsivos e impulsividade.
Fina lmente teríamos, como sintomas acessórios, os estados maníacos e me
lancólicos agudos, assim como os estados crepusculares e delirantes agudos.
O lugar central da dissociação e do autismo beneficiam uma con
cepção psicopatológica essencialmente sincrônica, levando a uma extensão
desmesurada da entidade esquizofrenia, que acaba incluindo as psicoses
agudas confusionais e delirantes, os. boi,iffées delirantes da psiquiatria fran
cesa, assim como as psicoses maníaco-depressivas. Além disso, a maneira
extremamente compreensiva da forma dita simples permite a Bleuler incluir
nas esquizofrenias os "nervosos", "psicopatas", al�oólatras, mendigos, va
gabundos e excêntricos, cuja "frouxidão associativa" acaba desembocando
na apatia e na desinserção social. A demissão do Outro aparece então aqui
como ruptura do laço social, consequência dessa entidade mórbida vasta
que se tomou O grupo das esquizofrenias. Os psicanalistas, no início do
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142 t.OGI.A
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nas
neuroses e nas psic os<..'s levando c111 conta O gozo. A solução jungui
ana
p;tr,l as pskoses - introversrro da libido no mundo interior do c;L0ei to - é
.1n[llog;1 ;1 solu(ào freudiana para as neuroses. O mecanismo das psicoses
cm Jun� está en1 co11ti nuidade com O das neuro ses, 0 que Lacan atri bui a
um;l confosào entre os registros do imaginário e do simbólico. Em Freud
esses registros seriam estri tamente distintos, perrni tindo-Jhe dizer que, na
neurm<:\ se h;í uma recusa ela realidade, pode haver um recurso às fantasias,
.10 pas�o que nJs psicoses nenhuma substituição imaginária seria possível.
Fre ud n,1o abandona o conteúdo sexual do seu conceito de libido
p.n-J faze-lo coincidir com o interesse psíquico em geral, como quer Jung.
P,ffJ LK,Hl. o esquema junguiano "não permite apreender as diferenças
que podem existir entre a retração dirigida, sublimada, do interesse pelo
mundo :1 qual pode chegar o anacoreta, e a do esquizofrênico, cujo re
�uludo é, entretanto, estruturalmente distinto" (LACAN, 1983, p. 137).
T rJta-se de un1a das poucas referências de Lacan à esquizofrenia.
Haveria na vida psíquica uma pressão para sair das fronteiras do nar
cisismo, ou do gozo do Um, e colocar a libido nos objetos, ou dirigir-se
ao Outro, quando o investimento do eu em libido ultrapassa uma de
terminada medida. Os fenômenos da hipocondria e da parafrenia, termo
utilizado por Freud para falar da esquizofrenia, estão ligados a uma estase
da libido do eu, ao passo que a introversão e a regressão das neuroses de
transferência estão ligadas a mna estase da libido de objeto.
É no seu texto "O inconsciente", notadamente no capítulo VII,
''Avaliação do inconsciente" (FREUD, 1974a, p. 224-233), que a retirada
de investimento dos objetos e o investim ,ento nas palavras na esquizofrenia
aparece em todo o esplendor do inconsciente estruturado como linguagem.
Pois é justamente através das alterações da linguagem na esquizofrenia
que Freud vai apontar a existência do inconsciente, a céu aberto, no que
ele chama então de psiconeuroses narcísicas.
Freud continua a opor libido do eu e libido objetal, de tal forma
que na neurose renuncia-se ao objeto real, n1as a libido que lhe é retirada
subsiste no inconscien te, apesar do recalque. A aptidão à transferência
supõe esse investimento de objeto. Na esquizofrenia, ao contrário, após o
processo de retirada do investimento obj,etal, a libido retirada não procura
um novo objeto, mas se volta para o eu. Se na paranoia essa libido serve ao
narcisismo e à megalon1ania, na esquizofrenia a libido retorna aos órgãos
do corpo de maneira frag1nentada, concomitantemente ao investimento
de determinados significantes.
144 '
PSlC ÜPATOLOCI OL. ocJ/\
A LACANIANA: NOS
Freud diz então que os esquizofrênicos tratam as coisas concretas como
se fosse1n abstratas, o que Lacan retoma dizendo que O significante parece
. . . . .
extenor ao SUJerto ps1cot1co, que fica preso a ele por uma fixação erot1. ca
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146 l'SlCOPATOLOC
IA LACANl/\NA: NOSOLO
CIA
de �ensar as psicoses com os desligamentos e religamentos ao Ou ro, novos
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feno 11�nos corporais e novas formas de
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transferência. Um paciente esqui
zof e � : por cxetnplo, que chega para tratamento, não representado por
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un� sigmh �a�1tc para O significante qualquer do analista, mas em posição de
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obJeto . exigira que O analista suponha a ele um saber
e o acompanhe em
suas po�sí�eis inv�i�çõcs. Inicialmente, é preciso q ue o analista se coloq ue
_
em poswao de SUJe1to e stga as pistas que o esquizofrênko lhe dá: al ns S,
gu
dispersos - quando nenhum significante se distingue para marcar o corpo,
que pennanece dócil a un1 enxame de significantes -, um mutismo ou
un1 quadro de agi tação, antes que ele possa tomar a palavra e entrar, por
1nenos que seja, en1 um discurso, definido por Lacan como um laço social.
Na esquizofrenia, com frequência, a transferência se organiza em tomo
de vários, n1as tan1bén1 de um terapeuta específico, seja na instituição, seja
fora dela. A transferência, por precária que seja, pode ajudar a construir uma
image1n corporal narcissizada, organizar um delírio, uma história núnima
ou un1a non1eação. A produção de objetos ou a escrita podem operar uma
e�-u-açào do gozo que mortifica e sacrifica o organismo, dando a esse corpo
a possibilidade de encontrar uma função., por delirante que seja, para seus
órgãos. Se a extração do objeto de gozo se dá habitualmente pela operação
do imaginário e do simbólico, havendo foraclusão do Nome-do-Pai e da
significação falica, essa extração terá de ser realizada por outros artifícios,
para evitar que ela seja feita no real da passagem ao ato.
O exemplo de um caso de "fibromialgia", que percorria a rede de
saúde mental, sem encontrar para si um lugar, um interlocutor ou um
corpo para além da dor que migrava, cada vez, para outro pedaço do corpo,
pode nos ensinar sobre novas formas de apresentação da esquizofrenia. 1
A desorganização do pensamento ou do corpo necessita de um endereço
onde possa alojar suas peças soltas e inventar pequenos artifícios para fazer
existir, por pouco que seja, um Outro como parceiro para o gozo, e um
corpo que o sujeito possa habitar.
Referências
ALVARENGA, E. A esquizofrenia e o estádio do esp elho. Revista de Psiquiatria
e Psicanálise com crianças e adolescentes. Belo Horizonte: FHEMIG, 1994, p. 81-88.
ALVARENGA, E. O conceito de psicose em Freud. Belo Horizonte: Tahl, 1992.
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LOC lA LACA!\' CANA: NOSOLO e
PSICO PAT IA
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