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Publicado em NOVA ESCOLA Edição 271, 14 de Janeiro | 2016

Educação Infantil | Creche | Sala de aula

Lugar de bebê é fora do berço


Crianças até 1 ano podem ter uma rotina permeada de explorações e
descobertas
Fernanda Salla

No ofurô, cada um ampliou a consciência sobre si mesmo e interagiu com os outros

Que atividades realizar com pequenos até 1 ano, que geralmente não falam nem andam? Antes de
assumir uma turma de berçário, Marlene Steffens, do CEI Miosótis, em Joinville, a 176 quilômetros de
Florianópolis, costumava ouvir questionamentos como esse. O que a princípio parece um empecilho,
no entanto, é um foco de oportunidades. "Uma das especificidades dessas crianças é que estão em um
momento de aquisição de linguagem, locomoção, comunicação e conhecimento sobre o corpo. Por
isso, todo estímulo é necessário", diz Maria Teresa Venceslau de Carvalho, coautora do livro Interações:
Ser Professor de Bebês - Cuidar, Educar e Brincar, uma Única Ação (Cisele Ortiz, 221 págs., Ed. Blucher,
11/3078-5366, 53 reais).
Livres para investigar o jardim, os pequenos exploraram brinquedos, sons e movimentos

O biólogo suíço Jean Piaget (1896-1980) descreve essa fase do desenvolvimento infantil como sensório-
motora, em que conhecemos o mundo por meio dos sentidos. Propiciar o contato com elementos
visuais, sonoros, olfativos e táteis auxilia no aumento e no aperfeiçoamento desse repertório. Por
acreditar na importância da experimentação, Marlene elaborou um planejamento anual voltado à
exploração de diferentes materiais e espaços dentro e fora da classe.

Uma iniciativa foi transformar os momentos de cuidados diários em possibilidades de aprendizagem. A


educadora começou pela hora da higiene, alternando alguns tipos de banho - de imersão, ducha e com
objetos -, para proporcionar prazer e sensações diferentes às crianças.

Em outra proposta, o berçário foi transformado em um spa, com ofurôs, velas e óleos aromáticos para
perfumar o ambiente e música relaxante. Cada bebê foi colocado dentro de um balde com água
aquecida a 37 graus Celsius e pétalas de rosas. A professora alerta para a importância de regular a
quantidade de água, que deve ficar abaixo do pescoço da criança quando ela estiver imersa. Para
favorecer a interação entre os bebês, os baldes foram colocados perto uns dos outros. Ela também os
aproximou do espelho fixado na parede para auxiliá-los na descoberta do próprio corpo, ampliando a
consciência de si mesmo.

A logística para dar conta de tudo isso não foi fácil. "Lidar com crianças tão pequenas demanda uma
organização muito precisa para que elas não fiquem desassistidas", afirma Clélia Cortez, formadora do
Instituto Avisa lá. Marlene conta com a ajuda de duas auxiliares. Como só tinham quatro baldes, ela
coordenava os banhos enquanto uma cuidava dos demais bebês e a outra mudava a água e higienizava
tudo para que as próximas crianças pudessem entrar nos ofurôs.

Atividades ao ar livre

As áreas externas da creche também se tornaram espaços ricos em descobertas para os pequenos,
com a organização de cantos de atividades. A turminha foi levada ao jardim da instituição, em que,
sobre um tatame, foram colocados instrumentos musicais, bolas e brinquedos. "O ambiente é um
terceiro educador e esse tipo de organização favorece a autonomia das crianças", diz Clélia. No grupo,
houve quem engatinhou até o objeto favorito, subiu no cavalinho e bateu a mão no pandeiro. Marlene
interveio com ações específicas, como jogar a bola para pegarem.
Em cada um dos espaços da creche, novos desafios foram ofertados à turma

Para Clélia, dar espaço e tempo para que os bebês possam fazer escolhas é essencial. Isso não significa
bombardeá-los com atividades - o excesso de estímulos pode confundi-los. A ideia é ter um olhar
atento e individual para cada um a fim de identificar interesses e avanços e, assim, oferecer desafios
adequados. Momentos coletivos de convivência como esses são interessantes, pois a criança pequena
tende a aprender por imitação e, ao observar movimentos feitos pelos colegas, se desenvolve mais
rapidamente.

No canteiro de plantas que circunda o gramado, a professora propiciou o contato com o solo seco e
úmido. Os bebês foram colocados sobre a terra e, delicadamente, ela a oferecia para que tocassem.
"Alguns estavam mais resistentes no começo, mas aos poucos eu fui aproximando cada um do
material", conta.

No parque da instituição, que conta com um playground, um labirinto de toras e um morro de pneus e
areia, a turma pôde circular livremente, o que contribuiu para o avanço motor. Uns subiram e
desceram o monte, apoiando-se nos pneus, outros tentaram andar pelo labirinto segurando nas
paredes.

Caso alguém se recusar a participar da atividade, é preciso respeitar seu tempo e não forçar. "Se o
bebê não quiser ficar em pé, não adianta pegar na mão dele e segurá-lo. O mais adequado é oferecer
outros meios para que ele faça o movimento naturalmente, como colocar objetos em que possa se
apoiar e almofadas para que caia com segurança", afirma Maria Teresa.

Todas as propostas entraram na rotina e foram reproduzidas constantemente. Repetir as atividades é


importante, pois a continuidade faz com que a criança ponha em prática habilidades já adquiridas,
evite o que já sabe que dá errado e teste novos gestos e movimentos. "É preciso, no entanto, fazer
ajustes constantes nas propostas para possibilitar novos desafios", finaliza Clélia. Ao final de cada
semestre, a docente preparou relatórios individuais, entregues às famílias.

1 Planejamento consistente Observe os espaços disponíveis na creche e organize atividades que


envolvam a exploração de diferentes materiais e locais. As ações devem ser repetidas ao longo ao ano,
entrando na rotina da turma.

2 Aprendizado nos cuidados Transforme o banho em um momento de desenvolvimento. Para


estimular os sentidos, planeje diferentes tipos, como de ducha, com bolinhas e de ofurô.

3 Exploração em todo canto No espaço externo, organize cantos com brinquedos, bolas e
instrumentos musicais. Deixe os bebês livres para interagir e fazer as próprias escolhas.
4 Estímulos e aprendizagem Ofereça às crianças diferentes texturas para tocarem, como terra úmida
e seca. Leve-as também a locais com objetos em que possam se apoiar e testar o equilíbrio e a
motricidade.

5 Relatórios de avaliação Acompanhe o desenvolvimento dos pequenos ao longo do tempo e prepare


relatórios individuais, que podem ser entregues às famílias.

Um universo de sensações

Conheça as atividades realizadas pelos bebês do CEI Miosótis e saiba o que aprenderam:

Bolas de todo tipo

Em um dos cantos de atividades organizados no gramado da creche, foram disponibilizadas bolas de


diversos materiais e tamanhos para os pequenos. Ao ir atrás dos objetos, eles desenvolvem a
motricidade.

Pés na terra

A criançada entrou de corpo inteiro no canteiro de plantas ao redor do jardim. Para ajudar quem não
quis se sujar, a professora interveio, fazendo com que se familiarizasse com a terra e as plantas.
Motricidade

No morro formado por pneus e areia, mesmo os bebês que não sabiam andar se arriscavam a subir e
descer. O fazer autônomo das crianças auxilia no desenvolvimento motor.

Estímulos sonoros

Instrumentos musicais variados foram colocados sobre um tatame no jardim. A educadora Marlene
Steffens incentivou os pequenos a tocá-los e a prestar atenção nos sons que cada um produzia.

Exploração livre

No parque da creche, onde há brinquedos, playground e um labirinto de madeira, os bebês ficaram


livres para explorar o ambiente. Alguns deles optaram por brincar no chão de areia com pás.
Banho de bolinhas

Os momentos de higiene foram transformados em possibilidades de aprendizagem. Em uma das


propostas, foi realizada uma espécie de banho a seco, em que as crianças faziam chuva de bolinhas.

Sensações

As crianças puderam sentir a diferença entre a terra seca e a úmida em uma proposta voltada a
ampliar o repertório de sentidos. A sujeira das mãos e das roupas foi recompensada com muito
aprendizado.

Ofurô no espelho

Em baldes com água a 37° C, os bebês experimentaram um banho relaxante, realizado em frente a um
espelho. A proposta ajuda no desenvolvimento da consciência corporal das crianças.
Ducha com boneca

No banho, os bebês puderam sentir a água cair sobre eles enquanto interagiam com bonecas. Assim,
eles se familiarizam com os gestos realizados pelas educadoras nesse momento.

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