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PET na TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE Nº 25 - SP (2023/0222450-4)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO


REQUERENTE : LIVRARIA CULTURA LTDA. - EM RECUPERACAO JUDICIAL EM
RECUPERACAO JUDICIAL
REQUERENTE : 3H PARTICIPACOES S.A. - EM RECUPERACAO JUDICIAL
ADVOGADOS : GUSTAVO BISMARCHI MOTTA - SP275477
RICARDO VISCARDI PIRES - SP353389
VICENTE CÂNDIDO DA SILVA - DF066155
INTERES. : LASPRO CONSULTORES LTDA - ADMINISTRADOR
ADVOGADO : ORESTE NESTOR DE SOUZA LASPRO - SP098628

DECISÃO

Trata-se de petição incidental ao presente pedido de tutela provisória de urgência


apresentada por LIVRARIA CULTURA S/A - EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL e 3H
PARTICIPAÇÕES S/A - EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL, requerendo a ampliação dos
efeitos da liminar concedida nesta tutela provisória (e-STJ, fls. 867/883).
De fato, foi apresentado pedido de tutela provisória de urgência pelas Requerentes,
objetivando a concessão de efeito suspensivo ao recurso especial, ainda pendente de
admissibilidade, interposto contra acórdão do eg. Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo, que confirmou a convolação da recuperação judicial das Requerentes em falência (e-
STJ, fls. 148/159).
O Presidente da Seção de Direito Privado do TJ/SP indeferiu o efeito suspensivo
postulado no bojo do recurso especial (e-STJ, fls. 480/487).
No bojo da tutela provisória, as Requerentes sustentaram que "o Ilmo. Administrador
Judicial já está praticando os atos necessários para lacração do estabelecimento e arrecadação
dos ativos das Requerentes, tendo procedido, na data de 26.06.2023, ao fechamento do icônico
estabelecimento ocupado pelas Requerentes na Avenida Paulista, já com repercussão pela mídia
nacional" (e-STJ, fl. 9).
Alegaram que, "além do risco de ineficácia de provimento jurisdicional futuro,
marcado pela irreversibilidade da adoção dos atos de lacração e demais inerentes à falência,
pois a operação da Livraria Cultura hoje é vinculada à atuação de editoras independentes em
seu fundo de comércio, também é evidente a probabilidade do direito e a relevância da
fundamentação elencada nas razões de recurso especial, atestando que a convolação da
recuperação judicial em falência se deu de modo a violar dispositivos de lei federal, bem como

Edição nº 0 - Brasília, Publicação: sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024


Documento eletrônico VDA40311298 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006
Signatário(a): MINISTRO Raul Araújo Assinado em: 22/02/2024 16:23:16
Publicação no DJe/STJ nº 3815 de 23/02/2024. Código de Controle do Documento: f4bdedef-d12c-4682-9071-ad560e9d5c62
configurando dissídio jurisprudencial para com o entendimento consolidado por essa própria C.
Corte" (e-STJ, fl. 18).
O pedido de tutela de urgência foi deferido na decisão de fls. 656/665, para
conceder efeito suspensivo ao recurso especial, repristinando os efeitos da recuperação
judicial, até ulterior deliberação desta Corte, cabendo ao juízo da recuperação judicial
retomar o seu processamento e às Requerentes dar continuidade às obrigações constantes
do plano de recuperação, da forma como aprovado pela assembleia geral de credores e
homologado pelo Juízo de primeiro grau.
A decisão de fls. 656/665 observou que, "à primeira vista, parece que o v. acórdão
recorrido, assim como a r. sentença de primeiro grau que convolou a recuperação judicial das
Recorrentes em falência, não discriminou quais obrigações especificamente foram descumpridas
durante o período fiscalizatório, tampouco em que momento essas obrigações teriam vencido,
com o fim de discriminar se seu vencimento se deu ao longo do biênio de fiscalização" (e-STJ, fl.
662).
Ressaltou "a pouca significância do inadimplemento (R$ 1.679.790,62), menor do
que o faturamento mensal das Requerentes, para ensejar tão gravoso decreto de quebra, o que
aparentemente revela um contrassenso com a conclusão de inviabilidade econômica da
atividade empresária de pessoa jurídica de tamanha relevância social como a LIVRARIA
CULTURA" (e-STJ, fl. 664).
Considerou que "o perigo da demora é evidente, sobretudo em função da relevância
da função social da empresa e do princípio que objetiva sua preservação - para preponderar
sobre o direito do devedor de buscar no processo de soerguimento a superação da crise
econômico-financeira que o acomete" (e-STJ, fl. 665).
Retomado o processamento da recuperação judicial, BOMBONIERES RIBEIRÃO
PRETO LTDA. (locadora do imóvel onde funciona o principal estabelecimento das Requerentes,
localizado na Avenida Paulista, nº 2.073, Conjunto Nacional, São Paulo/SP) peticionou ao Juízo
da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central de São Paulo/SP, postulando
que aquele juízo se manifestasse sobre a possibilidade de cumprimento da ordem de despejo
decretada nos autos nº 0009635-30.2022.8.26.0100, tendo em vista que o juízo da execução
submeteu a apreciação do despejo ao juízo especializado (e-STJ, fls. 896/898).
Sobreveio, então, decisão do Juízo da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais
do Foro Central de São Paulo/SP que, dentre outras medidas: a) autorizou a desocupação das
Recuperandas do imóvel situado na Avenida Paulista, nº 3.073, Conjunto Nacional, São
Paulo/SP; b) indeferiu o pedido de liberação de quantia disponível na Ação Declaratória nº
0022784-91.2014.4.03.6100, em favor das Recuperandas (e-STJ, fls. 911/919).
Seguiu-se agravo de instrumento (e-STJ, fls. 920/956), a que o relator concedeu em
parte o efeito suspensivo para obstar o cumprimento da ordem de despejo (e-STJ, fls. 957/958).
Ao final, a 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de

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São Paulo, negou provimento ao recurso, nos termos do acórdão assim ementado (e-STJ, fl.
960):
"RECUPERAÇÃO JUDICIAL - Processamento - Autorização de despejo e
desocupação do imóvel principal da atividade empresária bem como
manutenção de valores depositados em conta judicial atrelada ao processo de
soerguimento - Manutenção - Inocorrência de violação ao contraditório ou
decisão surpresa - Ordem de despejo confirmada - Inadimplemento de
despesas relacionadas à locação do imóvel, IPTU e taxas condominiais
Crédito extraconcursal - Locadora que injustamente vem arcando com essas
despesas - Manifesto inadimplemento das agravantes em prejuízo do credor-
agravado - Levantamento de quantia indeferido - Prudência na manutenção
da quantia em conta judicial diante da convolação da recuperação judicial
em quebra por este órgão julgador - Decisão de primeiro grau que não violou
o decidido pelo E. STJ em sede de tutela antecipada - Recurso improvido.”

As Requerentes afirmam que a decisão do d. juízo recuperacional afronta,


indiretamente, à determinação da decisão de fls. 656/665.
Isso porque a autorização do despejo das Requerentes do seu principal
estabelecimento, sem sequer ouvi-las para fins de contraditório, ceifa integralmente a
possibilidade de soerguimento das Requerentes por meio do seu processo recuperacional.
Afirmam que a determinação de despejo foi mantida pelo eg. TJ-SP com base em
elementos que subsidiaram a quebra e, portanto, não podem fundamentar o despejo, eis que a r.
decisão monocrática de fls. 656/665 suspendeu os efeitos da quebra.
Reforçam que o estabelecimento das Requerentes situado na Avenida Paulista, São
Paulo/SP (objeto do despejo), onde se localiza a icônica LIVRARIA CULTURA do Conjunto
Nacional, é o principal estabelecimento das Recorrentes, de modo que o cumprimento da ordem
de despejo inviabilizará a eficácia da manutenção do socorro legal e, por certo, implicará na
derrocada das operações das Requerentes.
Complementam que o impedimento do levantamento de valores titularizados pelas
Requerentes, sob o pressuposto de cautela, também viola o quanto decidido nos presentes autos,
à medida que a r. decisão de fls. 656/665 não insere nenhuma limitação acerca das atividades das
Requerentes.
As Requerentes postulam, então, a "ampliação da liminar concedida, para que seja
SUSPENSA a determinação do despejo ilegalmente determinado, bem como qualquer outro
ato que tenha por efeito prático infirmar os efeitos da bem lançada tutela de restabelecimento
do curso da Recuperação Judicial, tratando-se de ato que inviabilizaria o seu curso" (e-STJ, fl.
883).
É o relatório. Decido.
As Requerentes defendem que o d. Juízo da 2ª Vara de Falências e Recuperações
Judiciais do Foro Central de São Paulo/SP afrontou, indiretamente, a decisão monocrática
proferida nesta tutela às fls. 656/665, que suspendeu os efeitos do decreto de quebra,
repristinando os efeitos da recuperação judicial das Requerentes.

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Na parte que aqui interessa, a r. decisão está assim fundamentada (e-STJ, fls.
913/919):
"Nos autos do Cumprimento de Sentença atrelado à Ação de Despejo, nota-
se que o acordo celebrado entre as partes reconheceu, ainda em 2021, o
inadimplemento de alugueres e acessórios no montante de R$
15.100.476,61, desde o ano de 2020.
Isto é, observa-se que as Recuperandas, desde aquela oportunidade, estão
inadimplentes no que se refere à obrigação que, a rigor, deveria ser sua
primeira prioridade o pagamento do aluguel da sede de sua principal e
icônica loja.
Em complemento, consigna-se que, há tempos, o prazo atinente ao stay period
das devedoras se esgotou. Ou seja, não há qualquer razão jurídica ou
econômica que justifique a manutenção das Recuperandas no imóvel em
referência.
Portanto, autorizo a desocupação das Recuperandas do imóvel situado na
Avenida Paulista, nº 2.073, Conjunto Nacional, nesta Capital, em prazo a
ser concedido pelo Juízo Oficiante da C. 22ª Vara Cível da Comarca da
Capital do Estado de São Paulo, onde tramita a Ação de Desejo em
comento, em fase de Cumprimento de Sentença.
A atividade empresarial deverá ser exercida em outro local, cujos custos as
Recuperandas tenham condições econômico-financeiras de arcar.
Comunique-se o Juízo oficiante, devendo as devedoras noticiarem,
igualmente, os seus sublocatários atuais da presente decisão.
(...)
14. Fls. 34.859/34.878 (Petição Recuperandas liberação de valores): Trata-se
de manifestação das Recuperandas noticiando o vencimento das parcelas
referentes aos credores das subclasses “incentivadores 2 e 3”, bem como da
Classe IV.
Ressaltam que há valores retidos em processos judiciais, os quais estão
fragilizando seu fluxo de caixa e impedindo a reorganização do seu passivo.
Destaca, a título exemplificativo, que, nos autos da Ação Declaratória nº
0022784- 91.2014.4.03.6100, em trâmite perante a 21ª Vara Cível Federal de
São Paulo, há saldo remanescente, o qual se encontra “retido” até
deliberação desse Juízo acerca de sua destinação.
O saldo em questão foi depositado pelas próprias devedoras para garantir o
Juízo Fiscal, ante a discussão da incidência ou não do II (Imposto de
Importação) e do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) dos e-
readers.
Segundo elas, houve o reconhecimento da aplicação da imunidade tributária,
contudo, a liberação da garantia depositada restou condicionada à análise
deste Juízo (Agravos de Instrumento números 5024175-16.2021.4.03.0000 e
0022784-91.2014.4.03.6100); fora acostado nestes autos ofício do Juízo
Federal, às fls. 30.773/30.780, posteriormente reiterado às fls. 33.364/33.370.
Do mesmo modo, citam as Recuperandas como montante disponível para
levantamento aquele depositado nos nestes autos pelo Carrefour Comércio e
Indústria LTDA, exposto no item 6 desta decisão.
Sustentam as Recuperandas que a manutenção de R$ 89.715,89 (oitenta e
nove mil setecentos e quinze reais e oitenta e nove centavos) em conta
vinculada é injustificada.
Ao final, as devedoras pedem (i) a expedição de ofício, nos autos da Ação
Declaratória n.º 0022784-91.2014.4.03.6100, em trâmite perante a 21ª Vara
Cível Federal de São Paulo, a fim de que seja liberado o montante de R$
386.168,00 (trezentos e oitenta mil cento e sessenta e oito reais), relativo à
outrora garantia prestada, e (ii) o levantamento do depósito judicial de R$
89.715,89 (oitenta e nove mil setecentos e quinze reais e oitenta e nove
centavos) realizado pelo Carrefour Comércio e Indústria LTDA,

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comprometendo-se a destinar tais valores ao cumprimento do PRJ.
Sobre a quantia depositada pelo Carrefour Comércio e Indústria LTDA, este
Juízo já deliberou a respeito, conforme tópico anterior.
Não obstante, mostra-se temerária a situação das devedoras, uma vez que,
conforme demonstrado, dependem da liberação do montante ofertado em
garantia ao Juízo Federal, na Ação Declaratória nº 0022784-
91.2014.4.03.6100, para adimplir as prestações do Plano de Recuperação
Judicial que se encontram frise-se vencidas, fato este que comprova, por
mais uma oportunidade, o descumprimento do PRJ.
A propósito, entende-se que nenhum valor deverá ser liberado em favor das
Recuperandas até que haja o julgamento do mérito do seu Recurso Especial
interposto contra o v. acórdão que manteve sua sentença de quebra.
Dito de outro modo, até que sobrevenha julgamento definitivo sobre a
manutenção (ou não) do decreto falimentar, com o fito de resguardar valores
aos credores, nenhuma quantia deverá ser liberada em favor das devedoras,
salvo com prestação de eventual caução que não é o caso.
Isto posto, INDEFIRO o pedido de liberação da quantia disponível na Ação
Declaratória nº 0022784-91.2014.4.03.6100 em favor das Recuperandas,
devendo o Juízo Fiscal ser oficiado para transferir o numerário para os
presentes autos recuperacionais." (grifou-se)

Por cautela, este Relator suspendeu os efeitos da convolação da recuperação judicial


das Requerentes em falência, diante da relevante função social de suas atividades empresariais e
do princípio que objetiva sua preservação, a fim de resguardar as devedoras de buscarem no
processo de soerguimento a superação da crise econômico-financeira que as acometem.
Com isso, retomou-se a recuperação judicial, mas não retirou-se do juízo
recuperacional sua competência para promover todos os atos processuais e exercer o controle
sobre os atos constritivos no patrimônio das sociedades em recuperação, tendo em vista o
princípio basilar da preservação da empresa.
Ocorre que a ampliação dos efeitos da liminar pleiteada pelas Requerentes desborda
dos objetivos do recurso especial especificamente relacionado à presente tutela cautelar, que está
restritamente relacionado à fundamentação do decreto falimentar.
O pedido, portanto, extrapola em muito daquilo que pode ser examinado no recurso
especial em discussão, tomando os contornos de um "cheque em branco", apto a justificar futuros
descumprimentos e coibir determinações importantes que são legitimamente asseguradas ao
juízo da recuperação judicial ou a outros juízos singulares.
Dar tal amplitude ao comando da decisão de fls. 656/665 revelar-se-ia uma medida
precipitada e desarrazoada, que transborda da finalidade dos interesses que a decisão visou
assegurar.
Sabe-se da relevância da sede atual das Recuperandas para o fomento de suas
atividades empresariais. Igualmente é certo que a recuperação judicial não pode significar uma
blindagem patrimonial das empresas em recuperação, notadamente para os credores que não se
sujeitam ao concurso universal de credores. Nessa linha, o juízo da recuperação judicial não deve
permitir proteção desmedida à empresa, impondo o ônus da reestruturação exclusivamente aos
credores que há muito aguardam a satisfação de seus créditos.

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Desse modo, não há como examinar nos limites do recurso especial ora tratado a
autorização do juízo da recuperação judicial de cumprimento da ordem de despejo, face ao
descumprimento do acordo celebrado nos autos de cumprimento de sentença atrelado à ação de
despejo, onde se reconheceu o inadimplemento de alugueres e acessórios no montante de R$
15.100.476,61.
Com efeito, o presente pedido está a tratar de limitar o exercício do direito de
propriedade do locador que não mais pretende manter contrato de aluguel com empresa
inadimplente a pretexto de possibilitar o cumprimento de plano de recuperação judicial
homologado e aprovado.
Ademais, o entendimento da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça é de
que, por mais que se pretenda privilegiar o princípio da preservação da empresa, não se pode
afastar a garantia ao direito de propriedade em toda a sua plenitude daquele que, durante a
vigência do contrato de locação, respeitou todos os termos e condições pactuadas, obtendo, ao
final, decisão judicial – transitada em julgado – que determinou o despejo do bem objeto da
demanda por falta de pagamento.
Por oportuno, confiram-se os seguintes julgados:
"CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA - CONTRATO DE LOCAÇÃO
- EMPRESA LOCATÁRIA SUBMETIDA AO REGIME DE RECUPERAÇÃO
JUDICIAL - NÃO SUBMISSÃO AO JUÍZO UNIVERSAL DA
RECUPERAÇÃO - ESCÓLIO JURISPRUDENCIAL DA SEGUNDA SEÇÃO -
COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO.
Hipótese: consiste na declaração de competência para processar e julgar
ação de despejo c/c cobrança de alugueis formulada contra sociedade
empresária em regime de recuperação judicial.
1. O Superior Tribunal de Justiça é competente para o conhecimento e
processamento do presente conflito negativo de competência, pois apresenta
controvérsia acerca da competência entre juízos vinculados a Tribunais
diversos, nos termos do que dispõe o artigo 105, I, "d", da Constituição
Federal.
2. A jurisprudência da Segunda Seção caminha no sentido de que a ação de
despejo movida pelo proprietário locador contra sociedade empresária em
regime de recuperação judicial não se submete à competência do juízo
universal da recuperação. Precedentes.
3. Conflito negativo conhecido para declarar a competência do r. juízo
suscitado."
(CC n. 170.421/PR, Relator Ministro MARCO BUZZI, Segunda Seção,
julgado em 9/9/2020, DJe de 14/10/2020, g.n.)

"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. CONFLITO DE


COMPETÊNCIA. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AÇÃO DE
DESPEJO. IMÓVEL DESOCUPADO. AUSÊNCIA DE CONFLITO.
PRECEDENTES.
1. Esta Corte possui entendimento consolidado no sentido de que 'A ação de
despejo movida pelo proprietário locador em face de sociedade empresária
em recuperação judicial não se submete à competência do Juízo
recuperacional' (CC 148.803/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,
SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/04/2017, DJe 02/05/2017).
2. Agravo interno a que se nega provimento."
(AgInt no CC n. 165.754/SP, Relatora Ministra

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MARIA ISABEL GALLOTTI, Segunda Seção, julgado em 26/6/2019, DJe
de 1/7/2019, g.n.)

"CONFLITO POSITIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE DESPEJO.


EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SUJEIÇÃO AO JUÍZO
NATURAL.
- A ação de despejo movida pelo proprietário locador em face de sociedade
empresária em recuperação judicial não se submete à competência do Juízo
recuperacional. Precedentes.
- Conflito de competência não conhecido."
(CC n. 148.803/RJ, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, Segunda
Seção, julgado em 26/4/2017, DJe de 2/5/2017, g.n.)

Com efeito, o art. 49, § 3º, da Lei 11.101/05 prevê que o credor titular de propriedade
do bem imóvel não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial, prevalecendo os direitos de
propriedade sobre a coisa:
Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na
data do pedido, ainda que não vencidos.
(...)
§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de
bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou
promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham
cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações
imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de
domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e
prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições
contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo,
durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a
venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital
essenciais a sua atividade empresarial.

Vale salientar que, na ação de despejo, busca-se a retomada do imóvel locado com
base no direito de propriedade, e não a venda ou retirada de bens essenciais do estabelecimento
do devedor, não se aplicando o art. 6º, § 4º, da Lei n. 11.101/05 à espécie.
Ademais, tratando-se de credor titular da posição de proprietário, prevalecem os
direitos de propriedade sobre a coisa, sendo inaplicável à hipótese de despejo a exceção prevista
no § 3º, in fine, do art. 49 da Lei 11.101/2005, acima transcrito, pois, no despejo, regido por
legislação especial, tem-se a retomada do imóvel locado e não se trata de venda ou mera retirada
do estabelecimento do devedor de bem essencial a sua atividade empresarial.
Outrossim, a melhor interpretação a ser conferida aos arts. 6º e 49 da Lei
11.101/2005 é de que, em regra, apenas os credores de quantia líquida se submetem ao juízo da
recuperação, com exclusão, dentre outros, do titular do direito de propriedade.
Respeitadas as alegações das Requerentes, não há como se examinar nestes autos a
alegada ilegalidade na r. decisão do juízo da recuperação judicial que autorizou a desocupação
das Recuperandas do imóvel situado na Avenida Paulista, nº 3.073, Conjunto Nacional, São
Paulo/SP e indeferiu o pedido de liberação de valores depositados em juízo.
Isso, porque a decisão do MM. Juiz a quo em nenhum momento violou ou contrariou

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a decisão proferida por esta Corte às fls. 656/665, a qual não teve o objetivo de limitar outras
decisões do juízo recuperacional ou de outros juízos singulares, nem tem o alcance de deliberar
sobre a destinação de valores depositados no processo, cuja incumbência compete
exclusivamente ao juízo da recuperação judicial.
Ante o exposto, indefiro o pedido de fls. 867/883 (e-STJ).
Publique-se.
Brasília, 22 de fevereiro de 2024.

Ministro RAUL ARAÚJO


Relator

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