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EXAME DIREITO COMERCIAL (AVANÇADO)

Contratos Comerciais

1. Objetivos e Subjetivos

Existem duas categorias ou tipos fundamentais de contratos comerciais.

Desde logo, serão comerciais todos aqueles contratos que preencham o critério
objetivo da comercialidade previsto na primeira parte do art. 2.º do CCom., ou seja,
utilizando a terminologia da própria lei, todos aqueles "que se acharem especialmente
regulados neste Código."

Abrangem-se assim aqui genericamente os contratos previstos no Livro II do


Código Comercial, englobando, quer os contratos que aí se encontrem exclusivamente
previstos - onde incluem, por exemplo, os contratos de conta-corrente (art. 344.° do
CCom) ou de reporte (art. 477.º Do CCom) -, quer aqueles que se encontrem
simultaneamente consagrados no Código Comercial e no Código Civil - onde se
incluem, por exemplo, os contratos de mandato mercantil (art. 231.° do CCom), de
empréstimo mercantil (art. 394.º do CCom), de penhor mercantil (art. 397.° do CCom),
de depósito mercantil (art. 403.° do CCom), de compra e venda mercantil (art. 463.° do
CCom) ou de aluguer mercantil (art. 481.° do CCom) -, quer ainda os regulados em
legislação mercantil extravagante - como é o caso, por exemplo, do contrato de agência
(Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de Julho) ou do contrato de consórcio e de associação em
participação (Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de Julho).

Por outro lado, seriam ainda comerciais todos aqueles contratos que satisfaçam o
critério subjetivo da comercialidade da segunda parte do citado art. 2° do CCom, ou
seja, de novo recorrendo aos dizeres da lei, "todos os contratos e obrigações dos
comerciantes."
Estão aqui agora abrangidos todos os contratos em que uma ou ambas as partes
possuam o estatuto de comerciante, com exceção daqueles contratos que sejam
essencialmente civis (isto é, constituam contratos que, por definição e em abstrato, são
insuscetíveis de ter qualquer conexão com o exercício do comércio (v.g., casamento do
comerciante) e ainda desde que o contrario não resulte desses mesmos contratos (isto é,
não constituam negócios donde resulte, no caso concreto, serem alheios ao exercício do
comércio do respetivo autor.) 1

Naturalmente empresariais

Designa-se contratos naturalmente empresariais (também denominados


“funcionalmente” empresariais) aqueles contratos cujo tipo legal ou social, não
pressupondo explicitamente ou forçosamente a existência de uma empresa, nasceu
historicamente e encontra-se ainda hoje intimamente conexo à atividade empresarial.
Ou seja, a empresa, conquanto não constituindo um pressuposto necessário, é
pressuposto normal ou comum da respetiva celebração: trata-se de negócios jurídicos
que, em abstrato, podem também ser celebrados por simples particulares e para
finalidades meramente civis, mas que, por norma ou naturalmente, tem como (pelo
menos uma) parte contratante um sujeito jurídico titular de uma empresa ou vão
preordenados à constituição, organização ou desenvolvimento de atividade
empresariais.

Este conjunto de contratos, legal ou socialmente típicos, é extremamente vasto,


podendo ser subdividido em várias categorias. Entre estas, podem mencionar-se
diversos contratos de associação e cooperação económica, que têm por objetivo
fundamental proceder à organização jurídica das empresas, do seu funcionamento
interno ou das suas relações externas: estão neste primeiro grupo os contratos de
sociedade (art. 980.° do CCivil e art. 7.o do CSC), os contratos parassociais (art. 17.o do
CSC), os contratos constitutivos de empresas não societárias, os contratos de consórcio

1
Exemplo dono do stand de automóveis celebra compra e venda de determinado veículo para
fins puramente pessoais ou familiares). Se ali o que decide da natureza ou relevância jurídico-comercial
de um determinado contrato é a natureza do contrato em si mesmo, independentemente da qualidade do
respetivo autor (comercialidade “in re”), aqui o que decide dessa natureza ou relevância é
fundamentalmente o estatuto do comerciante de quem o pratica (comercialidade “in persona”).
e de associação em participação (Decreto-Lei n.º 231/81, de 28 de Julho), os contratos
de subordinação (art. 493.° do CSC), ou os contratos de empresa comum. Um outro
grupo é constituído pelos contratos de negociação de empresa, que têm por objeto
precípuo a transmissão empresarial, definitiva ou temporária, direta ou indireta: é o caso
do trespasse e locação de estabelecimento comercial (arts. 1109.° e 1112. ° CCivil), dos
contratos de fusão e de cisão societária (arts. 94.° e 118. ° do CSC), dos contratos de
compra e venda de participação sociais, ou dos contratos de "management buy-out”.

Um terceiro grupo é representado pelos contratos de distribuição comercial, que


têm por objetivo fundamental regular as relações entre produtores e distribuidores em
sentido amplo, tais como o contrato de agência ou representação comercial (Decreto-
Lei. 178/86, de 3 de julho), o contrato de comissão (arts. 266. e do CCom), o contrato
de concessão comercial, o contrato de franquia, o contrato de mediação, e ainda outros
contratos particulares (contratos de distribuição exclusiva, de distribuição autorizada).
Mas outras categorias poderiam ainda ser enumeradas.

Outras Qualificações

Como é próprio das tipologias doutrinais, várias outras classificações têm sido
elaboradas e ensaiadas na literatura especializada, com base nos mais diversos critérios
de natureza jurídica ou económica.

Assim, com fundamento num critério de natureza económica (que atende às


finalidades ou à função económica dos contratos), uma parte da doutrina estrangeira
ordena os contratos comerciais em contratos de organização e cooperação empresarial -
que têm por objeto proceder à constituição e organização jurídica das empresas
("maxime"', sociedade) ou à sua recíproca colaboração (v.g., consórcio, "joint venture"),
- contratos financeiros - que têm por objeto a contratação relativa ao exercício de
atividades financeira sem sentido lato, "rectius", das atividades pertencentes aos
mercados de crédito (contratos bancários), de capitais (contratos sobre instrumentos
financeiros) e de risco (contratos de seguro) - contratos de distribuição comercial - que
têm por objeto assegurar os circuitos económicos de circulação dos bens e serviços
(v.g., agência, concessão comercial, franquia) – e contratos de promoção de negócios -
que visam promover a atividade negocial (v.g., mediação, publicidade, patrocínio).

Outros, adotando um critério de natureza técnico-jurídica, ordenam os contratos


comerciais lançando essencialmente mão das classificações tradicionais desenvolvidas
pela doutrina jusprivatista para os contratos em geral - por exemplo, distinguindo entre
contratos mercantis formais e consensuais, contratos mercantis nominados e
inominados, contratos mercantis típicos, contratos mercantis simples e mistos, contratos
comerciais de execução instantânea ou permanente, e assim por diante. Ou, adotando
critérios de natureza sistemática, agrupam tais contratos com base nas próprias divisões
gerais do ordenamento jusprivativo - por exemplo, contradistinguindo os contratos
comerciais (entendidos como contratos celebrados entre empresas) dos contratos de
consumo (celebrados entre empresas e consumidores) e contratos civis (celebrados entre
particulares).

Os contratos comerciais como contratos de empresa. O caso dos


critérios mercantis clássicos.

Em nosso entender, esta visão tradicional é de recusar, a vários títulos. Em


primeiro lugar os critérios clássicos da comercialidade encontram-se hoje postos em
causa, dado que os conceitos-chave centenários em que assentam – “ato de comercio” e
“comerciante” -, forjados para realidades económicas que distam de nós em mais de um
século e de há muito ultrapassadas, deixaram de conseguir retratar fielmente o universo
do Direito Comercial atual. Ora, este anacronismo dos critérios tradicionais da
mercantilidade não poderia deixar de se projetar também, e muito em particular, naquele
que constitui o primordial tipo de ato jurídico-comercial ("lato sensu") - o contrato
comercial.

Relativamente à categoria dos contratos comerciais "objetivos” o elenco legal


previsto no Código Comercial de 1888, decorrido mais de um século sobre a sua
promulgação, representa hoje essencialmente uma venerável relíquia do passado,
totalmente incapaz de refletir a riqueza e complexidade do universo da contratação
mercantil na atualidade.
Para tanto bastará recordar, entre os muitos fundamentos dessa desatualização
que mais de metade das normas daquele elenco legal centenário foram revogadas (dos
originários 389 perceitos apenas subsistem hoje em vigor cerca de 151), que os tipos
contratuais mais relevantes nele previstos foram entretanto objeto de uma regulação
autónoma extremamente densa e complexa (é o caso do contrato de sociedade, dos
contratos bancários e dos contratos de bolsa), e, sobretudo, que dele submergiram
completamente *** massa verdadeiramente aluvional de novos contratos comerciais
progressivamente forjados na pratica dos “mercatore” ou consagrados em legislação
mercantil extravagante (exemplo contratos de agencia, concessão comercial, cessão
financeira, locação financeira, franquia, …)

E algo de semelhante se passa relativamente à categoria dos contratos comerciais


"subjetivos". Não carecerá decerto de especial demonstração a circunstância, hoje
visível a olho nu, de que a evolução da realidade económica posterior à aprovação do
Código Comercial de 1888 conduziu paulatinamente a que a figura tradicional do
comerciante tenha sido suplantada pela figura do empresário. De facto, ressalvados
casos pontuais que têm tanto de residual quanto de pitoresco (remetendo-nos para
tempos e lugares económicos que hoje nos fazem sorrir: v.g., vendedores ambulantes,
feirantes, pequenos especuladores de bolsa, pequenos agentes comerciais), a exploração
profissional de atividades económicas, sejam elas civis ou comerciais, é hoje sempre
realizada através de uma organização empresarial, por mínima ou rudimentar que esta
seja.
Contrato de mútuo.

Desde logo, serão comerciais todos aqueles contratos que preencham o critério
objetivo da comercialidade previsto na primeira parte do art. 2 CCom., ou seja,
utilizando a terminologia da própria lei, todos aqueles "que se acharem especialmente
regulados neste Código"

O contrato de mútuo é um contrato de crédito, oneroso, unilateral e real quanto à


constituição, nos termos do art. 1142.º do CC, que pode ser ou não garantido (v.g.
fiança, penhor, hipoteca, cessão de créditos em garantia) e pode também, ser escopo
(como é frequentemente o caso do mútuo bancário) ou simples (consoante o mutuante
se obriga a emprestar essa quantia para determinado fim).

É o contrato pelo qual uma parte entrega a outra um conjunto de bens fungíveis,
obrigando-se este a restituir esses bens decorrido um determinado período. Ele não tem
necessariamente dinheiro por objeto (podendo tratar-se de outras coisas fungíveis), mas
aqui, o mútuo será quase sempre um mútuo pecuniário.

Sendo um contrato real quanto à constituição, para o contrato estar celebrado,


não é suficiente o acordo, sendo necessário também a entrega da coisa (antes da quantia
ser entregue, não existe um contrato).

Note-se que as partes, ao abrigo da liberdade contratual, podem celebrar um


contrato de mútuo que seja simplesmente consensual e não real quanto à constituição,
ou seja, um mútuo atípico:

a) É possível as partes, ao abrigo da liberdade contratual, celebrarem mútuos


consensuais em que o contrato se conclui desde logo pelo acordo, sem
necessidade da entrega, sendo que a entrega será um dever nesse contrato.
b) Para tanto, as partes têm de acordar nesse sentido pois se estas nada tiverem
acordado, será necessário a entrega da coisa pois aplicar-se-á o regime legal
do contrato de mútuo.

Celebrado o contrato, só existem deveres para o mutuário (devolver a quantia e,


sendo o contrato oneroso, pagar os juros – Art. 1145.º, n.º 1, CC).

Mútuo comercial

O contrato de mútuo comercial está previsto nos arts. 394.º a 396.º do CCom,
estando ainda sujeito subsidiariamente às normas juscivilisticas gerais em sede de
mútuo (art. 1142.º e ss. Do CC). Estaremos face a ele quando a quantia mutuada se
destinar à prática de um ato comercial (ex. se for emprestada uma quantia a uma
sociedade comercial, será sempre um mútuo comercial pois esta vai destinar a quantia à
sua atividade, não revela assim, em princípio, a qualidade civil, ainda que celebrado
entre dois comerciantes, não terá natureza comercial, assim como um empréstimo
destinado a uma atividade comercial não perderá essa natureza pelo facto de uma ou
ambas as partes serem meros particulares – tal não significa que seja irrelevante a
qualidade de comerciante: por força ad presunção geral da comercialidade dos atos dos
comerciantes, nos termos do art. 2.º, 2ª parte CCom, todos os empréstimos contraídos
ou concedidos por comerciantes serão comerciais, exceto quando se prove que aqueles
são alheios ou impertinentes ao comércio desenvolvido pelo seu autor.).

O mútuo é sempre oneroso na falta de previsão específica, quanto à taxa aplica-


se a taxa legal e o mútuo possui liberdade de forma, nos termos do art. 395.º e 102.º
CCom.

Contrato de mútuo bancário

Encontra-se previsto no art. 362.º do CCom, não carecendo de forma quando


seja celebrado entre comerciantes (art. 394.º e 396.º CCom).

Este não é um contrato real quanto à sua constituição, mas sim um mútuo
consensual, socialmente típico no comércio bancário. Releve-se que não se pode falar
da entrega de notas ou moedas sendo que a entrega consiste quando o banco credita essa
soma na conta do mutuário. O mútuo transmite a propriedade das coisas mutuadas – art.
1144º CC (esta norma estava pensada peara aqueles casos em que eram entregues notas
e moedas, no mútuo bancário tal não sucede pois esse processa-se por crédito em
conta).2

O mútuo bancário é sempre oneroso, a sua contrapartida são os juros, obrigações


duradouras e periódicas, que consistem na contrapartida da disponibilização do capital
durante esse período. O não pagamento dos juros, dá, por si só, lugar à resolução do
contrato pois não é necessário converter a mora em incumprimento definitivo, mas já o
será se o incumprimento respeitar à obrigação de capital. Se, no entanto, o contrato for
resolvido, por força do art. 434.º, n.º 2 CC, os juros já recebidos não têm de ser
restituídos pois a resolução não tem efeitos retroativos.

O art. 1146.º CC estabelece limites para o estabelecimento da taxa de juros


sendo que, quando os juros ultrapassem esse limite, são considerados juros usurários e
são, nos termos do art. 1146.º, n.º 3 CC, reduzidos automaticamente à taxa de juro legal.

a) Se estivermos face a juros remuneratórios, ou seja, aqueles juros que vidam


remunerar a disponibilidade do capital durante um determinado período, os
limites máximos são de:
 3% somados à taxa de juro legal (4%) se o crédito estiver protegido
por uma garantia real (ex. hipoteca).
 Se o crédito não estiver protegido por uma garantia real, o limite é de
5% acrescentado à taxa de juro legal 6%.
b) Se estivermos face a juros moratórios, ou seja, aqueles que decorrem do
atraso no pagamento, os limites são de:
 7% acrescidos à taxa legal se houver garantia real.
 Caso não haja garantia real, os limites são de 9% acrescidos à taxa
legal.

Estes limites aplicam-se aos empréstimos bancários ao contrário do que é


defendido pela doutrina, que se apoia no aviso do Banco de Portugal que não tem esse
significado, mas, mesmo que o tivesse, a verdade é que um aviso que tem um caráter
2
Sendo o empréstimo mercantil destinado a ato mercantil, isto é, a uma operação lucrativa,
justo era que ele fosse também havido como ato naturalmente lucrativo ou oneroso”. Finalmente, ao
invés do mútuo civil (sujeito obrigatoriamente a forma solene ou escrito assinado pelo mutuário quando
o seu valor for superior, respetivamente a 25.000 e 2.500€: cf. Art. 1143.º CC), vigora no domínio do
empréstimo celebrado entre empréstimos um princípio geral fde liberdade de forma e prova. (Questão
muito controversa na doutrina é a de saber se o empréstimo mercantil talqualmente o civil (art. 1114.º
do CC), constitui um contrato real “quod constitutionem”, cuja dormação está dependente da entrega ou
“traditio” do objeto mutuado ao mutuário.
regulamentar não pode afastar uma lei geral da República que prevalece sempre sobre
ele.

Existem ainda outras modalidades de mútuo previstas na lei e que possuem


regimes específicos, como é o caso do mútuo para aquisição de imóveis, neste regime
protege-se o mutuário, os contratos de empréstimo de instrumentos financeiros (art.
350.º do CVM), dos contratos de crédito ao consumo, dos contratos de suprimento
societários, dos chamados empréstimos obrigacionais e assim por diante.

Forma

O princípio do consensualismo, consagrado no art. 219.º do Civil e aplicável aos


contratos comerciais por força do art. 3. ° do CCom, determina que as partes de um
contrato são livres de eleger qualquer tipo de forma: em via geral, pois, dir-se-ia que a
celebração dos contratos mercantis - tanto quanto os contratos civis - não está sujeita a
qualquer forma especial, podendo a vontade das partes ser exteriorizada por qualquer
via juridicamente relevante (oral ou escrita, física ou eletrónica). De acordo com
reputados comercialistas, este traço seria mesmo particularmente marcante e distintivo
do próprio direito comercial no seu conjunto, que tenderia a ser um direito isento de
formalismo.

A verdade, todavia, é que se assiste hoje a um inequívoco renascimento do


formalismo" no âmbito do Direito Comercial, bem patente no âmbito concreto da
contratação mercantil.

Bem vistas as coisas, este fenómeno não nos deve surpreender demasiado se se
tiver na devida conta que o Direito Comercial constitui um ramo que, além do interesse
da celeridade das transações comerciais, persegue ainda o interesse, de igual dignidade e
por vezes antagónico, da segurança e certeza jurídica das mesmas. Este antagonismo
axiológico tem sido assim responsável, ao longo da história deste ramo jurídico, por
uma oscilação cíclica entre regulações consensualistas e formalistas: se, por um lado, o
ordenamento jusmercantil exibe tradicionalmente uma tendência para a simplificação do
formalismo dos atos e relações jusmercantis (vejam-se os exemplos paradigmáticos da
relevância jurídica da correspondência telegráfica, da força probatória especial da
escrita comercial, ou do regime de determinados contratos mercantis especiais: cf. arts.
44.°, 97. °, 396. °, e 400.° do CCom), não menos verdade é que, por outro lado, se vem
acentuando recentemente um fenómeno inverso de recrudescimento desse formalismo.
Ora, como veremos melhor já a seguir, este fenómeno é particularmente notório no
domínio da contratação mercantil: semelhante formalismo pode ser fonte jurídico-
convencional, resultante da vontade dos próprios comerciantes (de que a prática dos
contratos de adesão constitui uma eloquente ilustração) ou de fonte jurídico-legal,
resultante de determinação do próprio legislador.

A razão de ser, o alcance e a natureza deste formalismo negocial mercantil são


bastante heterogéneos e complexos.

No que concerne aos seus fundamentos, a imposição de uma forma contratual


obrigatória pode ter a si subjacente uma variedade de motivos consoante os diferentes
contratos mercantis concretos, incluindo a segurança jurídica das transações comerciais,
a proteção da contraparte contratual contra a sua precipitação de debilidade negocial
(v.g., "maxime", nos contratos celebrados entre empresários e consumidores, ou entre
grandes e pequenos empresários), e a publicidade externa dos contratos com vista à
tutela dos interesses de terceiros e do tráfico jurídico geral (v.g., contrato de sociedade).
No que respeita ao seu alcance, a exigência de forma pode gerar diferentes tipos de
consequências jurídicas, desde efeitos absolutos ou "ad substantiam" (requisito de
validade negocial) - pense-se,"ex multi", em casos tão variados quanto os do contrato de
sociedade ou dos negócios relativos a títulos de crédito- até efeitos relativos ou "ad
probationem" (mero meio de prova negocial) – é o caso da apólice nos contratos de
seguro e dos contratos de empréstimo mercantil e penhor mercantil. Por fim,
relativamente à sua natureza, o formalismo negocial mercantil parece ser de um novo
género, bastante diverso daquele que tradicionalmente se observa no direito civil
comum, que vem sendo por vezes apelidado de “neoformalismo”: na verdade, para
alguns sectores da negociação mercantil, estamos frequentemente diante um formalismo
que sacrifica a realidade à aparência, ou a substancia à forma, consubstanciando-se
numa objetivização das obrigações e numa rigidez dos regimes jurídicos que lhe vão
associados.

Onerosidade

Outro aspeto importante consiste no princípio da onerosidade das obrigações


comerciais, segundo o qual à prestação patrimonial efetuada por uma das partes deve
corresponder uma atribuição ou contraprestação equivalente da outra parte.
Sendo a atividade comercial, hoje como sempre, uma atividade
precipuamente dirigida ao lucro, é crucial que nenhuma obrigação comercial se possa
presumir contraída sem a respetiva contrapartida.

Deste modo, ao passo que, no domínio juscivilistico, vigora em geral o


principio da liberdade do carácter oneroso ou gratuito dos negócios jurídicos (com
profundos reflexos no respetivo regime jurídico), no domínio jusmercantil existem
inúmeras disposições legais onde emerge claramente a não gratuitidade dos negócios e
atos comerciais: bastara para tanto atentar, por exemplo, que os contratos de mandato e
de deposito mercantis se presumem remunerado que o contrato de conta-corrente estatui
o vencimento de juros das quantias creditaras, que os contratos e operações bancarias
retira, a sua comercialidade da circunstancia de serem destinados a realizar “lucros
sobre numerário”, que o contrato de empréstimo comercial é sempre retribuído (art. 395
do Ccom) que o contrato de depósito de mercadorias vence juros em caso de mutuo
sobre o penhor das mercadorias depositadas (415.º), ou que os signatários de negócios
cambiários à vista ou a certos termo de vista podem estabelecer cláusulas de juros.

Juros comerciais

Uma das normas da lei comercial onde mais claramente aflora tal princípio é a
do art. 102. ° do CCom , que determina as regras em matéria do decurso e da contagem
dos juros relativos às obrigações comerciais.

Em via geral, os juros podem definir-se como os frutos civis, constituídos por
coisas fungíveis (em regra, mas não necessariamente, dinheiro), que representam o
rendimento de uma obrigação de capital (isto é, uma obrigação que tem por objeto
valores pecuniários oi outros bens fungíveis), vencível pelo simples decurso do tempo.
Na aceção mais corrente, o juro é visto como a soma pecuniária cujo cômputo se obstem
mediante a aplicação da fórmula J=C (t) (p), em que J representa o montante de juros, C
representa o montante da obrigação de capital (expressa em moeda com curso legal) (t)
representa a taxa percentual aplicável e (p) representa o prazo ou período temporal
relevante.

Dado que a lei comercial lhes faz corresponder regimes diversos, convém
começar por distinguir aqui entre vários tipos ou espécies de juros. Por um lado,
atendendo à sua fonte imediata, os juros podem ser classificados como juros legais e
juros convencionais: os primeiros são aqueles que resultam diretamente da lei, ao passo
que os últimos são aqueles que são fixados por vontade das partes. Por outro lado,
atendendo agora à respetiva função, os juros (tanto legais como convencionais) podem,
por sua vez, dividir-se em juros remuneratórios e juros moratórios: os primeiros são
aqueles que constituíam para o credor uma contrapartida pela cedência de capital ou
valor pecuniariamente avaliável ao devedor, ao passo que os últimos representam para o
credor uma indemnização pelos prejuízos causados pela mora do devedor no
cumprimento da respetiva obrigação. Finalmente, quanto ao seu pagamento, podem
distinguir-se entre juros postecipados e juros antecipados: ao passo que os primeiros são
pagos no termo do período legal ou contratual da respetiva contagem, os últimos
designam o caso excecional dos juros que são pagos no início desse prazo ou dobrados
“à cabeça”.

Juros comerciais legais

O regime em matéria de juros legais das obrigações comerciais vigora sempre


que haja lugar à contagem de juros por força da lei (sejam estes remuneratórios ou
moratórios) e as partes contratantes nada tenham expressamente convencionado (ou
então, tendo acordado o vencimento de juros, hajam omitido a fixação da respetiva taxa
ou quantitativo).

O corpo do art. 102. do CCom estabelece que, no silêncio das partes, haverá
lugar à contagem dos juros em dois casos fundamentais: sempre que "for (...) de direito
vencerem-se" e "nos mais casos especiais fixados no presente Código". O primeiro caso
parece reportar-se àquelas hipóteses em que a própria lei geral ou comum comina uma
obrigação de juros: haverá assim lugar à contagem de juros sempre que uma relação
jurídico-mercantil se insira ou subsuma numa daquelas situações previstas na lei civil
relativamente às quais haja lugar à contagem de juros, tais como, por exemplo, nas
obrigações pecuniárias (art. 806. ° do CC), com contratos de mútuo art. 1145.º do CC)
nos contratos de mandato ou nos contratos de deposito. Já segundo dos casos referidos
parece apontar para aquelas outras hipóteses em que a própria lei comercial a cominar
idêntica obrigação: para nos ficarmos apenas pelo código comercial, haverá assim lugar
a contagem de juros nas hipóteses contemplarás nos contratos de mandato mercantil, de
conta-corrente, de empréstimo mercantil ou de deposito de géneros e mercadorias.) ou
ed deposito ed géneros e mercadorias (art. 4153.

Qual o regime dos juros legais?


A norma central na matéria encontra-se prevista no 3 ° do CCom, que reza o
seguinte: "os juros moratórios legais e os estabelecidos sem determinação de taxa ou
quantitativo legais relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas
comerciais - singulares ou coletivas, são fixados em portarias conjunta dos Ministros
das Finanças e da Justiça". De acordo com a interpretação que fazemos deste preceito,
os juros convencionais sem taxa, sejam moratórios ou remuneratórios, relativos às
obrigações comerciais estão sujeitos a uma taxa de 8 por cento.

Os fundamentos deste entendimento, bem como o âmbito, conteúdo e


pressupostos do regime geral em apreço, justificam alguns esclarecimentos
suplementares.

Desde logo, no que concerne ao âmbito subjetivo do regime legal, têm-se


suscitado na doutrina e jurisprudência portuguesa algumas dúvidas sobre o sentido da
expressão legal empresas comerciais singulares e coletivas".

Não obstante existam autores e arrestos que consideram como aqui relevantes
apenas as entidades que desenvolvam uma das atividades empresariais referidas no art.
230. Do CCom. Propendemos a interpretar a expressão legal no sentido de considerar
abrangidas quaisquer pessoas físicas ou coletivas, titulares de uma empresa, no
exercício da sua atividade empresarial. Ou seja, em nosso entender, o regime em apreço
é aplicável aos créditos e (débitos, como veremos) emergentes de contratos celebrados
por quaisquer empresários singulares (V.g., empresários em nome individual, empresas
"conjugais" ou "hereditárias") ou coletivos (“máxime” sociedades, agrupamentos
complementares de empresas, cooperativas, empresas publicas): ponto é que tais
contratos possuam uma concreta conexão com o exercício da respetiva atividade
empresarial (conexão essa que, de resto, é mesmo presumida já em via geral, nos termos
dos arts. 2.° e 15.° do CCom), deixando assim de fora apenas aqueles outros que a esta
atividade sejam alheios ou impertinentes (por exemplo, negócios pessoais ou familiares
de um empresário em nome individual).
Depois ainda, quanto ao seu âmbito objetivo, o regime do art. 102, $3 do CCom
deve considerar-se como indistintamente aplicável aos créditos e débitos emergentes de
contratos comerciais para os referidos empresários.

Muito embora a letra da lei possa inculcar ideia diversa (ao falar dos créditos
que sejam titulares” estes sujeitos), justifica-se adotar aqui uma interpretação extensiva
dos dizeres legais, considerando como igualmente relevantes as obrigações contratuais
jusmercantis nas quais aqueles sujeitos assumem a posição de devedor, tanto mais que,
por força do DL n.º 32/2003, de 17 de fevereiro, o regime especial de juros moratórios
passou a ser aplicável a todas as obrigações pecuniárias emergentes de transações
interempresarial (abrangendo assim, necessária e simultaneamente, os créditos e os
débitos pecuniários de empresas). Vistas as coisas de um outro prisma, pode afirmar-se
que o regime legal em causa se aplica aos juros relativos a obrigações de pagamento
relativas a contratos bilaterais ou unilateralmente comerciais, celebrados entre
empresários ou celebrados entre um empresário e outras entidades publicas (estado,
autarquias locais) ou privado (consumidores).

Depois também, quanto ao seu conteúdo, importa sublinhar que o regime em


referência é aplicável ao vencimento de todos os tipos de juros legais e juros
convencionais sem taxa: ou seja, a taxa supletiva ficada ao abrigo do $3 e $4 do art. 102
do CCom vigorará relativamente a todas as obrigações pecuniárias emergentes de
créditos/débitos contratuais de empresários singulares ou coletivos relativamente às
quais a lei determine (ou as partes convencionem, omitindo, contudo, o respetivo
quantitativo ou percentual) a contagem de todo o tipo de juros, sejam eles moratórios ou
compensatórios.

E certo de que a letra do $3 do art. 102. ° do CCom se refere exclusivamente aos


juros legais "moratórios", parecendo assim excluir os juros remuneratórios: em face
desta redação legal, sempre seria possível sustentar que estes últimos juros estão
sujeitos à taxa geral das obrigações civis, prevista no art. 559. °, n°. 1 do CCivil. Esta
solução, todavia, afigura-se-nos de recusar, por várias razões: "primus", porque a nova
redação do art. 102, $2 do CCom, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de
fevereiro, justamente eliminou a anterior remissão para o citado preceito da lei civil;
"secundus", porque o preenchimento da atual lacuna legal, de acordo com os cânones
hermenêuticos gerais fixados no art. 3.° do CCom, deveria ser sempre obtido através do
recurso prioritário à aplicação analógica dos regimes da lei comercial, e não da lei civil;
e "tertius", porque não se descortina razão bastante para a manutenção de taxas
diferenciadas em matéria de juros legais das obrigações comerciais, apresentando-se
como mais consistente a existência de um regime unitário.

Uma palavra ainda sobre o montante quantitativo ou percentual da taxa de juro.


Em cumprimento do contrato do comando da diretiva 2000/35/CÊ, de 29 de junho, o $4
do art. 102.º do CCom veio determinar que a taxa supletiva ficada pelo legislador
nacional, ao abrigo do $3 do mesmo preceito, não poderia ser inferior a taxa de
referência do banco central europeu (ou seja, à taxa de juro aplicada à sua mais recente
operação principal de refinanciamento) acrescida de sete ponto percentuais. Ora, ao
contrário de muitos outros ordenamentos europeus, é mister frisar que o legislador
português decidiu alinhar a taxa supletiva pelo limiar mínimo imperativo fixado pelo
legislador comunitário: com efeito, recorde-se que a taxa de referência do banco central
europeu em vigor é de 1 por cento (sendo periodicamente comunicada ao mercado
financeiro), o que, acrescida dos referidos 7 por cento percentuais, explica o valor de 8
por cento que se encontra atualmente em vigor em Portugal.

A concluir, a par do citado regime geral dos juros legais comerciais, haverá ainda
que ter em atenção a existência de determinados regimes específicos aplicáveis a certas
obrigações mercantis particulares. Especialmente relevantes são as normas sobre os
chamados juros bancários, previstas genericamente no Decreto. Lei n.º 344/78, de 17 de
Novembro: entre outras especialidades, tais disposições permitem - em sede de juros
remuneratórios - a sua cobrança antecipada em operações de desconto de letras, extratos
de fatura e "warrants" (art. 5.°, n.º 1) bem assim como a capitalização de juros vencidos
há mais de três meses (art. 5.°, n° 6), além de prever - em sede de juros moratórios – a
possibilidade de se convencionar a cobrança de uma sobretaxa supletiva de %2 (art. 7.°,
n.º 1), não podendo nunca, porém, o montante total superar em 4% o valor das taxas
compensatórias (art. 7.°, n.º 3).

Juros comerciais convencionais


Em matéria de juros convencionais das obrigações comerciais, vigora o princípio
da liberdade da fixação pelas partes, consagrado no corpo do art. 102 CCom. Tal
princípio geral, todavia, encontra-se sujeito a algumas importantes restrições.

Desde logo, em homenagem aos interesses da segurança e certeza das transações


comerciais, a lei comercial tornou obrigatória a forma escrita, quer para a fixação
convencional da taxa de juros (remuneratórios e moratórios) de débitos comerciais, quer
para a respetiva modificação posterior.

Porventura impressionada com o alcance desta exigência formal, uma parte da


doutrina portuguesa chegou a sustentar uma interpretação restritiva do art. 102.° do
CCom, de forma a considerar obrigatória a redução a escrito apenas no caso de a
obrigação comercial resultar de ato para o qual se exigisse forma excita, ou em
conjugação com o art. 559/2 do CC (que apenas exige tal forma quando a taxa de juro
convencionada pelas partes for superior à taxa de juros legais), no caso de as partes da
obrigação comercial pretenderem convencionar taxa de juros superior à legal. Tal
entendimento, contudo, afigura-se de rejeitar: duma banda, ao preceituar que "a taxa de
juros comerciais só pode ser fixada por escrito" ($1 do art. 102. do CCom), a letra da lei
é bastante clara em não estabelecer qualquer distinção quanto à forma do ato a que se
reportam os juros, circunstância essa que, à luz da máxima hermenêutica consagrada
"ubi elx non distinguit nec nos", logo parece desfavorecer semelhante interpretação
restritiva dos dizeres legais; doutra banda, o espírito da lei concorre na mesma direção,
dado que a própria celeridade e certeza do crédito comercial dificilmente se
compaginaria com a instabilidade da sua fixação por mera via oral e com as morosas
operações probatórias que aquela sempre suscitaria, abrindo ademais a porta à ocultação
de juros usurários. Em suma, pois, toda a estipulação ou modificação de uma taxa de
juros comerciais, diversamente do que sucede para os juros civis, deverá constar de
documento escrito, sob pena de ser nula por falta de forma e ser consequentemente
suprida pela taxa legal.

Depois ainda, em homenagem a princípios de ordem publica, são proibidos os


juros convencionais usuários. Assim, por força dos art. 559-A e 1146 do CC (aplicáveis
ao abrigo no n.2 do art. 102 do CCom (, jamais poderão as partes de uma obrigação
comercial convencionar juros superiores a 3 por cento ou 5 por cento à taxa de juros
legais, consoante respetivamente exista ou não garantia real que assegure o respetivo
cumprimento, bem como convencionar cláusula penal que exceda aquela taxa,
relativamente ao tempo da mora, em 7 ou 9 por cento, consoante de novo exista ou
inexistência garantia real.

Finalmente, há ainda a considerar a proibição genérica do anatocismo


estabelecida no art.560° do CCivil, ou seja, do vencimento de juros sobre juros (por isso
também conhecida por usura dobrada).

Para as obrigações civis e comerciais, a regra é a de que a capitalização de juros


é uma prática proibida: os juros vencidos destas obrigações apenas poderão ser
capitalizados quando exista convenção das partes nesse sentido posterior ao vencimento
daqueles juros ou então quando o devedor haja sido notificado judicialmente para
capitalizar os juros ou proceder ao respetivo pagamento, sob pena de capitalização (art.
560.°, n.º do CCivil) - em qualquer dos casos, apenas poderão ser capitalizados os juros
correspondentes a período igual ou superior a um ano (art. 560. , n.º 2do CCivil).
Sublinhe-se, todavia, que estas restrições à prática do anatocismo poderão já não ser
aplicáveis quando se puderem considerar como "contrárias as regras ou usos
particulares do comércio" (art. 560.°, n.º 3 do CCivil): entre essas regras e usos estarão,
por exemplo, os usos bancários, onde se tornou corrente a capitalização dos juros
correspondentes a depósitos bancários independentemente de convenção e sem se
atender ao prazo respetivo, inclusive para depósitos inferiores a um ano.

Prova

Paralelamente a estes regimes probatórios aplicáveis à contratação mercantil em


geral, existem também regras probatórias especiais que apenas se aplicam a
determinados contratos mercantis individuais.

Está neste caso o contrato de empréstimo mercantil. Ao passo que o art. 1143.CC
prescreve para o mútuo civil a obrigatoriedade de forma solene ou de documento escrito
assinado pelo mutuário (quando o seu valor for superior, respetivamente a 25.000 e
2.500 euros), o art. 396° do CCom estabelece que o empréstimo mercantil celebrado
entre comerciantes admite qualquer género de prova. (Como é evidente, aqui o princípio
geral da liberdade de prova tem também o significado de um princípio de liberdade de
forma, já que não faria muito sentido admitir a prova de um empréstimo nulo por falta
de forma.)
Cumpre, todavia, chamar aqui a atenção para algumas especialidades.
Por um lado, o regime jusmercantil apenas é aplicável aos empréstimos mercantis
celebrados entre comerciantes: significa isto que, em princípio, ficarão já sujeitos às
regras gerais do civil os empréstimos mercantis nos quais uma das partes não seja
comerciante. Por outro lado, há também que não perder de vista a existência de certos
tipos específicos do empréstimo mercantis, ora disciplinados por regras especiais –
como é o caso por exemplo das regras relativas aos contratos de mútuo celebrados por
instituições bancarias – ora, carecidos de tratamento autónomo – como é o caso dos
contratos de credito ao consumo e porventura dos contratos de suprimento nas
sociedades comerciais.

Juros bancários

 Os juros são obrigações duradouras periódicas, ou seja, só se constituem com o


decurso do tempo e são acessórias (dependem de uma obrigação de capital).
 Uma vez constituída a obrigação de capital, o crédito aos juros pode ser
transmitido sem ter de acompanhar necessariamente o crédito ao capital – Art.
561º Código Civil.
 O seu regime geral encontra-se previsto nos Art. 559º-561º Código Civil.
 Quanto à fonte, os juros podem ser convencionais ou legais.
 É possível distinguir 4 tipos de juros:
1. Juros remuneratórios: visam ser o correspetivo da disponibilização do
capital durante esse período de tempo (o preço do capital) – ex. A
empresta 1000 euros a B durante um ano, os juros remuneratórios, de
10%, visam retribuir a disponibilização do capital nesse período.
2. Juro moratórios: consistem numa indemnização pelo atraso no
pagamento de uma obrigação de capital (ex. A empresta a B 1000 euros
durante um mês, se no fim desse mês não lhe for paga essa quantia, A
pode exigir o pagamento de juros de mora).
3. Juros compensatórios: visam compensar o credor por ter sido privado
desse capital durante um determinado período.
4. Juros compulsórios: visam forçar o devedor a cumprir.
 No direito bancário, os juros relevantes são os remuneratórios e os moratórios.
 Os juros podem ter uma taxa fixa ou uma taxa variável.
1. Os juros de taxa fixa são aqueles que estão determinados/calculados logo
aquando da celebração do contrato sendo que a taxa se refere a um valor
não alterável.
2. A taxa de juros variável é aquela que pode sofrer modificações ao longo
do tempo – ex. taxa que varie de acordo com a variação das taxas do
BCE.
 A taxa mista tem um elemento de taxa fixa e um elemento de taxa variável sendo
que a taxa mista é aquela que é comumente utilizada nos empréstimos bancários,
principalmente para aqueles que se destinam a aquisição de habitação.
1. O elemento fixo denomina-se o spread.
2. O elemento variável, em regra, é a taxa Euribor a 6/12 meses e esta faz
variar a taxa de juro – ex. se o spread for de 1% e a Euribor para aquele
período estiver em 0.5%, a taxa a pagar é de 1.5% para aquele período.
3. A Euribor consiste numa taxa que é apurada da seguinte forma:
a) Esta consiste na taxa que um banco de referência que integra um
painel está disposto a emprestar a um outro banco de referência
pertencente a esse mesmo painel sendo que essas taxas são
divulgadas diariamente.
b) Para a taxa ser calculada, esta consiste numa média das taxas que
os bancos desse painel estão dispostos a emprestar aos outros
membros desse painel.
 A capitalização de juros/anatocismo só é permitida nas seguintes condições –
Art. 560º nº1 Código Civil:
1. Mediante convenção posterior ao vencimento.
2. A partir da notificação judicial feita ao devedor para capitalizar os juros
vencidos ou proceder ao seu pagamento sob pena de capitalização.
3. Só podem ser capitalizados os juros correspondentes ao período mínimo
de um ano – Art. 560º nº2 Código Civil.
4. No entanto, no domínio do direito bancário há um regime próprio:
a) Admite-se que os bancos procedam à capitalização de juros
remuneratórios vencidos e não pagos, se houver convenção das
partes reduzida a escrito, com o limite de os mesmos não
poderem ser capitalizados por períodos inferiores a um mês.
b) Dispensa-se qualquer notificação ao devedor para o efeito.
c) A capitalização de juros moratórios só é admitida mediante
acordo escrito entre as partes e no âmbito de reestruturação ou
consolidação de contratos de crédito.
d) Esta convenção das partes deve ser anterior ao vencimento dos
juros.
e) Permite-se ao banco a capitalização de juros, sem necessidade de
convenção em contrário, quando os juros digam respeito a um
período mínimo de um ano.
Consórcio

NOÇÃO:

Define-se como o contrato através do qual duas ou mais empresas, singulares ou


coletivas, se vinculam a realizar concertadamente determinada atividade ou efetuar certa
contribuição com vista a prosseguir um dos tipos de atividade expressamente previstos
na lei.

A figura contratual do consórcio constitui uma expressão legislativa concreta da


necessidade geral sentida no mundo económico, já atrás assinalada, de instrumentos
jurídicos aptos a organizar uma cooperação temporária e limitada entre empresas que
lhes permita, a um tempo, criar vinculações mútuas para efeitos da realização de um
determinado empreendimento, organizando flexivelmente o quadro de relações internas
e externas, e libertar-se dessas amarras logo que tal objetivo tenha sido atingido. Esta
flexibilidade é especialmente marcante no caso do contrato de consórcio, o qual, ao
contrário de outras figuras contratuais de matriz cooperativa afim (v.g., sociedade,
cooperativa, agrupamento complementar de empresas), não dá origem ao nascimento de
uma nova entidade com personalidade jurídica.3

Exemplo: é aberto um concurso público para a concessão da construção,


conservação e exploração de uma grande empreitada (autoestrada), existindo três
empresas da área da construção civil que estão interessadas em unir forças e concorrer
em conjunto: no lugar de constituir uma nova sociedade comum que protagonizasse a
preparação desse concurso (“máxime”, a realização dos estudos prévios determinados
ao no caderno de encargo de obra), poderá revelar-se mais simples, eficaz e flexível
para as empresas interessadas organizar o quadro de cooperação interempresarial
através da celebração entre si de um contrato de consorcio.4

SUJEITOS:

Os sujeitos do contrato de consórcio devem ser "duas ou mais pessoas singulares


ou coletivas que exerçam uma atividade económica" (art. 1. °).

Tal contrato - além de revestir uma natureza formal 5 (art. 3°. n.°1) - representa
assim necessariamente um negócio bilateral ou plurilateral (extinguindo-se logo que,
por qualquer razão desapareça a pluralidade das partes)6, que é tipicamente celebrado
3
O consórcio é, enquanto tal, destituído de qualquer autonomia patrimonial ou personalidade
jurídica própria (ac. RE, 25-11-98, Fonseca Ramos), faltando-lhe mesmo personalidade jurídica ou fiscal.
Como veremos, tal não significa dizer que o mesmo não possa dar origem – e tal será mesmo a regra geral
no caso dos chamados “consórcios externos” – a uma organização interempresarial ou mesmo a uma
empresa consorcial autónoma não personificada por normas legais próprias (arts. 7.º, 12.º a 17.º e 19, DL
n.º 231/81, de 28 de julho.
4
Esta flexibilidade ou plasticidade da figura contratual – corroborada pelo caráter supletivo de
uma boa parte da disciplina legal (arts. 1.º e segs do DL n.º 231/81), bem como pelo princípio
fundamental da liberdade de conformação contratual (art. 4.º, nº1 do mesmo diploma) – explica
porventura a razão do seu sucesso prático, nas mais variadas áreas da atividade económica.
5
Os contratos de consórcio estão sujeitos à forma escrita ou, quando estejam envolvidos
imóveis, a forma mais solene (art. 3º, nº 1), formas essas também aplicáveis, em princípio, no caso da sua
alteração e resolução (art. 6º, n.º 2) – ac. STJ-23-10-1997, Miranda Gusmão.
6
Tal como a celebração de um negócio unilateral de consórcio seria nulo (art. 220º CC), também
a redução à unipessoalidade de um consórcio originalmente plural conduzirá à sua automática cessação
ou termo (art. 11.º, n.º 1, d)). Outras formas de cessação são a exoneração dos consortes (art. 9.º), a
resolução do contrato (art. 10º) e a extinção do contrato (por revogação, caducidade, etc. art. 11.º):
sublinhe-se que a duração supletiva do contrato de consórcio é 10 anos, sendo controvertida a
entre empresários singulares ou coletivos personificados (sociedades comerciais,
cooperativas, fundações, etc.) qualquer que seja o tipo de atividade económica por estes
desenvolvida (que poderá ser comercial ou civil, conexa ou irrelacionada, etc.)7.

Alguma doutrina, todavia, vem interpretando de modo lato a exigência legal no


sentido de permitir que a qualidade de membro de um consórcio seja genericamente
estendida a qualquer entidade com capacidade jusnegocial ainda que destituída de
personalidade jurídica (sociedades civis, sociedades comerciais irregulares,
comproprietários).

OBJETO:

O contrato de consórcio tem em vista a obrigação recíproca das partes


contratantes "de forma concertada, realizar certa atividade ou efetuar certa contribuição"
(fim imediato) "com o fim de prosseguir qual quer dos objetos referidos" na lei (fim
mediato) (art. 1).

Relativamente ao seu fim mediato, o contrato de consórcio pode ter por


finalidade a realização de um dos cinco tipos de atividades concretas previstas no elenco
legal do art. 2.º são elas a realização de atos preparatórios de um determinado
empreendimento ou atividade continua, a execução de um determinado
empreendimento, o fornecimento a terceiros de bens produzidos por cada consorte, a
pesquisa ou exploração de recursos naturais, e a produção de bens repartireis em espécie
entre os consortes.

Será uma lista taxativa ou delimitativa: Enquanto isso, a lei lá segue


impavidamente o seu curso: veja-se assim, por exemplo, o art. 5. ° do Decreto-Lei n.º
72/95, de 15 de Abril, que admite os consórcios no domínio da atividade de "leasing",
ou o art. 341.°do CVM, relativo aos consórcios de intermediários financeiros para
colocação de oferta pública de distribuição.

possibilidade de convenção de prazo superior.


7
No direito italiano, exige-se que as empresas contratantes exerçam atividades económicas
conexas.
Absolutamente central na economia do tipo contratual é, todavia, o seu fim
imediato – “rectius” – a obrigação de concertação em que este se consubstancia. Ao
contrário do que sucede com outros contratos de cooperação (v.g., sociedade,
agrupamento complementar de empresas), no contrato de consórcio a prossecução do
objeto contratual não é realizada em comum mas de forma concertada, o que significa
que cada um dos consortes desenvolve separadamente a respetiva atividade ou
contribuição económica, obrigando-se apenas a coordená-la ou harmonizá-la com as dos
demais consortes no quadro de uma ação concertada ou articulada: entre as
consequências desta obrigação característica, mencionem-se a inadmissibilidade de
consórcios puramente passivos (em que um ou mais consortes se obrigue a meras
prestações de “non facere” (exemplo acordos restritivos de concorrência) e a natureza
“intuitus personae” da relação contratual (assente na confiança reciproca e na igualdade
das partes).8

MODALIDADES:

Importante é também salientar a previsão legal de duas modalidades


fundamentais de consórcio: o consórcio externo e o do consórcio interno (art. 5. °),
consoante aquele é ou não apresentado aos terceiros (ou seja, consoante os consortes
invocam ou não sua qualidade de membro consorcial nas relações externas
estabelecidas com terceiros). No consorcio interno (art.5/1) pode ainda revestir duas
submodalidades, consoante todos os consortes podem estabelecer diretamente relações
com terceiros ou (sem jamais invocar tal qualidade diante destes) apenas um dos
membros o faz (designado por vezes chefe de consorcio “evidente”).

Ao contrário do consórcio interno (cujas especificidades são muito escassas: cf.


art. 18.º), o consórcio externo constitui a modalidade mais relevante e complexa,
caracterizada por um inequívoco reforço da componente organizativa e patrimonial da

8
Ilustrações desta natureza são a regra da unanimidade nas alterações do contrato (art. 6.º) e nas
deliberações do conselho de fiscalização (art. 7.º, n.º 2, a)), a exigência de justa causa em sede da
exoneração de membros do consórcio (art. 9.º), e os vários deveres dos consortes (v.g., deveres
qualificados de colaboração, informação e lealdade: cf. art. 8.º).
cooperação interempresarial de base consorcial.9 Assim, robustecendo o papel da
estrutura organizativa no seio dos consórcios, a lei previu a possibilidade de instituição
de um “conselho de orientação e fiscalização” – composto por todos os consortes, cujo
o funcionamento e competências podem ser supletivamente convencionadas por estes
(art. 7º) - e a obrigatoriedade de designação de um “chefe do consórcio” – o qual, sendo
necessariamente um consorte, é titular de poderes de natureza interna (“maxime”,
organização e implementação da cooperação consorcial cf: art. 14.º) e externa
(“maxime”, poderes de representação no plano das relações com terceiros), sem
prejuízo de outras atribuições, contratualmente previstas – alem de diversas outras
regras próprias, de natureza imperativa (exemplo – em matéria da adoção de uma
denominação própria art. 15.º) ou facultativa (exemplo o caso das chamadas “comissões
técnicas” ou equipas comuns – são um tipo de órgão facultativo que a pratica tem
acolhido amiúde nos consórcios com objeto complexo)

ESTRUTURA PATRIMONIAL:

Relevante é também, finalmente, a disciplina da sua estrutura


patrimonial. Não se pode perder de vista que o legislador veio proibir expressamente a
constituição de fundos comuns em qualquer tipo de consorcio (art. 20/1): aqui de novo,
uma diferença fundamental entre o consórcio e outros contratos de cooperação
(designadamente, a sociedade ou a cooperativa), aos quais é congénita, por definição, a
formação de um património comum entre as partes contratantes10.

Esta proibição legal é criticada por alguns autores, que alertam para as
dificuldades operacionais de financiamento por ela gerados e sugerem vias
alternativas para superação (exemplo celebração de contratos acessórios, entrega
de importância ao chefe de consorcio)

Todavia, em contrapartida, merece ser salientada a possibilidade de, dentro de


certos limites, os membros do consórcio procederem a uma regulamentação por via

9
Ex. externo ac. STJ, 24-2-1999, Silva Paixão; ex. interno ac. RL 16-4-96, Joaquim Dias.
10
contratual da repartição dos lucros e perdas gerados pela atividade consorcial
(redistribuição proporcional interna dos valores recebidos e prejuízos suportados no
âmbito das relações com terceiros: cf. art. 4/1, 16 e 17), bem como da respetiva
responsabilidade (a qual, sendo em regra puramente individual, admite o
encabeçamento representativo na figura do chefe do consórcio, além de diversa
disciplina contratual no plano das relações internas entre aqueles: cf. art. 15/2 e 19)

A ausência de personalidade jurídica e a autonomia patrimonial


do consórcio significa que ele não pode ser titular de débitos e créditos:
sujeitos dos direitos e deveres emergentes das relações estabelecidas
entre os membros do consórcio e os terceiros são os próprios consortes.
Reforçando este entendimento, a lei afastou expressamente qualquer
presunção de solidariedade ativa e passiva entre os consortes (art. 19/1) e
determinou que eventuais obrigações indemnizatórias fundadas em
responsabilidade civil apenas afetam o consorte responsável (art. 19\3).

FORMALISMO:

Nos nossos dias, são extremamente numerosos os contratos mercantis


relativamente aos quais o legislador prescreveu uma exigência de forma especial: a
magnitude deste vetor evolutivo é de tal ordem que é legítimo interrogarmo-nos se o
princípio geral do consensualismo, no Direito Comercial moderno, não se terá já
transformado de regra em exceção.

Desde logo, é mister salientar que os contratos normativamente empresariais,


que pressupõem necessariamente a intervenção de um empresário, correspondem hoje,
“ope legis” ou “ope voluntas”, a verdadeiros contratos formais.

Idênticas exigências de formas às que se operam para os contratos


normativamente formais, podem também ser observadas nos âmbitos dos contratos
naturalmente empresariais, ou seja, dos contratos que são usualmente (embora não
exclusiva ou necessariamente) celebrados por empresários ou conexos ao exercício de
atividades empresariais.
A lista é bastante vasta, cobrindo de novo a grande maioria desta subcategoria
dos contratos mercantis, nesta inserindo-se no contrato de consórcio cf. o art. 3.º do DL
231/81.

CESSAÇÃO CONTRATUAL:

Os contratos comerciais estão sujeitos às causas gerais de cessação dos negócios


jurídicos: tomando aqui esta expressão no seu sentido mais lato - e, reconhecemo-lo sem
rebuço, algo impróprio (que aqui adotamos por razões meramente expositivas),- os
contratos mercantis e os respetivos efeitos podem cessar por força de eventos
contemporâneos à sua formação (nulidade ou anulabilidade) ou de eventos posteriores à
sua celebração (revogação, resolução, denúncia e caducidade).

Esta subordinação ao regime geral não significa, todavia, que a disciplina legal
da contratação mercantil, impregnada dos seus valores próprios, não exiba algumas
especialidades que importa conhecer.

Assim, e desde logo, os contratos comercias estão sujeitos à invalidade em


virtude de vícios genéticos ou contemporâneos à sua formação, seja aquela uma
invalidade absoluta e insanável (nulidade) ou relativa e sanável (anulabilidade).
Todavia, existem vários negócios jusmercantis cujo regime de nulidade ou anulabilidade
se distancia de forma muito significativa do regime geral (art. 285 e ss. do CC).

Existem outras especialidades relativamente aos eventos extintivos posteriores à


celebração dos contratos mercantis, “rectius”, às causas da sua extinção ou cessação:
revogação, resolução, denuncia e caducidade.

Sirvam como exemplo os contratos comerciais de duração longa ou mesmo


indeterminada. O carácter organizado e profissional do exercício das atividades
empresariais explica a frequência com que os contratos comerciais possuem prazos de
duração muito extensos ou mesmo não preveem qualquer prazo de duração (exemplo
contrato de sociedade, de empreendimento comum, DE CONSÓRCIO, de distribuição
comercial, de fornecimento etc.). Não podendo deixar de valer aqui o princípio geral da
ordem pública segundo o qual são proibidas vinculações perpétuas ou excessivamente
duradouras (art. 280 do CC), tal significa dizer que tais contratos comerciais poderão ser
extintos mediante denúncia, a todo o tempo e sem causa justificativa especial, por
qualquer das partes contratantes. Ora, a integração do regime deste direito de denúncia
não pode deixar de ser profundamente tributária das normas e valores específicos do
Direito Comercial e da contratação mercantil. Assim, para alem das normas gerais
eventualmente aplicáveis (vejam-se por exemplo os art. 18.º j) e f) e 22/1 a) e b) da
LCCG), a determinação dos pressupostos e efeitos da denuncia contratual haverá de
arrancar primacialmente das normas especiais previstas pelo legislador comercial:
assim, nos contratos de sociedades comerciais de pessoas com duração indeterminada
ou por período superior a 30 anos, em homenagem aos interesses da estabilidade
empresarial, a “denuncia” dos sócios, que ai recebe a designação de exoneração sem
justa causa, apenas pode ser exercida após o prazo de 10 anos a contar da data de
aquisição da qualidade de socio. Do mesmo modo, nos contratos de associação em
participação com duração indeterminada, idênticas razoes explicam que associaste e
associado apenas disponham da faculdade de denunciar o contrato após o decurso de 10
anos de vigência. Nos contratos de agência por tempo indeterminado, o legislador
consagra já a liberdade de denuncia “ad nutum” e a todo o tempo do principal e do
agente, desde que observados determinados prazos mínimos de pré-aviso (que oscilam
entre um e três meses, em função do período de vigência contratual; e assim
sucessivamente.

Autores há mesmo que chegam a afirmar a existência de


um princípio geral do direito mercantil, extraído de tais normas
especiais, segundo o qual a denúncia dos contratos mercantis sem
prazo está sempre condicionada por uma duração mínima de (falta
a página 325)

CONTRATAÇÃO CONJUNTA:

Porventura de modo ainda mais nítido do que vai já sucedendo no domínio de


alguns contratos civis, um dos modelos mais frequentes da formação dos contratos
comerciais consiste na chamada "contratação conjunta", ou seja, na formação contratual
realizada através de declarações negociais de conteúdo idêntico inseridas num
documento unitário subscrito por ambas as partes.

Na verdade, a celebração de uma boa parte dos contratos comerciais, tanto


clássicos como modernos, consubstancia-se hoje em documentos únicos cuja subscrição
conjunta, dispensando o ritual clássico de oferta e aceitação, exprime em si mesma o
acordo contratual entre as partes.

Assim sucede forçosamente com os contratos comerciais que se encontram


sujeitos por lei à forma escrita (maior parte deles) incluindo os contratos de colaboração
empresarial – o consorcio.

E assim sucede também com vários outros contratos comerciais que, não obstante não
subordinados por lei a qualquer forma especial, carecem frequentemente da unificação dos enunciados
negociais em virtude da sua complexidade técnica ou relevo económico: é o caso de contratos mercantis
atípicos de grande vulto, especialmente internacionais, tais como, por exemplo, os contratos de compra e
venda de empresa ("sale of control", "Beteiligungs- "cessions de contrôle", "pachetti azionari di
controllo") ou os contratos de empreendimento comum ("joint venture").

CONTRATO DE COLOCAÇÃO:

Designam-se genericamente por contratos de colocação os contratos celebrados


entre um ou vários intermediários financeiros e um emitente pelo qual aquele ou aqueles
se obrigam, mediante remuneração, a colocar determinados instrumentos financeiros
(“maxime” valores mobiliários) no âmbito de uma oferta publica de distribuição.

Como é sabido, as ofertas públicas de distribuição encontram-se subordinada a


um princípio geral de intermediação financeira obrigatória: trate-se de ofertas de
subscrição ou de venda, o emitente dos valores mobiliários está vinculado a recorrer aos
serviços de um intermediário financeiro para a respetiva colocação (art. 113. °, n.° 1, a)
do CVM). Este serviço de colocação pode assumir três modalidades fundamentais
(todas elas expressamente qualificadas pelo legislador português como serviços de
investimento cf. art. 290. °, n.º 1, d) do CVM), das quais resultam outras tantas
modalidades contratuais: a colocação simples, a colocação com garantia, e a colocação
com tomada firme.

No contrato de colocação simples, o intermediário financeiro assume


perante o emitente a obrigação de desenvolver os seus melhores esforços tendentes à
distribuição dos valores mobiliários art. 338/1 CVM: estamos, portanto,
fundamentalmente diante de uma obrigação de meios ou de diligencia do entremetíamos
na colocação dos valores, que não se responsabiliza pelo repercutido resultado ou
sucesso, correndo assim o risco da colocação da emissão por conta do emitente.

No contrato de colocação com garantia, o intermediário, para alem da


obrigação anterior, vincula-se ainda a adquirir, para si ou outrem, a totalidade ou parte
dos valores mobiliários que não hajam sido subscritos pelo publico art. 340 CVM: aqui,
pois, diferentemente do caso precedente, o intermediário assume o risco de colocação da
emissão, variando apenas a sua extensão em função do alcance da garantia (total ou
parcial) e da percentagem dos valores mobiliários não colocados.

O contrato com tomada firme, o intermediário obriga-se a subscrever e


adquirir de imediato os valores mobiliários e, posteriormente, a colocar estes junto do
publico por sua própria conta e risco nos termos acordados art. 339/1 CVM: também
aqui o intermediário assume o risco da emissão, só que adquirindo “a priori” e
necessariamente os valores mobiliários antes da própria colocação e não, como sucede
no caso anterior, “a posteriori” e eventualmente após tal colocação, caso tais valores não
viessem a ser integralmente colocados.

Reflexo da complexidade operacional e financeira das ofertas públicas de


distribuição, o legislador prevê também como obrigatória a celebração de um contrato
de assistência (art. 113/a e 337/2 CVM - que dá origem a um contrato autónomo,
adiante estudado no âmbito dos contratos relativos a serviços auxiliares (art. 291.°, e) do
CVM) - e, numa disposição especial relevo, consagra expressamente a possibilidade de
formação de consórcios de colocação: tais consórcios são constituídos com base num
contrato de consorcio celebrado entre dois ou mais intermediários financeiros, mediante
acordo prévio do emitente, cabendo ao chefe do consorcio um papel fundamental na
organização da colocação e na representação dos consortes art. 341.° do CVM).
CESSÃO FINANCEIRA (“FACTORING”)

ENGRÁCIA ANTUNES, insere o contrato de cessão financeira na enorme mole


de contratos de crédito que são abrangidos pela categoria de contratos bancários,
colocando-os por sua vez na classe dos contratos normativamente empresariais.

Dizem-se contratos normativamente empresariais (também ditos


“necessariamente” empresariais) aquele conjunto de contratos típicos em que a empresa
surge como pressuposto normativo ou necessário do próprio tipo legal, ou seja, em que
o legislador elevou a empresa a requisito ou elemento constitutivo da própria “facti-
species” normativa do contrato em questão.

Os critérios clássicos da comercialidade encontram-se hoje postos em causa,


dado que os conceitos-chave centenários em que assentam – “ato de comércio” e
“comerciante” -, forjados para realidades económicas que distam de nós em mais de um
século e de há muito ultrapassadas, deixaram de conseguir retratar fielmente o universo
do Direito Comercial atual. Ora, este anacronismo dos critérios tradicionais da
mercantilidade não poderia deixar de se projetar também, e muito em particular,
naquele que constitui o primordial tipo de ato jurídico-comercial (“lato sensu”) – o
contrato comercial.
Relativamente à categoria dos contratos comercias “objetivos”, o elenco legal
previsto no Código Comercial de 1888, decorrido mais de um século sobre a sua
promulgação, representa hoje essencialmente uma venerável relíquia do passado,
totalmente incapaz de refletir a riqueza e complexidade do universo da contratação
mercantil na atualidade.11

Para tanto bastará recordar, entre os muitos fundamentos dessa desatualização,


que mais de metade das normas daquele elenco legal centenário foram revogados (dos
originários 389 preceitos, apenas subsistem hoje em vigor cerca de 151), que os tipos
contratuais mais relevantes nele previstos foram entretanto objeto de uma regulação
autónoma extremamente densa e complexa (é o caso do contrato de sociedade, dos
contratos bancários e dos contratos de bolsa), e, sobretudo, que ele submergiu
completamente ante a massa verdadeiramente aluvional de novos contratos comerciais
progressivamente forjados na prática dos “mercatore” ou consagrados em legislação
mercantil extravagante (v.g. contratos de agência, concessão comercial, cessão
financeira, locação financeira, franquia, forfaiting, engineering, merchandising,
countertrade, know-how, e um imenso “et caetera”.

Denomina-se de cessão financeira – correntemente conhecido por “factoring” –


o contrato pelo qual uma das partes (cedente financeiro ou aderente) cede ou se obriga
a ceder a outra (cessionário financeiro ou “factor”), mediante remuneração, a
totalidade ou parte dos créditos de curto prazo de que é titular sobre um ou mais
terceiros (devedor cedido).

Tal como a locação, a cessão financeira é um mecanismo jurídico de


financiamento bancário extremamente divulgado, já que, pese embora alguns
inconvenientes (designadamente, os custos inerentes às comissões de cobrança e
garantia e a perda de autonomia da gestão financeira e comercial do aderente), apresenta
algumas importantes vantagens para o aderente, desempenhando simultaneamente uma
função de financiamento (ao permitir a transformação imediata de créditos em fundos
líquidos), de segurança (mormente no “factoring” próprio ou sem recurso, ao permitir a
transferência para o “factor” do risco do incumprimento ou insolvência dos devedores) e

11
Esta vicissitude, aliás, não é um exclusivo lusitano, afetando também os elencos legais
previstos em outros Códigos europeus congéneres: assim, para o direito espanhol, a doutrina enfatiza
igualmente “a inadequação à realidade do tráfico atual de grande parte dos contratos contemplados no
Código Comercial vigente”.
de simplificação (libertando-o de tarefas e custos acessórios relacionados com a gestão e
cobrança dos créditos).12

O contrato de cessão financeira é um contrato legalmente atípico, embora


nominado e socialmente típico.13 Na verdade, o legislador português, no âmbito da
disciplina das chamadas sociedades de “factoring” prevista no DL n.º 179/95, de 18 de
julho, limitou-se, outrossim que atribuir-lhe um “nomen iuris”, a delimitar
genericamente o objeto (mediante a definição de atividade de cessão financeira ou
“factoring”: cf. art. 2.º, n.º 1) e a estabelecer alguns aspetos mínimos de regime jurídico
daquele contrato (arts. 7.º e 8.º).

Conquanto assente sobre a figura geral da cessão de créditos – cujas regras lhe
são, em princípio, supletivamente aplicáveis (arts. 577.º e segs. CC) 14 -, este contrato
exibe características distintivas próprias: no essencial, encontramo-nos
predominantemente diante de um contrato-quadro¸ celebrado entre um banco ou
instituição creditícia especializada (sociedade de “factoring”: cf. arts. 3.º, h) e 4.º, n.º 1,
b) de RGIC) e uma empresa, que regula e baliza a celebração futura de uma
multiplicidade de contratos individuais de cessão de créditos entre cedente de
cessionário financeiros.15 A cessão financeira ou “factoring” pode revestir diferentes
modalidades: fala-se assim em cessão financeira doméstica ou internacional (consoante
o aderente se obriga a ceder ao “factor” créditos decorrentes de contratos celebrados
com um sujeito do mesmo ou de outro Estado) 16, incompleta ou completa (também
designada “maturity” e “conventional factoring”, consoante o “factor” apenas se dispõe
a prestar ao aderente os seus serviços de cobrança e gestão de créditos, ou também um
serviço de financiamento, concedendo-lhe antecipações sobre o valor nominal dos
créditos cedidos), própria ou imprópria (também designada sem ou com recurso,
consoante o “factor” assume o risco de incumprimento dos devedores cedidos ou não), e
12
Diferentemente, embora vizinho, é o chamado “confirming”, negócio atípico mediante o qual
uma instituição bancária ou financeira especializada providencia um serviço consistente na gestão do
pagamento das dívidas de um empresário perante os respetivos fornecedores.
13
Qualificando-o como um contrato atípico misto, vide o Ac. RL de 27-5-2001, Salvador da
Costa.
14
Atribuindo a este contrato a natureza de uma cessão de créditos, vide os Acórdãos do STJ de 1-
6-2000 (Simões Freire) e STJ, 27-4-2004 (Azevedo Ramos).
15
Em abstrato, a operação de cessão financeira pode ser estruturada segundo um modelo monista
(cessão global de créditos presentes e futuros) ou dualista (celebração de um negócio inicial pelo qual o
aderente se obriga a ceder ao “factor” os créditos de que venha a ser titular sobre certos clientes seus).
16
A crescente importância do “factoring” no seio das transações internacionais levou mesmo à
elaboração da “Convenção sobre o Factoring Internacional” de 1988, a qual, no essencial, contém um
conjunto de regras materiais uniformes diretamente aplicáveis ao contrato em apreço.
aberta ou fechada (consoante postula ou não a notificação do devedor cedido pelo
aderente). Finalmente, no que concerne ao seu regime jurídico, são múltiplos os aspetos
a considerar, que aqui não podem ser analisados exaustivamente: quanto à sua
formação, os contratos de cessão financeira devem revestir forma escrita (art. 7.º, n.º 1,
“ab initio”), consistindo caracteristicamente em contratos de adesão sujeitos ao controlo
da LCCG; quanto ao seu conteúdo, eles devem integrar a disciplina do conjunto das
relações entre o “factor” e o aderente “art. 7.º, n.º 1 in fine), de entre as quais merecem
destaque, por parte do aderente, as obrigações de exclusividade (apenas pode ter único
“factor”), de notificação (dos devedores cedidos) e de remuneração (“máxime”,
comissões de cobrança), e, por parte do “factor”, as obrigações de prestação de serviços
de cobrança, gestão de créditos e outros, de creditação em conta-corrente do aderente
dos montantes dos créditos vencidos, de antecipação de pagamentos de créditos não
vencidos (art.º 8, n.ºs 2 e 3, todos do Decreto-Lei nº. 179/95, de 18 de julho) e de
assunção do risco de incumprimento do devedor cedido (salvo cláusula de cessão com
recurso ou “pro solvendo”).17

O contrato de cessão financeira poderá confundir-se com o contrato de forfaiting


[contrato pelo qual uma entidade (usualmente empresa) transmite a um banco ou
instituição financeira determinados créditos pecuniários a prazo de que é titular sobre
um terceiro (geralmente, incorporados em títulos de crédito e emergentes de contratos
celebrados com este), recebendo em contrapartida uma quantia em dinheiro], no
entanto, distinguem-se porque no contrato cessão financeira o objeto é a disciplina-
quadro de um conjunto de contratos de cessão de créditos de curto prazo e não um
determinado crédito concreto de médio ou longo prazo, como sucede no forfaiting.

Apresenta-se como fonte internacional de direito a Convenção de Otawa de


1988, que regula os contratos internacionais de “factoring” e “leasing”.

Contrato de factoring

 O factoring é um contrato particularmente importante como forma de concessão


de crédito de curto prazo a empresas.
 Embora o factoring possa desempenhar também funções de garantia de
cumprimento e de cobrança dos créditos, a sua principal função é a de
financiamento de curto prazo.

17
Jurisprudência relevante: oponibilidade da compensação – ac. STJ, 6-10-1998, Fernandes de
Magalhães; cessões sucessivas do mesmo crédito, ac. STJ, 25-5-1999, Torres Paulo; natureza jurídica –
STJ, 1-5-2000, Simões Freire.
 O factoring é um contrato no âmbito do qual um sujeito (chamado factorizado)
transmite ao outro (o factor) créditos comerciais de curto prazo que tem sobre os
seus clientes para que o factor lhe adiante o valor desses créditos e ele lhe
garanta o cumprimento dos devedores cedidos bem como a cobrança de créditos
sendo que, em contrapartida, o factorizado pagará as seguintes remunerações ao
factor – juros pelo adiantamento, uma comissão de garantia pela garantia de
cumprimento e uma comissão de cobrança.
 Quando uma empresa vende um bem ou presta um serviço, em regra entrega
logo o bem ou presta logo o serviço, mas concede à outra parte um prazo de
30/60/90 dias para ela pagar o preço.
 A empresa, nesse período, precisa de meios financeiros/liquidez para ela própria
ir cumprindo as suas obrigações (ex. pagar internet, renda, água, luz, salários) e
por isso recorre ao factor para que este lhe adiante, de imediato, parte do valor
desse crédito (em regra, cerca de 80%).
 Se esse crédito, com pagamento por ex. a 60 dias, for de 1000 euros, a empresa
irá transmitir esse crédito ao factor e solicitar um adiantamento de 80% desse
valor.
 O elemento essencial é sempre a cessão do crédito – o factorizado
transmite/cede ao factor o crédito ao preço que tem face ao seu cliente.
 Em qualquer circunstância, no factoring há sempre uma cessão de créditos que
está prevista nos Art. 577º-588º Código Civil.
 Quem irá cobrar este crédito vai ser o factor – este adquire o crédito, passa a ser
o cessionário do crédito e depois irá realizar a cobrança do crédito face ao
cliente do factorizado que se denomina o devedor cedido.
 O factoring é um contrato nominado (denomina-se cessão) sendo que para haver
cessão a lei exige:
1. Créditos comerciais de curto prazo (até 90 dias).
2. Transmissão/cessão de créditos.
 Estrutura do factoring:
1. Contrato quadro/de factoring sendo seguido de um conjunto de outros
negócios (negócios de segundo grau) de forma sucessiva sendo que
destes decorre a cessão dos créditos:
a) O contrato de quadro contém plafons de crédito (ex. o factor
obriga-se a conceder crédito/adiantamentos ao factorizado até um
determinado valor sendo que tal está definido no contrato de
factoring).
b) Ex. o factor concede também o serviço de garantia, também neste
contrato estão fixados os valores até aos quais o facto garante o
valor.
2. Estrutura unitária: assenta num contrato inicial/de factoring, mas este é
um contrato de cessão de créditos futuros, ou seja, deste contrato são
antecipadamente transmitidos os créditos como futuros (são transmitidos
mesmo antes de serem constituídos)
a) Nos termos do Art. 280º Código Comercial é possível a cedência
de créditos futuros desde que preenchido os requisitos de
determinabilidade: (ex. são cedidos créditos sobre os clientes B,
C, D do factorizado; logo que o factorizado celebre contratos com
qualquer um deles, esses créditos são cedidos ao factor).
b) Ex. depois de celebrar um contrato de factoring, A celebra um
contrato de compra e venda com B, o crédito que A tem sobre B
transmite-se imediatamente ao factor logo que o negócio seja
celebrado.
c) Este negócio não necessita de um negócio posterior de
transmissão de créditos.
d) É necessário haver critérios de determinabilidade (ex. clientes do
factorizado, valores dos créditos).
 O núcleo do factoring é a cessão de créditos (ex. A tem um crédito sobre B. A
vendeu-lhe uma mercadoria sendo que A tem um crédito ao preço).
 A cessão de créditos significa que esse crédito é cedido a outro sujeito factor,
passando o factor a ser titular do crédito sendo que é este que vai ter de fazer a
cobrança do crédito.
1. O crédito é transmitido ao factor sendo este o cessionário, mas B não
sabe e não precisa de saber ou dar consentimento.
2. É necessário proceder à notificação de B que consiste em informar este
de que o seu credor é o F sendo que B só pode pagar ao F.
3. Se B não for notificado este não sabe que o crédito foi transmitido e, se
não sabe está protegido, sendo que se pagar ao A (cedente) extingue-se a
obrigação.
4. Se A celebrar com B um contrato nos termos dos quais altera o conteúdo
do contrato (prazo, preço) esse negócio é oponível ao factor se a cessão
não tiver sido notificada – Art. 581º/582º Código Civil.
5. Não havendo notificação, se A ceder novamente a H, o credor é aquele
que em primeiro notificar B sendo que este será quem adquire o crédito
(adquire o crédito a non domino) – Art. 583º Código Civil.
 A notificação do crédito é relevante pois enquanto o crédito não for notificado o
devedor cedido (B) pode pagar liberatoriamente ao cedente, pode celebrar com
os cedentes negócios que serão oponíveis ao cessionário e também, perante uma
dupla cessão de crédito, aquela que prevalece é aquela que foi primeiramente
notificada.
 A notificação é feita da seguinte forma:
1. Ex. A vende a B uma mercadoria.
2. No contrato de compra e venda, o vendedor tem sempre de emitir uma
fatura sendo que o facto o obriga a colocar uma indicação de que aquele
crédito foi cedido ao factor e que só o pagamento ao facto será
liberatório.
3. Assim, quando o vendedor envia a mercadoria com a fatura, está a
notificar o comprador da cessão, enviando também a cópia da fatura ao
factor.
4. No entanto, o factor não se basta com a cópia da fatura, notificando
também B sobre a cessão (há uma dupla notificação).
 Meios de defesa oponíveis pelo devedor cedido ao factor:
1. Ex. A vende a B. A cede o crédito ao factor e este, como é titular do
crédito, vai cobrá-lo a B.
2. O devedor cedido por opor ao factor todos os meios de defesa
decorrentes desta relação (compra e venda) – ex. A vendeu a B mas A
não lhe entregou a mercadoria sendo que B pode opor a exceção de não
cumprimento ao facto.
3. Pode recorrer a todos os meios de defesa que decorram do contrato
sinalagmáticos decorrentes da relação entre o factorizado e o devedor
cedido.
4. Pode recorrer também aos meios de defesa do Art. 585º Código Civil:
a) O mais importante destes meios de defesa é a compensação.
b) Ex. há um contrato de compra e venda e deste decorre um crédito
de 1000 euros que é cedido ao factor sendo que o factor procede à
cobrança.
c) No entanto, foi celebrado um outro contrato entre as mesmas
partes sendo que este se traduzia num contra crédito em 1100
euros (B é agora credor de A).
d) O devedor cedido (B) pode recorrer à compensação nos termos
do Art. 585º Código Civil (B pode recorrer a todos os meios de
defesa que se constituíram antes da cessão do crédito – até ao
conhecimento da cessão, ou seja, da notificação).
e) Não é necessário que o contra crédito se tenha vencido (seja
exigível) antes desse período, basta que ele se tenha constituído.
 A cessão de créditos não existe só no âmbito do factoring:
1. Os bancos cedem créditos, uma empresa para se financiar muitas vezes
cede créditos.
 Modalidades de cessão de créditos no factoring:
1. Critério do adiantamento e critério da garantia:
a) Cessão de crédito com recurso e com adiantamento:
I. Com recurso: o factor não presta o serviço de garantia.
II. Com adiantamento: o factor adianta o crédito necessário.
III. Esta cessão funciona da seguinte forma - ex. A celebra
com B um contrato e cede o crédito ao factor.
IV. O devedor cedido paga (1000 euros), o factor retira o
adiantamento (800 euros), os juros e a comissão de
cobrança e entrega o remanescente a A.
V. Se o devedor cedido não pagar, o factor não prestou o
serviço de garantia, mas apenas o de adiantamento sendo
que o factor retransmitirá o crédito a A, cobrando-lhe o
crédito adiantado, os juros e a comissão de cobrança.
VI. Esta modalidade de cessão é um contrato misto de mútuo
(o factor empresta o dinheiro) e de mandato (o factor
possui poderes para cobrança do crédito).
b) Cessão sem recurso e com adiantamento:
I. Ex. Se B não pagar, uma vez que o factor prestou o
serviço de garantia, ele não vai retransmitir o crédito e vai
entregar a diferença entre o crédito e o que foi adiantado,
menos os juros, menos a comissão de cobrança, menos a
comissão de garantia.
II. Esta modalidade de cessão é um contrato misto, mas mais
complexo, possui na mesma o elemento de mútuo (há um
adiantamento), também existe o elemento de mandato (o
factor vai cobrar o crédito) mas possui um elemento de
fiança (o factor presta um serviço de garantia, este torna-
se fiador do devedor cedido)
c) Cessão com recurso e sem adiantamento:
I. O factor apenas vai cobrar o crédito, este não presta o
serviço de garantia nem de adiantamento sendo que
apenas cobrará uma comissão de cobrança.
II. Se o devedor pagar, o factor vai entregar o crédito a A
menos a comissão de cobrança.
III. Se B não pagar, o factor vai retransmitir o crédito e não
cobrará nada, exigindo que A lhe pague a comissão de
cobrança.
IV. Nesta modalidade de cessão este contrato é simplesmente
um mandato para cobrança, mas é um mandato fiduciário
(o factorizado/cedente não se limitou a conceder ao factor
poderes para ele cobrar o crédito, pois podia tê-lo feito
através de uma procuração, mas sim transmitiu-lhe o
crédito para esse efeito).

FORMA ELETRÓNICA:

A contratação mercantil por via eletrónica, a qual implica, por definição, uma
desmaterialização do suporte das declarações de vontade dos contraentes: não
surpreende assim que os legisladores, um pouco por todo o mundo, venham
consagrando uma equivalência dos documentos eletrónicos aos documentos em papel,
apontando consequentemente para uma progressiva neutralidade das formas (físicas ou
eletrónicas) dos negócios jurídicos.

No direito português, são dois os diplomas fundamentais outros aspetos


particulares na matéria, sem prejuízo de vários outros aspetos que agora não é possível
abordar.

Por um lado, o DL N.º 290-D/99, de 2 de agosto estabelece “o documento


eletrónico satisfaz o requisito legal da forma escrita quando o seu conteúdo seja
suscetível de representação como declaração escrita art. 3. Tal significa que serão
considerados documentos escritos, no sentido do art. 363.º do CC “quaisquer
documentos gerados e conservados através de processamento eletrónico de dados”.

- Além disso, o mesmo diploma contém ainda disposições relevantes em sede da


perfeição jurídico-negocial das declarações de vontade contidas em documentos
eletrónicos (no caso de existência de convenção expressa ou tácita, de endereço
eletrónico art. 6/1 e 4. do valor jurídico da validação cronológica aposta nesses
documentos (permitindo assim fixar com extrema precisão o momento da produção dos
respetivos efeitos art. 6/2 e do valor formal da respetiva equiparação (permitindo
integrar as normas, muito abundantes na lei positiva e em contratos duradouros, que
exigem comunicações por carta registada sem ou com aviso receção: cf. art. 6.°, n.º 3).

Por outro, o Decreto-Lei n.º 7/2004 de 7 de janeiro, determina que "as


declarações emitidas por via eletrónica satisfazem a exigência legal de forma escrita
quando contidas em suporte que ofereça as mesmas garantias de fidedignidade,
inteligibilidade e conservação" (art. 26.°, n.° 1): tal significa agora que as declarações
contidas em documento eletrónico que reúnam tais garantias ("maxime", documento
com assinatura eletrónica qualifica, certificada por entidade credenciada) preenchem
integralmente o requisito legal de forma escrita cominado para a formação contratual
jusmercantil.

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