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Por outro lado, pelo que se sabe sobre “probabilidade”, mesmo ao nível do senso
comum, ela é algo que se apresenta em “graus”: da probabilidade de grau mínimo à
probabilidade em grau máximo. Contudo, mesmo a probabilidade no mais elevado grau,
como quer que isso seja definido, ela jamais se confunde com algo que se possa definir
como “certeza”.
Situações em que o juiz, em sede de cognição exauriente, não decide a causa mediante
“juízo de certeza”:
Note-se que, nessa segunda hipótese, a cognição exauriente não apenas não se realiza
através de um “juízo de certeza”, como também, ela própria, se manifesta através de
um... juízo de probabilidade!
O termo ‘juízo’ é ambíguo e expressa noções distintas, analisadas por disciplinas tão
diferentes como a filosofia, a epistemologia, a psicologia cognitiva, a ética outras, sendo
tais noções objeto de intensas controvérsias.
Por isso mesmo, numa análise de textos legais, sequer se mostra recomendável se valer,
como termo teórico, de um termo assim, pois fazê-lo, sem levar em consideração e
tomar algum posicionamento sobre todas essas controvérsias, expõe os juristas a severas
críticas.
Impõe-se, portanto, que ele seja substituído por outro que possa ser definido clara e
objetivamente, apto a tratar das questões que são tratadas com o uso do termo ‘juízo’.
Dessa forma, parece conveniente substituir o termo ‘juízo’ pelo termo ‘convicção’, de
modo a quando se falar em “juízo sobre a existência do direito”, se está a falar em
“convicção sobre a existência do direito”.
Tomando como referência o convencimento que o juiz forma para conceder tutela de
urgência e aquele que ele forma para proferir sentença, ao final do processo, a diferença
que se identifica é a seguinte: ambos tomam, igualmente, a existência de um direito
alegado, sendo que, no primeiro caso, o convencimento se vale de elementos
processualmente falando incompletos, no sentido de ainda não terem sido exauridas as
oportunidades associadas ao contraditório para produção/colheita de novos elementos,
e, no segundo caso, ele se vale de elementos que são processualmente falando
completos, no sentido de já terem sido exauridas as oportunidades associadas ao
contraditório para produção/colheita de novos elementos.
Assim, ambos são convencimentos prováveis, sendo que o segundo pode ser
considerado mais provável se e somente se forem efetivamente produzidos novos
elementos para a formação do convencimento do juiz. Da mesma forma, o primeiro
pode ser considerado “menos provável” tão somente por razões processuais e admitindo
a hipótese de que outros elementos venham a ser produzidos, o que é um fato
inteiramente contingente e nem sempre ocorre.
Quanto às decisões judiciais, é indiscutível que tal noção não tem lugar: não se pode,
em absoluto, falar de “certeza” quanto à interpretação de textos legais, assim como dela
não se pode falar quanto ao convencimento do juiz quanto aos fatos alegados. Em
particular quanto a este segundo aspecto, por mais robusta que seja a prova dos autos,
jamais pode ser eliminada a possibilidade hipotética de existirem contraprovas que
poderiam inquiná-las. Do fato de que tais contraprovas não tenha sido produzidas, não
se pode inferir, racionalmente e sem incorrer na falácia ad ignorantia, que elas não
possam existir.
Daí porque, no Common Law, as decisões judiciais quanto aos fatos da causa são
fundadas em dois graus de probabilidade, ou seja, dois standards probatórios: aquele
do “beyound reasonable doubt” e o da “preponderance of probabilities”. Em qualquer
hipótese, portanto, a causa será decidida com base em um “juízo de probabilidade”,
nunca num suposto “juízo de certeza”.
Vale notar que no âmbito específico das disciplinas que se ocupam de “probabilidades”
– a teoria matemática da probabilidade, a lógica e a epistemologia – este termo,
simplesmente, não é utilizado. Ele é um termo do jargão teórico, tão somente, da
psicologia cognitiva e de suas aplicações, no que diz com o estudo do raciocínio
humano, como um dos processos cognitivos. Nesse contexto, ele é utilizado para
designar a avaliação informal que as pessoas fazem quanto a determinados fatos,
especificamente para descrever o quanto tais avaliações estão corretas, à luz da teoria
matemática da probabilidade. É nesse sentido que se constatou – apesar das
controvérsias quanto a isso – o viés da conjunção: as pessoas, em numero elevado de
casos, tendem a avaliar a ocorrência conjunta de dois fatos como mais provável do que a
ocorrência de apenas um deles, avaliação esta que é equivocada à luz da teoria
matemática da probabilidade, onde está assentado que a ocorrência conjunta de dois
fatos é igual ou menor do que a ocorrência de apenas um deles.
Por outro lado, o uso que costuma ser dado a ‘juízo de probabilidade’, deve
corresponder a uma definição mais complexa, do que significa, ao fim e ao cabo, o
termo ‘probabilidade do direito’, não como “termo comum”, mas como um termo legal.