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Comer emocional pt1 Ed.

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17 de setembro de 2021
Para entender o termo “comer emocional”, maneira, adequar a experiência e expressão
precisamos antes conhecer o processo de das emoções à situação e ambiente é uma
regulação das emoções, e o habilidade essencial.
condicionamento clássico (ou pavloviano).

Nesta edição, as informações apresentadas


podem parecer desconexas, mas a próxima
ESTRATÉGIAS
edição usará todas os conhecimentos Uma vez que a regulação emocional implica
apresentados aqui. em alterar como uma emoção é vivenciada
(experienciada) e/ou como é expressada
para o mundo exterior, as estratégias de

REGULAÇÃO DAS EMOÇÕES regulação emocional podem atuar em um


destes fatores ou ambos.
O processo de regulação emocional diz
respeito ao esforço feito pelo indivíduo para No processo temporal de formação das
influenciar a experiência (como ele emoções (a sucessão cronológica de eventos
vivencia) e expressão (como ele externaliza) que leva à formação e expressão de uma
das emoções. emoção) algumas estratégias podem ser
empregadas antes da formação da emoção
Embora a tentativa de manipular como nos
(sendo estas estratégias antecedentes) ou
sentimos pareça algo negativo, a regulação é
depois da formação dela (estratégias
uma capacidade essencial para a saúde física
focalizadas).
e psicológica.
Vamos abordar duas das estratégias mais
Se todas as vezes que você leva uma fechada
comuns, supressão emocional e reavaliação
no trânsito, vivencia e expressa a raiva de
cognitiva.
maneira plena, haverá consequências
negativas não só pelo estresse gerado, mas Reavaliação cognitiva
também pelas ações impulsivas
A reavaliação cognitiva é uma estratégia
possivelmente tomadas, como agredir o
antecedente: o processo pelo qual o
outro motorista ou revidar a fechada. Dessa
indivíduo reavalia e ressignifica o papel Supressão emocional
daquela emoção.
Podemos pensar ainda na supressão
Alguém que precisa falar em público, por emocional, que ao contrário da reavaliação,
exemplo, pode imaginar previamente o é uma resposta focalizada (acontece após a
passo a passo de como sua apresentação vai formação da emoção) e busca evitar que a
acontecer, quais os possíveis pontos de erro emoção experienciada seja externalizada e
e como prevenir o corrigi-los, ou ainda pode percebida por terceiros.
se convencer de que tal medo não é
Durante a apresentação, por exemplo, o
justificado: que ele estudou e se preparou
indivíduo que ficasse nervoso poderia
para a apresentação. Assim, provavelmente,
conscientemente respirar mais devagar,
a ansiedade durante a apresentação será
falar com calma e limpar o suor da testa para
diminuída.
que a ansiedade não fosse externalizada e
Assim, a reavaliação é o processo cognitivo percebida pelo público.
pelo qual o indivíduo modula possíveis
Consequências
emoções futuras.
Então temos a reavaliação, que é uma
Alguns estudos mostram que durante o
estratégia cognitiva e antecedente, e a
processo de reavaliação cognitiva, há uma
supressão emocional, uma estratégia
maior ativação do córtex pré frontal e menor
comportamental e focalizada.
da amigdala, sugerindo que a primeira
No longo prazo, a frequente supressão
região é capaz de modular a atividade da
emocional se relaciona com maior
segunda. De maneira BASTANTE
frequência de depressão, menor auto estima
simplificada, o córtex pré frontal é a região
e menores níveis de bem estar, enquanto o
cerebral responsável pela inibição de
uso mais frequente da reavaliação cognitiva
impulsos e favorecimento de objetivos de
se relaciona com menor ocorrência de
longo prazo, e a amigdala, responsável pelo
emoções negativas, e maior nível de bem
comportamento impulsivo e inconsequente
estar.
(áreas com funções antagônicas).
Entendemos então, que a reavaliação é uma
estratégia de regulação adaptativa, benéfica,
enquanto a supressão é mal-adaptativa,
deletéria.

CONDICIONAMENTO PAVLOVIANO
Ao perceber este fenômeno, Pavlov
Durante a década de 1890, Ivan Pavlov
descobriu o que chamamos hoje de
estudava a salivação dos cães quando
condicionamento Pavloviano, ou
alimentados de ração.
condicionamento clássico. Nele, um
No estudo, Pavlov coletava e mensurava a estímulo neutro e uma resposta não
saliva secretada pelos animais quando condicionada interagem para formar um
expostos ao alimento. estímulo e uma resposta condicionados.

No início do experimento os animais apenas No caso, temos um estímulo neutro (passos


iniciavam a salivação uma vez que tinham do tratador) e uma resposta não
acesso ao alimento e começavam a comer. condicionada (salivação). Quando o
Curiosamente, com a repetição do estímulo neutro passa a ser apresentado
experimento por vários dias, a salivação logo antes da resposta não condicionada,
passou a ser iniciada antes mesmo de os estes se transformam em estímulo e
animais enxergarem o alimento, mais resposta condicionados.
especificamente, quando ouviam os passos
Em resumo, o cérebro do cão entende que os
do tratador responsável.
passos do tratador antecedem a exposição
ao alimento e condiciona a liberação de
saliva a este estímulo.

Com os avanços científicos na área,


percebemos que o mesmo processo acontece
com humanos, porém de maneira mais
complexa (o estímulo neutro e resposta não emotional states." Cognition and Emotion 31.2
(2017): 284-297.
condicionada não precisam acontecer em
Bongers, Peggy, et al. "Emotional eating and
um intervalo tão curto de tempo, e não Pavlovian learning: does negative mood
facilitate appetitive conditioning?." Appetite 89
precisam ser tão óbvios).
(2015): 226-236.

O condicionamento clássico na alimentação Mocaiber, Izabela, et al. "Neurobiologia da


regulação emocional: implicações para a terapia
de humanos fica claro, por exemplo, em cognitivo-comportamental." Psicologia em
relação ao horário das refeições. É pouco estudo 13 (2008): 531-538.

provável que, todos os dias exatamente às


13:30 seus estoques de energia se depletem
e você sinta fome, mas o fato de que a pausa
para almoço no seu trabalho é sempre no
mesmo horário torna “ver o relógio
marcando 13:30” um estímulo
condicionado, e “ficar com fome” a resposta
condicionada.

Tá bom, entendi até aqui, mas o que toda


essa informação desconexa tem a ver com
o comer emocional?

Te explico na próxima edição.

REFERÊNCIAS
Evers, Catharine, F. Marijn Stok, and Denise TD
de Ridder. "Feeding your feelings: Emotion
regulation strategies and emotional eating."
Personality and social psychology bulletin 36.6
(2010): 792-804.

Bongers, Peggy, and Anita Jansen. "Emotional


eating and Pavlovian learning: evidence for
conditioned appetitive responding to negative

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